o fenômeno da prisionização em agentes penitenciários

Transcrição

o fenômeno da prisionização em agentes penitenciários
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
O FENÔMENO DA PRISIONIZAÇÃO EM
AGENTES PENITENCIÁRIOS DO ESTADO DO PARANÁ
CURITIBA
2007
JOSÉ ROBERTO RODRIGUES SANTOS
O FENÔMENO DA PRISIONIZAÇÃO EM
AGENTES PENITENCIÁRIOS DO ESTADO DO PARANÁ
Monografia apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de
Especialista em Gestão Penitenciária no
Curso de Pós-Graduação em Gestão
Penitenciária: Problemas e Desafios,
Setor de Ciências Humanas, Letras e
Artes, Departamento de Ciências Sociais,
Universidade Federal do Paraná.
Orientadora: Prof. Drª Cristina Maria
Kurowski
Co-orientador: Prof. Dr. Márcio Sérgio
Batista Silveira de Oliveira
CURITIBA
2007
ii
Dedicatória
A todos os Agentes Penitenciários do
Estado do Paraná, categoria profissional
da qual muito me orgulho em fazer parte.
iii
Agradecimentos
A Deus;
À minha esposa, Alze, e filhos, Juliana e
Guilherme;
À minha orientadora e amiga, profª drª
Cristina Maria Kurowski, pela dedicação e
sabedoria partilhada;
Ao meu co-orientador prof. dr. Márcio
Sérgio Batista Silveira de Oliveira, pelos
preciosos apontamentos;
Ao prof. dr. Luiz Antonio Bogo Chies
(Universidade Católica de Pelotas/RS),
pela colaboração no envio de materiais de
apoio;
Aos colegas do curso pela partilha do
saber e informações repassadas;
Ao Departamento Penitenciário Nacional e
Departamento Penitenciário do Estado do
Paraná, idealizadores do Curso;
A todos os Agentes Penitenciários que
participaram da pesquisa.
iv
“... heróis são pessoas que fizeram o que
era necessário fazer, enfrentando as
conseqüências.”
William Shakespeare
v
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS................................................................................................. vii
LISTA DE SIGLAS.................................................................................................... viii
RESUMO.................................................................................................................... ix
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................... 01
2 REVISÃO DE LITERATURA................................................................................. 04
2.1 PROBLEMATIZAÇÃO E FUNDAMENTOS TEÓRICOS..................................... 04
2.2 A PRISÃO COMO INSTITUIÇÃO TOTAL........................................................... 05
2.3 A ORGANIZAÇÃO E SUA RESPONSABILIDADE PARA COM O AGENTE
PENITENCIÁRIO................................................................................................ 08
2.3.1 Organização e Objetivo..................................................................................... 08
2.3.2 Organização e Comprometimento................................................................... 10
2.3.2.1 O Agente Penitenciário e sua formação........................................................ 10
2.3.2.2 O Agente Penitenciário e seu bem-estar físico-emocional........................... 14
2.3.2.3 O Agente Penitenciário e sua identidade profissional................................... 17
2.3.3 O Fenômeno da Prisionização......................................................................... 20
2.3.3.1 A prisionização quanto ao preso................................................................... 20
2.3.3.2 A prisionização quanto ao Agente Penitenciário........................................... 22
3 O DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO E AS UNIDADES PENAIS.................... 26
3.1 DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ..................... 26
3.1.1 História............................................................................................................. 26
3.1.2 Competências.................................................................................................. 27
3.2 PRISÃO PROVISÓRIA DE CURITIBA – PPC.................................................... 27
3.2.1 Características..................................................................................................27
3.2.2 História............................................................................................................. 28
3.2.3 Competências.................................................................................................. 29
3.2.4 Estrutura Física................................................................................................ 29
3.3 COLÔNIA PENAL AGRÍCOLA – CPA................................................................ 30
3.3.1 Características................................................................................................. 30
3.3.2 História............................................................................................................. 30
3.3.3 Competências.................................................................................................. 32
3.3.4 Estrutura Física................................................................................................ 32
3.4 PENITENCIÁRIA CENTRAL DO ESTADO – PCE............................................. 32
3.4.1 Características................................................................................................. 32
3.4.2 História............................................................................................................. 33
3.4.3 Competências.................................................................................................. 33
3.4.4 Estrutura Física ............................................................................................... 33
3.5 COMPLEXO MÉDICO-PENAL – CMP ............................................................... 34
3.5.1 Características................................................................................................. 34
3.5.2 História............................................................................................................. 34
3.5.3 Competências.................................................................................................. 36
3.5.4 Estrutura Física................................................................................................ 37
3.5.4.1 Espaço de segurança feminino..................................................................... 37
3.5.4.2 Espaço de segurança masculino.................................................................. 37
3.6 PENITENCIÁRIA FEMININA DO PARANÁ – PFP.......................................... 38
3.6.1 Características................................................................................................. 38
3.6.2 História............................................................................................................. 38
vi
3.6.3 Competências.................................................................................................. 39
3.6.4 Estrutura Física................................................................................................ 39
3.7 CENTRO DE OBSERVAÇÃO CRIMINOLÓGICA E TRIAGEM – COT.............. 40
3.7.1 Características................................................................................................. 40
3.7.2 História............................................................................................................. 40
3.7.3 Competências.................................................................................................. 41
3.7.4 Estrutura Física................................................................................................ 42
3.8 PENITENCIÁRIA FEMININA DE REGIME SEMI-ABERTO DO PARANÁ –
PFA..................................................................................................................... 42
3.8.1 Características................................................................................................. 42
3.8.2 História............................................................................................................. 43
3.8.3 Competências.................................................................................................. 43
3.8.4 Estrutura Física................................................................................................ 44
3.9 PATRONATO PENITENCIÁRIO DO PARANÁ – PATR..................................... 44
3.9.1 Características................................................................................................. 44
3.9.2 História............................................................................................................. 45
3.9.3 Objetivos do Programa..................................................................................... 46
3.10 PENITENCIÁRIA ESTADUAL DE PIRAQUARA – PEP................... 46
3.10.1 Características............................................................................................... 46
3.10.2 História........................................................................................................... 46
3.10.3 Segurança..................................................................................................... 47
3.10.4 Estrutura Física.............................................................................................. 47
3.11 CASA DE CUSTÓDIA DE CURITIBA – CCC................................................... 48
3.11.1 Características............................................................................................... 48
3.11.2 História........................................................................................................... 48
3.11.3 Segurança...................................................................................................... 48
3.11.4 Estrutura Física.............................................................................................. 48
4 APRESENTAÇÃO DA PESQUISA E ASPECTOS DO MÉTODO........................ 50
4.1 O UNIVERSO PESQUISADO............................................................................. 50
4.2 FORMULÁRIO DA PESQUISA........................................................................... 52
4.3 APRESENTAÇÃO DOS DADOS........................................................................ 54
4.3.1 Tabelas 1 a 5.................................................................................................... 54
4.3.2 Tabelas 6 a 11.................................................................................................. 60
4.3.3 Tabelas 12 e 13................................................................................................ 67
5 DISCUSSÃO DOS DADOS E ANÁLISES COMPLEMENTARES........................ 70
5.1 O FATOR DA RIGOROSIDADE......................................................................... 70
5.2 A MODIFICAÇÃO DE HÁBITOS......................................................................... 74
5.3 AS ALTERAÇÕES EMOCIONAIS E DE COMPORTAMENTOS........................ 80
5.4 SÍNTESE DOS PRINCIPAIS RESULTADOS..................................................... 85
6 CONCLUSÃO........................................................................................................ 87
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 90
ANEXO....................................................................................................................... 94
vii
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
DISCIPLINA.......................................................................................... 55
TABELA 2 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
DISCIPLINA EM RELAÇÃO ÀS PESSOAS COM AS QUAIS
CONVIVE.............................................................................................. 56
TABELA 3 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
EXIGÊNCIA EM RELAÇÃO AO HORÁRIO DE SUAS ATIVIDADES
E/OU DE OUTROS............................................................................... 57
TABELA 4 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU NA
MUDANÇA DO VESTUÁRIO................................................................ 58
TABELA 5 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU NA
MUDANÇA DO LINGUAJAR, ADOTANDO GÍRIAS INSTITUCIONAL. 59
TABELA 6 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
INSEGURANÇA.................................................................................... 61
TABELA 7 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
ANSIEDADE.......................................................................................... 62
TABELA 8 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
NERVOSISMO...................................................................................... 63
TABELA 9 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
AGRESSIVIDADE................................................................................. 64
TABELA 10 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
ESTRESSE......................................................................................... 65
TABELA 11 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
DEPRESSÃO...................................................................................... 66
TABELA 12 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
SENSAÇÃO DE ESTAR SENDO VIGIADO........................................ 67
TABELA 13 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
PERCEPÇÃO DE MUDANÇAS GERAIS DE COMPORTAMENTO... 68
viii
LISTA DE SIGLAS
CCC
CCL
CDRP
CLT
CMP
CNPCP
COCT
COOSIPE
COT
CPA
DEPE
DEPEN
ESPEN
LIBRAS
INAP
OIT
OMS
PATR
PCE
PEF
PEL
PEM
PEP
PEPG
PFA
PFP
PIC
PIG
PSC
PSS
QPPE
RATP
SEAP
SEJU
URSAF
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
–
Casa de Custódia de Curitiba
Casa de Custódia de Londrina
Centro de Detenção e Ressocialização de Piraquara
Consolidação das Leis de Trabalho
Complexo Médico-Penal
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
Centro de Observação Criminológica e Triagem
Coordenação do Sistema Penitenciário
Centro de Observação Criminológica e Triagem
Colônia Penal Agrícola
Departamento de Estabelecimentos Penais do Estado
Departamento Penitenciário do Estado do Paraná
Escola Penitenciária do Paraná
Língua Brasileira de Sinais
Instituto Nacional de Administração Prisional
Organização Internacional do Trabalho
Organização Mundial da Saúde
Patronato Penitenciário do Paraná
Penitenciária Central do Estado
Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu
Penitenciária Estadual de Londrina
Penitenciária Estadual de Maringá
Penitenciária Estadual de Piraquara
Penitenciária Estadual de Ponta Grossa
Penitenciária Feminina de Regime Semi-Aberto do Paraná
Penitenciária Feminina do Paraná
Penitenciária Industrial de Cascavel
Penitenciária Industrial de Guarapuava
Prestação de Serviços à Comunidade
Processo Simplificado de Seleção
Quadro Próprio do Poder Executivo
Regime de Adequação ao Tratamento Penal
Secretaria de Estado da Administração e da Previdência
Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania
Unidade de Regime Semi-Aberto Feminino
ix
RESUMO
Este trabalho apresenta uma pesquisa efetuada com Agentes Penitenciários de
Unidades Penais do Estado do Paraná com objetivo de identificar o fenômeno
sociológico denominado prisionização enquanto um processo diferenciado de
socialização, o qual acomete, além do grupo recluso em penitenciárias, também o
grupo de funcionários, em especial e mais intensamente o grupo profissional de
Agentes Penitenciários, podendo haver, por parte destes, a absorção em maior ou
menor grau dos hábitos, costumes e da cultura geral existente na prisão. Utiliza-se
no método, pesquisa descritiva com uso de questionário contendo perguntas
fechadas que propôs identificar – com base nos fatores universais da prisionização
descritos por Thompson – se após a entrada dos Agentes Penitenciários no Sistema
Penitenciário, os mesmos observaram – com preponderância quando estão fora do
ambiente prisional – graus diferentes de rigor e exigências em relação a seus
comportamentos, e sua exigência também em relação a terceiros em fatores como
disciplina e horário de atividades; alteração em seus hábitos como vestir e falar; e
sentimentos seus mais potencializados em relação à insegurança, ansiedade,
nervosismo, agressividade, estresse e depressão. Observa-se em todas as variáveis
resultados significativos que apontam para a exigência em se constituir diretrizes
através de mais outros trabalhos científicos que tragam contribuições para demais
análises referentes ao fenômeno da prisionização e suas implicações sociais, físicas
e emocionais aos Agentes Penitenciários, assim como políticas públicas específicas
que auxiliem dentro das esferas formativas e do bem-estar dos Agentes
Penitenciários.
Palavras-Chave: Prisionização;
Instituições Totais.
Agente
x
Penitenciário;
Penitenciária;
Prisão;
INTRODUÇÃO
O presente trabalho busca identificar através de pesquisa empírico-científica o
processo de socialização diferenciado, específico e atípico que acomete o grupo
profissional de Agentes Penitenciários1, caracterizado como prisionização. Este
fenômeno – a prisionização2 – apresenta o construto como sendo um processo de
socialização no qual o indivíduo tende em menor ou maior grau, absorver hábitos,
costumes e a cultura geral existente na prisão.
A prisionização enquanto fenômeno foi identificada em meados de 1940, por
Donald Clemmer, num estudo em prisões americanas, porém caracterizou-se a
afetação somente ao grupo recluso. No Brasil são raros os temas – e no Paraná não
se identificou estudos relacionados ao Agente Penitenciário – que abordam o
fenômeno estudando o grupo de funcionários, e mais específico, os Agentes
Penitenciários, em sua suscetibilidade ao processo de socialização diferenciado,
dado o intenso contato com o ambiente prisional e com o grupo de presos3.
Por
esse
viés,
o
trabalho
pretende
contribuir
em
apontar
mais
especificamente a prisionização enquanto fenômeno que atinge de forma direta e
intensa o grupo de Agentes Penitenciários, no intuito de se perceber que os fatores
relacionados à prisionização e suas conseqüências podem ser tão perversos quanto
se comparadas ao grupo recluso. Nesse sentido, o desvelar dessas conseqüências
podem sensibilizar para a necessidade de estudos de complexidades e
abrangências diferenciadas, assim como de políticas institucionais específicas no
âmbito da formação, treinamento e assistência terapêutica a serem dispensadas ao
grupo profissional de Agentes Penitenciários.
Parte-se do termo e conceito de instituições totais, da obra de GOFFMAN
(2005), para situar e relacionar as características da prisão, inserida neste conceito.
As instituições totais tendem a sublimar os indivíduos que lá vivem, seja na condição
de encarcerados ou na condição de funcionários, ressalvadas a intensidade e
1
Neste trabalho não se faz distinção quanto ao gênero.
Este é o termo que será utilizado neste trabalho, porém existem outros termos como
“prisionalização” e “prisonização”, todos com o mesmo conceito, utilizados em artigos e trabalhos e
que estarão referidos na forma adotada pelos respectivos autores quando em referência direta.
3
O termo “preso” (s) neste trabalho será adotado sem distinção de gênero, ou seja, estará se
referindo tanto ao (s) “preso” (s) como à (s) “presa” (s).
2
2
diferentes graus que interferem na socialização dos mesmos. Não há uma
possibilidade de desligamento pleno por parte dos funcionários que trabalham
nessas instituições, e, no caso das penitenciárias, em razão do ambiente atípico,
que é penoso, perigoso e insalubre, com indivíduos dos mais variados caracteres e
personalidades, os Agentes Penitenciários têm contato com diversas formas de
experiências, tendentes a serem pouco positivas. O ambiente é inóspito e
complicado, com constantes fatos que implicam na intervenção direta do Agente
Penitenciário, não podendo este se desvencilhar das experiências.
As penitenciárias são locais às vezes misteriosos para a sociedade, e isso
implica também no que tange ao trabalho e realidade dos Agentes Penitenciários, os
quais desempenham um importante papel para a busca da reintegração social e a
reformulação de princípios éticos do preso. Para isso, exige-se do Agente
Penitenciário uma competência técnica múltipla por ele tratar com pessoas que
trazem consigo, de sua vivência na sociedade civil, experiências que geralmente
negativam sua perspectiva de reinserção social.
A estrutura do trabalho inicia com a revisão literária existente, constando a
apresentação anterior do problema para identificação da hipótese paralela a
postulados, sendo: a penitenciária enquanto instituições totais, o objetivo
organizacional e o seu comprometimento com o Agente Penitenciário, e a
abordagem do fenômeno da prisionização. Em relação à organização (instituição
penitenciária
e
órgãos
responsáveis)
demonstram-se
as
concepções
e
direcionamentos, justificados pela literatura, do comprometimento organizacional
para com o indivíduo no intuito de se promover a compreensão e envolvimento deste
na aplicação do objetivo institucional; a responsabilidade e atitudes, também pela
organização, para com a formação do Agente Penitenciário em suas expectativas e
necessidades, assim como para a sua identidade profissional; e após, a concepção
e características relacionadas ao fenômeno da prisionização.
Segue-se no capítulo seguinte a apresentação do Departamento Penitenciário
do Estado do Paraná e das Unidades Penais com suas respectivas histórias,
competências e características físicas, locais esses onde prestam serviços os
Agentes Penitenciários que participaram da pesquisa.
O capítulo posterior apresenta a pesquisa com os dados obtidos, além das
discussões preliminares, esclarecendo aspectos do método como a aplicação do
3
questionário e o universo da pesquisa. As tabelas foram subdivididas em blocos que
apresentam variáveis abrangendo dados relativos à avaliação dos entrevistados
relacionados a graus de rigorosidade de disciplina, horários, assim como alteração
de hábitos; dados relativos à alteração de fatores físicos e emocionais do Agente
Penitenciário; avaliação de graus de alteração na sensação de vigilância e a
percepção de mudanças gerais de comportamentos. As variáveis são todas
relacionadas à posterior entrada do Agente Penitenciário no Sistema Penitenciário,
onde desempenha suas funções.
Após a apresentação da pesquisa e aspectos do método, inicia-se a
discussão dos dados obtidos, assim como análises complementares no intuito de
esclarecer e estabelecer resultados comparativos aos aspectos específicos do papel
e trabalho do Agente Penitenciário que estão vinculados ao ambiente prisional.
Ambiente este que apresenta características predominantes e contributivas no
processo de prisionização, assim como uma instituição que objetivamente tende à
dessocialização do indivíduo se comparados aos padrões sociais aceitos pela
sociedade geral. Ao final do capítulo, apresenta-se uma síntese dos principais
resultados.
Apresentados os capítulos antecessores, seguem-se as conclusões induzidas
pelos resultados dos aspectos do método e da pesquisa, com as limitações e
contribuições da pesquisa e as recomendações para estudos futuros relacionados
ao tema.
4
2 REVISÃO DE LITERATURA
Este capítulo apresenta o problema proposto para a pesquisa do trabalho e
seus postulados, a fundamentação teórica pela revisão de literatura onde se
abordam a prisão como instituição total, a organização penitenciária pelo seu
objetivo e também pelo seu compromisso com o Agente Penitenciário, no que tange
à sua formação, assistência terapêutica e sua identidade profissional. Na última
seção do capítulo é apresentado o fenômeno da prisionização.
2.1 PROBLEMATIZAÇÃO E FUNDAMENTOS TEÓRICOS
A proposta do trabalho se foca em proceder à identificação e posterior análise
quanto à inserção dos Agentes Penitenciários num sistema social diferenciado – o
dos estabelecimentos penais –, dadas as características típicas da instituição
penitenciária, e como ocorre a afetação desse sistema no profissional.
Quanto à fundamentação da teoria para a pesquisa, tratou-se de abordar a
prisionização através da produção científica existente, compreendendo o processo
de prisionização que acomete o grupo social de internados na instituição
penitenciária, donde se constitui esse processo como uma socialização diferenciada
que acomete seus indivíduos, os quais adotam em maior ou menor grau o modo de
pensar, os costumes, os hábitos, a cultura geral da penitenciária.
Em se conhecendo a comprovação desse processo diferenciado de
socialização no indivíduo preso da instituição penitenciária, segue-se o mesmo viés
convergindo a reflexão sobre um processo semelhante que acomete o grupo social
de Agentes Penitenciários, pelo fato desses profissionais exercerem intensamente
suas atribuições no interior das Unidades Penais e estarem em contato direto com
os reclusos.
Para tanto, parte-se da concepção de prisão como instituição total, termo
criado por GOFFMAN (2005), e por isso, com características marcantes e
fundamentais nos processos de socialização que podem acometer o Agente
Penitenciário, por proposta de direcionamento objetivo do trabalho.
Assim sendo, apresenta-se o seguinte problema:
5
Os Agentes Penitenciários, profissionais que exercem suas funções dentro de
ambientes prisionais, em contato direto com presos, e tendo em vista as
características enquanto organização das penitenciárias como instituições totais,
adotam um processo diferenciado de socialização (cultura, hábitos, costumes e
comportamentos), característico desse ambiente?
Paralela à fundamentação teórica, consigna-se as seguintes proposições:
a) as penitenciárias enquanto instituições totais e sua influência objetiva na
atribuição do trabalho do Agente Penitenciário;
b) a organização quanto ao seu objetivo institucional e seu comprometimento e
contribuições (Estado e seus Órgãos) para com a formação, o bem-estar
físico-emocional e a identidade do Agente Penitenciário;
c) o fenômeno da prisionização e seus efeitos – que pelas características da
instituição tendem a provocar um processo diferenciado de socialização aos
grupos a ela vinculados, em especial, o grupo de Agentes Penitenciários.
2.2 A PRISÃO COMO INSTITUIÇÃO TOTAL
O principal referencial para a abordagem da concepção de instituição total
será alcançado pela literatura de GOFFMAN (2005) haja vista o termo ser por ele
introduzido em relação a determinados tipos de instituições por suas características
de fechamento. Vale ressaltar que “esse conceito [instituições totais] tem sido
intensamente criticado por alguns estudiosos e em alguns casos tem sido
praticamente descartado” (MORAES, 2005, p. 216). MORAES (2005) afirma que
alguns autores que abordam o tema sobre Agentes Penitenciários nem sequer citam
o conceito de instituições totais. MORAES (2005) infere que os autores em questão
firmam seus fundamentos se referindo às mudanças sofridas pela prisão, mais
especificamente com a entrada da sociedade na prisão, assim remoldando
características de “detotalização”. Engaja-se na justificativa de MORAES (2005) que
para padrões franceses a detotalização pode ter causado efeito e mudanças
significativas, porém não é o que notadamente vemos na realidade americana e,
aqui em questão, precisamente, a brasileira, dados os novos modelos arquitetônicos
que, em alguns casos, foram importados dos Estados Unidos, com uma maior
rigidez de encarceramento e normas de regime disciplinar austeras, embora estas
6
questões - aspectos de encarceramento e regime disciplinar – não sejam aqui
objetos de elucubrações. Mesmo porque, GOFFMAN (2005) justifica que seus
elementos de análise devem levar em conta as características comuns e o método
de tipos ideais das instituições totais para que ele possa esclarecer diferenças
significativas.
As características de uma instituição total aplicam-se em algumas dimensões
que interferem no aspecto físico (da própria instituição), social e emocional
(relacionados ao indivíduo, encarcerado ou não). Para GOFFMAN (2005, p. 17) a
prisão é um tipo de instituição total que “é organizada para proteger a comunidade
contra perigos intencionais, e o bem-estar das pessoas assim isoladas não constitui
o problema imediato”. O aspecto de fechamento da prisão que estabelece a barreira
física – muros, grades, portões, dispositivos diversos de segurança – é uma de suas
características e, do ponto de vista do isolamento social, necessária. Porém, outro
aspecto é o do controle. Esse controle, essencialmente das necessidades humanas
por parte da organização de essência burocrática interfere de forma totalizante no
grupo social de reclusos de toda penitenciária, isso porque se constitui como fato
básico da instituição.
