Intervenção de terceiros na Arbitragem

Transcrição

Intervenção de terceiros na Arbitragem
INTERVENÇÃO DE TERCEIROS NA ARBITRAGEM
Lino Diamvutu
Docente de TGDC
da Universidade Óscar Ribas
1.
INTRODUÇÃO
A arbitragem como meio alternativo de resolução extrajudicial de litígios vem
conquistando o seu espaço no quadro normativo vigente. Para além dos diplomas legais
mais conhecidos que versam sobre a matéria, designadamente a Lei n.º 16/03 de 25 de
Julho sobre a Arbitragem Voluntária1 (LAV), o Decreto n.º 4/06 de 27 de Fevereiro
sobre o Regime de outorga das autorizações administrativas para a criação de Centros
de Arbitragem2 e a Resolução n.º 34/06 de 15 de Maio que reafirma o engajamento do
Governo na Arbitragem como meio de solução de litígios sobre os direitos disponíveis3,
é de referir, igualmente, algumas disposições pertinentes do Código de Processo Civil
(CPC), v.g. o artigo 290.º, prescrevendo apertis verbis que as partes numa instância
judicial podem “em qualquer estado da causa acordar em que a decisão de toda ou parte
dela seja cometida a um ou mais árbitros da sua escolha”.
Em concreto, a possibilidade do recurso à arbitragem como meio de solucionar
contendas sobre direitos disponíveis, entre particulares ou entre particulares e entes
públicos, só se tornaria inviável caso existisse uma sentença judicial sobre a matéria
que, por natureza, seria arbitrável. Antes disso, o legislador reconhece às partes
litigantes o direito de dispor do processo judicial, podendo livremente estipular uma
convenção de arbitragem e pôr termo, desse modo, ao processo pendente. Ao verificarse essa vontade das partes, é lavrado no processo o termo de compromisso, que é válido
em atenção ao seu objecto e à qualidade das partes, que são remetidas para o Tribunal
arbitral.
A arbitragem geralmente referida pela doutrina como justiça privada tem a sua fonte na
convenção de arbitragem (cláusula compromissória e compromisso arbitral), entre as
partes interessadas. Pode, no entanto, acontecer que (i) o litígio entre duas partes
ameace directa ou reflexamente os interesses de terceiros, ou (ii) a cláusula
compromissória se encontre inserta num contrato cedido a terceiro ou com alguns
elementos – crédito que resulte do contrato – transmitidos a terceiro (cessionário ou
sub-rogado).
Na primeira hipótese, como equacionar a problemática da intervenção de terceiros na
instância arbitral, uma vez que estes não são partes na convenção que instituiu a
arbitragem? Terá o árbitro poderes coactivos para ordenar a integração do terceiro no
contraditório? E se o árbitro entender indispensável a presença do terceiro para a
validade do processo e da sentença arbitral, poderá obrigá-lo a intervir? Na segunda
hipótese, questiona-se a legitimidade do terceiro de invocar ou ser-lhe oponível a
1
DR I.ª Série – N.º 58
DR I.ª Série – N.º 36
3
DR I.ª Série – N.º 59
2
cláusula compromissória que não convencionou. É dessa problemática que nos
ocuparemos a seguir.
2.
NATUREZA JURÍDICA DA ARBITRAGEM
A arbitragem funda-se na convenção arbitral. É abundante a doutrina e a jurisprudência
que consagra o fundamento contratual da arbitragem e a relatividade dos seus efeitos.4 /5
Quando se afirma que os contratos têm, em regra, uma eficácia relativa, entende-se que
os seus efeitos apenas se produzem relativamente aos sujeitos que neles intervieram,
não podendo criar obrigações, nem beneficiar a terceiros. Transposto à arbitragem, o
princípio originou duas correntes doutrinais.
A primeira, defendida por PASCAL ANCEL, considera que a eficácia relativa da
convenção arbitral tem um significado próprio. A mesma significa tão-somente que os
terceiros não podem ser forçados a participar num processo arbitral, nem se pode impor
às partes a presença destes. Contudo, sustenta que os terceiros não podem desconhecer o
caso julgado de sentenças arbitrais. Por conseguinte, podem ser-lhes oponíveis os
efeitos da sentença decorrente da aplicação de uma cláusula compromissória. Por
exemplo, o fiador pode considerar-se desobrigado por força da sentença que declarou
extinta a dívida do devedor.6
A segunda, sustentada por DANIEL COHEN, JEAN ROBERT, MATTHIEU
BOISSÉSSON e CARREIRA ALVIM, confirma o princípio de que a eficácia relativa
impede a intervenção voluntária ou forçada de terceiros no processo arbitral, sem o
consentimento das partes, concluindo que a sentença arbitral é inopposable a terceiros.
