Edição 52 - Superpedido Tecmedd
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Edição 52 - Superpedido Tecmedd
A ciência a serviço da saúde O preparador físico Marcio Atalla e a nutricionista Desire Coelho mostram que é possível ter uma vida saudável sem terrorismo – e ensinam, no livro A dieta ideal, como chegar lá Editorial Editorial Editorial Sucesso sem legendas Cinquenta tons de cinza, A culpa é das estrelas, O senhor dos anéis, O código Da Vinci e suas continuações – inclua-se aí Inferno, que terá novamente Tom Hanks no papel de Robert Langdon e deve ser lançado em 2016... Alguns dos grandes blockbusters recentes de Hollywood são adaptações de livros de sucesso. Obviamente, essa não é nenhuma novidade – os estúdios norteamericanos há muito perceberam esse filão. A questão aqui é se perguntar se a indústria cinematográfica brasileira também não deveria dedicar também um olhar mais generoso para a literatura nacional. Claro, filmes oriundos de obras como Cidade de Deus, Elite da Tropa, Nunca houve um homem como Heleno e, mais recentemente, Confissões de adolescente já fizeram bonito nas bilheterias. Ainda assim, a sensação é de que o potencial segue pouco aproveitado – especialmente entre os mais jovens. Por isso, a notícia da filmagem de O escaravelho do diabo é auspiciosa. Divulgada com a força do cinema, a trama de Lúcia Machado de Almeida certamente fisgará multidões – e abrirá caminho para outros best-sellers de nossa poderosa literatura infanto-juvenil ampliarem ainda mais seu público. Que tal ver os Irmãos Encrenca, de Stella Carr, na telona? Ou os Karas, de Pedro Bandeira? Sem falar nos livros de Marcos Rey, João Carlos Marinho... A lista é grande, e sabemos que os jovens heróis da literatura brasileira em nada ficam a dever à turma de Harry Potter, Crepúsculo ou Jogos Vorazes. Enfim, enquanto isso não acontece, que tal reler esse clássicos? Celso de Campos Jr. Editor Ligue para a Superpedido São Paulo 11 3505-9788 pág. 2 Cartas Sou leitor de Guerra dos Tronos e admirador do trabalho de George Martin. Muito interessante a entrevista com ele publicada na edição 51. Não tinha ideia que ele era assim uma figuraça! Aliás, Martin, que tal acelerar o próximo livro? Um abraço a todos. Ricardo Alves Beltrão São Paulo-SP O artigo de Julio Ribeiro sobre marketing de atitude devia ser lido por todos os profissionais do mercado livreiro. Continuem trazendo reportagens assim. Mário Eduardo Orsini São Paulo-SP A equipe da revista quer ouvi-lo, leitor-livreiro! Sugestões, críticas e idéias podem ser enviadas ao e-mail [email protected], ou remetidas para o endereço da redação. Mãos à obra! Índice 2 3 4 6 8 14 16 20 22 24 28 30 32 34 36 38 40 42 43 Editorial e Cartas Zoom Poesia Literatura Capa Biografia Papo de escritor Gastronomia Finanças Ficções livrescas Jornalismo Psicologia Fotografia Negócios Quadrinhos Memória História Top 100 Editoras Top 20 Livros Revista Superpedido Edição de Jan/Fev. de 2015 Ano XI - Nº52 Essa revista é uma publicação da Superpedido Comercial S/A Av. Doutor Antonio João Abdalla, 260 Bloco 400 - Área D - Sala H Empresarial Colina - Cajamar/SP cep. 07750-020 tel. 11-3505-9788 site. www.superpedido.com.br e-mail. : [email protected] Distribuição gratuita. Venda proibida. É proibida a cópia e a reprodução total sem prévia autorização. Não nos responsabilizamos pelo preço de capa dos livros desta revista. São sugeridos pela editora e podem ser alterados sem prévio aviso. Superpedido Comercial S/A. Todos os direitos reservados. Edição Celso de Campos Jr. Produção e projeto gráfico Nathália Furlan Nesta edição colaboraram Fernanda França, Kel Costa, Marcos Costa, Maurício Louzada, Reinaldo Polito e Tatiana Romano Ilustrações Estúdio Canarinho Zoom Zoom Zoom Mister Maigret Por essa, os leitores de George Simenon não esperavam. O comissário Jules Maigret, detetive da Brigada Criminal de Paris e herói de dezenas e dezenas de livros do escritor belga, será encarnado em dois longas para a TV a serem rodados ainda neste ano por... Rowan Atkinson, mais conhecido pelo papel de Mr. Bean. Será a quarta adaptação de Maigret para as telinhas – as histórias se passarão na Paris de 1950. “Há muito tempo devoro os livros de Maigret. Estou ansioso para interpretar esse personagem tão intrigante”, declarou Atkinson. Da mesma forma, os fãs do detetive estarão ansiosos para conferir a performance do britânico no papel do comissário parisiense. Mistério... Ruivos, cuidado! Em 1972, Lúcia Machado de Almeida lançava O escaravelho do diabo, sucesso que arrebatou milhares e milhares de leitores e se tornou um dos maiores sucessos da coleção Vagalume, da editora Ática. Quarenta anos e mais de 25 edições depois, o clássico da literatura juvenil ganhará agora as telas do cinema. Dirigido por Carlo Milani, o filme será protagonizado por Marcos Caruso, como o detetive Pimentel, que auxilia o garoto Alberto (vivido por Thiago Rosseti) a desvendar a série de assassinatos de ruivos na fictícia cidade de Vale das Flores. O lançamento da película está previsto para o meio deste ano, durante as férias escolares. “Essa garotada adora o suspense do cinema americano. Então acho que podemos acertar nesse caminho”, afirma o diretor Carlo Milani. “Se eu tenho uma expectativa com o filme, é deixar os cinco herdeiros da Lúcia Machado de Almeida felizes. O livro foi muito importante para a minha formação.” Amazon ataca novamente No final de 2014, a Amazon lançou no Brasil seu serviço de assinatura de livros eletrônicos, o Kindle Unlimited – já apelidado de “Netflix dos livros”. Por R$ 19,90 mensais, os assinantes podem ler quantas obras quiserem, dentro de um catálogo de seleções da Amazon, com um máximo de 10 e-books emprestados simultaneamente. Se por aqui o serviço ainda não fez tanto barulho, na França o Kindle Unlimited causou frisson – e aparentemente está com seus dias contados. A ministra da cultura Fleur pág. 4 Poesia Poesia Poesia Do guardanapo ao papel Em turnê de lançamento do Segundo Eu me chamo Antônio, o escritor Pedro Gabriel comenta nesta entrevista exclusiva o sucesso inesperado de suas poesias Antes de falar do segundo, o primeiro: como você encarou o sucesso de seu livro de estreia? De alguma forma, você esperava que ele tomasse a proporção que tomou? Nunca imaginei que um dia eu teria um livro publicado. Quanto mais que esse livro ficasse mais de trinta semanas na lista dos mais vendidos (lista da Veja). Até então eu era totalmente desconhecido e aquele era o meu livro de estreia. As vendas e, mais importante, o engajamento dos meus leitores superaram todas as minhas expectativas. Até hoje a ficha parece que não caiu (risos). Quais as novidades do novo livro? O segundo livro é como se fosse o caderno de ideias do personagem Antônio. Nele, o leitor encontra muitas ilustrações, fragmentos de textos e, claro, as tradicionais poesias desenhadas em guardanapos. Comparado ao primeiro, que é um livro com ambientação de botequim com direito a trocadilhos e jogos de palavras espontâneos, o Segundo coloca o Antônio no mundo dos sonhos com uma preocupação ainda maior na seleção das palavras. Para os leitores que chegaram agora, pode explicar a ideia das poesias em guardanapo e do Antônio? Meu primeiro guardanapo foi criado em outubro de 2012. Nasceu de forma espontânea, como nascem as coisas sinceras. Eu estava voltando para casa e, no meio do caminho, resolvi parar no Café Lamas (um bar muito tradicional no Rio de Janeiro) para tomar um chope. Naquele dia, eu havia esquecido meu caderno pág. 5 sa que tenha mudado é que agora eu divido com mais gente a minha poesia, isso aumenta um pouco a minha responsabilidade na hora de expor algum sentimento. O fato de seus livros agora serem divulgados como “do autor do best-seller...” acaba colocando uma responsabilidade maior em seu trabalho. Isso o influencia? Como você lida com isso? Sem dúvida, a responsabilidade aumenta. Mas isso não quer dizer que eu precise moldar o meu discurso para agradar tal ou tal faixa de leitores. Para mim, escrever só vale a pena se for sincero. Eu vou continuar publicando livros enquanto tudo o que estiver desenhando ou escrevendo tenha compromisso com a verdade e faça fronteira com a espontaneidade. O que vem por aí no horizonte de Pedro Gabriel – ou de Antônio? de anotações e comecei a desenhar na única plataforma que eu tinha à minha frente: os guardanapos. Eu não escolhi os guardanapos, eles me escolheram. Em suas poesias, quanto há de inspiração e quanto de transpiração? Pode nos contar um pouco de seu processo de criação? O que se manifesta nas minhas poesias é um acúmulo de inspiração. Tudo o que vivi, ouvi e vi até hoje me é útil ou pode me ser útil. A inspiração é a nossa arte prenha. A transpiração é como se fosse a parteira de nossas ideias. Aquela forcinha a mais que a gente precisa para tirar do nosso interior tudo o que nos incomoda. Poesia é tudo o que nos incomoda. Dito de uma forma bonita, mais sensível aos olhos, mais agradável aos ouvidos. Mas, ainda assim, a gente só exterioriza o que nos incomoda. Nesses quase dois anos desde o lançamento do livro, o que mudou em sua vida? Eu continuo criando diariamente. Nem sempre tenho postado as minhas criações nas redes sociais, mas estou sempre pensando em novas formas de traduzir as coisas que acontecem no meu mundo. Continuo frequentando os mesmos lugares, visitando os mesmos amigos, amando a mesma mulher. Talvez a única coi- Em 2015, quero continuar divulgando meus dois primeiros livros. Quero visitar o máximo de cidades que eu conseguir para receber ao vivo esse carinho todo que recebo dos meus leitores pelas redes sociais. Espero ter a oportunidade de publicar mais livros. Mas aprendi a viver um dia de cada vez. Ou melhor, um guardanapo de cada vez. Literatura Literatura Literatura Autógrafos, manias, medos e enfermarias Por CAIO FERNANDO ABREU Tem gente que não faz mesmo. Rubem Fonseca, por exemplo, que eu saiba nunca sentou em livraria para autografar. E não dá entrevista nem se deixa fotografar. Lembro de certa tarde em Erlanger, interior da Alemanha, pleno verão de 1993, durante a Interlit, encontro internacional de escritores, em que se deixou filmar pela TV. Mas de longe, e sem dizer palavra. Caminhava no parque ao lado de sua tradutora Karin von Schweder-Schreiner, uma das mulheres mais bonitas que conheço. Rubem acha, com razão, que a cara do escritor e o que ele tem a dizer fora do livro não interessam. Interessa o livro, está tudo lá. Dalton Trevisan também é assim, Greta Garbo perde. Já Lygia Fagundes Telles autografa, sim, mas passa o dia da noite de autógrafos nervosíssima, com uma fantasia obsessiva: ficar sentada sozinha ao fundo de uma livraria deserta, sem que apareça ninguém. Sempre aparece, claro: no caso de Lygia, multidões. Mas no próximo lançamento, a fantasia volta. Moacyr Scliar simplesmente esquece o nome da pessoa para quem vai autografar, algumas muito íntimas. Isso é frequente com escritores, daí