Paparazzi 5

Transcrição

Paparazzi 5
PAPARAZZI
Eny Miranda
Boletim Interno da Associação Profissional dos Repórteres
Fotográficos e Cinematográficos do Rio de Janeiro - Arfoc/
Fotojornalismo na passarela
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À frente da linha do tempo
6
Os contrastes do Rio
8
O lado mineiro do Velho Chico
11
Rio - Ano I - nº 5- Fevereiro
2003/ Foto da capa: A imagem
de Laura de Vison, famoso
travesti brasileiro, é parte da
reportagem fotográfica de Eny
Miranda sobre a utilização do
metrô carioca pelos foliões,
durante o período carnavalesco
de 1999. O ensaio da fotojornalista integrou a exposição
coletiva “Caminho da Folia”,
que foi exibida em vários locais
no Rio de Janeiro.
E
Editorial
sse ano está marcado para ser de mudanças, de realizações. É um ano
em que a esperança toma contornos de realidade; que o sonho deixou
a imaginação e tomou conta das ruas. Primeiro na eleição de Lula,
onde a esperança venceu o medo. Depois, na passagem do ano, festejado
como se fosse o primeiro de nossas vidas — de cidadão de fato e de direito,
claro. E, por fim, invadiu as ruas, lagos e rampas do Planalto Central, durante
a posse presidencial.
Mas não basta votar, aplaudir ou comemorar. É preciso colaborar, arregaçar as
mangas para, então, cobrar. A partir do dia 1 de janeiro, a sociedade civil foi
chamada a participar, e os jornalistas não podem ficar de fora desse mutirão para
mudar a cara do País.
A violência contra os jornalistas aumenta a olhos vistos. No governo FHC, a
categoria foi uma das mais atingidas. Perdemos os 25 anos para a aposentadoria
especial, os índices de reajuste foram minguando a cada ano (há 10 anos não se
tem aumento real), as redações inteligentes extinguiram funções e “gelaram” o
ambiente de trabalho, as horas extras deixaram de ser pagas, domingos e feriados
trabalhados virou folga compulsória e por aí vão, ladeira abaixo, os direitos
trabalhistas.
Ano passado, 25 jornalistas foram mortos, número superior ao de 2001. As
agressões físicas são constantes, em especial contra os profissionais de imagem,
pela natureza do próprio trabalho. E agora a artilharia está mirada para o exercício
profissional. Tanto fizeram que conseguiram que uma juíza substituta de São Paulo
emplacasse medida cautelar extinguindo a obrigatoriedade do diploma para o
exercício profissional — mais de um ano depois, ela mesmo julgou o mérito e
manteve a decisão. Agora, em segunda instância, a Fenaj poderá recorrer e mostrar
o absurdo da decisão. Antes de FHC apagar as luzes, foi aprovada a emenda que
permite a entrada do capital estrangeiro na mídia e pessoa jurídica como dona de
empresa de comunicação, tudo sem muita discussão e a toque de caixa. Nessa
avalanche, algumas empresas (JB e O Dia), resolveram terceirizar a atividade
jornalística. Um petardo e tanto lançado contra os jornalistas.
Por isso, é hora de realizar, de se organizar melhor quanto categoria. Quem
apostou na cidadania, mostrou que sonhar é possível e o fazer coletivo também.
Jornalismo é função social e jornalista, cidadão. Tem, para colocar a mão na massa
e ajudar a mudar a cara do Brasil, associações, sindicatos e federação. E tem que
estar disposto a dar sua colaboração para que a sociedade brasileira comece em
2003 a ser marcada com as tintas da solidariedade, ética, humanidade, justiça,
igualdade e respeito ao trabalhador.
A Arfoc Brasil está alinhada com essa virada. Em agosto, acontecerá o I Congresso
da entidade, em Minas Gerais. Um dos principais objetivos é a alteração do Estatuto
para que as estruturas regionais passem a ser representações da Arfoc Brasil e a
emissão da carteira de associado passe a ser feita pela Associação nacional. Dessa
forma, nos estados onde não existam Arfocs o profissional de imagem (repórteres
fotográficos e cinematográficos) pode filiar-se a Arfoc Brasil. A pedido da Apijor
(Associação Brasileira para Proteção da Propriedade Intelectual dos Jornalistas),
será elaborada, durante o evento, uma Tabela nacional sobre Direito Autoral, onde
será estabelecido um patamar que irá orientar o associado na cobrança de
Licenciamento de obra, utilização de Arquivo, danos causados pelo uso indevido
de imagem e publicação sem crédito do autor. A Tabela de Preços Mínimos para
prestação de serviços também será alterada. Terá um formato único, para ser utilizada
em todo território nacional, acabando com as distorções de preços entre os estados.
Alberto Jacob Filho
Na foto, os representantes
estaduais que participaram
da primeira reunião da Arfoc
Brasil em 2003,
na sede do Sindicato dos
Jornalistas Profissionais do
Município do Rio de Janeiro,
para debater, entre outras coisas,
a preparação do I Congresso.
