Capítulo 1: Sistemas Lineares e Matrizes

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Capítulo 1: Sistemas Lineares e Matrizes
1
Livro:
Introdução à Álgebra Linear
Autores: Abramo Hefez
Cecília de Souza Fernandez
Capítulo 1: Sistemas Lineares e Matrizes
Sumário
1
2
O que é Álgebra Linear?
. . . . . . . . . . . . . . .
2
1.1
Corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
3
1.2
Espaços Vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4
1.3
Sistemas de Equações Lineares . . . . . . . . . . .
9
Matrizes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
14
2.1
A Denição de Matriz . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.2
Operações com Matrizes . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.3
Matriz Inversa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
1
2
1
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
O que é Álgebra Linear?
Rn , com n ≥ 2, isto é, o produto
cartesiano de n cópias da reta real R. Para n ≥ 4, este espaço generaliza
2
3
o espaço R dos vetores do plano e o espaço R dos vetores no espaço. A
diferença crucial entre os casos n = 2 e n = 3 e os casos em que n ≥ 4
Os espaços em que trabalharemos são os
é que, para estes últimos, não se dispõe de uma representação geométrica.
O fato não diminui a importância desses espaços, pois basta pensar que o
R4
é o espaço-tempo da Física, em que os pontos são quaternos
(x, y, z, t),
com as três primeiras coordenadas representando a posição no espaço de uma
partícula ideal e a última representando o instante
ocupa tal posição.
pontos de
Rn
com
t
em que esta partícula
Por não existir uma representação geométrica para os
n ≥ 4,
seremos obrigados a tratá-los algebricamente, sem
o recurso da visualização geométrica, tão fundamental em
Rn como vetores,
(y1 , y2 , . . . , yn ) é dada por
Portanto, trataremos os elementos de
dois vetores
(x1 , x2 , . . . , xn )
e
R2
e
R3 .
onde a soma de
(x1 , x2 , . . . , xn ) + (y1 , y2 , . . . , yn ) = (x1 + y1 , x2 + y2 , . . . , xn + yn ),
e a multiplicação do vetor
(x1 , x2 , . . . , xn )
pelo número real
a,
chamado de
escalar, é denida por
a(x1 , x2 , . . . , xn ) = (ax1 , ax2 , . . . , axn ).
Os espaços
Rn
são utilizados de modo essencial em quase todos os ramos
do conhecimento e, por este motivo, são estudados em Matemática sob os
mais variados pontos de vista e com as mais diversas estruturas. Por exemplo, no Cálculo Diferencial, são considerados como espaços normados; em
Geometria, como espaços com produto interno.
Rn estudada em Álgebra Linear é a induzida pela estrutura
de corpo da reta real R. Essa é a estrutura mínima apropriada para se estudar
A estrutura de
sistemas de equações lineares com várias incógnitas.
Além disso, é aquela
sobre a qual se constroem o Cálculo Diferencial e a Geometria Diferencial,
entre outros.
1.
3
O QUE É ÁLGEBRA LINEAR?
Como a estrutura de corpo de
R desempenhará papel fundamental, vamos
denir formalmente este conceito.
1.1 Corpos
Um conjunto
de adição
K
será chamado de
corpo
se for munido de uma operação
(+) e uma operação de multiplicação (×), vericando as condições
a seguir.
A1 A adição é associativa:
(a + b) + c = a + (b + c),
para todos
a, b, c ∈ K .
A2 A adição é comutativa:
a + b = b + a,
para todos
a, b ∈ K .
A3 A adição possui elemento neutro:
existe
0 ∈ K,
tal que
a + 0 = a,
para todo
a ∈ K.
A4 A adição possui simétricos:
para todo
a ∈ K,
existe
−a ∈ K
tal que
a + (−a) = 0.
M1 A multiplicação é associativa:
(a × b) × c = a × (b × c),
para todos
a, b, c ∈ K .
M2 A multiplicação é comutativa:
a × b = b × a,
para todos
a, b ∈ K .
M3 A multiplicação possui elemento neutro:
existe
1 ∈ K \ {0},
tal que
a × 1 = a,
para todo
a ∈ K.
M4 A multiplicação possui inversos:
para todo
a ∈ K \ {0},
existe
a−1 ∈ K
tal que
a × a−1 = 1.
AM A multiplicação é distributiva com relação à adição:
a × (b + c) = a × b + a × c,
para todos
Portanto, são corpos os conjuntos
a, b, c ∈ K .
Q, R
e
C,
com as suas respectivas
adições e multiplicações.
A operação de multiplicação em um corpo muitas vezes é denotada por
(·), escrevendo a · b, ou mesmo ab, no lugar de a × b, notação que adotaremos
ao longo deste livro.
4
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Existem exemplos de corpos que à primeira vista parecem exóticos, como
1
o corpo de Galois
F2 , que consiste dos dois elementos 0 e 1 com as seguintes
operações:
+
0
1
0
0
1
×
0
1
1
1
0
0
0
0
1
0
1
Note que este é o corpo com o menor número possível de elementos,
pois todo corpo deve possuir os dois elementos distintos
0
e
1.
Apesar de
parecerem apenas curiosidades, os corpos com um número nito de elementos
têm as mais variadas aplicações em quase toda a Matemática e são essenciais
na tecnologia e na computação.
1.2 Espaços Vetoriais
Os espaços
Rn ,
por serem constituídos por vetores que podem ser soma-
dos e multiplicados por escalares, como vimos antes, são chamados
espaços
vetoriais.
Como os espaços vetoriais são os objetos principais de estudo da Álgebra
Linear, vamos deni-los formalmente a seguir.
Um conjunto
uma adição
(+)
V
será dito um
espaço vetorial
sobre um corpo
K , se possui
com as mesmas propriedades da adição em um corpo; ou
seja,
A1 A adição é associativa:
(u + v) + w = u + (v + w),
para todos
u, v, w ∈ V .
A2 A adição é comutativa:
u + v = v + u,
para todos
u, v ∈ V .
A3 A adição possui elemento neutro (elemento zero):
existe
0∈V,
tal que
v + 0 = v,
para todo
v ∈V.
1 Em homenagem a Évariste Galois (França, 1811-1832), considerado um dos grandes
gênios da Matemática.
1.
5
O QUE É ÁLGEBRA LINEAR?
A4 A adição possui simétricos:
para todo
v ∈V,
existe
−v ∈ V
tal que
v + (−v) = 0.
E além disso, existe uma operação chamada de
associa a um elemento
a∈K
e a um elemento
multiplicação por escalar, que
v ∈V,
um elemento
av ∈ V ,
tal que
ME1 a(u + v) = au + av , para todos a ∈ K e u, v ∈ V .
ME2 (a1 + a2 )v = a1 v + a2 v , para todos a1 , a2 ∈ K e v ∈ V .
ME3 (a1 a2 )v = a1 (a2 v), para todos a1 , a2 ∈ K e v ∈ V .
ME4 1v = v , para todo v ∈ V .
Os elementos de
V
serão chamados de
escalares. Assim, o elemento 0 de V
−v de vetor oposto de v .
vetores
e os elementos de
será chamado de
K
de
vetor nulo e o elemento
O primeiro matemático a dar uma denição abstrata para um espaço
vetorial foi Giuseppe Peano (Itália, 1858 - 1932) em seu livro
Calcolo Geo-
metrico, de 1888. No Capítulo IX, Peano dá uma denição do que ele chama
de um sistema linear. Para Peano, um sistema linear consistia de quantidades
com operações de adição e multiplicação por escalar. A adição deveria satisfazer as leis comutativa e associativa, enquanto a multiplicação por escalar
deveria satisfazer duas leis distributivas, uma lei associativa e a lei de que
1·v = v
para toda quantidade
v.
Além disso, Peano incluiu como parte de
0 (zero ) satisfazendo
v + (−1)v = 0 para todo v . Peano
seu sistema de axiomas a existência de uma quantidade
v + 0 = v,
para todo
também deniu a
v,
assim como
dimensão
de um sistema linear como o máximo número de
