Versão em PDF - FIOCRUZ Teses

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Versão em PDF - FIOCRUZ Teses
ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA
DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO
EM SAÚDE
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
EMPODERAMENTO DE IDOSOS EM GRUPOS DIRECIONADOS À
PROMOÇÃO DA SAÚDE
MIRNA BARROS TEIXEIRA
Orientadora: Prof. Dra. SELMA DE SOUZA LEÃO
Rio de Janeiro, RJ - Brasil
-
Abril de2002 -
Empoderamento de idosos em grupos
direcionados à Promoção da Saúde
Mirna Barros Teixeira
Dissertação submetida ao corpo docente da
Escola Nacional de Saúde Pública da
Fundação Oswaldo Cruz, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do grau
de Mestre em Saúde Pública.
Aprovada por:
______________________________
Prof. Dra. Selma de Souza Leão
_______________________________
Prof. Dra. Maria de Fátima Lobato
_______________________________
Prof. Dra. Sara Nigri Goldman
Rio de Janeiro, RJ – Brasil
12 de abril de 2002 -
Teixeira, Mirna Barros
Empoderamento de idosos em grupos de Promoção da Saúde. Rio de
Janeiro: Fiocruz, ENSP, Curso de Pós-Graduação em Psicologia, 2002.
Dissertação: Mestre em Saúde Pública.
1. Envelhecimento
2. Empoderamento
3. Promoção da Saúde
4. Grupos
5. Apoio Social
I. Escola Nacional de Saúde Pública, Departamento de Planejamento e
Administração em Saúde, Fundação Oswaldo Cruz.
II. Título
Dedico esse trabalho...
À memória da minha avó Luza, eternamente querida
Agradecimentos
Quero fazer um agradecimento especial a minha mestra e amiga, Ligia Py, que com a
sua sensibilidade e pensamento crítico, me apresentou o campo do envelhecimento. Sendo
fundamental para a elaboração deste trabalho, seus ensinamentos da gerontologia e a sua
postura aberta à criação, para que seus alunos venham a descobrir, em si mesmos, seus
estilos próprios de atuação profissional.
Agradecer aos meus pais, aos meus avós e toda a minha família pelo carinho, afeto e
cumplicidade, passados ao longo do meu desenvolvimento, e que me fizeram atingir a
juventude com consciência crítica e o desejo de conhecimento; e a minha mãe, em
especial, pela ajuda fundamental na transcrição dos textos de língua estrangeira.
Às minhas irmãs Milene, Mirele e Myriam pelo convívio afetivo.
À Selma, minha orientadora, por sua disponibilidade, ensinamentos e apoio,
fundamentais durante todo o processo de criação e elaboração desta dissertação. E por
acreditar nessa proposta desde o início.
À Alda, a Marcelo e a todos os meus colegas de mestrado pela afeição e pelas nossas
conversas, onde vários insights foram possíveis;
Ao INDC - Instituto de Neurologia Deolindo Couto da UFRJ - que me permitiu
realizar essa investigação.
A Capes – Coordenação de aperfeiçoamento de pessoal de nível superior do
Ministério da Educação - que subvencionou recursos para a efetivação desta pesquisa.
Ao PROVE e a todos os idosos, que a partir da sua convivência me suscitaram
questões relacionadas ao processo de envelhecimento saudável, me fazendo buscar o
mestrado para a sua elucidação.
Agradeço, especialmente, aos usuários do PROVE que participaram das entrevistas e
do grupo focal, pela disponibilidade com que se colocaram para responder as indagações e,
porque foi, a partir de suas falas e relatos de experiências de vida, que me foi possível
entender melhor o processo de envelhecimento com qualidade de vida.
Resumo
Este trabalho buscou investigar o empoderamento de pessoas idosas a partir da
participação em grupos de encontro, direcionados à Promoção da Saúde. Partindo-se do
pressuposto que o aumento da longevidade provoca o desempoderamento compreendido
como perda da autonomia positiva das pessoas idosas devido à imagem negativa da
velhice, associada a perdas fisiológicas, psicológicas e sociais; levanta-se a hipótese de que
a participação de pessoas idosas, na dinâmica de grupos voltados para a valorização do
envelhecer, implica no favorecimento do empoderamento, que se traduz em autonomia
positiva. O método utilizado se apoiou na entrevista e no grupo focal estando inserido na
Pesquisa Qualitativa em Saúde. Utilizou-se, como campo de investigação o grupo de
idosos do PROVE – Projeto de Valorização do Envelhecer, cujo objetivo é promover um
espaço onde os idosos, possam estar discutindo assuntos voltados para o fenômeno da
longevidade. Investiga-se esse grupo de encontro de idosos a partir de sua proposta de
construção positiva da velhice. Os resultados demonstraram que a participação dos idosos
em grupos voltados para o envelhecimento, favorece o empoderamento, expressa em
autonomia positiva, na medida em que os grupos atuam como apoio social aumentando a
rede social dos idosos, proporcionando a diminuição da alienação através de uma reflexão
crítica acerca dos valores negativos associados à velhice. E, constata-se, ainda, o
incremento de conhecimentos, através da incorporação e aplicação em suas vidas
cotidianas conteúdos da área da Geriatria e Gerontologia ministrados através das palestras.
Desse modo este trabalho tem como pretensão, a partir de referências teóricas do campo da
Promoção da Saúde onde se insere o tema do empoderamento e de uma consideração
metodológica, problematizar a possibilidade de abordagem e soluções de questões da
promoção da saúde no campo do envelhecimento e a busca de novos espaços para a
promoção da construção da autonomia das pessoas avançadas no tempo.
Abstract
This paper sought to investigate the empowerment of elderly people through
participation in group discussions aimed at promoting health. Assuming that with the
increase of longevity a process of unempowerment occurs - unempowerment is understood
here as the loss of positive autonomy of elderly people due to a negative view of elderly
age associated with physiological, psychological and social losses -, we put forward a
theory that says that the participation by elderly people in group dynamics aimed at valuing
the aging process facilitates empowerment, and manifests itself in positive autonomy. The
method used based itself on the interviews and focal group, part of the Qualitative
Research on Health. As investigation field, the PROVE – “Projeto de Valorização do
Envelhecer” group of elderly people was used. This group aims at promoting a space
where elderly people can discuss issues related to longevity. The starting point for the
investigation of this discussion group is its proposal for a positive construction of elderly
age. The results showed that participation in groups that focus on elderly age facilitates
empowerment, expressed as positive autonomy, since the groups act as social supports,
increasing the social network of the elderly, decreasing their alienation through a critical
reflection of negative values usually associated with old age. An increase of knowledge is
also be observed, through incorporation and application of geriatrics e gerontology
information in their everyday lives, learnt during the group sessions. Therefore this paper
aims to, from theoretical references about the Health Promotion field, in which
empowerment as a theme fits, and from a methodological consideration, question the
possibility of an approach and of a solution to health promotion issues related to growing
old and the search for new spaces for promoting autonomy construction for elderly people..
Epígrafe:
Conto: “Falamos do medo de envelhecer”1
“Na viagem desde o aeroporto de Boston, contei os outdoors com gente jovem e bonita.
Um mostrava um rapaz simpático de chapéu de cowboy fumando um cigarro, outro duas
moças lindas sorrindo para um vidro de xampu, o terceiro uma adolescente espevitada
com o jeans aberto na cintura, o seguinte uma mulher insinuante vestida de veludo preto
ao lado de um homem de smoking, cada um agarrado a um copo de uísque.
Não vi nenhum outdoor mostrando alguém de mais de trinta e cinco anos. Disse a Morrie
que já me sentia na ladeira abaixo, apesar de me esforçar desesperadamente para ficar no
alto dela. Eu me exercitava constantemente. Tinha cuidado com o que comia. Vigiava as
entradas do meu cabelo no espelho. Não me sentia mais ufano de revelar a minha idade –
por Ter realizado tanta coisa ainda jovem – e agora evitava falar nela por estar bem perto
dos quarenta e, consequentemente, me aproximando do esquecimento profissional.
Morrie envelhecera com uma perspectiva melhor.
- Essa ênfase toda na juventude não tem sentido para mim – Sei que ser jovem pode ser
um problema e tanto, por isso não venha me dizer que é uma maravilha. Aquele
garotos todos que me procuraram com seus grilos, seus conflitos, seus
desajustamentos, a sensação de que a vida é dura, tão difícil que pensavam em se
matar...
- E além de tudo isso, os jovens não tem sabedoria. Pouco compreendem a vida. Quem
que viver cada dia quando nem sabe o que está acontecendo? Quando somos
manipulados, quando nos dizem para comprar tal perfume para ficar bonito, ou tal
marca de jeans para ficar sexy? E quem dá essas sugestões tem crédito! É tal absurdo.
- Você nunca teve medo de envelhecer?
- Mitch, eu acolho o envelhecimento.
- Acolhe?
- É muito simples. À medida que se cresce, aprende-se mais. Se ficássemos parados nos
vinte e dois anos, ficaríamos sempre ignorantes como quando tínhamos vinte e dois.
Envelhecer não é só decair fisicamente. É crescer. É mais do que o fato negativo de
que se vai morrer, é também o fato positivo de que se compreende que se vai morrer e
que se pode viver melhor por causa disso.
- É – eu disse – mas, se envelhecer fosse tão valiosos, porque as pessoas vivem dizendo,
“ah, se eu ainda fosse jovem...?” Nunca ouvimos ninguém dizer, “quem me dera já ter
sessenta e cinco!”.
Ele sorriu e acrescentou:
- Sabe o que significa isso? Vidas insatisfeitas. Vidas sem realizações. Vidas que não
encontraram um sentido. Quem encontra um sentido para a vida não deseja mais
voltar atrás. Deseja ir em frente. Quer ver mais, fazer mais. Não se pode ficar
esperando chegar aos sessenta e cinco.
- Ouça. Você precisa saber mais uma coisa. Todas as pessoas mais jovens precisam
saber disso. Quem passa o tempo batalhando contra o envelhecimento sempre será
infeliz, porque o envelhecimento é inexorável! E Mitch?
1 1
Um conto sobre o medo de envelhecer entre um aluno que reencontra seu professor de faculdade vinte
anos depois de formado. Morrie, seu professor está com uma doença terminal – ELA (Esclerose Lateral
Amiotrófica) e nesse reencontro, conversam sobre as verdadeiras questões da vida, as questões que ele
chama de essenciais durante 13 encontros, entre essas questões está o medo de envelhecer. Livro: “A última
grande lição: o sentido da vida” de Mitch Albom. Tradução José J. Veiga. Rio de Janeiro: GMT/Sextante,
1998. 14º ed.; (pp.114-119).
Ele abaixou a voz:
- A verdade é que você vai morrer um dia.
Concordei.
- Não importa o que disser a si mesmo.
- Eu sei.
- Mas, felizmente, vai levar muito, muito temo.
Fechou os olhos com uma expressão serena, depois me pediu para ajeitar os travesseiros
sob a cabeça. Seu corpo precisava mudar constantemente de posição para se sentir
confortável. O corpo ficava calçado na cadeira com travesseiros brancos, espuma de
borracha amarela e toalhas azuis. Visto de relance, parecia que Morrie estava sendo
acondicionado para ser despachado.
- Obrigado – murmurou, enquanto eu ajeitava os travesseiros.
- Tudo bem.
- O que você está pensando, Mitch?
Pensei um pouco antes de responder.
- OK. Estou imaginando porque será que você não inveja pessoas mais jovens e de boa
saúde.
- Bem, acho que invejo – Fechou os olhos - Invejo-os por poderem ir a uma academia
de ginástica, ou a uma piscina. Ou dançar. Sobretudo dançar. Mas a inveja vem, eu a
sinto e depois deixo-a ir. Lembra-se sobre o que eu disse sobre desapego? Deixe
passar. Diga a si mesmo, “isso é inveja. Vou me separar dela agora”. E vire-lhe as
costas.
Tossiu uma tosse prolongada, roufenha. Empurrou um lenço de papel até a boca e cuspiu
fracamente nele. Sentado ali, eu me sentia tão mais forte do que ele, ridiculamente mais
forte. Poderia erguê-lo facilmente e jogá-lo nas costas, como se fosse um saco de farinha.
Sentia-me envergonhado dessa superioridade, porque não me sentia superior a ele em
nada mais.
- Como é que você evita invejar...
- O que?
- ...uma pessoa como eu.
Ele sorriu.
- Mitch, é impossível a um velho não invejar um jovem. Mas a questão é aceitar o que
somos e gostar. Você está no tempo dos seus trinta anos, e agora estou no tempo de ter
setenta e oito.
- Precisamos descobrir o que existe de bom e verdadeiro e belo em cada fase de nossa
vida. Olhar para trás estimula a competição. E idade não é assunto de competição.
Expirou e baixou os olhos, como se quisesse ver o ar expirado se espalhar no ar.
- A verdade é que cada parte minha tem todas as idades. Sou uma criança de três anos,
uma de cinco, um homem de trinta e sete, um de cinqüenta. Passei por todas essas
idades e sei como é cada uma. Delicio-me com ser criança quando é apropriado ser
criança. Delicio-me em ser um velho que sabe das coisas quando é apropriado ser um
velho sábio. Imagine tudo o que posso ser! Sou todas as idades, da atual para baixo.
Percebeu?
Respondi afirmativamente.
- Como posso invejar a fase em que você está hoje, se já estive nela?
LISTA DE ANEXOS
ANEXO I : Roteiro para Trabalho de Campo - Roteiro de Entrevista ......................... I
ANEXO II Roteiro para Trabalho de Campo Roteiro do Grupo Focal .......................II
ANEXO III Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................................ III
ANEXO IV Tabela de Identificação dos entrevistados ................................................. IV
ANEXO V Ficha de Identificação ................................................................................... V
ANEXO VI Perfil dos Entrevistados ............................................................................... VI
ANEXO VII Relatório gerado no Programa LOGOS com as categorias de análise e
suas respectivas falas ............................................................................................ VII a XX
ANEXO VIII Grupo Focal .............................................................................XXI a XXVIII
Sumário
Introdução: ..........................................................................................Páginas
Contexto e Justificativa ................................................................................................... 1
Organização da dissertação ............................................................................................. 4
Objeto
Problema
Pressupostos
Hipótese
Corpo teórico:
Capitulo
1: Promoção de Saúde e Gerontologia................................................................ 7
1.1-Histórico e contribuições da Promoção da Saúde. .................................. 7
1.1.1.Empoderamento como estratégia de Promoção da Saúde
no campo do envelhecimento. ................................................ 10
1.2-Gerontologia: contribuições da psicologia do envelhecimento............. 13
Notas ............................................................................................... 23
Capítulo
2: Empoderamento como estratégia de ganho de saúde ................................... 24
2.1-Empoderamento: Reflexões teóricas ..................................................... 24
2.2-Empoderamento: uma articulação no campo do envelhecimento ......... 32
2.3-Autonomia positiva como um indicador de saúde................................. 40
Notas ............................................................................................... 44
Capítulo
3: Grupo como apoio social.............................................................................. 45
3.1. A experiência da vivência grupal.......................................................... 45
3.2. Apoio social e Rede social no espaço grupal....................................... 49
3.3. Um Grupo de Encontro do Idosos ........................................................ 55
Notas ................................................................................................ 58
Metodologia
Capítulo
Capítulo
4: Metodologia.................................................................................................. 59
4.1. Pesquisa Qualitativa em Saúde ............................................................. 59
4.2. Coleta de dados ..................................................................................... 60
4.3. Campo de investigação ......................................................................... 62
4.4. Trabalho de campo................................................................................ 63
4.5. Análise dos dados ................................................................................ 63
Entrevistas
Grupo Focal
Programa LOGOS
Notas ............................................................................................... 65
5: Resultados e Discussão................................................................................ 66
5.1.Perfil dos entrevistados .......................................................................... 66
5.2.Atividades e formas de participação dos idosos nos grupos ................. 66
5.3.Categorias de análise.............................................................................. 68
5.4.Considerações sobre a implicação da pesquisadora............................... 96
Notas ................................................................................................ 97
Conclusões........................................................................................................................... 99
Referências bibliográficas ................................................................................................. 102
Anexos .................................................................................................................... I - XXVIII
1
Introdução:
Contexto e Justificativa
O aumento da população idosa demanda ações de intervenção no campo do
envelhecimento. Estudos epidemiológicos atuais vêm demonstrando o aumento acelerado da
expectativa de vida da população brasileira, cujo envelhecimento está se dando em grande
escala neste final de século. Estima-se que no ano de 2025 o Brasil, que estava em 16º lugar
em 1950, deva passar para o 6º lugar no hanking mundial em número de idosos, com a
quantidade aproximada de 30 milhões (Silvestre, 1996).
Segundo estudo do IPEA, em 1996, o Brasil chegou a atingir 12, 5 milhões de indivíduos
acima de 60 anos, com um aumento na população acima dos 100 anos chegando a 10 mil. A
maior parte dos idosos é composta por mulheres (cerca de 54,4%). Com esse crescimento da
população idosa, observamos um envelhecimento populacional que muda o perfil
demográfico do Brasil (Camarano, 1999).
O IBGE, (1) no seu censo demográfico de 2000 apresentou dados preocupantes em
relação ao envelhecimento populacional brasileiro. A população geral do Brasil se encontrava
então com 169.799.170 milhões de habitantes; em relação à população idosa, o Brasil atingiu
a marca de 14.536.029 milhões, tendo São Paulo em primeiro lugar, seguido de Minas
Gerais, Rio de Janeiro e Espirito Santo respectivamente. O Rio de Janeiro, no ano de 2000,
apresentava uma população de 1 milhão 540 mil e 754 idosos; sendo que esse número só
tende a aumentar nos próximos anos.
Assim sendo, o envelhecimento populacional traz à tona a discussão do que é ser idoso.
A Organização Mundial de Saúde - OMS, define idoso, como aqueles indivíduos que tem
idade acima de 65 anos, para os países desenvolvidos; e 60 anos, para os países em
desenvolvimento. Devido a esse novo contigente se fazer presente na nossa atualidade,
começou-se a utilizar o termo “terceira idade” para designar indivíduos em idade avançada
que não apresentam sinais de senilidade e estão em boa qualidade de saúde. (Camarano, 1999:
07).
Lessa (1998) alerta para o fato de se olhar o envelhecimento como um processo, ou seja,
ele não começa aos 60 anos, esse marco cronológico é apenas um critério para definir
intervenções na população mais velha:
“O envelhecimento não começa repentinamente aos sessenta anos, mas consiste no
acúmulo de interações de processos sociais, biológicos e do comportamento durante
toda a vida, de modo que um indivíduo com menos de sessenta anos pode ser
considerado um idoso do ponto de vista orgânico, mental e intelectual, ao passo que
um septuagenário ou octogenário pode até ter todas essas funções preservadas, mesmo
uma mentalidade coesa com as demais gerações, cabendo-lhe a designação de idoso
apenas por sua idade cronológica.” (Lessa, 1998: 205).
1
2
Em relação ao perfil epidemiológico das doenças, na população idosa predominam as
chamadas doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), que são representadas pelas doenças
cardiovasculares, seqüelas de doenças cerebroarticulares, osteoarticulares, diabetes mellitus
doenças pulmonares e doenças psicorgânicas, como os diversos tipos de demência. Em
relação aos fatores de risco, Lessa (1998) chama a atenção para um fator importante para a
população idosa, que é a história social. A história social tem um papel determinante nas
patologias do idoso, mais até do que o próprio estilo de vida e a hereditariedade
Os fatores de risco para os idosos, que estão ligados à história social, são chamados por
essa autora, de patologia social como a causa da patologia orgânica – “alguns fatos de ordem
social que ocorrem predominantemente nas idades mais avançadas parecem influenciar a
ampliação da morbidade e da mortalidade do idoso tais como: viuvez, aposentadoria”(Lessa,
1998: 207). A viuvez é um fator de risco mais significante para a morbidade entre os viúvos
no primeiro ano da morte do cônjuge. A aposentadoria pode levar à completa inatividade e a
perda dos vínculos sociais e por isso os idosos ficam mais expostos às doenças associadas à
inatividade física.
Outro fator de risco importante para os idosos é a solidão. Ela pode ser vista como
resultado das mudanças sociais ocorridas nas últimas décadas, como: a redução do núcleo
familiar, a participação mais efetiva da mulher no mercado de trabalho fora do lar e a quebra
dos vínculos matrimoniais (Lessa, 1998).
Segundo Cusack (1999), deve-se entender a velhice como um período da vida inerente ao
desenvolvimento humano e não como um tempo de desagregação da vida comunitária. Devese olhar a velhice, como um tempo de engajamento ativo em desafios e atividades que podem
beneficiar ambos: os idosos e a sociedade. O primeiro passo para isso é o empoderamento
pessoal.
Envelhecimento, Violência e AIDS são os três maiores problemas ligados à saúde,
segundo Minayo (1995), e daí se estar autorizado a dizer que o envelhecimento é, atualmente,
uma questão de Saúde Pública:
“há um outro espaço fundamental a ser preenchido pela saúde pública. Trata-se do
engajamento dos idosos como atores culturais visando o acolhimento dos idosos como
atores nobres e essenciais na sociedade e a consideração da velhice como uma etapa
da existência que pode ser desfrutada saudavelmente” (1995:15).
Dentro da área da Saúde Pública, este projeto se embasa no campo teórico da Promoção
da Saúde. Justifica-se ancorar este trabalho neste campo, porque se entende a saúde como
uma dimensão da qualidade de vida, não como um produto ou um objetivo em si mesmo, mas
sim como um estado, ou melhor, um recurso fundamental para a vida cotidiana (OMS, 1984).
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Na atualidade, a nossa sociedade busca novos espaços de convivências para os idosos, de
forma a engajá-los e reintegrá-los no meio social. Por isso a necessidade e criação de tantos
grupos de convivência de idosos: para dar conta desse novo contingente que começa a
aparecer e se fazer presente na nossa sociedade.
Este trabalho desenvolvido no Mestrado está ancorado em uma experiência pessoal, com
um grupo de idosos, direcionado para a promoção da saúde no campo do envelhecimento que
compõem o Projeto de Valorização do Envelhecer - PROVE.
O PROVE, é um projeto que objetiva viver a velhice com qualidade de vida; e para isso
oferece várias atividades de grupo para pessoas acima de 60 anos. O PROVE surge em 1996,
num contexto epidemiológico caracterizado por mudanças na incidência e prevalência das
doenças, bem como nas principais causas de morte. A chamada transição epidemiológica,
“pressupõe uma evolução gradual dos problemas de saúde caracterizados por alta
incidência, prevalência e mortalidade por doenças infecciosas para um estado em que
passaram a predominar as doenças não-infecciosas, particularmente as
cardiovasculares, neoplasias malignas, causas externas, transtornos mentais, diabetes e
outras doenças crônicas e degenerativas” (Laurenti, 1990: 147)
O PROVE surge ainda, dentro de uma universidade pública, numa casa de saúde, de
forma que a universidade cumpra a sua função social de atender essa demanda que se
encontra emergente, criando uma forma de intervenção que dê conta dessa sociedade que
envelhece.
“Aqui a universidade pública assume a responsabilidade social de apresentar-se como
cidadã para responder ao clamor emergente dos mais velhos; acionando para isso toda
a sua capacidade de produção e experimentação de conhecimento” (Trein,1996).
O PROVE é o espaço propício para se dar essa investigação, na medida em que tem como
atividade primordial os “Grupos de Encontro de Idosos”, que trabalham com a informação e
reflexão dos processos ligados ao envelhecimento.
Pretende-se utilizar este grupo como o campo de investigação, pelo fato de abordar o
tema do envelhecimento; por encontrar-se sediado numa Instituição de Saúde Pública, dentro
de uma Universidade Pública; por trabalhar com as dinâmicas de grupo voltadas para a
promoção e educação em saúde dos idosos, como estratégia de intervenção no campo do
envelhecimento na direção da qualidade de vida; e finalmente, pelo interesse pessoal da
pesquisadora pelo PROVE, pois esta acompanhou seu planejamento, sua implementação, seu
crescimento e desenvolvimento; e, amadurecendo junto com ele, foi possível desenvolver uma
investigação no campo da saúde do idoso, dando continuidade à sua formação acadêmica no
Mestrado de Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública -ENSP.
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Organização da dissertação:
A escolha do tema “Grupos de idosos direcionados à promoção de saúde como estratégia
de intervenção no campo do envelhecimento através do favorecimento do empoderamento das
pessoas para lidar com os problemas suscitados pelo fenômeno da longevidade” está
relacionada ao interesse da pesquisadora no campo do envelhecimento; tema que se preocupa
em desenvolver, para esta dissertação, que faz parte do seu mestrado em Saúde Pública.
Assim, este trabalho tem como objetivo fazer a aproximação entre os campos da Promoção da
Saúde e o do Envelhecimento, de forma a tentar responder algumas perguntas que foram
surgindo no desenrolar do primeiro ano de Mestrado; tais como: Como promover a saúde no
campo do envelhecimento? Que referenciais teóricos são possíveis, para dar base a um
trabalho de Promoção da Saúde, no campo do Envelhecimento? Dentro da área da Promoção
da Saúde, em quais campos estará atuando?
Tais questionamentos direcionaram a escolha do objeto de estudo para “o empoderamento
de pessoas idosas construído ao longo da vida, se encontra em risco pela própria condição
de velhos e, pode ser estimulado na dinâmica dos grupos de encontro direcionados à
Promoção da Saúde.”
O problema que esta pesquisa procura responder é se a dinâmica de trabalho dos grupos
de idosos que se dedicam à promoção da saúde, poderia ser considerada um fator de
empoderamento, que lhes possibilitaria maior capacidade para lidar com a limitação da
autonomia decorrente da condição fisico-social das pessoas idosas.
Essa problematização se dá a partir de dois pressupostos: o aumento da longevidade
provoca o desempoderamento, compreendido como perda da autonomia positiva das pessoas
idosas devido à imagem negativa do envelhecimento associada à perdas fisiológicas,
psicológicas e sociais; e que os grupos - espaços de convivência de idosos, direcionados à
promoção de saúde - configuram-se como lugar de pertinência e agência de mudanças para o
empoderamento dos idosos, através de um processo de valorização do envelhecer, apoiado
na construção positiva da velhice.
Com isso pretende-se investigar a seguinte hipótese: “a participação de pessoas na
dinâmica dos grupos de encontro, destinados à promoção da saúde, implica no favorecimento
do seu empoderamento, que se traduz em autonomia positiva.”
Assim, a presente dissertação está fundamentada em três capítulos teóricos e dois
capítulos que compõe a Metodologia:
O Capítulo 1 é sobre o tema Promoção de Saúde e Gerontologia. Tem como objetivo
fazer a fundamentação teórica de conceitos no campo da Promoção da Saúde, tais como:
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Campos de Ação da Promoção da Saúde, Empoderamento, Educação em Saúde, Saúde
positiva, Apoio Social e Autonomia positiva.
O Capitulo 2 trata do tema central desse trabalho, que é Empoderamento como estratégia
de ganho de saúde. Está dividido em três sub-itens: o primeiro sub-item: Empoderamento:
Reflexões teóricas, onde são discutidos os valores subjacentes ao termo empoderamento; o
duplo significado do empoderamento; o empoderamento entendido como processo e como
resultado; os níveis do empoderamento, seus objetivos, finalidades e estratégias; e finalmente
as críticas associadas ao processo de empoderamento. O segundo sub-item: Empoderamento:
uma articulação no campo do envelhecimento, como o próprio título antecipa, faz a
articulação dos conceitos, utilizando autores da literatura estrangeira que têm trabalhos sobre
empoderamento com idosos. E, finalmente, o terceiro sub-item: Autonomia positiva como um
indicador de saúde, onde é trabalhada a definição dos valores da autonomia, fundamentais
para se entender o processo de empoderamento.
O último capítulo do referencial teórico, Capitulo 3, aborda o Grupo como apoio social.
Nele são discutidas as contribuições da teoria dos grupos advindos da psicologia. No primeiro
sub-item: Grupo social e rede social atuando no espaço grupal são discutidas as
contribuições dos conceitos de apoio e rede social e como o grupo pode servir como espaço
de articulação desses conceitos. O segundo e último sub-item: O grupo de encontro do
PROVE, descreve a experiência prática, de como um grupo pode servir como apoio social e a
caracterização desse grupo de encontro que serviu como campo para a coleta de dados para
esta pesquisa.
O Capítulo 4, Material e Método trata da Pesquisa Qualitativa em Saúde, onde é
trabalhada toda parte teórica da Metodologia. Este capítulo está sub-dividido em quatro
partes: A primeira se refere a Coleta de Dados, onde são apresentados os instrumentos de
coleta de dados utilizados, como a entrevista e o grupo focal. A Segunda parte se refere ao
Trabalho de Campo com a descrição do mesmo. Depois, vem a terceira parte com o Campo
de Investigação e sua definição e caracterização. E, finalmente, a Análise dos dados, com o
método de análise dos dados coletados, que teve como instrumento de análise o Programa
LOGOS (2).
No último capítulo, o Capítulo 5: Resultados e Discussão, é feita a análise dos dados,
apresentando-se num primeiro sub-item o Perfil dos entrevistados com os dados obtidos na
ficha de identificação, e logo em seguida, no segundo sub-item, as Atividades e formas de
participação dos idosos nos grupos, onde são apresentadas as formas pelas quais as pessoas
chegaram ao grupo de encontro do PROVE; o tempo de participação dos idosos no grupo de
encontro; o tipo de atividades que eles exercem dentro do projeto e fora dele; a participação
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em outros grupos voltados para o envelhecimento e atividades que desempenham dentro das
suas famílias. No terceiro sub-item são expostas as Categorias de análise selecionadas: apoio
social, rede social, autonomia, cuidados, aprendizagem, integridade e realizações de projetos
pessoais, com as respectivas falas coletadas nas entrevistas geradas no Programa LOGOS.
Com isso, parte-se para a discussão dos resultados, onde são apresentadas as falas do grupo
focal e sua articulação com as categorias de análise à luz do referencial teórico. No quarto e
último sub-item são apresentadas as Considerações sobre a implicação da pesquisadora
nesta dissertação.
Notas:
(1) Fonte: IBGE. Síntese de Indicadores Sociais 2000. Rio de Janeiro, 2001.
(2) LOGOS é um software que é um gerenciador de dados textuais; ele foi desenvolvido pelo
Professor Keneth Camargo Jr. do Instituto de Medicina Social da UERJ.
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Capítulo 1
Promoção de Saúde e Gerontologia
“Desejo que você, sendo jovem, não amadureça depressa demais e,
sendo maduro, não insista em rejuvenescer, e que sendo velho, não se
dedique ao desespero. Porque cada idade tem o seu prazer e a sua
dor e é preciso que eles escorram entre nós”
Victor Hugo (1802-1885)
1.1- Histórico e contribuições da Promoção da Saúde
O conceito de Promoção da Saúde aparece na década de 40, de forma latente, com
Sigerist (1946), que a define como uma das tarefas essenciais da medicina; e vem novamente
à tona na década de 60, com o conceito positivo de doença, no sentido de incentivar a
prevenção das doenças, através do estímulo de hábitos e comportamentos saudáveis, e com a
preocupação de estar atuando nos fatores de risco, onde a Promoção da Saúde entra como
parte da prevenção primária.
Na década de 70, com a crise nos sistemas de saúde, continua-se a perceber que não
basta atuar apenas na cura da doença, ou seja, depois que a doença já se instalou; é preciso
intervir nos determinantes do adoecimento. Assim, o Informe Lalonde (1974) é um marco na
área da Promoção da Saúde. Define quatro grandes eixos do campo da saúde: biologia
humana, meio ambiente, estilo de vida e organização da atenção à saúde. Colocando-se o
enfoque da intervenção no campo da Promoção da Saúde vemos que:
“até agora, quase todos os esforços da sociedade canadense destinados a melhorar a
saúde, assim como os gastos setoriais diretos, concentram-se na assistência médica.
Entretanto, as causas principais de adoecimento e morte tem origem nos outros três
componentes do conceito” (OPS, 1996:4 apud Lalonde, 1974).
Ainda no final da década de 70, a OMS realiza a I Conferência Internacional de Saúde,
em Alma-Ata. Nessa conferência, é colocada a meta “Saúde para todos no ano 2000”,
reforçando a proposta da atenção primária em saúde. Essa conferência culmina em algumas
recomendações, com a adoção de oito elementos essenciais para a saúde como:
“educação dirigida aos problemas de saúde prevalentes e métodos para sua prevenção
e controle; promoção do suprimento de alimentos e nutrição adequada; abastecimento
de água e saneamento básico apropriados; atenção materno-infantil; incluindo o
planejamento familiar; imunização contra as principais doenças infecciosas; prevenção
e controle de doenças endêmicas; tratamento apropriado de doenças comuns e
acidentes; e distribuição de medicamentos básicos.” (Buss, 2000a :170).
Essa Conferência de Alma-Ata desdobra-se na I Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde. Só com a Carta de Ottawa, em 1986, é que o conceito de Promoção da
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Saúde é definido como: “o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria
da qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo.”
(OMS, 1986 apud Buss, 2000a:170).
A saúde, ao deixar de ser centrada na biologia, amplia a forma de se pensar as
possíveis intervenções em seus problemas. Com a incorporação dos quatro itens que compõe
o campo de saúde de Lalonde, é possível instaurar um sistema de análise para se examinar
qualquer problema à luz da interação desses quatro componentes: estilo de vida, biologia
humana, meio-ambiente e organização da atenção a saúde. Um exemplo claro, oferecido por
Lalonde (apud OPS, 1996:4), é o problema de acidente de trânsito. Observa-se que os fatores
que mais contribuem para o aumento dos acidentes de trânsito são: o estilo de vida, o meioambiente, e a organização da atenção à saúde, ficando a biologia humana com pouco
importância. Essa análise auxilia os planejadores da saúde a voltarem sua atenção para
intervenções direcionadas à implantação de políticas para mudança do estilo de vida e
intervenções mais diretas sobre o meio-ambiente, do que para a assistência médica. Assim,
observa-se a promoção da saúde como um desdobramento da atenção primária em saúde, já
que se torna um campo de análise, intervenção e planejamento das políticas de saúde.
A Promoção da Saúde, como nível de atenção, se refere às ações destinadas a melhorar
e aprimorar a saúde das pessoas não doentes e, neste sentido, tem como enfoque uma visão
integral do processo saúde-doença-atenção. Inicia-se, com essa discussão, a entender-se saúde
como um campo complexo, que envolve diversos olhares e diversas intervenções. Não se trata
mais apenas de atuar sobre as causas, como era feito no modelo da História Natural das
Doenças, e nem tão pouco de se fazer uma história social da doença. A partir dessa
declaração, começa-se a trabalhar com o conceito de campo de saúde, que se pretende
alternativo, para se entender a dinâmica saúde-doença-intervenção ou atenção.
Dessa forma, a Promoção da Saúde sai dos centros de saúde e se estende para as
comunidades, os ambientes, as escolas, os settings; acrescentando como campo de atuação, o
Reforço Comunitário, que contêm um componente educativo, que é o desenvolvimento de
habilidades sociais.
Assim, a partir da Carta de Ottawa, a Promoção da Saúde incorpora como método
cinco grandes campos de ação, a saber:
Elaboração e Implementação de Políticas Públicas Saudáveis
Criação de ambientes favoráveis à saúde
Reforço da ação comunitária;
Desenvolvimento de habilidades pessoais;
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Reorientação dos sistemas e serviços de saúde.
Este trabalho se encontra mais dentro do terceiro e quarto campos, ou seja, dentro do
campo do Reforço Comunitário e do Desenvolvimento de Habilidades Pessoais, já que os
campos não são excludentes, pelo contrário, se articulam entre si, havendo uma
interdependência entre eles.
Com a Promoção da Saúde, tem-se um novo conceito de saúde. A saúde é percebida,
não como um objetivo em si, mas como recurso da vida cotidiana. Se trata, portanto, de um
conceito positivo, que enfatiza os meios sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas.
A Promoção da Saúde é, então, o maior auxílio para o desenvolvimento social, econômico e
pessoal, assim como uma importante dimensão da qualidade de vida. Desse modo, a
Promoção da Saúde não é concernente apenas ao setor sanitário, mas pelo contrário, são
requisitos para a saúde: a paz, a educação, a habitação, a alimentação, a renda, o eco-sistema
estável, a justiça social e a equidade (Carta de Ottawa, 1986 apud Buss et al., 2000b:172).
Dentro desse conceito positivo de saúde tem-se discutido os diversos fatores que a
condicionam. São eles: políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais
e biológicos. De acordo com esses fatores, as ações da Promoção da Saúde devem atuar sobre
o universo dos determinantes da mesma, objetivando reduzir as diferenças no estado atual da
saúde e assegurar a igualdade de oportunidades, proporcionando os meios, que permitam à
toda população desenvolver ao máximo o seu potencial de saúde (Carta de Ottawa,1986 apud
Buss et. al.,2000b:173).
Dessa forma, a Carta de Ottawa (1986) estabelece três grandes estratégias para se
trabalhar no campo da Promoção de Saúde: a defesa da saúde, a capacitação e a mediação.
Entende-se que este trabalho se posiciona, mais diretamente, na estratégia de
capacitação, onde:
“Os indivíduos e as comunidades devem ter oportunidade de conhecer e controlar os
fatores determinantes da sua saúde. Ambientes favoráveis, acesso à informação, bem
como oportunidades para fazer escolhas mais saudáveis, estão entre os principais
elementos capacitantes” (Buss, 2000a:170).
Nesse sentido, busca-se compreender melhor, na relação promoção da saúde e
envelhecimento, se os grupos de idosos direcionados à Promoção de Saúde podem ser
entendidos como estratégia de intervenção no campo do envelhecimento, ao servir de espaço
onde essa capacitação possa vir a se dar.
1.1.1 Empoderamento como estratégia de Promoção da Saúde no campo do
envelhecimento
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O conceito de empoderamento, tradução do conceito de “Empowerment” (1), faz parte
do campo de ação da Promoção da Saúde Reforço da ação comunitária/Participação
Comunitária. Na Carta de Ottawa (1986), esse campo de ação é definido como o processo de
desenvolvimento, na comunidade, da capacidade de controle e de habilidades para gerar
mudanças nos condicionantes sociais da saúde, através da mobilização coletiva. O
desenvolvimento da comunidade se baseia nos recursos humanos e materiais com que conta a
comunidade para estimular a independência e o apoio social (Buss et. al., 2000b:174). A
ajuda recíproca, onde cada um cuida de si e dos outros, é um dos temas centrais da proposta
de intensificar a auto-assistência e o apoio social, para desenvolver sistemas flexíveis do
reforço e da participação comunitária, na direção dos assuntos da saúde (Buss et. al.,
2000b.:47).
Nas várias Declarações, que compõem os documentos direcionados à Promoção da
Saúde, tem-se abordado o tema do reforço comunitário e do empoderamento. Tanto a
Declaração de Adelaide (OMS, 1988) como a Carta de Ottawa (1986) fazem notar que a ação
comunitária é o ponto central da promoção de políticas públicas para a saúde, pelas quais a
comunidade busca a posse e o controle de seus próprios esforços e destinos. Nessa mesma
direção, a Declaração de Sundsvall (1991) propõem reforçar a criação de ambientes saudáveis
“através de ações comunitárias (...) de maior controle sobre a saúde e o ambiente (...) e
maior participação nos processos de tomada de decisões”. Finalmente, a Declaração de
Bogotá (OPS, 1992) sugere que a ação comunitária poderia “fortalecer a capacidade da
população para participar das decisões que afetam a sua vida e para optar por modos de
vida saudáveis (...) através do diálogo de diferentes saberes” (Buss et. al., 2000b: 48).
Outro campo de ação da Promoção da Saúde, em que o empoderamento está inserido,
é o de Desenvolvimento de Habilidades Pessoais. A ênfase nas habilidades pessoais, na
Carta de Ottawa (1986), é resultado da percepção, pelas autoridades sanitárias, do quadro
caracterizado pelo envelhecimento populacional e o aumento da morbidade, por enfermidades
crônico-degenerativas; assim como, pelo entendimento, de que as causas ou fatores de risco
mais importante estão relacionados com comportamentos individuais, modos de vida ou
riscos existentes em local de trabalho e no meio-ambiente. É essencial capacitar as pessoas
para que aprendam durante toda a vida, preparando-se para as diversas fases da existência que
incluem o enfrentamento das enfermidades crônicas e das causas externas que afetam a saúde
(Buss et.al., 2000b:45). Nesta concepção, tem-se como instrumento, a Educação em Saúde,
que objetiva a melhoria da auto-estima, a diminuição da alienação, incrementando os
conhecimentos, de modo a abrir o campo de possibilidades de escolhas do indivíduo,
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deixando-o livre para decidir sobre seus comportamentos. Desse modo, busca-se aprimorar as
opções disponíveis, para que a população exerça maior controle sobre sua própria saúde e
sobre o meio-ambiente e para que opte por tudo aquilo que proporcione saúde (Carta de
Ottawa, 1986 apud Buss et. al., 2000b: 45).
Ao pensar a saúde, como um estado de razoável harmonia entre o sujeito e sua própria
realidade, esta passa a ser definida pela Organização Mundial da Saúde - OMS (MS,1999)
como um bem-estar bio-psico-social. Vê-se, então, que a saúde é um campo que abrange
muito mais do que apenas a ausência de doença. Com a constituição federal de 1988, a saúde
passa a ser um direito de todos os cidadãos, assim a Lei 8.080, conhecida como a Lei
Orgânica da saúde, estabelece a abrangência do termo saúde para além do campo da
medicina;
“a saúde têm como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a
alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a saúde, a
educação, o transporte, o lazer, o acesso a bens e serviços essenciais; os níveis de
saúde da população expressam a organização social e econômica do país.” (Lei n.º
8.080 apud MS, 1999).
A partir de então, a saúde é vista como um “indicador de qualidade de vida, e é
determinada, por sua vez, pelas condições gerais da existência” (Duchiade, 1995:17). Isto
envolve um processo educacional, pois a educação procura, sempre, desencadear mudanças
de comportamento e exige o conhecimento da viabilidade das áreas de intervenção e a
compreensão das funções e dos papéis de cada indivíduo dentro de um contexto.
Já a conceituação de Educação em Saúde, refere-se a:
“quaisquer combinações de experiências de aprendizagem delineadas com vistas a
facilitar ações voluntárias conducentes à saúde, onde se enfatiza a importância de
combinar vários determinantes do comportamento humano com múltiplas experiências
de aprendizado e de intervenções educativas. A palavra delineada distingue o processo
de educação de saúde de quaisquer outros processos que contenham experiências
acidentais de aprendizagem, apresentando-o como uma atividade sistematicamente
planejada. Facilitar significa predispor, possibilitar e reforçar. Voluntariedade significa
sem coerção e com plena compreensão e aceitação dos objetivos educativos implícitos
e explícitos nas ações desenvolvidas e recomendadas. Ação diz respeito a medidas
comportamentais adotados por uma pessoa, grupo ou comunidade para alcançar um
efeito intencional sobre a própria saúde.” (Green & Kreuter, apud Candeias, 1997: 2).
E por Promoção de Saúde entende-se:
“uma combinação de apoios educacionais e ambientais que visam a atingir ações e
condições de vida conducentes à saúde. Combinação refere-se à necessidade de
mesclar os múltiplos determinantes da saúde (fatores genéticos, ambiente, serviços de
saúde e estilo de vida) com múltiplas intervenções de fontes de apoio. Educacional
refere-se à educação em saúde tal como acima definida. Ambiental refere-se a
circunstâncias sociais, políticas, econômicas, organizacionais e reguladoras,
relacionadas ao comportamento humano, assim como todas as políticas de ação mais
diretamente relacionadas à saúde.” (Green & Kreuter, apud Candeias, 1997: 2).
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Desse modo, a relação entre Educação em Saúde e Promoção da Saúde está em que:
“A educação em saúde procura desencadear mudanças de comportamento individual,
enquanto que a promoção da saúde, muito embora inclua sempre a educação em
saúde, visa a provocar mudanças de comportamento organizacional, capazes de
beneficiar a saúde de camadas mais amplas da população, particularmente porém não
exclusivamente, por meio da legislação.” (Candeias, 1997:03)
Assim, percebe-se que a Educação em saúde não é diferente da Promoção da Saúde,
mas pelo contrário, ela se insere na promoção, na medida em que o desenvolvimento de
habilidades pessoais é um campo de ação da promoção da saúde e para tanto “é
imprescindível a divulgação de informações sobre a educação para a saúde, o que deve
ocorrer no lar, na escola, no trabalho e em muitos outros espaços coletivos” (Buss, 2000 a:
171).
Assim, pode-se pensar a Educação em Saúde como instrumento de promoção. Essa
educação é dirigida a grupos e comunidades, mais do que aos indivíduos; e está centrada mais
em transformações econômicas e sociais que influenciam a conduta, do que em modificações
do estilo de vida, hábitos e referências.
Na Carta de Ottawa (1986), marco teórico para o campo da Promoção da Saúde,
quando é enfatizada que ela objetiva proporcionar os meios pelo qual a população venha a
desenvolver ao máximo o seu potencial de saúde, é colocado que isso só será possível se as
pessoas forem capazes de assumir o controle daquilo que determina seu estado de saúde (Buss
et. al., 2000b). Isso implica em dizer, que é preciso proporcionar os meios para que as pessoas
se empoderem, ou seja, obtenham controle sobre suas vidas.
Gutierrez (1997) incorpora ao conceito da Promoção da Saúde a participação da
comunidade e a responsabilidade do Estado no cuidado de sua população, definindo que:
“promoção da saúde é o conjunto de atividades, processos e recursos, de ordem
institucional, governamental ou da cidadania, orientados a propiciar a melhoria das
condições de bem-estar e acesso a bens e serviços sociais, que favoreçam o
desenvolvimento de conhecimentos, atitudes e comportamentos favoráveis ao cuidado
da saúde e o desenvolvimento de estratégias que permitam à população maior controle
sobre sua saúde suas condições de vida, a níveis individual e coletivo.” (Gutierrez,
1997apud Buss, 2000a:167)
A Saúde Pública utiliza os conceitos de empoderamento para trabalhar a Promoção da
Saúde, na medida em que reconhece que a sua falta se constitui num fator de risco para o
aparecimento e desenvolvimento de doenças e, consequentemente, o empoderamento entra,
assim, como uma estratégia de ganho de saúde (Wallerstein & Bernstein, 1994).
Dentro da discussão do campo do Reforço Comunitário, é muito utilizado o termo
Apoio Social como uma forma de ação comunitária (2). O debate em torno da questão do
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apoio social se baseia essencialmente em investigações que discutem seu papel na
manutenção da saúde, na prevenção de enfermidades e na forma de facilitar a convalescência.
Outro possível resultado do apoio social está relacionado à sua contribuição geral sobre o
sentimento de controle e coerência da vida, que por sua vez influência no estado de saúde da
pessoa, de forma benéfica. Existem estudos demonstrando que o apoio social oferecido por
determinadas organizações sociais, pode proporcionar proteção contra o aparecimento de
enfermidades, melhorando a saúde física, mental e emocional do indivíduo (Cassel, 1976
apud Buss et. al., 2000b:53). Nesse sentido, a participação comunitária pode ser um fator
psicossocial significativo para melhorar a confiança pessoal, a satisfação com a vida e a
capacidade de enfrentar problemas, que está diretamente relacionado a questão do
empoderamento.
Segundo Valla (1994), além do apoio social oferecer a possibilidade de realizar a
prevenção através da solidariedade e do apoio mútuo, oferece também uma discussão para os
grupos sociais, sobre o controle de seu próprio destino e a autonomia das pessoas em relação
à hegemonia médica, através de uma nova concepção do homem como uma única unidade.
Pensando nesses campos de atuação da Promoção da Saúde, vinculado ao campo do
envelhecimento tem-se o campo da Gerontologia.
1.2- Gerontologia: contribuições da psicologia do envelhecimento
“Uma coisa dentro de mim, perigosíssima e mortal lateja como um
desafio; essa coisa é uma verdade que rebenta chamada vida”
“A vida tem que ser algo que, quando termine, mereça
comemoração”
Herbert Daniel
O envelhecimento, na atualidade, é um fato que não pode mais ser contestado. As
pessoas estão vivendo cada vez mais tempo, provocando um aumento da população acima dos
60 anos. O fato de se estar envelhecendo, de modo tão acelerado, traz transformações nos
valores éticos, estéticos e no modo como se percebe o processo de envelhecer. Isto quer dizer,
que envelhecer, no início do século, nada tem a ver, com envelhecer, na virada do 3º milênio.
Ser idoso, há 50 anos atrás, era completamente diferente de ser idoso, atualmente; isso,
porque não se espera do idoso de hoje uma atitude passiva diante da vida.