A quem cabe o total controle pelo permanente e eficaz encarceramento do
indivíduo preso é ao Agente Penitenciário, que é tido, muitas vezes, como a principal
barreira física para o alcance das necessidades e objetivos do preso. O grupo
recluso sempre terá, segundo suas concepções, bem estabelecidos seus valores e
suas necessidades, e por isso, segundo GOFFMAN (2005, p. 19), embora a
lealdade não seja algo tão presente entre os encarcerados, “a expectativa de
formação dessa lealdade constitui parte da cultura do internado e está subjacente à
hostilidade com relação aos que rompem a solidariedade dos internados”.
A prisão representa a perda, pelo despojamento e não importância, do “eu
civil” do preso, onde ali não mais há indicações ou valoração para seu status social.
Por mais complexo e estranho que possa parecer, partindo da igualdade de direitos
que devem ser dispensados a cada indivíduo encarcerado, na prisão, por parte dos
dirigentes e demais servidores, não podem prevalecer como critérios primeiros de
atendimento ou direitos, as múltiplas condições ou posições sociais que existiam aos
diversos indivíduos antes de estarem reclusos. Na prisão todos devem ter as
mesmas condições de tratamento e acesso aos direitos estabelecidos – assistência
7
material, educação, religião, alimento, saúde e outros –, e se por um lado esse é um
notável critério de justiça e igualdade, ao recluso isso é fator que tende a ele se ver
como mais um, ou seja, alguém que não é visto como indivíduo dotado de suas
idiossincrasias, de vontades e liberdade como tinha antes de seu encarceramento.
Grande parte do impacto que o ambiente carcerário causa pelas suas
características físicas retorna como reação por parte do recluso numa ojeriza à
sociedade que para ele é responsável pelo seu encarceramento. Já dentro da
penitenciária, o tratamento dispensado a cada preso não pode ser diferenciado,
negligenciado a um em prol do outro, evidenciando diferenciações para o acesso às
necessidades humanas que deve ser igual para todos. Assim, todo controle
estabelecido por normas rígidas incluídos pelo tratamento e pela constante vigilância
para se manter a ordem e a disciplina é atribuída ao Agente Penitenciário. E é daí
que se reconhece por parte do preso o Agente Penitenciário como a extensão da
sociedade e do seu encarceramento, em grande maioria das vezes numa visão
negativa, pois o preso não quer estar na prisão. E mesmo que, como aponta
GOFFMAN (2005, p. 18), “o fato é que um é feito para o outro”, referindo-se ao
grupo de internados e o grupo que os dirige, o grupo recluso sempre tenderá a ver
no Agente Penitenciário o impeditivo de suas intenções e ações, a barreira que
estabelece todos os seus limites.
Cabe ressaltar que a descrição básica da atribuição do Agente Penitenciário,
consoante ao seu Perfil Profissiográfico1 (2004), é: “Efetuar a segurança da Unidade
Penal em que atua, mantendo a disciplina. Vigiar, fiscalizar, inspecionar, revistar e
acompanhar os presos ou internados, zelando pela ordem e segurança deles, bem
como da Unidade Penal.” Isso posto, dadas as características da instituição total
“prisão” que tem seu caráter “simbolizado pela barreira à relação social com o
mundo externo” (GOFFMAN, 2005, p. 16) e proibições múltiplas, muitas vezes
descaracterizando o indivíduo preso quanto à sua identidade, seu status civil, a
incumbência para se estabelecer uma sociabilidade aceitável dentro do objetivo
organizacional descrito na atribuição referida acima é prerrogativa do Agente
Penitenciário.
1
Conforme Resolução 3027, de 23 de janeiro de 2004, da Secretaria de Estado da Administração e
da Previdência, a qual define o Perfil Profissiográfico do Cargo/Função do Agente Penitenciário do
Estado do Paraná.
8
Nesse sentido, pode-se apontar que as características de fechamento,
barreira social, controle absoluto das necessidades do encarcerado, é convergida
num elemento real pela ação atributiva ao Agente Penitenciário, que deve efetuar a
segurança da Unidade Penal, além de vigiar, fiscalizar e acompanhar o preso em
todos os lugares e momentos, garantindo sua segurança.
2.3 A ORGANIZAÇÃO E SUA RESPONSABILIDADE PARA COM O AGENTE
PENITENCIÁRIO
Esta secção apresenta o que o Estado – segundo prevê a Lei –, estabelece
como objetivo central para com a pessoa presa, o envolvimento do Agente
Penitenciário nesse objetivo, assim como as demais responsabilidades deste.
Apresenta também comentários e definições sobre política de responsabilidade para
com o servidor no que tange ao suporte de sua formação, assistência terapêutica e
à identidade do Agente Penitenciário.
2.3.1 Organização e Objetivo
Para o Estado, seu compromisso em relação ao preso está descrito no artigo
1º da Lei de Execução Penal2, a qual prevê: “A execução penal tem por objetivo
efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições
para a harmônica integração social do condenado e do internado.”
Pode-se dizer que esse é um “objetivo conflitivo” dadas as diversas realidades
e condições adversas que são vividas pelo preso: basicamente a ele são aplicadas
as “disposições de sentença ou decisão criminal”, restando grandes e inúmeras
lacunas nas “condições para a harmônica integração social”. GOFFMAN (2005)
afirma que a principal ocupação numa prisão será sempre a segurança, pois a
ordem e o impedimento de fugas estão em primeiro plano. Aos presos cabe:
... aceitar, ainda que contra a vontade, o fato de estarem presos, pois as prisões
(pelo menos as do tipo “moderno”) supostamente dão um meio para que o preso
pague à sociedade, cultive o respeito pela lei, admita seus pecados, aprenda um
ofício legítimo, e, em alguns casos, receba uma psicoterapia necessária. No entanto,
2
Lei Federal nº 7210 de 11 de julho de 1984.
9
em termos de ação, a administração da prisão em grande parte se ocupa do
problema de “segurança”, isto é, procura impedir a desordem e a fuga. Um aspecto
importante da definição que a administração da prisão dá ao caráter dos internados é
que, se tiverem a menor oportunidade, tentarão fugir à sua pena legal. (GOFFMAN,
2005, p. 157)
Assim, se o fator principal para com a manutenção de um ambiente ordeiro e
pacífico se dá essencialmente pela segurança do estabelecimento penal, é ao
Agente Penitenciário que será delegada essa tarefa. Quando se estabelece o
objetivo conflitivo em assegurar que o preso permaneça recluso e que sejam
proporcionadas condições para sua harmônica integração social, isto nem sempre
esteve formal e sistematicamente refletido nas atribuições imputadas ao Agente
Penitenciário, pois somente em 2004 foi definida atribuição específica quanto à
integração do preso através da Resolução 3027, da Secretaria de Estado da
Administração e da Previdência que definiu o Perfil Profissiográfico (2004) do
cargo/função da categoria profissional dos Agentes Penitenciários, onde se prevê a
estes: “Participar das propostas para definir a individualização da pena e tratamento
penal, objetivando a adaptação do preso e a reinserção social.” Porém, todas as
outras atribuições estão relacionadas à segurança do estabelecimento penal e do
preso, e ainda, não se apontam meios efetivos formais e sistematizados para que a
participação dessas propostas sejam instrumentalizadas.
COYLE (2002) afirma que a administração penitenciária deve declarar
expressamente seu propósito com toda clareza, o que vale dizer, fundamentar
sistematicamente seu objetivo enquanto organização, justamente porque tal objetivo
não é claro ou conhecido da sociedade e muitas vezes, dos próprios servidores.
Deve ainda, formular suas bases a respeito do funcionamento das prisões para o
conhecimento dessas mesmas prisões, além de interagir dinamicamente com grupos
da sociedade civil.
Consoante ao exposto por Coyle, GOFFMAN (2005, p. 149) aponta que “uma
‘organização formal instrumental’ pode ser definida como um sistema de atividades
intencionalmente coordenadas e destinadas a provocar alguns objetivos explícitos e
globais”.
GUIMARÃES (2007, p. 77) estabelece que o funcionário deve ser
corretamente informado sobre sua verdadeira missão; as funções que terá que
desempenhar devem ser claras a fim de que ele saiba exatamente seu papel dentro
10
da organização. Porém, numa pesquisa feita pela Escola Penitenciária do Paraná no
ano de 20053, denominada Inventário (2005) aplicado somente aos Agentes
Penitenciários, num universo de 663 entrevistados, para a pergunta sobre o
conhecimento que possuíam “sobre Estatuto Penitenciário, Regimentos e estrutura
do DEPEN4”, 287 (ou 43,28%) assinalaram as alternativas “Ruim” e “Regular”.
Importante ressaltar que esses instrumentos formais são de máxima importância
para o desempenho legal (administrativo, civil e criminal) da função do Agente
Penitenciário, pois são eles que os resguardarão de responsabilidades e atribuições
relativas à função. É através desses instrumentos constituídos que a ação do Agente
Penitenciário também é ou não legitimada.
No caminho da compreensão de que é vital a organização apresentar seus
objetivos de forma clara e transparente, ETZIONI5 , citado por CHIES et al. (2001, p.
31) afirma que os objetivos são os demarcadores referenciais “para a atividade da
organização”, e que esses mesmos objetivos é que justificarão as atividades e a
própria existência da organização.
2.3.2 Organização e Comprometimento
Esta subseção aborda sobre como se estabelece o papel da Organização
Penitenciária relacionado ao seu compromisso e comprometimento para com o
Agente Penitenciário em sua formação, assistência terapêutica – bem-estar físico e
emocional – e identidade profissional.
2.3.2.1 O Agente Penitenciário e sua formação
Primeiramente, é importante informar que o Agente Penitenciário é um
funcionário público da administração estadual direta do Governo do Paraná e
pertencente ao Quadro Próprio do Poder Executivo – QPPE –, admitido através de
concurso público e que, dentro de suas atribuições, sua tarefa básica é manter a
3
Mesmo ano da pesquisa efetuada para este trabalho.
Departamento Penitenciário do Estado do Paraná. Órgão vinculado à Secretaria de Estado da
Justiça e da Cidadania, o DEPEN é uma de suas coordenadorias, responsável pela supervisão das
Unidades Penais do Paraná e pela Escola Penitenciária do Paraná.
5
ETZIONI, Amitai. Organizações Modernas, 8ª ed., São Paulo: Pioneira, 1989, p. 7.
4
11
segurança no estabelecimento penal em que atua, zelando pela ordem e segurança
dos presos6. Atualmente sua carga horária é de 40 horas semanais em regime de
escala de 12X367 (doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso,
independente de finais de semana ou feriados, com duas folgas mensais).
O treinamento a que são submetidos os Agentes Penitenciários antes de
ingressarem no Sistema Penal passou a ocorrer a partir de 19908, e até 1994,
penúltimo concurso público para admissão desses profissionais, esse treinamento
não era parte do processo de seleção, ou seja, o Agente Penitenciário o
freqüentava, mas já estava contratado para a função. A partir de 2004, no edital nº 1,
da Secretaria de Estado da Administração e Previdência – o qual instituiu abertura
de concurso público –, regulamentou-se o Curso de Formação ministrado através da
Escola Penitenciária do Paraná passando o mesmo a estar condicionado à obtenção
de aproveitamento para a admissão do Agente Penitenciário em sua função. O
período do curso compreende um total de 120 horas.
A formação profissional contínua, na concepção da administração moderna, é
o meio mais eficaz para se atingir objetivos, treinar para novos e constantes
desafios, atualizar o indivíduo sobre as competências da empresa, além da maior
produção e resultado em suas funções.
As Regras Mínimas para o Tratamento de Presos no Brasil9 ao se referir
sobre a admissão de funcionários para exercerem suas funções em espaço
penitenciário, incluindo, obviamente o Agente Penitenciário, prevê em seu artigo nº
49 que: “A seleção do pessoal administrativo, técnico, de vigilância e custódia10,
atenderá à vocação, à preparação profissional e à formação profissional dos
candidatos através de escolas penitenciárias."
Esse artigo, previsto nas “Regras Mínimas”, é datado de 1994, sendo que os
Agentes Penitenciários aprovados em concurso público anterior a 1990 não
6
Conforme Resolução 3027, de 23 de janeiro de 2004, da Secretaria de Estado da Administração e
da Previdência.
7
À época da pesquisa deste trabalho (2005) a escala de trabalho era de 24X48 (vinte e quatro horas
de trabalho por quarenta e oito de descanso, independente de finais de semana ou feriados, sem
direito a folga mensal).
8
Antes deste período os Agentes Penitenciários ingressavam no Sistema Penitenciário do Paraná e
desenvolviam suas atividades sem nenhum treinamento prévio formal.
9
Resolução nº 14 de 11 de novembro de 1994, do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária – CNPCP, elaborador das “Regras”. O CNPCP é o primeiro órgão da execução penal e
é vinculado ao Ministério da Justiça.
10
Grifo do autor.
12
passaram por nenhuma escola ou treinamento para conhecer e aprender sobre os
trabalhos que desempenhariam. Apenas em 199211, aconteceu o primeiro “Curso de
Reciclagem para Agentes Penitenciários” onde todos esses profissionais puderam
passar por uma atualização de 40 horas. Após esse período, o próximo curso –
Curso de Atualização para Agentes Penitenciários12 – ocorreu em 200513, ou seja,
13 anos após o anterior, e com duração de 16 horas.
No mesmo ano desse curso, no Inventário (2005) elaborado pela Escola
Penitenciária do Paraná e aplicado somente a Agentes Penitenciários, consta a
pergunta sobre situações que ele (o Agente Penitenciário) observa em seu local de
trabalho donde o item “desqualificação” foi o mais assinalado (265 vezes num total
de 1113 respostas, para um universo de 697 pesquisados que responderam à
pergunta). Numa outra pergunta sobre a participação do Agente Penitenciário em
algum curso da Escola Penitenciária nos últimos 3 anos, dos 677 que responderam
à questão, 350 (52%) afirmaram que não haviam participado de qualquer curso
oferecido pela Escola.
COYLE (2002) afirma ser a garantia de padrões dos servidores o rigoroso e
criterioso processo de seleção desse pessoal, onde o perfil e qualidades técnicas
específicas devem ser ajustados à operacionalidade do trabalho, por este ser de
natureza especial. Porém, por mais que a importância do recrutamento deva ser
criteriosa, “ainda persiste uma falta de entendimento do propósito para o qual os
servidores estão sendo capacitados e não existe uma compreensão das principais
características que formam a base do bom trabalho penitenciário” (COYLE, 2002, p.
32).
É nesse sentido que se faz requisito contínuo a capacitação adequada dos
servidores. Deve haver oportunidades de desenvolvimento contínuo a todos os
servidores, independente do tempo de serviço ou idade, pois as técnicas de trabalho
mudam, como todo processo dinâmico. Destarte, a capacitação inicial, sua
atualização permanente, assim como capacitações específicas para servidores mais
graduados e servidores especializados, devem ser a sustentação para o
desenvolvimento profissional. É deste modo que as habilidades técnicas específicas
11
Informação obtida através da Escola Penitenciária do Paraná.
Idem.
13
Período no qual ocorreu a aplicação do questionário, instrumento deste trabalho.
12
13
podem ser treinadas e aperfeiçoadas, assim como a sustentação de conhecimentos,
indispensáveis à manutenção e bem-estar da administração e de seus servidores.
DEMO (2005, p. 22) quando da apresentação de sua revisão de literatura
versando sobre os valores pessoais relata que “estes trabalhos levam a crer que
possivelmente
a
investigação
dos
valores
pessoais
contribuiria
para
a
implementação de políticas de gestão de pessoas mais adequadas aos ensejos dos
colaboradores14 e, possivelmente, mais eficazes no alcance dos objetivos
organizacionais”.
A autora também apresenta os estudos nacionais sobre Políticas de Gestão
de Pessoas em pesquisa empírica de GROHMANN e SCHERER15, citados por
DEMO (2005, p. 64-65), onde estes apontam fatores motivacionais e condicionantes
tendo como instrumentos essencialmente motivacionais: “... condições para que os
empregados
consigam
a
realização;
reconhecimento
simbólico
pelo
bom
desempenho; possibilidade de promoção de trabalho; responsabilidade por suas
atividades; liberdade de escolha; oportunidade de crescimento pessoal; incentivo à
resolução de problemas; pleno uso das habilidades; possibilidade de utilizar a
criatividade pessoal.”
O diferencial do trabalho no segmento penitenciário é que, pelas
características da essência do que é público, este não inclui programas de
recompensa pecuniária por produção, merecimento, típicos da iniciativa privada, e
no quadro de carreiras, o Agente Penitenciário pertence ao Quadro Próprio do Poder
Executivo, portanto, não tem seu “quadro próprio” nem há legislação que dispõe de
ascensão em funções superiores hierarquicamente. As ascensões poderão vir
segundo um ou outro critério (grau de escolaridade, tempo de serviço), mas sem
nexos integrados que possa convergir para o funcionário vislumbrar uma posição
hierárquica superior ao seu cargo16, que será sempre de Agente Penitenciário, e
que, no caso de ocupar uma função diferente, isso pode durar um tempo totalmente
imprevisível (muitas vezes, bastante curto). Assim, o foco na gestão de pessoas no
14
O termo aqui pode ser adaptado, indistintamente, para “servidor público”.
GROHMA, M. Z.; SCHERER, F. L. O que mais motiva na visão das organizações: dinheiro ou
elogio? Anais do XXV ENANPAD, Campinas, 2001.
16
No momento deste escrito – maio/07 – apenas dois Agentes Penitenciários ocupam cargo de
direção entre as 21 Unidades Penais do Paraná, mais a Escola Penitenciária do Paraná, Fundo
Penitenciário do Paraná e o próprio Departamento Penitenciário do Estado do Paraná. E nos últimos
20 anos esta dinâmica não foi diferente.
15
14
que tange ao Agente Penitenciário devem ser os valores pessoais deste grupo em
consonância aos objetivos organizacionais, para que se possa investir na formação
continuada e objetiva do servidor e o mesmo tenha condições de buscar a
motivação e o aparelhamento de uma missão proposta pela instituição. Ressalta-se,
porém, que a organização penitenciária ainda não dispõe de uma missão formal
declarada.
GUIMARÃES (2007) apresenta em sua obra uma metáfora em relação aos
problemas que fazem com que as organizações adoeçam, utilizando a enfermidade
do “câncer”, ou diretamente de seu termo o “câncer organizacional”.
Doença
conhecida e devastadora, de pouco sucesso de cura se não for diagnosticado
precocemente, é ainda um “mal para a humanidade”. A linha analítica do autor é
justamente pelo isolamento do problema, do câncer, investigação das causas e
impedimento de sua evolução com medicamentos e medidas profiláticas para a sua
cura. Por isso diz que “o segredo é analisar o corpo, pensar e ver o que pode ser
feito para melhorar as relações com o todo. Entender como ele interage com o
ambiente externo e quais são as suas ações contra e a favor desse meio”
(GUIMARÃES, 2007, p. 32).
Na seqüência de análise, afirma que quase ninguém faz uma pausa para
proceder ao exame do tecido organizacional para identificar como vai o
funcionamento deste, sendo que grande parte só reagirá quando algum tipo de
problema aparece. O problema aqui está justamente no diagnóstico geralmente
tardio, o que será doloroso, físico e emocionalmente, para o “paciente". Assim,
GUIMARÃES (2007, p. 69) é enfático em inferir que “o treinamento é uma das
melhores medidas profiláticas que a empresa pode realizar”.
2.3.2.2 O Agente Penitenciário e seu bem-estar físico-emocional
Paralelo ao investimento através da formação e treinamento mencionados na
subseção anterior, a moderna política de gestão de pessoas em sua literatura
organizacional tem como meta principal a promoção de maior bem-estar e realização
pessoal e profissional de seus colaboradores.
Para que o comprometimento organizacional – um dos aspectos psicossociais
do indivíduo – possa ser angariado e principalmente conservado, é preciso que nas
15
relações de trabalho, na cultura da organização ou de seus valores comuns, o
colaborador possa ser concebido como um bem, um valor humano. Nesse sentido a
automotivação desse colaborador é imprescindível.
ROCHA (2003, p. 27) fez uma análise sobre a motivação do Agente
Penitenciário do Paraná para com o seu trabalho, e em pesquisa aplicada através de
questionário obteve o índice de 72% para a resposta de que os entrevistados estão
com pouca ou nenhuma motivação para o trabalho. Ainda, 64% afirmaram
trabalharem por necessidade ou/e por não terem outra opção de serviço.
Em 2005, no Inventário (2005) efetuado pela Escola Penitenciária do Paraná
– o mesmo referido na subseção anterior – ao se perguntar sobre situações
observadas no local de trabalho, a segunda alternativa mais assinalada foi “baixa
auto-estima”, com 263 anotações das 1113 respostas, para um universo de 697
pesquisados que responderam à pergunta. Outras respostas desse mesmo
Inventário (2005) apontaram que 31% (206 das 668 respostas) disseram que são
regulares ou ruins as oportunidades que têm (os Agentes Penitenciários) em expor
suas idéias em seu local de trabalho. Ainda 42% (279 das 665 respostas) afirmaram
que as condições de local de trabalho são regulares ou ruins.
NEDEL (2004, p. 233) afirma que para a motivação ser preservada e
intensificada a questão se foca na importância a ser dada às Escolas Penitenciárias,
às diretrizes adotadas nas administrações pelos gestores dos estabelecimentos
penais, assim como o efetivo empenho nas políticas públicas instituídas pelos
governos tanto locais como estaduais desses estabelecimentos.
MORAES (2005) também apontou a problemática dos Agentes Penitenciários
para com as atribulações e problemas enfrentados na profissão. Afirma que ocorre
uma inércia nesses profissionais “à medida que vêem a impossibilidade de conseguir
outra atividade próxima da sua formação escolar ou com níveis salariais
semelhantes ao que ganham” (MORAES, 2005, p. 213), e que isso é um elemento
dificultador para que saia do sistema penitenciário, assim, tornam-se “frustrados e
desesperançados, o que por sua vez os torna ainda mais vulneráveis ao estresse e
outras doenças físicas e mentais que acometem os agentes penitenciários”
(MORAES 2005, p. 213).
Quando da entrevista com Agentes Penitenciários do Paraná, MORAES
(2005) em pergunta a um deles sobre “que tipo de assistência o Estado dá pra
16
vocês”, a resposta do Agente Penitenciário foi: “Nenhuma. Efetiva nenhuma. (...)
Agora nós temos um drama mais sério que é psicólogo, e essa assistência não é
dada nenhuma” (MORAES, 2005, p. 249). Outro diz ainda: “Não tem nenhum
acompanhamento médico, psicológico nenhum, o que é viável, né?” (MORAES,
2005, p. 250).
DEMO (2005) ao se referir sobre o segredo para promover a saúde e o bemestar no trabalho, afirma que “é a atenção e a compreensão das gerências em
relação aos problemas, ansiedades e necessidades de seus subordinados. Essa
compreensão abrange o que o superior pode fazer para ajudar seus colaboradores.
Como, por exemplo, a identificação da necessidade de uma ajuda profissional aos
empregados...” (DEMO, 2005, p. 102).
DEMO (2005) alerta para a urgência em haver nas organizações profissionais
uma “responsabilidade compartilhada” que auxilie na promoção do bem-estar dos
funcionários, haja vista os crescentes problemas que se relacionam com a saúde no
trabalho, como alcoolismo, estresse e burnout e demais doenças emocionais. A
autora revela que estudos têm mostrado que a competência organizacional mais
relevante, e também mais importante, é a gestão de pessoas, vindo antes da gestão
de negócios e da gestão da inovação em produtos e serviços.
Seguindo a linha de preocupação que as organizações devem primar,
GUIMARÃES (2007) afirma que a absorção da carga de estresse dirigida à pessoa
quando intensa terá conseqüências drásticas. Num primeiro momento, essa pessoa
leva suas angústias e frustrações do trabalho para casa, donde as pessoas de sua
família irão retribuir suas atitudes ruins. Em seguida, a agressividade remeterá para
o interior da empresa, porém, se isso não ocorrer, “o estresse fica represado,
acarretando desequilíbrios à saúde, como gripe, alergia, gastrite e úlcera”
(GUIMARÃES, 2007, p. 94).
