Revista Mensageiro de Março 2015

Transcrição

Revista Mensageiro de Março 2015
MENSAGEIRO
DO CORAÇÃO DE JESUS
IDEAL DE UM
VERDADEIRO
CARTUXO
pág. 10
A MEDICINA
AO SERVIÇO
DA PESSOA
pág. 4
MULHERES:
TER VOZ E LUGAR NA IGREJA
MARÇO | 2015
MENSAGEIRO
DO CORAÇÃO DE JESUS
Março 2015
Ano CXL n.º 3
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António Valério, s.j.
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ABERTURA
Todos são
FILHOS E FILHAS
SUMÁRIO
ABERTURA - Todos são filhos e filhas
P. António Valério, s.j.................................................................. 1
INTENÇÕES DO PAPA
António Coelho, s.j....................................................................... 2
DESTAQUE - «É um privilégio descobrir algo
que tenha impacto na saúde dos outros»
Rui Henrique, médico e investigador do IPO-Porto.................4
TIRAR A BÍBLIA DA ESTANTE -A Bíblia: como ler esta história?
Miguel Gonçalves Ferreira, s.j.................................................... 7
INformar - Quaresma: tempo de
descanso, silêncio e encontro
Paulo Duarte, s.j...........................................................................8
ANO DA VIDA CONSAGRADA
Ideal de um verdadeiro Cartuxo
Anónimo de Porta Coeli..............................................................10
OPINIÃO
Todas as manhãs - Isabel Figueiredo...................................... 12
DOSSIER - Mulheres: ter voz e lugar na Igreja
Stella Morra / Elias Couto.......................................................... 13
VIVER O AO - Um ritmo diário de oração
António Valério, s.j..................................................................... 22
REUNIÃO DE GRUPO - Esquema de reunião de grupo
Manuel Morujão, s.j................................................................... 23
1ª SEXTA-FEIRA - As mulheres na vida da Igreja
Dário Pedroso, s.j........................................................................24
NOTÍCIAS
Elisabete Carvalho...................................................................... 26
À CONVERSA COM...Paula Moura Pinheiro............................. 32
FOTOS págs. 5 e 6: © IPO-Porto; págs. 10 e 11: © Ricardo Perna/Família Cristã;
pág. 27 : © Lusa/EPA/Dennis M. Sabangan; pág. 28 : © Lusa/EPA/Alessandra
Tarantino/Pool; pág. 29 : © Lusa/EPA/Ettore Ferrari; pág. 31 : © Fundação AIS;
Arquivo AO.
P. António Valério, s.j.
Na intenção para a Evangelização, o Papa Francisco
propõe, neste mês de Março, que rezemos «para que
se reconheça cada vez mais o contributo específico
da mulher na vida da Igreja». Contributo específico.
É exactamente aqui que se coloca a questão: porquê
específico e não o mesmo contributo que os homens?
Esta e outras questões são tratadas no Dossier deste
número da Revista Mensageiro do Coração de Jesus,
que as aborda de um modo, esperamos, bastante
claro e que ajudará a esclarecer vários pontos relacionados com isto.
Nesta questão, como noutras, a feliz proclamação
da igualdade entre todos corre também o risco de
extremar posições. A igualdade não pode anular a
riqueza da diferença. E o tema do contributo específico da mulher, tal como o contributo específico do
homem na vida da Igreja, ajuda-nos a reflectir em
duas questões:
O critério fundamental das funções na Igreja não
é o poder, mas o serviço. Tudo está orientado para
servir o reino de Deus, em particular nos mais pobres.
O poder de servir não está reservado ao ministério
sacerdotal, mas a cada cristão, que o deseja pôr em
prática nas próprias circunstâncias.
Como afirma S. Paulo, não há judeu nem grego,
escravo ou livre, homem ou mulher, pois todos
somos filhos e filhas amados pelo Pai em Jesus
Cristo. Transmitir a experiência deste amor é um
desafio enorme, pois exige um coração capaz. E
nisso, uma coisa parece bastante óbvia: no âmbito
do amar com a vida, as mulheres têm um dom particular. E esse dom não pode ficar apenas no âmbito
afectivo e sentimental, terá de levar a uma prática
eclesial, iniciada nas instâncias de decisão pastoral.
A Igreja precisa das mulheres, e muito.
INTENÇÕES DO PAPA
POR ANTÓNIO COELHO, S.J.
A CIÊNCIA AO
SERVIÇO DA PESSOA
A investigação científica ocupa, nos nossos dias,
um papel muito importante e, dada esta investigação, têm-se feito progressos inimagináveis há relativamente poucos anos atrás.
Esta investigação é boa em si, mas possui
também uma grande e importante ambiguidade
que é necessário ter sempre em conta. Com efeito,
muitas vezes, sobre o optimismo generalizado do
saber científico estende-se a sombra do pensamento. O homem do nosso tempo é rico em meios,
mas não em fins, vivendo, não raras vezes, condicionado por um relativismo que o leva a não perceber o significado das coisas. Deslumbrado pela
eficácia técnica, esquece o horizonte fundamental
da pergunta do sentido que vai descobrindo, que
conduz a um empobrecimento ético, senão mesmo
antiético, esquecendo as referências normativas
dos valores.
A ciência não é um fim, mas um meio que deve ter
como horizonte a pessoa humana. Quando isto não
acontece, a ciência fica empobrecida. Por outras
palavras, sempre que a ciência esquece ou inclusivamente vai contra a pessoa humana, não pode ser
verdadeiramente ciência.
Todos os homens, em especial os cristãos, são
chamados a dar testemunho de que ciência e fé,
4 | Mensageiro
INTENÇÃO UNIVERSAL
PARA QUE TODOS AQUELES QUE SE
DEDICAM À INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA
SE PONHAM AO SERVIÇO DO BEM
INTEGRAL DA PESSOA HUMANA.
fé e religião podem e devem conviver pacificamente e ajudar-se mutuamente. E isto acontecerá
quando e só quando tiverem como horizonte a pessoa
humana, ao serviço da qual devem estar. E neste
sentido, os cientistas experimentam, hoje em dia,
grandes desafios que ultrapassam o mero campo
da investigação.
Todos somos chamados a ser instrumentos de
paz e reconciliação também no campo da ciência,
ajudando a curar as feridas abertas no passado na
comunidade científica e na comunidade eclesial. É
certamente este um ponto importante na evangelização, hoje em dia.
A MULHER NA IGREJA
Como é sublinhado na Exortação Apostólica
Evangelii gaudium, a Igreja reconhece a contribuição
indispensável da mulher na sociedade em geral e
na Igreja em particular, por meio da sensibilidade
e outras qualidades femininas que não encontramos nos homens. Esta sensibilidade encontra-se,
por exemplo, na maior atenção aos demais e em
muitos outros níveis. Isto demonstra a importância
da mulher, que tem que ser tida em conta, não só
pela sociedade, mas também pela Igreja.
Se recorremos à Escritura, damo-nos também conta
desta importância. Segundo referem os Evangelhos,
Cristo era acompanhado por um grupo de mulheres que proviam às suas necessidades e dos apóstolos. Foram também elas as primeiras testemunhas
da ressurreição, podendo afirmar-se que, nalgum
sentido, foram elas as apóstolas dos apóstolos.
S. Paulo também se rodeou de mulheres para organizar as primeiras comunidades cristãs, como aconteceu com Lídia e Priscila. Delas também pôde dizer:
«Lutaram comigo pelo Evangelho».
Nos últimos tempos, têm-se dado passos importantes na contribuição da mulher na vida da Igreja.
Contudo, o Papa reconhece, na já citada Exortação
Apostólica, que «é necessário alargar os espaços para
uma presença feminina mais incisiva na Igreja».
INTENÇÃO PELA EVANGELIZAÇÃO
PARA QUE SE RECONHEÇA CADA VEZ
MAIS O CONTRIBUTO ESPECÍFICO DA
MULHER NA VIDA DA IGREJA.
As reivindicações dos legítimos direitos das mulheres, a partir da firme convicção de que homem e
mulher têm a mesma dignidade, colocam à Igreja
perguntas muito sérias, que não podem ser ignoradas. Esta igualdade de direitos provém do baptismo,
no qual todo o baptizado recebe o dom de sacerdote,
profeta e rei, o dom da filiação divina, sem qualquer
distinção de homem ou mulher.
Rezemos neste mês para que a contribuição da
mulher na vida das comunidades seja cada vez
maior, em ordem a uma eficiência mais concreta
daquilo que Cristo pede à Igreja, seu Corpo Místico,
em que todos os membros são importantes e necessários.
Março 2015 | 5
DESTAQUE
É um privilégio descobrir algo
que tenha impacto na saúde dos outros
Rui Henrique, médico e investigador do IPO-Porto
«Poder investigar na área da Oncologia e descobrir algo
que venha a ser útil e que tenha um impacto sobre a
saúde dos outros isso é um privilégio». Quem o diz é o
médico Rui Henrique, do Instituto Português de Oncologia
– Porto, que nesta entrevista ao Mensageiro fala do panorama da investigação científica em Portugal, das motivações inerentes ao seu trabalho de investigador e da evolução do cancro na sociedade.
Que diagnóstico faz do estado da investigação científica em Portugal?
A investigação científica está numa fase de grande
vigor, em termos da qualidade e do número das
pessoas que a fazem, sobretudo quando comparada
com aquilo que era a investigação científica há 20 ou
25 anos atrás.
Como tenho tempo de vida suficiente e estou
envolvido em projectos científicos desde há mais
ou menos esse período, tenho a noção de que realmente passamos de uma fase em que existia um
número relativamente pequeno de pessoas a realizar investigação e em que o contacto com o exterior e com os grandes centros de investigação era
algo relativamente raro, ou pelo menos infrequente,
para uma fase de enorme expansão, que fez com
que hoje muitos dos investigadores portugueses
sejam reconhecidos internacionalmente pelo seu
mérito. Muitos deles estão a trabalhar em instituições estrangeiras, outros fizeram uma parte muito
importante da sua formação em grandes centros
reconhecidos internacionalmente e voltaram ao país
para aqui desenvolverem os seus grupos e fazerem
já uma nova geração de investigadores, baseados
na sua experiência e nos conhecimentos adquiridos
num centro de excelência.
6 | Mensageiro
Rui Manuel
Ferreira
Henrique
Nasceu no Porto em 1968.
Licenciou-se em Medicina pelo Instituto de Ciências
Biomédicas Abel Salazar - Universidade do Porto
(ICBAS-UP) em 1992, realizando posteriormente o
internato médico de Anatomia Patológica no Instituto
Português de Oncologia do Porto, que concluiu em 2001.