Estudos sobre o envelhecimento, no campo científico, passam a ser mais
sistematizados a partir do século XVII e XVIII; mas são maiores na metade do século XIX,
quando a população começa a envelhecer e o interesse médico, no cuidados com essas
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pessoas, passa a se fazer mais presente (Leme, 1996). O hospital de Salpétrière em Paris pode
ser considerado o primeiro estabelecimento geriátrico, com Charcot ministrando aulas sobre o
envelhecimento. Mas, é em 1909, que Nascher cria um novo ramo da medicina para estudar a
fisiologia do envelhecimento, fundando assim, a Geriatria. No Brasil, o interesse pela saúde
do idoso é mais recente; sendo fundada a Sociedade Brasileira de Geriatria em 1961, que
passa a ser chamada, posteriormente, de Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia –
SBGG (Leme, 1996:24). Assim, temos, atualmente, a Gerontologia, que é a ciência que
estuda os processos do envelhecimento em todos os seus aspectos: físicos, culturais,
psicológicos, econômicos; e a Geriatria, que é um ramo da medicina que estuda a fisiologia e
as alterações orgânicas vinculadas ao processo de envelhecer, estando inserida portanto,
dentro do campo mais amplo da Gerontologia. Deste modo este termo é definido:
“Gerontologia é o campo multi e interdisciplinar que visa à descrição e à explicação
das mudanças típicas do processo de envelhecimento e de seus determinantes
genético-biológicos, psicológicos e socioculturais. Interessa-se também pelo estudo
das características do idoso, bem como das várias experiências da velhice e
envelhecimento ocorrendo em diferentes contextos socioculturais e históricos.
Abrange aspectos do envelhecimento normal e patológico. Compreende a
consideração dos níveis atuais de desenvolvimento e do potencial para o
desenvolvimento. (Maddox, 1987 apud Neri, 2001b: 54).
Esta dissertação está situada dentro do campo da Gerontologia, denominado
Gerontologia Social. Este termo é definido, pela primeira vez, em 1954 por Clark Tibbits
(Neri, 2001b) para estudar o impacto das condições sociais e socioculturais sobre o processo
de envelhecimento. Temas, como rede de suporte social, relações intergeracionais, práticas e
políticas sociais, bem-estar na velhice, formas como as instituições sociais gerem a velhice e
atitudes em relação à velhice, são os assuntos pela qual a Gerontologia Social se interessa.
Em relação ao termo idoso, várias literaturas afirmam que não existe uma definição
única sobre o conceito de velhice ou de idoso, isto porque:
“não existe um consenso sobre o que se chama de velhice, porque as divisões
cronológicas da vida humana não são absolutas e não correspondem sempre às etapas
do processo de envelhecimento. Isto é, a velhice não é definível por simples
cronologia, senão – e melhor! – pelas condições físicas, funcionais, mentais e de saúde
das pessoas analisadas.” (San Martin & Pastor, 1990 apud Paschoal, 1996b: 27)
Paschoal (1996b) define velhice a partir da conjunto das condições: biológica, social,
econômica, cognitiva, funcional e cronológica. Dessa forma, tem-se que, biologicamente, o
envelhecimento se inicia no momento em que se nasce, e não aos 60 anos; socialmente, a
velhice vai variar de acordo com o momento histórico e cultural; intelectualmente, diz-se que
alguém está ficando velho quando suas faculdades cognitivas começam a falhar, apresentando
problemas de memória, atenção, orientação e concentração; economicamente, a pessoa entra
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na velhice quando se aposenta, deixa de ser produtivo para a sociedade; funcionalmente,
quando o indivíduo perde a sua independência precisando de ajuda para desempenhar suas
necessidades básicas; e finalmente, cronologicamente, a pessoa é idosa quando faz 60 ou 65
anos. A ONU adota a idade de 60 anos como a idade de transição das pessoas para o
segmento idoso da população. Esse critério é válido apenas para os países em
desenvolvimento, adotando-se 65 anos para os países desenvolvidos, pelo fato da expectativa
de vida ser maior (ONU, 1985 apud Paschoal, 1996: 27). Nesse ponto, abre-se um parênteses
para uma reflexão: uma pessoa de 70 anos, que trabalha, não apresenta déficit cognitivo, é
independente financeiramente e funcionalmente, pode ser considerada velha, apenas pela
idade cronológica?
O aumento da expectativa de vida é um fato real, que tem como conseqüência o
envelhecimento humano. O envelhecimento populacional é decorrente da diminuição das
variáveis mortalidade e fecundidade, “caracteriza-se por uma diminuição relativa e contínua
de jovens com aumento crescente da importância relativa dos mais idosos, enquanto a idade
entre esses dois grupos (20 a 60 anos) permanece relativamente estável.” (Laurenti,
1990:144). Este envelhecimento populacional traz repercussões para a saúde da população, na
medida em que ocorre a chamada transição epidemiológica, ou seja, uma mudança na
incidência e prevalência das doenças, bem como nas principais causas de morte;
“Do ponto de vista da saúde da população tem-se então o aumento da prevalência e da
mortalidade pelas doenças não-transmissíveis (ou crônico-degenerativas como são
mais comumente chamadas) devido ao aumento do numero de idosos; a permanência
ainda de algumas doenças infecciosas e a alta prevalência e mortalidade por causas
externas que atingem os mais jovens e ainda toda problemática de saúde que afeta a
população migrante que chega às grandes cidades.” (Laurenti, 1990: 147)
Desse modo, o envelhecimento deve ser uma preocupação real para o campo da
Promoção de Saúde. A Promoção da Saúde se impõem como um dever de cidadania, que se
constrói na prática do exercício de direitos, objetivando a promoção da longevidade, com
qualidade de vida. Com esta abordagem, deve-se pensar em trabalhar o processo de
envelhecimento, com a valorização da identidade pessoal, otimizando o potencial de
experiência de vida que essas pessoas possuem, já que a “pragmática cognitiva constituída
no bojo do conhecimento cultural e da experiência vivida, tende a intensificar-se com o
passar dos anos, apesar do declínio da mecânica cognitiva” (Py, 1996:48).
A transição epidemiológica, decorrente do envelhecimento populacional, a maior
visibilidade dos idosos no meio social; a experiência adquirida no trabalho junto com eles e a
multiplicidade de estudos no campo da Gerontologia, direcionam a se pensar a velhice, hoje,
neste início de milênio, por um foco menos pejorativo, e almejar uma visão positiva do
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processo de envelhecer; abordagem esta, que está sendo construída por todos os profissionais
que lidam com o sujeito idoso.
Essa mudança de foco de uma perspectiva negativa, que vê o idoso como a
antecâmara da morte ou como alguém retirado da sociedade sem nenhuma participação social
está sendo substituída, com grande força, para um outro enfoque menos pejorativo, e até
pode-se dizer, para uma construção positiva da velhice. Sob esse novo enfoque, almeja-se a
imagem do sujeito avançado no tempo, como uma pessoa participativa do mundo, inserida no
meio social: como um sujeito desejante (Py, 1996).
A Psicologia do Envelhecimento estuda as transformações do desenvolvimento
humano, percebendo o sujeito como um ser processual, onde cada indivíduo envelhece de
modo singular, ou seja, de acordo com experiências que lhe são peculiares.
O estudo do desenvolvimento humano apresenta, atualmente, uma evolução nas suas
teorias.
A teoria organicista tem o desenvolvimento como um processo de três etapas:
crescimento, culminância e declínio. A maturação é vista, anteriormente, como um
mecanismo genético sem qualquer influência do meio externo, como um processo
predeterminado (Neri, 2001:13). Segundo esta perspectiva o envelhecimento é um momento
de declínio.
Culminância
Crescimento
Contração
Estudiosos sobre a vida adulta e velhice (Baltes, P.; Warner Schaie, K; Birren, J;
Neugarten, B; Riegel, K; Riley, M. apud Neri, 2000) começam a desenvolver estudos, nos
meados dos anos 60, e percebem que o modelo organicista não dá conta do envelhecimento, e
propõem um novo paradigma para se pensar o processo de desenvolvimento humano. A
principal contribuição desses pesquisadores é pensar o desenvolvimento e envelhecimento
como processos correlatos, onde em todas as etapas da vida existem ganhos e perdas. Surge,
assim, a perspectiva do ciclo de vida ou Life Span, desenvolvida por Paul Baltes (1987), de
orientação dialética, que mostra que:
“nem crescimento nem decadência são processos unilaterais, que crescer e declinar
não são processos mutuamente excludentes, e que seres humanos não se desenvolvem,
chegam ao apogeu ou perdem todas as capacidades e competências ao mesmo tempo,
nem da mesma maneira.” (Neri, 2001: 25)
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Assim, pode-se pensar o conceito de desenvolvimento, na atualidade, com as seguintes
características:
Desenvolvimento é trajetória de mudanças, ao longo do tempo, que conduz o organismo à
maior organização e maior hierarquização, por meio das quais, as partes ou os sistemas
menores são englobados em partes ou sistemas mais abrangentes;
Desenvolvimento é um processo multidimensional e muiltidirecional, isto é, diferentes
estruturas e processos têm seu próprio curso de desenvolvimento, podendo diferenciar-se,
conforme a época, em ritmos variáveis;
Na vida adulta e na velhice fica preservado o potencial para o desenvolvimento, e sua
ativação depende de recursos do organismo e das influências do meio;
E, finalmente, ao longo da vida adulta e da velhice acontecem processos concorrentes:
crescimento e contração no desenvolvimento.
(Neri, 2001:27)
Desta maneira, desenha-se o processo de desenvolvimento através do seguinte
esquema:
Culminância
Continuidade
Contração
crescimento
A partir desse novo olhar sobre o curso do desenvolvimento humano, o
envelhecimento é visto como um momento de perdas e ganhos, retirando-se assim a imagem
do envelhecimento onde só existe perda de capacidades.
Em relação ao envelhecimento tem-se três padrões, a saber:
Envelhecimento primário, ou envelhecimento fisiológico, que é universal e progressivo.
Não é uma doença, é apenas um fenômeno, que acontece com todos os seres vivos. É
influenciado por múltiplos fatores, como: educação, estilo de vida, estresse, alimentação e
exercícios físicos. Os indicadores deste fenômeno são os cabelos brancos, as rugas, a
flacidez muscular e os déficits sensoriais (Birren, Schaie, Schroots, 1996 apud Neri,
2001:32).
Envelhecimento secundário ou patológico, na medida em que foge do processo fisiológico
normal do envelhecimento. É o envelhecimento associado a doenças orgânicas, como:
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esclerose múltipla, doenças cardiovasculares, demências, câncer e outras patologias, que
apresentam uma probabilidade maior de ocorrência com o aumento da idade (Birren,
Schaie, Schroots, 1996 apud Neri, 2001:33).
Envelhecimento terciário ou terminal, por estar relacionado a um grande aumento nas
perdas físicas e cognitivas num período de tempo relativamente curto. É reconhecido
como o ponto final das doenças terminais, em qualquer idade (Birren, Schaie, Schroots,
1996 apud Neri, 2001:34).
Seguindo-se esta linha de pensamento, pode-se definir envelhecimento como o momento
em que o indivíduo já atingiu a maturidade, almejada enquanto virtude, ou seja, “um adulto é
considerado adulto quanto atinge certo grau de excelência, tido como valioso pelos
semelhantes e por ele próprio.” (Neri, 2001:18). Dois conceitos, associados à maturidade, e
que se fazem refletir sobre o período de envelhecimento saudável são: sabedoria e
geratividade. Sabedoria sendo definida como resultado de uma vida com experiências ricas;
“sabedoria é virtude que emerge como resultado da resolução do conflito entre
geratividade e estagnação, implicando a realização de tarefas evolutivas que
significam adaptação individual e contribuições aos semelhantes: formação sobre um
ponto de vista sobre o próprio ciclo vital, aceitação do passado, memórias interativas,
formação sobre um ponto de vista sobre a morte e derivação de um conceito de
transcendência” (Erikson e Erikson, 1998 apud Neri, 2001:19)
Erik Erikson (1998) estuda a teoria do desenvolvimento humano, sob o foco das
interações sociais, vendo o desenvolvimento ao longo de todo o processo vital. Neste
processo, vão ocorrendo modificações e novas modalidades de funcionamento psíquico,
surgindo, a cada nova etapa do processo vital, novas exigências. A sua teoria é chamada de
epigênese do desenvolvimento:
“A forma como são solucionados os conflitos ou as crises típicas de cada estágio vai
influir decisivamente sobre como vão ser vivenciadas as etapas anteriores, fazendo que
cada estágio se torne presente e se atualize naquele que o sucede. E a personalidade
vai se estruturando, se reformulando, se adaptando, tendo sempre como fundamento as
experiências vividas: as soluções adaptativas que se mostraram eficazes e satisfatórias
bem como os fracassos dos estágios anteriores.” (Braghirolli et al., 1999:107).
Erickson (1998) propõe uma teoria de estágios, onde o indivíduo tem determinadas
tarefas evolutivas, situadas entre a necessidade individual e a exigência social, associadas a
cada período de vida - infância, adolescência, idade adulta e velhice - definindo oito etapas do
desenvolvimento humano: 1) confiança versus desconfiança básica; 2) autonomia versus
vergonha e dúvida; 3) iniciativa versus culpa; 4) competência ou produtividade versus
sentimento de inferioridade; 5) consolidação da identidade versus confusão de papéis; 6)
relacionamentos de intimidade versus isolamento; 7) geratividade versus estagnação e 8)
integridade ou aceitação do ciclo vital versus desesperança.
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19
No estudo da psicologia do envelhecimento são pertinentes as duas últimas etapas,
relacionadas à maturidade e velhice, principalmente a última. Esta etapa é o fechamento do
ciclo vital; e o modo como a pessoa a vivencia vai depender, fundamentalmente, do modo
como ela vivenciou as etapas anteriores; pois a velhice não é uma dimensão estanque, mas o
resultado de um processo de vida. Assim, Erikson (1998) coloca como tarefa evolutiva para a
oitava idade, a Integridade e Geratividade. Esta é expressa na preocupação com outras
pessoas, além da sua família, objetivando ações de gerar, manter e ofertar. Nesta idade,
muitos sucessos e fracassos foram vivenciados e vão constituir o chamado cuidado, no sentido
de se preservar o que foi conquistado, e o sentimento de integridade. Isto pode ser expresso na
capacidade do indivíduo em rever a sua trajetória de vida e apreciá-la, com algum grau de
satisfação. Como nos diz Braghirolli et al. (1999):
“A integridade é a marca individual daqueles que conseguem aceitar e conviver com a
sua própria trajetória de vida e defender o seu estilo peculiar, que representa o seu
patrimônio maior, frente às ameaças e adversidades que a vida possa lhes reservar.
Trata-se daquelas pessoas que conseguem vislumbrar a sua posição histórica e
cultural, inserida num contexto e numa ordem maior (1999:119).
Por outro lado, as pessoas que não conseguem conviver com a idéia de finitude,
podem cair num sentimento de desesperança, na medida em que o tempo se coloca como um
limite mais real, fornecendo limite para refazer a caminhada da vida. Assim, essas pessoas
podem se tornar idosos amargos, inconsoláveis e de difícil convívio.
Eis as características para se viver uma maturidade, como virtude:
busca constante de aperfeiçoamento pessoal;
auto-realização;
sabedoria
geratividade
senso de significado existencial
E como desafios para viver maturidade, na velhice:
ajustamento às realidades da velhice;
desenvolvimento de novos papéis sociais;
auto-conhecimento, auto-aceitação, propósito e senso de domínio (3);
Desse modo, pode-se refletir, que um dos objetivo da Promoção da Saúde, na área do
envelhecimento é poder viver a velhice com maturidade.
Um outro ponto, que a psicologia trabalha, diz respeito à questão da temporalidade do
sujeito, proposta por Birman (1995), que aborda a percepção, por parte do sujeito, em relação
a sua trajetória de vida.
O sujeito histórico, construído ao longo do tempo, deve viver o passado, articulado ao
presente, com uma projeção para o futuro. O tempo do velho não é o passado, é o presente,
19
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que é fruto de seu passado, com uma intenção de projetos futuros, pois ainda se encontra vivo.
Py (1996) nos apresenta essa temporalidade articulada ao processo de envelhecer:
“o sujeito que envelhece pode compartilhar o reconhecimento de si mesmo, sendo
reconhecido pelas pessoas da história de seu convívio. Pode então, re-produzir essa
sua história, na medida em que responde a uma situação presente, com vistas à criação
de projetos futuros, no incessante vir-a-ser da existência, inserido à vida dos sujeito.”
(Py, 1996:20).
Outra questão importante na psicologia do envelhecimento diz respeito ao termo
Finitude. A única certeza que os seres vivos têm da vida é a de que vão morrer. Os animais
não têm a consciência da sua finitude que os seres humanos tem.
Sabe-se, que em termos do inconsciente, os seres humanos são imortais e por isso
vivem suas vidas sem pensar na morte. Contudo, podem aceitar a morte do próximo e
acompanhar as notícias, pela mídia, de pessoas que morrem a todo momento, confirmando a
crença inconsciente em sua própria imortalidade; fazendo com que se alegrem com o
pensamento “ainda bem que não fui eu”. Assim, a morte está sempre fora deles. Porém,
quando começam a adoecer, quando recebem um diagnóstico de uma doença grave e quando
envelhecem, o sujeito é posto a confrontar-se com a sua condição de ser mortal e finito. Não
podem ignorar que a velhice é o momento em que se aproximam da morte, e portanto, a etapa
de vida onde se dá o confronto com a finitude. O tempo se torna mais curto; e é exatamente
por isso, pela Finitude se colocar de forma mais visível, que vai gerar novas tarefas referentes
à compreensão do self (eu) e do sentido da vida.
PY (1999), estudiosa da temática da Tanatologia, fala que a finitude traz uma idéia de
ruptura, de rompimento, na tragicidade do destino humano. Há uma ruptura com a vida,
fazendo com que a saída da existência viva permaneça como uma catástrofe do imaginário;
uma catástrofe não só biológica, marcada pela doença, pela deterioração do corpo; mas uma
catástrofe afetiva, uma catástrofe social do outro.
A morte é um grande mistério. É o desconhecido, é o estranho, e por isso, será sempre
algo que não se sabe como abordar. No entanto, o que se pode apreender, estudando a
temática da finitude, é justamente que não se trata da morte em si, mas sim da significação da
vida.
No século XX se assiste a uma obsessiva negação da morte, aflorada pela teoria do
consumo descartável, com uma dificuldade nos contatos entre os seres humanos. Deste modo,
a morte se coloca como algo que não é pensado, que é totalmente negado. Esses sentimentos
aflorados pela morte que se faz presente, geram uma impotência, não só nos pacientes
terminais, mas também nos profissionais de saúde, que não sabem como lidar com essas
questões do conflito entre vida-morte. Isto acaba por gerar um movimento de afastamento das
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pessoas adoecidas e muitas vezes das pessoas mais idosas, na medida em que simbolizam a
morte. E como fica essa pessoa, que se encontra numa situação fragilizada de doença, ou uma
pessoa idosa, que ainda está viva? Ela se encontra, muitas vezes, numa situação de
isolamento, de desespero e de grande sofrimento.
Por isso, é de grande importância para todos os profissionais da área da saúde, que se
discutam assuntos como este, de forma que se possa refletir sobre a morte e a suas
implicações na vida; para que não se use a defesa de apenas se afastarem de pessoas muito
idosas ou que estão com uma doença grave; mas que se possa estar diante delas, cuidando e
oferecendo um lugar, para que elas continuem sendo sujeito de sua história, até o final de suas
vidas, e impedindo que a morte social venha antes da morte física.
Seminério (1999) esclarece que não é da morte que temos mais medo e sim dos seus
correlatos, ou seja, da situação de completa dependência, dos aspectos terminais da vida. E o
recurso psíquico que os seres humanos utilizam para driblar a consciência da morte é o
imaginário. A ilusão é essencial. Vive-se numa seqüência de ilusões e desilusões. Muitas
vezes, na velhice, as desilusões se tornam mais freqüentes e o cessar das ilusões leva à queda
da motivação e, por conseqüência, à depressão. As pequenas desilusões proporcionadas pelo
afastamento nos processos decisórios; o aumento de doenças; a diminuição da vitalidade; a
perda da imagem jovem, entre outros, fazem com que a pessoa idosa se confronte com a
finitude. Seminério, porém; coloca uma estratégia para esse dilema: o ser humano perceber
que existem sempre programas em aberto, a construir:
“programas existem sempre, e a possibilidade de os realizar é o antídoto contra a
finitude. Porque enquanto realizamos, enquanto nós estamos, efetivamente
construindo através do nosso imaginário algo que até se pode tornar real – e o
importante é essa construção em nosso imaginário – enquanto nós tivermos condições
de elaborar, a nossa vida é, naquele segmento, efetivamente imortal.” (Seminério,
1999: 29).
Torres (1999) acrescenta que, com a velhice, há uma crise de identificação
proporcionada pela consciência da proximidade da morte pessoal, entretanto, alerta para a
possibilidade de se viver essa etapa de vida com oportunidade de crescimento através da
manutenção do domínio ativo em relação a própria vida.
“é fundamental manter-se como um ser competente e responsável que, dentro dos
limites de sua incapacidade, é capaz de usar ao máximo as habilidades que ainda lhe
restam (comportamento competente) e de preservar a sua autonomia, escolhendo a
maneira pela qual deseja resolver seus problemas (conduta responsável) . Ou sejá, é
fundamental que mantenha o controle ativo de sua vida até o final e que lhe seja
assegurado o direito de coreografar sua própria morte, vivendo até dizer adeus, para
usar expressões de Kubler-Ross.” (Torres, 1999:62).
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Estudos sobre desenvolvimento, na meia-idade e na velhice, demonstram que a
motivação, ou seja, aquilo que movimenta a pessoa em direção a algo é que dá significado a
vida, e vai adquirindo significações diversas, ao longo do desenvolvimento humano. Assim,
para os idosos, a força motriz da busca de contatos está muito mais ligada a conteúdos
emocionais e afetivos, do que a busca de informações, preponderantemente mais fortes nos
jovens (Frederickson e Cartensen apud Baltes & Silverberg, 1995).
Dessa forma, vê-se, que para se pensar no desenvolvimento de uma autonomia na
velhice, é necessário também se pensar em uma rede de relações sociais, que favoreça o
desenvolvimento de laços afetivos. Abordaremos a questão do grupo de idosos, como apoio
social, mais adiante nessa discussão. Antes, é preciso, porém, abordar a forma como a
psicologia do envelhecimento trabalha a autonomia e independência.
A psicologia trabalha na dialética de capacidades e limites. Isso quer dizer, que ao
longo de todo desenvolvimento humano, os sujeitos estão numa relação de dependência de
diferentes graus. Segundo Erick Erickson (1963), na velhice, última etapa do
desenvolvimento, os conceitos de dependência, independência, autonomia e perda desta
autonomia se colocam novamente como importantes questões.
Particularidades relacionadas ao envelhecimento concorrem para a alteração da
condição de dependência. São elas:
O aumento das perdas físicas, denominado por muitos autores como incapacidade
funcional;
A aposentadoria e a diminuição do contato social que afetam a rede de relações sociais do
idoso;
A confrontação com a sua própria finitude.
Algumas pesquisas demonstram que a principal tarefa evolutiva da velhice é a integração
social e a autonomia pessoal; “a segurança propiciada por um ambiente acolhedor, assim
como a autonomia permitida por um ambiente estimulador são ambas, necessárias ao bemestar do idoso” (Baltes & Silverberg,1995: 102)
Quando se estuda os conceitos de autonomia e independência, nos idosos, tem-se que
levar em conta, tanto as mudanças biológicas como as sociais. Pode-se atribuir a falta de
autonomia a causas intrínsecas, relacionadas à perda de competência física e mental; e a
causas extrínsecas ou sociais que são devidas a fatores econômicos, estereótipos negativos
associados à velhice e, às relações sociais ou redes sociais.
Na velhice, continuam esses autores, muitas vezes, a dependência física é confundida
com a dependência para a tomada de decisão, originando uma atitude paternalista por parte da
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sociedade. Assim, se justifica o fazer tudo, no lugar do idoso, negando sua liberdade,
autonomia e capacidade de escolha, que devem ser preservadas durante toda a vida (Baltes &
Silverberg 1995). Desse modo, autonomia e segurança se configuram como necessidades
básicas universais na velhice, tendo o ambiente social um grande peso ao exercer influência
forte sobre a otimização e o impedimento de processos comportamentais.
Notas:
(1) Optou-se por traduzir neste trabalho o termo empowerment por empoderamento, como é
traduzido no espanhol. No português é, freqüentemente, traduzido, também, como
“fortalecimento”.
(2) O termo apoio social será mais profundamente trabalhado no capítulo 3 “Grupo como
apoio social” deste trabalho.
(3) Neri, Anita. Palestra: “Maturidade: desafios individuais e socioculturais”. Realizada no
evento: Encontros Temáticos em Gerontologia, SBGG-RJ, setembro de 2001.
23
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Capítulo 2
Empoderamento como estratégia de ganho de saúde
“A mais bela experiência que podemos Ter é a do mistério. É a
emoção fundamental existente na origem da verdadeira arte e
ciência. Aquele que não a conhece e não pode se maravilhar com ela
está praticamente morto e seus olhos estão ofuscados.”
Albert Einstein
2.1 – Empoderamento: Reflexões teóricas
Empowerment constitui-se num termo da língua inglesa de difícil tradução para o
português. Sendo assim, optou-se por se utilizar, neste trabalho, a tradução da palavra
Empowerment como empoderamento, sendo, muitas vezes, traduzido como fortalecimento.
A complexidade dos fatores envolvidos na saúde, tem evidenciado a necessidade de se
investir em Promoção da Saúde e é, neste contexto, que se coloca a discussão de
empoderamento, enfocando-se a atenção para intervenções que extrapolam o já criticado
modelo biomédico.
Segundo Vasconcelos (2001), o conceito de empoderamento é o tema central das
políticas sociais e saúde mental na Europa, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova
Zelândia, principalmente, a partir dos anos 90. Historicamente, o empoderamento está
associado a formas alternativas de se trabalhar as realidades sociais, suporte mútuo, formas
cooperativas, formas de democracia participativa, autogestão e movimentos sociais
autônomos.
Empoderamento, em Promoção da Saúde, é sempre definido como “ um processo que
ajuda as pessoas a firmar seu controle sobre os fatores que afetam a sua saúde” (1) (Gibson,
1991 apud Airhihenbuwa, 1994: 345). É também usado como sinônimo para habilidades de
enfrentamento, suporte mútuo, organização comunitária, sistema de suporte, participação da
vizinhança, eficiência pessoal, competência, auto-estima e auto-suficiência. (Rappaport 1981;
Kieffer 1984 apud Airhihenbuwa, 1994: 345). Este conceito limitado de empoderamento
evoca a noção de que forças ambientais controladoras são a meta final. Educação empoderada
ou educação de empoderamento (empowerment education) é uma efetiva educação saudável
e um modelo preventivo que se focaliza na ação grupal e no diálogo direto dos alvos
comunitários, almejando aumentar a credibilidade das pessoas em sua capacidade em mudar
suas próprias vidas (Wallerstein, 1988 apud Airhihenbuwa, CO, 1994: 345). Neste sentido,
empoderamento se insere no campo da Promoção da Saúde como uma estratégia de ganho de
saúde, na medida em que se reconhece que a sua ausência se constitui como um fator de risco
para o adoecimento.
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Na sua definição mais geral, empoderamento é definido como “um processo pelo qual
indivíduos, comunidades e organizações obtém controle sobre suas vidas” (Rappaport apud
Minkler, 1992:303). Vasconcelos (2001) define empoderamento como “o aumento do poder
pessoal e coletivo de indivíduos e grupos sociais nas relações interpessoais e institucionais,
principalmente daqueles submetidos a relações de opressão e dominação social.” (2001: 5).
Vários autores que trabalham com o empoderamento se referem a ele como a habilidade de
pessoas conseguirem um entendimento e um controle sobre suas forças pessoais, sociais,
econômicas e políticas, para poderem agir de modo a melhorar sua situação de vida
(Wallerstein, 1994; Airhihenbuwa, 1994; Bernstein,1994; Labonte, 1994; Thursz, 1993).
Airhihenbuwa (1994), estudando a relação entre empoderamento e educação para a
saúde, delineia um modelo de empoderamento como forma alternativa para os modelos mais
tradicionais. Segundo ele, existem três abordagens básicas empregadas para desenvolver as
intervenções em educação em saúde: 1) Modelo Preventivo, que se focaliza no processo de
decisão individual em adotar um comportamento saudável, para prevenção de doenças; 2)
Modelo Político radical, onde o foco é na mudança social, ambiental e de estruturas políticas,
para atacar a raiz dos problemas de saúde e doença; e finalmente, 3) o Modelo de
Empoderamento, cujo o foco é facilitar as escolhas individuais e comunitárias, para fornecer
aquisição de conhecimento com clarificação de valores e decisão, tornando prática as
habilidades de organização comunitária, através de métodos de ensino não tradicional (Tones,
et. al. 1990; Airhihenbuwa, 1994 apud Airhihenbuwa, 1994:345).
Neste modelo de empoderamento, o contexto é algo que deve ser levado em conta, já
que o empoderamento se altera segundo as diferentes situações, considerando que elas
refletem as várias necessidades dos indivíduos, grupos, organizações, escolas e comunidades,
no contexto onde ocorre o empoderamento. Desse modo, as forças sociopolíticas e
ambientais, que influenciam o comportamento saudável, devem ser manipuladas dentro de um
contexto de cultura utilizando membros da comunidade (fontes especializadas). Entretanto,
diz Airhihenbuwa, o ônus de orientar essas forças ambientais não deve se apoiar apenas nas
pessoas que manipulam a educação em saúde e a prevenção de doenças, embora, raramente,
indivíduos marginalizados possam ter o controle sobre as influências ambientais.
Em um fórum de discussão sobre empoderamento, promovido pelos membros de da
Revista – Health Education Quarterly (Bernstein et. al., 1994), - vários estudiosos neste
assunto discutiram as bases teóricas e ressaltaram os seguintes pontos:
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26
Valores subjacentes ao processo de empoderamento e sua relação com o conceito de
poder
Segundo Gutierrez (Bernstein et. al., 1994), o significado central do empoderamento
está no “ganho de poder”, sendo que poder, neste contexto, traduz a idéia da habilidade de
agir e criar mudanças dentro de uma desejada direção. Para discutir-se o empoderamento é
preciso que se entenda o poder dentro de um relacionamento social, no qual os atores possam
usar os recursos de poder pessoal, social e político, para criar mudanças.
O entendimento mais comum de empoderamento, dentro do campo da saúde, trabalho
social, educação ou psicologia comunitária, deve ter uma conotação de valor baseada na
conceituação de poder compartilhado, ao invés do poder sobre o outro. Isto compreende que o
empoderamento deve permitir aos grupos desprivilegiados ganhar significado para mudar sua
condição de opressão (apud Bernstein et al., 1994: 283). Qual deve ser o meio pelo qual as
pessoas podem vir a obter este poder? Freire (apud Bernstein et al., 1994) nos oferece a
resposta para essa indagação, ao responder que é através do desenvolvimento de uma
consciência crítica. Desenvolver uma consciência critica é um meio crucial de ganhar poder.
Uma consciência critica envolve o entendimento de como as relações de poder na sociedade
moldam as experiências e percepções de cada pessoa, e de poder identificar como cada um
pode ter um papel dentro de uma mudança social. Isto é particularmente importante em
situações de desigualdade, nas quais os indivíduos internalizaram crenças sobre sua própria
identidade e poder, em potencial. O entendimento de como os membros de um grupo podem
afetar as circunstâncias da vida, é crucial para identificar a falta de poder como uma fonte de
problemas, no sentido de alcançar uma mudança social mais do que a individual (Gutierrez,
1992 apud Bernstein et. al., 1994: 283).
Em relação, ainda, à questão de poder, Labonte (1994) coloca a indagação: “se alguém
pode dar empoderamento a alguém?”. Ele argumenta, que se o poder é um elemento de
relação social, a capacidade de empoderar existe em todas as pessoas, num contexto de teias
de relação com outros (apud Bernstein et. al., 1994: 284). A palavra empoderamento, em si
mesma, tem um sentido contraditório. Por um lado, significa dar poder a outros, por outro,
significa capturar poder. Essa dualidade suscita outro tema fundamental que é:
O duplo sentido do empoderamento - processo ou resultado
Labonte (1994) traz uma discussão sobre empoderamento e Promoção da Saúde.
Entendendo-se por Promoção da Saúde “o processo de capacitação de pessoas para
aumentar seu controle e melhorar a sua saúde” (1994:253). Neste sentido, a Promoção da
Saúde compartilha valores com o empoderamento definido como “o processo pelo qual
26
27
pessoas, organizações e comunidades ganham domínio sobre suas vidas.” (1994: 253).
Ele propõe que esses termos devem ser vistos como lentes conceituais para avaliar as
práticas de saúde.
Empoderamento possui em si dois significados possíveis, que vão depender da forma
que sejam utilizados: Labonte (1994) chama a atenção para o perigo de se utilizar o
conceito de empoderamento transitivamente. Empoderar é a ação central na nova
Promoção da Saúde. É também um verbo transitivo, no qual o sujeito age sobre o objeto; e
um verbo intransitivo, no qual o sujeito age sobre si mesmo. Usado transitivamente,
empoderar significa dar poder a outro, compartilhando alguns poderes que os profissionais
devem ter sobre outros. Desta forma, o profissional é visto como agente de
empoderamento e como sujeito do relacionamento, e permanece como sendo o ator
controlador, definindo os termos da interação. Os indivíduos ou grupos, relativamente
desempoderados, permanecem como objeto da relação, como o receptor da ação do
profissional, numa atitude passiva. Na afirmação “nós precisamos empoderar este ou
aquele grupo” cria-se ou se reforça um mundo de práticas profissionais, atuando sobre
grupos não profissionais que não são capazes de sua própria ação de poder.
Quanto à reflexão se o empoderamento é um processo ou um resultado, Wallerstein &
Berstein (1994) colocam, que usado como verbo intransitivo, empoderar se refere a um
processo através do qual pessoas ganham influência e controle sobre suas vidas e
consequentemente se tornam empoderados. Isto é importante para distinguir entre a
primeira definição de empoderamento que é: investir ou dar poder e autoridade a outros; e
a segunda que é: tornar outros capazes, ou, dar a outros habilidades para que eles possam
obter poder por seus próprios esforços. A definição final é que: “educadores em saúde não
podem dar poder a pessoas, mas podem torná-las capazes de aumentar suas habilidades e
recursos para ganhar poder sobre suas próprias vidas.” (1994: 155)
Braithwaite (Bernstein et al., 1994: 284) propõe que o empoderamento seja um
processo que se estenda a grupos comunitários que necessitem receber um programa de
assistência técnica (por exemplo: desenvolvimento organizacional, construção de
relacionamento, desenvolvimento de liderança, desenvolvimento de infra-estrutura).
Nenhum desses processos pode ser conseguido num curto período de tempo, ao contrário,
necessitarão de muito tempo de trabalho com a comunidade.
Labonte (Bernstein et al., 1994: 286) afirma que, empoderamento é, simultaneamente,
processo e resultado. Empoderamento é um processo que descreve o relacionamento que
está sempre em mudança e nunca é completo; um relacionamento entre aquele que tem
formas objetivas de poder e os que não as tem. Já o resultado deve ser alcançar uma
27
28
distribuição mais eqüitativa, em uma forma objetiva de poder através do processo de
exercício de poder dentro de um relacionamento.
Neste ponto, parte-se para outro tópico relevante no que diz respeito ao
empoderamento.
Tipos ou níveis de empoderamento
Para Zimmerman (Bernstein et al., 1994: 286) o empoderamento é um conceito que
possui vários níveis. É uma construção a nível individual, quando se refere às variáveis intrafisicas e comportamentais; a nível organizacional, quando se refere à mobilização de recursos
e oportunidades participativas; e também pode ser a nível comunitário, quando a estrutura da
mudanças sociais e a estrutura sociopolitica estão em foco. Isto dificulta uma medida global
de empoderamento.
Wallerstein & Bernstein (1994) também definem três níveis de empoderamento:
Empoderamento individual ou psicológico, quando se refere à habilidade do indivíduo
para tomar decisões e ter controle sobre sua própria vida. Empoderamento individual
combina eficiência pessoal e competência, um sentido de domínio e controle, e um
processo de participação para influenciar instituições e decisões (1994: 152).
Empoderamento organizacional quando se refere ao controle democrático onde cada
membro compartilha informação e poder. Ele utiliza um processo cooperativo de tomar
decisões e está envolvido em aumentar os esforços em direção de uma mesma meta
definida (1994: 153).
Empoderamento comunitário sendo aquele onde indivíduos e organizações aplicam suas
habilidades e recursos nos esforços coletivos, para encontrar suas respectivas
necessidades. Este nível tem a possibilidade de influenciar decisões e mudanças no
sistema social mais amplo. É composto de capacidade e ação; onde capacidade é definida
pelo uso de poder para resolver problemas e ação é definida por conseguir uma razoável
partilha de recursos (1994: 153).
O conceito de conscientização de Freire (1980) fornece a base para ligar esses três
níveis de empoderamento. Conscientização envolve o desenvolvimento de um sentido de
identificação com o grupo, de compartilhar o destino deste grupo e de eficiência própria,
individual e coletiva. Este componente envolve tanto, a opinião cuja ação efetiva é possível,
quanto a capacidade (habilidade e recursos) para desenvolver uma estratégia efetiva para a
ação.
Labonte propõe o empoderamento como um holograma. Neste modelo são
identificadas estratégias que os profissionais precisam utilizar para reduzir ou minorar uma
28
29
condição social desigual. Estas estratégias não estão relacionadas a nenhum profissional de
saúde nem à disciplinas, mas são mandatos organizacionais e inter-organizacionais. A
responsabilidade individual do profissional é ver se o processo inteiro está ajustado e achar
seu lugar dentro deste processo. Cada uma das esferas do holograma representa um nível
diferente de organização social e relacionamento; este é composto pelas seguintes esferas:
cuidado pessoal (empoderamento pessoal); desenvolvimento de pequenos grupos (intragrupos); organização comunitária (inter-grupo); construção de coalizão e proteção/defesa
(inter-organizacional) e ação política (inter-organizacional) (Labonte, 1994: 258).
Interessa, particularmente, neste trabalho, as duas primeiras esferas, referentes ao cuidado
pessoal e ao desenvolvimento de pequenos grupos. Na primeira esfera, que trata do
empoderamento pessoal, os profissionais encontram indivíduos que estão vivendo em
situações de desempoderamento. Já em relação à segunda esfera, Labonte afirma ser a
comunidade, a máquina da Promoção da Saúde e, portanto, o veículo do empoderamento.
Neste sentido, o pequeno grupo é o locus de mudança. É no grupo que são planejadas as
identidades e criado o seu propósito. Somente na interação com outras pessoas é possível
ganhar características sadias e essenciais para o empoderamento, isto é, controle, capacidade,
coerência, conexão e pensamento crítico ou conscientização. Sem o suporte do grupo muitas
pessoas são incapazes de participar de mudanças sociais mais formais, permanecendo
historicamente marginalizadas e sem envolvimento (1994: 260). Essas esferas, que compõem
o holograma são níveis complementares e não contraditórios já que o empoderamento se
desenvolve nos níveis – pessoal ou interpessoal e sociopolítico – e deve ser sustentado por
ambos.
Objetivos e finalidades do empoderamento:
Segundo Zimmerman (Bernstein et al., 1994), a meta do empoderamento é ajudar pessoas,
organizações e comunidades a serem mais independentes; gerar auto-confiança e senso de
governabilidade, mais do que se sujeitar à força de alguma coisa ou de alguém do exterior.
Valores de empoderamento também sugerem que se devem salientar as reivindicações, pelo
menos, tanto quanto se focalizam as necessidades. Isto inclui o pressuposto de que muitos
problemas sociais existem devidos à distribuição desigual de acesso a recursos (1994: 284).
Braithwaite (Bernstein et al., 1994) afirma que o empoderamento é efetivo quando um
grupo, uma organização, uma coalizão ou parceria, sustenta seus esforços positivos durante
muitos anos; quando pode se transferir a tecnologia de um problema para outro; quando há
mudanças físicas significativas na vizinhança ou na comunidade, como resultado de esforços
de coalizão; quando, substancialmente, mais membros da comunidade são envolvidos em um
29
30
modo de manter a decisão tomada pela comunidade; quando mais pessoas estão criando e
ganhando oportunidades de emprego; quando a taxa de mortalidade diminui; e finalmente,
quando a autodeterminação e a solução dos problemas da comunidade estão sendo
endereçadas para os cidadãos, numa modalidade de plano estratégico.
Labonte (1994), em seu modelo holográfico de empoderamento, citado anteriormente,
pressupõe que instituições profissionais e burocráticas são capazes de transformações,
significando que seus comportamentos podem ser mudados. Este pressuposto está em
concordância com que o Wildavsky (apud Labonte, 1994:266) diz “cada solução política é o
começo de um próximo problema e o sucesso é quando o próximo problema é menor do que
aquele do qual ele foi a solução”. Assim, a meta do empoderamento é trocar um problema
maior por um problema menor, sendo um processo que requer contínua avaliação e
acompanhamento.
Segundo Braithwaite (Bersntein et al., 1994), uma das finalidades do empoderamento
comunitário é fazer o status quo inconfortável, desafiando o sistema vigente. Quando o
empoderamento é verdadeiramente realizado, racismo, sexismo, envelhecimento e problemas
de classe são colocados em cheque. Essas forças sociais negativas são minimizadas, por um
controle assumido pelo grupo empoderado.
Estratégias de empoderamento
Labonte, (Bersntein et al., 1994: 284) propõe, como estratégias de empoderamento, as
várias formas de desenvolvimento de grupos de suporte pessoal, incluindo educação crítica,
ajuda mútua, suporte terapêutico. Outra estratégia se dá através de organizações comunitárias,
que levam grupos a desafiar formas políticas e econômicas de poder, que os oprime ou
domina, através da construção e desenvolvimento de coalizão, que forja relações inter-grupos,
dentro de interesses de poder especifico e político. Isto gera um aumento na capacidade dos
membros dos grupos em aceitar seus objetivos políticos e econômicos.
Críticas e perigos associados ao processo de empoderamento
Labonte (Bernstein et al., 1994), ressalta que as definições e significados de
empoderamento tendem a dois extremos: a uma perspectiva burocrática oficial, onde
empoderamento tende a ser associado a padronização, “eu devo empoderá-lo para fazer isto”;
e a uma perspectiva do staff ativista, onde o empoderamento é sempre visto como legítimo
apenas se os grupos capturarem poder. As relações de poder entre profissionais, instituições,
estados, grupos comunitários (sociedade civil) são raramente conhecidas ou exploradas.
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Ainda para esse autor, os programas baseados em grupo educacional e comunitário são os
melhores veículos para o empoderamento das comunidades. Ressalta uma crítica, alertando
que a importância do empoderamento e a forma empática de serviços está sendo esquecida
grandemente pela política pública, no sentido de fornecer provisão desses serviços. Está
inserida nesta discussão, a dialética entre o relacionamento de serviços e empoderamento. De
um lado, os serviços são sempre veículos através dos quais grupos marginais se tornam
envolvidos em ações políticas e decisões publicas; de outro lado, os serviços podem sempre
ser desempoderados e ter uma dependência não saudável do Estado. Assim, eles diminuem o
senso de autonomia entre os grupos, evitando o engajamento na ação política desses mesmos
grupos. Afirma, ainda, Labonte (Bernstein et al., 1994) que existe um uso do conceito de
poder e empoderamento sem considerar o seu contexto, e uma falta de análise da opressão
política e do prejuízo psicológico que isso pode criar. Divorciado do seu contingente
histórico, o empoderamento é mais um paliativo do que um desafio ao status quo. Em nome
do empoderamento e da sociedade civil, a responsabilidade para o bem-estar social está sendo
relegada ao mais baixo nível da organização social.
Já Gutierrez (Bernstein et al., 1994), aponta a preocupação na estratégia de habilidade do
empoderamento em liderar uma grande transformação social. Aponta, como problema e
limitações reais, o foco do empoderamento baseado na individualidade, no desenvolvimento e
na mudança social. Para esse autor, a teoria de empoderamento baseia suas estratégias de
mudança nas transformações pessoais e coletivas, mais do que nas mudanças políticas ou em
outras forças sociais. Coloca a crítica de que, o empoderamento assume que, com a mudança
da consciência e da capacidade daqueles que tem menos poder, a ordem social pode ser
transformada. A teoria do empoderamento ignora os modos através dos quais o conflito é
necessário para um mudança social e nem focaliza as mudanças de consciência daqueles que
tem o poder (Bersntein et al., 1994: 288).
Zimmerman aponta como limitação ao processo de empoderamento, o fato dele não ser
um remédio para todos os males e nem uma meta apropriada em todos os contextos. Pensa,
também, que os muitos usos do termo e as muitas definições de planejamento, causam um
problema para a sua aplicação no contexto de pesquisa (Bersntein et al., 1994: 288).
Uma outra crítica, levantada por Braithwaite (Bersntein et al., 1994: 289), é que para se
proporcionar o empoderamento, é preciso admitir que as comunidades possuem um saber que
lhes é próprio, uma inteligência comunitária. A própria formação dos profissionais de saúde
não leva em conta esse saber; pelo contrário, lhes é ensinado que eles possuem as respostas
para os males das pessoas, o que gera uma grande contradição. O desafio é maior para aqueles
que estão no nível da prática. Abandonar o poder e o controle sobre esses recursos, em favor
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de um processo de desenvolvimento e planejamento coletivo, não é o comum. Profissionais de
saúde pública sempre abusam de dados epidemiológicos, como sendo as únicas informações
com credibilidade para planejar, e não vêm a inteligência comunitária como uma informação
viável para a solução dos problemas.
2.2- Empoderamento: uma articulação no campo do envelhecimento
A Gerontologia é a ciência que estuda o envelhecimento, nos seus múltiplos aspectos. Ao
fornecer bases teóricas para a construção positiva da velhice, objetiva que a vida tardia seja
vivida com o máximo de autonomia e independência.
A Gerontóloga Social canadense, Ellen Gu, resumiu o curso de uma sociedade mais velha,
afirmando que essa sociedade é composta de duas realidades que refletem as duas faces da
velhice:
Um aumento do número de pessoas acima de 85 anos, resultando no aumento da
responsabilidade de cuidados;
Um aumento no número de adultos velhos saudáveis e capazes.
Cusack (1999) trabalha com a liderança de idosos, investindo na massa dos idosos
saudáveis ou sem muita incapacidade. Para ela, nesses tempos de recessão econômica, não
importando a idade, gênero e raça, as pessoas têm menos direitos e mais responsabilidade.
Esta mensagem tem implicações particulares para os idosos. Assim, o foco deve ser
desenvolver serviços para tornar as pessoas idosas capazes, para ficaram em suas próprias
comunidades, controlar suas próprias vidas e continuarem a serem produtivas. (Gee &
Gutman, 1995 apud Cusack, 1999).
Ellen Gu, recomenda uma política que objetive a reintegração das pessoas idosas à
sociedade, reforçando que se fará melhor se “enfocarmos uma política de rede social para a
população mais velha e se enfocarmos nossa atenção para temas de empoderamento (....”
(Gee & Guttman, 1995:6). Deste modo, o empoderamento
de cidadãos idosos,
individualmente e coletivamente, se torna uma prioridade.
Para Cusack (1999) é importante aproveitar essa grande fonte de recursos, que é o
crescimento da população idosa, para oferecer treinamento e suporte. Para isso, é preciso
definir a estrutura organizacional e qual estilo de liderança facilitará a emergência de idosos,
treinados em liderança comunitária. Esta autora coloca, ainda, que o mandato central do
serviço social, é direcionado para proporcionar aos idosos um maior controle sobre suas vidas
e maior poder de decisão nos grupos comunitários e em outras organizações a que pertençam,
estando, portanto, diretamente relacionado com o empoderamento.
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Thurz (1993), que também trabalha com o empoderamento de idosos, vai nessa mesma
direção, colocando um desafio para todos os que trabalham no campo do envelhecimento:
fazer do empoderamento dos cidadãos idosos uma prioridade.
Myers (1993) reafirma esse desafio, na amplitude social, alertando para a necessidade das
sociedades atuais desenvolverem regras para as pessoas idosas, de tal forma, que elas possam
encontrar um sentido de ser e eleger, para si mesmas, o propósito de serem respeitadas pelos
outros, além de se destinarem à construção de uma barreira efetiva contra a vulnerabilidade
que as ameaça.