O autor revela que os “fatos que afetam o equilíbrio emocional do funcionário
devem ser conhecidos por quem o dirige”, pois se isso não ocorre poderá haver “um
mau julgamento de ambas as partes” (GUIMARÃES, 2007, p. 94).
Em 1997, numa pesquisa realizada pelo professor Cary Cooper, da University
of Manchester's Institute of Science and Technology, entre 104 profissões, apontouse as 20 mais estressantes, ficando em primeiro lugar a de prison officer, ou oficial
17
de prisão – no Paraná o termo é equivalente a Agente Penitenciário –, à frente, por
exemplo, de profissões como policial, bombeiro, paramédico e militar.
Avanços sobre pesquisas e descobertas surgem freqüentemente, como uma
recente pesquisa feita com ratos, mas, segundo os cientistas, aplicável aos
humanos, a qual indica que o estresse mata células do cérebro e causa depressão.
Ainda, segundo a Organização Internacional do Trabalho – OIT – e Organização
Mundial da Saúde – OMS –, “as perspectivas são sombrias para as duas próximas
décadas, pois, estas serão as décadas do 'mal estar na globalização’", onde
predominará depressões, angústias e outros danos psíquicos, relacionados com as
novas políticas de gestão na organização de trabalho e que estão vinculadas às
políticas neoliberais.
2.3.2.3 O Agente Penitenciário e sua identidade profissional
A categoria de profissionais representada pelos Agentes Penitenciários traz
ainda a carga de preconceitos tanto em relação à sociedade, pelos equívocos e
desconhecimento das reais atribuições desses servidores, como pelo próprio Agente
Penitenciário – muito embora, deve-se aqui relativizar a categoria.
GOFFMAN (1988) designa o termo “estigma” para retratar uma espécie de
barreira social entre pessoas e um processo de exclusão. O autor conceitua o termo
como “um tipo especial de relação entre atributo e estereótipo (...) em parte porque
há importantes atributos que em quase toda a nossa sociedade levam ao descrédito”
(GOFFMAN, 1988, p. 13).
Formas de discriminação e preconceito ao Agente Penitenciário estão ligadas
à sua profissão que é, muitas vezes, entendida simplesmente como “um indivíduo
que cuida de presos”, não se estabelecendo relação da importância e complexidade
do real trabalho que executa esse profissional. GOFFMAN (1988, p. 38-39) classifica
certo tipo de pessoa como “informada” donde este termo se aplica pelo fato da
informação advir do trabalho que desempenha, sendo o local desse trabalho onde
se cuida não só das necessidades daqueles que têm um estigma particular, mas
também das ações empreendidas pela sociedade em relação a eles.
GOFFMAN (1988, p. 41-42) ainda estabelece um segundo tipo de pessoa
informada que é aquela que justamente pela relação que mantém com um indivíduo
18
estigmatizado através da estrutura social acaba por ser reconhecido, considerado
como a mesma pessoa a qual mantém a relação, ou seja, a sociedade considera
“ambos como uma pessoa só”. O autor refere também sobre “carreira moral” onde
ocorrem os ajustamentos pessoais. Uma das fases do processo de socialização é
quando a pessoa estigmatizada “aprende e incorpora o ponto de vista dos normais”
(GOFFMAN, 1988, p. 41). Essa interação forma “modelos” estabelecendo bases e
“fornece meios de distinguir as carreiras morais disponíveis para os estigmatizados”
(GOFFMAN, 1988, p. 41-42).
CENTURIÃO (1990) em uma das representações recorrentes que se
estabelece com a figura do Agente Penitenciário para significativa parte da
sociedade que habitualmente relativiza esse profissional descreve: “Os agentes
penitenciários (...) apóiam uns aos outros para cobrir não somente infrações de
pequena importância, como, inclusive casos mais graves de violação da lei, como
suborno, tortura e homicídios. Encobrem também fugas facilitadas de presos,
mesmo que isto custe a vida de algum de seus colegas acobertando ou participando
de atos delituosos” (CENTURIÃO, 1990, p. 51).
COYLE (2002, p. 22) afirma que “de um modo geral, os servidores
penitenciários são considerados inferiores a outras pessoas que trabalham na área
da justiça penal, tais como os policiais.” Ele adverte que a sociedade não vê os
servidores com estima pública semelhante à de outros profissionais, e que o governo
deve pensar na instituição de um programa de educação da população através de
veículos de comunicação a fim de estimular o interesse da sociedade sobre a
importância do papel que os servidores têm ao salvaguardarem a sociedade civil.
COYLE (2002) estabelece em sua análise que a organização deve esclarecer seus
objetivos à sociedade e aos servidores de forma clara e efetiva através, se possível,
de documento oficial. E que da mesma forma isso seja feito em relação ao papel
profissional e social desempenhado pelo Agente Penitenciário, a fim de se
desmistificar e relevar o preconceito social de seu trabalho.
NEDEL (2004) em pergunta efetuada a um grupo de Agentes Penitenciários
do Presídio Regional de Pelotas (RS), sobre a “motivação de reconhecimento da
função” observou pelo entendimento da categoria sobre essa questão que:
19
... decresce na medida em que o verbo empregado na função se afasta de um verbo
de conotação mais hierárquico, ou seja, na medida em que a função perde o caráter
mais disciplinador, fiscalizatório e gerenciador, assim compreendido pelo verbo
utilizado ao estabelecer a função, o Agente Penitenciário não reconhece mais (em
número significativo) função como sendo sua. (NEDEL, 2004, p. 230)
Essa constatação vai de encontro à concepção de parcela dos Agentes
Penitenciários que têm internalizado dentre as atribuições de sua função
basicamente as que se referem às questões de ordem e disciplina. E no Paraná isso
é compreensível à medida que o Perfil Profissiográfico (2004) do Agente
Penitenciário (como já referido no item 2.3.1) prevê ordenações diversas quanto às
“tarefas associadas à função”, estabelecendo-as em sua grande maioria tarefas (à
exceção de uma, aliada ao papel do “tratamento penal” que objetiva a “reinserção
social”) de caráter justamente “disciplinador, fiscalizatório e gerenciador”.
MORAES (2005: 160-165) na parte de sua obra que descreve o “processo de
construção de estereótipos e representações”, aponta a expressão de um Agente
Penitenciário (do Paraná) ao entrevistador a respeito do que pensa sobre como são
vistos pela sociedade: “o sr. sabe, pra sociedade, qual a grande diferença entre nós
e os presos?, ‘respondendo em seguida’: o colete” (MORAES, 2005, p. 163).
São apontados nessa parte do trabalho de MORAES (2005), apoiado na
literatura, que o estereótipo dos “carcereiros, guardas” é de indivíduos “corruptos,
maus e perversos” além de aspecto desagradável. Existe ainda a transferência e
imputação ao Agente Penitenciário sobre a falência e ineficácia do processo de
recuperação dos presos, dada a forma truculenta, agressiva, com que os tratariam.
Adiante, um Agente Penitenciário faz o seguinte comentário ao entrevistador:
“(...) eu fui discriminado desta forma, para o serviço que eu iria executar, ter que lidar
com a pior classe, que é discriminada socialmente, que são os presos,
encarcerados, e o salário que eu ia ganhar, eu fui discriminado por isso e pela minha
família” (MORAES, 2005, p. 214).
MORAES (2005, p. 266), em suas conclusões, descreve: “No entanto, a
certeza dos que acreditam nas boas intenções da prisão, baseada em suas próprias
boas intenções, é de tal ordem que comumente são capazes de creditar todo o
fracasso da promessa penitenciária a um grupo de trabalhadores [Agentes
penitenciários] que, para eles, parece personificar a crueldade.”
20
Pode-se relacionar que há um conflito quanto ao estigma existente em
relação ao Agente Penitenciário, pois a sociedade imprime suas marcas em acordo
com suas concepções e critérios. Por outro lado, essa “impressão” é transferida ao
profissional que, destarte, em vez de refutar poderá ratificá-la, internalizando e
potencializando esse estigma. Isto é observado, quando verificamos as falas dos
Agentes Penitenciários descritas acima.
Porém, mesmo que não haja a reprodução por parte do Agente Penitenciário
das concepções de parcela da sociedade quanto ao seu estigma e preconceitos,
quando a marca está impressa de maneira comum – porque é vista e aceita desta
forma na sociedade –, não restam muitas alternativas senão o compromisso efetivo
da classe e da organização (Estado) em apresentar, justificar e assegurar uma
identidade diferente da que outrora seja concebida, como proposto por COYLE
(2002).
2.3.3 O fenômeno da Prisionização
Nesta subseção é apresentado o fenômeno da prisionização quanto ao seu
construto e afetações relacionadas ao grupo de presos e ao grupo profissional de
Agentes Penitenciários.
2.3.3.1 A prisionização quanto ao preso
Ao se utilizar o termo “prisionização” inicialmente é necessário se observar
que o mesmo foi instituído por Donald Clemmer, na década de 1940, a partir de seus
estudos em penitenciárias americanas sobre um diferente e específico processo de
socialização que acometia os presos ali reclusos.
GARCIA-TORO (1982) em seu estudo afirma que a vida dentro de um
estabelecimento carcerário acarreta no preso efeitos que estão ligados a um dos
maiores problemas da instituição, uma vez que esses presos para poderem subsistir
em acordo com essas circunstâncias típicas da vida social terão de se acomodar aos
diversos tipos de relacionamento e convívio, que são peculiares às instituições
fechadas. A prisionização, ao final, pode ser entendida como um fenômeno que
fornece meios de acomodação para a subsistência prisional, mas também tem suas
21
características pelos efeitos irreversíveis que causa à personalidade do indivíduo.
Estes efeitos são devidos em virtude da ruptura que há entre a vida civil e
institucional, “evidenciando inconformismo com a experiência e decorrente estado de
alienação e apatia com tudo o que se relaciona a ele como indivíduo” (GARCIATORO, 1982, p. 66-67).
GOFFMAN (1988) aponta que o modelo de socialização apresentado por
aqueles que são socializados à parte da considerada normal, ou seja, que não a da
instituição, é a segunda maneira de ser, a qual deve ser aprendida, pois é esta que
aqueles ao seu redor consideram real e válida. GOFFMAN (1988, p. 47) também
refere a respeito das “oscilações sobre a natureza do próprio grupo e sobre a
natureza dos normais”, onde a carreira moral, a concepção do ego, nessa linha de
análise, trafega pelos dois lados – grupo e natureza dos normais – onde ocorre a
mescla de experiências vividas, sem que preponderantemente haja a predominância
absoluta de uma sobre a outra. Porém, quando a vivência é dentro do grupo de
socializados pelo ambiente carcerário, ou seja, dentro da própria penitenciária, pela
própria retro-alimentação, a acomodação aos ditames de ambientação tornam-se
potencializados. A verdade é que não restam alternativas ao indivíduo recémchegado à penitenciária que não aceitar as regras de vivência e sobrevivência da
instituição, aplicada pela comunidade ali existente, e já acomodadas pelos
processos de socialização.
CHIES et al. (2001, p. 111) afirma que os processos especiais de socialização
têm a tendência de se apresentarem como dessocializadores em relação aos
padrões socializadores fora da instituição, e que a prisionização tem como resultado
uma nociva dessocialização, pois seus direcionamentos são alheios e negados em
relação aos valores sociais superiores.
THOMPSON (2002, p. 52), sobre a incondicional força e predominância do
sistema social carcerário, conclui que “o sistema social de um estabelecimento de
segurança média ou máxima funciona, basicamente, de acordo com os critérios
fornecidos pelos próprios condenados.”
Embora possa haver resistência (e muitas vezes há) quanto ao tipo de
sociedade que foi inserido e as formas de vida, das relações sociais predominantes,
o fato é de que o preso:
22
Dentro de algum tempo, compreende que ou se adapta à sociedade na qual foi
lançado, assumindo um dos papéis sociais disponíveis, ou sofrerá padecimentos
insuportáveis. Prisonizar-se será, normalmente, a solução. Prisonização corresponde
à assimilação dos padrões vigorantes na penitenciária, estabelecidos,
precipuamente, pelos internos mais endurecidos, mais persistentes e menos
propensos a melhoras. Adaptar-se à cadeia, destarte, significa, em regra, adquirir as
qualificações e atitudes do criminoso habitual. (THOMPSON, 2002, p. 95-96)
Assim, não restam opções ao preso senão se inserir e aceitar as influências e
o tipo de socialização imposto pelas regras da prisão, sendo que a prisionização se
dará em um maior ou menor grau quanto à sua assimilação por parte do recluso, em
relação aos hábitos, costumes, cultura geral do ambiente. THOMPSOM (2002, p. 24)
afirma que nenhum preso escapa a determinadas influências, que ele chama de
“fatores universais de prisionização”, a saber: “aceitação de um papel inferior;
acumulação de fatos concernentes à organização da prisão; o desenvolvimento de
novos hábitos, no comer, vestir, trabalhar, dormir; adoção do linguajar local; o
reconhecimento de que nada é devido ao meio ambiente, quanto à satisfação de
necessidades; eventual desejo de arrumar uma ‘boa ocupação’”.
2.3.3.2 A prisionização quanto ao Agente Penitenciário
Observado
o
fenômeno
da
prisionização,
sua
intensidade
e
até
inexorabilidade com que afeta ao indivíduo recluso pelas formas de socialização
peculiares da instituição carcerária, assim como seus mecanismos de adaptação,
relaciona-se a seguir esse fenômeno com o Agente Penitenciário pela sua função.
CENTURIÃO (1990, p. 47) afirma que o Agente Penitenciário, “está em íntimo
contato com os detentos”, e que tendo em vista as características de sua função,
mesmo que quisesse, não poderia se afastar desses enquanto está em seu período
de plantão. O Agente Penitenciário é todo tempo “solicitado e procurado” pelos
presos e mesmo durante a noite deve estar em vigilância permanente a fim de
detectar qualquer alteração que possa acontecer, ou seja, o trabalho é contínuo e
intenso, daí a ocorrência de uma “saturação de contatos”.
THOMPSON (2002) observa que a população carcerária – presos e demais
funcionários – convivem em uma área restrita e comprimida, onde a intimidade pode
ser percebida. Assim, essas partes observam e analisam uma as outras. Também
23
pelo fato de estarem tão próximos e vinculados, estabelece-se uma interação entre
presos e Agentes Penitenciários, pessoal técnico e administrativo, donde advém
uma “influência recíproca”. Segundo THOMPSON (2002) os Agentes Penitenciários
também são afetados pelo fenômeno da prisionização, pois abandonam os padrões
de suas vidas fora da prisão para adotar os valores que estão estabelecidos nesta.
Há uma ingerência e pressão dos detentos em relação aos Agentes
Penitenciários justamente pelo fato daqueles procurarem convencer estes que sua
conduta de cerceamento pela aplicação de regras de comportamento é ilegítima,
pois aos presos, as regras válidas são as estabelecidas por eles, em seu ambiente
prisional. Assim, estabelece-se uma tentativa de convergências de uma e outra
parte, onde cada uma procura situar a outra num comportamento aceitável pelos
padrões que julga ideal, correto. THOMPSON (2002, p. 49) lembra “que o guarda
não pode fugir à interação com o preso e que, por outro lado, este pode não ser uma
pessoa moral, mas consegue tornar-se altamente moralista, quando lhe convém.”
Sobre a incondicional força e predominância do sistema social carcerário,
THOMPSON (2002, p. 52) conclui que “o sistema social de um estabelecimento de
segurança média ou máxima funciona, basicamente, de acordo com os critérios
fornecidos pelos próprios condenados.”
Isso, segundo o próprio THOMPSON (2002, p. 52), “reforça a assertiva de
que o processo de prisionização não se restringe, tão-somente, à massa carcerária”,
pois que pela força e impregnação do sistema social existente, intenso e
predominante, acaba por arrebatar o Agente Penitenciário na cultura prisional
diversificada.
Quando se faz referência à “saturação de contatos”, “intenso contato” do
Agente Penitenciário no tratamento com o preso, THOMPSON (2002, p. 41) resume
esse contato pelo trabalho do profissional de segurança:
... tratá-lo como indivíduo único, mas contá-lo como um objeto no momento dos
“conferes”; respeitá-lo como um ser dotado de prerrogativas inalienáveis, dentre as
quais ressalta o direito à intimidade, porém revistar-lhe, freqüentemente, o cubículo,
remexer-lhe os objetos pessoais e vistoriar as roupas que está vestindo,
inspecionando-o, até mesmo, nas partes mais íntimas do corpo; captar-lhe a
confiança e trancá-lo a chave numa cela.
24
GOFFMAN (2005, p. 24) afirma que as instituições totais, e é o caso da
prisão, “criam e mantêm um tipo específico de tensão entre o mundo doméstico e o
mundo institucional, e usam essa tensão persistente como uma força estratégica no
controle de homens.” Não é possível o distanciamento efetivo entre o Agente
Penitenciário e o preso, pois, por mais que o profissional deseje se manter afastado
do indivíduo recluso e de seus “materiais humanos”, a tendência é que “estes podem
tornar-se objetos de sentimentos de camaradagem e até afeição” (GOFFMAN, 2005,
p. 75).
Nas penitenciárias isso é latente, o que não poderia ser de outra maneira.
Embora estejam os demais profissionais no espaço de trabalho, a convivência por
parte dos Agentes Penitenciários com os presos e internados é muito intensa,
próxima. Assim, por mais que exista um distanciamento técnico e constante
monitoramento para que sentimentos de piedade, de comoção ou mescla de
envolvimentos diversos não interfiram e desviem das atribuições e das intervenções
necessárias ao Agente Penitenciário, há uma mimetização nas relações sociais do
preso e do profissional. O que pode ser mais alarmante é quando o profissional,
neste caso, o Agente Penitenciário, não consegue estabelecer um limite consciente
da linha que delimita os espaços a serem ocupados e neles se envolver, formando
assim possíveis vínculos sociais de caráter comprometedor a ele e às rígidas
normas institucionais. É tênue a linha que separa o preso do Agente Penitenciário
quando não há marcadores conscientes e eficientes sobre o papel de controle
exercido pelo profissional. Papel que deve ser antagônico à posição de preso do
outro indivíduo, o qual está na “mão contrária”, ou ao menos transversal, do percurso
que é delimitado na instituição.
KNUDTEN17, citado por THOMPSON (2002, p. 7) quando descreve
incompatibilidades entre função punitiva e atividade terapêutica aponta que nesta se
“institucionaliza relações primárias entre os internos e os funcionários, num esforço
para assegurar ou facilitar uma transferência de valores destes para aqueles.”
Por fim, MORAES (2005, p. 221) apresenta, pelo diálogo de um Agente
Penitenciário, a força com que a prisionização enquanto um processo diferenciado
de socialização tende a ser adotada: “É muito mais fácil mil e quinhentos [presos] se
17
KNUDTEM, Richard D. Crime in a Complex Society. Dorsey Press, Illinois: 1970, p. 612.
25
colocar pra 30 [número de Agentes Penitenciários em serviço] do que o contrário. É
por isso que a gente começa a falar como preso e vira uma extensão do preso.”
A transversalidade do labor cotidiano impõe um tipo de conduta e estratégia
de trabalho. Ser diferente entre “iguais” (referindo-se a presos) causa estranhamento
e repúdio, e, como afirma MORAES (2005, p. 221) “a essas pressões encontram-se
também submetidos os agentes penitenciários que precisam muito rapidamente
aprender a dinâmica da prisão.” É por esta forma que os Agentes Penitenciários
acabam por sofrer uma “assimilação de comportamento” tanto dentro como fora da
prisão, advindo da prisionização como processo diferenciado de socialização.
26
3 O DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO E AS UNIDADES PENAIS
Neste capítulo serão apresentados o Departamento Penitenciário do Estado
do Paraná e as Unidades Penais, focando principalmente suas características,
história, competências e estrutura física. Serão aqui apresentados somente os locais
de trabalho em que estavam lotados os Agentes Penitenciários participantes da
pesquisa.
3.1 DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ
O Departamento Penitenciário do Estado do Paraná é um órgão vinculado à
Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania – SEJU, sendo uma das
coordenadorias que integram esta Secretaria. É responsável pela supervisão,
coordenação e inspeção dos estabelecimentos penais, Escola Penitenciária do
Paraná e patronatos.
3.1.1 História
Desde o surgimento das Cadeias Públicas e da primeira penitenciária, em
1909, a Secretaria de Estado dos Negócios do Interior, Justiça e Instrução Pública e
a Chefatura de Polícia eram os órgãos responsáveis pelas Cadeias e Penitenciária
do Estado.
Essa subordinação direta à Chefatura de Polícia durou até a criação do
Departamento de Estabelecimentos Penais do Estado – DEPE através da Lei nº
1767 de 17 de fevereiro de 1954, sendo designado como diretor-geral o sr. José
Muniz de Figueiredo, que desde 1951 estava à frente das obras de conclusão da
Penitenciária Central do Estado, e acumulando a direção da Penitenciária do Estado
(Ahú) e da Prisão de Mulheres da Rua Barão do Rio Branco.
A partir de 9 de julho de 1962, através do Decreto nº 4615, é criada a
Secretaria da Segurança Pública, passando o DEPE a subordinar-se à mesma, e a
responsabilizar-se pelas penitenciárias, prisões, escolas de recuperação, colônias,
sanatórios e manicômios penais. Somente em 1971, em virtude do disposto no artigo
27
150 da Emenda Constitucional 3 de 29/05/1971 e do Decreto nº 698 de 19/08/1971,
o DEPE volta à jurisdição da Secretaria do Interior e Justiça.
A denominação DEPE durou até 1975, quando passa a chamar-se
Coordenação do Sistema Penitenciário – COOSIPE, que seria novamente
modificada em 1987, dentro da nova regulamentação da Secretaria de Estado da
Justiça, passando a denominar-se Departamento Penitenciário – DEPEN.
A atual denominação ocorreu através do Decreto nº 609, de 23 de julho de
1991, pelo qual o secretário de Estado da Justiça e da Cidadania, Edson Luiz Vidal
Pinto, visando reorganizar a Secretaria e seus órgãos, aprova o novo Regimento
Interno do DEPEN, passando a chamar-se Departamento Penitenciário do Estado do
Paraná – DEPEN.
3.1.2 Competências
- Supervisionar, coordenar e inspecionar os estabelecimentos penais, Escola
Penitenciária e patronatos;
- fazer cumprir as disposições da Lei de Execução Penal, responsabilizando-se
pela custódia, segurança e assistência tanto dos presos quanto dos egressos do
Sistema Penitenciário;
- oferecer assistência jurídica, psicológica, social, médica, odontológica, religiosa e
material, além de desenvolver a reintegração social por meio da educação
formal.
3.2 PRISÃO PROVISÓRIA DE CURITIBA – PPC
3.2.1 Características
Estabelecimento penal de segurança máxima, que era destinado a presos
provisórios, do sexo masculino.
28
Localizado em Curitiba/PR, foi inaugurado em 5 de janeiro de 1909 e
funcionou até 31 de agosto de 2006, quando da sua extinção oficial1.
3.2.2 História
Foi a primeira penitenciária do Estado do Paraná e sua origem data de 5 de
janeiro de 1909, não se tendo notícias de inauguração formal, sendo denominada
inicialmente como Penitenciária do Estado.
Sua capacidade inicial era de 52 celas individuais, e foram transferidos da
cadeia para a penitenciária 55 presos, sendo 49 homens e 6 mulheres homicidas. O
regime adotado era o de Auburn2 que previa: "se observará o encarceramento
celular durante a noite, e o trabalho em comum durante o dia, sob regimento
rigoroso do silêncio".