A sentença arbitral não pode produzir efeitos à l’égard des tiers.7
Parece-nos mais acertada a posição de PASCAL ANCEL. Correcta, ainda, a sua opinão,
ao referir que: “L’origine contractuelle de l’arbitrage se fait davantage sentir lorsqu’on
envisage les effets de la convention d’arbitrage à l’égard des tiers, l’extention de la
procédure arbitrale aux tiers étant largement tributaire du principe de l’effet relatif des
contrats… »8
Se a arbitragem tem uma origem contratual, seria erróneo considerar a sentença arbitral
como sendo um negócio privado, de igual natureza contratual. Não há dúvidas que a
sentença proferida por árbitros tem carácter jurisdicional por vontade expressa do
4
Vide PINHEIRO, Luís de Lima, Arbitragem Transnacional, Almedina, 2005, p. 187
O fundamento contratual da arbitragem revela-se ainda quando a sentença arbitral é anulada por um dos
motivos previstos pelo art. 34.º da LAV. Neste caso, os árbitros podem retomar o julgamento da causa.
Mas, as partes devem celebrar nova convenção porque a primeira esgota-se aquando da pronúncia da
sentença.
6
ANCEL, Pascal, Les Effets des Conventions d’arbitrage, in Guide pratique de l’arbitrage et de la
médiation commerciale, Editions du Juris-classeur, 2004, pp. 32 - 33
7
DANIEL, Daniel, Arbitrage et société, Paris, LDGJ, 1993, n.º 604, p. 317 ; ROBERT, Jean, Projet d’une
clause compromissoire ouverte en matière d’operations multiples, cit. por Pierre Bellet, Revue de
l’Arbitrage, 1981, n.º 1, p. 56.; BOISSÉSSON, Matthieu, Le droit français de l’arbitrage, Paris: GLN
éditions, 1990, pp. 245 –246 ; Vide JÚNIOR, Humberto Theodoro, Arbitragem e Terceiros –
Litisconsórcio fora do Pacto Arbitral – Outras intervenções de terceiros, in Reflexões sobre Arbitragem,
Editora São Paulo LTR, 2002, pp. 245 e ss. ; ALVIM, J.E.Carreira, Intervenção de Terceiros na
Arbitragem, in Reflexões sobre Arbitragem, São Paulo Editora LTR, 2002, p. 262.
8
ANCEL, Pascal, op. cit., p. 29.
5
2
legislador. No Direito angolano, o artigo 33.º da LAV determina que “ a decisão arbitral
produz entre as partes os mesmos efeitos das sentenças judiciais e, sendo condenatória,
tem força executiva”.(9)(10) O mesmo é dizer que a sentença arbitral produz entre as
partes os efeitos de caso julgado e de força executiva.
Embora juiz e, portanto, detentor de jurisdição, o árbitro não é um juiz estadual, nem é
juiz permanente e com poderes jurisdicionais amplos como os magistrados do aparelho
judiciário. A prova mais evidente da limitação imposta ao árbitro está na falta de poder
para fazer executar as suas próprias sentenças. Só ao juiz estadual compete desencadear
os mecanismos da execução forçada.(11)
Essa ideia transparece no artigo 37.º da LAV ao afirmar que as partes devem executar a
decisão arbitral nos precisos termos determinados pelo Tribunal Arbitral, e findo o
prazo fixado pelo Tribunal Arbitral para o cumprimento voluntário da sentença ou na
falta dessa fixação, no prazo de trinta dias após a notificação da sentença, pode a parte
interessada requerer a sua execução forçada perante o Tribunal Provincial, nos termos
da Lei do Processo Civil, no caso de a mesma não ter sido cumprida.
A esta primeira limitação ao poder jurisdicional do árbitro, acresce o facto de que as
medidas provisórias ou cautelares (arresto, prestação de garantias...) – visando prevenir
situações de periculum in mora(12) ou proteger mera probabilidade da existência do
direito invocado – também ficam, em larga medida, dependente da intervenção do juiz
estadual. Se é verdade que o Juiz arbitral pode, a pedido de qualquer das partes, ordenar
a tomada de medidas provisórias, as medidas de coacção são da competência do Juiz
estadual. Daí resulta que o facto de as partes terem subscrito uma convenção de
arbitragem, não lhes impeça de recorrer aos tribunais comuns para obter o decretamento
de providências cautelares.
Conclui-se, por conseguinte, que o árbitro tem jurisdictio, mas não tem imperium
(poderes soberanos). Enquanto o juiz estadual tem a jurisdictio e o imperium, o árbitro
só conta com a jurisdictio: a faculdade de jus dicere, i.é. dizer o Direito.(13) Para
PHILIPPE FOUCHARD, o árbitro não participa, a nenhum título, da função pública ou
9
JÚNIOR, Humberto Theodoro, Arbitragem e Terceiros – Litisconsórcio fora do Pacto Arbitral – Outras
intervenções de terceiros, in Reflexões sobre Arbitragem, Editora São Paulo LTR, 2002, pp. 245 e ss.
10
Vide também: SURVILLE, M., Jurisprudence française en matière de droit international, in Revue
critique de législation et de jurisprudence 29, pp. 148 e ss. ; FOUCHARD, Philippe, L’arbitrage
commercial international, Paris, 1965, pp. 366 e ss. ; PINHEIRO, Luís de Lima, Arbitragem
Transnacional, Almedina, 2005, pp. 183 e ss.
11
CLAY, Thomas, L’arbitre, Paris, Dalloz, 2001, pp.36 et 8004 cit. por JÚNIOR, Humberto Theodoro,
op.cit., p. 245 « Étant un juge désigné par contrat, l’arbitre est soumis à un régime juridique qui repose
sur une double source : la source jurisdictionnelle de sa mission constitutive de son statut de juge, et la
source contractuelle de son investiture qui fonde la relation nouée avec ceux dont il va trancher le litige ».