Obteve o grau de Doutor em Ciências Médicas pelo
ICBAS-UP em 2006 e o título académico de agregado
em Patologia e Genética Molecular em 2011.
Desenvolve actividade profissional como Especialista
no Serviço de Anatomia Patológica do Instituto
Português de Oncologia do Porto, do qual é director
desde 2006, actividade científica como investigador
sénior do Grupo de Epigenética e Biologia do Cancro
do Centro de Investigação do mesmo Instituto, e actividade docente como Professor Catedrático Convidado
do ICBAS-UP.
A sua actividade de investigação científica está
centrada na descoberta de biomarcadores epigenéticos
em neoplasias urológicas e na compreensão do papel
das alterações epigenéticas na carcinogénese prostática, vesical e renal.
O que o levou a querer trabalhar e investigar na
área da Oncologia?
A investigação nesta área vem da minha actividade
profissional. Sou médico especialista em Anatomia
Patológica, cuja função profissional de base é realizar diagnóstico anátomo-patológico. E essa é uma
área crítica, ou básica, na área da Oncologia, porque,
em regra, na Oncologia o tratamento de um paciente
requer um diagnóstico que esteja comprovado
anátomo-patologicamente. Como elemento deste
Instituto, tenho outras actividades e outros deveres,
nomeadamente nas áreas da formação, ensino e
investigação. Mas o meu trabalho base é o trabalho
assistencial. Como sempre tive a vontade de querer
desenvolver investigação – uma vez que toda a
minha formação foi feita no Instituto de Oncologia
e permaneci aqui no final dessa formação, como
elemento do Serviço – então obviamente aquilo
que seria lógico era desenvolver a minha actividade
nesse âmbito.
A Oncologia é uma área privilegiada em termos
de investigação?
Poder investigar na área da Oncologia e descobrir
algo que venha a ser útil e que tenha um impacto
sobre a saúde dos outros, isso é um privilégio. Nem
toda a gente tem ao longo da sua vida certamente
o privilégio de, através de algo que faz, e faz com
gosto, conseguir tocar dessa forma a vida dos outros,
muitos dos quais não conhece.
Todos nós, ao longo da vida, temos muitas formas
de chegar à relação com os outros, de os ajudar, mas
nós sentimo-nos particularmente realizados quando
o fazemos, porque estamos com o pensamento colocado naqueles que hoje em dia têm cancro, mas
mais ainda naqueles que um dia podem vir a ter.
obviamente, e de forma imediata, o paciente como
o alvo primordial da sua investigação, porque se
centra exactamente à volta do seu tratamento ou da
sua avaliação. O paciente é, desde logo, o alvo da sua
atenção. Quem trabalha na área da investigação de
translação tem a visão deste dois mundos; utiliza os
conhecimentos que são realizados pelos colegas que
trabalham na área básica e tenta transferi-los para a
área clínica, tentando torná-los úteis aos pacientes.
A área em que trabalho é neste interface da investigação de translação.
Estas três áreas são necessárias e complementares. Não podem ser vistas nem como competidoras,
nem como elementos completamente desconectados entre si. E a melhor forma de o fazer é exactamente tentando, em projectos científicos, incorporar
conhecimentos das várias áreas.
Quem investiga tem a noção dos efeitos práticos
do seu trabalho, neste caso na vida dos pacientes
oncológicos?
Depende do tipo de investigação que se faz. De
uma forma genérica, podemos distinguir no nosso
trabalho três grandes áreas de investigação: investigação básica, investigação clínica e uma área que
está entre estas duas, uma área intermédia, a investigação de translação.
Quem trabalha na investigação básica trabalha
muito com modelos que não estão directamente
relacionados com os pacientes. Trabalha com
modelos animais ou com modelos in vitro de linhas
celulares ou ainda com bactérias ou leveduras, por
exemplo. Quem trabalha na investigação clínica tem
Havendo tantos avanços ao nível da investigação
científica, porque é que há cada vez mais pessoas
que são vítimas de cancro?
Há relativamente pouco tempo saiu um artigo
numa revista científica de grande renome que
tentava dar resposta a essa questão.
Uma das primeiras razões para que o cancro continue a ser uma doença cada vez mais relevante
em termos do número de pessoas que dela sofre,
tem a ver, por um lado, com o envelhecimento da
população, pois todas aquelas doenças que seriam
capazes de nos matar numa idade mais jovem estão
a ser eficazmente combatidas, seja pela prevenção,
como a vacinação, seja pelo tratamento, como por
exemplo os antibióticos.
Março 2015 | 7
A partir do momento em que a nossa esperança de
vida se centra nos 60, 70, 80 anos, como hoje em dia
acontece em Portugal, então o cancro passa a ser um
problema muito relevante, prioritário, diria eu, em
termos de saúde pública.
O que esse artigo científico tenta demonstrar é que
cerca de um terço dos cancros terão na base do seu
desenvolvimento sobretudo factores externos, ou
seja, a nossa exposição a factores de risco, e que em
dois terços dos casos a causa é intrínseca à nossa
biologia. Porquê? Porque de cada vez que uma das
nossas células se divide, incorpora sempre um
pequeno erro. Isto faz compreender que, à medida
que as nossas células, que são as responsáveis pela
manutenção dos nossos tecidos, se vão replicando
para manter a nossa estrutura, vão acumulando
progressivamente alterações e erros que, ao fim,
de um determinado número, e se atingirem áreas
sensíveis, acabam por conduzir à transformação
dessa célula e ao seu desenvolvimento num tumor.
Qual é a consequência prática de tudo isto? É que,
sobretudo para aqueles tumores que derivam da
exposição a agentes ambientais, a prevenção é um
factor extremamente importante.
Mas simultaneamente há um conjunto muito
alargado de tumores que vão continuar a existir
por muito que nós façamos prevenção. A única
forma de os tentar debelar passa por detectá-los
precocemente. A detecção precoce é de facto muito
importante, porque a nossa capacidade de terapêutica será melhor, a probabilidade de cura também
maior e o sofrimento do paciente é muito menor. E
também os custos que derivam desse tratamento,
sejam os custos humanos sejam os custos materiais, são também inferiores.
8 | Mensageiro
E o cancro nas crianças?
Os tumores pediátricos são relativamente raros. Na
criança, muito provavelmente, uma parte substancial dos tumores malignos tem como base alterações
genéticas que são herdadas. Igualmente, o cancro
pediátrico desenvolve-se especialmente em tecidos
que nas crianças têm um crescimento extremamente
elevado nesta fase da vida. Por exemplo, na criança
são muito comuns os tumores do sistema hemato-linfóide, como as leucemias. Isso tem muito a ver
com o facto de o desenvolvimento que nós temos
nesse sistema ocorrer sobretudo nos primeiros anos
de vida.
Os investigadores vêem o bem integral da pessoa
humana como o objectivo do seu trabalho?
Das pessoas com quem eu contacto, dos colegas que
eu conheço e que trabalham nesta área e já agora, de
uma forma que para mim é transversal à nacionalidade, às crenças religiosas e aos ideais políticos, para
quem trabalha nesta área do saber, o nosso objectivo
último é o benefício da pessoa humana.
Nenhum de nós trabalha nesta área com a perspectiva única de se satisfazer a si próprio naquilo
que são os seus ideais de investigação ou de realização pessoal. Todos nós certamente trabalhamos
com a visão de que aquilo que nós fazemos pode vir
a ser útil para alguém, para alguém que tem cancro
hoje ou que um dia irá padecer desta doença.
Entrevista por:
Cláudia Pereira e Elisabete Carvalho
TIRAR A BÍBLIA DA ESTANTE
A Bíblia: como
ler esta história?
Miguel Gonçalves Ferreira, s.j.
Para uma leitura proveitosa da Bíblia é necessário estar consciente dos géneros literários, através
dos quais se expressa «em linguagem humana
aquilo que Deus quis dizer para nossa Salvação»
(Constituição Dei Verbum, Concílio Vaticano II).
Para além disso, quando um cristão lê a Bíblia não
pode deixar de estabelecer pontes entre o que lê e a
pessoa de Jesus. É Jesus Cristo que dá, aos que n’Ele
crêem, o seu Espírito. A Igreja ensina que o mesmo
Espírito Santo que ontem inspirou a escrita, inspira
hoje a leitura. Por isso, a leitura da Sagrada Escritura
é um exercício espiritual.
Como podemos buscar, no que está escrito, uma
inspiração espiritual que traga sentido novo – e relevante – à vida quotidiana? Esta pergunta foi posta
pelos cristãos desde os primeiros séculos, e levou
a que, a partir da Idade Média, com autores como
Hugo de S. Vitor e Nicolau de Lyra, se passasse a
falar em quatro sentidos que podem emergir na
leitura da Bíblia:
1. literal (o que diz o texto?); 2. alegórico (que
diferença faz para a minha fé em Jesus Cristo?); 3.
moral (como motiva a minha caridade e responsabilidade?); 4. anagógico (como inspira e anima a
minha esperança?).
Estes sentidos tornaram-se de tal forma relevantes na compreensão do texto bíblico que um autor
medieval chega a dizer que sobre eles, «como
se fossem rodas, se move toda a sacra pagina»
(Guiberto de Nogent, Moralia in Genesim. Patrologia
Latina 156, 25). Tudo então nos leva a concluir que
para progredir na leitura pessoal da Escritura é
necessário um método. A esse método a tradição da
Igreja chama Lectio Divina. É este o modo como, ao
longo dos séculos, se foi exercitando – sobretudo em
contexto monástico – a leitura contínua da Sagrada
Escritura. (São relevantes os nomes de Orígenes,
Santo Ambrósio, Santo Agostinho, S. Bento e toda
a tradição beneditina, chegando até à obra de Guigo
II, Scala Claustralium). Na sua versão mais antiga
(A Escada dos Monges, de Guigo II), este método é
composto por quatro passos, que posteriormente
são completados por outros três:
1. Lectio: leitura atenta da Palavra de Deus; 2.
Meditatio: meditação à procura do sentido da
Palavra; 3. Oratio: oração de resposta à Palavra
escutada; 4. Contemplatio: contemplação (visão) da
Palavra incarnada na história humana; 5. Discretio:
discernimento (procura) da vontade de Deus à luz da
Palavra; 6. Collatio: confronto do meu entendimento
da Palavra com o de outros; 7. Actio ou Operatio: a
acção como efeito ou fruto da Palavra.
Podemos então concluir que, para ler a Bíblia, é
necessário compreender o ambiente em que as
Escrituras surgiram, alcançar o sentido da sua
mensagem e buscar o tempo e o modo da sua actualização. Estas são as «escadas» e as «rodas» que nos
ajudarão a «subir» na compreensão, «andando para
a frente» e sentindo que estamos a tirar proveito.