A transferência dos presos da cadeia pública do centro da cidade somente foi
possível devido ao acordo firmado em 28 de abril de 1905 entre o secretário de
Estado dos Negócios, Obras Públicas e Colonização, Francisco G. Beltrão, e o
provedor e responsável da Santa Casa de Misericórdia, monsenhor Alberto José
Gonçalves. O governo prontificou-se a construir no bairro do Prado (hoje Prado
Velho), novas instalações para o Hospício Nossa Senhora da Luz, localizado no
bairro do Ahú, Curitiba/PR, que seria adaptado como penitenciária.
Em seu primeiro ano de funcionamento já existiam os seguintes setores de
trabalho: cozinha, horta, alfaiataria, sapataria, tipografia e marcenaria. O trabalho
diurno e o estudo noturno eram obrigatórios, até que o preso soubesse ler, escrever
e contar. As disciplinas ministradas eram: noções de Gramática, Aritmética,
Geografia e História do Brasil.
Em 26 de fevereiro de 1925, é inaugurada a Casa de Detenção, localizada na
Rua Visconde de Guarapuava, Curitiba/PR, para abrigar presos não-condenados. O
prédio era dotado de quinze prisões com luz direta e todas as outras condições de
higiene aconselhadas pela ciência da época. Foram recolhidos ali 22 indivíduos; uns
1
Portanto, estava em atividade na época em que os Agentes Penitenciários passaram pelo Curso de
Atualização na Escola Penitenciária oportunidade na qual responderam ao questionário aplicado
entre os meses de setembro e dezembro/2005.
2
O “modelo de Auburn” foi inaugurado na penitenciária de Auburn, Nova York, em 1816, daí a
denominação.
29
submetidos a processo, outros já pronunciados, aguardavam os respectivos
julgamentos. Em 1928, a Penitenciária do Estado (Ahú) passou a contar com mais
40 celas, perfazendo um total de 92, porém, sua lotação já era de 122 presos, sendo
impossível manter o regime imposto.
Através do Decreto nº 253, de 07/02/1934, o interventor Manoel Ribas,
visando reduzir despesas, simplificar e reorganizar o Estado, determina a instalação
da Casa de Detenção numa parte que lhe fosse destinada no edifício da
Penitenciária do Estado, situada no bairro Ahú.
Somente com o Decreto nº 2043, de 09/02/1945, o ainda interventor do
Estado, Manoel Ribas, aprovava, juntamente com o capitão Fernando Flores, da
Chefatura de Polícia, o Regulamento das Prisões Provisórias, passando a
denominar-se Penitenciária Central e Prisão Provisória do Estado.
Com lotação média mensal de 790 presos, 80% mantinham-se ocupados
com atividades laborativas, num total de 54 canteiros de trabalho, tais como:
manutenção, limpeza, artesanato, olericultura, marcenaria, serralheria, produção de
bolas e outros.
3.2.3 Competências
- A segurança e a custódia temporária de presos do sexo masculino, a espera de
decisão judicial e que se encontravam recolhidos no estabelecimento, em regime
fechado;
- a segurança e a custódia daqueles que estavam sujeitos à efetivação de
sentença de pena e medida de segurança detentivas;
- a promoção da reintegração social dos presos e o zelo pelo seu bem-estar
através da profissionalização, educação, prestação de assistência jurídica,
psicológica, social, médica, odontológica, religiosa e material;
- a prestação de assistência aos familiares dos presos.
3.2.4 Estrutura Física
- Área do terreno: 67.764,36 m²
30
- Área construída: 14.000 m²
- Capacidade: 750 presos
- Lotação em 27/06/063: 784 presos
- 6 galerias
- 154 cubículos/alojamentos
- 10 solitárias
- 3 refeitórios
- 1 pátio
- 24 quartos para visita íntima
- 1 consultório médico
- 2 consultórios odontológicos
- 1 enfermaria
- 6 salas para atendimento técnico
- 1 lavanderia
- 1 biblioteca
- 2 cozinhas
- 36 canteiros de trabalho
3.3 COLÔNIA PENAL AGRÍCOLA DO PARANÁ – CPA
3.3.1 Características
Estabelecimento Penal de segurança média, destinado a presos do sexo
masculino, em cumprimento da pena, gozando do benefício do regime semi-aberto.
3.3.2 História
Realizou-se no Rio de Janeiro, em 26 de outubro de 1940 a “Conferência
Penitenciária Brasileira” que culminou com a criação das Penitenciárias Agrícolas.
Participou do evento Fredericindo Marés de Souza, diretor da Penitenciária do
3
Esta foi a última data da contagem antes do início da transferência dos presos para o Centro de
Detenção e Ressocialização – CDRP, em Piraquara/PR, que iniciou em 28/06/06 e finalizou em
11/07/06.
31
Estado (Ahú), que daria seqüência aos estudos de implantação do regime semiaberto no Paraná.
Manoel Ribas, interventor federal no Estado, através do Decreto nº 10.754 de
11/12/1940, desapropriou 11.494.435 m² (onze milhões quatrocentos e noventa e
quatro mil, quatrocentos e trinta e cinco metros quadrados) de terras do imóvel
denominado "Fazenda Palmeira", no município de Piraquara/PR, ao preço de
120:000$000 (cento e vinte contos de réis). Declarou a urgência da desapropriação,
para efeito da imediata emissão de posse do mesmo imóvel.
A partir de 18 de junho de 1941, em caráter experimental com trinta presos,
passava a funcionar a segunda unidade penal do Estado do Paraná com a
denominação de Penitenciária Agrícola do Estado, destinada a delinqüentes
primários, do sexo masculino, cujos antecedentes, comportamento carcerário,
personalidade e circunstâncias do crime, após haverem cumprido parte da pena na
Penitenciária, dariam seqüência ao cumprimento da mesma em regime semi-aberto,
até serem colocados em liberdade condicional.
Em 16 de outubro de 1942 através do Decreto-Lei nº 85, o interventor federal
no Estado, João de Oliveira Franco, desapropria mais 174 alqueires de terras na
mesma região ao preço de 65:000$000 (sessenta e cinco contos de réis). Somente
em 17 de dezembro de 1943 através do Decreto-Lei nº 197, foi oficialmente criada a
Colônia Penal Agrícola, sendo subordinada ao diretor da Penitenciária do Estado
(Ahú) e Casa de Detenção anexas nas dependências da mesma. Iniciado o novo
sistema, em 1943 contava com setenta presos beneficiados pelo novo regime,
participando de atividades agrícolas, avícolas e pecuárias. No governo Ney Braga,
em 1963, foram iniciadas as obras da atual sede administrativa da Colônia, sendo
inaugurada em 31 de outubro de 1964.
A partir de 23 de julho de 1991, através do Decreto nº 609, a Colônia Penal
Agrícola constitui-se em unidade administrativa de nível subdepartamental do
DEPEN, como estabelecimento destinado a presos do sexo masculino em regime
semi-aberto como prescreve a Lei de Execução Penal.
32
3.3.3 Competências
- Promover a reintegração social dos presos e o zelo pelo seu bem-estar através
da profissionalização, educação, prestação de assistência jurídica, psicológica,
social, médica, odontológica, religiosa e material.
3.3.4 Estrutura Física
- Ocupação da área: 1.656,65 ha
- Capacidade: 900 presos em regime semi-aberto
- Lotação atual: 1382 presos
- Área construída: 22.388,00 m²
- Área com benfeitorias e estradas: 27,88 ha
- Administração/Setores técnicos: 4.087 m²
- Área florestada: 109,03 ha
- Segurança/Refeitório e alojamentos: 5.643 m²
- Área destinada à agropecuária: 444,35 ha
- Canteiros de trabalho: 9.520 m²
- Área ocupada através de convênios: 178,06 ha
- Recreação: 1.117 m²
- Área alagadiça (barreiro/areal): 54,39 ha
- Moradias de funcionários: 1.680 m²
- Área alagadiça e não utilizada: 632,94 ha
3.4 PENITENCIÁRIA CENTRAL DO ESTADO – PCE
3.4.1 Características
Estabelecimento
penal
de
segurança
máxima,
destinado
condenados do sexo masculino que cumprem pena em regime fechado.
a
presos
33
3.4.2 História
É a terceira unidade penal construída no Paraná. Sua construção iniciou-se
em maio de 1944, com diversas paralisações. Teve suas obras reiniciadas em 1951,
na gestão de José Muniz de Figueiredo, na época diretor-geral do DEPE, que a
concluiu e inaugurou, sendo também seu primeiro diretor.
Localizada no município de Piraquara/PR, no local denominado Palmeira,
quando de sua inauguração foi declarada como a maior e mais moderna
penitenciária da América Latina, com capacidade para 522 celas individuais com 10
m². Possuía modernas instalações de lavanderia, padaria, cozinha, 2 câmaras
frigoríficas, 6 refeitórios de 76 m², 6 salas de aula, capela, templo protestante e 10
salões para oficinas com 300 m² cada uma.
Possuía ainda instalações para serviço médico, laboratório, farmácia, serviço
odontológico e conjunto cirúrgico, uma cozinha dietética, 14 salas individuais para
observação e 4 enfermarias com capacidade total de 30 leitos.
Em 1976 foram iniciadas as obras para se construir mais uma ala com 50
celas e várias salas, pois a Unidade já demonstrava os primeiros sintomas de
superlotação carcerária. A partir daí, as celas, até então individuais, foram
transformadas em coletivas, alojando-se dois presos em cada uma.
3.4.3 Competências
- Promover a reintegração social dos presos e o zelo pelo seu bem-estar através
da profissionalização, educação, prestação de assistência jurídica, psicológica,
social, médica, odontológica, religiosa e material, além da prestação de
assistência social aos familiares dos presos.
3.4.4 Estrutura Física
- Área do terreno: 72.600 m²
- Área construída: 25.292,24 m²
- Capacidade: 1.320 presos
34
- Lotação atual4: 1.489 presos
- 11 galerias
- 550 cubículos/alojamentos
- 68 solitárias
- 2 refeitórios
- 7 pátios
- 63 quartos para visita íntima
- 1 consultório médico
- 1 consultório odontológico
- 1 enfermaria
- 9 salas de aulas
- 4 salas para atendimento técnico
- 1 biblioteca
- 2 cozinhas
3.5 COMPLEXO MÉDICO-PENAL DO PARANÁ – CMP
3.5.1 Características
O Complexo Médico-Penal do Paraná – CMP é um estabelecimento penal de
regime fechado, destinado aos presos do sexo masculino e feminino, provisórios, e
internos (as) condenados (as) por medida de segurança e/ou que necessitam de
tratamento psiquiátrico e ambulatorial. O antigo Manicômio Judiciário foi inaugurado
em 31 de janeiro de 1969, mudando sua designação para Complexo Médico-Penal
do Paraná em 21 de dezembro de 1993.
3.5.2 História
Desde a criação da primeira unidade penal no Estado do Paraná, havia a
necessidade de uma unidade específica para tratar de doentes mentais condenados.
4
A lotação atual desta e das demais Unidades Penais (à exceção da Prisão Provisória de Curitiba)
mencionadas neste capítulo, refere-se ao efetivo de presos (as) na data de 31 de maio de 2007.
35
Com a inauguração do Hospital Psiquiátrico Adauto Botelho, no bairro do Canguiri,
município de Pinhais/PR, passou-se a utilizar um pavilhão deste hospital.
Em 31 de janeiro de 1969, no governo Paulo Cruz Pimentel, foram
inauguradas as obras do então Manicômio Judiciário do Estado, obra essa que já se
arrastava de forma lenta há mais de cinco anos, sendo considerada pelos padrões
da época um dos manicômios mais modernos do País. Fato interessante é que a
obra, sendo inaugurada durante o regime militar, tem planta no formato de uma
metralhadora.
Nascia ali a 4ª unidade penal do Sistema Penitenciário, localizada no
Município de Pinhais, bairro Canguiri, com uma área total de 5.970 m², tendo
capacidade de internamento para 167 homens e 44 mulheres. Possuía celas
comuns, enfermarias comuns, intercorrente e de isolamento, anfiteatro, salas de
trabalho para homens e mulheres, pátio para homens, mulheres e visitas, cozinha,
lavanderia e corpo da guarda, dispondo ainda de uma reserva de água de 40.000
litros.
Através da Resolução nº 088/85, o secretário de Estado da Justiça, Horácio
Raccanello Filho, visando à humanização do Sistema Penitenciário, resolve criar a
Divisão de Saúde, que compreenderia os serviços médico, odontológico, psicológico,
serviço social, fisioterápico, enfermagem, farmacêutico e de terapia ocupacional.
A criação dessa Divisão de Saúde seria o início do futuro Hospital
Penitenciário, necessário ao atendimento crescente das demais unidades penais.
Em 1986, através da Resolução nº 062/86, o secretário de Estado da Justiça cria a
Unidade de Pronto-Atendimento de Saúde, vinculada ao orçamento do Manicômio
Judiciário. Atribuiu a Jurandir Marcondes Ribas Filho a função de coordenador-geral
do Sistema de Saúde do Sistema Penitenciário e de diretor da Unidade de ProntoAtendimento de Saúde.
Em 15 de julho de 1987, através da Resolução nº 197/87, o secretário Antonio
Acir Breda, cria no âmbito de atuação da Coordenação do Sistema Penitenciário o
Hospital Penitenciário, que seria administrado por um diretor e teria unidades de
atendimento médico para prestação de serviços nas áreas de clínica médica e
cirúrgica, ortopedia e traumatologia, fisioterapia, enfermagem, anestesiologia,
farmácia e odontologia.
36
Enquanto não dispusesse de autonomia própria, o Hospital utilizaria a
estrutura e os recursos do Manicômio Judiciário. Nesta oportunidade foi inaugurada
uma construção defronte ao Manicômio Judiciário, dentro da mesma área, porém de
proporções modestas.
Finalmente, em 22 de dezembro de 1993 o governador Roberto Requião e o
secretário de Estado da Justiça e Cidadania, José Tavares, inauguram o Complexo
Médico-Penal, deixando-se para trás as denominações “Manicômio Judiciário” e
“Hospital Penitenciário”.
Tratava-se da ampliação do Hospital Penitenciário para uma área construída
de 1.500 m², com capacidade para 63 leitos, dos quais 20 destinados ao tratamento
de doenças infecto-contagiosas e especialmente de portadores do vírus da Aids,
ficando o valor total da obra em US$ 1,2 milhão. Com essa inauguração, diminuiria a
incidência de escoltas geralmente empregadas para acompanhar doentes
delinqüentes em hospitais comuns.
Atualmente caracteriza-se como um estabelecimento penal de regime
fechado e de segurança máxima, destinado a pessoas que precisam ser submetidas
a tratamento psiquiátrico e ambulatorial, em decorrência de decisão judicial, de
medida de segurança imposta ou de prescrição médica.
3.5.3 Competências
- Tratamento médico-psiquiátrico aos detentos provisórios e condenados do sexo
masculino e feminino, e internos (as) sujeitos à medida de segurança e de
tratamento por determinação judicial;
- coordenação da assistência à saúde dos presos, de caráter preventivo e curativo,
compreendendo
os
atendimentos
médico,
farmacêutico,
odontológico,
fisioterápico e de enfermagem, relativos aos estabelecimentos penais;
- segurança e custódia dos presos por medida judicial;
- formulação e implementação de políticas de saúde para os estabelecimentos
penais do Sistema Penitenciário do Paraná;
- internamento dos presos de todos os estabelecimentos penais para tratamento
hospitalar;
37
- promoção da reintegração social dos presos e o zelo pelo seu bem-estar através
da profissionalização, educação, prestação de assistência jurídica, psicológica,
social, médica, odontológica, religiosa e material.
3.5.4 Estrutura Física
- Área total do terreno: 8.000 m²
- Área total construída: 8.406 m²
- Área total do “Manicômio”: 6.000 m²
- Área do “Hospital”: 1.970 m²
3.5.4.1 Espaço de segurança feminino
- Capacidade: 30 presas/internas
- Lotação atual: 31 presas/internas
- 01 galeria
- 08 cubículos de segurança máxima
- 06 enfermarias
- 02 refeitórios
- 01 sala de aula
- 07 pátios
- 01 lavanderia
- 01 biblioteca
- 02 cozinhas
3.5.4.2 Espaço de segurança masculino
- Capacidade: 250 presos/internos
- Lotação atual: 401 presos/internos
- 04 galerias
- 33 cubículos individuais
- 06 cubículos de segurança máxima
38
- 06 cubículos coletivos
- 28 enfermarias
3.6 PENITENCIÁRIA FEMININA DO PARANÁ – PFP
3.6.1 Características
Inaugurada em 13 de maio de 1970, está localizada em Piraquara/PR. É uma
unidade penal de segurança máxima destinada às presas provisórias e condenadas.
3.6.2 História
Desde a criação da primeira penitenciária, em 1909, as mulheres estiveram
em ala separada dos homens na Penitenciária do Estado (Ahú) até a década de 60,
quando foram transferidas para o centro da cidade de Curitiba, à Rua Barão do Rio
Branco. Em 1960 iniciam-se as obras para a construção da Penitenciária Feminina,
a quinta unidade penal do Estado, obra esta que ficou paralisada até 1968, sendo
concluída e inaugurada em 13 de maio de 1970, no governo Paulo Cruz Pimentel.
A obra abrangia uma área de 1.769,44 m², composta de dois pavimentos. Na
área térrea localizavam-se 40 celas individuais, com instalações sanitárias
completas, além de 10 chuveiros, bem como 5 salas destinadas à administração.
No andar superior do prédio havia 3 salas de trabalho e aprendizagem de
artesanato, tecelagem, cabeleireiras e trabalhos domésticos, cada uma com 80 m².
Em ala isolada, no pavimento superior, localizava-se a clausura das Irmãs de
Caridade que prestavam serviços nessa unidade, orientando o trabalho e
a
aprendizagem das presas.
Após a inauguração, foram transferidas para o novo presídio várias mulheres
detentas, as quais viviam em condições precárias, isoladas em uma enfermaria da
Penitenciária Central do Estado, por falta de acomodações.
Atualmente ocupa uma área de 3.200 m², sendo que 95% da mão-de-obra
carcerária é ocupada em oito canteiros de trabalho, em atividades de artesanato,
manutenção, confecção de roupas, cartões de Natal, entre outras atividades.
39
A unidade possui também uma creche para dar atendimento aos filhos das
presas, uma vez que as crianças ficavam junto com as mães nas celas, local
totalmente impróprio para elas. Em 1983 foi utilizado o espaço da capela para essa
finalidade, porém em 1990 foi construído um local próprio para o alojamento,
dispondo de uma área de lazer, brinquedos, jardim e playground.
3.6.3 Competências
- A segurança e a custódia das pessoas do sexo feminino que se encontram
internadas no estabelecimento por decisão judicial e pelo período da respectiva
pena, em regime fechado;
- a segurança e a custódia daquelas que estão sujeitas à efetivação de sentença
de pena e medida de segurança detentivas;
- a promoção da reintegração social das presas e o zelo pelo seu bem-estar
através da profissionalização, educação, prestação de assistência jurídica,
psicológica, social, médica, odontológica, religiosa e material;
- a prestação de assistência à gestante, parturiente e aos menores de até seis
anos, filhos das presas desamparadas, de acordo com o artigo nº 89 da Lei
Federal nº 7210/84, e com o disposto no artigo 1º, parágrafo único da Lei
Estadual nº 9304 de 19/06/90;
- a prestação de assistência social aos familiares das presas.
3.6.4 Estrutura Física
- Área do terreno: 31.900 m²
- Área construída: 4.959,59 m²
- Capacidade: 340 presas
- Lotação atual: 304 presas
- 5 galerias
- 123 celas
- 6 solitárias
- 1 refeitório
40
- 2 pátios
- 1 quarto para visita íntima
- 1 creche (capacidade para 40 crianças)
- 1 consultório médico
- 1 consultório odontológico
- 7 salas de aula
- 5 salas para atendimento técnico
- 1 capela
- 1 lavanderia
- 1 biblioteca
- 1 cozinha
- 8 canteiros de trabalho
3.7 CENTRO DE OBSERVAÇÃO CRIMINOLÓGICA E TRIAGEM – COT
3.7.1 Características
Localizado em Curitiba/PR, o Centro de Observação Criminológica e Triagem
– COT é um estabelecimento penal destinado à triagem de presos que ingressam no
Sistema Penitenciário do Estado. Realiza avaliações técnicas e entrevistas de
triagem nas áreas: social, psicológica, saúde e jurídica, e possui sistema de
identificação digital.
3.7.2 História
Inaugurada em 7 de março de 1979, a Central Técnica de Triagem era uma
construção anexa à Prisão Provisória de Curitiba, estando presentes o Governador
Jayme Canet Júnior e o secretário de Estado da Justiça, José Maria de Azevedo.
Sendo final de governo, a obra foi somente inaugurada para que o próximo governo
utilizasse a construção, o que acabou não acontecendo.
Somente a 30 de junho de 1986, através da Resolução nº 077/86, o secretário
de Estado da Justiça, Waldemar Allegretti, visando cumprir os artigos 96 e 98 da Lei
41
nº 7210, de 11 de julho de 1984 de Execução Penal5, resolveu instituir no âmbito da
Coordenação do Sistema Penitenciário – COOSIPE, o Centro de Observação e
Triagem, unidade autônoma, cabendo-lhe a realização de exames gerais,
criminológico e pesquisas criminológicas, bem como o controle e acompanhamento
individual da vida carcerária.
Em 12 de fevereiro de 1987 foi reinaugurada, iniciando desta vez as
atividades dessa unidade denominada de Centro de Observação Criminológica e
Triagem – COCT, que tinha por objetivo a entrada obrigatória do preso para análise
dos aspectos de saúde física, psicológica, psiquiátrica, realização de exame
criminológico para a determinação do tratamento pessoal individualizado, com base
em levantamento sobre os aspectos sociais, econômicos e suas vocações
profissionais, além da situação jurídica.
Todo esse processo inicial indicaria a unidade penitenciária para o
cumprimento da pena, a fim de que o detento pudesse aprender atividade
profissional e prosseguir seus estudos regulares.
Atualmente é denominada Centro de Observação Criminológica e Triagem –
COT. Caracteriza-se como unidade penal do Departamento Penitenciário do Estado
do Paraná destinada à entrada de todos os presos com destino às unidades penais
de Curitiba e Região Metropolitana, para elaboração do prontuário criminal,
identificação e entrevista inicial pela Comissão Técnica de Classificação, objetivando
a individualização da pena.
3.7.3 Competências
- Realização de avaliações técnicas;
- identificação datiloscópica e cadastramento de presos;
- reuniões do Conselho Disciplinar;
- realização de audiências do Livramento Condicional;
- fornecimento das Carteiras de Regime Aberto e Livramento Condicional;
- solicitação de documentação;
5
Que previa: “a classificação dos condenados é requisito fundamental para demarcar o início da
execução científica das penas privativas da liberdade e da medida de segurança detentiva, de modo
que conhecida a personalidade do apenado e analisado o fato por ele cometido, possa ser ele
submetido a tratamento penitenciário adequado”.
42
- atendimento nas áreas: jurídica, social, psicológica, psiquiátrica e enfermagem
aos presos.
