felicidade de gelo - Denmark in Portugal

Transcrição

felicidade de gelo - Denmark in Portugal
DINAMARCA
FELICIDADE
DE GELO
Satisfeitos e seguros, sim. Felizes, nem por isso. Uma viagem
por Copenhaga, capital do país dito o mais feliz do mundo,
permite desmistificar ideias feitas acerca da nação que lidera os
rankings internacionais de felicidade. É que por trás do bem-estar
dos dinamarqueses, há todo um mundo (ob)escuro a descobrir
REPORTAGEM DE CHRISTIANA MARTINS (TEXTOS)
E ANA BAIÃO (FOTOGRAFIAS), ENVIADAS A COPENHAGA
REVISTA 16/NOV/13
IGUALDADE EM
COPENHAGA, MUITOS
HOMENS PASSEIAM
AS CRIANÇAS NA RUA,
COMO EM POUCAS
CAPITAIS DA EUROPA
SE PODE VER
REVISTA 16/NOV/13
Q
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FAMÍLIA HANSGAARD PARA HANS E CAROLINE, UMA CASA ESPAÇOSA É
ESSENCIAL PARA O BEM-ESTAR DOS FILHOS E DO BEBÉ QUE VAI CHEGAR
REVISTA 16/NOV/13
Quando um português abraça outro, aperta-o contra o peito e dá-lhe fortes palmadinhas nas costas. Como se dissesse: “Anda cá!”
Quando um dinamarquês abraça
alguém, trá-lo de encontro a si e
desliza as mãos pelas costas duas
vezes. Como se dissesse: “Gosto de
ti, mas não te chegues tanto...”
Parece garantida a felicidade
de se viver numa sociedade de 5,5
milhões de habitantes, onde a taxa
de desemprego é de 7,5%, a educação é gratuita, incluindo a universidade, a saúde para todos, o Estado
confiável, a corrupção quase inexistente, a sustentabilidade ambiental
uma preocupação real e a violência
reduzida. Ser feliz num país onde
as ruas são limpas, os cidadãos andam de bicicleta, há 30 cisnes num
Desemprego reduzido, educação e saúde gratuitas e a noção
de que o país é uma comunidade não apagam a solidão
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GERDA E NIS OS NISSEN TÊM TRÊS FILHOS E OITO NETOS, MAS SABEM QUE,
QUANDO PRECISAREM DE AJUDA NA VELHICE, VÃO PARA UMA INSTITUIÇÃO PÚBLICA
lago no centro da capital, nasceu
um escritor de contos de fadas,
uma sereia observa os barcos que
passam e a rainha é uma intelectual não deveria ser complicado.
Partilhar um país com pessoas em quem confiamos, onde a
privacidade, liberdade individual,
o trabalho e a inovação são palpáveis deveria gerar felicidade imediata. O país que liderou os resultados do Relatório Mundial da Felicidade, elaborado pelas Nações Unidas, não está no fim do arco-íris,
localiza-se na Escandinávia, chama-se Dinamarca e um bilhete de
avião de ida de Lisboa para a capital, Copenhaga, custa 250 euros.
Mas este é apenas o início da história. Como em todos os contos infantis, na Dinamarca há zonas escu-
ras, onde se escondem surpresas
menos boas. E destas zonas, os relatórios não falam. Solidão, dificuldade em exteriorizar sentimentos e
partilhar emoções, afastamento
das famílias, medo de perder conquistas sociais, receio das alterações que os imigrantes possam trazer são alguns dos defeitos apontados pelos próprios dinamarqueses.
Gerda e Hans Peter Nissen,
Nis para os amigos, chegam de
mão dada. Ele é enorme, herdeiro
dos guerreiros vikings, mas tem
um olhar estranhamente doce para alguém daquele tamanho. Ela é
magrinha. Nis tem 78 anos, já teve
cancro no cólon, Gerda, 76, há um
ano descobriu uma leucemia, ainda se está a tratar. Ambos estão reformados. Gerda foi dentista e Nis,
engenheiro eletrónico. Conheceram-se na escola, saíram de lá de
mãos dadas e assim continuam até
hoje. Estão casados há 53 anos,
têm três filhos e oito netos. No Natal, a grande festa da família dinamarquesa, estão todos juntos.
Para Nis ser feliz é ter “uma
boa relação com a mulher e os filhos, ter saúde e estar confiante face ao futuro”. Quando ficou doente, Gerda tomou conta dele. Quando Gerda adoeceu, Nis tomou conta dela. E quando um faltar ao outro ou a autonomia acabar? “Vamos para uma instituição. Nem eu
quero ir para a casa dos filhos, nem
eles esperam que vá”, explica Nis.
