Untitled - Fundação São José
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A Transformar é publicada anualmente pelo Centro de Pesquisa e Extensão (CenPE) e pelas Faculdades Integradas Padre Humberto da Fundação Educacional e Cultural São José. © Copyright: Centro de Pesquisa e Extensão (CenPE) Esta revista ou parte dela não pode ser reproduzida por qualquer meio sem autorização por escrito do Centro de Pesquisa e Extensão (CenPE) Distribuição Fundação Educacional e Cultural São José Rua Major Porphírio Henriques, 41 – Centro Itaperuna – RJ – CEP: 28.300-000 Tel: (22) 3824-8181- Fax (22) 3824-3202 CenPE @fsj.edu.br Editores Juçara Gonçalves Lima Bedim Leandro Garcia Pinho Lucia Alvim Couto Ficha catalográfica ______________________________________________________________________ TRANSFORMAR – Revista do Centro de Pesquisa e Extensão (CenPE) / Fundação Educacional e Cultural São José – Faculdades Integradas Padre Humberto. - - v. 6, jan./dez. 2009 - - - Itaperuna, RJ: Centro de Pesquisa e Extensão (CenPE), 2009, www.fsj.edu.br. ISSN 2175-8255 Ciência-Periódicos. 2. Conhecimento-Periódicos. 3. Pesquisa – Periódicos. 4. Extensão - Periódicos ______________________________________________________________________ PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO EDUCACIONAL E CULTURAL SÃO JOSÉ José Carlos Mendes Martins FACULDADES INTEGRADAS PADRE HUMBERTO DIRETORA Suely de Paula Coutinho VICE-DIRETOR Leandro Garcia Pinho SECRETÁRIO José Maria Cardozo CONSELHO EDITORIAL DA REVISTA TRANSFORMAR Profª Drª Speranza França da Mata (UFRJ) Prof. Dr. Mário Eduardo Toscano Martelotta (UFRJ) Profª. Drª Maria Moura Cezário (UFRJ) COMISSÃO EDITORIAL EXECUTIVA DA REVISTA TRANSFORMAR Juçara Gonçalves Lima Bedim Leandro Garcia Pinho Lucia Alvim Couto REVISÃO TEXTUAL DESTE NÚMERO Dulce Helena Pontes-Ribeiro Juçara Gonçalves Lima Bedim SUMÁRIO A IRONIA MACHADIANA OBSERVADA NOS CONTOS “TEORIA DO MEDALHÃO – DIÁLOGO” E “UMA SENHORA” EM FACE À CONTEMPORANEIDADE ............................................................................................. 5 RELAÇÃO ENTRE IMC E PERCENTUAL DE GORDURA COM ESTILO DE VIDA E PRÁTICA DE ATIVIDADES FÍSICAS: ................................................................... 15 ÉTICA JORNALÍSTICA: ENTRE A EVOCAÇÃO DO IDEAL E A CONCILIAÇÃO DE INTERESSE ............................................................................................................. 31 “A MURALHA”: ANÁLISE COMPARATIVA DA HISTÓRIA EM LIVRO E DA HISTÓRIA EM TELA ................................................................................................... 40 EDUCAÇÃO CORPORATIVA X EDUCAÇÃO FORMAL: ASSOCIAÇÃO OU COMPETIÇÃO? ............................................................................................................ 48 AS ESTRATÉGIAS DE LEITURA NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESPANHOLA ................................................................................................ 56 UMA ANÁLISE INTERDISCIPLINAR SOBRE O EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO/ENEM ............................................................................................... 61 O PROCESSO EPIFÂNICO EM CLARICE LISPECTOR E SUAS CORRELAÇÕES COM MEMÓRIA E LINGUAGEM: UMA ANÁLISE DOS CONTOS FELICIDADE CLANDESTINA, RESTOS DO CARNAVAL E CEM ANOS DE PERDÃO ............. 68 INTERDISCIPLINARIDADE NO PROCESSO DE ENSINO/APRENDIZAGEM .... 79 A IRONIA MACHADIANA OBSERVADA NOS CONTOS “TEORIA DO MEDALHÃO – DIÁLOGO” E “UMA SENHORA” EM FACE À CONTEMPORANEIDADE Elaine Teixeira da Silva Rubia Ramos de Faria Renato Marcelo Resgala Júnior Resumo: O presente artigo tem como objetivo apresentar uma análise sob o olhar machadiano quanto à questão do status no contexto familiar observados nos contos Teoria do medalhão – Diálogo e Uma senhora e sua perspectiva em relação às sociedades vindouras. Apresenta-se como uma pesquisa qualitativa com embasamento comparativo dos textos selecionados com a sociedade contemporânea. Realizou-se, portanto o método indutivo para tais observações. Estas implicações narradas por Machado no século XIX podem ser equiparadas à sociedade contemporânea, em seus meios de comunicação, como reality shows que englobam artistas ou mesmo pessoas anônimas em busca do poder, da aparência e nos tratamentos realizados pelas mulheres em busca da beleza e juventude. Com base nas observações, percebe-se que as sociedades se diferem apenas no quesito tempo, anos, pois as mesmas estão sempre em busca de manterem-se no ambiente social. Palavras-chave: Machado de Assis. Ironia. Sociedade. Introdução Propõe-se uma averiguação da ironia de machadiana, visando apresentar sua relevância no contexto de produção literária e suas implicações na instituição familiar observados nos contos Teoria do medalhão - Diálogo e Uma senhora analisando-os dentro do contexto de produção mediante a contemporaneidade. É deste contexto que emerge a investigação do artigo: como a instituição familiar do século XIX pode influir no indivíduo de nosso tempo? Com foco neste problema, objetiva-se efetivar o mapeamento destes perfis familiares, reconhecer determinadas características da sociedade da época em que foram escritos os contos em análise e correlacionar essas determinadas características com a sociedade atual. A pesquisa partiu da comparação dos textos selecionados com a sociedade contemporânea tendo como principal apoio bibliográfico Candido (1995), Cunha (1998) e Reis (1986). 1 O Bruxo do Cosme Velho: notas biobibliográficas Em 21 de junho de 1839, na então capital do país, a cidade do Rio de Janeiro, RJ, nasceu Joaquim Maria Machado de Assis (jornalista, contista, cronista, romancista, poeta e teatrólogo). Sem meios para cursos regulares estudou como pôde, mas isto não foi motivo para impedi-lo de iniciar sua carreira literária ainda jovem, “em 1854, com 15 anos 5 incompletos, publicou o primeiro trabalho literário, o soneto "À Ilma. Sra. D.P.J.A.", no Periódico dos Pobres, número datado de 3 de outubro de 1854” ( ABL). Em 15 de dezembro de 1896, foi fundamental para dirigir a primeira sessão preparatória da fundação da Academia Brasileira de Letras, a qual presidiu até sua morte. “[...] um jovem provido de família pobre, sem lastros de educação, nascido no arrabalde e, ainda, bisneto de escravos”! (REIS, 1986, p. 15). Casa-se com aquela que seria sua cúmplice e companheira, Carolina Augusta, no dia 12 de Novembro de 1869. Faleceu, também, no Rio de Janeiro, em 29 de setembro de 1908. Machado de Assis é um dos grandes nomes da nossa literatura e imortalizou-se nas memórias de nossos pais e avós (mesmo hoje neste mundo globalizado cheio de novas histórias em que vampiros e lobisomens sugam os olhares juvenis). O Bruxo do Cosme Velho ainda ocupa espaço com seus romances e seus contos na atualidade (condição para que sua produção seja considerada ‘imortal’), pois o autor utiliza de uma linguagem simples e objetiva, características do Realismo, período histórico-literário inaugurado por Machado no ano de 1881, quando da publicação do romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. O Realismo teve início no Brasil a partir do ano de 1881, um período em que os autores descreviam a realidade tal com o ela era (sem rodeios, as obras demonstravam o que ocorria na sociedade sem ocultar ou distorcer os fatos). As obras de Machado trazem as marcas dessa nova escola: oposta às características do Romantismo, o Realismo promove no leitor o questionamento contínuo a respeito do texto e do período em que a obra foi escrita. Observa-se, ainda que, no decorrer dos anos, a produção machadiana promove a recordação mnemônica, em que os rastros da construção literária se conectam com o período histórico-local de inserção, como afirma Reis (1986, p. 39) “Concebeste, Machado, um texto capaz de viajar no tempo, resistir aos ataques imediatistas e aos arroubos da moda de cada período e ir além, permanecer exercendo seu fascínio”. A linguagem utilizada pelo autor carioca carrega um tom de desconfiança, pela qual o leitor tem que se mostrar atento e interessado em compreender aquilo que está diante dos seus olhos, a leitura das obras de Machado não serve apenas para fruição, o leitor precisa estar atento, pois “Muitos dos seus contos e alguns dos seus romances parecem abertos, sem conclusão necessária, ou permitindo uma dupla leitura [...]” (CANDIDO, 1995, p. 26) e isto acontece em função de sua linguagem irônica que leva o leitor às linhas escritas e descritas já que A magia da leitura transborda o signo linguístico na sua denotação, resultando uma figuração, uma viagem pela metáfora e pela alegoria; por ela atinge-se o êxtase, chega-se ao choro e ao riso, à sublimação e ao exorcismo. A palavra que entra é digerida, assimilada, e depois metamorfoseada em imagens inusitadas, em criações e transfigurações. Há um trânsito livre do texto ao leitor em que este pensa e repensa a vida, vivendo-a virtualmente. Desse modo, o signo não é mais a representação do pensamento do autor, ele transcende a si mesmo e atinge potencialidades criadoras dentro de novas significações, forma-se novas imagens e pensamentos numa multidireção de sentidos (PONTES-RIBEIRO, D. H.; BEDIM, J. G. L.; BARCELLOS, M. E. N., 2004, p.18). Mesmo vivendo em épocas tão distintas as críticas machadianas à sociedade estão presentes em nossos dias, pois Machado olhava não somente para o passado, atentou para o presente “[...] inspirando-se na realidade social e psicológica que o cercava para atingir a sensibilidade das gerações futuras” (CUNHA, 1998, p.177). 6 O autor observou os males que assolariam a sociedade nos séculos vindouros, a mola precursora que nos lança ao centro das questões sociais, o poder e a aparência. Isto pode parecer-nos incomum devido às épocas, mas como afirma Candido (1995, p.20 ), “Esta circunstância parece chocante porque, nos seus contos e romances, [...], nós encontramos disfarçados por curiosos traços arcaizantes, alguns dos temas que seriam característicos da ficção do século XX”. 2 Das Obras 2.1 Teoria do medalhão - Diálogo Publicado no livro de contos Papéis Avulsos em 1882, este conto, ambientado em salas fechadas, apresenta-se através de um diálogo entre pai e filho, sem a presença de um narrador. A conversa paternal ocorre após o jantar de aniversário do filho e o pai começa a aconselhá-lo a cultivar o "ofício" de medalhão. Como doutrina, o pai ensina lições que, em seu curriculum vitae, seriam fundamentais: o ofício de medalhão, o qual requer de seu discípulo pouco esforço; que não haja a vaidade em se proferir ideias próprias; que se viva para ser popular e chamar a atenção; que tenha o nome lembrado, mas sem muitos esforços, parecendo ser culto, sábio, simpático; que seja, convenientemente, convincente, agradável a todos e necessário; que se socialize nas maiores festas e reuniões, em todos os lugares (inclui-se ir a livrarias apenas para contar piadas ou acontecimentos do dia a dia); saber sobre as ciências e filosofias, mas impedir que algumas desses pensamentos influenciem para reflexões ou mudança de atitudes. 2.2 Uma senhora O conto foi publicado no livro Histórias sem Data em 1884, narrado em 3ª, um narrador onisciente e tem o tempo cronológico representado através da protagonista D. Camila. Machado conta as dificuldades de uma jovem mulher em aceitar a passagem dos anos, mostrando as artimanhas que empreitadas, de maneira inconsciente, para se evitar que a filha Ernestina case, apontando, à revelia, apenas os, visíveis, defeitos nos pretendentes. D. Camila procurou atrasar ao máximo o amadurecimento da filha, tratando-a como criança e vestindo-a como menina até o momento em que não lhe foi mais possível. Até que, por fim, sem outro remédio, verga-se às imposições da vida, assumindo-se como avó enlevada. 3 No caldeirão do Bruxo: A representação da sociedade em Machado de Assis Pretende-se além de refletir e discutir sobre as críticas machadianas, analisar estes dois contos representados por personagens que qualificam determinada sociedade marcada pela busca de prestígio e ascensão social, alicerçando-se em aparências e no poder. Os contos analisados trazem a relação familiar, já que esta é a base para a formação do indivíduo além de ser um dos pontos representativos na obra machadiana. A família é o primeiro espelho na vida do homem, é olhando para os seus que se consegue enxergar o que o está diante de si, pois ao nascer o homem é apenas um ser vazio, a pureza é algo que ainda está presente, sem ser corrompido por influências familiares e sociais. “Machado traz à tona as coisas inconfessáveis do seu tempo e do 7 seu meio, revelando a dubiedade de um quadro constrangedoramente familiar” (CUNHA, 1998, p.147). Considera-se assim que o conto É a designação da forma narrativa de menor extensão e se diferencia do romance e da novela não só pelo tamanho, mas por características estruturais próprias. Ao invés de representar o desenvolvimento ou o corte na vida das personagens, visando a abarcar a totalidade, o conto aparece como uma amostragem, como um flagrante ou instantâneo, pelo que vemos registrado literariamente um episódio singular e representativo (SOARES, 2007, p. 54). Machado usou disto para levar aos seus leitores toda a sua crítica disfarçada em ironia em face à sociedade do século XIX, fato este que nos leva a concordar com o que diz Candido (1995, p.20) pois, “Machado de Assis, enigmático e bifronte, olhando para o passado e para o futuro, escondendo um mundo estranho e original sob a neutralidade aparente das histórias “que todos podiam ler”.” Portanto, já não nos é segredo que Machado de Assis era um homem a frente de seu tempo, escreveu sobre diversos assuntos, criando personagens com características que se fundiriam entre a razão e a loucura, o real e o imaginário, o sadismo, as questões familiares, enfim, “Machado soube imprimir em sua obra o distintivo da modernidade” (REIS, 1986, p. 38) função esta que não é para qualquer escritor, nem mesmo para os de nossa contemporaneidade. Filho de operário nascido em um lar humilde e de poucos recursos a Presidente da Academia Brasileira de Letras, Machado conheceu os dois lados pertinentes à condição de família, conheceu pobres e ricos e soube extrair destas classes todos os tipos de vivências para dar vida às suas personagens. Como disse Reis (1986, p. 37), Machado privilegiou-se “das sutilezas do ser homem, os meandros da natureza humana” para traçar os perfis ora sádico, ora romântico, mas sempre com um ar irônico que somente ele podia agregar às suas criaturas. Pois, [...] Machado de Assis inegavelmente compôs, através de seus contos, um retrato progressivo, porém indefectível, da formação da sociedade brasileira [...] [Machado de Assis] acompanha o surgimento de um tipo de comportamento que passaria a refletir todas estas contradições, basicamente dividido entre os paradoxos do ser ou não ser – procurando, acima de tudo, o flagrante do ser brasileiro, [...] (CUNHA, 1998, p. 178 apud VICENTE, 2010, p. 95). Sendo assim, percorreremos os dois contos buscando em suas personagens tais sutilezas e as convergiremos a nossas famílias do século XXI. 3.1 Teoria do medalhão – Diálogo Este conto faz parte da seleção de Papéis avulsos lançada em 1882. Enriquecido com grande ironia através do diálogo de um pai com o filho que acabara de completar seus vinte e um anos. Um pai que ensina ao filho o ofício de medalhão, 8 embora tão pouco exercesse esta função, mas era sonho seu que o filho assim se tornasse [...] medalhão foi o sonho da minha mocidade; faltaram-me, porém, as instrucções de um pai, e acabo como vês, sem outra consolação e relevo moral, além das esperanças que deposito em ti. Ouve-me bem, meu querido filho, ouve-me e entende (ASSIS, 1882, p.93). O pai tinha o sonho, mas não havia quem o instruísse a ser o tão almejado medalhão. Mutatis mutandis, agora ele se realizaria na figura do filho Janjão que mesmo jovem poderia iniciar-se no ofício o comparando a Napoleão Bonaparte, que ingressou na carreira militar ainda muito precoce, e a William Pitt sendo o primeiro ministro mais jovem da Grã-Bretanha. O pai quer que o filho se prepare para quando chegar à idade de assumir o ofício já que “[...] o verdadeiro medalhão começa a manifestar-se entre os quarenta e cinco e cincoenta annos [...]” (ASSIS, 1882, p.93) ele esteja apto para assumir a sua função de medalhão. O pai mostra ao filho que para se tornar uma pessoa conhecida e admirada pela sociedade do Rio de Janeiro no século XIX, o filho deveria perder todas as suas características e valores, acatando tudo aquilo a que a nata da sociedade o impusesse. Para ser um medalhão era preciso vestir uma máscara, não se mostrar por inteiro, não ser culto o suficiente para debater e opinar os seus palpites. O Medalhão deve manter se neutro, usar palavras sem sentido, para que as mesmas não o deixem em dificuldades, ou seja, ser uma pessoa limitada e que se sujeite a obedecer sem questionamento. Há ainda um agravamento quando o mesmo pai diz ao filho que este leva jeito para tal função, já que este “[...] pareces dotado da perfeita inópia mental, conveniente ao uso deste nobre officio” (ASSIS, 1882, p.94). Mesmo sendo dotado de perfeita inópia mental, o pai revela o filho que com o passar dos anos mesmo sem querer, surgem ideias próprias o que pode levar tudo a perder, mas é a partir do comportamento, que se distinguirá um medalhão. No entanto, podendo acontecer que, com a edade, venhas a ser affligido de algumas idéas próprias, urge apparelhar fortemente o espirito. As idéas são de sua natureza expontaneas e subitas; por mais que a sofreemos, ellas irrompem e precipitamse. Dahi a certeza com que o vulgo, cujo faro é extremamente delicado, distingue o medalhão completo do medalhão incomplet (Ibid., p.95). Para a dúvida do filho, observe-se a presença das reticências que nos indica que o filho esquivara-se por achar-se incapaz de exercer tal ofício ou incrédulo do mesmo quando ele diz ao pai “Mas quem lhe diz que eu...” (Ibid., p. 94). O pai mostra ao filho todas as características e dificuldades que o ofício de medalhão deve enfrentar para alcançar o tão de; logo o filho o indagaria se para tornar-se como o pai sonhara não seria algo que lhe requereria muito esforço; porém o pai que mostra as vantagens. Digo-lhe que o que vosmecê me ensina não é nada fácil. - Nem eu te digo outra cousa. E’diffícil, come tempo, muito tempo, leva annos, paciencia, trabalho, e felizes os que chegam a entrar na terra prometida! Os que lá não penetram, engole-os a obscuridade. Mas os que triumpham! E tu triumpharás, crê-me. Veráscahir as muralhas de Jerichó ao som das trompas sagradas. Só então poderás dizer que estás fixado. Começa nesse dia a tua phase de ornamento 9 indispensavel, de figura obrigada, de rotulo (ASSIS, 1882, p. 103). Contudo o pai mostra ao filho que este não sofrerá para se tornar um medalhão e que não será algo tão dolorido aparenta: é apenas necessário se adaptar ao novo ofício. Em suas palavras, “Tens um gênio folgazão, prazenteiro, não hás de sofreá-lo nem eliminá-lo; podes brincar e rir alguma vez. Medalhão não quer dizer melancólico” (ASSIS, p.71). Deve-se somente tomar cuidado para não se mostrar uma pessoa falsa e irônica “Sòmente não deves empregar a ironia, êsse movimento ao canto da bôca, cheio de mistérios” (ASSIS, p.71). Machado mantendo o suspense e a crítica feita em todo o conto deixa o leitor instigado em saber se o filho aceita ou não aceita a difícil missão de se tornar um medalhão “Vamos dormir, que é tarde. Rumina bem o que te disse, meu filho. Guardadas as proporções, a conversa d’esta noite...” (ASSIS, 1882, p.106) 3.1.1 Os Reality Shows Este tipo de programa vem ganhando espaço nas grades das emissoras de televisão com o intuito de aumentar o ibope conquistando a atenção dos seus telespectadores. Este tipo de programa surgiu na década de 70 nos Estados Unidos e desde então vem crescendo em todo o mundo com diversos formatos. É um gênero televisivo baseado na vida real, transformando pessoas anônimas em celebridades ou mesmo trazendo à tona as celebridades esquecidas pelo público. No Brasil, já observamos alguns destes fenômenos nas grandes emissoras em variadas formas, mas todas com o mesmo propósito, ganhar a atenção do público e elevar à fama àqueles que a almejam. O ofício de Medalhão proposto por Machado no final do século XIX é observado na atualidade – não é difícil ver os ditos Medalhões nas variadas fontes midiáticas como nos reality shows: ‘Casa dos Artistas’, programa exibido pelo canal SBT em 2001 e 2004 em que vários artistas, principalmente aqueles afastados dos meios de comunicação ou com pouco reconhecimento, se mantiveram em uma casa convivendo com as diferenças para ganhar um prêmio exorbitante; ‘Big Brother Brasil’ é apresentado pelo canal Rede Globo desde, confinando pessoas anônimas e as devolvendo a sociedade com o tão almejado dinheiro e fama; programa de mesmo modelo, ‘A Fazenda’ é outro reality transmitido pelo canal Rede Record com início em 2009 estendendo-se até 2013, ele trás o mesmo formato do reality Casa dos Artistas. Portanto, “Commissões ou deputações para felicitar um agraciado, um benemerito, um forasteiro, têm singulares merecimentos, e assim as irmandades e associações diversas, sejam mythológicas, cynegéticas ou coreographicas. Os sucessos de certa ordem, embora de pouca monta, podem ser trazidos ao lume, comtanto que ponham em relevo a tua pessoa (ASSIS, 1882, p. 101). Todos estes têm em comum o fato de se sujeitarem a serem vigiados, avaliados e julgados pelos telespectadores, pois suas atitudes, opiniões e decisões os levam a ganharem dinheiro e reconhecimento, o mesmo que era proposto pelo pai de Janjão ao mostrar ao filho os benefícios do ofício proposto. Perde-se a liberdade, mas o que importa é que “Uma notícia traz outra; cinco, dez, vinte vezes põe o teu nome ante os olhos do mundo” (ASSIS, 1882, p. 101). 10 3.2 Uma senhora Neste conto como personagem principal encontra-se D. Camila, uma mulher que “amou tanto a mocidade e a belleza, que atrazou o seu relogio, a fim de ver se poderia fixar esses dois minutos de crystal” (ASSIS, 1884, p. 147). Segundo o narrador esta mulher, D. Camila, poderia ser comparada a deusa Hebe, personagem da mitologia grega considerada a deusa da juventude, já que o tempo para ela parecia voltar, apenas valorizava a beleza, fato comprovado quando o narrador nos diz: A primeira vez que a vi, tinha ella trinta e seis annos, posto só parecesse trinta e dous, e não passasse da casa dos vinte e nove. Casa é um modo de dizer. Não ha castello mais vasto do que a vivenda d’estes bons amigos, nem tratamento mais obsequioso do que o que elles sabem dar as suas hospedes (Ibid. p. 147,1 48). Observamos neste trecho que Machado usou da metáfora para dizer-nos o quanto os anos nos poderiam ser generosos, e D. Camila sabia que era bonita tinha “Côr de leite, [...]