FESTIVAL DE CINEMA POLONÊS 2011 – WAJDA NO BRASIL

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FESTIVAL DE CINEMA POLONÊS 2011 – WAJDA NO BRASIL
FESTIVAL DE CINEMA POLONÊS 2011 – WAJDA NO BRASIL
De 6 a 16 de dezembro
Brasília, Museu Nacional – entrada franca
Retrospectiva de filmes do grande cineasta polonês exibe as mais
importantes obras do diretor, realizadas entre 1960 e 2009
Cinema polonês é sinônimo de cinema de qualidade. O país que cedeu ao mundo realizadores
como Kieslowski, Wajda, Polanski, Skolimowski, que acolheu a lendária Escola de Lodz, tem
com a linguagem cinematográfica uma parceria de longos anos. Em 2008, a Polônia celebrou o
centenário do cinema polonês – em 22 de outubro de 1908, ocorreu a primeira exibição pública
da comédia Antonio pela primeira vez em Varsóvia, do diretor Jerzy Meyer. Por este, em 2009,
motivo foi organizado em todo o Brasil o primeiro Festival do Cinema Polonês. No ano passado
o Festival aconteceu novamente – dessa vez tendo como foco as produções cinematográficas
mais recentes do país. Agora chegou a hora de mostrar o que o cinema polonês tem de melhor.
O Festival de Cinema Polonês 2011 será dedicado exclusivamente ao grande cineasta, laureado
com prêmio Oscar, Andrzej Wajda.
O FESTIVAL DE CINEMA POLONÊS 2011 – WAJDA NO BRASIL oferece a oportunidade
única de conhecer ou rever as mais importantes obras do célebre diretor polonês, que
marcaram a história do cinema nacional e mundial. Ao público brasileiro serão apresentadas
produções feitas entre 1960 e 2009. São onze filmes de vários gêneros, selecionados com o
objetivo de mostrar o perfil da obra do Andrzej Wajda. Além de Brasília, o festival circulará
pelos principais centros culturais do Brasil, entre outros: São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba,
Porto Alegre, Florianópolis, Manaus, Fortaleza e Salvador.
PROGRAMAÇÃO / BRASÍLIA
06 TER
20h A VINGANÇA
07 QUA
19h CRÔNICA DOS ACIDENTES AMOROSOS
21h KORCZAK
08 QUI
19h TUDO À VENDA
21h AS SENHORITAS DE WILKO
09 SEX
19h O MESCLADO
20h O HOMEM DE MÁRMORE
10 SAB
19h OS INOCENTES CHARMOSOS
20h30 SENHOR TADEU
11 DOM
19h CÁLAMO
21h A VINGANÇA
12 SEG
19h O MAESTRO
21h CRÔNICA DOS ACIDENTES AMOROSOS
13 TER
19h O HOMEM DE MÁRMORE
21h40 OS INOCENTES CHARMOSOS
14 QUA
19h AS SENHORITAS DE WILKO
21h O MAESTRO
15 QUI
19h O MESCLADO
20h SENHOR TADEU
16 SEX
19h KORCZAK
21h CÁLAMO
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SINOPSES
CÁLAMO / TATARAK
Polônia, 2009, 83 min, cor, legendas em
português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Andrzej Wajda
Fotografia: Paweł Edelman
Elenco: Jan Englert, Julia Pietrucha, Roma
Gąsiorowska e outros
Gênero: Drama psicológico
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 ANOS
"Cálamo" é um filme baseado no conto de Jaroslaw Iwaszkiewicz, um dos mais renomados
escritores poloneses. A princípio é uma história sutil e tocante sobre um amor impossível. No
entanto, Wajda vai mais fundo, criando um conto multidimensional sobre o sentimento, que
chega tarde demais, e sobre a morte, que sempre chega cedo demais.
Marta (Krystyna Janda), uma mulher instruída, de meia-idade, casada com um médico (Jan
Englert), não sabe que tem uma doença terminal. Há anos chora a morte de seus dois filhos,
mortos no Levante de Varsóvia. Certo dia conhece um homem mais novo, um simples
trabalhador chamado Bogus (Paweł Szajda), o qual a encanta com sua juventude e inocência.
Este encontro à beira de um rio coberto por cálamos é marcado pela fascinação recíproca de
duas existências, onde uma caminha para o fim prematuro e a outra somente acaba de entrar
na maturidade. No entanto o destino se mostra cruel para eles.
Essa é somente a primeira dimensão da produção, pois "Cálamo" é igualmente um filme sobre a
criação de um filme, e a personagem principal não é somente a fictícia Marta, mas a atriz que a
interpreta.
Andrzej Wajda entrelaça o conto de Iwaszkiewicz com um autêntico monólogo de Krystyna
Janda sobre a morte prematura de seu marido Edward Klosinski, um reconhecido diretor de
fotografia, ao qual este filme foi dedicado. Desta maneira, ambas as mulheres, Krystyna e
Marta, misturam-se em um único ser ferido, que precisa encontrar forças em si mesmo e
superar a perspectiva de uma morte inevitável.
A VINGANÇA / ZEMSTA
Polônia, 2002, 100 min, cor, legendas em
português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Andrzej Wajda
Fotografia: Paweł Edelman
Elenco: Roman Polański, Janusz Gajos,
Andrzej Seweryn, Katarzyna Figura e outros
Gênero: Comédia de época
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 12 ANOS
Baseado em uma comédia de um dos mais populares dramaturgos poloneses do século XIX,
Aleksander Fredro. Czesnik Raptusiewcz divide o castelo com o odiado vizinho - escrivão
Milczek. Ganancioso Czesnik quer se casar com a viúva Podstolina a fim de se apoderar das
propriedades dela. Porém, ele não sabe que a própria Podstolina está procurando um marido
rico. Ciente de sua miserável aparência e sua falta de polidez social, Czesnik pede ajuda a
Papkin (neste papel Roman Polanski) para arranjar o casamento. Já Papkin, que se faz de
conquistador e grande herói, sendo na verdade um covarde e fantasiado, ama Klara - sobrinha
do escrivão Milczek. Mas Klara está apaixonada pelo filho do escrivão, Waclaw. Os jovens
percebem que o seu amor está passando por uma grande prova, pois nem o pai de Waclaw, o
escrivão, nem Czesnik, o tio e protetor de Klara, pretendem aceitar este casamento. Segue-se
assim uma série de intrigas, mentiras, sequestros, acertos e desacertos desta comédia.