Março 2015 | 9
O descanso que permite o silêncio
Morando numa cidade grande, é fácil ver o ritmo
frenético com que se vive. Mesmo que o próximo
metro venha apenas dois minutos depois daquele
que está na estação, são muitas as pessoas a correr
até ele como se já não houvesse mais nenhum a
passar o resto do mês. A vida, depois, passa também
muito rapidamente e quando nos obriga a parar
apercebemo-nos de que, ao longo dos dias, fomos
perdendo o essencial. Então, porque não começar
por aproveitar verdadeiramente o descanso? Este
tempo pode ser aquele que nos faz respirar e
também «amar a nós mesmos», como nos recorda
o mandamento. O descanso é uma necessidade.
Desde o famoso descanso ao sétimo dia, passando
pelo texto de Qohelet que recorda o «há tempo para
tudo», junto com a passagem em que Jesus convida
os discípulos a descansar (Mc 6, 31), podemos tomar
consciência da importância destes momentos. Há
muitas pessoas que têm cada vez menos tempo
para si. Podemos dizer que é o ritmo da vida, mas do
pequeno ao maior cansaço, ele vai entrando. Pouco
a pouco, passa do nível físico ao emocional, depois
ao social e, claro, ao espiritual. E é aí que pode
entrar o extraordinário e a criatividade, impedindo
o cansaço de se apoderar da nossa vida. Às vezes
basta ir ao básico e começar por olhar a semana que
entra, programando as coisas de forma a eliminar
o que impede de ter esse tempo que ajuda a tomar
consciência que somos humanos e não máquinas
Sou daqueles que se emociona com histórias produtivas de algo. E depois de eliminar, perceber o
humanas. Umas com finais felizes, outras nem que há a fazer para tornar esse descanso momento
tanto. Contudo, todas, se são bem escutadas, têm o de silêncio.
efeito de abrir à conversão. A vida não é coisa pouca,
não pode ser. Daí que de vez em quando é neces- O silêncio habitado da existência
sário viver o tempo que nos permita parar e fazer O silêncio é muitas vezes relacionado como ausêno balanço da história pessoal, para também perce- cia de som. No entanto, pode ser de movimento ou
ber onde nos perdemos ou podemos estar a perder de acções. Conseguir fazer silêncio, algo por vezes
de nós mesmos. A rapidez dos tempos actuais faz difícil mas que se aprende, faz com que se possa
com que tudo passe a tal velocidade que facilmente digerir ou tomar consciência do que somos chamaas coisas podem resumir-se ao «trabalho – casa» ou dos a fazer ou viver perante os acontecimentos
«laudes – vésperas», deixando os dias diluírem-se na da vida. Há silêncios vazios e há os que são habimonotonia. Não dá para viver sempre o extraordiná- tados de densidade de existência, que não necesrio, mas de vez em quando os seus impulsos ajudam sitam justificar que se é alguém a partir do fazer
a dar sentido ao quotidiano. Parece-me que tempos coisas, muitas coisas. O silêncio habitado, ora da
que saem do comum, como a Quaresma, são ideais história pessoal visitada sem culpabilizações, sem
para parar ou descansar, permitindo o silêncio que vergonha, sem medos, ora de compreensão para
leva ao encontro. Como proposta, detenho-me nestes viver humanamente essa existência, ajuda a ir ao
três pontos: descanso, silêncio e encontro.
essencial. Percebe-se que diante de Deus não há
Quaresma:
tempo de
DESCANSO,
SILÊNCIO
E ENCONTRO
Paulo Duarte, s.j.
10 | Mensageiro
INformar
necessidade de provar que se é bom aluno ou bom
professor, boa mãe ou bom pai, boa mulher ou bom
marido, bom padre ou boa religiosa, mas de viver
a riqueza da aprendizagem e a beleza das relações,
permitindo o crescimento humano. Nesse silêncio,
depois de agradecer a vida, em atitude de crescimento, pode-se ver onde houve erros nas palavras,
nos actos ou nas omissões, onde houve a falha que
levou à desumanização do entorno.
O encontro que humaniza
Nós somos chamados a humanizar, a ser co-criadores com e em Deus. O descanso e o silêncio bem
vividos recordam-nos a vocação do encontro, por
também sermos em relação. O encontro estabelecido com muitas ramificações, mais ou menos fortes
e simbólicas, com maior ou menor sentido, entre
pessoas, pensamentos, linguagens, culturas, modos
de ver e sentir, convida-nos a viver, ou pelo menos
perceber, outras perspectivas da realidade, saindo,
assim, do perigo de absolutizar o meu querer e interesse. O encontro inevitavelmente leva à conversão,
abrindo as portas de novos mundos. Ao vivermos
a plenitude de nós, nos limites e nas capacidades,
em especial nas relações, nesse reconhecimento
de co-criação, renovamos o olhar para a vontade
divina, fazendo caminho de pacificação entre nós
próprios e entre aqueles que nos acompanham.
No final? A Ressurreição
Sou daqueles que se emocionam com histórias
humanas, em filmes ou conversas. Bem escutadas,
levam a parar e fazer silêncio, nesse encontro que
convida à conversão, impedindo o diluirmo-nos
na monotonia ou fecharmo-nos no nosso pequeno
mundo. A Quaresma bem vivida apresenta uma
nova oportunidade de fazer caminho onde, entre o
«trabalho – casa» ou «laudes – vésperas», há tanto
de Deus a acontecer, deixando-nos encontrar e
ser amados por Ele. Nesse impulso, o quotidiano
ganhará arejo, dando-nos mais alento e disponibilidade para mais amar e servir quem nos é confiado.
Aí, tocaremos Ressurreição.
Março 2015 | 11
ANO DA VIDA CONSAGRADA
IDEAL DE UM
VERDADEIRO
CARTUXO
Texto: Anónimo de Porta Coeli
Fotografia: Ricardo Perna/Família Cristã
O VERDADEIRO CARTUXO
É UM HOMEM QUE,
DESILUDIDO DA VAIDADE
DO MUNDO E DOS SEUS
ENCANTOS, SE CONSAGROU
PARA SEMPRE À PENITÊNCIA
EM PROFUNDA SOLIDÃO
12 | Mensageiro
O verdadeiro cartuxo é um homem que, desiludido da vaidade do mundo e dos seus encantos, se
consagrou para sempre à penitência em profunda
solidão, e se sepultou como em um sepulcro, para
morrer a si mesmo e às suas paixões. Separado
fisicamente do resto do mundo, muito mais o está
com o espírito e o coração, convencido de que a
um solitário é sempre perigosa a sua recordação,
para quem são mais comuns as vivas impressões.
Procura apagar inteiramente de sua memória o
mundo, e proíbe à sua imaginação toda a liberdade
de passear por ele. Descuidado de quanto acontece,
medita continuamente os anos eternos, que devem
seguir os poucos dias de vida que lhe sobram; e
sempre atento ao término da sua carreira, só pensa
em acabá-la felizmente.
Compenetrado da presença real de Jesus Cristo no
Santíssimo Sacramento do altar, assiste à celebração dos Sagrados Mistérios com uma fé viva e terna,
por ter consciência de que nunca saberá purificar-se
o bastante, seja para oferecê-los, seja para participar deles. Procura limpar sua consciência com uma
confissão humilde, perfeita e sincera. Não contente
em orar com fervor pelas necessidades de toda a
Igreja, estende a sua caridade a todas as criaturas
racionais, para que Deus as conduza ao seu conhecimento, as santifique segundo a ordem da sua
Providência e na medida das graças a elas designadas. Somente trabalha para humilhar o seu corpo,
e não para satisfazer os seus desejos. Também não
busca ocasião de manter algum trato exterior por
meio de presentes.
Zeloso unicamente da pureza da alma, pela qual
pode agradar a Deus, não finge uma pureza demasiado indiscreta e escrupulosa sem, contudo, descuidar a decência exterior, enquanto o permite a simplicidade do seu estado. Só se alimenta por necessidade
e nunca por mera satisfação; sempre está contente
com o alimento que lhe dão, nunca se queixando se
não gosta, nem fazendo dele murmurações.
Como renunciou a todos os conhecimentos profanos, que só servem para enfeitar o entendimento
sem ordenar o coração, não estuda para ser mais
sábio, mas unicamente para instruir-se mais profundamente em sua religião e dispor-se a cumprir com
mais piedade as obrigações do seu estado. Só se
aplica ao estudo da ciência dos Santos, que retira
das Sagradas Escrituras e dos livros ascéticos. Todas
as suas leituras se orientam à sua própria instrução,
por isso não lê senão o que trata das obrigações do
seu estado, deixando de lado livros eruditos que não
é capaz de compreender. Não busca mais utilidade
no que estuda do que conhecer a verdade, e aprender a segui-la em tudo.
Unido inviolavelmente à antiga fé da Igreja, nem
a um anjo ouviria se lhe anunciasse doutrinas
desconhecidas.
Convencido de que o silêncio e a oração são as
ocupações de um solitário que não está destinado
a ensinar, limita todo o seu zelo em oferecer a Deus
fervorosos votos pela tranquilidade da Igreja e pela
conversão dos que a perturbam. Alegre com o seu
estado de vida escondida, não cria nenhum pretexto
para sair dele. Livre de toda a pretensão de ofícios,
ambiciona unicamente as virtudes do seu estado e a
vantagem de ser o mais humilde, sem procurar parecê-lo. Limita todas as suas aspirações neste mundo
a quatro paredes enquanto vive, e a alguns pés sob
a terra depois que morre. Numa palavra, livre de
todo o temor e de toda a esperança humana, faz um
santo uso do presente e vive sem projectos para o
que virá; eleva-se sobre tudo o que é terreno e sensível e, feliz com a esperança do que será na glória da
eternidade, só por ela suspira, cuidando de preparar-se, pela continuação dos santos exercícios, nos
quais persevera até ao último suspiro. E, entregando
a sua alma nos braços de Jesus e de Maria, morre a
morte dos justos.
Março 2015 | 13
OPINIÃO
TODAS AS MANHÃS
Isabel Figueiredo
Todas as manhãs descia a rua cheia de lojas e os
seus passos não se ouviam nas pedras da calçada.
Só parava uma vez. No vão de uma velha escada,
em frente de uma montra de flores. Verdes, rosas,
vermelhas, amarelas, brancas… E parava, quieta a
olhar. Deslumbrada, dava os bons dias. E lá do fundo
do vão da escada, aparecia a dona daquele jardim.
Era quase um ritual. Uma vez por semana, escolhiam uma única flor e despediam-se com o sorriso
de quem partilha cumplicidades.