Esses autores trazem a discussão do empoderamento dos idosos, como uma prioridade,
justificando, que, com a longevidade, há, geralmente, um processo de desempoderamento.
Mudanças sociais nos modos de agir podem levar a uma perda de poder da autonomia e
independência individual. Tipicamente, a interação de fatores individuais e sociais, na velhice,
traz um ciclo negativo de desempoderamento, resultando na necessidade de reverter esse ciclo
através do “re-empoderamento” (1993 apud Cusack, 1999:13).
Thurz (1993) - presidente do Conselho Nacional dos idosos dos Estados Unidos –
desenvolve workshops, através da Federação Internacional dos Idosos – IFA, que têm como
resultado a compilação de várias experiências de idosos, que se organizam para modificar a
situação de suas vidas. Assim, surge a publicação “The Possibilities of empowerment”
(1993), no qual afirma, que cuidados e serviços para as pessoas idosas, são componentes
essenciais da resposta universal para os mesmos. Entretanto, algo mais é necessário, para que
a dignidade e a independência sejam mantidas através da vida. Pessoas idosas não devem ser
vistas como indivíduos inúteis, que tenham perdido sua utilidade para a sociedade. Ainda que
mais vulneráveis, os idosos merecem dignidade, amor e respeito. A comunidade deve se
organizar para prestar serviço a estas pessoas, providenciando a segurança, além do cuidado e
suporte que as famílias possam oferecer. Esta abordagem de perceber os idosos como um
grupo vulnerável, entretanto, cria uma dependência e freqüentemente tira do indivíduo, e até
de uma classe de indivíduos, o sentido de autonomia e de direção pessoal. Para manter
independência e dignidade, os idosos não podem somente ser objeto de compaixão e serviço.
Ambos, tanto o indivíduo como o grupo de cidadãos idosos, devem ser envolvidos em tomada
de decisões que afetam suas próprias vidas e a comunidade em que eles vivem.
Thurz (1993: 2) lança um desafio através dos seguintes questionamentos: Existem
meios de evitar o status de cliente ou paciente? Pode a autonomia e a escolha serem adotadas
por aqueles que trabalham com idosos?
Para pensar a este respeito, o autor conta uma fábula, para ilustrar os dois lados do
empoderamento: ele está fora, no meio ambiente, e ele reside internamente, na psique.
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“Uma cidade ganhou um urso. Ele estava numa jaula. As pessoas resolveram construir
um grande espaço para ele. Passou-se 1 ano. Então, a jaula foi removida. Apesar de
poder andar por todo o espaço do parque, o urso continuou a andar apenas no espaço
reduzido do que fora a jaula. Os limites da jaula estavam guardados em sua mente,
restringindo os seus movimentos.” (Brigid Donela, Universidade de Idosos apud
Thurz, 1993:2)
Como foi dito anteriormente, para falar de empoderamento em idosos, é preciso partir
do pressuposto que o processo de envelhecimento detona um processo de desempoderamento.
É Myers (1993) que traz a reflexão sobre esse ponto. Segundo ela, a velhice torna as pessoas
particularmente vulneráveis à análise e percepções sociais, existindo um perda real do poder
pessoal. A tendência para uma vulnerabilidade psicológica e emocional, que advém da
falência e queda social, parece ser natural. É, deste modo, imperativo que as pessoas idosas,
sejam alertadas para a possibilidade de prevenção, assim para as das conseqüências, caso as
pessoas desejem se tornar pessoas empoderadas na velhice. (1993:3).
“O empoderamento pessoal é um processo multidimensional e psicologicamente
complexo. Ele é melhor entendido através da consideração de fatores psicológicos
subjacentes, que, quando combinados com mudanças sociais em resposta à velhice,
podem levar a falta de empoderamento numa prévia independência individual. A
interação de mudanças individuais e sociais na velhice traz um conjunto de estágios
para um ciclo negativo de “desempoderamento” e, simultaneamente, revela
implicações para a reversão desta espiral negativa através do “re-empoderamento”
(Myers, 1993:3).
Myers (1993), estudando os aspectos psicológicos do envelhecimento, define três
processos fundamentais para se entender o empoderamento pessoal: valor pessoal, locus de
controle e auto-eficiência.
Valor pessoal se refere ao sentimento de auto-estima. Locus de controle se refere ao modo
como cada um avalia sua responsabilidade pessoal nos acontecimentos. Pessoas, com um
locus de controle interno percebem os acontecimentos como sendo seus, através de um
controle interno; já as pessoas com locus de controle externo, percebem os acontecimentos
como sendo devido a circunstâncias sobre as quais eles não têm controle. Auto-eficiência,
proposta por Bandina em 1977, como uma teoria de mudança de comportamento, se refere à
crença de que cada indivíduo tem controle ou poder de sua própria vida (1993: 3).
Ainda Myers (1993) traz uma discussão interessante para se entender o processo de
desempoderamento, que se está pressupondo que ocorra na velhice. O desempoderamento é
entendido através da discussão de falência social. Para ela, na velhice acontecem fenômenos
que estão fora do controle dos indivíduos como: o confronto com a morte, através da perda de
familiares e amigos; a saída do mercado de trabalho pela aposentadoria; a perda involuntária
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do emprego, como é o caso da aposentadoria compulsória; o maior índice de doenças, devido
ao declínio da vitalidade. Neste sentido afirma:
“Perda de membros da família, morte de amigos, mudanças geográficas, ou outros
fatores são exemplos de mudanças que ocorrem com os idosos sem que eles tenham
controle sobre os mesmos, e muitos desses indivíduos que antes tiveram muito
controle em suas vidas podem começar a perder o sentido de auto-eficiência”
(Myers,1993:4) .
Este processo pelo qual idosos ativos experimentam ajustamento negativo na idade
avançada, foi descrito por J. Kuypers e Vern Bengt’son (1973) como “Falência Social” (2)
(apud Myers, 1993:04). Sua descrição desta síndrome tornou-se a mais compreensível teoria
escrita para descrever o relacionamento entre idosos e o processo de desempoderamento. Essa
teoria define a interação entre investimento social e valor pessoal que resulta num ciclo de
auto-perpetuação de funções psicologicamente negativas. Este processo inclui quatro estágios
importantes:
Estágio 1: o primeiro estágio de falência social é uma pré-disposição existente para
suscetibilidade à depressão. As atitudes negativas e o preconceito, em relação aos idosos, que
existem na maioria das sociedades, contribuem para este estágio. Pessoas idosas são parte da
sociedade em que vivem e elas podem ter um visão negativa da velhice e interiorizarem essas
atitudes negativas para elas mesmas. Para muitas pessoas idosas, a perda do status social que
acompanha a aposentadoria, cria dúvidas sobre suas próprias capacidades. O declínio da força
física e da saúde pode criar dúvida sobre a capacidade do idosos viverem com independência.
Estágio 2: o segundo estágio inicia quando alguém ou um grupo de pessoas começa a ter
dúvidas sobre a capacidade ou o comportamento do idoso. Quando é dito que idosos são
menos capazes, os próprios idosos começam a questionar suas próprias capacidades.
Estágio 3: no terceiro estágio, o idoso começa a ter mais doença e dependência, do que saúde
e independência. É esperado dos idosos que aprendam e se acomodem ao papel de doente.
Mas, à medida que os idosos incorporam esse papel passivo, a sua vida independente vai se
atrofiando e desaparecendo.
Estágio 4: no quarto estágio, os idosos continuam a experimentar a atrofia do comportamento
independente, acompanhada pelo aumento da identificação com o papel de doente. Uma nova
percepção negativa, como inadequados e incapazes de ação independente, é desenvolvida.
Neste estágio, a auto-eficiência é prejudicada. A baixa expectativa de sucesso, resultante de
um comportamento dependente, é comum. Observa-se, que neste último estágio, o ciclo da
doença começa a repetir-se, mas com uma grande diferença; o idoso está agora mais
suscetível à avaliação negativa dos outros e mais vulnerável à interiorização de suas
percepções. A seqüência de quedas continua de uma maneira negativa e progressiva. A
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ausência de uma intervenção, para diminuir ou reverter este comportamento, poderá levar o
idoso à incapacidade e até mesmo a morte (Myers, 1993:6-7).
Myers (1993) ressalta, ainda, que alguns fatores psicológicos podem estar associados a
essa síndrome de falência social, que são: carência, depressão e desencorajamento. Pessoas
que experenciam ruptura/perda social podem experimentar uma ou mais combinações desses
fatores psicológicos. Entretanto, é possível intervir nessa espiral negativa do processo de
falência social, através de algumas estratégias. Myers resgata a síndrome de reconstrução
social, descrita por Kuypers and Bengtson (apud Myers, 1993), que pode ser vista também
como um modelo de empoderamento. As estratégias podem alterar a qualidade de vida, assim
como a intervenção no bem-estar pode alterar o ciclo de falência social numa direção positiva.
Reconstrução social, segundo Kuypers & Bengtson (apud Myers, 1993:06), se referem
ao processo de interrupção da síndrome de falência social, pelo aumento de competência
de pessoas idosas, através da seleção de intervenções psicológicas, sociais e ambientais.
Tais intervenções podem ocorrer em qualquer nível da espiral de falência social, mas as
intervenções que ocorrem mais cedo são mais eficazes. Interromper o primeiro estágio de
falência social requer atenção para as redefinições sociais, no sentido de aumentar o valor
dos indivíduos idosos. A valorização de atividades precisam ser cultivadas, como por
exemplo, trabalho voluntário, serviço comunitário, consultoria, etc.
“o desafio das sociedades é desenvolver atividades para as pessoas idosas nas quais
elas possam encontrar um senso de significado e perspectiva, atividades estas que
sejam respeitadas pelos demais e que ofereçam uma barreira efetiva para a
vulnerabilidade que existe para a maioria das pessoas idosas.” (Myers, 1993:6)
O que é mais importante, na perspectiva social é a necessidade de mudar as
colocações negativas para as pessoas idosas. Dentro das atitudes de decisão, ao invés de fazer
as coisas pelas pessoas idosas, a meta deve ser desenvolver atividades que permitam às
pessoas idosas serem parte do processo decisório, concernente aos eventos de suas próprias
vidas.
Empoderamento através da prevenção e do bem-estar. O empoderamento pode ser
visto tanto do ponto de vista da prevenção quanto da conseqüência. É melhor começar as
intervenções enquanto o “desengajamento” e o desencorajamento ainda não foram
internalizados. As intervenções preventivas enfatizam o empoderamento, ainda num
estágio de saúde e bem-estar, antes da doença ser instalada. O empoderamento, sob esta
perspectiva, reflete um conceito de vida, no qual as pessoas possam viver com mais saúde
e escolher um ambiente mais saudável.
A perspectiva do “ciclo de vida” ou lifespan necessita que os indivíduos estejam atentos
ao seu desenvolvimento físico e emocional, dentro do seu ciclo de vida. As várias escolhas
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podem, mais cedo ou mais tarde, afetar o funcionamento do ciclo de vida num estágio mais
tardio de suas vidas. “O bem-estar como uma filosofia de empoderamento se refere a
necessidade de ser assertivo, em criar seus próprios desejos para a sua vida, ao invés de
meramente reagir as circunstâncias da vida” (Myers, 1993:7). Neste ponto, recorda-se o
refrão da música de Geraldo Vandré, na época da ditadura militar no Brasil: “quem sabe faz a
hora não espera acontecer”. Isto significa ser responsável pelas suas próprias escolhas, e
deliberadamente, fazer escolhas que resultem em melhor saúde e bem-estar.
O bem-estar aumenta a possibilidade dos indivíduos tomarem conta de si mesmos. “A
abordagem do bem-estar empodera os indivíduos para se tornarem mais auto-suficientes e
manterem seus estilos de vida com mais saúde. Isto é verdade em qualquer ponto do ciclo de
vida e pode ser especialmente importante para o final da vida”.(Myers, 1993:07). Essas
intervenções de bem-estar devem ser discutidas à luz de uma abordagem holística, que integra
funções físicas, emocionais e espirituais. Esses três aspectos estão interrelacionados, tanto que
uma mudança numa dessas áreas causa e contribui para uma mudança nas outras áreas. Estas
são mudanças positivas que demonstram que o todo é maior do que a soma de suas partes.
Myers (1993) faz uma ressalva, ao informar que este modelo de falência social e a
intervenção da reconstrução social, só têm eficácia para sociedades ocidentais, onde a visão
do processo de envelhecimento é, ainda, pejorativa. Está idéia está de acordo com a discussão
anterior sobre se levar em conta o contexto onde se dá o processo de empoderamento. Esta
autora, coloca que esse modelo é ineficaz em explicar ou predizer o ajustamento da velhice,
em sociedades onde se espera que as pessoas vivam uma vida passiva, na velhice; ou
naquelas, onde o envelhecimento é visto positivamente, com respeito e veneração. Pode-se
pensar, por exemplo, no Japão, onde as pessoas idosas são tradicionalmente respeitadas em
virtude de sua idade. Nestas sociedades, o primeiro estágio da falência social, que é a
depressão pela incorporação de valores sociais negativos, não existe, porque, embora possa
haver a dependência física, é mantido o respeito à pessoa idosa pelos membros mais jovens da
família. Por isso, a falência social não existe e o idoso não se sente desempoderado, do
mesmo modo como acontece nas sociedades ocidentais. Um outro exemplo é dado na cultura
budista, onde o status emocional é fornecido pelo aumento da idade; ou seja, quanto mais
velha, mais valorizada é a pessoa. Na sociedade ocidental, ao contrário, quanto mais velha,
menos poder a pessoa tem. Esses exemplos mostram a necessidade de se considerar o
empoderamento individual dentro de um contexto cultural.
Deste modo, o empoderamento das pessoas idosas nas culturas orientais pode ser visto
como contraproducente, da forma como foi definido dentro do contexto da falência social. Por
outro lado, o empoderamento, sob a perspectiva de bem-estar, já é um conceito viável em
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todas culturas. Isso porque as pessoas idosas, que experimentam bem-estar, estão aptas a
encontrar expectativas em suas culturas fazendo escolhas, que aumentem o seu bem-estar na
velhice. O bem-estar permite às pessoas experimentarem um senso de empoderamento, não
importando suas circunstâncias de vida. Dessa forma, a perspectiva de empoderamento sob a
filosofia de bem-estar tem uma aplicabilidade transcultural muito maior do que o modelo de
falência social (Myers, 1993).
Minkler (1992) desenvolveu um trabalho prático e teórico sobre empoderamento de
idosos, nos Estados Unidos, denominado Tenderloin Senior Organization Project – TSOP que reflete a definição de Promoção da Saúde da OMS, como um meio de ajudar indivíduos e
comunidade a terem um controle cada vez maior, sobre os fatores que influenciam sua saúde.
Através deste Projeto, os idosos de baixa renda identificaram e focalizaram problemas
comuns, tais como: criminalidade e segurança, desnutrição e direitos locatários. Estes idosos
desenvolveram associações de inquilinos e outras organizações comunitárias de base, que
proporcionaram o desenvolvimento de uma “comunidade competente”.
Minkler (1992), estudando o processo de empoderamento dentro da organização
comunitária, afirma que este conceito pode ser visto como uma operação em dois níveis
simultâneos: 1) o indivíduo envolvido num esforço de organização comunitária pode ter a
experiência de um aumento do apoio social e do senso de controle. Este aumento, no sentido
de auto-controle e determinação, pode, por sua vez, trazer benefícios positivos para a saúde.
Estudos mostram, por exemplo, que o envolvimento comunitário pode ser um fator
psicossocial significativo, para melhorar a percepção da confiança pessoal, duplicar a
capacidade individual e a satisfação em viver. Os benefícios para a saúde física com tais
atividades, também tem sido demostrados em pesquisas experimentais, sugerindo que a
participação social pode afetar o sistema de defesas do organismo e diminuir sua
suscetibilidade a doenças (Cohen, 1985 apud Minkler, 1992:304). Num nível mais
abrangente,
a
organização
comunitária
pode
contribuir
para
o
empoderamento,
operacionalizado, em parte, por um aumento da “competência comunitária”, definida por
Cotrell (1976), como aquela, cujas várias partes componentes podem colaborar efetivamente
em problemas de identificação, seleção de metas e ação. (apud Minkler, 1992). Ainda essa
autora:
“A medida que as comunidades se tornam gradualmente mais competentes ou
empoderadas, a chave dos indicadores social e da saúde pode refletir este fator, e a
ação coletiva pode trazer, à tona mudanças em muitos fatores que contribuíram para
esses mesmo problemas.”(Minkler, 1992:304)
Uma das bases teórica deste estudo piloto – o TSOP, é a Teoria do Apoio Social,
elaborada pelo epidemiologista social Cassel (1974) a partir de sua observação sobre os
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efeitos da diminuição do suporte social no sistema de defesa do corpo. Segundo esse autor, a
ausência de suporte social faz com que os indivíduo fiquem mais suscetível às doenças. A
principal hipótese desta teoria é a “Hipótese Buffering” (3), que sugere que o apoio social
trabalha para manter as pessoas saudáveis, fazendo a função de mediação do tempo de
estresse e ajudando no curto-circuito da resposta à doença, que geralmente segue à maioria
dos eventos estressantes de vida (apud Minkler, 1992). Esta hipótese tem uma relevância
particular para o campo da Promoção de Saúde e envelhecimento, na medida em que se
reconhece que os idosos se encontram numa situação de mais risco, tanto para a doença,
quanto para os eventos estressantes da vida (a morte de uma pessoa querida ou uma súbita
mudança geográfica), assim como a interrupção de suas tradicionais fonte de apoio social.
Uma outra hipótese, muito interessante, do apoio social, que tem relação direta com o
tema do empoderamento, é a hipótese de que o apoio social pode influenciar a saúde pelo
aumento do sentido de controle individual, que por sua vez pode levar a um resultado positivo
na saúde. Lager (1981) e Rodin (1986 apud Minkler, 1992) demonstraram a influência do
aumento do sentido de responsabilidade e de controle, no estado da saúde de idosos
institucionalizados, e examinaram a implicação de suas descobertas em outros grupos de
população de idosos. Langer observa, que os problemas ligados ao processo de
envelhecimento, podem estar na falta de controle dos idosos sobre suas vidas; falta, esta,
induzida pelo meio-ambiente; no caso, a institucionalização. Segundo este autor, a diminuição
na oportunidade de interação com outras pessoas e uma menor participação nos processos
decisórios podem estar entre os fatores que contribuem para a diminuição de controle que, por
sua vez, afeta a morbidade e a mortalidade (apud Minkler, 1992:305). Esta hipótese tem uma
importante implicação para os idosos, que tem muitas vezes a sua rede social diminuída e o
poder de decisão cerceado pelos familiares ou pela instituição, que retiram a autonomia dos
idosos de responsabilizarem sobre suas vidas.
Nesse sentido, o processo de empoderamento se torna algo relevante para se trabalhar o
campo do envelhecimento e Promoção da Saúde. Schindler (1999) ressalta, que para se
trabalhar com empoderamento de idosos, é preciso colocar os idosos como ponto central do
processo de ajuda. Dentro de uma abordagem pós-modernista do empoderamento, onde “todo
fenômeno é significante e causal somente quando incorporado em um processo psicológico
de criação de seu próprio texto e narração” (1999:157). Para Schindler, “o processo de
empoderamento começa quando a busca (procura) e o sentido (significado) entre
pesquisador e o cliente é feito de modo que mais tarde possa se estabelecer um sentido maior
na interpretação desse significado.” (1999: 165).
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Hazan (1994 apud Schindler, 1999) parte, também, do pressuposto que idosos e jovens
constituem dois grupos distintos de população. Esta observação, hoje, pode ser vista em
muitas áreas de suas vidas. Os idosos são rotulados, nas esferas econômicas, como não
produtivos; nos serviços de saúde, como sobrecarregando o sistema; em recursos de
capitalização, como deixando os jovens sem fundos suficientes. A partir daí, este autor afirma
que os idosos precisam se ligar a um mundo que seja protetor. Como principais intervenções
propõe duas estratégias: a primeira delas, é incluir os idosos em grupos fraternais, sociais e
religiosos, tornando-os capazes de promoverem meios, subsídios para o empoderamento;
grupos estes, com significância social, de forma a acrescentar uma identidade social e
individual aos idosos. A segunda estratégia é conectar o idoso em seu grupo primário: a
família.
“o ato de empoderamento inclui engajar a família a focalizar em suas correntes de
força. O suporte dado pelas famílias em tempos de crise e ao papel do terapeuta em
guiar esse processo através da auto-revelação, aumenta a procura do significado
existencial, entendimento e controle para população idosa. (Schindler, 1999:175)
2.3 - Autonomia positiva como um indicador de saúde
Pelo fato de se entender o empoderamento como um processo pelo qual as pessoas obtêm
controle sobre suas vidas, então, se faz necessário trabalhar com um indicador de saúde, que
venha ao encontro deste processo. Empoderamento é um estado de ter poder, ou seja, de obter
as ferramentas necessárias para mover a própria vida na direção que se deseja que ela se
mova. Neste sentido, ele está associado diretamente ao conceito de automonia. Assim, tem-se
o indicador de autonomia, visto a partir do modelo de Autonomia Positiva, desenvolvido por
Farinatti (1997). Para este autor, “da mesma forma que saúde não é ausência de doença, a
autonomia não é ausência de dependência física” (1997:32). Deste modo, a autonomia é vista
sob o prisma da auto-realização, da perspectiva da realização das possibilidades.
Na argumentação de Kalache, a sociedade sonha com uma população que viva cada vez
mais, tendo aspirações que o idoso mantenha sua saúde com autonomia, para o desempenho
das “funções do dia-a-dia que o façam independentes dentro do seu contato sócioeconômico-cultural.” (1987:208). Desse modo, envelhecer sem incapacidades é fundamental
para a qualidade de vida. Assim, autonomia e independência são dois indicadores de saúde e
de qualidade de vida, para a população mais velha. (Paschoal, 1996).
Cusack, estudando as mudanças na natureza da aposentadoria, faz uma ressalva sobre as
palavras senior (idoso, velho) e retirement (aposentado) afirmando que elas estão se tornando
cada vez menos usadas, devido a tendências de atividades durante a vida tardia. Descrever
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indivíduos como sendo da “Terceira Idade” (Third Age) representa uma alternativa para os
termos elderly (envelhecimento) e senior (idoso) refletindo um movimento em direção a um
maior respeito. O conceito de Terceira Idade é tanto uma definição individual quanto coletiva.
Uma sociedade na Terceira Idade é definida “demograficamente, onde 10% ou mais de sua
população tem acima de 65 anos e 50% dos adultos acima de 25 anos com expectativa de
vida de no mínimo 70 anos.” (Cusack, 1999:13).
A nível individual, a terceira idade pode ser concebida como o terceiro dos quatro
estágios do curso da vida, definidos por Laslett (1987 apud Cusack, 1999:13):
um estágio de dependência, educação e sociabilização;
um estágio de individualização e responsabilidade;
um estágio de realização pessoal e desempenho e realização;
um estágio de dependência e decrepitude.
Laslett sugere, que é no terceiro estágio, que estão a maioria das características da
aposentadoria. A terceira idade acontece, geralmente, após a aposentadoria do homem. Para
as mulheres, que foram donas de casa, este estágio pode vir como um alívio das
responsabilidades familiares, como por exemplo, após a viuvez ou a morte de pais idosos. De
qualquer forma, o que Cusack (1999) enfoca é que, para ambos, este é um período na vida
tardia, caracterizado por uma participação ativa e escolhas pessoais, antes do período de uma
dependência maior. A promessa dessa “nova terceira idade” significa a produtividade (não
através do trabalho, mas daquelas atividades que escolheu para desenvolver) e o engajamento
ativo. Nesse sentido, o período do quarto estágio - representado pelo declínio e a dependência
– será severamente reduzido ou até eliminado, para a maioria das pessoas.
Ao se enfocar a autonomia positiva, o que se pretende é focar a saúde e não mais a
doença. Estando associada diretamente à noção de saúde positiva, “a abordagem da
autonomia é positiva quando ela é vista sob o prisma da realização da autocapacitação (...)
bons níveis de autonomia positiva são importantes para um bem estar verdadeiro.” (Farinatti,
1997:33). Downie (1991) define bem-estar verdadeiro ligando-o às possibilidades de
“controlar a própria vida, de escolher o que se quer fazer ou ser, de desenvolver os talentos
individuais” (Farinatti,1997:33). Dessa forma, Farinatti conclui que o bem-estar verdadeiro
nada mais é do que a “conseqüência natural do processo de autocapacitação
(empoderamento), da autonomia individual face às circunstâncias da vida” (1997: 33).
Valores de autonomia e empoderamento
Uma outra abordagem de empoderamento é caracterizada pela identificação de forças, ao
invés de catalogar fatores de risco; pelo aumento do bem-estar, ao invés de fixar problemas;
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pela procura de influências do ambiente, ao invés de culpabilizar as vítimas (Zimmerman,
apud Berstein et al., 1994: 283).
Farinatti (1997) define três níveis da autonomia positiva: 1) autonomia de ação, que
incorpora a noção de capacidade física. É a pessoa poder se mover fisicamente de forma
independente; 2) autonomia de vontade (ou de intenção), que se refere à capacidade de autodeterminação, que é um valor da autonomia que será definida mais adiante, por Downie
(1999). Se relaciona com a capacidade do indivíduo escolher livremente, de acordo com a sua
vontade; 3) autonomia de pensamento, que é um nível mais profundo da autonomia,
diretamente relacionado com a autonomia de vontade, só que pressupõe um conhecimento
crítico, uma reflexão mais consciente de escolha.
O primeiro nível de autonomia tem a ver com a capacidade física e pode ser medida pelas
escalas que medem Atividade de Vida Diária - AVD. Já os outros dois níveis abordam a
questão do poder de decisão, ou seja, ser autônomo não é só ter capacidade física, mas ter
autonomia para decidir sobre a sua vida. Neste sentido, eles estão diretamente relacionadas ao
empoderamento que é o indivíduo poder obter controle sobre a sua vida.
Downie (1999) traz, para dentro do campo da Promoção da Saúde, a discussão sobre
valores associados à autonomia. Para ele, valores são princípios que as pessoas têm e que
regem as escolhas perante a vida. Esses valores são sempre comparativos, ou seja, os
indivíduos vão valorizar algo sempre em comparação a outros valores. Cita como exemplo, as
escolhas dos indivíduos sobre sua saúde. Se a saúde está entre os princípios pessoais, o
indivíduo irá sacrificar outras coisas em nome da obtenção da saúde. Por exemplo, a pessoa
que é fumante e está com câncer, pode escolher parar de fumar em nome da restauração da
sua saúde; e estará sacrificando seu prazer em fumar, em nome da saúde.
Ainda esse autor, coloca que existem valores consensuais que são compartilhados
historicamente pelas sociedades, como a solidariedade, a preocupação com o meio-ambiente,
etc. Assim como existem valores sociais, existem também valores pessoais, que são
compartilhados e que são necessários para a prosperidade da humanidade. São eles:
Capacidade de auto-determinação, que se refere à “habilidade para se auto-determinar”,
ou seja, a habilidade para escolher por si mesmo, ou mais extensivamente, a habilidade
para formular e continuar com os seus próprios planos. A importância de se atentar para
essa habilidade está relacionada à autonomia, isto é, estar apto a andar com seus próprios
pés, ou por seus próprios meios; conhecer o que deseja; ter objetivos na sua vida. Deste
modo, “auto-determinação é um valor pessoal essencial para o crescimento e
desenvolvimento da personalidade humana e, portanto, do verdadeiro bem-estar.”
(1999: 162).
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Capacidade de auto-governo, que se refere à habilidade de se auto-governar e tem por
objetivo a igualdade de condições. Tem a ver com a alteridade, ou seja, de se colocar
além de seu próprio interesse para levar em conta as necessidades dos outros, como se
fossem a sua própria. Se relaciona também com a equidade, e reflete um traço de
maturidade da personalidade.
Senso de responsabilidade, que pode ser caracterizado como a habilidade de se
responsabilizar por suas ações.
Auto-desenvolvimento ou auto-realização, que está relacionado com o sentimento de
que existem algumas atividades – físicas, mentais ou sociais – nas quais as pessoas podem
se destacar. Este sentimento cria um desejo de desenvolver esta capacidade e expressá-la.
A literatura de Educação em Saúde e Promoção da Saúde reconhece a importância dos
valores denominados de “auto-desenvolvimento ou auto-realização”, pela relevância que dão
à aquisição das chamadas “habilidades pessoais – lifeskills” (Downie, 1999:163). Habilidades
pessoais envolvem aprendizagem e tomada de decisão; de como obter controle de sua própria
vida, mais do que estar à mercê das circunstâncias, assim, o empoderamento está mais
relacionado ao chamado “auto-desenvolvimento”. Autores como Antonovsky (1984 apud
Downie et al, 1999) apontam a importância de adquirir o “senso de coerência” sobre a sua
própria vida.
Estes valores estão diretamente relacionados à auto-estima. Porém, Downie (1999)
afirma que a auto-estima não deve ser considerada como um valor pessoal, já que ela não é
algo que se possa escolher. O que pode ser escolhido é o auto-desenvolvimento, ou, em
linguagem mais coloquial da Promoção da Saúde, as habilidades pessoais. É importante
ressaltar, entretanto, que se a pessoa escolhe desenvolver as habilidades pessoais, a autoestima virá como resultado. Em outras palavras, a auto-estima é um produto, uma
consequência das habilidades pessoais.
Downie (1999) relaciona estes quatro valores como faces de um mesmo conceito,
muito usado na literatura médica e da saúde, que é o conceito de autonomia. Coloca ainda três
aspectos importantes para entendermos a autonomia como um valor pessoal:
A autonomia deve ser entendida como um valor unificado da personalidade individual,
apresentando aspectos cognitivos, afetivos e conotativos;
Estes valores existem dentro de um contexto social e não podem ser entendidos fora desta
dimensão, porque os seres humanos não existem completamente separados dos outros. Os
ingredientes da autonomia são carregados de referenciais essenciais para a sociedade. Isto
quer dizer, que, na dimensão social, a pessoa autônoma é um cidadão; e emocionalmente
significa que uma pessoa autônoma não vive num vazio, ou seja, a pessoa só existe em
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relacionamentos emocionais com outras pessoas, e estes relacionamentos são essenciais
para a identidade delas (1999: 165).
E por fim, destaca-se que a autonomia é um valor. É ideal objetivá-la desta forma, mais do
que como uma característica que todo mundo possui.
“A Promoção da Saúde é um movimento que contribui para o desenvolvimento da
autonomia. Este é o motivo pelos quais os promotores frequentemente expressam seus
objetivos profissionais em termos do conceito de empoderamento. Empoderar pessoas
é tornar possível, ou permitir que as pessoas desenvolvam a sua autonomia ou se
tornem o que elas querem ser” (Downie, et al, 1999:165).
Conforme dito anteriormente, esses valores consensuais devem ser adotados pelas
sociedades se elas quiserem prosperar. Valores, esses, tanto pessoais como sociais; “ ambos
os valores expressam verdades físicas e psicológicas sobre o ser humano e a pressão, ou
coação sobre suas vidas. Em ambos os casos, os valores são fontes do empoderamento o qual
constitui o verdadeiro bem-estar individual e social.” (Downie et al., 1999:167).
Notas:
(1) Todas as traduções do inglês para o português são traduções livres.
(2) O termo em inglês, social breakdowm, foi traduzido por “Falência Social”, tradução livre.
(3) A “Hipótese Buffering” pode ser traduzida como tamponamento.
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Capítulo 3
Grupo como apoio social
“A um homem nada se pode ensinar. Tudo o que podemos fazer é
ajudá-lo a encontrar as coisas dentro de si mesmos.”
Galileu
3.1 A experiência da vivência grupal
Existem várias teorias de grupo, chamadas de grupoterapias, estudadas por várias
correntes da psicologia. Entre elas, pode-se citar a teoria psicanalítica, com Freud e Bion;
Pichon Riviére, com os grupos operativos; uma vertente mais sociológica, com Kurt Lewin;
Moreno, com psicodrama, entre outros. Existem, portanto, estudos voltados para a macrosociologia e a psicologia, que abordam os grandes grupos, e a micropsicologia, com o estudo
dos pequenos grupos (Zimerman, 1997).
Interessa, neste trabalho, focalizar algumas noções básicas dos grupos e suas
características, já que o foco desta pesquisa são os grupos voltados para a Promoção da Saúde.
Um grupo é formado por um conjunto de pessoas, a comunidade é formada por um
conjunto de grupos, e a sociedade é o conjunto interativo de várias comunidades. Mills define
grupo como:
“unidades compostas de duas ou mais pessoas que entram em contato para
determinado objetivo, e que consideram significativo o contato e representam não
apenas microsistemas, mas são também, fundamentalmente, microcosmos de
sociedades mais amplas.” (1970: 13)
Uma outra definição, bastante conhecida, é a de Olmsted que entende grupo como: “uma
pluralidade de indivíduos que estão em contato uns com os outros, que se consideram
mutuamente e que estão conscientes de que têm algo significativamente importante em
comum.” (1970 apud Braghirolli, et al., 1999: 122).
Segundo Zimerman (1997), todo ser humano é gregário por natureza, existindo em função
dos seus relacionamentos. Como diz Osório (1997), a interação entre os membros de um
grupo é o fenômeno que centraliza a atividade de qualquer agrupamento humano. Os seres
humanos nascem e pertencem a um primeiro grupo que é a família nuclear; depois, passam a
estabelecer outros grupos, como o da escola, trabalho, círculo social, entre outros.
É importante fazer a distinção entre grupo e agrupamento. Para ser considerado um grupo,
é preciso que exista, entre as pessoas, uma interação social e algum tipo de vínculo, “pode-se
dizer que a passagem da condição de um agrupamento para a de um grupo, consiste na
transformação de” interesses comuns” para a de “interesses em comum” (Zimerman,
1997:28). Para exemplificar um agrupamento, podemos pensar numa fila de ônibus, onde as
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pessoas estão com interesse comum de pegar o ônibus, mas não possuem nenhum vínculo
entre si.
Dessa forma, para que seja caracterizado um grupo é preciso que:
Os integrantes estejam reunidos em torno de um interesse comum;
No grupo, o “todo é maior do que as partes” (como numa gestalt), ou seja, um grupo se
constitui como uma nova identidade sendo mais do que apenas o somatório dos seus
membros;
É preciso que se mantenham discriminadas as identidades individuais, de forma que as
pessoas mantenham a sua individualidade e não virem uma massa indiscriminada;
É preciso que haja alguma forma de interação afetiva entre os membros do grupo, ou seja, que
seja estabelecido algum tipo de vínculo entre os integrantes;
É inerente à formação de um grupo a presença de um “campo grupal dinâmico”, onde
transitam fantasias e ansiedades. Assim, pode-se defini-lo:
“o campo é composto por múltiplos fenômenos e elementos do psiquismo e, resulta
que todos esses elementos, tanto os intra como os inter-subjetivos, estão articulados
entre si, de tal modo que a alteração de cada um deles vai repercutir sobre os demais,
em uma constante interação entre todos” (Zimerman, 1997:29).
Em todo grupo se forma o chamado “Campo grupal” (Zimerman, 1997), um campo onde
fenômenos circulam. Zimerman (1997) descreve seis fenômenos importantes que definem o
campo grupal:
A ressonância, que é um fenômeno comunicacional, onde a fala trazida por um membro do
grupo vai ressoar em outro, transmitindo um significado afetivo equivalente, e assim,
sucessivamente.
O fenômeno do espelho, conhecido como galeria dos espelhos, onde cada um pode ser
refletido nos, e pelos outros; o que nada mais é, do que a questão da identificação, onde o
indivíduo se reconhece sendo reconhecido pelo outro, e assim vai formando a sua identidade;
A função de “continente”, ou seja, o grupo coeso exerce a função de ser continente das
angústias e necessidades de cada um de seus integrantes.
O fenômeno da pertencência, chamado por Zimerman de vínculo do reconhecimento, que é “
o quanto cada indivíduo necessita, de forma vital, ser reconhecido pelos demais do grupo
como alguém que, de fato, pertence ao grupo. E também alude à necessidade de que cada um
reconheça o outro como alguém que tem o direito de ser diferente e emancipado dele” (1997:
39);
A discriminação, que é a capacidade de fazer a diferença entre o que pertence ao sujeito e o
que é do outro; ou seja, diferenciar entre fantasia e realidade, presente e passado, entre o
desejável e o que é possível naquele momento, etc.
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A comunicação, seja ela verbal ou não-verbal, fenômeno essencial em qualquer grupo onde
mensagens são enviadas e recebidas, podendo haver distorção e reações da parte de todos os
membros do grupo.
Zimerman (1997) classifica ainda, dois tipos de grupos, segundo o critério de finalidade,
em operativos e psicoterápicos.
Em relação aos grupos operativos, a sua sistematização foi feita por Pichon Riviére desde
1945, que definiu grupo operativo como “um conjunto de pessoas com um objetivo em
comum” (apud Bleger, 1993:55). Como diz Bleger (1993), os grupos operativos trabalham na
dialética do ensinar-aprender; o trabalho em grupo proporciona uma interação entre as
pessoas, onde elas tanto aprendem como também são sujeitos do saber, mesmo que seja
apenas pelo fato da sua experiência de vida; dessa forma, ao mesmo tempo que aprendem,
ensinam também. Assim:
“o ser humano está integralmente incluído em tudo aquilo em que intervém, de tal
maneira que quando existe uma tarefa sem resolver há, ao mesmo tempo, uma tensão
ou conflito psicológico, e quando é encontrada uma solução para um problema ou
tarefa, simultaneamente fica superada uma tensão ou um conflito psicológico”
(Bleger, 1993:62).
Os grupos operativos abrangem quatro campos:
Ensino-aprendizagem: cuja tarefa essencial é o espaço para refletir sobre temas e discutir
questões, pode-se exemplificar com os “grupos Balint” nos hospitais, com objetivo de
trabalhar a relação médico-paciente mais satisfatória, e os “grupos de reflexão” que serão
abordados mais adiante.
Institucionais: grupos formados em escolas, igrejas, sindicatos, promovendo reuniões com
vistas ao debate sobre questões de seus interesses.
Comunitários: utilizados em programas voltados para a Promoção da Saúde Mental, por
exemplo, grupo de gestantes e de crianças, onde profissionais não-médicos são treinados para
a tarefa de integração e incentivo a capacidades positivas.
Terapêuticos: como o nome já diz, objetiva a melhoria da situação patológica dos indivíduos,
tanto a nível físico quanto psicológico, que seriam os grupos de auto-ajuda, Alcoólicos
Anônimos, etc. ( Zimerman, 1997:76)
Os grupos psicoterápicos, Zimerman denomina-os para “formas de psicoterapia que se
destinam prioritariamente, à aquisição de insights, notadamente, dos aspectos inconscientes
dos indivíduos e da totalidade grupal” (1997:78); que seriam os chamados grupoterapias,
com abordagens diversas como a psicanalítica, a teoria sistêmica, a abordagem cognitivocomportamental e a psicodramática. Para maiores informações dessas abordagens ver
Zimerman (1997).
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É importante ressaltar, ainda, que tanto o grupo operativo pode propiciar um beneficio
psicoterápico, quanto os grupos psicoterápicos se utilizam do enfoque dos grupos operativos.
Já que “os grupos de ensino não são diretamente terapêuticos, mas a tarefa da aprendizagem
implica em terapia; toda aprendizagem bem realizada e toda educação é sempre,
implicitamente, terapêutica” (Bleger, 1993:63). E ainda, “pensar equivale a abandonar um
marco de segurança e ver-se lançado numa corrente de possibilidades”(Bleger, 1993:65).
Braghirolli (1999), estudando o comportamento e a formação dos grupos, coloca a
necessidade que existe nas pessoas de participar dos mesmos, levantando a seguinte
indagação: “Por que as pessoas se reúnem em grupos?”. As pesquisas demonstram que o ser
humano nasce com necessidades sociais e que a participação nos grupos tem intenção de
satisfazê-las. A teoria das necessidades pessoais, de Schultz, coloca que “as pessoas não se
integrarão em um grupo se ele não trouxer a satisfação de certas necessidades fundamentais
que são: necessidade de inclusão, necessidade de controle e necessidade de afeição.” (apud
Braghirolli, et al., 1999: 128).
A “necessidade de inclusão” é definida como a necessidade de se sentir integrado,
valorizado, aceito totalmente pelos demais”; a “necessidade de controle” pode ser entendida
como a necessidade de estabelecer, para si mesmo, quais são as suas responsabilidades e as
dos outros. O indivíduo precisa sentir-se totalmente responsável pelo grupo, seus objetivos,
estrutura, funcionamento e progresso; e a “necessidade de afeição”, que é descrita como a
necessidade que aparece depois das duas necessidades anteriores, e que representa o desejo de
ser valorizado, de ser percebido como insubstituível pelo grupo. Seria o desejo secreto de
todos os indivíduos, como participantes de um grupo. O indivíduo quer ser, ao mesmo tempo,
valorizado por sua competência e aceito como pessoa (Braghirolli et al.; 1999).
O estudo dos grupos é interessante porque existe, atualmente, uma proliferação de espaços
de convivências para idosos, ou os chamados “grupos de terceira idade”, que se fazem
presentes em universidades públicas, em centros de saúde, em órgãos privados como o SESC,
em espaços culturais e religiosos.
Atualmente, a sociedade busca esses espaços, como forma de engajar e reintegrar os
idosos ao meio social.
Debert estuda esses novos espaços, que trabalham com a temática do envelhecimento na
atualidade, denominado-os de “formas de gestão da velhice” (1999:30). São formas que
procuram entender o diálogo entre as representações do envelhecimento e as práticas voltadas
para um envelhecimento saudável ou bem-sucedido; formas estas, ocupadas pelos diversos
programas voltados para a terceira idade, ou para o público idoso.
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Debert (1999) chama a atenção para o contexto, onde se dá o surgimento dos grupos de
convivência e as universidades, voltadas ao atendimento ao idoso. Os grupos surgem num
contexto, onde uma nova linguagem aparece para tratar os velhos e aposentados, linguagem
esta onde:
“Terceira idade substitui a velhice; a aposentadoria ativa se opõe à aposentadoria; o
asilo passa a ser chamado de centro residencial, o assistente social de animador e a
ajuda social ganha nome de gerontologia. Os signos do envelhecimento são invertidos
e assumem novas designações: “nova juventude”, “idade do lazer”. Da mesma forma
invertem-se os signos da aposentadoria, que deixa de ser um momento de descanso e
recolhimento para tornar-se um período de atividade e lazer.” (Debert, 1999: 61)
O que se observa, é que existe uma preocupação, nesse novo contexto, que extrapola o
problema econômico e inicia uma problematização ao redor da integração do idoso na
sociedade, população antes tida como marginalizada. Os grupos surgem, então, para dar conta
desse novo contingente que começa a aparecer e se fazer presente na sociedade.
Visa-se, nesta dissertação, enfocar a discussão sobre grupos que tenham como
direcionamento a Promoção da Saúde, ou seja, que objetivem a melhoria da qualidade de vida
dos idosos.
Neri define qualidade de vida na velhice, qualidade esta onde “envelhecer
satisfatoriamente depende do delicado equilíbrio entre as limitações e as potencialidade do
indivíduo, o qual lhe possibilitará lidar, em diferentes graus de eficácia, com as perdas
inevitáveis do envelhecimento” (1993:13).
3.2. Apoio social e Rede social no espaço grupal
Parte-se do pressuposto, que os grupos de encontro, que se pretende utilizar como campo
de investigação para esta pesquisa, se configuram como grupos de apoio social.
Definir apoio social não é tarefa fácil, na medida em que existem vários significados na
bibliografia referendada. Arrosi (1993) cita Paykel (1993) que coloca em questão a própria
terminologia “apoio”, já que esta traz implícita a existência de um benefício; e Brugha (1993)
define apoio social como “aqueles aspectos das relações sociais que se pensam ter um efeito
benefício para a saúde física e mental” (apud Arrosi, 1993:26).
Outra questão importante, em relação a este conceito, são as variáveis pelas quais o apoio
social pode ser analisado. Segundo Arrosi (1993), os pesquisadores definem apoio social
segundo dois tipos:
Apoio emocional, que é referente à ajuda emocional, tais como carinho, afeto, estima,
valor, etc;
Apoio instrumental, referente à ajuda material, ajuda informacional, etc.
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Para Arrosi (1993), devido às múltiplas definições de apoio social, este não se constitui
como um conceito universal. É preciso defini-lo segundo o contexto em que está sendo
analisado, levando-se em conta os fatores culturais e socioeconômicos, os programas de
intervenção e as iniciativas comunitárias de cada sociedade; e ainda, a maneira como esses
fatores determinam o significado de apoio social.
Aqui, se utiliza a seguinte definição de Apoio Social como sendo:
“qualquer informação, falada ou não, e/ou auxílio material oferecidos por grupos e/ou
pessoas, com os quais teríamos contatos sistemáticos, que resultam em efeitos
emocionais e/ou comportamentos positivos. Trata-se de um processo recíproco, ou
seja, que gera efeitos positivos tanto para o sujeito que recebe, como também para
quem oferece o apoio, permitindo que ambos tenham mais sentido de controle sobre
suas vidas. Desse processo se apreende que as pessoas necessitam uma das outras.”
(Minkler, 1993 apud Valla, 1998:156)
Minkler (1985), estudando a relação entre apoio social e envelhecimento, coloca que
existem três eventos estressores, no processo de envelhecer: o luto, a aposentadoria e a
realocação involuntária. Segundo essa autora, tanto o apoio social como o senso de controle
são elementos chaves, para se entender a natureza e a intensidade do impacto desses eventos
estressores na velhice. Esses eventos são situações caracterizadas pela perda de suporte
social. O problema maior, nas pesquisas que estudam suporte social e envelhecimento, está na
dificuldade em se determinar, se a evidência do resultado de saúde é função do efeito
“buffering”, ou se é a presença (ou ausência) de um suporte social mínimo, que está em jogo
para manter a saúde e a auto-estima (1985: 202).
Vários estudos, sobre mortalidade e luto, demonstram elevado índice de mortalidade, nas
pessoas, acima de 50 anos, nos seis meses após a viuvez (Parkes, Benjamin and Fitzerald
1969 apud Minkler, 1985:203).
Em relação ao segundo evento estressor, que é a aposentadoria, Minkler chama atenção
para a necessidade de se levar em conta se a pessoa teve controle sobre a mesma; no caso, se a
aposentadoria é voluntária ou não, e o tempo em que esse evento ocorre no ciclo de vida.
Minkler cita um estudo longitudinal, feito por Wan’s (1982), sobre a relação entre
aposentadoria e seu efeito na saúde. Nesse estudo, é constatado que a aposentadoria, por si,
não tem efeito significante no status da saúde, porém, é observado um efeito sinérgico na
aposentadoria, em combinação com outros eventos de vida; pontuando a importância de se ter
uma visão da aposentadoria como efeito relevante, junto com outros estressores na saúde.
Nesse estudo, também se observa, que a rede social não apresenta efeito direto na saúde, mas
que ela aparece, como tendo um efeito negativo direto no montante das mudanças e
experiências de vida.
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Em relação ao terceiro evento estressor, a realocação involuntária, Minkler (1985)
ressalta, que apesar deste evento ocorrer menos nas pessoas mais velhas do que nas jovens,
estudos indicam, que a realocação não planejada ou involuntária apresenta efeitos negativos
na saúde das pessoas idosas (Lawton, 1980; Kasl & Rosenfield, 1980 apud Minkler, 1985:
209). Minkler (1985) afirma, que o apoio social é a variável contextual, que fornece a melhor
visão, para mediar os estudos sobre os efeitos dos maiores estressores de vida, na saúde das
pessoas mais idosas.
O apoio social tem, ainda, sua contribuição, no sentido de “criar uma sensação de
coerência da vida e de controle sobre a mesma, o que, por sua vez, afeta o estado de saúde
das pessoas de uma forma benéfica” (Cassel, 1976 apud Valla, 1998:156).
Como diz Valla, as pessoas ao terem menor oportunidade de participar no processo de
tomada de decisões, podem gerar um sentimento de falta de controle e consequentemente,
afetar a sua morbidade e mortalidade (Minkler, 1985 apud Valla, 1999). E ainda, “uma
sensação de não poder controlar sua própria vida juntamente com a sensação de isolamento
podem ser relacionados com o processo saúde-doença.” (Valla, 1999:10).