quantidades linearmente independentes do sistema (veja esta noção na Seção
2 do Capítulo 3). Peano vericou que o conjunto das funções polinomiais em
uma variável forma um sistema linear, mas não existia um tal número máximo de quantidades linearmente independentes, portanto, a dimensão deste
sistema deveria ser innito.
O fato a seguir decorre da denição de espaço vetorial.
Para
a ∈ K
e
6
CAPÍTULO 1.
v ∈V,
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
tem-se que
⇐⇒
a = 0 ou v = 0
De fato, sejam
a ∈ K
e
0 ∈ V.
Como
av = 0.
0 + 0 = 0,
pela propriedade ME1,
segue-se que
a 0 = a(0 + 0) = a 0 + a 0.
Somando o simétrico
−a 0
de
a0
a ambos os lados da igualdade acima e
utilizando as propriedades A4, A1 e A3, temos que
0 = a 0 + (−a 0) = (a 0 + a 0) + (−a 0) = a 0 + [a 0 + (−a 0)] = a 0 + 0 = a 0.
De modo semelhante, mostra-se (faça-o) que para
0 v = 0,
onde o elemento
0
0 ∈ K
da direita é o elemento zero de
Reciprocamente, suponhamos que
tem-se
V.
a 6= 0, então, multiplicando
−1
escalar a , temos que
av = 0
ambos os lados da igualdade acima pelo
v ∈ V
e
e
0 = a−1 0 = a−1 (av) = (a−1 a)v = 1v = v.
Dois vetores
u
e
v
a
em um espaço vetorial
V
serão ditos
colineares,
se
K tal que v = au. Portanto, são colineares os
vetores u e au, para todo a ∈ K . Note que o vetor 0 é colinear com qualquer
vetor v , pois 0 = 0v .
existir um elemento
em
É um exercício fácil mostrar que
R,
Rn
é um espaço vetorial sobre o corpo
com as operações de adição de vetores e a multiplicação por escalares
que denimos anteriormente, onde o elemento zero é o vetor
simétrico de
(x1 , x2 , . . . , xn )
(0, 0, . . . , 0)
e o
é o vetor
−(x1 , x2 , . . . , xn ) = (−x1 , −x2 , . . . , −xn ).
Observe que não há nada de especial sobre os reais, além de sua estrutura
de corpo para que
Rn
seja um espaço vetorial sobre
dado um corpo qualquer
K,
o espaço
K
n
R.
Mais geralmente,
é um espaço vetorial sobre
K,
com
1.
7
O QUE É ÁLGEBRA LINEAR?
operações semelhantes às de adição de vetores e de multiplicação de vetores
por escalares que denimos no caso em que
K = R.
n
Por exemplo, os espaços vetoriais F2 sobre
F2 ,
por mais inócuos que
possam parecer, são de extrema utilidade em várias aplicações, dentre elas
na construção de códigos corretores de erros (veja a referência [3] para maiores
detalhes sobre esta teoria).
Outros exemplos importantes de espaços vetoriais são os espaços
sobre o corpo
Q
e o espaço
C
sobre o corpo
R
e
C
R.
Como sucede com frequência em Matemática, ao introduzir um conceito
para lidar com determinado problema, cria-se um instrumento que muitas
vezes transcende o problema inicial e se constitui em um conceito central em
vários outros contextos.
Isto ocorreu com a noção de espaço vetorial, que
inicialmente foi introduzida para tratar de alguns tipos de problemas em
Rn ,
como a resolução de sistemas de equações lineares cuja discussão iniciaremos
na próxima subseção, e se desenvolveu em uma teoria com vida própria.
Pode-se sinteticamente dizer que a Álgebra Linear é a parte da Matemática
que se dedica ao estudo dos espaços vetoriais e de certas funções entre esses
espaços, chamadas de transformações lineares.
Embora muitas das ferramentas básicas da Álgebra Linear, particularmente as que estão relacionadas com sistemas lineares, datem da antiguidade, o assunto começou a tomar sua forma atual em meados dos século
XIX. A partir desta época, muitas noções estudadas em séculos anteriores
foram abstraídas e muitos métodos generalizados.
A Álgebra Linear tem várias aplicações fora da Matemática. Por exemplo,
citamos a teoria da relatividade e a mecânica quântica na Física e a teoria
de análise de regressão na Estatística.
A seguir, daremos alguns exemplos diferentes de
Rn para ilustrar situações
onde aparecem os espaços vetoriais e que, muitas vezes, quando tratadas
dessa forma ganham clareza.
Exemplo 1
O conjunto das funções de um conjunto não vazio
forma um espaço vetorial sobre
R,
A
em
R
onde a soma é a soma usual de funções
8
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
com valores reais
(f + g)(x) = f (x) + g(x),
e a multiplicação de uma função
f
para todo
por um escalar
x ∈ A,
a ∈ R
é denida como
sendo
(a f )(x) = a f (x),
Em particular, se
x ∈ A.
para todo
I = [a, b] é um intervalo em R, sabe-se do Cálculo Dife-
rencial e Integral que o conjunto das funções contínuas, bem como o conjunto
das funções integráveis, de
Exemplo 2
I
em
R,
são espaços vetoriais sobre
S das sequências de
N \ {0} em R é um espaço
que o conjunto R(a, b) das
De acordo com o Exemplo 1, o conjunto
números reais, isto é, o conjunto das funções de
vetorial sobre
sequências
R.
R. É fácil vericar (leitor, faça-o)
(un ) em S que satisfazem a recorrência
un+1 = aun + bun−1 , n ≥ 2,
onde
a
e
b
são dois números reais xados, é um espaço vetorial sobre
R.
Em
2
R(1, 1), que contém a sequência de Fibonacci (aquela
para a qual u1 = u2 = 1), é um espaço vetorial. Veremos no Capítulo 5
como esta informação nos ajudará a achar todas as sequências em R(1, 1),
particular, o conjunto
determinando suas fórmulas fechadas.
Exemplo 3
um corpo
K
(Peano) O conjunto
K[x]
dos polinômios com coecientes em
forma um espaço vetorial sobre
K[x]n = {p(x) ∈ K[x] ;
também são espaços vetoriais sobre
K.
Para
grau(p(x))
K.
n ∈ N,
os conjuntos
≤ n} ∪ {0}
Em particular, o conjunto
R[x]2 = {a0 + a1 x + a2 x2 ; a0 , a1 , a2 ∈ R}
é um espaço vetorial sobre
R.
2 Apelido de Leonardo de Pisa (Itália,
mático europeu da Idade Média.
∼
1170 -
∼
1250). Foi o primeiro grande mate-
1.
9
O QUE É ÁLGEBRA LINEAR?
1.3 Sistemas de Equações Lineares
Desde a antiguidade, em diversas áreas do conhecimento, muitos problemas são modelados matematicamente por sistemas de equações lineares.
Damos a seguir um exemplo de sistema de equações lineares:
(
x + y = 36
x − y = 2,
(1)
onde se subentende que estamos buscando dois números reais cuja soma
vale
36
e cuja diferença vale
2.
Portanto, as soluções procuradas podem ser
representadas por pares de números reais
(a, b)
tais que, se substituírmos
x
a e y por b, nas equações, elas se tornam igualdades de fato. Por exemplo,
par (x, y) = (19, 17) é uma solução, pois obtemos as igualdades:
(
19 + 17 = 36
19 − 17 = 2.
por
o
Os sistemas com duas equações lineares, como o acima, já eram considerados pelos babilônios por volta de 1800 a.C. e resolvidos por um método
3
que chamamos hoje de método de eliminação gaussiana .
Por exemplo, para resolver o sistema de equações (1), ao somarmos a
segunda equação à primeira, o transformamos no sistema equivalente,
(
2x = 38
x − y = 2,
que seguimos transformando até obtermos um sistema onde as soluções são
trivialmente encontradas:
(
2x = 38
x−y =2
(
⇔
x = 19
x−y =2
(
⇔
x = 19
x − y − x = 2 − 19
(
⇔
x = 19
y = 17.
3 Em homenagem a Carl Friedrich Gauss (Alemanha, 1777 - 1855), considerado um dos
maiores matemáticos de todos os tempos.
10
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Esse método será generalizado e sistematizado para
lineares
com
m
equações e
n
sistemas de equações
incógnitas do tipo


