RECOMENDAÇÃO Nº 04/2013 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO

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RECOMENDAÇÃO Nº 04/2013 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO
RECOMENDAÇÃO Nº 04/2013
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, pelo Promotor de Justiça da Comarca de
Afonso Bezerra, no uso das atribuições conferidas pelo art. 129, incisos II e III, da Constituição Federal de 1988, pelo
art. 27, parágrafo único, IV, da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e pelo art. 69, parágrafo
único, “d”, da Lei Complementar Estadual nº 141/96 (Lei Orgânica Estadual do Ministério Público), e ainda,
considerando que:
1. conforme estatui o artigo 37, caput, da Constituição Federal, a Administração Pública direta e indireta de qualquer
dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos Princípios de Legalidade,
Moralidade, Eficiência, Publicidade e Impessoalidade;
2. são funções institucionais do Ministério Público, nos termos do artigo 129, inciso III, da Constituição Federal,
promover o inquérito civil e a ação civil pública para a defesa dos interesses difusos e coletivos;
3. a Segurança é direito social fundamental do cidadão brasileiro (art. 6º, caput, da Constituição da República);
4. atualmente o Destacamento de Afonso Bezerra, além de seu Comandante, conta com 02 policiais
militares em alguns dias e, em outros, apenas com 01 policial militar, para: (i) realizar a segurança ostensiva
da Cidade, com aproximadamente 10.000 habitantes espalhados por um extenso território (576 km2, IBGE
2010); (ii) atender os chamados da população e (iii) custodiar os detentos que ainda estão sendo
irregularmente custodiados pela corporação militar (apesar de já existir decisão em sentido contrário, em
Ação Civil Pública manejada pelo Ministério Público);
5. não são raros os relatos de populares de que se dirigiram ao Destacamento de Polícia Militar solicitando auxílio da
força policial, mas só conseguiram encontrar naquele local os presos, que responderam que não existia sequer 01
policial no recinto naquele momento;
6. na última inspeção feita por este representante ministerial no estabelecimento, na data de hoje (21/03/13),
aproximadamente às 11 horas, sequer foi possível entrar no Destacamento, já que, apesar da viatura estar parada em
frente ao local, a porta estava trancada e ninguém respondia aos chamados – o que revela evidente desassistência da
Polícia Militar à população de Afonso Bezerra em pleno horário comercial;
7. as recomendações e requisições feitas pelo Ministério Público ao Comando do Destacamento e ao Comando do 10º
Batalhão de Polícia Militar, de Assu, não surtiram efeito (fls. 12 e 14, 61/62), chegando a ser relatado que o próprio 10º
BPM “passa pelo mesmo problema de efetivo” (fl. 12);
8. em razão do quadro calamitoso descrito, direitos mínimos dos custodiados no Destacamento local, como banho de sol
e visitas, estão sendo desrespeitados diuturnamente;
9. existe Ação Civil Pública tramitando no Juízo de Direito da Comarca de Afonso Bezerra – autos 000046551.2009.8.20.0134 – com decisão liminar irrecorrível, determinando ao Estado do Rio Grande do Norte, através de sua
Secretaria de Defesa Social, que:
a) mantenha em serviço um número total mínimo de 06 policiais militares por dia no Município de Afonso Bezerra/RN,
atuando no regime legal de 24 horas por 72 horas;
b) mantenha em serviço número mínimo total de 02 (dois) agentes de polícia civil e 01 (um) escrivão por dia para o
Município de Afonso Bezerra/RN;
c) promova a compra de 02 computadores e 02 impressoras, aptas a funcionar e apropriadas para o regular desempenho
da atividade policial, com o fornecimento regular de material para o devido funcionamento.
10. as possibilidades de recurso contra a decisão judicial mencionada precluíram, não havendo notícia nos autos de
interposição de Agravo de Instrumento – apesar do Estado do Rio Grande do Norte ter sido validamente intimado;
11. o Ministério Público requereu a execução específica do decisum, sendo proferida em 02/04/12 a seguinte
determinação judicial:
ISSO POSTO, ante as razões aduzidas, firme nos preceitos dos arts. 14, V, c/c 461, do CPC, defiro o pedido formulado
pela parte autora e, em consequência, assino o prazo de 30 (trinta) dias para que o Estado do Rio Grande do Norte
promova a manutenção de aparato mínimo de 06 (seis) policiais militares para atuação e trabalho ostensivo por dia,
atuando no Município de Afonso Bezerra-RN, com lotação de 02 (dois) agentes da polícia civil e 01 (um) escrivão na
Comarca, sem prejuízo da aquisição de dois computadores e duas impressoras para a delegacia local.
Deverão ser intimados o Sr. Procurador-Geral do Estado, o sr. Secretário de Defesa Social, o sr. Delegado-Geral da
Polícia Civil, na qualidade de agentes públicos gestores da Segurança Pública e responsáveis pelo cumprimento da
medida.