a moda de, na hora em que o livro é vendido, colocar um papelzinho dentro com o nome do leitor. Mas muitos, por distração ou por se acharem inesquecíveis, jogam fora o tal papelzinho. Constrangimentos indizíveis – como responder com um seco “não” a sorridente pergunta “e então, não lembra de mim?” Clarice Lispector apenas assinava seu nome. Nada de “para fulano, com simpatia”, coisas assim. E não dizia nada. Quando lançou o seu injustamente esquecido Tanto faz num fliperama da rua Augusta, Reinaldo Moraes mandou fazer um carimbo com seu nome. Erico Verissimo autografava, mas dizia sentir-se constrangido como um “camelô de si mesmo”. Há autores que, de nervosos e emocionados, bebem demais no lançamento. Outros chegam atrasados. Outros (já aconteceu) vão, mas o livro não fica pronto. Nenhum, que eu saiba, deu uma de João Gilberto (o cantor, não o escritor Noll) e simplesmente não apareceu no show. pág. 7 A verdade é que noite (ou tarde, ou manhã, madrugada talvez não) de autógrafos é chata. Que graça tem ficar às vezes horas numa fila, estender um livro e receber de volta um “para fulano, cordialmente”? Claro que, se passarem décadas e o escritor ganhar o Nobel, vai ter valido a pena. Claro que os netos ou bisnetos de Machado de Assis (ele os teve?) devem achar ótimo ter herdado autógrafos valiosíssimos. Mas em geral não tem graça. Ou tem pelos reencontros, pelo coquetel, pelo auê, não pela coisa em si. Que em vernissage a gente olha os quadros, em pré-estreia teatral ou cinematográfica a gente vê a peça, o filme. Livro não, livro a gente lê depois, em casa. E às vezes nem gosta. Para o escritor autografante, a coisa é confusa. Lançamento mistura enfermarias afetivas que de outra forma não se misturariam jamais – imagine reunir numa noite mãe, tias, psicanalista, colegas de trabalho, dentista, antigos professores, amantes ex ou não, vizinhos de apartamento, amigos de infância desaparecidos há 30 anos, etc. O liquidificador emocional é intensíssimo. E há a solidão indivisível: em noite de autógrafos, emoções à parte, quem menos se diverte é o escritor. Além dos turbilhões íntimos, precisa maquinar dedicatórias estonteantes, ser simpaticíssimo e lutar contra o impulso de sair correndo e gritando “me tira daqui!”. Tudo isso para dizer – et voilá! – e que amanhã à noite vou estar na Livraria Cultura, ali no Conjunto Nacional, Paulista com Augusta, coração de Sampa, autografando as minhas Ovelhas negras. Será certamente menos chato que de costume, não por mim, sempre feliz de voltar a Sampa e rever os melhores amigos do mundo, mas porque vai ter também Cida Moreira cantando divinamente como só ela. Aparece lá. Tenho medo, pânico, como Lygia, da livraria deserta e eu perdido feito pastor no meio de um rebanho de ovelhas desgarradas... Em um tão louvável quanto necessário projeto, a editora Nova Fronteira está reeditando as obras do escritor, jornalista e dramaturgo Caio Fernando Abreu (1948-1996). Os dragões não conhecem o paraíso, Limite branco, Onde andará Dulce Veiga?, Pedras de Calcutá, Morangos mofados, Teatro Completo e as imperdíveis antologias de Caio, com o essencial de sua produção nas décadas de 1970, 1980 e 1990, são os títulos que ganharam novas edições. A coletânea de crônicas Pequenas epifanias também está nessa lista – e é dele que retiramos o texto acima, originalmente publicado no jornal O Estado de São Paulo em 23 de julho de 1995. “Este é um momento muito precioso para o Caio e sua obra; pode-se dizer que a sua literatura está realmente viva. Já há algum tempo houve uma revitalização boa e mais do que justa da história do autor, e tenho certeza de que este projeto de edições novas e bem-cuidadas será muito bem-recebido pelos leitores”, diz Márcia de Abreu Jacintho, irmã do escritor. Capa Capa Capa SEM MÁGICA NEM TERRORISMO Na contramão das promessas milagrosas, Marcio Atalla e Desire Coelho recorrem a pesquisas e estudos científicos e provam que o ajuste das necessidades individuais e um bom planejamento é a melhor dieta para quem quer emagrecer pág. 9 “Após duas semanas de dieta, sinto que perdi catorze dias.” A conhecida frase de Tim Maia vai muito além de uma simples e genial sacada do saudoso cantor: representa o sentimento genuíno de muitos daqueles que embarcam pelo mundo dos regimes alimentares – uma jornada imprevisível que, para a maioria das pessoas, acaba apenas em frustrações. Mas, por incrível que pareça, tão difícil quanto emagrecer é resistir à tentativa de experimentar a última das dietas da moda. Como explicar esse ciclo pouco virtuoso? “Vivemos tempos paradoxais. Nunca se falou tanto em saúde e, ao mesmo tempo, nunca tivemos uma população tão doente, física e mentalmente. Há um excesso alimentar associado a uma obsessão pela prática de dietas e, apesar do grande volume de informações sobre esses temas, as pessoas nunca estiveram tão confusas”, explicam Marcio Atalla e Desire Coelho logo no início de seu livro A dieta ideal, lançamento da Paralela. “Os índices de obesidade só aumentam, vivemos em uma cultura na qual comida boa é comida farta e quase todo dia surgem notícias sobre um novo método de emagrecimento.” Marcio, formado em Educação Física e nacionalmente conhecido pelo quadro Medida Certa, do Fantástico, e Desire Coelho, formada em Esporte e Nutrição e co-coordenadora da pós-graduação em nutrição esportiva na Universidade de São Paulo, basearam-se na somatória de suas experiências para mostrar que não há nada mais eficaz do que a aplicação da ciência no cotidiano. De acordo com eles, a solução é mais simples do que se imagina: é possível obter resultados sem abdicar do prazer da alimentação. A dupla explica os fundamentos do livro em entrevista exclusiva à Revista Superpedido – confira também, nas páginas a seguir, algumas dicas de Marcio Atalla e Desire Coelho, extraídas das páginas da obra. Quando (e por que) vocês decidiram juntar forças para escrever A dieta ideal? E como foi o processo de produção da obra? Nos conhecemos há quatro anos, quando o Marcio fez a Pós-Graduação em Nutrição Esportiva na qual a Desire é coordenadora e professora. Sempre tivemos afinidade de pensamento sobre saúde, exercício e nutrição e não concordamos como esses temas vem sendo tratados hoje em dia. Começamos a trabalhar juntos em 2014, quando veio o convite da Editora Paralela para escrever o livro sobre dietas, que foi nossa oportunidade de mostrar para as pessoas que para se ter saúde não precisa extremismo. Que é possível sim ter saúde comendo o que se gosta com muito prazer e muito movimento. O livro alia teoria e prática, contendo também uma série de passos a serem seguidos pelos leitores. Podem nos contar como funciona essa estrutura? Nós dividimos o livro em 3 partes: Parte 1 - Entendendo os desafios - nessa parte explicamos tudo o que a pessoa terá que enfrentar, não apenas os desafios do ambiente, mas o do próprio corpo que não quer abrir mão da gordura corporal. Parte 2 - Preciso e quero emagrecer, agora o que eu faço? Nós propusemos sete passos que, se seguidos, farão com que a pessoa tenha muito mais saúde e satisfação com seu corpo e com a comida. Parte 3 - Colocando em ação: o desafio dos 10 dias. Como o próprio nome diz, a ideia é colocar em prática tudo o que foi proposto. Neste desafio, a pessoa já se propõe, logo de início, uma meta que não pode ser o peso corporal, mas sim relacionada à saúde, aceitação corporal e objetivos com a alimentação. Nós damos dicas de como ela atingirá essa meta em apenas 10 dias. Além disso, o livro é interativo, justamente para que a pessoa participe e consiga apenas com a leitura já identificar algumas questões importantes para sua saúde. Qual a diferença entre emagrecer e perder peso – e porque compreender essa distinção é tão importante para quem inicia uma dieta? Infelizmente as pessoas colocam toda sua expectativa em cima da balança, mas, como a gente sempre brinca, “a balança é burra”. Ela não sabe o que está pesando. Ela simplesmente mostra um valor. Mais importante do que o peso corporal, porém, é a composição corporal. Uma pessoa sedentária que inicia um programa de atividade física terá certo ganho de massa magra (músculo e outros componentes), e isso pesa na balança. Naturalmente, então, depois de um mês, a pessoa se pesa e a balança praticamente não muda. Isso deixa a pessoa frustrada. Mas está longe de significar pág. 10 Só se perde gordura após trinta minutos de atividade aeróbica? Quando iniciamos uma atividade aeróbica, com trinta segundos já usamos gordura como fonte de energia. Com um minuto e trinta segundos de duração, cerca de 50% da fonte de energia usada é gordura. Depois de três a quatro minutos, já chega a cerca de 80% a 85%, e após seis minutos a gordura é a fonte de energia predominante, com 90% a 95%. Portanto, atividades que duram de vinte a trinta minutos já são muito eficientes em “queimar” gordura e ajudam no processo de emagrecimento. O treino não precisa ter mais de trinta minutos para ser eficiente. Se a pessoa tem mais tempo, contudo, pode fazer outros tipos de treino, mais longos e menos intensos, por exemplo. Todos eles promovem queima de gordura. que ela não teve resultado algum. O mais importante é como a pessoa se sente. Por isso, deixe a balança de lado. Vocês escolheram para o subtítulo a frase “sem mitos, sem milagres, sem terrorismo”. A que vocês atribuem a grande quantidade de fórmulas mágicas que aparecem dia após dia, em revistas e livros? As pessoas acreditam e compram tanto essas fórmulas muito por uma terceirização da culpa: elas leem que determinado alimento faz mal e pensam: “Ah, então é por isso que eu não consigo atingir meus objetivos, esse é verdadeiro vilão”, e pensam que, se ele for retirado, os problemas serão solucionados. Mas isso não é verdade. Normalmente o problema é multifatorial, mas resumindo: comida demais, com qualidade de menos e pouquíssimo movimento. Muitas pessoas relatam ter conseguido emagrecer seguindo algumas dessas dietas. A pergunta: elas são efetivas a longo prazo? Quais os efeitos que podem ter no organismo? As pesquisam demonstram que as dietas restritivas que temos hoje são efetivas no longo prazo para apenas 1 a cada 10 pessoas que se submetem à elas. Outros dados demonstram que, daquelas que não conseguiram seguir a dieta, mais da metade acaba ganhando mais peso do que o que foi perdido, ou seja, engordaram mais ainda. Alimentos tradicionais como o leite e o pão têm virado vilões nos dias de hoje, enquanto outros viram queridinhos do momento, como o suco verde e quinoa, por exemplo. O que há de verdade nessas afirmações? Como saber o que se deve comer e o que não se deve comer? Basta pensar que todo ano surge um novo vilão e nenhum deles até hoje resolveu o problema. Suco verde e quinoa são ótimos? Sim! Mas arroz integral e feijão, salada colorida, entre outros, também são. Não adianta cortar o leite da dieta, tomar suco verde três vezes por dia e não se exercitar. Não existe alimento milagroso, o