3.7.4 Estrutura Física
- Área do terreno: 1.807,95 m²
- Área construída: 1.177,25 m²
- Capacidade: 110 presos masculinos, provisórios e condenados em regime
fechado
- Lotação atual: 60 presos
- 1 galeria
- 2 isolamentos
- 1 refeitório
- 1 pátio
- 2 quartos para visita íntima
- 1 consultório médico
- 1 enfermaria
- 7 salas para atendimento técnico com parlatórios informatizados
- 1 lavanderia
- 1 biblioteca
- 1 cozinha
- 3 canteiros de trabalho
- 20 celas
3.8 PENITENCIÁRIA FEMININA DE REGIME SEMI-ABERTO DO PARANÁ – PFA
3.8.1 Características
Localizada em Curitiba/PR, foi inaugurada em 10 de junho de 1986.
Caracteriza-se como estabelecimento penal destinada a presas do sexo feminino,
em regime semi-aberto, em conformidade com a Lei de Execução Penal. Em média
70% da população carcerária empregam sua mão-de-obra em atividades de
43
manutenção, artesanato e prestação de serviços nos 15 canteiros de trabalho
internos e externos existentes por meio de convênio.
3.8.2 História
Com a aprovação da Lei nº 7210, de 11 de julho de 1984, de Execução Penal,
surgiu a necessidade de se criar uma Penitenciária Feminina objetivando atender à
demanda da progressão de pena do regime fechado para o regime semi-aberto.
Em 5 novembro de 1985, na gestão do diretor da Penitenciária Feminina,
José Deliberador Neto, ocorreu o desmembramento da Unidade de Regime SemiAberto Feminino da Penitenciária Feminina, sendo esta instalada em caráter
provisório em uma das alas do atual Centro de Observação e Triagem – COT, onde
funciona atualmente, depois de ter passado por reformas em sua área física e
administrativa.
Somente em 10 de junho de 1986 aconteceu oficialmente a inauguração da
Unidade de Regime Semi-Aberto Feminino – URSAF, denominação que recebeu na
oportunidade. Sua lotação naquela data era de 18 presas.
Através da Resolução nº 078/86, de 30 de junho de 1986, o secretário de
Justiça, Waldemar Alegretti, instituiu no âmbito da Coordenação do Sistema
Penitenciário – COOSIPE a Unidade de Regime Semi-Aberto Feminina, vinculada à
Penitenciária Feminina, sendo que mais tarde passou a ter autonomia própria.
A partir de 23 de julho de 1991, conforme o Decreto nº 609, passou a
denominar-se Penitenciária Feminina de Regime Semi-Aberto do Paraná – PFA,
constituindo-se
em
unidade
administrativa
de
nível
subdepartamental
do
Departamento Penitenciário do Estado do Paraná – DEPEN.
3.8.3 Competências
- A segurança e a custódia de presas, em cumprimento de pena usufruindo o
benefício do regime semi-aberto;
- a promoção da reintegração social das presas e o zelo pelo seu bem-estar
através da profissionalização, educação, prestação de assistência jurídica,
psicológica, social, médica, odontológica, religiosa e material.
44
3.8.4 Estrutura Física
- Área do terreno: 897,55 m²
- Área construída: 538,95 m²
- Capacidade: 106 presas em regime semi-aberto
- Lotação atual: 109 presas
- Visita íntima: não tem
- 1 galeria
- 9 cubículos
- 2 alojamentos
- 1 solitária
- 1 refeitório
- 2 pátios
- 1 consultório médico
- 2 salas de aula
- 3 salas para atendimento técnico
- 1 lavanderia
- 1 biblioteca
- 1 cozinha
- 15 canteiros de trabalho
- 2 canteiros de trabalho interno (Artesanato e Cozinha)
- Canteiros de trabalho externo: limpeza e conservação em órgãos públicos
3.9 PATRONATO PENITENCIÁRIO DO PARANÁ – PATR
3.9.1 Características
Localizado em Curitiba/PR, tem como objetivo atender egressos beneficiados
com a progressão para o regime aberto, liberdade condicional, sentenciados com
trabalhos externos, liberdade vigiada, prestação de serviços à comunidade e os com
suspensão condicional da pena (Sursis), por determinação da Vara de Execuções
45
Penais, dos juízes das Varas Criminais e Justiça Federal, com penas restritivas de
direito.
3.9.2 História
O “Programa Pró-Egresso” é um projeto antecessor à criação da unidade
denominada Patronato Penitenciário do Paraná. Teve sua origem na cidade de
Londrina, em nosso Estado, por iniciativa do promotor Nilton Bussi. Constituía-se
num trabalho realizado junto aos presos da Cadeia Pública daquela cidade,
beneficiados com o “Projeto Albergue”.
Percebendo a validade deste projeto, o então secretário de Estado da Justiça,
Túlio Vargas, através da Resolução nº 098, de 23 de maio de 1977, objetivando uma
ampla campanha pela humanização do sistema penitenciário, aprova a criação do
"Programa Themis", que visava fiscalizar os egressos beneficiados do Sistema
Penitenciário.
Com a promulgação, pelo Governo Federal, da Lei de Execução Penal (nº
7210, de 11 de julho de 1984) que determinava a existência de assistência ao
apenado ou egresso das Unidades Penais, o governador José Richa, através do
Decreto nº 4.788, de 23 de novembro de 1985, instituiu no âmbito da Secretaria de
Estado da Justiça o “Programa Estadual de Assistência ao Apenado e Egresso”, a
ser desenvolvido em todas as comarcas do Estado. Como já existia o “Programa
Themis”, que funcionava dentro dos objetivos previstos pela nova lei, apenas mudou
de denominação.
Através do Decreto nº 609, de 23 de julho de 1991, constituiu-se em unidade
subdepartamental do Departamento Penitenciário do Estado do Paraná, da
Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania, passando a designar-se Patronato
Penitenciário do Estado do Paraná e Programa Pró-Egresso.
Caracteriza-se como unidade do DEPEN, que no Estado do Paraná coordena
a execução dos “Programas Pró-Egresso”, em seu desenvolvimento, fornecendo
supervisão e infra-estrutura para os programas, visando ao cumprimento da Lei nº
7.210/84, de Execução Penal.
Todo trabalho desenvolvido pelo Patronato Penitenciário, através dos
“Programas Pró-Egresso”, vem sendo acompanhado e apoiado pelo Ministério
46
Público e Ordem dos Advogados do Brasil, enfatizando a execução da pena como
um processo jurídico-social.
3.9.3 Objetivos do Programa
- Prestar assistência aos albergados e aos egressos;
- fiscalizar o cumprimento das penas de prestação de serviço à comunidade e de
limitação de fim-de-semana;
- orientar os condenados à pena restritiva de direitos;
- colaborar na fiscalização do cumprimento das condições da suspensão e do
livramento condicional;
- acompanhar os egressos no seu cumprimento da pena;
- desenvolver projetos de pesquisa para se obter dados reais sobre a situação da
criminalidade e o cumprimento de pena da Prestação de Serviços à Comunidade
– PSC.
3.10 PENITENCIÁRIA ESTADUAL DE PIRAQUARA – PEP
3.10.1 Características
Localizada em Piraquara/PR, a PEP é uma penitenciária de segurança
máxima para presos do sexo masculino. É a única Unidade Penal do Paraná que
dispõe de ala específica para presos que cumprem o Regime Disciplinar
Diferenciado, no Paraná denominado “Regime de Adequação ao Tratamento Penal”
– RATP.
3.10.2 História
Inaugurada em 16 de abril de 2002, é a maior unidade penal construída pelo
Governo do Estado, em parceria com o Ministério da Justiça. Com 169 celas, tem
12.800 m² de área construída e um espaço para horta com 7.500 m². O investimento
foi de R$ 8,5 milhões, sendo 80% provenientes do Ministério da Justiça e 20% do
Estado do Paraná.
47
O projeto arquitetônico da penitenciária, que conta com três túneis de acesso,
foi elaborado para que os presos e as visitas não conheçam a estrutura da unidade.
O preso não consegue ter noção do movimento na prisão ou do trabalho dos
funcionários, o que dificulta estratégias de fugas ou rebeliões.
A penitenciária foi dividida em módulos, como setor administrativo; bloco de
serviços, incluindo lavanderia e refeitório; tratamento penal; ensino; vestiário da
guarda; canteiros de trabalho. Além disso, foram construídos dois blocos para visita
de familiares e mais dois para visitas íntimas, com vinte quartos e oito pavilhões de
carceragem, cada um com pátio individual para os presos tomarem sol.
3.10.3 Segurança
A unidade conta com um inédito sistema de acesso para fortalecer a
segurança. Todos os servidores e familiares dos presos são cadastrados num
sistema informatizado e só entram no presídio depois de passar por um leitor ótico,
que confirma a imagem, identificação e impressão digital do visitante. Os visitantes
também são submetidos à revista pessoal, passando por um detector de metal e
raios-X.
3.10.4 Estrutura Física
- Área do terreno: 72.000 m²
- Área construída: 12.800 m²
- Área para horta: 7.500 m²
- Capacidade: 533 presos
- Lotação atual: 710 presos
- Celas: 143
48
3.11 CASA DE CUSTÓDIA DE CURITIBA – CCC
3.11.1 Características
Localizada em Curitiba/PR, é um estabelecimento penal de segurança
máxima destinado a presos provisórios do sexo masculino.
3.11.2 História
Inaugurada em 7 de agosto de 2002, foi construída de acordo com os padrões
de prisões norte-americanas. O uso de material pré-moldado e de blocos de
concreto impede a escavação de túneis, dificultando ainda mais as fugas.
Possui painéis de controle de segurança dos mais modernos, onde todas as
portas são automatizadas e é possível controlar a segurança até de fora do prédio
de carceragem. Com o fim da terceirização ocorrida em 01/07/2006, o Estado
retomou todos os serviços, seguindo os padrões estabelecidos na Lei de Execução
Penal, sendo oportunizado ao preso assistência jurídica, psicológica, social, de
saúde, religiosa, além de atividades que propiciam a reintegração social.
3.11.3 Segurança
A segurança externa é realizada por policiais militares do Batalhão de Polícia
de Guarda, e a segurança interna é feita pelos Agentes Penitenciários contando com
recursos e equipamentos como: portões automatizados, quadrante suspenso,
monitoramento por câmeras de vídeo, sistema de alarme e som (sirenes
eletrônicas), detector de metais (fixo e móvel), rádios transreceptores e aparelho de
raios-X.
3.11.4 Estrutura Física
- Área do terreno: 21.735 m²
- Área construída: 4.760 m²
- Capacidade de vagas: 410
- Lotação atual: 496 presos
49
- Número de celas: 108
- Número de presos por cela: 4
50
4 APRESENTAÇÃO DA PESQUISA E ASPECTOS DO MÉTODO
Neste capítulo apresenta-se primeiramente o universo pesquisado – Agentes
penitenciários –, seguido das considerações sobre o formulário utilizado na
pesquisa, passando-se, por último, a apresentação dos dados obtidos assim como
das discussões preliminares dos mesmos.
Antes, cabe apontar que o delineamento da pesquisa tem caráter quantitativo,
vez que se utilizou para a abordagem dos pesquisados um questionário, este
essencialmente contendo perguntas fechadas. A aplicação do questionário foi de
forma direta pelo pesquisador no momento da ocorrência do “Curso de Atualização
para Agentes Penitenciários”, entre os meses de setembro e dezembro/2005, na
sede da Escola Penitenciária do Paraná e também em outras duas Unidades Penais
(Penitenciária Central do Estado e Colônia Penal Agrícola). Neste curso o
pesquisador atuou como instrutor em um dos módulos, momento em que se fez
oportuna a aplicação do referido questionário.
4.1 O UNIVERSO PESQUISADO
O universo envolvido na pesquisa é de 564 Agentes Penitenciários lotados no
Departamento Penitenciário do Estado do Paraná e nas diversas Unidades Penais
de Curitiba e Região Metropolitana. Esse quantitativo de profissionais é de extrema
validação para a pesquisa, pois o total de Agentes Penitenciários do Paraná na ativa
à época da pesquisa contava com o número de 13281.
Alguns aspectos são aqui esclarecidos.
Primeiramente, não será indicado neste trabalho ou pelo questionário a
variável gênero, porém os Agentes Penitenciários que manifestaram suas respostas,
pode-se informar, que 90% são do sexo masculino, tendo em vista que há entre as
vinte e uma Unidades atualmente existentes, apenas duas2 que abrigam unicamente
presas, e é onde há a maior concentração de profissionais de segurança feminino.
1
Atualmente (31/05/07) o efetivo total é de 2539 Agentes Penitenciários, sendo 2264 masculinos e
275 femininos, conforme dados fornecido pelo Grupo Auxiliar de Recursos Humanos do
Departamento Penitenciário do Estado do Paraná.
2
Penitenciária Feminina do Paraná e Penitenciária Feminina de Regime Semi-Aberto.
51
As Unidades Penais representadas pelos Agentes Penitenciários que
responderam ao questionário foram: Prisão Provisória de Curitiba (Unidade extinta),
Centro de Observação Criminológica e Triagem, Penitenciária Feminina de Regime
Semi-aberto, Casa de Custódia de Curitiba, Patronato Penitenciário do Paraná,
Penitenciária Central do Estado, Penitenciária Feminina do Paraná, Penitenciária
Estadual de Piraquara, Colônia Penal Agrícola e Complexo Médico-Penal. Também
esteve representado o Departamento Penitenciário do Estado do Paraná, órgão
responsável pela coordenadoria geral das Unidades Penais, onde existem Agentes
Penitenciários prestando serviços. Todos esses estabelecimentos (Departamento
Penitenciário e Unidades Penais) já foram apresentados no capítulo 3, podendo-se
então, sob certos aspectos, ter uma visão geral das características de cada um.
Também não será demonstrado o número de Agentes Penitenciários que
estavam lotados em cada Unidade Penal representada, à época da pesquisa, assim
como outros elementos relativos aos Agentes Penitenciários, quais sejam: tempo de
serviço3; em qual ou quais outras Unidades poderá também ter prestado serviço; há
quanto tempo executa apenas as tarefas específicas da função4 (no contato direto
com o preso); há quanto tempo está afastado dessas tarefas; estado civil; relações
sociais com a família, demais servidores e nichos sociais externos. Estes elementos
não estão aqui demonstrados unicamente pela razão de que não serão utilizados
para aferição de valores, cruzamentos de demais dados, ou outras referências,
mantendo-se assim as variáveis que tão-somente se propõe a analisar e evidenciar
com apontamentos de parâmetros válidos na proposta da pesquisa.
Também não se relacionaram as respostas com a Unidade Penal de lotação
dos Agentes Penitenciários, pois a intenção é a identificação ou não do fenômeno da
prisionização sem apontamentos e conclusões que direcionem para alguma Unidade
Penal específica.
Como último aspecto quanto ao universo pesquisado, consigna-se aqui que
as Unidades5 de Ponta Grossa (Penitenciária Estadual de Ponta Grossa),
3
Ressalta-se que o Agente Penitenciário com menor tempo de serviço à época contava com onze
anos no cargo, havendo também os que tinham dezoito, vinte, vinte e cinco, trinta e até quarenta
anos de profissão (esses – trinta e quarenta anos – em número mínimo, porém presentes).
4
Existem Agentes Penitenciários que desempenham serviços essencialmente burocráticos nos
diversos setores do DEPEN e das Unidades Penais (por espaços de tempos variáveis).
5
Unidades em atividade, pois, após novembro de 2005, outras foram inauguradas, não estando
essas aqui relacionadas.
52
Guarapuava (Penitenciária Industrial de Guarapuava), Londrina (Penitenciária
Estadual de Londrina, Casa de Custódia de Londrina e Patronato Penitenciário de
Londrina), Maringá (Penitenciária Estadual de Maringá), Cascavel (Penitenciária
Industrial de Cascavel) e Foz do Iguaçu (Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu)
não estavam representadas, pois a proposta da Escola Penitenciária do Paraná era
de estender o curso para essas localidades em data oportuna.
4.2 FORMULÁRIO DA PESQUISA
O formulário utilizado para a pesquisa foi formatado exclusivamente com
perguntas fechadas totalizadas em número de treze, sendo estas divididas em cinco
unidades, onde as questões dizem respeito às mudanças de hábitos e
comportamentos possíveis de ocorrerem com o Agente Penitenciário (e em algumas
instâncias transferidas para terceiros), assim como alterações físico-emocionais
percebidas no próprio entrevistado. A questão central proposta aos entrevistados
para avaliação dos graus de afetação dessas mudanças de hábitos e
comportamentos, e alterações físico-emocionais foi orientando-os a respondê-las
considerando as questões “após sua entrada no Sistema Penitenciário”.
Antes de apresentar essas unidades, pertinente se faz esclarecer que foram
propostas três possibilidades de respostas em cada questão: “Um pouco”, “Bastante”
e “Nada”. Essa alternativa deu-se em virtude de se predispor uma lógica de aferição
dos graus de intensidade assinalados como uma forma de resposta satisfatória para
fins de análise, porém simplificadora, tendo em vista também os vários níveis
culturais e de conhecimento dos entrevistados. São formas conhecidas de respostas
que comumente se dão quando se dirigem perguntas verbalizadas diretamente ao
seu interlocutor, como: “Você está ansioso?” E obtemos quase sempre respostas
dessa natureza: “Um pouco”; “Bastante”; “Nem um pouco” (“Nada”, em consonância
com o escrito no formulário). Essas respostas valem para muitas outras perguntas
que se possam formular no cotidiano das pessoas quando de suas interações
lingüísticas.
Por outro lado, as alternativas possíveis em três graus propuseram aos
entrevistados uma melhor facilidade de resposta sem assim conjeturar sobre uma
valoração que melhor correspondesse à exatidão de sua resposta, ou que mais se
53
aproximasse, de seu grau “verdadeiro” de enquadramento. Isso posto, ratifica-se a
intenção de se comprovar ou não a absorção de hábitos, comportamentos e cultura
típicos do ambiente social diferenciado – penitenciárias – em “maior ou menor grau”
(ou até nenhum grau) a que estão submetidos os Agentes Penitenciários pela
saturação de contatos com o preso quando da execução de suas atividades, quando
fora do ambiente prisional nas diversas situações sociais, ou ainda fora do ambiente,
porém no sentir e perceber individual de alterações físico-emocionais.
Abordando-se agora os blocos de variáveis, o primeiro bloco corresponde às
Tabelas 1 a 5, subdivididas em duas unidades, sendo a primeira referente às
Tabelas 1 a 3, e a segunda às Tabelas 5 e 6. O segundo bloco relaciona-se às
Tabelas 6 a 11, sendo a terceira unidade de perguntas. Finalmente o terceiro bloco
corresponde às Tabelas 12 e 13, sendo a quarta unidade referente à Tabela 12 e a
quinta referente à Tabela 13.
Na primeira unidade (Tabelas 1 a 3), buscou-se a avaliação do entrevistado
quanto à rigorosidade disciplinar (para consigo e para com terceiros) e das diversas
atividades (sem especificar quais) que desempenha no espaço carcerário ou fora
dele. Neste bloco foram aplicadas três perguntas. A importância desse bloco de
perguntas se dá no sentido de se estabelecer vínculos das formas identificadas com
relação à instituição penitenciária, pelas características de instituição total, donde a
dinâmica operacional nas ações praticadas pelo Agente Penitenciário pode ser
absorvida e transferida para si e/ou terceiros.
A segunda unidade (Tabelas 4 e 5) – com duas perguntas – refere-se ao grau
de alteração de hábitos. Aqui é apresentada a possibilidade de “adoção de hábitos”,
haja vista a tipicidade de possíveis mudanças de atitudes no falar e no vestir,
apontados como fatores universais da prisionização, o que, então, tornam-se
indispensáveis na confirmação da hipótese proposta.
Na terceira unidade (Tabelas 6 a 11), seis são as perguntas inseridas no
contexto relacionado aos aspectos físico-emocionais. Aqui são dadas respostas
quanto ao grau de intensidade a que poderiam ser atingidos os entrevistados, por
exemplo, pela ansiedade, estresse e outros. Isto se justifica pela expectativa em se
comprovar as conseqüências possíveis da função de Agente Penitenciário donde se
consignam os múltiplos problemas de ordem física e emocional, também estes
devidos à tensão típica do trabalho exercido pela categoria.
54
A quarta unidade de verificação (Tabela 12) é apresentada com uma pergunta
relacionada à sensação de vigilância a que pode ou não ser atingido o entrevistado,
dado que “vigiar” é a máxima atribuída ao Agente Penitenciário. É a partir da
vigilância constante ao preso que qualquer alteração será percebida quanto à ordem
do local. E é pela vigilância também por parte do preso em relação ao profissional
que esse sentimento de “estar sendo vigiado” pode ser absorvido interna e
externamente ao estabelecimento penal.
Na quinta e última unidade (Tabela 13), também com uma única pergunta,
busca-se identificar se houve alterações diversas de ordem comportamental no
entrevistado. Essa alternativa foi inserida para a possibilidade de se identificar,
porém sem anotar, outras mudanças eventualmente percebidas pelo entrevistado e
que não foram sugeridas no formulário. Porém, relembrando que os fatores de
prisionização se demonstram pela alteração de hábitos e comportamentos da cultura
prisional, tal dado é altamente validador para as proposições deste trabalho.
Assim, julgou-se que a estruturação e diversificação dos dados sugeridos pelo
formulário seriam suficientes para o caráter científico do trabalho em se concluir pela
afirmação ou negação do problema inicialmente proposto sobre a prisionização do
Agente Penitenciário a partir da definição do fenômeno em suas formas
características e universais.
4.3 APRESENTAÇÃO DOS DADOS
Nesta seção serão apresentados, pelas Tabelas, os dados que foram obtidos
através do questionário aplicado aos entrevistados.
Em
conformidade
a
cada
Tabela,
algumas
considerações
julgadas
importantes serão apresentadas com intuito de esclarecer aspectos diretamente
ligados à pergunta e aos graus obtidos pelas respostas, considerações estas que
também serão abordadas no capítulo posterior com demais análises pertinentes.
4.3.1 Tabelas 1 a 5
Neste bloco serão apresentadas as Tabelas que apresentam dados com a
avaliação do entrevistado em relação ao seu grau de rigorosidade com a disciplina
55
(sua e de terceiros) e com o horário (seu e de terceiros), assim como alterações em
seus hábitos de vestimentas e à mudança no seu linguajar – estes dentro ou fora do
ambiente prisional.
TABELA 1 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE DISCIPLINA
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
255
280
28
1
564
%
45,21 %
49,64 %
4,97 %
0,18 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
Os dados apresentados na Tabela 1 se referem à intensidade da disciplina do
entrevistado, dizendo respeito apenas à disciplina consigo mesmo, podendo ocorrer
tanto no local de trabalho quando está desenvolvendo suas atividades com o preso
quanto nas diversas situações sociais, fora do ambiente prisional. Nessa variável os
dados são de extrema relevância percebendo cada resposta em relação ao grau de
intensidade, pois temos 255 (45,21%) respostas afirmando que a disciplina do
entrevistado aumentou “um pouco” quanto aos seus diversos afazeres determinados
pelas características de sua função. Os declarantes que indicaram sua disciplina
como “bastante” alterada foram 280 (49,64%) do universo e 28 (4,97%)
responderam que “nada” em sua disciplina foi alterado. Entre todas as respostas
houve 1 (0,18%) entrevistado que não anotou nenhuma alternativa, o que, embora
esteja esta aqui demonstrada, trata-se de um número não influenciável para a
aferição quanto aos graus apontados.
Obtidos os dados da Tabela 1, se somados as alternativas de respostas
positivas, ou seja “um pouco” e “bastante” as quais confirmam alteração de
disciplina, teremos um percentual altamente relevante, pois apontam que 94,85%
dos entrevistados admitiram a adoção de maior disciplina em seu cotidiano dada à
intensidade de contato com o indivíduo encarcerado.