a11 x1 + a12 x2 + · · · + a1n xn = b1



 a21 x1 + a22 x2 + · · · + a2n xn = b2
.
.

.



 a x + a x + ··· + a x = b ,
m1 1
m2 2
mn n
m
onde os
aij 's
e os
bi 's,
para
1≤i≤m
ou, mais geralmente, elementos de um
1 ≤ j ≤ n, são
corpo K dado.
e
(2)
números reais dados,
Seja
S = {(c1 , c2 , . . . , cn ) ∈ Rn ; ai1 c1 + ai2 c2 + · · · + ain cn = bi , 1 ≤ i ≤ m}.
Esse subconjunto de
Rn
é chamado de
conjunto solução
do sistema (2). É
precisamente este conjunto que queremos determinar ou descrever o mais
explicitamente possível.
Note que para resolver o sistema (1), do exemplo acima, o modicamos
gradativamente, por meio de uma sequência de
transformações elementares,
em um sistema mais simples de resolver, onde por transformação elementar
de um sistema entendemos uma das seguintes transformações:
1) Trocar a posição relativa de duas equações do sistema;
2) Trocar uma equação pela soma membro a membro da própria equação
com um múltiplo de outra;
3) Trocar uma equação dada por um de seus múltiplos (i.e., a equação obtida
multiplicando ambos os membros da equação dada por um número real não
nulo).
Diremos que dois sistemas de equações lineares são
sistemas equivalentes,
se pudermos obter um sistema do outro a partir de uma sequência nita de
transformações elementares.
Esta relação entre sistemas é efetivamente uma relação de equivalência.
De fato, ela é claramente reexiva, pois basta multiplicar uma das equações
1.
11
O QUE É ÁLGEBRA LINEAR?
do sistema por
1; é transitiva, pois basta concatenar uma sequência de trans-
formações elementares com uma outra; e é simétrica, pois podemos desfazer
uma transformação elementar com outra.
Assim, é imediato vericar que:
Sistemas de equações lineares equivalentes possuem mesmo conjunto solução.
Dentre os sistemas de equações lineares, ocupam lugar de destaque os
sistemas homogêneos,
bi 's
ou seja, aqueles sistemas como em (2), porém com os
todos nulos:


a11 x1 + a12 x2 + · · · + a1n xn = 0



 a21 x1 + a22 x2 + · · · + a2n xn = 0
.
.