que importa é o equilíbrio. Como o aspecto emocional é ligado ao sucesso ou fracasso de uma dieta? Comer é mais do que nutrir o corpo, é nutrir a alma. Algumas comidas são capazes de nos remeterem imediatamente a alguma lembrança boa, e isso aumenta nossa satisfação com aquela comida. A partir do momento que aquele alimento lhe é privado, gera-se uma série de comportamentos negativos que levará ao insucesso. É fato: se você gosta muito de determinado alimento, mais cedo ou mais tarde irá consumi-lo. levantar peso ajuda a emagrecer? A musculação tem o importante papel de aumentar ou preservar a massa muscular. Ter músculos no corpo ajuda a aumentar o ritmo metabólico. Assim, o corpo com mais massa magra é mais ativo e gasta mais calorias para se manter vivo do que um corpo mais fraco. Logo, associada às atividades aeróbicas, a musculação, ou qualquer outro treino de força resistida, é perfeita para auxiliar no emagrecimento. pág. 12 Vocês dizem que uma das formas de melhorar a alimentação é “organizar o ambiente”. Podem explicar como isso funciona? Muitas pesquisam sugerem que comemos mais por influência do ambiente do que pela fome propriamente dita. E isso é fácil de ser verificado. Se você chega em casa e tem bolo fresco, por mais que não tenha fome, você come. Se no seu local de trabalho sempre tem guloseimas, aumentam as chances de você comer algo toda vez que quiser uma pausa do trabalho. Sendo assim, nós damos algumas dicas no livro de como mudar o ambiente a seu favor. Não são poucos aqueles que se dispõem a iniciar uma sequência de atividades físicas, mas logo desistem. Na opinião de vocês, por que isso ocorre? E quais as dicas para ajudarem as pessoas a manter essa prática? As pessoas desistem pois é contra a natureza do ser humano procurar atividades que não sejam para sobrevivência. Nossa tendência é ficar parado. Então a dica é procurar primeiro uma atividade que seja prazerosa. Desse modo, a pessoa vai esperar ansiosamente por ela. Além disso, ela tem de se encaixar bem no cotidiano daquela pessoa. Para isso, a programação é fundamental. O exercício precisa fazer parte da agenda senão será sempre deixado para depois, e depois, e depois.... Quais os conselhos que vocês dariam para alguém que quer montar um programa de atividades físicas mas não tem orçamento suficiente para contratar um profissional ou se matricular em uma academia? Que a saúde pode, e deve, ser conquistada independente de condições financeiras. O importante é encontrar algo que a pessoa tenha prazer e que ela se programe para isso. A atividade tem que fazer parte da agenda da pessoa, como todas as outras atividades que ela tem. Então, sugerimos que essa pessoa pense em uma atividade que lhe dá prazer, pode ser dançar, pular corda, exercícios em casa, caminhada, corrida, bicicleta... As possibilidades são inúmeras! O estômago da sobremesa existe? A resposta é: sim! Às vezes a pessoa mal consegue terminar o prato principal de tão saciada que está, mas quando chega a sobremesa, tudo muda... Se você é uma daquelas pessoas que amam uma sobremesa, já deve ter passado pela seguinte experiência: mesmo depois de se sentir plenamente satisfeito com a refeição principal, quando lhe oferecem a sobremesa parece que seu estômago (que estava cheio) instantaneamente abre um espacinho para o doce. Duas hipóteses parecem atuar em conjunto para explicar esse fenômeno: quando a pessoa vê a sobremesa, o cérebro estimula a liberação de hormônios do prazer que superam os efeitos dos hormônios da saciedade. Ao ver a guloseima, o estômago se expande, criando mais espaço (pode chegar a quinhentos mililitros de aumento de volume) e permitindo, assim, que a pessoa coma mais. Se você ama doces, aqui vai uma dica importante para que continue saboreando sua sobremesa sem exageros. Caso faça a refeição em algum lugar no qual você sabe que haverá sobremesa de que gosta muito e sabe que vai saboreá-la, coma menos no prato principal, principalmente menos carboidratos, uma vez que praticamente todas elas são compostas desse nutriente. Aproveite para comer bastante salada crua para diminuir o efeito do açúcar no organismo. Assim você garante que naquela ocasião especial comerá o que tanto gosta, ficando satisfeito e em equilíbrio com seu corpo. pág. 13 pág. 14 Biografia Biografia Biografia Nua e crua Autobiografia póstuma de Norma Bengell revela por completo toda a vida da polêmica artista Na montanha russa de emoções que foi a vida de Norma Bengell (1935-2013), uma palavra é constante: independência. A artista jamais deixou de seguir seus instintos, trilhando seu caminho e fazendo-se ouvir independente de convenções ou opiniões alheias. Essa franqueza inegociável transparece por todas as páginas de sua autobiografia póstuma, coordenada por Christina Caneca e recém-lançada pela nVersos. Norma havia redigido boa parte do material entre os anos 1970 e 1990, e retomou os escritos cerca de dois anos antes de sua morte. Dos dias de estrela do teatro e do cinema à luta contra a ditadura e, depois, pela retomada do cinema brasileiro, passando por efervescentes casos amorosos, doenças, censura, prisões, toda a história da atriz que entrou para a história como a primeira a fazer um nu frontal no cinema brasileiro (no filme “Os Cafajestes”, de 1962) está narrada sem censura – e de forma ricamente ilustrada, para que não haja dúvidas de que tudo aquilo foi real. Certa vez, fui receber uma homenagem no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, em 2011, no Rio de Janeiro. Entrei no palco devagar. Quando começaram a me aplaudir, diminuí a marcha da cadeira de rodas. E aí os aplausos aumentaram. Foi um êxtase de carinho, como se todos os aplausos entrassem pelos meus poros. Quando cheguei ao meio do palco, pensei como era bom carregar comigo tudo aquilo que conquistei. Falei algumas palavras e chorei muito. Pedi que continuassem a aplaudir, pois é disso que um artista necessita. O artista vive a oposição do mundo vivido e do mundo sonhado. E o que no fundo realmente nos faz viver é saber que milhares de pessoas estão entrando em salas de cinema de todo o mundo para nos assistir nas telas. Todas as músicas que já ouvi passam por mim, o que às vezes dói. Meus movimentos já não são os mesmos, pois os gestos estão limitados pelo próprio corpo, mas lembrem-se de que sou uma grande atriz, e alguém pode se perguntar: “Será que ela está atuando?”. Não, desta vez não estou. Infelizmente. A seguir, confira um trecho da obra e uma galeria com fotos da carreira de Norma Bengell. O quanto de minha juventude já se perdeu? pág. 15 Pensando melhor, nada se perdeu. Muito de minha juventude está impressa no tempo, nos celuloides, como a beleza fixada para sempre no inconsciente de todas as pessoas, imagem que se reproduz na infinitude da arte, em todos os filmes que fiz. e chorar, muito além do meu dom de fazer rir e chorar. Sou invencivelmente frágil. Uma sobrevivente que vive com intensidade. Sou tão mortal quanto qualquer um, sou humana. Muito humana, da espécie dos que têm o dom de sorrir Não preciso me lembrar de tudo, pois prefiro imaginar as coisas, como faria aquela mesma menina do Lido brincando nos meus olhos, ou como a mesma musa sedutora, a rebolar em minha boca. Sou um ser humano de verdade, dos que renascem como a fênix. Em cena do teatro de revista, anos 1950 Foto do acervo pessoal de Norma, sem data Estrela do Festival de Cannes, anos 1960 Na peça Vestido de Noiva, anos 1970 Não sou imortal. Papo Papo de escritor de escritor Papo de escritor Civilização em pedaços Eloar Guazzelli fala sobre sua graphic novel Kaputt, adaptação do clássico livro do italiano Curzio Malaparte Durante a Segunda Guerra Mundial, o jornalista italiano de origem alemã Curzio Malaparte foi enviado pelo Corriere Della Sera para cobrir os conflitos no front oriental. Durante esse período, escreveu, secretamente, um relato sobre a guerra chamado Kaputt – palavra alemã que significa “quebrado, acabado, destroçado”. O livro é um misto de reportagem e ficção em que todos os horrores da guerra vêm à tona. Publicado originalmente em 1944, foi agora foi transformado pelo quadrinista brasileiro Eloar Guazzelli em uma graphic novel de tirar o fôlego, recém-lançada pela WMF Martins Fontes. Confira a seguir uma entrevista com Guazzelli – e, mais adiante, um trecho da adaptação. Como surgiu a ideia de adaptar o Kaputt? O Kaputt nasceu de uma reunião dos sonhos com o Alexandre Martins Fontes (diretor-executivo da WMF) e a Luciana Veit (coordenadora do Departamento Editorial e de Novas Aquisições). O Alexandre se virou para mim e disse: “Guazzelli, o que você quer fazer?”. Eu não esperava por aquilo – mas parei para pensar e sabia o que queria. Desejo fazer o Kaputt desde que eu tenho 14 anos, desde que tenho uma consciência profissional. Esse era o livro predileto do meu pai, que foi advogado de presos políticos e se identificou muito com Malaparte, autor do livro… É um livro forte, tem passagens terríveis mas muito poéticas, e me marcou. É a melhor obra que li nesse quesito de lidar com as entranhas, os perigos do mundo. Sobre um cara que acompanha a Segunda Guerra, no lado alemão, mas é absolutamente crítico. Foi uma grande honra e responsabilidade trabalhar com esse livro. Qual foi seu critério para escolher os contos que entrariam no livro? Foi uma operação desgraçada, já que o livro tem tantos contos maravilhosos. No caso do Kaputt, existe uma estrutura. São seis contos, que ele dividiu em: os cavalos, os ratos, as renas, os cães, os pássaros e as moscas. Foi uma ideia maravilhosa dividir em animais, que ele relaciona com a nossa crueldade humana. Ele coloca os ratos mais na questão da perseguição aos judeus na Polônia... Não por acaso, em Maus, que é a história do Holocausto em quadrinhos, os judeus são ratos; os alemães são gatos. Na minha versão, peguei um conto de cada animal. Sofri muito na parte dos ratos, onde há vários jantares com o monstro que é o governador da Polônia. O país está na miséria e na fome, e ali tudo é um luxo e um esplendor. E é de um cinismo... Os diálogos são absolutamente perfeitos, cruéis, atrozes. pág. 17 Por ser o livro favorito de seu pai, como você já mencionou, sua ligação com a obra é bastante emocional, certo? Todo o tempo em que mexi com o Kaputt, pensei em algumas pessoas, pensei no meu pai, a quem o livro é dedicado, de quem herdei o nome. Ele defendeu preso político, discutiu com torturador na porta da câmara de tortura; meu pai viu horrores, e o Malaparte viu horrores. Sei que a identidade é total. Os dois sobreviveram transformando isso em narrativa. A gente reclama de barriga cheia, muitas vezes. “Meu Deus, nossa vida, que estresse, onde vamos parar?, como é violento”, mas não. Ninguém sabe… Na guerra, o mundo é virado de cabeça para baixo. Está no Kaputt: a besta que há em praticamente todo ser humano aflora, e os seres mais pacatos e comuns se transformam na coisa mais horrorosa que se pode imaginar. Por que essa ainda é uma obra necessária e atual, mais de meio século após sua publicação? A França vai eleger, provavelmente nos próximos anos, uma neofascista; ou seja, o que aconteceu no passado pode voltar de forma diferente. Por isso, Kaputt é extremamente necessário. Além do mais, a obra tem uma incrível qualidade artística. Considero o Malaparte um sujeito brilhante – não vou falar a palavra gênio porque nós vivemos na era dos gênios. Nunca vi o mundo ir tão mal com tanto gênio. Gênio para lá, gênio para cá...