. Cabello negro, olhos castanhos e callidos. Tinha as espáduas e o collo feitos de encomenda para os vestidos decotados [...]” (Ibid., p.149), ironicamente os seus braços foram comparados aos da Vênus de Milo, uma famosa estátua que representa a deusa grega Afrodite, deusa do amor sexual e da beleza física, mas que fora encontrada sem os braços, porém restava-lhe a beleza talhada em mármore de Paros. Embora fosse uma mulher que ludibriava o tempo, a única coisa que podia ser exigido dela era “que não fosse ridícula, e não o era” (Ibid., p. 150). O único fio de cabelo branco que naquele momento insistia em manchar sua cabeleira negra era a filha, e D. Camila sabia disto a ponto de impedir que a filha também seguisse seu rumo na estrada dos anos. Ernestina, a filha, entre quatorze e quinze anos era tratada como se ainda estivesse em idade pueril, mas esta já manifestava as vicissitudes “muito espigada, muito quieta, com uns modos naturaes de senhora” (ASSIS, 1884, p. 148). Segundo Bergamini (2010, p.15), “São vários os estudiosos que verificam a frequência de famílias pequenas na obra de Machado de Assis, isto é, de poucos ou nenhum filho - e a ausência em suas histórias do ‘amor maternal’”. Provavelmente, seria este o motivo que levaria esta personagem simbólico-feminina a empreitar certos procedimentos, deveras, distintos de quaisquer mães. Mesmo com toda a vaidade que os anos podem proporcionar a uma mulher, D. Camila era seu modo uma “mãe zelosa”, e quando percebeu que a filha encontrava-se triste por não poder conviver com os jovens de sua idade, a mãe “resolveu, emfim,despedir-se d’essses dignos amphytriões” (ASSIS, 1884, p. 148), mesmo atormentada pela saudade dos anos joviais que teria de deixar para trás. Pensou em um momento a renunciar todos os anos que a traziam para a juventude se, não fosse comparada a uma irmã mais velha da própria filha, e qual mulher não gostaria de tal comparação? Não sendo diferente a esta “jovem senhora”, D. Camila, restou-lhe o fardo nada pesado de “dizer a todos que casára muito creança” (Ibid., p. 150). Talvez o fator mais agravante para esta mãe não seria o de casar a filha, mas, sim, a perpetuidade e a sucumbência da própria vida: os netos, os pais, os avós. Ser avó, para algumas mulheres, torna-se uma confirmação de que chegou a hora de abandonar a 11 jovialidade para ser avó. Por isto D. Camila adiou o quanto pôde a união de sua filha com algum pretendente, impondo-lhes sempre algum defeito para que, assim, Ernestina não casasse. Em seus tormentos quanto à idade, o crescimento da filha que agora não era mais criança e pensava em casar-se e por fim os cabelos brancos que agora sim insistiam em pigmentar o negror de seus cabelos negros, fizeram com que D. Camila fosse comparada à personagem lady Macbeth de Shakespeare que enlouquece atormentada pelos crimes que cometera. No entanto, antes que os tormentos lhe tomassem para si, “D. Camila apenas tergiversou um pouco, acabou cedendo. Que remédio senão aceitar um genro?” (Ibid., p.157). Consequentemente a união da filha com o pretendente aceito pela sogra traria os netos, mas D. Camila conseguia beneficiar-se de todas as situações, pois ela sabia que “Só a belleza intellectual é independente e superior” (ASSIS, 1884, p. 155). Com isto soube o que fazer com a chegada do neto, tomá-lo como se fosse seu, ou ao menos ela queria que assim pensassem, pois quem a encontrasse a veria sempre na companhia do neto e da criada, e quem a ouvisse pensaria sem dúvidas que ela era a mãe daquele pimpolho devido aos cuidados que transferia a ele, pois Ella ia tão apertadinha, tão cuidadosa da creança, tão a miudo, tão sem outra senhora, que antes parecia mais do que avó; e muita gente pensava que era mãi. Que tal fosse a intenção de D. Camilla não o juro eu (“Não jurarás”, MATH. V, 34). Tão sómentedigo que nenhuma outra seria mais desvellada do que D. Camilla com o neto; attribuírem-lhe um simples filho era a coisa mais verosimel do mundo (ASSIS, 1884, p. 160). D. Camila assim como a grande maioria das mulheres, fazem o que podem para retardar a chegada dos anos. Esta senhora usa todos os artifícios possíveis para que eles não cheguem e quando parece não haver mais solução, ela aproveita tudo o que está a sua volta ao seu favor. Observa-se a começar pelo título, Uma senhora, de qual senhora Machado estaria se referindo já que o artigo indefinido “uma” nos dá idéia de que pode ser qualquer mulher, embora na narrativa encontrássemos uma personagem batizada como D. Camila o autor apenas usou desta senhora como um exemplo, pois todas as mulheres são um pouco D. Camila, pois qual mulher deseja ser velha e feia “[...] porque no ânimo d’ella, a velhice era um remorso, e a fealdade um crime” (Ibid., p.157). Quando Machado diz que “a preocupação do calendário” (Ibid., p. 150), ou seja, os dias vindouros trazidos pelos anos é para as mulheres uma mal ainda maior, leva-nos a refletir porque a protagonista da história vivia preocupada “principalmente com os olhos da opinião” (Ibid., p. 150), porque todas as mulheres também vivem, “[...] mas como quer que vivam as mulheres de nosso tempo?” (Ibid., p. 150). É com este questionamento que chegou-se ao ápice do presente estudo. As mulheres do século XIX não eram tão diferentes das mulheres do século XXI, o que as difere são os recursos que em todos os são disponibilizados. As clínicas de beleza, as plásticas, as transformações em busca de um corpo perfeito ou um rosto jovem são fatores que contribuem para a permanência das mulheres no meio social, fato este que pode ser comprovado com as centenas de artistas que fazem loucuras para manterem-se belas, pois somente assim estarão na mídia. Algumas até fogem do “padrão” de beleza por acharem que mesmo assim estarão sob a mira dos flashs e holofotes. Pode-se denotar que: Nessa peculiar e resumida radiografia social e cultural que faz da sociedade brasileira ao fim do século XIX que, não por 12 acaso, é a do Rio de Janeiro capital do Império, o escritor toca num ponto nevrálgico que lhe é, todavia, com certeza, familiar: o de uma certa ambigüidade, do meio intelectual, capaz de abrigar, simultaneamente, o germe da invenção e do progresso genuínos, e o vírus da conformidade e do oportunismo,[...] (CUNHA, 1998, p. 146). Considerações Finais A partir do processo de descrição da sociedade do século XIX e sua relação com a contemporaneidade, verifica-se a narrativa machadiana, de fato, é objetiva e direcionada, em relação a tempo, ambiente, personagens, cultura etc. Pode-se afirmar que seu processo narrativo reflete-se com acontecimentos sociais e costumes culturais, ainda, arraigados na sociedade contemporânea. Como arma de combate e confronto em relação a determinadas sociedades distintas no tempo (a Belle Époque tropical, os séculos XX e XXI), os contos apresentados fazem uma reflexão a respeito da “aparência”, seja ela pelo status, como ocorre em Teoria do medalhão–Diálogo– ou por fatores físicos como em Uma senhora (sobre o quanto estamos dispostos a viver em busca de “[...] acautellar um officio para a hypóthese de que os outros falhem, [...]” (ASSIS, 1882, p. 92) ou mesmo fazer com “[...] que aos quarenta annos (verdadeiros)” lhe tragam “[...] um ar de trinta e poucos”.(ASSIS, 1884, p. 150). Os pais nos contos analisados mostraram-se preocupados na obtenção de poder e aparência, ensinado aos filhos que estas são as maneiras para serem figuras presentes na sociedade. Observa-se também que estas atitudes, tomadas pelas famílias machadianas do século XIX, continuam vívidas na sociedade atual. Referências ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS – ABL: Machado de Assis. Disponível em: http://www.machadodeassis.org.br/. Acesso em 14 de fev. 2013. ASSIS, Machado de. Histórias sem data. Disponível em: http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/00205600#page/160/mode/1upAssis.Ace sso em 14 de fev. 2013. ASSIS, Machado de. Papéis avulsos. Disponível em: http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/00209800#page/4/mode/1up. Acesso em 14 de fev. 2013. BERGAMINI, D. L. As mulheres no conto de Machado de Assis. Darandina Revista eletrônica, Juiz de Fora, v. 1, n. 2, 2010. Disponível em: <http://www.ufjf.br/darandina/files/2010/01/as_mulheres_no_conto.pdf> Acesso em 26 de mar. 2013. CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Duas Cidades, 1995. CUNHA, Patrícia Lessa Flores da. Machado de Assis: um escritor na capital dos trópicos. Porto Alegre: Ed. Unisinos, 1998. 13 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA – MEC. Disponível em: http://machado.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=125&Ite mid=121 /. Acesso em 25 de mar. 2013. 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A redução da atividade física de rotina e o aumento de atividades sedentárias têm papel importante na etimologia da obesidade na infância. O objetivo deste estudo foi comparar o percentual de gordura, o IMC, o estilo de vida e o nível de atividade física dos alunos da rede pública e particular de ensino. A amostra foi composta por alunos do 6º ano: 26 de um colégio da rede pública estadual e 22 da rede particular de ensino, ambas localizadas em Itaperuna-RJ. Desses escolares, foram mensuradas a estatura, a massa corporal e as dobras cutâneas (tríceps e panturrilha), para a realização dos cálculos do IMC e do Percentual de Gordura e para a correlação dos dados com os hábitos adotados pelos avaliados foi aplicado um questionário. Constatou-se que em ambas as escolas os índices de massa corporal foram classificados como normal, no entanto, notou-se divergência quando se analisou o percentual de gordura. Na rede pública, meninos e meninas apresentaram amplitude ótima, enquanto que na rede particular, os meninos foram classificados com percentual de gordura alto, e as meninas, moderadamente alto. Com base no questionário supracitado verificou-se que os alunos da rede particular adotam um estilo de vida menos ativo. Conclui-se que devido à adoção de padrões comportamentais hipocinéticos, a clientela da rede particular apresenta maiores índices de massa corporal e percentual de gordura. Palavras Chaves: Obesidade. Doença. Crianças. 1Introdução Cada vez mais a obesidade tem sido alvo de estudos e pesquisas devido ao aumento de sua incidência nas sociedades contemporâneas, preocupando os órgãos de saúde pública, assim como toda a sociedade. Em face desse quadro, surge este problema: até que ponto o estilo de vida e o nível de atividade física interferem no IMC e no percentual de gordura de crianças? Dessa indagação emergiu os seguintes objetivos: a) Geral: comparar o percentual de gordura, o IMC, o estilo de vida e o nível de atividade física dos alunos do 6º ano da rede pública e particular de ensino, ambas da cidade de Itaperuna-RJ. b) Específicos: Aplicar o termo de consentimento livre e esclarecido; selecionar os indivíduos; coletar a estatura e a massa corporal dos avaliados; realizar o cálculo do IMC; mensurar as dobras cutâneas de tríceps e panturrilha; somar as dobras encontradas e converter os resultados na categoria correspondente; aplicar o questionário sobre o nível de atividade física e analisar os dados encontrados. 15 A escolha desse tema justifica-se pelo desenvolvimento cada vez mais precoce dos casos de obesidade, aumentando sua incidência em crianças, pela relação dessa patologia com diversas doenças, pela tendência de crianças obesas se tornarem adultos obesos, pela discriminação que esses jovens podem sofrer na sociedade e, além disso, adultos que eram obesos quando crianças têm seus riscos de mortalidade aumentados. Como hipótese, acredita-se que há diferença significativa entre os alunos da rede pública e particular de ensino, sendo que esta apresentaria o IMC e o percentual de gordura mais elevado, e que essa diferença estaria diretamente relacionada ao estilo de vida e ao nível de atividade física dos alunos. Neste intento, este estudo procurou embasamento em teóricos como Sotelo et al. (2004), Santo, Mercês (2005), Borba (2006), Teixeira et al. (2009), dentre os demais. 2 Revisão de literatura A obesidade é uma doença crônica e multicausal, caracterizada pelo acúmulo de tecido adiposo em todo o corpo ou em determinadas partes do mesmo (SOTELO et al., 2004). No Brasil, um estudo realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2009 revelou que metade dos adultos brasileiros apresenta excesso de peso e que 12,4% dos homens e 16,9% das mulheres já são obesos, verificou também que um terço das crianças de 5 a 9 anos está com peso acima do recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e que 21,7% dos adolescentes de 10 a 19 anos estão com sobrepeso. (REVISTA E. F., 2012, 4-5 p.). Esta patologia vem assumindo grande importância devido à sua relação direta ou indireta com outras doenças como a diabetes melitos tipo II (DM), a osteoartrite, a aterosclerose, a apneia obstrutiva do sono, as dislipidemias, as doenças cardíacas, a hipertensão arterial, ao acidente vascular cerebral, a doença da vesícula biliar, aos distúrbios alimentares ou de humor e ao câncer de próstata, mama, endométrio e ovário (SANTO; MERCÊS, 2005; BORBA, 2006; TEIXEIRA et al., 2009). Em crianças, a obesidade pode causar distúrbios psicológicos, dificuldade de relacionamento social, baixa na autoestima, afetar seu desenvolvimento motor, acelerar a puberdade, elevar o colesterol e propiciar diversos problemas de saúde que poderão se prolongar pela vida adulta e em alguns casos levar a morte (BORBA, 2006). Diversos fatores podem desencadear a obesidade, esses podem ser endógenos ou exógenos, os fatores endógenos, ou seja, de origem interna são responsáveis por menos de 5% dos casos dessa doença, dentre eles destacam-se a genética, alterações hormonais, problemas neurológicos, ineficiência metabólica, entre outros. Os fatores exógenos, ou seja, de origem externa são os principais causadores da obesidade e estão relacionados a aspectos ambientais, culturais, sociais e emocionais (OLIVEIRA, 2002; BORBA, 2006). O aumento da violência e a diminuição dos espaços para a prática de atividades físicas provocados pelo crescimento das cidades, aliado ao avanço tecnológico ocasionaram uma mudança na forma de ocupação do tempo das crianças, que trocaram o tipo de brincadeira, passando a realizar atividades cada vez mais sedentárias, gastando mais tempo em frente à televisão, no computador e em jogos eletrônicos (MELLO et al., 2004; SANTO; MERCÊS, 2005; CAMPAGNOLO et al. 2008). Os maus hábitos alimentares constituem outro fator determinante para o desenvolvimento da obesidade, esses se intensificaram nas últimas décadas com o aumento do consumo de açúcares simples, de produtos industrializados e de alimentos 16 ricos em gorduras saturadas, ao mesmo tempo em que ocorreu o declínio da ingestão de leguminosas e hortaliças (MELLO et al., 2004; SANTO; MERCÊS, 2005). A distribuição da gordura corporal está diretamente ligada às chances que o indivíduo tem para adquirir determinadas doenças, essa distribuição anatômica irá definir os tipos de obesidade, que podem ser do tipo I que é caracterizada pelo excesso de massa corporal ou percentual de gordura distribuída por todo o corpo, a do tipo II que é caracterizada pelo acúmulo de gordura no tronco, particularmente no abdômen, constituindo o formato andróide, encontrada principalmente em homens e associada à hipertensão e Diabetes Melitos, por isso é considerada a mais invasiva, e a do tipo III que é o acúmulo excessivo de gordura na parte inferior do corpo, constituindo o formato ginecóide, ocorrendo principalmente em mulheres (BORBA, 2006). O tipo de obesidade mais encontrado em crianças é o tipo I, ou seja, a gordura não está centralizada em uma determinada parte do corpo, mas à medida que vão crescendo, o tipo de obesidade vai sendo definido (BORBA, 2006). É necessário identificar o mais cedo possível os casos de obesidade, principalmente a infantil, para que se possa eliminar seus fatores causadores, evitando que essa doença se agrave (SANTO; MERCÊS, 2005). Um efetivo combate a obesidade infantil implica em modificar os hábitos da criança e de toda a família, por isso este tratamento se torna tão complexo, pois necessita da participação ativa dos pais e da criança, que muitas vezes encontra dificuldade em entender os riscos que a obesidade pode causar. Reeducação alimentar, atividade física e mudanças comportamentais, dentro de um ambiente positivo, de acolhimento, compreensão e cumplicidade da família podem trazer excelentes resultados. Os pais devem adotar e estabelecer uma alimentação saudável com horários para as refeições e lanches, limitar o tempo de utilização do computador, televisão e jogos eletrônicos e estimular a prática de atividades físicas, pois crianças que são ativas desde cedo têm maior probabilidade de permanecerem ativas quando adultas. Devem também dar bons exemplos, pois como já comprovado em estudos, se a mãe pratica atividade física, o filho é 2 vezes mais ativo, se o pai pratica atividade física, o filho é 3,5 vezes mais ativo e se ambos praticarem o filho será 6 vezes mais ativo (BASTOS; PEREIRA, 2006). Um estilo de vida sedentário constitui uma das principais causas para o desenvolvimento da obesidade em todas as faixas etárias, por isso é de suma importância a prática regular de atividades físicas, pois esta traz benefícios para a saúde física e mental do praticante e contribui no processo de promoção da saúde, da qualidade de vida e prevenção de doenças (MASCARENHAS et al., 2005; BARUKI et al., 2006; DUMITH et al., 2008). Existem diversas formas de diagnosticar se um indivíduo se encontra em um quadro de obesidade, como a pesagem hidrostática, a bioimpedância elétrica, o Índice de Massa Corporal (IMC) e a utilização das medidas das dobras cutâneas, mas os dois últimos são os métodos mais utilizados em estudos por apresentarem maior praticidade de realização e menor custo financeiro (BORBA, 2006; MARTINS; FILHO, 2006). O IMC é muito utilizado em estudos clínicos por ser aceito pela comunidade científica, mas este método não é tão fidedigno em adultos, por não considerar as divergências da composição corporal, que são menos significativas nas crianças. Sua fórmula é igual a massa corporal dividida pela altura ao quadrado, sendo que a massa corporal é expressa utilizando a unidade de medida quilograma e a altura em metros. (TRITSCHLER, 2003; MELLO et al., 2004; SOTELO et al., 2004; SANTO; MERCÊS, 2005; BORBA, 2006). A avaliação da adiposidade através da mensuração da espessura das pregas cutâneas mostra como a gordura está distribuída no corpo, sabendo-se que não só a 17 quantidade total de gordura, mas também a sua localização são importantes na determinação dos riscos à saúde. A coleta é realizada em determinadas partes do corpo, de acordo com o protocolo utilizado e a amostra a ser analisada. (OLIVOTO, 2004; BORBA, 2006; DUQUIA et al., 2008). 3 Metodologia Os passos metodológicos foram os seguintes: 3.1 Amostra A amostra foi composta por 26 alunos da turma 601 do Colégio Estadual 10 de Maio e 22 alunos da turma 600 da Escola de Aplicação da Fundação Educacional e Cultural São José, ambos da cidade de Itaperuna-RJ. Os dados da escola pública foram coletados no dia 10 de fevereiro de 2012, na parte da tarde, dentro da sala de aula e enquanto os da particular foram obtidos no dia 15 de fevereiro de 2012, no período da manhã, na quadra da escola. Em ambas as instituições escolares, as dobras cutâneas foram mensuradas pelo mesmo avaliador. Para a obtenção dos dados referentes à adiposidade foram utilizados o IMC e a mensuração das dobras cutâneas e para a análise do estilo de vida e nível de atividade física foi aplicado um questionário ao final das avaliações (ANEXO 3). O presente estudo respeitou a Resolução 196/96, para pesquisas em serem humanos, sendo aplicado um termo de consentimento livre e esclarecido pelo qual os responsáveis autorizavam os alunos a participarem da pesquisa (ANEXO 1). 3.2 Estatística O presente estudo trata-se de uma pesquisa descritiva, de corte transversal, no qual seus valores serão expressos em média e desvio padrão. 3.3 Instrumentos Para a mensuração do IMC foram utilizados os seguintes instrumentos: Balança Clínica da marca Filizola® com capacidade máxima para 150kg e precisão de 100 gramas Trena da marca Sanny Medical de 2m 18 Tábua para estatura Para a mensuração do percentual de gordura foram utilizados: Compasso de dobras cutâneas da marca Sanny. Lápis Dermatográfico Carci Trena da marca FisioStore de 1,5m 3.4 Métodos A. IMC O IMC foi obtido através do protocolo proposto por Quetelet,1800. Inicialmente foi pedido ao avaliado para subir na balança de costas para a escala de medida, ficando na posição ereta e sem se movimentar, o avaliador fazia a leitura dos valores e anotava na ficha de anamnese do avaliado. Para a mensuração da estatura, foi utilizada uma fita métrica fixada na parede, o avaliador se posicionava no lado direito do avaliado, pedindo para que o mesmo ficasse ereto e com os olhos fixos num eixo horizontal paralelo ao chão, de acordo com a linha de Frankfurt e era solicitado ao aluno para que realizasse uma inspiração forte e executasse uma apnéia até que fosse colocada uma tábua no vértex de sua cabeça, feito isso pedia-se ao avaliado para se retirar dessa posição para que o avaliador realizasse a leitura e transcrevesse a estatura do aluno para sua ficha de anamnese. Logo após a coleta dos dados, o avaliador os digitou numa tabela no computador para os devidos cálculos do IMC. Os valores de IMC encontrados foram classificados de acordo com a tabela da OMS, 2002 (ANEXO 4). B. Percentual de Gordura O percentual de gordura foi obtido através da mensuração das dobras cutâneas do tríceps e panturrilha baseado no protocolo de Lohman,1987 para crianças e adolescentes. As localizações desses pontos anatômicos estão descritas abaixo. - Tríceps Determinada paralelamente ao eixo longitudinal do braço, em sua face posterior, sendo seu ponto exato no ponto médio acrômio-radial. 19 (DIAS, 2004) Medida e localização da dobra cutânea do tríceps - Panturrilha medial Obtida com o indivíduo sentado, com o joelho em 90 graus de flexão, tornozelo em posição anatômica e o pé sem apoio. Tomou-se a dobra no sentido paralelo ao eixo longitudinal do corpo, na altura de maior circunferência da perna. (DIAS, 2004) Localização e medida da dobra cutânea da panturrilha O compasso foi manuseado na mão direita e o gatilho deste com o dedo indicador, com a mão esquerda foi pinçado o tecido adiposo subcutâneo entre o polegar e o indicador, tendo cuidado para que o músculo não seja pinçado junto, em caso de dúvida foi solicitado uma breve contração e posterior relaxamento do músculo. A prega foi pinçada no ponto determinado e as extremidades do compasso foram ajustadas perpendicularmente a prega, um cm abaixo dos dedos, foram aguardados 2 segundos antes de efetuar a leitura. Em cada uma das dobras cutâneas, foram coletadas três medidas e registrada a medida mediana. Foram somadas as medidas do tríceps e da panturrilha e o resultado encontrado foi classificado segundo o nomograma proposto por Lohman, 1987. 4 Resultados e Discussão 20 A TABELA I apresenta a média e o desvio padrão do IMC e do percentual de gordura dos avaliados segundo o sexo. Observa-se que em ambas as instituições os índices de massa corporal são classificados como normal, no entanto, nota-se divergência quando se analisa o percentual de gordura. Na rede pública, meninos e meninas apresentaram amplitude ótima, enquanto que na rede particular, os meninos foram classificados com percentual de gordura alto, e as meninas, moderadamente alto. TABELA I - Valores de IMC e Percentual de Gordura Escola Pública Escola Particular N=48 Meninos Meninas Meninos Meninas IMC 17,45 ± 1,95 16,88 ± 1,23 20,48 ± 3,06 18,33 ± 2,68 Percentual de Gordura 16,39 ± 9,09 18,81 ± 5,91 27,82 ± 11,27 28,12 ± 10,55 Os gráficos abaixo mostram a classificação dos índices de massa corporal dos avaliados de acordo com a OMS (2002). O GRÁFICO I mostra que 81% dos alunos da escola pública apresentam IMC na categoria normal, 19% estão com baixo peso e nenhum aluno apresentou IMC acima do recomendado. Enquanto que na escola particular, 27% encontram-se com sobrepeso, 9% já são considerados obesos e 64% dos alunos estão dentro do normal, como mostra o GRÁFICO II. Esses resultados também foram observados por Oliveira (2002) em um estudo realizado na Bahia, com crianças da rede pública e privada de ensino da zona urbana, onde constatou que nas escolas públicas 6,5 % dos alunos encontram-se com sobrepeso e 2,7% são obesos e, nas escolas privadas, 13,4% dos escolares foram diagnosticados com sobrepeso e 7% com obesidade, sendo que o presente estudo apresentou diferença superior ao comparar a rede pública e particular. GRÁFICO I – Classificação do IMC da Escola Pública Classificação do IMC Escola Pública 19% Baixo Peso Normal 81% Sobrepeso Obeso GRÁFICO II – Classificação do IMC da Escola Particular 21 Classificação do IMC Escola Particular 9% 27% Baixo Peso 64% Normal Sobrepeso Obeso Os gráficos a seguir apresentam a classificação do percentual de gordura dos avaliados de acordo com o protocolo de Lohman (1987). O GRÁFICO III mostra que 77% dos alunos da escola pública apresentam percentual de gordura na categoria ideal, 15% moderadamente alto e 4% muito alto. Enquanto que na escola particular 87% dos alunos estão acima do ideal, sendo 32% moderadamente alto, 32% alto e 23% muito alto, e apenas 13% apresentaram percentual de gordura ideal, como mostra o GRÁFICO IV. Um estudo realizado por Campos et al (2010) em Porto Velho (RO) apresentou resultados semelhantes no que se refere aos dados da escola pública, onde 27,27% dos alunos foram encontrados abaixo dos níveis de gordura considerados normais e 72,72% estavam dentro dos padrões de normalidade. No entanto, apresentou divergências entre as escolas particulares, pois no estudo em Porto Velho, 57,14% foram classificados com percentual de gordura ideal, 28,57% moderadamente alto e 14% alto. GRÁFICO III – Classificação do percentual de gordura da Escola Pública Classificação do %G Escola Pública 4% 4% 15% Muito Baixo Baixo Ideal 77% Moderadamente Alto Alto 22 GRÁFICO IV – Classificação do percentual de gordura da Escola Particular Classificação do %G Escola Particular 13% 23% 32% Muito Baixo Baixo Ideal 32% Moderadamente Alto Alto Com relação à situação socioeconômica, a obesidade mostrou-se mais prevalente nas crianças de maior poder aquisitivo (escola particular), o que vai de acordo com a literatura, pois segundo Silva, Balaban, Motta (2005) o crescimento da obesidade está mais associado ao status socioeconômico do que à aspectos étnicos e geográficos. O questionário aplicado referente ao estilo de vida adotado pelos alunos vem elucidar os resultados encontrados acima, como nos mostra os gráficos a seguir. Os GRÁFICOS V e VI mostram que os alunos da escola particular passam mais tempo assistindo televisão, jogando videogame ou no computador se comparados aos alunos da escola pública. GRÁFICO V – Questão número 1 do questionário da Escola Pública Quantas horas por dia você costuma passar assistindo televisão, jogando videogame ou ficando no computador? Escola Pública 12% 15% 1 a 2 horas 35% 3 a 4 horas 5 a 6 horas 38% Mais de 6 horas GRÁFICO VI – Questão número 1 do questionário da Escola Particular 23 Quantas horas por dia você costuma passar assistindo televisão, jogando videogame ou ficando no computador? Escola Particular 14% 1 a 2 horas 32% 27% 3 a 4 horas 5 a 6 horas Mais de 6 horas 27% Os GRÁFICOS VII e VIII mostram que 82% dos alunos da escola particular utilizam meios de transporte automotivos para se locomoverem no trajeto escolar. Em contrapartida 65% dos alunos da escola pública utilizam meios de transporte ativo, ou seja, praticam alguma forma de atividade física durante esse percurso, proporcionando assim um maior gasto calórico. GRÁFICO VII – Questão número 2 do questionário da Escola Pública Como você vai de casa para escola? Escola Pública A pé 8% De bicicleta 27% 50% 15% De ônibus/ Van/ Kombi De carro/Moto Outro Meio de transporte GRÁFICO VIII – Questão número 2 do questionário da Escola Particular 24 Como você vai de casa para escola? Escola Particular A pé 18% 5% 77% De bicicleta De ônibus/ Van/ Kombi De carro/Moto Outro Meio de transporte De acordo com os GRÁFICOS IX e X não houve diferença significativa entre os alunos das escolas pública e particular em relação ao tempo gasto se exercitando durante as aulas de educação física. Isso mostra que infelizmente as poucas horas de educação física na escola não são suficientes para atenuar seus hábitos sedentários fora da escola. GRÁFICO IX – Questão número 3 do questionário da Escola Pública Em uma aula de educação física, quanto tempo você passa realmente se exercitando ou praticando esportes? Escola pública Eu não faço educação física 4% 42% 27% Menos de 30 minutos 31 a 60 minutos 27% Mais de 60 minutos GRÁFICO X – Questão número 3 do questionário da Escola Particular 25 Em uma aula de educação física, quanto tempo você passa realmente se exercitando ou praticando esportes? Escola Particular 18% 46% 36% Eu não faço educação física Menos de 30 minutos 31 a 60 minutos Mais de 60 minutos Os GRÁFICOS XI e XII mostram que 88% dos alunos da escola pública praticam atividades físicas fora do período escolar, enquanto que na escola particular some nte 50% cultiva esse estilo de vida saudável. Você pratica alguma atividade física fora da escola? Escola Pública 12% Não Sim 88% GRÁFICO XI – Questão número 4 do questionário da Escola Pública 26 Você pratica alguma atividade física fora da escola? Escola Particular Não 50% 50% Sim GRÁFICO XII – Questão número 4 do questionário da Escola Particular Os GRÁFICOS XIII e XIV mostram que além de um maior número de alunos de escola pública praticarem atividade física fora da escola, eles a fazem com mais freqüência. GRÁFICO XIII – Questão número 5 do questionário da Escola Pública Quantas vezes por semana você pratica atividade física? Escola Pública 19% 12% 11% 31% 27% Não pratica 1 vez por semana 2 ou 3 vezes por semana 4 ou 5 vezes por semana Mais de 5 vezes por semana GRÁFICO XIV– Questão número 5 do questionário da Escola Particular 27 Quantas vezes por semana você pratica atividade física? Escola Particular Não pratica 14% 9% 50% 23% 4% 1 vez por semana 2 ou 3 vezes por semana 4 ou 5 vezes por semana Mais de 5 vezes por semana A última pergunta do questionário verificou que os alunos da rede pública de ensino não praticam atividade física fora da escola por falta de interesse ou falta de opção, repetindo este quadro na rede particular de ensino. A partir da análise do questionário observa-se que a falta de atividade física constitui uma das principais causas para o desenvolvimento do sobrepeso e da obesidade. Constatou-se que os alunos da rede particular adotam um estilo de vida mais sedentário, tendo como conseqüência maiores níveis de gordura. No estudo realizado por Oliveira (2002) em Feira de Santana (BA) apontou uma relação inversa entre a prática sistemática de exercícios físicos e a prevalência do sobrepeso e obesidade na amostra avaliada. Para Pollock e Wilmore (1993), “a inatividade física tem papel potencializador no aumento da gordura corporal e a atividade física é um dos meios de controlar e manipular este aumento” (p.60). Com base nessas pesquisas, observa-se a necessidade da estimulação da prática de atividades físicas desde a infância, pois dessa forma a criança adotará um estilo de vida mais ativo e saudável e provavelmente o manterá durante a vida adulta, uma vez que esta prática pode contribuir no combate, controle e prevenção de diversas doenças, inclusive a obesidade (SANTO; MERCÊS, 2005). 