“O PROCESSO DE HIPERFLEXÃO” António Filipe Canelas Pinto

Transcrição

“O PROCESSO DE HIPERFLEXÃO” António Filipe Canelas Pinto
“O PROCESSO DE HIPERFLEXÃO”
António Filipe Canelas Pinto
MAFRA
2007
“O PROCESSO DE HIPERFLEXÃO”
TESE PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE DE EQUITAÇÃO
António Filipe Canelas Pinto
MAFRA
2007
ÍNDICE
Pág.
AGRADECIMENTOS
I - INTRODUÇÃO........................................................................................................ 1
II - OBJECTIVOS ......................................................................................................... 2
III - HIPERFLEXÃO: UMA TEORIA DIFERENTE DO TREINO DE ENSINO.......... 3
IV - OS PROBLEMAS DA HIPERFLEXÃO.............................................................. 11
1. Montando com a mão .......................................................................................... 11
2. Sinal de Submissão .............................................................................................. 14
3. Enrijecimento do maxilar e língua (o cavalo que baba) ........................................ 15
4. Respiração ........................................................................................................... 15
5. Campo de Visão .................................................................................................. 16
6. Efeitos no pescoço ............................................................................................... 17
7. Efeitos nos andamentos ....................................................................................... 24
7.1 DAP (Posicionamento em Avanço do Membro Posterior) e o Basculamento do
Cavalo ................................................................................................................. 26
8. Efeitos na concentração ....................................................................................... 29
V – A NOSSA VISÃO SOBRE O TRABALHO EM HIPERFLEXÃO ....................... 32
VI – CONCLUSÃO .................................................................................................... 39
VII – BIBLIOGRAFIA E MEDIAGRAFIA ................................................................ 40
AGRADECIMENTOS
Antes de mais gostaria de deixar bem expressos os meus sinceros agradecimentos
a todas as pessoas que directa ou indirectamente colaboraram na realização deste
trabalho e sem as quais o qual jamais teria sido possível concluir.
Sem querer particularizar muito não posso deixar de agradecer à minha família,
em particular à minha mulher Sofia por todo o apoio prestado, bem como aos meus
amigos que me ajudaram na elaboração deste trabalho e a todos aqueles que
contribuíram para a minha formação equestre.
O processo de hiperflexão
I - INTRODUÇÃO
A hiperflexão é um “método” de trabalho do cavalo de ensino numa atitude baixa e
redonda, ao qual no início se chamou “Rollkur” (denominação germânica) ou
“Overbending” (denominação anglo-saxónica). Este “método” tem suscitado uma
grande polémica a nível mundial na modalidade de dressage, daí a Federação Equestre
Internacional (FEI), preocupada pelo bem estar dos cavalos não só durante os concursos
internacionais como também no seu trabalho diário em casa, ter reunido, em Janeiro de
2006, cavaleiros, treinadores, médicos veterinários e juízes, para debaterem este
“método” controverso de treino e as suas consequências para a saúde do cavalo. Como a
palavra “Rollkur” não era muito compreensível decidiram escolher um termo mais claro
daí a expressão “ hiperflexão do pescoço “, com a seguinte definição: «técnica de
trabalho para obter um grau de flexão longitudinal. A hiperflexão só pode ser mantida
pelo cavalo durante curtos períodos.» (FEI, 2006).
Este fórum teve como objectivos:
- Estudar melhor este “método” de treino;
- Considerar as possíveis implicações veterinárias;
- Perceber melhor a biomecânica que este movimento do pescoço implica;
- Escrever um relatório para a FEI para ser delineado um plano de acção.
No seguimento das apresentações preliminares de diferentes projectos de
investigação no domínio da fisiologia, da radiologia, da biomecânica, o comité concluiu
que quando a hiperflexão era utilizada por treinadores competentes não haviam provas
científicas de que este “método” fosse abusivo para o cavalo. No entanto, a sua
utilização por pessoas inexperientes poderá ser uma ameaça para o bem-estar e
integridade física do cavalo. Apesar destas conclusões preliminares, ficaram por ser
aprofundados os seguintes temas:
- Uma definição detalhada do que é abusador, factor de stress ou de mau estar;
- A formação das pessoas habilitadas a verificar os abusos deste “método” que não
existe só na disciplina de dressage;
- A Comissão Veterinária e a Comissão de Dressage voltarão a estudar este
“método”, entregarão um relatório à FEI e decidirão qual a investigação científica que
ainda é necessária.
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
O tema continua a ser controverso, daí o nosso interesse pela questão, até porque em
causa está o “método” de trabalho de cavaleiros de ensino com grandes resultados como
a campeoníssima mundial e olímpica da modalidade Anky Van Grunsven. Estávamos
no início da pesquisa quando procurámos entrevistar a Presidente do Comité de
Dressage da FEI, Mariette Withages, que logo nos aconselhou a mudar de tema. Não
pretendemos com este trabalho tomar um partido, mas perceber melhor este “método”
utilizado pela maioria dos cavaleiros das equipas holandesas (juniores, jovens cavaleiros
e seniores) e bem outros cavaleiros de equipas de outras nacionalidades.
Achamos que seria um desafio complexo mas interessante de aprofundar dada a
controvérsia que este tema tem suscitado.
Assim sendo, propomos, numa primeira abordagem, expor a opinião dos defensores
da hiperflexão, as vantagens deste trabalho e como praticá-lo. Seguidamente veremos o
ponto de vista oposto e finalmente, através da nossa experiência, procuraremos ver a
eficiência do trabalho em hiperflexão, tentando apresentar uma análise comparativa
entre eles. Aproveitamos também, desde já, para explicar o porquê das aspas na palavra
“método” quando falamos de hiperflexão. “Método” é «um conjunto de regras,
princípios normativos sobre os quais repousam o ensino, a prática de uma arte». Tratase portanto de uma palavra de utilização delicada neste estudo, daí termos optado a
partir de agora pela palavra processo que é: «o método utilizado para chegar a um certo
resultado».
II - OBJECTIVOS
Este trabalho sobre hiperflexão tem por objectivo uma análise segundo duas
perspectivas: a primeira pretende abordar os aspectos positivos do trabalho do cavalo
em hiperflexão e a segunda os factores negativos para o bem-estar e integridade física
do animal, apresentando diversas opiniões de agentes envolvidos na modalidade. Por
último tentaremos apresentar a nossa opinião relativamente ao tema.
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O processo de hiperflexão
III - HIPERFLEXÃO: UMA TEORIA DIFERENTE DO TREINO DE ENSINO
O grande defensor e utilizador da hiperflexão para o ensino de competição é sem
qualquer dúvida Sjef Janssen treinador de Anky Van Grunsven. Tudo começou há cerca
de vinte anos com a compra de um cavalo para a sua filha. Este revelou-se muito
complicado, difícil e sensível na boca (não permitia o uso excessivo da embocadura),
muito quente, com dificuldades em estender e reagindo fortemente ao uso das pernas.
Pelo desenvolvimento do processo de hiperflexão neste animal, que começou por ser de
testagem e experimentação, o cavaleiro/treinador Sejf Janssen elevou-o ao nível de
Grande
Prémio
(GP),
chegando
à
equipa
holandesa
sénior
de
dressage
(www.horsemagazine.com).
