cirurgia de redução do estômago

Transcrição

cirurgia de redução do estômago
O que você precisa saber sobre a
cirurgia de redução do estômago
1ª. Edição
Curitiba, 2010
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Uma Decisão de Peso!
Sumário
APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
I. O PORQUÊ DESTE LIVRO
Eu Maria Fernanda, 44 anos, 54 kg, gastroplastizada. . . . . . . 17
II. OBESIDADE
Panorama geral. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Índice de Massa Corporal (IMC). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
Doenças Relacionadas à Obesidade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
III. CIRURGIA DA OBESIDADE
Indicação e Contraindicação da Cirurgia . . . . . . . . . . . . . . . 35
Quando Pensar em uma Cirurgia para Perder Peso?. . . . . . . . 36
Vale a Pena Fazer a Cirurgia?. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
O Início do Processo: Exames Pré-Operatórios . . . . . . . . . . . 38
A Escolha da Cirurgia Adequada. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
1. Balão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
2. Banda gástrica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
3. Gastroplastia com Derivação Gástrica em Y de Roux. . . 45
4. Outras Cirurgias para a Obesidade . . . . . . . . . . . . . . . 51
Sobre a Cirurgia do Intestino . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
O Pós-Operatório. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
Quando Reoperar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
Os Homens que Fazem a Cirurgia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
Cirurgia da Obesidade para Jovens e Idosos. . . . . . . . . . . 59
Coisas que Sempre me Perguntam . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
Os Custos da Cirurgia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
IV. A EQUIPE MULTIDISCIPLINAR NA CIRURGIA. . . . . 75
O Cirurgião . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
O Psicólogo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
O Nutricionista. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
O Fisioterapeuta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
V. TERAPÊUTICAS AUXILIARES À CIRURGIA. . . . . . 103
Yoga Studio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103
Acupuntura. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
VI. O DIREITO E A CIRURGIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
VII. VIVER EM SOCIEDADE COMO UM EX-OBESO. . . 115
VIII. EU FIZ! DEPOIMENTOS DE QUEM SE
SUBMETEU AO PROCESSO CIRÚRGICO. . . . . . . . 119
Carolina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 120
Fabíola . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
Tatiana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
Vinicius. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
Luana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132
IX. REFERÊNCIAS E INDICAÇÕES ÚTEIS. . . . . . . . . . . . . . 137
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Uma Decisão de Peso!
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
Apresentação
O
objetivo deste livro é mostrar a cirurgia
de obesidade com fatos concretos, porém de maneira simples, para quem deseja se aventurar neste empreendimento.
A luta contra a obesidade é um desafio para milhões de
pessoas em todo o mundo. A decisão de perder peso muitas
vezes não é fácil, por isso a cirurgia de obesidade surgiu com
tanta força nos últimos anos. A decisão pela cirurgia só é tomada quando o peso já atingiu proporções muito exageradas,
impossibilitando algumas atitudes essenciais para o emagrecimento. Muitas vezes, alguém com IMC acima de 40 kg/m²
não consegue realizar atividade física por apresentar dores articulares, problemas cardíacos ou outras comorbidades associadas à obesidade, que implicam em disfunções importantes que
impedem a realização de qualquer atividade física.
Não há dúvida de que a cirurgia é efetiva, os índices de
sucesso são demonstrados em inúmeras publicações. Além da
perda de peso, inúmeras doenças são controladas ou curadas
com a cirurgia, citando como exemplo maior a Diabetes tipo
II, que demonstra melhora importante após a cirurgia, mesmo
antes de perda de peso significativa. Entretanto, existem tam-
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Uma Decisão de Peso!
bém muitos casos de insucesso. A cirurgia tem se desenvolvido e
apresenta riscos cada vez menores, porém eles ainda existem.
O segredo para o sucesso não está muitas vezes na técnica utilizada, no cirurgião escolhido, no psicólogo, ou em qualquer membro da equipe multidisciplinar; mas sim no paciente. A decisão de
realizar a cirurgia deve ser muito bem estruturada. O comprometimento do paciente deve começar desde o início das avaliações. As
consultas com cada membro da equipe multidisciplinar devem ser
levadas sempre a sério e as recomendações precisam ser seguidas
cuidadosamente. Além disso, todos devem ter em mente que entrar
em algum tipo de programa de atividade física é imperativo após a
cirurgia, e este compromisso deve ser continuado por toda a vida,
pois trará benefícios não só para a manutenção do peso, mas também para a função cardiovascular e pulmonar.