Este autor segue discutindo sobre educação popular, saúde e apoio social, na atual
conjuntura, e faz um alerta, para a necessidade dos serviços de saúde, de contemplarem as
necessidades socais da população, sendo preciso para isso, levar em conta o que as pessoas
pensam sobre seus problemas e para as soluções que buscam, de forma espontânea. Nesse
ponto, apoio social faz a interseção com a questão do empoderamento:
“Se de um lado, o apoio social oferece a possibilidade de realizar a prevenção através
da solidariedade e do apoio mútuo, de outro, oferece também uma discussão para os
grupos sociais sobre o controle do seu próprio destino e autonomia das pessoas perante
a hegemonia médica, através da “nova” concepção do homem como uma unidade.”
(Tognoni, 1991; Valla 1997b apud Valla, 1999: 12).
Refletindo sobre isso, pode-se transpor essa idéia para pensar os grupos voltados para
a Promoção da Saúde, como estratégias ou espaços, onde possa se dar essa escuta, para as
necessidades das pessoas. Os grupos devem se configurar, como espaços onde as pessoas
possam falar sobre seus problemas, e buscar soluções, conjuntamente com os profissionais, de
forma que a informação circule, da experiência técnica à vivência prática das pessoas que
adoecem. Nos diz Valla, “um envolvimento comunitário, pode ser um fator psicossocial
significante na melhoria da confiança pessoal, da satisfação com a vida e da capacidade de
enfrentar problemas. A participação social pode reforçar o sistema de defesa do corpo e
diminuir a suscetibilidade à doença.” (1999: 10).
Um conceito diretamente relacionado com o de apoio social é o conceito de cuidado. O
apoio pressupõe o cuidado. Boff (1999), em seu livro “Saber Cuidar”, afirma que o cuidado é
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algo que se encontra na raiz de todo o ser humano; é algo que faz parte da constituição
humana. Como nos diz Boff: “o ser humano é um ser de cuidado, mais ainda, sua essência se
encontra no cuidado. Colocar cuidado em tudo o que projeta, eis a característica do ser
humano” (1999: 35).
Para o envelhecimento, o cuidado é de fundamental importância. O cuidado é o antídoto,
para o abandono de muitos idosos. O indivíduo, quando vai avançando no tempo, vai se
tornando mais vulnerável a doenças, e muitas vezes pode precisar ser cuidado. Mas o cuidado,
não é uma atitude só para os enfermos e os idosos, é uma atitude universal. Durante toda a
vida, o ser humano foi cuidado, principalmente no início do seu desenvolvimento (primeira
infância). Quando adquire um grau maior de independência, passa a ser cuidador, a ser o
sujeito que oferece cuidados: cuidados com os filhos, com a casa, etc. Assim, Boff (1999)
coloca, que a definição de cuidado contêm em si, dois significados: um significado
relacionado com o cuidado com o outro, que é a atitude de zelo, de atenção para com o outro;
e um significado de preocupação, de inquietação do próprio sujeito que cuida, porque se sente
envolvido com o outro. Dessa forma:
“o cuidado é o permanente companheiro do ser humano. Quer dizer: o cuidado sempre
acompanha o ser humano porque este nunca deixará de amar e de se desvelar por
alguém (primeiro sentido), nem deixará de se preocupar e de se inquietar pela pessoa
amada (segundo sentido).” (Boff, 1999: 92).
O ser humano é um ser que tem sentimentos, inclusive é isso que o diferencia da máquina.
É a capacidade de envolver-se, de afetar e ser afetado pelo outro, que o torna humano. É esse
sentimento, que se chama cuidado e se situa na lógica do afeto. O cuidado pressupõe uma
relação, e essa relação não deve ser de domínio sobre o outro, mas de con-vivência. O cuidado
se dá na “inter-ação e comunhão” (Boff, 1999: 96). É a partir do cuidado com o outro, que o
ser humano desenvolve a dimensão de alteridade, de respeito, valores fundamentais da
experiência humana. Assim, o cuidado se dá numa relação afetiva, e engloba o modo de ser
do ser humano, em seus laços afetivos.
“Dar centralidade ao cuidado não significa deixar de trabalhar e de intervir no mundo.
Significa renunciar à vontade de poder que reduz tudo a objetos, desconectados da
subjetividade humana. Significa recusar-se a todo despotismo e a toda dominação.
Significa impor limites à obsessão pela eficácia a qualquer custo. (...) significa
colocar-se junto ao pé de cada coisa que queremos transformar para que ela não sofra,
não seja desenraizada de seu habitat e possa manter as condições de desenvolver-se e
co-evoluir junto com seus ecossistemas e com a própria Terra (...).” (Boff, 1999: 102).
Outro conceito, muitas vezes confundido com o de apoio social, é o conceito de Rede
Social, com particular interesse para este trabalho.
Segundo Arrosi (1993), a consideração da rede social, como uma medida do apoio, ainda
é algo controverso. O’Reilly (1993) defende, que o apoio social, e o efeito de sua provisão, é
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uma função da rede social do indivíduo; e apesar da rede social ter uma dimensão interativa e
estrutural, que pode afetar o apoio social recebido, estas não são em si mesmas ações do apoio
social, nem são necessariamente indicadores de condutas de apoio (apud Arrosi, 1993:27).
Sadoum (1991) define rede social de uma pessoa, como o conjunto de relações humanas,
que tem um impacto duradouro na vida de uma pessoa; como por exemplo, o grupo de outros
significativos, aos quais os indivíduos vem aos poucos, e que formam um sistema de apoio
natural. A rede social opera, mobilizando recursos pessoais, e permite aos indivíduos, que
necessitam ajuda, atenuarem a sua carga emocional e melhorarem sua capacidade de defesa
(apud Arrosi, 1993). Desse modo, pode-se dizer, que o apoio se constitui em um pano de
fundo, e a rede social atua mais como uma teia de relações sociais, que rodeiam o indivíduo,
onde o apoio pode fluir ou não.
O conceito de rede social é definido por diversos autores como Lewin, Moreno, Barnes,
Bott entre outros (Sluzki, 1997). Porém, interessa, principalmente, neste trabalho, a definição
de “rede social significativa ou rede social pessoal” (Sluzki, 1997:37), porque diferencia da
definição de rede social, que em um nível mais macro, compõe o universo relacional do
indivíduo. Sluzki define rede social pessoal como:
“a soma de todas as relações que um indivíduo percebe como significativas ou
que define como diferenciadas da massa anônima da sociedade. Essa rede
corresponde ao nicho interpessoal da pessoa e contribui substancialmente para
seu próprio reconhecimento como indivíduo e para a sua auto-imagem.”
(Sluzki, 1997:41)
Nessa rede estão incluídas todas as relações do indivíduo, divididas em família, amizades,
relações de trabalho ou escolares e relações comunitárias (Sluzki, 1997).
Outro ponto importante no trabalho de Sluzki, é a definição das funções da rede. A rede
social teria como principais funções:
a companhia social, que se refere à realização de atividades conjuntas, ou simplesmente o
estar juntos;
o apoio emocional, que se refere aos intercâmbios que conotam uma atitude emocional
positiva, clima de compreensão, simpatia, empatia, estímulo e apoio; é o poder contar com
a ressonância emocional e a boa vontade do outro;
guia cognitivo e conselhos, como as interações destinadas a compartilhar informações
pessoais ou sociais, esclarecer expectativas e propiciar modelos de papéis;
a regulação social, que permite interações, que lembram e reafirmam responsabilidades e
papéis, neutralizam os desvios de comportamentos, que se afastam das expectativas
coletivas, permitem uma dissipação da frustração e da violência, e favorecem a resolução
de conflitos;
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ajuda material e serviços, que proporcionam colaboração específica, com base em
conhecimento de especialistas, ou ajuda física, incluindo os serviços de saúde;
acesso a novos contatos, se refere à abertura de portas, para a conexão com pessoas e
redes, que até então não faziam parte da rede social do indivíduo.
(Sluzki, 1997: 49-53).
Nesse sentido, pode-se dizer que o apoio social flui através da rede social, quando ela
desempenha uma das suas funções.
Existem vários estudos epidemiológicos, que fazem a correlação positiva entre rede social
e saúde (Holmes, 1956; Tilman e Hobbs, 1949; Gore, 1973; apud Sluzki, 1997: 68).
Sluzki (1997) aponta, a partir de sua investigação da relação entre rede social e saúde,
que:
“a pobreza relativa de relações sociais constitui um fator de risco para a saúde
comparável ao fumar, à pressão arterial elevada, à obesidade e a ausência de
atividade física. Esses esboços de direcionalidade da correlação entre rede e
saúde possui importantes implicações clínicas assim como para o planejamento
da saúde pública.” (1997:69).
Ao examinar-se a evolução do mapa da rede social, durante o ciclo de vida, observam-se
três fatores que ocorrem no envelhecimento, e que causam impacto na rede social pessoal:
Redução dos vínculos existentes, por morte, ou enfraquecimento dos seus membros, o que
vai causar uma retração da rede social;
Menos oportunidade para renovação da rede social, assim como menos motivação para
estabelecer novos vínculos;
Maior dificuldade para a manutenção da rede social, devido à diminuição da mobilidade e
da acuidade sensorial, reduzindo as habilidades e o interesse em expandir a rede.
(Sluzki, 1997:117)
Com isso, as pessoas idosas tendem a reduzir os seus contatos sociais e seus vínculos,
ficando cada vez mais recolhidas às relações familiares.
Um aspecto importante, é que, com a diminuição da vida social das pessoas, muitas vezes
devida à aposentadoria, desaparecem também os vínculos com as pessoas da mesma geração,
e isso provoca um enfraquecimento do apoio da história pessoal, “muitas das lembranças de
acontecimentos (“Você lembra de...”) simplesmente se esvaecem com o desaparecimento das
pessoas que os compartilham e com as quais se pode falar disso.” (Sluzki, 1997:118).
Sluzki (1997) chama a atenção para a depressão, quadro clínico muito freqüente na
velhice, como resultado da solidão; da perda de papéis; de lembranças e de funções; e,
consequentemente, da identidade e da imagem que a pessoa faz de si.
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Ainda este autor define uma visão evolutiva da rede social, que teria a seguinte seqüência:
uma curva de ascensão nos primeiros anos de vida, até a idade adulta, pela incorporação de
novos vínculos adquiridos na escola, namoro, trabalho, festas; seguida de um período de
estabilidade, com o casamento, filhos e trabalho; e por fim, uma retração, na qual as relações
vão se extinguindo, pela morte de amigos e parentes, pela aposentadoria, pela saída dos filhos
de casa.
3.3. O Grupo de Encontro de Idosos
O Projeto de Valorização do Envelhecer - PROVE, sediado no Instituto de Neurologia
Deolindo Couto - INDC da UFRJ; é como o nome já diz, um trabalho que objetiva a
valorização do processo de envelhecimento, através do desenvolvimento de um trabalho
Interdisciplinar, de caráter acadêmico-assistencial, articulando ensino-pesquisa-extensãoassistência a partir de parcerias com diferentes instâncias da UFRJ. O PROVE é aberto a
todas as pessoas acima (ou em torno) dos 60 anos, de ambos os sexos, que pertençam à
comunidade vicinal da Praia Vermelha e seus arredores, e que queiram estar com outras
pessoas da mesma idade, aprendendo e ensinando, através de grupos direcionados à Promoção
da Saúde.
O grupo de encontro do PROVE tem como objetivo oferecer aos idosos, um espaço para
se trabalhar, junto com eles, temáticas ligadas ao processo de envelhecimento; e tem como
metodologia de trabalho, a utilização de palestras de Orientação para a Saúde.
Existe ainda, como método onde se desenvolve um trabalho de educação em saúde, a
conscientização enquanto prática de libertação, segundo a pedagogia de Paulo Freire (1980).
A conscientização pressupõe a “práxis humana”, ou seja, a relação entre ação e reflexão, que
“implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo” (Freire,
1980:26). A conscientização é exatamente lançar um olhar crítico sobre os fenômenos; “é a
dialetização dos atos de denunciar a estrutura desumanizante e de anunciar a estrutura
humanizante” (1980:27).
Nestes grupos, opera-se, ainda, a informação-reflexão, que tem como objetivo a
conscientização dos idosos, para a construção positiva do processo de envelhecer, objetivando
a autonomia positiva. Para isso, é preciso estar em sintonia com o que Freire (1980) chama de
Educação Libertadora. Esta visa libertar as pessoas dos preconceitos que enrijecem as atitudes
e as crenças, acerca de si mesmo e do mundo. Freire, pertinentemente, afirma: “a
conscientização é o olhar mais crítico possível da realidade, que a dês-vela para conhecê-la e
para conhecer os mitos que enganam e que ajudam a manter a realidade da estrutura
dominante” (1980: 29).
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Bleger, nos fala do grupo enquanto lugar de aprendizagem afirmando que:
“o processo de aprendizagem funciona no grupo (...), não no sentido de que tudo
consiste em tirar de cada um o que já tem de dentro de si, mas no sentido de que é o
grupo que cria seus objetivos e faz suas descobertas através da ativação daquilo que
existe em cada ser humano de riqueza e experiência, ainda que pelo simples fato de
viver” (1993:66).
Dentro deste grupo de encontro do PROVE, é realizada uma vez por mês, a atividade de
Orientação para a Saúde” onde são ministradas palestras, baseadas no programa do Ministério
da Saúde “Viva Bem a Idade que Você Tem”. A essa cartilha são acrescentados materiais
obtidos, através de pesquisa bibliográfica, de forma a adicionar temas afins aos expostos na
cartilha.
Esta atividade tem por objetivo a informação em saúde, que é definida como sendo “toda
forma de conhecimento relacionada à produção, gestão e disseminação de informações que
possam ser utilizados para solucionar ou amenizar problemas de saúde de um indivíduo ou
de um grupo de indivíduos promovendo a melhoria da qualidade de vida” (1). Segundo Silva
Bezerra (1999), a informação também é vista como uma representação social da realidade,
sendo necessária a participação ativa do usuário, na sua produção. Desta maneira, a
informação exerce uma função estratégica na gestão de saúde, tornando-se um dos principais
recursos a contribuir para a elevação de padrões da qualidade da saúde em geral, objetivando
ajudar numa melhor utilização dos recursos humanos.
Pode-se refletir, sobre o grupo como espaço para a educação. Educação, esta, como um
processo de transformação do sujeito. A educação transformadora é aquela que propicia ao
sujeito uma apropriação do conhecimento. Segundo Moraes (2), a informação só é útil e
produtiva quando o sujeito se apropria dela. Deste modo, enfoca-se, neste trabalho, a
educação do ponto de vista de Freire (1987) como a educação libertadora, não-alienante.
Freire afirma que não se pode pretender libertar os homens se a educação é alienante. “A
libertação autêntica, que é a humanização em processo, não é uma coisa que se deposite nos
homens. Não é uma palavra a mais, oca, mitificante. É uma práxis, que implica a ação e a
reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo.” (1987:67).
Com relação ao processo de aprendizagem, Davini (1994) coloca a implicação do sujeito
na produção de mudanças, afirmando:
“se o pensamento e a ação estão conectados, se é necessário produzir mudanças nos
modos de pensar e perceber que orientam as práticas, a questão de mudança subjetiva
não é aleatória, são nossa teorias (como teorias internalizadas) as que determinam
aquilo que vemos e são nosso modelos mentais que muitas vezes representam
barreiras a aprendizagem. Não se trata de ignorar a presença da “realidade objetiva”,
mas de reconhecer a primazia do sujeito na produção do sentido da experiência” (apud
Ribeiro e Motta, s/d:07).
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Davini aborda, ainda, o processo de aprendizagem, como um processo ativo do sujeito.
Segundo ela, a aprendizagem não se processa em um determinado momento como um abrir e
fechar os olhos; pelo contrário, requer um tempo, no qual o sujeito “investigue ativamente
aplicando suas formas de conhecer e aproximando-se cada vez mais da matriz interna do
assunto, em um processo de idas e vindas de reflexão e ação.” (1994: 32). Assim, na medida
em que se concebe o processo de aprendizagem, enquanto um processo de reflexão e ação,
ocorre a dinâmica da aprendizagem que se apresenta como:
“este processo, de ação assimiladora e de aproximação sucessiva, sempre se inicia a
partir da primeira visão que o sujeito tem do assunto, visão altamente carregada de
costumes e tradições. Mas nem sempre tais costumes e tradições serão eliminados
durante o processo. Muitas se transformarão, enriquecidas pelo novo conteúdo a ser
assimilado; outras permaneceram, na medida em que não entrem em contradição com
o que foi aprendido. A visão baseada em costumes e tradições se transformará na
medida em que o educando sinta necessidade, a partir de sua própria reflexão e busca
ativa durante o processo. E, é assim que, a cada momento de aproximação ao
fundamental do assunto, o sujeito construirá ativamente novas regulações, ou melhor
dizendo, novos comportamentos cada vez mais ajustados ao objeto em questão.
Construindo gradualmente sua própria síntese modificará sua própria ação prática
abandonando os comportamentos anteriores. Assim, não avançará isoladamente no
conhecimento, mas haverá tido oportunidade de avançar em seus próprios esquemas
de assimilação pelo exercício de ação intelectual.” (apud Ribeiro e Motta, s/d:32)
Deste modo, a informação educativa promotora de mudanças, envolve programas que se
desenvolvem em diferentes ambientes que contêm as populações alvo.
O planejamento de grupos, com o objetivo da informação-reflexão, é, portanto, baseado
nas necessidades específicas, que emergem desses ambientes; e todos eles precisam da
colaboração de um especialista, sendo seu relacionamento direto com os indivíduos, que já
freqüentam ou venham a freqüentar determinados grupos, inseridos em projetos. Esses grupos
têm como objetivo contribuir para o alcance de melhores níveis de saúde da população
focalizada.
Esta atividade, de Orientação em Saúde, é desenvolvida nos grupos informativosreflexivos, como o grupo do Prove. Através da informação, se discutem as questões que
surgem, sempre remetendo ao envelhecimento.
É importante ressaltar, que o grupo do PROVE não tem um caráter terapêutico, a priori,
mas, como se trabalha na linha dinâmica, acredita-se que ele tenha um efeito terapêutico,
obtido a partir da interação das pessoas e da reflexão de questões.
Nessa linha, é nesse grupo que, profissionais e estagiários, trabalham junto aos idosos o
gerenciamento democrático do projeto; momento onde se discutem as atividades, que estão
sendo desenvolvidas, e onde são ouvidas as propostas de atividades dos usuários. De acordo
com o grupo, se faz a escolha do melhor horário, do melhor dia para que a atividade aconteça,
garantindo assim, a adesão dos idosos nas atividades. Ainda nesse gerenciamento, são
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discutidas, junto com os idosos, as questões operacionais de andamento do projeto, como por
exemplo, as questões institucionais, como: dificuldade de lugar, atrasos, falta de profissionais,
greve, entre outros assuntos; de modo que essas questões não venham comprometer o
desempenho do trabalho.
Dessa forma, as palestras ministradas nessa atividade, tem por objetivo fazer a conexão entre
saúde e condições de vida, através do acesso a informações pertinentes ao processo de envelhecer,
e se configuram, portanto, como um veículo para a “desnaturalização” - desmistificar
preconceitos concebidos como naturais - ligados ao envelhecimento, tais como: “velho é inútil”,
“velho não faz sexo”, “velho é sinônimo de doença”.
Nesse sentido, a cartilha do “Viva bem a idade que você tem” pode ser pensada como:
“um instrumento que vem a contribuir com as práticas educativas em saúde, sendo
subsídio para os profissionais, pois sem a construção de um novo saber, o trabalho em
saúde não alcança os objetivos desejados - as doenças continuam atingindo a população,
fazendo-nos perguntar qual é a eficácia e finalidade de nossa atuação como profissionais
em defesa da saúde e da vida.” (Valla, 1993:30).
Deste modo, estas informações, contidas na cartilha, estão sendo promotoras de mudança
na atitude desses idosos, para um modo mais saudável, no seu processo existencial. Isto
porque, através das informações dadas nas palestras de orientação para a saúde, é possível, às
pessoas idosas, aprenderem a vivenciar melhor suas capacidades e limites frente ao
envelhecimento e se proporem a mudar suas atitudes diante desse fato.
Notas:
(1) Informações retiradas do site: MORAES, I.H.S & MURAT, M. Informações em saúde.
Junho de 2000. <http// www.ensp.fiocruz.br/ infosaúde>
(2) Anotações da aula “Aspectos Genealógicos da Informação em Saúde”. Prof.a. Illara
Moraes. Disciplina : “Informação e Informática em Saúde” do Mestrado em Saúde Publica.
Maio de 2000.
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Capítulo 4
Metodologia
4.1. Pesquisa Qualitativa em Saúde
A Pesquisa Qualitativa em Saúde segundo Minayo:
“trabalha com o universo de significados, motivações, aspirações, crenças, valores e
atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e
dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variável”
(1994:22).
Nesta metodologia, tem-se a orientação filosófica dialética que “insiste na relação
dinâmica entre sujeito e objeto, no processo de conhecimento. O pesquisador é um ativo
descobridor do significado das ações e das relações que se ocultam nas estruturas sociais”
(Chizzotti, 2000: 80). Para Minayo a abordagem dialética:
“se propõe a abarcar o sistema de relações que constrói, o modo de conhecimento
exterior ao sujeito, mas também as representações sociais que traduzem o mundo de
significados (...) Advoga também a necessidade de se trabalhar com a complexidade,
com a especificidade e com as diferenciações que os problemas e/ou objetos sociais
apresentam” (1994: 24-25).
Spink (2000) utiliza, como abordagem teórica, o construtivismo, a partir da Sociologia do
Conhecimento e da Psicologia Social (Peter Berger e Tomas Luckman; Kenneth Gergen e
Tomás Ibáñez). A primeira valoriza o conhecimento que as pessoas tem da realidade, onde o
ser humano é visto como um produto social. A segunda contribui com o conceito de
investigação construcionista, que tem como preocupação “a explicação dos processos por
meio das quais as pessoas descrevem, explicam ou dão conta do mundo (incluindo a si
mesmos) em que vivem” (Gergen, 1985 apud Spink, 2000:26). Um outro conceito, muito
importante, é o da desfamiliarização, em relação ao de desconstrução, na medida em que é
mais difícil descontruir aquilo que já construímos. Assim,
“criamos espaços para novas construções, mas as anteriores ficam empregadas nos
artefatos da cultura, constituindo o acervo de repertórios interpretativos disponíveis
para dar sentido ao mundo. Decorre daí a espiral dos processos de conhecimento, um
movimento que permite a convivência de novos e antigos conteúdos (conceitos,
teorias) que já caíram em desuso. (Spink, 2000: 27)
Utilizando-se esta perspectiva das práticas discursivas da produção de sentidos, tem-se o
foco no sentido; esta-se navegando na esfera da semântica, através da análise dos significados,
cuja ênfase é a linguagem em uso. Spink define sentido como “uma construção social, um
empreendimento coletivo, mais precisamente interativo, por meio do qual as pessoas
constróem os termos a partir dos quais compreendem e lidam com situações e fenômenos a
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sua volta” (2000:41). Como esta autora fala, o modo como o pesquisador vai trabalhar, e a
escolha do método, é uma questão de foco, de olhar, do que ele elege como figura/fundo. Esta
mesma autora coloca que é pela ruptura do habitual, do usual, que é possível dar visibilidade
aos sentidos,
“numa entrevista, as perguntas tendem a focalizar um ou mais temas que, para os
entrevistados, talvez nunca tenham sido alvo de reflexão, podendo gerar práticas
discursivas diversas, não diretamente associadas ao tema originalmente proposto.
Estamos, a todo momento, em nossas pesquisas, convidando os participantes à
produção de sentidos.” (2000:45)
Assim, ao trabalhar com práticas discursivas, ao invés de análise de discurso, Spink
propõe uma metodologia que investigue a maneira a partir da qual as pessoas produzem
sentidos, e o modo como se posicionam, em suas relações sociais. As práticas discursivas são
compostas por três elementos:
A dinâmica, ou seja, os enunciados orientados por vozes, que descrevem o processo de
interanimação dialógica que se processa numa conversação. (2000:45)
As formas, que são os “speech genres” (linguagem social);
E os conteúdos, que são os repertórios interpretativos, definidos como “unidades de
construção das práticas discursivas – o conjunto de termos, descrições, lugares comuns e
figuras de linguagem” (2000: 47).
Desta forma, o construcionismo social tem como foco a interanimação dialógica, ou seja o
diálogo que se constrói na relação com o outro, que tem por objetivo:
“Identificar processos pelos quais as pessoas descrevem, explicam e/ou compreendem o
mundo em que vivem, incluindo elas próprias. Nesse sentido, o foco de estudo passa das
estruturas sociais e mentais para a compreensão das ações e práticas sociais e, sobretudo, dos
sistemas de significação eu dão sentido ao mundo.” (Spink, 2000:60)
4.2. Coleta de Dados
A escolha da técnica de coleta de dados a ser utilizada é norteada pelo melhor método,
dentro daquilo que o pesquisador objetiva na sua pesquisa. Tem como objetivo produzir
versões do mundo, sem perder a noção de que o conhecimento é sempre uma construção do
coletivo, ou seja, uma construção da realidade.
Como instrumentos de coleta de dados são utilizadas duas técnicas complementares: a
entrevista e o grupo focal, onde as informações coletadas nas entrevistas servem de base para
a discussão no grupo focal.
A entrevista pode ser considerada como prática discursiva, de forma a entendê-la como
“ação (interação) situada e contextualizada, por meio da qual se produzem sentidos e se
constróem versões da realidade” (Pinheiro, 2000: 184).
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Utiliza-se, neste trabalho, a entrevista semi-estruturada ou entrevista aberta. Esta
modalidade permite ao entrevistador uma maior flexibilidade, na medida em que pode se
alterar a ordem das perguntas e se tem ampla liberdade para fazer intervenções, de acordo
com o andamento da entrevista (Bleger, 1993). Foram formuladas 12 questões abertas que
estão em anexo (Anexo I).
Os temas contidos nas entrevistas analisadas neste trabalho versam sobre:
Forma pela qual as pessoas chegaram ao grupo de encontro de idosos do Prove;
Tempo de participação dos entrevistados no grupo de encontro de idosos do Prove;
Tipos de atividades que exercem dentro do projeto além do grupo de encontro;
Participação em outros grupos voltados para o envelhecimento;
Atividades que exercem fora dos grupos voltados para o convívio de idosos;
Atividades que desempenham dentro da sua família;
Realização de projetos futuros;
Modificações e percepções proporcionadas pelo processo de envelhecimento;
Transformações que a participação nos grupos proporcionou.
Já a técnica do grupo focal é definida como:
“uma técnica de pesquisa na qual o Pesquisador reúne, num mesmo local e durante
um certo período, uma determinada quantidade de pessoas que fazem parte do
público-alvo de suas investigações, tendo como objetivo coletar, a partir do diálogo e
do debate entre eles, informações acerca de um tema específico” (Neto et al., 2001: 9)
Deste modo, esta técnica pode ser vista como uma forma complementar da entrevista, isto
porque, o grupo focal tem por finalidade obter a “fala em debate”, onde vários pontos são
discutidos, gerando conceitos, impressões e concepções sobre determinado tema, entre os
participantes do grupo. Os dados, assim obtidos, são de natureza essencialmente qualitativa, e
o número ou quantidade de grupos deve ser definido a partir do objetivo da pesquisa, sendo
seu limite delineado pela saturação obtida através do esgotamento dos temas. Neto et al.
(2001), estudando esta técnica, propõe alguns pontos importantes para seu desenvolvimento:
deve-se ter uma equipe composta por dois pesquisadores: um exercendo a função de
mediador; e outro de relator-observador, durante a realização dos grupos focais;
devem ter uma duração entre uma e duas horas;
o grupo deve ser composto de quatro a doze pessoas;
deve-se elaborar um “Roteiro de Debate” construído a partir dos objetivos da pesquisa e
elaborado através de questões-chaves que favoreçam o levantamento das informações para
a elucidação dos objetivos propostos;
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os debates devem ser registrados de duas formas: através da gravação (gravador ou
filmagem) e através das anotações das falas, assim como algum registro da linguagem não
verbal (posturas, expressão, etc...).
(Neto, et al., 2001:11-15).
São formuladas para o roteiro de debate do grupo focal cinco perguntas que guiam as
discussões e encontram-se em anexo (Anexo II). As indagações contidas no roteiro do grupo
versam sobre:
Motivação pela qual as pessoas vêm buscar o grupo;
O que levam as pessoas a permanecerem no grupo;
Espaço que as pessoas encontram para se expressar no grupo;
Atividades que participavam antes de ingressar no grupo;
Transformações que as pessoas consideram que o grupo vem provocando nas suas
vidas.
4.3. Campo de investigação
Conforme dito anteriormente, utiliza-se como campo de investigação o Projeto de
Valorização do Envelhecer - PROVE, configurando-se, então, um estudo crítico sobre grupo
de idosos direcionado à Promoção da Saúde.
Este Grupo é denominado “Grupo de Encontro de Idosos” (1) e tem como característica a
informação e reflexão de questões relacionadas ao envelhecimento. Abarca três vertentes: 1)
Gerenciamento democrático do Projeto, 2) Abordagem conceitual e discussão de temas
propostos pelos usuários, 3) Palestras interativas de Orientação em Saúde, baseadas no
Programa “Viva bem a idade que você tem” do Ministério da Saúde.
Os sujeitos pesquisados são os idosos participantes do Grupo de Encontro do PROVE,
localizado no Instituto de Neurologia Deolindo Couto - INDC da UFRJ. Eles são convidados
a participar como voluntários dentro das diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas
envolvendo seres humanos (Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde),
representados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da ENSP, cujo Termo de Consentimento
Esclarecido encontra-se em anexo (Anexo III).
A amostra é selecionada a partir dos seguintes critérios: idosos que estejam participando
do Grupo de Encontro há, no mínimo, 1 ano, uma vez que, o empoderamento é entendido
como resultado de um processo e, deste modo, é preciso que estas pessoas participem há um
certo tempo do Projeto. São selecionados 15 sujeitos com idade acima de 60 anos.
Os idosos, usuários do PROVE, são homens e mulheres acima dos 60 anos, havendo uma
predominância do sexo feminino. Residem próximo ao Campus da UFRJ, na Praia Vermelha.
Existem 200 inscritos no Projeto, com uma freqüência aproximada de 20 a 40 participantes
por atividade.
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Dados sobre a capacidade funcional dos usuários que compõe o Grupo do PROVE e o
modo de chegada ao grupo, são quesitos importantes para o esclarecimento das motivações
pelas quais as pessoas procuram o grupo, especialmente se correlacionados aos níveis de
autonomia global; já que ambos são decisivos sobre o maior ou menor controle sobre suas
vidas, controle este relacionado ao processo de empoderamento.
Pode-se constatar que as pessoas chegam ao grupo sozinhas, atendendo à divulgação do
PROVE, ou indicadas por conhecidos; o que pressupõe certo grau de autonomia de ação ou
capacidade funcional.
Para resguardar a identidade dos idosos que fizeram parte deste estudo, são dados a eles
nomes de pedras e metais preciosos, ficando assim denominados: Água-marinha, Cristal,
Prata, Ouro, Diamante, Esmeralda, Citrino, Ágata, Pérola, Ónix, Lápis Lazuli, Safira, Rubi,
Topázio e Jade (Anexo IV).
4.4. Trabalho de Campo
A marcação das entrevistas foi feita da seguinte forma: a pesquisadora foi até o grupo de
encontro do PROVE e fez a apresentação da proposta da pesquisa, para os usuários. Logo
após, foi feito um convite a estes idosos, seguido do agendamento dos interessados, levandose em conta os critérios de inclusão acima relatados. A pesquisadora participou de dois grupos
de encontro para que essa marcação fosse efetivada.
Assim, foram agendadas entrevistas individuais com 15 usuários. As entrevistas, com
duração média de trinta minutos, foram realizadas em uma sala reservada do PROVE e todas
gravadas, com a autorização dos usuários. Após as entrevistas concluídas, foi marcado, com
estas mesmas pessoas, um segundo encontro, em grupo, onde foi aplicada a técnica de grupo
focal.
O grupo focal teve duração de duas horas, e foi realizado em um espaço do INDC, onde os
grupos de encontro do PROVE costumam se reunir. Essa reunião foi gravada e filmada com
autorização específica por escrito (termo de consentimento livre e esclarecido), de todos os
participantes. No final do grupo, foi colocado para os usuários, que após a conclusão da
dissertação seria realizado outro encontro no PROVE, onde seriam divulgados e debatidos os
resultados com os participantes da pesquisa.
4.5. Análise dos dados
Após as transcrições dos dados das entrevistas e do grupo focal, forma feitas as
avaliações, utilizando-se a técnica de análise qualitativa em saúde.
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Pinheiro (2000) coloca, que é preciso, na análise dos dados, haver uma apreensão global
da entrevista em seus aspectos dinâmicos e interativos, e partir, então, para a identificação de
temas, que vão emergindo das falas dos entrevistados, de forma que eles sejam uma primeira
organização das falas.
Utiliza-se como base teórica, para o método de análise dos dados, os autores Martins &
Bicudo (1989) e Spink (2000) que trabalham com pesquisa qualitativa em psicologia.
Martins & Bicudo (1989) utilizam a análise qualitativa buscando não os fatos em si, mas
os significados desses fatos para os sujeitos:
“A preocupação se dirige para aquilo que os sujeitos da pesquisa vivenciam como um
caso concreto do fenômeno investigado. As descrições e os agrupamentos dos
fenômenos estão diretamente baseados nas descrições dos sujeitos, e os dados são
tratados como manifestações dos fenômenos estudados” (1989:30).
Esta forma de análise se constitui de quatro momentos a serem seguidos:
Leitura para apreensão global do sentido geral das respostas; “a leitura das descrições é
feita em relação ao grupo tomado como um todo, almejando obter uma visão geral do
material analisado” (1989:39);
Leitura para encontrar unidades de significados; “O material coletado é lido com a
finalidade de encontrar-se aquilo que parece ser o mais significativo nos dados obtidos e
de saber-se quais as partes principais, onde podem ser percebidas diferenças entre os
dados.”(1989:39);
Definição de temas mais importantes; “as partes significativas são delimitadas por temas
ou perspectivas de investigação” (1989:39);
Síntese integradora dos “insights” das unidades de significado; “a perspectiva adotada
na análise é da descoberta de como os sujeitos experenciam o fenômeno ou de como o
autor da mensagem vê o fenômeno como um todo” (1989:39).
O material coletado foi lido, com a finalidade de se encontrar aquilo que parece ser o mais
significativo dentre as respostas das entrevistas, explorando-se também as diferenças
percebidas entre as falas. As partes significativas foram agrupadas em temas ou perspectivas
de investigação, escolhidas a partir de categorias de análise concernentes ao referencial
teórico, sendo elas: apoio social, rede social, autonomia, integridade, cuidado, aprendizagem e
realização de projetos pessoais.
Spink (2000) segue a mesma direção na interpretação dos dados, afirmando que a
interpretação é concebida como um processo de produção de sentidos que tem como
atividade-meio: o diálogo com as informações coletadas no trabalho de campo; e como
atividade-fim a explicitação dos sentidos encontrados a partir da interpretação. E para isso,
apresenta algumas técnicas de visibilização, que se configuram como estratégias para o rigor
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na pesquisa – rigor este entendido “como a objetividade possível no âmbito da
intersubjetividade” (2000: 105). Assim, a análise objetiva trabalhar a “dialogia implícita na
produção de sentidos e o encadeamento das associações de idéias” (2000:106).
Outro método, utilizado para a análise dos dados, foi um software, chamado LOGOS,
criado pelo Professor Kenneth Rochel (2) (1999). Ele é um sistema para gerenciamento de
documentos, permitindo a análise qualitativa dos dados. A partir desse software pode-se criar
categorias de análise e agrupar as falas referentes a essas categorias, gerando relatórios
qualitativos.
Notas:
(1) Este grupo foi descrito melhor no capítulo 3 desta dissertação: Grupo como apoio social.
(2) Prof. Kenneth Rochel é professor do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do
Instituto de Medicina Social - IMS da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Este
Programa LOGOS nasceu a partir da demanda de pesquisadores ligados ao Programa de PósGraduação do IMS.
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Capítulo 5
Resultados e Discussão
Neste momento, procura-se debater o material coletado no trabalho de campo, que já foi
mostrado nas categorias de análise, e apresentar as falas obtidas na dinâmica do Grupo Focal,
à luz do referencial teórico, de modo a buscar respostas para o objetivo e pressupostos
traçados neste estudo.
5.1. Perfil dos entrevistados
Participaram do trabalho de campo, 15 usuários do Prove. A partir dos dados contidos na
ficha de identificação (Anexo V) foi obtido o perfil dos entrevistados.
Observa-se que a maioria dos entrevistados é do sexo feminino, sendo apenas um do sexo
masculino, com idades que variam de 65 a 85 anos: quatro idosos na faixa de 65 a 69 anos,
dois entre 70 e 74 anos; cinco faixa de 75 a 79 anos e três acima de 80 anos. A situação
econômica dos entrevistados mostra homogeneidade: a maioria tem como fonte de renda,
exclusivamente, a aposentadoria, sendo que quatro deles somam a esta, outro tipo de renda,
como pensão ou aluguel, e três entrevistados ainda trabalham fora. Em relação à moradia, a
maioria mora na zona sul, apenas duas pessoas moram na zona norte do Rio. Do ponto de
vista da escolaridade, todos são alfabetizados, sendo que sete deles tem o curso universitário
concluído. Todos apresentam independência física, se locomovendo sozinhos; sendo que sete
moram sozinhos. Em relação ao apoio familiar, a maioria oito idosos informa não receber
nenhum tipo de ajuda da sua família; já sete recebem ajuda material ou funcional de sua
família. Em relação ao fornecimento de ajuda: oito idosos ajudam às suas famílias de alguma
maneira; cinco fornecem ajuda material, e três fornecem ajuda funcional às suas famílias. Os
dados com o perfil dos entrevistados podem ser melhor visualizados no quadro em anexo
(Anexo VI).
5.2. Atividades e formas de participação dos idosos nos grupos
A partir da análise preliminar das entrevistas são obtidos os seguintes resultados:
Formas pelas quais as pessoas chegaram ao grupo de encontro de idosos do Prove:
87% dos entrevistados souberam do projeto através de um amigo que já participava do Prove.
As outras duas pessoas: uma, chegou através da própria universidade - era funcionária da
UFRJ. E a outra, a filha passou na porta, viu várias pessoas idosas e chamou a mãe para
participar:
"- É, minha filha. Mas quem falou com ela era a L. P: Aqui é uma associação que protege os
idosos. Aí, ela falou: - mamãe vai lá ver o que é isso que protege os idosos, as vezes tem
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outras senhoras lá para conversar, pra passear e se entrosar com o pessoa. Ai eu vim."
(Ouro, 80 anos, viúva)
Tempo de participação dos entrevistados no grupo de encontro de idosos do Prove:
Todos os usuários que foram entrevistados participavam do projeto há, pelo menos, três anos:
40% desde o início do projeto em 1996 , 54% há quatro anos; e 6% há três anos.
Tipos de atividades que exercem dentro do projeto além do grupo de encontro:
94% participam de mais alguma atividade além do grupo de encontro. 40% fazem inglês e
psicomotricidade; 34% aulas de pintura, 20% teatro e 6% só participa do grupo de encontro.
Participação em outros grupos voltados para o envelhecimento:
67% dos entrevistados tiveram o Prove como o primeiro grupo de convivência de idosos. 23%
(três pessoas) já faziam grupos de convivência antes de entrar para o Prove, sendo que duas
freqüentavam grupos em centro ou posto de saúde; e apenas uma pessoa participava de um
grupo com atividades voltadas para a terceira idade do estilo do Prove. Todas as pessoas
(100%) buscaram outros grupos após o Prove e atualmente participam de mais de um grupo,
que trabalham com pessoas idosas, o que sugere que tenha sido uma experiência positiva a
participação nesse tipo de atividade.
Atividades que exercem fora dos grupos voltados para o convívio de idosos:
47% afirmam fazer algum tipo de exercício físico como caminhada, hidroginástica ou ioga,
fora dos grupos; 6% fazem trabalhos manuais. Outros 47% declaram não exercer nenhum
tipo de atividade fora dos grupos. Uma das razões atribuída é a falta de tempo, ou seja, o
grupo ocupa a maior parte do tempo das pessoas, conforme dito por uma das entrevistadas,
quando se perguntou se ela participava de alguma atividade fora do grupo:
“ - Não... só caminhada. A gente faz muita excursão de passeio. A gente vai dormir 1:00,
2:00hs da madrugada, acorda as 9:00hs. Quando a gente vê, já tá na hora de fazer o almoço
e não dá para fazer mais nada." (Ouro, 75 anos, viúva)
Atividades que desempenham dentro da família:
Nenhum entrevistado desempenha uma atividade sistemática dentro de sua família, apenas de
forma esporádica. 67% asseguram não exercer nenhum tipo de atividade no âmbito familiar;
20% dizem dedicar-se esporadicamente a algum tipo de atividade e 13% afirmam
desempenhar atividades cotidianas, como cuidar da casa, e desempenhar atividades
domésticas. A fala dos entrevistados nos traz a reflexão das pessoas idosas, não mais voltadas
apenas para o espaço do lar, mas para o espaço público de relações, até desvalorizando a
atividade na família:
“ - Não. Bem que eles queriam que eu participasse de atividades, assim, como tomar conta
de netos. Mas eu nunca deixei meus filhos com ninguém, então não vou terminar minha vida
criando netos! Precisou de mim por causa de alguma doença, tudo bem, eu fico. Dou até
ajudinha mas tirando isso não. Não tenho isso de ser vovó coruja, não. Minha neta outro dia
virou pra mim: "Ah vovó eu queria viajar pra Campos, quer ficar com seus bisnetos?" Eu
disse: - tô fora! Ela disse: " – Puxa, você nem parece que é bisa" Eu disse: " - O que você
vai fazer lá, eu tô fazendo aqui. Lá, você vai para namorar, não é? Eu aqui também namoro
ainda, eu não morri pro mundo não, minha filha!”. Bem que eu tive uma cunhada, essa que é
advogada, que disse: "- seu marido morreu, então morre pro mundo" . Eu disse: " -morre
você, eu não". (Rubi, 73 anos, viúva)
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"- De vez em quando, de quando em quando, e vez em vez (risos)...tomar conta do cachorro o
carnaval todinho, risos. As vezes tomo conta do Bernardo que é de 4 anos (bisneto), mas isso
é esporádico, só quando ela quer ir a um teatro. Ela pede: “ - vovó vem para cá, tomar conta
do Bernardo." (Ouro, 80 anos, viúva)
"- Eu cuido da casa, o que para mim é o bastante." (Jade, 69 anos, casada)
"- Não, eu colaboro em todas as reuniões, em tudo que a família se propõe. Colaboro,
digamos, com conselhos, com orientação, recebo recados, essas coisas assim; as vezes eu
banco a secretária, mas esporadicamente." (Diamante, 77 anos, viúva)
5.3. Categorias de análise
As categorias de análise são definidas a partir do referencial teórico, sobre
empoderamento, Promoção da Saúde, envelhecimento, grupos de apoio social; e de uma
primeira leitura do material coletado, de forma a se obter uma visão geral do que foi
analisado. Logo após, é feita uma nova leitura do material, buscando encontrar-se as unidades
de significados (Martins e Bicudo, 1989). Essas unidades têm como objetivo sintetizar o que é
mais significativo nos dados coletados.
Assim, são selecionadas sete grandes unidades de significados, descritas como categorias
de análise:
Apoio social
Rede Social
Autonomia
Integridade
Cuidado
Aprendizagem
Realização de projetos pessoais
Dentro de quatro categorias são formadas subcategorias, que atuam como funções ou
valores dessas categorias maiores, como é o caso da Apoio Social, Autonomia, Rede Social e
Integridade. A seguir, são mostradas as categorias de análise, com seus respectivos
significados teóricos. E, à luz destas categorias de análise, as entrevistas e o grupo focal são
analisados, com a ajuda do programa LOGOS, um software que auxilia no gerenciamento de
textos.
5.3.1. Apoio Social
É definido, por Minkler, “como sendo qualquer informação, falada ou não, e/ou auxílio
material, oferecido por grupos e/ou pessoas, com o qual teríam contatos sistemáticos, que
resultam em efeitos emocionais e/ou comportamentos positivos. Trata-se de um processo
recíproco, ou seja, que gera efeitos positivos tanto para o sujeito que recebe, como também
para quem oferece o apoio, permitindo que ambos tenham mais sentido de controle sobre suas
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vidas. Desse processo se apreende que as pessoas necessitam uma das outras.” (Minkler, 1993
apud Valla, 1998:156).
Subdivide-se o apoio social em dois tipos, que se configuram como subcategorias do
mesmo:
Apoio emocional alusivo à ajuda emocional, tal como carinho, afeto, estima, valor, etc.;
Apoio instrumental referente à ajuda material, ajuda informacional, etc. (Arrosi, 1993).
Seguem, abaixo, algumas falas relevantes que ilustram a categoria acima (1):
(Apoio emocional)” - A necessidade de ter pessoas pra conversar, a necessidade de fazer
exercícios, a caminhada que faziam. Me diziam que faziam caminhadas, tudo isso me levou a
aceitar o Prove." (Citrino, 85 anos, viúva)
(Apoio emocional) "- Primeiro que eu estava num momento muito assim, muito difícil, que eu
tinha perdido um irmão, uma pessoa muito amiga minha, muito boa. Então, eu estava muito
desesperada, eu tava procurando um apoio, procurando fazer alguma coisa diferente, uma
coisa que viesse me ajudar psicologicamente, emocionalmente, ocupacionalmente e o Prove
veio bem a calhar. Foi numa hora que eu precisava de uma ajuda e foi muito bom, foi um
apoio muito bom, foi muito positivo." (Ágata, 66 anos, casada)
(Apoio emocional) “- Na semana passada, lá na fono, teve uma atividade que era para ficar
uma pessoa em frente da outra, encarando. Então eu peguei uma das minhas parceiras,
esqueci o nome dela, ela é muito simpática também. Então eu disse: "-Vamos flertar, mas
não pode falar". Aí, depois, quando terminou, elas perguntaram o que eu senti da parceira.
Aí, eu disse: " - Senti sinceridade. Porque ela soube encarar nos meus olhos, o tempo todo me
encarando". Eu, sempre, desde pequena, soube, que as pessoas que encaram a outra, assim,
são pessoas honestas, sinceras. A mesma coisa, quando você vai cumprimentar uma pessoa,
que a pessoa faz mão mole, eu não confio naquela pessoa. A pessoa tem que cumprimentar de
verdade. Então, eu achei ela muito sincera, uma pessoa com sinceridade e ela sentiu a mesma
coisa de mim. Foi muito bom, muito bom mesmo!." (Rubi, 73 anos, viúva)
(apoio instrumental) "- O carinho de vocês com a gente é muito importante: sempre tendo
uma palavra amiga, transmitindo coisas sempre muito interessante sobre saúde. Tudo o que
eu participei aqui me acrescentou muita coisa, por isso eu dei continuidade. Eu também estou
no Rocha Maia, mas é completamente diferente; não estou desmerecendo o Rocha Maia,
cada um tem os seus valores, mas eu não largaria o Prove pelo Rocha Maia, entende? Acho
que sempre deveria ter mais e mais, porque nós nos divertimos e no fim da vida, também
depois de tanta luta, a gente merece um lazer, um lazer."(Jade, 69 anos, casada)
(apoio emocional)“- Tem sim, eu era muito envergonhada, já assim, em grupo, a gente já
fala, participa mais Eu acho que ajuda muito. O contato que a gente tem com vocês, mais
jovens, e com os próprios idosos, ajuda a gente a levar....a viver e receber bem a vida!”
(Água-marinha, 75 anos, viúva)
(apoio emocional e instrumental) “- Mas tem muitas senhoras que eu gosto de todas elas. Me
meto em todo curso que abre (risos), adoro ficar aqui dentro, adoro conviver com o pessoal,
adoro ajudar. Uma que está mais atrapalhada no inglês, eu ajudo (Ouro freqüenta as aulas
de inglês do projeto nesse semestre), porque a vida é isso, é viver bem, no grupo"(Ouro, 80
anos, viúva)
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(apoio emocional e instrumental)“Porque a terceira idade é para ser tratada como vocês
tratam, com carinho, passando informações positivas. Com os anos, a gente também vai
tendo experiências. Para você ter experiência como a gente tem, você tem que ter vivido.