.



 a x + a x + · · · + a x = 0.
m1 1
m2 2
(3)
mn n
Esses sistemas possuem peculiaridades não compartilhadas pelos sistemas
mais gerais.
Por exemplo, o vetor
soluções do sistema.
(0, 0, . . . , 0)
Além disso, se os
(c01 , c02 , . . . , c0n ) são soluções do sistema, e
Sh de
0
vetores u = (c1 , c2 , . . . , cn ) e u =
se a ∈ R, então os vetores
u + u0 = (c1 + c01 , c2 + c02 , . . . , cn + c0n )
e
pertence ao conjunto
au = (ac1 , ac2 , . . . , acn )
também são soluções do sistema (3) (leitor, verique).
Assim, resulta que o espaço
Sh
das soluções do sistema (3) é um espaço
vetorial sobre
R De fato, as propriedades A1 e A2 da denição são satisfeitas
n
para todos os vetores de R e em particular para os de Sh . Por outro lado,
(0, 0, . . . , 0) ∈ Sh e se (c1 , c2 , . . . , cn ) ∈ Sh , então
−1(c1 , c2 , . . . , cn ) = (−c1 , −c2 , . . . , −cn ) ∈ Sh ,
o que mostra que a adição em
Sh
possui também as propriedades A3 e A4.
Além disso, as propriedades ME1ME4 da multiplicação por escalar são facilmente vericadas para
Sh .
Note que o que há de essencial em um sistema de equações lineares
(2) são os coecientes das equações que o formam além dos números que
12
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
compõem os segundos membros das equações.
(ai1 , ai2 , . . . , ain , bi )
de
Rn+1
Consideremos os vetores
que representam os coecientes das equações do
sistema (2) acrescidos dos segundos membros e os organizemos como linhas
de uma tabela, chamada de
matriz ampliada
do sistema (2), como segue:

a11 a12 · · · a1n b1

 a21 a22 . . . a2n b2
 .
.
.
.
 .
.
.
.
.
.
.
 .
am1 am2 · · · amn bm



.


(4)
Quando o sistema de equações é homogêneo, a ele associamos a matriz

a11 a12 · · · a1n

 a21 a22 . . . a2n
 .
.
.
 .
.
.
.
.
 .
am1 am2 · · · amn



,


eliminando a coluna de zeros da direita na matriz (4).
As matrizes surgiram por volta do ano 200 a.C. com os chineses, motivados pelo interesse em calcular soluções de sistemas com mais de quatro equações lineares. De fato, no Capítulo 8 do texto intitulado
Jiuzhang suanshu, de
autor desconhecido, que signica Nove capítulos sobre a Arte Matemática" ,
ca claro que o procedimento de resolução de sistemas lineares usado pelos
chineses é semelhante ao método de escalonamento, que discutiremos ainda
neste capítulo, e é apresentado na forma de matrizes. Cabe observar que os
chineses só consideravam sistemas lineares com o mesmo número de equações e incógnitas, não constando em seus escritos o motivo desses sistemas
produzirem sempre uma única solução e como o algoritmo chinês funcionava.
Problemas
1.1
Verique que o conjunto das funções de um conjunto não vazio
reais é um espaço vetorial sobre
R,
A
nos
com as operações denidas no Exemplo
1.
13
O QUE É ÁLGEBRA LINEAR?
1. Verique também que, para cada par de números reais
R(a, b),
das recorrências
(a, b),
o conjunto
denido no Exemplo 2, é um espaço vetorial sobre
R.
1.2
Seja
v
um elemento não nulo de um espaço vetorial
V
sobre
R.
Mostre
que é injetora a função
R → V
t 7→ tv.
1.3 Sejam v1 e v2
elementos de um espaço vetorial
V
sobre
R.
Mostre que a
função
R2 → V
(a1 , a2 ) 7→ a1 v1 + a2 v2
é injetora se, e somente se,
v1
e
v2
não são colineares.
1.4 Diga, em cada caso, por que o conjunto com as operações indicadas não
satisfaz à denição de espaço vetorial, onde
a)
R2 ,
com as operações:
(x, y) + (x0 , y 0 ) = (x + x0 , y + y 0 )
b)
R2 ,
R3 ,
a(x, y) = (3ax, 3ay).
a(x, y) = (ax, 0).
e
com as operações:
(x, y, z) + (x0 , y 0 , z 0 ) = (0, 0, 0)
1.5
e
com as operações:
(x, y) + (x0 , y 0 ) = (xx0 , yy 0 )
c)
a ∈ R.
Sejam
U
e
W
produto cartesiano
operações em
e
a(x, y, z) = (ax, ay, az).
dois espaços vetoriais sobre um corpo
V = U ×W
K.
Considere o
desses dois conjuntos. Dena as seguintes
V:
(u1 , w1 ) + (u2 , w2 ) = (u1 + u2 , w1 + w2 ) e a(u1 , w1 ) = (au1 , aw1 ),
onde
u1 , u2 ∈ U , w1 , w2 ∈ W
e
a ∈ K.
Mostre que
V
com as operações de
adição e de mutiplicação por escalar, acima denidas, é um espaço vetorial
sobre
K.
Este espaço vetorial é chamado de
espaço produto
de
U
por
W.
14
CAPÍTULO 1.
2
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Matrizes
As matrizes são ferramentas básicas da Álgebra Linear, pois além de for-
necerem meios para a resolução dos sistemas de equações lineares, elas também representarão as transformações lineares entre espaços vetoriais, como
veremos no Capítulo 6.
2.1 A Denição de Matriz
Dados
m
e
n
em
N \ {0},
ou simplesmente uma matriz
formada por elementos de
elementos de
[3]
R
denimos uma
m
R
são chamados
é uma matriz
1 × 1,
por
2 × 3.
(escreve-se
distribuídos em
entradas
m
m × n),
como uma tabela
linhas e
n
colunas.
Estes
4
da matriz . Por exemplo, a matriz
ao passo que
"
é uma matriz
n
matriz real de ordem m por n,
#
2
1 0
−1 −2 4
As entradas da primeira linha da matriz são dadas pelos
números reais 2, 1 e 0 e as entradas da segunda linha da matriz são dadas
pelos números reais
−1, −2
e 4.
É usual indicarmos as entradas de uma matriz arbitrária
bolos
Aij ,
ou ainda
aij ,
A
pelos sím-
onde os índices indicam, nessa ordem, a linha e a
coluna onde o elemento se encontra. Assim, uma matriz
m × n é usualmente
representada por