12. o Secretário de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social, quando comunicado do cenário narrado acima
através da Recomendação 08/12 – oriunda desta Promotoria de Justiça –, declarou que encaminhou a peça ao DelegadoGeral de Polícia Civil e ao Comandante Geral da Polícia Militar para atendimento, “considerando tratar-se de matéria de
suas competências, por serem detentores de autonomia gerencial administrativa, orçamentária/financeira nas respectivas
instituições” (ofício 756/2012-GS/SESED, de 17/07/12, fl. 85), delegando expressamente às referidas autoridades o
cumprimento da decisão judicial;
13. o Comando-Geral da Polícia Militar do Rio Grande do Norte até o momento não respondeu como cumprirá a
decisão judicial irrecorrível;
14. comete ato de improbidade administrativa o agente público que deixa de cumprir decisão judicial, existindo
alternativas administrativas à sua disposição para tanto, já que tal comportamento demonstra omissão dolosa no
cumprimento dos deveres encartados no art. 11, caput, da Lei 8.429/92, representando ainda retardamento de ato que
deveria ser praticado de ofício (art. 11, II);
15. os tribunais, em casos semelhantes, adotaram o mesmo entendimento:
PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
– PRELIMINARES – Nulidade processual por falta de citação valida e julgamento antecipado da lide - Prejuízo que
não se demonstrou Nulidade não configurada - Rejeição - Preliminar de nulidade de sentença por ausência de motivação
e fundamentação - Confusão com o mérito - Rejeição - Decisão que atende aos requisitos processuais e constitucionais Rejeição - Mérito - Alegação de conduta ímproba prevista no art. 11 da Lei 8429/92 Atraso injustificado de salário e
descumprimento de ordem judicial - Atraso Condutas ímprobas configuradas - Possibilidade de punição - Elemento
volitivo demonstrado nas condutas do agente político. ART. 333, II DO CPC – NÃO OBSERVÂNCIA PELO RÉU –
PROCEDÊNCIA DO PEDIDO MANTIDA – PEQUENO RETOQUE NO QUE TANGE AS PENALIDADES
APLICÁVEIS – Redução de cinco para três amoldando-se ao dispositivo legal - Provimento parcial do apelo. Poderia e
não fez o apelante, prova em contrário nos autos, de que não havia salários atrasados injustificadamente, ou que também
não houvera descumprido ordem judicial, não havendo razões para a reforma da decisão atacada, que também, ao
contrário do aduzido, encontra-se devidamente fundamentada e motivada, expondo o MM. Juiz monocrático, as razões
de fato e de direito pelas quais entendia pela procedência da ação, razões as quais me acosto inteiramente. (TJPB – AC
008.2004.001660-5/002 – 3ª C.Cív. – Rel. Des. Genésio Gomes Pereira Filho – DJe 10.07.2010 – p. 7)
APELACAO CIVEL – ACAO CIVIL PUBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA –
DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL – PENA – DOSIMETRIA – 1- verificada a omissao dolosa da
autoridade publica em cumprir ordem judicial voltada a coibir ato administrativo irregular, caracterizada esta a conduta
improba do art. 11, inciso II, da lei 8.429/92, com sujeicao de seu autor as penas previstas no art. 12, inciso III, da
mesma lei. 2- A pena aplicavel ao agente publico improbo deve ter sua dosimetria norteada pela gravidade da conduta e
lesividade aos principios constitucionais aplicaveis aos agentes publicos, sob pena de inadequacao aos fins que se
destinam, comportando, no caso concreto, o afastamento da pena de suspensao dos direitos politicos, mantidas as
demais, por suficiencia da reprimenda. Recurso de apelacao civel conhecido e parcialmente provido. (TJGO – AC
144600-9/188 – 1ª C.Cív. – Rel. Jose Carlos de Oliveira –DJe 17.11.2009 – p. 227)
16. a omissão narrada também configura o crime do art. 330 do Código Penal, “Desobediência - Desobedecer a ordem
legal de funcionário público: Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa”, e pode eventualmente atrair a
incidência do art. 319 do Código Penal, “Prevaricação - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou
praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três
meses a um ano, e multa”.
RECOMENDA ao Comandante-Geral da Polícia Militar do Rio Grande do Norte que tome todas as medidas
administrativas necessárias para cumprir integralmente a decisão judicial irrecorrível exarada nos autos 000046551.2009.8.20.0134.
Publique-se esta Recomendação no Diário Oficial do Estado.
Encaminhe-se cópia eletrônica da presente para as Coordenações dos Centros de Apoio às Promotorias Criminais e de
Defesa do Patrimônio Público.
Remeta-se a Recomendação pessoalmente a seu destinatário – com cópia da decisão judicial mencionada –, através do
Setor de Transportes da Procuradoria-Geral de Justiça, requisitando-lhe que informe, em 05 dias, as providências
adotadas.
Afonso Bezerra/RN, 21 de março de 2013.
Augusto Carlos Rocha de Lima
Promotor de Justiça

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