“Estrangeirismos de Domínios Científicos e Técnicos no DLPC
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Estrangeirismos de Domínios Científicos e Técnicos no DLPC1 Rita Gonçalves2 ILTEC / CELEXTE 1. Introdução Perante a alta frequência de terminologia das várias áreas do saber em periódicos e outros meios de comunicação social, bem como perante a vulgarização do consumo de produtos resultantes de tecnologias várias, o falante está familiarizado com um sem-número de palavras especializadas com as quais convive e comunica. É com base na relação íntima que se estabelece entre o falante e o vocabulário científico e técnico que surge a responsabilidade pedagógica do dicionário na explicitação de conceitos que fazem parte de uma multiplicidade de cenários comunicativos: They cover, for instance, communication among specialists, between specialists and semi-specialists or technicians, between specialists and learners, as well as popularisation of science and technology (Cabré:2003). Assim, parece mais do que evidente a pertinência da inserção de unidades especializadas nos dicionários de língua geral, veículo do conhecimento que acaba por ser um espelho da sociedade tanto ao nível linguístico, como aos níveis cultural e sociológico, tanto mais que elas constituem unidades lexicais da língua, tal como fica expresso nas seguintes palavras de Cabré the terminological units are not perceived as separate from words which constitute a speakers lexical space but as special meanings of the lexical units at a speakers command. (Cabré:2003) Dados o peso e a importância de uma instituição como é a Academia das Ciências de Lisboa, as elevadas expectativas em relação ao seu dicionário 3 faziam prever um período de debates envolvendo temáticas linguísticas e lexicográficas, uma vez que, perante a inexistência de um organismo oficialmente responsável pela normalização do Português Europeu, o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (DLPC) foi tomado como referência e assume esse carácter normalizador, como podemos constatar na Introdução do mesmo: O Dicionário da Academia, embora seja uma obra de natureza essencialmente descritiva, fundamentada no uso da Língua, tem também uma preocupação normalizadora em aspectos que se relacionam com a grafia, a fonética, o aportuguesamento de estrangeirismos ou a sua substituição por formas vernáculas... (Casteleiro 2001: pp. XIII) Também as palavras de José Vitorino de Pina Martins, na altura Presidente da Academia das Ciências de Lisboa, deixam bem claro que acredita que estas unidades de origem estrangeira, depois de tratadas, devem ser plenamente integradas na língua e, por consequência, devem estar devidamente registadas: A Língua falada por um povo é um organismo vivo, enriquecendo-se quotidianamente no contacto dos seus falantes com novas realidades da existência e até com falantes de outros idiomas. Há que lutar pela sua defesa e ilustração, mas sabendo que os novos vocábulos e até novos termos de outros idiomas ou estrangeirismos, uma vez integrados e afeiçoados no cerne da língua falada, não a corrompem nem a poluem lexicalmente.. (Prefácio do DLPC: pp. IX) 1 Agradeço a Margarita Correia e Teresa Cabré as leituras atentas, as correcções e as sugestões. No entanto, quaisquer erros ou omissões constantes deste artigo são da minha inteira responsabilidade. 2 A minha participação neste congresso foi possível graças ao apoio do Instituto Camões, no âmbito do Programa Lusitânia. 