representações sociais do sucesso acadêmico na

Transcrição

representações sociais do sucesso acadêmico na
JÚLIO JOSÉ CARDOSO EGREJA
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO SUCESSO ACADÊMICO NA
PERSPECTIVA DE ESTUDANTES BEM-SUCEDIDOS
Dissertação de Mestrado submetida
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
Educação da Universidade Católica
Brasília, visando à obtenção do grau
Mestre.
ao
em
de
de
Orientador: Dr. Afonso Celso Tanus Galvão
Brasília
2007
E32r
Egreja, Júlio José Cardoso.
Representações sociais do sucesso acadêmico na perspectiva de
estudantes bem-sucedidos / Júlio José Cardoso Egreja. – 2007.
88f. ; 30 cm
Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2007.
Orientação: Afonso Celso Tanus Galvão
1. Ensino médio. 2. Rendimento escolar. 2. Motivação na educação. I.
Galvão, Afonso Celso Tanus, orient. II. Título
CDU 371.26
Ficha elaborada pela Coordenação de Processamento do Acervo do SIBI – UCB.
Aos meus pais, pela aposta
incondicional no meu sucesso e na
minha felicidade, e por me fazerem
acreditar nisso.
A Andrea, companheira de todas
as ocasiões, que soube compreender meus momentos de ansiedade e
de solidão.
A Bruna e Júlia, que suportaram
minha parcial ausência, sempre de
forma carinhosa.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por intuir-me e mostrar-me que os desafios são oportunidades.
Aos familiares, pelo apoio.
Aos amigos e amigas que me confortaram com sua presença constante e escuta atenta, em
especial a Ricardo Mariz.
Ao professor Afonso Galvão, que soube demonstrar muitas qualidades de grande professor e
de competente orientador.
Aos gestores do Colégio Marista de Brasília, pelo incentivo.
A todos os que colaboraram para a realização das entrevistas desta pesquisa, em especial os
alunos e alunas participantes.
Ao corpo docente do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Católica de
Brasília, em especial às professoras Eunice Soriano Alencar, Jacira Câmara e ao professor
Cândido Alberto Gomes.
À professora Denise Fleith, por sua disponibilidade e disposição em contribuir para a
realização deste trabalho.
Ao professor e amigo Reinaldo Reis, pela contribuição da revisão textual.
“A representação social é um corpus organizado de conhecimentos
e uma das atividades psíquicas graças às quais os homens
tornam inteligível a realidade física e social, inserem-se num grupo
ou numa ligação cotidiana de trocas, e liberam os poderes de sua
imaginação” (MOSCOVICI, 1978. p. 28)
RESUMO
Este trabalho objetivou investigar as representações sociais do sucesso acadêmico por meio de
pesquisa qualitativa. Participaram da pesquisa 36 estudantes da terceira série do ensino médio
de três escolas privadas de Brasília, que integram o universo dos 10% de maior desempenho
acadêmico de sua série, em cada escola. Foram realizadas 12 entrevistas individuais semiestruturadas e três entrevistas de grupo focal, com 8 jovens em cada um. A pesquisa buscou
identificar as significações do sucesso acadêmico, assim como investigar informações,
imagens e atitudes relacionadas a esse sucesso. Os resultados sugerem que as significações do
sucesso acadêmico giram em torno de reconhecimento, poder e inserção social. Inicialmente,
o reconhecimento pode ser interpretado como a materialização social do sucesso, ou seja,
aquilo que o transforma em um construto socialmente aceito e valorizado. Portanto, há um
elemento de constituição de identidade operando nesse processo. O discurso dos entrevistados
revelou também o poder como fator significacional de construção da imagem no grupo, de
tratamento diferenciado dos professores, de inserção social, de popularidade e aumento do
círculo de amizades. Esse fato torna-se ainda mais relevante se considerarmos que a maioria
se declarou introvertida. Em se tratando de estratégias motivacionais para o estudo, observouse tanto o apelo a metas relacionadas à aprendizagem profunda, mantidas pelo prazer em
aprender, quanto àquelas baseadas em aprendizagem superficial, com foco no alcance de boas
notas. Os entrevistados demonstraram em geral forte necessidade de manutenção de
expectativas daqueles que atuam como referências, freqüentemente os pais.
Palavras-chave: representações sociais, sucesso acadêmico, estudo deliberado, expertise,
motivação para aprendizagem.
ABSTRACT
This study aimed at investigating the social representations of academic success in the
perspective successful students by using qualitative method. Participants were 36 students of
the last year of the secondary school of three private schools of Brasilia. They were amongst
their schools’ best 10% in academic performance. Participants took part in twelve individual
semi-structured interviews and three focal groups interviews with 8 students each one. The
research tried to identify the meanings of the academic high performance and to examine
information, images and attitudes concerned to these matters. Results suggest the meanings of
academic success carry out the idea of recognition, power and social insertion. Recognition
can be interpreted as the social materialization of social success: something that makes it a
construct socially accepted and valued. So this process stands for a strong factor of identity
construction. From the group’s discourse emerged the notion of power. The image of power
as meaning of academic success was also expressed in the privileged treatment by their
teachers. The popularity derived from academic excellence makes it possible for these
students to expand their friendship network. This becomes particularly important if we
consider that most participants declared themselves introverts. Concerning motivational
strategies to keep working, it was observed the use of both strategies intrinsically based on
learning for pleasure and focused on aims related to deep learning, as well as those based on
more superficial strategies associated to merely achieving good grades. In general
interviewees showed a strong need for keeping themselves up to the expectations of those
important to them, particularly parents.
Keywords: social representations, academic success, deliberate practice, expertise, motivation
to learn.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 9
1. REVISÃO DA LITERATURA: sucesso acadêmico................................................... 11
1.1. Sucesso acadêmico e inteligência............................................................................. 12
1.1.1. Inteligência e testes psicométricos................................................................. 13
1.1.2. Natureza X ambiente..................................................................................... 17
1.2. Motivação ............................................................................................................... 18
1.2.1. Motivação para a aprendizagem................................................................... 20
1.3. Expertise.................................................................................................................. 23
1.4. Fatores sociais do sucesso acadêmico...................................................................... 24
1.4.1. O ambiente escolar........................................................................................ 25
1.4.2. O contexto familiar e o sucesso acadêmico................................................... 27
1.4.3. Os colegas e o sucesso acadêmico................................................................. 29
2. NATUREZA DA PESQUISA E METODOLOGIA................................................... 31
2.1. Problema................................................................................................................... 31
2.2. Justificativa............................................................................................................... 33
2.3. Objetivos................................................................................................................... 34
2.3.1. Objetivo geral................................................................................................ 34
2.3.2. Objetivos específicos..................................................................................... 34
2.4. Método...................................................................................................................... 35
2.4.1. Instrumentos de coleta de dados.................................................................... 35
2.4.2. Participantes e local....................................................................................... 36
2.4.3. Procedimentos............................................................................................... 38
2.4.4. Estratégia de análise...................................................................................... 38
2.4.5. A teoria das representações sociais e o ambiente escolar............................. 40
3. RESULTADOS.............................................................................................................. 42
3.1. Significações do sucesso acadêmico........................................................................ 42
3.1.1. Reconhecimento............................................................................................ 42
3.1.2. Poder.............................................................................................................. 45
3.1.3. Inserção social............................................................................................... 47
3.2. Motivações para o sucesso acadêmico..................................................................... 49
3.2.1. Atender a expectativas................................................................................... 50
3.2.2. O papel dos professores................................................................................. 53
3.2.3. Modelos......................................................................................................... 56
3.2.4. Vestibulares e PAS........................................................................................ 58
3.2.5. Competição.................................................................................................... 59
3.2.6. Aprendizagem x notas................................................................................... 62
3.3. Imagens negativas relacionadas ao sucesso escolar................................................. 63
3.3.1. Apelidos......................................................................................................... 64
3.3.2. Pressão excessiva........................................................................................... 65
3.3.3. Insucessos...................................................................................................... 67
3.4. Inteligência e sucesso acadêmico............................................................................. 68
4. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES.................................................................................. 72
4.1. Discussão.................................................................................................................. 72
4.2. Conclusões................................................................................................................ 81
REFERÊNCIAS………………………………………………………………………….. 83
ANEXO…………………………………………………………………………………… 88
9
INTRODUÇÃO
Sucesso acadêmico pode ser considerado resultado da aprendizagem dos
conteúdos escolares e é caracterizado pela manutenção de alto desempenho escolar, expresso
na forma de boas notas ao longo de anos. Há uma série de fatores e processos que contribuem
para esse elevado rendimento, que podem ser próprios do indivíduo, enquanto outros podem
ter origem no meio, como as expectativas e investimentos materiais e afetivos dos familiares.
As causas do sucesso podem ser, portanto, de natureza individual ou de construção coletiva.
Dentre os fatores que influenciam o sucesso acadêmico destaca-se a motivação
para a aprendizagem, caracterizada como força que move o indivíduo na direção da aquisição
de novos conhecimentos. A motivação pode ter orientação intrínseca, centrada no processo de
aprendizagem, ou extrínseca, com foco no desempenho, dependente de fatores externos tais
como recompensas. Assim sendo, também na motivação, torna-se difícil, se não impossível,
distinguir exatamente o que é fator puramente pessoal e o que é fruto de interação social
(STREET, 2001).
A inteligência, um construto de definições tão diversas, apresenta grande
relevância nesse contexto. Muitas vezes é definida como capacidade de aprender a partir da
experiência, ou como conjunto de processos mobilizados na resolução de problemas
(ROAZZI; SPINILLO; ALMEIDA, 1991). Há uma quantidade de testes que vêm sendo
desenvolvidos desde o século XIX e que têm por função avaliar o desempenho cognitivo das
pessoas. Os testes de inteligência, segundo Coll (1996a), continuam sendo preditivos de
sucesso acadêmico.
O estudante do ensino médio está inserido em um contexto que, por um lado,
exige dedicação em virtude da proximidade dos processos seletivos para o ensino superior; e
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por outro lado oferece uma quantidade de atividades para ou extra-escolares que concorrem
com a necessária dedicação.
Com a intenção de investigar as imagens e atitudes que compõem as
representações sociais do sucesso acadêmico, o presente trabalho visou pesquisar também, por
meio de entrevistas com estudantes bem-sucedidos, as conseqüências do sucesso na vida
social, familiar e escolar desses jovens.
As significações do sucesso acadêmico que emergiram neste estudo vão muito
além da manutenção de elevados escores nos boletins escolares. Os fatores motivacionais se
mostraram bem diversos, tendo o modelo e a expectativa dos pais como elementos decisivos.
Esperamos que, durante a apreciação deste trabalho, fiquem explicitados ao leitor
ou à leitora os valores que dão significação às análises dos resultados acadêmicos desvelados
nas pesquisas.
11
1. REVISÃO DA LITERATURA: sucesso acadêmico
Do ponto de vista da gestão de sistemas de ensino, o sucesso escolar é geralmente
avaliado por meio da análise de indicadores como o número de matrículas, a freqüência dos
estudantes, as taxas de evasão escolar e o desempenho de escolas ou sistemas em avaliações
de larga escala (INEP, 2002). Porém, considerando-se o aprendente, tal sucesso pode ser
considerado a partir dos sinais exteriores de competência, baseados nos produtos e nas
atitudes avaliadas pela escola como, por exemplo, o rendimento escolar acumulado (notas ou
médias de final de período escolar).
Para o estabelecimento desses sinais exteriores, o estudo individual deliberado
representa uma importante dimensão a ser considerada. Em termos gerais, estudantes de
sucesso dedicam quantidade considerável de tempo ao estudo individual superando
dificuldades como a fadiga e o desejo de desenvolver tarefas que gerem mais prazer em curto
prazo (GALVÃO, 2001).
Entretanto, para Perrenoud (1995), alguns casos de elevados resultados podem ser
frutos de manipulação por parte do estudante, que passa a jogar com as regras que o jogo
permite. Há um jogo tácito entre professor e aluno, no qual muitas vezes este tenta manipular
a situação em seu favor percebendo suas lacunas. Em outras palavras, aprender a ter sucesso
acadêmico é aprender também a preparar-se para as provas.
Estudo realizado por Nogueira (2004) revelou que estudantes economicamente
favorecidos estabelecem relações predominantemente instrumentais com a escola e com o
saber, ou seja, as metas perseguidas pelos estudantes são, em sua maior parte, pautadas no
utilitarismo (ex., obtenção de notas), e não no conhecimento em si mesmo. A partir dessas
metas, esses alunos e alunas assimilam a maneira de cada professor avaliar, por meio da
12
análise de provas anteriores, por exemplo, e pautam seu estudo nessa preparação para a
realização de exames.
Portanto, a concretização do sucesso acadêmico envolve estratégias previstas no
currículo formal e outras pertinentes ao currículo oculto, que abrange o conjunto de processos
e recursos não explicitados nos planos escolares, mas que exercem influência nas relações
entre os membros da comunidade educativa, de forma tácita.
No que diz respeito ao sucesso acadêmico, duas dimensões são particularmente
esclarecedoras. Envolvem aspectos psicológicos e sociológicos que parecem influenciar o
desempenho escolar. Assim, o sucesso acadêmico será apresentado sob dois vieses:
psicológico e sociológico. Na abordagem psicológica, será relacionado a construtos como
inteligência e motivação. Sob o viés social, o sucesso acadêmico será tratado nos contextos
escolar e extra-escolar.
1.1. Sucesso acadêmico e inteligência
No senso comum, aplica-se o termo inteligência em situações bem diversas. Por
exemplo, a criança que logo aprendeu a falar, o jovem que passou no vestibular, o orador que
prende a atenção da platéia, o mecânico que facilmente conseguiu diagnosticar e resolver o
problema do automóvel. Entre os pesquisadores que investigam o tema, várias são as
definições de inteligência. Embora não haja consenso em relação ao conceito, a capacidade
para aprender a partir da experiência e para adaptar-se ao ambiente são pontos recorrentes nas
definições da inteligência (STERNBERG, 2000). Para Fontana (1998), por exemplo,
inteligência se caracteriza como a capacidade de perceber relações e usá-las para solucionar
13
problemas. Roazzi, Spinillo e Almeida (1991) a definem como um conjunto de processos
mobilizados na resolução de problemas.
A despeito do caráter subjetivo dos conceitos de inteligência, uma categoria que a
acompanha desde o século XIX é sua aferição por meio de testes de inteligência.
1.1.1. Inteligência e testes psicométricos
A medição do nível de inteligência de um indivíduo foi objetivo seguido por
muitos especialistas. Galton (1883) criou um teste de inteligência baseado em questões que
avaliavam a capacidade motora e sensorial (de percepção de diferenças sutis como volume de
som, peso de objetos, notas musicais), com o intuito de classificá-las. Para ele, deveria ser
estimulada a reprodução daquelas pessoas consideradas mais inteligentes (aquelas capazes de
detectar diferenças sutis por meio dos órgãos sensoriais), em detrimento das que obtinham
menor desempenho em seus testes. Tal visão, além de enfatizar somente processos
perceptivos sensoriais, é uma proposta eugênica, isto é, traz implícita a idéia de uma apuração
da raça em direção a um modelo ideal. Algo que, embora soe absurdo, possui até hoje
defensores no meio acadêmico, como por exemplo, Watson (2005), renomado geneticista e
um dos descobridores da estrutura do DNA, que afirmou recentemente não enxergar
problemas na utilização de recursos de manipulação genética para o aprimoramento da
espécie humana. Para ele, não faz sentido permitir o nascimento de uma pessoa que apresente,
sabidamente, capacidade cognitiva muito inferior à média da população.
Como proposta alternativa à abordagem psicofísica de Galton, os pesquisadores
Binet e Simon (1905) criaram teste baseado em julgamentos mentais relativos à direção (saber
o que tem de ser feito e como fazê-lo), à adaptação (habituar uma estratégia e monitorá-la) e à
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crítica (reflexão sobre seus próprios pensamentos e ações). O resultado obtido pela criança era
comparado ao de outras com a mesma idade cronológica, obtendo-se o que foi denominado
idade mental, tendo como objetivo principal a identificação de crianças medianamente
retardadas ou com dificuldades de aprendizagem para que a elas fosse dada a oportunidade de
uma educação adequada às suas necessidades.
A partir daí, Stern (1912) sugeriu a criação de um quociente de inteligência (QI),
caracterizado pela razão entre a idade mental e a idade cronológica. Assim, QIs acima de 100
caracterizam idade mental superior à cronológica. No contexto de uma ciência positivista, os
testes de QI mostravam-se adequados (COLL, 1996a; STERNBERG, 2000).
Posteriormente, vários modelos de testes de inteligência surgiram. Spearman
(1923) propôs, por exemplo, o fator de inteligência geral, ou fator g, uma espécie de energia
mental responsável inclusive pelo desempenho nos testes específicos. Muitos foram os
pesquisadores que propuseram modelos multifatoriais (CARROLL, 1993; CATTELL, 1971;
GUILFORD, 1967). Por meio de análises multifatoriais, fragmenta-se estatisticamente um
construto, nesse caso a inteligência, para se interpretar cada fator ou habilidade a ele atribuída.
Thurstone (1938, citado por STERNBERG, 2000), por exemplo, analisou a inteligência em
sete fatores denominados capacidades mentais primárias: compreensão verbal, fluência
verbal, raciocínio indutivo, visualização espacial, habilidade numérica, memória e rapidez
perceptiva.