… Mas há pessoas muito brilhantes, e ele era uma pessoa de grande coragem, que conseguiu fazer um dos livros mais cruéis e mais poéticos que eu conheço. Uma obra que dói. Papo Papo de escritor de escritor Papo de escritor pág. 19 Gastronomia Gastronomia Gastronomia Do divã às panelas Tatiana Romano, autora do lançamento Panelaterapia (Belas-Letras), conta como passou de psicóloga a blogueira de culinária Há dez anos eu me casei e mudei de cidade. Mudanças nunca foram um problema para mim, gosto delas e tenho uma grande facilidade de adaptação. No meu primeiro ano na nova cidade, eu, que sou formada em Psicologia e pós-graduada em Recursos Humanos, já trabalhava na área e com o passar do tempo fui incorporando novas atividades. Passei a ministrar palestras em universidades, ensinando os jovens sobre como fazer um currículo, como se comportar em uma entrevista, e daí surgiram convites para atuar como professora. Minha rotina então era trabalhar das 8h às 18h em uma consultoria, pegar uma hora de estrada para chegar até a faculdade que ficava em outra cidade (isso incluía jantar qualquer porcaria durante o trajeto), dar aula até as 22h45min, pegar mais uma hora de estrada e chegar em casa “morta” de cansaço! Como se não bastasse, uma das faculdades que eu lecionava passou a exigir uma segunda pós-graduação na área de docência e lá se foi meu sábado “pelo ralo”. Bem, eu ainda tinha o domingo livre! Ah, o tão esperado domingo! Meu dia oficial de relaxar! Engana-se quem me imaginou jogada no sofá de pijama e pantufas. No domingo eu queria era cozinhar! Sempre gostei da arte culinária, minha família é repleta de bons cozinheiros e daquelas reuniões regadas a muita comida e bebida! O fato é que antes de casar eu não tinha tanta oportunidade de ir para a cozinha, já que minha mãe e a Luzia, nossa querida cozinheira há vinte anos, cumpriam essa tarefa maravilhosamente bem! Foi somente depois de casar que eu realmente percebi que levava jeito para a coisa. E todo domingo eu fazia as tarefas básicas de dona de casa pela manhã e passava o resto do dia cozinhando. Inventava, testava, errava, mas era sempre uma delícia! O tempo foi passando e eu me habituei à minha rotina insana de ter apenas um dia de lazer, havia me acostumado a viver mal (lembra da minha facilidade de adaptação?). Fazia parte da minha vida não ter tempo, não ter disposição, estava simplesmente “vivendo no piloto automático”. É bem verdade que eu tinha uma condição financeira confortável, principalmente porque não tinha (e não tenho) filhos, mas ter dinheiro e não ter tempo para usufruir, de que me adiantava? No meio deste período, em 2009, eu resolvi criar um blog, cujo nome eu escolhi com muita facilidade, o “Panelaterapia”. Criei este espaço virtual sem nenhuma pretensão, apenas para registrar minhas aventuras culinárias, meu momento de ‘terapia’ junto às panelas. Provavelmente também motivada pelo desejo inconsciente de prolongar meus tão festejados domingos na cozinha. Em 2010, já com mais de um ano de existência, o blog começava a se concretizar nesse universo virtual como pág. 21 uma fonte de pesquisa confiável para quem buscava receitas fáceis, com ingredientes possíveis, mas com aquele toque especial que conferia uma aparência mais gourmet aos pratos. Nesse mesmo período eu me vi em meio a uma uma crise existencial, na qual passei a questionar se realmente eu queria envelhecer levando este estilo de vida corrido, sem tempo para nada. Foi então que eu decidi que queria ser feliz. Confesso que não foi fácil admitir que a profissão que demandou tanto tempo de estudo, tantos anos de trabalho, já não me satisfazia mais. Eu não tinha desafios na carreira, não sentia mais aquele frio na barriga que acompanha as novidades, não tinha motivação alguma para continuar. Eu não queria mais passar a semana como a maioria das pessoas que eu via nas redes sociais comemorando a sexta-feira e chorando a segunda. E assim eu fiz um planejamento. Fui abandonando meus empregos aos poucos e me adaptando a viver com menos. Obviamente que esse ato de “chutar o balde” só foi possível graças ao apoio financeiro e emocional do meu marido. Em meados de 2010, já desempregada, eu não sabia que rumo minha vida profissional ia tomar, por ora eu só queria ser blogueira de gastronomia, queria continuar fazendo e postando minhas receitas. E assim eu o fiz. O Panelaterapia seguiu seu rumo e ocupou um lugar cada vez maior no meu coração. Quando me dei conta, ele já era minha nova profissão! Simplesmente aconteceu! Com o crescente sucesso do blog, tive de aprender fotografia, técnicas de SEO, programação em HTML, pesquisar sobre técnicas de cozinha, novas receitas, administrar redes sociais, enfim, como qualquer emprego, exige aprimoramento constante. Nestes cinco anos de existência o blog estabeleceu parcerias importantes, atingiu números de audiência que eu jamais poderia imaginar, possibilitou-me conhecer pessoas e lugares incríveis, experimentar novos sabores, ou seja, não me faltam motivos para comemorar. Todo esse processo de me assumir como cozinheira e blogueira fez com que eu refletisse muito sobre a relação das emoções com a comida e culminou com o livro Panelaterapia, que é a consolidação do meu desejo de compartilhar receitas que são adequadas a cada uma das situações emocionais em que podemos nos encontrar. As receitas que sugiro são fruto muito mais da minha percepção e meu feeling de cozinheira do que de qualquer conhecimento técnico ou científico. Espero que, de maneira leve e descontraída, ele cumpra o papel de despertar a percepção de que o ato de cozinhar, além de divertido, pode ser muito terapêutico. LASANHA DE MACARRÃO INSTANTÂNEO Ingredientes 200ml de água – 1 embalagem de 340ml de molho pronto de tomate – 2 pacotes de macarrão instantâneo de 80g cada – 120g de presunto cozido picado – 120g de queijo mozzarela ralado – 200ml de leite integral – 1 colher (sopa) bem generosa de requeijão cremoso – 1 colher rasa (café) de sal – 25g de queijo parmesão ralado Modo de preparo Ligue o forno em 200ºC para ir aquecendo. Misture a água com o molho pronto. Leve ao fogo ou micro-ondas para aquecer. Não é necessário ferver. A intenção é obter um molho bem ralo para que o macarrão cozinhe nele. Despeje metade desse molho em um refratário. Separe as placas dos pacotinhos de macarrão instantâneo (cada pacote possui 2 placas) e acomode-as ainda cruas no refratário sem sobrepô-las, apenas colocando-as lado a lado. Despeje o restante do molho sobre o macarrão. Cubra com presunto picado, em seguida com o queijo ralado. Aqueça o leite e misture com o requeijão e o sal. Despeje por cima de tudo de maneira uniforme. Polvilhe parmesão ralado, cubra com papel alumínio e leve ao forno por 25 minutos. Retire o papel alumínio e volte para o forno por alguns minutos apenas para gratinar o queijo. Nesse momento, ative a função grill, caso seu forno a possua. Dica: Se o seu refratário for fundo, você pode sobrepor as camadas, para isso dobre a quantidade de todos os ingredientes. Rendimento: 3 a 4 porções Finanças Finanças Finanças O porquinho da economia Segundo a tradição, o porco é um símbolo de futuro e prosperidade. De sua carne se aproveita quase tudo, e bemconservada é uma fonte de alimento que pode durar por longas temporadas. Os cofrinhos em forma de porquinho provém da assimilação dos vocábulos ingleses pig (porco) e pygg, um tipo de argila cor de laranja que outrora era utilizada para fabricar utensílios caseiros, entre eles panelas e jarros no qual eram guardadas moedas. Procure alimentar seu porquinho sempre que puder! Poupança à moda japonesa Chega ao Brasil o Kakebo, a agenda de finanças pessoais que é febre na terra do sol nascente Kakebo é uma palavra do japonês que significa “livro de contas para a economia doméstica”. Algo aparentemente tão simples é um verdadeiro fenômeno no Oriente, onde centenas de milhares de pessoas o utilizam diariamente para manter na linha os gastos familiares e administrar até o último centavo que entra e sai de casa. Trata-se de uma ferramenta simples porém extremamente eficaz para organizar as finanças pessoais – e que agora chega ao Brasil em uma prática edição da BestSeller, intitulada Kakebo – Agenda de finanças pessoais. Não há segredo: por meio do preenchimento de tabelas de despesas (mensais e semanais) e de planilhas de entrada e saída de dinheiro, o Kakebo auxilia o leitor no controle de suas finanças, ajudando-o também a refletir a respeito de seus hábitos de consumo – segue nesta reportagem o exemplo de uma das páginas do livro. Mas atenção para o ensinamento da sabedoria oriental: “O Kakebo não vai fazer milagres por você, só vai ajudá-lo no caminho. A chave está em suas mãos. Defina seus próprios objetivos, siga as diretrizes e mantenha o ritmo.” pág. 23 FicçõesFicções livrescas livrescas Ficções livrescas Encontro entre escritos Por FERNANDA FRANÇA O seu amor pelos livros era tão grande que ele escolheu trabalhar rodeado por eles. Érico, que nasceu em uma família que também amava as letras, já havia ajudado muita gente a escolher o melhor livro para diversas ocasiões – havia quem procurava um livro há anos e não se lembrava do nome, os que desejavam ler algo e nem sabiam exatamente o quê, aqueles que buscavam um presente e quem, sem saber, buscava um consolo nas páginas daquela livraria. E Érico sempre sabia o melhor livro para indicar. Mas era a primeira vez que se encantava por um rosto atrás de um livro. Procurava por um título quando a viu, lá em cima, em uma mesa quase nunca ocupada, segurando um livro com as duas mãos enquanto lia. Seu cabelo caía sobre o rosto e seu semblante era triste. O que será que aconteceu?, pensava Érico. Para ele, tudo tinha um motivo. A vida era quase um enredo literário. Se uma personagem aparece triste é porque algo aconteceu. Ou a leitura era dramática. Perdeu a moça da visão quando entregou um livro a um cliente, mas notou que no dia seguinte, no mesmo horário do almoço, ela estava lá novamente, sentada na mesma mesa escondida, mas dessa vez com outro livro. O semblante era o mesmo. Subiu sem que ela percebesse que havia mais alguém por perto e se escondeu atrás de uma prateleira. Não porque era errado estar ali, mas porque não queria que sua presença interferisse em nada. pág. 25 Ele queria vê-la de perto como havia conhecido de longe. E ficou ali, com o olhar perdido entre uma capa e outra, sem ser visto, e em seu próprio livro da vida real. O telefone tocou e ela atendeu. Érico não devia, coisa feia, diria sua avó, escutar a conversa sem ser notado. Mas como nem sempre fazemos o que devemos, mas o que achamos que devemos naquele momento, ele apenas escutou. E a moça balançava a cabeça negativamente e respondia de forma lacônica com “uhum” e “tá bem”. Mas não estava bem. No final da ligação, ela fez um pequeno discurso sobre a pessoa do outro lado da linha não ter direito de julgá-la por ela ter parado de falar com a irmã. “Ela abandonou a mãe justamente quando ela está doente. Ah, você acha que não? Então como você chama isso? Dar um tempo? Refrescar a cabeça longe da família?”