a11 a12 . . . a1n


 a21 a22 . . . a2n 


A= .
.
. ,
.
.
.
.
. 
 .
am1 am2 . . . amn
4 As entradas de uma matriz não precisam ser necessariamente números reais, podem
ser números complexos ou, mais geralmente, elementos de um corpo
K.
2.
15
MATRIZES
ou por
A = [aij ]m×n ,
matriz estiver subentendida.
matrizes
A = [aij ], quando a ordem da
M(m, n) denota o conjunto das
ou simplesmente por
O símbolo
m × n.
m e n, uma matriz m × n recebe um nome
especial. De fato, toda matriz 1 × n é chamada de uma matriz linha e toda
matriz m × 1 é chamada de uma matriz coluna. Uma matriz n × n é chamada
de matriz quadrada de ordem n. Por exemplo, a matriz
h
i
1 −3 1 0 4
Dependendo dos valores de
é uma matriz linha de ordem
1 × 5 e a matriz


2 −1 0


1 2
0
3
1 4
é uma matriz quadrada de ordem 3.
A = [aij ] é uma matriz quadrada de ordem n, as entradas aii , com
1 ≤ i ≤ n, formam a diagonal principal de A.
Uma matriz diagonal de ordem n é uma matriz quadrada de ordem n em
Se
que os elementos que não pertencem à diagonal principal são iguais a zero:


a11 0 . . . 0


 0 a22 . . . 0 
 .

.
. .
 .
.
.
.
.
.


0
0 . . . ann
A matriz diagonal de ordem
n
cujas entradas da diagonal principal são
iguais ao número real 1,


1 0 ... 0


0 1 . . . 0
. .

. ,
. .
.
.
.
.


0 0 ... 1
é chamada
matriz identidade de ordem n e denotada usualmente por In .
alguns casos, representaremos por simplicidade
In
apenas por
I.
Em
16
CAPÍTULO 1.
Uma
ordem
n
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
matriz triangular superior de ordem n
é uma matriz quadrada de
em que todos os elementos abaixo da diagonal principal são iguais
a zero:


a11 a12 . . . a1n


 0 a22 . . . a2n 
 .

.
. .
 .
.
.
.
.
.


0
0 . . . ann
Portanto, uma matriz quadrada
se
aij = 0
sempre que
de ordem
n
é triangular superior
i > j.
Analogamente, uma
quadrada de ordem
A = [aij ]
matriz triangular inferior de ordem n é uma matriz
n em que todos os elementos acima da diagonal principal
são iguais a zero:

a11 0 . . . 0


 a21 a22 . . . 0 

 .
.
. .
 .
.
.
.
.
.


an1 an2 . . . ann

Portanto, uma matriz quadrada
aij = 0
sempre que
Uma matriz
uma
de ordem
n
é triangular inferior se
i < j.
m×n
matriz nula.
A = [aij ]
cujas entradas são todas iguais a zero é chamada de
Por exemplo, a matriz
"
é uma matriz nula de ordem
#
0 0 0
0 0 0
2 × 3.
2.2 Operações com Matrizes
A = [aij ]m×n e B = [bij ]m×n , de mesma ordem,
A = B , quando aij = bij para todo 1 ≤ i ≤ m e para
Dizemos que duas matrizes
são
iguais,
todo
escrevendo
1 ≤ j ≤ n.
2.
17
MATRIZES
Por exemplo, se
são iguais quando
x
e
y denotam
"
#
x 0
1 y
x = −1
e
Denimos a seguir uma
números reais, temos que as matrizes
"
e
#
−1 0
1 2
y = 2.
operação de adição
no conjunto
M(m, n)
das
m × n.
Se A = [aij ] e B = [bij ] são duas matrizes de mesma ordem m × n, a
soma de A e B , denotada A + B , é a matriz C = [cij ] de ordem m × n tal
que cij = aij + bij para todo 1 ≤ i ≤ m e para todo 1 ≤ j ≤ n.
matrizes
Por exemplo,
"
# "
# "
#
2
3 −1
−2 −3
1
0 0 0
+
=
.
0 −2
1
0
2 −1
0 0 0
Dada uma matriz
A = [aij ], dene-se a matriz oposta
de
A, como a matriz
−A = [−aij ].
A adição de matrizes tem propriedades semelhantes à adição nos números
reais, ou à adição de elementos em espaços vetoriais, como mostra o resultado
a seguir.
Proposição 1.2.1. Se A, B e C são matrizes de mesma ordem, então :
(i)
(ii)
A + (B + C) = (A + B) + C (associatividade da adição);
A + B = B + A (comutatividade da adição);
(iii)
A + 0 = A, onde 0 denota a matriz nula m × n (elemento neutro);
(iv)
A + (−A) = 0.
Demonstração
As propriedades acima decorrem diretamente das deni-
ções de igualdade e adição de matrizes. Por esta razão, provaremos apenas
o item (i) e deixaremos (ii), (iii) e (iv) como exercício (veja Problema 2.5).
(i): Se
A = [aij ], B = [bij ]
e
C = [cij ],
então
A + (B + C) = [aij ] + [bij + cij ] = [aij + (bij + cij )] =
[(aij + bij ) + cij ] = [aij + bij ] + [cij ] = (A + B) + C,
18
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
onde usamos a associatividade da adição de números reais.
multiplicação por esproduto de A pelo número
Uma outra operação importante com matrizes é a
calar. Dada a matriz A = [aij ]m×n ,
real a, como aA = [aaij ]m×n .
denimos o
Por exemplo,