SENHOR TADEU / PAN TADEUSZ
Polônia/França, 1999, 147 min, cor, legendas
em português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Andrzej Wajda, Jan Nowina Zarzycki,
Piotr Wereśniak
Fotografia: Paweł Edelman
Elenco: Bogusław Linda, Daniel Olbrychski,
Grażyna Szapołowska, Andrzej Seweryn, Marek
Kondrat, Krzysztof Kolberger, Jerzy Bińczycki,
Alicja Bachleda-Curuś, Michał Żebrowski e outros
Gênero: Filme de época
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: LIVRE
Filme baseado na epopeia do grande escritor polonês, Adam Mickiewicz, escrita em 1834,
depois de dez anos da emigração forçada do autor no exterior. Carregado de lirismo e saudade
do país, num longo poema o escritor apresenta a visão de um mundo aristocrata em extinção,
tornando pública a imagem contemporânea (de então) dos poloneses e da Polônia.
Na penumbra de um apartamento em Paris, imigrantes poloneses se encontram e relembram a
sua pátria. Adam Mickiewicz (Krzysztof Kolberger) nos narra o conto sobre a Última Incursão
Armada na Lituânia. Estamos no ano de 1811. Tadeusz Soplica (Michal Zebrowski), depois de
terminar os estudos, retorna para a casa familiar da Lituânia. Visitando antigos recantos da
casa, Tadeusz chega ao seu quarto de infância, onde encontra Zosia (Alicja Bachleda-Curus).
Esta linda e desconhecida jovem atiça as suas imaginações juvenis despertando seus
sentimentos de desejo e paixão. À noite, durante um jantar oferecido no castelo, Tadeusz
encontra a sedutora Telimena (Grazyna Szapalowska) e iniciam um romance. Porém, em pouco
tempo descobre que ela é a tutora da linda e jovem Zosia. No fundo da complicada relação
amorosa entre Tadeusz, Zosia e Telimena, há um enredo histórico-político. No século XIX o
território da Polônia estava partilhado entre Rússia, Prussia e Áustria. Boa parte dos poloneses
vira no exército do Napoleão uma força capaz de restituir a independência da Polônia. Esta
tendência está representada no filme pelo personagem do padre Robak, que prepara em
conspiração um levante armado na sua terra para facilitar à França o ataque contra a Rússia.
A tentativa de transferir para as telas esta epopeia nacional encontrou, desde o princípio,
disputas e controvérsias com respeito tanto ao elenco como a configuração do roteiro. Mesmo
com a maioria não acreditando no sucesso de tal empreitada, Andrzej Wajda não desistiu de
seus planos. Levando em consideração os gostos dos espectadores atuais, o diretor se focou na
ação, no romance, com um toque de humor e lindas paisagens, não ignorando as estrofes
poéticas originais, com as quais os atores se comunicam. Os esforços do Wajda resultaram em
triunfo: o filme bateu todos os recordes de bilheteria na Polônia.
KORCZAK / KORCZAK
Polônia / Alemanha, 1990, 113 min., preto e
branco, legendas em português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Agnieszka Holland
Fotografia: Robby Muller
Elenco: Wojciech Pszoniak, Ewa
Dałkowska,Teresa BudziszKrzyżanowska, Marzena Trybała,
Piotr Kozłowski, Zbigniew Zamachowski, Jan
Peszek, Aleksander Bardini e outros
Gênero: Drama
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 ANOS
Com “Korczak”, Wajda volta para um dos seus temas preferidos: a ocupação nazista na Polônia
durante a segunda guerra mundial. Este filme retrata a vida do escritor, pedagogo e médico
Janusz Korczak (pseudônimo de Henryk Goldszmit). O protagonista passa três anos da guerra
com as crianças do orfanato no Gueto de Varsóvia. Em um esforço heroico ele tenta garantir
que seus tutelados tenham uma existência com o mínimo de dignidade. Korczak tenta separar
as crianças do horror do dia a dia, organizando aulas e brincadeiras. Ao perceber que o pior
está por vir, prepara uma peça de teatro baseada na obra de Rabindranath Tagore, que fala
sobre a morte, achando que as crianças devem se acostumar com ela. A sua atitude na hora da
maior prova assegurou-lhe um lugar imortal.
"Korczak" é uma imagem modesta, em preto e branco, com a comovente interpretação de
Wojciech Pszoniak no papel principal e excelente fotografia do internacionalmente reconhecido
operador holandês Robby Mulle.
CRÔNICA DOS ACIDENTES AMOROSOS / KRONIKA WYPADKÓW MIŁOSNYCH
Polônia, 1995, 114 min, cor, legendas em
português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Tadeusz Konwicki
Fotografia: Edward Kłosiński
Elenco: Paulina Młynarska, Piotr
Wawrzyńczak, Magdalena
Wójcik, Bernadetta Machała, Dariusz
Dobkowski, Jarosław Gruda, Joanna
Szczepkowska e outros
Gênero: Drama psicológico
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 12 ANOS
Um filme poético, baseado no romance do Tadeusz Konwicki, que traz nostalgia dos tempos da
infância. A ação se passa na Lituânia, cuja parte, antes da Segunda Guerra, pertencia à Polônia.
Um aluno de ginásio, Wicio (Piotr Wawrzynczak), um pouco antes da II Guerra Mundial,
apaixona-se por uma jovem da mesma idade, uma senhorita de boa família, Alina (Paulina
Mlynarska). Para esse rapaz a vida só está começando, mas o mundo pretende chegar ao fim, o
que no filme é anunciado pela galopante cavalaria e os ainda vivos judeus, que logo serão
vitimas do Extermínio.