A sua instrução equestre baseia-se em grandes mestres da equitação como
Steinbrecht (Fig. 1) de quem é um grande admirador, Nuno de Oliveira (Fig. 2) ou Von
Neindorff (Fig. 3), para além de profissionais da Escola Espanhola de Viena. Para Sjef
Janssen estes tinham os seus cavalos a executar bem alguns exercícios de dificuldade
superior como piaffer, passage ou piruetas. No entanto, para ele, os cavalos não estavam
suficientemente para diante, muito concentrados mas sem grande expressão nos seus
andamentos. Além disso eram diferentes dos cavalos com que tinha que trabalhar: os
warmblood (descendentes de cavalos de tipo pesado, de sangue frio). Para estes era
necessária uma técnica diferente, tratando-se de cavalos frios, sendo a sua regra de
trabalho número um tê-los sempre à frente das pernas, atentos e activos para nunca
ficarem para trás.
Ao longo do tempo foi desenvolvendo o seu processo que continua em permanente
evolução. De seguida tentaremos apresentar os fundamentos deste processo.
Figura 1 – G. Steinbrecht
Figura 2 – Mestre Nuno de
(members.aon.at).
Oliveira (www.equisport.pt). (www.pferdezentrum.de).
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Figura 3 – Von Neindorff
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O processo de hiperflexão
Segundo Pia Munck (2007) este processo de descontracção baixo e redondo não
pode ser utilizado efectivamente para todos os cavalos pois é necessário um mínimo de
força no pós-mão, nem para todos os cavaleiros pois é preciso técnica, ou seja, saber
encontrar e dosear a cadência ideal para cada cavalo, a tensão nas rédeas, o estímulo das
pernas, as meias-paragens, a atitude do pescoço mais ou menos baixa para obter o
resultado procurado, isto é, um cavalo em equilíbrio baixo e redondo, com a linha de
cima estendida, o garrote subido, o pós-mão a avançar para debaixo da massa, o que
permite desenvolver lentamente os andamentos do cavalo nas melhores condições.
A hiperflexão é um processo progressivo com diferentes patamares: 1) a extensão do
pescoço passando por mais ou menos tensão entre o pós-mão e o ante-mão, ou seja,
entre as pernas/assento do cavaleiro e a tensão das suas rédeas (Figs. 4 e 5); 2) baixo e
redondo (Fig. 6) muito próximo do peito (Fig. 7) e finalmente a atitude de concurso,
com mais ou menos rassembler conforme a idade do cavalo e o seu nível de ensino
(Fig. 8). O ensino destes cavalos é feito com a alternância destas atitudes.
Figura 4 - Cavalo em grande extensão de
Figura 5 - Cavalo em extensão de pescoço
pescoço (www.sustainabledressage.com).
(www.horsemagazine.com).
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O processo de hiperflexão
Figura 6 - Cavalo baixo e redondo
Figura 7 - Cavalo em hiperflexão
(www.scandinavian-dressage.com).
(www.eurodressage.com).
Figura
8
-
Cavalo
em
atitude
de
concurso
(www.eurodressage.com).
O cavalo em hiperflexão não é um cavalo encapotado porque o cavalo está naquela
posição a pedido do seu cavaleiro. Segundo Janssen (2001) cavalos com a cabeça atrás
da vertical não significa que não estão encostados à mão. Está completamente errado as
pessoas pensarem assim. Os cavalos podem estar em hiperflexão com a rédea do bridão
frouxa mas se os empurrarmos eles respondem outra vez de forma impulsionada e
encostam-se à mão (mas se não tiverem uma reacção imediata então o cavaleiro começa
a ter problemas e deve voltar atrás). Podemos montá-los em hiperflexão durante curtos
espaços de tempo e a seguir montá-los extremamente longos, porque seguem sempre a
nossa mão até onde quisermos.
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Os seguidores deste sistema dizem que é necessário aprender a ouvir o seu cavalo e
a conhecer as suas reacções, para não cometer erros. É necessário estar sincronizado
com o cavalo e segundo Janssen (2001), se o cavaleiro leva dois ou três segundos a
reagir, pode ser tarde de mais porque já perdeu o tempo de reacção do cavalo. Neste
processo de hiperflexão tem que existir uma reacção imediata e se este leva três
segundos a responder, então já perdeu o tempo óptimo de reacção, assim como os
cavaleiros têm que estar preparados para as reacções dos cavalos. Portanto o
sincronismo entre o cavalo e o cavaleiro é muito importante. Deve-se recordar que os
cavalos não são tão inteligentes como as pessoas, por isso, não percebem o que elas
pensam. Tem que se explicar passo a passo o que se pensa, ensinar-lhes o que são física
e mentalmente capazes de fazer, dado serem animais com boa capacidade de
memorização e que funcionam por associação. Mais de 60% do trabalho é o treino
mental do cavalo. Este processo está em constante evolução com cada cavalo até que
este se transforme num cavalo Grande Prémio.
Segundo Janssen (2001) o modo como trabalhamos os cavalos novos depende do
cavalo, alguns em hiperflexão outros em ½ hiperflexão. Cavalos com problemas de
contacto,de aceitação de embocadura, de dorso, montamos muito em baixo (rollkur).
Mas o que é em baixo? Muitas vezes o cavalo tem diferentes blocos na sua maxila e
pescoço e antes de atingir o ponto mais baixo de extensão do pescoço, existem todas
essas fronteiras que devem ser quebradas, como acontece muitas vezes com os
garanhões. Quando chega mesmo abaixo, a nossa mão abre e cede e sentimos realmente
que o cavalo quer estender sem cair em espáduas, o dorso a subir, a arredondar, ficando
o cavalo redondo. Cada vez que abrimos as mãos e o cavalo levanta a cabeça é sinal que
ainda não foi suficientemente a baixo (hiperflexão). Tão simples quanto isto. Logo, com
alguns cavalos, é preciso ir mesmo muito fundo, até que estendam, noutros não é
necessário montar tão fundo, isso acontece mais naturalmente, por exemplo, em cavalos
com costas e pós-mão mais fortes.
Os seguidores deste processo têm que se submeter a este sistema e filosofia de
treino porque a abordagem e o trabalho do cavalo passam a ser diferentes. Para Janssen
(2001) o método clássico do ensino do cavalo é bom e ele diz utilizar as mesmas
técnicas, só que a abordagem é diferente, cada cavalo tem um plano específico de
trabalho de dressage. Segundo ele, as pessoas que trabalham no método clássico não o
adaptam a cada cavalo, porque têm só um método e o cavalo adequa-se ou não a esse
método. Se não conseguem ensinar o cavalo, é porque este não é bom. No seu processo
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O processo de hiperflexão
de hiperflexão há muitas maneiras de trabalhar o cavalo e se este reunir um mínimo de
capacidades para a dressage acaba sempre por se deixar ensinar e chegar ao nível de
Grande Prémio.