Destaca-se aqui que o Agente Penitenciário é o responsável direto e principal
em estabelecer a disciplina do preso, podendo-se afirmar que o fator “disciplina” – ao
lado do fator “segurança”, ou seja, o controle dos presos, os quais podem atentar
56
contra a ordem do estabelecimento penal – é o que mantém o distanciamento
necessário nos papéis atribuídos ao preso e ao Agente Penitenciário, além de ser
determinante para que se mantenha a ordem no estabelecimento prisional. Ainda
pode-se caracterizar a fundamental atribuição do profissional de segurança que é
“Manter a ordem e a disciplina”. Isso vem confirmar o alto grau de interferência
dessa variável nas instâncias do cotidiano do Agente Penitenciário interna e externa
ao trabalho.
TABELA 2 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE DISCIPLINA
EM RELAÇÃO ÀS PESSOAS COM AS QUAIS CONVIVE
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
286
212
61
5
564
%
50,71 %
37,59 %
10,81 %
0,89 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
Como comentado quando da análise dos dados da tabela anterior, a fator
disciplinar é altamente percebido no perfil do Agente Penitenciário dada a relevância
desse imperativo. A manutenção do indivíduo encarcerado está submissa à
prerrogativa de que mesmo deve ter, em qualquer momento de suas interações, o
comportamento ilibado. É vital para o Agente Penitenciário, então, submeter o preso
a uma disciplina rigorosa. Se na questão anterior o entrevistado avaliou sua
autodisciplina, possível pela imposição que faz ao preso ser disciplinado, e podendo
isso lhe afetar diretamente, aqui, em virtude de ser massiva essa atribuição, o
entrevistado poderia transferir consciente ou inconscientemente essa atitude quando
da convivência com terceiros (entendendo-se qualquer pessoa ou grupo que não o
de presos).
Nos dados obtidos, verifica-se que foi alterada a disciplina que se é exigida de
terceiros, sendo que 286 (50,71%) responderam que exigem “um pouco” a disciplina
de terceiros, 212 (37,59%) atestam que alterou “bastante” sua exigência e para 61
(10,81%) “nada” sofreu alteração quando se relaciona com terceiros no que tange a
ser mais exigente disciplinarmente com os mesmos. Na soma de respostas
positivas, 498 (88,30%) pesquisados manifestaram alteração quanto ao seu grau de
57
exigência da disciplina para com terceiros, obtendo-se assim um índice bastante
elevado para a variável. Houve 5 (0,89%) “não respostas” identificadas, número
bastante pequeno e que não alteram os dados de forma a comprometer os
resultados da pesquisa, mesmo porque se tratou de não conferir nenhum formulário
quando da entrega pelos entrevistados, deixando-se assim, o livre arbítrio de cada
um em responder ou não a determinadas perguntas, nem tampouco foi informado
que os mesmos poderiam assinalar somente as questões que desejassem.
TABELA 3 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE EXIGÊNCIA
EM RELAÇÃO AO HORÁRIO DE SUAS ATIVIDADES E/OU DE OUTROS
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
211
273
76
4
564
%
37,41 %
48,40 %
13,48 %
0,71 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
Para os dados desta variável partiu-se do conhecimento de que no espaço
penitenciário o horário imposto pelos Agentes Penitenciários para as atividades dos
presos é totalmente coordenado e compulsório. A rotina do preso é estabelecida
pela rigidez de horário, porém ao Agente Penitenciário esta rotina tende a ser
semelhante uma vez que os intervalos6 estabelecidos para o mesmo fazer suas
refeições é bastante limitado, não havendo horários para descanso.
Assim, pode-se pressupor que a exigência para essa sistematização e
imposição de horários afetasse o cotidiano tanto do profissional quanto de terceiros,
o que se verificou para 211 (37,41%) dos pesquisados os quais responderam que a
exigência de horário tanto para suas atividades como para a de terceiros foi “um
pouco” alterada. Para 273 (48,40%) pesquisados a exigência alterou “bastante”; já
para 76 (13,48%) a alteração não ocorreu. Foram computadas ainda 4 (0,71%) não
respostas para a variável, índice baixo se comparado ao universo de pesquisados.
Esta variável se comparada aos dados da Tabela 2 vem reforçar os
resultados obtidos, uma vez que a rigidez do horário está estreitamente ligada à
6
O Decreto nº 2471 de 14/01/04, da Casa Civil, prevê apenas intervalos para o Agente Penitenciário
fazer suas refeições, que é no máximo de 30 minutos cada.
58
disciplina, ou seja, a um método disciplinador. Resultante desse cruzamento da
pesquisa é que enquanto 88,30% na Tabela anterior apontou positivamente a
alteração, nesta o percentual foi de 85,81%, índices bastante próximos.
TABELA 4 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU NA MUDANÇA
DO VESTUÁRIO
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Total
Absoluto
213
108
243
564
%
37,77 %
19,15 %
43,08 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
Os resultados da Tabela 4, que se refere à avaliação do grau de alteração
quanto à mudança em vestimentas, confirmam que 213 (37,77%) dos Agentes
Penitenciários alteraram “um pouco” as maneiras de se vestirem. Para outros 108
(19,15%) a mudança foi “bastante” significativa, enquanto que 243 (43,08%)
declararam que em “nada” alteraram as formas de vestimentas.
O esclarecimento dessa variável aos pesquisados foi de que a mudança
deveria ser para o sentido “negativo”, ou seja, menor preocupação com as roupas
(também complementos como calçados e acessórios) denotando possível desleixe
quando tivessem que buscar alternativas para roupas nas diversas ocasiões sociais,
incluindo a ida para o trabalho. No Sistema Penitenciário do Paraná existem
Unidades nas quais o preso faz uso de uniforme fornecido pelo Estado, mas também
há aquelas em que o preso usa suas próprias roupas, não havendo exigência ali
para que ele use um ou outro traje, a exceção das ocasiões em que deve se
apresentar perante alguma autoridade ou atendimento por parte de divisões
internas.
A questão vinculada nesta Tabela é importante para a comprovação do
problema apresentado, haja vista que a alteração na “vestimenta” é um dos fatores
universais da prisionização, o que nesta variável representa índices relevantes nos
graus de intensidade, mais ainda quando contemplamos alterações “Um pouco” e
“Bastante”, que somadas representam 56,92% dos pesquisados.
59
TABELA 5 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU NA MUDANÇA
DO LINGUAJAR, ADOTANDO GÍRIAS INSTITUCIONAL
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
292
47
224
1
564
%
51,77 %
8,33 %
39,72 %
0,18 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
A variável proposta para a Tabela 5 foi obter dados dos Agentes
Penitenciários na qual deveriam avaliar o grau de mudança no seu linguajar – dentro
ou fora do ambiente carcerário – inclusive enfatizando a gíria típica prisional. A
instituição linguagem caracteriza-se no ambiente da prisão por várias alterações de
vocabulário e de sinais gestuais quando da interação lingüística de presos entre si e
de presos e funcionários. Porém, além da adoção de uma linguagem tipicamente
institucional ser um dos fatores da prisionização, ela, em meio à massa carcerária,
torna-se condicionante para a aceitação e pertencimento de um preso em um grupo
determinado, ou mesmo ao universo da prisão. É por meio da linguagem –
maciçamente o uso de gírias específicas – que o indivíduo encarcerado será
identificado pelos demais, que será distinguido nas várias situações interacionais de
comunicação. Ainda é um meio de proteção, sigilo e até de sobrevivência para o
preso.
Pelas indicações do que se vê e ouve na comunicação midiática, fica mais
notável o entendimento comum referente à intensidade com que se faz uso da
linguagem e gíria institucional penitenciária. E é pelo constante e intenso contato
que o Agente Penitenciário estabelece com o preso, e aqui a verbalização é
essencial para a interação entre interlocutores, que coube incluir a proposição de se
obter dados pela avaliação do pesquisado devendo ele responder se poderia
absorver a linguagem e gírias inerentes do meio prisional.
A amostragem indicou que 292 (51,77%) dos pesquisados afirmaram que
houve “um pouco” de alteração na sua forma de falar. Para 47 (8,33%) a mudança
foi “bastante” assimilada; houve ainda no universo pesquisado 224 (39,72%)
Agentes Penitenciários que assinalaram que “nada” perceberam no uso de
linguagem e gírias penitenciárias. Houve ainda 1 (0,18%) que não assinalou
60
resposta. Os dados resultantes desta variável apontam expressivos indicadores de
afirmação da hipótese do uso de linguagem institucional por parte dos Agentes
Penitenciários, independentes pelos graus, porém consideravelmente significativos
ao se assinalar que 339 (60,10%) pesquisados manifestaram haver alterado seu
linguajar pela influência do ambiente prisional.
4.3.2 Tabelas 6 a 11
Nas tabelas seguintes serão demonstrados os dados obtidos referentes aos
fatores emocionais do Agente Penitenciário, esses decorrentes do ambiente prisional
e conseqüentemente da saturação de contatos com o indivíduo preso.
As Tabelas 6 a 11 representam as variáveis relacionadas aos dados obtidos
quanto às avaliações dos graus de intensidade medidos pelo Agente Penitenciário
na sua afetação pela insegurança, pela ansiedade, pelo estresse, pelo nervosismo,
pela agressividade e pela depressão.
Não há neste trabalho nem nesta apresentação de bloco de tabelas a
intenção de descrever clinicamente os eventos de cada variável. Importante
mencionar que essas avaliações – incluindo classificações de distúrbios emocionais,
doenças,
sensações
–
não
foram
descritos
cientificamente
aos
Agentes
Penitenciários quando da aplicação do questionário, sendo apresentado apenas
algumas informações sobre esses fatores físico-emocionais quanto às suas origens
e conseqüências. Nas respostas, a classificação dos graus foi apontada
exclusivamente pelo critério subjetivo pessoal do entrevistado.
A propensão do ambiente prisional ao desenvolvimento dos sentimentos
sugeridos são amplamente invocados pelos próprios Agentes Penitenciários através
de conversas informais e quando de treinamentos a eles proporcionados.
61
TABELA 6 – AVALIAÇÃO DO
INSEGURANÇA
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
ENTREVISTADO
Absoluto
262
74
221
7
564
QUANTO
AO
SEU
GRAU
DE
%
46,45 %
13,12 %
39,19 %
1,24 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
A Tabela 6 demonstra os dados da avaliação do entrevistado em relação ao
seu sentimento de insegurança externa ao ambiente da prisão. A razão pela qual se
pretendeu obter resposta sobre a insegurança quando fora do trabalho na prisão
vem do pressuposto de que o interior da prisão por si só já é um espaço de
insegurança. Isso porque na rotina de trabalho, os Agentes Penitenciários não
utilizam ostensivamente materiais próprios para uso em sua defesa ou de contenção
do preso.
Em algumas Unidades Penais existem materiais como bastão (denominado
PR 24), escudo, capacete, algemas, porém não são utilizados de maneira ostensiva,
ou seja, o Agente Penitenciário não porta consigo tais materiais, e, deste modo, o
profissional de segurança fica completamente vulnerável às ações dos presos. Esta
é uma das razões fundamentais, ou seja, a da vulnerabilidade, aliada ao excedente
número de presos em relação ao de Agentes Penitenciários, que o elemento
“insegurança” é presente no dia-a-dia de trabalho nos estabelecimentos penais.
Importante ressaltar que esta é a práxis de trabalho7 implementada pelo Governo do
Estado, então, o Agente Penitenciário que se propõe a trabalhar com presos terá
conhecimento desse sistema de trabalho.
De outro lado, os Agentes Penitenciários quando estão fora do ambiente
carcerário têm uma vida normal como outro civil qualquer e por isso estão expostos
a eventuais “encontros” casuais com presos egressos, evadidos ou foragidos do
sistema penitenciário. Pode ocorrer de esses presos estarem armados ou trazerem
consigo determinados rancores em relação a Agentes Penitenciários. É nesse
momento que poderá acontecer algum atrito ou incidente de maior gravidade
7
Os Agentes Penitenciários trabalharem sem fazer uso ostensivo de materiais para controle de
distúrbios.
62
envolvendo agressão ou até atentados. Desta forma, pode-se supor uma evidência
em relação ao sentimento de insegurança ao qual os Agentes Penitenciários estão
expostos.
Assim foi que 262 (46,45%) entrevistados responderam que sentem “um
pouco” de insegurança quando fora do ambiente carcerário. Já 74 (13,12%)
avaliaram haver “bastante” sentimento de insegurança, enquanto outros 221
(39,19%) afirmaram que não sentem “nada” ou nenhuma insegurança fora da prisão.
Houve 7 (1,24%) Agentes Penitenciários que não responderam a esta variável.
TABELA 7 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE ANSIEDADE
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
273
208
80
3
564
%
48,40 %
36,88 %
14,19 %
0,53 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
Em restrita análise da variável sugerida, a ansiedade como sentimento de
apreensão desagradável e que prepara o indivíduo para as diversas situações
danosas em potencial, incluindo as ameaças de integridade física e moral, não exclui
os diversos indivíduos ou categorias profissionais, mas credita um alto grau na
exposição desses fatores vivenciados pelos Agentes Penitenciários, isso devido às
características de vulnerabilidade, fechamento e situações de tensão constantes da
prisão.
Na Tabela 7, resultaram dessa variável 273 (48,40%) respostas de
profissionais que se sentem “um pouco” ansiosos devido à vivência no ambiente
prisional e pelas situações potencialmente danosas ali experimentadas. O dado
relacionado ao sentimento de ansiedade em grau “bastante” percebido foi
assinalado por 208 (36,88%) Agentes Penitenciários, enquanto 80 (14,19%)
afirmaram que em “nada” sentem-se ansiosos pela experiência do serviço
penitenciário. Houve o registro de 3 (0,53%) não respostas para a proposição.
63
TABELA 8 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO
NERVOSISMO
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
295
170
95
4
564
AO
SEU GRAU
DE
%
52,30 %
30,14 %
16,85 %
0,71 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
O nervosismo enquanto distúrbio está relacionado diretamente com a
ansiedade. Sobre esta, pelo exposto acima, percebe-se que a sensação de
nervosismo alia-se a extremas situações de tensão por que passa o Agente
Penitenciário, as quais necessitam de ações e respostas imediatas para a solução
de problemas e crises, estas quase sempre provocadas pelos detentos. Deste modo,
a atividade psíquica torna-se exagerada, acarretando um estado freqüente de vigília
e alerta por parte do profissional, e assim podendo ocorrer uma constante tensão
nervosa que compromete em muito a sua atividade.
Validou-se, pelo exposto, a necessidade de também sugerir aos Agentes
Penitenciários que avaliassem seu grau de nervosismo levando em consideração a
transferência dessa tensão também quando fora do espaço prisional, estabelecendo
a possibilidade de sentir o nervosismo, talvez não tão constante, nas diversas outras
situações sociais, porém percebidas como resposta da carga de tensão absorvida
pelas características da instituição.
Assim, na Tabela 8 o grau de nervosismo foi avaliado por 295 (52,30%) dos
Agentes Penitenciários como lhes afetando “um pouco”. Para uma parcela de 170
(30,14%) entrevistados a intensidade foi avaliada como “bastante” percebida na
sensação relacionada a variável. Ainda 95 (16,85%) respostas do universo
pesquisado demonstraram que a intensidade do nervosismo não afetou em “nada”
os Agentes Penitenciários quando relacionada com o trabalho por eles desenvolvido.
Do montante, 4 (0,71%) questionários foram identificados sem nenhuma alternativa
assinalada.
64
TABELA 09 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO
AGRESSIVIDADE
SEU GRAU DE
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
%
47,52 %
10,28 %
41,31 %
0,89 %
100,00 %
Absoluto
268
58
233
5
564
FONTE: Pesquisa direta, 2005
A agressividade pode ser amplamente questionável enquanto elemento
cultural8. Porém, por não se vincular agressividade a traço de personalidade da
pessoa, o que se julga são os comportamentos agressivos que podem ocorrer como
resposta ao meio percebido e vivenciado por esta; e no caso do ambiente carcerário,
são recorrentes as situações observadas pelos Agentes Penitenciários de atos de
agressividade por parte dos reclusos.
Dada à percepção do tipo hostil em que muitas vezes se dão as relações
entre presos, às situações que exigem ações de intervenção permitidas ao Agente
Penitenciário – tanto físicas como verbais – e ainda uma determinada freqüência
desses acontecimentos em virtude da própria dinâmica da instituição carcerária, é
que a possibilidade de o Agente Penitenciário potencializar esses atos agressivos
nas demais situações interacionais tanto fora como dentro da penitenciária foram
admitidos como possíveis. Foi explicado aos Agentes Penitenciários no momento do
questionário que se deve entender por agressividade uma resposta comportamental
de caráter tanto físico quanto verbal, porém não se apontou na variável uma opção
entre esses, apenas foi solicitado avaliação do grau de possível agressividade
advinda da experimentação profissional por parte do entrevistado.
Deste modo, os dados da Tabela 9 apontaram que 268 (47,52%) Agentes
Penitenciários avaliaram se reconhecerem “um pouco” agressivos em decorrência
do seu trabalho, transferindo esse comportamento interna e externamente ao
estabelecimento carcerário. Identificaram-se “bastante” agressivos 58 (10,28%) dos
entrevistados e outros 233 (41,31%) afirmaram que “nada” foi afetado em relação a
8
Pois, conforme a cultura de uma dada região, certos atos – de natureza física ou verbal – que em
uma sociedade qualquer se considera agressivos naquela podem ser entendidos e/ou aceitos como
natural.
65
um possível comportamento agressivo decorrente da atividade que exercem.
Ocorreu uma incidência de 5 (0,89%) não respostas para a variável.
TABELA 10 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE ESTRESSE
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
227
281
54
2
564
%
40,25 %
49,81 %
9,58 %
0,36 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
O estresse enquanto relação entre o individuo e o meio, está ligado ao
binômio agressão/reação, ou seja, ao perceber uma situação que possa ser
perigosa ou agressiva, o indivíduo tende a aplicar uma reação entendida como sua
defesa natural. O estresse também pode ser causado pela ansiedade e depressão
devido à exposição da pessoa em determinado ambiente. Ainda as várias situações
de mudança são agentes estressores que afetam diretamente o ser humano. O
Agente Penitenciário, inserido no ambiente prisional, vê-se bastante afetado pelo
estresse dado à própria característica de sua função. O estresse enquanto uma
agressão que origina desconforto pode obter uma resposta “certa” ou “errada” para
esta agressão.
O profissional ligado diretamente à segurança penitenciária que está
propenso ao perigo iminente, eventos violentos e traumáticos não poderia estar
imune a uma reação orgânica que lhe causasse altos graus de estresse. Assim, foi
concebido que seria de grande utilidade contemplar também na gama de sensações
a variável relacionada ao estresse.
A Tabela 10 mostrou que se reconhecer “um pouco” estressado perfez o total
de 227 (40,25%) entrevistados, tendo como referencial o ambiente carcerário em
que atuam. “Bastante” afetados pelo estresse sentiram-se 281 (49,81%) dos
Agentes Penitenciários, sendo que outros 54 (9,58%) julgam-se “nada” afetados pelo
estresse. Nesta Tabela estão incluídas 7 (1,24%) não respostas, uma vez não haver
sido assinalada nenhuma alternativa para a variável.
66
TABELA 11 – AVALIAÇÃO DO
DEPRESSÃO
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
Absoluto
241
101
217
5
564
%
42,73 %
17,91 %
38,47 %
0,89 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
O entendimento para inserção dessa variável partiu de conhecidos casos de
Agentes Penitenciários que se reconhecem em processo depressivo ou ainda os
que são afastados das suas atividades decorrentes da depressão. Porém, não cabe
para a proposta do trabalho, especialmente pelo caráter de abordagem clínica que o
tema sugere, a apresentação de aspectos específicos sobre a depressão, portanto
foi necessário balizar fatores relacionados a ela para não haver a relativização da
variável.
Por isso, foi identificado aos entrevistados – antes de efetuarem suas
respostas – que são alguns elementos relacionados à depressão a perda de
energia, humor deprimido, dificuldade de concentração, pessimismo, autocompaixão
e desesperança, devendo os Agentes Penitenciários, a partir desses elementos,
avaliarem seu grau de intensidade relativo à depressão.
Em conversas informais e durante treinamentos são relatadas pelos Agentes
Penitenciários situações de alteração na imagem corporal, no estilo de vida social e
financeira, interrupção de planos de vida, baixa ou perda de auto-estima, desânimo
e tristeza mais ou menos profunda, todas estas diretamente relacionadas ao
ambiente prisional e suas dinâmicas operacionais. É somado a isso que se reforçou
a intenção de se mensurar a variável em questão.
Para tanto, a Tabela 11 demonstrou que a intensidade “um pouco” foi dada
como resposta por 241 (42,73%) entrevistados; 101 (17,91%) dos Agentes
Penitenciários se reconheceram “bastante” comprometidos pela depressão,
enquanto que outros 217 (38,47%) aferiram intensidade “nada” para avaliação do
grau de depressão. As não respostas nesta Tabela somaram-se 5 (0,89%).
67
4.3.3 Tabelas 12 e 13
Nessas duas últimas tabelas serão apresentados os dados coletados quanto
ao grau de intensidade avaliado relativo à sensação de vigilância (Tabela 12) e da
possível identificação de mudanças gerais de comportamento (Tabela 13)
percebidas pelos Agentes Penitenciários que participaram do questionário.
TABELA 12 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE SENSAÇÃO
DE ESTAR SENDO VIGIADO
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
237
91
232
4
564
%
42,02 %
16,14 %
41,13 %
0,71 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
A Tabela 12 apresenta a proposição para o entrevistado avaliar o grau
relacionado à sensação de estar sendo vigiado quando fora do ambiente prisional.
Isto porque se partiu do conhecimento de que o Agente Penitenciário quando
próximo ao preso está constantemente sendo vigiado, pois é desse vigiar que o
detento poderá concretizar sua ação intencionada, seja pelo simples fato de quando
perceber o Agente Penitenciário possa então abordá-lo e verbalizar sua intenção, ou
para poder praticar ações que não possam ser flagradas.
Se a “ordem e disciplina” são atributos fundamentais para a manutenção da
rotina aceita em uma unidade penitenciária, é através da observação, da vigilância
que a rotina ordeira e pacífica será alcançada. O Agente Penitenciário deve estar em
alerta constante, observando e vigiando todo o ambiente prisional assim como os
detentos a fim de perceber alguma alteração, ou ainda se antecipar a qualquer
ocorrência que altere a rotina formal admitida dentro do estabelecimento.
O preso conta com a ausência física do Agente Penitenciário para cometer
delitos e quaisquer ações que não sejam permitidas, e se a ausência física não for
possível – e normalmente nunca será – estará vigiando o profissional todo o tempo a
fim de atingir seu intento sem ser percebido. Todo Agente Penitenciário conhece
essa prática do preso e deve administrar essa realidade, porém a vigilância desse
68
profissional em relação ao preso e vice-versa é intensa, sendo admitido então, que
essa sensação constante do “perceber estar sendo vigiado” seja transferida pelo
profissional quando fora do ambiente prisional.
Assim, 237 (42,02%) Agentes Penitenciários responderam que se sentem “um
pouco” vigiados quando nos diversos locais públicos que possa freqüentar, principal
e mais intensamente se estão em ruas e praças, locais estes referidos verbalmente.
Para 91 (16,14%) dos entrevistados a sensação é “bastante” percebida nas mesmas
condições acima, enquanto que “nada” sentem em relação a estarem sendo vigiados
outros 232 (41,13%). Do universo pesquisado 4 (0,71%) não responderam à
proposição.