Há que considerar que a cirurgia não é uma opção para todos. Aqueles que apresentam índice de massa corporal inferior a 35
kg/m² devem recorrer a outras opções. A equipe multidisciplinar
permanece fundamental, pois sem realizar um amplo reequilíbrio
da saúde mental, de reeducar a alimentação de toda a família e de
entrar em um programa de atividade física, é muito difícil vencer a
empreitada contra o excesso de peso. O melhor profissional médico
neste estágio é o endocrinologista, pois além de orientar a melhor
estratégia alimentar, poderá fazer uma avaliação completa do estado
de saúde, avaliação hormonal e do metabolismo do paciente. Além
disso, com acompanhamento rigoroso, existem medicações fitoterápicas e alopáticas que podem ser recomendadas para o auxílio na
perda de peso.
Para completar, um alerta para um outro fator importantíssimo para quem quer começar ou já começou a jornada de preparação para a cirurgia de obesidade. A participação da família é fundamental em cada etapa do processo. Os relatos apresentados neste
livro já enfatizam as mudanças de comportamento em familiares de
pacientes operados. As mudanças desencadeadas pela cirurgia são
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
muito significativas. Alterações da vida familiar, social e cultural
acontecem depois da operação. Desta forma, é muito importante
o esclarecimento dos familiares por parte do médico e da equipe
multidisciplinar em todas as fases preparatórias.
Enfim, para quem opta por esta “decisão de peso”, este livro
é um ótimo começo para esclarecer muitas dúvidas sobre a cirurgia
e para relatar a experiência de alguns casos de sucesso e de insucesso. Entretanto, a decisão deve ser realizada com base em muitas
outras informações, pesquisa e opinião de profissionais capacitados
e treinados para este tipo de procedimento, com base em evidências
científicas, profissionais e éticas sérias.
Dra. Carolina Gomes Gonçalves
CRM 18399 – Cirurgiã do Aparelho Digestivo, Especialista em
Cirurgia da Obesidade pela Cleveland Clinic – Cleveland/Ohio, EUA.
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Uma Decisão de Peso!
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M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
O porquê deste livro
E
screver este livro foi a forma que encontrei
para levar às pessoas um pouco de informação sobre a
cirurgia de redução do estômago, conhecida também
como cirurgia bariátrica ou gastroplastia. Procurei reunir
muita informação disponível na Internet, em artigos de revistas e jornais e com profissionais do ramo.
Desde que fiz a cirurgia, passei a ter contato com pessoas que já haviam feito a cirurgia e outras que ainda fariam. Todas tinham um ponto em comum: dúvidas e falta
de informação. Escrevendo este livro, não tenho nenhuma
pretensão de ser conclusiva e única. Meu desejo é que as
pessoas possam ter uma fonte de informação acessível, que
reúna um quadro amplo sobre o tema, para ter mais elementos ao decidir sobre algo invasivo e definitivo, que interfere na vida de um obeso de forma grandiosa e que nem
por isso é um método milagroso. De jeito nenhum!
Um obeso gosta de comer – e quem não gosta? E viver
de dietas restritivas é insano e abusivo. Antes que repitam
que obesidade é falta de vergonha na cara, por favor, nos
deem uma chance de curar as mazelas que o excesso de peso
traz junto.
I
Uma Decisão de Peso!
A redução do estômago é, talvez, a última oportunidade
do obeso passar a ter uma vida digna. Além de emagrecer, de
poder ter uma vida normal, de ter saúde e qualidade de vida, o
obeso vai deixar de sofrer preconceitos e constrangimentos. Só
quem já foi obeso sabe o quanto é doloroso ser o referencial da
turma – “Senta atrás da gordinha de laço azul” –, atolar na catraca do ônibus, entortar a perna da cadeira, não ser aceito no
elevador, ser mal visto na praça de alimentação do shopping,
padecer para entrar na roupa tamanho GG das lojas e perder
oportunidades de emprego. Além, é claro, de ver vários pretendentes escorrerem pelos dedos. A única coisa que recordo ser
positivamente uma unanimidade a respeito de um obeso é que
temos um rosto bonito. Também, com tanta gordura a pele
estica mesmo, fica sempre luminosa e sem rugas.
Este livro vai mostrar a importância de todos os passos
e elementos do processo para realizar uma redução do estômago, começando pela decisão inicial, pelos exames, as técnicas,
as consequências para a vida e a importância dos profissionais
envolvidos.
A melhor maneira de se vencer um inimigo é conhecendo-o. O livro é um recurso para vencer a obesidade por meio
do conhecimento.