Mas não é só a relação cavaleiro / cavalo que é diferente, a própria maneira de estar
do cavaleiro também é diferente. Assim, quando alguém lhe vem pedir ajuda, mesmo
que sejam cavaleiros de GP, tenta confrontar o sistema clássico com coisas simples que
eles tenham dificuldade em fazer, como uma simples transição. Na primeira lição deixaos trabalhar de uma forma simples e directa, pedindo por exemplo uma transição sem
deixar o cavalo perder o equilíbrio ou outros exercícios simples. Quando os cavaleiros
não conseguem fazê-lo, confronta-os com isso, de modo a convencê-los que algo de
muito básico está errado. Então leva-os a tomar uma decisão e a esquecer todo o
trabalho que fizeram até àquele momento. Para Janssen (2001) os objectivos do ensino
são os mesmos, mas a maneira de os atingir é que é diferente.
No processo de hiperflexão, a evolução dos cavalos é lenta e progressiva,
conseguindo assim que os cavalos apresentem uma boa longevidade competitiva.
Segundo Munck (2007) aos dezoito anos o cavalo Bonfire ganhou os Jogos Olímpicos
de Sidney em plena forma física e mental, depois de vários anos submetido a esta
técnica de treino. Para Van Schie (2001), médico veterinário da quadra de cavalos de
Anky Van Grunsven e de Sjef Janssen, e especialista em ortopedia equina, este processo
de treino dos animais não causa danos, muito pelo contrário, leva à descontracção dos
músculos ílio-espinais e glúteos e não causa pressão no ligamento nucal.
Segundo a fisioterapeuta Schrijer (2001) há um paralelismo entre o cavalo baixo e
redondo e o cavalo em pastoreio (Fig. 9) em que o alongamento da linha de cima é
parecido com o do cavalo em hiperflexão.
Figura 9 - Cavalo em pastoreio
(www.dkimages.com).
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O processo de hiperflexão
O abaixamento do pescoço conduz, através do ligamento da nuca (que se estende do
occipital - nuca à região do garrote) e do ligamento supra-espinhoso (do garrote ao sacro
- garupa), ao alongamento da linha de cima permitindo a entrada dos posteriores (Fig.
10A). O levantamento da cabeça contrai o músculo extensor do dorso, longo dorsal,
substituindo a acção do ligamento superior (Fig. 10B). Ao mesmo tempo, os músculos
abdominais distendem-se, contrariando o avanço dos posteriores para debaixo da massa.
Estas observações foram testadas em cadáveres de onde se retiraram todos os músculos,
ficando somente para análise a função mecânica do ligamento nucal.
B
A
Figura 10A – Abaixamento do pescoço – alongamento da linha de cima. 10B –
Levantamento da cabeça – contracção da linha de cima (www.sustainabledressage.com).
Schrijer (2001) parte do princípio que os cavaleiros de ensino de competição
trabalham diariamente numa posição estática de competição, ou seja, alta (Fig. 11).
Segundo esta autora um cavalo só se pode manter cerca de doze minutos nesta atitude
alta, daí aconselhar as variações de atitude (Fig. 12).
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O processo de hiperflexão
Figura 11 – Cavalo treinado em hiperflexão que em pista apresenta uma atitude alta
de competição (www.sustainabledressage.com).
Figura 12 - Variação de atitude: mais baixa no aquecimento
(www.sustainabledressag.com)
Assim, Solange Schrijer (2001) conclui que a monte baixa e redonda com transições
rápidas, característica do trabalho em hiperflexão, é útil para os músculos abdominais e
músculos sub-lombares, levando à descontracção da linha de cima, tirando-se assim o
máximo de partido do pós-mão do cavalo. É esta a base da explicação física para os
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O processo de hiperflexão
benefícios da hiperflexão. Ainda segundo esta fisioterapeuta (Schirijer, 2001) para que a
técnica de hiperflexão seja usada correctamente, o cavalo tem que se manter redondo
em quatro pontos (Fig. 13):
1º Ponto - articulação do crânio com a primeira vértebra cervical (cor vermelha);
2º Ponto – articulação da última vértebra cervical com a 1ª vértebra torácica (cor
azul);
3º Ponto - articulação da última vértebra torácica com a 1ª vértebra lombar (cor
verde);
4º Ponto - articulação da última vértebra lombar com a 1ª vértebra sagrada (cor
amarela).
Figura 13 – Pontos onde o cavalo tem de arredondar para que o trabalho de
hiperflexão seja eficaz (www.sustainabledressage.com).
Para explicar os benefícios neurológicos deste método, Solange Schrijer (2001)
refere que ao flectir o pescoço o cavalo arredonda a coluna vertebral e relaxa totalmente
o corpo. Pelo contrário, quando quer fugir, ele levanta a cabeça e o pescoço, ficando
tenso e contraído. Conclui então que este processo de trabalho leva ao relaxamento
físico e psicológico, o que é bastante vantajoso nos cavalos quentes e complicados.
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O processo de hiperflexão
IV - OS PROBLEMAS DA HIPERFLEXÃO
1. Montando com a mão
Alguns puristas da equitação clássica defendem uma monte com pouca utilização
das rédeas, mas renunciar a importância das rédeas também não estará correcto. Os
problemas do trabalho do cavalo em hiperflexão não estão só relacionados com o facto
de serem utilizadas fortes ajudas das rédeas (Fig. 14).
Figura 14 - Utilização das rédeas
(www.sustainabledressage.com).
Estas constituem, sem dúvida, uma ferramenta importante no ensino do cavalo,
facilitando, por exemplo, o relaxamento da maxila, as encurvações ou a colocação do
cavalo na atitude pretendida. A forma como estes cavalos trabalham é que é prejudicial
à sua integridade física. A actividade, o ritmo, o equilíbrio e a concentração são gerados
pelos posteriores. A qualidade do trabalho dos posteriores influencia a qualidade do
trabalho do cavalo, por isso, um bom trabalho do pós-mão será sempre a preocupação
do cavaleiro. A maioria dos cavaleiros de hiperflexão sabe isso, daí estarem sempre a
explorar as transições de forma explosiva com ataques para diante. Como neste
processo o cavalo tem que contrair os músculos inferiores do pescoço e como a sua
atitude vai para trás e para baixo em direcção do peito ou até mesmo entre os joelhos,
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
estes cavalos têm que ser fortemente empurrados para se tornarem activos atrás (Fig.
15).
Figura 15 - Transição explosiva em
hiperflexão (www.sustainabledressage.com).
Segundo os hiperflexionistas, ao dobrarem o pescoço do cavalo, eles estão a
arredondar o pós-mão; mas o que estão a fazer é a contrair os músculos inferiores do
pescoço em detrimento da descontracção e da flexibilidade dos mesmos, com a
probabilidade de produzir tensão no ligamento nucal, provocando resistências na
articulação da nuca e até crescimentos ósseos anormais (Fig. 16). A tensão no ligamento
nucal e no ligamento supra-espinhoso impedem o arredondamento do pós-mão,
impossibilitando, desta forma, a verdadeira concentração do cavalo (Fig. 17).
Figura 16 – Ligamento nucal em esforço e coluna cervical em
forma de “s” (www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
A
B
C
Figura 17 – A) Posição normal. B) Pescoço estendido C) Pescoço encurvado em
hiperflexão (www.sustainabledressage.com)
Quando o pescoço está alongado, o ligamento nucal não está tão esticado mas os
músculos elevadores do garrote estão alongados. Quando o pescoço está arredondado o
ligamento nucal está esticado mas os músculos elevadores do pescoço estão sem
tonicidade.