5 Conclusão Os hábitos, o estilo de vida e os fatores que colaboram para a aquisição de determinadas condutas são decorrentes do ambiente social e físico em que a criança/jovem vive. Por isso devido às maiores facilidades os alunos da rede privada de ensino apresentam uma tendência cada vez maior à adoção de padrões comportamentais hipocinéticos, caracterizados por um predomínio de atividades de lazer passivo (assistir televisão, jogos eletrônicos) em detrimento das atividades físicas e de um estilo de vida mais ativo. Em conseqüência desses hábitos os índices de massa corporal e o percentual de gordura encontrado nos alunos da rede privada foram mais elevados. Referências BARUKI, S. B. S. et al. Associação entre estado nutricional e atividade física em escolares da Rede Municipal de Ensino em Corumbá- MS. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, v.12, n.2, Niterói, mar./abr. 2006. 28 BASTOS, M. V.; PEREIRA, M. A. M. Obesidade Infantil. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/obesidade-infantil/10247>. Acesso em: 02 de março de 2012. BORBA, P. C. S. A importância da atividade física lúdica no tratamento da obesidade infantil. Janeiro de 2006. 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A análise dos resultados é amparada por uma fundamentação teórica pautada no entendimento do jornalismo enquanto um serviço público e no código de ética dos jornalistas brasileiros. Este artigo é uma versão resumida da pesquisa de mestrado da autora, defendida em maio de 2008 na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e orientada pelo Prof. Drº Hugo Lovisolo. A pesquisa de campo foi restringida aos participantes de um encontro de jornalistas que reuniu profissionais das regiões Norte, Noroeste e Lagos do Estado do Rio de Janeiro, no Brasil, em dezembro de 2007. Palavras-chave: Ética, Moral, Jornalismo, Códigos Deontológicos Introdução É a partir do século XIX, articulando a herança deixada pelas Luzes, que celebrava a liberdade de opinião e expressão do pensamento como um dos mais importantes direitos do Homem, que o jornalismo desenvolve o ethos da atividade como interesse público, um quarto poder, um produtor e divulgador de informações, a partir de uma técnica peculiar, que tem como principal baliza a busca pela verdade dos fatos a fim de atender a demanda dos cidadãos por notícias que lhes informem sobre o que se passa na sociedade. Trata-se, portanto, de uma atividade que, à semelhança de tantas outras, ao se profissionalizar, assume valores, objetivos e tarefas que são compartilhados com o público, que, inclusive, reconhece nos jornalistas as pessoas devidamente habilitadas para tal. Assim, há uma opinião que serve de base para a reflexão sobre o jornalismo: o entendimento da atividade como um serviço público, mediadora da informação, cujo principal objetivo é manter os cidadãos cientes dos fatos, garantir seu acesso aos diversos pontos de vista a respeito das temáticas mais atuais e servir de canal entre o público e as diversas instâncias de poder na sociedade. Entre os profissionais da área diz-se que, se perder de vista esse papel, a imprensa fará tudo, menos jornalismo. De nossa parte, percebemos que, se perder de vista a perspectiva ética, de um lado, e, de outro, as rotinas e demandas que moldam a produção jornalística , o pesquisador não poderá compreender o que é o mundo das notícias e por que elas são como são . É, portanto, tendo em vista a deontologia jornalística, que esta pesquisa procurou investigar, entre outras situações, como hoje se sustenta o jornalismo ideal enquanto representação entre os profissionais da área. Como veremos, muitos jornalistas e estudantes de jornalismo dizem ser difícil a observância do código de ética feito para conduzir a atividade dentro dos ideais seculares de compromisso com a democracia e a cidadania. Dizem ser quase impossível desenvolver um “bom jornalismo” dadas às circunstâncias contemporâneas, em que os negócios da comunicação pautam-se pelas leis de mercado, visando o lucro e a proteção dos anunciantes . Contudo, o ideal ético pode sobreviver apesar das influências, vistas como desvios ou deturpações, do modo real de funcionamento . Tudo indica que, sem o ideal ético, a profissão perde sua 31 legitimidade. Ele deve ser elogiado, fundamentado e, quando possível, perseguido, ainda que realizado de forma parcial ou imperfeita. 1 – Moral, deontologia e ética jornalística Noções como notícia, verdade, independência, objetividade e serviço ao público para atender as demandas do interesse público por inteirar-se do que se passa amadureceram junto com a profissionalização da atividade e a transição do jornalismo artesanal, de campanha, despretensioso, para uma realidade capitalista, de alta especialização, onde o título de quarto poder e de porta-voz dos cidadãos convive com a idéia de ser esta uma ocupação rentável. A partir do século XIX, com sua profissionalização e a transformação das redações em empresas capitalistas , o jornalismo passou a ser orientado por um discurso de tipo ethos, regido por regras e por uma deontologia toda particular . O discurso legitimador do papel profissional e público da atividade jornalística toma como missão dos jornalistas contribuir para o desenvolvimento da sociedade e para a manutenção dos valores democráticos, fornecendo informações e análises acerca do andamento da vida, da sociedade, da política. Para realizar-se como dispositivo da cidadania, o jornalismo procura circular em torno de balizas que indicam o que a atividade deve ser, um deverser historicamente construído que regula e dirige a atividade. Já faz quase cem anos que os primeiros códigos de ética – ou deontológicos, como preferimos – foram escritos, e hoje eles já estão presentes em praticamente todos os países do mundo. Hoje, já não se pode conceber a vida em sociedade sem meios de comunicação que permitam às pessoas saber o que se passa; necessita-se não apenas de mídia, mas de mídia de qualidade. Para especialistas como Claude-Jean Bertrand (1999), a maioria dos problemas que impede a mídia de alcançar esse padrão de qualidade é a sua natureza tríplice, que faz dela, ao mesmo tempo, indústria, serviço público e instituição política. É por isso que a deontologia preocupa-se com deveres, regras que decorrem de um conjunto de princípios morais, que atuam em conformidade com a moral social . São adotados em larga medida, aceitos, porque as pessoas que os adotam compartilham de uma determinada visão dos homens, do mundo e da vida em sociedade. O código deontológico nem sempre apresenta regras fáceis ou coerentes, mas nisso os teóricos do jornalismo estão de acordo, estabelece-se, ao menos, um ideal. “Tenta-se armar a consciência individual de cada profissional enunciando valores e princípios unanimemente reconhecidos. O código dá a cada um, um sentimento de segurança, de força coletiva.” (BERTRAND, op. cit., p. 81). Karam (1997) acrescentaria que o código “é apenas uma referência que não esgota a constante criação de uma prática profissional, com os novos problemas e posturas que sugere. É mais um eixo que norteia a ação profissional, tanto no sentido de cumprir quanto negar um princípio.” (KARAM, op. cit., p. 53) O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros versa sobre o direito à informação (o jornalista brasileiro trabalha pelo interesse público, deve ter total acesso às informações e não admitir qualquer tipo de impedimento nesse sentido) ; dá diretrizes para a conduta profissional do jornalista (deve ser uma conduta pautada pelo código de ética, em conformidade com o interesse público e a verdade; o jornalista deve honrar e dignificar a profissão, lutar pela liberdade de expressão; combate a corrupção e tudo aquilo avilta os direitos humanos) ; reafirma sua responsabilidade social (o parágrafo sobre a presunção de inocência é um dos pontos de discussão mais aflorada, para alguns autores) ; orienta sobre o relacionamento entre colegas (não aceitar remuneração abaixo 32 do piso estabelecido ou acúmulo de função, para não prejudicar os colegas, por exemplo) ; e dá as sanções para aqueles que desobedecerem ao código . 2 – A pesquisa de campo A amostragem aqui relacionada foi obtida através da aplicação de questionários entre os participantes do II Encontro Regional de Jornalistas do Norte/Noreste/Lagos Fluminense, realizado no município de Quissamã, a 233 km do Rio de Janeiro, capital do Estado, no dia 1º de dezembro de 2007. Durante uma palestra sobre ética jornalística e o novo Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, proferida pela jornalista e professora-mestra Carmem Pereira, da Comissão de Ética da FENAJ (Federação Nacional de Jornalistas), foram distribuídas no auditório 200 fichas. Desse número, 112 retornaram com respostas, validadas nesta tabulação. O questionário apresentou ao respondente 12 questões objetivas, reunindo perguntas a respeito de sua convicção pessoal acerca de dilemas éticos sobre o relacionamento entre os departamentos editorial e comercial de uma empresa jornalística, a invasão de privacidade, o sensacionalismo e a função política da imprensa – a maioria dos respondentes, 44, eram declaradamente jornalistas profissionais, que atuavam em diversos cargos, entre eles o de assessor de imprensa. O segundo grupo mais numeroso foi o de estudantes de jornalismo, formado por 35 pessoas, sendo que a maioria declarou já atuar como estagiário em algum veículo de comunicação. Para efeitos de amostragem neste artigo, trabalharemos com as respostas desses dois grupos mais representativos. O terceiro grupo de respondentes foi formado por 23 pessoas que se declararam como “outro”, ou seja, não eram jornalistas profissionais, nem estudantes, nem proprietários de meios de comunicação ou ocupante de qualquer outra função prevista no questionário . As demais fichas não continham identificação por função. Entretanto, os respondentes que eram jornalistas profissionais ou estudantes de jornalismo que fazem estágio, ou seja, que já atuam como profissionais, declararam unanimemente atuar em empresas com no máximo 10 equipes de jornalismo. A maioria vinda de jornais impressos, emissoras de TV e empresas privadas com serviços de assessoria de imprensa. A primeira pergunta do questionário pretendia saber o que os respondentes pensavam sobre o uso de fotografias que, de alguma forma, eram apelativas ou grotescas, como imagens de acidentes ou assassinatos. O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros determina que o jornalista não pode divulgar informações “de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos” (Artigo 12, inciso III). No entanto, a maioria das respostas do questionário (46%) foi de que essas imagens deveriam ser usadas nas chamadas principais, mas com edição que diminuísse o impacto e/ou dificultasse a identidade das vítimas. Outros 26% decidiriam usar as imagens apenas nas páginas internas, em caso de veículo impresso, e 20% disseram descartar as imagens apelativas para dar lugar a outras menos impactantes do mesmo fato. Apenas 3,9% das respostas totais indicaram a opção por publicar as imagens nas chamadas principais, sem restrição. Esses resultados indicariam uma reserva generalizada ao sensacionalismo ou uma tendência a proteger fontes, personagens e leitores da exposição pública da miséria humana, mas a tabulação das respostas por grupos, indicou que os jornalistas profissionais, em sua maioria (80%), decidiriam usar as imagens tal como foram feitas. O equilíbrio do resultado geral foi definido pelos estudantes de jornalismo, que, nas respostas por grupos, dividiram-se entre editar as imagens (55%) ou usar apenas nas internas (54,5%), o que faz pensar sobre uma ética mais conservadora, pautada no jornalismo ideal, modelo balizado, talvez, pela 33 Academia. A maioria dos demais respondentes demonstrou uma restrição relativa ao sensacionalismo, julgando que as imagens grotesco-apelativas devem estar nas internas, sem edição. Outra questão dizia respeito ao relacionamento entre os departamentos comercial e editorial de uma empresa jornalística. O Código de Ética dos Jornalistas não orienta o profissional de forma objetiva, dizendo apenas, no Artigo 12, inciso I, que o jornalista não deve divulgar informações “visando o interesse pessoal ou buscando vantagem econômica.” Entretanto, desde a segunda metade do século passado é tradicional no jornalismo brasileiro a divisão que Bucci (2000) chama de igreja-estado, em que se administra a empresa jornalística como uma estrutura bipartida, com dois lados autônomos, independentes. Esse modelo prescreve que o repórter não tenha nenhum tipo de relacionamento com quem negocia publicidade e vice-versa, porque há clientes distintos e seus interesses são antagônicos. Mais uma vez, houve diferença entre os ideais traçados por jornalistas profissionais e estudantes de jornalismo. Os resultados gerais deram conta de que o ideal para 60% dos respondentes era que os dois departamentos colaborassem entre si sempre que necessário. No entanto, quando são verificadas as respostas por grupos, conclui-se que a maioria dos jornalistas profissionais (40%) declarou não tolerar a proximidade entre redação e publicidade uma vez que o departamento comercial poderia interferir na produção jornalística isenta. Os demais jornalistas profissionais (30,7%) que responderam a esta questão da pesquisa admitiram a colaboração; já estudantes de jornalismo ficaram divididos: 46% votaram pela independência dos departamentos e 48% acham que a colaboração entre os dois é bem-vinda e só tem a somar. Sobre a diferença na relação entre os departamentos editorial e comercial em pequenas e grandes empresas, a maioria das respostas gerais (59%) acredita que esta existe e implica a política administrativa e editorial do veículo. Dos integrantes do grupo “outro”, a maioria opina pela colaboração mútua. O questionário da pesquisa de campo deixou espaço em aberto para os respondentes dissertarem sobre algumas questões específicas, como foi o caso daquela que inquiria sobre a convergência do comercial e do jornalismo e a que pretendia saber sua opinião a respeito da presença do dono da empresa na redação. Alguns corresponderam à proposta. O respondente do questionário número 13, por exemplo, identificado como “outro”, escreveu que “quanto mais próximos os dois setores, menos imparcialidade”, embora seja “preciso que o empresário saiba o que acontece em todos os setores da empresa”, fazendo-nos entender que a presença do dono ou do publisher ou do editor-executivo não deva necessariamente implicar no fim da autonomia dos departamentos. O respondente do questionário número 70, por sua vez, identificado como repórter e assessor de imprensa, considerou que quanto maior a empresa, mais forte a pressão mercadológica, ficando visível a tendência do veículo que “diz sim ao mercado”. Já nas pequenas empresas, os departamentos apresentam “limites muito mais tênues” e “geralmente o dono se sente editor”, fazendo com que a administração do veículo de comunicação seja “mais pessoal que mercadológico”. O respondente do questionário 45, identificado como estagiário, considerou que “no interior essa relação (jornalismo/comercial) é muito mais comprometida com o poder, principalmente com o poder público, como as prefeituras e câmaras”. Sobre a presença do dono ou de seu representante na redação, o respondente do questionário número 100, identificado como estudante de jornalismo e estagiário, admitiu que este acompanhamento aconteça “para que haja uma valorização do trabalho do jornalista, mas sem interferir no seu raciocínio”, reiterando a imagem do jornalista como trabalhador intelectual e detentor de direitos, como a autonomia do pensamento e a liberdade autoral. O respondente do questionário número 87, identificado como repórter, escreveu 34 que a prioridade nas empresas jornalísticas é o comercial, que, segundo eles (os membros do departamento), alimentam financeiramente a instituição. Dessa forma, se estabelecem os espaços de publicidade e depois se decide o que sobrará para as matérias, vulneráveis ao limite imposto, podendo ser, e sempre sendo, encurtada (sic). Além disso, são raros os donos de empresa que se preocupem (sic) mais com o produto do que com a folha de pagamento. No Brasil, tradicionalmente, as atividades de repórter e de assessor de imprensa não são vistas como incompatíveis por muitos profissionais, e mesmo o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros admite dupla matrícula . Entretanto, o assunto provoca polêmica em algumas instâncias da classe. A quinta pergunta do questionário inquiria os respondentes a respeito dessa dupla função do jornalista. Das respostas totais, 68% indicavam que o jornalista que exercesse também a assessoria de imprensa deveria ter o cuidado de não atuar, na redação, cobrindo assuntos da área de interesse de seu assessorado, de modos a manter sua isenção; 16%, que o jornalista deveria escolher entre uma atividade e outra e 16% defendia que o jornalista-assessor de imprensa deveria não só exercer as duas funções despreocupadamente, como também aproveitar na redação os próprios releases para pautar reportagens. As respostas por grupo não variaram das gerais, resguardadas as devidas proporções, o que reforça que, pelo menos entre os participantes do evento onde a pesquisa aconteceu, a dupla matrícula não constitui problema ético para a maioria dos profissionais. O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, no inciso VIII do Artigo 6º, diz que “é dever do jornalista respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão”. Quando questionados a respeito dos limites à invasão de privacidade, no entanto, as respostas gerais indicaram uma tendência a legitimar a violação da privacidade de uma pessoa quando seus atos privados interferem na vida dos cidadãos (43%), embora o uso de métodos clandestinos para investigar/obter informações sigilosas, mas de interesse público, seja rejeitado pela maioria (64,9%). As respostas por grupo permitiram um outro olhar: os estudantes mostraram-se mais ousados do que os jornalistas profissionais no que se refere à invasão de privacidade: enquanto 37% dos últimos admitiram a invasão de privacidade, os primeiros saíram à frente com 53,7% das respostas. Os estudantes também demonstraram uma maior aceitação dos métodos clandestinos nas repostas individuais: “a moralidade da fraude é inversamente proporcional à imoralidade do crime e ao valor-notícia do fato” para 60% dos estudantes e 25% dos jornalistas. Tão contraditórias são as respostas como o é o próprio Código quando diz que o jornalista não pode divulgar informações “obtidas de maneira inadequada – como o uso de identidades falsas, câmeras escondidas ou microfones ocultos – a, salvo em caso de esclarecimento de informações de relevante interesse público e quando esgotadas todas as possibilidades que o profissional possa recusar o seu uso.” (Artigo 12º, inciso III, grifo nosso) Ficaria por conta do arbítrio, do bom senso ou de que outra instância a decisão do limite dessa linha fina? No que refere-se à ação da imprensa na formação e orientação da opinião pública , os respondentes dividiram-se entre o dever de apenas noticiar com relatos objetivos e emitir interpretação e opinião em suas reportagens: 53% das respostas gerais reivindicavam informações objetivas e imparciais, enquanto 47% reclamavam um papel mais ativo para o jornalista (nas respostas por grupo, os estudantes demonstraram-se mais propensos a defender essa posição). Mas o mesmo não ocorreu quando foi perguntado se o jornal deveria ou não declarar sua posição política: nas respostas gerais a maioria dos respondentes (75,2%) disse “não, o jornalismo deve ser neutro para melhor servir o interesse público” e apenas 24,8% disse “sim, seria o mais honesto comportamento para com os leitores”. Também nas respostas por grupo, apesar de um 35 maior equilíbrio entre esses dois pólos, tanto jornalistas profissionais quanto estudantes de jornalismo e o grupo “outro” apresentaram maior inclinação para o apartidarismo e a imparcialidade. Contraditório? Talvez não, se interpretarmos essas respostas como uma repulsa dos jornalistas e estudantes ao jornalismo partidário, mas não ao jornalismo engajado na causa social. O desprezo, aqui, parece ser à política partidária, à possível manipulação do jornal pelos ideais do partido, não à ação concreta no meio social para o benefício dos cidadãos. Os jornalistas e estudantes entrevistados, no entanto, queixaram-se de falta de liberdade criativa para exercer seu trabalho. Tanto nas respostas gerais quanto nas repostas por grupo, a maioria dos entrevistados disse que a liberdade do jornalista é limitada pela linha editorial do jornal e pelas forças do mercado. Os estudantes parecem cientes do futuro que os aguarda, mas entre este o fatalismo parece mais exacerbado: nas respostas por grupo, enquanto 33,3% dos profissionais disseram que o “jornalista é escravo do seu trabalho”, esse número sobe para 66,7% entre os estudantes. Tanto para uns quanto para outros, bem como para o grupo “outros”, entretanto, assim a qualidade do jornalismo praticado é razoável ou de boa qualidade (85% das respostas totais). A este respeito, o Código de Ética é vago. O artigo 14 computa à cláusula de consciência quando diz que o jornalista pode se recusar a executar uma atividade jornalística que confronte com os princípios previstos no presente Código, ou que agrida as suas convicções filosóficas ou morais, desde que isso não seja argumento, motivo ou desculpa para não ouvir pessoas com opiniões contrárias às do próprio profissional. Sabe-se, entretanto, o destino de quem se insurge contra as ordens da direção, bem como os caminhos para burlar a vigilância da hierarquia, o que será discutido à diante. O curioso, nisso tudo, é a certeza de que o jornalista não cumpre seu código de ética (opinião de 86,2% dos entrevistados nas respostas totais). A desconfiança maior a este respeito está entre os estudantes: 48% de estudantes críticos contra 31% de jornalistas igualmente desacreditados dos colegas. Só quem parece acreditar nos jornalistas é o grupo “outros”, que, para nós, parece representar o público servido com a notícia produzida nas redações. 3 – Pensando os resultados Observa-se nos resultados da pesquisa de campo realizada em Quissamã/RJ a disparidade nas respostas de jornalistas e estudantes de jornalismo no que se refere à visão do papel da profissão e do relativismo das regras deontológicas. O único consenso entre os dois grupos parece ser a desconfiança quanto à observância do código de ética pelos membros da categoria e o sentimento de limitação criativa para a realização do seu trabalho imposta pela linha editorial do veículo, a rotina e as leis do mercado. Aparentemente, o conservadorismo e a ousadia não possuem a mesma natureza em um grupo e em outro. Entre os estudantes, a reserva é reflexo, aparentemente, de um humanismo que exige o respeito à integridade do homem, cuja miséria não deveria ser exposta na primeira página de um jornal; entre os profissionais, a reserva forma um campo de proteção ao departamento editorial, ao poder que só eles detém de dizer o que é notícia, por exemplo, quando o assunto é a possível interferência do departamento comercial. A reserva também aparece na possibilidade do uso de métodos clandestinos para obtenção da notícia de interesse público, talvez mais por receio de processos judiciais e das conseqüências de iniciativas dessa natureza do que por respeito à privacidade e à dignidade das pessoas investigadas, já que essa preocupação com o “personagem” da história não aparece quando é momento de decidir se ele vai ou não para a primeira página ou as chamadas principais com uma abordagem negativa. 