12
É o prejuízo acrescido que a demora na satisfação judicial acarreta para o titular do interesse protegido.
O credor, que assista à intencional alienação do património pelo devedor, pode instaurar um arresto (uma
apreensão provisória, ainda que efectiva e material) desse património, de modo a que os bens que o
constituam fiquem à ordem do tribunal até que a acção (definitiva) de condenação termine a sua marcha.
Essa decisão provisória vai manter-se até que na acção principal seja definido o direito e composto o
litígio. Vide PIMENTA, António Montalvão Machado Paulo, O Novo Processo Civil, Teixeira e Sousa,
Sociedade Editora, Lda, 1997, pp. 338 e ss.
13
ROBERT, Jean, L’arbitrage, droit interne, droit international privé, 6ème éd., Paris, Dalloz, 1993, n.º
201, p. 170 ; JARROSSON, Charles, La notion d’arbitrage, Paris, LGDJ, 1987, n.º 183, p. 104 ; JÚNIOR,
Humberto Theodoro, Arbitragem e Terceiros – Litisconsórcio fora do Pacto Arbitral – Outras
intervenções de terceiros, in Reflexões sobre Arbitragem, Editora São Paulo LTR, 2002, pp. 245.
3
jurisdicional do Estado em cujo território tem sede e realiza o seu “mandato” por força
de um contrato privado; ao mesmo tempo, porém, o árbitro “desempenha um papel
jurisdicional tanto no decurso do processo como no momento de dizer o Direito”.14 Para
CHARLES JARROSSON: “...l’arbitre dit le droit, il a la jurisdictio”.15
O Tribunal da Relação de Lisboa considera que a arbitragem voluntária, na medida em
que resulta da convergência da vontade das partes, é contratual na sua origem e, ainda,
privada na sua natureza, jurisdicional na sua função e pública no seu resultado.16
Se o árbitro só tem jurisdictio, que se baseia no exercício da autonomia da vontade das
partes na convenção arbitral, coloca-se a questão do fundamento da intervenção de
terceiros na arbitragem, que pode ter por consequências: (i) a ampliação objectiva e
subjectiva da convenção da arbitragem e (ii) a extensão subjectiva dos efeitos da
sentença, na medida em que alarga a discussão sobre a relação jurídica material
deduzida no processo (res in iudicum deducta)17.
3.
INTERVENÇÃO DE TERCEIROS NA INSTÂNCIA ARBITRAL POR
VIA INCIDENTAL
A intervenção18 de terceiros é a modalidade de ingresso de um terceiro num processo
entre outras partes, cujo propósito é extrair dele uma utilidade adicional, provocando a
extensão subjectiva dos efeitos da sentença19. A intervenção de terceiros constitui uma
excepção ao princípio da estabilidade da instância, segundo o qual, citado o réu, aquela
(a instância) deve manter-se quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir.
No Código de Processo Civil, encontram-se tipificados seis incidentes20conducentes à
intervenção de terceiros na lide, a saber: (i) a nomeação à acção, (ii) o chamamento à
autoria, (iii) o chamamento à demanda, (iv) a assistência, (v) a oposição e (vi) a
intervenção principal.
Na verdade, alguns destes incidentes processuais determinam situações de litisconsórcio
voluntário subsequente21, susceptíveis de se verificarem quer do lado activo, passivo ou
misto da relação processual. É o que acontece no chamamento à demanda e na
intervenção principal. Outros, embora implicando uma pluralidade subsequente das
partes no pleito, não implicam litisconsórcio porquanto se trata de uma pluralidade por
subordinação e não de uma pluralidade das partes que sejam principais. É o caso do
chamamento à autoria e da assistência.
Vejamos, agora, a questão da intervenção de terceiros na arbitragem, nos casos de
chamamento à autoria, assistência, oposição e de litisconsórcio necessário, sendo certo
14
FOUCHARD, Philippe, L’arbitrage commercial international, Paris, 1965, pp. 366 e ss. ; PINHEIRO,
Luís de Lima, Arbitragem Transnacional, Almedina, 2005, pp. 183 e ss.
15
JARROSSON, Charles, La notion d’arbitrage, Paris, LGDJ, 1987, n.º 175, p. 101.
16
Acórdão de 15-05-2007 www.dgsi.pt
17
ALVIM, J.E.Carreira, Intervenção de Terceiros na Arbitragem, in Reflexões sobre Arbitragem, São
Paulo Editora LTR, 2002, p. 263.
18
Do latim interventio, de intervenire que tem o significado de assistir, intrometer-se, ingerir-se.
19
ALVIM, J.E. Carreira, Intervenção de Terceiros na Arbitragem, in Reflexões sobre Arbitragem, São
Paulo Editora LTR, 2002, p. 261.
