Evolução das redes telefônicas a partir de processos

Transcrição

Evolução das redes telefônicas a partir de processos
Evolução das redes telefônicas a partir de
processos gradativos de modificação de
topologia de rede e conversão de centrais
André Fagundes da Rocha*
O artigo discute a evolução das redes telefônicas convencionais baseadas em comutação de circuitos
para redes de comutação de pacotes onde o tráfego de voz é transportado através do protocolo IP
(VoIP), conhecidas como redes convergentes ou redes de próxima geração. Os principais obstáculos
observados nessas evoluções são a necessidade de mudanças significativas e abruptas na topologia da
rede telefônica em operação e a dificuldade de manter transparência para os serviços oferecidos aos
assinantes. O artigo apresenta uma proposta de evolução das redes existentes, de forma que as
interconexões entre as centrais telefônicas e a parcela do tráfego de voz sobre IP possam ser modificadas
gradativamente até que se atinja um estágio final em que as centrais telefônicas estão totalmente
convertidas em unidades de acesso IP classe 5, controladas por um ou mais softswitches, com todo
tráfego de voz sendo transportado pelo protocolo IP. Por fim, essa abordagem é exemplificada pela
descrição da experiência de conversão de centrais Trópico R e RA em unidades Vectura IP Access, que é
uma solução baseada no aproveitamento do hardware instalado na central, o que contribui para reduzir
os custos das operadoras de telefonia na evolução de suas redes.
Palavras-chave: Telefonia. Topologia de rede. Redes convergentes. Voz sobre IP. Media gateways.
1.
Introdução
A intensificação da concorrência no
mercado nacional de telefonia, em virtude das
novas concessões para serviço local e longa
distância, da expansão da telefonia móvel e do
surgimento de alternativas para estabelecimento
de chamadas através da Internet – principalmente
chamadas de longa distância –, vem exigindo
das operadoras nacionais de telefonia fixa a busca
por instrumentos para retenção de seus clientes
e preservação de suas receitas. Assim, uma das
principais estratégias das operadoras é o
oferecimento de novos serviços, diferenciados e
inovadores, que possam constituir esse
instrumento de retenção de clientes e contribuir
para compensar eventuais perdas de receita com
o serviço de voz tradicional.
Uma solução que possibilita a introdução
de novos serviços de forma ágil, flexível e com
eficiência na utilização dos recursos de rede é a
evolução das redes telefônicas convencionais,
baseadas em comutação de circuitos, para redes
convergentes baseadas em comutação de
*
pacotes, com interfaces abertas e padronizadas,
também denominadas redes de próxima geração
[1] [2] [3]. A proposta de convergência das redes
de voz e dados das operadoras para uma rede
única, otimizada para trafegar dados e capaz de
suportar o serviço de telefonia através do
protocolo IP [4] se justifica do ponto de vista
econômico-financeiro não apenas pela
perspectiva de receitas para serviços
diferenciados – com destaque para aqueles
baseados na integração entre voz e dados [2]
[5] – como também pela redução de custos
operacionais obtida pela convergência das infraestruturas de transporte e gerenciamento. Além
disso, as redes convergentes proporcionam
otimização dos recursos de transmissão pela
utilização de codecs com reduzida taxa de bits,
utilização de técnicas de supressão de silêncio
que minimizam a banda necessária para o
serviço de voz e pela própria multiplexação
estatística inerente à comutação de pacotes, que
contrasta com a comutação de circuitos onde
os recursos das centrais telefônicas permanecem
alocados durante toda a chamada.
Autor a quem a correspondência deve ser dirigida: [email protected].
Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 1, n. 1, p. 61-70, jan./dez. 2005
Evolução das redes telefônicas...
Apesar das vantagens que a evolução das
redes telefônicas em direção a um modelo de rede
baseado em comutação de pacotes traz para as
operadoras, alguns obstáculos importantes
dificultam essa evolução nas redes em operação.