O cavalo aprende a flectir o pescoço porque sabe que se não o fizer a embocadura
(freio e bridão) vai provocar uma forte dor na boca, por isso fica nervoso, ansioso e
inseguro e começa a salivar de uma forma intensa. A pressão constante da embocadura
leva a que o cavalo dobre o pescoço. Nessa altura o cavaleiro avança a mão ficando de
rédeas soltas mantendo-se o cavalo na atitude de flexão. O cavalo aprende, então, que
quando dobra o pescoço, não tem dor na boca por falta de pressão a este nível. Esta
pressão na boca origina graus crescentes de flexão, de tal forma que o cavalo de Grande
Prémio é montado com a boca completamente encostada ao peito (Fig. 18).
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Figura 18 - Cavalo com a boca encostada ao
peito (www.sustainabledressage.com).
2. Sinal de Submissão
O cavalo mostra a sua inferioridade a outro cavalo baixando a cabeça. Quanto mais
baixa estiver a cabeça mais submisso ele está. Este sentimento de inferioridade aparece
também quando o cavaleiro baixa a cabeça do cavalo.
Os criadores do cavalo de desporto (Warmblood) têm produzido nas últimas décadas
cavalos grandes e poderosos, o que leva ao aparecimento de processos mais vigorosos
para o seu controle. É o voltar à época medieval em que eram utilizados grandes freios,
esporas e técnicas que provocassem dor para poderem controlar os cavalos (Sandin,
2005).
Segundo Sandin (2005), trabalhar em hiperflexão nos aquecimentos antes das
provas, leva a uma fadiga física e psicológica do cavalo que resulta num melhor
controle do cavalo na pista de competição (Fig. 19).
Figura 19 - Aquecimento de um
cavalo em hiperflexão antes da
competição
(www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
3. Enrijecimento do maxilar e língua (o cavalo que baba)
Segundo Wyche (2007), o músculo longo do pescoço, localizado na sua parte
inferior, juntamente com o esternocefálico que liga o esterno à mandíbula, flexiona e
puxa a cabeça em direcção ao peito. Nesta atitude atrás da vertical o cavalo quase não
consegue engolir. O babar que vemos em cavalos em hiperflexão resulta daí, dado que
ao puxar a cabeça em direcção ao peito, a língua enrija e para se defender o cavalo
serve-se dela como se fosse uma “batedeira eléctrica” conduzindo a um excessivo
espumar (Fig. 20).
Figura 20 - Baba e espuma em excesso devido à
tensão
no
músculo
longo
do
pescoço
(www.sustainabledressage.com)
4. Respiração
Para o correcto funcionamento dos músculos todos os mamíferos necessitam de
oxigénio, que é fornecido pelo sangue após as trocas gasosas que ocorrem nos pulmões.
O tracto respiratório do cavalo engloba a cavidade nasal, a laringe (localizada na região
da garganta), a traqueia (estrutura tubular situada na parte inferior do pescoço) e os
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O processo de hiperflexão
pulmões. Quando o pescoço está hiperflectido, a laringe fica comprimida dificultando a
respiração do cavalo (Sandin, 2005).
5. Campo de Visão
Os olhos do cavalo são os maiores de todos os mamíferos terrestres. Estão
localizados de cada lado da cabeça, o que lhes proporciona uma visão panorâmica
bastante alargada, indispensável para detectar a presença de predadores que se
encontram no meio selvagem. Esta visão panorâmica é monocular, o que permite aos
cavalos verem o que os rodeia de cada lado da cabeça. A visão binocular, ou seja, com
ambos os olhos, é muito boa e encontra-se direccionada para baixo do chanfro e não
para a frente, levando a que o cavalo tenha uma “zona cega” mesmo à frente da região
da testa. Assim, apesar da sua larga visão panorâmica, o cavalo normalmente não
consegue ver o seu cavaleiro enquanto está a ser montado, uma vez que este se encontra
mesmo na “zona cega”, a não ser que encurve bastante o pescoço (Silva, 2007,
comunicação pessoal).
Ao serem montados com o chanfro perto da vertical, os cavalos têm a sua visão
direccionada para baixo, de modo que não conseguem observar o que se passa
directamente à sua frente (Fig. 21). Por este motivo sentem necessidade de elevar a
cabeça cada vez que algo lhes suscita a curiosidade, perscrutando-o com a sua visão
binocular (Sandin, 2005).
Figura 21 – Campo de visão com o chanfro na
vertical (www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Quando o cavalo é obrigado a manter a cabeça atrás da vertical em hiperflexão, quer
dizer que, no máximo, vê o chão junto às suas mãos (Fig. 22). Se não consegue ver,
então não tem liberdade de movimentos. Também se fala muito de montar para diante
quando se monta em hiperflexão. O problema é que o cavalo não pode ver para a frente
e por isso tem dificuldade em pensar para diante (Sandin, 2005).
Figura 22 - O campo de visão com a cabeça atrás
da vertical (www.sustainabledressage.com)
O cavalo precisa de poder colocar a cabeça para focar a visão. Assim, quando olha
para algo no horizonte levanta a cabeça até à vertical “olhando pelo nariz”. Quando foca
algo perto, o ângulo da cabeça é quase vertical e olha para a frente formando um ângulo
de 90º com o nariz.
Segundo Harman, cavaleira e neurocientista da Universidade de Western na
Austrália, nos cavalos em hiperflexão o campo de visão vai na direcção do nariz e do
chão em vez de estar orientado para a frente como nos humanos. Acima e atrás do nariz
simplesmente não consegue ver (Sandin, 2005).
6. Efeitos no pescoço
O mais visível na monte em hiperflexão é a forma do pescoço. Este é muito flexível
e a maioria dos cavalos consegue morder o seu peito e até chegar à garupa sem grande
esforço. As vértebras que compõem a região do pescoço (vértebras cervicais) não
possuem apófises espinhosas proeminentes como as vértebras da região do dorso
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
(vértebras torácicas), funcionando aquelas como uma “corrente”, apresentando grande
mobilidade.
As vértebras cervicais não seguem o contorno do pescoço visto do exterior,
apresentam uma forma em “s” (Fig. 23). O trabalho em hiperflexão tende a aumentar a
curvatura do “s” mas não é o arco do pescoço que se pretende disfarçar. Pelo contrário,
pretende-se alongar o pescoço (abertura do “s”) e trabalhar os músculos elevadores da
base do pescoço (Fig. 24). O desenvolvimento destes músculos e dos seus congéneres flexores do dorso (psoas e abdominais) - é que comanda a colocação e a entrada dos
posteriores .
Figura 23 - Coluna cervical em forma de “s” num cavalo
em hiperflexão (www.sustainabledressage.com)
Figura 24- Coluna cervical direita
(www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Vista de lado, a linha de cima do pescoço deve ser arredondada, ou pelo menos
direita, sem quebra na 3ª vértebra cervical (Fig. 25).
Figura 25 - Desenvolvimento correcto do
pescoço (www.sustainabledressage.com)
O contorno inferior do pescoço deve ter o esófago bem definido desde o maxilar até
à espádua. Esta linha não deve estar preenchida com músculos, nem convexa, deve ser
côncava ou pelo menos direita (Fig. 26).