“Quando chegou a altura, a minha
mãe foi para uma instituição, é esta a tradição. Esperamos que o sis-
tema tome conta de nós quando ficamos velhos. Sabemos que será
assim desde o início das nossas vidas”, diz. “Os nórdicos são diferentes dos demais europeus. Mas
quando estou nos países do Sul,
quando vejo os portugueses, invejo
a capacidade de exteriorizar sentimentos. Não sei fazê-lo, mas acho
que é bom. Nós temos o sangue
frio, deve ser do clima”, conclui.
O casal vive numa casa grande nos arredores de Copenhaga,
que foi, em parte, construída por
eles. Ambos saíram da casa dos
pais com 19 anos e nunca mais voltaram. São resultado da política de
educação gratuita e acreditam que
os netos terão os mesmos direitos.
“Torna-nos mais pacíficos saber
que não temos de nos preocupar
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JONAS JENSEN SEM O ESTADO PROVIDÊNCIA NÃO TERIA IDO PARA
A UNIVERSIDADE E ESTÁ DISPOSTO A PAGAR MAIS IMPOSTOS
com a educação dos filhos. Não temos medo do futuro”, explica Nis.
Para garantir total independência,
Nis limpou ruas enquanto estudava e acabou o curso sem dívidas.
Gerda não trabalhou e depois devolveu ao banco o que lhe foi
adiantado.
Com profissões qualificadas,
sempre pagaram no mínimo 50%
dos rendimentos em impostos.
Dos salários, 15% destinaram à reforma, o que lhes permite receber
70% das últimas retribuições. Mensalmente, em conjunto e depois
das taxas, ficam com seis mil euros. Mas a segurança financeira
não os modifica: “Nunca seremos
extravagantes, não gostamos de ostentar ou esbanjar.”
À semelhança da maioria dos
dinamarqueses, nem Gerda nem
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Nis são religiosos. Nada os ampara,
a não ser um ao outro e o Estado
aos dois. Apesar de ateus, pagam o
imposto da Igreja Luterana — religião oficial da Dinamarca, onde os
pastores são funcionários públicos
— e, embora Nis diga que “a realeza não é uma instituição democrática”, votariam a favor da sua manutenção, caso a questão fosse colocada num referendo. “São velhas
e belas tradições. Devem ser preservadas. Gosto do meu país como
é, não poderia viver fora daqui”, resume. Não diz frontalmente, mas
ao falar explica como o Estado Providência é a família daquela gente.
NO INÍCIO, A AJUDA
E se os idosos vivem cercados de
certezas e apoios, aos jovens também não falta suporte, o que lhes
HENRIK PODER DESEMPREGADO, MAS SEM ANSIEDADE, PORQUE SABE
QUE O POSTO DE TRABALHO VIRÁ, RÁPIDO E NA SUA ÁREA DE ESTUDO
garante toda uma forma nórdica e
pragmática de enfrentar a vida. A
barba cerrada não engana a origem dinamarquesa, mas ilude a
idade de Jonas Jensen, que parece
mais velho do que os seus 24 anos.
Está a acabar o bacharelato em Fisioterapia e, desde os 18 anos, recebe cerca de 670 euros mensais do
Estado para estudar e sair da casa
dos pais.
Antes de ir para a universidade, viajou pelo mundo durante um
ano, com o dinheiro que poupou a
trabalhar a meio tempo. Agora divide um apartamento com o irmão mais novo, também estudante. O que sobra da renda de 400
euros não é suficiente para as demais despesas, por isso, trabalha algumas horas na sua área. A namorada, também fisioterapeuta, traba-
lha em part-time e recebe mensalmente cerca de 1800 euros, depois
de impostos. Jonas não fica chocado com a carga fiscal: “Temos educação gratuita, pagamos metade
do valor dos medicamentos e nada
quando vamos ao hospital! Se não
fosse assim, eu não teria entrado
para a universidade.”
A mãe de Jonas é enfermeira,
o pai operário fabril. O rapaz assume ter grandes ambições, quer inovar e o amanhã parece-lhe promissor. “Quero levar a fisioterapia às
escolas, trabalhar preventivamente, combater o excesso de peso e o
sedentarismo”, explica. Também
quer ter filhos e reconhece na Dinamarca um bom país para os educar: “A minha geração quer exercer a paternidade em plenitude, envolver-se com a infância dos fi-
Felicidade e autossatisfação são conceitos que o comum
dos dinamarqueses não confunde. Falta algo àquela segurança
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KATE KALSO É DA REGIÃO AUTÓNOMA DAS ILHAS FAROE E VIVE ILEGAL
NA RESIDÊNCIA UNIVERSITÁRIA PORQUE É LÁ QUE SE SENTE MAIS EM CASA
lhos, responsabilizar-se.” Para ele,
ser feliz é “ser-se capaz de fazer o
que se gosta, sem se sentir condicionado”. E os impostos não o condicionam, “pelo contrário”.