Para Gardner (1994), por exemplo, não há um só fator geral de inteligência,
porém várias capacidades independentes (inteligências múltiplas). Nessa perspectiva, uma
mesma pessoa pode ter uma determinada inteligência mais desenvolvida que outra, embora
ainda continuem as dificuldades de se medir psicometricamente as inteligências (PATTO,
1997; STERNBERG, 2000).
15
Sternberg (1981) também criou testes que analisavam a inteligência, basicamente
segundo o tempo de processamento em cada uma de duas etapas do processo cognitivo: o
planejamento global (conhecimento do problema e elaboração de estratégias de resolução) e
planejamento local (a implementação das estratégias de resolução e seus detalhes). Percebeu
que, em geral, pessoas consideradas mais inteligentes (ou seja, de melhor desempenho nos
testes de inteligência) levam mais tempo no planejamento global, porém menos tempo na
execução da tarefa. Por analogia, segundo o autor, pesquisadores mais brilhantes levariam
mais tempo no planejamento e pesquisa, porém seriam mais rápidos na redação do trabalho
que os menos brilhantes. Sternberg (2000), ainda, considera a inteligência dependente de três
capacidades, ou formas de pensamento: analítica (para problemas conhecidos), criativa (para
problemas novos) e prática (para problemas de contextos cotidianos). Os conhecimentos
oriundos dessa classificação ficaram conhecidos como a teoria triárquica da inteligência de
Sternberg.
Gardner (1995), além de criticar os testes psicométricos de inteligência, contesta o
sistema educacional no qual e para o qual esses testes foram desenvolvidos. Para o autor, a
escola deveria ser centrada no indivíduo, de modo a atender os interesses e habilidades dos
estudantes. Escola em que os educadores são especialistas em avaliação, sensíveis e
preparados o suficiente para perceber e potencializar as capacidades e as diversas
inteligências do aluno – lógico-matemática, lingüística, interpessoal, intrapessoal, musical,
corporal-cinestésica e espacial. Portanto, Gardner (1994) defende a idéia do talento como
característica inata, embora não possa determinar satisfatoriamente a estrutura mental sobre a
qual esta noção se sustenta.
Um problema advindo das avaliações psicométricas da inteligência, em geral, é a
estigmatização dos indivíduos classificados nos extremos. Ser classificado como muito acima
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ou muito abaixo da média pode gerar nas crianças dificuldades de várias ordens no campo
relacional e afetar a aprendizagem (FONTANA, 1998).
Outra crítica em relação a essas avaliações psicométricas é que elas geralmente
não levam em conta a diversidade regional e cultural dos avaliados. Os testes são
padronizados, e, em geral, traduções de instrumentos elaborados por pesquisadores europeus
ou norte-americanos. Sabemos que, mesmo entre aqueles que habitam a mesma região
geográfica, há diferenças culturais que variam, por exemplo, de acordo com a origem étnica
ou socioeconômica. Muitos pesquisadores (ex. JENKINGS, 1979; KEATING, 1984)
construíram testes de inteligência que empregam habilidades e conhecimentos relacionados às
experiências dos respondentes. A criação desses testes relevantes à cultura envolve mais do
que somente a adaptação lingüística. Leva em consideração o contexto social em seus
diversos matizes (especificidades de gênero, de ambiente físico e outras). Ceci e
Bronfenbrenner (1985), por exemplo, perceberam que adolescentes apresentam desempenhos
diferentes em uma mesma habilidade, a depender da forma como é exigida.
No campo educacional, os resultados dos estudos sobre a inteligência devem ser
analisados a fim de se aprimorar os processos de ensino-aprendizagem buscando um trabalho
inclusivo, visando o desenvolvimento de habilidades distintas nos estudantes, de acordo com
seus interesses e possibilidades. Até os dias de hoje, os testes de inteligência continuam sendo
preditivos de sucesso acadêmico, pelo menos até o nível do ensino médio. Nesse sentido,
podem-se identificar com relativa margem de segurança alunos com potencial acadêmico,
ainda no início de sua escolaridade (COLL, 1996a; 2000).
Pelo exposto, quantificar a inteligência representa uma meta perseguida por
muitos pesquisadores. Porém, investigar os fundamentos da inteligência nos parece mais
relevante que buscar formas de medi-la. Na discussão acerca dos fatores determinantes da
17
inteligência, é presença constante o debate que estabelece a dualidade entre fatores ambientais
e fatores biológicos como colaborativos para seu estabelecimento.
1.1.2. Natureza X ambiente
Anatomicamente, o cérebro humano é bem conhecido. Suas regiões estão
relativamente bem descritas nos manuais de anatomia. Em termos fisiológicos, muitas áreas
do encéfalo já foram mapeadas. Sabe-se, por exemplo, quais são as regiões responsáveis pela
fala, visão, equilíbrio, coordenação motora, emoções. Porém, em relação aos processos
cognitivos, as bases psicofisiológicas são ainda bastante inconsistentes. Vários estudiosos (ex.
HAIER, 1992; VERNON; MORI, 1992) já tentaram correlacionar inteligência (avaliada em
testes de inteligência) a fatores neurofisiológicos ou anatômicos, como à massa cerebral, à
velocidade de condução do impulso nervoso e à taxa de consumo de glicose no cérebro.
Entretanto os resultados dessas pesquisas se mostraram inconsistentes ou carentes de maiores
investigações (STERNBERG, 2000).
Para muitos autores (ex. PLOMIN; PETRILL, 1997, citados por COLOM, 1998),
a influência genética é um dos determinantes das diferenças intelectuais entre as pessoas,
embora não seja a única, e suas bases não estejam esclarecidas. Pesquisas demonstraram que
indivíduos geneticamente relacionados que foram criados em famílias distintas têm uma
semelhança cognitiva significativa, verificada em testes de inteligência.
Os membros de uma família geneticamente relacionados que vivem juntos têm,
em geral, desempenhos mais similares do que os membros de uma família adotiva. Os gêmeos
univitelinos, que são geneticamente idênticos, apresentam resultados nos testes mais
semelhantes que os dos gêmeos bivitelinos, que compartilham somente da metade de seus
18
genes. Segundo Plomim e Petrill (1997), independentemente da estimação precisa da
hereditariabilidade, o fato é que a influência genética sobre o desempenho nos testes de
inteligência não é somente estatisticamente significativa, como também é substancial.
Nem todos os autores comungam dessa tese. Smith (1998), por exemplo, defende
a idéia de que o desenvolvimento humano é impulsionado menos pelos traços biológicos e
mais pelas experiências culturais heterogêneas que o próprio aprendiz tornou significativas.
Mesmo as diferenças transculturais têm sido correlacionadas a diferenças no desempenho em
testes de inteligência: comunidades rurais versus urbanas; proporções baixas versus altas de
adolescentes dentro das comunidades, nível socioeconômico baixo versus alto das comunidades (STERNBERG, 2000).
Com base em todo este debate, talvez seja plausível pensar que o construto
inteligência é tampouco influenciado por fatores exclusivamente biológicos, nem somente por
aqueles atribuídos ao ambiente: trata-se de um construto multifatorial, para o qual a restrição a
algum desses fatores nos parece uma posição reducionista, inclusive porque, até o presente
momento, e com os recursos disponíveis, não é possível segregar os fatores biológicos dos
culturais, já que eles se relacionam e se influenciam mutuamente.
1.2. Motivação
Diferentes correntes da Psicologia definem e interpretam a motivação de maneiras
diversas. Nos animais, a motivação está intimamente ligada à homeostase, que é a tendência
do organismo em se manter funcional, em equilíbrio dinâmico com o meio. Nesse sentido, a
motivação nos animais está relacionada à saciedade das funções básicas da manutenção da
vida e da espécie, tais como fome, sede e sexo (FONTANA, 1998).
19
Na visão dos comportamentalistas, motivação, recompensa e punição caminham
muito próximas. A motivação corresponde a um impulso proveniente de um estímulo externo
gerador de resposta, que é um comportamento observável (COUTINHO; MOREIRA, 1999).
Quando se quer motivar o indivíduo em direção a um comportamento desejado, usa-se a
recompensa. Quando não se quer tal comportamento, a punição atua como fator motivador da
extinção desse comportamento observável. À medida que o estímulo é repetido, ocorre uma
associação entre ele e a resposta, que passa a ser automatizada, transformando-se em hábito.
Nessa visão, o ambiente é determinante da motivação e, portanto, controlador das
aprendizagens. Portanto essa abordagem não prestigia as estruturas cognitivas (MIZUKAMI,
1996; STERNBERG, 2000).
Para a teoria psicanalítica, a motivação está relacionada à satisfação dos
instintos e dos desejos, que por sua vez estão ligados à sobrevivência do indivíduo e ao prazer
(fome, sede, sexo etc.). Esses impulsos motivadores, denominados pulsões, atuam em direção
à satisfação de desejos inconscientes. Braghirolli (1990) ressalta que, para Freud, os
fenômenos do inconsciente, tais como os sonhos, podem influenciar a motivação do
indivíduo.
Autores de influência cognitivista (STERNBERG, 2000) acreditam que a
motivação origina-se tanto de processos conscientes do indivíduo como dos acontecimentos
do meio sobre os quais não tem controle. Por meio da percepção, valores, crenças, opiniões e
expectativas, o indivíduo regulará sua conduta em direção à meta desejada. O discurso de
psicólogos cognitivistas enfatiza o papel da criatividade como agente motivador de
descobertas de padrões e significações.
À luz da psicologia humanista, a motivação não é oriunda apenas de sua
fisiologia, necessidade cognitiva, impulso ou instinto, mas da conjunção de todos esses fatores
20
(MIZUKAMI, 1996). Para Maslow (1970), a motivação segue uma escala hierárquica das
necessidades básicas (sede, fome, proteção ao perigo) passando pelas afetivas (amor,
aceitação, auto-estima) até as intelectuais (cognitivas, estéticas, auto-realização). Para ele, o
indivíduo só irá motivar-se intensamente por uma determinada necessidade se a anterior
estiver atendida (FONTANA, 1998).
Para Freire (1980), em abordagem sociocultural, a motivação corresponde à
energia libertadora da submissão do oprimido, tendo como meta a consciência crítica e a
humanização das relações sociais.
1.2.1. Motivação para a aprendizagem
A aprendizagem é definida por Fontana (1998, p. 156) como “mudança
relativamente persistente no comportamento potencial do indivíduo devido à experiência”.
Para Hilgard (1973, p. 3) aprendizagem é o
[...] processo pelo qual uma atividade tem origem ou é modificada pela reação a uma
situação encontrada, desde que as características da mudança não possam ser
explicadas por tendências inatas de respostas, maturação ou estados temporários do
organismo.
Nesse contexto, estudar a motivação para a aprendizagem significa pesquisar o
que move o indivíduo a atingir essa mudança no comportamento, ou seja, onde ele se inspira,
busca forças para adquirir novos conhecimentos. Na educação escolar, motivação para a
aprendizagem pode ser definida como aquilo que serve de incentivo ao estudante para
aprender e como isso se reflete no grau de aceitação ou negação das tarefas e a maior ou
menor tendência a perseverar na realização dessas tarefas (COLL, 2000).
21
A motivação para a aprendizagem tem característica dinâmica e desenvolve-se na
relação entre o indivíduo e seu meio. Pode ser categorizada segundo três dimensões: origem,
estabilidade e possibilidade de controle. Se a motivação é originada e sustentada a partir do
desejo, necessidade ou satisfação do aprendiz, é denominada interna; se o motivo advém do
ambiente, é classificada como externa. Nesse caso, o estudante mantém-se dependente de
fator externo para continuar interessado na tarefa. Alunos com forte motivação extrínseca
dependem de um ambiente competitivo que gere comparações entre as pessoas. Do ponto de
vista da avaliação, as que apresentam função classificatória atuam como motivadoras
extrínsecas (STREET, 2001). Segundo o mesmo autor, a motivação intrínseca é aquela
alimentada pela curiosidade, necessidade de exploração, de descoberta. É caracterizada por
gerar metas de longo prazo, centradas na aprendizagem. Portanto, o estudante foca mais o
processo, a tarefa em si, do que o resultado que ela produzirá.
Se a motivação é dependente de um fator dificilmente alterável, como habilidade,
é considerada estável; se depender de fatores volúveis como humor, é considerada instável.
Quanto à controlabilidade, a motivação é considerada controlável ou incontrolável,
dependendo da possibilidade de controle do sujeito sobre o fator motivacional. (TAPIA;
GARCIA-CELAY, 1996; DRISCOLL, 1999).
Entre os indivíduos com altas habilidades, a motivação intrínseca parece ser o
principal agente incentivador da aprendizagem. Em diversos modelos relacionados à
superdotação, encontra-se o fator motivação como integrante da própria definição de
superdotado. No modelo de Renzulli, o que caracteriza o indivíduo superdotado é uma
conjunção de três fatores: envolvimento com a tarefa (a motivação ocupa aí papel central),
criatividade e habilidade acima da média. (ALENCAR, 2001; ALENCAR; FLEITH, 2001).
22
A motivação intrínseca é também decisiva para o alto desempenho criativo.
Impulso para a realização, dedicação ao trabalho, desejo pelo novo (ALENCAR, 1991), amor
à criação e curiosidade intelectual são fatores motivacionais à criatividade, e ao
desenvolvimento de altas habilidades (MARTÍNEZ, 1995).
Csikszentmihalyi (1996) denominou de estado flow o ápice da motivação
intrínseca, quando o indivíduo concentra-se tanto na atividade que acaba por perder a noção
do tempo. Nesse caso, a satisfação pelo processo e o sentimento de controle são tão intensos
que a atividade passa a ter um fim em si mesma, sendo denominada “autotélica”, superandose resistências como o cansaço e a ansiedade (ALENCAR; GALVÃO, 2007; COLL, 1996a).
Níveis de ansiedade e de controle interno interferem na motivação. Em geral,
existe uma faixa ótima de ansiedade geradora de incremento à motivação para a aprendizagem
e para a performance. Portanto, a ansiedade nem sempre atua como fator de resistência à
realização da tarefa. Se a pessoa encontra-se abaixo dessa faixa, tende à letargia. Se estiver
acima, pode passar a sentir medo do fracasso, que pode gerar aprendizagem superficial
(preenchimento de requisitos formais da tarefa para não fracassar) ou conduta estereotipada
(ex. “eu já sei”, ou “essa tarefa é banal”), o que dificulta o avanço (COLL, 1996a;
FONTANA, 1998).
Dentre as fontes de motivação para a aprendizagem, destacam-se a curiosidade, a
relevância da tarefa de aprendizagem (interesse e necessidade), o estabelecimento de
objetivos de curto, médio e longo prazos. Cumprir as metas traçadas (experiência positiva)
reforça a auto-estima (juízo valorativo de si), gera imagem positiva de si mesmo e influencia
positivamente a forma de enfrentar novos desafios ativando mecanismos de auto-regulação. A
relação entre a noção da dificuldade de uma determinada tarefa e a do seu resultado é
chamada de auto-eficácia, que pode ser influenciada por alguns fatores, tais como a
23
experiência anterior em tarefa semelhante, o conhecimento do desempenho de alguém na
mesma tarefa, a persuasão verbal feita por outra pessoa e o estado fisiológico ou psicológico
(emocional) do aprendiz. Estudantes com autoconceito e auto-estima elevados obtêm
melhores resultados na escola (BANDURA, 1977; COLL, 1996a, 2000).
Para Weiner (1979), a motivação para ações futuras depende da maneira como
atribuímos razões para o sucesso ou fracasso de ações passadas. As causas atribuídas podem
ser classificadas em categorias. Quanto à origem, podem ser internas ou externas. Em relação
ao controle, elas podem ser controláveis ou não-controláveis (pelo próprio indivíduo). Por
exemplo, afirmação causal como “... não me saí bem porque eu estudei pouco, de fato” denota
atribuição interna e controlável (na próxima vez, poderá se dedicar mais), enquanto “não fui
bem porque o professor não explicou bem a tarefa” caracteriza atribuição causal externa, nãocontrolável. Segundo o autor, estudantes mais motivados são aqueles que atribuem a causa do
sucesso ao próprio esforço (interna, controlável).
Pode-se traçar um paralelo entre o sucesso acadêmico e o elevado nível de
desempenho em tarefas específicas, ou seja, a expertise.
1.3. Expertise
Para Galvão (2001), expertise pode ser definida como a “capacidade, adquirida
através de prática ou estudo individual deliberado, de desempenhar particularmente bem uma
tarefa específica de um domínio” (p. 225). Expertise e inteligência são construtos próximos.
Alguns autores consideram-nas sinônimos (CECI; LIKER, 1986); outros vêem a expertise
como um caso de elevado raciocínio inteligente (FRENSCH; STERNBERG, 1989).
24
Sentir-se valorizado e capaz são importantes fatores para se atingir a excelência. A
atribuição causal interna também é uma característica presente no desenvolvimento da
expertise. Portanto, pessoas que atingem a expertise tomaram para si a responsabilidade de
sua aprendizagem dedicando-se intensamente ao estudo individual deliberado ao longo de
muitos anos, o que lhes passa a conferir amplo domínio na área de expertise. São geralmente
determinadas a atingir alta qualidade de performance, ou seja, dedicam-se intensamente ao
estudo e à atuação na tarefa em si.
Para Ericsson e Smith (1994), o desenvolvimento da expertise se dá por etapas,
em que se observa uma progressiva mudança de fatores motivacionais: dos externos (pais,
professores auxiliando na construção de uma rotina de estudo e organização) aos internos
(auto-reguladores, ou seja, a pessoa desenvolve mecanismos próprios de estabelecimento e
perseguição de metas e de rotinas de estudo individual).
