Para acabar com a Torre de Babel

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Para acabar com a Torre de Babel
ID: 60666131
22-08-2015 | Economia
Tiragem: 100925
Pág: 18
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Semanal
Área: 24,17 x 44,50 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 1
TECNOLÓ GICAS
Vasco Pedro
quer tornar
a Unbabel
uma empresa
lucrativa tão
depressa
quanto
possível
Para acabar
com a Torre
de Babel
Revolucionar o mercado da
tradução juntando a tecnologia
a uma comunidade de tradutores
é o objetivo da Unbabel
Texto João Ramos
Foto Nuno Botelho
“O mercado
mundial da
tradução é gigantesco e a
oferta atual de
tradutores está
muito longe
de satisfazer a
procura”. Foi
a constatação
que fez Vasco Pedro (em conjunto com Bruno Silva, João Graça,
Sofia Pessanha e Hugo Silva)
avançar há dois anos para a criação da Unbabel. Uma startup que
se propõe acelerar o trabalho de
tradução, facultando tecnologia
aos profissionais do sector.
“Hoje um tradutor consegue,
em média, traduzir 300 a 400
palavras por hora. A atividade
de tradução tem um custo elevado porque há um limite na
produtividade que cada profissional consegue atingir. O nosso
objetivo é que uma pessoa consiga traduzir 40 mil palavras/
hora, reduzindo a sua intervenção para 15% ou 20%”, refere
Vasco Pedro.
O potencial é enorme porque
a esmagadora maioria dos internautas não fala inglês. “Há muitas empresas que ambicionam
vender e comprar no exterior,
mas têm essa limitação”, alerta
Vasco Pedro. As oportunidades
da globalização são desaproveitadas por causa desta torre de
Babel. “Além de tradução de
documentos legais, há cada vez
mais empresas que precisam
de traduzir newsletters, campanhas, correio eletrónico”, exemplifica o líder da startup.
Para arrancar com o desenvolvimento de tecnologia, a Unbabel beneficiou do programa de
aceleração e capital semente do
Y Combinator. Criou uma plataforma que combina um motor
de tradução que aprende e tem
em conta o contexto (usa técnicas de inteligência artificial),
uma base de dados de 30 milhões de palavras e a intervenção de uma comunidade de 30
mil tradutores em todo o mundo. Hoje já faz traduções em 22
línguas. “Para que a tradução
seja de qualidade, a Unbabel usa
primeiro a tradução automática.
Depois o documento é divido
em pedaços mais pequenos e a
tradução feita pela máquina é
editada por um ou mais tradutores humanos. Estas partes são
recombinadas por um tradutor
sénior que confere a consistência da tradução. Pode haver
ainda um copywriter (revisor)
nativo da língua que se foca no
estilo linguístico.
O interface da aplicação está
vocacionado para a tradução
em larga escala e recorrente”,
explica Vasco Pedro, que tirou
um doutoramento em processamento de linguagem natural
na universidade americana de
Carnegie Mellon.
O recrutamento de tradutores
por parte da Unbabel tem vindo
a abrandar porque a atual rede
(30 mil) atingiu “uma escala em
que é preciso gerir a procura e a
oferta”. “Não vale a pena deixar
entrar na rede tradutores se não
houver trabalho para eles”, diz
Vasco Pedro, adiantando que
as línguas mais procuradas são
o chinês, o alemão e o coreano.
Família e idade temperam risco
Quatro filhos, 38 anos. Vasco
Pedro já não é o protótipo do
jovem empreendedor na
casa dos 20 anos que decide
criar uma startup. As
responsabilidades familiares
e a carreira académica
anterior nos Estados Unidos
— doutorou-se em
processamento de
linguagem natural e
semântica na Universidade
de Carnegie Mellon —
conferem ao fundador da
Unbabel o gosto pelo risco,
mas com os pés assentes no
chão. “Quando se é mais
novo é mais fácil arriscar. Se
as coisas não funcionarem
voltamos à casa dos pais”,
refere o fundador da
Unbabel. “Quando se tem
mais idade e mais
responsabilidades familiares
estamos mais focados.