3 O dicionário com a chancela da Academia das Ciências de Lisboa era esperado desde o séc. XVIII, data da publicação do primeiro dicionário a cargo desta instituição que acabou por ficar apenas pela edição do volume correspondente à letra A, que voltou a ser editado em 1976, numa versão revista e actualizada. De entre as unidades lexicais de origem estrangeira que se registaram no DLPC é dada especial atenção ao vocabulário técnico e científico, como afirma Malaca Casteleiro: O léxico registado no Dicionário abrange não apenas o vocabulário de uso geral, mas também os termos mais usuais das diferentes áreas científicas e técnicas, assim como os neologismos recentes e os vocábulos internacionais dos nossos dias, nomeadamente os das novas tecnologias (ou novas técnicas), a maior parte deles provindos do inglês, sobretudo por via americana.. (Casteleiro 2001: p. XIII) Nesta comunicação começarei por fazer uma breve apresentação do tratamento dos estrangeirismos 4 e da sua representatividade, tendo em conta o que é afirmado na Introdução do DLPC e o que se encontra na nomenclatura. Em seguida, focarei a minha exposição na questão da manutenção, ou não, da forma original, abordando os diferentes tipos de adaptação propostos e, finalmente, apresentarei as conclusões mais interessantes deste estudo. Este trabalho surge no contexto da elaboração da minha tese de Mestrado, com o tema Tecnicismos no DLPC, sob a orientação de Margarita Correia e Teresa Cabré, a ser apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. 2. Os Termos Importados no DLPC 2.1. Tratamentos na Introdução A introdução do DLPC dá conta do tipo de palavras que encontraremos no dicionário, sendo que, para este trabalho, nos interessam particularmente 3 secções: I. Vocabulário Científico e Técnico Visto que este estudo se refere ao vocabulário de cariz especializado, é necessário entender as linhas de pensamento que levaram à escolha destas unidades de áreas específicas na nomenclatura do dicionário. De modo a abranger um público de vários níveis etários, com formação e interesses diversificados, o dicionário contempla, de acordo com o texto da Introdução do DLPC: • • • Tecnicismos generalizados no uso comum da língua; Tecnicismos que, apesar de não serem de uso comum, correspondem a noções, classificações ou aparelhos fundamentais para essa ciência ou técnica; Tecnicismos que ocorrem em manuais escolares de matérias de natureza científica e técnica. II. Neologismos Tratando-se de um dicionário que pretende ser descritivo do português contemporâneo, os neologismos têm um papel importantíssimo na sua forma de mostrar a realidade comunicacional, admitindo a inclusão de unidades que, embora não satisfaçam a boa formação, já estão enraizados, parecendo impossível bani-los, ignorá-los, ou tentar criar novas unidades adaptadas ou vernáculas para os substituir, já que são, na sua esmagadora maioria, palavras importadas de línguas estrangeiras. III. Estrangeirismos 4 O termo estrangeirismo é [...] usado para designar lexias ou formantes de lexias que, [...], apresentam características, sobretudo do ponto de vista gráfico, das respecticas línguas estrangeiras (Andrade & Lopes: 1997) Apesar de se verificar o recurso a estrangeirismos em variadíssimas situações da língua corrente, o que é certo é que existe uma acentuada proeminência de unidades estrangeiras nas linguagens de especialidade, nomeadamente em áreas relacionadas com as novas tecnologias, ou em áreas de confluência de culturas, como a Culinária. Devido às dificuldades inerentes à escolha de estrangeirismos para integrar a nomenclatura de uma obra com as características do DLPC, com responsabilidades tanto ao nível linguístico como social, os autores optaram por integrar estrangeirismos de três tipos: • • • Aqueles que não têm qualquer alteração à sua forma original, por via da sua generalização e aceitação consensual no seio da comunidade linguística; Os que continuam a manter a forma de origem, com remissão para uma versão aportuguesada; Os que se mantêm na versão original, com remissão para um equivalente vernáculo. 