Kate Kalso também tem 24
anos, recebeu 670 euros do Governo por mês enquanto estudava.
Acabou o curso de Fisioterapia no
verão e ainda paga 400 euros de
renda de um estúdio numa residência universitária. Está ilegal,
porque o apartamento destina-se
a estudantes, mas o anterior ocupante vive noutro estúdio com a
namorada e, para Kate, era muito
importante ficar ali. No edifício
também vivem a irmã mais nova e
a melhor amiga. São todas das
ilhas Faroe, região autónoma, conservadora e rural. “Lá, as pessoas
são mais fechadas, ligadas à natu-
reza”, explica. Mas, quando chegar
a hora de constituir família, Kate
quer voltar para casa, a duas horas
de voo de Copenhaga.
O apartamento é formado por
um minúsculo hall de entrada, que
divide o espaço com a cozinha, e
uma sala que é também quarto. É
onde Kate toca viola, recebe os
amigos, olha pela janela, estuda, vê
televisão, dorme. Do lado de fora
ficam as paredes grafitadas, os corredores de mau aspeto. Depois de
pagos os impostos, sobram 2200
euros. Como Jonas, não perde tempo com complicações: “Ser feliz é
ter amigos, viver cada dia.” Parece
fácil. Filha de um pescador e de
uma bancária, não lhe passa pela
cabeça viver noutro país.
Desempregado desde junho,
Henrik Poder garante que, “até ao
fim do ano, um trabalho vai aparecer”. E na área dele, “sem dúvida”.
Aos 26 anos, guarda a frescura da
adolescência, boné ao contrário na
cabeça. Ainda vive numa residência universitária, paga pelo seguro
de desemprego. Enquanto estudava, destinava 200 euros a cada três
meses ao seguro, que lhe permite
agora receber 1200 euros por mês.
Como contrapartida, tem de se empenhar na procura de trabalho.
“Não estou preocupado, sei
que vou encontrar”, afirma com a
tranquilidade de quem vive num
país com 11% de desemprego jovem. “Não consigo imaginar o que
será estar sem emprego e sem
apoio do Estado”, afirma. A paciência do Estado Providência vai durar dois anos até Henrik arranjar
trabalho. Já durou quatro, mas a
austeridade aperta os gastos até
dos dinamarqueses.
FELIZES, MA NON TROPPO
Na Dinamarca, a questão é levada
tão a sério que existe mesmo um
Instituto para a Pesquisa da Felicidade. Meik Wiking é o diretor deste think tank financiado por verbas
públicas e privadas. O projeto mais
recente visa mapear a felicidade
em Copenhaga, tendo em conta as
faixas etárias e as classes sociais
dos habitantes, de forma a identificar barreiras e apresentar recomendações ao governo local.
A solidão foi um dos principais problemas encontrados. Também foi possível perceber que, na
capital da Dinamarca, as pessoas
são mais felizes na juventude e na
velhice, cabendo aos habitantes de
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Factos & números
O território da Dinamarca é composto por cerca de 400 ilhas.
Originalmente uma vila piscatória viking, a capital, Copenhaga,
tem 1,2 milhões de habitantes. O clima, temperado, é na realidade, inclemente: no verão, a luz dura tempo de mais e, no inverno, a escuridão chega cedo, o vento é forte e as temperaturas
obrigam ao recolhimento. Desde 1849 que a Constituição assegura aos dinamarqueses liberdade religiosa e de imprensa.
Durante a depressão de 1930, o país chegou a ter 40% da população adulta desempregada e o Estado Providência desenvolveu-se a partir de 1945 para garantir educação e saúde a todos. O
Estado emprega cerca de um terço dos trabalhadores, o que
torna a Dinamarca um dos países com a mais pesada máquina
do Estado. Pioneiro mundial em energia eólica, é considerado o
país mais ecológico do mundo, conjugando crescimento económico com redução das emissões de carbono e fixou como
objetivo a neutralidade de emissões em 2025. A riqueza por
habitante (PIB per capita) está 20% acima da média da União
Europeia, menos de 2% dos dinamarqueses estão no desemprego há mais de um ano e mais de 40% estão envolvidos em
ações de voluntariado. Cautelosos, decidiram não integrar o
euro e mantiveram a coroa dinamarquesa. Nas últimas eleições, 87,7% dos eleitores fizeram questão de votar, embora o
voto não seja obrigatório. Desde 1909 o país não tem governos
maioritários e, atualmente, o poder passa pelas opções do
Partido do Povo Dinamarquês, de extrema-direita. Cerca de 10%
da população são imigrantes, a maioria turcos. O país tem das
mais altas taxas de natalidade da Europa e o cancro como uma
das principais causas de morte, mas o álcool e o tabaco são um
problema. A taxa de suicídio era grande na década de 70, mas
diminuiu, correspondendo a cerca de 1% do total de mortes. E
porque felicidade tem muito a ver com qualidade de vida,
Copenhaga espera que em 2015 todos os cidadãos cheguem a
um parque em 15 minutos. Atualmente, 36% dos habitantes
deslocam-se em bicicletas e, em 2015, deverão ser 50%. Cerca
de 45% da comida consumida na cidade é orgânica e o restaurante da moda, Spisehuset Rub & Stub, elabora diariamente a
ementa com base no que é doado pelos supermercados.