Segundo Galvão (2001), entre outras características do especialista, destacam-se a
excelente memória e o uso de diferentes estratégias para a resolução e representação de
problemas, além da capacidade de concentração na atividade da expertise, muitas vezes
solitária e monótona. Expertos constroem estratégias de adiamento de gratificações, ou seja,
desenvolvem mecanismos de resistir às ofertas para atividades outras potencialmente mais
prazerosas em curto prazo optando pela atividade em que se especializarão.
1.4. Fatores sociais do sucesso acadêmico
Dentre os fatores que cooperam para o sucesso acadêmico, serão agora abordados
aqueles predominantemente externos ao indivíduo, ou seja, oriundos do ambiente
sociocultural onde o estudante se insere e constrói sua vida. Há na literatura uma quantidade
25
de considerações sobre a relação entre o sucesso acadêmico e alguns fatores, tais como o nível
socioeconômico e os ambientes escolar e familiar.
Pesquisas diversas avaliaram a relação entre o desempenho dos alunos em provas
e diversos fatores ligados ao contexto sociocultural. Muitas dessas pesquisas foram
desenvolvidas simultaneamente em vários países (GOMES, 2005). Cientes do risco do
reducionismo e de relegarmos alguns aspectos relevantes, optamos por categorizar esta
abordagem em três contextos: o ambiente escolar, o ambiente familiar e os colegas. Mesmo
sabendo que integram o ambiente escolar, optamos por enfatizar a participação dos colegas na
obtenção e manutenção do sucesso escolar.
1.4.1. O ambiente escolar
Há na literatura a visão de que escolas com maior autonomia na gestão e com
diretores com visão estratégica, capacidade de liderança e de motivação do corpo docente, e
que tratam bem os alunos e professores, apresentam índices maiores de rendimento escolar.
Portanto, a capacidade de decisão acerca de compras, nomeações, demissões e outras
atribuições do gestor têm implicação no aumento de desempenho dos estudantes (GOMES,
2005). Mais que controlar, gestores de escolas eficientes incentivam o desenvolvimento dos
potenciais de seus educadores e alunos. Estimulam e encorajam o corpo docente a prosseguir
estudos, tratam os estudantes cordialmente, possuem certo grau de autonomia, zelam por um
ambiente democrático e por uma atmosfera de ordem.
No que concerne à estrutura física da escola, a literatura disponível é bastante
diversificada no que diz respeito à relação entre ser bem equipada e ser bem sucedida. Em
geral, escolas bem equipadas com material didático apresentam alunos de maior desempenho
26
que as menos equipadas. Não há dúvidas de que as instalações e equipamentos influenciam no
sucesso acadêmico, porém é difícil quantificar essa influência, já que escolas bem equipadas,
em geral, apresentam também outros atributos e atraem estudantes de destaque acadêmico que
representam um público auto-seletivo. Embora os recursos sejam prevalecentes, percebe-se
que os processos, mais que os recursos, exercem maior influência no favorecimento de
elevados desempenhos escolares (CASASSUS, 2002).
Em relação ao número de alunos por turma, pesquisa na América Latina
demonstrou que turmas com 25 estudantes apresentam melhores desempenhos que outras
significativamente menores ou maiores (CASASSUS, 2002). Gomes (2005) mostra que, em
países de outros continentes, o número de alunos pode não ter influência direta no rendimento
dos estudantes. Em outras palavras, mais importante que a quantidade de alunos por turma é o
tipo de estratégia de ensino adotada e o clima da sala de aula.
Para alguns autores (CASSASSUS, 2002; GOMES, 2005), dos fatores ligados à
escola, o clima emocional de sala de aula é o que mais influencia no desempenho dos
estudantes. Casassus (2002) chega a afirmar que esse fator tem, quantitativamente, a mesma
significância que todos os outros juntos. Várias características concorrem para o
estabelecimento de saudáveis relacionamentos interpessoais na sala de aula que repercutem na
elevação do desempenho dos alunos: ambiente cooperativo, cumprimento de normas
estabelecidas em conjunto, confiança, cordialidade, liderança, clima de ordem, ausência ou
baixos níveis de violências (GOMES, 2005; UNESCO, 2003). O que denominamos “clima de
sala de aula”, portanto, é um conjunto segmentado de fatores que abrangem desde a formação
e personalidade do professor até as condições físicas da sala.
Vários aspectos relacionados aos docentes têm implicação direta ou indireta no
rendimento de seus alunos. Casassus (2002) observou que professores mais reflexivos em
27
relação à sua prática e mais autônomos têm alunos com melhores desempenhos acadêmicos.
O mesmo autor mostra que, em relação às atribuições causais, aqueles professores que
atribuem a causa do sucesso ou do fracasso a fatores externos (geralmente familiares)
apresentam estudantes com menores desempenhos. Alunos que obtêm maiores rendimentos
têm professores que trazem para si a responsabilidade do sucesso ou fracasso escolar, isto é,
professores que centram as atenções nas próprias habilidades e nas dos estudantes bem como
nas estratégias de ensino.
Em relação a essa atribuição causal, podemos traçar um paralelo com a expertise:
pessoas que atingem alto nível de desempenho em uma atividade também apresentam
atribuição causal interna, ou seja, chamam para si a responsabilidade sobre o sucesso ou
fracasso (GALVÃO, 2001). Em outras palavras, este parece ser um indiscutível ingrediente de
sucesso, não só no contexto educacional.
Escolas cujos alunos apresentam alto desempenho acadêmico têm professores
com elevado grau de satisfação (não apenas financeira), reflexivos sobre sua prática e com
certo grau de autonomia para o planejamento e a ação pedagógica. Professores que dão
importância à avaliação e seus registros e que avaliam a aprendizagem de seus alunos de
forma sistemática e processual. Embora o conflito entre idéias e posicionamento de docentes
seja previsível, é imperioso também haver certo grau de consenso entre os professores
(CASASSUS, 2002; GOMES, 2005).
1.4.2. O contexto familiar e o sucesso acadêmico
O sucesso acadêmico pode variar de acordo com as condições familiares. No que
tange ao nível socioeconômico, vários exames de avaliação de sistemas – por exemplo, o
28
Saeb (INEP, 2002) –, constatam correlação positiva entre essa condição e o resultado em
testes. Gomes (2005, p. 220) afirma que “quanto mais alto o status socioeconômico, maior é o
estímulo para ir adiante na escala educacional, e vice-versa”. Dubet (2003, p. 36) reforça essa
retroalimentação assegurando que “alunos mais favorecidos socialmente, que dispõem de
maiores recursos para o sucesso, são também privilegiados por um conjunto de mecanismos
sutis, próprios do funcionamento da escola, que beneficia os mais beneficiados”.
Em relação ao número de filhos, Castro (1984) mostra que famílias menos
numerosas têm maiores proporções de estudantes de maior desempenho e com escolarização
mais longa. A ordem de nascimento também pode ser fator de influência. Percebe-se que,
numa mesma família, alguns filhos podem desenvolver uma carreira escolar mais bem
sucedida que outros. O primogênito costuma levar vantagem em relação aos demais irmãos
(CAMACHO, 2000; SOUZA E SILVA, 1999).
O interesse dos pais pela leitura (e pela leitura para os filhos), o tempo de
permanência deles em casa e de diálogo com os filhos, o nível de escolaridade dos pais, a
expectativa dos pais em relação ao sucesso dos filhos e o envolvimento dos pais nas
atividades escolares, entre outros, são fatores que apresentam correlação positiva com o
sucesso acadêmico (CASASSUS, 2002; GOMES, 2005). Dentre eles, destacamos a
alimentação de elevadas expectativas em relação ao sucesso dos filhos e a participação em
atividades escolares, inclusive nas decisões institucionais, por meio de conselhos de pais, por
exemplo (MELLA et al., 2002).
O nível de instrução dos pais tem forte impacto sobre a probabilidade de um filho
freqüentar a escola e obter sucesso escolar, sendo que a influência da educação da mãe
costuma ser maior do que a do pai (IBGE, 2001). Isso pode ser explicado pelo fato de a mãe
estar mais envolvida no acompanhamento escolar dos filhos.
29
1.4.3. Os colegas e o sucesso acadêmico
Alunos que se aproximam de colegas mais privilegiados e interagem com eles
obtêm aspirações mais altas e melhores resultados no estudo, o oposto sendo verdadeiro
(GOMES, 2005). Assim sendo, um misto de cooperação e competição entre colegas parece
ser fator benéfico à melhora do desempenho. Por outro lado, os colegas podem exercer
influência negativa, por meio de violências simbólicas e incivilidades, até porque essas
atitudes hostis acabam por contaminar o grupo e geram novos atos hostis (ABRAMOVAY,
2002). Com isso, estudantes potencialmente bem-sucedidos podem não se desenvolver
plenamente em relação às habilidades cognitivas. Ser destacadamente bem-sucedido é ser
diferente, e isso geralmente é motivo de manifestações como segregações, exclusões e
indiferenças por parte de colegas, sejam elas explícitas ou disfarçadas.
Essa crise de socialização, para Dubet e Martuccelli (1995), ocorre pelo fato de a
escola não estar conseguindo desempenhar de forma satisfatória seus dois papéis, pedagógico
e relacional, sendo permissiva – de forma velada ou declarada – a essas formas de violência.
É necessário, portanto, que educadores e gestores assumam, em todos os níveis da educação,
esse papel de socialização pertencente, embora não exclusivamente, à instituição escolar
(CAMACHO, 2000). Essa ação conjunta atuará na diminuição do que Tedesco (2002)
denomina déficit de socialização, que é a carência de referenciais de valores gerada pelo fato
de família e escola terem diminuído sua ação no sentido da socialização de suas crianças e
jovens, culpando-se mutuamente.
Portanto, o sucesso acadêmico é apresentado como resultado de processos
diversos que, por serem psicológicos, biológicos e sociais, são dotados de grande
complexidade. Pode ser considerada reducionista qualquer tentativa de simplificação, a ponto
de se eliminar um conjunto de fatores causais.
30
Sem entrar no mérito das conseqüências do sucesso acadêmico, o que se
pretendeu com esta revisão foi a apresentação sucinta de alguns desses fatores relacionados ao
alcance de elevados desempenhos escolares. Para fins de organização da apresentação, optouse por separar os de origem psicológica daqueles de natureza social. Na realidade, porém,
como já fora dito, esses diversos fatores estão intimamente intricados, a ponto de, muitas
vezes, ser difícil a tarefa de segregá-los, ainda que para fins de análise e explicação.
31
2. NATUREZA DA PESQUISA E METODOLOGIA
2.1. Problema
O sucesso acadêmico é caracterizado nesta pesquisa como aquele resultante do
alto desempenho no rendimento escolar, manifestado por elevadas notas durante um período
relativamente longo (pelo menos um ano letivo). Portanto, partimos do princípio de que, no
ambiente escolar, estudante que alcança resultados superiores é considerado bem-sucedido
academicamente, independente das conseqüências que esse sucesso poderá trazer à sua vida.
Logo, não se pretendeu com este estudo entrar no julgamento do valor do sucesso acadêmico
como preditivo de sucesso pessoal ou profissional, assim como não foi intenção desta
pesquisa avaliar ou discutir a qualidade educacional dos estabelecimentos de ensino dos
grupos pesquisados. Pretendeu-se compreender, portanto, como estudantes bem-sucedidos
representam o sucesso acadêmico, quais são suas significações, como estas se relacionam com
a vida prática do aluno, com a sua vida afetiva, com a sua rede social, entre outras.
A investigação sobre o sucesso acadêmico na perspectiva de estudantes bemsucedidos, objeto desta pesquisa, foi ancorada na teoria das representações sociais. De acordo
com essa teoria, o indivíduo constrói uma estrutura cognitiva da sociedade em que vive. Essa
estrutura, denominada por Moscovici (2003) de representações sociais, constitui uma forma
de conhecimento primordial, socialmente elaborado e partilhado, que auxilia o sujeito a
conhecer o mundo e a agir sobre ele atendendo às necessidades cotidianas. O verbo
representar significa reproduzir o pensamento em imagem ou símbolo. Portanto, este estudo
das representações sociais do sucesso acadêmico se propõe a fazer emergir esse construto e
seu papel na forma de agir e pensar de estudantes bem-sucedidos, permitindo a compreensão,
pelo menos em parte, de sua postura frente aos estudos, ao grupo social e à família.
32
Ao longo da história, o sentido do conhecimento tem passado por transformações.
Na sociedade atual, conhecimento apresenta íntima relação com sucesso profissional, sendo
inclusive considerado um tipo de capital (DEMO, 1997). Nesse contexto, a possibilidade de
valorização do sucesso acadêmico é ainda maior, inclusive por ser considerado fator preditivo
de êxito profissional. Este é, ainda, um dos argumentos de professores e pais para persuadir
seus alunos e filhos no sentido da dedicação aos estudos.
Tomamos neste trabalho o rendimento escolar como referência de excelência
observável. É razoável observar que o ser e o parecer ser excelente podem não se tratar da
mesma coisa, ou seja, seria ingênuo imaginar que os processos avaliativos escolares
identificam precisamente estudantes de excelência acadêmica. Ou seja, é importante destacar
que há uma possibilidade de estudantes selecionados para a pesquisa terem chegado ao
sucesso acadêmico por meio de manipulações que o sistema permite, como o da preparação
para os exames com base na aprendizagem mecânica, na qual a memorização é a estratégia
principal. Em outras palavras, embora tenhamos consciência das limitações da avaliação
escolar, por outro lado deve-se reconhecer o seu impacto na rede social, afinal é amplamente
difundido que bons alunos tiram boas notas.
Independentemente da forma com que alcançaram o sucesso e das suas possíveis
conseqüências, o relevante é que, nos ambientes escolar e familiar, os participantes são vistos
como bem-sucedidos e estão sujeitos a todas as decorrências dessa circunstância.
Nesse contexto, torna-se preponderante investigar que fatores motivacionais
levaram o estudante ao sucesso acadêmico, assim como o que esse sucesso significa para o
aluno bem-sucedido, ou seja, como isso faz parte de seu mundo; como o influencia em sua
inclusão social, que preço ele paga por ser bem-sucedido e que possíveis satisfações e
insatisfações o sucesso traz.
33
2.2. Justificativa
A presente pesquisa pretendeu contribuir para os estudos sobre a motivação para a
aprendizagem fornecendo conhecimentos que poderão auxiliar na orientação educacional de
professores, estudantes e familiares, no sentido do fomento ao desenvolvimento acadêmico.
Por explorar as conseqüências do sucesso, a pesquisa contribui com os estudos
sobre o ajustamento de estudantes com alto desempenho acadêmico, assim como dá pistas a
educadores e familiares quanto à orientação desses alunos, principalmente no sentido de
auxiliar em direção a uma inserção social saudável. A partir do conhecimento do mundo do
estudante de sucesso, o estudo sinaliza rumos para o estabelecimento de condições favoráveis
ao desenvolvimento do potencial acadêmico.
34
2.3. Objetivos
2.3.1. Objetivo geral
Investigar as representações sociais do sucesso acadêmico na perspectiva de
estudantes bem-sucedidos.
2.3.2. Objetivos específicos
ƒ Identificar as significações do sucesso acadêmico;
ƒ Investigar informações, imagens e atitudes relacionadas ao sucesso acadêmico;
ƒ Caracterizar os fatores motivacionais que levaram o estudante ao sucesso acadêmico;
ƒ Investigar as conseqüências do sucesso acadêmico na vida social, cognitiva e
emocional do estudante.
35
2.4. Método
A pesquisa teve caráter qualitativo e exploratório. Bauer e Gaskel (2002)
caracterizam a pesquisa qualitativa como aquela que evita números e lida com interpretações
das realidades sociais, ao passo que a quantitativa lida com números e usa modelos
estatísticos para explicar os dados. Não se trata de modelos antagônicos, porém diversos,
sendo cada um adequado a um determinado tipo de análise, ou seja, cada tipo se destina a um
propósito. Podem ser complementares, inclusive (triangulação). Assim, pode-se utilizar, em
uma mesma pesquisa, de métodos quantitativos para medir-se a extensão de um fenômeno, e
qualitativos a fim de se avaliar a sua intensidade (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).
Pelo seu caráter qualitativo e exploratório, a presente pesquisa visou trabalhar
profundamente o tema do sucesso acadêmico em uma quantidade de participantes menor que
a de um estudo quantitativo clássico, que tem como principal característica sua grande
extensão. Ao invés dessa amplitude, o estudo qualitativo objetivou prioritariamente a
intensidade da abordagem, permitindo-se assim a exploração do universo de cada participante
ou grupo.
2.4.1. Instrumentos de coleta de dados
Esta pesquisa utilizou as técnicas de entrevista semi-estruturada e de entrevistas
de grupo focal. A opção pela entrevista deve-se ao nível de profundidade que se pretendeu
atingir na exploração do tema. Segundo Bauer e Gaskel (2002), na pesquisa social, “estamos
interessados na maneira como as pessoas espontaneamente se expressam e falam sobre o que
é importante para elas e como elas pensam sobre suas ações e as dos outros” (p. 21). A
flexibilidade em relação à seqüência determinada pela naturalidade do discurso dos sujeitos
36
também é uma vantagem desta técnica. As entrevistas coletivas (grupos focais) permitiram ao
pesquisador explorar o tema a partir da interação entre os entrevistados, o que se torna
interessante em uma pesquisa de representações sociais.