Uma das principais dificuldades está relacionada
com a modificação abrupta que essa evolução
significa para a topologia da rede, o que se torna
particularmente complicado em se tratando de uma
rede em operação. As propostas de evolução que
sugerem a desativação completa da rede antiga
seguida da ativação da nova rede são inviáveis
em redes grandes e complexas como as redes
telefônicas nacionais. Outras questões que
merecem atenção dizem respeito à necessidade
de garantir transparência nos serviços para os
assinantes, obrigando que a rede convergente seja
capaz de, no mínimo, tornar disponíveis os
mesmos serviços com o mesmo nível de qualidade
que a rede telefônica em operação; e aos custos
de se implantar um backbone IP atendendo os
requisitos de Quality of Service (QoS) [6] [7]
exigidos pelo serviço telefônico, com capilaridade
suficiente para alcançar todas as localidades
atendidas pela rede atual.
Com base nesse cenário, o presente artigo
descreve uma proposta de evolução das redes
telefônicas convencionais para redes convergentes,
que busca minimizar essas dificuldades práticas
vividas pelas operadoras. A proposta tem como
premissas a transparência de serviços e interfaces
para os usuários, além da preservação, em um
primeiro momento, das interconexões entre os
elementos de rede (centrais telefônicas), de
modo que as modificações na topologia da rede
em operação sejam gradativas.
O artigo está organizado da seguinte forma.
A seção 2 apresenta a topologia das redes
telefônicas atuais e o modelo proposto para redes
convergentes. A seção 3 discute as principais
dificuldades da evolução para as redes
convergentes e define uma proposta de evolução
que visa à minimização desses impactos sobre as
redes em operação. Na seção 4, essa proposta é
exemplificada com a solução de evolução das
centrais telefônicas Trópico, em sintonia com o
modelo de rede convergente proposto. Por fim,
as conclusões são apresentadas na seção 5.
2.
Topologias de Rede
2.1. Rede de Telefonia Pública Comutada –
RTPC
As redes nacionais de telefonia fixa baseadas
em comutação de circuito, que compõem a Rede
de Telefonia Pública Comutada (RTPC), adotam
uma topologia hierarquizada, conforme ilustrado
na figura 1 [8].
As centrais telefônicas locais, também
denominadas centrais de comutação classe 5, são
aquelas que provêem interfaces de acesso aos
usuários do serviço telefônico através de interfaces
analógicas a dois fios. Essas centrais geralmente
se interconectam a centrais telefônicas com função
trânsito, também denominadas centrais de
Figura 1 Topologia da RTPC
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Evolução das redes telefônicas...
comutação classe 4, através de interfaces de
acesso digital E1 a 2 Mbit/s utilizando soluções de
transmissão apropriadas (ópticas, satélite, rádio,
etc.). As centrais trânsito, por sua vez, podem se
interconectar a centrais de maior hierarquia como
centrais trânsito internacionais. Através de todas
essas interconexões, o tráfego de voz pode fluir
entre as centrais locais, via centrais trânsito,
possibilitando o estabelecimento de chamadas
entre usuários atendidos por centrais locais
distintas, mediante um plano de encaminhamento
adequado.
Para comunicação entre esses diversos
elementos de rede (centrais telefônicas), são
utilizadas sinalizações apropriadas, com destaque
para sinalização associada ao canal, como o R2
Digital, e sinalização por canal comum Signaling
System Number 7 (SS7) [9], em que as mensagens
de sinalização podem possuir um trajeto próprio,
distinto do tráfego de voz, através de uma rede de
sinalização composta por diversos pontos de
transferência de sinalização (PTS).
2.2. Redes Convergentes
Uma abordagem bastante empregada na
literatura [6] modela as redes convergentes em três
camadas, conforme ilustrado na figura 2. Essas
camadas se comunicam através de interfaces
abertas e padronizadas, que proporcionam
flexibilidade à rede e garantem interoperabilidade
entre equipamentos e sistemas de diversos
fornecedores.