Figura 26 - Desenvolvimento incorrecto do
pescoço (www.sustainabledressage.com)
Os cavalos em hiperflexão partem o pescoço ao nível da 3ª vértebra cervical (Fig.
27).
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Figura 27 - Cavalo em hiperflexão com o pescoço partido
pela 3ª vértebra cervical (www.sustainabledressage.com)
Os
cavalos
em
hiperflexão
desenvolvem
excessivamente
o
músculo
parótidoauricular (ligado à zona frontal das orelhas ou seja, situa-se entre a ganacha e o
pescoço), devido à compressão das glândulas parótidas pela flexão que é exercida por
parte do cavaleiro (Fig. 28). Os cavalos de ensino que não são montados desta forma,
não desenvolvem este músculo.
Figura 28 - Cavalo com a glândula parótida saliente em virtude da
compressão do maxilar contra o pescoço (www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Na hiperflexão, a parte de cima da coluna vertebral está excessivamente flexionada
e em grande esforço. Como existem apenas sete vértebras cervicais, há abertura dos
ângulos entre as vértebras, criando-se assim uma posição anormal (Fig. 29). Até certo
ponto não será prejudicial, dado que o pescoço é flexível e é capaz de aguentar esta
posição. Mas ao trabalhar o cavalo nesta atitude, com os músculos e ligamentos entre as
vértebras em extensão até ao seu limite, deixa de haver tónus muscular e os ligamentos
alongam perdendo a sua elasticidade, fazendo desaparecer toda a tonicidade natural do
pescoço.
Figura 29 – Pescoço em hiperflexão – coluna cervical com abertura dos
ângulos das vértebras – Mandíbula tensa (www.sustainabledressage.com)
Este tipo de trabalho provoca um desenvolvimento muscular anormal, porque o
pescoço é colocado de uma forma anormal. A flexão exagerada da coluna vertebral
resulta no alongamento exagerado do músculo esplénio.
Segundo Weiler (2000), nos seus estudos sobre problemas de tendões e ligamentos
em cavalos, 80% dos cavalos usados para ensino e saltos, tinham lesões no ligamento
nucal. Em contrapartida os cavalos usados para passeio, os trotadores, os cavalos
pesados, praticamente não tinham este tipo de lesões. Estas consistiam na calcificação
da inserção do crânio, em nódulos ósseos dentro do ligamento e na sua mineralização
21
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
(Fig. 30). Estas lesões foram causadas por stress excessivo e inflamação. Este médico
veterinário concluiu então que quanto maior era a flexão do ligamento nucal, mais
problemas apareciam principalmente em cavalos trabalhados em hiperflexão. O “stress”
no ligamento nucal ocorre provavelmente quando os cavaleiros exigem uma extrema
flexão da nuca dobrando o pescoço até o nariz tocar no peito.
Figura 30 - Crescimento ósseo na inserção do crânio
(www.sustainabledressage.com)
Em descida de pescoço o ligamento nucal está esticado, mas sem estar em esforço
excessivo, e os músculos elevadores da base do pescoço estão alongados, o que permite
ao garrote subir. Em posição de hiperflexão, o ligamento nucal está demasiadamente
esticado mas os elevadores da base do pescoço não estão alongados. Segundo os
seguidores deste processo, a posição de hiperflexão faz com que o ligamento nucal
levante o garrote. É uma interpretação errada, pois não é o ligamento nucal mas sim os
músculos elevadores que fazem subir o garrote.
Weiler (2000) concluiu que as lesões do ligamento nucal não são fáceis de detectar
porque não causam dor visível mas constante, com a qual o cavalo aprende a viver.
Trata-se obviamente de uma degeneração lenta, de baixa intensidade, na área da
inserção. Sendo o ligamento nucal um tecido sem elasticidade e que se danifica
facilmente, estes cavalos acabam por viver com problemas crónicos difíceis de reparar.
Mas os problemas não aparecem só a nível do ligamento nucal. A tracção feita neste
ligamento também vai ter implicações no ligamento supraespinhoso, colocando-o,
22
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
igualmente sob uma grande tensão, o que vai causar um bloqueio na área lombar. Este
bloqueio leva a um trabalho excessivo dos músculos abdominais o que requer uma
acção compensatória das articulações lombo-sagrada e coxo-femoral (Fig. 31). Assim, a
região que os hiperflexionistas pretendem arredondar com este processo (a região
lombar), é exactamente aquela que se vai encontrar bloqueada em extensão, impedindo
a “entrada dos posteriores”(Fig. 32).
Figura 31 - Bloqueio da coluna lombar por flexão extrema do
pescoço (www.sustainabledressage.com).
Figura 32 - Contracção dos músculos abdominais e psoas, que levam à flexão
do rim e ao arredondamento do dorso (www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
7. Efeitos nos andamentos
Um problema que surge num cavalo trabalhado em hiperflexão é o seu equilíbrio.
Neste treino de atitude baixa, com o cavalo muito fechado e o peso no ante-mão, este
reage com os seus membros posteriores ficando estes mais esticados e com todos os
ângulos das articulações direitos, na expectativa de aliviar a frente e retomar o
equilíbrio.
Os membros posteriores muito esticados não conseguem simultaneamente manter o
equilíbrio e transportar o peso para diante de forma dinâmica e atlética, logo o cavalo
não se propulsiona tanto de trás para a frente. Para avançar o mais possível ele arqueia o
dorso, faz a rotação da bacia sem dar o dorso (swinging back), ficando arqueado e
estático (Fig. 33). O cavalo encurta a linha de baixo com tensão abdominal e dos
músculos do pescoço, e a respiração torna-se mais difícil (Sandin, 2005).
Figura 33- Cavalo a trote (www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
O bloqueio do dorso afecta o ritmo dos andamentos podendo levar a alguns defeitos
nos andamentos do cavalo, nomeadamente a galope onde o cavalo com um dorso tenso
não consegue usar os membros posteriores para se propulsionar para diante com
suspensão adequada. O ante-mão mantém-se no solo até que o pós-mão tenha tocado no
solo, logo perdendo-se a suspensão (estilo cavalo de baloiço) ou seja a mão do 3º tempo
fica no chão até o posterior chegar ao chão (Sandin, 2005).
A trote, o bloqueio do dorso faz com que o ante-mão do cavalo trote numa batida
diferente do pós-mão, o que conduz a uma descoordenação entre os membros
posteriores e anteriores com desfasamento da diagonal do trote (por vezes o membro
posterior assenta no solo antes do membro anterior da diagonal correspondente). Este
fenómeno denomina-se DAP (Diagonal Advanced Placement / Posicionamento em
Avanço do Membro Posterior / Dissociação da Diagonal). Se o membro posterior toca
no solo antes do membro da diagonal anterior será que isto significa que o pós-mão irá
suportar mais peso que o ante-mão? Isto poderá parecer bom à primeira vista, mas há
três ses:
- O primeiro é que o posterior sai do solo mais rápido que o anterior, logo a uma
dada altura o peso está todo nos anteriores quando queremos que o cavalo se
propulsione para diante;
- O segundo, é que o membro posterior assenta prematuramente no solo quando o
cavalo ainda está no ar. Então o cavalo vai assentar o peso sobre esse membro mais
cedo e este não consegue aguentar o peso todo, deixando-o para trás, para depois se
propulsionar e cobrir terreno para diante como acontece quando a diagonal assenta toda
ao mesmo tempo. Desta forma o membro posterior assenta mais atrás e transporta
menos peso para diante.