 

2
0
−6
0

 

−3 1
1  = −3 −3 .
0 −1
0
3
Tendo denido as operações de adição e multiplicação por escalar em
M(m, n), denimos a operação
matrizes A e B em M(m, n),
de
subtração
da maneira usual:
dada as
A − B = A + (−B).
Proposição 1.2.2. As seguintes propriedades se vericam para quaisquer A
e B ∈ M(m, n), e a, a0 ∈ R:
(i)
a(A + B) = aA + aB ;
(ii)
(a + a0 )A = aA + a0 A;
(iii)
a(a0 A) = (aa0 )A;
(iv)
1A = A.
Demonstração
Provaremos apenas (i) e deixaremos a demonstração das
demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5).
(i): De fato, sejam
de
R,
A = [aij ], B = [bij ] elementos de M(m, n) e a um elemento
então
a(A + B) = a[aij + bij ] = [a(aij + bij )] = [aaij + abij ] =
[aaij ] + [abij ] = a[aij ] + a[bij ] = aA + aB,
onde usamos a distributividade da multiplicação em relação à adição de números reais.
2.
19
MATRIZES
Assim, com as Proposições 1.2.1 e 1.2.2, provamos que o conjunto
é um espaço vetorial sobre
M(m, n)
R.
O conjunto das matrizes tem uma estrutura muito mais rica do que a de
simples espaço vetorial, obtida com a noção de produto de matrizes, noção
esta, fundamental para a resolução de sistemas de equações lineares com o
uso de matrizes.
Nosso próximo objetivo é, portanto, denir a
multiplicação de matrizes
e
mostrar algumas de suas propriedades. A denição de produto de matrizes
foi apresentada por Arthur Cayley (Inglaterra, 1821-1895), no trabalho intitulado A Memoir on the Theory of Matrices, publicado em 1858 na revista
Philosophical Transactions of the Royal Society of London.
Neste trabalho,
Cayley notou que a multiplicação de matrizes, como foi denida, simplica
em muito o estudo de sistemas de equações lineares. Também observou que
esta multiplicação deixava de apresentar propriedades importantes, como a
comutatividade e a lei do corte, e que uma matriz não nula não é necessariamente invertível.
A = [aij ]m×n e B = [bij ]n×p duas matrizes. Denimos o produto
AB de A por B , denotado por AB , como a matriz C = [cij ]m×p tal que
Sejam
cij =
n
X
aik bkj = ai1 b1j + · · · + ain bnj
k=1
para todo
1≤i≤m
e para todo
1 ≤ j ≤ p.
Vamos explicar esta fórmula para obter o elemento da matriz
encontra na
i-ésima
Na matriz
A,
linha e
j -ésima
destaque a
i-ésima
AB
que se
coluna:
linha, e na matriz
B,
a
j -ésima
coluna.
Feito isto, multiplique ordenadamente o primeiro elemento da linha com o
primeiro elemento da coluna, o segundo elemento da linha com o segundo
elemento da coluna, etc., o último elemento da linha com o último elemento
da coluna e nalmente some esses números todos.
20
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Por exemplo,



 

#
2 4 "
2(−1) + 4(1)
2(1) + 4(−1)
2 −2
1

 −1

 

=  0(−1) + 0(1)
0(1) + 0(−1)  = 0
0 .
 0 0
1 −1
−1 3
−1(−1) + 3(1) −1(1) + 3(−1)
4 −4
A
Note que para o produto de
por
B
estar denido, o número de colunas
A deve ser igual ao número de linhas de B . Assim, se A e B são matrizes
2 × 3 e 3 × 1, respectivamente, o produto AB está denido e é uma matriz
2 × 1. Porém, o produto BA não está denido. Uma condição necessária
para que AB = BA é que A e B sejam matrizes quadradas de mesma ordem.
de
Contudo, esta condição não é suciente. Por exemplo, as matrizes
"
0 1
A=
2 0
#
"
0 1
B=
1 0
e
são matrizes quadradas de ordem 2, mas
#
AB 6= BA.
Assim, vemos que a
multiplicação de matrizes não possui a propriedade comutativa.
Observe que
"
1 1
1 1
# "
#
1
1
= 0,
−1 −1
sem que nenhuma das duas matrizes seja nula. Portanto, na multiplicação de
matrizes, podemos ter
AB = 0
sem que necessariamente
A
ou
B
seja nula.
Lembremos que isto não ocorre com a multiplicação de números reais, pois
dados dois números reais
x=0
ou
x
e
y
tais que
xy = 0,
tem-se obrigatoriamente que
y = 0.
Os sistemas lineares como em (2) da Seção 1 se expressam de modo perfeito pela equação matricial
AX = B,
onde


