Universidade Federal de Santa Catarina Programa de Pós
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Universidade Federal de Santa Catarina Programa de Pós
Universidade Federal de Santa Catarina Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção RESENHA CRÍTICA: “UMA SENHORA TOMA CHÁ... COMO A ESTATÍSTICA REVOLUCIONOU A CIÊNCIA NO SÉCULO XX” Identificação do resenhista: Cláudia Cristina Joaquim - Mestranda do Curso de Pós-graduação em Engenharia de Produção - Área de Concentração: Sistemas Produtivos - Email: [email protected] Identificação da obra: SALSBURG, David. A UMA SENHORA TOMA CHÁ... COMO A ESTATÍSTICA REVOLUCIONA A CIÊNCIA NO SÉCULO XX. Tradução: José Maurício Gradel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009. Resenha crítica: A obra, com 288 páginas distribuídas em 29 capítulos, não segue necessariamente uma seqüência cronológica, de forma que os tópicos são dispostos de acordo com a sequência de temas. Com caráter narrativo, o autor Salsburg conta em pequenos fragmentos a história da estatística no século XX vivida por homens e mulheres responsáveis por essa grande mudança na pesquisa científica em diversas áreas de estudo, como a agricultura, a medicina e as ciências sociais. É destinada ao leitor comum, que não tem noções de estatística nem de matemática, com o intuito de fazê-lo compreender como a ciência se constrói a partir da crítica dos modelos anteriores e da interação entre diversas idéias. Sabe-se que a estatística não surgiu naturalmente, mas sim a partir do trabalho de diversos estudiosos e pensadores. As histórias de como eles criaram e desenvolveram o conhecimento estatístico no século XX são relatadas por Salsburg, com o objetivo principal de demonstrar os fundamentos matemáticos sem, no entanto, apresentar fórmulas para isso. Com o intuito de tornar o texto mais rico e próximo da realidade, o autor utiliza a história das pessoas que inventaram esses métodos e teorias, as discussões e brigas entre estatísticos e a situação política e social em que se encontravam. O livro recebeu esse título inspirado no primeiro capítulo que trata de um episódio da biografia de Ronald Aylmer Fisher. Em Cambridge, um grupo de professores universitários se reuniu numa tarde de verão no final de 1920 para tomar chá, uma tradição inglesa. Uma das senhoras afirmava que o gosto do chá ficava diferente se alguém pusesse antes o leite na xícara e depois derramasse o chá ao invés de pôr antes o chá e depois derramar o leite, e que ela era capaz de distinguir uma forma da outra através do gosto. Um dos homens presentes, Fisher propôs que fosse testada a proposição com experimentos. A princípio, a idéia comum era oferecer diferentes xícaras de chá com leite àquela senhora, cujos olhos estariam vendados, e verificar se ela era capaz de acertar a ordem da mistura. Fisher pensou mais além: Quantas xícaras seriam suficientes para asseverar que a senhora tinha razão? Quantos erros podiam ser admitidos em seus palpites? Acredita-se que tenha sido dessa história, a qual não se sabe se foi real ou não, que nasceu um clássico da metodologia científica, "The Design of Experiments" (o desenho, ou a arquitetura, dos experimentos), publicado por Fisher em 1935, onde ele mostra como exemplo o caso da senhora tomando o chá. Fisher é considerado pelo autor um gênio da estatística e provavelmente por este motivo todo o enredo gira em torno dele. Os demais capítulos ou falam de suas descobertas e experimentos ou relatam outros estudiosos da área e suas relações com Fisher. Com isso, Karl Pearson torna-se também um protagonista do livro, haja vista que não possuía uma relação amigável com Fisher. O nome original de Karl era “Carl”, mas mudou-o em homenagem a Karl Marx. O autor comenta no decorrer de vários capítulos os estudos e descobertas de Pearson. O autor menciona também como surgiu a prestigiada revista Biometrika, iniciada por Galton, Pearson e Weldon que acabou se tornando posteriomente na revista pessoal de Pearson e por que Fisher não publicava nela, apesar do reconhecimento desse periódico. Além de relatar as desavenças entre Fisher e Pearson, o autor conta a história de diversos outros estatísticos e cientistas que contribuíram para o desenvolvimento dos métodos que são hoje parte do cotidiano de qualquer cientista ou estatístico. Alguns exemplos de histórias narradas são: • William Gosset (1876-1937) que publicava seus trabalhos com o pseudônimo Student, uma vez que publicações de funcionários contrariavam a política interna da cervejaria Guiness onde trabalhava. Foi Gosset quem inventou o teste t de Student, motivado pelo cálculo dos quatro parâmetros para uma distribuição de amostra muito pequena, desconsiderada por Pearson em estudos anteriores. Além dessa descoberta incrível, Gosset tornou-se o intermediário entre Pearson e Fisher: geniais pesquisadores, mas inimigos. • Emil Gumbel (1891-1966) que publicou o trabalho sobre a distribuição “estatística dos extremos”, complementando os estudos sobre o assunto de Leonard Henry College Tippett e Fisher conhecidos como as “três assíntotas do extremo de Tippett”. • Chester Bliss (1899-1979), inventor do modelo probit desenvolvido a partir de um estudo que relaciona a dose de veneno e a probabilidade de um inseto morrer. Um parâmetro gerado pelo modelo ficou conhecido como “dose letal 50%”. • Jerzy Neyman (1894-1981), que desenvolveu a matemática que explica os testes de hipótese. Cabe ressaltar, contudo, que a base do conhecimento foi formulada por Neyman e juntamente com Pearson, conquistando por isso um desafiante: Fisher. • Andrei Kolmogorov (1903-1987), consagrado o Mozart da matemática, é considerado pelo autor um dos gênios da estatística, pois já aos cinco anos descobriu que a soma dos primeiros k números ímpares era igual ao quadrado de k, entre outros. No ramo da estatística, ele ganhou destaque na estatística se aprofundando no detalhamento da matemática e desenvolveu a teoria da probabilidade.. • Florence Nightingale (1820-1910), enfermeira e estatística autodidata, foi ela quem inventou o gráfico em formato de pizza como modelo para expor sua mensagem ao exército britânico durante a guerra de Criméia. Ela inspirou um casal amigo dela a dar o nome Florence Nightingale David à filha do casal. Florence Nightingale David trabalhou por tempos com o eminente estatístico Karl Pearson como assistente de pesquisa. • W. Edwards Deming (1900-1993), que revolucionou a indústria japonesa com métodos estatísticos de amostragem. Outros capítulos da obra descrevem o trabalho de muitos outros estudiosos importantes como Miguel de Umanumo, Wassily Hoeffding, John Tukey, Snedecor, Gertrude Cox, Kolmogorov, George Box, David Cox e Shewhart. Salsburg fecha o livro falando do avanço tecnológico e dos recursos de computação cada vez mais disponíveis e das consequências que trazem à Estatística, como por exemplo, a diminuição das inovações no ramo já que a facilidade que o computador proporciona para os cálculos contribui para uma acomodação científica. Analisando criticamente a obra, pode-se afirmar que a mesma é uma leitura complicada, recomendável para admiradores da Estatística. Além do mais, apesar de tratar-se de um apanhado geral sobre relatos da história no século XX, percebe-se um vício para Fisher e Pearson. Como já dito anteriormente, a estrutura não segue uma ordem cronológica. Não bastasse isso, várias vezes o autor está contando uma história e puxa um assunto e/ou estudioso de anos atrás ou anos à frente, e depois retorna ao assunto original... Enfim, esse “artifício” usado para explicitar a ligação entre eles frequentemente gera dificuldades de entendimento às pessoas que não conhecem o assunto profundamente, que por sinal são os leitores alvo deste livro. Ao final da obra, é apresentada uma tabela intitulada “Linha do tempo” que representa a cronologia da evolução estatística no período, trazendo o ano, o evento e a qual pessoa está o evento relacionado. Acredito que essa tabela auxiliaria muito no entendimento, mas deveria ser apresentada no início da publicação para que desde o início da leitura o leitor possa situar-se. Como a sequência da leitura é dada pelos assuntos abordados, estranha-se o fato de que os títulos dos capítulos muitas vezes sejam vagos, parecendo que foram escolhidos sem correlação com o contexto, como por exemplo: “Revolver um monte de estrume” e “O dilúvio de 100 anos”. Fora isso, em alguns trechos ocorre a repetição de fatos e acontecimentos já mencionados, tornando a leitura maçante. Acredito que a mensagem passada pelo autor nos entrelinhas é que a história é escrita por pessoas, que têm família, problemas de relacionamento, problemas político, falhas de caráter, que precisam de ajuda. A diferença entre uma pessoa comum e um gênio é a dedicação com a qual desenvolveu o seu trabalho. O reconhecimento quase sempre vem, mas nem sempre leva o nome de quem realmente criou o método. Críticas à parte, o livro é maravilhoso! Não é simplesmente mais um livro sobre a história da estatística, mas sim um retrato falado com tom de humor que apresenta como a estatística se desenvolveu, os problemas que enfrentou e a importância dessas descobertas e as contribuições que cada estudioso proporcionou. Identificação do autor: David Salsburg é um autor norte-americano, estatístico e farmacêutico industrial que atualmente trabalha como consultor em diversas indústrias. Por muito tempo trabalhou como matemático numa indústria farmacêutica. Ensinou em diversas instituições, como a Universidade da Pensilvânia, Universidade de Connecticut e no Trinity College, em Cambridge. Atualmente é membro da American Statistics Association. Além da obra “Uma senhora toma chá...”, Salsburg também é autor de “The Story of Statistics” que obteve grande sucesso.