40 anos o pico das preocupações.
“Filhos e carreira são altamente
stressantes, mas verificamos que
pessoas sozinhas também sofrem
elevados níveis de ansiedade. É evidente que a proximidade da morte,
característica dos idosos, afeta os
níveis de felicidade, mas também é
certo que, com a idade, aprende-se
a valorizar coisas simples, a que,
noutras fases da vida, não se dá tanta importância”, explica Wiking.
As pesquisas do instituto envolveram 10 mil dinamarqueses e,
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para o diretor, foi surpreendente
constatar o impacto das relações
sociais nos níveis de felicidade individuais. “É mais importante ter
amigos que dinheiro e o mais importante não é ter muitos amigos,
mas de confiança.” E aí está uma
das chaves do segredo dinamarquês: tendem a confiar mesmo em
quem não conhecem.
A outra chave são as expectativas realistas, características da população dinamarquesa, que não esquece a Lei de Jante. Composta por
dez regras, criada na década de 30
do século XX, recomenda a discrição individual em nome do bem-estar do grupo. A inveja é considerada um sentimento negativo e, como não querem ninguém infeliz,
combatem tudo o que possa causar desigualdade ou competição
excessiva. Como a não atribuição
de notas nas escolas públicas primárias, para que as crianças não
fiquem ansiosas. Wiking sublinha
ainda a importância do elevado nível de emprego: “O trabalho é um
componente mágico, assegura
maior nível de felicidade individual e reduz a tensão coletiva.”
Mas também foram encontrados pontos fracos nesta fortaleza
de felicidade: a questão da longevidade, por exemplo. Como explicar
que uma população tão rica e satisfeita morra mais cedo do que os
portugueses? Os dinamarqueses
bebem e fumam muito. E é preciso
não esquecer que a Dinamarca está no topo do consumo de antidepressivos, tendência que tem vindo a ser combatida com o estímulo
da atividade física. Preocupados
com a estabilidade da comunidade, não é confortável para os dinamarqueses reconhecer que uma
parte importante da população
(cerca de 15%) sofre de depressão,
associada mais a uma patologia
mental do que a uma insatisfação
social ou individual.
“Quando as sociedades são
muito desenvolvidas e as necessidades básicas estão asseguradas,
se alguém se sente infeliz, a responsabilização do indivíduo é muito
maior. E nem todas as pessoas suportam”, assume Wiking. Mas a
ideia da Dinamarca como um país
feliz é um conceito que vale muito
dinheiro, reconhece. Torna o país
capaz de atrair estudantes de qualidade, profissionais de alto nível e
investidores, todos interessados
em ficar associados à ideia positiva de felicidade. “É um ativo de valor por calcular mas é também
uma responsabilidade”, conclui.
Lars Ap já encontrou o seu nicho de mercado na questão da felicidade dinamarquesa. O rosto sor-
ridente atrai, dá gosto ouvi-lo. Como não ficar contente a conversar
com um homem que elegeu como
projeto profissional transformar
os seus conterrâneos em pessoas
mais afáveis? Ele não percebia como os dinamarqueses podiam ser
considerados o povo mais feliz do
mundo e eram rudes com os estrangeiros. “Queria que a cadeia se
propagasse, que não nos contentássemos com a felicidade individual”, explica, dizendo ter ficado
surpreendido com as reações,
após a publicação, em 2010, do seu
livro “Fucking Flink” (“Que Se Lixe
a Simpatia”). O próximo passo será
levar esta atitude de abertura perante o outro às escolas, começando cedo a conversão dos dinamarqueses à polidez. E Lars fará isso,
para além de publicar a continuação do primeiro livro, com um título provisório de “Guerrilha da simpatia”. “Sem ser invasivo, respeitando a privacidade de cada um, é
possível sermos amigáveis com os
outros, o que nos trará felicidade
como consequência”, ensina. Lars
começou sozinho e já tem oito pessoas a trabalhar com ele. “O movimento da simpatia mudou a minha vida”, assume. E deve ser verdade, porque ele é supercool.