Da esquerda para a direita:
Jairo de Araujo Andrade (SE),
Djalma Guedes Figueiredo (BA),
Luiz Armando Vaz (RS),
Sergio Cardoso
(RJ e presidente da Arfoc Brasil),
Claudio Luiz Silva (SC), Adalberto
Diniz (RJ- Fenaj), Daniel Andrade
Azevedo (RJ), Raimundo Afonso
Gomes (AC), Luiz França (SP)
e, agachado,
Marcos Alvarenga (MG)
Boletim Interno da Associação Profissional dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Rio de Janeiro (ARFOC RIO). Distribuição Gratuita. Filiado à Aberje. Sede própria. Redação
e Administração: Av. Treze de Maio, nº 23, salas 2.227 e 2.228, Centro - Rio de Janeiro - RJ - CEP 20031-000 - Telefax: (21)2524-9488 e Tel: (21) 2524-1070; e-mail: [email protected].
Conselho Editorial: Alberto Jacob Filho, Sérgio Cardoso, Alcyr Cavalcanti e Marcos Tristão. Edição e reportagem: Sônia Regina S. Gomes (MTB 18.880/87). Diagramação e Editoração Eletrônica:
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Segundo vice-presidente: Renato Teles. Secretário Geral: Alcyr Cavalcanti. Primeiro tesoureiro: Sérgio Cardoso. Segundo tesoureiro: Marcos Tristão. Presidente do Conselho Fiscal: Fernando Maia. Conselheiros:
Adriana Lorette e Antonio Vianna. Suplentes do Conselho Fiscal: Alaor Filho e Paulo Araújo. Suplentes da Diretoria: Antonio Brasil, Antônio Batalha, André Telles, Delfim Vieira, Sergio Costa e Salvador Scofano. Home
page: www.arfoc.org.br .
PAPARAZZI
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PAPARAZZI
7o Concurso Agfa
Notas
A Agfa-Gevaert abriu inscrições para o 7º Prêmio Internacional para Jovens Fotojornalistas. O concurso, realizado
pela empresa desde 1991, tem
atraído cada vez mais participantes, de mais de 40 países,
interessados na premiação de 15 mil
Euros. O tema é livre e pode ser
apresentado em um conjunto de até 20
fotos (em cores ou em branco e preto)
no tamanho máximo de 30x40 cm. O
material deve conter ainda o tema de
um projeto - inédito ou complementar
ao trabalho inscrito no concurso - para
ser realizado com o dinheiro da
premiação. O júri será composto por
jornalistas e fotógrafos internacionais.
A Agfa também realizará uma exposição
itinerante por diversos países, bem como
a produção de um catálogo com os
melhores projetos apresentados. A idade
limite para os profissionais participarem
é de 35 anos. As inscrições vão até 30
de abril e os trabalhos deverão ser
enviados para: Das Bildforum, Anja Kügler,
Kesser Weg 1 - 45699 Herten, Alemanha.
Oportunidade
O fotógrafo Paulo Batelli clicou mais
de 130 agências do Banco Real/ ABN
AMRO Bank durante quase dois meses de
viagens por 27 capitais brasileiras onde
o banco tem agências. “O objetivo é
mostrar a presença do banco em todo o
país”, afirma Mirian Favareto, diretoraadjunta da divisão de e-Business da
instituição financeira. Também foram
incluídas agências como a de Fernando
de Noronha, onde o banco é a única do
gênero presente e a de Minas Gerais,
devido à beleza e a conservação do
patrimônio histórico. O trabalho pode
ser vista no site www.bancoreal.com.br,
que dá acesso à galeria virtual, que reune
todas as fotografias.
T
Salvador Scofano
udo que você queria
saber sobre imagem
digital. Esta foi a tônica da
palestra da FUji do Brasil na
sede do Sindicato dos
Jornalistas Profissionais do
Municpío do Rio. A
iniciativa da Arfoc faz parte
da série de parcerias que a
Associação vem implementando para contribuir
com a atualização profissional dos jornalistas de imagem. A palestra esteve a cargo de Willian Loiola,
especialista em imagem e equipamentos digitais da Fuji. O evento é um
desdobramento da parceria que a Arfoc tem com a Fuji, inicialmente para
revenda de filmes. Qualquer tipo de filme é vendido a preço de custo para o
associado. Caso não tenha, é só encomendar na sede da Associação.
ATENÇÃO!
A validade da carteira 2002
da Arfoc-Rio termina
em fevereiro.
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PAPARAZZI
A magia
dos Agudás
Milton Guran
ordem profissional. Por isso mesmo
ma reportagem fotográfica
eram, e são ainda, considerados
vai desfilar este ano na
estrangeiros entre seus pares, daí
Marquês de Sapucaí e no
o termo agudás, assim designados
grupo especial das Escolas de
em iorubá, fom ou mina, os
Samba. “Agudás, os “brasileiros”
beninenses que têm sobrenome de
do Benin”, livro com texto e fotos
oprigem portuguesa como os DE
de Milton Guran é a base do samba
Souza, Dos Santos, Domingo,
enredo que a Unidos da Tijuca vai
Sacramento, entre outros que
desfilar no Sambódromo no
representam cerca de 5% da
Carnaval 2003. Sob o título
população do país. Nessa
“Agudás, os que levaram a África
comunidade, misturaram-se além
no coração, e trouxeram para o
dos ex-escravos antigos negreiros
coração da África, o Brasil”, o
e comerciantes baianos, alguns já
carnavalesco Milton Cunha conta
estabelecidos no Daomé, durante
à sua maneira a história dos exo comércio de escravos.
escravos que saíram do Brasil para
Guran já foi perfil do Paparazzi
retornar à África, nem sempre para
(nº64) quando lançava, em 2001,
os mesmo lugares de onde teriam
Agudás (276 páginas), pelas
saído, e que acabaram se
editoras Nova Fronteira e
concentrando no Benin, antigo
Universidade Gama Filho. Desde
Daomé.