36 A ousadia dos estudantes, que querem do jornalismo uma ação política mais intensa e direcionada para a (in) formação da opinião pública, que defendem métodos mais incisivos de apuração, sempre em nome da “descoberta da verdade”, que acredita existir diversidade de interesses entre jornalismo e assessoria de imprensa, de fato não se assemelha à dos profissionais, que celebrariam altas vendagens de um impresso por conta da exibição de uma imagem grotesco-apelativa na capa. Estes são apenas alguns exemplos de que a prática da profissão parece, sim, moldar a moralidade dos que a exercem , e não o contrário, e indica que se faz útil repensar as motivações que impulsionam a atividade jornalística hoje. Refletindo sobre as respostas dos que integram o grupo 3 (“Outro”), por sua vez, percebemos que o perfil destes parece aproximar mais de um público que recebe as informações e que está, portanto, do outro lado do processo produtivo da notícia. São, os “outros”, os que conferem aos jornalistas profissionais o papel de informar os acontecimentos com objetividade, imparcialidade, correção e ética; são estes os que acreditam que a produção da notícia é um processo ético; são os que desejam ser esclarecidos com relação às preferências políticas do veículo preferido; são os que acreditam que os jornalistas observam seu código de ética – justamente o pacto de confiança que torna a profissão possível e aceita socialmente. Esta pesquisa mostrou, ainda que de modo limitado, que algo acontece entre a Academia e a prática sistemática da profissão de jornalista, passando por um público que acredita nos agentes do jornalismo, ainda que restritamente. A inobservância da deontologia, quando ocorre, é justificada pela necessidade de sobrevivência, pessoal e empresarial. O código de ética é reconhecido como um valor, mas torna-se relativo quando pregado no alto das metas nunca atingidas, tidas como utópicas. O “bom jornalismo” é aquele considerado pelo pelos próprios jornalistas e pelo público como o que consegue acertar no atendimento das demandas da sociedade por informação, mostrar “a verdade” do acontecer, oferecer um leque de leituras do mundo, dar respostas, sem constrangimentos além daqueles auto-impostos pela consciência, por aquilo que o jornalista acha que é certo e que a sociedade merece ou está pronta para saber. Embora reivindique sua autonomia de pensar e dizer, isto não implica a negação em produzir acordos ou conciliações. As discussões filosóficas a respeito do “bom jornalismo”, ou, mais precisamente, as reflexões éticas , ficam restrita aos congressos, reuniões sindicais, eventos como o Encontro Regional de Jornalistas onde os questionários foram aplicados: ao ambiente acadêmico e aos casos em que a legitimidade da liberdade de imprensa e a ética jornalística são questionadas nos meios de comunicação, provocando lampejos de mobilização de parte da sociedade e da categoria e provocando a opinião dos intelectuais. Tais atividades são fundamentais: servem como ritual reforçador do princípio ético diante das demandas, por vezes pouco éticas, do princípio de realidade. No cotidiano das redações e da “rua”, a preocupação inscreve-se em outra seara: na da boa informação como produto bom para ser consumido, isto é, vendido sem inventar, mentir ou omitir em demasia. A velocidade em que se movimentam as redações exige a notícia em tempo real, não a reflexão ética; nem muito menos exige um projeto de longo prazo comprometido com uma sociedade melhor, formada por homens e mulheres melhores, porque mais bem informados, porque mais esclarecidos, porque mais conscientes do seu poder de decisão e da sua ação no mundo. Se esse projeto “de longo prazo” não existe, nem por isso o jornalismo deixa de ser jornalismo ou abre mão de seus preceitos éticos: a cada edição a proposta de informar o melhor possível parece se renovar quando a publicação procura atingir 37 através das reportagens uma representação da vida, do mundo que acontece, mesmo que a partir do seu próprio olhar, que nem é tanto seu, mas de uma sociedade consensual, que lhe molda. Não podemos esquecer que, nela, o mundo dos negócios e do trabalho ocupa um lugar de destaque. Referências ALDÉ, Alessandra; et. al. Critérios jornalísticos de noticiabilidade: discurso ético e a rotina produtiva. 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Palavras-chave: A Muralha, Minissérie, Adaptação 1 – Introdução A adaptação da literatura para o meio imagético implica a produção de signos interpretantes gerados numa mente tradutora ou intérprete, durante o processo de releitura da obra. O novo texto contém elementos sígnicos inseridos em seu interior que referenciam a obra original, mas a tradução intersemiótica consiste no surgimento de uma outra obra, ou seja, uma transcrição. A transposição inclui uma série de transformações de linguagem que constitui uma ruptura estrutural no texto literário, modificando sua forma. Por isso, aproximações e deslocamentos são os termos mais adequados para explicar os processos pelos quais uma obra literária é submetida a outra linguagem, neste caso, a televisiva. Freitas; Oliveira; Francis (2004) destacam os fenômenos decorrentes da passagem do signo verbal para o visual. Citando o Palimpsestes de Gerard Genette (1982), as autoras nomeiam o processo de entrelaçamento de textos de "transtextualidade": o trânsito intertextual realizar-se-á a partir da capacidade do leitor em reconhecer as marcas ou, simplesmente, os vestígios dos textos, para poder então estabelecer as conexões entre eles. As autoras também dão relevo à contribuição de Yannick Mouren (1983) no entendimento da adaptação da literatura para o meio imagético. Esta aconteceria em três níveis: na narrativa, na história (como sucessão de acontecimentos) e, ainda, nas personagens. Uma outra mudança ainda pode ser admitida: de acordo com as necessidades e a vontade do cineasta, o tempo e/ou espaço podem ser deslocados. Neste caso, pode-se deslocar uma história antiga num contexto mais atual ou vice-versa. Em “A Muralha”, em estudo neste trabalho, o tempo foi deslocado para o passado. Há ainda mudanças no nível pragmático (da história), estas consideradas mais freqüentes, podendo estar ligadas a fatores econômicos ou a questões artísticas que a nova obra venha a exigir. (MOUREN, 1993, p. 114-110 apud FREITAS; OLIVEIRA & FRANCIS, op. cit.) Percebe-se que, nesta análise, os conceitos e citações são referentes à adaptação da literatura para o cinema, onde encontramos vasta bibliografia. No entanto, sabe-se que tais conceitos e citações podem ser aplicados à obra televisiva (objeto de pesquisa deste trabalho), porque cinema e televisão são mídias correlatas. No que concerne às minisséries brasileiras, podemos analisá-las pelo viés do sucesso e qualidade técnica das novelas nacionais, que, praticamente, nasceram com a televisão. (HAMBURGER, 1998, p.139). 40 Quando as novelas atingiram seu apogeu técnico e de audiência, a Rede Globo de Televisão começou a produzir minisséries. A primeira foi “Lampião e Maria Bonita” (1982). Dessa época para os dias de hoje, com apurada qualidade técnica e bons elencos, a emissora acumulou vários sucessos explorando este gênero da teledramaturgia. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística/IBGE (2001), dos 5.506 municípios brasileiros, 93% não possuem sala de cinema, 85% não têm museus e teatros e 25% não possuem sequer bibliotecas. Por outro lado, o Brasil conta com canais de televisão que cobrem cerca de 98% do território nacional e aproximadamente 145 milhões de telespectadores. Não é difícil, portanto, presumir que a televisão reina absoluta no acesso à cultura, lazer e informação de grande parte da população brasileira, devido a suas peculiaridades históricas e culturais. Assim como a literatura pode nos levar a pensar a sociedade, a televisão também tem essa capacidade. Podemos afirmar que ela traz elementos para pensar as relações sociais, pois, por meio dela, vêem-se representados traços que caracterizam tais relações, como a cordialidade, o “jeitinho brasileiro”, a valorização do corpo, as paixões pelo carnaval e pelo futebol, entre outros aspectos que ressaltam a inserção de seus produtores numa teia de relações sociais que caracterizam o país, e a internalização de valores que acabam aparecendo na elaboração dos programas. As possibilidades dos textos literários adaptados para a televisão são múltiplas, desde o texto de partida ao veículo de chegada, ou seja, a tradução intersemiótica de uma obra pode gerar um re-criador, um teledramaturgo que ofereça à grande audiência de TV uma oportunidade única de ver uma grande obra dramática. Ao todo, a Rede Globo já produziu mais de oitenta minisséries. Vale ressaltar que, das minisséries produzidas de 1984 até janeiro de 2007, trinta e três foram feitas tendo por base textos literários, a maioria de autores do século XX. Destas, vinte e oito produções foram baseadas em autores brasileiros. De certa forma, é possível perceber que há uma preferência por títulos nacionais e autores conhecidos do grande público. Assim, a mídia televisiva consegue quebrar paradigmas, transmutando valores, mas sem descaracterizar, na maioria das vezes, o fazer literário. “O que os textos da mídia oferecem não é a realidade, mas uma construção que permite ao leitor produzir formas simbólicas de representação da sua realidade com a realidade concreta.” (GREGOLIN, 2003, p.97). 2 A Muralha: o livro e a minissérie O livro “A Muralha”, escrito por Dinah Oliveira Queiroz, foi publicado em 1954, em comemoração ao IV centenário da fundação da cidade de São Paulo. A obra, circunstanciada em 1708, é uma saga que conta a história dos bandeirantes e da fundação da cidade. Antes do lançamento, o livro foi publicado em capítulos na revista “O Cruzeiro”. O gênero literário em questão é o romance épico. Queiroz recria a infância turbulenta e impressionante do povo brasileiro — e dos paulistas, mais especificamente — “num contexto de paixões e sucessos violentos em um cenário copioso e colorido”, como comenta Rachel de Queiroz, na contra capa do livro. A paisagem e os costumes, a família paulista da época, as lutas dos homens na selva e a busca do ouro, que a terra não se preocupava em ocultar, são recriadas pela autora. Os personagens são fortes: enérgicas mulheres, índios, mestiços, escravos, padres, mercadores judeus, senhores e aventureiros que vão moldar o esboço de uma nação. 41 A técnica literária de Queiroz, os diálogos, o ritmo das cenas, o modo de ser dos personagens têm um caráter de objetividade e realidade que fascinam o leitor, mesmo tendo a autora usado linguagem de época. E, exatamente por essas características, talvez tenha, também, chamado a atenção dos produtores de TV. Dentro de uma profusão de personagens, destaca-se Cristina, a noiva vinda de Portugal para casar-se com um primo desconhecido, numa terra selvagem e estranha. Mas é ela, na sua aparente fraqueza de moça da corte, sem entender bem os costumes do novo mundo, que se fortalece durante a narrativa e é o personagem central do romance. Vale assinalar que a presença da força feminina na literatura tornou-se uma demanda necessária a partir do momento em que o movimento feminista evidenciou o caráter de construto social da inferioridade feminina, o que até então era considerado algo natural e indiscutível. Falar sobre gênero é abordar algo social (LOURO apud CONFORTIN, 2003, p. 109). O estudo de gênero mostraria que, em “A Muralha”, há a intenção de se desconstruir a representação tradicional do feminino, contraponto a do masculino, entendendo que homens e mulheres são socialmente produzidos pelo discurso patriarcal dominante e também por doutrinas, por imagens e por símbolos presentes nas diferentes culturas. Os fatos e personagens do livro nos remetem a uma possibilidade de entendimento da história do Brasil, que não a oficial. Até então, os bandeirantes eram apresentados somente como heróis, que desbravaram os sertões do Brasil. Em “A Muralha”, percebemos uma outra face destes homens, sua crueldade extrema, preconceito e ganância. A escritora desconstrói a imagem romântica e heróica dos desbravadores. Ao lado da dureza e rusticidade mostra também homens temerosos da morte iminente, religiosos, que não iniciavam uma expedição sem a participação de um padre, mas com conceito moral dúbio. Mesmo achando que os nativos não eram gente, tinham relações sexuais com as índias e levavam os filhos bastardos para serem criados pelas esposas. “A Muralha”, adaptada por Maria Adelaide Amaral, João Emanuel Carneiro e Vincent Villari, e dirigida por Denise Sarraceni, baseada no romance, foi produzida pela Rede Globo e exibida em 2000, em comemoração aos 500 anos do descobrimento do Brasil. A minissérie rendeu para a emissora uma audiência fantástica. Foram 37 pontos de média e 40 de pico, segundo a medição do IBOPE. Diferentemente do livro, na minissérie a história se passa cem anos depois que Pedro Álvares Cabral e suas caravelas aportaram no Brasil, uma época em que a principal preocupação era sobreviver e os bandeirantes eram os donos da terra, apesar das leis do Reino de Portugal e dos jesuítas, que tentavam catequizar os índios e livrálos dos bandeirantes, que os escravizavam. O choque entre os paulistas, que conquistavam terras e minas e os forasteiros de diversas procedências, que queriam se apossar delas, era inevitável. A “muralha” é uma alusão à serra compreendida como obstáculo às incursões dos bandeirantes, nas suas buscas de novas terras e riquezas. Na fazenda Lagoa Serena, situada nos arredores da Vila de São Paulo, rodeada pela "muralha" e desbravada pelos bandeirantes, mora Dom Braz Olinto (Mauro Mendonça), líder de uma bandeira, sua mulher, Mãe Cândida (Vera Holtz) e seus filhos: Basília (Deborah Evelyn), casada com Afonso Góes (Celso Frateschi), um bandeirante, Tiago (Leonardo Brício), Rosália (Regiane Alves) e Leonel (Leonardo Medeiros), que vive com a esposa Margarida (Maria Luísa Mendonça). Há, ainda, uma sobrinha, Isabel (Alessandra Negrini), que, na verdade, é sua filha bastarda, e um sobrinho, o mestiço Aimbé (Enrique Diaz). Ao redor dessas personagens flui toda a trama, iniciada com a chegada de outra sobrinha de Dom Braz, Beatriz (Leandra Leal), vinda de Portugal. Vem ao Brasil para 42 casar-se com Tiago. Mas a jovem portuguesa terá de disputá-lo com Isabel, o braço direito de Dom Braz, que o acompanha em suas bandeiras, uma menina que foi criada entre o convívio da família e dos índios, entre eles Apingorá (André Gonçalves), Tuiú (Patrick de Oliveira) e Parati (João Pedro Roriz), moldando-se, assim, um personagem com um temperamento arredio e selvagem. Na trama haverá também, o conflito gerado por Rosália, ao se apaixonar por um inimigo de Dom Braz, o aventureiro e traidor Bento Coutinho (Caco Ciocler). Junto com Beatriz, chegam ao Brasil novos personagens que comporão o cenário típico da época: padre Miguel (Matheus Nachtergaele), que auxiliará o Padre Simão (Paulo José), jesuíta da Companhia de Jesus, na catequização dos índios, e que terá que resistir aos encantos da índia Moatira (Maria Maya), apaixonada por ele; dona Antônia (Claudia Ohana), uma ex-cortesã que vem ao Brasil em busca de um bom casamento; dona Ana (Letícia Sabatella), uma judia que foge dos horrores da Guerra Santa e vai viver sob a tutela de Dom Jerônimo Taveira (Tarcísio Meira), com quem tem uma dívida moral a pagar, Dom Jerônimo, irmão de um inquisidor, livrou da morte o pai de Dona Ana em Portugal. Inimigo de Dom Braz Olinto, Jerônimo é um comerciante que sabe ser canalha e fingido diante das autoridades, mas não as respeita; é “carola” frente aos padres, mas na realidade é um homem pervertido, cruel e obsceno. 3 Análise da adaptação A minissérie “A Muralha”, adaptação livre do livro homônimo de Dinah Silveira de Queiroz demonstra as inúmeras possibilidades do dialogismo entre literatura e mídia televisiva. Na análise da obra em tela, percebe-se que inúmeras aproximações e deslocamentos foram realizados. Novas situações, personagens, nomes e tramas foram introduzidos como, por exemplo: na minissérie, Cristina, a noiva que veio de Portugal, passa a chamar-se Beatriz; junto com ela, no navio, vieram a judia, Dona Ana Cardoso, o padre jesuíta Miguel e mais dois personagens que não estão na narrativa literária. Dona Ana, D. Jerônimo Taveira, outro personagem criado pela autora da minissérie, e Dom Guilherme Sheter, que no livro é Dom Guilherme Saltão, formam um núcleo de destaque na obra televisiva de grande apelo dramático. As aproximações e deslocamentos são evidenciados nas treze horas da minissérie. Mas, para maior objetividade deste trabalho, selecionamos situações e personagens que julgamos paradigmáticos para a análise da obra em perspectivas literária e televisiva. Na escritura de Queiroz, Dom Guilherme tem participação curta, mas, na minissérie, é pivô de uma das maiores transmutações de personagens do romance. A cena que se passa com Dona Ana na minissérie, no livro acontece com Cristina (Beatriz, na adaptação), por exemplo : Cristina ali ficou, a garganta aquecida e abafada, inerte. Na confusão de sombra, e de luz viva, viu Dom Guilherme passar, inteiramente nu, abraçado a duas índias também despidas. Em seguida, pelo quadro de lume desigual, passou um grupo ruidoso de índias nuas, com seus gritos e risos de meninas. (QUEIROZ, 2000, p. 28). Na minissérie há um ataque a uma aldeia indígena, pelos bandeirantes comandados por D. Braz Olinto, com participação de aventureiro Bento Coutinho. Não há referência a esse ataque no livro, e nem a participação de Bento Coutinho, que apenas fala do caráter de D. Braz, numa das conversas que tem com Rosália, sua esposa e filha do bandeirante: 43 – Não quero que vosmecê brinque, falando desta maneira. Afinal qual é o meu crime? De me acusam? De tomar à força escravos alheios? Mas seu pai também não pegou índio, não fez escravidão proibida? E tanto faz tomar gente da casa alheia, como em suas próprias casas no mato. (QUEIROZ, 2000, p. 197) Um dos personagens mais fortes da minissérie, D. Jerônimo Taveira, inimigo de D. Braz Olinto, não existe no livro, mas há referência a certo padre que financiou a expedição em busca de ouro: “depois de uma espera que lhe pareceu infindável, mas, que na verdade, foi apenas de uns poucos dias, Padre Pompeu voltou, com grande presteza fez a Leonel o empréstimo, já antes assegurado em carta a Dom Braz” (QUEIROZ, 2000, p. 229). O empréstimo e a referência à riqueza de Padre Pompeu sugere que ele era um padre diferente dos jesuítas, mas sua semelhança com D. Jerônimo é somente essa. O personagem representado por Tarcísio Meira na minissérie é rico, avarento, amoral, não é padre, mas, sim, um quase beato e inimigo de D. Braz Olinto. D. Jerônimo, além disso, é um personagem que permite a Maria Adelaide Amaral introduzir a inquisição portuguesa no enredo, cuja participação não é, sequer, citada na obra de Queiroz. Deslocamentos, aproximações e ajustes de cenas, personagens e situações são encontrados ao longo de toda a minissérie. Pode-se observar, por exemplo, que acontece uma grande aproximação entre a obra em livro e a obra em tela no que se refere ao encontro de Cristina (Beatriz) com Tiago Olinto. A situação é semelhante à do livro, mas quem foge de cumprimentos, na trama literária, é a moça e não Tiago, como na minissérie. Aculturado pelos bandeirantes, o índio Apingorá participa de muitos capítulos da minissérie, mas é alvo de um deslocamento temporal e de adequação de personagem. Ele está presente desde o primeiro capítulo, no ataque dos bandeirantes a uma aldeia indígena até sua morte pelas mãos de Leonel, um dos filhos de D. Braz Olinto. Na obra literária, é citado poucas vezes, quais sejam: a primeira num diálogo entre mãe Cândida e D. Braz, referindo-se à gravidez de Isabel: Então mãe Cândida disse, sem uma lágrima: – Já faz tempo que eu, todas as manhãs eu fazia um esforço para contar... Eu sei quem foi o culpado. – Então tu soubeste e não me dissestes, para que eu punisse o infame? – Isabel disse... Vosmecê havia saído com outros homens e foi apanhada de surpresa por Apingorá. Isabel custou muito a me dizer esta vergonha. Queria manter segredo. Jurava que a culpa fora da bebida. Ela havia tomado demais e não tinha certeza.... Mãe Cândida mal podia dizer a palavra – Não tinha certeza ter sido... forçada. Dom Braz pensou em Apingorá, aquele índio, aquele filho de chefe, seu escravo, que tivera em sua fazenda, e que aprendera até a ler com os padres, graças a sua benemerência. Desfrutara depois, da liberdade e até fundara uma aldeia. (QUEIROZ, 2000, p.179) 44 No quarto capítulo do livro, nas páginas 183 a 186 e 229 e 234, o índio aparece pela segunda vez, na voz narrativa e nos pensamentos de Leonel Olinto. O momento mais significante é o de sua morte, quando, então, a minissérie aproxima-se, contundentemente, do livro: À frente da primeira casa, um moço moreno ensinava um velho, como se preparava o couro de boi. Estavam os dois emprenhados no serviço, quando ouviram o chamado: – Apingorá! O índio voltou com rosto alegre e festivo, ao reconhecer a voz de Leonel. Um tiro estrondou. Apingorá caiu, com a fisionomia ainda marcada pela descoberta feliz do seu companheiro branco dos dias antigos. (QUIEROZ, 2000, p.185) A guerra (termo sempre usado por Queiroz), não tem lugar na mina de Morro Negro, e sim na estrada durante a retirada dos bandeirantes, que acabam se rendendo às tropas de Bento Coutinho. O aventureiro aceita a rendição, promete garantia de vida aos bandeirantes e fugitivos agregados a estes, mas recua quando recebe a notícia, por meio de um escravo mensageiro, de que foi abandonado pela esposa Rosália, filha de D. Braz Olinto. Inicia-se, então, um grande massacre do qual poucos bandeirantes e fugitivos escapam. A minissérie desloca o ataque para a mina de Ribeirão Dourado e tem a participação de D. Jerônimo Taveira. Outros personagens são introduzidos na batalha, como Rosália, que vê o pai morto e o sangrento resultado da contenda. No livro, a batalha pela posse da mina está nos momentos finais da história, que são marcados pelos episódios de Rosália ferindo Bento Coutinho à faca e voltando para Lagoa Serena; pela volta de Tiago Olinto ferido e rejeitado inicialmente pela mãe; pela descoberta da gravidez de Beatriz, quando está atravessando a serra, determinada a voltar para Portugal; pela decisão de Isabel em deixar o filho com Beatriz e ir embora. Em todos estes episódios existem aproximações e deslocamentos. Na minissérie Bento Coutinho é morto a tiro de espingarda, quando vai á Lagoa Serena em busca de Rosália. A volta de Tiago aproxima-se da narrativa literária, mas a gravidez de Beatriz é revelada em Lagoa Serena. “A Muralha”, em sua versão literária, termina com a revelação da gravidez de Cristina (Beatriz), em meio à mata da serra que dá nome à obra literária de Dinah Silveira de Queiroz. A minissérie continua e desloca-se para o personagem de D. Jerônino Taveira, que enlouquece, e investido do poder de um inquisidor, prende sua esposa, a judia D.Ana e D. Guilherme Saltão( par romântico que está em fuga para a Argentina). Outros personagens que vão defender o par romântico, como Padre Miguel, Mestre Davidão e sua futura esposa, Dona Joana Antônia, também são presos e levados a julgamento nos moldes da Inquisição da Igreja Católica. O julgamento em praça pública, com as fogueiras acesas para queimar os hereges, é de um grande impacto visual, próprio da tecedura ficcional televisiva e não deixa de ser antológica a cena final em que D. Jerônimo, enlouquecido, vê seu pai chamando-o, entra em uma das fogueiras destinada a queimar os que ele considerava hereges, e termina morrendo queimado. Este final da minissérie é uma recriação da autora Maria Adelaide Amaral. Os deslocamentos acentuam-se mais do que as aproximações, o apelo aos parâmetros da teledramaturgia são mais fortes do que na narrativa literária. Como em todo folhetim televiso, os pares românticos se acertam. Há o casamento de dona Antônia com mestre Davidão, fato que na obra de Queiroz, acontece nos primeiros 45 capítulos. Leonel, filho de D. Braz Olinto, volta à Lagoa Serena; nasce o filho de Beatriz (Cristina) e Tiago. Bento Coutinho é morto por Basília Olinto, quando vai procurar Rosália na fazenda. Padre Miguel é expulso da congregação Jesuíta por padre Simão se transforma em curandeiro, indo viver numa aldeia indígena. O final é emblemático e ufanista. Os filhos de D. Braz partem para mais uma expedição, desta vez acompanhados por Beatriz (Cristina), levando o filho recémnascido e também o filho de Isabel, que foi embora e deu o menino para ser criado pela prima e esposa de Tiago Olinto. Isabel se transforma em uma onça pintada e o grand finale é Beatriz, Tiago Olinto e o filho, no alto de uma montanha com vista para o esplendor da nova terra a ser conquistada: Beatriz diz: – Meu Deus que vastidão! Tiago: – Que esta terra seja mais afortunada para nossos filhos do que tem sido para nós. Beatriz: – A terra sempre será a mesma e nós também seremos os mesmos, movidos até o fim pela esperança, de que um dia esta terra possa ser melhor. A minissérie “A Muralha” termina dentro dos padrões televisivos, com um longo beijo entre Tiago e Beatriz. 