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
Eu, Maria Fernanda,
44 anos, 54 kg, gastroplastizada
Sou Maria Fernanda, esposa, mãe,
amante, amiga, confidente, dona de casa,
enfim, várias mulheres em uma só. Não
sou escritora. Sou uma ex-obesa. E conheço
como ninguém os problemas, preconceitos e
descasos da vida de um obeso. Como disse a
pouco, obesidade não é falta de vergonha na
cara, não! Obesidade é uma doença e atinge
mais de 10 milhões de brasileiros.
Eu nasci em Vitória-ES, prematura de
sete meses, e fui motivo de orgulho e alegria
para os meus pais ao completar o meu primeiro ano de vida bem gorduchinha. Cresci normalmente, sem sobressaltos, magra a
maior parte do tempo. Tive o primeiro problema com a gordura na época do vestibular
para Jornalismo, em 1982. De repente, engordei dez quilos! Depois disso, o meu peso
oscilou normalmente, fruto das alterações
hormonais de qualquer mocinha.
Enfrentei a primeira grande frustração quando morava no Rio de Janeiro, em
1984, e meu noivo terminou nosso relacionamento porque eu estava gorda – eu só pesava 61 kg e tinha 1,56 m de altura! Além
de não aceitar a rejeição, passei a me esconder atrás da gordura e da comida, buscando
uma aceitação que não viria mais e estava
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I . O Porquê Deste Livro
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Uma Decisão de Peso!
me autodestruindo quando negava-me a fazer uma reeducação alimentar correta.
Bem, eu precisava virar a página da minha vida e consegui isso a duras penas, muitos relacionamentos e várias dietas
da moda depois... Cite uma e eu fiz: dieta de Bervely Hills, do
ying e yang, do suco de laranja, do leite, da água de alho etc.
Seria cômico, se não fosse triste, recitar a lista toda. Fiz todas
delas e fracassei.
Quando conheci o meu marido, em 1992, estava pesando 64 kg e sentia-me em paz com meu peso e com minha
vida. Meus “quilinhos” a mais nunca afetaram o nosso relacionamento. A minha primeira filha nasceu em 1993 e todos os
18 kg que engordei na gravidez foram perdidos em menos de
seis meses. Eu estava ótima!
Emagreci mais um pouco e, sete anos depois, em abril de
2000, o meu segundo filho nasceu. Foi uma gravidez complicada, com problemas de pressão alta. Engordei 25 kg e demorei
mais de um ano para perdê-los. Quando meu filho completou
um ano, nós morávamos em Macaé-RJ e, infelizmente, surgiu um problema de coluna e tive que fazer um tratamento
com corticoides que me fizeram inchar, engordar. Entre 2001
e 2002, o meu peso saltou de 70 kg para 95 kg. Meu Deus, eu
nunca fora tão gorda! Era desastroso, as pessoas comentavam,
o meu marido cobrava e as fotos da época eram horrendas, mas
eu teimava na ideia de que não precisava me cuidar, achava que
o meu marido tinha que gostar de mim do jeito que eu era, que
a minha inteligência era o suficiente e que a minha capacidade profissional deveria ser reconhecida de qualquer jeito. Bem,
isso não funcionava muito, principalmente porque a gordura
começava a me deixar doente, a inchar minhas varizes e minha
autoestima ia embora pelo ralo novamente, junto com o meu
casamento. Nessa época, eu trabalhava em uma empresa ligada
ao ramo de petróleo, lidava com muitas pessoas e não conse-
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
guia enxergar os distúrbios que o meu excesso de peso estava
provocando na minha aparência, que muitas vezes parecia desleixada...
Em 2003, entrei para o time das mulheres que apelam
para as anfetaminas! Nossa, era ótimo não ter fome, emagrecer
bastante e voltar a caber em roupas pequenas. Era ótimo dormir demais, inclusive nas horas impróprias. Sim, eu passei a ter
distúrbios de sono, a cochilar em qualquer lugar, e não voltei
atrás mesmo depois de quase sofrer um acidente de carro por
cochilar ao volante. Eu me sentia ótima pesando 66-67 kg,
fazendo exercícios, achando que estava supersaudável. Meu endocrinologista da época nunca pediu nenhum exame laboratorial, dizia que tudo estava bem, que eu tinha alcançado a meta.