Abria a porta do seu gabinete de trabalho, uma
pequena cela carmelita, como gostava de lhe chamar,
e na sua secretária, entre o teclado do computador, os
livros e os papéis, colocava com delicadeza a sua flor.
Naquele gabinete, com uma única flor por companhia, não via as paredes e a solidão perdia a sua
força. Naquele gabinete, com uma única flor por
companhia, via campos cobertos de jacintos,
sonhava com dias de mar e deixava entrar, por ali
adentro, aquele azul do céu que torna evidente a
presença de Deus no mundo.
Porque a beleza torna a vida mais suave, traz consigo
a capacidade de nos tornar melhores, mais felizes.
Torna possível ver o mundo com outros olhos.
E agora, que a Primavera começa a respirar, a beleza
está aí, com toda a sua força, à nossa volta, ao alcance
de um olhar, de uma respiração, de uma pausa.
As planícies caladas e o verde intenso; as praias
batidas pelo vento e as suaves de areia quente. O
murmúrio dos rios que correm e a dureza das pedras
nas serras. Os castelos que se erguem nos montes
e as pequenas casas caiadas em aldeias vazias.
14 | Mensageiro
As amendoeiras em flor, as videiras alinhadas, as
searas que sobrevivem ao tempo.
As cidades onde ainda se ouvem os sinos, o bulício
nos mercados, o pão amassado e quente, as praças
cheias de gente, o som das guitarras no anoitecer
das ruelas; as igrejas que guardam tesouros, as
flores que tombam em muros de jardins, pequenos
e grandes, cuidados e abandonados… A poesia que
teima em não se esconder na intimidade de cada
um. E sempre, sempre a imensidão do mar. Portugal.
Precisamos de estar conscientes do que se passa no
mundo; precisamos de estar atentos, de conhecer o
medo, a maldade, a pobreza e a tristeza. Precisamos
de falar claro, de denunciar o que está errado, o que
estraga o mundo. É verdade.
Mas o renascer de cada Primavera traz sempre
consigo uma promessa de beleza e de abundância.
Uma promessa que nos fala da eternidade.
NAQUELE GABINETE, COM UMA ÚNICA
FLOR POR COMPANHIA, VIA CAMPOS
COBERTOS DE JACINTOS, SONHAVA
COM DIAS DE MAR E DEIXAVA ENTRAR,
POR ALI ADENTRO, AQUELE AZUL DO
CÉU QUE TORNA EVIDENTE A PRESENÇA
DE DEUS NO MUNDO.
MULHERES:
ter voz e lugar na Igreja
Stella Morra / Elias Couto
MENSAGEIRO | DOSSIER 3
Março 2015 | 15
O facto era que, mesmo estando convencido que ao menos
metade das coisas da vida fossem mistérios da vontade divina,
Frantziscu Pisu sabia bem que a outra metade eram frutos da
estupidez dos homens.
Michela Murgia, Accabadora, Einaudi, Turin 2009, p. 94
NÃO
SÓ DE
SUFRAGISTAS:
UMA
HISTÓRIA DE
EMANCIPAÇÃO?
Stella Morra
16 | Mensageiro
O tema das mulheres é um tema bastante longo
na história europeia contemporânea: desde os
inícios do século XIX em diante, as mulheres reflectiram acerca de si mesmas e lutaram por aquilo que
achavam justo, para si e para os outros.
E podemos individuar algumas fases nesta história;
uma primeira fase é a da Emancipação, a luta pelos
direitos, para serem consideradas sujeitos para
todos os efeitos: desde a luta das sufragistas pelo
direito de voto ao feminismo dos inícios dos anos
60 do século XX. Uma segunda fase, mais complexa,
é a conhecida como «questão da diferença»: sujeitos de igual dignidade, quer dizer sujeitos iguais?
Sensatamente, não, mas a questão é «em que é
que consiste a diferença»? Fazer as mesmas coisas,
aceder aos mesmos trabalhos, ter os mesmos direitos torna-nos necessariamente «mulheres masculinas»? Uma terceira fase, a dos dias de hoje, anda à
volta da difícil e complexa questão do género: com
esta palavra tenta-se definir a diferença que não é
identificável apenas como uma diferença de natureza (nascemos homens e mulheres), nem unicamente de cultura e educação (tornamo-nos homens
e mulheres), nem muito menos reduzível à nossa
decisão biográfica (somos este homem ou esta
mulher, específico e irrepetível).
Como talvez saibamos, esta última passagem
é usada muitas vezes de modo muito ideológico,
e a própria palavra «género» é usada de muitos
modos e muitas vezes demonizada: na realidade,
na grande pluralidade dos usos que hoje se fazem
dela, aquilo que se quer indicar é que compreender-se a si mesmos como homens e mulheres é uma
questão complexa, que tem juntamente elementos de natureza e cultura, que recebemos e não
dependem de nós e, junto a isso, uma elaboração
de liberdade pessoal, na qual cada um interpreta o
seu próprio modo de ser. Indica, além disso, que o
problema não é (mais) apenas das mulheres: todos
têm um género e são chamados a ser conscientes da própria parcialidade, do próprio ser não a
humanidade no seu conjunto, mas uma parte dela,
chamada a interagir com os outros, respeitando a
dignidade comum.
Permanece o facto de, a nível estrutural ou das
coisas (direitos civis, instrução, saúde, direito de
família, tutela do trabalho…), a igualdade ainda
não ser uma realidade: basta recordar que o assim
chamado gender pay gap (isto é, a diferença de salário
no desempenho de funções iguais) é, na média europeia, ainda de 16% desfavorável às mulheres. E mais grave ainda é, ao menos na nossa opinião,
a questão simbólica e relacional: a nível educativo
e do imaginário, há muito trabalho a fazer para que
as mulheres tenham pleno respeito por si mesmas
e os homens saibam que são apenas uma parte do
mundo… As estatísticas relativas à violência sobre
as mulheres falam por si mesmas. Espero que não
aconteça mais aquilo que me aconteceu há pouco
tempo, com a minha sobrinha de quatro anos, que
saía da escola em lágrimas porque as suas companheiras não quiseram brincar com ela, porque,
segundo elas, tinha «sandálias de homem» (sic!... isto
é, sem lacinhos, florzinhas e borboletas…): levou-me
tempo, muitas palavras e um gelado para explicar à
pequena Sofia que, especialmente aos quatro anos,
existem sandálias bonitas, feias, cómodas, incómodas, de que gosto ou de que não gosto, mas… não
«de homem» ou «de mulher». Ocupamo-nos muito
pouco da cada vez mais precoce sexualização estereotipada que uma lógica de consumo nos impõe…
Março 2015 | 17
MULHERES E
IGREJA:
UM AMOR
CONTROVERSO
Stella Morra
18 | Mensageiro
As mulheres têm desde sempre uma relação
intensa e complexa com a experiência cristã:
desde o tempo de Jesus, a boa notícia libertou-as
e reconheceu-as como sujeitos e interlocutores
(João mostra-as, por exemplo, como imagens da fé
do discípulo quase mais eficazes que os apóstolos,
sempre fora de tempo e de lugar…), mas contemporaneamente nem sempre no curso da história as
Igrejas souberam reconhecer isto, libertando-se dos
lugares comuns das culturas onde viviam.
É muito difícil, por isso, resumir em poucas linhas
o quanto é controversa e complexa esta relação:
hoje, por exemplo, muitas coisas nas nossas paróquias não funcionariam se as mulheres não estivessem lá, mas, ao mesmo tempo, muitas mulheres e
muito das suas vidas é silenciosamente estranho à
vida das Igrejas… O risco é que nos lembremos delas
apenas quando se fala de Nossa Senhora ou quando
se lamenta o tempo em que o abc da fé era ensinado
em casa, pelas mães e pelas avós, por mulheres que
não tinham um trabalho profissional e «cuidavam»
da família…
Cai tão em baixo – na minha consideração
Que o ouvi bater na terra – e
Despedaçar-se nas pedras
No fundo da minha mente
Mas reprovei a sorte que o abateu – menos
De quanto denunciei a mim mesma,
Por ter objectos banhados
Sobre a mesa das pratas
Emily Dickinson
A verdadeira questão, pelo menos hoje, é que as
mulheres e a sua vida possam ter uma voz e um lugar
na Igreja, não tanto por aquilo que fazem ou podem
fazer, mas sobretudo por aquilo que são e pelo que
sentem e compreendem acerca de si próprias e do
seu percurso. De facto, o risco é que a Igreja, hoje,
seja pensada apenas por homens e do modo como
os homens a pensam, desde a escolha dos horários à
escolha dos temas, só para apresentar alguns exemplos concretos…
Quais são as questões que atravessam verdadeiramente a cabeça e o coração das mulheres? E do que
sentem falta para se sentirem verdadeiramente parte
activa da comunidade cristã? Duvido que estejamos
verdadeiramente em condições de o dizer.
Mas, em parte, como quisemos indicar com o breve
poema de Emily Dickinson, a questão está também
sobre os ombros das mulheres, que não têm, no
âmbito da fé, o sentido da profunda dignidade de
si mesmas e das próprias perguntas e exigências,
e confundem os objectos banhados com a prata!
Mulheres que se põem ainda demasiadas vezes num
canto, pensando que aquilo que são não é suficiente,
que não sabem, que não sabem explicar, que não têm
tempo… e às vezes vão-se embora silenciosamente,
quando a distância se faz muito grande.
A Igreja tem necessidade de mulheres e as mulheres têm necessidade da Igreja, tal como os homens,
os jovens, os idosos, as crianças… Mas é necessário
que saibamos reencontrar a delicadeza, o tempo e o
modo de nos ouvirmos, acima de tudo.
E, a propósito disto: Maria, a Mãe de Jesus, era uma
mulher, certamente; mas quando se fala dela, como
nos ensina o Concílio Vaticano II, fala-se do ícone do
discípulo e da Igreja, não do ícone das mulheres…
Fala-se Nela da humanidade que diz o seu sim a Deus
na liberdade, que é questão de homens e mulheres;
tem-se Nela uma advogada e um modelo para os
homens e para as mulheres… Não vos parece?
Stella Morra
Socióloga e teóloga,
docente na Pontifícia Universidade Gregoriana
e no Pontifício Ateneu Sant’Anselmo (Roma).
DULCE COUTO
Março 2015 | 19
PERGUNTAS
&RESPOSTAS
Elias Couto
A IGREJA CATÓLICA NÃO CONFERE O
SACRAMENTO DA ORDEM ÀS
MULHERES. PORQUÊ?