a11 a12 . . . a1n


 a21 a22 . . . a2n 


A= .
.
. ,
.
.
.
.
. 
 .
am1 am2 . . . amn


 
x1
b1
 
 
 x2 
 b2 

 
X=
 ..  e B =  ..  .
.
 . 
xn
bm
2.
21
MATRIZES
As matrizes
coecientes
dentes.
A, X
e
B
matriz das incógnitas
do sistema,
matriz dos
matriz dos termos indepen-
são chamadas, respectivamente, de
e
Na seguinte proposição apresentamos algumas propriedades da multiplicação de matrizes.
Proposição 1.2.3. Desde que as operações sejam possíveis, temos:
(i)
(ii)
A(B + C) = AB + AC (distributividade à esquerda da multiplicação
em relação à adição);
(A + B)C = AC + BC (distributividade à direita da multiplicação em
relação à adição);
(iii)
(AB)C = A(BC) (associatividade);
(iv)
A I = I A = A (existência de elemento identidade).
Demonstração
Provaremos a propriedade (iii) e deixaremos a demons-
tração das demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5).
(iii): Suponhamos que as matrizes
s × m,
A, B
e
C
sejam de ordens
n × r, r × s
e
respectivamente. Temos que
(AB)C
Pr
l=1
ail
ij
=
Ps
k=1 (AB)ik ckj
Ps
k=1 blk ckj
=
Pr
=
l=1
Ps
k=1
Pr
l=1
ail blk ckj =
ail (BC)lj = A(BC))ij .
Isto mostra que a propriedade (iii) é válida.
Tendo denido a multiplicação de matrizes, denimos a
maneira usual: dados
A
em
M(n, n)
A0 = In
e
e
potenciação
da
k ∈ N \ {0},
Ak = A
· · · A} .
| A{z
k fatores
A = [aij ]m×n , chamamos
matriz [bij ]n×m , onde
Dada uma matriz
mos por
t
A,
a
bij = aji ,
de
transposta
de
A,
e denota-
22
CAPÍTULO 1.
para todo
1≤i≤n
e para todo
Por exemplo,
se
1 ≤ j ≤ m.
t
"
0
−4

2 =
0
3

−4

−1
0
Uma matriz quadrada
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
A
é chamada
#
0
.
3
−1
2
simétrica
se
At = A
e
antissimétrica
t
A = −A.
Por exemplo, dadas as matrizes

2

A = −1
3
a matriz
A

3

0
5
−1
1
0
é simétrica e
B

e
0

B = −1
3
1
0
−2

−3

2 ,
0
é antissimétrica.
Terminamos esta seção apresentando o conceito de matriz em blocos.
Uma matriz
A é dita ser uma matriz em blocos
trizes menores, chamadas
blocos.
se
A está subdividida em ma-
Esta subdivisão é, geralmente, apresentada
por linhas horizontais e/ou linhas verticais, como mostra o seguinte exemplo:
"
# "
#
2 1 1 0
2 1 | 1 0
=
.
6 4 0 1
6 4 | 0 1
Uma matriz pode ser subdividida em blocos de várias maneiras.
Por
exemplo,

 



0
|
1
|
0
2
0
1
|
0
2


 
0 1 0 2
−− −− −− −− −− −−
1
4
|
2
1 

 



.
1 4 2 1 = 
=
|
4
|
2
1 

−− −− −− −− −−  1
0 0 5 3
0
|
0
|
5
3
0
0
|
5
3
Uma propriedade interessante da partição em blocos é que os resultados
das operações de adição e multiplicação com matrizes em blocos podem ser
obtidos efetuando o cálculo com os blocos, como se eles fossem simplesmente
elementos das matrizes.
2.
23
MATRIZES
2.3 Matriz Inversa
Dada uma matriz quadrada
uma matriz quadrada
B
A
de ordem
de ordem
n
n,
chamamos de
inversa
de
A
a
tal que
AB = BA = In .
Por exemplo, dada a matriz
"
#
2 5
A=
,
1 3
temos que a matriz
"
#
3 −5
B=
−1
2
é uma inversa de
A,
já que
AB = BA = I2 .
Note que uma matriz
não possui necessariamente
" quadrada
#
" uma# inversa.
Por exemplo, seja
que
Logo,
A
0 0
a b
. Dada qualquer matriz B =
0 0
c d
"
# "
# "
#
0 0
a b
0 0
AB =
=
6= I2 .
0 0
c d
0 0
A=
, temos
não tem inversa.
Mesmo que uma matriz
" não
# seja nula, ela pode não ter inversa.
exemplo, a matriz
matriz quadrada
B
A =
1 1
1 1
não possui inversa, já que não existe uma
de ordem 2 tal que
Uma matriz quadrada
Por
AB = I2
A é dita invertível
se
(verique).
A admite uma matriz inversa.
A possui uma inversa, então essa inversa é única. De fato,
suponhamos que B e C são duas inversas de uma matriz A de ordem n × n.
Então AB = In e CA = In . Assim, por (iii) e (iv) da Proposição 1.2.3,
Se uma matriz
C = C In = C(AB) = (CA)B = In B = B.
24
CAPÍTULO 1.
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Já que a inversa, no caso de existir, é única, escrevemos
inversa de
A.
Se
A−1
para denotar a
k ∈ N \ {0} e A é uma matriz invertível, denimos A−k
por:
−1 −1
−1
A−k = A
| A {z· · · A } .
k fatores
Vejamos algumas propriedades das matrizes inversas.
Proposição 1.2.4. Sejam A e B matrizes quadradas de ordem n.
(i)
(ii)
Se A é invertível, então A−1 é também invertível e (A−1 )−1 = A.
Se A e B são invertíveis, então AB também é invertível e
(AB)−1 = B −1 A−1 .
Deixamos a demonstração desta proposição ao leitor (veja Problema 2.12),
bem como a generalização do item (ii) para um número arbitrário de fatores.
O interesse das matrizes invertíveis reside no fato de que dado um sistema
linear de equações com
que a matriz
A
n
equações e
n
incógnitas,
AX = B ,
se soubermos
é invertível e soubermos como calcular sua inversa, então o
sistema se resolve efetuando apenas a multiplicação da matriz
A−1
com
B,
pois
AX = B =⇒ X = (A−1 A)X = A−1 (AX) = A−1 B.
Vimos que uma matriz quadrada não nula não possui necessariamente
inversa. Uma pergunta natural é se podemos caracterizar as matrizes quadradas invertíveis, ou seja, se podemos apresentar uma condição necessária
e suciente para que uma matriz quadrada seja invertível.
Também esta-
mos interessados em obter um método para o cálculo da inversa de uma
matriz invertível. No próximo capítulo, apresentaremos uma caracterização
de matrizes invertíveis e um método para inversão de matrizes que utiliza as
transformações elementares nas linhas de uma matriz e a forma escalonada.
No Capítulo 8, Proposição 8.3.1(iii), veremos um outro modo bem diferente
de atacar este problema pelo uso dos determinantes.
Problemas
2.
25
MATRIZES
"
2.1*
1 −2 3
A=
4
1 0
Sejam
Calcule
2A, 3B
e
#
"
−1
2 0
B=
1 −2 0
e
#
.
2A−3B .
2.2 Determine os valores de x, y e z
em
R
para que as matrizes
A
e
B
dadas
sejam iguais:
"
x+y
0
A=
z
x − 2y
#
"
13 0
B=
1 4
e
#
.
2.3 Dadas as matrizes
"
#
−1 4 −2
A=
,
2 0 −1
"
#
0 1 −2
B=
,
0 1 −1
 