As entrevistas tiveram por meta a exploração da significação do sucesso
acadêmico, os fatores motivacionais que cooperam para seu desenvolvimento e as suas
conseqüências para a vida do estudante. Para isso, o roteiro conteve as seguintes questões:
ƒ
Para você, o que representa ser bem-sucedido(a) academicamente?
ƒ
Como e onde você aprendeu que ser bem-sucedido é isso?
ƒ
A que você atribui esse sucesso?
ƒ
O que motivou ou motiva seus estudos?
ƒ
Que conseqüências o sucesso acadêmico traz em termos de suas relações sociais?
ƒ
Há algo mais que você gostaria de falar sobre o assunto?
No transcorrer das entrevistas, outras perguntas surgiram a partir da fala dos
participantes, algo natural em entrevistas semi-estruturadas, permitindo-se assim exploração
mais profunda dos significados contidos nos discursos.
2.4.2. Participantes e local
Participaram da investigação 36 estudantes do terceiro ano do ensino médio,
sendo 18 moças e 18 rapazes. A opção pela terceira série do ensino médio se fez por ser o
último ano da educação básica e pela relativa maturidade e autocrítica dos estudantes. Foram
selecionadas três escolas privadas do Distrito Federal, região que apresenta elevado Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH).
37
O cálculo do IDH é feito em três variáveis: renda, longevidade e educação. O
índice máximo de 1,0 não foi atingido até agora em nenhum lugar do mundo. O campeão de
IDH, entre os países, é a Noruega, com índice de 0.942, seguido da Suécia, com 0,941. O
índice na Região Administrativa de Brasília, onde está instalado o chamado Plano Piloto,
chega perto dos melhores do mundo, com a marca de 0,936 (IBGE, 2001). A opção por
escolas privadas de elevado nível socioeconômico pode ser justificada pelo fato de perceberse correlação positiva entre status sociocultural e rendimento escolar (CASASSUS, 2002).
Outro motivo da escolha por participantes privilegiados economicamente é o fato de haver
poucos estudos sobre a escolarização das elites. A sociologia da educação, tanto no Brasil
como em outros países, tem se detido a estudar sistematicamente a escolarização dos menos
aquinhoados financeiramente (NOGUEIRA, 2004).
Os participantes foram selecionados de acordo com o desempenho acadêmico.
Foram convidados doze jovens por escola, que encerraram o ano letivo anterior no decil
superior de sua série, de acordo com os registros disponíveis emitidos pela coordenação
pedagógica ou pela secretaria escolar. Em outras palavras, participaram da pesquisa
estudantes que pertenciam ao grupo dos 10% de maior rendimento em sua série. Dessa forma,
a pesquisa teve como sujeitos estudantes que se destacam academicamente em um contexto de
elevado índice de sucesso escolar.
A média de idade dos participantes era de 17 anos e 4 meses. O mais novo tinha
16 anos e idade, e o mais velho 18. Pouco mais da metade deles é filho mais velho (19
participantes), mais de um quarto localiza-se no meio da prole (10 jovens), menos de um
quarto é filho caçula (6 estudantes), apenas um filho único. A quase totalidade dos pais (um
genitor como exceção) tem nível superior completo.
38
A dedicação média dos entrevistados ao estudo individual era de 17 horas
semanais. Esse estudo ocorre, para dois terços dos entrevistados, em casa. Um terço costuma
estudar na escola. Todos eles tinham carga horária escolar concentrada principalmente no
período matutino, e a maioria declarou dedicar-se ao estudo individual prioritariamente no
turno vespertino.
2.4.3. Procedimentos
Foram realizadas doze entrevistas semi-estruturadas individuais (quatro em cada
escola) e três entrevistas de grupo focal (uma por escola), com oito alunos por grupo. As
entrevistas ocorreram no próprio ambiente escolar, durante o turno vespertino. Foram
gravadas em áudio e transcritas pelo pesquisador. A duração média da entrevista individual
foi de 53 minutos, e do grupo focal, uma hora e 26 minutos.
Para viabilizar a coleta de dados, foi encaminhada a cada escola carta de
apresentação emitida pela Universidade Católica de Brasília. Além disso, cada estudante leu,
assinou e ficou com uma via do termo de consentimento livre e esclarecido (presente em
anexo).
2.4.4. Estratégia de análise
Os dados foram analisados segundo a análise de conteúdo. Para Bardin (1977), a
análise de conteúdo corresponde a um conjunto de técnicas que, de forma sistemática e
objetiva, visa obter indicadores que permitam ao pesquisador inferir conhecimentos relativos
à produção da mensagem. Segundo o autor, o desmembramento do texto em categorias
39
possibilita posterior agrupamento de categorias análogas de diversos sujeitos. Isso permite o
levantamento da freqüência com que cada idéia ocorre no conjunto dos sujeitos pesquisados.
Esse processo o autor denominou análise freqüencial ou temática.
A análise de conteúdo, para o mesmo autor, também possibilita a interpretação do
que está por trás do conteúdo, ou seja, as motivações, desejos e outras características e
manifestações de cunho afetivo, como risos, pausas e perturbações, o que facilita a
interpretação do conteúdo, seus significados e encadeamentos. Essa parte da análise do
conteúdo Bardin (1977) chamou de análise da enunciação.
Nessa proposta, a análise dos dados seguiu os seguintes passos:
a. Transcrição de cada uma das entrevistas individuais semi-estruturadas e das
entrevistas de grupo focal;
b. Leitura atenta dos textos das entrevistas;
c. Seleção de palavras ou termos geradores das categorias e subcategorias;
d. Estabelecimento das categorias e subcategorias, cada uma delas nomeada;
e. Organização hierárquica das categorias, de acordo com a freqüência, relevância
e pertinência ao tema da pesquisa;
f. Comparação, por analogia ou por confronto, das categorias oriundas de
entrevistas de sujeitos distintos, levando-se em consideração a análise da
enunciação, interpretando-se o sentido da fala dos entrevistados.
40
2.4.5. A teoria das representações sociais e o ambiente escolar
Esta pesquisa está ancorada na teoria das representações sociais, que possibilitou
ao pesquisador a exploração do modo como o aluno bem-sucedido se percebe e como essa
percepção influencia sua maneira de ser e agir. A teoria das representações sociais congrega
aspectos localizados entre a psicologia cognitivista e a sociologia durkheimiana.
A visão cognitivista da psicologia da aprendizagem em muitos aspectos se
confronta com o determinismo econômico-social proposto pela sociologia de Durkheim.
Enquanto a primeira tende a ser excessivamente focada no indivíduo, a segunda dá
importância exagerada ao contexto social (GUARESCHI; JOVCHELOVITCH, 1995).
Moscovici (1976) propõe uma perspectiva em que as representações geradas no
ambiente social são reelaboradas pelo indivíduo e passam a interferir na maneira como ele
pensa e interpreta o cotidiano, em relação dialética com o meio. O que a teoria das
representações sociais traz é mais do que uma investigação do senso comum. São
conhecimentos individuais que só ocorrem no momento em que a interação com o outro se dá.
Os objetos não são, portanto, captados isoladamente pelos indivíduos, mas em
determinados contextos e relações. Representar um objeto significa criá-lo simbolicamente,
passando assim a fazer parte de seu mundo (MOSCOVICI, 1976). Esse objeto simbólico age
como campo de interação entre o processo ideológico e o representativo, podendo enfatizar
diferenças individuais e cristalizar preconceitos (PATTO, 1997).
De grande importância à psicologia social em seus mais diversos campos de
pesquisa, a teoria das representações sociais encontra no ambiente escolar um espaço
privilegiado para investigação. Se o comportamento humano é alterado por pressões sociais,
isso é mais evidente entre escolares, especialmente adolescentes. Vários são os exemplos,
41
muitos não-construtivos, de atitudes de grupos de jovens que se caracterizam pela falta de
reflexão e de medida das conseqüências. Atitudes que não seriam tomadas individualmente,
mas que no grupo passam a fazer sentido, negando princípios éticos e morais a que esses
jovens foram submetidos durante sua formação (BRAGHIROLLI, 1990).
Em relação ao contexto escolar, Almeida (1991) ressalta que a prática educativa
transcende os marcos escolares e envolve processos formais e não-formais de aprendizagem.
Por ser atividade socialmente estabelecida, a prática pedagógica influencia e é influenciada
por sistemas de significações construídos socialmente, sendo assim um palco privilegiado ao
estudo das representações sociais.
Segundo Jodelet (2002), a formação da representação social se dá através dos
processos de objetivação, síntese e ancoragem. A objetivação se caracteriza pela construção
do conhecimento coletivizado. O indivíduo procura tornar um fato, objeto e/ou conhecimento
novo em algo familiar forjando uma visão do objeto que seja coerente com sua visão de
mundo. Em seguida, materializa os elementos de representação em sua realidade de senso
comum naturalizando os esquemas conceituais, dotando-os de realidade própria.
No processo de síntese, o conhecimento elaborado na representação social é
reestruturado a fim de que o indivíduo possa ser mais bem inserido ou aceito no grupo,
negando muitas vezes o conflito cognitivo existente entre o conhecimento da representação e
o anterior que ele possuía.
A ancoragem, ainda segundo a autora, consiste em materializar coletivamente o
conhecimento da representação, que passa a ser referencial para o estabelecimento de relações
entre seus agentes, segundo seus valores e contravalores sociais e culturais.
42
3. RESULTADOS
A diversidade de conteúdos presentes na fala dos entrevistados permitiu o
estabelecimento de uma série de categorias de análise. Optou-se por organizar as categorias
mais freqüentes em quatro grandes blocos: significações, motivações, imagens negativas e
inteligência.
3.1. Significações do sucesso acadêmico
Para os participantes da pesquisa, a noção de sucesso acadêmico estrutura-se
dentro de uma cadeia discursiva que remeteu a um calidoscópio de expressões, as quais, por
sua vez, remeteram a outras cadeias discursivas cujo ponto de repetição é algo, às vezes,
difícil de encontrar. No entanto, três significações emergiram de um modo mais sistemático:
sucesso acadêmico como reconhecimento, como poder e como inserção social.
3.1.1. Reconhecimento
O primeiro tema investigado em relação às representações sociais do sucesso
acadêmico focalizou as significações que estudantes bem-sucedidos têm do tema. As falas
sobre o que vem a ser sucesso acadêmico tiveram como núcleo significacional a noção de
reconhecimento. Trata-se de um termo que apareceu no discurso da maioria dos participantes
e foi devidamente aprofundado no contexto da entrevista.
Inicialmente, o reconhecimento pode ser interpretado como a materialização
social do sucesso, ou seja, aquilo que o transforma em um construto socialmente aceito e
valorizado. Um exemplo interessante diz respeito ao modo como os participantes se
implicaram com esta pesquisa. Os entrevistados demonstraram, em geral, sentimento de
43
orgulho por terem sido selecionados para a pesquisa e fizeram uso da situação como exemplo
de recompensa pelo esforço empreendido na construção do sucesso escolar, que significa
primeiramente reconhecimento. Ser reconhecido é algo muito valorizado pelos entrevistados e
oferece oportunidades de análise em diferentes dimensões.
[O que representa o sucesso acadêmico?]
Acho que é motivo de orgulho, né, porque você se esforça, estuda e acaba sendo
recompensado por isso.
A., 17 anos
É uma espécie de retribuição que eu recebo. Ao longo da minha vida de estudante
de ensino fundamental, eu sempre fui muito esforçada, muito mais dedicada do que
os meus colegas em geral. Então, chegar hoje e você me chamar pra uma entrevista
por eu ser destaque, é um esquema de reconhecimento seu, de reconhecimento das
pessoas que vêem isso em mim. Eu acho que é isso que toca mais, como se eu
estivesse colhendo...
D., 17 anos
Subjacente ao reconhecimento, além do orgulho, percebe-se a idéia de justiça.
Estudantes bem-sucedidos em geral se esforçam mantendo rotinas disciplinadas de estudo
individual deliberado, que requerem adiamento de gratificações em curto prazo. Em especial,
na faixa etária pesquisada há grande oferta de atividades lúdicas, presenciais ou pela rede
mundial de computadores. A maioria dos entrevistados considera justo o reconhecimento
pelos resultados alcançados como fruto desse esforço.
O reconhecimento pelo outro como alguém de sucesso compõe o autoconceito dos
entrevistados e parece alimentar seu ego. É nítida a expressão de satisfação quando se aborda
a publicidade do sucesso, marcadamente quando o reconhecimento é declarado por pessoas
próximas, notadamente colegas da escola e pais. Isso parece atenuar uma possível autodúvida.
Portanto, há um elemento de constituição de identidade operando nesse processo. Ter sucesso
acadêmico significa sair do anonimato por meio do próprio esforço e capacidade, e isso
agrega ainda mais valor ao sucesso, em comparação àqueles gerados por privilegiada
44
condição econômica, por exemplo. Ocupar posição de destaque pelo desempenho escolar gera
satisfação diferente daquela proporcionada pela aquisição de um bem material.
[...] o sucesso acadêmico se baseia em uma coisa sólida, né? Você não tá hoje
conversando aqui comigo porque eu tenho um carro caro ou porque eu tenho um
par de olhos azuis. Não é nada disso. É uma construção longa, um processo que
existe mesmo. Se eu tenho sucesso acadêmico, não é superficial.
D., 17 anos
É interessante perceber as conotações assumidas pelo sucesso acadêmico no
depoimento anterior, em comparação a outros sucessos. A entrevistada estabelece dicotomias
durante a definição do sucesso escolar. Embora materialmente concretos, carro e olhos são
tratados como bens voláteis, superficiais, ao passo que o sucesso acadêmico, bem
aparentemente abstrato, é considerado sólido, profundo, palpável, real.
Como a nota obtida nas avaliações escolares é o principal meio de explicitação
dos resultados escolares, para os entrevistados parece ser o maior referencial do sucesso
acadêmico. Em muitos momentos, é até mesmo confundida com ele. É citada do início ao fim
das entrevistas como indicador de rendimento escolar.
[Você tem um apelo forte e constante em relação a notas, a escores
elevados...]
É, porque manter altas notas também é estar no auge. Mesmo que eu tire um 7 e
seja a maior nota de todas, não vai ser um 10 que vai estar no meu boletim, vai ser
um 7.
G., 17 anos
Esse apelo por nota, evidente nos discursos, pode ser revelador de estilo de estudo
baseado na busca de resultado, por meio de aprendizagem muitas vezes superficial, passiva,
mecânica, baseada em recepção de conteúdo e memorização por repetição. Apesar de alguns
entrevistados terem dito que gostam de aprender, em vez de explicitarem esse declarado
sentimento pela citação dos objetos específicos aprendidos, referem-se muito mais aos
resultados dessa aprendizagem: freqüentemente as notas obtidas. É a conseqüência assumindo
45
o papel de objetivo final do estudo. Os discursos da maioria dos entrevistados, portanto,
revelam prioridade de foco no resultado (nota) em vez do processo (aprendizagem).
O valor do reconhecimento é explicitado em muitos momentos dos discursos,
como no fato de, com freqüência, serem procurados por colegas para o esclarecimento de
dúvidas acerca dos conteúdos escolares. Nas várias ocasiões em que esse auxílio surgiu nas
falas, foi claro o sentido unidirecional da procura: são os colegas que buscam o auxílio, o que
faz emergir outra significação evidente: o poder.
Se eu estou num lugar e alguma pessoa me pede alguma dúvida, eu não vou até
ela, ela é que tem que vir até a mim pra tirar a dúvida.
[E você se sente confortável assim?]
Sim, me sinto. Se eu tivesse que tirar a dúvida, eu iria até a pessoa.
G., 17 anos
3.1.2. Poder
Ser referência, além de atuar como forte agente motivacional para a manutenção
do sucesso, parece causar um misto de sensação de poder e cooperação, superioridade e
solidariedade. É importante sentir-se detentor de conhecimentos e com possibilidades de
socializá-los com os colegas, porém esse auxílio é seletivo. Na fala a seguir, “G” salienta este
poder ao falar sobre dependência. Está bastante firme a idéia de que os dependentes se
adaptam aos independentes, àqueles que oferecem ajuda. Mais ainda, há o poder da escolha de
quem ajudar. Neste caso, os melhores amigos. Poder ajudar os amigos coloca alguém numa
função de utilidade capaz de promover o estreitamento de laços de amizade e a própria
consolidação do seu papel e importância no grupo.
[Sensação de poder?]
É, também, porque às vezes as pessoas estão dependendo de você. Se eu estivesse
dependendo delas, eu teria de me adequar ao jeito delas. E se elas estão dependendo
de mim, elas têm que se adaptar ao meu jeito.
[Você acha que a ordem natural é essa?]
Acho. Vou ajudar quem mais me interessa, meus melhores amigos.
G., 17 anos
46
Alguns estudantes incomodam-se quando percebem que são procurados por
jovens com quem não mantêm cotidianamente relação próxima. Sentem-se explorados quando
a solicitação parte de algum colega distante, o que revela que o sucesso, ou o conhecimento
construído, atua como ferramenta para colocá-los em posição hierarquicamente favorável no
grupo social.
Por outro lado, perceber-se instrumento de auxílio aos colegas confere ao sucesso
sua característica utilitária, assim como àquele que auxilia, o sentimento de solidariedade.
Cooperar é, ao mesmo tempo, uma forma de reafirmar-se bem-sucedido, confirmar sua
posição de destaque no grupo e auxiliar os colegas próximos que o procuram. Sendo assim, o
sucesso significa também a possibilidade de inserção social.