20
Art.320.º a 359.º do CPC
21
Por oposição ao litisconsórcio voluntário inicial
4
que as soluções encontradas poderão ser aplicáveis, com as necessárias adaptações, às
outras situações contempladas pelos artigos 320.º a 359.º do CPC.
a) Chamamento à autoria
O incidente de chamamento à autoria tem como única finalidade estender ao chamado o
efeito de caso julgado a obter com a decisão a proferir na acção, em particular se ela for
condenatória. O que se pretende é evitar que na acção de regresso que, eventualmente,
venha a ser posteriormente instaurada, a parte demandada possa questionar o resultado
da acção anterior, onde foi proferida a condenação que serve de base à acção de
regresso. Daí a conveniência – não o dever – de chamar o terceiro a intervir como
auxiliar na defesa22.
Tal incidente não interfere com a delimitação do objecto da acção, mantendo-se
inalteradas as questões submetidas à apreciação do tribunal, sendo o chamado admitido
a discuti-las, na medida em que nisso possa ter interesse, sendo-lhe estendido, a final, o
efeito de caso julgado a formar com a decisão que vier a recair sobre o objecto da
acção.23 O chamado não é parte principal, mas tão somente auxiliar na defesa.
Na prática, há duas situações bem conhecidas em que é levado a efeito o incidente de
chamamento à autoria:
(i)
(ii)
Nas acções declarativas de condenação no âmbito dos contratos de
empreitada, envolvendo o dono da obra (autor) e o empreiteiro (réu), quando
este, por sua vez, contratou um sub-empreiteiro, responsável pelo
incumprimento apontado àquele (empreiteiro).
Nas acções declarativas de condenação contra a Seguradora de
responsabilidade civil que, ao abrigo da apólice de seguro, assumiu a
obrigação de pagar as indemnizações que, eventualmente, possam ser
exigidas ao seu segurado por terceiros lesados.
Perante a vontade expressa de uma das partes (ré) de chamar à autoria um terceiro à
convenção de arbitragem, que soluções devem ser encontradas?
A doutrina, de forma unânime, defende o descabimento da intervenção forçada do
terceiro responsável pela garantia do direito de um dos litigantes.
Na doutrina francesa, JEAN ROBERT afirma que “l’arbitrage ne pourra permettre
l’intervention, ni volontaire, ni forcée, de même que l’appel en garantie”.24/25
22
Vide também PIMENTA, António Montalvão Machado Paulo, op.cit. p. 329.
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 08-03-2007 www.dgsi.pt
24
ROBERT, Jean, Projet d’une clause compromissoire ouverte en matière d’operations multiples, cit. por
Pierre Bellet, Revue de l’Arbitrage, 1981, n.º 1, p. 56. Vide JÚNIOR, Humberto Theodoro, Arbitragem e
Terceiros – Litisconsórcio fora do Pacto Arbitral – Outras intervenções de terceiros, in Reflexões sobre
Arbitragem, Editora São Paulo LTR, 2002, pp. 255 e ss.
25
ANCEL, Pascal, Les Effets des Conventions d’arbitrage, in Guide pratique de l’arbitrage et de la
médiation commerciale, Editions du Juris-classeur, 2004, p. 32.
« Mais il est maintenant bien acquis que les tiers ne peuvent méconnaître les effets que le contrat produit
entre les parties, et qu’ils peuvent s’en prévaloir.
23
5
A Plenária da Corte de Cassação francesa, num célebre aresto de 12 de Julho de 1991
(Besse) decidiu que le maître de l’ouvrage a, contre le sous-traitant, une action
délictuelle, et que, en conséquence, il ne peut se voir appliquer une clause
compromissoire éventuellement contenue dans le contrat de sous-traitance, pas plus
qu’il ne peut s’en prévaloir. Pas davantage ne serait applicable dans ces rapports une
clause contenue dans le contrat entre le maître de l’ouvrage et l’entrepreur ».26
No direito italiano, ELIO FAZZALARI sustenta que “a chamada em garantia” (appel en
garantie) atrita com o princípio segundo o qual ninguém pode, contra a sua vontade, ser
privado do juiz natural, pré-constituído para a generalidade, portanto o estadual.
Consequentemente, não é dado às partes coagir um terceiro a intervir, nem ao árbitro
cabe expedir uma ordem obrigando-o a intervir, nem tão pouco ao terceiro se permite
realizar uma intervenção contra a vontade das partes, para fazer valer as suas próprias
razões num processo em que não é parte.27
Nos direitos brasileiro e português, o entendimento não é diverso: somente se deve
admitir a intervenção de terceiro, havendo consenso entre todos os interessados. Mas, o
que é que se deve entender por todos os interessados? É tão somente o consenso das
partes à convenção de arbitragem ou de todas as partes na relação processual: o autor, o
réu e o árbitro?
Para CARREIRA ALVIM, a jurisdictio do árbitro confere-lhe o poder de decidir, como
qualquer juiz togado sobre o pedido de integração do contraditório pelo terceiro. Se é ou
não caso de intervenção, é algo a decidir, em face do caso concreto. Afinal, o árbitro é
nomeado e aceita resolver um litígio, numa determinada extensão, não podendo ser
constrangido a resolver um litígio objectiva e subjectivamente mais extenso.
No caso concreto da chamada em garantia, distingue as seguintes situações:
(i)
As partes aceitam que o terceiro seja chamado em garantia e o mesmo
recusa-se a intervir na arbitragem como garante da parte que o chamou, pelas
condenações que lhe poderiam ser impostas pelos árbitros.