A camada de acesso e transporte contém
os elementos que compõem a infra-estrutura
(backbone IP) da rede convergente, como os
switches e roteadores, além dos media gateways,
responsáveis por prover as interfaces de acesso à
rede convergente e pela codificação e
packetization dos sinais de voz. Os media
gateways são freqüentemente classificados como:
- Residential gateways, que são os
equipamentos que provêem a interface da
rede convergente com aparelhos
telefônicos convencionais através de
interfaces analógicas a dois fios.
- Enterprise gateways, que são os
equipamentos que provêem a interface da
rede convergente com PABX digitais
através de enlaces E1, utilizando
principalmente sinalização R2 Digital.
- Trunking gateways, que são os
equipamentos que provêem a interface da
rede convergente com a RTPC através de
enlaces E1, utilizando principalmente
sinalização por canal comum SS7.
A camada de controle de chamadas é
responsável pelo estabelecimento, tarifação,
supervisão e liberação de todas as chamadas que
trafegam pela rede convergente, por meio do
controle dos media gateways via protocolos
padronizados. O elemento de rede que
desempenha essa funções é denominado
genericamente call agent, que pode ser um
softswitch, media gateway controller ou SIP Server.
A camada de serviços é constituída por
servidores e bases de dados que controlam a
lógica de execução dos serviços oferecidos aos
usuários atendidos pela rede convergente. O
desenvolvimento de novos serviços segundo esse
modelo se resume à introdução de novas
aplicações nesses servidores. Por isso, a
implantação de novos serviços nessas redes é
considerada mais ágil, flexível e abrangente do que
nas redes telefônicas convencionais.
A figura 3 ilustra uma topologia típica de
rede convergente baseada em protocolo IP [1]
Figura 2 Modelo de rede convergente
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Evolução das redes telefônicas...
Figura 3 Topologia de rede convergente
onde o controle de chamadas é centralizado em
um ou mais softswitches. Nessa topologia, os
residential e enterprise gateways realizam as
funções tradicionalmente desempenhadas pelas
centrais telefônicas locais, tornando disponíveis
o serviço de voz a assinantes, telefones públicos
e centrais privadas (PABX) conectados a suas
interfaces de acesso. Internamente, os sinais de
voz provenientes dessas interfaces são
codificados e encapsulados em pacotes RTP
[10], que são então enviados ao backbone IP a
partir de uma solução de transmissão adequada.
Para interconexão da rede convergente
com a RTPC, possibilitando que assinantes
atendidos através de residential e enterprise
gateways estabeleçam chamadas com assinantes atendidos pelas centrais telefônicas da RTPC,
devem ser introduzidos na rede os trunking
gateways, que passam a desempenhar, nesse
caso, o papel das centrais trânsito na interconexão com outras redes. A operadora pode adotar
a estratégia de vários pontos de interconexão,
utilizando vários trunking gateways de menor
capacidade, ou um número reduzido de pontos
de interconexão, concentrando trunking gateways
de maior porte em poucas localidades. Em
ambos os casos, a sinalização com a RTPC
pode ser provida diretamente pelo softswitch
através de rotas de sinalização de canal comum
SS7 (modo quase-associado) com os pontos de
transferência (PTS) da rede de sinalização.
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Para o estabelecimento das chamadas
envolvendo os diversos media gateways da rede,
utilizam-se protocolos de sinalização que também
são transportados pelo backbone IP em conjunto
com o tráfego de voz. Os mais comuns são o
MGCP, H.248, H.323 e SIP [1] [7]. Por meio desses
protocolos, o softswitch cria, modifica e libera
conexões entre as interfaces dos diversos media
gateways, possibilitando a transmissão de pacotes
RTP entre eles e tornando disponível, assim, o
serviço telefônico aos usuários da rede. No caso
dos residential gateways, o softswitch adicionalmente os instrui a detectar e informar sobre
determinados eventos (tais como telefone fora
do gancho, tom de modem ou fax, etc.) e aplicar
determinados sinais a suas interfaces (tais como
tom de ocupado, tom de controle de chamada,
corrente de toque, etc.) para que o serviço
telefônico da rede convergente seja efetivamente
transparente para o usuário em relação ao
serviço da rede tradicional.
3.