que retornou de Londres, em 1972,
Quando foi a primeira vez ao
onde foi parar por conta da
Benin, em 1994, Milton Roberto
militância, Guran não parou de
Monteiro Ribeiro — Guran, desde
agitar. Trabalhou em jornais e
que começou a fotografar, em 1973
revistas como revisor e repórter
—, tinha como objetivo estudar a
fotográfico, deu aulas sobre
fotografia como instrumento de
fotojornalismo, montou a Agência
pesquisa nas ciências sociais. O
Ágil de fotojornalismo, encerrada
estudo faria parte de sua tese para
por um incêndio criminoso, foi
o doutorado em Antropologia
diretor da Associação Nacional de
Social e Etnologia, na Ecole des
Apoio ao Índio, tema que marca
Hautes Etudes em Sciences
suas mais famosas exposições
Sociales, na França, por conta de
fotográficas, foi sócio da Livraria
Bolsa de Estudos da Capes. A tese
Dazibao, escreveu outros três
virou exposição, que virou livro,
livros, dois sobre fotografia e um
que virou enredo e que breve
sobre a reconstrução da UNE, foi
poderá ser vista nas telas de
diretor da Federação Nacional dos
cinema. Mestre também em
Jornalistas, da União de Fotógrafos
Comunicação Social, Milton Guran
de Brasília e da extinta Executiva
hoje é professor do Instituto de
Menina agudá dança o samba em Cotonu, capital econômica do Benim (1995)
Nacional dos Repórteres
Humanidades da Universidade
Candido Mendes, no Rio de Janeiro, e pesquisador do políticas ou vendidos pelas famílias, os “brasileiros” Fotográficos, liderando, entre outros, o movimento pela
Centro de Estudos Afro-Asiáticos, além, é claro, retornaram a seu continente de origem com novos valorização do repórter fotográfico, e está sempre
consultor do carnavalesco da Unidos da Tijuca desde nomes, costumes e cultura pelo extenso contato com participando de palestras, debates e seminários sobre
abril do ano passado, quando começaram a desenvolver os brancos e a cultura européia. Excluídos de sua fotografia.
a narrativa sobre os Agudás ao ritmo dos tamborins e sociedade original para serem escravos em uma terra
Seu mais novo projeto é o FotoRio 2003, Encontro
dos pés dos passistas, da cadência das baianas e dos distante, no Benin formaram uma comunidade “ Internacional de Fotografia do Rio de Janeiro, para
carros alegóricos e da explosão de luzes e cores da brasileira”, que falava português, se vestia à moda marcar a cidade como referência em fotografia no
ocidental, comia com talheres à mesa, que praticava o continente. Quando D. Pedro II se interessou por
Avenida dos Desfiles.
Feitos cativos em guerra, vítimas de perseguições cristianismo entre outras particularidades, inclusive de fotografia, em 1840, tornou o Rio a “capital” da
U
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PAPARAZZI
Estefan Radovicz
Milton Guran
Destaque do desfile de carnaval, na véspera da comemoração
do Senhor do Bonfim. Atrás do destaque, Yoyô e Yayá,
bonecos conhecidos em Recife como o Homem da Meia Noite
e a Mulher do Meio Dia (Porto Novo, 1995)
fotografia na América Latina, atraindo para cá inúmeros
fotógrafos europeus que nos legaram seus arquivos
iconográficos. Esse evento pretende resgatar o papel
de vanguarda da cidade e mostrar a importância da
fotografia na comunicação e na vida social
contemporânea.
O FototRio 2003 está integrado ao Festival da Luz,
rede mundial criada por fotógrafos, colecionadores e
estudiosos de fotografia que reúne 21 eventos pelos
vários continentes. Farão parte do evento, coleções,
conferências, leituras de portfólio, varal livre, encontro
com o autor, fotografia sem câmara, exposições
internacionais, nacionais (coletivas e individuais,
inclusive por adesão — os trabalhos serão selecionados
pelos organizadores. Marcado para acontecer de 10 a
29 de junho, o FotoRio já conta com apoio dos
consulados da França (com exposições já selecionadas),
Itália e Argentina. Tal qual os meses que antecedem o
carnaval, esquenta os tamborins para receber os
patrocinadores. O Rio merece!
Milton Guran, o autor de Agudás
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PAPARAZZI
Eny Miranda
A imagem integra o livro Retratos do Tempo, sobre idosos
Eny Miranda
A alegria do circo contagiou a autora
Perfil
Eny Miranda
Eny Miranda
Fernando Miceli
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PAPARAZZI
O flagrante no metrô carioca é parte do ensaio fotográfico Caminho da Folia
D
e mineira, ela só tem a origem. De resto,
é carioca: agitada, falante e antenada, do
jeito da tribo à beira-mar. Durante um
desfile da Estação Primeira de Mangueira, para
não ser expulsa do meio da avenida, tirou o colete,
enrolou a câmera nele, em estilo pivete, e
misturou-se à Comissão de frente, que simulava
uma briga entre ricos e pobres. Foi gingando até
o final, só para fotografar a escola de frente,
bem de perto. Eny Maria Jorge de Miranda, filha
do jornalista Onofre Miranda e nascida em Belo
Horizonte, sempre quis morar no Rio. E foi nas
asas da fotografia que ela aportou na cidade,
aos 24 anos. Passados 15 anos, muitas realizações pessoais e histórias profissionais, entre
elas ser a responsável pela fotografia de três
campanhas políticas, Eny vai homenagear a cidade
com um projeto especial: O Rio de 2003 visto
pelas lentes de uma Speeddgraph, máquina alemã
que era a mais poderosa no início do século.