"Naquele tempo a Lituânia tinha sua área geográfica indeterminada, uma formação étnica
confusa, uma zona de cultura indefinida. Naquela época a Lituânia era um temporal de verão
que chega de forma brusca, ou melhor, o interior de um vulcão em extinção. A Lituânia era
então um grande sol se pondo, mostrando lindas e estranhas faixas de luz e os restos do arcoíris" - escreveu Tadeusz Konwicki em "Crônica dos acidentes amorosos". Estas palavras
poderiam ser a moral do filme de Andrzej Wajda baseado no mesmo romance. O diretor,
extremamente sensível à composição de cada fotograma, encheu sua obra de claras e
cintilantes imagens, paisagens de cidades, fotografias de um mundo seguro, comum e cheio de
ternura. Nessa realidade apresentada conscientemente, mas de maneira inocente e idílica, o
autor inseriu sinais de inquietação e temor implícitos, anunciando a destruição, pois a "Crônica
dos acontecimentos amorosos", assim como o filme "Senhor Tadeu", se passa numa esfera
tecida de lembranças e nostalgia. Nostalgia da inocência, da pureza e do mítico país da infância
– a mais linda, e ao mesmo tempo, perdida para sempre. O fundamento e a única razão de ser
deste mundo é a imaginação do artista – tão indefesa contra as confusões históricas e
cataclismos. Os movimentos dessa imaginação movem as personagens do filme de Wajda.
AS SENHORITAS DE WILKO / PANNY Z WILKA
Polônia, 1979, 116 min, cor, legendas em
português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Zbigniew Kamiński
Música: Karol Szymanowski
Elenco: Daniel Olbrychski, Anna Seniuk,
Christine Pascal, Maja Komorowska,
Stanisława Celińska, Krystyna
Zachwatowicz, Andrzej Łapicki e outros.
Gênero: Drama psicológico
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 ANOS
Mais uma obra-prima do Wajda baseada no conto do escritor Jaroslaw Iwaszkiewicz. Um filme
calmo, com reflexão, nostalgia e um tom de melancolia, que traz à tela o mundo da aristocracia
agrária dos anos vinte do século passado, entre as duas guerras mundiais.
À procura de vestígios de emoções passadas, o nosso herói Wiktor Ruben (Daniel Olbrychski),
depois de anos de ausência, revisita a cidade do interior onde passou sua mocidade em
companhia de algumas jovens senhoritas - intituladas "senhoritas de Wilko". Porém, depois de
tanto tempo, a relação entre Wiktor e as senhoritas não pode ser a mesma. Julia (Anna Seniuk)
aguarda o nascimento de gêmeos, Jola (Maja Komorowska) se casou, Fela morreu
prematuramente, Zosia (Stanislawa Celinska) e Kazia (Krystyna Zachwatowicz) mudaram, e a
pequena Tunia (Christine Pascal) transformou-se em uma linda mulher. O aparecimento de
Wiktor, com suas lembranças e seu desejo de acordar o passado, atormenta a paz de todos os
habitantes da mansão, revelando os seus destinos perturbados, dramas e fracassos da vida.
As obras do escritor Jaroslaw Iwaszkiewicz (1894-1980) estão entre as mais ricas da literatura
polonesa moderna. Ao longo de seus 60 anos de incansáveis produções, Iwaszkiewicz se
interessou por diversas áreas e estilos literários. Por toda a vida praticou a lírica, escreveu
romances e novelas, dramas, ensaios, biografias, reportagens e críticas. Os romances ocupam
um lugar muito especial entre as suas criações. Uma de suas características mais comuns é o
realismo envolvido em termos psicológicos. Problemas comuns de cada ser humano, questões
sobre a vida e a morte, sentimentos e amor, são observados através do prisma de um tempo
que não para. Não há volta aos acontecimentos do passado. A imagem da realidade, sobre a
qual por anos pensávamos ser a única verdade, agora sob a luz de novas experiências parece
ser simples e banal. Um conto íntimo e repleto de reflexões sobre a relação do homem e os
ciclos naturais: vida e morte.
O MAESTRO / DYRYGENT
Polônia, 1979, 102 min, cor, legendas
em português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Andrzej Kijowski
Fotografia: Sławomir Idziak
Elenco: Ilona Ostrowska, Maciej
Marczewski, Robert Więckiewicz,
Danuta Szaflarska, Agnieszka
Sienkiewicz, Sylwia Dziorek, Inga
Pilichowska e outros.
Gênero: Drama psicológico
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 16 ANOS
Quando pediram a Ingmar Bergman que apresentasse uma lista de onze filmes que mais o
impressionaram, ele aceitou o desafio. Entre essas restritas onze obras, na segunda posição,
esteve um filme polonês – "O Maestro" de Andrzej Wajda. Qual foi a razão de tal escolha, dado
que segundo os críticos poloneses, este filme não estava nem mesmo entre os melhores de
Wajda? Talvez seja a presença neste filme do motivo da "procura do tempo perdido", ideia
também constantemente presente nos filmes do Bergman? Sem dúvida "O Maestro" foi mais
bem recebido no exterior do que na Polônia. O filme recebeu prêmios em prestigiados festivais
de cinema como o de San Sebastian e Santander.
Uma história dramática de três pessoas cuja maior fascinação da vida era a música. Marta
(Krystyna Janda) uma jovem e talentosa violinista, durante seus estudos nos EUA conhece John
Lasocki (John Gielgud), maestro conhecido internacionalmente, que antigamente fora um
grande amor de sua mãe. O choque causado por esse encontro com Marta, desperta no velho
mestre o desejo de voltar ao passado. Lasocki rompe contatos, descuida de seus compromissos
e horários e viaja para a Polônia, até a pequena cidade onde nasceu há mais de setenta anos.
Lasocki quer dirigir a V Sinfonia de Beethoven, a ser executada pela orquestra local. No
entanto, o diretor desta orquestra é o marido de Marta, Adam (Andrzej Seweryn) - pessoa
ambiciosa e um pouco absorta. Com a chegada de Lasocki ele vê sua grande chance. Adam
repara a fascinação de Marta pelo grande maestro, sua humildade, gentileza e entendimento da
essência da música. Nasce então, um sentimento de ameaça que se transforma em raiva...
Após o lançamento do filme a crítica polonesa provocava Wajda afirmando que não aproveitou
suficientemente o papel da música de Beethoven. Escreveram que a "V Sinfonia" poderia ser
um comentário metafórico do intrincado destino dos personagens, mas serviu somente como
um belo acessório adicional. Mesmo assim, o filme "O Maestro", ficou como uma gravação
minuciosa das relações "trêmulas" entre as pessoas; sobre a insegurança de atitudes e ideais,
padrões culturais passageiros e relativos.