Nesta circunstância, a arbitragem prosseguirá sem o terceiro, não sendo
possível ao árbitro obrigar-lhe a integrar o contraditório. A nosso ver, o
terceiro não poderá, pura e simplesmente, ignorar o efeito de caso julgado da
decisão arbitral.
L’obligation, pour les tiers, de respecter les clauses de non-concurrence stipulées en dehors d’eux où, à
l’inverse, la possibilité, pour un tiers, d’obtenir réparation du dommage que lui cause l’inexécution de la
convention, sont des applications classiques de cette idée.
En matière d’arbitrage cela implique surtout que les tiers peuvent se voir imposer les conséquences de la
sentence rendue en application d’une clause compromissoire ou, à l’inverse qu’ils peuvent s’en prévaloir.
Ainsi, si une sentence arbitrale a condamné un débiteur envers son créancier, la caution, débiteur
accessoire, ne pourra pas méconnaître la chose jugée par les arbitres au motif qu’elle n’a pas signé la
clause compromissoire. Et de même, en sens inverse, la caution pourrait se prétendre libérée par l’effet de
la sentence ayant considéré que la dette était éteinte. »
26
Cass. Ass. Plén. , 12 juill. 1991, Besse c/ Protois et a JPC G 1991, II, 21743, note G. Viney, E 1991, II,
218, note Larroumet ; RJDA 1991, n.º 771, p. 583, concl. Mourier et rapp. Leclercq p. 590.
27
FAZZALARI, Elio, L’arbitrato, Torino, UTET, 1997, p. 58 cit. por JÚNIOR, Humberto Theodoro,
Arbitragem e Terceiros – Litisconsórcio fora do Pacto Arbitral – Outras intervenções de terceiros, in
Reflexões sobre Arbitragem, Editora São Paulo LTR, 2002, p. 255.
6
(ii)
O terceiro aceita a competência dos árbitros e a sua participação na instância
arbitral.
A convenção de arbitragem passa a ser-lhe oponível. Não terá prima facie o
direito de indicar novo árbitro ou de alterar a composição do tribunal arbitral
já constituído e em funcionamento. Qualquer alteração neste aspecto só
poderá acontecer por força de novo compromisso. As demais partes na
arbitragem não poderiam, nestas condições, opor-se à chamada formulada
por uma das partes.
b) Assistência
Trata-se da situação jurídica processual de quem, não sendo parte na causa, intervém
nela, espontaneamente, para auxiliar qualquer das partes, desde que tenha interesse
jurídico em que a decisão do pleito seja favorável a essa parte.28 A título
exemplificativo, pode-se referir ao interesse do fiador na vitória do afiançado, que o
legitima a intervir no processo movido contra este pelo credor. É a chamada assistência
ad adiuvandum. O objecto do processo permanece inalterável.
No direito brasileiro29, distingue-se entre assistência simples (ou adesiva) e qualificada
(ou litisconsorcial). A assistência simples ocorre quando o direito do terceiro não está
sendo discutido em juízo, mas pode ser afectado pela sentença, pela relação de
dependência ou acessoriedade que ele mantém com o direito que está sendo objecto de
apreciação judicial.
A assistência qualificada ou litisconsorcial ocorre quando o direito que está sendo
discutido em juízo pertence também ao assistente. Por ser direito seu, poderia ele ter
assumido as vestes de litisconsorte, demandando nessa qualidade. Mas, como não o fez
oportunamente, ou por que não quis, ou porque não teve conhecimento da demanda,
assegura-lhe a lei a faculdade de fazê-lo posteriormente, recebendo o processo no estado
em que se encontra. Essa modalidade diz-se coadiuvandum, porque a actividade do
assistente vai além do simples auxílio a uma das partes, sendo dele também o direito em
litígio, pelo que é considerado um litisconsorte da parte principal.
Parece-me que a assistência litisconsorcial deve ser equiparada, no nosso direito, à
intervenção principal e que o CPC só consagra a assistência ad adiuvandum. Nos
termos do artigo 337.º, caput, do CPC, os assistentes têm no processo a posição de
auxiliares duma das partes principais. E, reza o artigo 340.º que a assistência não afecta
os direitos das partes principais, que podem livremente confessar, desistir ou transigir,
cessando em qualquer destes casos a intervenção do assistente.
Em virtude do fundamento contratual da arbitragem, não tem nenhum terceiro o direito
de ingressar em feito de outrem, tenha o seu direito relação de dependência com a
relação jurídica em discussão ou não, sem o consentimento das partes que assinaram a
convenção de arbitragem. Em bom rigor, o assistente nada pede, nem contra ele se
28
PRATA, Ana, Dicionário Jurídico, Almedina, 4 ed., 2006, p. 147.
ALVIM, J.E.Carreira, Intervenção de Terceiros na Arbitragem, in Reflexões sobre Arbitragem, São
Paulo Editora LTR, 2002, p. 272; LIMA, Gustavo Bayerl, Litisconsórcio e Intervenção de Terceiros, cf.
http//www.geocities.com/juristantum2000/dpc1.htm?200814
29
7
formula pedido algum. É certo, porém, que o terceiro se torna sujeito do processo,
autorizado a praticar actos processuais. Por este motivo, as partes devem acordar sobre
o seu ingresso na arbitragem.
c) Oposição
O incidente da oposição consiste na intervenção espontânea de um terceiro numa acção
pendente entre duas ou mais pessoas, para aí fazer valer um direito próprio,
incompatível com aquele que invoca o autor na acção. O opoente passa a ser autor de
uma acção em que o autor e o réu originários são réus. Diz-se então que a oposição é ad
excludendum, ampliando inequivocamente o objecto do processo.