Continuei nessa mentira até mudar-me para Curitiba em
2005 e me descobrir grávida do meu terceiro filho, em uma cidade estranha, sem nenhum parente e sem poder trabalhar por
causa da gravidez recém- descoberta. Padeci então de todos os
males: físicos, emocionais, sentimentais, profissionais. Enfim,
à medida que a minha barriga crescia, o meu peso ia ficando
maior, sem controle. A pressão arterial subia vertiginosamente
até sair sangue pelo nariz, a glicose chegou a níveis perigosos a
ponto de ter que tomar insulina - eu tinha adquirido diabetes
gestacional e uma ecografia revelou que o meu filho poderia
desenvolver um distúrbio renal ou diabetes. Eu chorei muito,
dias e dias, sozinha, desolada comigo e com a minha saúde.
Nessa época de turbulências encontrei duas grandes amigas,
minha obstetra e minha gerente do banco – sem o apoio delas
acho que teria surtado. Entre tantos cuidados e apoio emocional, eu mantinha a fé. Em outubro de 2005, o meu filho
nasceu saudável e na sala de parto todos os meus parâmetros
fisiológicos estavam inacreditavelmente normais. Não havia
uma explicação lógica, mas a fé não se explica.
Durante o ano seguinte, eu sofria com meu peso, fazia
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I . O Porquê Deste Livro
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Uma Decisão de Peso!
dietas e fracassava, nada dava certo. Meu casamento estagnou
e eu me sentia desolada pela distância do meu marido. A Internet passou a ser uma companhia constante e comecei a ler sobre as cirurgias de estômago e de intestino, pesquisando tudo
sobre o assunto.
Certo dia, uma dor no abdome levou a minha obstetra
a pedir uma ecografia e constatar pedras na vesícula. Encaminhou-me então para o marido, especialista no Aparelho Digestivo, com quem tive uma longa conversa. Explicou-me o que
estava acontecendo e eu contei o meu drama com a obesidade.
Naquele momento eu pesava 103 kg, meu IMC (Índice de
Massa Corporal) era 42, já tinha três filhos, tinha problemas
de saúde pelo excesso de peso, enfim, eu era uma candidata à
cirurgia de redução do estômago. Ele indicou-me o Dr. Daniellson, especialista em Gastroplastia.
Meu marido arregalou os olhos quando contei o que
pretendia fazer. Ele temia que eu morresse. Mas já estava decidida a seguir em frente pois não queria voltar a tomar anfetaminas, e sobretudo, permanecer doente.
Em fevereiro de 2007, fui consultar o Dr. Daniellson
com uma lista de perguntas – ele respondeu a todas e decidimos começar o processo de preparação para a cirurgia. Logo
de início, o Dr. Daniellson encaminhou-me para a psicóloga
de sua equipe, Paula. Ela diminuiu com inteligência e firmeza a minha pressa em fazer a cirurgia, ajudou-me a controlar
a ansiedade. Fizemos cinco sessões ótimas, fortalecendo-me
emocionalmente neste trabalho. Paralelamente ao trabalho
psicológico, fiz todos os exames pré-operatórios, as consultas
com a nutricionista e com o cardiologista, cumprindo ponto
a ponto todo o cronograma prévio à cirurgia. Houve apenas
um atraso, por conta de uma das pedras da vesícula que desceu pelo colédoco (um pequeno tubo que transporta a bile
da vesícula biliar para o intestino), obrigando-me a fazer uma
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
microcirurgia para restaurar o que ficou danificado em função
da descida da pedra.
Fiz Gastroplastia, a cirurgia de redução do estômago,
no dia 25 de junho de 2007, no Hospital Santa Cruz, em
Curitiba. Quando o dia chegou era uma segunda-feira e fui
internada logo cedinho, cheia de expectativas. Graças a Deus
e à equipe médica, correu tudo muito bem. Acordei na sala
de recuperação sem sentir dor alguma e sem nenhum enjoo.
Quando fui para o quarto, veio em seguida o fisioterapeuta
do hospital para iniciar a fisioterapia respiratória e verificar
o bom funcionamento das botas pneumáticas que eu usava
– elas comprimiam as minhas pernas de tempos em tempos
para evitar a formação de tromboses.
Fui para casa na sexta-feira, dia 29, no início da tarde.
Era tão bom estar em casa, rever meus filhos... Eu sou um
caso de sucesso? Sou sim. Emagreci 49 kg em quinze meses
e agora mantenho os meus 54 kg, os quais me trazem muita satisfação. Amo usar tamanhos M e P, adoro usar biquíni,
mesmo com as pelanquinhas que ainda tenho – nada que uma
cirurgia plástica reparadora não resolva – acho chique demais
cruzar as pernas, e adoro meus jeans. Posso dizer que a minha
autoestima está em alta. Sou obediente e determinada. Eu sou
um caso de sucesso, nada impede que você também seja.