Eu acho que eu tenho mais acesso à coordenação da escola do que quase todos os
demais alunos da escola. Apesar de que soe arrogante, eu só estou sendo direta,
curta e grossa. Eu acho que se... se... os alunos querem fazer alguma reivindicação,
estão transtornados, chateados com a escola em algum aspecto, eu sou uma boa
pessoa pra encaminhar isso pra coordenação. Talvez, uma das pessoas que mais
teria esse acesso, que a coordenação ouviria com mais seriedade, digamos, que
seria mais levada a sério.
D., 17 anos
A fala da entrevistada revela também a idéia de credibilidade aliada ao sucesso
acadêmico. Mostra que outros estudantes creditam a ela a responsabilidade de atuar como
ponte entre o corpo discente e a equipe gestora da escola. Sua voz seria, em sua perspectiva,
mais ouvida e mais considerada. Em outras palavras, a direção da escola é a instância máxima
da estrutura de poder numa escola. Ser considerado excelente é ter acesso a esse poder.
Em outros casos, fica clara a imagem de privilégios concedidos por parte de
docentes a um estudante, em função de ocupar posição de destaque. Para alguns entrevistados,
professores acabam sendo mais condescendentes ou complacentes com os “bons alunos”, em
relação à correção de instrumentos avaliativos, por exemplo.
47
[E do ponto de vista social, você acha que tem alguma posição de
destaque?]
Em alguns casos sim. Com os professores, por exemplo, acho que eles consideram
mais as minhas respostas em provas do que as de alunos que dormem em sala.
A., 17 anos
Para muitos sujeitos pesquisados, estar em posição de destaque também traz
conseqüências sociais entre colegas, como ser motivo de comentários, curiosidades, o que
facilita a inserção social.
3.1.3. Inserção social
Segundo muitos entrevistados, o fato de ocuparem posição de destaque gera, entre
jovens não-próximos, motivo de comentários e curiosidade. Embora de forma tácita, é
possível notar que, em muitos momentos, estar no centro de conversas gera ao estudante bemsucedido a possibilidade de inserção social.
Isso fica ainda mais evidente considerando-se o fato de que a maioria dos jovens
que participaram da entrevista se declarou introvertida. A própria introversão contribui para o
sucesso acadêmico, na medida em que alunos introspectivos apresentam, em geral, maior
facilidade em passar horas em estudo individual. Por outro lado, têm geralmente mais
dificuldade em fazer amizades.
Por esse ponto de vista, a introversão acaba por ser aliviada pela popularidade,
liderança e poder que o sucesso escolar gera. Dessa forma, o sucesso atua incrementando a
possibilidade de aumento no círculo de amizades.
[De uma certa forma, usar seu conhecimento pra manter a amizade?]
É, talvez... é, pode ser, manter a amizade. Manter a aceitação no meio, tudo.
G., 17 anos
48
Esse testemunho expõe uma tendência marcante nas falas em geral, embora
muitas vezes de forma velada: a necessidade de ser aceito e, também, de ser amado. Algumas
falas demonstraram contínua busca em atender metas e expectativas de outras pessoas,
freqüentemente os pais, cuja admiração é evidente em muitos momentos. Isso parece ser forte
agente motivacional para o estudo, já que o sucesso escolar é valorizado pelos pais.
[Então você sempre teve também a preocupação da comparação com
os demais?]
É, também. Se você está junto com os melhores, você, sei lá, você tem alguma...
[hesitação]
[Tente dizer isso...]
Sei lá, você é aceito, as pessoas gostam de você...
G., 17 anos
Por outro lado, percebeu-se incômodo na exposição social, principalmente em
relação a dois aspectos: os preconceitos e os oportunismos. Em muitos discursos, fica
evidente o incômodo gerado pelos rótulos criados por aqueles menos conhecidos, que tecem
um perfil do aluno de sucesso sem conhecê-lo, muitas vezes atribuindo-lhe adjetivos
indesejáveis. Portanto, o mesmo sucesso que auxilia a inserção social, em outros pode
dificultá-la.
Ser tratado de forma diferente é bom porque eu levo o estudo como um hobbie,
assim como se eu fosse um bom músico, um bom esportista, eu ia achar legal. É
ruim porque... eu não diria nem dos meus amigos, mas amigos dos meus amigos,
que não me conhecem, então eles ficam... não sei... meio que com receio de falar
comigo, têm medo de mim, eles acham que eu sou mau, ‘...olha lá o Fulano. Nossa,
eu tenho medo dele...’ E na verdade eu sou tímido, eu não falo com ninguém. Se a
pessoa vier falar comigo, eu falo tranqüilamente com ela, mas eu não chego em
ninguém pra conversar. Aí eles meio que se afastam de mim. Quem é meu amigo é
porque um dia veio e se interessou em conversar comigo.
L., 17 anos
Como fechamento desta subseção que versa sobre as significações de sucesso
acadêmico, destacamos um fragmento de discurso que, embora curto, ilustra bem a
multiplicidade de significados e de causas do sucesso escolar.
49
[O que representa pra você ter um desempenho superior, se
comparado com seus colegas?]
Representa que eu tirei nota, né, que eu consegui aprender, os professores estão
falando e eu consegui assimilar, talvez porque eu tenha tido uma base melhor no
passado, ou porque eu me dedico mais do que algumas pessoas.
G., 17 anos
Sucintamente, o entrevistado ressaltou a importância da nota como materialização
do sucesso. Além disso, situou o valor da aprendizagem – por assimilação – de conteúdos
apresentados pelos professores. Citou a relevância dos conhecimentos prévios como
fundamentais à aprendizagem ao longo dos anos, ou seja, a visão processual da construção do
sucesso. Por fim, localizou o próprio esforço como fator importante, e comparando-o ao
esforço de colegas, o que denuncia visão competitiva. Portanto, o entrevistado agrega fatores
motivacionais às significações do sucesso escolar.
3.2. Motivações para o sucesso acadêmico
Durante a composição desta análise, foi tarefa complexa desmembrar aquilo que é
significação do que é fator motivacional, já que estão intimamente relacionados. O que o
sucesso representa atua também como motivo para mantê-lo. Portanto, podemos dizer que o
reconhecimento, o poder e a possibilidade de inserção social são, ao mesmo tempo,
significações e fatores motivacionais. Além desses, outros fatores aparecem fortemente nos
discursos: o apelo das expectativas geradas, o sucesso nos processos seletivos para o ensino
superior, a competição e a aparente dualidade entre o prazer em aprender e a necessidade de
atingir altos resultados. A entrevistada “A” enumera as razões para continuar fazendo o
melhor. Nota-se que o primeiro argumento diz respeito à expectativa da família, professores e
colegas. Aqui, para além da hierarquização das pessoas significantes (família, professores,
colegas), há também uma hierarquização das razões (competição, necessidade da bolsa). É
mister também enfatizar que ela é boa num ambiente livre de cobranças.
50
[Por que você tem que continuar fazendo melhor?]
De tudo um pouco: expectativa da família, dos professores, dos colegas,
competição com os colegas, as bolsas... é, essa questão de ser a primeira da turma
pra mim é importante, pra manter a bolsa. É engraçado que minha mãe nunca
cobrou isso. Eu é que faço a questão de correr atrás. Se eu consegui, vou me manter
em primeiro.
A., 16 anos
3.2.1. Atender a expectativas
As falas dos entrevistados sugerem forte relação entre sucesso acadêmico e
necessidade de atender aos desejos daqueles que servem como referência ao aluno de sucesso.
É nítida a preocupação em manter as elevadas expectativas de colegas e, principalmente, pais.
Em muitas falas, as metas próprias confundem-se com aquelas traçadas por essas outras
pessoas, ao longo de toda a escolaridade. Denotam pessoas aparentemente autônomas e
seguras em relação ao estabelecimento de metas, mas que no íntimo buscam sempre atender a
expectativas traçadas por aqueles que atuam como referenciais.
Reconhecer-se bem-sucedido gera compromisso em manter elevados desempenhos, a fim de continuar alimentando expectativas. É como se o papel representado o
transformasse em um mito, que deve ser alimentado e mantido tão intensamente quanto mais
duradouro for o sucesso. Percebe-se medo em ver desmoronado o castelo construído à custa
de tanta dedicação. O depoimento abaixo ilustra a necessidade de manutenção de expectativas
de colegas. Observa-se que a quebra do padrão de alto rendimento do entrevistado gerou certa
frustração entre colegas, o que lhe ocasionou incômodo também. Percebe-se ainda, embora de
modo sutil, necessidade de justificar ao entrevistador o baixo rendimento obtido, nesse caso
em função da falta de afinidade pelo componente curricular.
[Você tem essa preocupação constantemente, de não decepcionar o
outro?]
É involuntário, né? Acho que é um mecanismo que eu criei... é porque sempre eles
ficam: ‘oh, é o Fulano, ele sempre tira notas boas’... e você quebrar isso é muito
chato, porque se eu fosse um aluno, sei lá, de desempenho menor, aí isso não ia me
afetar em nada. Já aconteceu isso no 1º ano, de eu tirar 10% da prova de literatura,
51
não gosto muito de literatura, aí aconteceu de ficarem a semana inteira me
enchendo o saco: ‘como que ele foi tão mal na prova de literatura, logo ele...’
L., 17 anos
Curiosamente, em um dos casos, ter atingido a meta gerou certo desânimo. Chegar
ao objetivo traçado ocasionou a abertura de uma lacuna provisória. É como se não houvesse
mais nada além. Nesse caso, o jovem teve que aprender a estabelecer novas metas.
No primeiro simulado da escola eu fiquei em primeiro lugar. Aí eu tinha uma meta:
ficar em primeiro lugar. Eu atingi o primeiro lugar. Aí, como eu tinha alcançado
todas as minhas metas, eu relaxei. A pressão externa de ficar entre os melhores eu
atingi, aí não tinha mais pressão, porque eu atingi o topo.
R., 17 anos
Metas traçadas pelos pais são absorvidas intensamente pelos filhos, como nos
recortes a seguir. “V” e “D” assumem como seus os compromissos estabelecidos por seus
pais. Nesses casos, como em muitos outros, a expectativa gerada pelos pais, materializada em
metas traduzidas em notas de provas, foi fator preponderante para gerar no estudante a
necessidade de manutenção de elevados desempenhos.
Meus pais são bastante exigentes em relação ao desempenho. Pra eles, nota boa é
no mínimo 8. Só querem nove, dez. Eu vejo amigos meus satisfeitos com seis. Se
eu tiro oito numa prova, isso não é um grande feito pra mim.
V., 17 anos
Ah, eu não podia aparecer com um 8,5 no boletim, que meu pai diria que aquilo não
condizia com o meu potencial, entendeu?
D., 17 anos
Metade dos entrevistados citou o investimento financeiro feito pelos pais para
custear sua educação básica. Vale lembrar que o estudo foi realizado em escolas privadas,
com mensalidades relativamente altas. Para eles, manter elevados desempenhos escolares é
uma contrapartida, uma forma de retribuição de toda a provisão material despendida pelos
responsáveis durante o processo de formação em família.
Minha mãe paga o colégio, faz o maior esforço pra pagar, tô tendo essa
oportunidade, então eu tenho que fazer o melhor pra aproveitar essa oportunidade.
G., 17 anos
52
A associação entre desempenho escolar e investimento material também apareceu
de outras formas. Em dois casos, a expectativa da contrapartida financeira (desconto nas
mensalidades) ou na forma de bem tangível (automóvel) parecem ter atuado como fortes
agentes motivacionais para o estudo.
[E essa recompensa é de que forma?]
Vou te dar um exemplo bem palpável: quando eu estava na 8ª serie, eles ofereceram
uma bolsa pra quem fosse os melhores da turma, e eu ganhei essa bolsa pro 1º ano,
e se eu mantivesse o desempenho eles me manteriam com a bolsa, e eu consegui
manter essa bolsa até hoje.
[Então a ultima vez que você pagou escola foi na 7ª serie?]
Foi. Então pra mim a recompensa é bem mais palpável, e me motiva a continuar
estudando.
A., 16 anos
Meu pai me prometeu um carro se eu passar no vestibular da UnB.
E., 17 anos
A imagem expressa pelos entrevistados em relação a seus pais é de
acompanhamento da vida escolar. Presença física na escola, perguntas sobre fatos ocorridos
ou resultados de provas são eventos freqüentes nos discursos. Percebe-se que, de forma geral,
essas questões são postas de forma dialógica (pelo menos na fase atual de escolaridade)
porém firme, estabelecendo-se relação de cumplicidade e confiança, com responsabilidades
bem definidas.
[E seus pais, que papel tiveram na construção do seu sucesso?]
Meu pai fala muito na UnB. Diz que se eu passar lá vai ser meu mérito, mas que se
eu não quiser fazer lá, não vai ser nenhum demérito, que eu tenho que fazer o que
eu achar que for o melhor pra mim.
[Eles acompanham?]
Minha mãe sim, meu pai nem tanto. Com o passar dos anos, eles adquiriram
confiança, viram que eu não dou problema.
A., 16 anos
[Seus pais acompanham?]
Acompanham. Acho que minha mãe ficou preocupada com isso, mas à medida que
eu vou ficando mais velho, meus pais vão me dando mais responsabilidade. É
lógico que ele vai cobrar porque eu não tirei boa nota, mas se ele percebe que eu
estou estudando pra recuperar, ele não vai me incomodar.
53
[E como incomodaria?]
Ele é dialogal. Ele conversa, você tem que estudar... Ele já foi mais rigoroso. Mas
aí vai ficando mais leve, ganhando confiança. Minha mãe também, mas pra ela é
mais inaceitável tirar nota abaixo da média. Mas ela não fala muito, porque ela sabe
que eu vou recuperar.
V., 17 anos
Em outro caso, fica clara a busca pela recompensa da liberdade de escolhas. Para
“L”, as notas altas serviram também como instrumento de barganha de liberdade para
desfrutar de encontros sociais. Houve o estabelecimento de um jogo entre pai e filho. Este
último avalia a proposta como adequada. Mais uma vez, como em muitas outras falas, fica
clara a relação íntima estabelecida entre “ser bom aluno” e “ter boas notas”.
E meu pai foi importante porque ele sempre falou assim pra mim: ‘se você tiver
notas boas na escola, se for um bom aluno, você faz o que você quiser com os seus
amigos. Seja um bom aluno, que eu não vou pegar no seu pé’. Acho que isso foi
bom.
L., 17 anos
3.2.2. O papel dos professores
Em geral, os indivíduos pesquisados demonstraram afinidade por professores que
estabelecem o diálogo como principal instrumento de persuasão e que consideram a pessoa do
aluno em sua totalidade, ou seja, não vêem os jovens somente como aprendizes, e sim como
sujeitos únicos, com necessidades e desejos individuais.
[Esses professores que te marcaram positivamente. Que características eles têm/tinham para ficarem em um lugar bom na sua memória?]
Eles estavam preocupados com o indivíduo, sabe? Eu tive uma professora na 7ª e
na 8ª série, de História, que se eu levantasse o dedo pra falar alguma coisa, ela dizia
‘dá sua opinião, o que você acha, como você enxerga? Você acha que o golpe de 64
foi um golpe ou uma revolução?’ Então se tinha a preocupação de fora da sala, a
professora me perguntar como tinha sido o meu dia, me parar na porta e conversar
comigo enquanto as pessoas entram... isso é importante demais. Na escola tem
figuras que eu não me interesso nem um pouco pela matéria, mas... nem um pouco
mesmo, por exemplo, Biologia não me interesso nada, no entanto passa o professor
na porta e fala ‘salve!, bom dia, tudo bem? Você está melhor do que na semana
passada? Tá tranqüila, algum problema em casa?’ Isso é essencial. Eu acho que o
que eu sou hoje, o que eu vou ser daqui a dez anos, espero que seja também um
profissional de sucesso, se deve muito aos professores que me levaram junto com
eles, porque os professores que eu tenho melhor lembrança foram coincidentemente
os professores de História, de Geografia, que é a área que eu tenho mais interesse. É
claro que você tem uma propensão natural por uma área ou outra, segundo
características pessoais, sociológicas, hereditárias, sei lá. Mas tem muita
importância pra mim.
D., 17 anos
54
Vê-se, no exemplo, que a professora de História, em vez de oferecer uma definição sobre revolução ou golpe, oferece à aluna a possibilidade de fazê-lo, o que possibilita a
expansão de sua capacidade crítica e de seu envolvimento. Essa estratégia revelou-se
marcante para a estudante, a ponto de ser lembrada quatro anos depois.
O exemplo anterior faz emergir também o valor do reconhecimento da estudante
como pessoa. Ela reconhece naqueles que considera bons professores a capacidade de fazer
aparecer, na aluna, a pessoa que ela é, algo que vai além da relação mecânica da transmissão
de informações. Há subjetividade em operação: antes (e além) de desempenharem papéis
sociais de professor e aluna, são sujeitos em pleno exercício de relacionamento interpessoal.
A empatia mostra-se como condição básica – e valorizada pela entrevistada – à manutenção
da harmonia dessa relação.
De forma geral são valorizados aqueles profissionais que mantêm um discurso
direto e reflexivo e que primam pela organização didática, estabelecendo de forma clara e
concisa a seqüência de tópicos explorados na aula. Essa sistematização proposta pelo
professor parece contribuir para a organização mental do aluno, no sentido de orientá-lo para
a compreensão da estrutura epistemológica da área de conhecimento em questão. A fala
abaixo ilustra a assertiva.
[E do ponto de vista acadêmico, que influências os professores
tiveram no seu bom desempenho?]
Academicamente falando, uns eu considero bons professores, e outros não tão bons.