O PESO DO CLIMA
Um outro Lars, desta vez de apelido Kjerulf Petersen, é sociólogo, especializado em questões culturais
e preocupado com a identidade dinamarquesa. Para este professor
da Universidade de Aarhus, a segunda maior cidade da Dinamarca, a felicidade não deve ser confundida com bem-estar e autossatisfação. “Nós próprios ficamos espantados com os resultados destes
relatórios, porque não nos sentimos assim tão felizes”, afirma. “Em
geral, os dinamarqueses sentem-se sozinhos e melancólicos e o clima não é indiferente a estes sentimentos. Temos falta de luz no inverno e demasiada luz no verão,
vivemos entre o claro e o escuro,
entre a felicidade e a melancolia.
E, na minha opinião, as condicionantes ambientais explicam de
O extremo respeito pela privacidade e pelo direito de cada
um não pode ser desculpa para a falta de delicadeza
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EXERCÍCIO FAZ
SORRIR CLIMA
AUSTERO E INVERNOS ESCUROS ALIMENTAM A TENDÊNCIA PARA A MELANCOLIA, COMBATIDA COM
ATIVIDADE FÍSICA
LARS AP ASSUMIU
COMO PROJETO DE
VIDA A TENTATIVA DE
DISSEMINAR A FELICIDADE E FAZER DOS
DINAMARQUESES UM
POVO MAIS AFÁVEL
SHARMI
ALBRECHTSEN
AMERICANA
DE NASCIMENTO E
DINAMARQUESA POR
AGORA, NÃO CONCORDA COM O NÍVEL DE
IMPOSTOS DO PAÍS
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alguma forma os comportamentos
sociais”, afirma. E se compararmos
com Portugal? “Não somos tão dramáticos, interiorizamos mais os
nossos sentimentos”, explica.
O reino dinamarquês é dos
mais antigos da Europa, tem mais
de mil anos e vai buscar as origens
aos guerreiros vikings, ensina o sociólogo, para quem que a melancolia tem as suas raízes não apenas
no clima, mas também na História: “Temos a noção de que nos desenvolvemos como país através de
derrotas. A Dinamarca perdeu território para a Suécia, sofreu invasões dos exércitos ingleses, foi ocupada pelos nazis. O que salvou o
país foi a inovação aplicada à agricultura.” Diz mais: “Os dinamarqueses sabem que terão de se reorganizar para manter o sistema que
lhes garante bem-estar e estão preparados para sacrifícios. É um tema em discussão, mas é, sobretudo, uma questão de responsabilidade”, conclui Kjerulf.
FELICIDADE E ESTRANGEIROS
Sharmi Albrechtesen é americana
e vive na Dinamarca há dez anos.
A casa onde mora tem dois andares e é branca, por fora e por dentro. As janelas de vidro, enormes,
dão para um jardim traseiro, onde
a nota de desarrumação são três
maçãs vermelhas caídas na relva.
A obrigatória bicicleta está encostada à cerca. Do lado de dentro, peles
de animais sobre os sofás, aconchegam quem vem do frio da rua. A
decoração fica completa com as velas, acesas mesmo com a luz do dia.
Sharmi trabalha numa empresa
sem fins lucrativos e escreveu um
livro em que conta a sua experiência no país mais feliz do mundo.
Casada pela terceira vez, vai
no segundo marido dinamarquês.
Diz que “os homens dinamarqueses são bons maridos, igualitários,
sabem cozinhar, arrumar e nem é
preciso pedir porque não têm problemas de ver a masculinidade fragilizada por estas atitudes”. Esperam apenas que as companheiras
tenham idêntico comportamento,
“o que não é pouco, porque, como
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privilegiam o ambiente do lar, a
mulher terá de ser boa anfitriã, preparar uma deliciosa refeição e garantir que a casa está perfeitamente acolhedora”. Quanto à felicidade, Sharmi não tem meias palavras: “Não são felizes, estão satisfeitos”, explica a autora de “Um Pedaço da Felicidade Dinamarquesa”.
“Vivem em grupos pequenos
e parecem pensar que já têm amigos suficientes. Não fazem visitas
inesperadas e planeiam tudo com
meses de antecedência. Preferem
conversar sobre temas que evitem
discussões. São felizes a pagar impostos”, ensina Sharmi, sem conseguir separar-se da sua identidade
norte-americana. Na sua mentalidade, o sistema de impostos e benefícios sociais não estimula a
competitividade profissional. Como tem rendimentos altos, paga
68% dos rendimentos em impostos. E não gosta. “Eles têm total confiança no governo, é como um
grande pai, a que eu chamo mesmo Sugar Dad Denmark”, ironiza.
Durante algum tempo, Sharmi sentia-se triste na Dinamarca.