. Ele se sentiu mal por ouvir e desceu as escadas sem ser notado. Não precisava saber o final da história. Pesquisou pelo livro certo. Ele sabia que existia, já tinha lido e indicado. No dia seguinte, quando ela se sentou no mesmo lugar, o livro estava lá, sobre a mesa. Ela o pegou e olhou para os lados, como fazem aqueles que acham que estão sendo seguidos nos filmes. Abriu o livro e começou a ler. Na hora de ir embora, deixou-o ali. E assim por mais dois dias, quando finalmente passou no caixa com o livro debaixo do braço. Depois de levá-lo, Érico continuou a brincadeira e deixou mais um livro sobre a mesa. O tema era outro, mas ele sabia que ela também gostaria de ler sobre aquilo. Não era mais um livro de ajuda, era ficção. A história era exatamente o que ela precisava ler, foi o que pensou quando leu o primeiro capítulo na livraria. Dessa vez, a leitora não esperou dias para levar o livro. Decidiu comprá-lo no mesmo dia. aquele era o quarto livro de comunicação entre os dois. A página tinha uma frase marcada com uma caneta fluorescente amarela. Eu quero te conhecer. Ela havia tido o cuidado de selecionar essa frase no livro e marcá-la. Ao lado, mais um número. Ao abrir essa página sugerida, havia um bilhete escrito em um pequeno papel de bloco. Obrigada por me ajudar. Você soube encontrar os livros certos. Este é um presente para você, espero que goste. O primeiro livro que eu li, ainda criança. Ganhei um igual a este da minha mãe e fala sobre amizade. Vamos conversar sobre ele e tomar um café? Beijos, Anna. No dia seguinte, ela encontrou um outro livro com uma charada parecida. Na capa estava um bilhete com a palavra SIM e embaixo o número da página. Ele não queria aparecer ali, naquele momento, para ela. A página indicava outra e mais outra e mais outra, formando, ao fim, o número de um telefone. Ela o adicionou, já viu sua foto e enviou uma mensagem na hora. E, daquela vez, sem palavras, apenas um recado com uma carinha formada por dois pontos, traço e fecha parênteses. E ele perguntou se ela toparia encontrá-lo na cafeteria da livraria no fim de seu expediente. Anna respondeu que topava e que imaginava que ele trabalhava com livros, mas que era escritor. De certa forma, eu tenho um pouco de todos eles em mim – respondeu Érico. E aquela foi a primeira e última vez que ele se interessou por um rosto atrás de um livro. Pelo menos, essa era a história que ele contava aos filhos. A intenção de Érico, muito mais do que apenas vender livros, era saber qual era o livro certo para cada pessoa em cada momento. Os livros tinham esse poder mágico de trabalhar para que tudo começasse a se resolver, como se fossem amigos calados e cada palavra se agrupasse a outras de forma a escrever o que você precisa ler. Como se o autor, ao criar um texto, soubesse do que cada leitor precisa. Após o terceiro livro, Érico percebeu que naquele dia, depois que a moça foi embora, havia um livro infantil sobre a mesa. Ao perceber que não havia ninguém no andar superior, ele subiu e notou um bilhete sobre o livro. Um recado que talvez só ele entendesse. O número quatro e o número de uma página. Quatro porque Fernanda França é jornalista e escritora, pós-graduada em Comunicação Jornalística pela Cásper Líbero. É autora de Bolsas, Beijos e Brigadeiros, publicado pela Editora Planeta e de Malas, Memórias e Marshmallows e 9 Minutos com Blanda. Mantém contato com os leitores por meio de seu site www.fernandafranca.com.br e das redes sociais. Ficções Ficções livrescas livrescas Ficções livrescas Quando as luzes se apagam Por KEL COSTA Fernanda era uma funcionária que gostava de ser a última a sair e ser a responsável por fechar as portas da livraria. Aquele tinha sido um dia cheio, afinal. Após uma sessão de autógrafos de um autor famoso e uma fila interminável de leitores, ela merecia um descanso. Ignorando o horário tardio, Fernanda se sentou numa das poltronas de couro que ficavam espalhadas pelo local e descalçou os sapatos. O silêncio que reinava ali dentro era mesmo magnífico. A livraria, pequena e aconchegante, tornara-se seu lugar favorito. O piso estava sempre muito bem polido, as estantes de mogno, antigas e tradicionais, conservavam a madeira belíssima. A iluminação era intimista, mas acima de algumas poltronas, havia luminárias potentes para o visitante fazer uma leitura. Além disso, o ar ali dentro era diferente. De algum modo, o cheiro inebriante de café com biscoitos amanteigados estava sempre presente, mesmo que não houvesse nenhuma das duas coisas à venda. Fernanda gostava de estender seu horário e ler um pouco, antes de fechar a loja. Naquele dia não foi diferente. Depois de puxar as pernas para cima, dobrando-as sobre a poltrona, abriu o livro escolhido do dia. Vinte minutos depois, sobressaltou-se quando as luzes se apagaram. Tateou em busca do celular no seu colo e acionou a lanterna do aparelho. Decidiu que era hora de ir para casa, mas ao se levantar, ouviu risadas que vinham dos fundos da livraria. Seu coração parou por um instante antes de retomar as batidas. – Quem está aí? – perguntou, virando-se para trás com a lanterna iluminando as estantes. – Tem alguém na loja? Sem receber resposta, Fernanda se encaminhou para a seção de literatura brasileira, que parecia ser o local de origem da perturbação. Apontava a lanterna para os lados sempre que passava por um corredor escuro, mas ao contornar a estante de autoajuda, ela estacou, assombrada com a visão. – Pois não? – perguntou ao estranho de costas para ela. A jovem achava impossível aquele rapaz ter entrado sem que ela percebesse. Lembrava-se muito bem de ter trancado a porta depois que o último cliente deixou a loja. Contudo, sua experiência como vendedora solícita falou mais alto. Ela não podia simplesmente expulsar o cliente. – Posso ajudar em algo? – Fernanda se aproximou do homem, que rapidamente virou-se para ela. Era lindo, bronzeado e usava um chapéu. pág. 27 Ele arregalou os olhos quando a luz forte da lanterna o capturou. Fernanda pensou em se aproximar mais e obriga-lo a se retirar, mas não conseguiu se mover quando um garotinho sem camisa e vestindo apenas um short vermelho saiu detrás do rapaz. Ela não sabia o que era mais absurdo: o cachimbo na mão da criança ou o fato dela ter somente uma perna, como se fosse um... não! Ela se recusava a pensar nisso! Ela nem deve saber muita coisa sobre nós. Não temos asas, nem dentes afiados, não usamos varinhas mágicas, não nos transformamos em animais... – Bem, sobre esta última questão, fale apenas por você. – Não tem graça, Boto! Fernanda soube que estava delirando. Talvez seu almoço estivesse estragado, pois se sentiu doente. Sentou-se no chão e apoiou as costas numa estante, para então fechar os olhos. Ficou assim por alguns segundos, mas ao abri-los novamente, viu que as duas figuras continuavam ali. Fernanda destapou o rosto, mas usou as mãos para cobrir as orelhas. Talvez se ela bloqueasse aquele som, conseguisse interromper a alucinação. Ficou cantando uma de suas músicas favoritas enquanto mantinha os olhos fechados. Aos poucos, o som das vozes foi diminuindo, diminuindo... e então cessou. Ela finalmente abriu os olhos e baixou as mãos. Não precisava mais da lanterna, pois a eletricidade tinha voltado. Agora, onde segundos antes estavam os dois rapazes, não havia nada além de partículas de poeira pairando pelo espaço vazio, iluminado pela fraca luz da lua que entrava pela janela. – Quem... quem são vocês? – perguntou e levou uma mão à cabeça, que latejava. – Estamos sendo esquecidos, Boto. Ninguém se importa mais... – Como assim quem somos nós? A senhorita trabalha numa livraria e não sabe? – O menino parecia ter se magoado. – É tão difícil reconhecer um saci? A voz que ela ouviu parecia estar a quilômetros de distância. Justo quando ela pensava ter se livrado da alucinação. – Ela está falando com a gente? – o belo jovem de chapéu perguntou ao menino. – Acho que ela pode nos ver. – Um... – ela engasgou – o quê? Aquele menininho que não devia ter mais de oito anos colocou as mãos na cintura e prendeu o cachimbo entre os dentes ao se aproximar dela. Agora parecia bem mais velho, além de furioso. – Saci! Preciso ser mais claro que isso? Eu não preciso de apresentações! E não me olhe com esta cara! Se eu fosse um lobisomem ou um anjo, você estaria radiante! – Ou um vampiro – o rapaz de sorriso perfeito falou. – Você é? – Fernanda, que achava estar prestes a desmaiar, não conseguiu resistir. – Um vampiro? – Caramba, não! – Ele jogou as mãos para o alto e agachou-se perto dela, apoiando as mãos nos joelhos. – Sou o boto, muito prazer. A gargalhada de Fernanda foi tão alta que nem ela mesma reconheceu como sua. Depois, largou o celular no chão e escondeu o rosto com as mãos, desejando recuperar a consciência o mais rápido possível. – Acho que ela está em negação. – É lógico que está! – o garotinho bufou. – Você não vê? Fernanda se recompôs rapidamente, ansiosa para fechar a livraria e ir para sua casa. Não sabia mais o que era fruto de sua mente e o que era real. Tinha certeza que acordaria ainda mais confusa no dia seguinte e, para piorar, com uma bela enxaqueca. No entanto, quando levou alguns exemplares sobre o folclore brasileiro para espalhar pela vitrine, sentiu-se como se fizesse parte de alguma coisa importante. Antes de passar pela porta, achou ter escutado mais algumas risadas. É claro que depois de passar a chave pela fechadura e virar de costas para ir embora, não viu as duas figuras que dançavam no escuro. Durante a faculdade de Interpretação Cênica, Kel Costa descobriu seu amor pela escrita. Atualmente é estudante de Letras e blogueira, por amor à literatura. Viciada em romance e fantasia, é apaixonada por histórias de vampiros. Escreveu mais de trinta fanfics antes de dar início à Fortaleza negra, o primeiro de uma trilogia publicada pela editora Pensamento. Para falar com Kel, basta procurá-la pelas redes sociais ou em seu site: www.kelcosta.com.br. Jornalismo Jornalismo Jornalismo Que bonito é... Pioneiro do jornalismo transcultural no Brasil e ícone da revista Trip, Arthur Veríssimo tem suas famosas crônicas lançadas em Gonzo (Realejo Livros). A seguir, a fantástica história do dia em que o repórter participou de uma pelada a mais de 4 mil metros de altitude na Bolívia. Respirava o ar