Evolução das redes telefônicas
A evolução das redes telefônicas baseadas
em comutação de circuitos para redes convergentes baseadas em comutação de pacotes passa
necessariamente pela substituição das centrais
locais por media gateways, que se tornam os
responsáveis por prover as interfaces de acesso
aos assinantes. O tráfego de voz dos assinantes
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Evolução das redes telefônicas...
passa então a ser convertido em pacotes RTP
que são encaminhados a um backbone IP
disponível a todos os media gateways da rede
convergente. Todas as chamadas originadas e
recebidas pelos assinantes passam a ser
controladas e tarifadas de forma centralizada por
um ou mais softswitches que se comunicam com
os media gateways através do mesmo backbone
IP. Em função da necessidade de convivência e
estabelecimento de chamadas com as demais
redes telefônicas existentes, devem ser implantados trunking gateways em substituição às
centrais trânsito em sua função de interconexão
com outras redes. Na realidade, as centrais
trânsito podem ser totalmente eliminadas na nova
topologia de rede, pois suas funções passam a
ser exercidas de forma distribuída pelos trunking
gateways, softswitches e backbone IP. Adicionalmente pode ser necessária a introdução de
plataformas de serviço para preservar serviços já
disponíveis na rede telefônica, bem como
servidores de mídia para prover anúncios.
Uma das principais dificuldades na implementação dessa evolução é a mudança significativa que representa na topologia da rede. Dessa
forma, a alternativa mais direta de se implementar
a evolução seria a desativação completa da rede
em operação, seguida da ativação da nova rede,
o que, no entanto, se torna totalmente absurdo
face à dimensão e complexidade das redes
telefônicas. É fato, então, que a evolução das
redes telefônicas deve ser gradual. O desafio consiste em como operacionalizar esse processo sem
criar topologias intermediárias que exijam
investimentos adicionais proibitivos.
Além dos argumentos técnicos, a exigência
de que a evolução das redes telefônicas seja um
processo gradual também decorre dos custos
envolvidos. Uma vez que a evolução completa
da rede telefônica de uma operadora representa
investimentos significativos, estas certamente vão
optar por evoluir em um primeiro momento apenas parte de sua rede, como aquelas centrais
telefônicas mais antigas, obsoletas e sem suporte
técnico da parte dos fornecedores. Ainda sob a
ótica dos custos, a evolução das redes exige
investimentos importantes para a implantação de
um backbone IP que tenha capilaridade suficiente
para atender todos os novos media gateways que
substituem centrais locais e que seja dotado dos
mecanismos de qualidade de serviço (QoS)
exigidos para o tráfego de voz. Essa questão
reforça ainda mais a necessidade de que a
evolução das redes telefônicas seja gradual,
possibilitando que o backbone IP cresça
gradativamente à medida que o processo de
evolução caminhe.
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Uma terceira questão de grande importância é o requisito de transparência de serviços
para os assinantes. É extremamente desejável
que todo o processo de evolução da rede
telefônica não tenha impacto sobre os
assinantes, o que exige que a rede convergente
seja capaz de disponibilizar, pelo menos, os
mesmos serviços que a rede anterior, com o
mesmo nível de qualidade, e que os procedimentos de evolução não representem longas
interrupções na prestação do serviço telefônico.
Dado esse cenário, a proposta de evolução
da rede telefônica apresentada nesse artigo assume
como premissas fundamentais a transparência de
serviços para os assinantes e a gradatividade do
processo de evolução da rede telefônica, sem a
necessidade de modificações abruptas na
topologia da rede. A idéia básica proposta para
atender essas premissas é que a evolução inicial
de cada elemento de rede (central telefônica) possa
ser independente em relação aos demais. Dessa
forma, a operadora pode identificar quais centrais
locais deseja fazer evoluir em um primeiro momento, sem o compromisso de que todas as centrais
tenham de ser substituídas pelos media gateways,
o que lhe garante flexibilidade. Porém, para que a
central local possa ser evoluída de forma independente, ela deve preservar suas interconexões com
os demais elementos de rede, o que significa ser
substituída não apenas por residential gateways,
como também por trunking gateways que
possibilitem preservar suas rotas de entrada e saída
de modo que a rede telefônica não reconheça que
houve modificações naquele nó.