Mas, transformada pela influência
do país, a exuberante americana de
origem indiana aprendeu a sentir
prazer em pequenas coisas, como
os passeios pelo bosque ou as caminhadas com uma amiga. “Aprendi
que posso ficar satisfeita sem ter adquirido algo. É também uma questão de tornar as expectativas acessíveis, de não gastar tempo a sonhar
e esquecer-se de viver”, afirma. E
garante que vai sempre levar com
ela o que aprendeu na Dinamarca.
Conhece muitos estrangeiros insatisfeitos de viver na Dinamarca e
aconselha: “Também vivi anos em
que não conseguia ver a beleza do
país, é preciso esforçarmo-nos para os entendermos e para sermos
aceites. Fiz com que acontecesse. E
até aprendi a gostar de cozinhar!”
A Dinamarca é um país complexo e muitas vezes os dinamarqueses parecem sentir-se estrangeiros no seu próprio país. Arne
Moller é enorme, parece um urso
polar. De riso fácil, tem uma vivacidade inédita num dinamarquês.
Na Dinamarca, cerca de 15% da população sofre de depressão,
problema agravado pela falta de luz e pelos longos invernos
PEDALAR ANDAR DE BICICLETA FAZ PARTE
DA IDENTIDADE DOS DINAMARQUESES
Dea Crodt Kragh é pequenina e
desperta a vontade do interlocutor
se abrir com ela. Ambos representam a região de Lollands, um Alentejo dinamarquês. Apesar da industrialização crescente, ainda é a
agricultura que sustenta a população de cerca de cem mil pessoas.
São gente do campo, mas como querem crescer e inovar abriram uma embaixada em Copenhaga para divulgar as potencialidades regionais. A região de Lollands
produz todo o açúcar feito na Dinamarca, o melhor queijo de cabra do
país, e os seus responsáveis apostam em energia eólica e parecem
procurar uma forma de felicidade
mais espontânea e comunitária.
“Queremos acabar com os preconceitos e mostrar que não somos saloios, defendemos que, na
comunidade, uns tomem conta
dos outros, e temos o objetivo de
criar maior proximidade entre as
pessoas”, afirma Arne Moller. Juntamente com Dea Crodt, reconhece que a maior fragilidade de Lol-
HOMOSSEXUAIS A DINAMARCA FOI O PRIMEIRO PAÍS
A RECONHECER A UNIÃO LEGAL DE CASAIS DO MESMO SEXO
lands é a falta de trabalhadores
qualificados e ambos estimam em
oito mil pessoas as necessidades
para os projetos dos próximos
anos, especialmente para ajudar
na construção de um túnel que ligará Lollands à Alemanha. Mas, para já, Arne e Dea ficariam mais felizes apenas se se sentissem mais
próximos da própria Dinamarca.
Considerado o país com as
mais duras leis de imigração, na Dinamarca só se concedem vistos de
residência a cidadãos extracomunitários que ali vivam há mais de
sete anos e, antes, é preciso passar
por testes de aptidão linguística,
dar provas de educação e até depositar uma caução. Para Niels-Erik
Hansen, advogado e diretor do
Centro Contra a Discriminação Racial, organização que assegura
apoio jurídico a imigrantes em risco, “os franceses são suaves quando comparados com os dinamarqueses”. No país, há turcos, somalis, eritreus, marroquinos, libaneses, muitos à espera de visto. Entre-
tanto, alguns estão confinados em
campos de refugiados, mesmo junto à capital. “Não pedimos que se
abram completamente as portas,
apenas que a Dinamarca tenha as
mesmas leis que o resto da Europa”, defende Hansen. E como ser
feliz estando próximo da infelicidade de tantos imigrantes? “Estou feliz por poder ter o privilégio de ajudar pessoas como a mulher da Eritreia que se encontra há 12 anos
num campo de refugiados a 30 quilómetros de Copenhaga. Estas pessoas vivem num limbo, não podem trabalhar nem se integrar na
sociedade”, diz o diretor do DRC.
O estrangeiro tem de aprender a encontrar o seu lugar, mas os
próprios dinamarqueses têm dúvidas quanto às consequências do
sistema que os ampara. Hans tem
36 anos, Caroline 37. Ele é professor do ensino primário, ela arqueóloga. Têm uma filha de dois anos e
meio, Johanne, e ainda Anders, um
rapaz de 11 anos, da primeira relação de Caroline. A família Hans-
gaard ficará completa quando da
barriga de sete meses de gravidez
de Caroline sair o novo bebé, cujo
sexo preferem para já não conhecer. Depois e durante seis meses, a
mãe ficará em casa, paga pelo empregador, os outros seis serão pagos pelo Estado. Após o nascimento, o pai fica duas semanas em casa e os últimos seis meses da licença podem, à escolha, ser repartidos entre o pai e a mãe.