2.2. Quantidade / Representatividade De modo a delimitar o âmbito deste estudo foi necessário estabelecer alguns critérios para a compilação do corpus, não serão consideradas para este estudo as unidades dos seguintes tipos: - Brasileirismos - Africanismos em geral - Nomes de Línguas - Sistemas monetários - Antropónimos - Topónimos - Marcas registadas Excluídas do corpus foram também as palavras que, enquanto entrada, já sofreram aportuguesamentos como Hóquei, sem que seja apresentada, na nomenclatura, a forma que lhe deu origem no inglês. O número de entradas recenseadas refere-se apenas a unidades registadas na sua forma original e assinaladas como pertencentes a uma área específica do saber. O DLPC regista ainda várias outras unidades de vários domínios, sem alterações à sua forma de origem, mas que não têm qualquer marca que as identifique como termos de nenhuma área de especialidade, como se pode verificar nos seguintes casos: Cockpit Cyberspace Bowling Broker Pipeline Output Match Spaghetti Thriller Foram encontradas 250 formas provenientes de 8 línguas: Inglês, Francês, Italiano, Alemão, Japonês, Sânscrito, Hebraico e Castelhano. A grande maioria das unidades em língua estrangeira é, obviamente, proveniente do Inglês (70%) pelo prestígio desta língua em algumas linguagens de especialidade e pelo seu monopólio em outras áreas, como a INFORMÁTICA e a ECONOMIA. Apenas 16% das entradas entraram no Português por via do Francês e trata-se essencialmente de vocabulário ligado à CULINÁRIA e, quase sempre, com remissão para uma forma aportuguesada ou vernácula. O Italiano tem uma representação de 7% e todas as palavras estão ligadas à CULINÁRIA e à MÚSICA. Os outros 7% são distribuídos pelas restantes cinco línguas, com números de ocorrências pouco significativos, confinadas a áreas com marcas culturais muito fortes, como é o caso da RELIGIÃO ou da POLÍTICA. A discrepância dos valores fica bem clara através da representação no gráfico (Fig.1), onde se verifica a grande proeminência do Inglês relativamente às outras línguas, incluindo o Francês. Esta língua apresenta valores baixos, mas que, mesmo assim, são mais elevados do que os valores correspondentes ao conjunto de todas as outras línguas, já que apenas o Italiano apresenta valores consideráveis. As outras quatro línguas têm uma representação praticamente irrelevante. Fig. 1: Unidades Estrangeiras por Línguas 2.3. Áreas mais representadas Perante a questão das unidades em língua estrangeira, temos uma tendência imediata para pensar em áreas relacionadas com a Ciência, ou com as tecnologias. No entanto, o presente corpus vem demonstrar que existem outras áreas em que os empréstimos são em número bastante significativo. Assim, as áreas com mais representação (algumas unidades pertencem a mais do que um domínio) são: - DESPORTO (58) MÚSICA (45) INFORMÁTICA (41) - ECONOMIA (25) CULINÁRIA (22) Na verdade, os termos de áreas como o DESPORTO, a MÚSICA ou a CULINÁRIA estão de tal maneira integrados no nosso vocabulário e na nossa cultura que acabamos por não os sentir como estranhos, a não ser na sua forma gráfica, no caso de ainda não existir uma versão aportuguesada. Os termos de DESPORTO são, na sua esmagadora maioria, provenientes do Inglês (variedade americana), facto que também se verifica nos casos da INFORMÁTICA e muito particularmente na ECONOMIA, área em que raramente existem tentativas de aportuguesamento ou de criação de qualquer tipo de denominação alternativa. As línguas românicas (Francês e Italiano) têm uma presença forte na CULINÁRIA e na MÚSICA, onde podemos encontrar várias designações do Italiano. Para além das áreas que se destacam com números elevados de ocorrências, existem também áreas com uma certa relevância numérica, como o CINEMA (8), a actividade MILITAR (8) e a FOTOGRAFIA (7). Áreas com pouca representação são a GENÉTICA (1), a QUÍMICA (2) e a AERONÁUTICA (3), áreas onde seria de esperar um número elevado de palavras estrangeiras, sobretudo no que se refere ao Inglês. 2.4. Formas de tratamento dos empréstimos 2.4.1. Manutenção da forma original Cerca de (44%) das formas não têm qualquer remissão para formas aportuguesadas ou vernáculas e é precisamente este grupo que constitui a maioria, relativamente ao total de termos recolhidos. Talvez porque estejam já definitivamente integradas na língua portuguesa, ou porque, pelo contrário, ainda estão no decorrer do processo de integração, o que é certo é que o DLCP apresenta variadíssimas palavras sem alterações à forma que nos chega da língua de origem. A seguir, apresentamos a lista completa 5, com as abreviaturas correspondentes ao domínio do saber a que