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I . O Porquê Deste Livro
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Uma Decisão de Peso!
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
Obesidade
Panorama geral
Para começarmos, alguns esclarecimentos e dados sobre a obesidade e o quadro no Brasil.
De acordo com o site do Instituto de Videocirurgia do
Paraná, “obesidade é uma alteração da composição corporal,
com determinantes genéticos e ambientais, definida por um excesso relativo ou absoluto das reservas corporais de gordura, que
ocorre quando, cronicamente, a oferta de calorias é maior que o
gasto energético corporal e que resulta com freqüência em prejuízos significantes para a saúde.” Fatores sociais, econômicos,
culturais e psicológicos também contribuem para a evolução do
quadro.
Segundo o IBGE, a conseqüência de novos e piores hábitos alimentares, a vida sedentária e a facilidade dos restaurantes fast foods podem ser apontadas como algumas das causas do
crescimento da obesidade entre os brasileiros nas últimas três
décadas (Fonte: Jornal O Estado do Paraná, 19/07/08).
Nosso país tem cerca de 63 milhões de pessoas maiores de
18 anos acima do peso, sendo que pelo menos 15 milhões são
obesos e 3,7 milhões são obesos mórbidos. Se o ritmo se mantiver, em 2030 seremos um país tão gordo quanto os Estados
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II
Uma Decisão de Peso!
Unidos, com uma média de 33% da população obesa (Sociedade
Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, 2007).
Para um país com tantos desnutridos, isso parece até difícil
de acreditar, mas é verdade. E várias razões contribuem para isso:
sociais, econômicas, biológicas, culturais e psicológicas. Veja alguns
exemplos simples:
• Nossa vida está mais confortável e, portanto sedentária. Há
pelo menos duas décadas não precisamos mais nem levantar
do sofá para mudar o canal da TV porque temos o controle
remoto à nossa disposição. Ir ao correio colocar uma carta? Decididamente um anacronismo, pois o envio de emails (correio
eletrônico) tornou-se popular há uma década.
• Quando uma criança sofre desnutrição ainda no útero ou nos
primeiros anos de vida, ela tem mais propensão a desenvolver
a obesidade porque o corpo já se habituou com pouco, e na
medida em que tiver mais opções de comida, vai comer mais
e mais. E as novas gerações terão mais tendência a desenvolver
obesidade. Isso já é uma realidade nas regiões mais áridas do
Nordeste do Brasil. Bem, coincidência ou não, eu venho de
família nordestina por parte de pai e mãe.
• Quantos de nós não tiveram uma maravilhosa e amorosa avó
ou mãe que não aceitava que seus netinhos deixassem sobras
nos pratos? Que tinha certeza absoluta que saúde estava relacionada as grandes bochechas rosadas? Eu não fugi à regra.
Minha avó e minha mãe sempre me incentivavam a comer,
a ficar gordinha, rechonchuda e linda (ainda que precisando
fazer dieta antes dos dois anos de vida!). Pois é, eu me iniciei
no círculo vicioso das dietas bem cedo. E tive que fazer um
“regime de engorda” aos dez anos de idade porque eu pesava
apenas 29 kg e todo mundo dizia que eu era magra, que “um
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
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vento mais forte me arrastaria”. Minha mãe não agüentou a
pressão e me levou a um endocrinologista para que eu ganhasse peso! Ao final de noventa dias eu pesava 36 kg e todos
ficaram muito felizes! Meu pai reclamou um pouco porque
eu tive que comprar muitas roupas novas.
• Com o stress da vida moderna, é muito comum que as pessoas
afoguem suas mágoas na frente da TV, devorando potes de
sorvete ou pacotes de biscoito. Os happy hours após o horário
de trabalho e certas reuniões comerciais também ganharam os
bares e restaurantes, ou seja, as pessoas ficam mais expostas às
comidas e muitas vezes comem sem perceber. Quando meu
noivo terminou o noivado dizendo que eu era gorda (eu só
pesava 61 kg na época) eu afoguei muita mágoa e frustração
em frente a TV devorando tanta comida que nem me dava
conta, e jurando depois de cada pacote de biscoito e pote de
sorvete que eu iria parar, que “na segunda feira eu começaria
uma dieta que me deixaria magra e linda de novo, nem que
fosse para ele me ver bem e sentir arrependimento de ter me
deixado!” Claro que nada disso funcionou, só serviu para que
eu engordasse mais e mais.