Como recorda o Papa Francisco, na Exortação
Apostólica Evangelii gaudium, «O sacerdócio reservado aos homens, como sinal de Cristo-Esposo que
Se entrega na Eucaristia, é uma questão que não
se põe em discussão» (n. 104). Este «não se põe em
discussão» não é uma simples opinião, como outras
que o Papa Francisco ou outro Papa qualquer pode
emitir sobre os mais variados assuntos. Resulta de
uma Tradição bimilenar, que o Papa João Paulo II
resumiu na Carta Apostólica Ordinatio sacerdotalis,
na qual afirma: «para que seja excluída qualquer
dúvida em assunto da máxima importância, que
pertence à própria constituição divina da Igreja, em
virtude do meu ministério de confirmar os irmãos
(cfr. Lc 22, 32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser
considerada como definitiva por todos os fiéis da
Igreja» (n. 3). E a Congregação para a Doutrina da
Fé, a uma pergunta dirigida à mesma Congregação
sobre se esta doutrina pertence ao «depósito da Fé»,
respondeu de modo afirmativo, salientando que esta
doutrina não muda e deve ser acolhida assim pelos
católicos (28 de Outubro de 1995). Ou seja, não se
trata de a Igreja, na pessoa do Papa, não «querer»
conferir a ordenação sacerdotal às mulheres; pelo
contrário, a Igreja, partindo do exemplo de Jesus,
«não pode» fazer de modo diferente.
É VERDADE QUE, NO INÍCIO DA
IGREJA, AS MULHERES EXERCERAM MINISTÉRIOS ORDENADOS?
Alguns estudiosos defendem esta perspectiva. Mas
não é fácil encontrar textos que o comprovem.
Alguns recorrem aos Actos dos Apóstolos ou às
Cartas de S. Paulo. No entanto, essa teoria não encontra um fundamento claro na Bíblia e a interpretação
mais sustentável nos estudos é que, de facto, não há
notícia de mulheres ordenadas. Pelo contrário, o Papa
20 | Mensageiro
Paulo VI, em carta ao Primaz da Igreja Anglicana,
lembrava que a Igreja Católica «defende que não é
admissível ordenar mulheres para o sacerdócio, por
razões verdadeiramente fundamentais. Estas razões
compreendem: o exemplo – registado na Sagrada
Escritura – de Cristo, que escolheu os seus Apóstolos
só de entre os homens; a prática constante da Igreja,
que imitou Cristo ao escolher só homens; e o seu
magistério vivo, o qual coerentemente estabeleceu
que a exclusão das mulheres do sacerdócio» corresponde àquilo que a Igreja entende ser o desejo de
Deus a seu respeito (Carta de 1975).
AS MULHERES PODEM EXERCER FUNÇÕES
«DE PODER» NA IGREJA?
Na Igreja, por mandato de Cristo, o «poder» deve
ser entendido como serviço: «o primeiro entre vós
seja aquele que serve» (Mt 20, 27). Isto aplica-se a
todos. Sendo, no entanto, uma sociedade humana,
há serviços na Igreja que implicam tomar decisões e
exercer alguma espécie de poder. Nos casos em que
o desempenho de um determinado serviço na Igreja
não implique necessariamente o ministério sacerdotal, tais serviços podem e devem ser desempenhados por quem tenha mais competência, carisma
e disponibilidade. E o âmbito destas situações deve
ser alargado, pois há muitos casos em que o ministério sacerdotal está indevidamente associado ao
desempenho de certas funções na Igreja, desde a
Cúria Romana até às paróquias, passando pelas
Cúrias diocesanas e pelos mais diversos serviços
na Igreja. A propósito, afirma o Papa Francisco: «é
preciso ampliar os espaços para uma presença feminina mais incisiva na Igreja. Porque “o génio feminino é necessário em todas as expressões da vida
social; por isso, deve ser garantida a presença das
mulheres também no âmbito do trabalho” e nos
vários lugares onde se tomam as decisões importantes, tanto na Igreja como nas estruturas sociais»
(Evangelii gaudium, n.103). Porque não havemos de ter
mulheres a presidir a confrarias, centros paroquiais,
departamentos diocesanos... e mesmo em nunciaturas apostólicas ou em congregações romanas?
A IGREJA DEFENDE A SUBMISSÃO
DAS MULHERES AOS HOMENS?
No Evangelho, nada indica que Jesus pensasse na
relação homem-mulher como uma relação de submissão desta àquele – pois o importante, para Jesus, era
instituir novas relações entre as pessoas, à imagem da
sua relação com o Pai do Céu. Esta mudança no modo
de viver as relações entre as pessoas é uma conversão pedida a todas as culturas onde o Evangelho é
anunciado. Acontece que as culturas são realidades
muito profundas e de evangelização difícil. Assim se
compreende que, por exemplo, seja possível encontrar nas Cartas de S. Paulo passagens claramente
devedoras da sua cultura judaica – «mulheres, sede
submissas aos vossos maridos» (Col 3, 18, cf. 1 Cor 14,
34) – e outras verdadeiramente evangelizadas – «Não
há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há
homem e mulher, porque todos sois um só em Cristo
Jesus». Ambas as passagens são Palavra de Deus, mas
devemos fazer a sua interpretação, pois a Palavra de
Deus não deixa de ser também palavra de homens, que
escreveram, como diz o Concílio Vaticano II, de acordo
com o modo e a cultura comuns no seu tempo (cf. Dei
Verbum, n. 12). O modo como a Igreja olhou e olha a
relação homem-mulher não é, portanto, estático,
mas acompanha as mudanças culturais e, não raro,
contribui para elas, através da força transformadora
do Evangelho. Hoje, a Igreja não promove um modelo
de submissão na relação entre homem e mulher, mas
um modo de viver, segundo o Evangelho, que afirma
a igual dignidade, vivida no reconhecimento das diferenças e no respeito mútuo.
O CASAMENTO É PARA SUPORTAR, MESMO
EM CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA?
Há uma confusão entre indissolubilidade do casamento válido e separação dos esposos. A indissolubilidade é uma característica do sacramento do matrimónio que não pode ser posta em causa. Outra coisa é a
esposa que sofre violência doméstica ser obrigada a
manter a convivência conjugal em nome da indissolubilidade do casamento. Manter a convivência conjugal
numa situação dessas é alimentar o mal e permitir a
violência. Em vez disso, a esposa deve utilizar os meios
legais para se defender, de preferência não pondo em
causa o matrimónio, mas recorrendo à separação, se
esta for necessária para evitar a violência exercida
sobre ela, não pactuando, deste modo, com o pecado
do agressor.
Março 2015 | 21
A participação da mulher na vida da Igreja e da sociedade, através
dos seus dons, constitui, ao mesmo tempo, a estrada necessária para
a sua realização pessoal – na qual justamente tanto se insiste – e o
contributo original da mulher para o enriquecimento da comunhão
eclesial e para o dinamismo apostólico do Povo de Deus.
Dulce Couto
TESTEMUNHO
(João Paulo II, Vocação e Missão dos Leigos na Igreja e no Mundo, n. 51)
22 | Mensageiro
Nasci no seio de uma família católica, no hemisfério sul, onde as noites são
quentes e os dias cheios de sol. Este pormenor para mim é importante porque, na
minha infância, ir à missa nunca foi algo aborrecido. Não me recordo da duração
das eucaristias, mas recordo a alegria das celebrações e ainda “oiço” o som das
violas e, sobretudo, o som dos batuques.
Na minha juventude, já em Portugal, fiz um largo percurso num movimento
católico de jovens, que me marcou profundamente. Muito daquilo que hoje sou
devo a esse mesmo percurso.
Quando chegou a altura de ir para a universidade, não entrei em gestão por
algumas décimas e, sem saber muito bem como, acabei a estudar teologia. O início
não foi particularmente fácil, pois ninguém percebia porque é que uma rapariga
iria tirar uma licenciatura naquela área, ainda por cima trabalhando já num
estúdio regional de uma rádio nacional. Mas porque nada acontece por acaso,
nunca me arrependi das escolhas que fiz, nem mesmo quando optei pela leccionação de EMRC (Educação Moral e Religiosa Católica). Nunca me tinha passado
pela ideia ser professora, muito menos de uma disciplina que era e, nalguns casos,
ainda é vista como menor e mal amada. Se ser professora é algo normal para uma
mulher, ser professora de EMRC, na altura, não era propriamente algo normal
para uma mulher. No entanto, nunca me senti discriminada, quer nas escolas
por onde passei, quer pela Igreja que me confiou essa missão. Aliás, nunca senti
que o meu lugar e missão na Igreja fosse questionado pelo facto de ser mulher.
Evidentemente, existe todo um peso cultural e civilizacional que tem de ser
compreendido, mas se encararmos a vida como dom e missão, os pequenos obstáculos apenas servem para nos incentivar a sermos mais e melhores.
Resido em Braga e trabalho numa diocese com séculos de história, mas sempre
senti que o que estava em causa era o meu testemunho de vida e o que contava era
a qualidade do meu trabalho e não o facto de ser mulher. Existiram dificuldades?
Algumas. Puseram em causa as minhas convicções? Nunca! Actualmente, além de professora e de todo um trabalho paroquial intenso, sou
directora de um departamento diocesano que durante décadas teve à frente sacerdotes. Mas não vejo isso como uma promoção pelo facto de ser mulher, antes pelo
trabalho desenvolvido e que mereceu a confiança do meu bispo. Nunca considerei que a igualdade significasse que todos fizéssemos as mesmas
coisas, acho até essa ideia muito redutora. Também em Igreja não acho que todos
podemos ser tudo. Acho que todos temos o direito, e sobretudo o dever, de ocupar o
nosso lugar e de desenvolver a missão que somos chamados a viver com empenho,
determinação e, sobretudo, com a alegria de sermos cristãos!
REVISTA MENSAGEIRO
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Março 2015 | 23
VIVER O AO
Um ritmo diário de oração
António Valério, s.j.
O percurso espiritual do Apostolado da Oração quer
conduzir aquele que o faz a criar e desenvolver uma
espiritualidade quotidiana muito próxima da vida.
Esta espiritualidade leva a uma atitude de disponibilidade interior a realizar a vontade de Deus no
dia-a-dia. É a disponibilidade própria dos Apóstolos,
tocados pelo amor de Jesus e desejosos de O seguir
sempre e em cada momento, com simplicidade e
radicalidade. Nada está fora, na nossa vida, da força
e da alegria do Evangelho que Deus quer que se
concretize na nossa vida.
Para isso, são propostos três momentos de oração,
simples e breves, em três momentos diferentes,
ao longo do dia, que ajudam a pôr em prática esta
atitude de disponibilidade apostólica. Pela manhã, começar o dia com um olhar agradecido sobre o dom da vida e sobre o mundo, pedindo
a Deus a graça de estar disponível para fazer aquilo
que Deus for pedindo ao longo da jornada e oferecendo o dia, com tudo o que vier a acontecer, unido
às intenções do Santo Padre para esse mês.