TABELA 13 – AVALIAÇÃO DO ENTREVISTADO QUANTO AO SEU GRAU DE
PERCEPÇÃO DE MUDANÇAS GERAIS DE COMPORTAMENTO
Grau de Intensidade
Um pouco
Bastante
Nada
Não resposta
Total
Absoluto
307
171
80
6
564
%
54,43 %
30,32 %
14,19 %
1,06 %
100,00 %
FONTE: Pesquisa direta, 2005
A última variável do questionário descrito na Tabela 13, foi quanto à avaliação
do entrevistado para o grau de intensidade nas possíveis outras mudanças, de
caráter genérico, observados em seu comportamento, podendo ser fora ou dentro do
ambiente carcerário.
Esta proposição foi admitida como alternativa para mudanças que possam
ocorrer, mas que não estejam contempladas no questionário, ou ainda que o
entrevistado (mesmo ele não sendo identificado), por convicções próprias, valores
não queira indicar diretamente, embora tenha conhecimento dessas mudanças ou
as perceba.
A alternativa valida a possibilidade de numa abordagem ampla – que aqui não
se torna oportuno descrever – de se confirmar ou não que o sistema carcerário
devido às suas características específicas e totais propicia alterações ou mudanças
no comportamento dos profissionais, e que no caso específico da penitenciária,
69
determinadas mudanças são diretamente vinculadas ao processo diferenciado de
socialização, a prisionização.
Para esta variável houve 307 (54,43%) Agentes Penitenciários que afirmaram
terem percebido “um pouco” de mudanças de caráter geral em seu comportamento
dentro e fora da penitenciária e que são decorrentes das dinâmicas relativas ao tipo
de trabalho que exercem nas prisões. As respostas referidas a uma percepção
“bastante” diagnosticada foram dadas por 171 (30,32%) dos entrevistados, e ainda
80 (14,19%) afirmaram que em “nada” foram afetados por mudanças gerais de
comportamento, segundo suas avaliações. Computou-se 6 (1,06%) não respostas
para esta variável.
70
5 DISCUSSÃO DOS DADOS E ANÁLISES COMPLEMENTARES
Após finalizada a apresentação de todos os dados que foram compilados para
a pesquisa deste trabalho, passa-se à discussão centrada no problema e outras
análises a ele pertinentes.
O problema proposto neste trabalho foi de se comprovar se os Agentes
Penitenciários, em virtude das dinâmicas de seu trabalho profissional dentro de
penitenciárias – que pelas suas características peculiares enquadram-se na
concepção de instituições totais – acabam por adotar um processo diferenciado de
socialização – nos moldes da prisionização – que é característico do ambiente social
penitenciário.
Como elementos de análise para balizar a discussão e sua validação através
de literatura existente, adotam-se os elementos referidos por THOMPSON (2002) –
mencionados anteriormente no item 2.3.2.1 –, notando-se que a absorção desses
fatores da prisionização está relacionada aos presos, muito embora pelo também
intenso contato com o ambiente institucional penitenciário e com o próprio preso, o
Agente Penitenciário também está propenso à absorção dos hábitos, dos
comportamentos e da cultura prisional. Desta forma, os elementos que serão
consignados diretamente ao fator de análise da prisionização afetos ao profissional
serão a acumulação de fatos concernentes à organização da prisão, o
desenvolvimento de novos hábitos, assim como a adoção do linguajar institucional
penitenciário.
5.1 O FATOR DA RIGOROSIDADE
As atividades dos Agentes Penitenciários quando no desempenho de suas
funções estão relacionadas diretamente a um rigoroso controle da segurança interna
a fim de que possam manter a disciplina no ambiente prisional, para “garantir as
disposições da sentença ou decisão criminal” aplicadas ao recluso. Como se referiu
anteriormente neste trabalho, através do item 2.3.1, dentro dos objetivos formais da
organização penitenciária burocrática, esse atributo quanto à aplicação de ordem,
disciplina e manutenção do indivíduo encarcerado é tarefa essencialmente do
71
Agente Penitenciário, não restando a ele senão legitimar essas ações como
resposta ao ordenamento jurídico e bem-estar geral da sociedade.
O dia-a-dia dentro de uma penitenciária está pautado pela organização e
estabelecimento rígido quanto aos horários das atividades e da disciplina de todos
os presos. Deste modo, a rigorosidade desses elementos é que darão a atmosfera
de ordem no estabelecimento, pois “todas as atividades diárias são rigorosamente
estabelecidas em horários, pois uma atividade leva, em tempo predeterminado, à
seguinte, e toda a seqüência de atividades é imposta de cima, por um sistema de
regras formais explícitas e um grupo de funcionários” (GOFFMAN 2005, p. 18).
Esse mecanismo cronológico e sistemático é aceitável do ponto de vista de
uma forma regrada para um efetivo controle da população carcerária. Todavia, o
“grupo de funcionários” que determina a ação e eficácia desse controle é o dos
Agentes Penitenciários, por isso estes se vêem diretamente envolvidos nesse
mecanismo, o que os leva, na maioria das vezes, inconscientemente, a assimilar as
regras, ou seja, a rigidez quanto ao horário da disciplina.
É em virtude desse rigoroso mecanismo que ocorreu, conforme a Tabela 3, o
maior número de respostas – 273 (ou 48,40%) – com a afirmativa de que a exigência
quanto ao horário de suas atividades e/ou de outros foi “bastante” afetada, e ainda,
outros 211 (37,41%) afirmaram que essa dinâmica foi “um pouco” afetada. O fator
“disciplina” é típico da função daqueles que têm a atividade policial ou penitenciária
enquanto responsáveis pela custódia de indivíduos reclusos, e, no caso do Agente
Penitenciário, como já referido, a descrição básica de sua atribuição consta no
cabeçalho do Perfil Profissiográfico (2004) do seu cargo/função e inicia-se
justamente com o texto: “Efetuar a segurança (...) mantendo a disciplina”1. Retomase, portanto, a determinação legal que habilita o profissional para que esteja atuando
como agente disciplinador em toda ação que desempenha como atributo
incondicional para se manter também a ordem e a segurança do estabelecimento
penal. Mesmo assim, é inerente à compreensão de todo Agente Penitenciário –
porque ele assimila essa prerrogativa como constatação do cotidiano de suas tarefas
e de sua imprescindível autoridade – que atua diretamente dentro dos presídios o
entendimento que para se ter controle dos indivíduos encarcerados não poderia
1
Grifo do autor.
72
haver outro mecanismo que não a aplicação intensiva e constante da disciplina a fim
de estabelecer a ordem dentro do espaço prisional e também o regramento de
condutas a que esses indivíduos devem estar submetidos, assim como a
administração de toda dinâmica que envolve as relações sociais entre os próprios
presos, entre presos e Agentes Penitenciários e entre presos e demais funcionários.
Vale então dizer que a disciplina é fator absoluto dentro do processo das relações
sociais no ambiente institucional penitenciário para administração de convivências e
legitimação de um atributo jurídico-administrativo essencial delegado ao Agente
Penitenciário enquanto profissional de segurança que atua em estabelecimentos
penais em contato direto com o recluso.
THOMPSON (2002) afirma que quanto à disciplina e controle aplicados pelo
Agente Penitenciário, assim como a exigência de impor ordens é transferida
incondicionalmente ao preso, tanto que: “Não se lhe permite fazer escolhas: as
opções são regradas minuciosamente e as que dependerem de uma decisão
humana devem provir dos funcionários. Como teria de ser, por várias razões, mas,
sobretudo, porque se trata de um regime totalitário, as ordens não são justificadas
nem explicadas. Exige-se uma obediência cega, simplesmente” (THOMPSON, 2002,
p. 60).
CHAUVENET, ORLIC e BENGUIGUI2, citados por MORAES (2005, p. 224225) descrevem em relação à vigilância exercida pelo Agente Penitenciário que:
De uma maneira geral nós constatamos que a missão de vigilância desenvolve entre
os agentes penitenciários uma faculdade de ver (e uma capacidade de observação
em geral), que surpreende o observador externo. A mobilidade, a acuidade, a rapidez
no olhar e o dom da ubiqüidade são aspectos reais das qualificações do agente
penitenciário (...). ... Ele se inquieta diante de uma vigilância global e geral reparando
todo indício, sinal que anuncie um movimento coletivo, uma revolta, uma agressão
individual, uma crise de nervos, uma evasão.
Essa atribuição árdua e complexa, de competência do Agente Penitenciário,
torna-se comum e necessária, até vital, formando neste profissional uma postura de
autoridade que deve mesmo ter, e que pelo excesso de vezes que se vê incumbido
de impor entraves, regras e determinações, de algum modo, isto fica imbricado,
2
CHAUVENET, A., ORLIC, F. e BENGUIGUI, G. Le monde des surveillants de prison. Paris/Fr:
Éd. Eres, 1994, p. 25.
73
podendo, muitas vezes, tornar-se parte do perfil do Agente Penitenciário também
fora sociedade carcerária.
Desta maneira, o julgamento dos Agentes Penitenciários pesquisados quanto
ao grau de absorção do fator disciplinar em relação a si, conforme Tabela 1, foi
admitido por 94,85% (ou 535 profissionais) dos Agentes Penitenciários, para os
graus “bastante” e “um pouco”. E quando a disciplina se referiu à exigência desta
para com as pessoas com as quais o Agente Penitenciário convive, as respostas
contidas na Tabela 2 também foram em número altamente relevantes, pois apontou
88,30% dos pesquisados revelando que há graus de absorção desse fator
estabelecendo intensidades “bastante” e “um pouco” para a variável.
Importante ressaltar que mesmo que os percentuais totais entre os graus
“bastante” e “um pouco” relacionados à “sua disciplina” e à “disciplina das pessoas
com as quais convive” foram pouco distantes entre si, por mais que o Agente
Penitenciário seja o responsável direto pela aplicação da disciplina aos presos, ele
passa, em virtude desse atributo e atividade constante, a exigir de si próprio um grau
elevado de disciplina quando está fora do ambiente prisional3. Tanto que ele foi
maior que o grau de exigência quando em relação às pessoas com as quais convive,
de onde poderia se julgar que o Agente Penitenciário passasse a ser muito exigente
com terceiros e pouco, ou em grau bem menor, consigo.
Isso se justifica inclusive pela própria peculiaridade também descrita no Perfil
Profissiográfico (2004) do cargo/função do Agente Penitenciário, onde prevê, dentre
outras, “aceitar e cumprir com naturalidade as ordens de serviço e normas
disciplinares4 que recebe; atitude disciplinadora5 e de respeito com os presos ou
internados; adaptação ao trabalho rotineiro e repetitivo6". Percebe-se, então, que é
peculiar ao Agente Penitenciário que tenha – ou desenvolva – qualificações
específicas que moldem seu perfil e passem a fazer parte de suas atitudes
cotidianas a aplicação da disciplina como fator essencial da segurança e da ordem
do ambiente prisional.
3
Ressalta-se que a pergunta foi efetuada para que o Agente Penitenciário manifestasse o grau de
disciplina – seu e das pessoas com as quais convive – fora do ambiente prisional, ou seja, o interesse
foi em se constatar ou não a absorção desse fator quando está extramuros, distante da influência ou
exigência da aplicação da disciplina.
4
Grifo do autor.
5
Idem.
6
Idem.
74
Destarte, os resultados obtidos para as variáveis quanto ao rigor de horário
das atividades do próprio Agente Penitenciário assim como de terceiros e o rigor
quanto à sua disciplina e a de terceiros, são altamente significativos no sentido de
validar a adoção por parte do profissional Agente Penitenciário desses fatores
concernentes à organização institucional penitenciária pelo processo diferenciado de
socialização, a prisionização.
5.2 A MODIFICAÇÃO DE HÁBITOS
Sobre a modificação de hábitos experimentadas pelo Agente Penitenciário, o
que se apresentou nas variáveis das Tabelas 5 e 6 foi a alteração quanto ao
vestuário (forma de se vestir) e no linguajar, adotando gírias institucional,
respectivamente.
Relevante apontar que desde o final da década de 1900 até o final da década
de 1960 o Agente Penitenciário – à época denominado “Guarda de Presídio7" –,
contava com o uso de uniforme completo8 para desempenho de suas atividades no
interior dos estabelecimentos penais do Estado. Esse uniforme era composto de
calça, camisa, gravata, sapatos pretos, meias pretas e um tipo de quepe, e, em
época de frio, de casaco. Na década de 70 do século XX, esse uniforme já não era
mais utilizado, sendo que os Agentes Penitenciários – neste período ainda
denominados “Guarda de Presídio” – vestiam-se “à paisana”, ou seja, utilizavam
para o trabalho as mesmas roupas de uso pessoal diário.
Durante muitos anos os presos do Sistema Penitenciário do Paraná também
fizeram uso de suas roupas pessoais, sendo que somente em 12 de novembro de
1999, com a inauguração da Penitenciária Industrial de Guarapuava9 – PIG
7
A denominação “Guarda de Presídio” permaneceu até 1982, quando se passou a designar “Agente
de Reclusão”, e, a partir de 21/12/1992, “Agente Penitenciário”, com a passagem do regime
trabalhista CLT – Consolidação das Leis de Trabalho – para “Estatutário”, onde se prevê a legislação
dos profissionais pelo Estatuto dos Funcionários Civis do Paraná, Lei nº 6.174 de 16 de novembro de
1970.
8
Não se é precisa a data de quando foi extinta tal uniformização, mas segundo informações de
Agentes Penitenciários mais “antigos” e aposentados do Sistema Penitenciário, isso de seu por volta
de 1968.
9
A PIG, quando de sua inauguração, era uma unidade terceirizada, sendo administrada por uma
empresa privada de segurança (Humanitas) que era responsável por toda a administração e
manutenção da Unidade, incluindo presos e funcionários. O Estado mantinha o diretor, o vice-diretor
e o chefe de segurança para auxílio e fiscalização da administração efetuada pela Empresa. A partir
75
condicionou-se o uso de uniforme, porém somente aos presos daquela Unidade.
Após, com as inaugurações da Casa de Custódia de Londrina – CCL, da
Penitenciária Industrial de Cascavel – PIC, da Penitenciária Estadual de Piraquara –
PEP, da Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu – PEF, da Casa de Custódia de
Curitiba – CCC e da Penitenciária Estadual de Ponta Grossa10 – PEPG, seguido de
outras unidades inauguradas, os presos dessas unidades penais também passaram
a usar obrigatoriamente uniformes fornecidos pelo Estado. Cabe por fim esclarecer
que em algumas Unidades11 ainda os presos permanecem fazendo uso de suas
roupas pessoais.
A questão objetiva deste esclarecimento prévio é para delimitar o
entendimento que o período de convivência entre Agentes Penitenciários e presos
no qual tanto estes como aqueles oscilaram – e ainda oscilam – no uso de uniforme
é significativo. Ressalta-se que o uso de colete e crachá como identificação
profissional foi estabelecido formalmente através da Resolução 3027/04 da
Secretaria de Estado da Administração e Previdência, porém o uso de colete como
única identificação foi adotado no início da década de 1990, após grande período do
abandono do uso do uniforme referido anteriormente, sendo que a identificação
formal era somente o colete, e todas as demais vestimentas do Agente Penitenciário
eram de uso pessoal diário, o que permanece atualmente, acrescido do uso de
crachá.
Isso posto, não causa estranheza também destacar que os presos em sua
maioria absoluta vestem-se (e aqueles anterior ao uniforme vestiam-se) de forma
muito simples, e muitas vezes até deficitária, relativo ao aspecto de suas
apresentações. Ainda aliado a isso, muitos fazem uso de roupas velhas, deformadas
e em não poucos casos, de roupas não asseadas.
de 02/08/06 o Estado retomou toda a administração da Penitenciária, mantendo o trabalho da área
administrativa e da área técnica com pessoal contratado pelo PSS – Processo Simplificado de
Seleção, porém os serviços de segurança passaram a ser desenvolvidos por Agentes Penitenciários
concursados.
10
Essas Unidades, desde quando inauguradas, também foram administradas nos mesmos moldes da
PIG, ou seja, por empresas terceirizadas: a CCL, pela empresa INAP – Instituto Nacional de
Administração Prisional, até 01/07/06; a PIC, pela empresa INAP, até 01/07/06; a PEF, pela empresa
INAP, até 01/07/06; a PEP, pela empresa Montesinos até 01/05/06; a CCC, pela empresa INAP, até
01/07/06 e a PEPG, pela empresa INAP, até 01/07/06.
11
Penitenciária Central do Estado, Colônia Penal Agrícola, Complexo Médico-Penal, Centro de
Observação Criminólogica e Triagem, Penitenciária Feminina de Regime Semi-Aberto, Penitenciária
Estadual de Londrina e Penitenciária Estadual de Maringá.
76
Nesse ambiente e condições trabalharam e trabalham muitos Agentes
Penitenciários, e por um direcionamento de avaliação do aspecto de “alteração
quanto ao vestuário” foi que se entendeu válido indagar aos pesquisados se
identificaram algum grau de alteração nessa variável, visto que também corresponde
a um dos fatores universais da prisionização. E observando-se a Tabela 4 pode-se
constatar a alteração no modo de se vestir12 em grau “bastante” ou “um pouco”
confirmado por 56,92% dos Agentes Penitenciários.
Retomando-se o destacado supra quanto à “escassez” e “desleixe” com a
apresentação nas vestimentas dos presos, pode-se relacionar, mesmo que
relativizando, que parte dos Agentes Penitenciários poderão ter adquirido esse
hábito devido ao intenso contato que mantêm com os presos. Em conversas
informais de alguns Agentes Penitenciários, estes informaram que não se
preocupavam com a apresentação de suas vestimentas especialmente no local de
trabalho, pelo fato destes locais não serem devidamente higiênicos e limpos,
principalmente as celas dos presos, incluindo os próprios presos. Ou seja, pela
alegação desses Agentes Penitenciários, eles estariam em contato direto e
constante com locais insalubres e com presos deficientes em sua higiene e asseio
pessoal, literalmente afetados pelo contato físico – então também incluídas as suas
vestimentas –, o que justificaria a não preocupação na apresentação pessoal
referente ao modo de se vestir.
Pode-se deduzir – também com a devida relatividade – que a influência
quanto à mudança no hábito de se vestir apresentada por alguns Agentes
Penitenciários tem convergência dupla se percebido que por um lado a alteração se
deu pela justificativa quanto aos aspectos de insalubridade dos espaços físicos do
ambiente prisional13 e dos presos, e, de outro, pela própria convivência com o grupo
recluso deficitário e “desleixado” em suas vestimentas, convivência essa que por ser
constante e intensa produziu uma influência “negativa” a parte do grupo de Agentes
Penitenciários.
12
A alteração no modo de se vestir foi apresentado aos Agentes Penitenciários quando do
questionário ressaltando-se que essa mudança deveria configurar o aspecto “negativo” na
apresentação visual pessoal, ou seja, com uma não preocupação em de consignar o modo de se
vestir ou selecionar vestimentas “adequadas” ao ambiente a ser freqüentado, inclusive o próprio local
de trabalho, a penitenciária, isto em virtude das convenções sociais existentes.
13
Isto foi observado anteriormente no item 2.3.2.2 quando no Inventário (2005) desenvolvido pela
Escola Penitenciária do Paraná e aplicado aos Agentes Penitenciários, dos 665 que responderam à
questão, 42% afirmaram que as condições do local de trabalho são “regulares” ou “ruins”.
77
Pelo mesmo viés do fator “influência”, prossegue-se na análise abordando a
questão da linguagem utilizada dentro dos estabelecimentos penitenciários – e que
podem ser notadas em prisões de todo Brasil –, pois nesses ambientes uma
linguagem própria dos presos e também a gíria institucional são amplamente
utilizadas.
Uma realidade típica de penitenciárias é a linguagem que os presos utilizam
em suas comunicações. A forma de comunicação entre presos desperta curiosidade
aos que não convivem de alguma forma com eles, mas que para os profissionais do
Sistema Penitenciário, principalmente os Agentes Penitenciários, deve ter um único
interesse: conhecer a linguagem estabelecida, mas não fazer uso indiscriminado da
mesma.
Antes de 2005, a questão da linguagem utilizada pelos presos não era
abordada e repassada aos Agentes Penitenciários através do conhecimento formal.
Revelava-se preponderantemente que os presos se utilizavam de gírias e eram
repassadas aos Agentes Penitenciários, para que eles conhecessem, listas com as
gírias utilizadas pelos presos. Foi a partir daquele ano (2005) que a Escola
Penitenciária do Paraná – por sugestão e desenvolvimento do autor, dos temas
sobre a “Linguagem e gíria dos presos” e a “Prisionização” –, em seus cursos de
formação, passou a incluir no programa de aulas a questão da linguagem
institucional penitenciária, enfatizando a gíria utilizada pelos presos.
A abordagem do tema é de que o Agente Penitenciário deve sim conhecer a
gíria do preso porque há, além dos fatores sociais e culturais, algo de especial
interesse nisto. Este interesse vincula-se ao motivo de que os encarcerados utilizam
expressões e palavras variadas em seus diálogos. A linguagem do preso não é
inocente, ou seja, ele fala utilizando códigos lingüísticos específicos e de
conhecimento e pertencimento peculiar ao seu grupo não porque desconhece as
normas tidas como “padrão da língua”, mas porque a comunicação é vital para o ser
humano expressar suas vontades, sentimentos, desejos. As vontades, intenções dos
indivíduos presos, pela necessidade da sobrevivência no cárcere, motivaram que
criassem em sua comunicação traduções literais e contextuais diferentes das
convencionais que são conhecidas e entendidas pela sociedade em geral e,
principalmente, pelos Agentes Penitenciários e demais servidores.
78
Sendo assim, a linguagem do preso não deixa de ser criativa, pois apresenta
conotações diferenciadas, paralelos de informações, e está em constante evolução e
modificação. Porém, essa linguagem não é inocente ou gratuita, mas traz a carga da
sobrevivência na prisão. A iniciativa e realidade da linguagem dentro das
penitenciárias se estabelecem essencialmente pela dissimulação nas atitudes e
intenções do preso, pois para ele é indispensável manter no secretismo absoluto, ou
ao menos o quanto puder ocultar, sobre o que tem a comunicar com outros presos
ou pessoas que lhes possam compactuar em seus anseios. Conforme COSTA
(2002, p. 10), “quando se sentem ameaçados, os presos tratam de atribuir novo
significado às palavras e expressões. Sentir-se ameaçado é perceber que a
criatividade está sendo dominada pelas autoridades.”
Importante esclarecer que embora se tenha referido à comunicação falada do
preso, este, é claro, pela mesma necessidade relatada, utiliza a gíria e demais
códigos em suas comunicações escritas. Atualmente também fazem uso da Língua
Brasileira de Sinais - LIBRAS, a mesma utilizada na comunidade de surdos,
obviamente com algumas adaptações para dificultar o entendimento por parte de
funcionários, prevalecendo a técnica da datilologia (alfabeto manual).
As expressões diversas, com seus símbolos e códigos, são verdadeiros
labirintos, muitas vezes indecifráveis para servidores ou qualquer cidadão comum
alheio ao conhecimento desses códigos.
O Agente Penitenciário, dados esses apontamentos, não pode estar inerte ou
indiferente à comunicação do preso. É necessário, de extrema relevância para o
desempenho de seu trabalho, que esse profissional busque conhecer e entender as
expressões e palavras usadas na dinâmica da comunicação entre os presos, pois
elas carregam informações que são extremamente úteis para a segurança de todos:
funcionários, civis e de outros presos. As informações trocadas entre presos no
interior de penitenciárias podem traçar planos de fuga, resgate, motim, assim como
uma infinidade de intenções nem sempre inocentes ou desprezáveis. É, destarte,
nesse viés que o Agente Penitenciário deve se ater no sentido de angariar subsídios
dentro das observações e investigações necessárias para procurar decifrar essa
linguagem.