Quando eu estou nas aulas, aprendendo as matérias, eu gosto de tudo muito bem
dividido: tópicos, subtópicos, gosto de tudo organizado pra eu saber onde eu estou,
quando eu for estudar. E tem professores bons também que não fazem isso, e isso
me atrapalha um pouco. Mas eu não reclamo deles, eu gosto.
L., 17 anos
Um defeito que eu acho no ensino brasileiro é que o professor passa a matéria sem
fazer discussão sobre ela.
R., 17 anos
55
Professores que elogiam e que são disponíveis a atendimentos também são muito
estimados. O reconhecimento do esforço eleva a auto-estima e motiva o estudante para novas
aprendizagens. O testemunho abaixo ilustra a importância dada aos retornos positivos
(elogios, pontos) e ao estabelecimento de situações-problema como desafios cognitivos.
Por exemplo, eu tive um excelente professor de matemática no primeiro grau. Ele
atendia todos os alunos que procuravam. Se ele percebia que o aluno tinha
facilidade, ele dava desafios pra ele resolver. E dava alguns pontos extras. Tinha
também uma de português que também incentivava, elogiando. Eu acho até mais
importante o de procurar desafios. Pra quem não se interessava tanto, ele dava o
básico, e aprofundava aqueles que quisessem mais.
R., 17 anos
Entretanto a relação com os professores nem sempre foi estabelecida em palco de
harmonia e diálogo. Surgiu até mesmo ambiente competitivo entre aluno e professor, como
ilustrado no depoimento abaixo.
Já aconteceu de eu sentir rivalidade de professor em relação a mim, antipatia
gratuita, sabe, eu não posso dizer isso porque eu tô dentro do problema, né, então é
claro que se você for conversar com o professor, vai ver que tem motivo, uma
resposta atravessada, porque eu sou mestre em fazer isso, né? Mas muitas vezes eu
senti isso. Eu tive uma professora na sétima série dava pra sentir um lance de ódio
naquela relação.
[E o que isso influenciou no seu estudo?]
Eu acho que me motivava. Eu desafiei muito até a minha oitava série. Então o quão
mais eu estava preparada, mais putos eles ficavam, né... então eu acho que era um
fator de... sei lá, pra eu produzir mais.
D., 17 anos
Esse fragmento explicita, além da competição estabelecida, um sentimento hostil
que ela projetava no professor, numa relação de transferência. Esse sentimento gerava o
estabelecimento de duelos, que alimentavam ainda mais o sentimento projetado, que era
agente motivador de estudo levando a novas aprendizagens.
Com outros entrevistados, é nítida a tentativa de se evitar conflitos com
professores, como estratégia de aprendizagem. O discurso abaixo ilustra essa tentativa de se
afinizar com o docente por meio da aceitação.
56
Eu tento gostar do professor. Eu acho que se eu não gostar dele, toda vez que ele
chegar eu vou dizer: nossa, eu não vou ouvir a aula desse cara chato. E aí eu não
vou aprender a matéria dele. Não vou depois ser capaz de saber o que ele quer que
eu saiba, na hora da prova.
G., 17 anos
Esse testemunho também expõe, mais uma vez, um detalhe bem evidente nos
discursos e já abordado anteriormente, que é a necessidade de se atender às expectativas
(“saber o que ele quer que eu saiba”), especialmente em momentos avaliativos.
De qualquer forma, embora a postura dialógica do professor seja a preferida, os
discursos referem-se a esquemas expositivos de aula, ou seja, o ensino focado no discurso do
professor e nas estratégias por ele estabelecidas. Caracteriza, principalmente, aprendizagem
por recepção. As falas remetem também a uma preocupação em se “descobrir” os estilos e as
estratégias avaliativas de cada um dos professores.
3.2.3. Modelos
A comparação com pessoas de referência surge em boa parte dos discursos, em
alguns casos com irmãos mais velhos e, na totalidade, com os pais. Sem exceção, os sujeitos
pesquisados afirmaram ter a imagem de pelo menos um dos pais como pessoa muito
estudiosa. Na quase totalidade dos casos, essa imagem se aplicava a ambos os genitores.
Como a referência aos pais é constante, parece que a imitação do modelo dos pais é
importante fator motivacional para o estudo.
Demonstrar atitudes favoráveis ao estudo e valorizar o ambiente escolar gera nos
filhos o desejo de valorização semelhante, contribuindo para a dedicação ao estudo individual.
Os recortes a seguir, extraídos de quatro entrevistas, ilustram de maneira bem clara a
influência da imagem dos pais na atitude dos filhos. “A.” destaca o hábito de leitura dos pais.
57
[Tente se lembrar do início da sua escolaridade. Houve alguma ação,
ou conjunto de ações, que acabaram influenciando esse seu sucesso
acadêmico de hoje?]
Acho que pelo jeito dos meus pais, talvez. Meu pai sempre gostou muito de ler, lê
muitos livros, conversa muito sobre as leituras, sobre pessoas conhecidas que
adquiriram sucesso profissional pelo estudo. Minha mãe também sempre gostou
muito de ler, de estudar, então acaba que você tem em quem se espelhar, é um
reflexo.
[Algum outro espelho, modelo, além dos pais?]
Não sei... acho que não. Nunca parei pra pensar...
A., 16 anos
“V.” relaciona os títulos dos pais à imagem de pessoas estudiosas, ao listar os
cursos superiores.
[Tem irmãos?]
Sim, uma irmã mais velha dois anos.
[E isso de alguma forma te motivou a ser um bom estudante?]
Não. Acho que o que me motivou foi muito mais meus pais.
[Você considera seus pais estudiosos?]
Sim, muito. Meu pai acabou de fazer um curso de Direito, e já tinha formação
superior, engenheiro. Minha mãe tem formação em Biblioteconomia, mas trabalha
como gestora pública.
V., 17 anos
A imagem de pais estudiosos também emerge nos discursos de “L.” e “G.”. Este
último ainda estabelece relação entre estudo e sucesso profissional.
[Seus pais te influenciaram?]
É... eu não consigo ver isso, mas eu sei que sim. A família é importante. Meus pais
foram bem-sucedidos academicamente.
L., 17 anos
[Você acha seus pais estudiosos?]
Acho, até hoje. Meu pai principalmente. Minha mãe é estudiosa, ela passou em
concurso público, teve que estudar muito pra isso.
G., 17 anos
58
3.2.4. Vestibulares e PAS
Passar no vestibular da UnB ou no Programa de Avaliação Seriada da
Universidade de Brasília – PAS é uma das mais significativas materializações do sucesso
acadêmico. Em termos mercadológicos, é para algumas escolas a principal forma de
demonstrar esse sucesso. Portanto, a pressão sobre o aluno é enorme, porque o êxito integra o
conjunto de expectativas sociais geradas.
Embora o pesquisador se referisse a toda a escolaridade do entrevistado, era
comum nas entrevistas o jovem referir-se ao passado recente e ao presente. Como a pesquisa
foi realizada entre estudantes da terceira série do ensino médio, um fator motivador para o
estudo, amplamente citado, foi a possibilidade de sucesso (ou o medo do insucesso) nos
concursos vestibulares e no Programa de Avaliação Seriada da Universidade de Brasília, o
PAS. A quase totalidade dos entrevistados relatou ter ampliado consideravelmente o tempo de
estudo individual deliberado na última série do ensino médio. A possibilidade de ingressar na
Universidade de Brasília com menos dificuldade é um forte agente motivacional para “V.”,
como ele atesta a seguir.
Eu acho que não tem importância você falar pra mim ‘você está entre os melhores’,
acho que eu não ligo pra isso. Acho mais importante a questão de aprender, de
passar no vestibular. Agora, a vantagem de estudar, pra te falar a verdade, é que
estar entre os primeiros significa que no vestibular eu terei mais facilidade.
[Então uma coisa que você mira é o vestibular...]
É porque quando você estuda em uma escola boa, e essa é uma escola boa, e você
está entre os melhores, você pode ter uma idéia de como será seu desempenho no
vestibular.
V., 17 anos
O estudo também é visto como uma possibilidade de estar no controle da opção de
curso superior, o que remete à questão do poder, já abordado anteriormente, só que desta vez
com foco no poder de escolha, no foro privilegiado, em função do esforço investido ao longo
dos anos.
59
Acho que o que mais me motiva é a possibilidade de eu escolher a melhor opção no
PAS, de eu não chegar no final desse objetivo e dizer: ‘ah, não posso fazer aquilo
porque eu não tenho nota’.
R., 18 anos
A forte motivação gerada pela aprovação no processo seletivo também
proporciona vencer as adversidades geradas pelo estudo, principalmente daqueles objetos de
conhecimento de menor afinidade por parte do estudante. No caso de “A.”, essa motivação foi
decisiva para que ela encontrasse energias para perseverar no estudo individual, mesmo em
momentos de maior dificuldade.
[O que realmente te move a se manter no topo da crista?]
Bom, esse ano a questão do vestibular acaba sendo forte. Eu quero UnB, e a melhor
forma de entrar na UnB é o PAS. E isso me impulsiona. Entrar na faculdade. Tem
muita coisa que você tem que estudar e que você não gosta, mas você precisa, pra
passar no vestibular e chegar no lugar em que você quer, na profissão que você quer
seguir.
A., 16 anos
Esse universo da corrida rumo a uma vaga no ensino superior ilustra uma
realidade vivida por muitos jovens de sucesso acadêmico, ao longo de toda a escolaridade: a
competição.
3.2.5. Competição
Nos vários momentos em que a competição surgiu nos discursos, veio
acompanhada de sentimento positivo, como motivador para o estudo. Os competidores mais
freqüentes são os colegas de turma. Os fatores de competição são os resultados, expressos em
forma de notas. A competição é disputada prova a prova, ora de forma tácita e geral, em
brincadeiras e comentários aparentemente amistosos em relação a desempenhos de diversos
colegas, ora de forma explícita e específica, quando o competidor é um colega exclusivo, e
muitas vezes esse jogo perdura por mais de um ano letivo. No fragmento a seguir, “V.”
60
explicita a preocupação em manter-se informado sobre o desempenho de seus colegas. Além
disso, deixa claro que perceber-se distante do melhor desempenho o motiva a se dedicar ao
estudo.
[Competição com colegas?]
Eu procuro saber, pra saber como é que eu estou em relação à turma, quantos foram
melhores do que eu.
[E se você descobre que está abaixo?]
Aí eu tomo vergonha na cara e estudo. Eu fico um pouco incomodado, aí eu vou
recuperar a matéria.
V., 17 anos
Em casos em que há irmãos com pouca diferença de idade e também de elevados
desempenhos escolares, é comum estabelecer-se jogo competitivo, algumas vezes alimentado
por comentários dos pais. No caso de “D.”, também de professores. Esses comentários,
freqüentemente comparativos, algumas vezes aparecem nas falas dos entrevistados,
geralmente carregados de certa carga emocional negativa.
O meu irmão sempre foi a ovelha branca da família. Minha mãe sempre o exaltou
muito, sempre... ele sempre foi um exemplo, um referencial, porque ele é uma
pessoa metódica, pontual, disciplinada, responsável, muito bonito, muito
inteligente, é... tudo. E minha mãe sempre deixou isso muito evidente. Muito...
sempre comparou a gente, muito. Só que eu nunca percebi isso. Só fui perceber isso
agora. Então eu acho que meu irmão foi uma coisa que eu quis ser durante muito
tempo. Eu acho que é por isso que esse lance de você me conhecer pela minha
inteligência, pelo meu sucesso acadêmico foi tão importante pra mim durante tanto
tempo, porque ele era tudo isso. E como ele é três anos mais velho e estudou nas
mesmas escolas que eu, tivemos muitos professores repetidos. Aí os professores
falavam: Ah, você é irmão do fulano? Nossa, adoro seu irmão, ele é um exemplo de
aluno etc. etc. Então, assim, eu nunca estabeleci uma rivalidade consciente com ele,
não percebi que fiz isso, mas agora eu começo a entender que eu queria um pouco
do trono que meu irmão tinha, porque minha mãe colocou ele lá. Então durante
muito tempo eu fui uma pessoa que não tinha muito a ver com a minha essência.
Esse lance de número, de nota, de muito importante eu ser a primeira colocada, na
verdade eu percebo que foi uma transferência que eu fiz, já que em casa eu não era.
D., 17 anos
Esse depoimento evidencia o forte papel motivador que a competição pode
assumir. Nesse caso, é clara para a entrevistada a preferência da mãe em relação a um dos
filhos, e a competição entre irmãos ocorreu por disputa pelo lugar principal: o trono materno.
61
Revela ter assumido o papel competitivo sem a plena consciência de que sua luta era pelo
colo maternal, consciência essa só estabelecida ao final da escolaridade básica. Nesse caso, a
escola supriu a lacuna deixada pela família.
O discurso indica a percepção de si como a contraface do outro: o irmão. Ele era
tudo o que ela não é, porém gostaria de ser. É um misto de amor e ódio. Considera, portanto,
o irmão um referencial a ser alcançado. A competição foi potencializada por comentários de
professores, que acabaram por fortalecer, mesmo que sem intenção, o clima competitivo
estabelecido na relação com o irmão.
Outros casos de competição entre irmãos apareceram nas falas, como o fragmento
a seguir, no qual aspectos do exemplo anterior ressurgem. Influência dos pais no estabelecimento de ambiente competitivo, visão positiva da competição e o irmão como referencial são
imagens presentes no discurso.
[Você acha que seu irmão contribuiu para esse sucesso?]
Contribuiu. Porque desde moleque a gente sempre competiu muito, eu acho que até
por educação dos pais.
[Você acha a competição negativa?]
Eu não acho negativa. Acho que o modo como ela é feita pode torná-la negativa ou
positiva. Você depreciar as pessoas na competição, eu acho negativo. Uma
referência minha era o meu irmão. Ele é um cara inteligente. Às vezes, eu fazia as
coisas só pra provar pra ele que eu conseguia.
R., 18 anos
No caso de “R.”, a competição fraternal, além de ser alimentada por comentários
dos pais, vai além de uma simples rivalidade. O irmão assume o papel de referencial e
legitimador do sucesso. Não adiantava apenas ser bom. Era essencial, ainda, que o irmão
atestasse sua competência.
62
3.2.6. Aprendizagem x notas
Os discursos analisados desfizeram a aparente dualidade entre o prazer em
aprender e a perseguição de atingir altas notas. Apesar da constante busca à nota máxima, a
quase totalidade dos alunos declarou sentir satisfação em aprender e, mais que isso, que essa
satisfação é, por si só, motivadora de novas aprendizagens. Provocados para escolher entre
processo (aprender) ou produto (nota), os pesquisados em geral demonstraram dúvida
confirmando que ambos são inerentes.
A constante referência a notas leva a sugerir que estudar por curiosidade ou pelo
prazer do tema pode parecer menos significativo, mas na verdade muitos que declararam
mirar notas também declaram prazer em aprender, principalmente conteúdos de disciplinas de
maior afinidade. Talvez sejam aspectos mais complementares do que auto-excludentes.
Por outro lado, muitos deixaram claro que as notas nem sempre refletem a
aprendizagem, referindo-se a situações de descompasso. Por exemplo, quando o instrumento
avaliativo é mal elaborado e não contempla o conteúdo trabalhado. Outra situação citada é o
acerto ao acaso em provas objetivas.
[É possível ter boa nota sem ter aprendido?]
Em alguns tipos de prova é. Em provas objetivas, tem gente que tira notas altas e
que não sabem...
[É possível o contrário? Você ter entendido, e na prova não ter
conseguido resultado alto?]
Pode. Você pode estar mal no dia, ou até você consegue pensar daquele jeito, mas
na hora algum fator te atrapalhou.
[E qual das duas situações você preferiria?]
Olha... eu acho que é saber, mas na prova não ir muito bem, porque quando você
tira nota baixa numa prova e você entendeu, na outra você vai bem.
G., 17 anos
No trecho destacado, “G.” expõe algumas fragilidades da avaliação com
característica somativa e pontual, especialmente aquelas construídas em instrumentos
63
objetivos, que aumentam a chance do acerto ao acaso. Além disso, demonstrou sua
preferência pela aprendizagem, ao invés do resultado expresso pela nota.
A fala a seguir também sinaliza a fragilidade dos instrumentos avaliativos escritos
praticados nas escolas. Denuncia também a possibilidade de se atingir bons resultados por
meio de aprendizagem superficial, baseada em estratégias que privilegiam a memorização por
repetição, em detrimento à aprendizagem profunda, significativa. “V.” dá o testemunho de
alcance de resultados a partir da transferência de informações dos livros para os instrumentos
avaliativos. Essa aprendizagem, mecânica, ancora-se em campos da memória de curta
duração. Assim, as informações volatilizam-se com facilidade preservando-se apenas nos
escritos das provas.
A prova não é um bom instrumento de avaliação, porque ela coloca o aluno numa
situação que não prova que o aluno sabe a matéria. Prova que ele decorou a
matéria. Tem provas que eu fiz muito bem, mas hoje eu não lembro a matéria. Eu
acho que um bom instrumento de avaliação, por mais complexo e demorado que
fosse, seria entre o mestre e o aluno. Ninguém melhor do que aquele que domina a
matéria pra avaliar se ele aprendeu ou não.
V. 17 anos
3.3. Imagens negativas relacionadas ao sucesso escolar
O sucesso acadêmico nem sempre é relacionado a imagens boas. Em vários
momentos, estimulados por perguntas ou espontaneamente, entrevistados expuseram
situações de desconforto relacionadas ao sucesso. Além das já citadas, apresentamos a seguir
algumas dessas imagens e situações.