1
 
C = 1
3
D = [−1 1],
e
determine:
(a)
A + B;
(b)
−2C ;
(c)
AC ;
(d)
CD;
(e)
BC ;
(f )
DA.
2.4* Considere as matrizes
A = [aij ]4×5
com
aij = i − j,
B = [bij ]5×9
com
bij = j
C = [cij ]
com
C = AB.
(a) É possível determinar
(b) Determine
c63 ?
e
Justique a resposta.
c36 .
2.5 Conclua as demonstrações das Proposições 1.2.1, 1.2.2 e 1.2.3.
2.6*
Dada uma matriz
AX = XA.
A,
dizemos que uma matriz
X comuta
com
A
se
Determine todas as matrizes que comutam com
"
#
1 0
A=
.
0 3
2.7
a) Mostre que a matriz
M(n, n).
c In ,
onde
c ∈ R,
comuta com toda matriz
X ∈
26
CAPÍTULO 1.
b) Ache todas as matrizes
2.8 Verdadeiro ou falso?
A
(a) Se
e
B
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
"
#
x y
M=
z t
"
que comutam com a matriz
#
1 1
.
0 1
Justique.
são matrizes quadradas de mesma ordem, então
(A − B)(A + B) = A2 − B 2 .
(b) Se
então
2.9
A, B e C
B = C.
são matrizes quadradas de mesma ordem tais que
Mostre que se
A
é uma matriz triangular superior, então
A2
AB = AC ,
também é
uma matriz triangular superior.
"
2.10* (a) Obtenha At , onde
1
2 3
A=
0 −1 4
#
.
(b) Verique que a transposta de uma matriz triangular superior é uma
matriz triangular inferior.
(A + B)t = At + B t
ordem e k ∈ R.
(c) Mostre que
de mesma
A é uma
(AB) = B t At .
(d) Se
matriz
m × n
e
(kA)t = kAt ,
e
B
onde
é uma matriz
A
e
B
são matrizes
n × p,
prove que
t
(e) Mostre que
(At )t = A
2.11* Mostre que se B
BB t
para toda matriz
A
de ordem
m × n.
é uma matriz quadrada, então:
(a)
B + Bt
e
(b)
B − Bt
é antissimétrica.
(c)
Observando que
são simétricas;
B=
B + Bt B − Bt
+
,
2
2
conclua que toda matriz quadrada se escreve como soma de uma matriz
simétrica e de uma matriz antissimétrica.
2.
27
MATRIZES
(d)
Mostre que a escrita em (c) é o único modo possível de escrever uma
matriz quadrada como soma de uma matriz simétrica e de uma matriz antissimétrica.
2.12 Prove a Proposição 1.2.4.
2.13 Demonstre que:
(a) se
A
tem uma linha nula, então
AB
(b) se
B
tem uma coluna nula, então
tem uma linha nula;
AB
tem uma coluna nula;
(c) qualquer matriz quadrada com uma linha ou uma coluna nula não é
invertível.
2.14 Mostre que uma matriz A é invertível se, e somente se, At
é invertível.
Conclua que as operações de inversão e de transposição comutam; isto é,
(At )−1 = (A−1 )t ,
quando
A
é invertível.
2.15 Sejam a = (a1 , . . . , an ), b = (b1 , . . . , bn ) ∈ Rn .
Denamos


a1 0 · · · 0


 0 a2 · · · 0 


Diag(a) =  . . .
.  .
.
.
..
.
. 
. .
0 0 · · · an
Mostre que:
c ∈ R;
(a)
Diag(a) + cDiag(b) = Diag(a + cb)
(b)
Diag(a) · Diag(b) = Diag(b) · Diag(a) = Diag(a1 b1 , . . . , an bn );
(c)
m
Diag(a)m = Diag(am
1 , . . . , an ),
(d)
Em que condições a matriz
onde
Diag(a)
onde
m ∈ N \ {0};
é invertível e qual é a sua inversa?
Este problema mostra que somar, multiplicar, calcular potências e inverter matrizes diagonais é muito simples.
2.16
Supondo que as matrizes
A, B
e
C
são matrizes quadradas de mesma
ordem e invertíveis, resolva as seguintes equações matriciais nas quais
incógnita:
X
é a
28
(a)
CAPÍTULO 1.
CX + 2B = 3B ;
2.17 Dada uma matriz
a) se
ad − bc 6= 0,
então
CAX t = C ; (c) ABX = C .
"
#
a b
A=
, mostre que :
c d
(b)
A
é invertível e
A−1
b) se
ad − bc = 0,
então
SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
A
"
#
d −b
1
=
;
ad − bc −c
a
não é invertível.
Bibliograa
[1] H. P. Bueno,
Álgebra Linear, um segundo curso ,
Coleção Textos Univer-
sitários, SBM, 2006.
[2] P. Halmos,
Teoria Ingênua dos Conjuntos ,
Editora Ciência Moderna,
2001.
[3] A. Hefez e M. L. T. Villela,
Códigos Corretores de Erros ,
Coleção Mate-
mática e Aplicações, IMPA, 2008.
[4] A. Hefez e M. L. T. Villela,
Números Complexos e Polinômios ,
Coleção
PROFMAT, SBM, 2012.
[5] V. J. Katz,
A History of Mathematics - an Introduction ,
HarperCollins
College Publishers, 1993.
[6] S. Lang,
Introduction to Linear Algebra , 2nd edition, Undergraduate Texts
in Mathematics, Springer, 1986.
[7] E.L. Lima,
Álgebra Linear , 3a
edição, Coleção Matemática Universitária,
IMPA, 1998.
[8] E.L. Lima,
Geometria Analítica e Álgebra Linear ,
Matemática Universitária, IMPA, 2010.
300
2
a
edição, Coleção

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