Porém, ao Agente Penitenciário não se justificaria interiorizar, adquirir para si
e passar a fazer uso da linguagem amplamente utilizada pelos presos, quando nas
79
diversas interações lingüísticas que mantém em suas relações sociais dialogadas
fora do espaço prisional. Ela não é útil e adequada nessas comunicações, pois é
específica, inerente a uma comunidade típica (a dos presos), e até porque na
maioria das vezes o (s) interlocutor (es) não consegue (m) decifrar – ou decifra (m)
de maneira equivocada – a mensagem transmitida por aquele que faz uso desse tipo
de linguagem.
Na Tabela 5 pode-se constatar que 60,10% dos Agentes Penitenciários que
responderam à variável admitiram em graus correspondentes a “bastante” e “um
pouco” fazer uso da linguagem e gíria institucional penitenciária, típica do preso. Isso
aponta para a lógica de que a linguagem enquanto instituição é um elemento
essencial ao ser humano, pois é parte integrante e indispensável em sua
comunicação, e pelo constante e intenso contato que o Agente Penitenciário
mantém com o grupo recluso, destacando-se a interação lingüística, é de se
conceber que a transferência deste tipo de linguagem passe a integrar a linguagem
do profissional.
A comunicação através da linguagem falada não é restrita para Agentes
Penitenciários – ou outros servidores – e presos, ressalvando, obviamente, que a
permissão se restringe aos diálogos dentro de um ordenamento profissional,
estabelecendo-se os espaços naturais necessários que ocupam, pelas suas
condições, os presos e os servidores. Isto equivale a dizer que presos e
principalmente Agentes Penitenciários, pela proximidade, mantêm uma comunicação
dinâmica. Assim, ocorre que “as pessoas da equipe dirigente e os outros internados
automaticamente adquirem o direito de empregar uma forma íntima de chamar a
pessoa, ou uma maneira formal e truncada para fazê-lo (...), isso nega o direito de
manter-se distante dos outros, através de um estilo formal de tratamento”
(GOFFMAN, 2005, p. 36).
GOFFMAN (2005: 19) aponta que se faz necessária a comunicação entre os
presos e a equipe de Agentes Penitenciários, porém “uma das funções do guarda é
o controle da comunicação entre os internados e os níveis mais elevados da equipe
dirigente” . Descreve ainda que uma ‘gíria institucional’ é criada pelos presos14 a fim
de descreverem “os acontecimentos decisivos em seu mundo específico”. E que “a
14
“Internados”, conforme termo por ele utilizado.
80
equipe dirigente, principalmente em seus níveis inferiores, conhece também essa
linguagem, e pode usá-la ao falar com os internados, embora passe a linguagem
mais padronizada quando fala com superiores e estranhos” (GOFFMAN, 2005, p.
53).
Esse controle de “passar a uma linguagem mais padronizada quando fala
com superiores ou estranhos” pode ser relativizado quando constatamos o
percentual já demonstrado pela Tabela 5. MORAES (2005, p. 231), em
demonstração através de entrevistas realizadas com Agentes Penitenciários, revela
a constatação por parte de um entrevistado que afirma: “A cultura do preso acaba
com a gente. A gente começa a falar15 como preso, daí a pouco a família também.”
Em outro momento o entrevistado comenta: “ao chegar em casa, no ambiente de
família, deixar, sair do trabalho não é fácil. A gente acaba levando muita coisa pra
família: é gíria16, é jeito, é tudo...” (MORAES, 2005, p. 231).
Assim, os fatores relacionados à alteração de vestimentas e do uso da
linguagem e gíria institucional penitenciária tornam evidente o direcionamento para
se constatar uma relevante adoção na mudança de hábitos por parte da categoria
profissional de Agentes Penitenciários, relacionados diretamente com o ambiente
prisional e pela saturação de contatos com o grupo de reclusos.
5.3 AS ALTERAÇÕES EMOCIONAIS E DE COMPORTAMENTOS
Os mais relevantes e preocupantes aspectos relacionados ao trabalho do
Agente Penitenciário no espaço prisional relacionam-se aos fatores de ordem
emocional e comportamental. As competências peculiares à função dessas ordens
exigem desempenho físico e de raciocínio apurados, além de um elevado equilíbrio
psicológico.
Isto está também previsto na definição do Perfil Profissiográfico (2004) do
cargo/função do Agente Penitenciário que prevê, além de outras peculiaridades, ao
profissional contemplar:17 aceitar e cumprir com naturalidade as ordens de serviço e
15
Grifo do autor.
Idem.
17
As peculiares descritas relacionadas aos fatores emocional, psicológico e cognitivo são em maior
número, dadas a importância e a grande exposição a esses por parte do Agente Penitenciário.
16
81
normas disciplinares que recebe; capacidade de decisão em situações imediatas e
imprevisíveis; equilíbrio e maturidade emocional; potencial para o desenvolvimento
de raciocínio lógico; trabalhar com análise e síntese; facilidade para enfrentar
situações de relacionamento humano; resistência à pressão; adaptação ao trabalho
rotineiro e repetitivo; percepção crítica; capacidade de manter em sigilo informações
de caráter confidencial preservando sua integridade e a dos presos ou internados;
demonstrar possuir valores e princípios morais e éticos que o habilitem a exercer a
função de maneira íntegra.
Nesse sentido, a exposição do profissional quando em serviço às constantes
pressões exercidas pelos detentos – e muitas vezes somadas à de superiores e da
sociedade –, a submissão a ordens e normas, raciocínio lógico, rápido e eficiente,
além de diversas situações de conflito que exigem intervenção e decisão acertadas,
estão presentes na rotina do ambiente prisional atingindo diretamente o Agente
Penitenciário.
Pelas características do trabalho penitenciário, possivelmente não causa
nenhum estranhamento àqueles que estão alheios a este relacionar as diversas
situações críticas, de perigo e pressões psicológicas aplicadas ao Agente
Penitenciário, pois é de se conceber tais situações como pertencentes a um
ambiente carcerário. Assim, a sensação de insegurança, o comportamento agressivo
e as tendências para tornar-se um indivíduo ansioso, depressivo e estressado, estão
propensos a serem transferidos para o meio externo, atingindo em diversos graus as
pessoas que fazem parte das relações sociais do Agente Penitenciário.
Deste modo, a mensuração dos dados das Tabelas 6 a 11, que tratam das
variáveis relacionadas à insegurança, ansiedade, nervosismo, agressividade,
estresse e depressão, compreenderam um bloco específico, e sugeriram que os
Agentes Penitenciários deveriam responder quanto à afetação dos graus de
absorção nessas variáveis que interferem justamente quando estão fora do
estabelecimento penal, e que, por relação, atingem as pessoas com as quais
convivem.
Os resultados foram bastante expressivos, pois se têm índices entre 59,67%
a 90,06% para as respostas dos Agentes Penitenciários que assinalaram o
questionário nas opções “bastante” e “um pouco”, afirmando assim que em menor ou
82
maior grau perceberam alterações emocionais e de comportamento quando fora do
ambiente prisional.
GOFFMAN (2005, p. 22) afirma que vida familial contrasta “com a vida
solitária, mas, na realidade, um contraste mais adequado poderia ser feito com a
vida em grupo, pois aqueles que comem e dormem no trabalho, com um grupo de
companheiros de serviço, dificilmente pode manter uma existência doméstica
significativa.”
Assim, em relatos dos Agentes Penitenciários após responderem ao
questionário aplicado, muitos disseram que a família é o principal grupo social
atingido pelos efeitos causados pela alta carga emocional e situações críticas a que
estão submetidos no trabalho. Isto porque as pessoas da família são as que estão
mais próximas, em contato permanente, e aquelas que permitem maior intimidade
para manifestarem suas alterações emocionais e comportamentais.
GOFFMAN (2005, p. 23) relaciona que quanto maior o tempo que o indivíduo
permanece numa instituição total maior será a dificuldade em “enfrentar alguns
aspectos de sua vida diária”.
MORAES (2005) aponta sua insistência para que os entrevistados falem
subjetivamente sobre as doenças ou problemas de ordem física e principalmente
psicológica, havendo notada resistência e convergência para “o outro” como afetado
pela sobrecarga inerente à função. Porém, um Agente Penitenciário – tendo esse
comentário como exemplo –, relata em resumo o que supostamente acontece em
outras situações familiais: “Sabe, eu me surpreendi pô gritando com a minha filha,
sendo áspero com minha mulher ou ralhando por causa de bobagem, entendeu,
porque você sai carregado da cadeia, o estresse é muito grande” (MORAES, 2005,
p. 232).
Quando percebemos as disposições institucionais que determinam as
peculiaridades pessoais do Agente Penitenciário, apresentadas através de como
deve ser seu perfil, coerente seria sistematizar um suporte para manter o equilíbrio
desse perfil. Desta forma, como referido anteriormente, GUIMARÃES (2007) alerta
de que os fatos que afetam o equilíbrio emocional dos funcionários devem ser
conhecidos por quem os dirige. Esse é um fator fundamental para se poder manter a
saúde do Agente Penitenciário, principalmente a sua saúde mental. Quando temos o
trinômio “instituição – objetivo – colaborador (servidor)”, para a administração
83
moderna se estabelece um círculo que deve ser funcional, ou seja, o objetivo de
uma instituição deve ser claramente transmitido ao colaborador. Este, por sua vez,
deve entender e assimilar o objetivo para desempenhar suas funções dentro da
missão proposta, mas, para isso, também deve sustentar um vigor físico e mental
para desenvolver e manter sua eficiência.
É por esse entendimento que a saúde do servidor é compromisso da
instituição, mesmo porque no trinômio supra mencionado, um é diretamente
comprometido com o outro; a manutenção de um depende da sustentabilidade do
outro. O Sistema Penitenciário do Paraná até o momento não conta com nenhum
programa amplo de assistência que seja específico, sistemático e operacional e que
auxilie na saúde do Agente Penitenciário, dadas as singularidades da profissão.
Neste sentido, um programa de assistência não pode ser lacônico. Deve originar-se
da ampla discussão técnica – incluindo toda a classe dos Agentes Penitenciários –
que compreenda um planejamento sustentado e circunstanciado a partir do
conhecimento efetivo e eficaz relacionado ao profissional Agente Penitenciário e de
toda a dinâmica de seu trabalho. Isto foi apontado por MORAES (2005, p. 249), e
demonstrado em seção anterior, quando se pergunta ao Agente Penitenciário: “que
tipo de assistência o Estado dá pra vocês?”, sendo a resposta do Agente
Penitenciário: “Nenhuma. Efetiva nenhuma. (...) Agora nós temos um drama mais
sério que é psicólogo, e essa assistência não é dada nenhuma.” Mais adiante diz:
“Não tem nenhum acompanhamento médico, psicológico nenhum, o que é viável,
né?...” (MORAES, 2005, p. 250).
O Inventário (2005) aplicado pela Escola Penitenciária do Paraná, numa
questão formulada que perguntava ao Agente Penitenciário se ele acreditava que o
seu trabalho contribuía para determinados problemas (incluídos como opção), foram
assinaladas
por
697
Agentes
Penitenciários,
1554
respostas,
sendo:
cansaço/estresse (512), irritação e nervosismo (354), ansiedade (258), tristeza (102),
desânimo (117) e dificuldade para dormir (211). Isto demonstrou um grande alerta
para os dirigentes sobre o grau de comprometimento dos Agentes Penitenciários
relacionado aos fatores físicos, emocionais e psicológicos, assim como que os
mesmos tinham consciência desses problemas que os acometem.
Ainda neste mesmo Inventário (2005), foram assinaladas 1113 respostas por
697 Agentes Penitenciários para a pergunta que tratou da questão sobre se eram
84
percebidas, em relação aos seus colegas de trabalho e/ou chefia, algumas das
situações (incluídas como opção), sendo assinaladas: gritos (168), baixa auto-estima
(263), intimidação (136), desqualificação (265), depreciação (126) e medo (155). É
certo que também essas situações são contributivas para potencializar os problemas
relacionados aos fatores emocionais e psicológicos mencionados anteriormente.
Consigna-se aqui que depois de apresentado o questionário utilizado neste
trabalho para anotarem suas respostas, foi solicitado aos Agentes Penitenciários
que, reunidos em grupos, sugerissem alternativas para amenizar a carga dos efeitos
físico-emocionais e psicológicos a que estão submetidos. Todos os grupos, somados
564 Agentes Penitenciários, apontaram a necessidade de atendimento psicológico
específico – dado à tipicidade do trabalho penitenciário – e a adoção de escala de
trabalho de 24X72 (vinte e quatro horas de trabalho por setenta e duas de descanso)
como aplicada em alguns estados do Brasil. A referência à escala de trabalho se
deu por ocasião da iminência em se mudar a escala vigente à época (2005) de 24X
48 para 12X36, que é a escala atual. No Inventário (2005), dos 669 Agentes
Penitenciários que responderam quanto à avaliação sobre o horário de trabalho que
praticavam18, 45% afirmaram ser “ótimo”, 22% “muito bom” e 23% “bom”, o que
totaliza uma satisfação entre “boa” e “ótima” de 90%. Ainda houve 6% de respostas
pra “regular” e 4% para “ruim”. Isso constata a satisfação dos Agentes Penitenciários
com a escala de trabalho que desenvolviam e, conseqüentemente uma negativa
para a alteração de outra forma de jornada de trabalho em turnos.
Referente à mudança de escala de trabalho, CHIES et al. (2001) afirma que
os Agentes Penitenciários que participaram de sua pesquisa – e que praticavam a
escala de 24X72 – não entendem como satisfatória a mudança da escala com
período diferente ao que praticam na justificativa de amenizar a sobrecarga dos
períodos de plantão: “A folga e o período de descanso seriam menores, a
preocupação seria maior” (CHIES et al., 2001, p. 105). Adiante afirma: “E, nesse
sentido inclusive através de aprofundamentos dos estudos acerca da validade dos
efeitos do sistema de plantões, como hoje vigente (...) não obstante a aparente
adesão e aceitação do mesmo por parte dos Agentes Penitenciários (... não
18
24X48 (vinte e quatro horas de trabalho por quarenta e oito de descanso).
85
entendem como benéfica uma duração menor dos plantões)” (CHIES et al., 2001, p.
115).
Frente ao exposto, as alterações emocionais e de comportamentos ficaram
evidenciadas, através dos resultados, assim como a modificação de hábitos e
fatores quanto à rigorosidade, todos esses decorrentes do “processo diferenciado de
socialização”.
O ambiente prisional com suas características de fechamento, típico das
instituições totais, o intenso contato dos Agentes Penitenciários com esse ambiente
e com o grupo recluso e sua “cultura”, convergem para uma dessocialização quando
comparados aos padrões conhecidos e aceitos na sociedade geral, pois que resulta
no processo de socialização diferenciado, a prisionização. Foi este processo, a
prisionização, que pode ser demonstrado neste trabalho enquanto um fenômeno
presente que acomete os Agentes Penitenciários participantes da pesquisa.
5.4 SÍNTESE DOS PRINCIPAIS RESULTADOS
Os resultados demonstraram que os Agentes Penitenciários do Estado do
Paraná integrantes da pesquisa participam de uma socialização diferenciada – a
prisionização – com assimilação dos fatores a ela relacionados, em diferentes graus,
haja vista o intenso contato que mantêm com o ambiente prisional por conta de sua
atipicidade e, conseqüentemente, com o grupo recluso.
Os dados relativos aos graus estabeleceram que, em relação ao grau “Nada”,
o maior percentual de respostas compreendeu a variável “Agressividade”, com
41,31% de respostas. O mínimo ficou para a variável “Disciplina”, com 4,97% de
respostas. Assim, estabeleceu-se que dentro do universo de itens analisados, a
variável “Agressividade” é a que menos afetou os Agentes Penitenciários; já a
“Disciplina” – como enfatizado anteriormente, na descrição básica da função, ou
seja, “Manter a disciplina...” – foi a que mais afetou os profissionais. O grau “Um
pouco” apresentou o maior percentual na variável "Mudanças gerais de
comportamento”, com 54,43% de respostas; o menor compreendeu a variável
“Rigorosidade quanto ao horário de suas atividades e/ou de outros”, com 37,41%
das respostas. O grau “Bastante” apresentou o maior percentual na variável
86
“Estresse”, com 49,81% de respostas e a variável “Mudança do linguajar, com uso
de gírias institucional”, o menor, com 8,33% das respostas.
Por fim, se verificarmos os graus de adoção positiva dos fatores da
prisionização na acumulação dos graus “Um pouco” e “Bastante”, a menor soma
compreendeu a variável “Alteração no modo de se vestir”, com 56,92% das
respostas, e a maior soma na variável ao sentimento do “Estresse”, com 90,06% de
respostas. Esses dados alertam para os altos graus de comprometimento a que
estão submetidos os Agentes Penitenciários face à exposição do fenômeno da
prisionização.
87
6 CONCLUSÃO
Consoante ao tema “prisionização” optou-se por estudar as afetações
mensuradas por graus de intensidade – sendo estes avaliados pelos próprios
Agentes Penitenciários participantes da pesquisa –, com ênfase na maior, menor ou
nenhuma assimilação dos hábitos, comportamentos e cultura da prisão, e o
desenvolver e/ou intensificar sentimentos condicionados ao papel que desempenha
no ambiente prisional, devendo-se relacionar esses graus a si e à sua exigência a
terceiros, quando fora do espaço prisional. Concluiu-se, pela demonstração da
pesquisa, que os Agentes Penitenciários do Estado do Paraná integrantes da
pesquisa, estão submetidos a um “processo de socialização”, a prisionização,
decorrente do contato intenso que mantêm com a instituição penitenciária e com o
grupo recluso.
Esta pesquisa resultou em contribuições e limitações, não diferente de outras
pesquisas empírico-científicas.
Quanto às contribuições, pode-se destacar o pioneirismo em se estudar o
fenômeno da prisionização no Estado do Paraná, tendo como alvo específico o
grupo de Agentes Penitenciários, o que foi possível comprovar, e o desvelar do alto
grau de assimilação do fenômeno a que estão submetidos os Agentes
Penitenciários, uma vez que os escassos estudos existentes na literatura apontam o
grupo recluso como a grande categoria implicada e prejudicada pela convivência e
confinamento na instituição total penitenciária.
O estudo revela o estresse, que acarreta várias conseqüências sistêmicas,
como um dos grandes males atuais na classificação dos distúrbios emocionais que
afeta os Agentes Penitenciários, e ratifica a profissão como de altíssimo grau
estressante, além da estabelecida natureza penosa, perigosa e insalubre.
O universo da pesquisa, 564 Agentes Penitenciários, de diversas Unidades
Penais, diferentes idades, tempos de serviço e múltiplos vínculos com a função,
permitiram incluir dimensões de análises significativas que não contemplou relações
específicas do profissional atrelada a tempo, espaço ou lugar. Assim, objetivamente
pelo estudo num universo amplo e diversificado, não ocorreram tendências para
subgrupos de Agentes Penitenciários com maior ou menor propensão em assimilar o
88
processo de socialização e seus fatores de interferência; não que uma
sistematização com focos delimitados a diferentes grupos seja menos importante.
Talvez a contribuição mais importante foi o desvelar do significativo
comprometimento ao qual está submetida a classe profissional de Agentes
Penitenciários em face da exposição à prisionização, e os conseqüentes prejuízos
que esta acarreta.
A limitação desta pesquisa diz respeito ao delineamento adotado para a
resultante dos dados, uma vez que preponderantemente não se estabeleceu relação
dos graus avaliados com categorias como gênero, local de trabalho, tempo de
serviço, especificidades de atribuições, assim como cruzamentos dos dados que
resultassem em delimitações desses graus.
Aponta-se a validade de um estudo que contemple grupos distintos de
Agentes Penitenciários – dada a realidade múltipla existente no Sistema
Penitenciário do Paraná – no qual se estabeleçam categorias distribuídas entre
Agentes Penitenciários, constituídas, por exemplo, de gênero, estabelecimentos
penais que atuou, tempo de serviço, tempo que atua (ou atuou) na função específica
de Agente Penitenciário, os treinamentos formais que receberam, além de outros.
Tais categorias podem determinar com resultados específicos as classificações nas
quais estão inseridos os diversos grupos constituídos e seus respectivos graus de
assimilação relacionados ao fenômeno da prisionização.
Importante seria também um estudo longitudinal com Agentes Penitenciários
para avaliar no decorrer do tempo de serviço a assimilação de hábitos, costumes e
comportamentos advindos da prisionização, assim como os efeitos dos fatores
relacionados à saúde física e emocional, com seus graus de intensidade, causados
pelo ambiente prisional, haja vista que em função de concurso público estadual em
andamento, existem Agentes Penitenciários que há pouco tempo ingressaram no
Sistema Penitenciário e outros que ainda estão por ingressar. À época desta
pesquisa, onze anos era o menor tempo de serviço que tinham os Agentes
Penitenciários participantes.
Em linhas gerais, percebe-se que o Sistema Penitenciário carece de estudos
científicos em suas diversas áreas que compreendam perspectivas com enfoque
para todo o grupo de funcionários e seus comprometimentos organizacionais nas
89
dimensões sócio-jurídicas de seus papéis. Todavia, importante se faz que esses
estudos contemplem um aspecto transversal, interdisciplinar de abordagem.
Contudo, numa dimensão prática e urgente, necessário se faz, em virtude dos
dados resultantes da pesquisa deste trabalho, que o grupo diretivo penitenciário, em
suas múltiplas hierarquias, adote medidas eficazes que contemplem políticas de
gestão que incluam o treinamento contínuo, auxílio terapêutico adequado e
específico, além de condições de trabalho que atendam a prerrogativa essencial do
bem-estar físico e mental do Agente Penitenciário. Também a geração de programas
de assistência para a qualidade de vida que incluam o grupo profissional de Agentes
Penitenciários e seus grupos sociais de convivência – em especial a família –, assim
como contemple uma efetiva participação da categoria nos múltiplos programas que
envolvem as questões penitenciárias.
Ao fim, este trabalho pretendeu contribuir com o estudo da prisionização
relacionado à classe dos Agentes Penitenciários do Estado Paraná – distintos atores
do desafiante e complexo trabalho penitenciarista –, assim como despertar sobre o
tema novos interesses para o desenvolvimento de outras pesquisas.
90
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94
ANEXO
DEPOIS DE SUA ENTRADA NO SISTEMA PENITENCIÁRIO:
A. Você se julga mais rigoroso quanto:
1. À sua disciplina?
( ) Um pouco ( ) Bastante
( ) Nada
2. À disciplina das pessoas com as quais convive?
( ) Um pouco ( ) Bastante
( ) Nada
3. Ao horário de suas atividades e/ou de outros?
( ) Um pouco ( ) Bastante
( ) Nada
B. Você alterou hábitos quanto:
4. À sua forma de se vestir?
( ) Um pouco ( ) Bastante
( ) Nada
5. À sua forma de falar, adotando gírias institucional?
( ) Um pouco ( ) Bastante
( ) Nada
C. Você se sente mais:
6. Ansioso?
( ) Um pouco
( ) Bastante
( ) Nada
7. Inseguro?
( ) Um pouco
( ) Bastante
( ) Nada
8. Estressado?
( ) Um pouco
( ) Bastante
( ) Nada
9. Nervoso?
( ) Um pouco
( ) Bastante
( ) Nada
10. Agressivo?
( ) Um pouco
( ) Bastante
( ) Nada
11. Depressivo?
( ) Um pouco
( ) Bastante
( ) Nada
D. Você tem a sensação de estar sendo vigiado?
12. ( ) Um pouco ( ) Bastante
( ) Nada
E. Você percebeu mudanças gerais em seu comportamento?
13. ( ) Um pouco ( ) Bastante
( ) Nada