- O terceiro, é que este movimento saltado do tronco do cavalo, dada a dessincronia
do trote é enganoso, pois dá a impressão que o andamento é muito exuberante e
expressivo, mas no entanto os membros posteriores não avançam muito, o que não é
bom.
No passo, é frequente observar cavalos tensos, precipitados, com pouca amplitude e
com dificuldade em esticar as rédeas e alongar o pescoço. Estes problemas advêm quase
sempre de um dorso bloqueado e contraído (Fig. 34) (Sandin, 2005).
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Figura 34 - Passo concentrado em hiperflexão
(www.sustainabledressage.com)
7.1 DAP (Posicionamento em Avanço do Membro Posterior) e o Basculamento do
Cavalo
Segundo (Sandin, 2005), quando se propulsiona para diante, a trote, o membro
diagonal posterior é o que produz mais trabalho. O membro anterior suporta o peso à
frente e deixa o corpo deslizar para diante (Fig. 35A).
Figura 35 A – Membro anterior suporta o peso à frente
(www.sustainabledressage.com)
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
DAP – Entrada do posterior enquanto o anterior ainda está no solo. Dessincronia e
oscilação do tronco (Fig. 35B).
Figura 35B – Entrada do posterior enquanto o anterior
ainda está no solo (www.sustainabledressage.com)
Ambos os membros, posterior e anterior, assentam no solo ao mesmo tempo e o
tronco está estável (Fig.35C).
Figura 35C – Tronco estável com ambos os membros anterior
e posterior a assentar no solo (www.sustainabledresage.com).
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
DAP – O membro posterior assenta antes do anterior – dessincronia, oscilação do
tronco (Fig. 35D).
Figura 35D – Membro posterior assenta antes do
anterior (www.sustainabledressage.com).
O oscilar do tronco provocado pelo DAP é enganador, parecendo que a passage ou
o trote são muito bons. O cavalo parece um verdadeiro atleta dado trabalhar tão
arduamente. Na realidade pode ser muito cansativo para os membros anteriores do
cavalo, porque aí têm que suportar todo o peso e propulsionar-se, para além de ter o
membro em completa extensão, logo sem amortecimento adequado do choque (Fig. 36).
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Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Figura 36 – Sequência de imagens demonstrando um cavalo em hiperflexão. De
realçar a dessincronia e a oscilação do tronco (www.sustainabledressage.com)
1 – Mostra o casco posterior a assentar no solo não entrando muito para debaixo da
massa e o correspondente membro diagonal anterior bem visível em suspensão.
2- Mostra a fase onde o cavalo começa a apoiar o peso no posterior. O anterior
correspondente acabou de tocar no solo. Nota-se o posterior bem atrás da ponta da anca
ou seja, basicamente suporta o peso mas não o transporta.
3 – Mostra a fase em que o anterior suporta todo o peso do cavalo ao deslizar sobre
ele. O posterior fica para trás e a garupa fica plana. De notar a tensão da cauda.
4 – Mostra o apoio do anterior quando o posterior sai do solo. Esta mecânica eleva a
garupa levando a uma oscilação do tronco. Nas imagens seguintes vemos a repetição do
processo com as mesmas cores.
De notar que a entrada dos posteriores é mínima e que a canela do membro posterior
diagonal está longe do paralelismo desejado com a canela do membro anterior
correspondente.
8. Efeitos na concentração
Concentração é o cavalo redondo de atitude erguida e fixa em todos os exercícios
(RND, 2007).
Um dos principais conceitos mal interpretados da equitação moderna é que a
concentração consegue-se apenas com o arredondar do dorso. O dorso redondo é um
29
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
resultado da concentração, mas não é sinónimo de concentração, tal como a elevação do
pescoço e da cabeça (atitude) é o resultado da subida do ante-mão.
O verdadeiro conceito de concentração é que quanto maior for a entrada dos
posteriores para debaixo da massa, maior é a concentração. A entrada dos posteriores
com as ancas a baixar, resulta na subida do dorso e flexão das articulações do pós-mão.
O arredondar do dorso pelo trabalho em posição de hiperflexão não alivia em nada o
peso do ante-mão, pelo contrário estes cavalos não se tornam mais redondos em pista do
que cavalos treinados pela metodologia convencional. Estes somente arqueiam o dorso,
e não apresentam a verdadeira concentração, apresentam o chamado equilíbrio
horizontal, especialmente evidente em exercícios como o piaffer (Fig. 37). Os cavalos
não baixam as ancas e a garupa, simplesmente porque não estão reunidos. Aprenderam
a
movimentar
os
membros
no
mesmo
sítio
a
trote,
sem
concentração
(www.sustainabledressage.com).
Figura 37 - Cavalo em piaffer sem verdadeira
concentração (www.sustainabledressage.com).
Sem a verdadeira concentração é mais fácil fazer transições piaffer-passage pois não
há alteração do equilíbrio horizontal do peso (frente-trás-frente) (Fig. 38). Estas
transições com um cavalo concentrado tornam-se mais difíceis para não se perder o
ritmo.
30
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Figura
38
-
Transição
piaffer-passage
do
cavalo
Salinero
(www.eurodressage.com).
Existe ainda uma forma muito comum de equilíbrio horizontal, conhecida como o
problema da triangulação, ou seja, os posteriores quase não entram para debaixo da
massa e são os anteriores que recuam, reduzindo a base de sustentação (Fig. 39). Tratase pois de uma falsa concentração apesar de o cavalo parecer concentrado e fechado.
Este problema da triangulação é muito conhecido e falado na Escola Espanhola de
Viena e no Cadre Noir de Saumur, onde o piaffer é também feito como um exercício
preparatório para a levada, logo exige que o peso seja transportado para trás com
entrada dos posteriores, pois se isto não acontecer, a levada será mais difícil e de pior
grau técnico.
Figura 39 – O problema da triangulação em
piaffer (www.eurodressage.com)
31
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
V – A NOSSA VISÃO SOBRE O TRABALHO EM HIPERFLEXÃO
Ao escrevermos o nosso trabalho surgiram-nos dúvidas sobre a utilização da palavra
“método” ou de “processo” quando se fala de hiperflexão. Não se trata apenas de um
problema de semântica, mas sim de um problema de linguagem equestre. Ao
consultarmos artigos em diversas línguas, apareceu sempre a palavra “método” para
falar de hiperflexão. Quando se fala de equitação clássica, fala-se de “método”, dada a
sua universalidade. Num “método” há uma orientação rigorosa de um trabalho para se
chegar a um fim. Num “processo” o que varia é a utilização das técnicas de ensino do
cavalo para se chegar a esse fim.
Não sendo nós praticantes deste processo e não tendo tido contacto directo com
treinadores ou cavaleiros que utilizassem esta técnica de treino, a nossa visão baseia-se
apenas em observações feitas nos campos de aquecimento das competições
internacionais, nas pistas de prova, através de conversas com diferentes intervenientes
na modalidade de dressage (cavaleiros, treinadores e juízes) ou fruto da nossa pesquisa
e investigação.