pertencem (Ver Lista de abreviaturas, antes da Bibliografia deste artigo): ABS (Autom.) Acelerando (Mús.) Aficción (Taurom.) Agitato (Mús.) Aileron (Aeron.,Autom.) Airbus (Aeron.) Andante (Mús.) Antidumping (Econ.) Bit (Inform.) Blues (Mús.) Bug (Inform.) Byte (Infom.) CD-ROM (Inform.) Chip (Inform.) Cliché (Fotogr.) Cobol (Inform.) Currency (Econ.) DDT (Quím.) Dealer (Econ.) Drible (Desp.) Drive (Desp., Infom.) Dumping (Econ.) DVD (Tecnol.) Factoring (Econ.) Folk (Mús.) Fondue (Cul.) Fortran (Inform.) Funk (Mús.) Funky (Mús.) Gigabyte (Inform.) Glasé (Cul.) Gospel (Mús.) Hardware (Inform.) Internet (Inform.) Jazz1 (Mús.) Jazz2 (Mús.) 5 Joystick (Inform.) Karaoke (Mús.) Kilobit (Inform.) Kilobyte (Inform.) Laser (Fís.) Leitmotiv (Mús.) Marketing ( Econ.) Medley (Mús.) Megabit (Inform.) Megabyte (Inform.) Modem (Inform.) Off (Cinem.) Offset (Inform.) Offshore1 (Adj.) (Econ.) Offshore2 (Econ.) Open (Desp.) Ostpolitik (Polít.) Pack (Desp.) PBX (Telecom.) Performance (Ling.) Pick-up (Autom.) Pidgin1 (Ling.) Pidgin2 (Ling.) Pin-up (Fot.) Prise (Autom.) Quark (Fís.) Ram (Inform.) Ranger (Mil.) Realpolitik (Polít.) Reggae (Mús.) Remake (Cinem.) Rifle (Arm.) Rock1 (Mús.) Rock2 (Adj.) (Mús.) Rom (Inform.) Sample (Mús.) Sampler (Mús.) Scat (Mús.) Scherzando (Mús.) Scherzo (Mús.) Scone (Cul.) Self (Electr.) Set (Desp., Cinem., Mús.) Sfogato (Mús.) Sfozando (Mús.) Shunt (Electr.) Single (Mús.) Skate (Desp.) Slalom (Desp.) Smorzando (Mús.) Software (Inform.) Soul (Mús.) Spin (Fís.) Spinnaker (Náut.) Squash (Desp.) Stacatto1(Adv) (Mús.) Stacatto2 (Mús.) Star (Cinem.) Swing (Mús.) Time-sharing (Inform.) Trust (Econ.) Upgrade (Inform.) Vaudeville (Teat.) Vintage (Vin.) Warrant (Econ.) Web (Inform.) Windsurf (Desp.) Workstation (Inform.) Zen1 (Filos., Rel.) Zen2 (Filos.) Zoom (Fot., Cinem.) Todos os termos são substantivos, à excepção dos que apresentam indicação em contrário. Algumas destas formas constituem verdadeiros internacionalismos, pelo carácter universal de certas áreas e, consequentemente, das suas terminologias, como é o caso da maioria dos termos do DESPORTO, da INFORMÁTICA ou da MÚSICA. Mas, sempre que existam equivalentes vernáculos, a situação ideal será a sua divulgação, como nos casos de Aileron (estabilizador), ou Set (cenário). Importa destacar que a instalação de grandes quantidades de estrangeirismos pode trazer sérias consequências para o português: Se o fenómeno de importação de termos não constitui per si um dano, a verdade é que a sua entrada maciça numa determinada língua pode conduzir a uma descaracterização da mesma, inibindo a sua capacidade criativa e conduzindo à sua subalternização enquanto língua de comunicação científica e tecnológica e enquanto língua de comunicação internacional. (Correia, no prelo) 2.4.2. Adaptação O DLCP apresenta, na sua nomenclatura algumas formas aportuguesadas (cerca de 33% das unidades recenseadas), com a intenção de integrar essas palavras em conformidade com as características ortográficas, fonológicas e morfológicas da língua portuguesa. A forma como esse processo foi levado a cabo é matéria de inúmeras discussões, levadas a público pela grande maioria dos jornais nacionais, que dedicaram a este assunto várias notícias, entrevistas, reportagens especiais e artigos de opinião. Apresentamos a lista (Ver Lista de Abreviaturas): Aikido aiquidô (Desp.) Audio Áudio (Tecnol.) Badminton Badmínton (Desp.) Bâton batom (Desp.) Box1 Boxe1 (Desp.) Box2 Boxe2 (Desp.) Bunker Búnquer (Mil.) Cannabis cannabis (Bot.) Cannelonne canelone (Cul.) Kart carte (Desp.) Chantilly chantili (Cul.) Courgette curgete (Bot.) Couscous cuzcuz (Cul.) Cricket críquete (Desp.) Deck deque (Náut.) Diskette disquete (Inform.) Éclair ecler (Cul.) Écran ecrã (Fot.) Flan flã (Cul.) Flash flache (Fot.) Geyser gêiser (Geol.) Golf golfe (Desp.) Gong gongo (Mús.) Hamster hamster (Zool.) Karaté carate (Desp.) Karma carma (Fil., Rel.) Kendo quendo (Desp.) Microchip chipe (Inform.) Net Internet (Inform.) Ozone ozono (Quím.) Paprika paprica (Cul.) Parquet parqué, parquete (Constr.) Pâté patê (Cul.) Pickles picles (Cul.) Pivot pivô (Agr.) Pizza piza (Cul.) Placard placar (Desp.) Plafond plafom (Fin.) Plastron plastrom (Arm.) Poster poster (Cin.) Ragoût ragu (Desp.) Raid raide (Desp.) Rally rali (Desp.) Rappel rappel (Desp.) Ravioli ravióis (Cul.) Record recorde (Desp.) Ring ringue (Desp.) Rocket roquete (Mil.) Rugby râguebi (Desp.) Scanner scâner (Inform.) Server servidor (Inform.) Ski esqui (dEsp.) Skiff esquife (Desp.) Softball softbol (Desp.) Spot spote (Teat.) Sprint spínte (Desp.) Sprinter sprinter (Desp.) Stress stresse (Med.) Suit suite (Mús.) Surf surfe (Desp.) Toboggan tobogã (Desp.) Vamp vampe (Cin.) Videotape video (Tecnol.) Vinagrette vinagreta (Cul.) Vison visom (Zool.) Volley vólei (Desp.) Yod iode (Gram) Ghetto gueto (Hist.) Phot fot (Fís.) Mezzo meio-soprano (Mus.) Mezzo-soprano meio-soprano (Mús.) Kivi quivi (Bot.) Knockout1 nocaute1 (Desp.) Knockout2 nocaute2 (Desp.) Löss loesse (Geol.) Intermezzo entremez (Teat.) Karting cartismo (Desp.) Rink rinque (Desp.) Round ronda (Desp.) Sauté salteado (Cul.) Soufflé suflê (Cul.) 2.4.3. Decalque Semântico O DLPC registou formas estrangeiras, para as quais propõe alternativas vernáculas (cerca de 23% do corpus), deixando claro que muitos dos estrangeirismos podem ser, efectivamente, substituídos, por formas vernáculas. Por razões sociais ou sócio-profissionais, alguns grupos da comunidade insistem em importar termos estrangeiros. Por vezes o equivalente vernáculo não é tão divulgado ou usado por razões da ordem das que são apontadas por Nelly Carvalho (Carvalho 1992: 662): - A evolução rápida (sem tempo para divulgar o termo vernáculo); - A falta de tradução exacta; - A facilidade de comunicação (intercâmbio). A seguir apresentamos a lista de estrangeirismos com a respectiva proposta de decalque (Ver Lista de Abreviaturas): Airbag almofada de ar (Autom.) Boxeur pugilista (Desp.) Budget orçamento (Econ.) Bypass derivação (Med.) CD disco compacto (Tecnol.) Champignon cogumelo (Bot.) Check-up exame geral (Med.) Consommé consome (Cul.) Court campo de ténis (Desp.) Crawl livre (Desp.) Décor decoração (B.-Art.) Démarche diligência (Mil.) Destroyer contratorpedeiro (Mil.) DNA ADN (Gen.) Driver taco (desp.) Editing edição (Inform.) E-mail correio electrónico (Inform.) Encore Bis (Mús.) Enjambement encavalgamento (Lit.) Feedback retorno (Econ.) Fixing fixação de câmbio (Econ.) Franchise contrato de franquia (Econ.) Franchising contrato de franquia (Econ.) Free livre (Desp.) Gap Hiato (Gram.) Gourmet gastrónomo (Cul.) Handicap desvantagem (Desp.) Hi-fi alta fidelidade (Electr.) Holding sociedade gestora de participações sociais (Econ.) Horsepower cavalo-vapor (meter.) Keeper guarda-redes (Desp.) Management gerência (Econ.) Manager gerente, treinador (Econ., Desp.) Mouse rato (Infor.) Note-book portátil (Inform.) Off-line fora de linha (Inform.) On line em linha (Inform.) Motherboard placa-mãe (Inform.) Water-polo - pólo-aquático (Desp.) Pool consórcio (Econ.) Script guião (Cinem.) Self-government governo representative (Polít.) Self-induction auto indução (Elec.) Site sítio (Inform.) Spoiler estabilizador (Autom.) Yeld rendimento (Econ.) Green relvado, campo de golfe (Desp.) Groom paquete (Náut.) Hacker pirata informático (Inform.) Putsh golpe de estado (Polít.) Meeting reunião (Mil., Desp.) Net líquido (adj.) (Econ.) Network rede (Inform.) Nonsense absurdo (Filos.) Jet avião a jacto (Aerón.) Round assalto (Desp.) Short curta-metragem (Cinem.) Speaker locator (Ling.) Tape gravação (Acúst.) Target objectivo (Mil.) Umlaut metafonia (Ling.) Muitos dos estrangeirismos desta lista parecem ser muito menos usados pelos falantes do que a forma apresentada como alternativa vernácula, o que leva a questionar a pertinência da inserção das formas estrangeiras na nomenclatura do DLPC. Na verdade, muitas são as situações em que não se justifica a importação de termos, dado que cada língua possui a capacidade e os mecanismos necessários à construção de neologismos passíveis de denominarem os conceitos que vão surgindo na sociedade, pelo que a entrada maciça de empréstimos numa língua não