puríssimo enquanto observava, da estação de esqui de Chacaltaya, a imensidão dos Andes. No horizonte distante, onde está encravada a cidade de La Paz. A capital da Bolívia está situada a mais de 3.600 metros de altitude e Chacaltaya está a uma altura de nada menos que 5.350 metros; a estação se encontra no coração da cordilheira real e é a mais alta do planeta. Suas pistas para esquiar resumem-se, atualmente, a apenas duas linhas finas de neve. Tudo isso devido ao degelo dos picos nevados e às mudanças climáticas. Eu circulava pela Bolívia há mais de duas semanas, investigando a vida dos povos que habitam as bordas do lago Titicaca e as entranhas do caldeirão de La Paz. Estava aclimatado e havia organizado algo inusitado: uma partida de futebol com as cholas, as tradicionais indígenas aimarás que se destacam por suas tradições e por seu visual. O desafio estava lançado. A partida seria na cidade El Alto, que se estende na plataforma que rodeia a imensa cratera de La Paz. Estava marcada para domingo, em uma quadra de 4.050 metros de altitude. O cenário misturava os picos nevados dos Andes com as casas de adobe dos habitantes. Aos poucos, as cholitas iam chegando com suas bolsas, fardos e sorrisos marotos. A única condição que a dirigente havia imposto era que este repórter deveria estar trajando as roupas típicas das mulheres andinas. Fazer o quê? Fui agraciado com a tradicional pollera e o chapéu de coco. A tal pollera é um conjunto de saias que são colocadas uma por cima da outra. Imagine a cena. Este cabrón com mais de 1,85m de altura travestido de cholita aimará. Com chapéu Borsalino no topo da minha cabeça, era uma mistura de Bat Masterson de saia plissada com um Carlitos desidratado. Começa a partida. Minha esquadra fazia parte de um grupo de indígenas que batem bola todos os fins de semana há mais de oito anos. Todas são pequenas, mas com pulmões de Cesar Cielo. No primeiro pique, senti o peso do meu corpo como se fosse um mamute. As cholas se divertiam e queriam dar meia lua, lençol e olé neste incauto esportista. O chapéu coco não se firmava na calota craniana. Fiquei na minha. Respirava com tranquilidade e, aos poucos, fui tirando o pé do freio. A partida estava 3 a 2 para as adversárias. Depois de 30 minutos, o Borsalino encaixou na cabeça e percebi que tinha poderes sobrenaturais. Num dado momento, baixou o Alex, personagem do filme Laranja Mecânica, neste precioso corpo humano. Saí em disparada. Acreditem, marquei dois gols. Vibração total. As adversárias me olhavam torto. No segundo tempo, houve até expulsão. Faltando quatro minutos para o encerramento, fiz um passe para Carmen, a craque do time, que finalizou fazendo um golaço. Final: 7 a 5 para nossa esquadra. pág. 29 Psicologia Psicologia Psicologia No livro Personagens ou Pacientes? (editora Artmed), uma seleção de psicólogos e psiquiatras analisam clássicos da literatura mundial sob a ótica da saúde mental. No texto a seguir, algumas das patologias dos personagens de Macbeth, de William Shakespeare, são desvendadas. Diagnóstico literário Por ZACARIA BORGE ALI RAMADAN e TÁKI ATHANÁSSIOS CORDÁS A dramaturgia de Shakespeare é mais divulgada e conhecida por meio de Hamlet e Romeu e Julieta em detrimento de outras peças igualmente admiráveis. Contudo, nesta nossa época de grandes ambições, disputas de poder, vaidades narcísicas, traições e covardias, nenhuma tragédia é tão atual quanto Macbeth, rica de ensinamentos psicológicos e psicopatológicos – paixões humanas que nem as mais sofisticadas culturas conseguiram sepultar. zado com o destino de Macbeth e de sua esposa, enredados em uma trama cruel e sem saída. Além disso, a peça registra, em um de seus atos, uma das mais intrigantes manifestações psicopatológicas, relacionada a turvação de consciência, onirismo, pseudoalucinações e dissociação histérica, ilustrativa do conceito de compreensão proposto por Karl Jaspers. Não por acaso, a peça deu origem a duas primorosas obras cinematográficas, a de Orson Welles, em 1948, e a de Roman Polanski, em 1971, também pouco divulgadas. Em 1957, Kurosawa dirigiu uma adaptação de Macbeth cujo título, em português, é “Trono manchado de sangue”, considerada pelo crítico Harold Bloom a melhor adaptação cinematográfica de Macbeth. Criada entre 1600 e 1620, segundo os historiadores, a tragédia se passa na Escócia, onde Macbeth, primo e fiel vassalo do rei Duncan, graças aos seus atos de bravura, credencia-se a sucedê-lo no trono. Nosso tempo, relegando ao ostracismo as dúvidas e reflexões hamletianas, está, certamente, muito mais sincroni- A caminho de seu palácio, na companhia de Banquo, Mac- pág. 31 beth cruza com três bruxas que o saúdam como rei, vaticinando seu destino de monarca. Banquo é saudado como pai de futuros reis. Seduzido pelos augúrios e dominado pela ambição, Macbeth arquiteta com a esposa (Lady Macbeth) um conluio para apressar sua ascensão ao trono, por meio do assassinato de Duncan. Em viagem, o rei, confiante em tão dedicado e fiel vassalo, resolve pernoitar no palácio de Macbeth, propiciando, assim, oportunidade para a sinistra empreitada. Sorrateiramente, Macbeth o apunhala durante o sono e, para despistar, atribui o crime aos dois guardas do quarto – previamente embriagados por Lady Macbeth –, executando-os de imediato. Conforme o previsto, Macbeth se torna rei, porém, como não tem filhos, reflete que seu procedimento apenas facilitaria a ascensão dos herdeiros do Banquo ao poder, conforme a predição das feiticeiras. Ainda movido pela ambição, no intuito de obstar seus possíveis sucessores, contrata dois sicários para matar Banquo e seus filhos; na refrega, o amigo é morto; os filhos, porém, salvam-se do atentado. Desenrola-se, então, o drama do casal criminoso, atormentado por medos e sentimentos de culpa, sofrendo importantes transtornos psicopatológicos. Em um banquete de recepção aos nobres no palácio real, Macbeth alucina e vê o fantasma de Banquo sentar-se em sua cadeira; Lady Macbeth passa a ver manchas de sangue e sentir seu cheiro, lavando as mãos obsessivamente, como a purificar-se, e vaga pelo palácio, à noite, com uma vela acesa. É clássica a cena em que ela perambula, e o médico observa para uma criada: – Veja, seus olhos estão abertos. – Sim, diz a criada, mas os sentidos estão fechados. Com maestria, Shakespeare vai registrando um elenco de transtornos psicopatológicos que, embora passíveis de compreensão (conforme postulou Karl Jaspers), permanecem ainda obscuros no que concerne aos seus mecanismos biológicos de neurotransmissão. Questões como sonambulismo, pseudoalucinações, dissociação histérica ou estados crepusculares, enfim, numerosos problemas referentes à sensopercepção, entram nessa pauta controversa da propedêutica psiquiátrica. O texto suscita muitas discussões, inclusive na esfera ética, já que, na relação com o poder, todo ser humano traz, dentro de si, um Macbeth adormecido, no confronto com pais, chefes, diretores e outras figuras de autoridade. Sabiamente, Shakespeare não oferece nem soluções, nem fal- sas esperanças. Quase no fim da peça, Macbeth observa: “A vida não é senão uma sombra passageira, um pobre ator [...]. É uma história contada por um idiota, com muito som e fúria, que nada significa”. O desfecho da tragédia fica reservado ao prazer da leitura e às reflexões do leitor. Sobre William Shakespeare William Shakespeare nasceu em Stratford-uponAvon, em 1564, e faleceu na mesma cidade, em 1616. Tom Payne, o editor de Encyclopedia of Great Writers, começa o verbete sobre “o bardo de Avon” de maneira muito curiosa, afirmando que Shakespeare pode ter sido qualquer um. Sugere que as obras podem ter sido escritas por Francis Bacon ou pelo Conde de Oxford ou, ainda, por Marlowe, já que alguns afirmam que o verdadeiro Shakespeare não tinha educação formal para tanto o quanto escreveu. Parece que hoje, porém, a maioria defende de maneira encarniçada que Shakespeare realmente foi Shakespeare e escreveu tudo o que Shakespeare escreveu, embora pouco se conheça sobre sua vida real. Sabe-se que aos 18 anos casou-se com uma jovem local, Anne Hathaway, tendo dessa união dois filhos. Em 1584, aparece em Londres como autor teatral, gozando então de fama e fortuna. Não se conhece a ordem exata da produção de suas peças. Macbeth, aqui analisada, foi apresentada no Globe Theatre, em Londres, entre 1505 e 1506, sendo publicada em 1623 pela First Folio. Sugere-se que o texto original tenha sido parcialmente corrompido e que alguns trechos tenham se perdido. pág. 32 Fotografia Fotografia Fotografia Cachorros ao mar (ou melhor, às piscinas) Reunidas em livro, fotos aquáticas revelam facetas tão inesperadas quanto divertidas dos melhores amigos do homem À primeira vista, alguns parecem temíveis monstros, com dentes afiados e olhar quase canibal. Mas depois de alguns segundos de observação pode-se notar que os selvagens em questão são simpáticos cachorrinhos – apenas clicados em poses tão inesperadas quanto improváveis. Essa é a premissa do livro Cachorros submarinos, do fotógrafo Seth Casteel, lançado pela Intrínseca. A original ideia surgiu quase por acaso, durante um ensaio com Buster, um cão cavalier king charles spaniel, em um quintal na Califórnia em 2010. A sessão deveria ser em terra firme, mas Buster escapuliu e mergulhou na piscina, saindo dela como um cachorro completamente diferente. Seth tentava convencer o modelo canino a ficar na superfície, mas o cão insistia em voltar para a água, perseguindo freneticamente uma bola de tênis que ele próprio tratava de arremessar. Foi quando o fotógrafo se perguntou qual seria a aparência do animal enquanto nadava. O resultado? Bem, a foto de abertura desta reportagem é justamente do brincalhão Buster. Depois de capturar esse registro, Seth deu início a uma série de ensaios fotográficos com mais de 250 cães, entre labradores, golden retrievers, boston terriers, yorkshires, pastores alemães, pugs e muitas outras raças. Por meio de jogos e brincadeiras, Seth incentivou os cães a adentrarem o universo aquático e registrou a divertida experiência. Depois do sucesso na internet, o projeto virou livro, que conta mais de 80 fotos selecionadas entre quase 300 mil – nos Estados Unidos, Cachorros submarinos foi considerado o melhor livro-presente pelas revistas Entertainment Weekly e The Oprah Magazine. Aliás, o êxito foi tão grande que a obra ganhará em breve uma sequência – Filhotes submarinos, a ser publicado por aqui também pela Intrínseca ainda neste semestre. Negócios Negócios Negócios Escreva sua própria história Por MAURÍCIO LOUZADA É verdade! O momento parece um tanto quanto conturbado! Gasolina que sobe, desemprego batendo na porta, escândalos de corrupção e uma situação econômica instável. O cenário perfeito para entrar em desespero, e para os mais pessimistas, esperar pelo pior! No meio de tanto caos está o seu negócio no mercado editorial, em um país que, sabemos, não tem a cultura como sua principal prioridade. O que