O HOMEM DE MÁRMORE / CZŁOWIEK Z MARMURU
Polônia, 1976, 153 min, cor, legendas
em português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Aleksander Ścibor-Rylski
Fotografia: Edward Kłosiński
Elenco: Jerzy Radziwiłowicz, Krystyna
Janda, Tadeusz Łomnicki, Jacek
Łomnicki, Michał Tarkowski, Piotr Cieślak,
Wiesław Wójcik, Krystyna Zachwatowicz,
Magda Teresa Wójcik e outros.
Gênero: Drama político
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 anos
Polônia, anos 70. Uma iniciante diretora de filme, Agnieszka (com uma excelente estreia de
Krystyna Janda, hoje uma atriz de fama europeia) tenta realizar um filme para o seu diploma
de graduação através da televisão estatal. O filme toca no tema tabu daquela época: o
stalinismo. A equipe tenta ajudar "a jovem revoltada" da melhor maneira possível. Porém, o
diretor da edição, fiel ao poder comunista, quer que o filme da iniciante não passe de uma boa
propaganda do sistema. Agnieszka não se rende...
O enredo principal do filme está entrelaçado a outro, retrospectivo, que nos leva ao início dos
anos 50, aos tempos de Stalin. Esta inclusão no filme das cenas que contam a realidade da
época do stalinismo fez com que "O homem de mármore" se tornasse uma obra não somente
artística, mas também sócio-política. As retrospectivas mostram o conteúdo do filme de
Agnieszka: o destino de um simples pedreiro, Mateusz Birkut (comovente papel de Jerzy
Radziwilowicz), um dos tantos assim chamados "trabalhadores superprodutivos" que
alimentados pela propaganda ideológica estavam dispostos a cada sacrifício para ajudar a
erguer o país emergente das ruínas da guerra.
"O Homem de Mármore" nasceu no sacrifício. Foram necessárias muitas tentativas e
intervenções para convencer as autoridades responsáveis pela cultura na época de que o filme
não fosse um que atacasse o governo comunista. Mas foi. E de forma tão eficaz e minuciosa
que gerou pânico. Esta obra de Wajda constitui uma combinação perfeita da arte com uma
crítica aberta sobre a mentira, violência e escravidão, tendo em si uma força singular de
influência. "O Homem de Mármore" tornou-se um grande evento, não apenas cultural. As
mídias oficiais tentaram adulterar o seu sentido, alegando que "O Homem de Mármore" era
somente uma voz útil em um construtivo debate socialista sobre "o tempo dos erros e
distorções" já condenado pelo partido comunista. Mas "a vontade do partido" se desencontrou
com "a vontade do povo". A vida dramática da personagem principal do filme, Mateusz Birkut
(Jerzy Radziwiłowicz) foi, com razão, percebida pelos espectadores como uma metáfora de luta
de uma unidade contra o totalitarismo. Através de seu filme Wajda diz que a luta de Birkut pela
verdade não acabou nos anos 50. Essa luta continua, e uma prova disso é a desesperada luta
de Agnieszka contra os burocratas nomeados pelo partido que administravam a televisão
estatal. Hoje "O Homem de Mármore" é um clássico e uma lenda.
TUDO À VENDA / WSZYSTKO NA SPRZEDAŻ
Polônia, 1968, 94 min, cor, legendas em
português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Andrzej Wajda
Fotografia: Witold Sobociński
Elenco: Beata Tyszkiewicz, Elżbieta
Czyżewska, Andrzej Łapicki, Daniel
Olbrychski, Witold Holtz, Małgorzata
Potocka, Elżbieta Kępińska, Bogumił
Kobiela e outros.
Gênero: Filme psicológico
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 anos
A obra foi criada sob influência da morte trágica do famoso ator polonês da época, Zbigniew
Cybulski, que se atirou do trem em 8 de janeiro de 1967. Cybulski era um dos atores
preferidos de Wajda, que já havia atuado em "Cinzas e diamante", "Os inocentes charmosos" e
na famosa co-produção internacional "O Amor aos vinte anos". Quando veio a notícia sobre a
sua morte, Wajda estava elaborando um roteiro de um filme não somente com Cybulski no
papel principal, mas também sobre Cybulski - uma lenda viva do cinema polonês. Entendeu que
nunca iria realizar esse filme. Portanto fez outro: "Tudo à venda". Este filme, construído ao
redor do tema da procura do ator desaparecido que não apareceu para as gravações, é uma
imagem de paixão e fraqueza do ambiente cinematográfico. "Tudo à venda" conta sobre um
homem que de repente partiu. Sua morte força a refletir sobre quem ele foi de verdade, o que
ele deixou para trás, o que ficará na memória dos que o amavam, quanto tempo a lenda dele
sobreviverá?
Mas a morte de Zbigniew Cybulski foi somente um dos motivos para realização desse filme.
Mesmo que o público veja na tela muitos fatos da vida de Cybulski, não é um filme sobre ele.
Como dizia Andrzej Wajda - esse é um conto sobre as pessoas que fazem filmes, sobre os
diretores, atores, assistentes, ajudantes. Os atores do filme "Tudo à venda" representam eles
mesmos, com seus próprios nomes e falam seus próprios textos. Neste sentido "Tudo à venda"
foi feito com métodos realmente da Nova Onda. O roteiro foi apenas esboçado. Os intérpretes
dos papeis principais improvisaram os diálogos. A ficção de um filme se mistura com a
realidade. A intitulada "venda" refere-se ao descobrimento dos próprios pensamentos, emoções
e impressões destes homens de cinema, uma espécie de exame de consciência.
O MESCLADO / PRZEKŁADANIEC
Polônia, 1968, 35 min, preto e branco,
legendas em português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Stanisław Lem
Fotografia: Wiesław Zdort
Elenco: Bogumił Kobiela, Ryszard Filipski,
Anna Prucnal, Jerzy Zelnik, Piotr Wysocki,
Tadeusz Pluciński, Gerard Wilk, Marek
Kobiela e outros.