Você pode ter mais cultura, mas a prática da vida... A vida é uma escola, eu vejo a vida
assim, como uma escola, sempre estamos aprendendo. Eu gosto muito de estar informada. Eu
sou uma pessoa muito comunicativa, muito aberta, porque as pessoas, às vezes, ficam com
muito medo... As pessoas, quando não acham certo tem que falar, para modificar, porque
estamos aqui para Ter uma experiência prazerosa. (...) As pessoas daqui do Prove
questionam mais e são mais atualizadas. As pessoas lá são um pouquinho mais alienadas,
alienada é a palavra?"(Jade, 69 anos, casada)
"- A coisa de não ficar sozinha, de ficar participando com mais pessoas da minha idade, se
comunicando, trocando idéias e conversando, porque as pessoas da nossa idade são as que
melhor nos entendem, melhor nos entendemos uns aos outros. Porque os jovens podem até
nos entender, mas não tem a vivência que tem a gente, não é?! Então, eu participei, gostei e
continuei. ..."(Topázio, 73 anos, separada)
Apoio social articulado à categoria de rede social:
“- É, amizade! Dessa vez que fui em Raposo (na viagem com o grupo), fiz uma amizade que
fiquei até boba. Ela nem me conhecia muito, no grupo; me emprestou dinheiro, durante a
viagem, eu ai fiquei nervosa para pagar, dei meu telefone, disse pra ela me ligar. Ela nem
me cobrou, eu que fui atrás dela para devolver o dinheiro que ela tinha me emprestado. E
aí, nós ficamos grandes amigas, me chamou para passar uma tarde na casa dela. São essas
coisas que a gente gosta, é mais uma casa para ir. As vezes, eu faço na minha casa um chá e
convido todo mundo. Mais a melhor coisa que houve, foram esses grupos da terceira idade,
porque antigamente as pessoas faziam 50 anos e ficavam dentro de casa sentada, só fazendo
tricô, crochê, aquelas coisas. Ah, não. Se eu ficasse assim eu tinha morrido. Então, a
melhor coisa... não podia existir coisa melhor do que esses grupos, muito bom!." (Safira, 74
anos, viúva)
" - Ter mais vida social. Porque elas chamam para uma coisa, outra chama mais para outra;
ouve-se uma conversa de uma, que está mais atrapalhada e a gente até inventa, "- não... eu já
passei por isso também”. A gente dá um conselho, dizendo que aconteceu com a gente
aconteceu nada, mas a gente diz que aconteceu prá... Ah, não liga pra isso, não, amanha ou
depois já estão bem, eles falam isso da boca para fora... coisas assim, que acontecem."
(Ouro, 80 anos, viúva)
"- A convivência com as colegas, a amizade. Você passeia muito, tem com quem conversar,
isso que eu gosto." (Safira, 74 anos, viúva)
"- Ah, eu espero, como se diz, que eles ajudam... Geralmente eles tem os mesmos problemas
que a gente, aí, sempre tem alguém mais animado, que promove um passeio, promove uma
festinha. Essas coisas ajudam a gente a não se sentir tão só, não é?! Os netos estudam; os
filhos ficam correndo de um lado para o outro; correndo atrás, você sabe como é que é.
Então a gente tem que correr para os nossos colegas que tem mais ou menos os mesmos
problemas. As vezes, a gente tem uma doença, uma coisa qualquer. E por não ter tempo dos
filhos escutarem, a pessoa amiga escuta, ajuda; até se precisar ir ao médico, acompanha,
essas coisas. Eu acho que tem bastante solidariedade entre as pessoas... eu gosto muito."
(Topázio, 73 anos, separada)
5.3.2. Rede social significativa ou rede social pessoal
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71
Pode ser definida como a soma de todas as relações que um indivíduo percebe como
significativas, ou que define como diferenciadas da massa anônima da sociedade. Essa rede
corresponde ao nicho interpessoal da pessoa e contribui substancialmente para seu próprio
reconhecimento, como indivíduo, e para a sua auto-imagem. (Sluzki, 1997:41).
A rede social apresenta algumas funções descritas como subcategorias de análise, que são:
Companhia social se refere à realização de atividades conjuntas ou simplesmente o estar
junto (p. 48);
Apoio emocional se refere a intercâmbios que conotam uma atitude emocional positiva,
clima de compreensão, simpatia, empatia, estímulo e apoio; é o poder contar com a
ressonância emocional e a boa vontade do outro.” (p. 49);
Guia cognitivo e conselhos é definido como “interações destinadas a compartilhar
informações pessoais ou sociais, esclarecer expectativas e propiciar modelos de papéis”
(p.50);
Regulação social, significa as “interações que lembram e reafirmam responsabilidades e
papéis, neutralizam os desvios de comportamentos que se afastam da expectativas
coletivas, permitem uma dissipação da frustração e da violência e favorecem a resolução
de conflitos.”(p.50);
Ajuda material e serviços quer dizer “colaboração específica com base em
conhecimentos de especialistas ou ajuda física, incluindo os serviços de saúde.” (p. 52);
Acesso a novos contatos, se refere à “abertura de portas para a conexão com pessoas e
redes que até então não faziam parte da rede social do indivíduo.”(Sluzki, 1997: 53).
Abaixo estão transcritas as falas relativas a estes conteúdos (2):
(guia cognitivo e conselhos) "- Por que eu vim? - Porque era um projeto de idosos e eu
achei interessante, sabe? Porque eu gosto muito de assistir, de ouvir palestras, entrevistas
essas coisas. Eu gosto muito e isso me atraiu." (Água-marinha, 75 anos, viúva)
(Regulação social e acesso a novos contatos/ apoio social) “- Conhecer os problemas do
grupo, porque, às vezes, a gente acha que o problema é só nosso e vamos ver que o
problema é coletivo, né! E participar com pessoas da mesma faixa etária que a da gente,
porque eu tenho um monte de amigas da mesma faixa etária que a minha."(Cristal, 67 anos,
solteira)
(companhia social) "- Expectativa? É que eu me sentisse satisfeita, realizada. A expectativa?
Eu não disse porque eu vim? Então, para ter um relacionamento maior com um numero
maior de pessoas" (Água-marinha, 75 anos, viúva)
(guia cognitivo e conselhos) “- O Prove não é assim "oba, oba" não. Não sou nada contra
"oba, oba"; eu até acho "oba, oba" bom. Mas o Prove... aqui também tem os momentos de
"oba,oba" mas é um negocio muito palpável, que informa muito a gente, que ajuda, que leva
você a buscar até coisas fora, a ler mais coisas, a se interessar, até pesquisar sobre o
problema do idosos como um todo. Em todas as áreas, a gente tem que tá buscando
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informações e lendo para se ajudar, né?! Para a sua própria ajuda mesmo, porque a ajuda
maior é você mesmo que tem que fazer . Eu acho que principalmente, assim, em termos de
você tomar precauções para tudo que você vai fazer, você tem que fazer com mais atenção,
tomando mais conta, tomando mais cuidado.” (Ágata, 66 anos, casada)
(apoio emocional) "- A expectativa é que a convivência faz com que a gente adquira mais
conhecimentos, amizade e outras coisas mais, não é?! Porque um garoto de 14, 15 anos não
tem a idéia que tem uma pessoa já de idade; uma pessoa já vivida assim da vida. Tenho
tantas amizades boas aqui que eu tenho conseguido, que até hoje... A amizade, a convivência
mesmo." (Ônix, 75 anos)
5.3.3. Autonomia:
Farinatti (1997) define autonomia pelo que ela não deve ser, diz ele: "da mesma forma que
saúde não é ausência de doenças, a autonomia não é ausência de dependência física"
(1997:32). Deste modo, a autonomia é vista sob o prisma da auto-realização, na perspectiva
da realização das possibilidades e não sob o foco das perdas de capacidade.
Este autor concebe três níveis de autonomia que são, aqui, consideradas como
subcategorias da autonomia:
Autonomia de ação, que incorpora a noção de capacidade física. É a pessoa poder se
mover fisicamente, de forma independente. Está relacionada à dimensão física.
Autonomia de vontade (ou de escolha), se refere à capacidade de auto-determinação, que
é um valor da autonomia, definida mais adiante. Se relaciona com a capacidade do
indivíduo escolher livremente, de acordo com a sua vontade.
Autonomia de pensamento, que é um nível mais profundo da autonomia, diretamente
relacionado com a autonomia de vontade; só que pressupõe um conhecimento crítico, uma
reflexão mais consciente de escolha.
O primeiro nível de autonomia tem a ver com a capacidade física e pode ser medida pelas
escalas que medem AVD – Atividade de Vida Diária. Já os outros dois níveis abordam a
questão do poder de decisão; ou seja, ser autônomo não é só ter capacidade física, mas ter
autonomia para decidir sobre a sua vida, neste sentido, autonomia está diretamente
relacionada ao empoderamento, que é o indivíduo poder obter controle sobre a sua vida.
Uma outra subcategoria, observada nas falas, é a Capacidade de auto-determinação, que
pode ser definida como a capacidade de escolha, um importante valor pessoal, que deve ser
compartilhado e que pode ser chamado de “habilidade para se auto-determinar”, a habilidade
para escolher por si mesmo, ou mais extensivamente, a habilidade para formular e continuar
com os seus próprios planos (Downie et al.,1999). Esse valor da autonomia está ligado ao que
Farinatti (1999), chama de autonomia de vontade.
O auto-desenvolvimento ou a auto-realização, é outra subcategoria, que também está
diretamente relacionada à autonomia de vontade e de pensamento definidas por Farinatti
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(1997). Ela se relaciona ao sentimento das pessoas em comparação às suas habilidades
pessoais, naquilo em que elas podem se destacar.
Abaixo, seguem algumas falas relevantes para ilustrar a categoria acima (4):
(autonomia de vontade e auto-determinação) “- Depende de mim, sim! Por exemplo: eu
morei 30 anos num apartamento de quarto e sala. Eu tive um problema na perna, meu filho
ficou falando que eu tinha que me mudar para um apartamento maior, mas eu só ia me
mudar se for para aqui, em Copacabana. Meu filho mora na Tijuca e tinha um apartamento
muito bom perto dele, mas eu disse que não queria e fui buscar um apartamento aqui mesmo,
em Copacabana. Coincidências, eu achei no prédio da Adelaide (que é freqüentadora do
Prove). Eu perguntei se tinha algum apartamento para vender. No outro dia telefonei para o
proprietário e noutro dia fechei negócio. Mudei do número 86 e fui para o 125, em frente!
Foi esforço meu, nunca tive ajuda nenhuma, a não ser a pensão de meu marido ( morreu
quando tínhamos 1 ano e meio de casados). Fora isso nunca tive ajuda nenhuma, tudo o que
tenho e possuo hoje é esforço meu!". (Água-marinha, 75 anos, viúva)
(autonomia de ação) “- Eu saí do trabalho, fui pra aposentadoria e isso aí pouca coisa
mudou. Só que eu me engajei nesses grupos, porque eu sou muito irrequieta e eu jamais ia
conseguir ficar em casa plantada; tenho que me mexer." (Diamante, 77 anos, viúva)
(autonomia de vontade) "- Bom, eu acho que aquela... responsabilidade de estar presente às
reuniões, de me manifestar durante as reuniões, sobre os assuntos, é, focalizados na reunião.
Acho que é isso aí, porque eu não sou de ficar parada, de ficar quieta, de ficar calada. Eu me
manifesto logo.” (Diamante, 77 anos, viúva)
(autonomia de ação) “- E, você, não tá ficando velha, não?" Eu não. Eu tô usada: velha
não... risos. Usada pelo tempo, mas não sou velha, não. Olha, eu não tenho preguiça, eu não
tenho preguiça pra nada! Eu faço tudo: eu vou ao banco, eu vou ao supermercado, eu volto,
vou num local, vou no outro, não páro, não. Me sinto mal, me sinto uma pessoa inútil,
quando não tem nada pra fazer. “(Esmeralda, 84 anos, solteira)
(autonomia de vontade e auto-determinação) " - Ah, sim. A gente é aquilo que a gente quer
ser. Eu quando criança, não era assim... livre, como eu queria ser. Era muito presa, e eu
queria ser muito livre. Eu era levada, teimosa, e minha mãe prendia muito. Na juventude, fui
muito presa e a melhor idade é agora! Me casei, vivi bem com meu marido e era ótimo, mas a
gente sempre fica presa e eu sou dessas pessoas que tem vontade de ser livre. Meu marido
era ótimo, não me empatava de fazer nada, eu fazia o que queria, ele combinava tudo
comigo. Depois que eu fiquei viúva, eu fiquei abalada, um pouco; mas depois, eu me senti
livre. Faço o que quero, vou aonde quero, acordo na hora que quero. Agora, não, porque
tenho trabalho, né? e tenho horário. Mas, quando tenho trabalho em casa, eu não tenho
horário prá ele e faço como eu quero. E, para mim, é a melhor idade." (Pérola, 74 anos,
viúva)
(auto-realização) "- É, liberdade. Eu sempre tive vontade de ter liberdade; consegui, agora,
depois de sessenta e tantos anos." (Pérola, 74 anos, viúva)
(auto-realização) "- Acho que é viver, é isso que eu disse: viver com liberdade! Ninguém
depender de mim e eu também não depender de ninguém. Eu não queria, nunca, jamais,
aquilo, de ter de dizer: "eu vou sair". Não. Eu gosto de sair e pronto! Saio. Fazer o que é de
direito e viver!” (Pérola, 74 anos, viúva)
(autonomia de ação e vontade)“Não sei, porque isso são coisas que não é da nossa vontade,
73
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não é... A única coisa que a gente pode fazer, acho eu, é não se entregar, não se entregar.
Dizer que estou velha e não sirvo para mais nada; não! Eu procuro atividades o meu tempo
inteiro. Vou para aqui, vou para lá, vou aos meus médicos, faço meus exames, faço tudo... Eu
faço croché, eu faço tricô, eu faço ponto de cruz; aí, eu passo bem, não tem problema.”
(Topázio, 73 anos, viúva)
(autonomia de ação)“- Na verdade, eu não sou dependente de ninguém, e isso me dá mais
autonomia pessoal, e eu vejo as coisas de uma forma diferente, isso é o que eu acho. O que
você acha? Porque quando a gente é mais dependente, você fica mais limitada, não
é?!”(Jade, 69 anos, casada)
(autonomia de vontade)“- Ah, outra coisa. O pessoal fala: "- você ainda vota?" Voto!, Por
que? Porque eu quero votar, ué; ninguém me impede. Você sabe que eu vou lá no dia de
eleição. Eu me arrumo toda e vou lá para votar toda satisfeita. Adoro! Agora, você vai no
computador e resolve tudo, não é?! Eu tô aceitando... uma beleza, tô achando ótimo. Não tô
me queixando de nada, porque tem gente que fica: "- ai tô ficando velha. Aí, sei lá o que".
Não, não quero nem saber disso. Que isso! Velha é estrada...Eu fico por conta, quando a
pessoa fala: "- aquela velha". Eu digo: “Pelo amor de Deus, não me chama de velha.”
(Esmeralda, 84 anos, viúva)
(auto-realização)“- Eu penso em viver muito! Estou com 73 anos e penso em viver muito,
ainda. Agora que eu tô conhecendo a vida....Tô conhecendo a vida agora! “(Rubi, 73 anos,
viúva)
5.3.4. Integridade
É um valor necessário para o bem-estar do indivíduo. Pode ser definida como “a marca
individual daqueles que conseguem aceitar e conviver, com a sua própria trajetória de vida, e
defenderem o seu estilo peculiar, que representa o seu patrimônio maior, frente às ameaças e
adversidades que a vida possa lhes reservar. Trata-se daquelas pessoas, que conseguem
vislumbrar a sua posição histórica e cultural, inserida num contexto e numa ordem maior.
(Braghirolli et al.,1999:119). Pode ser expressa na capacidade do indivíduo rever sua
trajetória de vida e apreciá-la com algum grau de satisfação. Esta categoria se relaciona com a
subcategoria anterior, que é a auto-realização, porque a pessoa que consegue rever sua
trajetória de vida com satisfação se sente realizada.
Integridade apresenta como subcategoria a geratividade:
Geratividade, conceito definido por Ercik Erickson (1963), é expresso na preocupação do
indivíduo com outras pessoas, além da sua família, objetivando ações de gerar, manter e
ofertar. Neri sugere que a geratividade é um indicador de maturidade, “sua origem é
uma necessidade interna de garantir a própria imortalidade, de ser necessário e de
passar o bastão para a geração seguinte, tanto no sentido biológico quanto cultural”
(2001b: 52). Este conceito é chave para o desenvolvimento na velhice.
(integridade) "- Ah, eu acho que tou muito bem. Estou feliz de ter vivido até agora e tenho
perspectiva de viver mais ainda porque pelos exames que eu fiz ultimamente eu fiz uma série
de exames e os médicos dizem que eu estou muito bem. Então eu acho que só se ocorrer uma
74
75
tragédia... Eu tô muito feliz como idosa. Ah! Eu faço muita coisa que na minha juventude eu
não podia fazer, era reprimida com meu pai, com meu marido e depois as crianças. Então,
agora tô solta, tô livre para voar!" (Diamante, 77 anos. viúva)
(integridade) “- Estou muito bem graças a Deus. Não sinto assim... ah porque eu tô velha,
porque eu tô...ah, se eu não tivesse ficado velha eu teria morrido, né?! Ah, minha mão tá
feia? Não, ela tá com a idade que tem! O meu rosto? Não, tá com a idade que ele tem! Não
me sinto assim... Ah, quando eu era novinha; ah, quando eu fazia aquilo.. Tô fazendo, ainda!
O que eu fazia quando era novinha, faço agora. Não sinto assim, envelhecimento. Até agora,
esse minuto. Porque tem pessoas que ficam com idade e ficam assim: "ah, mas eu tô feia, ah
minha pele, ah meu cabelo..." Eu adoro meu cabelo branquinho. Não quero pintar. Estou
com quase 75 anos; vou pintar meu cabelo? Vou pintar meu cabelo, vai me prejudicar a
vista, vai prejudicar minha pele; não pinto." (Pérola, 74 anos, viúva)
(integridade) “- Hoje estou com 75 anos e estou bem... eu não me acho velha, eu aceito a
velhice. A velhice é uma coisa natural da vida. A gente nasceu, viveu e morre... Então a gente
vai levando." (Água-marinha, 75 anos, viúva)
(integridade) “- Terceira idade, pensa assim... Às vezes, quando a gente é mais novo, tem um
pensamento; na terceira idade, já tem outro pensamento, já pensa que vai ficar velho e vai
morrer logo. Hoje mesmo falei com minha filha: eu não vou morrer tão cedo. Antes de
morrer eu ainda vou matar muita gente. O que?! A minha vida melhorou muito! Melhorou,
porque quando a gente tem filho, a gente nunca deixa de ter aquela preocupação com filho,
porque filho casa, tem netos...”(Rubi, 73 anos, viúva)
(geratividade) "- Isso que eu te falei, já falei até, né?! Faz você buscar coisas até fora e
refletir, sobre tudo aquilo que você leu, que você ouviu, que foi falado, e tudo isso vai te
ajudando muito. Eu procuro até passar prá outras pessoas, quando é uma coisa assim, que eu
acho que é importante, que vai ajudar. Eu sempre passo para as minhas amigas, lá da
ginástica, sobre a maneira de viver, de se comportar, de remédio, de não muito médico...
Você não pode ser uma velha hipocondríaca, você tem que ser velha e agradável; não pode
ser uma velha chata, uma velha suja, fedorenta. Você tem que procurar se apresentar da
melhor maneira possível. Não pode querer impor que no seu tempo era melhor, que agora é
pior, que no seu tempo era bom. Não; todo o tempo é bom. Cada um tem que viver o tempo da
sua época e tentar se adaptar às mudanças que vão ocorrendo. As mudanças vão ocorrendo e
você tem que conviver com elas. “(Ágata, 66 anos, casada)
5.3.5. Cuidado
O cuidado faz parte da essência de todo ser humano. É aquilo que se opõe ao descuido.
“Cuidar é mais que um ato, é uma atitude. Representa uma atitude de ocupação, preocupação,
de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro.” (Boff, L. 1999:33).
“- O que que eu vou fazer? Deus me deu essa vida; o que que eu vou fazer? Eu vou cuidar
dela, tratar dela para ver até quando vai, até aonde vai. Porque também tem disso, se você
não trata bem da sua vida, ela não pode ir muito longe, não é? Então, o que eu faço é isso, é
só tratar dela! (risos) Já que ele me deu, deixa eu tratar."(Prata, 78 anos, separada)
“- Tratando, a pessoa melhora. Eu nunca fumei; beber não bebo, refrigerante não bebo, só
bebo suco. Quer dizer tem uma possibilidade melhor de tratar; uma saúde melhor. Não
abuso, procuro dormir bem, me alimentar bem, essa coisas... cuidar da saúde. Porque o
pessoal de 75 anos... "- ah, eu vou morrer amanhã, não tô ligando". Mas tem que ligar! Meu
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pai morreu com 103 anos, mas morreu de velhice; mas com 103 anos já desidratou todo, não
tava mais ligando, mas é a idade mesmo; mas foi trabalho do pessoal, a união lá de casa,
sempre cuidando dele. E morreu com 103 anos, porque se não fosse a gente a cuidar dele,
morria mais cedo, se fossem uns filhos que não ligam para os pais, morria mais cedo. Ele
não, morreu, porque tinha de morrer mesmo." (Ônix, 75 anos, separado)
“- Eu controlo muito, porque minha família toda morre por problema de enfarto, coração.
Então, eu sabendo disso, eu procuro controlar minha pressão. Eu tomo remédio de manhã e
na hora que eu vou dormir. Tomo meu remédio direitinho.” (Rubi, 73 anos, viúva)
5.3.6. Aprendizagem
O trabalho de grupo funciona como um processo de aprendizagem “não no sentido de que
tudo consiste em tirar de cada um o que já tem de dentro de si, mas no sentido de que é o
grupo que cria seus objetivos e faz suas descobertas através da ativação daquilo que existe
em cada ser humano de riqueza e experiência, ainda que pelo simples fato de viver” (Bleger,
1993:66). Entende-se aprendizagem, como um processo de mudanças e de ação assimiladora,
entre o que o sujeito apresenta, de conhecimento, baseado na sua visão de mundo, nas suas
tradições e costumes; e do conhecimento novo, que está sendo ensinado. E é sempre um
processo, onde a transformação é o resultado.
“- Porque eu gosto de aprender. Tudo que eu tenho possibilidade de aprender eu aprendo. Se
tiver oportunidade de aprender, não to gastando dinheiro, então tá bom." (Prata, 78 anos,
separada)
“- Eu falo mesmo prá pessoas que ficam de moleza. Eu tenho uma irmã assim, que é mole.
Gente, não pode ficar assim, não. A máquina que fica parada, muito tempo, enferruja. Você
tem que dar uma caminhada, você tem que fazer uma ginástica, você tem que fazer alguma
coisa. A memória, então? Eu gosto de fazer palavras cruzadas, eu aprendo muito, gosto
muito de fazer. As coisas que eu não sei, vou no dicionário procurar, pesquisar, eu sou assim,
sabe?" (Prata, 78 anos, separada)
“- Ajudou, me jogou tudo isso. Você assistia uma palestra; cada vez ficava um pouquinho
daquilo que se ouvia. Pra mim ficou muito. Então, eu vou juntando tudo aquilo e amarro
direitinho, segura e dá pra ajudar muito a gente." (Ágata, 66 anos, casada)
“- Não... pra mim foi muito bom, porque eu fui tendo conhecimento sobre a terceira idade;
porque quando a gente é jovem, a gente tem um pensamento, quando a gente chega na
terceira idade, a gente já tem um pensamento completamente diferente. Sempre eu pensava
assim: se ficar em casa, fazer o que em casa? Meu Deus do céu! Quando eu era mais nova eu
saia, mesmo com todos os filhos, eu ainda saía, não ficava em casa. E agora, na terceira
idade o que que eu vou fazer, com os filhos todos casados? Então, pra mim, foi uma beleza,
pra mim me incentivou a participar dos trabalhos, as coisas assim, aqui do Prove. Agora,
fazendo inglês, fazendo aula de pintura; essas coisas pra mim tem sido maravilhosas." (Rubi,
73 anos, viúva)
“- Muitas coisas que eu não sabia eu aprendi aqui. Esse programa "Viva Bem a idade que
você tem" era muito bom (eram 10 temas dados através de palestras na atividade de
orientação para a saúde). Era muito bom pra gente, muito informativo, porque como disse
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pra você, quando se é jovem é só saúde, saúde, saúde. Pelo menos comigo, foi. Só ia ao
médico para fazer preventivo.”(Jade, 69 anos, casada)
5.3.7. Realização de projetos pessoais
Pode ser definido como o antídoto contra a finitude, contra a estagnação. É a estratégia
que o indivíduo deve ter para alcançar a autonomia, até o final da sua vida. Segundo
Seminério: “programas existem sempre, e a possibilidade de os realizar é o antídoto contra a
finitude. Porque, enquanto realizamos, enquanto estamos efetivamente construindo através do
nosso imaginário, algo até se pode tornar real – e o importante é essa construção em nosso
imaginário – enquanto nós tivermos condições de elaborar, a nossa vida é, naquele segmento,
efetivamente imortal.” (1999: 29). É perceber a velhice como uma idade ativa, em ativaidade.
“- Computador. Eu não queria morrer sem aprender alguma coisa de computador, isso eu
sempre disse, desde 96. A primeira da lista sou eu! Porque eu não quero morrer sem
aprender alguma coisa; eu não quero chegar lá em cima (no céu) e burra, burra! Isso é o que
eu quero: aprender. Quero aprender alguma coisa de computação"(Ouro, 80 anos, viúva)
“- Ah , outra coisa. Eu tenho uma vontade tão grande de estudar; eu não quero me formar,
eu quero mesmo é estudar, pra quando tiver uma pessoa assim, falando, a gente saber falar.
Eu não sei e o pouco que eu sei eu fico com vergonha de falar... risos. As vezes, eu vejo as
meninas no grupo. Elas falam, discutem... Naquele dia, eu falei umas coisas com aquela
menina, a C. (psicóloga do projeto), mas não sou de falar, não gosto. Eu acho bonito a
pessoa que sabe falar.” (Esmeralda, 84 anos, solteira)
“- Agora, Dra.L. P. disse que vai arrumar pessoa pra poder aprender informática. Eu disse:
" - eu tô lá". Vou aprender informática também, vou sim. Às vezes, as pessoas falam assim: "pra que você quer aprender inglês, não vai viajar mesmo" Eu digo: "- Ué, vou aprender
porque eu quero falar, ué!". Às vezes, uma pessoa pergunta alguma coisa na rua e a gente
fica sem saber; às vezes, um americano pergunta um negócio aqui, eu chego ali no mapa e
tinha que ensinar por mímica. Pronto, a gente falando é outra coisa.”(Esmeralda, 84 anos,
solteira)
A questão que se procura responder, ao longo desta dissertação, é se a dinâmica de
trabalho dos grupos de idosos, que se dedicam à Promoção da Saúde, pode ser considerada
um fator de empoderamento, que lhes possibilita maior capacidade para lidar com a limitação
da autonomia, decorrente da condição fisico-social de velhos.
Durante a análise dos dados coletados pode-se observar o processo de construção do
empoderamento, sintetizado na fala de Cristal no grupo focal:
“- Nós temos a direção da Dra.L. P., o que ela proporciona para nós... Eu disse pra você que
eu gosto imensamente de palestras. A Dra. L. P. consegue ótimas pessoas gabaritadas, como
a Ouro falou, para vir aqui, para fazer palestras; e como a Diamante acabou de falar, nós,
quando temos, assim, um problema, nós, quando chegamos perto dela, nós sentimos nela
aquele amparo, aquele acolhimento; essas atividades todas, que nós fazemos; se não
podemos fazer uma coisa, vai para outra. Se você não pode... Por exemplo, eu deixei o teatro
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por problema de visão; então, quando a gente não pode fazer... Eu fiz o artesanato,
fonoaudiologia, temos aula de inglês, então... Nós temos o que fazer, nós temos tido o que
fazer! Outra coisa; essas atividades todas nos tiram de casa. Porque, senão, nós acabamos
fazendo o que? Nós não temos para onde ir, e vamos ficar em casa sentada vendo televisão e
cada vez mais vamos ficando mais apática, mais emudecida, de ficar dentro de casa. Esse
convívio, que nós temos umas com as outras, sabe... Então, eu acho que o Prove... Você não
pode analisar assim, por uma determinada coisa; a gente tem que ver o todo. Existe um todo
e eu acho que é esse todo que nos prende, a nós todas, aqui”(Cristal, 67 anos, solteira).
O primeiro pressuposto desta dissertação, é de que o envelhecimento desencadeia um
processo de desempoderamento, devido a diversos fatores, tais como a diminuição da rede
social pela perda dos vínculos sociais; a perda da vitalidade inerente ao processo fisiológico
do envelhecimento; e a perda do prestígio social, devido a se estar fora do processo produtivo.
Esses fatores constituem a teoria de falência social (8), descrita por Myers (1993). O
processo de desempoderamento faz com que as pessoas busquem os grupos, como está bem
ressaltado abaixo:
“- Procurar novas amizades, porque os velhos, meus amigos, já foram embora todos. Então,
a gente fica sem amizade; então, eu precisava procurar outras pessoas da minha idade e que
também pudessem trocar idéias comigo; trocar trabalhos; fazer uma vida social, porque o
velho vai abandonando a vida social, porque os amigos dele vão sumindo, vão morrendo e a
pessoa vai se isolando.”(Ouro, 80 anos, viúva)
“- Porque eu acho que o pessoal da terceira idade não deve ficar em casa. Eu acho que a
gente participando desses grupos é melhor; tem com quem conversar. Ficar em casa. Os
filhos mesmo, não tem tempo: trabalham, estudam, aquela história; então, não dá para eles
conversar assim... Então, quando a gente tá no grupo, você tem com quem conversar. Isso te
dá uma melhora, você não fica assim, tão sozinha dentro de casa. Eu acho a melhor coisa
que tem, esses grupos."(Safira, 74 anos, viúva)
“- Não ficar em casa parada, sem fazer nada, que é horrível! A pessoa idosa ficar em casa,
sem fazer nada, é horrível. O dia em que eu fico em casa, que as vezes não saio pra fazer
nada. Ah! eu tenho que sair para outro lugar, porque ficar em casa é horrível.” (Rubi, 73
anos)
No grupo focal a temática do desempoderamento também aparece:
“- Eu vim através da Lurdes; aí, quando eu cheguei, vim até no início; sou uma das primeira
daqui: sou o numero 09. Aí, eu peguei, vim com a Lurdes, nos escrevemos. Aí, eu vim, gostei,
achei, assim, as palestras muito boas, porque eu gosto muito das palestras e também tinha
outras atividades: tinha dança, tive no teatro, tive na fono. Assim, fiz muita coisa aqui dentro
e eu gosto da convivência, conhece o pessoal da nossa idade. Isso é muito importante, porque
hoje em dia, quase não tem ninguém para conversar com você, não é? Porque a vida é muito
corrida; então, eu achei ótimo, é um meio da gente ficar assim, conversar, não é?” (Safira,
74 anos, viúva)
Outro fator descrito, que corrobora o processo de desempoderamento, é o declínio da
vitalidade, decorrente do processo fisiológico do envelhecimento; e o preconceito das pessoas
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diante da velhice; fatores que foram descritos em resposta ao modo como as pessoas
percebem o envelhecimento e as modificações decorrentes da velhice:
“- Ah, eu me decepcionei muito com a velhice. É muito chato, muito desagradável: “Tadinha dela”. É sempre alguma coisa assim de pena, sabe? Esses movimentos feministas e
mesmos masculinos que diz: “- nós vamos cuidar da terceira idade”. Que nada! Não tão nem
ligando pra gente.”(Citrino, 85 anos, viúva)
“- Olha, agora olhando para o espelho (risos)... Eu não enxergava (risos)... Eu não
enxergava! Então, comecei a perceber o envelhecimento, porque as pessoas começavam a me
dar lugar no ônibus. O motorista começou a abrir a porta da frente pra eu entrar. Eu não me
achava tão velha para fazer isso. Hoje em dia, eu percebo olhando para minha mão. Espia
como ela está (Cristal mostra as suas mãos para mim), está uma tristeza! Porque minha mão
era gordinha. Aí, olhando para minha mão, eu percebo que eu estou envelhecendo. Agora, o
problema físico... Não tenho mais aquele pique que eu tinha, já chegam as doenças, a coluna
que dá dor nas costas, mais os problemas de saúde.”(Cristal, 67 anos, solteira)
“- A coisa que eu percebo muito no envelhecer, que eu procuro cuidar, é a pele. Porque o
resto, pra mim, não envelheceu não. (...) Meu namorado não sabe que eu sou hipertensa.
Quando ele dorme lá em casa, ele não sabe nem aonde está a caixa do meu remédio. Então,
o problema é minha pele. Ah, meu Deus; se eu pudesse entrar num lugar assim, dentro de um
aparelho, que esticasse toda a minha pele, eu ia gostar muito! (Rubi, 73 anos, viúva)
“- No aspecto físico tem. Eu, por exemplo, não dou mais adeus porque aqui... (mostra o
antebraço balançando)( risos). Eu estou também com um negócio na perna, que parece sujo,
eu acho horrível; mas o resto, não. Como eu te disse, no dia em que eu não puder dar mais
uma corrida, dançar no baile... Mas, enquanto isso está tudo ótimo... Eu sou uma otimista.
Temos que viver a vida como ela é.”(Água-marinha, 75 anos, viúva)
“- A falta de disposição; a morosidade; aquilo que eu fazia, assim, em meia hora, eu levo
uma hora, uma hora e meia. Isso aí é uma coisa que me faz sentir. Outra coisa que eu sinto
assim, bem mais deficiente: eu tinha uma redação fácil, rápida, raciocinava com rapidez,
Atualmente eu sou lenta, digamos, se eu tiver de redigir um ofício, eu já vou pensar, já vou
até buscar um dicionário porque me ocorrem dúvidas na grafia das palavras; coisas
assim.”(Diamante, 77 anos, viúva)
“- Não trouxe muitas modificações, não; porque eu sempre fui isso, magrinha, seca; sempre
isso. Nunca fui gorda. Só isso. Tá chovendo eu não vou, não. Antes, eu nem queria saber
disso. Ia saindo porta afora. Quando tinha cantores, eu ia assistir, ficava até tarde, não tinha
medo de ir. Hoje em dia, eu não tenho coragem nem de sair, com medo de ser assaltada;
porque com o novo eles fazem o que fazem, quanto mais com o velho. É perigoso e se você
não tem o dinheiro pra dar, que eles querem, pra comprar vícios e absurdos, eles maltratam
a gente.”(Citrino, 85 anos, viúva)
“- Sempre trás, né? Você sente que não é a mesma pessoa. Começa a sentir uma dorzinha pra
cá, outra dorzinha pra lá, um cabelo branco. O corpo também: estou barriguda; nunca tive
barriga! A idade chega; a barriga chega; chega tudo. Vai chegando, mesmo você fazendo
ginástica, mesmo você correndo atrás. Vai modificando a estrutura muscular, o rosto... Aí,
vai plástica pra cá, plástica pra lá. Você pode fazer, eu acho muito bom quem faz, mas nunca
fiz, não e nem tenho vontade de fazer. Eu assumo, assim, numa boa. Eu acho que pessoas que
fazem plástica, fica até bonito, mas a maioria é um horror. Eu prefiro ficar inteira assim
mesmo, deixa as pregas, tudinho.” (Ágata, 66 anos, casada)
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“- O que o envelhecimento trouxe para minha vida... a gente sente a afirmação do corpo.
Antes eu não sabia o que era reumatismo, não sabia o que era pressão. Em 98, eu fiz o teste
lá na Lagoa, dos olhos; mas nesses dias fui no médico e ele me disse que eu tenho que
colocar um remédio, porque já tá começando a aparecer catarata e se não melhorar vai ter
que fazer operação. Aí, que a gente vai vendo as transformações, que vai sentindo na vida,
né?” (Ónix, 75 anos, separado)
O objetivo do trabalho do grupo de encontro de idosos, voltado para a Promoção da
Saúde, é atuar no sentido de romper com a espiral negativa da falência social, que leva, dentre
outras conseqüências, à depressão, devido à incorporação de valores negativos, associados ao
processo de envelhecimento. Deste modo, o grupo auxilia no processo de empoderamento,
através da construção de uma rede social e de sua função de apoio social que também é um
dos pressupostos desta dissertação: grupos - espaços de convivência de idosos, direcionados à
Promoção de Saúde - configuram-se como lugar de pertinência e agência de mudanças para o
empoderamento dos idosos, através de um processo de valorização do envelhecer, apoiado na
construção positiva da velhice.
Labonte (Bernstein et al., 1994) pontua, que o poder é um elemento de relação social.
Portanto, a capacidade de empoderar, que existe em todas as pessoas, é construída num
contexto de teia de relações com os outros. Neste ponto, pode-se retornar à questão do grupo
de encontro de idosos, enquanto um espaço que proporciona a ampliação da rede social, na
medida em que é, no grupo, que as relações humanas formam uma teia.
Sluzki (1997), afirma que os programas voltados para a Promoção da Saúde, como é o
caso do grupo de encontro de idosos do PROVE, contêm, como componente principal, o
desenvolvimento de uma teia de relações sociais e de aprendizagem, necessárias para que o
indivíduo venha a estabelecer relações sociais ativas. As entrevistas demonstram, que uma
das principais motivações pelas quais as pessoas buscam os grupos, é justamente a ampliação
dessa rede social e a busca de apoio social.
Ruiz (1993) aponta que, na última fase da vida, o medo da deterioração física e da morte
pode ser devastador. Ao negar esses medos, a pessoa se arrisca a uma doença emocional.
Enfrentar o medo pode significar, para o idoso, lamentar a perda da mocidade e dos
relacionamentos passados. Contudo, se as habilidades físicas e intelectuais forem fortes, a
produtividade e auto-estima se mantiverem elevadas e os idosos permanecerem cercados de
pessoas queridas - amigos e comunidade - este medo será defrontado e derrotado. E é, através
do enfrentamento da finitude, sob a égide da resignificação da vida, isto é, por aquilo que
ainda pode ser vivido por meio da construção de projetos futuros, que o empoderamento pode
vir a ser deflagrado.
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Cristal fala de suas experiências, através do Prove, onde foi possível experimentar pela
primeira vez, habilidades que até então não haviam sido vivenciadas, por ela, nos seus
sessenta e sete anos de existência:
"- Eu não sei, eu acho que aos pouquinhos eu vou fazendo tudo o que eu tenho vontade. Não
tem nada assim... Eu já tive experiências tão diversas na minha vida; coisas que eu achava
que eu nunca ia fazer. Interessantíssimo, sabe? Eu, por exemplo, sempre tive medo de esporte,
e eu fui fazer escalada depois de adulta. Agora, você vê: eu que tinha medo de jogar bola, de
nadar, fui fazer escalada! Agora você vê, o que é a vida! Outra coisa, também: quando eu ia
pensar em pisar num palco? Nunca! E fui representar uma peça no Hotel Intercontinental,
com um monte de gente (Cristal está se referindo a uma peça do grupo de teatro do PROVE,
que foi apresentar para o pessoal do Congresso da SBGG, no dia aberto ao Encontro de
Idosos. Deveriam ter umas 300 pessoas assistindo); coisas que eu pensei que nunca fosse
fazer. Inclusive, fui sócia do teatro amador. Dizia que nunca ia fazer isso, e fiz. Experiências,
assim, muito diversas, que eu nunca pensei em fazer e faço! “(Cristal, 67 anos, solteira).
Pesquisas demonstram, que para os idosos, a força motriz da busca de contatos está muito
mais ligada a conteúdos emocionais e afetivos, do que a busca de informações,
preponderantemente mais fortes nos jovens (Frederickson e Cartensen apud Baltes &
Silverberg, 1995).
Destaca-se aqui, a fala de Lápis Lazuli, que resume como o grupo atua como apoio e rede
social, conceitos que foram selecionados como categorias de análise (3):
"- Para encontrar um convívio bom, um convívio sadio. É o principal, né? Eu acho que todo
grupo de terceira idade deve procurar isso: procurar um maneira de como viver, cada vez
melhor, e entretenimento; entendeu? Que faz com que a pessoa tenha sempre um astral bom,
uma maneira boa de enxergar a vida, sem ficar sempre reclamando. Porque, a pessoa ficar
resmungando, reclamando; até as outras pessoas não gostam de conviver, não é? A pessoa,
para você ter um bom convívio, você tem que procurar as coisas boas da vida, para você
dialogar, pensar." (Lápis Lazuli, 77 anos, casada).
Os resultados mostram, que o grupo estudado se configura como uma rede social, através
da formação de vínculos interpessoais, onde o apoio social flui através dessa teia de relações,
desempenhando um papel importante para a ampliação da rede social significativa do
indivíduo, na medida em que proporciona o estabelecimento de novas relações sociais, que é
uma das funções da rede.
Na literatura estudada, o pequeno grupo é o locus de mudança; o lugar de construção do
empoderamento, justamente, porque é, somente, na interação com outras pessoas que é
possível ganhar características sadias e essenciais para o empoderamento. Labonte (Bernstein
et al., 1994) reforça isso, na medida em que coloca, que os grupos de suporte pessoal servem
como apoio social, como veículos para o empoderamento nas comunidades.
Uma outra estratégia, para reverter o processo de desempoderamento, é a intervenção de
Reconstrução Social, definida por Kuyper & Bengtson (1973). Ela se dá através da
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valorização das pessoas idosas, pelo aumento de competências, ao mudar perspectivas
negativas associadas à velhice. Isso pode ser obtido no desenvolvimento de atividades, onde o
idoso possa participar de forma a se engajar novamente no meio social. Nesse sentido, pode
ser que esta intervenção seja vista como uma estratégia de empoderamento, na medida em
que: “O envolvimento pessoal dessas pessoas lhes permite se apropriar dessas decisões assim
como ter um senso de controle sobre as mesmas. A medida que as pessoas idosas tomam
parte nesse processo decisório, elas aumentam o seu empoderamento” (Myers, 1993:7).
Ruiz (1993) ressalta, que a habilidade dos seres humanos em aprender, permanece ao
longo da vida. Se uma pessoa pode aprender, ela pode mudar e descobrir novos modos de usar
seu potencial individual. A longevidade dá as pessoas a experiência de se copiar, na forma de
lidar com as crises e dificuldades, ao longo do ciclo da vida; portanto, as pessoas idosas
podem aproveitar as suas experiências vividas e aplicá-las, em uma nova situação.
Isso foi observado na atitude de Ouro, na atividade de teatro, em que ela aplica seus
conhecimentos obtidos no teatro do grupo do PROVE, para outros grupos; ensinando, através
das peças feitas por ela, dicas de bom comportamento:
“- Algumas coisas eu modifico, sim, você pode. Lá, no Rocha Maia (que é outro grupo que a
Ouro frequenta), por exemplo, eu tenho feito varias encenações. Lá, eu fiz para o dia do
natal, fiz para o dia do papai. Eu fiz, ensaiei e eles apresentaram. Eu fiz várias peças, mas
sempre pequenininhas; e nelas todas tem aquele fundo de moral, que abrange qualquer coisa
que eu vi de anormal, de irregular, entendeu? Ou que mexeu, ou que foi indelicado.
Distribuíram lá, uma vez, uns trabalhos. Cada uma ganhou um trabalhinho, porque não
sobrou muito mais presentes. Aí uma falou: "- Ah que porcaria, não quero isso não". Nessa
encenação de Natal, eu falei sobre isso no roteiro entendeu? A pessoa recebia o presente e
falava (na peça feita pela Ouro): "- Olha, sinceramente, isso não vai ter muito uso para
mim, mas eu gostei. Porque, afinal de contas, você acha que eu vou dizer que não gostei do
presente? Não cabe, aqui, dizer uma coisa dessas!”.”(Ouro, 80 anos, viúva)
Palestras de orientação para a saúde, e diferentes atividades educativas/lúdicas, como
inglês, fonoaudiologia, teatro e pintura, são desenvolvidas em grupos de informação-reflexão,
como o PROVE. Esses grupos propiciam a Aprendizagem. E, é na busca de conhecimentos e
de atividades, que muitos idosos buscam os grupos. Observa-se neste trabalho, que a
aprendizagem também é um dos motivos pelo qual os idosos se interessam em participar do
grupo de encontro, como se observa na fala de Pérola (4):
"- Aprendizagem! Eu queria aprender tudo! Qualquer coisa para aprender, eu quero.
Principalmente trabalhos manuais, porque outra coisa assim, é mais difícil; mas trabalhos
assim, que eu possa botar o olho e mexer com as mãos, eu quero aprender. Quero aprender
tudo!" (Pérola, 74 anos, viúva)
Chama atenção, o fato da maioria dos entrevistados participarem de outras atividades do
PROVE, além do grupo de encontro de idosos; o que vem de encontro à busca dessas pessoas
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por conhecimento e aprendizagem. E, como Ruiz (1993) fala: os idosos podem avaliar, eles
mesmos, seus ganhos de força e se tornarem aptos a chegar à velhice com esses ganhos. De
posse desse conhecimento, o idoso pode aprender novos meios de divertimento, lidando
consigo mesmo e com os outros, de modo aceitável, sem dor e frustração.
É importante, novamente, pontuar o empoderamento como um processo que torna as
pessoas capazes de gerirem ou controlarem as suas vidas. Os veículos do empoderamento,
como é o caso do grupo, são um meio pelo qual é possível, às pessoas, aumentarem seus
recursos e habilidades para ganhar poder sobre suas vidas (Wallerstein e Bernstein, 1994).
Desse modo, o desenvolvimento de atividades voltadas para a Promoção da Saúde, geradas
em espaços de convivência de idosos, lhes permite fazer parte do processo decisório,
concernentes aos eventos de suas próprias vidas. Essas atividades têm como objetivo
trabalhar, para que as pessoas mantenham a sua autonomia, através da valorização do
processo de envelhecimento, que permeia todas as atividades. Diamante na sua fala, resume o
empoderamento obtido por meio desta valorização:
“- Eu acho, que com o objetivo do PROVE, só existe o PROVE; de promover o
envelhecimento, de valorizar a terceira idade do ponto de vista de saúde, de atividades, de
movimentação. Eu acho que só existe o Prove porque outros grupos não tem atividades como
é o da... da Tijuca, do Maracanã...” (Diamante, 77 anos).
Alcançar a velhice é um processo seletivo, que só poucos atingem; é um privilégio do qual
devem se orgulhar. Consegui-lo, indica que o indivíduo percorreu um longo caminho, de ricas
experiências, com conteúdos variados: experiências de interação a serem imitadas ou
reproduzidas, em momentos difíceis. Entender o envelhecimento como uma conquista pessoal
que deve ser valorizada, aproveitando a arsenal de experiências de vida, deve ser o motor de
todo grupo que se propõe trabalhar com o processo de envelhecimento; como podemos
constatar nos idosos que participam do PROVE.
Denominar-se de grupo para a terceira idade não assegura o empoderamento de seus
usuários. É preciso que os grupos, cujo objetivo é o desenvolvimento do empoderamento,
tenham como foco o desenvolvimento de uma consciência crítica do processo de
envelhecimento, ao entendê-lo como algo natural, inerente a todo ser vivo e que pode ser
vivido com autonomia. Isso se torna possível, ao se trabalhar baseado na dialética das
capacidades e limites, em que desenvolvimento e envelhecimento são vistos como processos
correlatos, dentro da perspectiva do ciclo de vida ou Life Span, desenvolvida por Baltes
(1987); onde, em todas as etapas de vida, o indivíduo perde algumas dinâmicas e ganha outras
através da experiência de vida.
A percepção do envelhecimento como um processo natural e como uma conquista de vida,
constituem a categoria Integridade; na medida que leva ao sentimento de satisfação com a
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vida expressa na capacidade do indivíduo rever a sua trajetória de vida. Assim, pessoas com
sentimento de Integridade pensam o envelhecimento como uma conquista e não como algo
pejorativo, resumido nas falas de Jade e Água-marinha:
“- Todas as marcas que nós temos, no rosto, no braço; tudo é o processo de vida, é porque
viveu, é o preço que eu pago por isso, e eu acho que esse preço é valido; para mim é válido. É
válido, por que? Porque, se eu não tivesse esse corpo, eu não estaria viva; e estar aqui,
conversando com você, é uma coisa muito gratificante para mim. Posso ter falado coisas
inconvenientes, mas de qualquer forma, eu me senti bem, me senti à vontade. Você pode ser
minha filha, quase minha neta, e, no entanto, me sinto à vontade, me sinto bem!”(Jade, 69
anos, casada)
“- Hoje estou com 75 anos e estou bem... eu não me acho velha, eu aceito a velhice. A
velhice é uma coisa natural da vida. A gente nasceu, viveu e morre... Então, a gente vai
levando." (Água-marinha, 75 anos, viúva)
Na dinâmica do grupo focal, o contentamento e a alegria em viver uma longa vida com
autonomia, indicam, mais uma vez, que o processo de empoderamento foi alcançado, no
grupo de indivíduos estudados.