Com essa estratégia, todo tráfego RTP (voz)
permanece interno à localidade, mesmo nas
chamadas de entrada ou saída. Se, por exemplo,
um assinante de uma localidade origina uma
chamada de saída para outra localidade, seu
tráfego de voz é convertido para IP em um
residential gateway e, em seguida, restaurado à
forma original no trunking gateway que provê a
rota de saída, a qual deve ser a mesma rota que
seria utilizada pela central local, de forma que
fique transparente para a central que recebe a
chamada. Como todas as chamadas passam a
envolver media gateways, elas devem ser
controladas pelos softswitches, que devem estar
acessíveis através do backbone IP para a troca
de mensagens de sinalização. Nesse momento,
ainda não são necessários trunking gateways para
interconexão com outras redes, pois a topologia
de encaminhamento original via centrais trânsito
também está preservada.
Dessa forma, caracteriza-se uma primeira
etapa do processo de evolução da rede em que
as centrais locais podem ser convertidas ou
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Evolução das redes telefônicas...
substituídas por media gateways, sem que haja
qualquer alteração na topologia original da rede,
uma vez que as interconexões são mantidas. Deve
ser ressaltado que já nessa etapa a operadora
está apta a prover certos serviços aos assinantes
mediante a introdução de plataformas de serviços
ou até mesmo por meio dos softswitches. A etapa
seguinte consiste em gradativamente transferir o
tráfego de voz para o backbone IP até o momento
em que as rotas de interconexão locais e as
centrais trânsito possam ser desativadas.
O investimento inicial no backbone IP, que
é uma das dificuldades para evolução das redes
apontadas no artigo, torna-se reduzido pelo fato
de não precisar contemplar inicialmente os pacotes RTP, que permanecem internos à localidade.
A questão da capilaridade da rede de dados também pode ser minimizada transmitindo o tráfego
de sinalização das diversas localidades até pontos
de concentração em que o backbone IP esteja
disponível. Para transmitir a sinalização até um
ponto de concentração, pode ser utilizada a própria infra-estrutura de transmissão existente para
interconexão, bloqueando alguns canais anteriormente utilizados para tráfego de voz e reservandoos para sinalização. Para inserir o tráfego de
sinalização nesses canais, podem ser utilizados
multiplexadores com interfaces apropriadas.
Dessa forma, o backbone IP também pode crescer
gradativamente e se estender conforme o processo de evolução caminhe.
Por fim, resta abordar a questão da transparência de serviços para assinantes. Na realidade,
essa questão está muito mais relacionada com os
recursos que media gateways e softswitches oferecem e o quanto tais equipamentos são compatíveis
com os serviços e interfaces já disponíveis na rede
telefônica do que com o processo de evolução
propriamente dito. No entanto, uma estratégia que
pode ser bastante eficiente na garantia dessa
transparência é utilizar equipamentos que sejam
evoluções de equipamentos já utilizados nas redes
telefônicas convencionais, para os quais a probabilidade de transparência de serviços e interfaces
deve ser maior. A situação mais interessante, porém,
acontece quando as centrais locais podem ser
convertidas em media gateways, incorporando
algum hardware e software adicional e, principalmente, preservando as interfaces com assinantes e
centrais de comutação públicas e privadas e seus
respectivos cabeamentos, o que diminui consideravelmente o esforço operacional para evolução da
rede. Vale ressaltar que a conversão de centrais
locais em media gateways pode representar uma
economia importante nos investimentos necessários para evolução da rede telefônica da operadora,
contribuindo decisivamente para sua viabilidade
econômico-financeira.
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4.
Evolução das centrais locais Trópico R
e RA
Nesta seção, a proposta de evolução das
redes telefônicas discutida na seção anterior é
exemplificada mostrando como as centrais de
comutação Trópico R e RA podem ser convertidas
em unidades Vectura IP Access PX (VIA PX), em
sintonia com o conceito de que as centrais locais
devem evoluir para media gateways de forma
independente em relação aos demais elementos
de rede. Essa seção se restringe a abordar a experiência de conversão das centrais Trópico, sem
levar em consideração os outros aspectos da
evolução da rede discutidos anteriormente, como
implantação de softswitches e backbone IP.