“Consegui achar uma em boas condições, e fazer
esse ensaio será resgatar as histórias que ouvia
sobre a profissão”.
Aliás, foi por conta disso que Eny resolveu
ser fotojornalista. Criada no meio jornalístico
(Diários Associados, Revista O Cruzeiro e o Estado
de Minas), adorava ouvir as histórias da profissão,
em especial a dos “tios” da fotografia. Mas tanto
o pai quanto os amigos jogavam água fria na sua
animação. Unânimes, diziam que fotografia de
jornal não era lugar para mulher. A desculpa para
barrar sua insistência em estagiar “oficialmente”
era a falta de equipamento próprio.
Ainda cursando o científico, Eny arrumou um
emprego numa loja de auto-peças. Por coincidência, o dono da loja era apaixonado por
fotografia e acabou financiando sua primeira
câmera: uma FM2 novinha em folha. Seis meses
depois, já quites com o ex-patrão, bateu de novo
na porta do Estado de Minas, com sua câmera a
tiracolo. Aí não teve jeito. Começou no jornal de
7h às 12. Como não entendia nada de fotografia,
foi fazer um curso na Universidade Federal de Minas
Gerais e aproveitava para ficar xeretando sobre
fotografia na biblioteca. Decidida a decolar, fez
fotos de divulgação para uma boate — ficava no
local até as 2h para ver o vaivém. Logo depois,
começou também na imprensa oficial, à tarde, e,
à noite passou a estudar Comunicação na PUC.
Dois anos depois, quando foi contratada como
fotojornalista do Estado de Minas, largou a
universidade para se dedicar à fotografia.
É através da fotografia que Eny Miranda supera
limites. Soube disso desde o começo da carreira.
Eny Miranda
Eny Miranda
As aves "musicais"
são do ensaio digital
sobre o sertão.
Ao lado, o então
candidato a prefeito
Luiz Paulo Conde em
campanha na Feira de
São Cristóvão.
Por causa da foto
abaixo, o senhor que
estava no local há
horas foi atendido
durante a greve do
Hospital da Posse, em
Nova Iguaçu (1991)
Eny Miranda
Com medo de altura, em sua primeira saída foi
pautada para fotografar o relógio solar de Belo
Horizonte. Procurando novos ângulos, quando deu
por si estava fotografando o relógio de cima, sem
sentir vertigem. “A máquina é meu ponto de
equilíbrio. Mas físico”, explica. “Me enrolo toda
para correr, mas quando estou trabalhando com a
máquina na cara, não tropeço nem caio”, conta.
No pouco tempo que ficou no Estado, Eny
cobriu pautas especiais, como os 60 anos do jornal,
a posse de Collor (“Nunca vou me esquecer do
olhar de loucura dele”) e uma grande reportagem
na Amazônia, durante dois meses, onde teve
muita febre por conta da reação à vacina e
participou até de resgate de animais. Mas queria
mesmo era fazer polícia. E a vontade de vir para
o Rio, a cada dia ficava mais forte. Até que veio
com o portfólio debaixo do braço e conseguiu uma
vaga no Jornal de Bairros do O Globo, e
eventualmente fazia saídas para o caderno principal
ou suas fotos emplacavam nas páginas do Globão.
Três desejos estavam realizados nesses dois anos:
estava no Rio, começava a “ser” carioca e fazia
polícia. No entanto, não tinha carteira assinada.
Assim como ela, muitos outros jornalistas
estavam insatisfeitos com a situação e iniciaram
um movimento para serem contratados, e aí
foram dispensados. Ela foi para a Revista Caras,
como frila. Mas bateu um desespero, uma
saudade da pauleira diária do jornal e aí foi para
O Dia, contratada.
Decidida a comprar um apartamento, começou
a perceber as diferenças financeiras do mercado.
Apesar de adorar trabalhar em jornal e sentir falta
dessa adrenalina, queria ganhar dinheiro. Muito
ligada à velha guarda, até pelos “professores” de
Minas, percebeu que o futuro do jornalista diário
é ter uma aposentadoria sem dignidade, pela
questão financeira. Saiu do Dia e voltou a trabalhar
só como frila. Fazia trabalhos para o Estadão e
pegou a Bolsa de Valores, o que lhe abriu as
portas profissionais; “foi minha vitrine”, lembra.
Quando dava saudades, cobria férias em jornal.
Em uma pauta pela Bolsa, pediu um frila à
assessoria de Marcelo Alencar, então candidato
ao governo do Estado. E aí começava sua trajetória
em campanhas políticas. Do trabalho, passou a
fotografar para a campanha e com a vitória do
candidato foi alçada a chefe da Fotografia do
Palácio das Laranjeiras
Pioneira no cargo, ela diz com orgulho que
apesar de ter levado algumas pessoas, não precisou
demitir ninguém, os mais antigos, sua grande
preocupação. Inaugurou o uso da cor na imprensa
oficial. Essa história só não acabou bem. Magoada,
Eny conta que quando saiu, no término do governo,
plantaram uma notinha difamatória em uma coluna
de jornal sobre ela. “Descobri que bons profissionais podem ser mau caráter”. Voltou, renovada, para o Dia, e aí fez, segundo ela, uma
loucura: comprou uma DCS 5209, uma das primeiras
digitais (Canon-Kodak), que só jornal usava, e um
laptop, para poder transmitir as fotos, e, de uma
maneira diferente, continuar a fazer frilas. Fez
curso para se preparar para a era digital e daí
conseguiu fazer a campanha de Sérgio Cabral para
a prefeitura do Rio.