Pelas mesmas razões anteriormente apontadas, o terceiro opoente não poderá ingressar
no contraditório sem o acordo de todas as partes envolvidas no processo arbitral.
Excluíndo ambas as partes, o opoente que for admitido na lide, vai provocar
inevitavelmente a extensão objectiva e subjectiva da convenção de arbitragem.
Haverá, certamente, necessidade de celebrar novo compromisso, intervindo o opoente
na qualidade de parte principal no processo. Sendo assim, deverá ser acautelada a
questão da “recomposição” ímpar desse tribunal.
Se não for possível ao terceiro opor-se na instância arbitral, poderá fazer valer os seus
direitos perante o Tribunal comum, por via de recurso de oposição de terceiro.
d) Litisconsórcio necessário
De origem latina, o vocábulo “litisconsórcio” decompõe-se em litis, cum, sors e obtémse o seu exacto conceito: lis, litis – processo, pleito; cum – com; sors, sortis – resultado,
sorte. O litisconsórcio exprime a reunião de várias pessoas num processo comum para a
mesma sorte, ou seja, a existência de uma pluralidade de partes principais no processo
civil (autor e réu).
Distinguem-se o litisconsórcio voluntário30 do necessário.
Designa-se por litisconsórcio necessário, a situação em que, por a lei ou o negócio
exigirem a intervenção dos vários interessados na relação material, a acção tem de ser
proposta por todos ou contra todos, sob pena de se verificar ilegitimidade. Pode-se dar o
exemplo das obrigações indivisíveis com pluralidade de devedores, que só de todos eles
podem ser exigidas (art. 535.º do CC).
Como observa ANTÓNIO PIMENTA31, a violação do litisconsórcio necessário implica
a ilegitimidade da parte que litigue desacompanhada. Não porque essa parte careça de
interesse em demandar ou contradizer, isto é, de interesse no desfecho da lide
30
Diz-se voluntário o litisconsórcio quando a pluralidade de partes resulta da vontade do ou dos
interessados. Significa isto que, embora a questão (relação jurídica) diga respeito a vários interessados, a
presença de todos na acção respectiva só se verifica porque o autor decidiu (teve vontade de) propor a
acção contra todos os interessados, ou porque vários interessados decidiram propor em simultâneo a
acção. PIMENTA, António Montalvão Machado Paulo, op.cit. p. 85.
31
PIMENTA, António Montalvão Machado Paulo, op.cit. p. 90.
8
(legitimidade directa), antes porque esse interesse não pode ser regulado judicialmente
sem a presença de todos os interessados.
De acordo com HUMBERTO JÚNIOR32, a intervenção de terceiros é sempre
voluntária, sendo contrário ao pensamento jurídico que a lei possa obrigar o estranho a
ingressar no processo. O que ocorre, muitas vezes, é a provocação de uma das partes do
processo pendente para que o terceiro venha a integrar a relação processual. Mas a
possibilidade de obrigar, por acto de ofício, o terceiro a ingressar em juízo deve hoje ser
contestada. O juiz não pode, inquisitorialmente, trazer o terceiro a juízo. O que ele faz é
determinar a uma das partes que, se quiser a decisão de mérito, cite terceiros
(litisconsortes necessários), pois de contrário o processo será trancado sem ela. A
coacção legal exerce-se sobre a parte e não sobre o terceiro. Esse continua livre de
intervir ou não. Não se lhe comina pena alguma. Suporta apenas o ónus de sujeitar-se
aos efeitos da sentença, como decorrência da citação.
Na instância arbitral, se o terceiro se recusa a ingressar no processo, por não ter
subscrito a convenção arbitral, tratando-se de uma situação de litisconsórcio necessário,
não haverá decisão sobre o mérito da causa. O tribunal arbitral deve extinguir-se sem
qualquer decisão sobre a matéria controvertida porque a parte faltosa não pode ser
citada a comparecer na instância arbitral. Cria-se um impasse. Caberá à parte
interessada promover novo processo junto do Tribunal comum.
Para o último autor citado, no litisconsórcio, não se deve, em regra, reconhecer a cada
litisconsorte o direito pessoal de nomear o seu próprio árbitro. Na relação processual em
que os litisconsortes estiverem agrupados em números diferentes de cada lado, criar-seia um tribunal desequilibrado quantitativamente. O ideal é que cada grupo
litisconsorcial designe o seu árbitro, ou os seus árbitros, de modo que cada lado do
processo figure número igual de julgadores, dispondo as partes sobre a forma de escolha
do desempatador.
4.
PARTICIPAÇÃO DE TERCEIROS NA ARBITRAGEM POR
TRANSMISSÃO DA CONVENÇÃO ARBITRAL33
a) Cessão da posição contratual
A cessão da posição contratual consiste no negócio pelo qual um dos outorgantes em
qualquer contrato bilateral ou sinalagmático transmite a terceiro, com o consentimento
do outro contraente, o complexo dos direitos e obrigações que lhe advieram desse
contrato.