As centrais Trópico R e RA são centrais de
comutação pública que atualmente respondem
por mais de oito milhões de terminais na rede
telefônica nacional, o que corresponde a cerca
de 20% da planta instalada no país (cf.
www.tropiconet.com.br). São equipamentos com
arquitetura modular, o que torna particularmente
simples sua conversão para media gateways.
O Vectura IP Access PX é uma unidade de
acesso IP classe 5, também composta por
diferentes tipos de módulos. Cada módulo
representa um media gateway e suporta uma
grande diversidade de interfaces. Conforme a
configuração hardware adotada, o VIA PX pode
atuar como residential, enterprise, trunking
gateways ou aplicações mistas. Na realidade, os
módulos do VIA PX correspondem a evoluções
dos módulos das centrais Trópico R ou RA onde
são mantidas a estrutura mecânica e as placas
terminais, enquanto as demais placas são
substituídas por uma nova placa processadora
e gateway (PGW). A conversão de uma central
Trópico R ou RA em uma unidade VIA PX é um
procedimento relativamente simples: os módulos
de assinantes e troncos digitais da central
Trópico são convertidos, respectivamente, em
residential e trunking gateways, por meio da
introdução da placa PGW, enquanto os demais
módulos, como os módulos de comutação,
podem ser eliminados, conforme ilustrado nas
figuras 4 a 6. Para interconexão entre os diversos
módulos, são utilizados switches de modo a se
criar uma rede de dados local.
É importante destacar que nessa
conversão não há necessidade de mudança na
posição das placas terminais (placa de assinante
ULD ou placa de tronco digital TDT). Portanto,
não é necessária a modificação nos cabos até o
Distribuidor Geral (DG) ou Distribuidor
Intermediário Digital (DID), o que simplifica
bastante os procedimentos operacionais, além
de garantir maior confiabilidade na conversão.
Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 1, n. 1, p. 61-70, jan./dez. 2005
Evolução das redes telefônicas...
A nova cabeação necessária se resume a cabos
Ethernet entre placas PGW e switches.
Esses procedimentos de conversão se
aplicam a quaisquer módulos de assinantes ou
troncos digitais de centrais Trópico R ou RA, uma
vez que todos utilizam uma interface proprietária
comum para comunicação entre a placa PGW e
as placas terminais.
Na concepção do processo de conversão
das centrais Trópico, teve papel de destaque a
especificação da placa PGW, onde efetivamente
são implementadas as funções de media gateway.
Com o objetivo de se atender a demandas
diversificadas, foram definidas várias opções de
placas, funcionalmente idênticas. Tais placas
diferem, no entanto, na quantidade de
dispositivos de processamento digital de sinais
(DSP), o qual se traduz na quantidade de
chamadas estendidas simultaneamente no
módulo (8, 16, 32 ou 64, para assinantes, e 32
ou 64, para troncos), as quais devem ser
escolhidas conforme os requisitos de capacidade
e tráfego, observando-se a teoria das filas e
fórmula de Engset [11]. As principais funções
dessa placa são:
- Sinalização com softswitch utilizando
protocolo MGCP e, futuramente, SIP e
H248, para estabelecimento das
chamadas.
-
-
-
-
-
Codificação dos sinais de voz e
conversão em pacotes RTP.
Detecção de atividade de voz,
supressão de silêncio e introdução de
ruído de conforto.
Controle de ganho e cancelamento de
eco.
Acomodação de jitter por meio da
“bufferização” dinâmica dos pacotes RTP
recebidos.
Controle das placas terminais e do fluxo
de pacotes pela interface de rede
Ethernet.
Detecção e geração de tons DTMF.
Detecção de tons de fax e modem.