Gênero: Comédia negra
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 12 ANOS
"O mesclado" foi a única viagem na carreira de Wajda na direção da ficção científica. O roteiro
foi escrito pelo mundialmente conhecido autor polonês desse gênero literário, Stanislaw Lem.
Realizado no final dos anos 60, é um filme de curta metragem cuja ação desenrola-se no início
do século XXI. A personagem principal do filme (Bogumil Kobiela) é o piloto de carros de
corrida, Richard Fox. Múltiplo medalhista e ganhador de vários prêmios, faz sucesso junto com
o seu irmão, Thomas (Marek Kobiela),, um ótimo copiloto. Em uma corrida, os irmãos sofrem
um grave acidente com sérios ferimentos e são levados para a clínica dirigida por um médico
genial (Jerzy Zelnik,, especializado em transplantes de órgãos humanos. As vítimas da terrível
catástrofe são submetidas aos complexos procedimentos cirúrgicos. Infelizmente, apenas um
sobrevive ao tratamento...
Esta comédia negra, realizada para a Televisão Polonesa, mostra as consequências do
transplante da identidade sexual e jurídica do ser humano. O piloto "mesclado" com os órgãos
das vítimas do acidente tem cada vez menos partes de seu próprio corpo. Por isso a ação do
filme gira em torno da pergunta: quanto do antigo Richard Fox sobra no novo Richard Fox? E
qual, emfim, é a sua identidade jurídica?
OS INOCENTES CHARMOSOS / NIEWINNI CZARODZIEJE
Polônia, 1960, 83 min, preto e branco,
legendas em português
Direção: Andrzej Wajda
Roteiro: Jerzy Andrzejewski, Jerzy
Skolimowski
Fotografia: Krzysztof Winiewicz
Elenco: Tadeusz Łomnicki,
Krystyna Stypułkowska, Wanda
Koczeska, Kalina Jędrusik, Zbigniew
Cybulski, Roman Polański, Krzysztof
Komeda, Jerzy Skolimowski e outros.
Gênero: Filme psicológico
CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 anos
"Os Inocentes Charmosos" é um estudo psicológico de um casal jovem. Ele, um jovem médico
de atletas, que em "seu tempo livre" toca jazz no porão. Não tem grandes ambições, sonha
com uma casa e um carro, e não liga muito para as emoções. Tem um jeito próprio de construir
sua autoconfiança, pinta o cabelo de loiro, tem comportamento natural, anda de moto, sua
quitinete é um buraco vazio em função de um quarto com vários troféus e uma foto de Einstein.
Ela, uma moça que o encontrou por acaso em um clube de música. Não se sabe muito mais
sobre ela. O casal passa a noite juntos, flertando, num jogo de aparências e poses, mas ficam
cada vez mais fascinados um pelo outro. Com o passar do tempo, um sutil jogo erótico se
transforma em um streap poker. No jogo a aposta é alta e se a moça perder deverá se
entregar... Cinismo, indiferença e a atitude libertina dos personagens são apenas uma máscara,
atrás da qual se escondem emoções humanas normais ou pelo menos da nostalgia por estas. O
filme causou um amplo debate social. As críticas depois de sua estreia foram extremamente
diferentes: desde as agressivas até as positivas. Isso não fez com que "Os Inocentes
Charmosos" deixassem de conquistar o diploma no Festival Internacional de Filmes em
Edimburgo em 1961.
Andrzej Wajda disse sobre a sua obra: "... provavelmente um dos filmes mais politicamente
neutros que realizei, porém foi avaliado de outra maneira pelo poder comunista da época. Um
tema inocente – sobre um jovem médico, que gosta de meias elásticas e de bons cigarros, que
tem um gravador e fica gravando as suas conversas com as mulheres, e o seu único
passatempo é tocar bateria na banda de jazz de Krzysztof Komeda – verificou-se ser um tema
mais delicado para os educadores da ideologia comunista de que o próprio Exército Nacional ou
o Levante de Varsóvia".
SERVIÇO
Local: Museu Nacional do Conjunto Cultural da República, Auditório I
Data: de 6 a 16 de dezembro de 2011
ENTRADA FRANCA
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FESTIVAL DO CINEMA POLONÊS 2011
WAJDA NO BRASIL
CONVITE PARA O CINEMA
Texto por Andrzej Bukowiecki
Varsóvia, junho de 2011
Em 1978, Andrzej Wajda realizou o documentário "O convite para o interior". Com esse filme ele
despertou o interesse para uma das maiores coleções polonesas da arte naïf. Fazendo uma paráfrase ao
título desse filme, convidamos o público brasileiro ao cinema com o intuito de estimular a todos para que
conheçam uma parte da enorme coleção das obras do próprio Wajda, que há 50 anos goza do título de
mestre da cinematografia polonesa.
No dia 06 de março deste ano, Andrzej Wajda completou 85 anos. Por essa ocasião, o Presidente da Polônia,
Bronislaw Komorowski, condecorou o diretor de cinema com a maior distinção estadual da República da
Polônia – Medalha da Águia Branca – em reconhecimento aos "grandes méritos para a cultura nacional,
êxitos na atividade artística e promoção da arte cinematográfica polonesa no mundo". Assim, essa
condecoração aumentou ainda mais a coleção dos mais de 90 troféus que recebeu o autor do mais famoso
filme polonês, "Cinzas e diamante" (1958). Nessa coleção não faltam, também, o Oscar pelo conjunto da
criação artística (2000), Palma de Ouro em Cannes pelo filme "O homem de ferro" (1981), bem como o
prêmio Águia, conhecido como o "Oscar polonês" pelo conjunto da obra durante a sua vida (2000).
Mesmo com quatro de seus filmes indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro, "A terra prometida"
(1974), "As senhoritas de Wilko" (1979), o mencionado "O homem de ferro" e recentemente o filme "Katyn"
(2007), o autor não pensa em descansar. Em Varsóvia, conduz a Escola de Maestria de Direção
Cinematográfica de Wajda, que acaba de fazer seu décimo aniversário. Como sempre, toma a palavra nos
assuntos de ambiente cinematográfico, nas questões de mais amplo alcance público e política.