Voltou para O Dia e conseguiu uma licença
para fazer a campanha de reeleição de Conde,
para prefeito da cidade. Montou um esquema de
cobertura digital. “Só usava filme por causa dos
jornais pequenos, mas durante os finais de
semana muito jornal grande não mandava ninguém
cobrir o candidato por conta de nossa cobertura,
da agilidade que a digital dá. A principal vantagem
é que na mesma hora o fotojornalista fica sabendo
se tem a foto ou não, acabando com a angústia
dos minutos que antecedem a revelação do filme.
“Minha gastrite quase que acabou”, declara Eny,
creditando a melhora a performance da digital e
informando que não usa filme há quase dois anos
profissionalmente, embora seus trabalhos pessoais
sejam feitos em P/B por sua Leica de estimação.
“Nunca gostei do C-41 (cromo). Agora com a digital,
até gosto de cor.”
Na volta para o jornal ainda fez boas pautas
— a mágica do jornalismo diário, “que te leva a
lugares onde você normalmente não estaria” . Na
cobertura dos 500 anos do Brasil encontrou uma
índia Pataxó (Bahia) com um filho louro. A índia
envolveu-se com um branco e foi aceita de volta
na tribo quando o marido morreu de Aids — Eny
soube que a índia também morreu e que a criança
não é soropositiva. Mas, logo depois saiu. “Jornal
está um moedor: folga de 15 em 15 dias, 8 pautas
em média por dia, com celular apitando direto no
ouvido, começou a afetar minha saúde. Quando
estava de folga, só queria ficar deitada,
descansando, e minha coluna começou a doer
muito.”
Já de apartamento comprado, resolveu investir
alto. Abriu uma agência, a Cia. da Foto, com a
parceira de campanha Luciana Tancredo. O forte
do trabalho é imagem digital, foto de divulgação,
e o principal cliente nacional é o site do Globo.com.
O contrato, diz Eny, é moderno e conciso, com
cláusulas de Direito Autoral (reprodução, arquivo
etc) e só não entra na Agência Globo. Com clientes
também no exterior, e um trabalho diversificado,
Eny comprou a Canon 1DS (cerca de U$ 9 mil), que
tem uma qualidade, segundo ela, igual a de filme.
“Estou recomeçando, trabalhando para pagar
contas. Apesar do equipamento estar barateando,
o veloz avanço tecnológico faz com que logo o top
de linha seja ultrapassado. Sei que não vou ter o
retorno financeiro mas hoje o mercado de frila
pede digital.” Sobre isso, Eny diz que está uma
vergonha; que há uma invasão de “fotógrafos”,
sem compostura ou respeito profissional. “Botam
a máquina na cara da gente e ainda cobram muito
abaixo da Tabela”.
Para treinar, Eny foi ver o sertão com os olhos
da digital. Nesse campo, tem dois projetos
fotográficos. Em julho estará de volta para continuar
fotografando a vida em torno do Rio São Francisco,
desde Juazeiro até desaguar no mar, com atenção
nas Festas Religiosas, uma forte tradição em Minas
Gerais. “Fui criada no São Francisco”, ela conta.
“Tenho paixão pelo rio, igual a meu pai”, diz. A lei
que proíbe a pesca no rio durante a piracema,
quando os peixes sobem para desovar, foi criada
pelo pai de Eny, durante seu trabalho junto ao
governo de Minas como superintendente de pesca.
Mas o projeto que mais lhe emocionou foi sobre
o asilo Cristo Redentor, um escândalo sobre os
maus tratos aos velhinhos na época em que
trabalhava na assessoria de Marcelo Alencar. “Fiquei
desesperada com as cenas. O local tinha o cheiro
da morte”. Para dar uma virada nisso, fez um
trabalho com os internos. Montou uma tendaestúdio no local e ia fotografando os idosos fazendo
o que eles mais gostavam. Fez uma exposição para
que eles pudessem se ver, em uma igreja, e que
acabou no Bom Dia Rio, pelas mãos de Tim Lopes,
repórter da TV Globo assassinado pelo tráfico ano
passado. Através dessa reportagem, um velhinho
foi encontrado pela família e recebeu um patrocínio
para editar o livro — o doador quis permanecer
anônimo — “Retratos do Tempo”, com texto de
Pedro Vasquez. “Esse é o meu maior orgulho!”
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PAPARAZZI
Severino Silva
Severino Silva
Os contrastes do Rio de Janeiro que impressionaram os dinamarqueses: o luxo e a pobreza da cidade maravilhosa, que também é violenta
A arquitetura colorida
da miséria
A
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PAPARAZZI
face cruel da Cidade Maravilhosa, nas
cenas de violência, e o contraste entre a
explosão de cores e a arte de viver
perigosamente nas vielas e encostas das
favelas cariocas aterrisaram na Dinamarca para
representar a fotografia brasileira em um dos maiores
eventos culturais da Europa, o Festival de Verão de
Aarhus, uma cidadezinha ensolarada quase ao lado
da capital, Oslo. As 40 imagens cor , todas em 50 X
60cm, que fizeram parte da exposição foram tiradas
pelo fotojornalista Severino Silva e pelo fotógrafo
Pedro Lobo, sendo que cada um expôs 20 trabalhos.