Monitoração de eventos telefônicos (tais
como retirada e reposição de telefone no
gancho, etc.) e controle de envio de
corrente de toque e tons (tais como tom
de ocupado, tom de controle de
chamada, etc.), no caso dos módulos
de assinantes.
Sinalização R2 Digital e sincronismo,
no caso dos módulos de troncos
digitais.
Deve ser observado que o procedimento
de conversão de centrais Trópico implementado
está totalmente aderente à proposta de evolução
Figura 4 Evolução do módulos de assinantes de um Trópico R
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Evolução das redes telefônicas...
Figura 5 Evolução do módulos de troncos digitais de um Trópico R
Figura 6 Evolução de central Trópico para VIA PX
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Evolução das redes telefônicas...
gradual da rede telefônica definida na seção
anterior. A preservação das interconexões com
outras centrais é garantida pela evolução dos
módulos de troncos digitais, que podem, em
seguida, ser gradativamente desativados
conforme o plano de migração do tráfego de
voz para o backbone IP, definido pela
operadora. Também não há problemas em
relação a possíveis limitações na capilaridade
do backbone IP: se não estiver disponível na
localidade onde se encontrava a central
Trópico, uma alternativa é introduzir com auxílio
de multiplexadores o tráfego de sinalização em
um ou mais canais de 64Kbps das interfaces
E1 das placas TDT, devidamente bloqueados
para o tráfego de voz, transportando a
sinalização através dessa rota até o ponto de
concentração definido pela operadora.
Por fim, uma questão importante consiste
em identificar como garantir que o VIA PX possa,
pelo menos, estabelecer chamadas entre seus
assinantes quando a conexão com os
sofswitches é perdida e não é possível trocar
mensagens de sinalização. Nesse caso, a
solução proposta é implantar localmente um call
agent de pequeno porte que possa ser
carregado em um micro ou processador de baixo
custo. Por outro lado, a real necessidade dessa
implementação depende do nível de confiabilidade
e robustez da rede convergente e dos
6.
mecanismos de redundância e contingência
implementados nos diversos pontos dessa rede.
5.
Conclusões
O presente artigo apresentou uma
proposta para evolução das redes telefônicas em
direção a uma rede convergente baseada em
protocolo IP, objetivando a flexibilidade das
operadoras para introdução de novos serviços.
A proposta teve como premissa a gradatividade
do processo de evolução – motivada por
questões técnicas e financeiras – e a
transparência para os assinantes em relação aos
serviços já disponíveis nas redes atuais.
Em seguida, demonstrou-se como a
proposta pode ser aplicada utilizando a solução
de conversão de centrais Trópico em unidades
Vectura IP Access. Destacam-se diferenciais como
aproveitamento de hardware, preservação das
interfaces existentes e simplicidade dos
procedimentos operacionais, que podem
representar uma economia importante nos
investimentos necessários para evolução da rede
telefônica de uma operadora.
De maneira geral, o artigo buscou identificar
problemas, discutir alternativas e propor soluções
para a evolução das redes telefônicas nacionais,
com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento do setor de telecomunicações no país.
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[11] KLEINROCK, Leonard. Queueing systems:
volume I: theory. New York: John Wiley & Sons,
Inc., 1975.
69
Evolução das redes telefônicas...
Abstract
The paper discusses the evolution of existing telephony networks based on circuit switching to packet
networks where voice traffic is carried over Internet Protocol (IP), which are known as converged networks
or next-generation networks. The main problems on such procedures are the need of great and abrupt
changes on network topology and some difficulty to guarantee transparency on services to subscribers.
The paper presents a proposal of telephony network evolution so that the trunks between central offices
and the volume of voice traffic which is carried over IP can be changed gradually until a final stage
where central offices are totally converted to class 5 access gateways controlled by one or more
softswitches, and all voice traffic is over IP. Finally, it is shown the experience of converting Tropico
central offices to Vectura IP Access units, which is a solution that take advantage of installed hardware
and then can contribute to reduce carriers costs on evoluting their networks.
Key words: Telephony. Network topology. Next-generation networks. Voice over IP. Media gateways.
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Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 1, n. 1, p. 61-70, jan./dez. 2005