Sintomaticamente, Andrzej Wajda está começando a produção de um filme biográfico sobre outro grande
polonês, o arquiteto da restituição da independência após cinquenta anos de comunismo – Lech Walesa.
Esperamos que esse não seja o último filme do autor de "Canal" (1956). Pressupõe-se, porém, que esse filme
irá se tornar uma soma do mais importante fluxo de sua criação, onde Wajda- artista encontra-se com
Wajda-consciente cidadão do próprio país, comentando com a sua lente problemas de grande significado
para os compatriotas.
Assim foi em "Canal", onde o protagonista da nossa mostra reabilitou os participantes do Levante de
Varsóvia: uma batalha antinazista, antes desprezada pela propaganda de Stalin; em "O homem de mármore"
(1976), onde numa época de relativa prosperidade, a sociedade acordou da letargia, lembrando que o
stalinismo existia de verdade e, mesmo vinte anos após a morte de Stalin, não parou de influenciar a vida
pública; e no recente filme "Katyn", que foi transmitido também pela televisão brasileira, que aponta a
Rússia não contemporânea – mas a soviética, totalitária, da época do stalinismo – como a responsável pelo
assassinato bestial dos oficiais do exército polonês em 1940.
O CINEMA PARA TODOS
Nos filmes que serão assistidos pelo público brasileiro, Andrzej Wajda não fugirá dos assuntos poloneses,
mas em uma visão mais ampla, igualmente assuntos europeus, o que cria uma chance maravilhosa de
aprofundar o conhecimento sobre tudo o que a Polônia e os países da mesma região viveram durante anos.
"Chance maravilhosa", por ser o conhecimento vindo não de um manual tedioso, mas de obras de arte, que
irão nos proporcionar impressões estéticas e emocionais. Queremos tirar todas as dúvidas: uma forte ligação
da criação de Wajda (também no teatro, mas esse não é o assunto da presente mostra) com a história, a
tradição, a cultura e a vida contemporânea da Polônia, não significa que será incompreendida no
estrangeiro.
Primeiro, porque a luta contra o totalitarismo foi uma experiência de vários países em diversos cantos da
Terra. Segundo, pelo fato do autor destinar as camadas políticas do filme principalmente ao espectador
polonês, essas sempre estão envolvidas em uma história comovente sobre as pessoas e valores universais
como o amor, a liberdade ou simplesmente a vida. Não é preciso ser perito na área do stalinismo para se
emocionar com os destinos dos jovens protagonistas de "O homem de mármore": um operário e uma
diretora de filmes, os quais, respectivamente à sua época, lutam com determinação pelo respeito à
dignidade humana e à contestação da história.
Terceiro é que Wajda frequentemente apela aos códigos culturais das conhecidas pessoas cultas,
independente do lugar onde vivem. Os espectadores de ambos os hemisférios poderão ter uma leve ideia
sobre o conflito político no qual ficou envolvido o protagonista de "Cinzas e diamante", Maciek Chelmicki,
numa interpretação inesquecível de Zbigniew Cybulski. Mas, se ouvirem falar de filosofia existencial,
entenderão o drama de Maciek – um rapaz em uma situação sem saída, sem boas escolhas pela frente. Da
mesma maneira, dessa vez, graças ao paralelo com "Antígona" de Sófocles, identificaram-se com uma
heroína de "Katyn". Na comédia de época "A vingança" (2002), apesar de referências ao caráter nacional dos
poloneses, descobrirão uma versão mais feliz do padrão conhecido de "Romeo e Julieta" de Shakespeare.
A quarta razão de uma grande facilidade de entender os filmes de Wajda é o universalismo das imagens,
através das quais os filmes dele chamam a atenção de todos com grande impacto. Mesmo com a sorte de
viver em um país feliz, onde não houve o Holocausto, será difícil conter as lágrimas ao ver a marcha final de
"Korczak" (1990). No meio da segunda guerra mundial o herói principal, famoso pedagogo polonês de
origem judaica, está caminhando num silêncio inigualável à frente dos seus tutelados – crianças do orfanato
do Gueto de Varsóvia – no sentido da praça, da qual vai partir com eles para sua última viagem: rumo às
câmaras de gás do campo de concentração nazista em Treblinka.
Além de Wajda "envolvido" existe também o Wajda "diferente", que faz filmes livres de política e do
martírio, que falam "somente" sobre a vida, a morte, o amor, a passagem do tempo, muitas vezes sobre a
paixão e a inquietude da criação, porém não livres de um fundo histórico.
Esse fluxo psicológico-moral da criação do mestre da cinematografia polonesa estará presente na
retrospectiva brasileira, em exemplos como "Os inocentes charmosos" (1960), "Tudo à venda" (1968) e "As
senhoritas de Wilko". Ambos os fluxos – tanto "político" como "apolítico" – estão presentes juntos aos
filmes: "O maestro" (1979), "Crônica dos acidentes amorosos" (1985), cuja ação se passa na véspera do
estouro da segunda guerra mundial e no último filme de Wajda feito até a data de hoje: "Cálamo" (2009),
onde o segundo fluxo é visivelmente predominante.
Além disso, o público da retrospectiva irá se convencer que Wajda, um homem muito realista, fez até um
filme de ficção científica. E mais: nos últimos anos olhou para a história polonesa com uma distância maior,
com um sorriso, não abrindo mão de sua minuciosa análise, certamente em razão de sua idade avançada.
Assim como fizeram nos seus últimos filmes Bunuel e Fellini, começou a divertir o público. Se a versão
brasileira dos diálogos em forma de poema em "Senhor Tadeu" (1999) e em "A vingança" refletirem bem o
humor, estes filmes serão capazes de proporcionar bastante alegria também aos brasileiros, mostrando ao
mesmo tempo mais uma, das inesperadas faces da contínua atividade cinematográfica de Andrzej Wajda.