Há um ano, mudaram-se para
a casa que é símbolo do esforço da
família em nome do bem-estar. O
pagamento do empréstimo de 30
anos ao banco consome 50% dos
rendimentos dos Hansgaard. “Se
não houvesse dois salários, era impossível”, assume Caroline. Mas, garantem, vale a pena. É que, durante
algum tempo, viveram num pequeno apartamento e sofreram as consequências da falta de espaço. “Não
conversamos muito quando chegamos à casa. O Hans passa todo o
dia a ouvir crianças e quer silêncio.
A pequenina também prefere ver
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As leis da imigração
são as mais duras
da Europa. Ser
estrangeiro não
é fácil na Dinamarca
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televisão sozinha, para descomprimir, o rapaz
vai para a cave. Eu fico por aqui”, explica a mãe.
Quem os conhece de perto diz que são representativos de uma família de classe média
dinamarquesa. A aliança enorme exibe uma
promessa de felicidade, que parece passar também pelos quadros coloridos pendurados na
parede, o castiçal com várias velas no peitoral
da janela, o vaso com trevos roxos de três folhas, a cadeira de balanço coberta por uma pele quentinha. A casa não é grande, maior é o
esforço que exige. Os sapatos ficam à entrada.
Enquanto conversa, Caroline controla a tarte
no forno. O cheiro contribui para o sentimento
de hygge, palavra dinamarquesa para algo indefinível entre o conforto e a beleza do ambiente.
Uma vez por semana recebem amigos e, mais
uma vez, a casa é o elemento central daquela
ideia de felicidade. “O período mais difícil das
nossas vidas começa agora”, afirma Hans, referindo-se ao peso do empréstimo. Tudo em nome de uma qualidade de vida que passa por
dar segurança e conforto à família. Mas nem
tudo é segurança. “Começamos a nossa vida
nos hospitais e acabamos nos hospitais, é assim a nossa sociedade. Eu ainda deveria estar
próximo dos meus pais.” Autossuficientes e satisfeitos com o que construíram, os dinamarqueses reconhecem que a estrutura de bem-estar parece ter esquecido algo fundamental.
Mesmo assim, Hans ainda quer mais: “Temos o
mais caro sistema de educação e não o melhor.
Temos de ter.”
Nas escolas, é incutido aos dinamarqueses o
amor pelo país. Canta-se a beleza das faias. As regras são claras e iguais para todos. Os direitos
também. Mas foi na Dinamarca que 11 mil pessoas, entre 1929 e 1970, foram esterilizadas em
nome da melhoria da qualidade genética da população. Como Tony Judt escreveu na sua obra-prima “Pós-Guerra”, “as sociedades escandinavas
eram pequenas e socialmente homogéneas, sem
colónias ultramarinas ou ambições imperiais”.
Feito o retrato, fica a sensação de que esquecemos de algo. Esquecemos de Hans Christian Andersen, que nos falou do frio que sentia a rapariga
que vendia fósforos, do cisne que se achava feio
por ser diferente, do amor sem esperança que o
soldado de chumbo sentia pela bailarina... Não podemos esquecer é do rapaz que, vendo o monarca sem roupa, gritou: “O rei vai nu!” R
REVISTA 16/NOV/13
Felicidade gera
artistas melancólicos
No reino das artes dinamarquesas, o risco não faz parte da
partitura. Ser ou não ser feliz para poder criar foi a grande questão
debatida por cinco artistas numa mesa de café em Copenhaga
A reunião está marcada para as 9h30, mas
às 9h já lá estávamos porque um dos convidados teria de sair mais cedo e não queria
perder tempo para poder explicar bem o
seu ponto de vista. A razão do encontro, no
Sommersko, um dos tradicionais cafés do
centro histórico de Copenhaga, era a realização de um debate sobre a felicidade e a
melancolia na arte dinamarquesa.
Às nove em ponto chegou Mikkel Niemann, artista plástico. Simpático, apresenta-se e começa logo a defender as suas posições. É o homem da exceção, aquele que
assume que, para criar, é bom ter uma situação económica estável. Em Portugal tal
discussão causaria espanto, mas, na Dinamarca, a situação inverte-se.
Aos poucos, chegam os outros convidados. Discretos e cordatos, pedem um
chá, um café, um croissant ou uma fatia de
bolo. Apresentam-se de mão estendida e
sorriso tímido. O último chega às 9h35. É o
escritor e realizador Anders Rønnow Klarlund que, incomodado ao ver todos instalados e o gravador a postos, pergunta: “Não
era às nove e meia? Estou atrasado? Peço
desculpa!” É nos pequenos detalhes que a
identidade dinamarquesa transparece: o estrito cumprimento das horas marcadas, a
expectativa de receber do outro o mesmo
ARTISTAS
DINAMARQUESES
NIELS PETER FLINDT,
TORBEN REJNHOLDT-PETERSEN, ANDERS
RØNNOW KLARLUND,
MIKKEL NIEMANN
E BENT SØRENSEN
(DA ESQUERDA PARA
A DIREITA)
que se dá, a educação contida nas relações
sociais. Com o cenário composto, é dada ordem para se avançar. A primeira questão é
fatal: se são tão felizes, porque a arte dinamarquesa que é conhecida além-fronteiras
prima pela escuridão e pela melancolia?