64
3.3.1. Apelidos
A maior parte dos entrevistados relatou ter tido, durante a escolaridade, apelidos
decorrentes do sucesso acadêmico. Alguns efêmeros, outros com duração superior ao ano
escolar. “Nerd”, “Cabeção” e outros termos empregados por colegas causaram incômodo no
ensino fundamental, porém hoje são aparentemente bem tolerados pelos entrevistados que
citaram essas situações.
Já me chamaram de muita coisa. Isso me incomodava antes, agora não mais.
C., 17 anos
[Apelidos?]
Não muito. Tem sempre um babaca da sala que fica falando alguma coisa...
G., 17 anos
A forma hostil como “G.” se refere aos colegas que o assediam verbalmente
denota o incômodo ainda gerado pelos comentários considerados inconvenientes.
Os apelidos já me incomodaram muito, porque me colocavam lá numa posição
como um E.T., mas eu sempre achei que não estava fazendo nada mais que minha
obrigação. Quem tá errado é você, não eu. Hoje em dia eu levo na brincadeira, eu
sei que quem faz isso são meus amigos.
[E alguma vez, quando essas brincadeiras te incomodavam, você já
teve o impulso de reduzir seu rendimento, para ser inserida no
grupo?]
Com certeza isso já passou pela minha cabeça, mas eu sempre chegava à conclusão
de que era bobagem, aí eu desistia da idéia logo, mas que já passou pela cabeça,
isso já.
A., 16 anos
É ilustrativo ressaltar que as entrevistas foram realizadas entre alunos da terceira
série do ensino médio. Atingiram o sucesso porque, entre outros fatores, venceram diversas
dificuldades, inclusive a do assédio moral, como ilustra a fala acima, em que “A.” assume que
já se viu em situações de ceder às pressões do grupo para ser mais aceita socialmente.
Portanto, uma das habilidades desenvolvidas por eles foi a resistência às influências do grupo,
65
que em muitos momentos tenta conduzi-los a atividades ou situações divergentes em relação à
meta do sucesso escolar.
No ensino médio, é particularmente estratégico o assédio para encontros sociais,
tais como festas, cinema etc. Muitas vezes os convites são aceitos, embora com certa parcela
de culpa, dado o envolvimento com o estudo. Dessa forma, aquilo que seria uma atividade
natural para qualquer indivíduo, especialmente nessa faixa etária, transforma-se em
concorrente ao estudo deliberado.
O que mais me provoca é quando meus amigos me chamam pra sair quando eu
estou querendo estudar. Às vezes não dá pra resistir, e eu vou com eles.
F., 17 anos
Nesse trecho, “F.” revela a dificuldade em perseguir a meta do estudo individual,
quando confrontada aos convites para eventos sociais. Percebe-se nesses jovens a imagem da
dualidade entre a diversão e o estudo. Nota-se certa dificuldade dos entrevistados em lidar
com essa questão. “G.”, por exemplo, expõe seu incômodo com a imagem de que alunos de
sucesso escolar apresentam restrição de vida social.
Também me incomoda quando as pessoas ficam falando que eu não tenho vida. Eu
tenho vida, eu saio, vou a festas, ao cinema com os meus amigos.
G., 17 anos
3.3.2. Pressão excessiva
Em algumas falas percebe-se que a pressão, alimentada principalmente por
sentimentos do próprio entrevistado, parece ter gerado níveis elevados de estresse. O
perfeccionismo para resultados escolares é nítido, e esse fator, aliado a outros, como a
exigência dos pais e o cansaço, deixou imagens de sofrimento.
66
Essa busca por ser a melhor acaba que gera um pouco de pressão. Às vezes, nem
por outras pessoas, mas por você mesma. Você sabe que pode fazer melhor, então
você corre atrás...
A., 16 anos
Por exemplo, eu tenho que ficar aqui todas as tardes. Eu poderia almoçar em casa,
eu almoço aqui todos os dias, e isso desgasta. Eu acordo praticamente como se não
tivesse dormido. Eu volto pra casa, durmo e acordo cansado.
G., 17 anos
Os fragmentos apresentados expressam de forma clara o sofrimento embutido no
sucesso escolar, o que agrega ainda mais valor. Paralelamente a esse sofrimento, é possível
notar nas entrelinhas certo ar de heroísmo nessa conquista.
[Alguma outra lembrança negativa, em relação à sua vida escolar?]
Em termos de pressão, tem hora que eu não agüento mais, o estudo enche o saco
demais, eu tenho vontade de ir embora,... fico saturada.
[Saturada de estudar ou saturada de tentar se manter em primeiro?]
Os dois, os dois.
[E o que te incomoda mais?]
Já rolou vontade de me contentar com seis, de não me exigir muito, já tentei, mas
nunca consegui fazer isso.
[De que maneira?]
Ah... não sei... Por exemplo em Química, já larguei assim: pô, não vou aprender
mesmo... aí vem a prova e eu tiro seis, ou seis e meio. Aí rola aquele
arrependimento, porque eu podia ter ido melhor. Aí depois eu meto a cara no
estudo. Não consigo. Nem quero ser a melhor de todos sempre, mas quero ser o
melhor que eu puder ser.
K., 17 anos
Esse último trecho ilustra a exigência desenvolvida pela aluna em relação aos
próprios resultados e à incapacidade estabelecida em contentar-se com o mínimo exigido pelo
sistema educacional. O discurso demonstra também o papel motivador que o insucesso
desempenha na retomada da aprendizagem. A consciência sobre o fracasso ativou na jovem a
vontade de superar a dificuldade, com foco na própria potencialidade, numa atitude de
autoconhecimento.
67
3.3.3. Insucessos
Durante as entrevistas, os sujeitos foram provocados a discorrer acerca dos
insucessos e seus desdobramentos. Mais uma vez, fica evidente a auto-exigência por elevados
desempenhos.
Na quinta serie, quando mudei pra escola particular, eu tinha uma dificuldade
grande com algumas matérias. Na escola pública, em geral, eu só tirava 10 ou 9,5.
Chega lá, você tira um 7. Aí, você: ‘nossa, muito baixo’. Isso diminuiu a autoestima, porque você pensa que está piorando. E também porque você chega e tenta
estudar mais, como eu tentei. Me desafiou, mas na época foi ruim. Eu não me sentia
eu. Eu gostava de ser bem-sucedido nas provas.
G., 17 anos
Percebe-se no excerto a busca pelo bom resultado, a relação entre nota e bemestar e a forma como o jovem lidou com pequenos fracassos, chamando para si a
responsabilidade. É dada muita relevância aos erros, cuja causa é geralmente localizada em
procedimentos do próprio aluno (atribuição causal interna, controlável).
Um termo recorrente quando se fala em sucesso é culpa. Na interação abaixo, o
entrevistado relaciona culpa à responsabilidade e também localiza a causa do erro nas próprias
ações. Como no caso anterior, percebe-se também forte preocupação em corrigir os erros, de
modo a não repeti-los e, assim, atingir as metas estabelecidas.
[Você citou mais uma vez a palavra culpa. É a primeira coisa que
você busca após um insucesso?]
Sim.
[E esse culpado, geralmente, é quem?]
No meu caso, geralmente sou eu. Geralmente é a quem é incumbida a
responsabilidade.
[E o que você faz depois de ter descoberto a culpa?]
Eu vejo o que eu fiz de errado. A partir daí é aprender com os erros e fazer de tudo
pra conseguir atingir minhas metas.
R., 18 anos
68
3.4. Inteligência e sucesso acadêmico
O construto inteligência está longe de ser consenso na pesquisa sobre o tema.
Apesar disso, os participantes tenderam a reificar o conceito. Assim, quando perguntados em
relação ao assunto, a quase totalidade dos entrevistados se autodenominou inteligente.
Entretanto as imagens relacionadas a esse construto foram diversas.
Em muitos discursos, nota-se a clara influência dos pais, professores e colegas na
construção dessa auto-imagem. A percepção dos outros em relação a si influi diretamente na
construção do autoconceito de alguém. Portanto, os elogios recebidos ao longo da escolaridade parecem ter sido fundamentais para a elaboração dessa imagem de si próprio como alguém capaz.
Apenas duas entrevistadas disseram que não se consideram inteligentes, mas
estudiosas, estabelecendo uma dicotomia entre esforço (estudo) e talento (inteligência). Para
essa duas estudantes, a inteligência constitui-se em talento inato, que não depende do esforço
para se construir. Entretanto, no caso delas, o empenho, a determinação foram fundamentais
para estarem em igualdade de condições com aqueles que consideram privilegiados por terem
nascido inteligentes.
Não me considero inteligente, mas sim estudiosa. Meu irmão sim é inteligente.
Sem estudar, ele consegue ir tão bem quanto eu. Eu tenho que estudar muito pra
ter o resultado dele.
L., 17 anos
Os significados de inteligência apresentados pelos participantes circularam em
torno de cinco idéias principais: capacidade de se atingir metas; capacidade de resolução de
problemas; inteligência relacionada a habilidades diversas (escolares e extra-escolares);
capacidade de retenção de informações; preocupação com o bem-estar de si próprio e com o
69
do próximo. Os recortes abaixo ilustram alguns desses significados que emergiram na fala dos
entrevistados.
[Você se considera inteligente?]
Sim [risos].
[O que é ser inteligente?]
Olha, pra mim é conseguir aprender as coisas. Alguém dizer alguma coisa e eu
aprender.
[E o que é aprender?]
É chegar ao objetivo que a pessoa quer. Se o meu professor de Matemática quer que
eu chegue à conclusão de que isso é aquilo e a conclusão está certa, eu tenho que
chegar até ela. Ele não tem que chegar até ela por mim. Eu tenho que ter a
capacidade de aprender, de chegar à conclusão sozinho, sem ter que depender de
ninguém.
G., 17 anos
Para “G.”, a inteligência é considerada a capacidade de aprender e de se atingir
metas com relativa autonomia. Esse sentimento contribui ao estudo individual deliberado,
atividade que depende da capacidade autônoma, da disciplina. Portanto, é possível que essa
imagem de inteligência alimente a atitude de perseverar no estudo administrando as próprias
dificuldades. De forma semelhante, surgiu a associação entre inteligência e capacidade de
resolução de problemas.
[Você então se acha inteligente?]
Acho.
[E o que é ser inteligente?]
Capacidade de resolver problemas.
[E você acha que consegue resolver com certa facilidade?]
Acho.
D., 17 anos
A inteligência também foi relacionada a habilidades escolares e extra-escolares. A
fala de “V.” remete à idéia das múltiplas inteligências quando estabelece diferenças entre
habilidades valorizadas não somente no ambiente escolar.
70
[Mas como você quantifica essa capacidade sua?]
Acho que pela facilidade de aprender. Também pelas notas, que é o método que a
gente quantifica no colégio, e apesar disso eu não acho que seja necessariamente
inteligente. Acho que inteligência é uma coisa muito mais ampla.
[E o que é inteligência?]
O que é inteligência?... Inteligência é... acho que é a capacidade de você saber lidar
com determinadas situações e se sair bem nelas. Por exemplo, socialmente, a hora
de falar, a hora de ficar calado. Em matemática, conseguir resolver situaçõesproblema. Lingüística, a capacidade de escrever bem, de saber usar bem as
palavras, usar seus argumentos. Acho que inteligência é algo mais do que
simplesmente colégio.
V., 17 anos
Por sua vez, “A.” relaciona a inteligência à capacidade de retenção de
informações, à curiosidade e à capacidade de discorrer sobre temas diversos.
[E você se acha inteligente?]
Sim.
[E o que é isso?]
Boa pergunta... [risos]...eu não sei, nunca parei pra pensar nisso... Não sei, talvez
seja ser acima da média...
[Média de quê?]
Da inteligência... [risos] é conhecer mais que os outros...
[E o que é conhecer mais?]
[risos, incomodada com a insistência do entrevistador] ...Quanto mais
responde, mais informação... Eu acho meu irmão do meio muito mais inteligente
que eu. Qualquer assunto que você puxe com ele, ele sabe falar. Sabe falar sobre
história, arte, ele é de ficar horas lendo um livro, vai pro computador e fica
vasculhando, é mais curioso que eu.
A., 16 anos
Surgiu inclusive a relação entre inteligência intrapessoal e a interpessoal, ou seja,
a prática de atitudes favoráveis a si mesmo, sem que tragam prejuízos a outrem.
[Você se considera inteligente?]
Sim.
[E o que é ser inteligente?]
Ser inteligente... eu acho que é... fazer o que é bom pra você sem que isso seja mal
para as outras pessoas.
L., 17 anos
71
A abordagem acerca do tema inteligência por parte dos entrevistados vem
confirmar a diversidade de imagens em torno desse construto. Embora a quase totalidade
tenha se julgado inteligente, as concepções do que vem a ser variaram bastante em termos de
significado.
Considerações
Os resultados da presente investigação revelaram que o significado do sucesso
acadêmico extrapola a dimensão da aprendizagem de conteúdos escolares. Estar nesse seleto
grupo é ser reconhecido como alguém capaz, alimentar expectativas, ter poder e maior
possibilidade de inserção social. Ao mesmo tempo que caracterizam o sucesso acadêmico,
esses significados agem como motivadores do estudo e, portanto, atuam na manutenção desse
objeto simbólico.
A introversão desses estudantes pesquisados, que dificulta a ampliação do círculo
de amizades, facilita a dedicação ao estudo individual deliberado por eles declarada, que é
uma atividade solitária, necessitando o estudante de suportar com satisfação sua única
companhia e seu próprio silêncio.
A aparente segurança e autodeterminação desses jovens oculta uma forte
necessidade de seguir metas traçadas por outras pessoas, e atender a expectativas, que são
com freqüência os pais. Percebeu-se grande identificação com modelos estabelecidos que
incluem professores e colegas, mas estes nem se comparam, em grau de influência, à força do
modelo dos pais.
72
4. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
4.1. Discussão
O perfil dos entrevistados corrobora o que a literatura apresenta sobre as possibilidades do sucesso acadêmico, já que são estudantes oriundos de famílias pouco numerosas,
de elevado nível socioeconômico, e em sua maioria primogênitos (CAMACHO, 2000;
CASSASSUS, 2002; CASTRO, 1984).
Os resultados desta pesquisa apontam para a questão de que o sucesso acadêmico,
na perspectiva de alunos bem-sucedidos, não se resume a manter elevados resultados no
desempenho escolar. As imagens e atitudes que emergiram nas entrevistas sugerem que são
muitas as significações desse construto, e corroboram a teoria das representações sociais
(JODELET, 2002). O reconhecimento gerado pelo sucesso escolar parece ser elemento de
objetivação do construto, ou seja, uma forma de torná-lo socialmente aceito e compartilhado.
Em outras palavras, ter excelentes notas no boletim escolar não caracteriza por si só esse
sucesso, cujo significado se complementa no reconhecimento por parte dos outros.
A possibilidade de inserção social que o sucesso acadêmico proporciona sugere
atuar no processo de síntese desse objeto simbólico, na qual o conhecimento elaborado na
representação social é ressignificado, a fim de que o indivíduo possa ser mais bem inserido ou
aceito no grupo. É um tipo de recompensa social oriunda desse objeto, a partir da qual o
estudante bem-sucedido tem a possibilidade de alterar seus conceitos sobre o mundo
circundante, já que esse mundo passa a vê-lo de forma diferenciada.
O empoderamento e a credibilidade do aluno bem-sucedido são exemplos da
ancoragem desse construto. Nesse processo, ocorre a materialização coletiva do conhecimento
73
da representação, que passa a ser referencial para o estabelecimento de relações entre seus
agentes, segundo seus valores e contravalores sociais e culturais. Dito de outra forma, trata-se
da reificação do objeto simbólico, no caso o sucesso acadêmico, um construto socialmente
aceito, compartilhado e carregado de conceitos e valores estabelecidos no contexto das
relações entre os indivíduos.
Este estudo revelou também o forte papel motivacional dos pais em relação ao
alcance do sucesso acadêmico dos jovens pesquisados, principalmente por meio da adoção,
pelo estudante, de pelo menos um dos pais como modelo para esse sucesso. Para Bandura
(1986), o meio social exerce decisiva influência, positiva ou negativa, na determinação dos
comportamentos que serão desenvolvidos ou ativados. Esse suporte social, estabelecido por
meio de interações contínuas, controla as ações dos componentes de uma família, por
exemplo.
Outras aprendizagens, além daquelas relacionadas aos conteúdos escolares
formais, também são passiveis de ser influenciadas pelas ações e expectativas dos pais.
Davidson e colaboradores (1996) demonstraram essa influência no desenvolvimento da
habilidade musical. As crianças de melhores performances foram aquelas de maior interesse,
apoio e participação dos pais, que se envolviam cada vez mais, na proporção do progresso dos
filhos.
Assim, se o ambiente familiar privilegia o estudo, ou seja, se o considera um de
seus principais valores, essa inclinação terá grande chance de determinar o comportamento
dos filhos em direção a esse valor. Como foi dito, todos os entrevistados consideram pelo
menos um dos pais (para a grande maioria, ambos) bastante estudioso. Além disso,
freqüentemente se remeteram aos pais como referenciais para o sucesso escolar, quase sempre
74
com o argumento de não decepcioná-los demonstrando as elevadas expectativas depositadas
pelos pais em relação ao sucesso dos filhos.