AULA DE HISTÓRIA DO CINEMA CONTEMPORÂNEO
A primeira apreciação do programa da retrospectiva causa uma suspeita: os filmes foram escolhidos um
pouco ao acaso. Mas não foi assim. Quem assistir a todos os filmes passará pela história da Polônia. Iniciará
pela "república nobre" do século XVIII ("Senhor Tadeu", "A vingança"); depois pela II República Polonesa do
tempo entre as guerras ("As senhoritas de Wilko", "Crônica dos acidentes amorosos"); pela ocupação
nazista ("Korczak"); pelas etapas de pior ou menor vigilância do comunismo ("Os inocentes charmosos",
"Tudo à venda", "O homem de mármore", "O maestro" e parcialmente em o "Cálamo") até os tempos
modernos (de novo "Cálamo"). O espectador vai repetir igualmente uma aula da história do cinema
contemporâneo, não apenas cinema polonês – pois os filmes de Wajda fazem parte das tendências da
cinematografia mundial (e graças a isso se tornam mais compreensíveis fora da Polônia), ou no mínimo dos
cursos importantes da cinematografia nacional.
Vale a pena lembrar que no início da carreira, Andrzej Wajda, através do seu primeiro filme "A geração"
(1954), e em particular através de "Canal" e "Cinzas e diamante", e depois pelo seu primeiro filme colorido "Lotna" (1959), cocriou e propagou esse curso mundialmente: Escola Polonesa de Cinema. Os filmes de
Wajda, Andrzej Munk, Jerzy Kawalerowicz, Kazimierz Kutz e de outros diretores que fizeram parte desse
curso, ajustavam as contas com a época da segunda guerra mundial e a ocupação nazista de uma maneira
histórica, filosófica e artística.
Se considerarmos a ordem cronológica das realizações dos filmes apresentados, a nossa mostra começa
depois da extinção da Escola Polonesa de Cinema. O filme mais antigo "Os inocentes charmosos", junto com
alguns outros filmes da passagem dos anos 50/60 do século XX, tais como "O último dia do verão" de
Tadeusz Konwicki, "O trem" de Jerzy Kawalerowicz, "Tchau, até amanhã" de Janusz Morgenstern e "Faca na
água" de Roman Polanski, criaram outro fenômeno, chamado pela crítica de "Nova Onda Polonesa". Esse
fenômeno floresceu ao mesmo tempo em que o novo cinema europeu, com a francesa Nouvelle Vague à
frente, se aproximou a este tanto do ponto de vista ideológico, como do estético.
A guerra e a ocupação nazista deram lugar aos assuntos contemporâneos. Os jovens, um pouco cínicos e
protagonistas de "Os inocentes charmosos", trocaram fuzis e granadas, os quais levaram os seus
antecedentes heróicos de o "Canal", pelos instrumentos da música de jazz, composta pelo genial Krzysztof
Komeda – o futuro compositor da "Canção de ninar" em "O Bebê de Rosemary" de Polanski. "Os inocentes
charmosos" é um belo e íntimo conto sobre uma longa conversa noturna, ocorrida no apartamento entre
Bazyli – um médico de profissão e percussionista amador (papel desempenhado pelo genial ator Tadeusz
Lomnicki) e a jovem Pelagia (Krystyna Stypulkowska). Será que o jovem concentrado em si mesmo e em
"dolce vita" irá notar uma relação de amor que irá nascer entre eles?
Nesse primeiro filme de Wajda que não fala sobre a guerra, a câmera sai mais do estúdio para mostrar nas
longas filmagens, uma língua da Nova Onda, a vida da boêmia varsoviana no início dos anos 60. Pela tela
passam entre outros: Komeda, Polanski e Jerzy Skolimowski, vagueando sem sentido pelas ruas e praças,
como Jean Seberg e Jean Paul-Belmondo em "Acossado" de Godard, Jean-Pierre Leaud em "Os
incompreendidos" de Truffaut ou os protagonistas em "Os Boas-vidas" de Fellini.
Na última fase da Nova Onda, Wajda fez uma referência à vida boêmia com os filmes: "O mesclado" (1968) e
"Tudo à venda".
"O mesclado" foi uma única viagem na carreira de Wajda na direção da ficção científica. O roteiro foi escrito
pelo mundialmente conhecido autor polonês desse genro de literatura, Stanislaw Lem, baseado em sua
própria novela. Uma comédia negra, realizada para a Televisão Polonesa, que mostra as consequências do
transplante na identidade sexual e jurídica do ser humano. Uma visão sugestiva de um mundo estéril do
futuro foi criada com meios modestos, porém utilizados com criatividade, com a ajuda da cenografia e do
figurino. O papel principal foi desempenhado pelo excelente ator cômico, Bogumil Kobiela – genial
intérprete no papel de Jan Piszczyk em "Sorte vesga" de Munk, uma das últimas obras da Escola Polonesa de
Cinema. "O mesclado" foi ligado com a Nova Onda, entre outros, pela introdução dos gibis no toque da
narração. Toda parte visual do filme também foi da Nova Onda e referia-se à pop-arte, muito na moda nos
anos 60.
Um dos mais belos filmes daquela década é "Tudo à venda". A imagem foi criada sob influência da morte
trágica do famoso ator polonês da época, Zbigniew Cybulski, que se atirou do trem. Em 08 de janeiro de
1967, Andrzej Wajda colaborou pela última vez com o seu ator preferido que interpretou Maciek, em
"Cinzas e diamante", Edmund, em "Os inocentes charmosos" e Zbyszek, na famosa co-produção
internacional "O Amor aos vinte anos". Cybulski, na falta de mais propostas de Wajda, disse a alguém: "Ele
ainda vai sentir saudades de mim...". Não errou. Quando veio a notícia sobre a sua morte, Wajda estava
elaborando um roteiro de um filme não somente com Cybulski no papel principal, mas também sobre
Cybulski – uma lenda viva do cinema polonês. Entendeu que nunca iria realizar esse filme. Portanto fez
outro: "Tudo à venda", um conto sobre um diretor de filme (ele mesmo não atuou no filme, entregou esse
papel a Andrzej Lapicki), que tentava fazer um filme sobre a vida de um ator (na tela o nome dele não é
mencionado), mas sem ele. Será que isso seria possível?