Severo, como é mais conhecido, mostrou o lado
violento do dia a dia da cidade, da favela. Pedro
apresentou parte de um grande trabalho, o Projeto
Favela, que enfoca a arquitetura mirabolante das
favelas cariocas.
O trabalho dos dois profissionais de imagem
atraiu a atenção do público. Severo conta que,
segundo os organizadores, foram 5 mil visitantes
durante os 12 dias de exposição. “Ficávamos de 9
horas até as 20 horas no pavilhão. O público é muito
interessado e pediam explicações de tudo. O
intérprete quase ficou rouco”, brinca o fotojornalista. A opinião geral é a de que a criatividade
da fotografia brasileira, considerada muito boa,
supera as dificuldades enfrentadas pelos
profissionais (moeda instável, equipamentos caros,
jornada dura de trabalho etc), diz Severo. O festival,
que é anual, mostra um pouco de vários países
através de várias linguagens culturais, dança,
pintura, arte, música — o Brasil esteve representado
por MV Bill, D. Ivone Lara, Jamelão e Martinho da
Vila, e pelos estados do Rio de Janeiro e São Paulo.
Convidados do Festival, com todas as despesas
pagas, a exposição fotográfica de Severo e Pedro
ficou instalada na galeria da parte erudita do
Festival, que abrigava também a parte popular. O
trabalho dos dois foi tão apreciado que ambos
receberam filmes para fotografar a cidade, e talvez,
ano que vem, realizem outra exposição: “ O olhar
brasileiro sobre Aarhus”. “Essa mania de andar com
a máquina fotográfica pendurada, fotografando
cenas do cotidiano, foi o que chamou a atenção
dos organizadores”, conta Severo, que está de volta
à fotografia de O Dia há seis anos. “Quando expliquei
que estava com pouco filme, no dia seguinte recebi
30 rolos, para dividir com o Pedro”.
Essa parceria bem-sucedida é resultado do olho
clínico de Klaus Veter, falecido diretor do Instituto
Goethe, uma ONG que trata de Direitos Humanos.
“Ele percebeu, ao conhecer em ocasiões diferentes,
nosso trabalho que um é o contraponto do outro”,
explica Pedro Lobo, 48 anos e fotografando desde
os 16. Klaus viu as fotografias de Pedro durante
exposição no Paço Imperial sobre várias
manifestações artísticas — a de Pedro, imagens
sobre as construções nas favelas. E a partir daí
manteve contato com ele.
Pedro Lobo é um apaixonado pela arquitetura
Pedro Lobo
Michael Wesely
Pedro Lobo
A engenharia
plástica das
favelas cariocas
explode em cores
na Copa do
Mundo
Severino Silva, à esq., e Pedro Lobo
popular. Antes de se formar em Belas Artes, fez um ano
de Arquitetura. Mas não mudou a essência, só a
deslocou: trabalhou como fotógrafo durante anos para
o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(Iphan). Já participou de vários projetos no Centro
Cultural Banco do Brasil (CCBB), recebeu prêmios
(Funarte) e foi para o exterior desenvolver projetos, ao
ser selecionado para bolsas, como a Fullbright, em 1985.
Severino Silva foi descoberto por Klaus através
de uma foto de sua autoria que é capa de um CD da
Banda Afro Reggae. E le foi até o Imagem e
Movimento, evento de projeções fotográficas na
Casa das Ruínas, em Santa Tereza, do qual Severo é
um dos organizadores e, é claro, expositores. Isso
foi em 2000, e a princípio, Severo não acreditou
“que fossem vingar as conversas”. Mas para sua
surpresa, mesmo depois da morte de Klaus, o contato
permaneceu — através de Pedro Lobo — e Dieter
Jaenicke, diretor do Festival, assumiu os
entendimentos. Para Severo foi uma emoção só: foi
a primeira vez que viajou e expôs seu trabalho no
exterior. Ele conta que nem a barreira da língua e
dos costumes o impediu de saborear a oportunidade,
e de exercer seu lado repórter. “É uma realidade
totalmente diferente. A cidade é muito limpa, a
bicicleta é o principal meio de transporte, para não
causar poluição ambiental, e às 22 horas ainda há
claridade, no Verão”.
Considerado um mestre na arte de retratar a
violência, pela plasticidade de suas fotografias,
Severino Silva aos 43 anos e 17 de fotojornalismo já
coleciona alguns prêmios, entre eles o Nikon (91/
92), o 6º Salão de Fotografia e o Líbero Badaró, e
muitos, mas muitos amigos, aos quais ele faz questão
de agradecer pela força nesta viagem!
Severino Silva
Cenas de
Aarhus pelas
lentes do
fotojornalista
Severino
Silva,
durante suas
andanças
pela cidade
dinamarquesa
Severino Silva
Severino Silva
9
PAPARAZZI
“Contradição”!