Se o contrato cedido contempla uma cláusula compromissória, pode o terceiro
(cessionário) invocar esta cláusula para obrigar o cedido a colaborar na constituição de
um Tribunal arbitral visando dirimir os litígios entre ambos, ou inversamente?
A resposta é afirmativa, na medida em que o cessionário e o cedido tomaram
conhecimento do conteúdo do contrato que foi objecto de cessão.
32
JÚNIOR, Humberto Theodoro, Curso de Direito Processual Civil, Vol. I, Editora Forense, par. 16.
Vide ANCEL, Pascal, Les Effets des Conventions d’arbitrage, in Guide pratique de l’arbitrage et de la
médiation commerciale, Editions du Juris-classeur, 2004, pp. 32 et ss. ; VARELA, João de Matos
Antunes, Das Obrigações em geral, Vol. II, Almedina, 2006, pp. 285 e ss.
33
9
b) Cessão de créditos
A cessão de créditos é o contrato pelo qual o credor transmite a terceiro,
independentemente do consentimento do dever, a totalidade ou uma parte do seu
crédito.
Neste caso, não é o contrato no seu todo que é cedido a terceiro, mas tão-somente o
crédito do cedente para o cessionário.
Na jurisprudência francesa34, considera-se a cláusula compromissória como sendo
acessória do crédito cedido. Por conseguinte, conclui-se à validade da cláusula
compromissória entre o cessionário e o cedido.
c) Sub-rogação
A sub-rogação define-se como a substituição do credor, na titularidade do direito a uma
prestação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor ou que faculta a este
os meios necesários ao cumprimento.
O sub-rogado (solvens) é terceiro ou não à convenção arbitral assinada entre o credor e
o seu devedor, quando por força do favor subrogationis se encontra na titularidade do
mesmo direito de crédito que pertencia ao credor primitivo?
Há que distinguir duas situações:
(i)
Sub-rogação convencional
A sub-rogação convencional resulta de um acordo entre o terceiro que pagou e o credor
a quem o pagamento foi feito, ou entre o terceiro e o devedor.
Imaginemos que A fornece produtos diversos à B, que por sua vez, procede à sua venda
à empresa C, prevendo o contrato entre A e B uma cláusula compromissória para
solucionar eventuais litígios que venham a surgir entre ambos. Tendo sofrido perdas
financeiras por culpa de A, B quer obter a condenação de A no pagamento de uma
indemnização. Antes da constituição do Tribunal arbitral, a seguradora de B procede à
reparação do prejuízo pecuniário sofrido pelo seu segurado, B. Terá ela legitimidade
processual para impor a A a observância da cláusula compromissória, por estar subrogado convencionalmente nos direitos de B?
Recorrendo à jurisprudência francesa, a Corte de Apelação de Paris, numa sentença
datada de 13 de Novembro de 1992, decidiu que tratando-se da sub-rogação
convencional, não existe nenhuma relação contratual entre a seguradora e o fabricante
de produtos, responsável pelos prejuízos sofridos pelo fornecedor, seu segurado,
obrigado a ressarcir um terceiro comprador pelos defeitos desses produtos. Não poderá
a seguradora, prevalecer-se da cláusula compromissória existente no contrato entre o
fabricante e o fornecedor para que se institua o Tribunal arbitral35.
34
Cass. 2e civ., 20 déc. 2001, Bull. civ. II, n.º 198.
Vide Cour d’Appel de Paris (1re ch. Suppl.) 13 novembre 1992 Société Casco Nobel France c/ Sico
Inc. et Kansa, Revue de l’Arbitrage, 1993, n.º 4, pp. 692 e ss.
35
10
Parte da doutrina discorda com essa solução jurisprudencial e afirma que a subrogação
produz os mesmos efeitos que a cessão de crédito, transferindo ao sub-rogado o crédito
em causa. Se o contrato de que nasceu o crédito continha uma cláusula compromissória,
a mesma prevalecerá, em caso de litígio, entre o sub-rogado e o devedor.36
(ii)
Sub-rogação legal
A sub-rogação legal ocorre quando a investidura do solvens na posição até então
ocupada pelo credor se dá ope legis, independentemente de qualquer declaração de
vontade do credor ou do devedor nesse sentido.37
A Corte de Apelação de Paris, na já referida sentença de 13 de Novembro de 199238
decidiu que: « …par l’effet translatif de cette subrogation (légale), la clause
compromissoire est transmise à l’assureur avec la créance et les droits de l’assuré dont
elle constitue une modalité».
A mesma solução foi anteriormente afirmada numa decisão do Tribunal de Orléans, de
16 de Junho de 198339: «l’assureur de responsabilité du fournisseur de tuyaux
défectueux, subrogé dans les droits de son assuré pour avoir indemnisé l’acquéreur,
doit, lorsqu’il exerce un recours contre le fabricant des tuyaux, respecter la clause
compromissoire figurant dans le contrat intervenu entre le fabricant et l’assuré».
Em conclusão, a seguradora de responsabilidade sub-rogada, por força da lei, nos
direitos do seu segurado não é, seguindo a jurisprudência francesa, um terceiro em
relação à convenção de arbitragem assinada por aquele (segurado). Daí, resulta que ela
pode obrigar o co-contratante do seu segurado, uma vez ressarcido, à constituição do
Tribunal arbitral.