Durante o dia, cada pessoa é convidada a fazer
um momento de paragem, mais ou menos longo,
24 | Mensageiro
em que renova, diante de Deus, o seu compromisso
de disponibilidade assumido pela manhã, para
não deixar “adormecer” a paixão do seguimento,
mas recuperar continuamente a presença de Deus
em cada momento e diante das situações que vai
encarando.
E, por fim, ao terminar o dia, fazer um exame de
consciência numa lógica de avaliar a disponibilidade que se teve ao longo do dia para fazer aquilo
que Deus foi pedindo, ou, pelo contrário, avaliando
os obstáculos que foram colocados à realização da
vontade de Deus. Num momento de sinceridade,
agradecer o ter sido apóstolo, ou pedir perdão por
não ter sido diligente em cumprir a vontade de
Deus, fazendo um propósito concreto para melhorar
alguma coisa no dia seguinte.
Não se pode ser apóstolo na vida diária sem um
contacto frequente com a origem da própria missão,
que é a Pessoa de Jesus. Estes três momentos de
oração criam um ritmo que ajuda a facilitar o encontro com o Senhor, a experimentar a sua misericórdia
e a acertar, nas coisas grandes e nas coisas pequenas, com os desafios que nos são pedidos em cada
dia. Procuremos exercitar-nos, cada dia, no encontro com Jesus, que muda a nossa vida.
REUNIÃO DE GRUPO
Esquema de reunião de grupo
Manuel Morujão, s.j.
«Reunir» é um verbo que temos de conjugar muitas
vezes, na família, no trabalho, na convivência social.
Como cristãos, a nossa principal reunião é a participação na Eucaristia, convocados por Cristo que Se nos
oferece como pão que sacia a nossa fome mais profunda.
Sabemos que nem todos os encontros e reuniões nos
despertam interesse e, por vezes, temos a sensação de
perder tempo… Mas, em qualquer caso, importa aproveitar essas ocasiões para encontrar Deus no meio de um
grupo de irmãos e irmãs que têm garantida a presença
do Senhor: «Onde estiverem dois ou três reunidos em meu
nome, Eu estarei no meio deles». É esta presença, misteriosa mas real, de Cristo que nos deve animar a aproveitarmos da melhor maneira uma reunião.
Oração inicial – Oração do Oferecimento
(com a fórmula tradicional ou com outra)
1.ª Parte
Intenções do Papa para o mês de Março
O responsável, ou outra pessoa do grupo, poderá
fazer uma apresentação de uma ou das duas intenções do Papa Francisco. A intenção universal fala
dos que se dedicam à investigação científica: «Que
todos aqueles que se dedicam à investigação científica se ponham ao serviço do bem integral da pessoa
humana». O serviço da pessoa humana, e não os
interesses económicos ou ideológicos, deve ser a
meta de todas as actividades, também da investigação científica. A intenção pela evangelização recorda-nos o papel das mulheres na vida da Igreja: «Que
se reconheça cada vez mais o contributo específico
da mulher na vida da Igreja». Cristo, em tempos em
que as mulheres eram claramente secundarizadas e
mesmo menosprezadas, deu-nos corajoso exemplo
de acolher e valorizar mesmo as mulheres que eram
mal vistas e marginalizadas. É fácil de ver que a
Igreja conta muito com a colaboração das mulheres: as nossas paróquias e movimentos reduziriam
substancialmente a sua capacidade de fazer o bem
se deixassem de contar com o contributo das mulheres. Importa examinar como esta participação pode
e deve ser reforçada e valorizada.
2.ª Parte
Os grupos do AO são grupos de oração e de acção
Dar algum tempo para partilhar o que os membros
do AO poderão fazer na linha das propostas que o
Papa Francisco nos dirige, talvez respondendo às
seguintes perguntas:
- Como é valorizada nesta paróquia e no nosso
movimento a participação das mulheres na vida da
Igreja?
- Que se poderá fazer para melhorar esta
participação?
3.ª Parte
Assuntos práticos do grupo do AO
Terminar com uma leitura da Palavra de Deus
(por exemplo, o Evangelho do domingo seguinte à
reunião) e com uma oração ou um cântico.
Março 2015 | 25
1ª SEXTA-FEIRA
As mulheres na
vida da Igreja
Dário Pedroso, s.j.
O Papa propõe-nos que rezemos este mês para que se reconheça cada vez
mais o contributo específico da mulher na vida da Igreja. Vamos rezar com
uma Celebração da Palavra.
1 – Meditar a Palavra
O Evangelho coloca diante de nós muitas atitudes de Jesus em que Ele
respeita, ama, acolhe, perdoa a muitas mulheres:
Como tratou Ele a viúva de Naim que ia sepultar o seu único filho? Como
tratou a Samaritana pecadora, que tinha um amante, mas que Ele converteu, levando-a a mudar de vida, dando-lhe a água viva? Como Se compadeceu de Marta e Maria, que choravam a morte do seu irmão, Lázaro, chorando
com elas? Como elogiou e colocou como modelo a pobre que no Templo deu
tudo quanto tinha e ficou sem nada? Repassar em oração silenciosa cada uma
destas cenas. Recolhamo-nos em silêncio orante.
2 – Cântico de oferta e de oblação
3 – As mulheres que serviram Jesus
Na vida pública de Jesus aparecem várias mulheres que O serviam, cuidavam
d’Ele, partilhavam os seus bens e a sua amizade. Na sua caminhada para o
Calvário, algumas mulheres boas e amigas, compadecidas, fazem-Lhe companhia, choram e querem aliviar o seu sofrimento. Junto à Cruz, com Maria, a
Mãe, a grande Mulher, estão outras que assistem à morte e ajudam na sepultura. Depois de Ressuscitado, aparece a Madalena e a outras mulheres, dignificando o seu encontro e dando paz e alegria. Rezar cada uma destas cenas
em silêncio orante.
4 – Cântico de louvor a Jesus, ao jeito da homenagem de Maria, que deu o
perfume de nardo puro.
26 | Mensageiro
5 – As mulheres na Igreja
Desde os Actos dos Apóstolos até hoje nunca faltaram, na vida da Igreja, mulheres heróicas, generosas, dedicadas, serviçais, humildes que se puseram ao serviço
da Igreja e do mundo. O que seria a Igreja sem elas, sem a sua dedicação, o seu
trabalho, o seu dom, a sua ajuda? E que dizer da maravilhosa história das mulheres santas e místicas, tantas delas canonizadas, verdadeiros tesouros e catedrais
na vida da Igreja e no amor ao mundo, aos pobres e necessitados? Rezar esta
história e parar com serenidade nalguns exemplos maravilhosos. Fazer silêncio.
6 – Rezar com Maria
Com Nossa Senhora, rezar pela Igreja, Esposa e Mãe, e por todas as mulheres,
solteiras, casadas ou viúvas, que entregam o seu tempo e a sua vida à família, à
Igreja, aos doentes, aos mais pobres. Digamos três Ave Marias…
7 – Contributo específico das mulheres
As qualidades, a sensibilidade feminina, o modo de pensar, de olhar o mundo, os
problemas e suas soluções encontram na inteligência, no coração, na sabedoria e na
doação das mulheres um contributo precioso. Muitas são verdadeiras catedrais em
generosidade e em sabedoria, como foram Teresa de Ávila ou Catarina de Sena. A
Igreja, em todos os seus sectores, mesmo ao nível das Congregações Romanas, das
estruturas das dioceses, etc., tem que se abrir à sua contribuição preciosa. É este o
desejo do Papa e a sua intenção pela evangelização deste mês de Março. Em silêncio, rezemos por esta grande intenção, para que se concretize mais.
8 – Dar graças
Terminemos dando graças por todas as mulheres que, de muitos modos, já
contribuem para a vida e o serviço da Igreja: mulheres filósofas, teólogas, artistas,
sociólogas, psicólogas, educadoras, médicas, enfermeiras, consagradas pelos
votos, mães de família, mulheres simples no serviço paroquial, missionário, etc.,
etc. Profunda oração de acção de graças, trazendo à memória tantas e tantas
benfeitoras da Igreja. Terminemos com um cântico de acção de graças pelo dom
precioso das mulheres na Igreja.
Março 2015 | 27
NOTÍCIAS
AO É NOTÍCIA
200 pessoas no encontro diocesano em Viseu
No dia 17 de Janeiro, no Centro Pastoral Diocesano
de Viseu, teve lugar mais um Encontro diocesano
do Apostolado da Oração, com a presença activa e
entusiasmada de perto de 200 pessoas, vindas de
cerca de 30 paróquias. Os temas foram tratados pelo P. Dário Pedroso, s.j.
e versaram sobre o “Caminho do Coração”. O encontro, organizado pela direcção diocesana, constou de
duas palestras, um tempo longo de Adoração ao
Santíssimo e a celebração da Eucaristia. Com a manifestação positiva e entusiasta de
todos os presentes, marcou-se o próximo encontro
para dia 16 de Janeiro de 2016, um sábado. Todos
se comprometeram a rezar ao Senhor pedindo a
nomeação de um novo Director Diocesano.
Paróquias da Lourinhã aprofundam
espiritualidade do AO
No domingo, dia 18 de Janeiro, teve lugar, na
Lourinhã, Patriarcado de Lisboa, um encontro do
Apostolado da Oração, que contou com a participação de cerca de cem pessoas, vindas de oito paróquias da Vigararia. A iniciativa foi organizada pela
direcção local da Lourinhã.
Foi com alegre surpresa que se viu o salão quase
cheio e um tão grande número de participantes, o que
aconteceu graças ao trabalho e esforço dos sacerdotes da zona e da direcção local da Lourinhã. O tema – A espiritualidade e vida do Apostolado da
Oração – foi desenvolvido pelo P. Dário Pedroso, s.j. a
colaborar com a Direcção Diocesana de Lisboa até à
nomeação do novo Director Diocesano. Ficou marcado novo encontro para 17 de Maio,
tendo-se todos comprometido a convidar mais
pessoas, sobretudo da zona de Peniche e de Torres
Vedras, desejando que haja participação de mais
paróquias. Um grande obrigado aos respectivos párocos, à direcção local da Lourinhã e a todos aqueles que nas diversas paróquias procuraram entusiasmar a participação
no Encontro.