Nos aquecimentos das provas internacionais não é só a atitude destes cavalos em
hiperflexão que nos chama a atenção. Estes são montados com um contacto ligeiro,
muito activos e vibrantes, à vista pouco sossegados e por isso tensos, mas sempre
controlados. O mais surpreendente é que quando vemos estes cavalos entrar em pista
eles sobem a frente e ficam numa atitude de competição, graças à impulsão e à
sensibilidade às ajudas das pernas. Para poder ter uma opinião sobre este processo
tentámos perceber melhor como é que o treinador Sjeff Janssen chegou à hiperflexão.
É sabido que Sjeff Janssen frequentou e foi aluno de uma escola de equitação
clássica na Bélgica, com cavaleiros que tinham montado na Escola Espanhola de Viena
e com Nuno de Oliveira em Portugal. Os cavalos existentes eram na maioria Lusitanos e
Lipizzanos, ensinados a fazerem exercícios como piaffer, passage e piruetas. Foi com
estes cavalos que aprendeu a sentir estes exercícios e o equilíbrio em que tinham que ser
feitos.
Pensamos que ao montar nesta Escola, terá aprendido a sentir o que é a
descontracção e a ligeireza total do cavalo, a descontracção da maxila e a sensação do
que é um cavalo fino às pernas e à mão, como trabalhava Mestre Nuno de Oliveira, e
que da Escola de Viena terá sido influenciado por uma equitação mais impulsionista
(www.horsemagazine.com).
32
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Ao montar cavalos com vontade de andar, finos à perna e sensíveis, havia a
necessidade de os controlar. Desenvolve o controle do cavalo pela frente, pelo pescoço,
pela cabeça e pela boca. Como têm necessidade de terem sempre os cavalos
impulsionados, com uma resposta rápida e forte às pernas, para os controlarem, é mais
fácil fazê-lo com cavalos com a frente baixa até chegarem à hiperflexão. Neste processo
os cavaleiros montam com pernas sem mão e mão sem pernas. Os cavalos aprendem a
aceitar as pernas do cavaleiro para andar e as meias-paragens para travar o movimento
para diante.
Não nos parece que os cavalos trabalhados em hiperflexão cheguem à verdadeira
concentração. A aproximação do ensino deve ser feita de trás para a frente, de forma a
que os cavalos aprendam a avançar os posteriores.
Pensamos que este processo não serve para todos os cavalos. Normalmente os
cavalos utilizados neste processo são cavalos muito quentes, um pouco explosivos, com
tendência a andarem por eles, sendo apenas necessário trabalhar o seu controle. Os
animais aos quais se aplica esta técnica de ensino, são normalmente cavalos de raças do
centro da Europa, cruzados com puro-sangue inglês, e mesmo dentro destas raças
(warmblood) só são escolhidos animais muito particulares que se adaptem a este
processo.
Tentaremos de seguida estabelecer uma relação/distinção entre ramener, ramener
outré e hiperflexão pois nas nossas leituras certos autores estabelecem essa ligação.
Tomemos estes temas por ordem.
O ramener como definiu o General Décarpentry “é o fecho do ângulo da cabeça
com o pescoço (ganacha), sendo a nuca o ponto mais alto (Fig. 40). O ramener diz-se
completo quando o chanfro atinge a vertical. Quando o chanfro está para trás da vertical
o cavalo passa a estar encapotado. O General L´Hotte dizia que “o ramener não se
concentra na direcção da cabeça, ele reside primeiro na submissão do maxilar que é o
primeiro ponto a receber o efeito da mão “(Fig. 41).
Baucher praticava o ramener outré (outré quer dizer para trás da vertical) bem como
as flexões levadas ao máximo para descontrair e muscular, mas sempre com o cuidado
de dispor a qualquer momento da frente do cavalo (Fig. 42). Faverot de Kerbrecht
explicava que o ramener outré só deve ser utilizado se quisermos acabar completamente
com as resistências da boca e do pescoço em qualquer posição e em qualquer
andamento “.
33
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Figura 40 – Gen. Décarpentry
(Décarpentry, 1997)
Figura 41 – Gen. L´Hotte
(butler.cc.tut.fi)
Figura 42 – Baucher
(membres.lycos.fr)
Na nossa opinião a hiperflexão é um processo no qual o cavalo é trabalhado muito
baixo, muito enrolado, com o nariz quase no peito. Trata-se de um processo muito
delicado e discutido, apesar de ele ter dado provas com certos cavalos. Certas pessoas
dizem que esta postura praticada em excesso, terá graves consequências sobre as
articulaçãoes temporo-maxilares e cervicais, sobre o campo de visão, sobre a deglutição
e respiração. Pensamos que é tudo uma questão de dosagem e que tudo repousa também
na actividade e no avançar do pós-mão para chegar ao levantar do ante-mão. Utilizados
pelos bons cavaleiros todos os processos trazem resultados.
A atitude destes cavalos parece ser, à primeira vista, a de um cavalo encapotado
porque o nariz está para trás da vertical e por vezes está mesmo bastante para trás mas
há uma grande diferença entre um cavalo encapotado, um cavalo em hiperflexão, e um
cavalo redondo. O cavalo encapotado para além do nariz atrás da vertical, está contraído
na base do pescoço com o dorso côncavo e para trás da mão. O cavalo trabalhado
redondo tem a base do pescoço descontraída, o dorso redondo ou convexo, ao ser
empurrado encosta-se à mão, subindo e aligeirando o ante-mão. A ideia do trabalho em
hiperflexão é basicamente a mesma, provavelmente poderá ocorrer um bloqueio do
dorso.
A riqueza da biomecânica faz com que um processo exclusivo não possa responder
a todos os problemas, necessitando cada caso de um trabalho apropriado, da nossa
inteligência e sensibilidade em saber utilizar a técnica de treino correcta em função das
situações.
A primeira vez que vimos a cavaleira Anky Van Grusven montar a cavalo, foi no
Campeonato da Europa de 2001 em Verden, na Alemanha. No aquecimento, para além
34
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
da atitude do seu cavalo, que na altura era o Idool, o que nos chamou a atenção foram os
ataques constantes de pernas, estando o cavalo sempre atento sem nunca poder
“desligar” (perder a atenção) do cavaleiro (Fig. 43). Lembramo-nos de ele estar em
passage, com uma boa actividade e de numa fracção de segundos sair num galope
explosivo com a sua cavaleira a galopar em pé nos estribos, percorrendo todo o campo
de aquecimento neste galope e nesta posição.
Figura 43 – Idool em pista no Campeonato da Europa de
Dressage em Verden, 2001 (www.eurodressage.com)
Este tipo de resposta é pedido constantemente aos cavalos e ela tem de ser imediata;
os alemães no quarto ponto da Escala de Treino, a impulsão, falam de Schwung (Fig.
44) palavra mais forte, pois referem-se às batidas enérgicas e vibrantes dos membros,
que prolongam o tempo de suspensão e dão a expressão máxima aos andamentos
saltados. É a transmissão enérgica da força do pós-mão para o ante-mão e para o ar, para
diante e para cima.