Autor desconhecido
Shirley Penaforte
“C
ontradição”! Esse foi a
grito da fotojornalista
Shirley Penaforte, de
Belém do Pará, contra os maus-tratos
e a situação miserável que enfrentavam os internos do Espaço
Recomeço (Erec), para menores
infratores, durante uma rebelião para
denunciar os espancamentos e a
superlotação do local, que funciona
em regime de semi-internato,
permitindo que os menores saiam
para estudar. Shirley conta que os
jornalistas que estavam cobrindo a
rebelião é que serviram de mediadores
entre os menores e a PM, já que não
havia nenhum oficial. Os jornalistas
passaram do portão e andaram junto
com os menores que se dirigiam à
outra galeria cerca de 10 metros,
quando a PM invadiu atirando para
cima. “Era muito tiro e correria, mas ninguém foi ferido, morto ou feito refém”. E
também tive muita sorte do menor ter caído bem embaixo da frase que sintetiza o
problema do menor infrator”. A foto ganhou o Prêmio Esso Regional Norte 2002. É a
nona fotografia a ganhar um prêmio regional desde 1971 — a última foi em 1993
Shirley Penaforte
—, e a terceira a ser premiada da
Região Norte.
Shirley é fotojornalista há quase
oito anos. Começou na Voz de Nazaré,
um jornal católico de Belém. Depois,
foi para a revista Ver o Pará, de cunho
turístico. Fez muitos frilas e foi parar
no Amazônia Jornal, um diário
popular (R$ 1,00) — filhote do
Liberal —, e que circula com 15 mil
exemplares só na capital, Belém.
Shirley já teve foto estampada em
capa de livro, venceu um concurso fotográfico realizado na Croácia, sobre
fotojornalismo, e vem participando de vários Salões de Arte e exposições fotográficas
coletivas na região, entre elas sobre a Amazônia, mostra que percorreu a Região
Norte e foi até a Alemanha.
Propaganda enganosa
10
PAPARAZZI
Como diz nosso bravo presidente
Lula, tem maracutaia no ar... Sob o
pretexto de comemorar um tema,
prestar tributo a essa ou aquela
personalidade ou simplesmente
eleger uma data como dia marcante,
exposições, livros, coleções,
projeções e murais se multiplicam
pelas cidades, tendo a imagem como
centro das atenções. Não há Centro
Cultural ou Museu que não tenha em
suas salas pelo menos uma mostra
que envolva imagem. Sob a bandeira
do “revival”, e do “ tema-que-atraipúblico”, pela saudade, pela
admiração ou pela simples curiosidade que a imagem provoca, até
mesmo bares, restaurantes ganham
dinheiro através das imagens exibidas.
Os grandes eventos realizados em
centros de arte são patrocinados
por empresas ou entidades que não
economizam para tornar a realização
um acontecimento importante. No
caso dos Centros Culturais e Museus,
normalmente o projeto é apresentado para seleção por um produtor cultural ou curador, que
apresenta a planilha de custos—
muito poucas vezes é feito pelo próprio
autor das imagens. Não raro, uma
empresa multinacional participa como
promotora ou apoio.
Nas exposições, em sua maioria, é
designado um curador da obra, que tem
a remuneração garantida nas cotas de
patrocínio. Nas publicações, há o
produtor cultural, que igualmente tem
sua parcela embutida na quantia a ser
desembolsada pelos patrocinadores. E
até nas mostras em bares ou restaurantes, o “mediador” recebe alguma
coisa: ou em cortesia ou em pró-labore,
por atrair mais clientela, e, consequentemente aumentar as vendas.
Até aí, nada demais. Essa é a regra
do mercado: quem trabalha recebe por
isso. Mas é aí que reside a contradição
— e até mesmo um golpe baixo no ser
humano: o autor da imagem, que é
exibida e aplaudida; que atrai público
e admiradores; que é capaz de trazer
patrocínio e espaço na mídia não
recebe nada. Inebriados pelas luzes dos
flashes dos lançamentos e das inaugurações, das dezenas de cumprimentos
e dos abraços, nem sempre tão sinceros,
esquecem de valorizar o próprio esforço,
o trabalho realizado que resultou naquele
momento. Autores “hipnotizados” ou
coordenadores simplesmente alheios ao
respeito à obra, e ao profissional, exibem
ou publicam imagens sob o pseudônimo
Arquivo ou Divulgação.
Nas revistas especializadas, por
exemplo, o Direito Autoral é respeitado.
Em contrapartida, as imagens, os
ensaios fotográficos são publicados sem
remuneração, apesar das publicações
serem vendidas, e bem, em lojas ou
bancas de jornais e veicularem
anúncios, muito bem pagos. É o preço
da vitrine de papel!
Nesse cenário de lucro, o profissional
de imagem que cede sua obra é o único
que sai no prejuízo. Se a vaidade fica
em alta, o bolso fica em baixa. A parte
que lhe cabe, é um Muito Obrigado!
Parabéns!
Sensibilizados pelo convite (Enfim,
lembraram do meu trabalho!) e
embalados pela notoriedade que
supostamente um evento pode proporcionar, ignoram a regra número um
do mercado: todo trabalho tem que ser
remunerado.
Ignorar essa premissa é andar na
contramão da história da profissão no
Brasil. O reconhecimento e a valorização
foram conquistados com muita luta.
Assim como a obrigatoriedade do
crédito, o respeito ao Direito Autoral, que aponta a imagem como
obra de criação, portanto propriedade de um autor, e que, por isso,
deve receber por ela — mesmo já
falecido, o direito passa a seus
herdeiros.