(Pérola) “- Eu nunca me senti... e olha que eu tenho idade, mas velhice não. Eu sinto assim:
eu tenho 74 anos, mas eu não me sinto velha. Eu me sinto assim, eu acho, com uns 30 anos. O
que eu faço, o que qualquer pessoa de trinta anos faz: acordo cedo, arrumo a casa, vou para
loja, venho almoçar, volto para a loja; de noite, tem qualquer coisa, ainda saio. E eu faço
coisas que pessoas de trinta anos não fazem, se sentem cansadas. Eu, até agora não senti
ainda... Eu me sinto com bastante idade, muita vivência, mas velhice, não. Ah, cabelo
branco? Acho lindo. Essa papadinha aqui? (risos da turma) Se eu não tivesse, eu não era
normal. Então, eu me sinto com bastante idade, com saúde e não me sinto velha.
(Prata) - O pior é se sentir velha. Eu nunca me senti velha. Tenho 78 anos e nunca me senti
velha,... Agora, velha não, sou idosa...
(tumulto...)
(Ouro) - Eu, Citrino e Esmeralda já passamos de 80.
(Cada uma vai falando as idades rindo muito...)
(Topázio) - Você vê como é um grupo otimista!
(Ouro) - O que importa é o humor, gente! No dia que você tá mal, tá com 100; no dia em que
você está ótima, tá com 50!
(grupo focal)
Em contrapartida, as pessoas que percebem o envelhecimento como algo negativo, como a
antecâmara da morte, e não conseguem conviver com a idéia de Finitude, entram com mais
facilidade na espiral da falência social, que as leva a estados de depressão e de desesperança.
Nesse sentido, deve-se pensar o processo de envelhecimento como inserido na temporalidade
do sujeito, ou seja, pensar o tempo do velho, não como passado, mas como presente, que é
fruto do seu passado, com uma intenção de projetos futuros, que ainda estão em aberto (Py,
1996).
Como diz Ruiz (1993), obviamente, o passado de cada um deve ser valorizado, assim
como o seu presente. Mas, o valor colocado no passado deve ser real, para que ele possa
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servir, no presente. Muitos idosos sofrem pelo que passou, ao invés de aceitar o presente e o
breve futuro.
Isso nos remete a outra categoria de análise utilizada, que é a Realização de projetos
pessoais. Como nos fala Seminério (1999), a melhor forma de se combater a estagnação e de
não se paralisar diante da Finitude, que se faz presente, é através da manutenção de projetos
em aberto. Isso fica bem explicitado na narrativa esperançosa de Pérola:
"- Tudo que eu não fiz eu queria fazer! (risos). Queria aprender mais e conhecer muitas coisas,
que não conheci, ainda queria muita coisa, ainda."(Pérola, 66 anos)
Conforme Frankl (1963 apud Neri, 2001:20): “o senso de significado existencial é um
pré-requisito para o bem-estar físico e mental”. Baseia-se no pressuposto de que a vida vale a
pena ser vivida, se configurando como um indicador fundamental de maturidade psicológica
na vida adulta. Maturidade é entendida como momento de culminância biológica, psicológica
e social do ciclo vital, onde o indivíduo exibe estruturas e comportamentos esperados para a
sua idade (Neri, 2001b).
Bernstein et al. (1994) pontua, que, para que se seja possível às pessoas ganharem poder,
se tornarem empoderadas, é necessário que os veículos de empoderamento, como é o caso do
grupo de apoio social, adotem como estratégia, o desenvolvimento da conscientização crítica
da realidade que os cerca, conforme já dito por Freire: “a conscientização é o olhar mais
crítico possível da realidade, que a des-vela para conhecê-la e para conhecer os mitos que
enganam e que ajudam a manter a realidade da estrutura dominante” (1980: 29).
O grupo de encontro de idosos, se constitui, como grupos informativos-reflexivos, através
das palestras de orientação para a saúde, que abordam as questões importantes do
envelhecimento. Desta forma, ele proporciona a conscientização critica necessária ao
processo de empoderamento. Como nos fala Ouro:
“- Eu acho que o que nos prende aqui é o conhecimento científico. Porque os professores que
vem aqui são atualizadíssimos, trazem sempre novidades, derrubam aqueles tabus que a
gente tinha e que vem trazendo, e que tem que ser firmemente combatidos. Então, eu acho que
é isso. O que traz a gente são as palestras... é o que nos prende aqui”(Ouro, 80 anos, viúva).
Dessa forma, pode-se dizer que este grupo de encontro incorpora a temática da Promoção
da Saúde onde se insere o tema da educação em saúde. Labonte (1994) propõe como modelo
para a educação em saúde, o “Modelo de Empoderamento”, que tem como foco facilitar as
escolhas individuais e coletivas, para fornecer aquisição de conhecimentos com clarificação
de valores, auxiliando as pessoas na tomada de decisão. Isso é obtido, no grupo de encontro,
através da reflexão crítica de assuntos ligados ao processo de envelhecimento.
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Esse tema é abordado no grupo focal (9) quando as usuárias ressaltam os novos
ensinamentos e atitudes frente ao processo de envelhecimento, adquiridos a partir do convívio
com o grupo, em contraste com a desinformação daqueles que não freqüentam algum tipo de
grupo:
(Rubi) - É, pra nossa idade, é bom, porque às vezes, a gente fica pensando: será que tá
certo? Porque, às vezes, a gente pensa que tá certo e tá errado; então, a gente encontra com
a turma da terceira idade, todo mundo junto, então... Ontem mesmo, eu tive com um amigo
meu, que tem a minha idade, 73 anos, que me disse: “- Você sabe que tem dias que eu penso
que estou ficando louco?”. – Não, Brás, você não está ficando louco não, é a idade. Se você
participasse da nossa turma da terceira idade, você não ia pensar que você está ficando
louco. Ele é um homem inteligente, advogado, tem dinheiro, mas está com 73 anos. A mulher
morreu e ele fica trancado, só dentro de casa. Então, ele fala pra mim que pensa que tem
horas que ele está ficando esclerosado, que está ficando louco. Esclerosado eu até admito.
Porque fica só socado dentro de casa, não faz nada, fica só lendo. Para ele, agora, só
palestra. Palestra é bom, porque ele pode participar, dar aquilo que ele sabe; porque ele é
advogado e sabe muita coisa que a gente não sabe, ele não fica só socado... Bonito ele, sabe?
Só porque a mulher morreu? Meu marido também morreu! E eu vou morrer com ele? Eu?
(Risos da turma) Quem morreu foi ele, não fui eu! Foi um bom marido, um casamento
maravilhoso... e se fosse eu que morresse? Ele não ia fazer a mesma coisa que eu estou
fazendo? Ele dizia: “- Se você morrer antes do que eu, não vou querer saber de mulher
nenhuma”. Eu nunca enganei ele: “- se você morrer, vou arrumar um namorado logo, logo.”
(Moderador) - “Vocês estão falando da diferença que vocês percebem entre as pessoas
que ficam em casa e as que participam de grupos?”.
(Pérola) - Eu tenho uma coisa muito interessante. Além de ter minhas amigas daqui e de
outros grupos, eu tenho amigas que não saem de casa. Então, eu noto que a cabeça nossa,
aqui, de todas, decora texto... Essa aí, também. E cria, assim mesmo, na hora; vamos fazer
assim e assim se faz. E, eu tenho outras, mais novas... Eu tenho amigas. Eu tive, agora com
uma numa festa lá do colégio; meu Deus ela é mais nova que eu 10 anos. Eu estou com 75, e
ela está com sessenta e poucos, mas a cabeça está tão apertadinha...
(Diamante) - Tá atrofiada!
(Pérola ) - É, eu acho que ela foi fechando o círculo, não busca mais nada. Em meia hora ela
pergunta uma coisa só, cinco, seis vezes; então, a cabeça dela tá atrofiada. Mas, outra coisa,
não é só ela, e eu vejo as pessoas aqui (aponta para as colegas) com a cabeça ótima. Eu não
sei, eu fui fazer um teste lá na UERJ; aí, sentou uma moça, primeiro do que eu e fez lá o
teste; a senhora perguntou umas coisas. Quando ela saiu, no final, a senhora pegou um papel
e disse: “- você vai lá em tal lugar”. Aí, fui eu. Sentei. A senhora fez lá as perguntas, colocou
número e quando foi no final, eu perguntei: “- A senhora não me deu aquele papel?”; “- A
senhora não precisa, acertou tudo!” Então eu estou bem ainda, né?!
(Ouro) - Eu acho muito natural... Se os neurônios não são muito usados, eles vão se
perdendo. É isso mesmo.
(Pérola) - Se a gente fica com um braço o tempo todo assim (faz o movimento de braços
cruzados) depois é difícil para recuperar o movimento; e a cabeça acho que ainda é...
(Diamante) - Mais sensível.
(Pérola) - É. E é a cabeça que domina tudo.
Rubi, na fala a seguir, traz a questão da relação dos idosos com a sua família, que é
abordada no grupo focal:
(Rubi ) - Eu vim mais, porque lá em casa, depois que se tem filhos... Eu tive muitos
filhos.Tenho netos, bisnetos e nossos filhos acham que a gente quando fica com mais idade,
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assim, tem que tomar conta dos netos, dos bisnetos, e eu tô fora disso, de tomar conta de
netos e bisnetos. Porque eu já tomei conta dos meus filhos e eu nunca deixei meus filhos com
ninguém , eu não vou ficar em casa, não. Ficar em casa, pra ficar tomando conta de netos e
bisnetos e os filhos ficam se abanando, por aí? Vou fazer a mesma coisa que eles estão
fazendo; faço a mesma coisa.
(Rubi ) - Eu participo aqui, mas minha família não me incentivou nada. Meus filhos, meus
netos já tenho neto de 35 anos; ninguém me incentivou nada. Participo porque eu quero.
Participo daqui; participo na Barata Ribeiro, no grupo Sol; participo da ginástica, lá na
Tijuca, mas depende muito do meu temperamento. Se depender dos meus netos, eu não
participo de nada.
Essa falta apoio da família para atividades de convívio e do cuidar, fora do âmbito
familiar é um dado que foi observado também no perfil dos entrevistados, citado
anteriormente nos Resultados. Quando questionados se desempenham alguma atividade
sistemática na família, a maioria dos entrevistados responde que não o fazem, por opção.
Pode-se refletir, a partir deste fato, que essa atitude seja uma postura de oposição à antiga
imagem da vovó que só vivia para cuidar dos netos. O que parece, é que os idosos
entrevistados, participantes de grupos de encontro, têm uma outra postura diante da vida,
apresentando o que Farinatti (1997) descreve como autonomia de vontade, isto é, o idoso
mantém o seu poder de decisão sobre aquilo que ele deseja fazer e ser. Porém, resta comparar
esses resultados, acerca deste ponto, com aqueles indivíduos que não participam de grupos de
encontro. Isso pode ser objeto para um desdobramento deste trabalho; porém, nas falas acima
mostradas, pode-se observar, na discussão que os idosos do PROVE percebem das diferenças
entre as pessoas que ficam em casa e as que participam de grupos; parece demonstrar que os
grupos favorecem a manutenção da autonomia.
Uma outra questão, interessante e relevante, que aparece de forma espontânea no grupo
focal, é a questão da institucionalização de idosos. Eles falam, do asilo como espaço de
desempoderamento e de perpetuação da síndrome de falência social, e, portanto, como um
contraponto para o grupo, que seria um espaço de empoderamento:
(Rubi) - Há duas semanas eu fui ali, no asilo, e eu vi pessoas que poderiam estar
participando de alguma coisa, como nós participamos. Mas, não. As mulheres, ainda novas;
às vezes, mais novas que a gente, tão lá no asilo sem fazer nada...Se elas fizessem tudo aquilo
que nós fazemos, participamos aqui, acho que muita gente ia sair do asilo! Porque eu acho
muito triste, muito triste mesmo, tão lá pagando para ficar num asilo. Por que? Porque eu
acho que elas não tiveram incentivos da família, e também não tiveram força de vontade de
participar. Nós temos incentivo da família e a nossa força de vontade; que é uma coisa muito
importante! Se a gente não tiver força de vontade a gente vai cair mesmo, não adianta.
Nesse ponto pode-se refletir sobre a importância da rede e apoio social para os idosos:
(Topázio) – Talvez, essas pessoas do asilo não tiveram a oportunidade de ter umas pessoas
amigas que dedicassem...que a direcionassem...que incentivassem...
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(Jade ) - Na nossa sociedade tem pessoas muito solitárias, ficam muito isoladas, as pessoas
também tem que se ajudar, a procurar...
(Ouro) - Quando as pessoas não estão isoladas, estão relegadas a segundo plano.
(Moderador) - As pessoas do asilo?
(Ouro) – Não, as pessoas idosas. E aqui não. Aqui, nós temos uma outra família (gesto)
(Jade ) - (...) Foi uma porta muito grande que se abriu no meu mundo...
Discutem como deveria ser um asilo, na opinião delas:
(Prata ) - Você não acha que é falta de iniciativa desses asilos, para com as pessoas que
estão lá? Porque nós temos a nossa casa para morar, eles moram lá... A direção do asilo,
deveria promover essas coisas para as pessoas não ficarem assim, tudo com cara de boba...
(Pesquisadora) - Mas o problema não é esse. O problema é: Por que ele foi até lá?
(Diamante) – Não. É falta de gente para tomar conta. Não tem casa para morar, o que
ganha não pode pagar um lugar, e lá não, né!
(Safira) – Olha, eu fui num lugar, mas lá não é assim, um asilo. As pessoas pagam caríssimo.
É um pensionato.
(Moderador) - Todos vocês já foram, alguma vez, num asilo?
(Cristal) - É deprimente!
(Safira) - Eu já fui, uma vez, num asilo, dançar caipira. Num asilo que as pessoas pagam...
Porque, hoje em dia, a verdade é essa: os filhos não querem ficar com os velhos, nem com a
mãe, nem com a tia, nem com ninguém. Acham que incomoda; então, já bota lá. Olha, eu
fiquei impressionada com uma senhora de 92 anos; mas, olha, uma gracinha. Ela dançava;
me abraçou e disse: “- Vem sempre aqui, é muito bom a gente ver gente diferente, vem
sempre aqui, dançar pra gente”. Mas, tem muita gente, assim, entendeu? Bem, ainda, muito
bem, sabe? Mas os filhos não querem aturar. Às vezes, ficam lá visitando, um pouquinho,
aqueles que ainda vão, porque tem uns que nem vai; sabe como é...
(Diamante) - Sabe o que é...Os asilos deveriam promover atividades... Agora, acontece que
eles não querem gastar dinheiro... Porque, promover uma reunião, uma atividade, implica em
investimento. Tem que pagar um professor, uma professora, e provavelmente, eles não
querem fazer isso. Às vezes, também é questão de espaço; às vezes, não tem espaço, porque
um professor de Tai Chi Chuan, uma coisa dessas, era uma coisa que daria um bom
resultado, uma coisa muito benéfica, num asilo. Uma professora de trabalhos manuais, de
música, de canto, de dança, seriam muito benéfico. Agora, provavelmente, os asilos não
querem isso.
Leandro (1993 apud Santana, 1999), estudando programas para aposentados, discute que,
a transição da vida ativa, para a inatividade, provoca uma diminuição do universo social do
indivíduo, levando muitas vezes, ao isolamento social. Segundo esta autora, esta redução é
devida a perdas de papéis, provocadas pelo esvaziamento profissional e funcional. Em seus
resultados, observa que o grupo traz benefícios, na medida em que se configura como o lugar
da promoção da sociabilização, através da troca de experiências entre as pessoas, favorecendo
novos aprendizados. O tema da troca intrageracional e intergeracional também apareceu no
debate do grupo focal.
Troca intrageracional:
“- Conhecer os problemas do grupo, porque, às vezes, a gente acha que o problema é só
nosso e vamos ver que o problema é coletivo, né! E participar com pessoas da mesma faixa
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etária que a da gente, porque eu tenho um monte de amigas da mesma faixa etária que a
minha." (Cristal, 67 anos, solteira)
“- Me interessei porque a gente participa de muita coisa da gente da nossa idade; aí,cada um
mostra as suas idéias. Vocês também colaboram muito com a gente, com as palestras que
vocês fazem” (Topázio, 73 anos, viúva)
"- A expectativa é que... a convivência faz com que a gente adquira mais conhecimentos,
amizade e outras coisas mais, não é?! Porque um garoto de 14, 15 anos, não tem a idéia que
tem uma pessoa já de idade; uma pessoa já vivida; assim da vida. Tenho tantas amizades
boas aqui; que eu tenho conseguido, até hoje... a amizade, a convivência mesmo." (Ónix, 75
anos, separado)
“- Ah, eu espero, amizade, a gente sair, pegar assim, aquela turminha boa, porque tem
pessoas com a cabeça muito vazia ainda. Então, eu gosto muito de tá naquele grupo, que a
pessoa não tem a cabeça vazia, que ainda pense em viver.” (Rubi, 73 anos, viúva)
“- Tem sim. Eu era muito envergonhada, já, assim, em grupo a gente já fala, participa mais.
Eu acho que ajuda muito. O contato que a gente tem com vocês, mais jovens e com os
próprios idosos, ajuda a gente a levar... a viver e receber bem a vida!” (Água-marinha, 75
anos, viúva)
Troca intergeracional:
(Jade) – Mas, você, Mirna, também passa coisas positivas; juventude. Juventude também faz
parte da terceira idade. Acho muito importante. Não é só ter o grupo da terceira idade. Tem
que ter gente jovem para renovar...
(Diamante) - O contato com a juventude nos faz muito bem, e é necessário. Eu tenho filhos e
tenho netos, mas eu só tenho uma neta de 19 anos. Ela é muito carinhosa, gosta de dançar e
me faz dançar...(risos). A gente se diverte. Ela faz a festa e eu a orquestra da festa. A gente
brinca mesmo. Eu me sinto jovem, igual a ela; só que não tenho a resistência dela...
Leandro (1993) observa, também, em seu estudo, que o grupo pode ser o lugar de
reconforto emocional, satisfazendo as carências afetivas, através do estabelecimento da autoestima positiva pela redução do isolamento social (apud Santana, 1999:35).
Outro fator, observado durante a análise do material coletado, é que o grupo serve como
prevenção de patologias sociais associadas à velhice. Essas patologias sociais são
relacionadas por Lessa (1998), como sendo a aposentadoria e a viuvez. Esta autora afirma que
aposentadoria e viuvez são fatores de risco para idosos. A viuvez é um fator de risco mais
significante para a morbidade entre os viúvos no primeiro ano da morte do cônjuge. E a
aposentadoria pode levar à completa inatividade e a perda dos vínculos sociais tornando-os
mais expostos às doenças associadas a inatividade física.
Processos sociais que geram situações estressoras, passíveis de provocar enfermidades
como a depressão, são mencionados pelos idosos investigados durante o grupo focal, e
segundo se pode apreender das falas a seguir, estas situações estressoras estão sendo
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minimizadas ou mesmo debeladas pela rede social e as inter-relações estabelecidas entre seus
usuários.
(Cristal) - Eu não senti, assim, grandes transformações, não. Acontece que até 96, eu
trabalhei. Então, eu tinha muita atividade. Em 96, eu me aposentei. Então, eu vim pra cá; foi
quando eu vim pro grupo. Eu apenas dei continuidade às minhas atividades... Lá, eu tinha
atividades de lá; de repente, me aposentei e fiquei sem fazer nada; então, eu vim para cá.
(Diamante) - A aposentadoria, às vezes deprime muito a pessoa, quando a pessoa não sabe
enfrentar, não tem apoio. Às vezes, a pessoa entra em depressão, porque fica em casa, não
sabe o que fazer. É um período que a pessoa devia ser preparada...
(Rubi) - Mas eu acho que dói mais no homem do que na mulher, porque a mulher se aposenta
e, em casa, ela sempre tem mais afazeres. O homem, não. Só depende do trabalho pra casa.
Então, quando se aposenta, entra em depressão..
(Esmeralda) - Não me fale em depressão, não quero saber de depressão...
(Ouro) - Estando aqui, no Prove, é difícil ter depressão.
(Diamante) É, aqui, a gente não tem depressão, não.
(Risos do grupo- grupo focal)
Segundo Lessa (1998), o benefício do suporte social é ainda mais eficaz na presença de
fatores estressores severos, como os que podemos encontrar naqueles indivíduos isolados
socialmente.
Dessa forma, concorda-se com Santana (1999:35), quando diz: “nesse sentido o grupo
pode ser um instrumento que transforma e é transformado, numa dinâmica permanente pela
individualidade grupal”.
Hartford, estudioso dos efeitos dos grupos no campo das ciências sociais, observa que “os
grupos são um meio eficaz para a sociabilização do indivíduo, para induzi-lo a novas
experiências, para fixá-lo no sistema social, para educá-lo, e para mudar sua personalidade,
auto-imagem, atitudes e comportamentos.” (1983:75). Esta autora chama a atenção para os
efeitos negativos que o grupo também pode proporcionar, já que “os grupos não são
benéficos para todas as coisas; e podem não só ser inúteis, mas também prejudiciais”
(1983:92). Este ponto é importante, porque, à medida que o envelhecimento passa a ser um
bom negócio, muitos grupos são criados por profissionais sem compromisso ético, onde os
idosos são tratados como crianças, reforçando os estereótipos negativos associados ao
envelhecimento.
Nas falas das usuárias, nas entrevistas e no grupo focal, aparece essa questão, quando
apontam para a diferença do grupo de encontro do Prove, onde são privilegiadas a autonomia,
a liberdade de expressão e as informações em saúde, em relação aos outros grupos
vivenciados por elas:
"- Ah, sim. A gente tendo uma direção, assim como o PROVE tem uma direção, né! Tem
várias coisas que orientam; uma orientação, isso que leva a gente, assim, a participar e cada
vez mais buscando coisas, informações. Porque eu gosto do PROVE. Porque, aqui, é muito
diferente de qualquer grupo. Eu já tive em vários outros grupos, até por curiosidade mesmo,
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participando de festas e tudo. Mas eu acho aqui, assim, um trabalho muito bom, mais
voltado... assim, não sei se poderia dizer, científico, sabe? É um negócio, assim, mais
dirigido, muito informativo. E isso é muito bom.” (Ágata, 66 anos, casada)
No grupo focal, esse tema também é debatido:
(Topázio) - Vocês também nos consultam, não é? A gente dá opiniões, Somos convidados
para nos expressar, não é? Somo sempre solicitadas para participar das coisas. Então, temos
espaço...
(Rubi) - Desses lugares que eu participo, o melhor é aqui que dá oportunidade de participar
de muitas coisas. A gente vai participando e vai sentindo que aqui é bom pra gente, mesmo.
Porque pessoas falam... não sabem o que tão perdendo ( risos).
(Jade) – Aqui, o espaço físico é sempre questionado, não é? Mas nós temos conseguido,
desde que começou, não é?
(Moderador) - Esse espaço físico vocês foram conseguindo com a participação de vocês...
(Jade) - Não é? Então, é tudo positivo... Essa é a minha opinião.
(Rubi) - Na semana passada eu falei com a minha filha de 54 anos, que tudo ela esquece:
Você tem que entrar para o PROVE! ( risos).
(...)
(Esmeralda ) - Ouro, o que você acha daquela reunião do posto de saúde da terceira idade?
(Ouro) - Eu acho muito bom, é um trabalho mais social, muito pouca palestra; não tem quase
palestra.. É diferente: a assistente social trata de uma por uma, e todo mudo fica sabendo do
problema de uma, então, o problema dela serve como experiência, mas falta um
planejamento total.
(Moderador) - Vamos retomar a questão. Vocês estão falando da diferença entre os
grupos, mas o que estou colocando é: O que, em vocês, mudou, a partir da participação
no grupo?
(Ouro) - Claro, claro, até de separar o joio do trigo; saber escolher, saber ver o que é bom, o
que é mais ou menos, o que é ruim...
(...)
(Rubi ) - Outra coisa, o PROVE, aqui, foi a primeira porta que se abriu para a terceira idade.
Eu, depois que entrei aqui para o PROVE, é que passei a participar de outros lugares; mas, a
primeira porta que abriu para gente da terceira idade foi aqui. Aqui, a gente se sente muito
bem. Então, aqui eu me sinto maravilhosamente bem...
(Diamante) - Eu acho que com o objetivo do Prove só existe o Prove: de promover o
envelhecimento, de valorizar a terceira idade do ponto de vista de saúde, de atividades, de
movimentação, eu acho que só existe o PROVE...
(Rubi) - O Grupo Esperança também valoriza essa questão de saúde, eles também se
interessam, mas eu acho que não é tanto quanto o PROVE.
(Pérola ) - Aqui tem mais conteúdo, não é?!
(Safira) - Para você ver, eu era do Sesc Copacabana, vim aqui e gostei mais e fiquei mais
aqui.
Neste ponto, pode-se fazer uma relação com o dado encontrado no perfil dos
entrevistados, que mostra que a maioria dos entrevistados teve o Prove como o primeiro grupo
voltado para as questões do envelhecimento, ou da terceira idade. E, a partir dele, foram
buscar outros grupos; o que pressupõe que tenha sido uma experiência positiva,
impulsionado-os para a procura de novos espaços propícios a ampliação da rede social e das
inter-relações. É interessante notar a relevância que os idosos dão as informações/palestras
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sobre o processo de envelhecimento, e como sua ausência, em programas voltados à terceira
idade influencia negativamente na avaliação de seus usuários:
(Pérola ) - Eu não sabia que existia quando eu vim pela primeira vez aqui...
(Diamante) - É, eu também não sabia que havia esses grupos assim...Agora, uma coisa que
eu acho com o PROVE, o pessoal mesmo interessado que continua, os outros...(gesto de
dispersão)
(Ouro) - Eu acho que aqui é a sede. A gente aproveita um bocadinho dali, que é bom; outro
bocadinho dali, que é bom; mas a gente fica mesmo, é aqui. Porque lá tem algo de bom,
também, porque senão a gente não teria ido lá. A gente aproveita um bocadinho daqui e dali
e traz para aqui e fica aqui. Aqui é a casa da gente.
(Rubi) - O grupo do Sol, da Barata Ribeiro, também é muito bom, mas não tem...
(Safira) - Lá, é só passeios.
Outro dado obtido na primeira análise das entrevistas, já exposto nos Resultados, é que as
pessoas já participavam do Prove há pelo menos três anos, o que pressupõe um engajamento
no projeto. Isto pode ser relacionado com a função de pertencimento, gerada pelo grupo.
Descrito por Zimermam (1997), o pertencimento decorre do funcionamento do grupo como
continente, onde as pessoas se reconhecem, sendo reconhecidas pelos outros. No grupo focal,
este tema é ilustrado através das falas:
(Topázio) - A mim me motivou... A gente está numa de igual para igual. Às vezes, os jovens
não tem tempo para vir conversar, nem a gente se entende também; então, aqui a gente se
entende, tudo a mesma faixa etária. Eu gosto muito. Bom, faz muito bem para a cabeça e o
para o espírito também, e o conhecimento que a gente vai acumulando, não é? É isso aí. Eu
também gostava muito do bingo, tinha aquela festinha do aniversariante do mês...
(Ouro) - Todo mundo gosta!
Isso vem de encontro à recomendação da Gerontologia, no contexto atual, que é fazer uma
aproximação maior, para reintegrar as pessoas mais velhas na sociedade. O que está sendo
necessário é uma mudança de atitude das pessoas mais velhas em relação a si próprias, muitas
das quais se retiraram muito cedo do mercado de trabalho com uma aposentadoria precoce,
voluntária ou não. (Gee & Guttman, 1995 apud Cusack, 1999)
Acima, viu-se que os grupos, através da informação-reflexão, e de uma conscientização
crítica acerca do processo de envelhecimento, fornecem o apoio para que as pessoas idosas
possam perceber o envelhecimento como uma etapa de vida, onde a Autonomia pode ser
mantida. Autonomia e suas subcategorias, são selecionadas para o estudo do empoderamento
proporcionado por grupos de encontro, porque, para se pensar no desenvolvimento da
autonomia na velhice, é preciso pensar numa rede de relações sociais que favoreçam o
desenvolvimento de laços afetivos. O grupo se configura como uma rede, capaz de fornecer
apoio e proporcionar autonomia. Como pode ser observado nas falas do grupo focal (6):
(autonomia de ação) "- Olha... eu só vou me considerar velha, no dia em que quiser
atravessar uma rua correndo e não conseguir; mas enquanto eu puder andar depressa, dar
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uma corrida, eu não me considero velha.”(Água-marinha, 75 anos, viúva)
(Autonomia de vontade e auto-determinação) "Claro que dependem de mim. Se eu não fizer
por onde; parada não se faz nada, eu tenho que me movimentar, não posso ficar parada. Se a
gente ficar parada não sai nada, a gente tem que ficar sempre mudando de coisa. Eu tô
sempre procurando alguma coisa para fazer. As vezes eu tô de tarde: não tem nada pra eu
fazer, o que eu vou fazer?... Eu não me aperto, só quando eu não quero sair mesmo, mas
quando eu tô, passo o dia inteirinho na rua. Menina pra que isso? Não, não vou ter nada na
rua não, pelo amor de Deus, não me fala em ter nada não.."(Esmeralda, 84 anos, solteira)
No grupo focal:
(Diamante) - A liberdade que a gente tem na terceira idade, é maravilhosa. É a melhor
idade.. É, eu acho...
(Jade) - Sempre que a gente se defenda por conta própria. A gente tem que conservar a nossa
atividade, o nosso dinamismo, a nossa autonomia. Aí, é importante.
O grupo pode, então, servir como espaço de Promoção da Saúde e manutenção da
autonomia, através de cuidados específicos com a saúde, como descrito abaixo:
(Cristal) - Uma outra coisa que eu acho importante, que a Dra, L. P. faz, é encaminhar as
pessoas para os médicos quando elas necessitam. Isso não foi dito em momento nenhum, por
isso estou falando. Algumas pessoas, tem plano de saúde, mas outros não tem, e está muito
difícil o acesso aos hospitais e aos médicos. Você vê, quando ela encaminhou lá para o
Hospital de Lagoa, por problema de visão, quantas fizeram operação de catarata? Ela fez,
ela fez, e com uma pessoa gabaritada, o Dr. M., muito competente, não é? Outras precisaram
ir lá na cidade, fazer outros exames preventivos. Então, esse cuidado que a Dra. L. P. tem
sabe... Eu, por exemplo, tinha aquele problema de artrose; eu até melhorei, não sei porque,
andei caminhando e tudo. Eu fui lá, no Fundão, o médico me atendeu muito bem, olhou
minha radiografia, olhou meu joelho... Então, é esse cuidado com a saúde, que eu acho,
assim, muito importante. Quantas de nós não se beneficiaram por causa disso?
(Safira ) - Eu tenho plano de saúde mas fiz todos meu exames aqui. Fiz com o neurologista,
fiz com a Dra. E., do problema do coração. Fiz lá, ali atrás da psiquiatria; eu fui muito bem
atendida.
(Moderador) - Vocês estão falando do cuidado com a saúde?
(Jade) – É. Não são só as palestras, é também essa parte física. Eu acho muito importante.
Porque, alguns tem planos de saúde, mas, quantos não tem plano de saúde, não tem
condição, pelo preço em que estão? Eles estão caríssimos... mas nós temos essa
possibilidade, entendeu?
A partir da proposta da Promoção da Saúde, as pessoas que participam dos grupos, se
preocupam mais com o cuidado com a sua saúde. Cuidado, que é outra categoria de análise,
selecionada para ilustrar o material coletado, resumido na fala de Rubi (7):
“- Eu sou uma mulher que não sinto nada. Não sinto dor nos dentes, não sinto dor de
cabeça, não sinto dor nos ossos. A única coisa que eu tenho, é que sou hipertensa, mas isso
estou cuidando; cuido mesmo. Tenho um médico maravilhoso; então, quando me aborreço,
sinto que me aborreci por algum motivo, corro para o doutor tiro minha pressão. Eu
controlo muito, porque minha família toda morre por problema de enfarto, coração; então,
eu sabendo disso, procuro controlar minha pressão. Eu tomo remédio de manhã e na hora
que eu vou dormir, tomo meu remédio direitinho.” (Rubi, 73 anos, viúva).
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“- Quando chego em casa, tomo meu banho e passo aquele creme cheiroso no corpo, porque
a pele já está enrugando e a gente tem que cuidar. Tenho um creme para passar durante o
dia, um creme para passar durante a noite. Puxa, vocês novas, ainda tem alguma coisa pra
apresentar que é a juventude. Eu não tenho juventude, então a gente, que não tem mais a
juventude, tem que se cuidar.” (Rubi, 73 anos, viúva)
Neste ponto, relaciona-se novamente dados já divulgados nos Resultados, sobre as
atividades desenvolvidas fora dos grupos. Observa-se que a maioria dos entrevistados fazem
atividades físicas. Alguns, dentro dos grupos voltados para o envelhecimento; outros, em
academias ou em caminhadas pelas praias. Esse dado leva a refletir que as atividades em
grupo, voltadas para a Promoção da Saúde, estimulam o cuidado com a saúde.
Ao longo da literatura estudada, o foco para se trabalhar com Promoção da Saúde, no
campo do envelhecimento, deve ser sempre dirigido para o desenvolvimento de serviços, de
forma a tornar as pessoas idosas capazes, para ficarem em suas próprias comunidades,
controlar suas próprias vidas, e continuarem a serem produtivas (Gee & Gutman, 1995 apud
Cusack, 1999). Ellen Gu, gerontóloga social, recomenda uma política que objetive a
reintegração das pessoas idosas na sociedade, reforçando que se fará melhor se “enfocarmos
uma política de rede social para a população mais velha e se enfocarmos nossa atenção para
temas de empoderamento (...)”.
Esta discussão é o gancho para se integrar e discutir empoderamento e Promoção da
Saúde. Entendendo-se por Promoção da Saúde: “o processo de capacitação de pessoas para
aumentar seu controle e melhorar a sua saúde”; neste sentido, compartilha valores com o
empoderamento definido como “o processo pelo qual pessoas, organizações e comunidades
ganham domínio sobre suas vidas.” (Labonte, 1994: 253). Desse modo, estes termos devem
ser vistos como lentes conceituais para avaliar as práticas de saúde.
Nas falas, obtidas na análise das entrevistas e do grupo focal, observam-se as
transformações que as pessoas percebem, a partir de sua participação no grupo de encontro de
idosos do PROVE. Resumindo as categorias de análise aqui efetuadas, pode-se afirmar que o
grupo proporciona, através da ampliação da rede social e do apoio social um controle mais
efetivo sobre as vidas das pessoas que dele participam.
O processo de empoderamento pode ser expresso na autonomia positiva, no cuidado que
os idosos têm com a saúde, e no sentimento de integridade refletindo assim um
envelhecimento com maturidade.
Para finalizar, ilustram-se, a seguir, as transformações provocadas pelo grupo, com as
falas espontâneas dos entrevistados, obtidas no debate do grupo focal:
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(Jade) – O que faz com que permaneçam? É justamente o que as colegas falaram: essa união,
o que nos acrescenta são coisas muito positivas; embora, balançou, como a Ouro disse, com
a greve, não é? Mas, no fundo, no fundo, nós sempre continuamos unidas. Por que? Porque é
interessante pra gente, o quanto acrescentou de bom pra gente: conhecimentos de coisas que
a gente não sabia, o que a Topázio falou de terem pessoas para conversar, de igual para
igual e nos gratificamos com as pessoas, entendeu? Porque, dentro de casa, é sempre aquela
rotina. Eu acho muito importante esse convívio para pessoas da nossa faixa de idade; e
sempre fazendo uma força para que isto não vá acabar, não é?
(Jade ) - Na minha pessoa? Ah, mudou. Muito bom... Me sinto muito bem. Acho que tudo isso
faz parte, o convívio das pessoas... O negócio da gente quando vai ficando velha, é que...
convivendo com pessoas da mesmo idade eu não sinto a pessoa que eu sou: Jade, de sessenta
e nove anos. Eu me sinto, como você, assim como estou falando (expressão), então, isso me
faz bem. Eu vejo o quanto vocês estão lúcidas, o quanto vocês ainda estão contribuindo para
o aprendizado, porque é um aprendizado, uma reunião dessas com você, o contato com
vocês, que também passam muitas coisas boas para gente. E eu agradeço por estar viva e
poder participar de tudo isso.
(Ouro) - Eu acho que é isso. Não é só uma coisa. Foi o que ela falou, o que eu falei, foi a
reunião de tudo isso, uma vai lembrando uma coisa, a outra vai lembrando outra...Quer
dizer: é a vivência, é a vivência de tudo, que dá orientação para a nossa vida; quer dizer,
orienta até a maneira da gente pensar, de agir com o colega; tem colegas mais sensíveis tem
outros.
(Diamante ) - Eu achei que, a partir dessa participação, eu me sinto mais feliz como idosa.
Eu nunca fui complexada, não. Mas, atualmente, eu me sinto privilegiada por ter chegado a
essa idade! (expressão) E peço a Deus me conserve com saúde, com essa disposição, com
essa alegria de viver, de valorizar as coisas boas, de não me preocupar muito com as coisas
ruins...
(Jade) - É um prêmio, chegar a essa nossa idade, é um prêmio. A gente está lúcida e dá conta
da gente...
(Topázio) - Eu acho, que para mim, tudo isso tem sido muito importante, porque a gente tem
a oportunidade de analisar um pouco o total do ser humano. Cada pessoa tem uma cabeça
tem uma expressão, tem uma maneira de pensar; e isso, é que faz a gente entender os outros
melhor, também.
(Ouro) - Ser mais tolerante, ser mais compreensivo...
(Topázio) - É... Porque se você se fecha, aí, nada. Você fica assim (gesto), obtusa; mas,
assim, não! A gente convivendo com os demais, cada um fala uma coisa; umas pessoas tem
mais cultura; outras, menos, mas procura tirar o melhor...
(Ouro) - A gente vai ensinando e vai aprendendo.
(Prata) - Para mim, mudou. Quando eu entrei aqui, foi uma transformação, por causa do
teatro. Isso, para mim, melhorou bastante em tudo, sabe? Eu sempre fui muito de sair, de
viajar, de não parar em casa. Hoje, por causa do compromisso aqui, eu sempre vou e volto,
porque eu tenho um compromisso aqui, as segundas-feiras. Eu faço o que eu gosto, decoro
tudo. Graças a Deus, tenho uma memória boa... O F. dá aquele papelzinho, que é chato,
então, eu vou mais pela minha cabeça que é a mais nova de todas...( risos).
(Safira) - Para mim, foi muito bom. Eu aprendi muito, assim, negócio de política com as
palestras. Então, para mim foi muito bom ter essa parte, a parte de médicos. No início, nós
tínhamos muitas atividades e podíamos participar de todas, porque não tinha tanta gente;
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mas para mim foi ótimo. Não tenho o que dizer; para mim foi muito bom. Eu fiquei assim,
assim, essas amizades que a gente tem com as colegas, faz muita falta, né? Eu achei ótimo.
E nas entrevistas:
"- Ah, valeu, valeu muito, a participação, porque é tal coisa: você não fica parada, tem idéias
novas, tem sempre palestras para dar as coisas... Então, tudo isso ajuda e a gente vai se
atualizando mais um pouco da realidade da vida. Então, eu acho que isso ajuda. Ali, no
Rocha Maia, também tem palestras... Então, tudo isso ajuda; cada um descobre as suas
coisas...então tudo isso é bom para gente. Não deixa você ficar parada, sem fazer nada, nem
de participar das coisas. Eu gosto, por causa disso, e enquanto tiver, eu venho”.(Topázio, 73
anos, viúva).
"- Eu não tinha uma coisa, assim, para mim... tipo um lazer. Então, eu vim mais por isso.
Porque tinha encontros, palestras, também tinha trabalho, que vinha pessoas também dar
aulas, palestras... aprendizagem também”. (Pérola, 74 anos, viúva)
"'É muito bom. A expectativa é a seguinte: você vai discernir quais são as amizades que você
deve continuar, quais você deve conservar, com cuidado; e até as que você tem que
abandonar. É mesmo. No PROVE, já teve umas que eu tive que abandonar, porque entravam
na minha casa as 7:30 da manhã e só saiam às 10:00 da noite. Já não conseguia mais, né?!”
(Ouro, 80 anos, viúva)
Inferiu-se, portanto, a partir da análise feita, que o grupo de encontro de idosos do
PROVE, se ajusta aos critérios apontados na literatura especializada, para caracterizar os
grupos como espaços promotores do empoderamento expressos em autonomia positiva;
podendo, portanto, ser referido como tal. No entanto, ele apresenta fatores que o faz singular,
como um grupo que se configura como espaço para a promoção do empoderamento, através
da interrupção da espiral negativa do desempoderamento. A partir da aprendizagem, do apoio
social e da rede social; evocando o cuidado, expresso em autonomia; proporcionando a
realização de projetos pessoais, a partir do sentimento de integridade; é possível favorecer o
empoderamento das pessoas avançadas no tempo.
5.4- Considerações sobre a implicação da pesquisadora
É preciso, para finalizar, que sejam colocadas algumas inquietações que ocorreram,
durante a trajetória da elaboração deste projeto.
Cabe, aqui, uma ressalva, quanto à neutralidade da pesquisadora. Durante a elaboração
deste trabalho, foi questionado se, enquanto pesquisadora, a mesma não estaria contaminada
pelo olhar que teve sobre o grupo, já que participou na sua constituição.
Refletindo sobre o fato, acredita-se que isto só poderá auxiliar; visto que, o que se
pretende é problematizar questões referentes aos grupos que trouxeram - e trazem perplexidade. Pretende-se investigar, sim: se o grupo, realmente, traz algum benefício a essas
pessoas; o que as liga a ele com um grau de adesão tão elevado; o que as leva a querer
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participar; o que as leva a querer ficar no grupo durante tanto tempo. Essas questões foram
surgindo, enquanto a pesquisadora ainda trabalhava no PROVE e permanecem, ainda,
inquietantes.
Estando ausente deste trabalho, há mais de dois anos, enquanto técnica, essas questões a
fizeram permanecer na busca do estudo do envelhecimento, ligado ao campo da saúde;
encontrando, na área da Saúde Pública e, principalmente, no campo da Promoção da Saúde,
alguns dados para tentar clarear o que vem questionando há algum tempo, como por exemplo:
como promover saúde, no campo do envelhecimento? Por que o sucesso desses grupos de
idosos? Qual é o espaço dado aos idosos para que eles possam ter maior autonomia e poder de
decisão?
No Mestrado, pôde encontrar, no tema do empoderamento, no conceito de saúde positiva
e de autonomia positiva, uma luz teórica para pensar a prática que experenciou neste Projeto
com idosos. Por isso, tem bem claro, que é preciso ter um olhar crítico para as atividades
realizadas, pois, o que se pretende, nessa re-visita, é problematizar, a partir de referenciais
teóricos e de uma condução metodológica - que possibilitem iluminar essas questões que
estão longe se serem simples; pois, o ser humano é um ser complexo pela sua própria natureza
e condição de ser vivente.
Notas:
(1) Todas as falas, selecionadas nas entrevistas e grupo focal, geradas no Relatório do
Programa LOGOS, que ilustram a categoria de análise Apoio Social, se encontram, na
íntegra, no Anexo VII;
(2) Todas as falas, selecionadas nas entrevistas e grupo focal, geradas no Relatório do
Programa LOGOS, que ilustram a categoria de análise Rede Social, se encontram, na
íntegra, no Anexo VII;
(3) Todas as falas, selecionadas nas entrevistas e grupo focal, geradas no Relatório do
Programa Logos, que ilustram a categoria de análise Autonomia, se encontram, na íntegra,
no Anexo VII;
(4) Todas as falas, selecionadas nas entrevistas e grupo focal, geradas no Relatório do
Programa LOGOS, que ilustram a categoria de análise Integridade, se encontram, na
íntegra, no Anexo VII;
(5) Todas as falas, selecionadas nas entrevistas e grupo focal, geradas no Relatório do
Programa LOGOS, que ilustram a categoria de análise Cuidado, se encontram, na íntegra,
no Anexo VII;
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(6) Todas as falas, selecionadas nas entrevistas e grupo focal, geradas no Relatório do
Programa LOGOS, que ilustram a categoria de análise Aprendizagem, se encontram, na
íntegra, no Anexo VII;
(7) Todas as falas, selecionadas nas entrevistas e grupo focal, geradas no Relatório do
Programa LOGOS, que ilustram a categoria de análise Realização de projetos pessoais, se
encontram, na íntegra, no Anexo VII;
(8) Cabe salientar, que os conceitos e seus autores, já referendados anteriormente no
referencial teórico, não mais serão definidos na íntegra. Far-se-á, apenas, menção dos
mesmos, quando houver necessidade. Em relação às falas, serão repetidas, somente,
quando for indispensável enfatizar a sua relação com o referencial teórico.
(9) A transcrição do Grupo Focal se encontra, na íntegra, no Anexo VIII.
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Conclusão
“Eu não sinto a idade, são os outros que a sentem em mim”
Sartre
Este estudo tem como proposta investigar os espaços direcionados para o envelhecimento,
já que, atualmente, existe uma proliferação de grupos, voltados para a “terceira idade”. O
objetivo deste estudo é estudar o envelhecimento, dentro da perspectiva da Promoção da
Saúde.
O envelhecimento se constitui como um grande paradoxo humano, já que ninguém quer
ficar velho, muito menos, morrer. Entretanto, se não morremos, envelhecemos. Assim, o
envelhecimento deve ser visto como uma conquista. Mas, as pessoas não querem envelhecer
nem ficar dependendo dos outros para tomar decisões e desempenhar atividades cotidianas.
Ao longo deste estudo, pode-se observar que os grupos voltados para a Promoção da
Saúde, tem como objetivo, exatamente, o envelhecimento saudável, com qualidade de vida.
A pesquisa qualitativa em saúde torna-se crucial para a investigação das ações propostas
neste trabalho, que é de analisar o processo de empoderamento construído através da
dinâmica de grupo. As entrevistas e o grupo focal, são fundamentais para o esclarecimento do
objeto em questão.
Os pressupostos teóricos evidenciam ser pertinentes ao longo da literatura estudada.
O referencial teórico levantado sobre a teoria de grupo sobre a temática do
empoderamento, tendo como pano de fundo a Promoção da Saúde e o campo da
Gerontologia, é fundamental para esclarecer o objeto de estudo proposto e para compreender
as falas coletadas.
As falas dos idosos comprovam que é possível envelhecer com autonomia, entendida aqui
como a manutenção do desejo de viver e ser de acordo com o momento de vida. Nas falas
pode-se constatar que o envelhecimento, apesar de desencadear o processo de
desempoderamento, pode também ser um momento de construção de conhecimentos e de
experiências novas de vida.
O grupo, através da possibilidade de ampliação da rede social, e funcionando como apoio
social, configura-se como lugar pertinente para a resignificação dos valores negativos
associados ao processo de envelhecimento, vencendo esteriótipos associados à velhice.
A idéia, defendida ao longo do trabalho, é que se possa investir em grupos, como
estratégias para Promoção da Saúde, através do favorecimento do empoderamento. Durante a
investigação, ficou bem claro, que não é qualquer tipo de grupo que favorece esse processo. É
preciso que o grupo se configure como espaço de reflexão e manutenção da autonomia
positiva, no sentido da manutenção das escolhas, trabalhando com competências e não com
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perdas. É necessário fazer uma ressalva, no sentido de apontar a existência de muitos grupos,
que trabalham com envelhecimento e que têm como proposta a imposição de um modelo
positivo de velhice. Nesses grupos, o que se observa, é um culto à velhice, através do
imperativo da atividade, onde, muitas vezes, os idosos são desrespeitados no seu poder de
decisão.
Resgata-se, aqui, a crítica feita à Promoção da Saúde em Instituições Públicas, que diz que
ela objetiva passar a responsabilidade para o indivíduo, se isentando do cuidado com a saúde
da população. Promoção da Saúde não é tirar a responsabilidade do governo e transferir para a
comunidade, mas proporcionar meios para que a comunidade se torne empoderada.
Inclusive, esta é a crítica feita, por muitos autores, ao processo de empoderamento e à
Promoção da Saúde; onde os indivíduos devem se responsabilizar sobre sua saúde, isentando
assim, a responsabilidade do Estado frente aos problemas da população.
Para reverter este perigo e esta crítica, deve-se utilizar o empoderamento como ato de
ganhar ou assumir poder (Labonte, 1994:256). O empoderamento, usado desta maneira, é
reflexivo e deve servir como um guia.
Neste sentido, o empoderamento e a Promoção da Saúde são lentes conceituais, que
objetivam proporcionar os meios, para que as pessoas consigam uma maior resolutividade e
controle sobre o que afeta a sua saúde, não retirando a responsabilidade do Estado, no cuidado
da saúde de sua população.