Figura 44 – Representação gráfica da impulsão / Schwung
(www.wikipedia.org)
35
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
O que é importante na equitação, é sentir a atitude onde pode e deve ser trabalhado o
cavalo em dado momento. Um cavalo com tendência a estar muito alto, deve ser
trabalhado baixo, mas num animal com tendência a baixar a frente o cavaleiro deve
subir a frente. Quanto a nós, é importante saber sentir a atitude em que o cavalo deve
trabalhar. Pensamos que há cavalos (mesmo os de alto nível) que têm que ser
pontualmente trabalhados muito fechados. O que é realmente muito importante é o bemestar do animal e a aplicação de uma equitação sem agressão física e moral. Neste
sentido procura-se é a preparação física e mental do cavalo afim de se atingirem os
objectivos equestres, seguindo a escala de treino da FEI (Fig. 45) (FEI, 2006).
Figura 45 – Escala de Treino da FEI (www.wikipedia.org)
No ensino de competição, existem os juízes que estão presentes para controlar esse
trabalho com as suas notas e observações. As grandes competições internacionais são
sempre pontuadas por um pequeno grupo de juízes oficiais, que com a sua formação
controlam a forma como os cavaleiros apresentam em pista os seus cavalos (Fig. 46). O
problema surge no campo de aquecimento, quando certos cavalos são submetidos
através do processo da hiperflexão a uma monte mais agressiva e que não existe
controle. O juiz em pista deve controlar o que vê, sem perder a noção da técnica em
detrimento do movimento, está cada vez mais atento a uma equitação sem resistências,
com um bom contacto entre a mão do cavaleiro e a boca do cavalo.
36
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Figura 46 – Colégio de Juízes de Dressage Oficiais da FEI
(www.horsesport.org)
Não podemos nem queremos avaliar se a hiperflexão é ou não uma boa técnica de
treino. Do ponto de vista da saúde e bem-estar animal, não foram encontradas provas
efectivas que este processo cause graves problemas aos cavalos (FEI, 2006). A FEI está
a realizar um estudo com um conjunto de médicos veterinários para poder emitir uma
opinião concreta. Por outro lado, existe um grupo de veterinários que pretende
apresentar brevemente um estudo, onde se prova que, ao contrário dos cavalos
montados em cima, montá-los em baixo é bom para a saúde, sobretudo para o pescoço,
e para a sua flexibilidade.
Em alguns artigos que lemos para a realização deste trabalho, fala-se da monte
clássica como uma equitação de atitude estática em que não há variações de atitude.
Nada de mais errado ao dizer-se isto. A grande maioria dos cavaleiros de competição
sabe variar o trabalho em diferentes atitudes pois tem noção de que se trata de uma
ginástica para a linha de cima. Procura-se que os cavalos subam o ante-mão pelo
abaixamento das ancas e flexão dos posteriores, com o pós-mão forte e o dorso redondo,
permitindo ao cavalo um trabalho cada vez mais concentrado.
Uma das críticas mais ferozes que se fazem aos cavaleiros hiperflexionistas, é que
não existe uma verdadeira concentração. Os cavalos nesta atitude ficam com os
anteriores recuados, os posteriores hirtos, sem flexão nas articulações e o dorso
bloqueado. Por estarem muito activos aprendem a expressar certos movimentos mas
sem os realizarem com a verdadeira técnica do exercício. À vista ficamos
impressionados pela actividade que demonstram e esquecemo-nos do rigor técnico.
Em 2007, no Concurso de Dressage Internacional de Saumur, procurámos assistir
aos treinos e ao aquecimento do cavalo Mister G de Lully montado pela cavaleira Fiona
37
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
Bigwood membro da equipa britânica no último Campeonato da Europa, sabendo à
priori que este cavalo é treinado no processo de hiperflexão. Vimos este cavalo em
piaffer, com as rédeas quase bambas, os anteriores bastante atrasados ficando próximos
dos posteriores, criando a ilusão de haver concentração (problema da triangulação), o
pescoço com uma musculatura diferente e partido pela terceira vértebra, as pernas da
cavaleira soltas e para a frente (Fig 47 A-C). No que se refere aos andamentos, o trote é
muito exuberante sempre activo e com swing mas depois o cavalo não consegue
descontrair e avançar no passo, por exemplo.
B
A
C
Fig. 47 – Cavaleira Fiona Bigwood montando Mr. G de Lully no aquecimento (A) e
em competição (B e C) (www.eurodressage.com)
Pensamos que, deste modo, este processo de treino poderá levar a alguma
instabilidade e tensão denotadas em alguns dos exercícios de GP.
Em suma, entendemos que mais uma vez é criada a ilusão de movimentos
espectaculares em detrimento da técnica. A marca de um bom ensino não é uma
gesticulação vistosa, mas o repouso e a descontracção, com o máximo de energia na
calma sem ultrapassar o que cada cavalo pode dar.
Para finalizar citando Mestre Nuno de Oliveira “é muito importante que no ensino
do cavalo o deixemos tomar uma atitude de pescoço que favoreça o desenvolvimento da
força propulsiva dos posteriores. O que é necessário é trabalhar o pescoço de acordo
com o pós-mão, com a sua posição e a sua atitude. No ensino trabalha-se toda a coluna
vertebral do cavalo da ponta da nuca à inserção da cauda...” (Oliveira, 1996a)
38
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
VI – CONCLUSÃO
A Equitação Clássica tem evoluído ao longo dos séculos, sendo actualmente o seu
mais forte representante, o ensino de competição (dressage). A dressage é uma
disciplina praticada em todo o mundo, tendo o seu expoente máximo na Europa. Esta
modalidade faz parte dos Jogos Olímpicos e dos Campeonatos Equestres Mundiais e,
para além disso, tem os Campeonatos Regionais de cada zona do globo e de cada país.
Nalguns países a sua importância socio-económica tem vindo a ganhar relevo, devido
aos altíssimos preços que os cavalos atingem dando desenvolvimento à criação cavalar,
a todas as infra-estruturas e intervenientes necessários para o desenvolvimento da
modalidade.
Pela necessidade de se ser competitivo e ter sucesso, procura-se cada vez mais a
espectacularidade em prova e para isso criam-se cavalos mais adaptados à modalidade e
também processos que possam levar a atingir mais pontos em prova e com maior
exuberância. O processo de hiperflexão é talvez o mais moderno e recente, e ao ser
utilizado por um conjunto de cavaleiros ganhadores distinguiu-se na modalidade. Esta
técnica de treino tornou-se polémica devido às possíveis consequências físicas que
possa trazer para os cavalos, e também por vezes à falta de técnica de alguns exercícios
em detrimento da espectacularidade.
Ao credibilizar este processo e colocá-lo na mesma escala que o método clássico de
treino, é ignorar a experiência e o entendimento de muitas gerações de bem sucedidos
cavaleiros e treinadores.
Finalizando, nada melhor que citar Mestre Nuno de Oliveira: “ter um cavalo
ensinado não é só coleccionar movimentos ou andamentos
amplos, é sobretudo ter um cavalo em equilíbrio, feliz e sem
resistência” (Oliveira, 1996b)
“Só com métodos racionais e suaves é que se consegue a
sujeição e o equilíbrio...Tenho a certeza que ainda tenho
muito para aprender, não só montando muito mas também
estudando, reflectindo e observando...“ (Oliveira, 1996a).
Figura 48 – CDI Saumur de 2007
39
Filipe Canelas Pinto
O processo de hiperflexão
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Filipe Canelas Pinto

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