4 Considerações finais A minissérie é um gênero da teledramaturgia relativamente novo se comparado às novelas. Explorado principalmente pela Rede Globo, trouxe para a mídia televisiva uma massificação da adaptação de obras literárias, prática pouco explorada pelas novelas. Por enquanto, a Rede Globo domina a produção nacional do gênero, conseguindo grande sucesso na maioria das adaptações. Concluímos que são possíveis adaptações da literatura para o meio televisivo com todas as aproximações, deslocamentos e transmutações desde que autor (roteirista), respeite os vestígios, as marcas da obra original. Entendemos, inclusive, que isso ocorreu na obra em estudo neste trabalho. A versão cinematográfica ou televisiva de uma obra literária é uma recriação, uma outra obra, que não tem obrigação de ser necessariamente fiel ao original. A linguagem audiovisual, tendo como base a literatura ou não, tem dado, neste século de existência, uma enorme contribuição ao acervo do conhecimento humano. Não é necessário, aqui, lembrar de como a televisão contribuiu para compartilhar as diferentes visões de mundo, de diferentes épocas e países. Assim, é importante entender a dramaturgia como um laboratório social porque é por meio dela que pesquisaremos e aprofundaremos as nossas relações com o social. É na sua produção cultural que um povo se reconhece e, se reconhecendo, pode se transformar. Em “A Muralha”, ou em qualquer obra adaptada, a narrativa audiovisual, por melhor que seja não substitui a importância e o prazer da leitura. Só a leitura produz escritores e até bons adaptadores e roteiristas. A televisão cria imagens, a leitura facilita a imaginação. Referências bibliográficas A MURALHA. Direção: Carlos Araújo. Produção Rede Globo de Televisão, 2000, 46 3 DVDs CONFORTIN, Helena. Discurso e gênero: a mulher em foco. In: Representações do Feminino. Campinas: Editora Átomo, 2003. FREITAS, Norma de Siqueira, OLIVEIRA, Maria de Lourdes Abreu de, FRANCIS, Paulina. Luzia Homen, a Donzela Guerreira. Transformar 2004, nº. 2. Revista do Centro de Estudos da Fundação São José, Itaperuna-RJ. GREGOLIN. Maria do Rosário. Discurso e Mídia: a Cultura do Espetáculo. São Carlos: Claraluz, 2003. HAMBURGER, Esther. Diluindo fronteiras: a televisão e as novelas no cotidiano.In História da vida privada no Brasil - vol. 4 . São Paulo: Cia das Letras, 1998. Resultado do Censo 2001. Disponível em http://www.ibge.gov.br. Acesso em 19/07/2007. QUEIROZ, Dinah Silveira. A Muralha. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2000. 47 EDUCAÇÃO CORPORATIVA X ASSOCIAÇÃO OU COMPETIÇÃO? EDUCAÇÃO FORMAL: LEÔNIDAS CRESPO DE GODOY Resumo Este artigo objetiva analisar as razões que têm motivado o surgimento de diversas universidades corporativas e as possibilidades que estas apresentam. A pesquisa traça um paralelo com a atuação das chamadas universidades tradicionais, a fim, de verificar a possibilidade de competição, ou até mesmo de associação das práticas existentes. A discussão proposta incendeia-se devido o avanço tecnológico na área de ensino e pesquisa e as grandes transformações proporcionadas por ele nas áreas de telecomunicação e computação. Desta forma, buscou-se na revisão bibliográfica apresentar a fundamentação deste artigo. Verificar-se-á que não existe um consenso entre os teóricos sobre o futuro das universidades corporativas e tradicionais, tendo em vista, que dependerá da forma de atuação de cada uma, que definirá se serão capazes de se adaptar às novas contingências desta sociedade do conhecimento. Palavras-chave: Tecnológico. Universidade Corporativa. Universidade Tradicional. Avanço 1 INTRODUÇÃO O ritmo acelerado imposto pela globalização e a tecnologia nos últimos anos levou muitas empresas a refletirem sobre a necessidade de preparar seus colaboradores de acordo com suas exigências, criando um processo de aprendizado contínuo. A resposta encontrada a essa demanda foi a Universidade Corporativa (UC), definida por Meister (1999, p.8) como “um guarda-chuva estratégico para o desenvolvimento e a educação de funcionários, clientes e fornecedores, buscando aperfeiçoar as estratégias organizacionais, além de um laboratório de aprendizagem para a organização de um polo permanente”. O rápido crescimento das UC cria possibilidades concretas de realização da teoria da “escola empresa”, mas traz também uma grande questão: a UC é uma ameaça ou uma oportunidade de unir a qualidade em educação das universidades tradicionais com a capacidade de inovação das universidades corporativas? Diante do rápido crescimento das UCs no Brasil, criando uma alternativa ao processo de ensino dos profissionais, a Universidade Tradicional (UT) enfrenta o dilema de descobrir se está diante de uma ameaça ou de uma oportunidade. O grande desafio para a universidade tradicional é o de se adequar a este novo cenário, se unindo as UCs e criando uma parceria que beneficie o empregado, a corporação e a instituição de ensino. 2 EDUCAÇÃO CORPORATIVA NO BRASIL A Universidade Corporativa (UC) teve origem nos Estados Unidos da América (EUA), na empresa General Eletric (GE), por volta de 1955, quando surgiu o entendimento que era necessário preparar o funcionário para atender especificamente as 48 necessidades da corporação, oferecendo, então, cursos que buscavam criar expertise nos colaboradores, além de desenvolvimento constante. No Brasil, a UC teve seu início nos anos 1990, com a criação das primeiras instituições, nos moldes americanos, impulsionadas pela alta competitividade do mercado e com o objetivo de preencher as lacunas de conhecimento existente nos funcionários. Para alguns autores, as universidades corporativas representam uma evolução dos departamentos de treinamento e desenvolvimento (T&D). No entanto, além da mudança de foco dos meios que essas instituições utilizam para dar respostas às organizações em que atuam, percebe-se a verdadeira revolução nos seus fins. As UC’s não se apresentam como substitutas dos departamentos de T&D porque elas não são vistas como T&D. Haja vista que ela muda da plataforma de suporte logístico para a esfera estratégica. Por trás disto está a crença, sobretudo da alta administração, no papel do elemento humano na consecução dos negócios e na sua capacidade em aprender, além de outras importantes diferenças entre os dois modelos, conforme podemos verificar no quadro abaixo: QUADRO 01 – Treinamento Tradicional x Universidade Corporativa Reativo Foco Pró-ativo Fragmentada e descentralizada Organização Coesa e centralizada Tático Alcance Estratégico Pouso/nenhum Endosso/responsabilidade Administração de funcionários Instrutor Apresentação Experiência com várias tecnologias Diretor de treinamento Responsável Gerentes de unidades de negócio Público-alvo amplo / Profundidade Audiência Currículo personalizado por famílias de limitada cargo Inscrições abertas Inscrições Aprendizado no momento certo Aumento das qualificações Resultado Aumento do desempenho no trabalho Opera como função administrativa Operação Opera como unidade de negócios (centro de lucros) Imagem “Vá para o treinamento” “Universidades como metáfora aprendizado” Ditado pelo departamento de Marketing Venda sob consulta treinamento Fonte: Possato (2002, p. 33). Segundo Veloso (s.d.), o desenvolvimento de universidades corporativas foi influenciado: [...] pela rápida obsolescência da informação; capacidade de desenvolver novas competências para estar em condições de atender as contínuas exigências e desafios impostos no mercado de trabalho; formação global, evidenciando-se a necessidade de formar pessoas com visão global e perspectiva internacional dos negócios. Além destes fatos, soma-se o grande avanço tecnológico, tanto no campo da informática (softwares e hardwares), quanto no campo da telecomunicação (internet e intranet). 49 de Assim, as universidades corporativas chegam ao século XXI expostas como um forte instrumento de qualidade e gerador de competitividade, agregando ao desenvolvimento dos talentos humanos as estratégias empresariais. As primeiras instituições de educação corporativa implantadas no Brasil foram nas empresas: ACCOR, no ano de 1992, BRAHMA, em 1995 e ALGAR, em 1998. Abaixo o Quadro 02 lista algumas das empresas que possuem instituições de educação corporativas em nosso país. Para Ferronato (2005), essas empresas estão transformando suas salas de aula em infraestrutura de aprendizagem corporativa, cujo o objetivo é desenvolver maneiras de alavancar novas oportunidades, entrar em novos mercados globais, criar relacionamentos mais profundos com os clientes e impulsionar a organização para um novo futuro. O quadro abaixo lista algumas das empresas que possuem UC's no Brasil. O autor (2005) menciona, ainda, que essas empresas transformaram suas salas de aula em infraestrutura de aprendizagem corporativa, visando a desenvolver formas de otimizar oportunidades, alcançar novos mercados, criando relacionamentos mais profundos com os clientes e impulsionando a corporação para um novo futuro. QUADRO 02 – Lista de empresas que possuem instituições de educação corporativa no Brasil B C D E A Abrange Banco do CEF Datasul Elektro Abril Brasil Carrefour Eletronorte Dpaschoal Accor BankBoston Citibank Elma Chips Alcatel BNDES CNI-IEL Embraer Alcoa Bompreço Coca-Cola Embratel Algar BIC Correios Embasa Ambev Bermatech Credicard Elevar Amil Bristol Coelba Associl Amesp Arbras AON ABB ALL Albert Einstein F Fiat Ford Fischer América Facchini M Martins McDonald’s Microsiga Motorola Mêtro – SP G Globo GM Gessy Lever GVT N Natura Nestlé Novartis/Agro S T H HSBC HP Habib`s O Oracle Orbitall Origem U I Illy café Itaú Intelbrás IBM P Petrobrás Previdência V L Leader Losango Lojas Renner R Real ABN Amro Redebahia Rhodia Redecard X 50 Sabesp Sebrae-RS Secovi Senac-SP Sesi Siemens Sefaz-SP Souza Cruz Serasa Sadia Softway Syngenta Tam Telemar Tigre Telemig Celular Transportadora América Unimed Unisys Unimetro Usiminas Ultragaz Unibanco Unidistribuição Vallé Xerox Visanet 3M Volkswagen Vale do Rio Doce VCP Fonte: Ferronato (2005, p. 91). Os objetivos das UC’s são especificamente preparar o profissional para que este possa gerar melhores resultados. Para Veloso (s.d.): A universidade corporativa pretende complementar a formação dos profissionais, oferecendo ferramentas adicionais para o autodesenvolvimento do capital humano da empresa. O objetivo é fazer com que o aprendizado retorne depois sob a forma de lucros. Desta forma, o conhecimento disseminado por esta alternativa de ensino, tem por objetivo atender, antes de tudo, as prerrogativas empresariais onde a preocupação com a formação do indivíduo como cidadão crítico é colocada em segundo plano. Sendo assim, vê-se que a Universidade Corporativa eleva o indivíduo a um estágio de expertise em determinado processo ou função, que atende a necessidade da corporação oferecedora do aprendizado, exigindo primeiramente que este já possua formação suficiente e o perfil desejado por essa corporação. 3 RELAÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO CORPORATIVA E EDUCAÇÃO FORMAL As universidades tradicionais desempenham um papel importantíssimo no processo de aprendizagem, na formação inicial do indivíduo, construindo alicerces de conhecimentos teóricos, sociais e metodológicos, os quais constituirão a base para o desenvolvimento das competências necessárias para o mundo do trabalho e para formação de um indivíduo crítico. Porém, não acompanham a veloz evolução do mercado, cada vez mais exigente. Possato (2002, p. 26) apresenta a amplitude esperada da formação oferecida pelas universidades tradicionais: A universidade tradicional, pelo seu caráter de instituição formadora de profissionais em nível superior, produtora de conhecimento em todas as áreas, criada dentro de uma perspectiva de desenvolvimento nacional, tem, nas suas relações com a sociedade, o importante papel de desenvolver abordagens e processos, elaborar explicações teóricas, propor soluções para problemas concretos e acompanhar o desenvolvimento integral da comunidade em que está inserida e formar profissionais competentes, técnica e politicamente, para assumirem a condução do desenvolvimento, de modo cidadão. 51 Para cumprir esse papel, a universidade tradicional necessita de um currículo complexo, extenso e multidisciplinar. Tornando qualquer tentativa de alteração, evolução para adequação a necessidades da atualidade morosa, devido a análise dos impactos da mudança, além de autorização de órgãos públicos reguladores da educação, o que dificulta ainda mais. Vergara (2009) mostra como este quadro contribuiu para o surgimento e evolução das universidades corporativas: Se o sistema formal de educação não consegue se movimentar para atender rapidamente as demandas de mercado devido a questões de complexidade e burocracia, as empresas agiram na busca do atendimento à formação de colaboradores que pudessem adquirir novas competências alinhadas aos seus objetivos estratégicos. Possato (2002, p. 34) descreve o impacto desse crescimento em parte do mundo acadêmico: Alguns segmentos do ensino acadêmico enxergam nas universidades corporativas uma eminente ameaça aos seus objetivos, principalmente pela semelhança de propósitos. Em razão disso, uma certa perplexidade vem tomando conta de alguns desses profissionais, ofuscando-lhes a visão das enormes oportunidades que as universidades corporativas oferecem. Essa paralisia, além de imobilizar as organizações de ensino superior no sentido de aproveitarem as demandas explícitas que as universidades corporativas trazem, não as têm estimulado a melhorar a qualidade do ensino superior. O quadro a seguir mostra o papel de cada uma na sociedade: QUADRO 03 – O papel das UESs e das UCs Universidades de Educação Superior Universidades Corporativas Desenvolver competências essenciais para Desenvolver competências essenciais para o o mundo do trabalho sucesso do negócio Aprendizagem baseada em sólida formação Aprendizagem baseada na prática dos conceitual e universal negócios Sistema educacional formal Sistema do desenvolvimento de pessoas pautado pela gestão por competências Ensinar crenças e valores universais Ensinar crenças e valores da empresa e do ambiente de negócios Desenvolver cultura acadêmica Desenvolver cultura empresarial Formar cidadãos competentes para gerar o Formar cidadãos competentes para gerar o sucesso das instituições e da comunidade sucesso da empresa e dos clientes Possato (2002, p. 34) também mostra a visão da outra parte: Entretanto, há evidências de que o relacionamento entre as empresas e as universidades vem se intensificado nos últimos anos, o que corrobora com a visão de uma parcela dos profissionais do ensino acadêmico de que a coexistência entre as universidades corporativas e as universidades acadêmicas é perfeitamente factível. 52 O conceito de universidade corporativa está alterando a relação entre empresa e escola (EBOLI, 1999). Logo, nesse processo, a parceria entre ambas serão cada vez mais requisitadas. Não podemos olvidar que as universidades tradicionais assumem um importante papel na formação do indivíduo, mas precisam repensar suas concepções mecanicistas e criar uma cultura de aprendizado permanente, que não se esgote e/ou se limite a seu mundo acadêmico. Neste ponto, algumas iniciativas e parcerias com empresas estão demonstrando que a concepção de “universidade”, conforme Veloso (s.d.), traz um sistema feito para crescer e se renovar, capaz de atender, independentemente de barreiras geográficas ou temporais, as demandas do indivíduo e da sociedade, garantindo, assim, a continuidade do aprendizado ao longo de toda a vida. Quando se fala em educação continuada não se está apenas pensando na oferta de cursos e na renovação do conhecimento, mas numa estratégia mais integrada onde a aprendizagem seja um processo natural, inerente à própria característica do trabalho. A própria mensuração dos resultados não é feita pelas melhores notas como na escola tradicional, mas está ligada aos resultados obtidos no trabalho (VELLOSO, s.d.). Isso tem resultado na criação de convênios entre os dois modelos de instituições, nas quais ambas se beneficiam com o resultado. As universidades tradicionais que conseguem perceber esse desejo latente no mercado estão buscando rapidamente uma aproximação das organizações empresariais, com a real perspectiva de realização de negócios. Outras, no entanto, ainda permanecem com a visão de ameaça mais arraigada do que a de oportunidade de crescimento e ampliação de suas ações no mercado de trabalho. Como já foi observado, as empresas competitivas vêm percebendo que investir na capacitação de seus colaboradores, seja por questões gerenciais ou por pressões mercadológicas, traz bons resultados. Nesse sentido, acredita-se que, com a educação profissional, a empresa poderá criar um ambiente propício ao desenvolvimento de novas ideias, ampliando sua capacidade produtiva, minimizando desperdícios, baixa rotatividade, dentre outros requisitos de atuação efetiva em mercados globalizados e com altos índices de sucateamento de conhecimento. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS As universidades corporativas, através dos diversos mecanismos de aprendizagem, permitiram um progresso considerável sob diversos aspectos. Nota-se que a universidade corporativa pode representar uma ameaça às universidades tradicionais, caso estas não modifiquem sua forma de atuação. Todavia, essa ameaça não significa a substituição de uma pela outra. Pelo menos a curto e médio prazos, as universidades corporativas podem reduzir a demanda das universidades tradicionais, à medida que ofereçam cursos aos seus profissionais mais eficazes e eficientes, enquanto estas últimas permaneçam no conservadorismo, defasagem e burocracia. Ao final, o que se percebe é que a discussão quanto ao surgimento das universidades corporativas em ameaça às universidades tradicionais vem enfraquecendo, na medida em que evidências comprovam um processo crescente de associação entre empresas e universidades, com a finalidade de ações educativas voltadas ao capital humano. As empresas procuram programas aderentes aos seus interesses corporativos, suas estratégias e o compromisso com os resultados para o negócio que a educação pode proporcionar. 53 Mesmo que a relação universidade corporativa/empresa e universidade tradicional seja objeto de debates e polêmicas, as parcerias são possíveis, viáveis e desejáveis por ambos os lados. As universidades tradicionais por disporem da capacidade de pensamento universal e conceitual podem ajudar significativamente as universidades corporativas, que correm o risco de voltarem-se excessivamente para suas necessidades e perderem a capacidade de inovação, enquanto as universidades corporativas por seu envolvimento direto com o mercado de trabalho e terem sempre em pauta a especificidade da empresa, pode oxigenar e maximizar a relação dos colaboradores, clientes e fornecedores através de novos conhecimentos, novas formações e aperfeiçoamento contínuo. Assim sendo, as universidades corporativas no modelo atual, não poderão ameaçar a continuidade das universidades tradicionais, porém implicarão a nesta última uma necessidade ao seu desenvolvimento. Verifica-se, pois, que as universidades corporativas podem servir como uma alternativa a universidades tradicionais, inclusive quando estas atuarem de forma conjunta. REFERÊNCIAS CARVALHO, Renata Pinheiro; CRUZ, Dulce Márcia. Universidade corporativa: uma nova estratégia para a aprendizagem organizacional. Disponível em: <http://www.pp.ufu.br/Cobenge2001/trabalhos/IUE012.pdf>. Acesso em: 15 out. 2011. COSTA, Inês Tereza Lyra Gaspar da. et al. Aprendizagem Organizacional em Organizações Públicas: A Experiência de uma Universidade Corporativa. In: 5th CONFERENCE OF IBEROAMERICAN ACADEMY OF MANAGEMENT. 2007. Santo Domingo – República Dominicana. Anais... República Dominicana. Meio Digital, 2007. EBOLI, Marisa. Desenvolvimento e alinhamento dos talentos humanos às estratégias empresariais: o surgimento das universidades corporativas. São Paulo: Schmukles Editores, 1999. FERRONATO, Sibele Paulon. A universidade corporativa e a universidade de educação superior. 2005. Dissertação de Mestrado em Administração, Área de concentração em Estratégia e Competitividade. Universidade Federal de Santa Maria-RS (UFSM, RS). MAILLARO, William Ervedeira. A gestão de desempenho através de indicadores múltiplos: o caso de uma universidade corporativa. 2010. Dissertação de Mestrado em Tecnologia. Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza-CEETEPS, SP. MEISTER, Jeanne. Educação Corporativa: a gestão do capital intelectual através as universidades corporativas. São Paulo: Makron Books, 1999. LOCK, Murialdo. Universidades corporativas catarinenses: uma análise teórica. Disponível em: <http://www.inpeau.ufsc.br/wp/wpcontent/BD_documentos/1410.doc>. Acesso em: 13 fev. 2012. OTRANTO, Célia Regina. Universidades corporativas: o que são e para que servem?. Disponível em: <www.anped11.uerj.br/30/GT11-2852--Int.pdf>. Acesso em: 15 out. 2011. 54 POSSATO, Lívia Maria. Gestão do conhecimento: universidades corporativas. Um estudo de caso da caixa econômica federal de lavras. 2002. Monografia Bacharel em Ciência da Computação. Universidade Federal de Lavras, MG. TARAPANOFF, Kira, Phd. Panorama da Educação Corporativa no Contexto Internacional. Disponível em: <http://www.educor.desenvolvimento.gov.br/public/arquivo/arq1229431901 .pdf>. Acesso em: 17 nov. 2011. VELOSO, Carlos Augusto Barcellos; QUELHAS, Osvaldo Luiz Gonçalves, D.Sc.. Universidade corporativa x universidade tradicional: ameaça ou nova possibilidade de capacitação profissional. Disponível em: <www.aedb.br/seget/artigos05/20_carlosveloso_seget.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2011. VERGARA, Sylvia C.. Gestão de pessoas. 5. ed.. São Paulo: Atlas 2009. 55 AS ESTRATÉGIAS DE LEITURA NO PROCESSO ENSINOAPRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESPANHOLA Estefani Leyne Marques Dias Barboza Jacinta de Fátima Menezes Rosa Luciana Maria Chagas de Castro Resumo: Este trabalho apresenta estratégias e ações voltadas para a prática da leitura dentro do ambiente escolar e na formação dos alunos como se refere Paulo Freire (ano) e Foucambert (ano), bem como estratégias para o desenvolvimento e interesse do aluno no ato de ler. Palavras chave: leitor. habilidades. ações. Resumen: Este trabajo presenta estrategias y acciones dirigidas para la practica de la lectura dentro del ambiente escolar en la formación de los alumnos como se refieren Paulo Freire e Foucambert, bien como estrategias para lo desarrollo y interés del alumno en el ato de leer. Palabras clave: lector. habilidades. acciones. INTRODUÇÃO A leitura é utilizada em diversos locais e para diversos fins em nossas vidas: no trabalho, em casa, no lazer. A formação do leitor inicia-se na escola tendo como mediador o professor. Porem vale ressaltar que, a leitura não é responsabilidade exclusiva da escola, mas de uma parceria com a família. A leitura é importante para a formação do cidadão. Os questionamentos mais comuns para a formação de leitores críticos e que participam ativamente do ato de refletir são trabalhados ao longo do processo de aprendizado através de diversas leituras que se leva para a sala de aula. Nesse sentido vale destacar que pouco se vê nos espaços escolares leituras voltadas para a compreensão da essência do texto, e principalmente de língua estrangeira/espanhol que tem sido hoje muito pouco aceita pelos nossos jovens pelo medo do desconhecido e por não saber ao certo estabelecer uma conexão entre a leitura e o leitor. Partindo dessa escassez de apresentar aos estudantes leituras que norteiam seu posicionamento, e que o aluno compreenda a essência do texto preenchendo assim, a lacuna que possivelmente possam surgir no ato de ler, encontra-se diversas formas de aplicar as estratégias de leituras. As estratégias de leitura são as habilidades que o estudante usa para compreender as situações da leitura. São planos flexíveis utilizados pelos estudantes em diferentes ocasiões, de acordo com o texto. Enriquecer a aprendizagem dos alunos mostrando que a leitura é um instrumento que pode proporcionar novos conhecimentos, tornando-os participativos na sociedade. Sociedade essa que discute e cria situações novas e reflete os problemas e as soluções do dia-a-dia. Cada aproximação do estudante com essas estratégias vem torná-los cada vez mais participativos e conscientes. Um texto não pode ser entendido como algo pronto e acabado. Deve ser como uma estrutura em acabamento com lacunas, que necessita que alguém o complete e lhe de um caráter significativo. Ao ler o leitor crítico e reflexivo cria seu texto com base no 56 que foi lido concordando ou discordando (BRANDAO e MICHELITTI apud CHIAPPINI, 1998, p. 22). 