Deste modo, o empoderamento de cidadãos idosos, individual e coletivamente, se torna
uma prioridade fundamental. Os grupos visam aproveitar esta fonte de recursos, que é o
crescimento da população idosa, para oferecer treinamento e suporte. É, exatamente, isso que
o grupo do Prove faz, através da sua proposta de valorização do envelhecer.
Assim, o grupo de encontro de idosos do PROVE se configura como espaço de construção
do empoderamento, na medida em que evoca o cuidado com a saúde; se configura como
espaço de pertencimento, de referência, portanto, de apoio emocional, permitindo
potencializar talentos através das trocas de experiências, inter e intrageracional, onde “o
jovem tem a ação e o velho a reflexão”. Isso é possível, através da autenticidade nas relações
sociais, suscitadas pelo diálogo interativo e pela conscientização crítica dos valores
associados ao envelhecimento. Desta forma, permite aos idosos a renovação dos espaços de
convivência social, o que remete ao resgate do sentido da vida, onde, finalmente, a velhice
pode ser vivida com maturidade.
Nesse ponto, pode-se refletir sobre a situação dos idosos, que tem a rede social reduzida,
devido aos processos associados ao envelhecimento, tendo com isso a necessidade de
estabelecer novos vínculos sociais. Vê-se, que para se pensar no desenvolvimento de uma
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autonomia na velhice, é necessário, também, se pensar em uma rede de relações sociais, que
favoreça o desenvolvimento de laços afetivos. Assim, o engajamento dos idosos em grupos,
que promovem a saúde, faz com que haja uma ampliação de sua rede social e, portanto, se
constitui como uma estratégia de Promoção da Saúde.
As falas, geradas no debate e nas entrevistas, evidenciam que as pessoas vivenciam o
envelhecimento com maturidade, mostrando sua capacidade de buscarem aquilo que
necessitam, superando o esteriótipo da incompetência. Isto gera um bem-estar psicológico,
expresso pela autonomia positiva e integridade, favorecendo o que se chama de
empoderamento, que é a capacidade do indivíduo controlar os eventos e situações da sua vida.
Isto demonstra, que estar inserido em grupos, que trabalham nesta perspectiva de olhar
crítico sobre a realidade, permite ao idoso refletir sobre os mitos negativos da velhice, e a
partir disso, poder criar possibilidades de estar no mundo de forma mais prazerosa, sempre em
busca de novas realizações, com projetos sempre em aberto.
Investigar o grupo de encontro do Prove, onde se insere o tema do empoderamento,
permite problematizar a possibilidade de abordagem e soluções de questões da Promoção da
Saúde no campo do envelhecimento, através da estratégia de construção de novos espaços
para a promoção da autonomia das pessoas avançadas no tempo.
O grupo de encontro de idosos, constitui-se como grupo de apoio social, uma vez que se
adequa aos critérios apontados na literatura especializada.
Desta forma, constata-se, ao longo desta dissertação, que a vivência grupal, direcionada à
Promoção da Saúde, pode ser vista como uma estratégia de intervenção no campo do
envelhecimento, através do favorecimento do empoderamento das pessoas para lidar com os
problemas suscitados pelo fenômeno da longevidade; permitindo, assim, viver a velhice com
qualidade de vida. Desejo de todos nós!
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105
Anexo I
ROTEIRO PARA TRABALHO DE CAMPO
Roteiro de Entrevista
1. Como soube do Projeto?
2. Há quanto tempo participa deste Projeto?
3.Que motivos o (a) trouxe ao Projeto?
4. O que você espera de um grupo de com pessoas da sua idade?
5. Dentro do Projeto, de quais atividades que você participa, além do grupo de encontro?
6. Participa de algum outro grupo deste tipo? Qual?
6.1. Anterior ou posterior ao PROVE?
7. Pratica alguma outra atividade? Que tipo ?
8. Você desempenha alguma atividade na sua família?
9. O que você faz para se divertir?
10. O que você gostaria de fazer que ainda não fez (projetos futuros)?
11. Como você percebe o envelhecer?
12. Que modificações o envelhecimento trouxe para a sua vida?
I
Anexo II
ROTEIRO PARA TRABALHO DE CAMPO
Roteiro do Grupo Focal
Roteiro de Debate:
1. O que vocês vêm buscar no Grupo?
2. O que leva vocês a permanecerem no Grupo?
3. Que espaço vocês encontram no Grupo, para se expressar?
4. De que atividades vocês participavam, antes de ingressar no Grupo?
5. Que transformações vocês consideram que o Grupo vem provocando nas suas vidas?
II
Anexo III
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Eu, _____________________________________________ declaro para os devidos
fins, que participarei, por livre e espontânea vontade, da pesquisa de campo a ser realizada
pela mestranda Mirna Barros Teixeira, como parte do Mestrado em Saúde Pública da Escola
Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Fundação Oswaldo Cruz. Esta pesquisa tem como
objetivo pesquisar a dinâmica de trabalho de grupos de idosos, que se dedicam à Promoção da
Saúde, investigando a sua atuação na construção da autonomia.
Tenho conhecimento, que, o resultado desta pesquisa busca entender melhor a
contribuição dos trabalhos direcionados aos idosos, no sentido da promoção da melhoria da
qualidade de vida e autonomia.
Declaro, ainda, estar ciente de que esta pesquisa constará da aplicação de entrevistas,
que serão lidas e preenchidas pela pesquisadora, e de minha participação em grupos de
discussão, para debater alguns temas propostos, coordenados pela mesma. Ainda:
Que a minha participação não acarretará risco para minha saúde;
Que as informações prestadas por mim serão classificadas como confidenciais;
Que ao estudo interessam as respostas obtidas nas entrevista e nas discussões em
grupo, sem a identificação individual, preservando minha privacidade; e finalmente,
Que minha participação será voluntária e que estarei, à vontade, para pedir
esclarecimento e para me retirar do estudo, em qualquer fase, sem que isso implique em
qualquer dano, custo ou penalização à minha pessoa.
Rio de Janeiro, ......../............./2001
_____________________________________
Entrevistado
_____________________________________
Pesquisador
Anexo IV
III
Tabela de Identificação dos entrevistados
Entrevista
ENTREVISTA
01
ENTREVISTA
02
ENTREVISTA
03
ENTREVISTA
04
ENTREVISTA
05
ENTREVISTA
06
ENTREVISTA
07
ENTREVISTA
08
ENTREVISTA
09
ENTREVISTA
10
ENTREVISTA
11
ENTREVISTA
12
ENTREVISTA
13
ENTREVISTA
14
ENTREVISTA
15
Nome fantasia
Água-marinha
Idade
75
Estado Civil
viúva
Cristal
67
solteira
Prata
78
divorciada
Ouro
80
viúva
Diamante
77
viúva
Esmeralda
84
solteira
Citrino
85
viúva
Ágata
66
casada
Pérola
74
viúva
Ônix
75
separado
Lápis lazuli
77
casada
Safira
74
viúva
Rubi
73
viúva
Topázio
73
viúva
Jade
69
casada
IV
Anexo V
Ficha de Identificação
Data ___/___/___
Matrícula:_____________
Dados pessoais
Nome:_____________________________________________________
Data de nascimento: _____/____/________
Idade:_______
( ) 60 a 64 ( ) 65 a 69 ( ) 70 a 74 ( ) 75 a 79 ( ) 80 e mais
Sexo: ( ) F ( ) M
Cor: ( ) Branco ( ) Amarelo ( ) Pardo ( ) Preto
Naturalidade:_________________ Nacionalidade:_____________________
Endereço:_____________________________________________________
Bairro:___________________ Cidade:_______________ CEP __________
Tel :_____________________
Tel de contato: ____________
Situação ocupacional:
Trabalha atualmente? ( ) sim Em que?__________ ( ) não
Aposentado? ( ) sim ( ) não Profissão anterior :___________________
Tipo de Renda: ( ) com rendimentos ( ) sem rendimentos
Própria: ____________
( ) até 1 sm ( ) de 1 a 2 sm ( ) de 2 a 5 sm ( ) mais de 5 sm
Familiar: ___________
( ) até 1 sm ( ) de 1 a 2 sm ( ) de 2 a 5 sm ( ) mais de 5 sm
Principal fonte de Renda:
( ) trabalho ( ) pensão ( ) aposentadoria ( ) outros _________________
Escolaridade:
( ) analfabeto ( ) 1º grau incompleto ( ) 1º grau completo ( ) 2º grau incompleto
( ) 2º grau completo ( ) 3º grau incompleto ( ) 3º grau completo
Número de anos de estudo? __________
Composição Familiar:
Estado Civil: ( ) Casado ( ) Solteiro ( ) Separado ( )Divorciado ( ) Viúvo
Filhos ? ( ) Sim ( ) Não Quantos ? _________________________________
Mora c/quem? ( ) Só ( ) Em instituição ( ) Acompanhado Especifique:__________
Tipo de moradia: ( ) própria ( ) alugada
Tipo de família: ( ) única ( ) convivente
Você é o chefe da sua família? ( ) sim ( ) não
Em relação ao apoio social - intercâmbio de apoio entre gerações:
Recebe alguma ajuda?
Ajuda fornecida:
Material ( ) De quem?______________
Material ( ) A quem?___________
Funcional ( ) _____________________
Funcional ( ) __________________
Instrumental ( ) ____________________
Instrumental ( )________________
V
Anexo VI
Perfil dos Entrevistados
Sexo: 93% (14 mulheres) e 7% (01 homem).
Idade: Todos com idade superior a 65 anos. 29% entre 65 a 69 anos; 14% entre 70 a 74 anos;
36% entre 75 a 79 anos; 21% entre 80 e 85 anos.
Estado civil: 54% são viúvos, 20% casados, 13% separados e 13% solteiros. 80% tem filhos
e 20% não tem filhos.
Escolaridade: Todos são alfabetizados; 7% possuem o 1º grau completo; 13% 2º grau
incompleto, 33% o 2º grau completo e 47% concluíram a universidade.
Moradia: a maioria mora na zona sul, 87% (13 pessoas). Sendo 47% residentes de
Copacabana, 27% de Botafogo, 7% do Jardim Botânico e do Leme. E 14% (duas pessoas)
moram na zona norte. 80% moram em residência própria e 20% em alugada. 47% moram
sozinhos e 53% moram acompanhados de algum parente.
Rendimentos e ocupação: 93% são aposentados (14 pessoas). A maioria vive
exclusivamente da sua aposentadoria 54%, e 46% vivem da sua aposentadoria e de mais
algum tipo de renda, como pensão, aluguel, ou do trabalho que ainda exercem. 20% (três
pessoas) ainda trabalham fora. 46% dos entrevistados tem renda própria acima de cinco
salários mínimos; 27% ganham entre 2 a 5 salários mínimos, 7% ganha entre 1 a 2 salários
mínimos e 20% ganham até 1 salário mínimo. 80% dizem ser os chefes de suas famílias.
Apoio familiar: 54% afirmam não receber nenhum tipo de ajuda. 46% dizem receber algum
tipo de ajuda (material ou funcional) da sua família. 54% dizem oferecer algum tipo de ajuda
(34% material e 20% funcional) aos seus familiares.
VI
Anexo VII
Relatório gerado no Programa LOGOS com as categorias de análise e suas
respectivas falas:
1- Apoio Social
Entrevistas:
“Tem sim, eu era muito envergonhada. Já, assim, em grupo, a gente já fala, participa mais,
eu acho que ajuda muito. O contato que a gente tem com vocês mais jovens e com os próprios
idosos, ajuda a gente a levar, a viver e receber bem a vida!" (Água-marinha, 75 anos,viúva)
“Eu estou com uma vida tão ocupada. O divertimento maior, para mim, agora, está sendo vir
para o Prove, nas aulas de inglês nas quintas e a fonoaudiologia nas sextas. Terça-feiras eu
vou ao Rocha Maia e tem muitas outras coisas que eu faço. (Cristal, 67 anos, solteira)
“Procurar novas amizades; porque os velhos, meus amigos, já foram embora todos. Então, a
gente fica sem amizade. Então, eu precisava procurar outras pessoas da minha idade, e que,
também, pudessem trocar idéias comigo; trocar trabalhos; fazer uma vida social. Porque o
velho, vai abandonando a vida social, porque os amigos dele vão sumindo, vão morrendo e a
pessoa vai se isolando.” (Ouro, 80 anos, viúva)
“Mas tem muitas senhoras que eu gosto de todas elas. Me meto em todo curso que abre
(risos). Adoro, ficar aqui dentro, adoro conviver com o pessoal, adoro ajudar. Uma que está
mais atrapalhada, no inglês, eu ajudo (Ouro freqüenta as aulas de inglês do projeto nesse
semestre). Porque a vida é isso, é viver bem no grupo"(Ouro, 80 anos, viúva)
“Vou ao teatro, ao cinema e me divirto aqui no Prove; venho encontrar com meus colegas,
venho dançar, venho brincar, né? A psicomotricidade com a B. é ótimo; o inglês com a L. S. é
ótima. O S. (professor de pintura) também é um amorzinho, e a esposa dele está sempre com
a gente, tá sempre fazendo um carinho na gente, tá sempre ajudando. Ah, tá bom sim,
continua, tá ótimo." (Ouro, 80 anos, viúva)
"Ter mais vida social. Porque elas chamam pra uma coisa, outra chama mais para outra;
ouve-se uma conversa de uma, que está mais atrapalhada, e a gente até inventa: - não... eu já
passei por isso também. A gente dá um conselho, dizendo que aconteceu com a gente;
aconteceu nada, mas a gente diz que aconteceu: - Ah, não liga pra isso não, amanha ou
depois já estão bem, eles falam isso da boca para fora..”. Coisas, assim, que acontecem."
(Ouro, 80 anos, viúva)
“E tem a L.S. (professora de inglês) que é ótima, ela tem uma paciência, menina. Ela ensina
duas, três vezes; enquanto a gente não falar certinho ela não sossega. Porque tem pessoas,
que não tem paciência, não é? Ela tem paciência, isso a gente fica animada pra aprender,
porque quando é com uma pessoa estúpida, ah é horrível”. (Esmeralda, 84 anos, solteira)
“Eu me dou com todo mundo, gosto de todo mundo. Todo mundo me trata bem, é um pessoal
muito unido, um pessoal muito bom. Eu não conheço, mas tem gente por ai, que diz que tem
grupo que tem muita briga, o pessoal discute. Aqui, não tem isso. Todo mundo conversa, todo
mundo se dá, eu gosto muito daqui, gosto muito mermo. “ (Esmeralda, 84 anos. solteira)
VII
“A necessidade de ter pessoas pra conversar. A necessidade de fazer exercícios; a
caminhada que faziam. Me diziam que faziam caminhadas, tudo isso me levou a aceitar o
Prove.” (Citrino, 85 anos, viúva)
“Só amizade né! Camaradagem, que eu fiz muitas, só isso... risos, também não precisa mais,
né?!" (Citrino, 85 anos, viúva)
"Primeiro, que eu estava num momento muito assim, muito difícil, que eu tinha perdido um
irmão, uma pessoa muito amiga minha, muito boa. Então, eu estava muito desesperada, eu
tava procurando um apoio, procurando fazer alguma coisa diferente, uma coisa que viesse
me ajudar psicologicamente, emocionalmente, ocupacionalmente. E o Prove, veio bem a
calhar, foi numa hora que eu precisava muito de uma ajuda, e foi muito bom. Foi um apoio
muito bom, foi muito positivo." (Agata, 66 anos, casada)
“Ah foi ótimo! Muito bom, porque, é como eu te digo, a gente arruma mais amigos, mais
conhecimento com garotas, com garotos, com pessoas de todas as idades, porque aqui no
Prove, tinha vocês, meninas, que trabalhavam muito bem com a gente. Foi muito, muito bom,
aprendi muito. Me senti muito bem, e gosto muito de conviver." (Pérola, 74 anos, viúva)
“Eu sempre gostei. Não sei se é porque meu signo é peixes, e gosta de convivência. O peixes,
gosta sempre de andar em cardume, e o grupo para mim é maravilhoso, sabe disso?” (Lápis
Lazuli, 77 anos, casada)
"Para encontrar um convívio bom, um convívio sadio, é o principal, né? Eu acho que todo
grupo de terceira idade deve procurar isso: procurar um maneira de como viver cada vez
melhor, e entretenimento, entendeu? Que faz com que a pessoa tenha sempre um astral bom,
uma maneira boa de enxergar a vida, sem ficar sempre reclamando. Porque a pessoa ficar
resmungando, reclamando, até as outras pessoas não gostam de conviver, não é? A pessoa,
para você ter um bom convívio, você tem que procurar essas coisas boas da vida para você
dialogar, pensar." (Lápis Lazuli, 77 anos, casada)
“Porque eu acho que o pessoal da terceira idade não deve ficar em casa. Eu acho que a
gente participando desses grupos é melhor, tem com quem conversar. Ficar em casa; os
filhos mesmo não tem tempo, trabalham, estudam, aquela história; então não dá para eles
conversar assim... Então, quando a gente tá no grupo, você tem com quem conversar, isso te
dá uma melhora, você não fica assim, tão sozinha dentro de casa. Eu acho a melhor coisa
que tem, esses grupos." (Safira, 74 anos, viúva)
"A convivência com as colegas, a amizade. Você passeia muito, tem com quem conversar,
isso que eu gosto."(Safira, 74 anos, viúva)
“A única coisa que eu achei, não foi do envelhecimento... eu gostaria de ter envelhecido junto
com o meu marido, mas o resto não tenho nada para me queixar não... passeio, faço o que eu
quero. Vou jantar fora, hoje mesmo fui almoçar com o pessoal do grupo, muito bom. Eu
acho que o pessoal dessa idade deve entrar, porque quando a gente tá com essa idade, não
tem mais assim... os filhos mesmo não tem mais aquele papo com a gente, conversa e tudo,
mas não é como o pessoal da nossa idade, é outra coisa. (Safira, 74 anos, viúva)
“É, amizade! Dessa vez que fui em Raposo (na viagem com o grupo), fiz uma amizade que
fiquei até boba. Ela nem me conhecia muito no grupo, me emprestou dinheiro durante a
viagem. Eu, ai, fiquei nervosa para pagar, dei meu telefone, disse pra ela me ligar; ela nem
me cobrou, eu que fui atrás dela para devolver o dinheiro, que ela tinha me emprestado. E ai,
VIII
nós ficamos grandes amigas, me chamou pra passar uma tarde na casa dela. São essas
coisas, que a gente gosta, é mais uma casa para ir; às vezes eu faço na minha casa um chá e
convido todo mundo. Mas a melhor coisa que houve, foram esses grupos da terceira idade.
Porque, antigamente, as pessoas faziam 50 anos e ficavam dentro de casa, sentada, só
fazendo tricô, crochê, aquelas coisas. Ah, não! Se eu ficasse assim, eu tinha morrido. Então,
a melhor coisa... Não podia existir coisa melhor do que esses grupos, muito bom!." (Safira,
74 anos, viúva)
“Não ficar em casa parada, sem fazer nada, que é horrível! A pessoa idosa ficar em casa sem
fazer nada, é horrível. O dia em que eu fico em casa, porque às vezes não saio pra fazer
nada. Ah, eu tenho que sair para outro lugar, porque ficar em casa é horrível.” (Rubi, 73
anos, viúva)
“Na semana passada, lá na fono, teve uma atividade, que era pra ficar uma pessoa em frente
da outra encarando. Então, eu peguei uma das minhas parceiras, esqueci o nome dela, ela é
muito simpática também; então, eu disse: "- Vamos flertar, mas não pode falá". Aí, depois
quando terminou, elas perguntaram o que eu senti da parceira, ai eu disse: "- Senti
sinceridade. Porque ela soube encarar nos meus olhos, o tempo todo me encarando". Eu,
sempre, desde pequena soube, que a pessoa que encara a outra assim, são pessoas honestas,
sinceras. A mesma coisa, quando você vai cumprimentar uma pessoa, que a pessoa faz mão
mole; eu não confio naquela pessoa. A pessoa tem que cumprimentar de verdade. Então, eu
achei ela muito sincera, uma pessoa com sinceridade e ela sentiu a mesma coisa de mim. Foi
muito bom, muito bom mesmo!" (Rubi, 73 anos, viúva)
“Me interessei, porque a gente participa, de muita coisa da gente da nossa idade. Ai, cada
um mostra as suas idéias. Vocês, também colaboram muito com a gente, com as palestras que
vocês fazem e a Dra. L.P., não é? Tinha o bingo, não sei se ainda tem? Porque ano passado,
sofreu uma interferência, ai, ficou meio parado. Mas tinha o bingo, todo final do
mês..."(Topázio, 73 anos, viúva)
"A coisa de não ficar sozinha. De ficar participando com mais pessoas da minha idade; se
comunicando; trocando idéias e conversando. Porque, as pessoas da nossa idade, são as que
melhor nos entendem, melhor nos entendemos uns aos outros. Porque, os jovens podem até
nos entender, mas não tem a vivência que tem a gente, não é? Então, eu participei, gostei e
continuei. ..."(Topázio, 73 anos, viúva)
"Ah, eu espero, como se diz, que eles ajudam... Geralmente, eles tem os mesmos problemas
que a gente; ai sempre tem alguém mais animado que promove um passeio, promove uma
festinha. Essas coisas ajudam a gente a não se sentir tão só, não é? Os netos estudam, os
filhos ficam correndo de um lado para o outro, correndo atrás. Você sabe como é que é.
Então, a gente tem que correr para os nossos colegas que tem mais ou menos os mesmos
problemas. As vezes, a gente tem uma doença, uma coisa qualquer, e, por não ter tempo dos
filhos escutarem, as pessoas amiga escutam, ajudam, até se precisar ir ao médico
acompanham, essas coisas. Eu acho que tem bastante solidariedade entre as pessoas... eu
gosto muito." (Topázio, 73 anos, viúva)
"Ah, valeu, valeu muito, a participação. Porque é tal coisa, você não fica parada, fica sempre
tem idéias novas, tem sempre palestras para dar as coisas... Então, tudo isso ajuda. E a gente
vai se atualizando mais um pouco, da realidade da vida. Então, eu acho que isso ajuda. Ali,
no Rocha Maia, também tem palestras...então tudo isso ajuda, cada um descobre as suas
coisas...então, tudo isso é bom para gente. Não deixa você ficar parada, sem fazer nada, nem
de participar das coisas, eu gosto por causa disso e enquanto tiver, eu venho. "(Topázio, 73
IX
anos, viúva)
"O carinho de vocês, com a gente, é muito importante. Sempre tendo uma palavra amiga,
transmitindo coisas sempre muito interessante sobre saúde. Tudo o que eu participei, aqui,
me acrescentou muita coisa, por isso eu dei continuidade. Eu também estou no Rocha Maia,
mas é completamente diferente. Não estou desmerecendo o Rocha Maia, cada um tem os seus
valores, mas eu não largaria o Prove pelo Rocha Maia, entende? Acho, que sempre deveria
ter mais e mais. Porque, nós nos divertimos e no fim da vida, também depois de tanta luta, a
gente merece um lazer, um lazer."(Jade, 69 anos, casada)
“Porque a terceira idade é para ser tratada como vocês tratam: com carinho, passando
informações positivas. Com os anos, a gente também vai tendo experiências; para você ter
experiência como a gente tem, você tem que ter vivido. Você pode ter mais cultura, mas a
prática da vida... A vida é uma escola. Eu vejo a vida assim, como uma escola, sempre
estamos aprendendo. Eu gosto muito de estar informada, eu sou uma pessoa muito
comunicativa, muito aberta. Porque as pessoas, as vezes, ficam com muito medo... As
pessoas, quando não acham certo, tem que falar, para modificar. Porque estamos, aqui, para
ter uma experiência prazerosa. (...) As pessoas, daqui, do Prove, questionam mais e são mais
atualizadas, as pessoas lá são um pouquinho mais alienadas, alienada é a palavra?
(...)."(Jade, 69 anos, casada)
“Eu venho. No Prove, se eu não venho, eu não tenho nada para fazer. Quando eu venho, eu
vejo gente, eu troco idéias. É o convívio com as pessoas." (Jade, 69 anos, casada).
“Tanto que eu acho muito legal, esse convívio aqui com vocês. Vocês são mais jovens; a
juventude também faz falta, e também a nossa experiência. Vocês, também, ganham
experiência com a gente. É uma troca. E o mundo de hoje...todas as modificações que teve,
eu assisti, o homem indo a lua, a guerra mundial. " (Jade, 69 anos, casada)
“O grupo só acrescenta, eu só tenho pena que não tenha mais...."(Jade, 69 anos, casada)
2- Rede Social
Entrevistas:
"Expectativa? É que eu me sentisse satisfeita, realizada. A expectativa? Eu, não disse porque eu
vim? Então, para ter um relacionamento maior, com um numero maior de pessoas." (Água-marinha,
75 anos, viúva)
"Por que eu vim? Porque era um projeto de idosos,e eu achei interessante, sabe? Porque eu gosto
muito de assistir, de ouvir palestras, entrevistas, essas coisas. Eu gosto muito, e isso me atraiu."
(Água-marinha, 75 anos, viúva)
“Conhecer os problemas do grupo. Porque, às vezes, a gente acha que o problema é só nosso, e
vamos ver, que o problema é coletivo, né? E, participar com pessoas, da mesma faixa etária que a
da gente. Porque, eu tenho um monte de amigas, da mesma faixa etária que a minha."(Cristal, 67
anos, solteira)
“É muito bom. A expectativa é a seguinte: você vai discernir quais são as amizades que você deve
continuar; quais você deve conservar, com cuidado. E, até os que você tem que abandonar. E,
mesmo no Prove, já teve umas, que eu tive que abandonar; porque entrava na minha casa, às 7:30
X
da manhã, e só saia as 10:00 da noite. Já não conseguia mais, né?“(Ouro, 80 anos, viúva)
”Ah posso! Algumas coisas, eu modifico sim. Você pode. Lá, no Rocha Maia (outro grupo), por
exemplo, eu tenho feito varias encenações lá. Eu fiz pro dia do Natal; fiz pro dia do papai. Eu fiz,
ensaiei e eles apresentaram. Eu fiz várias pecinhas, mas sempre pequenininhas. E nelas, todas, tem
aquele fundo de moral, que abrange qualquer coisa que eu vi de anormal, de irregular, entendeu?
Ou que mexeu, ou que foi indelicado. Distribuíram lá, uma vez, uns trabalhos. Cada uma ganhou um
trabalhinho, porque não sobrou muito; aí, uma falou: "- Ah que porcaria, não quero isso não.".
Nessa encenação, de Natal, eu falei sobre isso (no roteiro), entendeu? A pessoa recebia o presente,
e falava (na peça feita pela Célia): "- Olha, sinceramente, isso não vai ter muito uso para mim, mas
eu gostei, porque afinal de contas, você acha que eu vou dizer que não gostei do presente? Não
cabe, aqui, dizer uma coisa dessas! "(Ouro, 80 anos, viúva)
"Ah, sim. A gente tendo uma direção, assim como o Prove, tem uma direção, né! Tem várias coisas,
que orientam. Uma orientação. Isso que leva a gente, assim, a participar, e cada vez mais, buscando
coisas, informações. Por que eu gosto do Prove? Porque, aqui, é muito diferente de qualquer grupo.
Eu já tive em vários outros grupos, até por curiosidade mesmo, participando de festas e tudo. Mas,
eu acho aqui, assim, um trabalho muito bom, mais voltado, assim, não sei se poderia dizer,
científico, sabe. É um negócio, assim, mais dirigido; muito informativo, e isso, é muito bom.”(Ágata,
66 anos, casada)
“O Prove, não é assim, "oba, oba", não. Não sou nada contra, "oba, oba". Eu até acho, "oba, oba",
bom. Mas, o Prove... aqui, também, tem os momentos de "oba,oba"; mas é um negocio muito
palpável, que informa muito a gente, que ajuda, que leva a você buscar até coisas fora, a ler mais
coisas, a se interessar, até pesquisar sobre o problema do idosos como um todo. Em todas as áreas,
a gente tem tá buscando informações, e lendo para se ajudar, né? Pra sua própria ajuda, mesmo.
Porque, a ajuda maior, é você mesmo, que tem que fazer. Eu acho, que principalmente, assim, em
termos de você tomar precauções, para tudo que você vai fazer. Você tem que fazer, com mais
atenção; tomando mais conta, tomando mais cuidado.” (Ágata, 66 anos, casada)
"A expectativa é que... A convivência, faz com que a gente, adquira mais conhecimentos, amizade, e
outras coisas mais, não é? Porque, um garoto de 14, 15 anos, não tem a idéia que tem, uma pessoa
já de idade. Uma pessoa já vivida, assim, da vida. Tenho tantas amizades boas aqui, que eu tenho
conseguido, que até hoje... A amizade, a convivência mesmo." (Ônix, 75 anos, separado)
“Muito boa, muito boa. Se eu, não tivesse, aqui no grupo, não tinha essas amizades; não tinha
esclarecimentos bons; essas coisas todas. Porque, a convivência daqui, não parece não, mas é muito
boa, é maravilhosa. Convivendo com vocês todos, com os colegas também. Pena que tem poucos
homens, mas não tem nada não, a gente faz amizade também.” (Ônix, 75 anos, separado)
"Ah, eu espero, amizade. A gente sair, pegar assim, aquela turminha boa. Porque tem pessoas, com
a cabeça muito vazia, ainda. Então, eu gosto muito, de tá naquele grupo, que a pessoa não tem a
cabeça vazia, que ainda pense em viver.”(Rubi, 73 anos viúva)
3- Autonomia
“Depende de mim, sim! Por exemplo: eu morei 30 anos num apartamento de quarto e sala. Eu tive
um problema na perna; meu filho ficou falando, que eu tinha que me mudar para um apartamento
XI
maior, mas eu só ia me mudar se fosse aqui, em Copacabana. Meu filho, mora na Tijuca. E, tinha
um apartamento, muito bom perto dele. Mas, eu disse que não queria, e fui buscar um apartamento
aqui mesmo, em Copacabana. Coincidências, eu achei no prédio da Adelaide (que é freqüentadora
do Prove). Eu perguntei, se tinha algum apartamento para vender; no outro dia, telefonei para o
proprietário, e noutro dia, fechei negócio. Mudei, do número 86, e fui para 125, em frente! Foi
esforço meu, nunca tive ajuda nenhuma, a não ser a pensão de meu marido (que morreu quando
tínhamos 1 ano e meio de casados). Fora isso, nunca tive ajuda nenhuma. Tudo, o que tenho, e
possuo, hoje, é esforço meu!". (Água-marinha, 75 anos, viúva)
"Olha... Eu, só vou me considerar velha, no dia em que quiser atravessar uma rua, correndo e não
conseguir. Mas, enquanto eu puder andar depressa, dar uma corrida, eu não me considero
velha.”(Água-marinha, 75 anos, viúva)
“No aspecto físico tem. Eu, por exemplo, não dou mais adeus, porque, aqui... (mostra o antebraço
balançando) risos. Eu estou, também, com um negócio na perna que parece sujo, eu acho horrível,
mas o resto, não. Como eu te disse, no dia em que eu não puder, dar mais uma corrida, dançar no
baile... Mas, enquanto isso, está tudo ótimo... Eu sou uma otimista. Temos que viver a vida como ela
é." (Cristal, 67 anos, solteira)
"Eu não sei. Eu acho, que aos pouquinhos, eu vou fazendo tudo o que eu tenho vontade. Não tem
nada, assim... Eu já tive experiências tão diversas na minha vida. Coisas que eu achava que eu
nunca ia fazer. Interessantíssimo, sabe? Eu, por exemplo, sempre tive medo de esporte, e, depois, eu
fui fazer escalada, depois de adulta. Agora, você vê: eu, que tinha medo de jogar bola, de nadar, fui
fazer escalada. Agora, você vê, o que é a vida! Outra coisa, também: quando eu ia pensar em pisar
num palco? Nunca. E fui representar uma peça, no Hotel Intercontinental, com um monte de gente
(foi uma peça do grupo de teatro do Prove que foi apresentar para o pessoal do Congresso da
SBGG, no dia aberto ao Encontro de Idosos; devia ter umas 300 pessoas na platéia). Coisas que eu
pensei que nunca fosse fazer. Inclusive, fui sócia do teatro amador; dizia que nunca ia fazer isso, e
fiz. Experiências, assim, muito diversas, que eu nunca pensei em fazer, e faço!” (Cristal, 67 anos,
solteira)
“Mas, eu, graças a Deus, com a minha idade, eu saio; viajo sozinha; vou para Cabo Frio ver meus
bisnetos, meus netos... Eu tinha dois filhos, um morreu... Então, agora eu vou só passear; minha
vida, agora, é essa. Não tenho mais nada. Eu alugo meu apartamento, vou pra fora. Sou sozinha,
quero viajar, alugo pra um mês, por vinte dias, e alugo e vou embora. Eu gosto muito, da minha
casa, embora eu saio muito, mas eu gosto de tá na minha casa." (Prata, 78 anos, separada)
“Se tá um sol, uma coisa bonita, ou eu tenho que fazer um monte de coisa... Adoro fazer as coisas
pros outros. Minha filha fala: “ – mamãe, paga isso assim, não sei aonde pega isso, depois, pega
aquele material, vai na casa da Rosana...” Ai, eu adoro. Tem um monte de coisa para fazer;
arrumo minha vida daqui, com a vida de acolá, ajeito e faço tudo , nunca deixo de fazer nada pro
dia seguinte, não.” (Ouro, 80 anos, viúva)
“Eu, sai do trabalho, fui pra aposentadoria. E, isso ai, pouca coisa mudou. Só, que eu me engajei
nesses grupos, porque eu sou muito irrequieta, e eu jamais, iria conseguir ficar em casa, plantada.
Tem que me mexer." (Diamante, 77 anos, viúva)
"Bom, eu acho que aquela responsabilidade de estar presente às reuniões, de me manifestar
durante a reuniões sobre os assuntos focalizados na reunião. Acho, que é isso ai. Porque, eu não
sou de ficar parada, de ficar quieta, de ficar calada; eu me manifesto logo.” (Diamante, 77 anos,
viúva)
XII
"Eu acho, que fui umas das primeiras. O meu papel (cartão do prove) está até amarelinho. Eu
guardo, pendurei no guarda-roupa, ai eu fico olhando... risos. Hoje, eu também fui no Posto de
Saúde, também faço parte de lá. Ai, vim pra cá de tarde. Amanhã, vou no Rocha Maia, tenho
médico. Ai, quando acabar, venho para cá, para aula de inglês. Quando eu sair daqui, já vou lá, pro
outro grupo, nós vamos tomar uma sopa lá, lá em Copacabana."(Esmeralda, 84 anos, solteira)
"Claro que depende de mim. Se eu não fizer por onde! Parada, não se faz nada. Eu tenho que me
movimentar, não posso ficar parada. Se a gente ficar parada, não sai nada. A gente tem que ficar,
sempre mudando de coisa. Eu, tô sempre procurando, alguma coisa para fazer. As vezes, eu tô de
tarde: "- Não tem nada pra eu fazer, o que eu vou fazer?". Eu não me aperto, só quando eu não
quero sair mesmo. Mas, quando eu to, passo o dia inteirinho, na rua.“ - Menina, pára que isso?”.
Não, não vou ter nada, na rua, não. Pelo amor de Deus, não me fala em ter nada não."(Esmeralda,
84 anos, solteira)
“Eu não. Eu tô usada, velha não... risos. Usada, pelo tempo, mas não sou velha, não. Olha, eu não
tenho preguiça, eu não tenho preguiça pra nada! Eu faço tudo, eu vou ao banco, eu vou ao
supermercado, eu volto, vou num local, vou no outro, não páro não. Me sinto mal, me sinto uma
pessoa inútil, quando não tem nada pra fazer. “(Esmeralda, 84 anos, solteira)
“Ah, aumentou. Eu não saía, para lugar nenhum, não saía para lugar nenhum! Era dentro de casa,
de casa pro trabalho, de casa pro trabalho, quando me libertei disse:” – Agora, não. Agora vou me
libertar, agora vou passear, eu agora vou fazer o que eu tenho vontade!”. Não, que isso? Tem
gente, que se aposenta, e fica dentro de casa; morre. Não. Eu, agora, que tô viva, não quero esse
negócio, não. Gosto muito de passear. Adoro passear. Não páro nem um minuto, não quero nem
saber de parar. Às vezes, não quero nem pensar, não quero nem saber o dia de amanhã, que dia é, o
que vai acontecer, não quero nem saber disso. Já tô preparando a minha programação, para
amanhã. Amanhã, vou pro Rocha Maia, venho pra cá, daqui vou lá pro coisa, depois vou pra casa.
"(Esmeralda, 84 anos, solteira)
“É bom, distrai, né? A gente é velha... velha, não. Não sou velha, não, sou usada! A gente, tem que
ter distração. Não, minha filha, porque, se você ficar parada, dentro de casa, aparece tanta
doença! Dói o pé, dói a orelha, dói não sei o que. As vezes, olho pro meu pé e digo: “- Isso aqui tá
tudo inchado”. Dói, você, pensa que eu deixo de sair, de casa? Eu, boto uma palmilha, e vou me
embora! Eu não; não me esquento, não. Só mesmo, quando eu não quero. Aí, eu digo que não vou,
porque tá chuvendo, porque tá frio."(Esmeralda, 84 anos, solteira)
“Eu, não tenho problema de saúde, sou sadia. Posso ir a qualquer grupo, sair sozinha, vou ao
cinema, vou ao teatro, eu vou sozinha, bem é isso ai!" (Citrino, 85 anos, viúva)
“Porque eu trabalho muito. Eu faço as coisas em casa; ai, eu gosto até de fazer mesmo. Tenho até
uma pessoa, que me ajuda, que vai lá em casa, 3 vezes por semana, mas eu gosto de fazer. Porque,
você fazendo, você tá mexendo com você mesmo, com o seu raciocínio, com o corpo, com a mente,
com tudo.” (Ágata, 66 anos, casada)
“É, se a sua cabeça está boa, você tira de letra. Agora, se você for encucar, ao se olhar no espelho:
"- aí, eu tô horrível, tô cheia de prega, num sei o que...". Aí, se você botar essas coisas na cabeça, o
EU né, o EU carrega você pra qualquer lugar. O EU, exige de você, ou te leva bem pra cima, ou te
leva bem pra baixo. Então, eu acho que a gente, tem que deixar o EU de lado, e viver. Não vamos
deixar que aquilo, te domine. Eu, tava lendo isso, nesses dias, ai, parece que o EU, leva você pra
cima, ou pra baixo. Então, você se liberte do EU, e seja você!” (Ágata, 66 anos, casada)
"Ah sim, a gente é aquilo que a gente quer ser. Eu, quando criança, eu não era assim, livre, como eu
XIII
queria ser. Era muito presa, e eu queria ser muito livre. Eu era levada, teimosa, e minha mãe
prendia muito. Na juventude, fui muito presa, e a melhor idade, é agora! Me casei, vivi bem com
meu marido, e era ótimo. Mas, a gente, sempre fica presa, e eu sou dessas pessoas, que tem vontade
de ser livre. Meu marido, era ótimo, não me empatava de fazer nada, eu fazia o que queria, ele
combinava tudo comigo. Depois, que eu fiquei viúva, eu fiquei abalada um pouco, mas depois, eu
me senti livre. Faço o que quero, vou aonde quero, acordo na hora que quero. Agora não, porque
tenho trabalho, né? E tenho horário. Mas, quando tenho trabalho em casa, eu não tenho horário pra
ele, e faço como eu quero. E, para mim, é a melhor idade." (Pérola, 74 anos, viúva)
"É, liberdade. Eu sempre tive vontade de ter liberdade. Consegui agora, depois de sessenta e tantos
anos." (Pérola, 74 anos, viúva)
"Acho que é viver. É isso, que eu disse, viver com liberdade! Ninguém depender de mim, e eu
também não depender de ninguém. Eu, não queria nunca, jamais, aquilo de ter de dizer: - eu vou
sair, não. Eu gosto de sair, e pronto, sai. Fazer o que é de direito, e viver!” (Pérola, 74 anos, viúva)
“Eu ando, eu saio, cuido de planta, tenho muita planta, tem esse negócio da pintura, eu sei costurar,
costuro pra um, costuro pra outro de graça. Eu fui alfaiate... Meu tempo nunca fica vazio, tem
sempre alguma coisa pra fazer. Eu compro uma cesta, faço um arranjo, faço artesanato, faço de
jornal, tudo pra dar, pra vender, não... e vou matando o tempo". (Ônix, 75 anos, separado)
“Você sabe, que na minha casa, eu faço muita coisa? Eu faço croché, eu faço pintura eu sei muita
coisa."(Lápis Lazuli, 74 anos, casada)
“Acho que nada. Já fiz tudo que tinha vontade de fazer. Tudo, que eu tenho vontade de fazer, eu
faço! A única coisa, que eu tinha que fazer muito, bastante, que eu vejo amigas minhas, aí, ainda
com dificuldades... que, as vezes, quer arranjar um namorado e não consegue. Que diz assim: "homem nenhum, olha pra mim". Ah, para mim, não. Teve uma amiga, que me disse assim: "- Ah,
Rubi,, como você tem tanta sorte? Pra mim, depois que eu fiquei viúva, nem cachorro olha pra
mim". Eu falei: - Cachorro não olha, pra mim, não. Quem olha, é homem." (Rubi, 73 anos, viúva)
“A minha vida em si! O meu cotidiano, depende de mim...Eu tenho que fazer, até aonde alcança as
minhas finanças, e a minha saúde. Claro, que eu não tenho aquela saúde, de quando a gente é
jovem. Mas, eu não tenho grandes problemas de doenças, posso me movimentar para qualquer
lugar. " (Topázio, 73 anos, viúva)
“Não sei. Porque isso são coisas que não é da nossa vontade, não é? A única coisa que a gente pode
fazer, acho eu, é não se entregar. Não se entregar. Dizer que estou velha, e não sirvo para mais
nada, não! Eu procuro atividades, no meu tempo inteiro. Vou para aqui, vou para lá, vou aos meus
médicos, faço meus exames, faço tudo... Eu faço croché, eu faço tricô, eu faço ponto de cruz, ai, eu
passo bem, não tem problema.” (Topázio, 73 anos, viúva)
“Na verdade, eu não sou dependente de ninguém. E isso, me dá mais autonomia pessoal. E eu vejo
as coisas, de uma forma diferente. Isso é o que eu acho. O que você acha? Porque, quando a gente é
mais dependente, você fica mais limitada, não é?! “(Jade, 69 anos, casada)
“Eu faço hidro, porque é muito importante também. Faço caminhadas. Quando posso eu caminho
também. Eu tenho uma vida bastante ativa, dentro das minhas possibilidades. Eu só páro, quando
tenho qualquer problema de saúde." (Jade, 69 anos, casada)
"Ah, é muito bom, muito... algumas delas (mudanças), porque muitas fogem do nosso alcance. Mas
muita sim. É o negócio da autonomia. Porque, quando era moça antes de casar, eu tinha o controle
XIV
da minha família. Depois de casar, continuei tendo o controle do meu marido, (risos)." (Jade, 69
anos, casada)
Sub-Categoria da autonomia:
3.1. Auto-realização
"Eu me sinto uma pessoa realizada, está me entendendo? Vim de uma família, assim, minha mãe
teve 14 filhos, com muita dificuldade. Então, hoje me sinto realizada. Eu faço o que eu quero.”
(Água-marinha, 75 anos, viúva)
“Eu sou feliz! Me considero feliz, você não depender de ninguém... é uma felicidade! Eu tenho
diabetes, mas cuido, né?! Ontem, fui para um lanche e não tomei insulina; hoje, fui ao médico para
medir e deu 170, tá alto, mas, porque não tomei o remédio ... mas, é bom, para saber como o
organismo está reagindo." (Água-marinha, 75 anos, viúva)
“Ah, outra coisa, o pessoal fala: "- Você ainda vota?" Voto!, Por que? Porque eu quero votar,
ué?! Ninguém me impede. Você sabe, que eu vou lá no dia de eleição, eu me arrumo toda e vou lá
para votar toda satisfeita? Adoro. Agora, você vai no computador, e pum, resolve tudo, não é?!"
(Esmeralda, 84 anos, solteira)
“Eu tô aceitando... uma beleza, tô achando ótimo. Não tô me queixando de nada. Porque tem gente,
que fica: "- Aí, tô ficando velha, aí, sei lá o que". Não, não quero nem saber disso, que isso?! Velha
é estrada! Eu fico por conta, quando a pessoa fala: "- Aquela velha". Eu digo: “- Pelo amor de
Deus, não me chama de velha.” (Esmeralda, 84 anos, solteira)
"Como eu te falei, você não deixar o EU te levar nem lá pra cima, nem lá pra baixo, se libertar do
EU, e viver. (...)Pronto, é isso que eu faço, todo dia. Todo dia, eu sempre agradeço pelo dia de hoje.
Eu, não tenho muito o que pedir, tenho mais a agradecer.”(Ágata, 66 anos, casada)
"Vou te falar uma coisa, não tem nada que eu não quisesse fazer, que eu não fiz. Eu conheço a
Europa todinha. Eu conheço os EUA, as ilhas do Caribe, risos... Então, eu costumo brincar com as
minhas amigas, que no dia em que eu morrer, vocês podem falar assim: “- morreu uma mulher, que
soube levar a vida, que aproveitou a vida”. A pessoa, tendo um bocado de cultura geral, é muito
bom, pra gente, né?! Saber viver, e sentir bem. Eu me sinto bem. Por isso, que as pessoas, graças a
Deus, gostam do convívio comigo. Porque, se eu tiver que passar alguma coisa, só coisa boa, nunca
levo ninguém pra coisa ruim."(Lápis Lazuli, 77 anos, casada)
"Ah... eu acho por eu estar mais feliz. Assim, me dou com todo mundo, o pessoal gosta de mim.
Converso com todo mundo, tem gente que fala assim: "- Poxa Safira, você se dá com todo mundo...".
Isso é uma coisa boa, eu converso com um, converso com outro, me dou bem.”(Safira, 74 anos,
viúva)
“Eu, penso em viver muito! Estou com 73 anos, e penso em viver muito ainda. Agora que eu tô
conhecendo a vida....tô conhecendo a vida, agora! “(Rubi, 73 anos, viúva)
"Para mim, o envelhecimento para mim, me trouxe alegria. Porque, eu me sinto, assim, tão feliz, eu
me sinto muito feliz, mesmo. As vezes, me aborreço com problemas de filhos, ou qualquer coisa.
Mas, quando saio, na portaria, e o porteiro diz, assim: "- oi tudo bem?". Eu já estou com um
sorriso, no canto da boca. Não sei, então, eu não guardo raiva, eu não sou, assim. Então,
envelhecer, para mim, foi muito bom.”(Rubi, 73 anos, viúva)
XV
4- Integridade
Entrevistas:
“Hoje, estou com 75 anos, e estou bem... Eu não me acho velha. Eu, aceito a velhice. A
velhice, é uma coisa natural da vida. A gente, nasceu, viveu e morre... Então, a gente vai
levando." (Água-marinha, 75 anos, viúva)
“Não, é normal. Meu envelhecimento, é normal. Como toda pessoa, que segue seu caminho,
direitinho. Procuro tomar meus remédios; não faço estraparfúrdias, coisa maluca, não fico
dormindo 3, 4 horas da manhã. Tenho minha vida normal. Assisto o Jô, mas se tenho que acordar ás
7:30hs, para ir lá, para o Leme, não posso assistir, o Jô... Mas, levo uma vida tranqüila, normal.