Cautelosos, pedem mais explicações.
Não se entregam à primeira provocação.
Recordamos os contos de Andersen, a filosofia de carácter existencialista-religioso
de Søren Kierkegaard, que comemora 200
anos de nascimento em 2013 e defendia
que “a angústia é a possibilidade de liberdade”. Ou as tiradas polémicas e os filmes pesados de Lars Von Trier, que não se furtou a
rodar uma fita intitulada “Melancolia”. Ou
as séries televisivas cult e muito atuais “The
Killing” e “The Bridge”...
Aceites as hostilidades, a discussão
abre acesa, com os artistas a não perderem
tempo e a começarem por onde tudo se inicia e acaba: o dinheiro. Afinal, ser artista
num país onde há subsídios para criar, torna a produção artística mais espontânea ou
limita-a?
Mikkel Niemann regressa à sua tese,
defendendo que precisa de estabilidade para pintar e criar as suas instalações. Classifica mesmo esta questão da melancolia na
arte dinamarquesa como “uma marca para
vender no mercado externo”. “Estou feliz
com o conforto, gosto do que o dinheiro me
permite fazer”. A sua arte atual está muito
ligada ao Japão e as viagens custam dinheiro, assim como a sua formação, feita entre
Londres, Berlim e Nova Iorque. Mas o cenógrafo e arquiteto Niels Peter Flindt, especializado em questões de sustentabilidade ambiental, discorda do argumento do conforto. Recentemente chegado da Índia, vem influenciado pela capacidade de se fazer arte
a partir de muito pouco. Embora se diga
grato por viver na Dinamarca, “onde é
mais fácil trabalhar com arte”, diz que ali
“tudo é acompanhado por um sentimento
de solidão, que inviabiliza, na base, a questão da felicidade”. O problema, na sua opinião, é que “os dinamarqueses são disfuncionais por não saberem lidar com as próprias emoções”. E rasga a discussão com
uma afirmação dura: “Tenho de sair da Dinamarca para criar. Aqui não podemos ter
altos e baixos e corremos o risco de nos tornarmos pequenas barbies. Vivemos uma séria crise de identidade. Nunca me senti tão
feliz como quando estive na Índia!”
Bent Sørensen, renomado compositor
e professor de música no Conservatório de
Copenhaga, sublinha a importância da vontade individual: “Felicidade ou tristeza são
decisões que se tomam todas as manhãs.
Os dinamarqueses não são apaixonados.
Pensam na tristeza como uma doença e temos de aprender a lidar com esta pressão
para sermos felizes. É preciso saber criar
com a felicidade. Pessoalmente, o conforto
é bom, mas a arte precisa de algum risco.” E
toca na contradição inerente àquela sociedade: “Sabemos que não somos uma sociedade completamente feliz, mas é preciso reconhecer que o dinheiro nos dá liberdade
para produzir, o que também é positivo.”
O realizador e novelista Anders Rønnow Klarlund explica que, para ele, “ser feliz é saber lidar com a própria infelicidade”,
mas considera também que “quanto mais
estável for a sociedade, menos criativos são
os artistas”. Ele, por exemplo, diz recusar-se a obter subsídios estatais para os seus
trabalhos. “Bloqueio”, garante Klarlund.
“Na Dinamarca temos muito medo das
emoções e este é um grande espaço que ainda pode ser explorado artisticamente”, afirma, para, a seguir, lançar a sua bomba: “Somos como a Coreia do Sul, estão sempre a
dizer-nos que somos a sociedade perfeita!”
Torben Rejnholdt-Petersen, talvez o
mais jovem, fotógrafo, acredita que “segurança de mais gera imobilismo, não provoca a criação”. Diz que “é preciso saber sentir
os altos e baixos da vida” e conta que o período em que foi mais criativo foi quando se
sentiu deprimido. “É preciso motivar o confronto emotivo em cada artista, sair da rotina, do conforto. E nós, dinamarqueses, somos deficientes emocionais.” Os chás e os
cafés estavam frios sobre a mesa e a hora
para acabar o debate soou. A conversa acabou, mas a dúvida permanecia. R
[email protected]
Veja fotogaleria da reportagem
na Dinamarca em
www.expresso.sapo.pt
REVISTA 16/NOV/13
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