28 | Mensageiro
IGREJA É NOTÍCIA
Reconciliação e solidariedade na bagagem do Papa para o Sri Lanka e Filipinas
Papa Francisco cumprimenta sobreviventes de Tacloban, Filipinas
Em menos de seis meses, o Papa deslocou-se duas
vezes à Ásia. Em Agosto de 2014, Francisco foi à
Coreia do Sul pedir paz e reconciliação. Em Janeiro
deste ano, viajou para o Sri Lanka e Filipinas. Ao
Sri Lanka levou uma mensagem de reconciliação.
O país viveu durante mais de 30 anos uma guerra
civil que opôs a maioria cingalesa à minoria tamil.
Nas Filipinas, alertou para a necessidade de combater as desigualdades sociais e manifestou a sua solidariedade para com os habitantes daquele território
tão fortemente atingido por catástrofes naturais. Os
apelos ao diálogo inter-religioso foram uma constante nos encontros ecuménicos que manteve com
líderes religiosos dos dois países.
No Sri Lanka, onde decorreram os primeiros três
dias de viagem, o Sumo Pontífice assumiu uma
atitude inédita a favor da paz e da reconciliação:
dirigiu-se ao santuário de Nossa Senhora do Rosário,
em Madhu, um lugar simbólico por se situar na
linha da frente da guerra. Francisco orou e pediu
reconciliação.
Momentos antes, no Centro de Congressos
Bandaranaike Memorial de Colombo, Francisco
manteve um encontro inter-religioso com líderes
budistas, hindus, muçulmanos e cristãos. No Sri
Lanka, convivem várias confissões religiosas. Numa
Março 2015 | 29
Oração no Santuário de Madhu, no Sri Lanka
população de 20 milhões, apenas 7% são católicos e
10% muçulmanos.
Um dos momentos altos da visita ao Sri Lanka
foi a canonização de Joseph Vaz, o missionário
que nasceu em Goa, no século XVII, e que passou
a ser o primeiro santo do país. Foi ordenado sacerdote na Congregação de São Felipe Neri e enviado
como missionário para o Sri Lanka, onde budistas
e calvinistas exerciam uma forte pressão contra a
Igreja Católica. No Sri Lanka, Vaz fundou mais de 15
Igrejas e 400 capelas e traduziu o Evangelho nos dois
idiomas do país, o tamil e o cingalês.
Na Missa, que incluiu a cerimónia de canonização,
o Papa falou de Joseph Vaz como «um exemplo de
tolerância religiosa que deve ser seguido por todos
no Sri Lanka» e reforçou a importância da reconciliação e do respeito pelas diferentes confissões
religiosas.
A caminho do aeroporto, antes da viagem para as
Filipinas, o Santo Padre visitou o Instituto Bento XVI,
criado para reconstruir o país, depois da guerra civil,
e fomentar o diálogo inter-religioso.
30 | Mensageiro
“Escandalosas”
desigualdades sociais nas Filipinas
O quarto dia de viagem cumpriu-se nas Filipinas,
um país em que 80% da população é católica e que,
há um ano, foi devastado pelo tufão “Yolanda”,
que causou sete mil mortos e afectou cerca de um
milhão de pessoas.
No encontro com as autoridades e com o corpo
diplomático, que decorreu no Palácio Malacanang,
em Manila, o chefe da Igreja Católica pediu ao presidente das Filipinas, Benigno Aquino, empenho no
combate à corrupção, de forma a acabar com as
«escandalosas» desigualdades sociais no país.
«A grande tradição bíblica prescreve para todos os
povos o dever de ouvir a voz dos pobres e quebrar as
cadeias da injustiça e da opressão, que dão origem a
óbvias e verdadeiramente escandalosas desigualdades sociais», afirmou Francisco, acrescentando que
«é necessário que os dirigentes políticos se distingam pela honestidade, integridade e responsabilidade quanto ao bem comum».
O Papa abordou directamente a questão que mais
intefere com o desenvolvimento económico e social
daquele país: a corrupção, tida como endémica. Em
2008, o Banco Mundial considerou as Filipinas o caso
mais grave de corrupção na Ásia e, na última Tabela
do Índice de Transparência, que lista 176 países, o
país aparece em 85º lugar.
O combate às desigualdades voltou a ser o assunto
na Missa celebrada na Catedral da Imaculada
Conceição e que reuniu bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas. O Santo Padre disse que os membros
da Igreja Católica filipina têm que «reconhecer e
combater as causas da muit0 enraízada desigualdade na sociedade».
Visita aos sobrevivente de Tacloban
Apesar da chuva e dos ventos fortes, o Papa deslocou-se a Tacloban, cidade das Filipinas completamente destruída pelo tufão Haiyan, em 2013, para
manifestar a sua solidariedade aos sobreviventes.
Comovido, Francisco pôs de lado os discursos e
explicou que quando soube da catástrofe o seu sentimento foi de que tinha de ir a Tacloban. «Hoje estou
aqui junto de vós, mas cheguei um pouco atrasado»,
referiu, remetendo-se, por momentos, ao silêncio.
«Aquilo que me vem ao coração, a razão pela qual
vim aqui, é para vos dizer que Jesus não abandona
nunca. Vocês podem dizer: fui abandonado, perdi a
minha casa, o meu pai, a minha mãe… Eu respeito
esses sentimentos. Mas o Senhor da Cruz é capaz
de chorar, de caminhar ao vosso lado nas piores
circunstâncias», continuou o Papa.
Depois do encontro, Francisco cumpriu o resto do
programa em Tacloban apressadamente, dada a
adversidade das condições climatéricas. Percorreu
a multidão no seu papamóvel descoberto, parou
cerca de dez minutos para falar com uma família
de pescadores pobres, benzeu sem sair do carro um
centro de acolhimento para pobres, almoçou rapidamente com um grupo de sobreviventes e foi à
pequena catedral de Palo, a 12 quilómetros do aeroporto, para abençoar a assembleia.
Deus «escolheu cada um de nós para ser testemunha, neste mundo, da sua verdade e da sua justiça»,
assinalou o Bispo de Roma, lamentando que, «pelo
pecado», o homem tenha destruído a «unidade e a
beleza da nossa família humana, criando estruturas
sociais que perpetuam a pobreza, a ignorância e a
corrupção».
O Pontífice aludiu novamente à necessidade de
combater a corrupção e congregou a população
nesse sentido, evocando Cristo Menino, o padroeiro
das Filipinas: «Uma criança frágil trouxe ao mundo a
bondade de Deus, a misericórdia e a justiça. Resistiu
à desonestidade e à corrupção, que são a herança do
pecado, e triunfou sobre elas com o poder da cruz.
Agora, no final da minha visita às Filipinas, entrego-vos a Jesus que veio estar entre nós como criança.
Que Ele torne todo o amado povo deste país capaz
de trabalhar unido, de se proteger mutuamente a
começar pelas vossas famílias e comunidades, na
construção de um mundo de justiça, integridade e
paz», concluiu.
Depois da Eucaristia, o porta-voz do Vaticano,
Frederico Lombardi, adiantou que «o Papa quis nesta
viagem dar um impulso para uma sociedade filipina
mais coerente com os valores cristãos», justificando
assim a insistência de Francisco nas desigualdades
que persistem naquela população muito católica.
Durante os quatro dias nas Filipinas, o Santo Padre
manteve ainda um encontro com famílias, durante
o qual se reportou à defesa da família tradicional,
denunciando o «relativismo», as «ameaças insidiosas» e a confusão sobre o casamento.
Seis milhões na Missa em Manila
Seis milhões de Filipinos assistiram à Missa celebrada no Parque Rizal, em Manila, pelo Papa, um
dia antes do regresso a Roma. Um mar de gente,
junto ao mar, debaixo de chuva e num verdadeiro
ambiente de festa. Na homilia, Francisco desafiou os
filipinos a serem «missionários» em toda a Ásia.
Encontro Inter-religioso no Sri Lanka
Março 2015 | 31
África na agenda do Papa
O Papa tem prevista, para o final deste ano,
uma viagem a África. Francisco pretende visitar
a República Centro-Africana (RCA) e o Uganda.
A bordo do avião de regresso a Roma, após oito
dias de viagem à Ásia, o Sumo-Pontífice anunciou
ainda, para Julho, uma visita ao Equador, Bolívia e
Paraguai. Chile, Uruguai e Argentina farão parte da
agenda para 2016.
A data exacta da deslocação a África vai depender
do clima, pois há que ter em conta «a estação das
chuvas», explicou o Papa, assinalando que a viagem
ao Sri Lanka e Filipinas «foi atrasada por causa do
Ébola». A República Centro-Africana está a tentar
sair de uma crise política e de segurança que deixou
um rasto de milhares de mortos entre as milícias
cristãs (anti-balaka) e os rebeldes Seleka, essencialmente muçulmanos. A presença de três forças
internacionais - a francesa Sangaris, a Eufor centro-africana e a missão da ONU para a RCA (Minusca)
- ajudou a estabilizar a situação, mas ainda não
conseguiu pacificar o país inteiro.
Dois mil mortos na Nigéria
O grupo terrorista Boko Haram terá assassinado
mais de duas mil pessoas na cidade de Baga, na
Nigéria, maioritariamente crianças, mulheres e
idosos que não conseguiram fugir. Testemunhas
descrevem um cenário de total destruição e morte.
Baga, que tinha uma população de 10 mil pessoas,
já não existe. Desde o fim do ano, mais de 10 mil
pessoas abandonaram a região com medo da chegada
dos terroristas, já que a cidade era a única que ainda
resistia ao avanço dos islamistas radicais do movimento Boko Haram no Nordeste da Nigéria.O Boko
32 | Mensageiro
Haram é um grupo islamita, fundado em 2002, que
começou por se opôr à educação ocidental. Depois
do atentado ao jornal Charlie Hebdo, em França,
que colocou o mundo em alerta máximo contra os
fundamentalistas islâmicos, várias vozes têm alertado para o terror que se vive em alguns territórios africanos, alguns completamente aniquilados,
como Baga, sem qualquer consideração pela vida
humana. Em causa, está o supremo valor e defesa
da vida humana, seja em África, na Europa ou em
qualquer outro continente.
Ano sangrento na Síria
2014 foi o ano «mais sangrento da guerra civil» na
Síria, desde o início do conflito, em 2011. Segundo o
Observatório Sírio dos Direitos Humanos, há registo
de mais de 76 mil mortos, entre os quais estão cerca
de 18 mil civis e 3500 crianças. Os restantes mortos
pertencem a militantes de grupos jihadistas, como o
“Estado Islâmico” e a Frente al-Nusra, que se opõem
ao presidente sírio, e ainda elementos das tropas do
governo e milícias fiéis a Bashar al-Assad.
A Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS) recorda
que o conflito começou em Março de 2011 e a ONU
calcula que neste período morreram «mais de 200
mil pessoas». A AIS revela ainda que há organizações que têm monitorizado o conflito e que apontam
para números «bem mais graves»
Portugal já tem Observatório para a Liberdade Religiosa
Um grupo de investigadores do Departamento de
Ciências das Religiões da Universidade Lusófona
criou o Observatório para a Liberdade Religiosa
(OLR), com o objectivo de «observar analiticamente
o fenómeno religioso» e as suas «vivências».
«Há muitas outras instituições que fazem recolha
de dados. O nosso objectivo é, a partir de todos esses
dados de recolha sobre as vivências religiosas em
Portugal e no mundo, dar o passo que faltará em
Portugal, criar um dinamismo de análise e debate»,
adiantou Joaquim Franco, um dos coordenadores do
OLR. O jornalista observou que os promotores não
querem entrar em colisão com os organismos que
já existem, mas fazer uma «observação analítica» do
fenómeno religioso, das vivências e da forma como
«estão ou não consubstanciadas na Lei da Liberdade
Religiosa».
«Nenhuma liberdade está à partida garantida, é
um processo que tem de ser trabalhado, analisado.
A própria forma como vemos a liberdade obriga-nos
a fazer exercício de reflexão sobre a nossa própria
responsabilidade para com essa liberdade», alertou
Joaquim Franco.
Neste sentido, o jornalista revela que o OLR não
tem como objectivo «indicar um ou outro caminho
de interpretação», mas ajudar, a partir da compreensão do fenómeno religioso - em termos sociais, políticos ou religiosos -, a «avançar para caminhos» de
uma melhor «integração, coexistência, coabitação
do diferente e das diferenças».
Elisabete Carvalho
Fontes: Ecclesia / Público / www.vatican.va
Março 2015 | 33
À CONVERSA COM...
Paula Moura Pinheiro
O que a levou a enveredar por uma actividade profissional ligada ao jornalismo?
Foi uma opção pensada ou um acaso que não quis desperdiçar?
Decidi estudar Comunicação Social quando me ia inscrever na Faculdade de Direito.
Foi uma mudança repentina de que nunca me arrependi. O mundo é vasto e diverso e
eu sou infinitamente curiosa e interessada por tudo. O jornalismo revelou-se a melhor
profissão para mim.
Já trabalhou em imprensa, rádio e televisão.
Qual destes meios mais a fascina? Porquê?
Gosto dos três meios por diversas razões. A televisão é o mais exigente sob o ponto
de vista da quantidade de competências que envolve - saber comunicar de viva voz e
com a própria imagem é complexo. A rádio encanta-me pela intimidade que gera com
o ouvinte e pela simplicidade do dispositivo. A imprensa, a escrita é o meu primeiro
elemento. Tudo o que faço passa sempre pela escrita que é, finalmente, a minha mais
preciosa ferramenta.
Actualmente, é responsável pelo programa semanal “Visita Guiada”, exibido na
RTP e transmitido na Antena 1. Como tem vivido esta experiência de dar a conhecer
aos portugueses alguns tesouros do património cultural português?
O Visita Guiada tem sido um projecto muito gratificante. Portugal é um país maravilhoso, com um património muito interessante, pouco conhecido dos portugueses.
Viajar pelo país a conhecer e a dar a conhecer os nossos tesouros pela mão dos historiadores mais qualificados é um privilégio que tem sido muito bem acolhido pelo
público.
Que trabalho jornalístico ainda não desenvolveu e gostaria que fosse a “cereja em
cima do bolo” da sua carreira jornalística?
Gostaria ainda de fazer um documentário.
Como se auto-define Paula Moura Pinheiro, a pessoa que se “esconde” atrás da
jornalista?
Alguém abençoado com o dom da alegria.
Considera-se uma mulher de fé? Como a vive no dia-a-dia?
Tento estar à altura da minha fé em Jesus. É um compromisso muito exigente a que não
consigo sempre corresponder. Mas tento. Acrescentar beleza e bondade ao mundo e
nunca olhar para os outros de uma forma instrumental são as minhas maiores apostas.
34 | Mensageiro
ACTIVIDADES INACIANAS
Março / Abril
Em Soutelo (Vila Verde): CEC – Casa da Torre
Av. dos Viscondes da Torre, 80 – 4730‑570 SOUTELO – Tel. 253 310 400; Fax: 253 310 401; E‑mail: [email protected]
05-08 Mar. 05-13 Mar. 08 Mar.
12-15 Mar. 12-15 Mar. 19-22 Mar. 20-22 Mar. 20-22 Mar. 20-22 Mar. 26-29 Mar. 27-30 Mar. 27 Mar.-04 Abr.
02-04 Abr. 12 Abr.
16-19 Abr.
16-24 Abr.
18-19 Abr.
24-26 Abr.
30 Abr.-03 Mai.
30 Abr.-03 Mai.
30 Abr.-03 Mai.
Exercícios Espirituais – P. Miguel Gonçalves Ferreira
Exercícios Espirituais – P. António Costa e Silva
Exercícios Espirituais “Vida corrente” (em colaboração com CVX e ACI)
Exercícios Espirituais – P. Nuno Branco
Exercícios Espirituais “pé-descalço” (para Universitários) – P. Miguel Almeida
Exercícios Espirituais – P. Filipe Martins
Desafio da meia-idade (dos 40 aos 55 anos) – P. Vasco Pinto de Magalhães
Rezar com Daniel Faria e Maria Gabriela Llansol – P. Mário Garcia
Porta estreita (Mt 7, 13): O caminho singular dos místicos-D. António Couto, Emília Providência, Joana Serrano, Patrícia Calvário
Exercícios Espirituais – P. Manuel Morujão
Exercícios Espirituais – P. João Carlos Onofre Pinto
Exercícios Espirituais – P. Gonçalo Eiró
Páscoa em Soutelo – Filósofos, s.j. e P. Miguel Almeida
Exercícios Espirituais “Vida corrente” (em colaboração com CVX e ACI)
Exercícios Espirituais – P. António Santana
Exercícios Espirituais – P. Luís Maria da Providência
O relógio da família – P. Álvaro Balsas e grupo de casais
”Modos de orar” ao longo dos Exercícios – P. António Santana e P. Nuno Branco
Exercícios Espirituais – Alzira Fernandes
Exercícios Espirituais – P. Rui Nunes
Exercícios Espirituais (para CVX) – P. Vasco Pinto de Magalhães (Inscrições no CREU)
No Porto: CREU – Centro de Reflexão e Encontro Universitário Inácio de Loyola
R. Oliveira Monteiro, 562 – 4050-440 PORTO– Tel.: 226 061 410; E-mail: [email protected]
05 Mar.
06-07 Mar.
14-15 Mar.
18 Abr.
Conversas D’ouro – Encontro com as artes e os artistas
1 Noite & 1 Dia: Onde é que está o mal? Biografia das melhores tentações – P. Miguel Almeida
Relações Humanas – P. Vasco Pinto de Magalhães
Fé e Ética
Em Coimbra: CUMN – Centro Universitário Manuel da Nóbrega
R. Almeida Garrett, 4 – 3000-021 COIMBRA – Tel. 239 829 712; E-mail: [email protected]
03 Mar.
10 Mar. 15 Mar.
19-22 Mar.
14 Abr. 17-19 Abr. Rezar com os ícones – P. José Carlos Belchior
Orar, comer e gostar (com Círculo Loyola)
Atravessar o deserto: Dia de retiro – P. Miguel Gonçalves Ferreira e Círculo Loyola
Exercícios Espirituais “pé-descalço” (em Ourém) – P. António Santana e Margarida Alvim
Orar, comer e gostar (com Círculo Loyola)
Fim-de-Semana para Noivos – P. Nuno Branco e equipa de casais
Em Lisboa: CUPAV – Centro Universitário Padre António Vieira
Estrada da Torre, 26 – 1769-014 LISBOA – Tel. 217 590 516; E‑mail: [email protected]
12-15 Mar.
20-22 Mar. 20-22 Mar. 10-12 Abr. 17-19 Abr. 25 Abr. 30 Abr.-03 Mai. Exercícios Espirituais “pé-descalço” (para Universitários) – P. João Goulão
Nós e Deus – P. Nuno Tovar de Lemos e animadores
CaFé: Curso de Aprofundamento da Fé – P. Carlos Azevedo Mendes e P. João Goulão
Curso de Eneagrama – Clara e João Pedro Tavares
Experiência de Oração – P. Carlos Azevedo Mendes
Fé e Justiça
Exercícios Espirituais – P. Carlos Azevedo Mendes
NO RODÍZIO – Casa de Exercícios de Santo Inácio
Estrada do Rodízio, 124 – 2705-335 COLARES – Tel. 219 289 020; Fax: 219 289 026; E‑mail: [email protected]
06-08 Mar.
07-08 Mar.
12-15 Mar.
12-15 Mar.
12-15 Mar.
26 Mar.-02 Abr. 02-05 Abr. 30 Abr.-03 Mai. 30 Abr.-03 Mai. 30-Abr.-03 Mai. Formação da Consciência – P. Alberto Brito
Fim-de-Semana para Noivos – P. Carlos Azevedo Mendes e grupo de casais
Exercícios Espirituais – P. Alberto Brito
Exercícios Espirituais – P. António Santana
Exercícios Espirituais Temáticos: “Comprometer-se” – P. Sérgio Diz Nunes
Exercícios Espirituais – P. Luís Maria da Providência
Tríduo Pascal – P. Hermínio Rico
Exercícios Espirituais – P. António Júlio Trigueiros
Exercícios Espirituais – P. Manuel Morujão
Exercícios Espirituais Temáticos “A vida como liturgia” – P. Roque Cabral
Também na Igreja é importante perguntar-se: qual é a presença
da mulher? Sofro – digo a verdade – quando vejo na Igreja ou
em determinadas organizações eclesiais que o papel de serviço
– que todos nós temos e devemos ter – da mulher diminui
para uma função de servidumbre. Não sei se se diz assim em
italiano. Compreendeis-me? Servidão. Quando vejo mulheres
que desempenham tarefas de servidumbre, não se entende qual
é o papel que a mulher deve desempenhar. Qual é a presença
da mulher na Igreja? Pode ser valorizada em maior medida? É
uma realidade que me está muito a peito e foi por isso que eu
me quis encontrar convosco – contra o regulamento, porque
não está previsto um encontro deste tipo – e abençoar-vos, bem
como o vosso compromisso.
PAPA FRANCISCO,
DISCURSO AOS PARTICIPANTES NO
SEMINÁRIO SOBRE A CARTA APOSTÓLICA
«MULIERIS DIGNITATEM» DE JOÃO PAULO II