1 A leitura sob a perspectiva da escrita A principal função da escola é formar sujeitos sociais leitores da realidade em que se inserem e capazes de usar a escrita como instrumento indispensável à sua participação na construção do mundo histórico e cultural, implica desenvolver a comunicação do aluno a capacidade de interpretar e produzir construções para interpretar o mundo. Sendo assim, o ensino deve estar focado não apenas em livros didáticos, mas nos textos que circulam na sociedade, utilizando materiais diversificados. Com isso, é necessária uma reflexão em torno da concepção de leitura que irá fundamentar a ação educacional. Nesse sentido, vale destacar que ao nascermos sentimos a necessidade de nos comunicar com o mundo e utilizamos todos os meios para realizarmos esta comunicação. Um dos meios mais importantes que dispomos é a linguagem. A partir dela é possível adquirir os conhecimentos do mundo. Essa linguagem é aquela desenvolvida a partir da leitura e escrita. As teorias mais recentes concebem o ato de ler como atribuição voluntária de sentido à escrita, entendendo a leitura também como prática social. Freire (1982) propõe uma concepção de leitura que se distancia dos tradicionais entendimentos do termo como sonorização do texto escrito, defendendo que a leitura começa na compreensão do contexto em que se vive: A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto (FREIRE, 1982). Tendo em vista que uma das estratégias de trabalhar a leitura é o livro didático, no ensino da língua Espanhola, cria-se a ideia que é necessário um aprimoramento do livro didático, possibilitando uma maior leitura de mundo e de si mesmo. Nesse momento cabe ao professor fazer uma avaliação critica. Para Foucambert (1994) Ler significa ser questionado pelo mundo e por si mesmo, significa que certas respostas podem ser encontradas na escrita, significa poder ter acesso a essa escrita, significa construir uma resposta que integra parte das novas informações ao que já se é. E na leitura em que muitos se encontram e se perdem onde encontram respostas e também fazem questionamentos. Cada aluno interpreta de sua maneira um texto, mas a forma que ele faz a leitura é comum a todos mudando apenas as estratégias usadas para seu entendimento. Resende (1993, p.164) concebe a leitura como conhecimento mais aprofundado sobre si mesmo. O autor destaca que A leitura é um ato de abertura para o mundo. A cada mergulho nas camadas simbólicas dos livros, emerge-se vendo o universo interior e exterior com mais claridade. Entra-se no território da palavra com tudo o que se é e se leu até então, e a volta se faz com novas dimensões, que levam a re-inaugurar o que já se sabia antes. A tarefa de formar leitores é de responsabilidade dos educadores de diversas disciplinas e não apenas da língua portuguesa, contando que a leitura é a ferramenta para aprender a aprender. Uma das grandes dificuldades encontradas nos alunos de língua espanhola do ensino médio está na incapacidade de se expressar a incapacidade da utilização da linguagem escrita visível na formação de frases. Segundo Nacarato e Lopes (2005, 57 p.158), o indivíduo ao ler, interpreta e compreende de acordo com a sua história de vida, seus conhecimentos e suas emoções Solé (1998) questiona o fato que a maior parte das atividades escolares estarem voltadas para avaliar a compreensão de leitura e não para o ensino de estratégias de leitura que formem um leitor competente. Muitos alunos são “taxados” como alunos com dificuldades na aprendizagem porque não lhes foi ensinada a forma apropriada de ler. A autora defende uma formação adequada aos professores, pois assim esses alunos serão capazes de atingirem os objetivos propostos. Tendo em vista que a competência em leitura é influenciada por fatores motivacionais, cognitivos e contextuais tem-se necessidade de uma ação conjunta entre família e escola. 2 Estratégia pedagógica para a formação do leitor Para que os alunos tornem-se leitores críticos e cidadãos atuantes é imprescindível que o desenvolvimento do processo de leitura seja realizado por meio de estratégias que facilitem a formação leitora dos alunos. Cabe ao professor adotar alguns procedimentos para desenvolver um trabalho de leitura crítica com diferentes gêneros textuais em sala de aula, o que vem ao encontro da proposta dos PCNs. Todo texto se organiza dentro de um determinado gênero, formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo e estrutura composicional. A noção de gêneros refere-se a "famílias" de textos que compartilham algumas características comuns, embora heterogêneas, como visão geral da ação à qual o texto se articula, tipo de suporte comunicativo, extensão, grau de literariedade, por exemplo, existindo um número quase ilimitado. (p.8) O professor tem que ser o mediador e facilitador no processo ensinoaprendizagem. Deve criar algumas estratégias de leitura como, por exemplo, despertar o conhecimento prévio do aluno por meio de determinadas perguntas que tenham relação com o que foi lido, levar o aluno a saber diferenciar o essencial do que é pouco relevante, criando um esquema de hierarquização, para construir o significado global do texto. Para isso, é fundamental o aluno saber qual o objetivo da leitura, para poder avaliar e reformular. Além disso, o professor pode instigá-lo a interagir com o texto, criando expectativas ou, também, fazendo previsões. Esses procedimentos, no início, devem ser feitos com a orientação do professor, o que mais tarde, deve tornar-se um hábito no aluno. Solé (1998) ao destacar algumas das estratégias mais usadas nas aulas de leitura, destaca que, mesmo dentro das principais estratégias mencionadas, pode-se apresentar ainda as seguintes variações: 1)Os objetivos da leitura, dependendo da situação, podem servir para: a) obter uma informação precisa; b) obter uma informação de caráter geral; c) revisar um escrito próprio para comunicação; d) praticar em voz alta; e) verificar o que se compreendeu. 1)Em relação a ativar o conhecimento prévio pode: a) ser dada uma explicação geral por parte da professora sobre o que será lido; b) instigar o aluno a prestar atenção a determinados aspectos do texto que podem ativar seu conhecimento; 58 c) incentivar os alunos a expor o que já sabem sobre o assunto em discussão com o grande grupo; 2)Estabelecer previsões sobre o texto seria formular hipóteses sobre a continuidade textual. Nessa atividade, sugere-se omitir a sequência do texto e solicitar aos alunos que formulem hipóteses; 3)Incentivar os alunos a fazerem perguntas pertinentes sobre o texto, as quais devem ser reformuladas, se necessário, pelo professor. Eles devem ser instigados, paulatinamente, a fazer seus próprios questionamentos, o que implica auto-direcionamento. Ao tomar como base à visão sociointeracionista, a linguagem é compreendida como prática social. Dessa forma, a partir dela, o aluno pode "compreender e expressar opiniões, valores, sentimentos, informações, oralmente e por escrito" (PCN-EF, 1998, p. 54). Aulas com exclusivos exercícios de cópia e tradução, repetição e textos descontextualizados devem dar lugar ao desenvolvimento de atividades que explorem diferentes recursos (TV, gravador, computador, entre outros) e fontes (jornais, revistas, histórias em quadrinhos, receitas, por exemplo), segundo as possibilidades da escola, a fim de que o aluno se conscientize da existência de vínculos entre o que é estudado e seu entorno social. O foco deve estar mais no significado e na relevância da atividade do que no estudo do sistema da língua envolvida, embora ele não esteja descartado. 3 O ensino de LE como prática de leitura e escrita significativa e efetiva Uma das estratégias a ser usada, poderia ser histórias em quadrinhos, pois trata de temas variados, possui linguagem acessível e personagens interessantes. Autores como Quino, criador de Mafalda, utilizam os quadrinhos para fazer denúncias e criticar situações políticas, sociais e culturais. Situações essas que devem ser discutidas com os estudantes, já que não consideramos aqui e nas demais sequências didáticas a leitura como mera decodificação do código lingüístico, mas, sim, como habilidade essencial para o desenvolvimento intelectual e cultural dos alunos. Para exemplificar, como esses aspectos podem ser trabalhados observamos o quadrinho abaixo: Podemos trabalhar esse quadrinho começando com um questionamento com os alunos, pedindo a eles que identifiquem as palavras cognatas e também assim conseguiríamos trabalhar os tempos verbais (gramática) e a questão de visão de mundo (cultura). Após a compreensão de todo o texto, o que inclui o significado e o sentido da palavra brigde – uma vez que o aspecto mais cômico da tirinha trabalhada está justamente no fato de Susanita concluir que jogar bridge é uma ação inerente às grandes damas da sociedade. Outra estratégia de leitura é a realização de um debate na pósleitura de “As visões de Mafalda e de Susanita” sobre a função social da mulher na sociedade atual. O objetivo é o de explorar o uso de estratégias para a leitura de exemplares do referido gênero textual, o reconhecimento dos elementos que o constituem, além de ampliar conhecimentos com relação a algumas estruturas lingüísticas da língua alvo. Ler nas aulas de Espanhol deve ser como um desafio, um encontro com a cultura e nem sempre como uma exigência, um processo avaliativo. Já ao propor um texto, um livro, devemos fazer pensando em estimular o prazer e o gosto pela leitura. Como educadores devemos mostrar a importância de se saber ler uma língua estrangeira e entender o que se está lendo. Estamos vivendo num mundo capitalista que tem 59 crescido muito e que tem exigido muito dos nossos jovens. Assim, os PCNs de LE apresentam uma preocupação a respeito da atuação do indivíduo na sociedade; promovendo um contato com uma língua que vise ampliar a percepção do aprendiz em relação a si mesmo e ao outro, a sua capacidade de engajamento discursivo, desenvolvendo a consciência de que a linguagem também é uma prática social. Quando lemos podemos dar asas a nossa imaginação e aprendemos muito sobre coisas que muita das vezes não teremos oportunidades de conhecer como a cultura e os costumes de outros países que falam espanhol. Conclusão Concluímos que desenvolver leitores críticos que dialoguem com o texto e que construam conhecimentos capazes de inserir os leitores dentro de um novo universo cultural é imprescindível. É importante que se criem espaços de produção de conhecimentos, nos quais a prática dos alunos gere novas teorias e não se constitua apenas em espaços de aplicação de teorias, tendo o professor como o mediador do processo de ensino aprendizagem trazendo para o aluno um mundo onde ele possa interagir adicionando o seu conhecimento ao do professor. O professor constrói mentes que constroem mentes que evoluem e modificam o mundo, as estratégias de compreensão e interpretação representam a possibilidade de proporcionar meios de amadurecimento e autonomia para o leitor. Neste processo embora o aluno seja o protagonista, o professor, como mediador também tem um papel de destaque. REFERENCIAS BAMBERGER, Richard. Como incentivar o hábito de leitura. Série Educação em Ação. 6. ed. São Paulo: Ática, 1995. BRANDÃO, H; MICHELITTI, G. (Coord.). Aprender e ensinar com textos didáticos e paradidáticos. 3° vol. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1998. FOUCAMBERT, J. A Leitura em questão. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. KLEIMAN, Ângela. Oficina de leitura: Teoria e Prática. 6. ed. Campinas, SP: Pontes, 1998. KUENZER, Acácia (Org.). Ensino Médio: Construindo uma proposta para os que vivem do trabalho. 3. ed. Cortez, 2002. SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. 6. ed. Porto Alegre: ArtMed, 1998. SOLIGO, Rosaura. Para ensinar a ler. – Brasília, 1999. 60 UMA ANÁLISE INTERDISCIPLINAR NACIONAL DO ENSINO MÉDIO/ENEM SOBRE O EXAME Lucinéa de Oliveira Clímaco Ondina Márcia Correa de Souza Roni Von dos Santos de Carvalho RESUMO: O presente artigo de natureza qualitativa, de cunho bibliográfico com vistas a analisar as provas de língua estrangeira Espanhol do ENEM quanto ao aspecto interdisciplinar. Inicialmente faz considerações acerca da interdisciplinaridade, apresentando sua definição, campo de atuação e marco legal. Analisa provas do ENEM, quanto aos aspectos interdisciplinares. Para tanto se vale das considerações de Fazenda (2002), Japiassu (1995) e PCN (1999). Por fim, apresenta considerações e recomendações acerca do objeto de estudo. RESUMEN: El reciente artículo de naturaleza cualitativa, de cuño bibliográfico con vistas a analizar las pruebas de lengua extranjera Español del ENEM cuanto al aspecto interdisciplinario. Inicialmente hace consideraciones acerca de la interdisciplinaridad presentando su definición, campo de actuaciones y marco legal. Analiza pruebas del ENEM, cuanto a los aspectos interdisciplinarios. Para tanto se acoge de las consideraciones de Fazenda (2002), Japiassu (1995) e PCN (1999). Por último, presenta consideraciones y recomendaciones acerca del objeto de estudio. Palavras-chave: Língua Espanhola. Interdisciplinaridade. ENEM. Introdução Em face das constantes transformações pelas quais a nossa sociedade vem passando, em que conceitos são questionados, e paradigmas são quebrados, possibilitando assim o surgimento de novas estruturas do pensar e do fazer. Que obviamente influenciarão o processo de ensino, que inevitavelmente será obrigado a buscar novas metodologias, com vistas a responder de maneira eficaz e objetiva às indagações que lhe são apresentadas. Neste contexto de transformação a educação vê-se obrigada a rever seus conceitos, propor novas metodologias de trabalho que correspondam a esse novo momento pelo qual estamos passando. Onde não é mais possível conceber uma educação fragmentada na qual cada disciplina visualizaria apenas oferecer ao aluno uma formação descontextualizada e desraigada, de uma práxis comprometida com as novas exigências do fazer pedagógico; Corroborando todo esse processo vem-se ganhando espaço, um novo conceito de avaliação que privilegia o conhecimento global adquirido pelo aluno principalmente durante o ensino médio, que na atualidade, resume-se a um curso intensivo de preparação para uma prova denominada ENEM. Nesta perspectiva a matriz de referência para o ENEM propõe que a língua estrangeira moderna deve promover a competência do aluno, para que o mesmo seja capaz de utilizá-la “como instrumento de acesso a outras culturas e grupos sociais” (2009, p. 2). Ademais, de consolida-se como o principal instrumento de avaliação do governo, que visa diagnosticar a real situação na qual os nossos estudantes deixam as escolas de Ensino Médio. Como não poderia ser diferente tal instrumento contempla em sua abordagem aquilo que a legislação (LDB, DCN, PCN e OCN) há anos prescreve no 61 que tange a um ensino contextualizado, interdisciplinar e em sintonia com a contemporaneidade. Após essas primeiras observações, esta pesquisa objetiva pontuar alguns aspectos que merecem uma atenção em particular. Em primeiro plano conceituar interdisciplinaridade, seu campo de atuação e as possibilidades que tal abordagem aporta ao fazer pedagógico contemporâneo. Prescindir da legislação educacional em vigor a real compreensão do papel da interdisciplinaridade na construção do conhecimento na vida do aluno. Por fim, analisar esse principal instrumento de avaliação legal (ENEM) na parte de linguagens e signos, mas precisamente, a prova de Língua Espanhola, para nela constatar de fato e na prática como se dá à compreensão, apresentação e manifestação deste processo chamado interdisciplinaridade. 1.1 Definição, marco legal e campos de operacionalização Entende-se a interdisciplinaridade como sendo um conjunto das diferentes atribuições das diversas ciências com o intuito de buscar uma resposta e entendimento de um determinado tema, cada assunto ou tema envolve várias ciências, disciplinares e interdisciplinares. Entretanto, esse conceito pode sofrer variação ou alteração de sentido quando levado a reflexões sobre o que é interdisciplinaridade, ou seja, uma forma de perceber e entender o mundo, ser capaz de perceber os fenômenos a ela relacionados. Fazenda (2001). Ampliando a discussão, Fazenda (1999) destaca que muito já foi escrito, discutido e apresentado sobre o tema interdisciplinaridade, entretanto encontram-se divergências quanto à conceituação do termo interdisciplinaridade, devido a uma indefinição sobre o conceito de disciplina. Neste sentido, Morin (2000) ressalta que uma disciplina tende naturalmente à autonomia pela delimitação de fronteiras, da linguagem em que ela se constitui e das técnicas que é levada a elaborar e a utilizar e, eventualmente, pelas teorias que lhe são próprias. Outro equívoco que é desmistificado é a falsa ideia de que a interdisciplinaridade eliminaria com a abordagem disciplinar dos conteúdos, com relação a isso orienta os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). A interdisciplinaridade não dilui as disciplinas, ao contrário, mantém sua individualidade. Mas integra as disciplinas a partir da compreensão das múltiplas causas ou fatores que intervêm sobre a realidade e trabalha todas as linguagens necessárias para a constituição de conhecimentos, comunicação e negociação de significados e registro sistemático dos resultados. BRASIL (1999, p. 89). Ainda de acordo com os PCN (1999), a nova proposta curricular que leva em consideração o desenvolvimento dos conteúdos por áreas de conhecimento visa facilitar a abordagem dos mesmos em um cenário interdisciplinar e contextualizado. Após essas considerações, faz-se necessário buscar um conceito para o termo interdisciplinaridade, entretanto não é possível apresentar um único conceito. Para Japiassu (1976, p.74): “A interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre os especialistas e pelo grau de interação real das disciplinas no interior de um mesmo projeto de pesquisa”. Ainda com relação à definição do tema, os PCN corroboram no sentido de afirmar que: O conceito de interdisciplinaridade fica mais claro quando se considera o fato trivial de que todo conhecimento mantém um diálogo permanente como os outros conhecimentos, que pode ser de questionamento, de confirmação, de complementação, de negação, de ampliação, [...] BRASIL (1999, p.88). Enfim, reafirma-se a complexidade de conceituar interdisciplinaridade, contudo fica evidente a amplitude do seu campo de ação, que não se limita ou se restringe a uma disciplina, mas potencializando o ensino-aprendizagem, favorecendo a aquisição de 62 conteúdos pelos alunos e aumentando as possibilidades de abordagem para os professores. Quanto a isso, pode-se destacar que o valor e a aplicabilidade da Interdisciplinaridade, portanto, podem-se verificar tanto na formação geral, profissional, de pesquisadores, como meio de superar a dicotomia ensino-pesquisa e como forma de permitir uma educação permanente (FAZENDA, 1992, p.49). Outrossim, não se pode deixar de salientar o importante papel interdisciplinar que o ensino de língua estrangeira pode desempenhar no fazer pedagógico, pois abre caminhos que oportunizam o contato entre diferentes disciplinas, culturas e campos do saber. Outro ponto que não se pode deixar de ressaltar é a função social desempenhada pelo estudo da língua estrangeira que possibilita ao aprendiz interagir socialmente e culturalmente, portanto, adquirindo novos conhecimentos, refletindo experiências e desenvolvendo aptidões. Em suma, a presença da língua estrangeira no currículo que por si só já é interdisciplinar, tendo em vista as trocas que se estabelece, além de agregar ao arcabouço formativo, um emaranhado de possibilidades, oportunidades de compreensão do mundo, haja vista, que a amplitude temática dos assuntos abordados, são os mais variados possíveis. Corroborando a tudo que fora apresentado, encontramos no mais recente documento oficial (currículo mínimo) da SEEDUC (2012) no que tange o ensino de LE, a proposta é promover inicialmente a interdisciplinaridade com a língua materna, mas a interdisciplinaridade com todas as demais áreas poderá ser suscitada a partir das temáticas introduzidas pelos diferentes gêneros. Após essa pequena trajetória, conclui-se que a interdisciplinaridade passa muito mais por uma questão de decisão, aceitação, que uma mera imposição legal. Em síntese, a abordagem interdisciplinar é uma necessidade imperiosa ao prévio desenvolvimento das habilidades e competências do currículo. 2.1 Análise dos aspectos interdisciplinares presente nas provas de língua estrangeira moderna Espanhol nos anos de 2010 e 2011 do ENEM, na área de linguagem e signos. Passamos à segunda etapa de nosso trabalho, num primeiro momento buscamos conceituar o termo interdisciplinaridade, seus campos de atuação e seu marco legal. De posse desses pressupostos teóricos queremos agora, analisar e identificar a presença da interdisciplinaridade mais precisamente, nos textos de Língua Estrangeira (Espanhol) e sua relação com as outras disciplinas. Para tanto, selecionamos textos das provas do ENEM dos anos de 2010 e 2011, com o intuito de submetê-las aos critérios elencados na primeira parte do trabalho. Transcreveremos os textos com suas respectivas alternativas: TEXTO A ¡BRINCANDO! KangaROOS llega a México con diseños atléticos, pero muy fashion. Tienen un toque vintage con diferentes formas y combinaciones de colores. Lo más cool de estos tenis es que tienen bolsas para guardar llaves o dinero. Son ideales para hacer ejercicio y con unos jeans obtendrás un look urbano. www.kangaroos.com Revista Glamour Latinoamérica. México 63 O texto está baseado no gênero publicidade, originalmente extraído de uma revista mexicana especializada em modas. No que tange ao nosso foco, observa-se que a compreensão da mensagem do texto requer do leitor um conhecimento de mundo e moda. Observa-se também o uso de palavras de origem inglesa e francesa relacionadas ao contexto da moda e direcionadas a um público específico. Valendo-se de um jogo de palavras que buscam atrair pessoas que se identificam com esse estilo. Além de relacionar imagem e frases predispostas a transmitir ao seu leitor uma compreensão lúdica da mensagem vinculada. Portanto não seria possível uma adequada compreensão da mensagem se o interlocutor não atentasse para os diferentes recursos lingüísticos (imagens, signos e jargões) culturais (maneira de se vestir) e estilísticos, contidos na propaganda. Conclui-se, do objeto em análise que não bastaria apenas conhecimento fragmentado de E/LE para uma adequada compreensão da mensagem presente no texto publicitário. (anuncio) Texto B: Los fallos de software en aparatos médicos, como marcapasos, van a ser una creciente amenaza para la salud pública, según el informe de Software Freedon Law Center (SFLC) que ha sido presentado hoy en Portland (EEUU), en la Open Source Convention (OSCON). La ponencia “Muerto por el código: transparencia de software en los dispositivos médicos implantes” aborda el riesgo potencialmente mortal de los defectos informáticos en los aparatos médicos implantados en las personas. Según SFLC, millones de personas con condiciones crónicas del corazón, epilepsia, diabetes, obesidad e, incluso, la depresión dependen de implantes, pero el software permanece oculto a los pacientes y sus médicos. La SFLC recuerda graves fallos informáticos ocurridos en otros campos, como en elecciones, en la fabricación de coches, en las líneas aéreas comerciales o en los mercados financieros. Disponível em: http://www.elpais.com.(adaptado). O título da palestra, citado no texto, antecipa o tema que será tratado e mostra que o autor tem a intenção de a) relatar novas experiências em tratamento de saúde. b) alertar sobre os riscos mortais de determinados softwares em seres humanos. c) denunciar falhas médicas na implantação de softwares em seres humanos. d) divulgar novos softwares presentes em aparelhos médicos lançados no mercado. e) apresentar os defeitos mais comuns de softwares em aparelhos médicos. O primeiro ponto que merece destaque é a presença de palavras da Língua Inglesa que designa termos específicos relacionados ao contexto da informática e da medicina. O texto discute a utilização de programas informáticos como recursos que possibilitam o tratamento de enfermidades crônicas. Portanto, se estabelece uma relação de interdisciplinaridade entre saúde, informática, Língua Estrangeira e cinema (gênero ficção), tendo em vista que o assunto abordado no texto já foi apresentado no cinema muito bem ilustrado no filme “O homem bicentenário”. Ainda observa-se a presença do gênero jornalístico. TEXTO C 64 ‘Desmachupizar’ el turismo Es ya un lugar común escuchar aquello de que hay que desmachupizar el turismo en Perú y buscar visitantes en las demás atracciones (y son muchas) que inca tiene un imán innegable. La Cámara Nacional de de los ingresos por turismo en Perú, ya que cada turista que tiene como primer destino la ciudadela inca visita entre tres y cinco lugares más (la ciudad de Cuzco, la de Arequipa, las líneas de Nazca, el Lago Titicaca y la selva) y deja en el país un promedio de 2200 dólares (unos 1 538 euros). Carlos Canales, presidente de la ciudadela tiene capacidad para recibir más visitantes que en la actualidad (un máximo de 3 000) con un sistema una cifra. Sin embargo, la Unesco ha advertido en varias ocasiones que el monumento se encuentra cercano al con lo que coincide el viceministro Roca Rey. Disponível em: http://www.elpais.com. A reportagem do jornal espanhol mostra a preocupação diante de um problema no Peru, que pode ser resumido A) à escassez de turistas no país. B) ao difícil acesso ao lago Titicaca. C) à destruição da arqueologia no país. D) ao excesso de turistas na terra dos incas. E) à falta de atrativos turísticos em Arequip A interdisciplinaridade apresentada no texto C requer do aluno conhecimentos geográficos, culturais (pontos turísticos da cidade de Machu Picchu) e históricos relacionados aos povos pré-colombianos. Constata-se ainda que há o emprego de um neologismo destacado no título do texto por meio de sinais gráficos, cuja compreensão dependerá de conhecimentos prévios como os elencado acima. Insta ainda esclarecer que a questão se vale de linguagem formal e está baseado no gênero jornalístico (notícia). Texto D Los animales En la Unión Europea desde el 1º de octubre de 2004 el uso de un pasaporte es obligatorio para los animales que viajan con su dueño en cualquier compañía. AVISO ESPECIAL: en España los animales deben haber sido vacunados contra la rabia antes de su dueño solicitar la documentación. Consultar a un veterinario. Disponível em: http://www.agencedelattre.com. (adaptado). De acordo com as informações sobre aeroportos e estações ferroviárias na Europa, uma pessoa que more na Espanha e queira viajar para a Alemanha com o seu cachorro deve: A) consultar as autoridades para verificar a possibilidade de viagem. B) ter um certificado especial tirado em outubro de 2004. C) tirar o passaporte do animal e logo vaciná-lo. D) vacinar o animal contra todas as doenças. E) vacinar o animal e depois solicitar o passaporte dele. 65 No texto D a questão está baseada predominantemente em aspectos “geopolíticos”, ou seja, requer do aluno conhecimentos geográficos e políticos da organização dos países europeus em torno da zona do Euro, representados neste texto pela Espanha (único país na Europa de Língua oficial Espanhola) e Alemanha. Observase ainda no concernente a tipologia textual o emprego do gênero discursivo notícia. TEXTO E PICASSO, P. Guernica. Óleo sobre tela 349 X 777 cm. Museu Reina Sofía, Espanha 1937. Disponível em http://www.fddreis,files,wordpress.com O pintor espanhol Pablo Picasso (1881-1973) um dos mais valorizados no mundo artístico, tanto em termos financeiros, quanto históricos, criou a obra Guernica em protesto ao ataque aéreo à pequena cidade basca de mesmo nome. A obra, feita para integrar o Salão Internacional de Artes Plásticas de Paris, percorreu toda a Europa, chegando aos EUA e instalando-se no MoMA, de onde sairia apenas em 1981. Essa obra cubista apresenta elementos plásticos identificados pelo A) painel ideográfico, monocromático, que enfoca várias dimensões de um evento, renunciando à realidade, colocando-se em plano frontal ao espectador. B) horror da guerra de forma fotográfica, com o uso da perspectiva clássica, envolvendo o espectador nesse exemplo brutal de crueldade do ser humano. C) uso das formas geométricas no mesmo plano, sem emoção e expressão, despreocupado com o volume, a perspectiva e a sensação escultórica. D) esfacelamento dos objetos abordados na mesma narrativa, minimizando a dor humana a serviço da objetividade, observada pelo uso do claro-escuro. E) uso de vários ícones que representam personagens fragmentados bidimensionalmente, de forma fotográfica livre de sentimentalismo. A compreensão do texto requer conhecimentos prévios, pois estabelece relações interdisciplinares com diferentes áreas, como: geografia, história, história da arte e conhecimentos da guerra civil espanhola. Posto que o quadro em questão retrata uma parte trágica da história da Espanha, a qual o aluno só terá acesso por meio de aulas de língua espanhola e/ou história. O texto mezcla linguagem verbal e não verbal. Destaca-se ainda que a questão apesar de versar sobre um tema específico da Literatura e História da Espanha encontrar-se fora da prova de Língua Espanhola, no entanto ainda dentro da área de linguagens, códigos e suas tecnologias. Gênero discursivo. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS O momento a que hora chegamos o qual denominamos conclusão refere-se não propriamente um momento de fechamento de nossa pesquisa, mas sim, de síntese orientadora acerca das informações que tivemos acesso através de leituras especializadas que nos possibilitaram tecer considerações a cerca de nosso objeto de estudo, e analisar as provas de língua estrangeira Espanhol do ENEM, quanto ao aspecto interdisciplinar: Depreende-se da análise dos textos em questão que a prova de língua estrangeira Espanhol do ENEM, está intimamente repleta de aspectos interdisciplinares que requer do aluno um conhecimento não fragmentado em 66 disciplinas mas, sim contextualizado e mais abrangente; Outro ponto relevante constatado nas provas é no que diz respeito as fontes das questões, que predominantemente, foram retiradas do jornal El País, da Espanha, dado este que comprova que a língua é utilizada em sua modalidade de uso. Além de serem baseadas no gênero discursivo, mesclam textos jornalísticos, notícias e propagandas; Observamos ainda a presença de aspectos interculturais na elaboração das questões das provas, que estão além das disciplinas em si. Fica evidenciado, portanto que o ensino de língua estrangeira deve basear-se em aspectos interdisciplinares, interculturais e em gêneros diversificados, tendo em vista a abordagem requerida pelo ENEM. Recomenda-se ainda, trabalhar aspectos culturais dos diferentes países de língua hispânica, temas diversos e atualidades (matéria jornalística). Por fim, é impossível trabalhar língua estrangeira sem nos apropriarmos de valores culturais, crenças e ideologias dos povos hispano-hablantes. REFERÊNCIAS BRASIL, Ministério da Educação. Matriz de referência para o ENEM 2010 e 2011. Disponivel em: http://download.inep.gov.br/educacao_basica/enem/provas/2011/05_AMARELO_GAB. pdf (Acesso em 10/03/12) http://download.uol.com.br/educacao/enem2010/provas/AMARELO_Domingo.pdf (Acesso em 10/03/12) BRASIL, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros curriculares nacionais, códigos e suas tecnologias. Língua estrangeira moderna. Brasília: MEC, 1999. FAZENDA, I. C. A. Dicionário em construção: interdisciplinaridade. São Paulo, Editora Cortez, 2002. ________________Didática e interdisciplinaridade. Campinas, SP, Editora Papirus, 1998. _______________Integração e interdisciplinaridade no ensino brasileiro: efetividade ou ideologia. São Paulo, Edições Loyola, 2001. _______________Práticas interdisciplinares na escola. São Paulo, Cortez, 2002. JAPIASSU, Hilton. A Questão da Interdisciplinaridade. In: ____ Signos. Lajeado: FATES, 1995. MELLO, Guiomar Namo de. Médio. Brasília: CNE, 1998. Diretrizes Nacionais para a Organização do Ensino 67 O PROCESSO EPIFÂNICO EM CLARICE LISPECTOR E SUAS CORRELAÇÕES COM MEMÓRIA E LINGUAGEM: uma análise dos contos Felicidade Clandestina, Restos do Carnaval e Cem anos de perdão Mayara Abreu Costa Rodrigo da Silva Nogueira Renato Marcelo Resgala Junior RESUMO: Este estudo se baseia em pesquisas bibliográficas, de caráter qualitativo, cujos resultados apontam para a apresentação do caráter do processo de epifania em três contos da escritora Clarice Lispector. Além da epifania através da linguagem, a autora, intermitentemente, apresenta certa transcendência do sujeito, narrador e personagens, e sua escrita faz com que se perceba a textualidade envolvida em todo o seu discurso: assim como uma mãe lendo para seu filho, Clarice se assemelha à concepção de leitura materna. As sensações expressas em seus contos e romances demonstram a capacidade singular que a autora lida com os recursos linguísticos, ritmo e escolha ideológica. Com todos esses recursos, o leitor prova (catarse literária) sensações até então desconhecidas: raiva em Felicidade Clandestina; compaixão em Cem anos de Perdão; zelo e amadurecimento em Restos de Carnaval, com a presença notável da narradora no cuidado com a mãe. De certo modo, a ‘Clarice escritora’ dá lugar a uma ‘Clarice biógrafa’, pois seus contos são remetidos a momentos de suas memórias, durante toda a sua trajetória de vida, das migrações, de suas percepções e imagens simbólicas. Palavras-chave: Consciência. Infância. Lembrança. Introdução Chaya Lispector, assim chamada no seu país de origem, e conhecida pelos leitores na literatura brasileira como Clarice Lispector, escreveu romances, contos, crônicas e livros infantis, despertando olhares curiosos ao se apresentar ao mundo literário já no lançamento do primeiro livro, denominado “Perto do Coração Selvagem”. A escritora que sempre impressionou com seus personagens conflituosos apresentou um desprendimento da linguagem e uma aproximação à memória e à epifania. Diante deste enfoque, tomamos como objeto de estudo a linguagem, memória e epifania presentes nos contos de Clarice Lispector, enfatizando a epifania e levantamos a seguinte questão: Tendo em vista o processo epifânico, em quais momentos a autora demonstra determinadas revelações? De modo a orientar nosso objetivo, pretendemos analisar o processo de epifania utilizado pela escritora em três contos: Felicidade Clandestina, Restos do Carnaval e Cem anos de Perdão. Para apresentar o proposto, direcionamos nosso trabalho em três etapas: (i) definir e analisar o processo epifânico em contos, no intuito de avaliá-los como momentos de revelação; (ii) demonstrar a linguagem diferenciada da escritora; (iii) relacionar os conceitos de epifania e memória, sendo o último elemento primordial para análise de tal processo. 68 Acreditamos que, com este trabalho, demonstraremos o aspecto, não somente linguístico, mas também a forma de narrar de maneira diferenciada, utilizando da epifania involuntariamente. A linha deste estudo é fundamentada na pesquisa bibliográfica, tendo como teóricos básicos: Bosi (1987), Moser (2001) e Sant’Anna (2009). Esta pesquisa apresenta em seu desenvolvimento as seguintes seções: epifania, memória e linguagem. (o processo epifânico como instrumento de escrita; uma linguagem desconhecida; entre os labirintos da memória) e análise dos contos Felicidade Clandestina; Restos do Carnaval; Cem anos de Perdão. 1 EPIFANIA, LINGUAGEM E MEMÓRIA 1.1 O processo epifânico como instrumento de escrita James Joyce, William Faulkner, Virginia Woolf e Marcel Proust marcaram-se como escritores precursores de uma escrita delineada por imagens e trajetos epifânicos. Quem explicita esse dado é Sant’Anna (2009, p.162) ao afirmar que, no Brasil, quem poderia se aproximar deste processo epifânico seria Guimarães Rosa, que se tornou um receptáculo de epifanias. Vale lembrar que a literatura roseana promove um trabalho de linguagem na linguagem, sendo suas pesquisas vocabulares e estilísticas levadas aos extremos, pouco vistas, dentro e fora da nossa literatura. Em seu livro “A Escritura de Clarice Lispector”, SÁ (2000) dedica seu capítulo inicial para conceituar o processo da epifania, no qual apresenta considerações suas e de outros críticos deste fenômeno, não só na obra de Clarice, como também na do escritor James Joyce, sendo ele um dos precursores deste recurso. Ainda, segundo a autora, Clarice nunca revelou claramente ter consciência de que se utilizava do processo epifânico em suas obras. De acordo com Ferreira, a palavra epifania, epiphanéia (= manifestação, aparição), de origem grega (epi =sobre; phaino = aparecer, brilhar), pode ter dois significados. O primeiro no sentido místico e religioso, que pode ser definido como aparição ou manifestação divina ou até mesmo como uma festividade religiosa em que se celebra essa aparição. Como por exemplo, no Novo Testamento, em que são demonstradas as aparições de Jesus Cristo. A Igreja celebra a Festa da Epifania em comemoração a vinda de Jesus ao mundo. Em contrapartida, a segunda possui caráter literário e é definida por Sant’anna (2009, p.163): Como o relato de uma experiência que a princípio se mostra simples e rotineira, mas que acaba por mostrar toda a força de uma inusitada revelação. É a percepção de uma realidade atordoante quando os objetos mais simples, os gestos mais banais e as situações mais cotidianas comportam iluminação súbita na consciência[...] (grifo nosso) Para Bosi (1987, p. 479) há na origem dos textos de Clarice Lispector a exacerbação do momento interior, em que a própria subjetividade entra em crise. O espírito, perdido no labirinto da memória e da autoanálise, precisa de certo equilíbrio, que será feito pela recuperação do objeto, não mais em nível psicológico, mas, sim, na esfera da sua própria realidade. É o reconhecer da existência, assim como na religião de um Ser que a transcende para provar nas suas fontes a própria existência. Trata-se de um salto do psicológico para o metafísico, salto este plenamente amadurecido na consciência da narradora. 69 Além do mais a “psicologia” nunca me interessou. O olhar psicológico me impacientava e me impacienta, é um instrumento que só transpassa. Acho que desde a adolescência eu havia saído do estágio psicológico. (Paixão Segundo G. H., p.26 apud BOSI, 1987, p.479). A epifania que se faz presente na obra da escritora, além da busca do sujeito, perpassa pela experimentação da problematização do perfil psicológico das personagens e todos os seus conflitos. A escritora remete à concretização de algo já passado que se poderia notificar certa repulsa de sua vida em si, tanto em momento felizes ou tristes, em que se recusa a demonstrar, explicitamente, revelando, em suas personagens, alguma característica próxima do real, de algo já vivido por Clarice. Podemos observar este fato no seguinte trecho: “[...] ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas.” (LISPECTOR, 1998, p.9). Como sabemos, a escritora morou até os quinze anos em Recife, e neste fragmento do conto “Felicidade Clandestina”, a autora cita a cidade que a personagem do livro residia, denunciando que o fato, realmente, ocorreu-lhe. 1.2 Uma linguagem desconhecida No tempestuoso, contraditório e revolucionário movimento de inovação denominado Modernismo, muitos ainda não haviam conseguido atingir o patamar da língua trabalhada convenientemente. Afinal, desde o início desta famosa escola literária, em que se rompeu com paradigmas propostos por outras escolas, a língua foi utilizada por vários escritores modernistas como instrumento de nova reflexão vocabular. Fazer da ficção uma forma de conhecimento do mundo e das ideias; e com isso, entregando-se a uma aventura da expressão, tenta agir sobre a língua, como instrumento, para chegar a esses domínios pouco explorados da mente. Clarice corre o risco da aposta, não se resigna à rotina. Seu tom é mais ou menos raro. Cria “imagens novas”, “novos torneiros”, associações incomuns. Sua meta é penetrar no mistério acerca do homem. [...] (SÁ, 2000, p.130). Segundo Sá (2000, p.130), Clarice Lispector retoma a linhagem de invenção, dos raros que fizeram “exploração da palavra”, como Mário de Andrade, na obra Macunaíma. Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro: passou mais de seis anos não falando. Sio incitavam a falar exclamava: If — Ai! que preguiça!. . . e não dizia mais nada."] Ficava no canto da maloca, trepado no jirau de paxiúba, espiando o trabalho dos outros e principalmente os dois manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê na força de homem. (ANDRADE, 1928, p.2) Além de destacar o processo epifânico, que era um método utilizado por Clarice Lispector, merece ênfase a linguagem destacada pela autora, simultaneamente espiritual e mística. Vieira (1987, p.83), sobre este tópico, afirma: A linguagem e a obra de CL refletem e respeitam a estética da narrativa bíblica, especialmente a retórica do Antigo Testamento, onde o poder concreto da palavra, a repetição de palavras chave e de uma sintaxe evocativa, mais o elemento mítico, paradoxal e ilógico apresentam ao leitor um estilo sério, sagrado e espiritual, pleno de enigmas e perguntas. 70 É relevante ressaltar que a escritora, na maioria dos contos e romances, menciona situações diárias. Através desse descritivismo, atinge o mais profundo do ser humano, proporcionando a revelação de desejos íntimos. Sobre esta forma de escrever, Sá (2000, p.26) afirma: Como o João Miramar de Oswald e Macunaíma de Mário de Andrade. Ambos estenderam o “domínio da palavra sobre regiões mais complexas e mais inexprimíveis”. Clarice Lispector se anuncia como escritora que não resigna à rotina literária e faz da descoberta do cotidiano uma aventura possível. Sua escrita aproxima-se, por muitos estudiosos, à poesia, sendo classificada por Sérgio Milliet como ‘poema em prosa’. O jornal Diário Crítico, por exemplo, acredita que a autora não domina as palavras, mas as palavras que a dominam, o que para Sá é uma característica da poesia, ou seja, a linguagem transborda e emociona. Com um modus scribendi diferente, atemporal, salientamos a forma de escrever da escritora com alguns desvios do português formal. Acreditamos, assim, se algo tentasse impedi-la de escrever, provavelmente, não demonstraria um estilo tão único, móvel (Quod scripsi, scripsi!, diria-nos Pôncio Pilatos). Para exemplificar, citamos a questão da pontuação, que não obedece às normas da gramática portuguesa. No livro “Perto do Coração Selvagem”, encontram-se construções como esta: “Quando descobria coisas a respeito de si mesma exatamente no momento em que falava o pensamento correndo paralelo à palavra.” (Perto do Coração Selvagem, p.43). Outro ponto primordial a ser citado é que podemos definir o estilo de Clarice Lispector como metafórico da linguagem, citado por Jakobson, no qual destaca as operações de seleção e substituição. Em relação a este assunto, Sá (2000, p.143) denota que: Há, no seu texto, preferência pelos jogos metafóricos, em que se criam as associações de similaridade, em prejuízo das operações lingüísticas, fundadas na contigüidade. É claro que as duas atitudes não se excluem, mas, como diz Jakobson, manipulando esses tipos de conexão, uma pessoa revela suas predileções espontâneas e seus esforços voluntários. Manifesta-se todo um modo pessoal de estruturar a frase e o discurso, de organizar a sintaxe, de dar relevo a certos aspectos da enunciação. Aliás, a atitude de estranhamento do leitor se dá justamente pela linguagem que Clarice utiliza. Muitos acreditam que a estranha fala de Clarice seja ocasionada pela sua origem estrangeira. A respeito disso, ela faz questão de esclarecer: “Eu sou brasileira, de Pernambuco, oi. Do Recife, menino. Foi lá que eu me criei. Foi lá que eu estudei.” (SÁ, 2000, p. 147). Clarice Lispector nasceu em uma viagem de fuga da família da Ucrânia para o Brasil, em uma das paradas, na cidade de Tchtchelnik. Em relação a isso era, ocasionalmente, questionada quanto ao seu modo de falar, pois pronunciava uns erres ásperos, o que enfatizava um sotaque considerado estranho. Acerca deste fato a escritora acrescenta: “Não sou francesa. Esse meu err é defeito de dicção: simplesmente tenho língua presa. Uma vez esclarecida minha brasilidade [...]” (MOSER, 2011, pág. 22). Enfim, pode-se dizer que a linguagem da escritora atinge o âmago do ser, já que alerta o leitor para questionamentos profundos que ultrapassam o trivial e o superficial da língua. 71 A escritora tem o ato de escrever como algo puro, e demonstra, na maioria de seus livros, a paixão pela língua portuguesa e pelo próprio ato criador. A autora relaciona a escrita à alma, ao afirmar: “Escrevo porque encontro nisso um prazer que não sei traduzir. Não sou pretensiosa. Escrevo para mim, para que eu sinta minha alma falando e cantando, às vezes chorando”. Sobre sua atividade de escrita, Clarice escreve: Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. Não me lembro porque exatamente eu disse, e com sinceridade. Hoje repito: é uma maldição mas uma maldição que salva. [...] É uma maldição porque obriga e arrasta como um vício penoso do qual é quase impossível se livrar, pois nada o substitui. E é uma salvação. [...] Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada. (LISPECTOR, 1999, p.134) 1.3 Entre os labirintos da memória Ao falarmos sobre epifania e linguagem, é preciso entender que há uma relação intensa entre este dois vocábulos e a memória. Afinal, o método do processo epifânico se utiliza, a todo o momento, dos recursos que se remetem a lembranças de Clarice Lispector em relação á infância e adolescência. Vale ressaltar que no campo dos estudos referentes à memória há diversas correntes investigativas que são relacionadas à medicina, aos estudos históricos (que passam desde o período bíblico até a contemporaneidade) e aos aspectos cognitivos. Contudo, pretendemos analisar àquela que se remete ao individual e ainda, numa capacidade mais ampla, poderíamos nos apegar àquela originada da oralidade e passa para a escrita. Esta que, em muitos momentos, fizeram parte do fluxo de consciência de Clarice Lispector, trazendo para seus textos tudo aquilo já vivido ou presenciado e, ainda mais, a que poderia estar por vir. Conforme afirma Polak, 1992, p. 204, citado por Magalhães, 2005, p.29: A memória é um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, na medida em que ela é também um fator extremamente importante do sentimento de continuidade de coerência de uma pessoa de um grupo em sua reconstrução de si. Além disso, é relevante salientar que a memória é uma forma citada e utilizada por alguns escritores e estudiosos. Santo Agostinho, por exemplo, descreve sobre este fator em alguns escritos dele: “Aliás, não são as próprias coisas que entram na memória, mas as imagens das coisas sensíveis que ali permanecem à disposição do pensamento que as evoca.” (Agostinho, s/d: 184). Podemos afirmar que a presença de um discurso epifânico, por vezes, enleva determinadas características do discurso memorialístico, de certo modo, involuntariamente: há marcas na infância e na vida que a influenciaram, enquanto modus operandi, em enredos, na demarcação de tempo e espaço da escrita e na criação de personagens. 2 ANÁLISE DOS CONTOS 2.1 Felicidade Clandestina 72 O conto “Felicidade Clandestina” dá nome ao livro e relata uma história de infância de Clarice Lispector, ocorrida em Recife. Neste, a narradora em primeira pessoa discorre a respeito de uma de suas experiências com um livro. Tudo se resume na história de uma menina má, cujo pai era dono de livraria. Clarice Lispector atribui este adjetivo à menina, porque esta se recusa a emprestar o livro “Reinações de Narizinho”, de Monteiro Lobato para a narradora, mesmo estando o livro disponível. Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar[...] Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia. (LISPECTOR, 1998, p.9) Após alguns dias de agonia e visitas diárias da menina àquela que era “toda pura vingança”, a mãe da garota desconfia das idas constantes e “a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa”(LISPECTOR, 1998, p.11). Logo, ela resolve conferir o que estava acontecendo, e acaba por descobrir a crueldade de sua filha, e emprestando o livro à menina por tempo indeterminado. É importante ressaltar que esta obra tem um caráter autobiográfico, como comprovou a própria irmã da escritora ao afirmar que se lembra da menina má. Reveca, filha de Bernstein, tinha a mesma idade que Clarice. De acordo com Suzana, irmã de Reveca, Clarice teve durante um tempo acesso à livraria e à grande biblioteca particular de Bernstein [...]Clarice, no entanto, lembrava-se de Reveca de modo menos terno[...]Um dia, Reveca anunciou casualmente que tinha Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. (MOSER, 2001, p.145) Trata-se de uma narrativa que predomina o fluxo de consciência, consistindo numa representação dos processos mentais das personagens. Estes desencadeiam, assim, na epifania, que é uma súbita revelação ou compreensão de algo. Após passar por esta fase de epifania, a personagem descobre a essência de algo que muda o olhar perante o mundo ou até mesmo sua própria vida. Comprova-se esta ideia no fragmento: “Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-os contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.” (LISPECTOR, 1998, p.12). O uso da personificação “meu coração pensativo” esclarece a revelação existente no conto, um momento que modifica totalmente a vida da personagem. É a partir daí que a menina descobre o conceito de felicidade como algo clandestino, que é o ponto central deste texto. A escritora parece questionar o seguinte: “Afinal, o que é felicidade?” Esta seria sempre clandestina para a menina. Clandestina porque o livro não pertencia a ela, e ter algo sem ser dono legítimo, torna-se clandestino: “Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim.”(LISPECTOR, 1998, p.12). Além disso, a personagem central parece conhecer profundamente a frase “Felicidade é bom, mas dura pouco”, já que ela cria distintas formas para prolongar o sentimento de felicidade. Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. (LISPECTOR, 1998, p.12). 73 Conclui-se, portanto, que a escritora, mais uma vez, por meio de experiências vivenciadas, demonstra no conto que a felicidade deve ser descoberta por cada um, nos momentos mais simples. 2.2 Restos do Carnaval Neste conto, a autora narra, também em primeira pessoa, uma história triste de uma menina com oito anos. A família desta menina – a própria Clarice Lispector – passava por momentos difíceis com a doença da mãe e se esqueciam da presença da pequena. É relevante fazer uma observação neste momento. A mãe de Clarice foi estuprada por um soldado, combatente da Primeira Guerra Mundial, quando ainda residiam na Europa. Por isso adquiriu sífilis, uma doença que a consumia diariamente. Os pais da menina acreditavam que se a mãe da menina concebesse outra criança, Mania Lispector se livraria deste mal. Sobre este fato, a própria escritora afirma: Fui preparada para ser dada à luz de um modo tão bonito. Minha mãe já estava doente, e, por uma superstição bastante espalhada, acreditava-se que ter um filho curava uma mulher de uma doença. Então fui deliberadamente criada: com amor e esperança. Só que não curei minha mãe. E sinto até hoje essa carga de culpa: fizeram-me para uma missão determinada e eu falhei. Como se contassem comigo nas trincheiras de uma guerra e eu tivesse desertado. Sei que meus pais me perdoaram eu ter nascido em vão e tê-los traído na grande esperança. Mas eu, eu não me perdoo. Quereria que simplesmente se tivesse feito um milagre: eu nascer e curar minha mãe. (MOSER, 2011, p.57). A menina do conto afirma, a todo instante, que a única felicidade dela seria participar daquela festa tão linda e que ocorria todos os anos em Recife: o Carnaval. Para a narradora, ela poderia ser alguém diferente, afinal, assim teria a oportunidade de se fantasiar. Percebe-se a necessidade da menina em fugir do mundo que ela gostaria de esquecer, pelo menos, por alguns dias. Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para carnaval de criança. Mas eu pedia uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça – eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável – e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.