36
ANCEL, Pascal, Les Effets des Conventions d’arbitrage, in Guide pratique de l’arbitrage et de la
médiation commerciale, Editions du Juris-classeur, 2004, p. 35.
37
VARELA, João de Matos Antunes, Das Obrigações em geral, Vol. II, Almedina, 2006, pp. 238 – 239
“Nalgumas legislações estrangeiras a sub-rogação e o direito de regresso são tratados, não como
realidades jurídicas distintas ou opostas, mas como figuras compatíveis entre si, em vários casos
sobrepostas uma à outra.
Diz-se, com efeito, no artigo 1251.º do Código civil francês, que a sub-rogação opera, de pleno direito, a
favor...daquele que, sendo obrigado com outros ou no lugar de outros ao pagamento da dívida, tinha
interesse em cumprir (n.º 3). Doutrina paralela se encontra consagrada no n.º 3 do artigo 1203.º do Código
civil italiano de 1942, que, alias, a importou da legislação anterior...A sub-rogação e o direito de regresso
constituem, no sistema legal português, realidades jurídicas distintas e, em determinado aspecto, mesmo
opostas. A sub-rogação, sendo uma forma de transmissão das obrigações, coloca o sub-rogado na
titularidade do mesmo direito de crédito (conquanto limitado pelos termos do cumprimento) que pertencia
ao credor primitivo. O direito de regresso é um direito nascido ex novo na titularidade daquele que
extinguiu (no todo ou em parte) a relação creditória anterior ou daquele à custa de quem a relação foi
considerada extinta”.
38
Cour d’Appel de Paris (1re ch. Suppl.) 13 novembre 1992 Société Casco Nobel France c/ Sico Inc. et
Kansa, Revue de l’Arbitrage, 1993, n.º 4, pp. 632 e ss.
39
Orléans, 16 juin 1983, JCP, 1984 II 20130 et la note. Vide GOUTAL, Jean- Louis, Subrogation et effet
relatif de la convention d’arbitrage, note sous Paris, 1re Ch. Suppl., 13 novembre 1992, Revue de
l’Arbitrage, 1993, n.º 4, pp. 632 e ss.
11
d) Contratos sucessivos
Nas situações em que diferentes contratos operam a transmissão da propriedade de uma
coisa, v.g. a mesma coisa é vendida, e revendida sucessivamente a várias pessoas. O
último adquirente, se ficar insatisfeito com a coisa tem uma acção contratual em
garantia ou responsabilidade por não conformidade da mesma, contra o seu próprio
vendedor. Em vários sistemas judiciais40, admite-se que tenha também o mesmo direito
contra a pessoa a quem o seu próprio vendedor comprou a coisa, remontando a cadeia
dos intervenientes até chegar ao fabricante da coisa defeituosa.
Nesse contexto, há que admitir, partindo da ideia segundo a qual accessorium sequitur
principale, isto é, a acção contratual tendente à reparação de danos provocados pelo
vício ou não conformidade da coisa é um acessório dessa coisa, e que é transmitida aos
proprietários sucessivos da dita coisa.
Consequentemente, a cláusula compromissória que figure no primeiro contrato de
compra e venda é aplicável nos demais contratos celebrados pelos sucessivos
intervenientes, sendo oponível, quer ao primeiro vendedor, quer ao último comprador.
5.
CONCLUSÕES
(i)
(ii)
A arbitragem tem a sua origem na convenção arbitral.
Essa realidade jurídica implica que a intervenção de terceiros na instância
arbitral requer o acordo de todas as partes envolvidas na relação processual.
(iii) O terceiro não pode ser forçado pelo árbitro a integrar o contraditório.
(iv)
Não é admissível, tendo em conta a natureza da arbitragem, impor ao árbitro
e às partes contratantes uma nova causa, com parte e objecto estranhos ao
negócio arbitral.
(v)
Nos casos de litisconsórcio necessário, a não integração do terceiro na lide,
impossibilita o juiz arbitral de se pronunciar sobre a matéria controvertida. A
parte mais interessada deverá, nestes casos, recorrer ao Tribunal comum.
(vi)
A cessão de posição contratual e a cessão de crédito legitimam a pretensão
do cessionário a recorrer à arbitragem para resolver os seus diferendos com o
cedido.
(vii) É de se admitir a legitimidade, nos casos de sub-rogação, de quem pagou
(solvens), de invocar a cláusula compromissória assinada entre o credor
primitivo e o devedor.
(viii) Os contratos sucessivos podem originar a transmissão da cláusula
compromissória a todos os negócios entre os diferentes intervenientes.
40
Em França: Cass. 1re civ., 6 févr. 2001; ver. Arb. 2001, 765, note Cohen; CCC 2001, 1135, note
Leveneur : RTD com. 2001, 413, note Loquin; JCP 2001, 10567, note C. Legros; JCP E 2001, p. 1228,
obs. D. Mainguy et J.-B. Seube. Vide também : Cour d’Appel de Paris (1re Ch. C), 23 novembre 1999, Sté
Glencore Grain Rotterdam c/ Sté Afric., Revue de l’Arbitrage, 2000 – n.º 3, pp. 501 e ss.
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