fazer? Arrancar os cabelos? Calma! Antes de qualquer ação impensada, convido você a olhar a situação por um outro ponto de vista e se concentrar naquilo que realmente importa: as suas ações. Tenho falado constantemente em minhas palestras uma frase, que de tanto ser repetida está virando um bordão: “VOCÊ NÃO PODE CONTROLAR O MERCADO, MAS PODE CONTROLAR A FORMA COMO REAGE A ELE.” Simples, direto e verdadeiro. Podemos escolher se seremos vítimas da situação ou se escreveremos nossa própria história. Se sua opção for a primeira, pode parar de ler este artigo no próximo ponto final. Se a sua opção for a segunda, convido você para ler algumas dicas que podem ajudar a fazer deste momento uma grande oportunidade de crescimento: 1 – Estabeleça metas claras para sua equipe Só podemos atingir ou superar aquilo que podemos mensurar. É altamente recomendável que, pelo menos uma vez por mês, você faça uma reunião com sua equipe deixando claro quais as metas a serem atingidas e como isso impacta na manutenção do seu negócio. A partir do segundo mês, mostre também os resultados do mês anterior e discuta com sua equipe os fatores que levaram ao sucesso nas metas atingidas e o que pode ser melhorado naquelas que não foram alcançadas. Estas metas devem ser quantitativas (número de exemplares vendidos, receita bruta total etc) e qualitativas (percepção do cliente quanto à qualidade no atendimento, organização da loja e disposição dos títulos etc). Quando as pessoas sabem onde devem chegar, fica mais fácil de engajá-las na busca por resultados – a nossa dica número dois. 2 – Engaje sua equipe na busca por resultados Nenhum ser humano quer ficar atrás de um balcão ou no meio das estantes de uma loja esperando o salário chegar. Seres humanos, por natureza, gostam e são movidos por desafios. Se estão parados, apáticos e desmoti- vados é porque não foram verdadeiramente desafiados. Por isso as metas devem ser, ao mesmo tempo, atingíveis e ousadas. É importante lembrar que o profissional responsável pelo atendimento ao cliente é o único capaz de transformar uma intenção de compra em uma venda concretizada: portanto, não meça esforços para motivar este profissional, reconhecer seu desempenho e estimulá-lo a alcançar metas. Procure orientá-lo sobre a importância de seu trabalho no dia-a-dia. Recompense a equipe de alguma maneira. Nem sempre recompensa precisa ser dinheiro (afinal neste momento, convenhamos, este pode ser um recurso bastante escasso), mas um café da manhã diferenciado, um almoço ou até mesmo um evento interno onde os mais bem posicionados são reconhecidos publicamente. Ouvir um “muito obrigado, seu trabalho foi incrível”, muitas vezes, pode ser a maior recompensa que um profissional pode receber. 3 – Inspire as pessoas a buscarem sempre o “melhor” Expectativas positivas geram resultados positivos. Portanto, espere o melhor das pessoas que trabalham com você. Da mesma forma, procure oferecer o melhor de si para seu time. Não permita, em hipótese alguma, que frases tendenciosamente negativas invadam o ambiente. As pessoas compartilham com facilidade pensamentos ruins. Basta alguém falar que algo não vai dar certo para que os demais sejam contagiados por este sentimento. Para criar um ambiente positivo, comece por você mesmo: repita quantas vezes forem necessárias, para todas as pessoas, que você acredita plenamente na capacidade da equipe em atingir metas, de superar momentos de crise e de se diferenciar da concorrência pelo bom atendimento e pelo próprio espírito de união do grupo. Busque os pontos fortes do seu negócio e compartilhe sempre com as pessoas, dizendo em alto e bom tom: “É isso o que nos diferencia”. Não permita que alguns pensamentos prontos como: “Somos pequenos, menores que a concorrência, por isso eles têm inúmeras vantagens sobre nós” determinem o fracasso das metas propostas. Mostre que, independentemente do tamanho e das condições externas, vocês estão preparados para a vitória. Conto uma história, em uma de minhas palestras, sobre um atleta etíope chamado Abebe Bikila, que em 1960, “ pág. 35 Nenhum ser humano quer ficar atrás de um balcão ou no meio das estantes de uma loja esperando o salário chegar. Seres humanos, por natureza, gostam e são movidos por desafios. Se estão parados, apáticos e desmotivados é porque não foram verdadeiramente desafiados ” durante a maratona das Olímpiadas de Roma, bateu o recorde mundial naquela modalidade. Ele veio de um dos países mais pobres do mundo, não era o favorito e os narradores nem sequer conheciam seu nome. O mais impressionante é que ele venceu a maratona completamente descalço!!! Foi motivo de chacotas e risadas na linha de largada. Mas, ao vencer a prova, deu a resposta a todos que olhavam incrédulos e admirados. Quando perguntado por um repórter o motivo de ele ter corrido descalço, suas palavras foram devastadoras: – Eu corri descalço porque queria que o mundo soubesse que na Etiópia nós vencemos com determinação e heroísmo. Ele havia escolhido escrever sua própria história e não se entregar às condições que o envolviam. E você? O que vai decidir? Maurício Louzada é formado em Professional Coach pela Bridgestone AC (Londres) e ministra treinamentos e palestras motivacionais em todo o Brasil. Pela editora Pandorga, publicou o livro Pra valer – Impossível é somente aquilo que você ainda não tentou. Contato: www.mauriciolouzada.com.br Quadrinhos Quadrinhos Quadrinhos PERIGO SOBRE RODAS Em uma história em quadrinhos sem personagens, quadrinista britânico explicita a fatal combinação entre homens e carros O Brasil é o grande campeão mundial no ranking de mortes no trânsito. Em 2010, tivemos 21,5 mortos para cada 100 mil habitantes – número que poderia ser maior se as estatísticas levassem em conta as pessoas que morrem horas depois dos acidentes. Ainda assim, nossa liderança nesse quesito está assegurada. A Argentina, por exemplo, tem 12,6 mortos por 100 mil, enquanto que a Inglaterra mal chega aos 3 mortos. Os desastres de trânsito também são a principal causa de morte de crianças brasileiras: 43,7% das vítimas fatais, sendo que 38% das mortes de crianças por acidente acontecem por atropelamento. Os números são terríveis, mas o que de fato se faz a respeito disso? “Governantes se elegem prometendo mais estradas, e as propagandas continuam a prometer carros mais incríveis, mais velozes. Sabemos que essa é uma estrada sem saída, mas continuamos nela, velozes”, escreve o quadrinista britânico Woodrow Phoenix no posfácio da edição brasileira de seu livro Autocracia, recém-lançado pela editora Veneta. Se outros se mexem, o escritor usou as armas que tinha a mão – lápis e papel – e criou uma obra que é uma espécie de manifesto gráfico contra a sociedade do automóvel. Nela, Woodrow Phoenix mistura sua experiência pessoal, estatísticas internacionais sobre o trânsito e casos relatados na imprensa. O resultado é uma importante e inquietante reflexão sobre nossa perigosa relação com os carros e a velocidade. pág. 37 Memória Memória Memória Carta a uma jovem atriz Organizado pelo escritor Márcio Borges, parceiro inicial de Milton Nascimento e um dos fundadores do Clube da Esquina, o livro Cartas da Humanidade, lançado pela Geração Editorial, traz uma seleção de 140 mensagens redigidas por políticos, artistas, religiosos e personalidades como Zaratustra, Che Guevara, Jânio Quadros e Albert Einstein. Uma leitura surpreendente em um volume respeitabilíssimo, cuidadosamente editado e contextualizado, que abrange 5 mil anos de história. A carta a seguir, datada de 1951, foi escrita pelo cineasta Elia Kazan a Marilyn Monroe – e os conselhos do experiente diretor à jovem atriz encontram eco ainda hoje. Confiram... * Recebi seu telefonema por Ogden. Então, sentei-me e escrevi pela primeira vez em meu diário, ao que parece em meses (de fato, duas semanas). A per- gunta que você me fez logo antes de o trem partir – não se pergunte aquilo de novo. Você sempre estará comigo onde quer que eu vá. Eu sempre inventarei um modo de nos vermos. Farei tudo que puder para ficar tão perto de você quanto seja possível, conforme as circunstâncias. E sempre serei, espero, seu amigo íntimo... até mesmo quando você se casar e tiver filhos. (Sei que quando ficar verdadeiramente livre e independente, por sua própria conta, vai conhecer alguém que será todo seu.) Você disse algo no último dia que me fez feliz. Disse que eu lhe fiz sentir que nunca teria que se conformar novamente com o segundo lugar. Você ficou um pouco calejada estando com homens que continuam derrubá-la. Jim não teve nenhuma utilidade real para você, exceto para fazê-la dormir mais depressa. Você estava completamente sozinha com ele. Fred disse que você era comida para uma coisa só e geralmente obtinha prazer em humilhá-la. E Johnny – de lon- pág. 39 ge, o melhor dos três – tornou-a dele quando você realmente não o amava – o que é uma coisa terrível para se fazer a qualquer um. Você buscou abrigo sob seu teto como um animal ferido. E atrás de tantas dessas coisas que você costumava me dizer – especialmente nas primeiras semanas –, há um impressionante senso de inutilidade. Por que, por exemplo, Art M. não devia chegar e levá-la no carro dele – por que você devia ser “usada” indo às festas de táxi? Não que você seja minha queridinha, mas pelo amor de Deus, você é tão melhor que as pessoas que dão as festas! Se você é boa o bastante para mim, tenha isso em mente, é boa o bastante para qualquer outro! Você merece o melhor! E vai tê-lo. Não quero que você devaneie a meu respeito ou de Art. Eu a quero quando estiver pronta, quando você realmente conhecer o sujeito certo para se casar novamente e dormir todas as noites com um companheiro que ama, e tiver sua própria família e seus próprios filhos e sua própria casa. Você pode ter todas essas coisas, e as merece. Espere por elas!!! O primeiro passo é você se construir. Até. 1. Trabalhe. Torne-se uma atriz profissional. Agora você é uma criança com uma personalidade e olhares. Mais talento ingênuo, mais um bom rosto na tela! Aprenda tudo! 2. Consiga seu próprio lugar. Viva só. Organize sua vida. Leia umas duas horas por dia. Você vai jogar fora muito tempo ao telefone com idiotas, sendo fotografada por idiotas etc., rodando por aí sabe deus fazendo o quê. Tudo que você tem é o tempo... Mantenha pelo menos seis horas de cada porra de dia para você. Fazendo o que você quiser, não fazendo o que outras pessoas querem que você faça. 3. Corte aquele negócio de solo com Natasha. Bote fé no que eu digo sobre isso, que ela é mortal como sua amiga única. De mais maneiras que eu possivelmente possa lhe explicar. Sei muito mais sobre esses tipos. Eu até gosto dela, mesmo. Realmente gosto. Mas ela é veneno como companheira de quarto. Lute pelo que você quer. Leve Clara com você. Você ficará tão contente! Faça isso, logo, agora. Nunca a deixe novamente nas fases sãs. Ela é uma amiga neurótica ocasional interessante. Desfrute-a, não confie nela!!! 4. Não saia com Pat de C. Você nunca achará lá ninguém, a não ser as pessoas que despreza. Saia com jovens escritores, diretores... e – se não puder evitar – atores, produtores. Em seu coração, que é honesto e muito perceptivo, você despreza esses idiotas. É de todo um insulto a você, e, de certo modo, a eles, saírem juntos. 