E nesse tempo de realizar
mudanças, de guinar a sociedade
para o reconhecimento da dignidade
e respeito ao trabalhador como
práticas a serem valorizadas, fica
registrado aqui uma sugestão, quase
um convite a uma parceria: se os
modelos de projetos culturais
existentes hoje excluem da planilha
de custo o valor a ser destinado ao
autor da obra, os fomentadores de
eventos culturais podem tomar a
iniciativa e ter como prerrogativa
essa cláusula, assim como fazer
constar a proibição de expor ou
publicar imagem sem o crédito do
autor. É o tal ditado: se Maomé não
vai à montanha ...
Sérgio Cardoso
Presidente da Arfoc Brasil
“Velho Chico Mineiro”
Maurício Seidl
M
ostrar a realidade da região mineira
banhada pelo Rio São Francisco, com
suas contradições entre a beleza e a
destruição feita pelo homem, os costumes da
população ribeirinha, sua cultura, culinária,
lendas e crenças que fazem parte da história
do maior rio genuinamente nacional, já que
nasce e morre em terras brasileiras, é a intenção
do livro “Velho Chico Mineiro”, recheado de
fotos de Maurício Seidl, com texto do
historiador Ivan Alves.
O livro tem forma de narrativa, como se
fosse um diário de viagem para documentar o
acervo humano, histórico e cultural que existe
em torno do rio, assim como a fauna e a flora
nativas. A primeira etapa foi feita em Minas
Gerais e contou com o patrocínio da Belgo
Mineira e apoio da Secretaria de Estado de
Transporte e Obras Públicas de Minas Gerais.
Nem todos os 2.624 km de extensão do rio
são navegáveis. Por isso, no trecho mineiro,
os autores tiveram algumas vezes de largar a
via fluvial para continuar a documentação por
terra. O que rendeu boas imagens e relatos,
contatos mais estreitos com uma população que
tem sua sobrevivência diretamente ligada a
própria sobrevivência do São Francisco. São
personagens fascinantes: carranqueiros,
bordadeiras, barqueiros, pequenos lavradores,
que são a alma do folclore mineiro com suas
festas e tradições, como as modas de viola e a
folia de reis.
Para mostrar a diversidade da região e dar
água na boca do leitor, receitas típicas e
registros de processos artesanais de trabalho
estão entre as páginas do livro, vendido nas
livrarias a R$ 70,00.
O diário de uma viagem às cidades
barranqueiras do Rio São Francisco é fruto da
preocupação dos autores de mostrar a luta
constante dessa população por melhores
condições de existência. Por isso, em suas
páginas foram confrontados, na medida do
possível, a realidade de hoje da região com a
percebida pelos primeiros viajantes, ainda na
primeira metade do século XIX.
O passado ganhou corpo nas tintas do
historiador Ivan Alves, autor de oito livros de
História do Brasil e atualmente pesquisador
associado do projeto Rota do Escravo da
Unesco. Maurício Seidl ficou encarregado de
mostrar cara do Velho Chico. Fotógrafo
internacional há 24 anos, já participou de várias
exposições fotográficas e há 18 anos se dedica
também ao fotojornalismo.
A idéia do livro nasceu em um encontro
entre os dois amigos, quando comiam um
pão de queijo em uma lanchonete no final
de 2001. Em 2002, já estavam na estrada.
Foram 30 dias, saindo de Belo Horizonte
para Pirapora até a nascente do rio, na
Serra da Canastra, entre terra, água e ar.
Depois, veio a triagem do material, o
lançamento do livro e, no caminho, a idéia
para novas parcerias.
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PAPARAZZI
Otávio Magalhães / Ag Estado
Tá tudo liberado!
Ou quase tudo! Embora tenha liberado sua imagem este ano para os fotojornalistas, a
modelo Luma de Oliveira para ser fotografada à frente da bateria, durante os ensaios da
Unidos de Viradouro, os profissionais de imagem têm que fazer seu trabalho de pé. Na
quadra, os seguranças da bateria estão lá para garantir que profissional de imagem não
trabalha agachado diante da rainha da bateria. Nem que precise amarrar o sapato! Com
isso, Luma quer garantir que não seja fotografada mostrando mais do que quer, embora
continue a freqüentar os ensaios com roupas minúsculas, quase sempre transparente.
O excessivo zelo da modelo, levou-a a processar, civil e criminalmente, o fotojornalista
Wilton Júnior, 28 anos, da sucursal carioca do Jornal O Estado de São Paulo. Wiltinho
fotografou Luma de baixo para cima quando ela evoluía, na quadra, com um vestido
quase igual ao da foto ao lado - só mudou a cor e o modelo -, curto, justo e transparente.
A foto, publicada no dia 17 de janeiro de 2002, em vários jornais indignou Luma, que
alegou que sua calcinha cor da pele sugeria que estivesse nua em pêlo por baixo da roupa,
o que segundo ela não era verdade e "ainda a colocava em situação de execração pública,
por denegrir sua imagem de modelo", conforme constava em nota divulgada à imprensa
por seu advogado Michel Assef. O fato indignou os fotojornalistas, que levaram seu protesto,
organizado pela Arfoc-Rio, durante o desfile da modelo pela Viradouro ano passado.
Todos abaixaram os equipamentos para não fotografar a modelo no aquecimento da bateria,
espaço tradicional para a imprensa.
Mas, com o esquentar dos tamborins para 2003, a ira da modelo foi diminuindo e só
durou até a audiência de conciliação, quando retirou a ação contra o fotojornalista. É
como diz a música: ... pra tudo se acabar na quarta-feira...