Não faço nada, de estaparfúrdio, nada.” (Ouro, 80 anos, viúva)
"Ah, eu acho, que estou muito bem. Estou feliz, de ter vivido até agora. E, tenho perspectiva, de
viver mais ainda. Porque, pelos exames que eu fiz, ultimamente. Eu fiz, uma série de exames, e, os
médicos, dizem que eu estou muito bem. Então, eu acho, que só se ocorrer uma tragédia... Eu tô
muito feliz, como idosa. Ah, eu faço muita coisa, que na minha juventude, eu não podia fazer. Era
reprimida, com meu pai, com meu marido, e depois, as crianças. Então, agora, tô solta, tô livre,
para voar!" (Diamante, 77 anos, viúva)
"Olha, eu não penso muito, não. Não me preocupo, muito, não. Nunca me preocupei com idade. Eu
tive 15, 20, 30, e fui indo, e nunca me preocupei, não. As vezes, eu digo assim: "- Meu Deus do céu,
eu já sou muito velha, já quase 70 anos. É muita idade. Será, que já estou perto, de morrer?". É
melhor, nem pensar nisso, porque é a lei natural, das coisas, né!. A gente, tem que ver, também, essa
realidade; mas eu, não me preocupo, não... Para mim, não é nenhum bicho de sete cabeças. Eu, tiro
numa boa. " (Ágata, 66 anos, casada)
“Deixa o tempo passar. Não olhar pra trás, e viver. Assim, o futuro é hoje! O meu futuro, futuro,
não tem muito, não. Então, o futuro, tem que ser hoje; o aqui e agora. É viver o presente, viver o
momento, curtir aquele momento, e esquecer o que passou. As vezes, a gente puxa o baú das
recordações, né? Vai puxando... Mas, se pensar, no futuro, também, não é legal. Então, tem que
viver, o aqui e agora. Dorme hoje, reza: "- Meu Deus, obrigado pelo dia de hoje; estou inteira, tô
dentro de casa, minha família está aqui, obrigado senhor." (Ágata, 66 anos, casada)
“Ai, eu me olhando no espelho: “- Ah, eu estou igualzinha a ela, não senti, que envelheci muito, de
uma época para outra.” (referente a 7 anos atrás, tempo do retrato para hoje). Agora, assim, dentro
de mim; eu acho, que eu faço, o que eu fazia com 20 anos. Eu não tenho, assim, cansaço. Tenho a
pressão alta, mas eu não sinto nada. Os médicos é que dizem, né? Mas, tô muito bem, graças a
Deus. Não sinto, assim: “- Ah, porque eu tô velha, porque eu tô...”. Se, eu não tivesse ficado velha,
eu teria morrido, né? Ah, minha mão tá feia? Não. Ela tá, com a idade que tem! O meu rosto? Não.
Tá, com a idade que ele tem! Não me sinto assim: "- Ah, quando eu era novinha... ah, quando eu
fazia aquilo...". Tô fazendo, ainda! O que eu fazia, quando era novinha, faço agora. Não sinto,
assim, envelhecimento. Até agora, esse minuto. Porque, tem pessoa, que ficam com idade, e ficam
assim: "- Ah, mas eu tô feia, ah, minha pele, ah meu cabelo...". Eu adoro, meu cabelo branquinho.
Não quero pintar, estou com quase 75 anos. Vou pintar, meu cabelo? Vou pintar meu cabelo, vai me
prejudicar a vista, vai me prejudicar minha pele, não pinto." (Pérola, 69 anos, viúva)
“Minha expectativa? É, a de que as pessoas, procurem valorizar a sua própria vida; a saúde que
Deus dá, entendeu? E, levar a vida, muito bem. Isso, que eu acho! Sem aborrecimento, sabendo
transformar, os aborrecimentos em alegrias. Porque, ninguém vive, sem ter de vez em quando, uma
coisa que as vezes não agrada muito. Mas, a pessoa, tem que saber superar, essas coisas.”(Lápis
XVI
Lazuli, 77 anos, casada)
“Terceira idade, pensa assim... ás vezes, quando a gente é mais novo, tem um pensamento. Na
terceira idade, já tem outro pensamento. Já pensa, que vai ficar velho, e vai morrer logo. Hoje
mesmo, falei com minha filha: “- eu não vou morrer tão cedo. Antes de morrer, eu, ainda vou matar
muita gente.”. O que? A minha vida, melhorou muito! Melhorou. Porque, quando a gente tem filho,
a gente, nunca deixa de ter aquela preocupação com filho; porque filho casa, tem netos...”(Rubi, 73
anos, viúva)
“Todas as marcas, que nós temos, no rosto, no braço, tudo é o processo de vida; é porque, viveu! É
o preço, que eu, pago por isso. E, eu acho, que esse preço, é valido. Para mim, é válido; é válido
por que? Porque, se eu não tivesse esse corpo, eu não estaria viva. E, estar aqui, conversando com
você, é uma coisa muito gratificante, para mim. Posso ter falado, coisas inconvenientes, mas, de
qualquer forma, eu me senti bem, me senti a vontade. Você, pode ser minha filha, quase minha neta,
e no entanto, me sinto a vontade, me sinto bem!” (Jade, 69 anos, casada)
Sub-categoria:
4.1. Geratividade:
"- Isso que eu te falei, já falei até, né?! Faz você buscar coisas, até fora, e refletir sobre tudo aquilo,
que você leu, que você ouviu, que foi falado. E, tudo isso, vai te ajudando muito. Eu procuro, até
passar, pra outras pessoas. Quando é, uma coisa, assim, que eu acho que é importante, que vai
ajudar, eu sempre passo para as minhas amigas lá da ginástica; sobre a maneira de viver, de se
comportar, de remédio, de não muito médico... Você, não pode ser uma velha hipocondríaca; você
tem que ser velha, e agradável. Não pode ser uma velha chata, uma velha suja, fedorenta. Você, tem
que procurar se apresentar, da melhor maneira possível. Não pode querer impor, que no seu tempo,
era melhor, que agora, é pior. Que no seu tempo, era bom, não. Todo o tempo, é bom. Cada um, tem
que viver, o tempo da sua época, e tentar se adaptar às mudanças, que vão ocorrendo. As
mudanças, vão ocorrendo, e você tem que conviver, com elas. “(Ágata, 66 anos, casada)
5- Cuidado
Entrevistas:
“O que, que eu vou fazer? Deus me deu essa vida; o que, que eu vou fazer? Eu vou cuidar
dela; tratar dela, para ver até quando vai. Até aonde vai. Porque, também, tem disso; se
você, não trata bem da sua vida, ela não pode ir muito longe, não é? Então, o que eu faço, é
isso: é só tratar dela! (risos) Já que ele me deu, deixa eu tratar".(Prata, 78 anos, separada)
“Tratando, a pessoa melhora. Eu, nunca fumei; beber, não bebo; refrigerante, não bebo. Só
bebo, suco. Quer dizer, tem uma possibilidade melhor de tratar, uma saúde melhor. Não
abuso, procuro dormir bem, me alimentar bem, essa coisas... Cuidar da saúde. Porque, o
pessoal de 75 anos: "- ah, eu vou morrer amanhã, não tô ligando". Mas tem, que ligar! Meu
pai, morreu com 103 anos, mas morreu de velhice. Mas, com 103 anos, já desidratou todo.
Não tava mais ligando. Mas, é a idade mesmo; mas, foi trabalho do pessoal; a união, lá de
casa, sempre cuidando dele. E, morreu com 103 anos. Porque, se não fosse a gente, a cuidar
dele, morria mais cedo; se fosse uns filhos, que não liga pros pais, morria mais cedo. Ele,
não. Morreu, porque tinha de morrer mesmo." (Ônix, 75 anos, separado)
“Eu não! Quando chego em casa, tomo meu banho, e passo aquele creme cheiroso, no corpo.
Porque, a pele, já está enrugando, e a gente tem que cuidar. Tenho um creme, para passar
XVII
durante o dia, um creme, para passar durante a noite. Puxa, vocês novas, ainda tem alguma
coisa pra apresentar, que é a juventude. Eu, não tenho juventude. Então, a gente, que não
tem mais a juventude, tem que se cuidar.” (Rubi, 73 anos, viúva)
“Eu sou uma mulher, que não sinto nada. Não sinto dor nos dentes, não sinto dor de cabeça,
não sinto dor nos ossos. A única coisa, que eu tenho, é que sou hipertensa. Mas, isso, estou
cuidando, cuido mesmo. Tenho um médico, maravilhoso; então, quando me aborreço, sinto
que me aborreci, por algum motivo, corro pro doutor, tiro minha pressão. Eu controlo muito.
Porque, minha família toda, morre por problema de enfarto, coração. Então, eu sabendo
disso, procuro controlar minha pressão. Eu tomo remédio de manhã, e na hora que eu vou
dormir; tomo meu remédio, direitinho”. (Rubi, 73 anos, viúva)
"Eu não tenho tempo. Então, agora, na terceira idade, meu tempo é pra terceira idade
mermo; pro Prove; lá pra Barata Ribeiro; pro Sesc, lá na Tijuca. Então, minha vida, é assim.
Me alimento bem, dentro daquilo que a minha idade pode comer. Não sou, assim, de ficar
comendo gordura; me cuido. Minha alimentação é muito cuidada. Não como muita carne
vermelha, como mais carne branca, bastante salada." (Rubi, 73 anos, viúva)
“Hoje, eu já tenho o meu cuidado. Faço meus exames de sangue, meu check up. Tenho um
acompanhamento médico. Isso, acarreta uma coisa que é boa; mas, por outro lado, você vai
descobrir coisas, que nunca imaginava que fosse ter. Comigo aconteceu. Fui fazer um exame,
e deu adenoma na supra renal; essas coisas, acontecem. A gente escuta mais os médicos, e
também, tem mais preocupações.”(Jade, 69 anos, casada)
6- Aprendizagem
Entrevistas:
"Para preencher espaço. A gente, fica parada, em casa; tem que ter alguma atividade, fazer
alguma coisa, tá entendendo? E, amizade, também. Conhecimento, para ajudar a passar o tempo.
E, também, contato com outras pessoas. Eu, não tenho complexo, porque sou velha. Não me
incomodo, de ter contato, com gente mais nova, mais velha... É, o contato com outras pessoas. E,
às vezes, a gente desenvolve conhecimento, também, né?! Aumentar o conhecimento; tem
palestras, e a gente sempre pega, alguma coisa.”(Água-marinha, 75 anos, viúva)
“Porque, eu gosto de aprender. Tudo que eu tenho, possibilidade de aprender, eu aprendo. Se tiver
oportunidade de aprender, não tô gastando dinheiro, então, tá bom!" (Prata, 78 anos, separada)
“Eu falo mesmo, pra pessoas que ficam de moleza. Eu tenho uma irmã, assim, que é mole: - Gente,
não pode ficar assim, não. A máquina, que fica parada, muito tempo, enferruja. Você tem que dar
uma caminhada; você tem que fazer uma ginástica; você tem que fazer alguma coisa. A memória,
então. Eu gosto de fazer palavras cruzadas, eu aprendo muito. Gosto muito, de fazer. As coisas,
que eu não sei, vou no dicionário, procurar, pesquisar. Eu sou assim, sabe?" (Prata, 78 anos,
separada)
”É. Tudo que eu vejo de errado, eu anoto, que, depois na peça, eu encaixo. No IBMR, eu também,
já fiz isso. Porque, tavam inventando que estavam doente, tavam isso, e aquilo, para passar a
frente do camarada, né? Aí, os outros catucavam, porque não é legal, porque a pessoa, as vezes,
está doente, e precisa de ajuda, e outro que precisa mesmo, não vai pegar númer. E, você, que não
está precisando, vai usar uma coisa, que não há necessidade de você pegar, não tem necessidade
daquele remédio. Mas, só porque disseram que estava sobrando aspirina, você vai pegar aspirina?
XVIII
Não; deixa para aquele, que tem necessidade realmente, de aspirina, e não pode comprar; não tem
como comprar.(...)”(Ouro, 80 anos, viúva)
“Ampliar meu círculo de amizades, adquirir conhecimentos; e, colaborar, em alguma coisa,
também." (Diamante, 77 anos, viúva)
“Ajudou. Me jogou tudo isso. Você assistia uma palestra... cada vez, ficava um pouquinho, daquilo
que se ouvia. Pra mim, ficou muito. Então, eu vou juntando tudo aquilo, e amarra direitinho,
segura, e dá pra ajudar muito, a gente." (Ágata, 66 anos, casada)
"Eu não tinha uma coisa, assim, para mim, tipo um lazer. Então, eu vim mais por isso. Porque
tinha encontros, palestras; também tinha trabalho, que vinha pessoas, também, dar aulas,
palestras... Aprendizagem, também." (Pérola, 69 anos, viúva)
"Aprendizagem; eu queria aprender, tudo! Qualquer coisa, para aprender, eu quero.
Principalmente, trabalhos manuais. Porque, outra coisa, assim, é mais díficil. Mas, trabalhos,
assim, que eu possa botar o olho, e mexer com as mãos, eu quero aprender; quero aprender,
tudo!"( Pérola, 69 anos, viúva)
"O que me motivou, foi porque, ele disse, que tinha diversas atividades. Inclusive, tinha aula de
dança, e, ai, cheguei aqui, e tinha um monte de atividades. Não tinha só aula de dança, tinha
caminhada, tinha ginástica, fisioterapia... E fiquei, até hoje. Fiquei, só sentindo o tempo, que eu
perdi, de não ter vindo. Porque, todos esses grupos de idosos são uma maravilha. Além da gente
ganhar tanta coisa, ganha amizade, ganha conhecimentos; e, isso é, tudo bom, uma
maravilha."(Ônix, 75 anos, separado)
“Muitas coisas que eu não sabia, eu aprendi aqui. Esse programa: "Viva Bem a idade que você
tem", era muito bom (eram 10 temas dados através de palestras na atividade de orientação para a
saúde). Era muito bom para gente, muito informativo. Porque, como disse para você, quando se é
jovem, é só saúde, saúde, saúde; pelo menos comigo, foi. Só ia ao médico, para fazer
preventivo.”(Jade, 69 anos, casada)
7- Realização de projetos pessoais
Entrevistas:
“Mas gostaria de percorrer, ainda, muita coisa pelo Brasil. Fazer uma viagem pelas Serras
Gaúchas, é, pelas Serras Gaúchas, que é uma coisa que me interessava. Ir ao Nordeste , e, ir a
Portugal. É o meu sonho, conhecer Portugal." (Diamante, 77 anos, viúva)
“Computador. Eu não queria morrer sem aprender alguma coisa de computador. Isso, eu sempre
disse, desde 96: a primeira da lista sou eu, hein?! Porque, eu não quero morrer, sem aprender
alguma coisa. Eu não quero chegar, lá em cima, (no céu) e burra, burra. Isso é o que eu quero,
aprender. Quero aprender, alguma coisa de computação."(Ouro, 80 anos, viúva)
“Ah , outra coisa, eu tenho uma vontade tão grande de estudar. Eu não quero me formar, eu
quero mesmo, é estudar; pra quando tiver uma pessoa, assim, falando, a gente sabe, falá. Eu não
XIX
sei, e o pouco que eu sei, eu fico com vergonha, de falá.. risos. As vezes, eu vejo as meninas no
grupo: elas falam, discutem... Naquele dia, eu falei umas coisas, com aquela menina, a C. B.
(psicologa do projeto). Mas não sou de falar; não gosto. Eu acho bonito, a pessoa que sabe falá.
(Esmeralda, 84 anos, solteira)
"Aprender a dançar. Eu tenho uma vontade! Antigamente, eu dançava. Mas, depois que fiquei
mais velha, fiquei com medo de dançar. Eu acho uma maravilha, gente dançando; eu fico, assim,
olhando." (Esmeralda, 84 anos, solteira)
“Agora, Dra.L. P. disse, que vai arrumar pessoa, pra poder aprender informática. Eu disse - eu
tô lá. Vou aprender informática também, vou sim. As vezes, as pessoas falam assim: "-Pra que,
você quer aprender inglês, não vai viajar mesmo". Eu digo: - Ué, vou aprender porque eu quero
falar, ué!. As vezes, uma pessoa pergunta alguma coisa, na rua, e a gente fica sem saber. As
vezes, um americano pergunta um negócio aqui, eu chego ali, no mapa, e tinha que ensinar por
mímica. Pronto, a gente falando, é outra coisa.” (Esmeralda, 84 anos, solteira)
“Olha, eu gostaria, assim, muito é de tocar. Tocar um instrumento. Eu acho bonito, violão. Às
vezes, eu até tenho vontade. Lá em casa, tem até um teclado, da minha irmã, mas eu nunca mexi
nele. No curso normal, você estudava tudo. Você estudava música, pegava pauta, todas as claves
e você sabia fazer. Eu disse: - Meu Deus do céu, você sabia tanta música, porque que eu não fui
tocar violão?. Lá na minha cidade, as pessoas tocam muito. Ah, eu devia ter tocado, violão,
algum instrumento, violão principalmente." (Ágata, 66 anos, casada)
"Tudo que eu não fiz,eu queria fazer( risos)! Queria aprender mais, e conhecer muitas coisas,
que não conheci. Ainda, queria muita coisa, ainda." (Pérola, 66 anos, viúva)
"Tem uma coisa, que eu tenho muita vontade de fazer, e estou deixando um tempo para isso.
Porque o tempo, é contado. Hoje, se não tenho alguma coisa de manhã, para fazer, tenho de
tarde. Mas, o que eu gostaria de fazer, no momento, agora, é aula de dança. Eu dançava muito,
com meu marido, mas a dança, agora, mudou muito. Então, tenho que aprender, me atualizar.
"(Safira, 74 anos, viúva)
XX
Anexo VIII
Grupo Focal - Segunda fase da pesquisa de campo
Data: 09 de julho de 2001
Duração: 13:30 às 15:00hs
Local: Refeitório do Instituto de Neurologia Deolindo Couto –INDC/UFRJ
Participantes 13 pessoas: 11 usuários do Prove e 02 pesquisadores. Os nomes dos usuários
foram trocados por nomes de pedras e metais preciosos. A tabela com nome dos entrevistados
se encontra em Anexo V.
1- O que você s vem buscar no grupo, aqui no prove?
(Diamante) - Eu vim ampliar meus conhecimentos, sobre saúde, sobre política do idoso,
sobre vários assuntos...
(Cristal ) - Eu gosto muito de assistir, de ouvir palestras, entendeu? Então, quando eu soube
que aqui havia palestras, eu procurei vir. E outra coisa, também, por causa da convivências
com pessoas idosas. Porque a gente, fica em casa, e a gente não tem esse tipo de convivência.
Quer dizer, eu não, porque eu tenho muitos amigos, na minha faixa etária, mais velhos, mais
novos. Mas sempre é bom, ampliar o círculo de amizades. Eu gostei muito dessa experiência.
(moderador) - E vocês, o que vocês acham?
(Jade) - É, para conhecer novas pessoas, e para mim, sempre tem sempre algo a
acrescentar... (Célia) É, esclarecimento! Esclarecimento. Às vezes, você tem dúvidas que
quer esclarecer, e, um tem uma opinião aqui, outro tem outra opinião diferente. Você chega,
aqui, para ter uma opinião mais balizada, mais científica.
(Prata) - Eu vim, através de uma amiga. Eu tava procurando alguma coisa para fazer... ela
então, me indicou que, aqui, tinha teatro, tinha uma porção de coisas. Então, eu vim. Gostei,
fiquei no teatro, e estou há três anos, já no teatro. Tenho assistindo as palestras, e, não faço
mais aulas que tem aqui, como pintura e tudo, porque tenho alergia, se não, faria também....
Eu gosto daqui: conhecimento, a reunião das colegas, a gente sempre faz umas festinhas, os
aniversariantes, essas coisas, assim, que tudo isso, é importante para a nossa idade.
(Esmeralda) As nossas colegas, são boas. É muito bom a gente conviver com as pessoas,
sempre tem novidades. Eu vim, aqui, com a Lápis lazuli, que ela falou, que era muito bom,
então, eu vim...
(Diamante) - E, cadê a Lápis lazuli , não tenho visto?
- Está lá com a irmã doente...
(Rubi) - Eu vim mais, porque lá em casa, depois que tem filhos... eu tive muitos filhos, tenho
netos, bisnetos, e nossos filhos, acham que a gente, quando fica com mais idade, assim, tem
que tomar conta dos netos, dos bisnetos. E eu, tô fora disso, de tomar conta de netos e
bisnetos. Porque eu, já tomei conta dos meus filhos, e eu nunca deixei meus filhos com
ninguém. Eu não vou ficar em casa, não. Ficar em casa, pra ficar tomando conta de netos e
bisnetos? E, os filhos ficam se abanado por ai? Vou fazer a mesma coisa, que eles estão
fazendo, faço a mesma coisa!
(Safira) - Eu vim, através da Lurdes. Aí, quando eu cheguei, vim até no início, sou uma das
primeira daqui, sou o numero 09. Aí, eu peguei, vim com a Lurdes, nos inscrevemos. Eu vim,
gostei; achei, assim, as palestras muito boa. Porque, eu gosto muito das palestras; e também,
tinha outras atividades, tinha dança, tive no teatro, tive na fono. Assim, fiz muita coisa aqui
dentro, e eu gosto da convivência, conhece o pessoal da nossa idade. Isso é muito importante,
porque hoje, em dia, quase não tem ninguém para conversar com você não é? Porque a vida
é muito corrida. Então, eu achei ótimo. É um meio, da gente ficar assim, conversar, não é?
(Prata) - A gente, sempre aprende mais alguma coisa, sempre... é, como minha mãe dizia: a
gente aprende, aprende, e morre faltando alguma coisa, para aprender...
(Moderador) - Citrino, o que você acha?
XXI
- Eu acho maravilhoso. Eu vim, por intermédio de uma amiga... por curiosidade, curiosidade.
Mas gostei, me sinto muito bem, as vezes, sou faltosa.
(Rubi ) - É muito bom mesmo, a turma da nossa idade...
(Esmeralda) - Tudo camarada, né?
(Diamante) A gente troca idéias... é muito interessante, essa convivência...
(Rubi) - E, pra nossa idade, é bom, porque, as vezes, a gente fica pensando: será que tá
certo? Porque, as vezes, a gente pensa que tá certo e tá errado. Então, a gente encontra com
a turma da terceira idade. Todo mundo junto... Ontem mesmo, eu tive com um amigo meu,
que tem a minha idade, 73 anos, que me disse: "- Você sabe que tem dias que eu penso que
estou ficando louco?". “ -Não Brás, você não tá ficando louco, não. É a idade. Se você,
participasse da nossa turma da terceira idade, você não ia pensar que você está ficando
louco”. É um homem inteligente, advogado, tem dinheiro, mas está com 73 anos., A mulher,
morreu, e ele fica trancado só dentro de casa. Então, ele fala pra mim, que pensa que tem
horas que ele tá ficando esclerosado; que está ficando louco. Esclerosado, eu até admito.
Porque fica só socado dentro de casa; não faz nada, fica só lendo. Para ele, agora, só
palestra. Palestra é bom, porque ele participa, dá aquilo que ele sabe. Porque, ele é
advogado, e sabe muita coisa que a gente não sabe, mas ele não fica só socado... Bonito ele,
sabe? Só porque a mulher morreu? Meu marido também morreu! E eu vou morrer com ele?
Eu? (Risos da turma). Quem morreu foi ele, não fui eu.
(Diamante) - Ele nem acreditava, não é? risos
(Moderador) Pérola, você chegou agora, a gente está falando do motivo pelo qual vocês
vieram? O que vocês vieram buscar no grupo?
(Pérola) - Eu vim, porque eu gosto muito de bingo, e era um dia que ia ter bingo aqui, e uma
amiga minha me trouxe. Mas, eu não sabia do que se tratava. Quando cheguei aqui, essa
minha amiga, só veio essa vez, e eu fiquei, até agora. Participei muito, menos agora, porque
estou trabalhando, mas gostei muito, de conhecer as outras colegas. Aprendi muito, a gente,
aprende um monte de coisas. Eu adorei aqui; gostei, principalmente, das pessoas que
conduziam o grupo... (cita os nomes da equipe profissional do Prove)
- F. já veio depois,
- F., foi também, um esteio aqui, e ainda é...
(Prata pergunta para Pérola ) - Você não só aprendeu, como nos ensinou também, não é?
(Pérola) - É verdade...Eu vim, quando tinha uma professora, a tia da menina da medicina,
não é? Eu aprendi, ai, vim ensinar. Ensinei mais de 3 anos, adorei ensinar, mas a minha
turma aprendeu e...
(Ouro) – Mirna, a bem da verdade, eu queria dizer que foi a Pérola e o F., que em 99
seguraram o Prove. Quando veio aquela invasão toda, ela e o F., é que seguraram o Prove.
(Pérola ) - Obrigada!
Pérola pergunta por uma pessoa do prove que está sumida.
- É D., ela tá no Leme, no IBMR, mas D. não tem lugar certo não, tá em todos os
lugares...mas, não faz vínculo em lugar nenhum
- Ela não pára em lugar nenhum, não.
- Ela é universal...
As outras olham para Topázio e falam que ela ainda não falou...
(Topázio) - Eu ainda não tinha tido oportunidade... Eu vim, porque essa minha amiga,
(aponta para Jade) me trouxe para cá... Eu gostei, e fiquei.
(Moderador) - Mas, o que te motivou a vir?
(Topázio) - A mim, me motivou...( barulho na fita) a gente, estar numa de igual para igual, às
vezes, os jovens não tem tempo para vir conversar, nem a gente se entende, também. Então,
aqui, a gente se entende. Tudo a mesma faixa etária, eu gosto; muito bom. Faz muito bem,
para a cabeça, e o para o espírito, também. E, o conhecimento que a gente vai acumulando,
não é? É isso ai. Eu também gostava muito do bingo, tinha aquela festinha do aniversariante
XXII
do mês...
(Ouro ) - Todo mundo gosta!
2- A maioria de vocês estão aqui desde 96... Maruja, o que você acha que faz
com que as pessoas permaneçam aqui tanto tempo?
(Jade) – O que faz com que permaneçam? É justamente o que as colegas falaram: essa união.
O que nos acrescenta, são coisas muito positivas. Embora, balançou, como a Ouro disse com
a greve, não é? Mas, no fundo, no fundo, nós sempre continuamos unidas. Por que? Porque,
é interessante para gente. O quanto acrescentou de bom, para gente: conhecimentos de
coisas que a gente não sabia. O que a Topázio falou, de terem pessoas para conversar, de
igual para igual, e, nos gratificamos com as pessoas, entendeu? Porque, dentro de casa, é
sempre aquela rotina. Eu acho, muito importante esse convívio, para pessoas da nossa faixa
de idade.”
(Ouro) - Eu acho, que o que nos prende aqui, é o conhecimento científico. Porque, os
professores que vem aqui, são atualizadíssimos. Trazem sempre novidades, derrubam aqueles
tabus que a gente tinha, e que vem trazendo, e que tem que ser firmemente combatidos.
Então, eu acho, que é isso. O que traz a gente, são as palestras...é o que nos prende aqui.
(Diamante) - Eu acho, que o que nos segura aqui, é os laços de afetividade construídos
(gesto), e o carinho de vocês e da Dra. L.P., porque ela, é fora de série, é excepcional, ela
tem um carisma muito grande, de prender, de cativar as pessoas.
(Safira) - Faço dela, as minhas palavras, a mesma coisa.
(Rubi) - Há duas semanas, eu fui ali no asilo, e eu vi pessoas que poderiam estar
participando de alguma coisa, igual como nós participamos. Mas, não. As mulheres ainda
novas, as vezes, mais novas que a gente, tão lá no asilo, sem fazer nada...Se ela fizesse, tudo
aquilo que nós fazemos, participamos, aqui; acho, muita gente ia sair do asilo! Porque, eu
acho muito triste, muito triste, mesmo. Tão lá, pagando para ficar num asilo. Por que?
Porque eu acho, que elas não tiveram incentivo da família. E, também, não tiveram força de
vontade de participar. Nós, temos incentivo da família, e a nossa força de vontade, que é uma
coisa muito importante! Se, a gente não tiver força de vontade, a gente vai cair mesmo, não
adianta.
(Topázio) – Talvez, essas pessoas do asilo, não tiveram a oportunidade, de ter umas pessoas
amigas que dedicassem...que a direcionassem...que incentivassem...
(Jade ) - Na nossa sociedade, tem pessoas muito solitárias. Ficam muito isoladas. As pessoas,
também, tem que se ajudar, a procurar...
(Ouro) - Quando as pessoas não estão isoladas, estão relegadas a segundo plano.
- (Moderador) As pessoas do asilo?
(Ouro) – Não, as pessoas idosas. E, aqui, não. Aqui, nós temos uma outra família (gesto).
(Jade ) - (...) Foi uma porta, muito grande, que se abriu no meu mundo...
(Prata ) - Mirna, você não acha, que é falta de iniciativa desses asilos, para com as pessoas
que estão lá? Porque, nós temos a nossa casa para morar, eles moram lá... a direção do
asilo deveria promover essas coisas, para as pessoas não ficarem, assim, tudo com cara de
boba...
(barulho na fita, muitas pessoas falando ao mesmo tempo)
(Pesquisadora-observadora ) - Mas o problema não é esse, o problema é por que ele foi
até lá?
(Diamante) – Não. É falta de gente para tomar conta. Não tem casa para morar, o que
ganha, não pode pagar um lugar; e lá, não, né!
(Safira) – Olha, eu fui num lugar, mas lá, não é assim, um asilo; as pessoas pagam
caríssimo...
- É um pensionato?
XXIII
(Moderador) Todos vocês, já foram alguma vez a um asilo?
(Cristal) - É deprimente!
(Safira) - Eu já fui, uma vez, num asilo dançar caipira. Num asilo que as pessoas pagam...
Porque hoje, em dia, a verdade é essa. Os filhos, não querem ficar com os velhos, nem com a
mãe, nem com a tia, nem com ninguém. Acham que incomoda, então, já bota lá. Olha, eu
fiquei impressionada com uma senhora, de 92 anos. Mas, olha, uma gracinha: ela dançava,
me abraçou e disse: “- Vem sempre aqui, é muito bom, a gente ver gente diferente, vem
sempre aqui dançar pra gente”. Mas, tem muita gente, assim, entendeu? Bem ainda, muito
bem sabe? Mas, os filhos, não querem aturar. Às vezes, ficam lá visitando, um pouquinho,
aqueles, que ainda, vão. Porque tem uns, que nem vai, sabe como é...
(Diamante) - Sabe o que é? Os asilos, deveriam promover atividades... Agora, acontece que
eles não querem gastar dinheiro... Porque promover uma reunião, uma atividade implica em
investimento; tem que pagar um professor, uma professora, e, provavelmente eles não
querem fazer isso. As vezes, também é questão de espaço; as vezes, não tem espaço, porque
um professor de Tai Chi Chuan, uma coisa dessas, era uma coisa que daria um bom
resultado. Uma coisa muito benéfica. Num asilo, uma pessoa de trabalhos manuais, de
música, de canto, de dança, seriam muito benéfico; agora, provavelmente, os asilos, não
querem isso.
(Esmeralda )- Foi aonde? Eu fui num um espetáculo, tive curiosidade, uns quartinhos tudo
bonitinho, arrumadinho, as caminhas tudo bonitinha...
(Cristal) - O que falta é formação da direção. Porque a direção, é tudo em qualquer lugar.
Você vê, o Prove tem tido sucesso. Por que? Porque nós, temos a direção da Dra. L. P., o que
ela proporciona para nós! Eu disse para você, que eu gosto imensamente de palestras. A
Dra. L.P., consegue ótimas pessoas gabaritadas. Como a Ouro falou para vir aqui para fazer
palestras, e como a Diamante acabou de falar; nós, quando temos, assim, um problema; nós,
quando chegamos perto dela, nós sentimos nela aquele amparo, aquele acolhimento. Essas
atividades todas, que nós fazemos. Se não pudemos fazer uma coisa, vai para outra. Por
exemplo, eu deixei o teatro por problema de visão. Então, quando a gente não pode fazer...
Eu fiz o artesanato, fonoaudiologia, temos aula de inglês. Então, nós temos o que fazer. Nós
temos tido o que fazer! Outra coisa, essas atividades todas, nos tiram de casa. Porque se não,
nós acabamos fazendo o que? Nós não temos para onde ir, e vamos ficar em casa, sentada,
vendo televisão? E, cada vez mais, vamos ficando mais apática (gesto), mas emudecida, de
ficar dentro de casa. E, esse convívio, que nós temos, umas com as outras, sabe... Então, eu
acho, que o Prove, você não pode analisar, assim, por uma determinada coisa. A gente tem
que ver o todo; existe um todo. E, eu acho, que é esse todo, que nos prende, a nós todas,
aqui.”
(Pérola) - Eu tenho uma coisa, muito interessante. Eu tenho, além de ter minhas amigas
daqui, e de outros grupos, eu tenho amigas que não saem de casa. Então, eu noto, que a
cabeça nossa, aqui, de todas... decora texto, essa ai, também, essa...e, cria, assim mesmo na
hora, vamos fazer assim, e assim se faz. E, eu tenho outras, mais novas... Eu tenho amigas, eu
tive agora, numa festa, lá do colégio... Meu Deus, ela é mais nova que eu, 10 anos, eu estou
com 75, e ela está com sessenta e poucos; mas a cabeça está tão apertadinha...
(Diamante) -Tá atrofiada!
(Pérola ) - É, eu acho, que ela foi fechando o círculo, não busca mais nada. Em meia hora,
ela pergunta uma coisa, só cinco, seis vezes. Então, a cabeça dela, tá atrofiada. Mas, outra,
não é só ela. E, eu vejo, as pessoas aqui (aponta para as colegas), com a cabeça ótima! Eu
não sei, eu fui fazer um teste lá na UERJ. Ai, sentou uma moça, primeiro do que eu, e fez lá o
teste. Perguntou umas coisas, quando ela saiu, no final, pegou um papel e disse: “- Você vai
lá, em tal lugar”. Aí, fui eu, sentei, fez lá, as perguntas, colocou número, e, quando foi no
final, eu perguntei: - A senhora não me deu aquele papel?. “- A senhora não precisa, acertou
tudo!”. Então, eu estou bem, ainda, né?
(Moderador) Então, você está falando, da diferença que você percebe, entre as pessoas
XXIV
que ficam em casa, e as que participam de grupos. O que vocês acham disso?
(Ouro) - Eu acho muito natural... se os neurônios não são muito usados, eles vão se
perdendo, é isso mesmo.
(Pérola) Se, a gente fica com um braço, o tempo todo assim (faz o movimento), depois, é
difícil para recuperar o movimento, e a cabeça... acho que ainda é...
(Diamante ) - Mais sensível.
(Pérola ) – E, é a cabeça, que domina tudo.
(Rubi ) - Eu participo, aqui, mas minha família, não me incentivou nada. Meus filhos, meu
netos... já tenho neto, de 35 anos. Ninguém me incentivou nada. Participo, porque eu quero.
Participo daqui, participo na Barata Ribeiro, no grupo Sol, participo da ginástica lá na
Tijuca. Mas depende muito do meu temperamento. Se depender dos meus netos, eu não
participo de nada.
(Pesquisadora -Observadora) Quer dizer, que a questão da independência é uma coisa
séria, não é?
(Diamante) - A liberdade que a gente tem, na terceira idade, é maravilhosa. É a melhor
idade...
(Pesquisadora- observadora) - A gente ganha independência, você acha isso?
(Diamante) - É, eu acho...
(Jade) - Sempre que a gente se defenda, por conta própria. A gente, tem que conservar a
nossa atividade, o nosso dinamismo, a nossa autonomia. Ai, é importante.
(Cristal ) - “- Uma outra coisa, que eu acho importante, que a Dra. L. P. faz, é encaminhar
as pessoas para os médicos, quando elas necessitam. Isso não foi dito, em momento nenhum,
por isso estou falando. Algumas pessoas, tem plano de saúde, mas outros, não tem. E está
muito difícil, o acesso aos hospitais e aos médicos. Você vê: quando ela encaminhou, lá para
o Hospital da Lagoa, por problema de visão, quantas fizeram operação de catarata? Ela fez,
ela fez, e com uma pessoa gabaritada, que é o Dr. M., muito competente, não é? Outras,
precisaram ir lá na cidade, fazer outros exames preventivos. Então, esse cuidado, que a Dra.
L.P. tem, sabe... Eu, por exemplo, tinha aquele problema de artrose; eu até, melhorei, não sei
porque. Andei caminhando, e tudo. Eu fui lá no Fundão, o médico me atendeu muito bem;
olhou minha radiografia, olhou meu joelho... Então, esse cuidado com a saúde, que eu acho,
assim, muito importante. Quantas de nós, não se beneficiam por causa disso?”
(Moderador) - Vocês estão falando do cuidado com a saúde?
(Jade) - É, não são só as palestras. É, também, essa parte física. Eu acho muito importante.
Porque, alguns tem planos de saúde, mas quantos não tem plano de saúde; não tem condição,
pelo preço em que estão. Eles estão caríssimos... mas, nós temos essa possibilidade,
entendeu?
3-Que espaço vocês encontram, aqui, para se expressar? Vocês encontram
espaço aqui para se expressarem?
(Jade ) - Claro que sim... e para trocar idéias.
(Topázio) - Vocês também nos consultam, não é? A gente dá opiniões. Somos convidados
para nos expressar, não é? Somos sempre solicitadas, para participar das coisas. Então,
temos espaço...
(Rubi ) - Desses lugares, que eu participo, o melhor, é aqui. Que dá oportunidade de
participar de muitas coisas. A gente vai participando, e vai sentindo, que aqui, é bom pra
gente, mesmo. Ah, porque pessoas falam... não sabem, o que tá perdendo... risos.
(Jade ) – Aqui, o espaço físico, é sempre questionado, não é? Mas nós temos conseguido
desde que começou, não é?
(Moderador) - Esse espaço físico vocês foram conseguindo com a participação de vocês...
(Jade) - Não é? Então, é tudo positivo... essa é a minha opinião.
XXV
(Rubi)- Na semana passada, eu falei com a minha filha de 54 anos, que tudo ela esquece
tudo: - Você tem que entrar para o Prove, em?! risos.
(Diamante ) – Ah, eu esqueço, eu tenho que anotar tudo...
(Zilah )- Eu não esqueço, nada. Eu não escrevo nada...
(Moderador) – Esmeralda, e você?
(Esmeralda ) - Eu? Tá tudo muito bom. Sou muito bem atendida, aqui. O pessoal, é muito
bom, muito camarada, podia só voltar o aniversariante do mês...
(Prata ) - O aniversariante do mês já voltou... (explica como é a nova dinâmica das
atividades do Prove para o grupo)
(Cristal) - Está sendo muito bom, para gente, o trabalho das sextas-feiras, que a
fonoaudiologia está fazendo com a gente. Tá fazendo uma terapia, esqueci o nome; mas eu
sei, que nesse trabalho, as pessoas se abraçam, as pessoas se beijam, as pessoas se olham
nos olhos, entendeu? E isso, está criando um laço afetivo, enorme. Eu estou sentindo isso,
sabe? Tem até uma moça, que ela tem problemas, e ela tá tão chegada. Nós estamos
chegadas a ela, e ela a nós; muito interessante, não é? Vocês também não estão achando?
(Rubi) - Ela está maravilhosa. Ela está se soltando. Ela se libertou, como é que pode? Não
sei, ela se libertou, rapidamente. Tudo que mandam ela fazer, ela faz tudo direitinho; uma
beleza. Ela se libertou mesmo.
(Cristal) - Essa moça, ela está se desenvolvendo muito sabe? Ela sente o apoio da gente todo,
entende? (expressão).
4- Jade, como você sente que a sua participação aqui mudou? O que mudou?
(Jade ) - Na minha pessoa? Ah, mudou, muito bom.. Me sinto muito bem. Acho, que tudo isso,
faz parte, o convívio das pessoas... O negócio da gente quando vai ficando velha, é que...
convivendo com pessoas, da mesmo idade, eu não sinto a pessoa que eu sou, Jade de sessenta
e nove anos. Eu me sinto....como você, assim, como estou falando (expressão). Então, isso me
faz bem. Eu vejo, o quanto vocês, estão lúcidas; o quanto vocês, ainda estão contribuindo
para o aprendizado. Porque é um aprendizado, uma reunião dessas com vocês, o contato com
vocês, que também passam muitas coisas boas para gente. E eu agradeço, por estar viva, e
poder participar de tudo isso...Mas, você Mirna, também passa coisas positivas, juventude.
Juventude, também faz parte da terceira idade. Acho muito importante. Não é, só ter o grupo
da terceira idade, tem que ter gente jovem, para renovar...
(Diamante) - O contato com a juventude, nos faz muito bem. E, é necessário. Eu, tenho filhos,
e tenho netos. Mas, eu só tenho uma neta, de 19 anos, ela é muito carinhosa, gosta de dançar,
e me faz dançar...risos. A gente se diverte. Ela faz a festa, e eu a orquestra da festa. A gente
brinca mesmo; eu me sinto jovem, igual a ela. Só, que não tenho a resistência dela...
(Moderador) – Ouro, e você, você percebe que mudou alguma coisa?
(Ouro) Eu acho, que é isso. Não é só uma coisa. Foi o que ela falou, o que eu falei, foi a
reunião de tudo isso. Uma vai lembrando uma coisa, a outra vai lembrando outra... Quer
dizer, é a vivência, é a vivência de tudo... que dá orientação para a nossa vida. Quer dizer,
orienta, até a maneira da gente pensar, de agir com o colega, tem colegas mais sensíveis tem
outros...
(Diamante) - Mais rabugentos... risos
(Esmeralda ) – O Ouro, o que você acha daquela reunião, do posto de saúde da terceira
idade?
(Ouro) - Eu acho muito bom. É um trabalho mais social, muito pouca palestra, não tem quase
palestra...
(Moderador) - E o que você acha, Esmeralda, o que te motivou, a perguntar isso?
(Esmeralda) - Eu gosto de lá, e eu freqüento o Hospital da Lagoa, que tem terceira idade de
lá.
(Moderador) - Já que você está falando, você sente que mudou alguma coisa?
XXVI
(esmeralda) – Não, daqui eu gosto muito, também...
(Ouro) - É diferente (falando da diferença entre os grupos). A assistente social, trata de uma
por uma, e todo mudo fica sabendo do problema de uma. Então, o problema dela, serve
como experiência. Mas falta um planejamento total.
(Moderador) - Vamos retomar a questão: Vocês estão falando da diferença entre os
grupos, mas o que estou colocando, é o que, em vocês, mudou, a partir da participação
no grupo?
(Ouro) - Claro, claro. Até, de separar, o joio do trigo. Saber escolher, saber ver o que é bom,
o que é mais ou menos, o que é ruim...
(Diamante ) - Eu achei, que a partir dessa participação, eu me sinto mais feliz como idosa.
Eu nunca fui complexada, não. Mas, atualmente, eu me sinto privilegiada por ter chegado a
essa idade! (expressão) E, peço a Deus que me conserve com saúde, com essa disposição,
com essa alegria de viver, de valorizar as coisas boas, de não me preocupar muito com as
coisas ruins...
(Jade) - É um prêmio. Chegar a essa nossa idade, é um prêmio. A gente está lúcida, e dá
conta da gente...
(Rubi) - Eu gosto tanto, que era para mim vir hoje, e eu vim na semana passada (Rubi
antecipou a reunião e veio na data errada mas voltou hoje).
(Topázio) - Eu acho, que para mim, tudo isso tem sido muito importante. Porque a gente, tem
a oportunidade, de analisar um pouco o total do ser humano. Cada pessoa tem uma cabeça,
tem uma expressão, tem uma maneira de pensar. E, isso, é que faz, a gente entender os outros
melhor, também.
(Ouro ) - Ser mais tolerante, ser mais compreensivo...
(Topázio ) - É ... Porque, se você se fecha, aí nada. Você fica, assim, (gesto) obtusa. Mas
assim, não. A gente, convivendo com os demais, cada um fala uma coisa, umas pessoas tem
mais cultura, outras menos, mas procura tirar o melhor...
(Ouro ) - A gente vai ensinando, e vai aprendendo.
(Prata) - Para mim, mudou. Quando eu entrei aqui, foi uma transformação, por causa do
teatro. Isso para mim, melhorou bastante, em tudo, sabe? Eu, sempre fui muito de sair, de
viajar, de não parar em casa. Hoje, por causa do compromisso aqui, eu sempre vou e volto.
Porque eu tenho um compromisso aqui, às segundas-feiras. Eu faço, o que eu gosto; decoro
tudo, graças a Deus, tenho uma memória boa... o professor., dá aquele papelzinho, que é
chato, então, eu vou mais pela minha cabeça, que é a mais nova de todas... risos
(Moderador) – E, você, Pérola ?
(Pérola) - Eu nunca me senti... e, olha, que eu tenho idade, mas velhice, não. Eu sinto, assim,
eu tenho 75 anos, mas eu não me sinto velha. Eu me sinto, assim, eu acho, uns 30 anos. Eu
faço, o que qualquer pessoa de trinta anos, faz: acordo cedo, arrumo a casa, vou para loja,
venho almoçar, volto par loja, de noite, tem qualquer coisa ainda, saio. E, eu faço coisas, que
pessoas de trinta anos, não faz, se sente cansada. Eu, até agora, não senti ainda... eu, me
sinto com bastante idade, muita vivência, mas, velhice, não. Ah, cabelo branco? Acho lindo!
Essa papadinha aqui? (risos da turma). Se eu não tivesse, eu não era normal. Então, eu me
sinto com bastante idade, com saúde, e não me sinto velha.
(Prata ) - O pior, é se sentir velha. Eu nunca me senti velha. Tenho 78 anos, e nunca me senti
velha,... Agora, velha não, sou idosa...
(tumulto...)
(Ouro ) - Eu, Citrino e Esmeralda já passamos de 80.
(Cada um vai falando as idades rindo muito...)
(Topázio ) - Você vê? Como é um grupo otimista!
(Ouro ) - O que importa, é o humor gente. No dia que você tá mal, tá com 100, no dia em que
você está ótima, tá com 50!
(Moderador) - Dando continuidade Cristal ?
(Cristal) Oh, Mirna, eu não senti, assim, grandes transformações, não. Acontece, que até 96,
XXVII
eu trabalhei. Então, eu tinha muita atividade; em 96, eu me aposentei. Então, eu vim pra cá,
foi quando eu vim, pro grupo. Eu apenas dei continuidade, as minhas atividades... Lá, eu
tinha atividades de lá, de repente, me aposentei, e fiquei sem fazer nada. Então, eu vim para
cá.
(Diamante) - A aposentadoria, às vezes, deprimi muito a pessoa. Quando a pessoa não sabe
enfrentar, não tem apoio, as vezes, a pessoa entra em depressão. Porque fica em casa, não
sabe o que fazer. É um período, que a pessoa devia ser preparada...
(Rubi) – Mas, eu acho, que dói mais, no homem do que na mulher. Porque, a mulher se
aposenta, e em casa ela sempre tem mais afazeres; o homem, não. Só depende do trabalho
pra casa; então, quando se aposenta, entra em depressão.
(Esmeralda ) - Não me fale em depressão. Não quero saber de depressão...
(Ouro ) - Estando aqui, no Prove, é difícil ter depressão.
(Diamante ) - É, aqui, a gente não tem depressão, não.
Risos...
(Moderador) - E você Safira ?
(Safira) - Pra mim, foi muito bom. Eu aprendi muito, assim, negócio de política com as
palestras. Então, pra mim, foi muito bom ter essa parte; a parte de médicos. No início, nós
tínhamos muitas atividades, e podíamos participar de todas, porque não tinha tanta gente;
mas, para mim, foi ótimo. Não tenho o que dizer. Para mim, foi muito bom. Eu fiquei, assim,
assim, essas amizades que a gente tem com as colegas, faz muita falta, né?! Eu achei ótimo.
(Rubi ) - Outra coisa, o Prove, aqui, foi a primeira porta que se abriu para a terceira idade.
Eu, depois que entrei aqui, para o Prove, é que eu passei a participar de outros lugares. Mas,
a primeira porta que abriu, pra gente, da terceira idade, foi aqui. Aqui, a gente se sente
muito bem. Então, aqui, eu me sinto maravilhosamente bem, aqui no Prove...
(Diamante) - Eu acho, que com o objetivo do Prove, só existe o Prove: de promover o
envelhecimento; de valorizar a terceira idade, do ponto de vista de saúde; de atividades, de
movimentação; eu acho que só existe o Prove...
(Rubi ) - O Grupo Esperança também valoriza essa questão de saúde, eles também se
interessam, mas eu acho, que não é tanto quanto o Prove.
(Pérola ) - Aqui tem mais conteúdo, não é?
(Safira) - Para você ver. Eu era do SESC Copacabana, vim aqui, e gostei mais, e fiquei...
(Moderador) - A maioria de vocês começou aqui, eu percebi isso nas entrevistas..
(Pérola ) - Eu não sabia que existia, quando eu vim pela primeira vez, aqui.
(Diamante) – É, eu também, não sabia que havia esses grupos, assim... Agora, uma coisa
que eu acho com o Prove: o pessoal mesmo interessado, continua, os outros...(gesto de
dispersão).
(Ouro)- Eu acho, que aqui é a sede. A gente aproveita um bocadinho dali que é bom, outro
bocadinho dali, que é bom. Mas a gente fica mesmo, é aqui. Porque lá, tem algo de bom
também, porque senão, a gente não teria ido lá, a gente aproveita um bocadinho daqui, e
dali, e traz para aqui, e fica aqui. Aqui, é a casa da gente!
(Moderador ) Termina o grupo agradecendo às pessoas pela participação na pesquisa e
avisando que após a defesa da dissertação será feita a devolução dos resultados.
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