5. Seja orgulhosa de si. Confie em si. Leia Ralph Waldo Emerson em Autoconfiança. Invista em si mesma. Estude. Vá realmente à faculdade. Faça-o na semana que vem. Não no ano que vem! Se você não começar direito agora, acho que nunca irá. Estou sendo duro com você de propósito, mas é o que penso. 6. Não deixe que clareiem muito seus cabelos. Não os deixe também pôr vestidos muito de puta em você. Fale mais alto. Seu gosto é naturalmente excelente. Não aceite merda de qualquer um. Mas escute o ponto de vista de todo mundo. 7. Faça o que eu lhe digo. 8. Agora. Por que eu sempre acabo dissertando para você? Não vou mais. Mas relate progressos ou eu faço de novo! Isso é uma ameaça! Nenhuma noite jamais será a mesma. Elia Kazan (Constantinopla, 7 de setembro de 1909 – Nova York, 28 de setembro de 2003) foi um cineasta greco-americano, filho de pais gregos, que se tornou um famoso diretor de teatro da Broadway na década de 1940. Mais tarde desenvolveu também uma bemsucedida carreira no cinema. Em 1952, foi acusado de denunciar colegas ao Comitê de Investigações de Atividades Antiamericanas, em plena era do macarthismo. Marilyn Monroe, nascida Norma Jean Baker (Los Angeles, 1º de junho de 1926 – Los Angeles, 5 de agosto de 1962) foi uma das mais famosas estrelas de cinema de todos os tempos e considerada um dos maiores símbolos de sensualidade do século XX. História História História A Princesa Isabel contra os donos do poder Por MARCOS COSTA Um dos episódios mais importantes da história do país, a abolição da escravatura é também uma chave para entender as contradições do Brasil de hoje. No artigo a seguir, o historiador Marcos Costa, contextualiza o episódio – que é um dos temas de seu livro O Reino que Não era deste mundo – Crônica de uma República não-proclamada, lançamento da editora Valentina. No início do ano de 1888, o Imperador D. Pedro II encontra-se gravemente doente, numa viagem de tratamento pela Europa, e a Princesa Isabel está à frente do governo do Brasil na sua Terceira Regência. Há uma apreensão generalizada na sociedade brasileira. Do lado da elite – fazendeiros escravocratas –, o medo era de que o Imperador morresse e tivesse início o Terceiro Reinado. Do lado da Princesa Isabel, a apreensão se explicava pelo fato de que, para a monarquia brasileira, o Terceiro Reinado já havia começado – e era hora de romper os diques e partir para o tudo ou nada. No dia 13 de maio de 1888, numa canetada, a Princesa fez o que o Imperador D. Pedro II não teve coragem de fazer em quase 50 anos de reinado: pôr fim a um estado de coisas que persistia na sociedade brasileira há quatrocentos anos. Com esse gesto singelo, diz ao que veio e que não estava para brincadeira. Este ato, profundamente hostil contra os donos do poder, é revestido de extrema coragem pela Princesa Isabel e de extrema importância para o Brasil, pois a partir desse momento deixa de existir o principal entrave para o desenvolvimento do país e o último elo com o passado colonial: a escravidão. Passamos a conviver, segundo Sérgio Buarque de Holanda, entre dois mundos: um definitivamente morto e outro que lutava por vir à luz. Mais dia menos dia essa decisão teria que ser tomada. A monarquia brasileira estava contemporizando com o pág. 41 problema desde os anos 1840. Foi a partir dos desdobramentos da Revolução Industrial que haviam começado as articulações da Inglaterra para acabar com a escravidão no mundo. A pressão sobre o Brasil, por meio da lei Bill Aberdeen de 1845, foi o segundo batismo de fogo do imperador D. Pedro II, então com 20 anos. O primeiro foi a superação da própria resistência interna à monarquia no período das regências. No entanto, para o jovem imperador, o fim do tráfico negreiro e da escravidão, numa canetada, representaria um risco enorme para a monarquia que representava, visto que as maiores fortunas da época eram oriundas justamente deste tipo de comércio. Seria um suicídio político. A lei Eusébio de Queiroz de 1850, proibindo o tráfico negreiro, só foi possível pois o imperador contou com a astúcia de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, que soube transformar a desgraça iminente da elite brasileira em uma oportunidade de negócio infinitamente melhor, transformando-a de traficante em rentista. A imensa quantidade de capital que ficou disponível para empréstimo ao setor produtivo e comercial transformou a cidade do Rio de Janeiro, com o surgimento de novas casas comerciais, novas ruas, iluminação pública, linhas de bonde etc. Para o imperador, ficou claro que qualquer alteração na esfera dos negócios que envolvia os donos do poder teria que vir acompanhada de mecanismos de compensação profundamente atrativos e compensatórios. Caso contrário, a guilhotina estava posta. Os fazendeiros escravocratas formavam a base de sustentação política e econômica da monarquia, e se indispor com este setor da sociedade era quase um suicídio. A solução deveria vir a longo prazo, e o imperador projetou essa mudança para ocorrer num possível Terceiro Reinado. Sendo assim, a primeira questão a ser resolvida era a da sucessão ao trono. Todos os filhos homens do Imperador D. Pedro II haviam morrido ainda na infância, de modo que a Princesa Isabel tornou-se a herdeira presuntiva do trono. Dada a situação da mulher no século XIX, numa sociedade patriarcal, era necessário tratar do casamento da Princesa. O imperador escolheu um príncipe francês, o Conde D’Eu, cujo pensamento liberal ia ao encontro dos seus projetos para o Brasil. Dois aspectos da vida da Princesa Isabel e do Conde D’Eu demonstram claramente qual era o pensamento de ambos a respeito dos rumos que o Brasil deveria tomar. Nas viagens à Europa, podemos perceber como a princesa se interessava pelos avanços que a Revolução Industrial estava proporcionando. A cada dia se convencia mais de que o Brasil devia primeiro ir diminuindo aos poucos a sua dependência para a produção e exportação de commodities e, em segundo lugar, se livrar do trabalho escravo. É emblemático que no fim da Guerra do Paraguai, em 1870, um dos primeiros atos do Conde D’Eu seja decretar o fim da escravidão naquele país. “ No dia 13 de maio de 1888, numa canetada, a Princesa fez o que o Imperador D. Pedro II não teve coragem de fazer em quase 50 anos de reinado: pôr fim a um estado de coisas que persistia na sociedade brasileira há quatrocentos anos. ” Não vai ser por acaso também que nas regências da Princesa Isabel as decisões mais importantes no sentido de abolir a escravidão serão tomadas. Na primeira regência, em 1871, ela aprova a Lei do Ventre Livre e, depois, a Lei dos Sexagenários. Essa atitude e os fomentos à imigração, à industrialização, ao comércio etc., deixaram os fazendeiros com a pulga atrás da orelha. Desde a atitude do Conde D’Eu de libertar os escravos no Paraguai, os fazendeiros já haviam percebido que o Terceiro Reinado vinha se desenhando de um modo completamente desfavorável para a manutenção do ruralismo, do escravismo e da monocultura do café. As políticas progressistas da Princesa Isabel objetivavam conectar a Monarquia com outra elite, arrivista, urbana, liberal, industrial, comerciante, que vinha ascendendo desde as mudanças operacionalizadas nos anos 1850. Essa outra elite começava a aparelhar o Estado, com a conivência e o beneplácito da monarquia. Não é por acaso também que logo depois de aprovada a Lei do Ventre Livre na primeira regência da Princesa Isabel, nasce no Brasil o movimento Republicano e em 1873, o Partido Republicano Paulista, o grande articulador do golpe de 1889. Marcos Costa é formado em História pela Unesp – campus de Assis. Tornou-se Mestre e Doutor em História Social também pela UNESP. TOP 100 EDITORAS DISTRIBUÍDAS pág. 42 Nesta página, listamos, por ordem alfabética, as 100 editoras que registraram, nos meses de novembro e dezembro de 2014, o maior volume de vendas e negócios com a Superpedido. Agradecemos a parceria de todos. ALAUDE ALEPH ARQUEIRO ARTMED ATICA AUTENTICA AVE MARIA BELAS LETRAS BICHO ESPERTO BLU EDITORA BRASILIENSE BRINQUE BOOK CAMBRIDGE CASA DA PALAVRA CASA LYGIA BOJUNGA CLIO COMPANHIA DAS LETRAS CONTEXTO CONTRAPONTO CORTEZ COSAC & NAIFY DARKSIDE DSOP DVS EDGARD BLUCHER EDIOURO - PASSATEMPO EDIPRO EDITORA 34 EDITORA DCL ELSEVIER ESTACAO LIBERDADE FEB FTD FUNDAMENTO GEN GENTE GERACAO GIRASSOL GLOBAL GLOBO GMT SEXTANTE GRYPHUS HQM INTRINSECA IRMAOS VITALE ITATIAIA JOHN WILEY & SONS JORGE ZAHAR L&PM LAFONTE LEYA MADRAS MANOLE MARTIN CLARET MARTINS MATRIX MELHORAMENTOS MODERNA MUNDO CRISTAO NACIONAL NOBEL NOSSA CULTURA NOVA FRONTEIRA NOVO CONCEITO NOVO SECULO OBJETIVA ORIGINAL OXFORD PANDORGA PANINI PAPALEGUAS PAPIRUS PAULUS PEARSON PENSAMENTO PERSPECTIVA PETIT PLANETA POSITIVO PUBLIFOLHA RECORD REVINTER ROCCO SAIDA DE EMERGENCIA SARAIVA SCIPIONE SENAC SPRINGER VERLAG SUMMUS TAYLOR & FRANCIS BOOKS THOMAS NELSON TODOLIVRO UNIVERSO DOS LIVROS VALE DAS LETRAS VALENTINA VENETA VERGARA & RIBA VIDA E CONSCIENCIA VOZES WMF Para conhecer a lista completa de editoras distribuídas, ligue para a central de vendas ou acesse o portal. TOP 20 LIVROS MAIS VENDIDOS pág. 43 Confira na lista a seguir os livros mais vendidos na Superpedido nos meses de novembro e dezembro de 2014. Para não perder oportunidades, mantenha o estoque de sua livraria sempre abastecido com estas obras. SE EU FICAR - E SE VOCE TIVESSE QUE ESCOLHER? ISBN: 9788581635415 R$ 29,90 PEQUENO PRINCIPE, O 48 ED. ISBN: 9788522005239 R$ 19,90 11 16 CIDADES DE PAPEL ISBN: 9788580573749 R$ 34,90 14 SANGUE DO OLIMPO, O VOL. 5 ISBN: 9788580575958 R$ 39,90 MINIDICIONARIO AURELIO HISTORICA 100 ANOS SEM CD - - 8 ED. ISBN: 9788580572186 R$ 49,80 10 DIARIO DE UM BANANA MARE DE AZAR VOL. 8 ISBN: 9788576836902 R$ 36,90 19 DIARIO DE UM BANANA A VERDADE NUA E CRUA VOL. 5 ISBN: 9788576833079 R$ 36,90 APARECIDA ISBN: 9788525057532 R$ 29,90 15 CULPA E DAS ESTRELAS, A (CAPA DO FILME) ISBN: 9788580575019 R$ 34,90 DESTRUA ESTE DIÁRIO ISBN: 9788580574166 R$ 24,90 18 17 DIARIO DE UM BANANA RODRICK E O CARA VOL. 2 ISBN: 9788576831952 R$ 34,90 ANSIEDADE - COMO ENFRENTAR O MAL DO SECULO ISBN: 9788502218482 R$ 14,90 13 12 CULPA E DAS ESTRELAS, A ISBN: 9788580572261 R$ 34,90 9 8 NAO SE APEGA, NAO ISBN: 9788580575330 R$ 29,90 5 DIÁRIO DE UM BANANA VOL. 1 ISBN: 9788576831303 R$ 36,90 PARA ONDE ELA FOI ISBN: 9788581635675 R$ 29,90 SOMENTE SUA ISBN: 9788565530835 R$ 29,90 7 6 4 3 2 1 PETRUS LOGUS - O GUARDIAO DO TEMPO ISBN: 9788582401545 R$ 29,90 20 DIARIO DE UM BANANA A GOTA D’AGUA VOL. 3 ISBN: 9788576832294 R$ 36,90 DIVERGENTE - UMA ESCOLHA PODE TE TRANSFORMAR ISBN: 9788579801310 R$ 39,50
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