(LISPECTOR, 1998, p.26) Além disso, Lispector questiona e traz o mistério das máscaras utilizadas no Carnaval. Ela, uma menina ingênua e indefesa, não sentia medo, o que poderia ocorrer com qualquer outra criança de sua idade. Muito pelo contrário, Clarice demonstra maturidade ao explanar para o leitor que todo ser humano almeja uma fuga diária, ser alguém diferente, mascarado. A escritora, de modo delicado e nas entrelinhas, declara que todo ser humano utiliza máscaras, não somente aquela criança desejava externar suas angústias. E as máscaras? Eu tinha medo mas era um medo vital e necessário porque vinha de encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito 74 só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim. (LISPECTOR, 1998, p.26). A ansiedade, por estar fantasiada e por sua oportunidade única na realização dos sonhos, se desfez quando ela já estava pronta para sair e há uma piora da mãe. A família, sem considerar o “carnaval de criança”, pede a ela para ir à farmácia comprar o remédio. A partir deste acontecimento, a festa, que fora tão esperada, perdera a graça e a alegria de se sentir outra morre dentro dela: Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.(LISPECTOR, 1998, p.28). Para finalizar o conto, Clarice Lispector faz apologia ao amadurecimento da menina, quando a compara à rosa. Salva por um garoto de 12 anos, que a enxerga com outros olhos, a menina se sente uma “mulherzinha”. Utilizando da metáfora, a autora demonstra o único sentimento de alegria da garota no conto: “ E eu então, mulherzinha de 8 anos, considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.” (LISPECTOR, 1998, p.28). Toda a narrativa é desenvolvida em torno da busca da menina de ser percebida e, assim como em Felicidade Clandestina, revela o quanto a infância vivida por Clarice Lispector era triste, portanto, qualquer fato simples, deixava-a alegre. 2.3 Cem Anos de Perdão A análise deste conto requer uma verificação do percurso da família Lispector, afinal, com um título sugestivo como este, a autora nos demonstra o doloroso processo do se sentir culpado, algo que ela carregaria consigo por muitos anos. É relevante salientar que Clarice vivenciou um longo e tenebroso processo imigratório, desde o ventre materno (com a intencionalidade de ser a redentora de sua mãe sifilítica), passando por sua chegada ao Brasil, em Maceió e, aos 5 anos, finalmente no Recife, conforme sua irmã Tania Lispector explica o motivo da mudança: (...) Maceió, naquele tempo, era quase uma aldeia; foi um ato natural procurar uma cidade maior como o Recife que era, então, a capital do Nordeste. Todos dependiam do Recife para compras melhores e até para médicos mais competentes. (MOSER, 2012, p. 79). A possibilidade de médicos mais competentes era para eles importante, mas não foi somente isso que os motivou. Segundo Moser (2012, p.80), no século XVII, Pernambuco foi conquistado pelos holandeses, que transformaram o estagnado Recife na cidade mais rica e tolerante, devido ao fato de um grau maior de liberdade religiosa, fazendo com que judeus afluíssem para lá. Algo que na Ucrânia, seu país de origem, não era permitido. Havia no Recife inúmeras ruas, ficavam no centro de grandes jardins. decidir a quem pertenciam os palacetes. brancos são meus.” “Mas esse não (LISPECTOR, 1998, p. 60). as ruas dos ricos, ladeadas por palacetes que Eu e uma amiguinha brincávamos muito de “Aquele branco é meu.” “Não, eu disse que os é totalmente branco, tem janelas verdes.” 75 Entretanto, essa não era a realidade que a família de Clarice vivia, porque, de acordo com Moser (2012, p. 87), eles moravam numa comunidade em que o centro era uma praça chamada Maciel Pinheiro, precisamente no número 367, onde a autora passara sua infância em um casarão velho. Ainda, segundo o autor, Lispector, meses antes de falecer, retornou à cidade e se hospedou no hotel na esquina da praça em que vivera e fez a seguinte reflexão ao ficar horas na janela: Para a pequena Clarice, conforme ela lembrou numa entrevista, aquele jardinzinho, onde os motoristas de táxi flertavam com as empregadas domésticas, parecia uma floresta, um mundo onde ela escondera coisas que nunca mais consegui recuperar. (MOSER, 2012, p. 88). Em seu conto, descreve o encontro memorialístico com os jardins (que tanto admirava), as flores e outras coisas que são marcas, rastros que se apresentam à menina – neste primeiro momento uma adolescente sensível: Bem, mas isolada no seu canteiro estava uma rosa apenas entreaberta cor-derosa-vivo. Fiquei feito boba, olhando com admiração aquela rosa altaneira que nem mulher feita ainda não era. E então aconteceu: do fundo de meu coração, eu queria aquela rosa para mim, Eu queria, ah como eu queria. (LISPECTOR, 1998, p.60). A personalidade marcante da escritora sempre foi elogiada por suas irmãs Elisa e Tania: Clarice era uma líder natural. “Fazia muitas amizades na escola”, relembra Tania. “Mas era seletiva, escolhia as amiguinhas.” “Eu era meio liderzinha”, admitia Clarice. Era também “muito imaginosa, era quem inventava as brincadeiras”, disse Tania. (MOSER, 2012, p.89). O que se confirma no conto (LISPECTOR, 1998, p. 61): “[...] Mas, como boa realizadora que eu era, raciocinei friamente com minha amiguinha, explicando-lhe qual seria seu papel: vigiar as janelas da casa ou a aproximação ainda possível do jardineiro, vigiar os transeuntes raros na rua.” Ao longo da narrativa é demonstrado que todos os seres humanos possuem um lado bom e outro mal e que, principalmente na adolescência, estes são mais aflorados conforme afirma Formiga (2005, p.64). A compreensão dessas condutas requer considerar que os jovens e a sociedade sempre viveram conflitos associados a condutas desviantes. Nestes episódios, frequentemente curtos e passageiros, que tem lugar o despertar de uma consciência social e moral, ainda pouco organizada. Considerar que um jovem apresenta condutas anti-sociais e delitivas é fazer referência ao seu comportamento transgressor como uma tendência generalizada desta fase evolutiva à quebra de normas. Sendo este momento para Clarice não como um crime ou delito, mas sim como algo simplesmente puro e comum a uma jovem não só apaixonada por rosas, mas que queria ser uma: Se o jardineiro estivesse por ali, pediria a rosa, mesmo sabendo que ele nos expulsaria como se expulsam moleques. Não havia jardineiro à vista, ninguém (...). Entreabri somente o bastante para que meu esguio corpo de menina pudesse passar, E, pé ante pé, mas veloz, andava pelos pedregulhos que rodeavam os canteiros. Até chegar à rosa foi um século de coração batendo. Eis-me afinal diante dela. Paro um instante, perigosamente, porque de perto ela é ainda mais linda. (LISPECTOR, 1998, p. 61). No decorrer da história percebemos uma Clarice já madura, e mesmo sendo uma adolescente, a vida que pulsava em seu peito fazia com que seu corpo passasse por transformações físicas, psicológicas e, principalmente, biológicas, passando de uma menina para uma mulher. Ela não mais queria ser uma pitanga, que vivia escondida, 76 sem muita importância, mas sim como as rosas que despertam fascínio e sensualidade, particularmente, as vermelhas. Por isso, sempre afirmava que não se arrependera do que fizera: Nunca ninguém soube. Não me arrependo: ladrão de rosas e de pitangas tem 100 anos de perdão. As pitangas, por exemplo, são elas mesmas que pedem para ser colhidas, em vez de amadurecer e morrer no galho, virgens. (LISPECTOR, 1998, p.62). CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante a pesquisa propusemo-nos a avaliar três aspectos importantes nas construções textuais, dentre tantos outros_ epifania, memória e linguagem_ sendo cada um deles imprescindíveis para o reconhecimento das características de cada escritor, o que foi exemplificado mediante o trabalho, principalmente a epifania. (que muitos escritores utilizaram, mesmo desconhecendo tal método.) O fluxo de consciência, a escrita entre a ficção, memória e a linguagem, presentes nos contos analisados, colaboram por demonstrar que a escritora Clarice Lispector utilizou-os em suas histórias, conceitos e marcas presentes em personagens, em descrições ambientais, na linguagem ou simultaneamente. A escritora enfrentou uma vida conturbada, passando por muitas dificuldades desde a negação de seu país natal se utilizando da afirmação veemente “sou brasileira”. Afinal, suas memórias estavam ligadas ao Brasil, quando viera para cá muito nova e sua família sofrera na Ucrânia. A autora cria em seus personagens, nos contos analisados, uma complexidade psicológica, algo próximo de seu real, de suas próprias amarras mentais, criadas pela necessidade de se proteger. Seu sofrimento não passaria somente na meninice, mas também em toda a sua vida, porque encontramos diversos momentos em que a autora demonstra um pedido de perdão (consciente ou inconsciente) por coisas vividas. A vida de viagens viera desde a infância e passaria pela adolescência, até a maturidade, quando se casou com um diplomata. Todavia, as sofreguidões ainda surgiriam com o rompimento de seu casamento, porque, com isso, precisou escrever crônicas para jornais, romances encomendados, contos e livros infantis para seus filhos. A escritora de “Felicidade Clandestina” não passara pela vida como outros, mas sim viveu e deixou um grande e complexo arsenal bibliográfico que passa de gerações em gerações. (despertando fascínio como as rosas em “Cem anos de Perdão” e não sendo como as pitangas.) Em vista disso, linguagem_ enquanto a tessitura da narrativa clariceana_ e memória são recursos que não podem estar isolados quando se almeja uma análise do processo epifânico. Vale lembrar que há a marca do fluxo de consciência em tais processos, fatores determinantes para que compreendamos o sentido e possamos demonstrar a ressignificação do caráter epifânico na obra da autora. REFERÊNCIAS AGOSTINHO, Santo. As confissões. Rio de Janeiro: Ediouro, v.31993, s/d. ANDRADE, Mário de. Macunaíma. Disponível em:<http://www.techtudo.com.br/tudosobre/s/macunaima-mario-de-andrade.html>. Acesso em: 17 març. 2013. BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. 3.ed. São Paulo: Cultrix, 1987. 77 FORMIGA, S. Nilton. Condutas anti-sociais e delitivas e relações familiares em duas áreas urbanas na cidade de Palmas-TO. Aletheia. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/aletheia/n22/n22a06.pdf > Acesso em 17 març. 2013. LISPECTOR. Clarice. Felicidade Clandestina. 1. ed. 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Florianópolis: UFSC, nº 14,1987. 78 INTERDISCIPLINARIDADE ENSINO/APRENDIZAGEM NO PROCESSO DE Danielle da Silva Zanon Karen Inácio de Souza RESUMO: Este artigo apresenta um estudo teórico sobre o processo de ensino/aprendizagem numa proposta interdisciplinar e tem por objetivo trazer reflexões sobre o tema, definição de conceitos e suas implicações na prática docente, que resultam na construção de um conhecimento amplo, sem fragmentação, baseado na realidade, visando a formação de cidadãos. O trabalho aponta ainda, as competências necessárias ao professor para que ele trabalhe de forma interdisciplinar, abrindo novos horizontes para uma prática de ensino mais eficiente e integrada, incluindo os desafios impostos a essa prática. Além de abordar questões referentes ao ensino de língua espanhola, considerando o papel que ela exerce hoje na formação global do educando, como objetiva a interdisciplinaridade. Palavras-chave: Interdisciplinaridade. Aprendizagem. Língua Espanhola. RESUMEN: Este artigo presenta un estudio teórico sobre el proceso de enseñanza en una propuesta interdisciplinar y tiene por objetivo traer reflexiones sobre el tema, definición de conceptos y sus implicaciones en la práctica docente, que resultan en la construcción de un conocimiento amplio, sin fragmentaciones, basado en la realidad, visando la formación de ciudadanos. El trabajo apunta también en las competencias necesarias al profesor para que trabaje de manera interdisciplinar, abriendo nuevos horizontes para una práctica de enseñanza más eficiente e integrada, incluyendo los desafíos impuestos a esa práctica. Además de abordar cuestiones referentes a la enseñanza de lengua española, considerando el papel que ella ejerce hoy en la formación global del educando, como objetiva la interdisciplinaridad. Palabras claves: Interdisciplinaridad. Aprendizaje. Lengua Española. 1 Introdução O desenvolvimento deste artigo contou com uma pesquisa bibliográfica que contribuiu para uma reflexão acerca das propostas interdisciplinares, tendo como objetivo investigar e demonstrar a importância da interdisciplinaridade no processo de ensino/aprendizagem e sua prática que vão além das contribuições de cada disciplina, pois ela não se limita a realizar um esforço para integrar conhecimentos e sim, garantir uma construção de um conhecimento globalizante, rompendo as fronteiras das disciplinas. Por isso, ao adotar a interdisciplinaridade é importante deixar claro que a prática docente deve ser voltada para uma maior consciência da realidade, observando e entendendo os fenômenos complexos surgidos ao longo do caminho. Diante do momento histórico atual, a educação manifesta a necessidade de se romper com modelos tradicionais de ensino. No Brasil evidencia-se uma preocupação, um interesse pelas práticas interdisciplinares, que chegaram ao Brasil ao final da década de 1960. Faz-se necessária a observação de dois aspectos relevantes: por uma questão 79 de modismo, na década de 70, a interdisciplinaridade passou a ser empreendida na educação sem as reflexões necessárias, sem se pensar nos objetivos e nas dificuldades que se poderia encontrar para alcançá-los. Outro aspecto a ser considerado é o avanço nas reflexões sobre este tema a partir dos estudos realizados pelo brasileiro Hilton Japiassú (1976). A primeira produção significativa sobre o tema no Brasil é de H. Japiassú. Seu livro é composto por duas partes, a primeira na qual apresenta uma síntese das principais questões que envolvem a interdisciplinaridade, a segunda em que anuncia os pressupostos fundamentais para uma metodologia interdisciplinar (FAZENDA, 2008, p. 24). Quanto à metodologia, aponta-se a necessidade de se estabelecer conceitoschave para facilitar a comunicação entre os membros de uma equipe interdisciplinar, a exigência em se delimitar o problema ou a questão a ser desenvolvida, de distribuição de tarefas e de comunicação dos resultados. Essas indicações são reconhecidas hoje como fundamentais a qualquer trabalho interdisciplinar. A partir desses estudos, outros trabalhos surgiram no Brasil. Em um desses trabalhos, de Ivani Fazenda (2008), constata-se o descaso, a falta de critério, de informações e perspectivas do projeto reformista da educação na década de 1970. Essa alienação e o descompasso no trato das questões da interdisciplinaridade resultaram no desinteresse por parte dos educadores da época, assim como no empobrecimento do conhecimento escolar, condenando a educação a 20 anos de estagnação. A década de 1980 foi marcada pela necessidade da explicitação dos equívocos dos anos 70. Muitas foram as contribuições e um dos documentos mais importantes foi elaborado por Gusdorf, Apostel, Bottomore, Dufrene, Mommsen, Morin, Palmarini, Smirnov e Ui, Interdisciplinaridade e ciências humanas (1983), que acrescenta importantes conclusões acerca da natureza e alcance da interdisciplinaridade. A partir dos anos 80, rompeu-se o silêncio iniciado no final dos anos 50. Para Fazenda (2008), o educador fora influenciado pelo modismo estrangeiro, se omitiu e perdeu aspectos de sua identidade pessoal. Essa perda gradativa de identidade registrada nas décadas de 1960 e 1970 causou danos irreparáveis a curto prazo. Entretanto, tal como Fênix, o educador dos anos 80 renasceu das cinzas, em busca de seu passado de glórias e de sua afirmação como profissional (FAZENDA, 2008, p. 24). O professor interdisciplinar é um pesquisador, um profissional que inova, que luta contra a acomodação através de atitudes que revelam seu compromisso, seu comprometimento e sua competência. A explosão dos projetos que se intitulam interdisciplinares aconteceu no Brasil nos anos 90. Esses trabalhos são marcados pela falta de orientação e de regras, pela ausência de intenção e pelo improviso. Surgem da moda ou da intuição, apoiados numa teoria pouco difundida. 2 Interdisciplinaridade e Ensino 2.1 Conceito Não é mais possível aos educadores acreditarem que a interdisciplinaridade não é uma exigência das propostas atuais de conhecimento e educação. As escolas invariavelmente criam projetos interdisciplinares, as universidades criam grupos de estudo com especialistas nas diversas áreas do conhecimento e o mercado de trabalho 80 exige um profissional interdisciplinar. Contudo, deve-se observar que poucos os fazem de forma consciente, planejada. Ser interdisciplinar, vai muito além de misturar disciplinas. Conforme FAZENDA (2002, p. 24) “a aquisição de uma atitude interdisciplinar envolve, pois, um universo de tramas, experiências e pensamentos[...]”. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), a reorganização curricular determinada em áreas de conhecimento , estruturada pelos princípios pedagógicos da interdisciplinaridade, da diversidade e autonomia, estabelece uma relação entre os sistemas de ensino e as escolas, que proporciona uma influência mútua entre as áreas curriculares e desenvolvimento dos conteúdos, numa perspectiva de contextualização (BRASIL, 1998). Em um projeto interdisciplinar deve-se discutir em nível teórico, suas estruturas e intencionalidade. Esses fundamentos possibilitam entender que a interdisciplinaridade é muito mais que uma junção de conteúdos de diferentes disciplinas. A interdisciplinaridade não dilui as disciplinas, ao contrário, mantém sua individualidade. Mas integra as disciplinas a partir da compreensão das múltiplas causas ou fatores que intervêm sobre a realidade e trabalha todas as linguagens necessárias para a construção de conhecimentos, comunicação e negociação de significados e registro sistemático dos resultados (BRASIL, 1998, p. 89). Assim, pode-se dizer que a interdisciplinaridade trata-se de uma proposta em que a forma de ensinar visa integrar os saberes disciplinares e não eliminá-los, criando no conceito de conhecimento uma visão de totalidade, ampliando e articulando o trabalho disciplinar de forma orientada e com objetivos bem definidos. O trabalho interdisciplinar favorece o desenvolvimento de todos na escola, professores, alunos e a própria escola, à medida em que o conhecimento recupera sua totalidade e complexidade. Contemplada nos PCN’s, a interdisciplinaridade assume a prática docente voltada para o desenvolvimento de competências e habilidades comuns aos alunos como fundamento de integração, promovendo assim, a mobilização da comunidade escolar em torno de objetivos educacionais mais amplos. Segundo os PCN’s: Um trabalho interdisciplinar, antes de garantir associação temática entre diferentes disciplinas - ação possível, mas não imprescindível, deve buscar unidade em termos de prática docente, ou seja, independentemente dos temas/assuntos tratados em cada disciplina isoladamente (BRASIL, 2002, p. 21) 2.2 Desafios Vários fatores são determinantes para dificultar o desenvolvimento de um trabalho interdisciplinar nas escolas. Entre as dificuldades, talvez a mais crítica e impactante de todas, refira-se à formação do docente, que lida com uma realidade que por vezes desconhece e é despreparado teoricamente para enfrentá-la. Em decorrência dessa deficiência na sua formação, que vem a ser o reflexo do ensino fragmentado, tem dificuldades para desenvolver um trabalho de interação entre sua disciplina e a de seus colegas, desvinculando, limitando a possibilidade de desenvolvimento da educação. Um trabalho interdisciplinar não se começa de um dia para o outro; requer mudanças no conceito que se tem de aula, de professor e de aprendizagem. É preciso que haja um grupo de professores que estejam dispostos a trabalhar de forma conectada, interligada. Isto pressupõe um trabalho de planejamento e de intercâmbio entre eles. 81 2.3 Interdisciplinaridade e o ensino de língua espanhola Sabe-se que o ensino de línguas estrangeiras é uma necessidade no mundo atual e colabora para uma melhora da qualidade de ensino, uma vez que contribui para o desenvolvimento integral do aluno. Além disso, pode vir a desempenhar uma função interdisciplinar brilhante, à medida que possibilita o trabalho de ligação, integração com conteúdos de diferentes disciplinas, dando acesso a questões sociais e como estas são tratadas em diferentes lugares. Para os PCN’s, esta “é a função interdisciplinar que a aprendizagem da Língua Estrangeira pode desempenhar no currículo” (BRASIL, 1998, p. 37). Assim, o estudo de línguas estrangeiras, possibilita a participação social, mantém contato com culturas, pensamentos, visões de mundo distintas, através de textos, artigos históricos, imagens artísticas, ampliando a capacidade do aluno de compreensão do desconhecido, oferecendo a oportunidade de construir conhecimento a partir de suas experiências. Embora sejam notáveis os benefícios do estudo de idiomas aos alunos, muitas barreiras ainda são encontradas para o desenvolvimento deste trabalho. Pode-se encontrar referências sobre essas dificuldades inclusive nos PCN’s de Língua Estrangeira: “[...] o ensino de Língua Estrangeira não é visto como elemento importante na formação do aluno [...]. Ao contrário, frequentemente essa disciplina não tem lugar privilegiado no currículo [...]” (BRASIL, 1998, p. 24). Assim, “o número de aulas dedicadas à Língua Estrangeira é reduzido, raramente ultrapassando duas horas semanais” (BRASIL, 1998, p. 66). Mister se pode destacar que há maior dificuldade, sobretudo com a disciplina de língua espanhola, pois esta ainda não conquistou espaço nas matrizes curriculares de algumas escolas como deveria, embora seja reconhecida sua importância nas relações com países vizinhos que, em sua maioria, têm o espanhol com língua materna, e a possibilidade, com seu ensino, da abertura para o conhecimento de novas culturas. Entende-se que o estudo de espanhol faz uma relação direta com aspectos culturais, temas de discussão social, folclóricos, geográficos, históricos, religiosos e artísticos que podem se relacionar com qualquer disciplina, ampliando as possibilidades, enriquecendo, favorecendo seu entendimento. Não é tarefa simples encontrar material didático com proposta interdisciplinar pronta ou adequada para determinado grupo de estudantes. Portanto, cabe ao professor adaptar seus materiais ao que ele pretende abranger com sua aula. Dentro desta perspectiva, apontamos uma atividade que o professor pode transformar numa proposta interdisciplinar a partir de suas interferências e da variedade de temas que pretenda trabalhar com seu grupo. Depois de observar e refletir um pouco, pode-se levantar alguns tópicos para serem explorados a partir desta charge. A primeira e mais marcante, sem dúvida, é a questão cultural: Que componentes culturais estão presentes no diálogo dos touros? Em nosso país, que aspecto cultural é mais expressivo e firma nossa identidade como brasileiros? Também pode-se propor um estudo geográfico sobre onde ainda ocorrem as corridas de touro atualmente e onde elas já deixaram de acontecer. Além disso, é claro, há a questão histórica: O que motivou o aparecimento dessas corridas? Como, ao longo dos anos, elas foram deixando de ocorrer? Qual o papel da sociedade nessa mudança de atitude? Qual a influência de ações políticas, ambientalistas e humanitárias sobre essa questão? Vale a pena ressaltar que há uma gama de possibilidades e não se deve esperar propostas perfeitas ou soluções imediatas. A postura dos educadores, para alcançar êxito 82 em seus projetos, deve ser permanentemente crítica, reflexiva e comprometida com sua missão de educar. Educar para o plural, não para o singular, para o que abrange, não para o que restringe, enfim, educar para a cidadania. 3 Considerações finais A perspectiva interdisciplinar traz inúmeras implicações pedagógicas, pois assume riscos e enfrenta conflitos. Isto ocorre pois a metodologia interdisciplinar conta com os limites e condições de cada saber, eliminando as barreiras entre eles e erradicando conhecimentos, daí a necessidade de um trabalho em equipe. Porém, é importante ressaltar que esta união implica em planejamento e compromisso entre os agentes envolvidos, tendo assim, que abandonar o conformismo e o comodismo, fazendo mudanças nas rotinas em sala de aula, sendo isso dificuldade para muitos educadores. Mas não podemos avaliar essa metodologia como adequada ou inadequada pelas dificuldades que apresenta, mas sim como necessária e comum. Por isso, percebe-se o valor da interdisciplinaridade e a necessidade de situar o ensino de língua espanhola nos desafios, dúvidas e interrogações da atualidade e a importância de sua inserção na construção do conhecimento dentro de sala de aula, manifestando assim, a necessidade de se romper com os modelos tradicionais de ensino diante desse mundo globalizado que apresenta tanto desafios aos homens. Um dos passos rumo à nova proposta é a mudança na postura do professor que deve colocar-se como aprendiz e buscar novas formas de trabalho conjunto para expor e discutir criticamente valores e sentidos. O papel do educador não deve ser de um transmissor de conhecimentos prontos, mas o de alguém que seja capaz de manter no educando um interesse que jamais poderá ser confinado ao tempo escolar. Portanto, pode-se afirmar que o professor deve ser um profissional em formação contínua, precisa estar sempre se atualizando não só para acompanhar um mundo em constante mudança, mas também para ser capaz de provocar mudanças. 4 Referências Bibliográficas BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 1998. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 2002. FAZENDA, Ivani. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. 15 ed. São Paulo: Papirus, 2008. FAZENDA, Ivani. Dicionário em construção: interdisciplinaridade. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002. JAPIASSÚ, Hilton. Interdisciplinaridade e Patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976. MARTÍN, Ivan. Síntesis: curso de lengua española: Ensino Médio. São Paulo: Ática, 2010. 83