é apenas perniciosa, como claramente não constitui uma inevitabilidade (Correia no prelo). Esse é o caso dos exemplos que apresentamos a seguir: DNA ADN Driver taco Free - livre Keeper guarda-redes Mouse rato Net líquido (Adj.) Short curta-metragem Tape gravação 3. Conclusões A constituição de uma obra lexicográfica é uma actividade de escolhas constantes e as questões levantadas pela inserção de palavras estrangeiras na sua nomenclatura são verdadeiramente polémicas. No entanto, não existem muitos estudos sobre este assunto para o português (à excepção de trabalhos como os de Andrade e Lavouras Lopes 1997) e a edição do DLPC veio trazer à ribalta as questões que se relacionam com o todo esse fenómeno dos estrangeirismos. O presente estudo centrou-se na forma como o DLCP trata estas unidades, por ser uma obra que tem a particularidade de tentar assumir um difícil compromisso entre as perspectivas descritiva e normativa, tarefa nem sempre levada a cabo da melhor forma. Consideramos que o número de entradas que constitui o nosso corpus é suficientemente representativo para ter importância num dicionário com cerca de 70.000 entradas, contanto com inúmeros desdobramentos de entradas por razões morfológicas, etimológicas, ou outras menos compreensíveis. Importa, neste momento, enunciar algumas conclusões deste trabalho: - A grande maioria dos termos recenseados vem do língua inglesa, está relacionada com áreas como a Informática, a Música ou a Economia e acaba por não sofrer adaptações ao português; - O DLPC regista alguns estrangeirismos, sem apresentar alternativas para formas com equivalentes vernáculos; - A forma como as adaptações dos estrangeirismos foram levadas a cabo levantou polémicas linguísticas e de opinião pública, como demonstram as palavras de Ivo de Castro (Castro 2003: pp. 22): Pessoalmente, custa-me menos ver uma frase com palavras estrangeiras, [...], do que uma frase com estranhas malformações que resultam da tentativa de aportuguesar aquelas palavras [...]. Este assunto foi muito discutido aquando da recente publicação do Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da autoria de Malaca Casteleiro, não tento pela liberdade que mostra na admissão de estrangeirismos em forma original, [...], mas pelas suas propostas de aportuguesamento. - Alguns dos estrangeirismos registados parecem não ser muito usados pelos falantes. Em alguns dos casos recenseados neste estudo, a comunidade linguística parece ter optado pela utilização de uma forma vernácula, deixando para trás a forma estrangeira (como o caso de Keeper gurada-redes). A inserção de estrangeirismos científicos e técnicos no DLPC tem muitas outras questões a investigar, como as incongruências relativas à classificação por domínios de especialidade, a pertinência e a boa formação das unidades inseridas na nomenclatura já com as adaptações ao português e sem referência ao termo original, etc. Interessante seria também a confrontação destes dados com as recolhas feitas no âmbito do Observatório de Neologia do Português.6 6 Projecto Observatório de Neologia do Português ONP, a ser desenvolvido pelo Centro de Estudos em LÉXico e TErminologia CELexTE, em funcionamento no ILTEC. Lista de Abreviaturas: Acústica (Acúst.), Aeronáutica (Aeron.), Agricultura (Agr.), Armaria (Arm.), Automobilismo (Autom.), Belas-Artes (B.Art.), Botânica (Bot.), Cinema (Cinem.), Construção (Constr.), Culinária (Cul.), Desporto (Desp.), Direito (Dir.), Economia (Econ.), Electricidade (Electr.), Electrotécnica (Electotéc.), Filosofia (Filos.), Finanças (Fin.), Física (Fís.), Fotografia (Fot.), Genética (Genét.), Geologia (Geol.), Gramática (Gram.), História (Hist.), Informática (Inform.), Linguística (Ling.), Literatura (Literat.), Medicina (Med.), Meteorologia (Meteor.), Militar (Mil.), Música (Mús.), Náutica (Náut.), Política (Polít.), Química (Quím.), Religião (Rel.), Tauromaquia (Taurom.), Teatro (Teat.), Tecnologia (Tecnol.), Telecomunicações (Telecom.), Tipografia (Tip.), Vinificação (Vin.), Zoologia (Zool.) 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