Casassus (2002) e Gomes (2005) afirmam que o interesse dos pais pela leitura, o
tempo de permanência deles em casa e de diálogo com os filhos, o nível de escolaridade, a
expectativa em relação ao sucesso dos filhos e o envolvimento nas atividades escolares,
dentre outros, são fatores que apresentam correlação positiva com o sucesso acadêmico.
Por outro lado, Bandura (1977) não atribui a motivação apenas ao contexto social.
Para o autor, a modelagem cognitiva depende fortemente do que denominou auto-eficácia,
que é a crença do indivíduo sobre sua capacidade de se motivar e de exercer controle sobre as
atividades relacionadas à sua vida. Em outras palavras, a auto-eficácia envolve não só a
capacidade do indivíduo de executar determinada tarefa como também o julgamento, a
representação dessa capacidade, o que depende também de experiências anteriores. Dessa
forma, atividades carregadas de forte sentimento de auto-eficácia apresentam altas
possibilidades de serem bem executadas, ou seja, o bom desempenho de uma tarefa depende
não só da capacidade em realizá-la como também da crença, por parte do realizador, de sua
capacidade de realização, motivação e controle sobre processos e resultados.
As imagens que emergiram das falas dos entrevistados corroboram essa idéia da
auto-eficácia, na medida em que revelaram jovens com razoável controle sobre suas
atividades de estudo, incluindo estratégias motivacionais. São estudantes que demonstram ter
o controle sobre sua aprendizagem, suas estruturas metacognitivas, quando narram as formas
de estudar os diferentes conteúdos das diversas disciplinas de maneiras variadas, de acordo
com sua afinidade, capacidade de aprendizagem e tempo disponível.
Esses resultados permitem inferir forte atribuição causal interna dos estudantes, o
que para Weiner (1979) é fator primordial ao sucesso. Isso se torna mais evidente nos relatos
75
de insucessos, quando entrevistados atribuem as falhas a omissões ou desacertos em sua
própria conduta indicando os rumos para corrigi-las. A freqüência dessas falhas, a facilidade
em repará-las e a energia despendida no estudo têm relação com a forma como alguns
entrevistados representam o construto inteligência. Para eles, ser inteligente se opõe a ser
esforçado. O inteligente é aquele que atinge resultado sem muito esforço, ou seja, que não
demonstra necessidade de grande dedicação para manter elevado desempenho. Essa noção
relaciona-se à idéia de dom inato, de talento, outro construto carregado de significações
diversas e controversas (GALVÃO, 2007).
Além da motivação intrínseca, os jovens entrevistados demonstraram em geral
boa resposta quando elogiados e quando desafiados por professores, por meio de atividades
escolares com graus crescentes de complexidade. O papel do elogio na motivação desses
jovens confunde-se com uma das principais significações do sucesso acadêmico: o
reconhecimento.
Isso nos remete a Freud (1976), que descreve o narcisismo como um
comportamento no qual o indivíduo ama a si mesmo, ou trata a si mesmo como se tratasse
uma pessoa amada. Para o autor, o narcisismo é uma fase necessária à evolução da libido.
Antes de se voltar ao mundo externo, o indivíduo tem a necessidade de formar o “eu”, que
corresponde à auto-imagem idealizada, acrescida de todos os valores, julgamentos e
declarações de perfeição dessa imagem ideal. Essa imagem ideal é construída a partir de
enunciações pronunciadas por aqueles que estão próximos, principalmente os pais, que se
projetam no filho, resgatando o narcisismo que também tiveram, mas que a realidade os
forçou a abandonar.
Portanto, o reconhecimento como uma das principais significações do sucesso e a
referência que os jovens entrevistados têm em seus pais são questões intimamente
76
relacionadas. Ser reconhecido como bem-sucedido alimenta seu narcisismo, que foi
construído à custa dos valores e declarações dos pais, que continuam exercendo elevada
influência na manutenção desse significado e desse sentimento.
Como mencionado, os desafios também se mostraram importantes agentes
motivacionais. No ambiente escolar, atividades cognitivas desafiadoras levaram os estudantes
pesquisados a se interessarem mais pelo objeto de estudo, o que nos obriga a revisitar o
conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP), de Vigotsky (1989). Para o autor, é
importante que o educador estabeleça no estudante o conflito cognitivo, por meio de
estratégias educativas que o desafiem a progredir do nível de desenvolvimento real (situação
atual) ao nível de desenvolvimento potencial (situação desejada). Para isso, devem ser
propostas atividades que fujam do trivial, mas que, ao mesmo tempo, não sejam tão difíceis a
ponto de gerar desmotivação.
O ambiente competitivo gerado e alimentado por colegas ou irmãos contribui para
esse clima de desafio, motivador do estudo. Apesar de causar, por vezes, pressão excessiva e
desgastante, na maior parte dos casos parece exercer influência positiva na manutenção do
estudo e do sucesso. A comparação de seus resultados com os dos colegas de sucesso é
menção constante nos discursos. Alunos que se aproximam de colegas mais privilegiados e
interagem com eles obtêm aspirações mais altas e melhores resultados no estudo (GOMES,
2005). Por vezes, uma nota aparentemente medíocre é considerada meritória, por ser, embora
baixa em termos absolutos, a melhor nota da turma ou maior do que a do colega competidor.
Aqueles entrevistados que apresentam irmãos mais velhos e bem-sucedidos
verbalizaram forte preocupação em manter o clima competitivo em relação ao desempenho
escolar. É de se supor que essa rivalidade deve ter se iniciado na disputa pelo amor dos pais
(FREUD, 1976). Observando que na sala de aula ocorre disputa entre alunos de sucesso em
77
relação à admiração por parte do professor, podemos estabelecer analogia entre a rivalidade
fraternal disputando o amor dos pais e aquela escolar, na disputa pela atenção e respeito do
professor (MILLOT, 1987).
O discurso dos entrevistados permite concluir que, em alguns casos, o apelo por
manter elevados desempenhos traz o foco para a realização de instrumentos avaliativos, ou
seja, uma aprendizagem superficial ativa que seja suficiente para o alcance de boas notas em
provas e um bom desempenho em concursos vestibulares, com nível razoável de compreensão
sobre o assunto (ENTWISTLE, 1998). Isso se revela especialmente naquelas disciplinas de
menor afinidade por parte do estudante. Os conteúdos de interesse parecem ser assimilados de
forma profunda, a partir de estratégias de estudo individual que envolvem várias horas de
dedicação e o contato com fontes diversas de informação, gerando ótimo nível de
compreensão.
Estudantes que apresentam estratégias bem definidas de aprendizagem possuem
dois focos de ação distintos, que são o conteúdo acadêmico e o sistema de avaliação, que podem ser relacionadas a estratégias de aprendizagem profunda e superficial, respectivamente.
Portanto, é comum estudantes conviverem com focos diversos, a depender de fatores tais
como afinidade pelo conteúdo ou pelo professor e tempo disponível para o estudo
(ENTWISTLE, 1998).
Além do estabelecimento de situações desafiadoras, estudantes pesquisados viram
também como qualidade de seus “melhores” professores a afetividade como fator de
qualidade do ensino. Os professores mais valorizados foram aqueles que aliaram
conhecimento técnico à competência relacional, ou seja, que demonstraram empatia para com
os alunos. Isso nos remete, mais uma vez, a Freud (1976), que considera o afeto o principal
alimento da pulsão. Assim, o afeto, cuja manifestação é percebida como um sentimento,
78
portanto consciente, é o principal influenciador da pulsão, que ocupa um lugar no
inconsciente. Embora Freud não tenha se utilizado do termo motivação, atrevemo-nos a
estabelecer relação estreita entre pulsão e motivação. Como a motivação está intimamente
relacionada à aprendizagem, os resultados desta pesquisa reforçam a idéia de que afetividade
e cognição são temas intimamente relacionados, posição que converge com a de diversos
autores (DAMÁSIO, 1996; GALVÃO, 2006).
Transportando esse conceito ao ambiente familiar dos sujeitos da pesquisa,
podemos concluir que a afetividade dos familiares também contribuiu para zelar pelo
ambiente de aprendizagem observado na imagem dos entrevistados, que consideram seus pais,
embora exigentes, compreensivos e dialogais. Em outras palavras, além de cobrarem
resultados, são pais que, na perspectiva dos estudantes pesquisados, acompanham os
processos escolares e se solidarizam com seus filhos, inclusive nos episódios em que há
insucessos.
Isso se mostra ainda mais claro quando nos referimos a desempenho em testes
avaliativos. A tendência à preocupação excessiva e, mais especificamente, o medo de
avaliação é um componente poderoso da ansiedade em testes (SARASON, 1988). Muitos
jovens disseram remeterem-se à imagem de seus professores quando realizavam provas, o que
sugere que imagens positivas de professores geram ambiente mental favorável à realização de
exames, com redução do nível de ansiedade.
Ainda em relação aos exames, notou-se em muitos fragmentos de discursos uma
preocupação em perceber a forma de cobrança do professor, ou seja, a maneira como ele
elabora as questões, o que nos remete à metáfora do quarto chinês (SEARLE, 1984), na qual
um matemático trancado em um quarto consegue responder, em chinês mandarim, a perguntas
79
elaboradas também em chinês, sem nunca ter tido contato com a língua, a partir do
entendimento da lógica com que se estruturam os ideogramas.
De certa forma, isso revela a fragilidade dos processos avaliativos escolares, baseados em provas escritas em que se espera do estudante uma resposta semelhante ao que fora
dito em sala pelo professor. Dessa forma, a avaliação passa a constituir um processo frágil,
passível de dissimulações e que facilite o desenvolvimento de estratégias que levem à
aprendizagem superficial passiva, em detrimento ao que Ausubel e colaboradores (1980) denominaram aprendizagem significativa, para cuja avaliação outras estratégias são requeridas
além, ou em vez, da prova escrita, para se perceber os atalhos cognitivos construídos pelo
estudante.
Espera-se que o processo avaliativo seja regulador das aprendizagens dos
estudantes (PERRENOUD, 2000), de forma que as intervenções avaliativas ocorram não só
ao final como também ao longo do processo de aprendizagem, comunicando ao aluno suas
possibilidades de progresso, de forma a permitir alterações de posturas e procedimentos
durante a ação educativa. Essa avaliação, denominada formativa (HADJI, 2001), requer do
professor uma atenção especial aos modelos mentais dos seus alunos, o que implica grande
conhecimento sobre estratégias de aprendizagem e contato próximo com o estudante em
atividade, o que não é fácil tarefa em turmas numerosas e com poucos encontros semanais.
Assim, espera-se que as estratégias de ensino e avaliação sejam planejadas tendose como meta o estabelecimento de um clima de sala de aula que seja suficientemente
motivador (intrínseca e extrinsecamente), estimulando-se o trabalho em grupo, por meio de
projetos em que haja participação dos estudantes no planejamento de atividades vinculadas à
sua realidade (HERNÁNDEZ, 1998). Os processos avaliativos reguladores estabelecem
constante comunicação orientando mutuamente aluno e professor. O primeiro, em direção à
80
aprendizagem. O professor, rumo ao replanejamento das estratégias de ensino
(PERRENOUD, 2000).
Uma vez motivado o aluno, as aprendizagens se dão de maneira natural,
significativa, de modo compreensivo, interativo, lógico. Assim, é interessante que o processo
valorize também a aprendizagem em si, e não só os resultados, incentive a produção do
conhecimento e o estudo contínuo, fomente as habilidades e talentos a fim de se atingir o
enfoque profundo no cumprimento das tarefas (COLL, 1996b; ENTWISTLE, 1998). Nesse
sentido, é interessante que a escola seja suficientemente capaz de promover um clima que seja
equilibrado e simultaneamente cooperativo e competitivo, de forma a alimentar a motivação
dos estudantes extrínseca e intrinsecamente cultivando a curiosidade, o espírito de pesquisa e
a criatividade, desenvolvendo habilidades por meio de múltiplas linguagens.
Os estudantes entrevistados encontravam-se no último ano da educação básica,
portanto apresentavam pelo menos onze anos de vida escolar. Como o sucesso acadêmico, da
forma como foi concebido nesta pesquisa, é considerado exceção no ambiente escolar, e tendo
em vista que muitas vezes o grupo de crianças e jovens trata as exceções de forma hostil, esses estudantes tiveram que desenvolver estratégias para resistir às pressões do grupo. Vários
indivíduos pesquisados narraram experiências em que foram expostos a situações que os fizeram questionar o preço de serem bem-sucedidos, seja por meio de apelidos, de comentários ou
de outras atitudes discriminatórias.
Isso faz supor que muitos outros alunos com grande potencial acabam por
sucumbir a essas pressões em prol de uma inserção social mais “natural”, já que aquela gerada
pelo sucesso é considerada por muitos alunos bem-sucedidos como “por interesse”, pois os
demais necessitam do apoio dos alunos de sucesso, seja nos momentos de estudo, seja em
momentos avaliativos. Muitos desses alunos de destaque acadêmico não são convidados para
81
os eventos sociais, embora sejam intensamente requisitados para trabalhos em grupo, por
exemplo, nos quais muitas vezes acabam por realizar a maior parte da tarefa, enquanto outros
alunos tiram proveito.
É de se imaginar que uma parcela considerável de alunos abandone sua dedicação
intensa aos estudos ou preserve-a sob o sofrimento da violência simbólica ou física daqueles
que não toleram o diferente. No fenômeno bullying, nem sempre a vítima é sempre só vítima,
ou seja, muitas vezes ela aceita por certo tempo as agressões, com o intuito de ser incluída no
grupo social. Essas manifestações de violência podem causar sérios danos psicológicos,
muitas vezes imperceptíveis aos olhares pouco sensíveis de educadores e pais, mas passíveis
de gerar comportamentos patológicos futuros (FANTE, 2005).
4.2. Conclusões
Este estudo pretendeu identificar as significações do sucesso acadêmico e suas
conseqüências sociais, na visão de estudantes bem-sucedidos. Uma interessante sugestão de
prosseguimento seria o estudo longitudinal da trajetória acadêmica e profissional desses
jovens, de forma a relacionar o sucesso acadêmico na educação básica aos seus
desdobramentos futuros mapeando-se seus destinos e satisfações profissionais.
Uma outra sugestão de estudo seria uma pesquisa semelhante, porém envolvendo
estudantes de classe socioeconômica menos favorecida, a fim de se traçar perfil comparativo
das representações sociais de estudantes bem-sucedidos de realidades distintas.
Durante a escrita deste documento, puderam-se colher notícias dos entrevistados.
Todos entraram em universidades federais, a maioria na Universidade de Brasília, sendo que
um deles obteve a primeira colocação para o curso de Medicina.
82
Independentemente do valor futuro desse sucesso, este estudo permitiu a
extrapolação de interessantes sugestões para se manter crianças e jovens com elevados
desempenhos escolares: aos professores, uma postura dialógica, franca e cognitivamente
desafiadora; aos pais, o apreço pelo estudo, a partir do próprio exemplo, e a necessidade de
verbalizar metas e elogios.
Porém sugerimos também ações no sentido da construção de autonomia
emocional desses jovens, haja vista a forte dependência afetiva às pessoas de referência. A
aparente independência desses estudantes oculta uma forte busca por atender a metas e
expectativas de outras pessoas.
Embora não tenha sido o foco da pesquisa a investigação de altas habilidades nos
sujeitos pesquisados, nota-se que muitos apresentam comportamentos compatíveis a casos de
superdotação. Nesse sentido, é interessante que as escolas procedam a investigações
psicopedagógicas desses alunos de destaque, a fim de se dar o tratamento adequado aos
portadores de altas habilidades, tanto na dimensão acadêmica quanto na afetiva.
Os resultados incitam a escola a uma discussão sobre os métodos avaliativos,
visto que muitas estratégias são sabotáveis, seja pelo acerto ao acaso (no caso de provas
objetivas), seja pelo fato de permitirem a aprendizagem superficial passiva: aquela altamente
volátil e desprovida de significados. O aluno transcreve algumas informações que foram
memorizadas às vésperas da prova, e que são esquecidas logo após a realização da
verificação. Embora imaginemos que os alunos continuem focando também as estratégias de
se fazer um bom exame (PERRENOUD, 1995), é desejável que esses exames sejam cada vez
mais qualificados.
83
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88
ANEXO
Termo de consentimento livre e esclarecido
Prezado(a) participante,
Leia cuidadosamente o que se segue e quaisquer dúvidas serão respondidas
prontamente.
Você está sendo convidado(a) a participar de uma pesquisa da Universidade Católica
de Brasília sobre as representações sociais do sucesso acadêmico. Este estudo será conduzido
por Júlio Egreja, e integra sua dissertação de mestrado em Educação.
O objetivo deste estudo é identificar o significado do sucesso acadêmico para um(a)
aluno(a) bem-sucedido(a), assim como os fatores motivacionais para os estudos e as
conseqüências do sucesso.
Você foi selecionado(a) para a pesquisa por estar entre os alunos de melhor
desempenho escolar de sua série. A coleta de dados se dará na forma de entrevista, que será
gravada. Sua identidade será mantida em sigilo. Somente o pesquisador terá acesso às suas
informações para verificar os dados do estudo. Você pode escolher não fazer parte dele, ou
desistir a qualquer momento. A sua participação é voluntária, e será documentada através da
assinatura deste Termo de consentimento livre e esclarecido, do qual você receberá uma
cópia.
Muito obrigado.
Declaro que li e entendi o termo de consentimento, sendo minhas dúvidas
esclarecidas, e que sou voluntário(a) a tomar parte neste estudo.
Brasília, ____ de ______________ de _____.
__________________________________
Participante
__________________________________
Pesquisador