Para a Organização Mundial de Saúde, a obesidade é a principal epidemia do século e entre os brasileiros a constatação mais alarmante é que estamos saindo de um quadro da desnutrição para um
quadro de obesidade (Fonte: Jornal O Estado do Paraná, 07/2008) .
O Dr. Henrique Lacerda Suplicy, endocrinologista do Ambulatório
de Obesidade do Hospital das Clínicas da UFPR, alerta que “para reverter essa expectativa, de difícil controle, somente a prevenção pode
contribuir e que a obesidade é uma doença crônica e deve ser tratada
com tal. Mais do que um problema estético, a obesidade está relacionada à co-morbidades e, por isso, deve ser tratada como prioridade
pela saúde pública, principalmente porque também causa problemas
II . Obesidade
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Uma Decisão de Peso!
M a r i a Fe r n a n d a M e r l i n g
psico-sociais como a perda de auto-estima e o isolamento”.
Na realidade, segundo o Dr. Suplicy, “apenas uma pequena
parcela de casos de obesidade está relacionada a doenças endócrinas, síndromes genéticas e tumores, por exemplo”. Obesidade tem
tudo a ver com o nosso modo de vida, como vivemos, o que queremos e como encaramos nossa alimentação. As nossas expectativas,
os planos, o dia-a-dia têm parcela efetiva e importante no modo
como encaramos a comida.
Os números de peso, de acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares realizada nos anos 2002-2003 pelo IBGE:
encontrou alguém, já se casou... Ou acabam achando que cuidar do corpo e da saúde pode ser secundário (principalmente
quando enfrentam alguma crise econômica). Quanto aos
viúvos, geralmente aquele que fica sente uma falta muito
grande do(a) companheiro(a) e a depressão e vida sedentária
contribuem para um aumento significativo de peso – eu vi isso
acontecer em minha família com minha mãe e meu avô. Ao
perderem seus companheiros, eles deixaram de sentir alegria e
prazer em viver, entraram num processo lento e silencioso de
resignação e estagnação.
1. As mulheres obesas somam 42%, os homens são
38% e as crianças, 35%.
Além dos fatores hormonais, nós mulheres estamos mais
propensas a enfrentar distúrbios emocionais que contribuem
para um aumento de peso. As crianças têm uma oferta muito
grande de fast foods e junk foods (literalmente “comida lixo”
– como os típicos salgadinhos), e passam cada vez mais tempo
sedentariamente instaladas em frente de computadores, vídeo
games e TVs. Quanto aos homens, tradicionalmente sempre
existiu uma grande pressão da sociedade para que em seu papel
masculino não se cuidasse, não demonstrasse vaidade ou procurasse se manter saudável. Mesmo este cenário estando em
mutação hoje, a grande oferta de comerciais de roupas transadas, cremes, jóias e outros, ainda assim muitos homens encaram o cuidado consigo mesmo com um certo desdém.
3. 12% dos adolescentes estão acima do peso.
Isso inclui a minha filha. Acredito que as alterações hormonais, a grande oferta de alimentos não saudáveis, a correria
do dia-dia, os hábitos sedentários em frente ao computador,
contribuem para que isso se torne cada vez mais comum. E se
a gente sugere uma reeducação alimentar eles nos olham como
se tivéssemos sugerido algo insano e descabido.
2. Apenas 27% dos solteiros estão com sobrepeso, contra 52% dos casados e 59% dos viúvos.
Quando um casal se casa, o cuidado consigo mesmo
parece ficar em segundo plano depois de algum tempo imersos na rotina e a ocupação com os filhos. Parece um pouco
aquela história de não ser mais necessário se cuidar porque já
4. 58% dos idosos estão acima do peso.
Além da menopausa e andropausa (menopausa masculina), muitos idosos são levados a acreditar que não precisam
se cuidar, que não têm mais o direito a uma vida saudável e
variada e passam a ter uma vida cada vez mais sedentária e
dependente.
5. 46% das pessoas com escolaridade alta são obesas
contra 44% daquelas com baixa escolaridade.
A escolaridade em si hoje não determina mais a obesidade.
O acesso facilitado a bens de consumo que propiciam conforto
e o lazer cada vez mais girando em torno de bares e restaurantes
e à internet, vem tornando as pessoas semelhantes no sedentarismo, independentemente de classe econômica e social.
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II . Obesidade
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