Procuro não desperdiçar o
tempo porque quero estar
com a família à hora do
jantar, mesmo que tenha de
voltar a trabalhar após os
meus filhos terem ido
dormir”, confidencia. Por
isso, não surpreende que
Vasco Pedro pugne para
tornar a Unbabel “lucrativa e
autossustentável o mais
depressa possível”. Um
desejo que, admite, não é
partilhado por “alguns dos
investidores”.
O principal mercado da Unbabel é o empresarial e em 50%
tem origem nos Estados Unidos.
“Temos muito clientes que são
pequenos negócios, mas onde a
nossa solução faz a diferença é
nas médias e grandes empresas
que estão em processo de internacionalização. Para algumas é
uma dor de cabeça gerir dezenas de tradutores freelancers”.
acrescenta Vasco Pedro, referindo que a Unbabel tem vindo
a ganhar negócio de subscrições
mensais para empresas que têm
necessidades recorrentes de tradução. “O objetivo é chegarmos
um dia a um serviço ilimitado
por uma tarifa fixa em alternativa ao preço à peça”, sublinha.
Além do escritório de Lisboa
(onde trabalham 23 pessoas que
se dedicam ao desenvolvimento
de produto e tecnologia), a empresa tem um escritório com
duas pessoas em São Francisco
que se dedicam às vendas e ao
marketing nos EUA. As vendas
na Europa são feitas a partir de
Portugal.
Novo financiamento
em 2016
Vasco Pedro diz que há muita
concorrência no mercado mundial de tradução de incumbentes
e novos atores, mas não identifica uma empresa que esteja a
inovar o processo de tradução
como a Unbabel. “Há empresas de tradução automática que
apenas se preocupam com a tecnologia e não com o elemento
humano”, refere.
Quanto às necessidades de
capital, Vasco Pedro diz que a
Unbabel vive atualmente “uma
situação tranquila”. Depois de
ter passado no início pelo acelerador Y Combinator, a empresa
teve uma primeira ronda de financiamento de três milhões de
dólares em que entrou capital
de risco internacional (Google
Ventures, Matrix Partners, IDG
Capital Partners) e português
como a Caixa Capital, Faber
Ventures e Shilling Capital Partners. “Se não tivéssemos receitas, que não é o caso, tínhamos
dinheiro para ‘viver’ um ano e
meio”, refere o gestor.
A empresa deverá avançar no
próximo ano com uma nova ronda de financiamento de maior
NÚMEROS
360
clientes empresariais em mais
de 30 países tem a Unbabel. Os
Estados Unidos, com 50% das
vendas, é o principal mercado
22
línguas são traduzidas
atualmente por uma rede de 30
mil tradutores que a Unbabel
dispõe a nível mundial.
Emprega 25 pessoas em Lisboa
e duas em São Francisco
40
mil palavras traduzidas por
hora é o objetivo da Unbabel.
Um tradutor humano, sem
ajuda da tecnologia, atinge em
média 300 a 400 palavras/hora
dimensão (series A). O momento e o montante vão depender do
desempenho da empresa. “Se os
resultados correrem acima do
esperado pode haver uma aceleração”, admite Vasco Pedro.
Além de queremos ser lucrativos e autossustentáveis — uma
ideia em que os investidores
não concordam muito — queremos faturar entre 150 e 200 mil
dólares por mês”, ambiciona o
fundador da empresa. A terceira
meta, acrescenta, é demonstrar
que a tecnologia da Unbabel tem
“uma enorme vantagem competitiva na tecnologia de tradução
no par de línguas de demonstração que é o inglês/espanhol”.
“Para desenvolver tecnologia
para outros pares de línguas vamos precisar de mais capital”,
admite Vasco Pedro.
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