Criado em circunstâncias excepcionais, o filme "Tudo à venda" foi feito com métodos realmente da Nova
Onda. O roteiro foi apenas esboçado. Os intérpretes dos papeis principais improvisavam os diálogos. E mais:
atuaram sob os próprios nomes, inclusive Daniel Olbrychski, que desempenhou um jovem ator, que ele
realmente era naquela época, apontado como um substituto do ator ausente. Na verdade Olbrychski foi
promovido a um "novo Zbigniew Cybulski". E foi com dignidade que substituiu o seu grande antecessor à
frente da câmera de Wajda. Cinemaníacos brasileiros se convenceram disso há dois anos, assistindo "A terra
prometida", e agora iriam confirmar a sua convicção durante as projeções não só de "Tudo à venda", mas
também de "As senhoritas de Wilko", "Senhor Tadeu" e "A vingança".
"Tudo à venda" aproximou-se da Nova Onda com a livre construção dramatúrgica, com o final aberto e o
estilo impressionista das sensacionais fotos coloridas de Witold Sobocinski, inspiradas na igualmente
brilhante fotografia de Claude Lelouche em "Um Homem, Uma Mulher". Essa obra-prima poética de Wajda é
com razão comparada ao filme "Oito e meio" de Fellini, se situado entre os melhores filmes sobre filmes.
NO CÍRCULO DO CINEMA DA INQUIETAÇÃO MORAL
O Cinema da Inquietação Moral, além da Escola Polonesa de Cinema, é o fluxo mais importante da história
da cinematografia polonesa. Iniciado por "O Pessoal" de Krzysztof Kieslowski (1975), e bem introduzido no
ano seguinte com "O homem de mármore" de Wajda e "Mimetismo" de Krzysztof Zanussi, virou um domínio
dos diretores tão famosos como justamente Kieslowski, Agnieszka Holland e Feliks Falk.
Naquela época eles apenas iniciavam suas carreiras. Com os olhos atentos dos jovens inteligentes na fase
dos trinta anos, eles notavam a discrepância entre a ficção de democracia, desenhada nas bandeiras do
partido comunista que estava no poder (Partido Unido Trabalhista Polonês), e a falta da real liberdade de
cidadania. Ao mesmo tempo repararam outros fenômenos negativos: a disputa pela carreira, o oportunismo,
as tentativas de controlar totalmente os cidadãos, a falsidade da propaganda oficial, etc.. Assim era, de
modo geral, a mensagem dos filmes mencionados, bem como de "Atores de província" (roteiro elaborado
por Holland), com base no tocante drama de Wajda "Sem anestesia" (1978), "Amador" de Kieslowski, "O
animador do baile" e "A Chance" de Falk, ou "Kung-fu" de Janusz Kijowski, autor da expressão "Cinema da
Inquietação Moral". Essa expressão foi um eufemismo, porque na verdade ocultava uma inquietação política
dos seus criadores pelo destino do país.
A maior parte desses diretores, Wajda conseguiu reunir no Zespol Filmowy "X" (Grupo de Cinema X), sob sua
liderança e a do famoso crítico de filmes Boleslaw Michalek, lembrando quanto ele mesmo devia na sua
juventude aos protetores da Escola Polonesa de Cinema, ao diretor de filmes Jerzy Kawalerowicz, ao escritor
e diretor de filmes Tadeusz Konwicki e ao seu Grupo de Cinema "Kadr".
Como a ação de todos os filmes do Cinema da Inquietação Moral ocorria na vida contemporânea, ou melhor,
no fim dos anos 70, "O homem de mármore" inscrevia-se nessa tendência. No filme, uma iniciante diretora
de filme, Agnieszka (com uma excelente estreia de Krystyna Janda, hoje uma atriz de fama europeia) tenta
realizar um filme para o seu diploma de graduação através da televisão estatal (pois até então não existia
outra na Polônia!). O filme toca no tema tabu daquela época: o stalinismo. A equipe e a diretora de
montagem tentam ajudar "a jovem revoltada" da melhor maneira possível, mas o diretor da edição, fiel ao
poder comunista, quer que ela faça outro filme: uma boa propaganda do sistema. Agnieszka não se rende...
A ligação desse enredo com outro, retrospectivo, que nos leva ao início dos anos 50, aos tempos de Stalin,
fez com que "O homem de mármore" tenha se tornado uma obra não somente artística, mas também
sócio-política. As retrospectivas mostram o conteúdo do filme de Agnieszka: o destino de um simples
pedreiro, Mateusz Birkut (comovente papel de Jerzy Radziwilowicz), um dos tantos assim chamados
"trabalhadores superprodutivos". Na época do stalinismo essas pessoas bateram recordes quanto ao
desempenho no trabalho. Por exemplo, na colocação de milhares de tijolos durante a construção de prédios
ou extração de muitas toneladas de carvão das minas em curto prazo. Dessa maneira resgataram os planos
impossíveis do governo a custo de sua própria saúde. Faziam isso geralmente pela convicção ideológica,
como Birkut, porque o país emergente das ruínas de guerra exigia esses sacrifícios. Só que quando quiseram
protestar contra uma exploração demasiada ou qualquer outra irregularidade, o poder virava-se contra eles.
No início do ano 1977, depois de uma longa luta contra a censura, "O homem de mármore" começou a ter a
sua distribuição limitada (o roteiro deste filme, por Aleksander Scibor-Rylski, tinha sido publicado 14 anos
antes), as bilheterias estavam hiperlotadas.
A sociedade, cuja memória coletiva da época de stalinismo fora literalmente "deletada", estava ansiosa para
ver nas telas as manipulações mentirosas da propaganda governamental, as práticas cruéis da polícia, da
política, etc. Ao mesmo tempo conseguiu-se notar no enredo contemporâneo do filme que, apesar do terror
já ser coisa do passado, ainda era difícil falar a verdade sobre ele. Uma prova disso foram os problemas que
Agnieszka enfrentou na realização do filme sobre o operário Birkut, bem como os que Wajda enfrentava em
"O homem de mármore".
Usando a construção do "Cidadão Kane" de Orson Welles, Wajda juntou os dois planos de tempo da ação do
filme em um só: Agnieszka consegue chegar às pessoas que conheciam Birkut e os contos dessas pessoas
sobre ele recebem na tela uma forma de retrospectiva. Dessa maneira, "O homem de mármore", abrindo
um capítulo importante na arte cinematográfica da Polônia – o Cinema da Inquietação Moral – referiu-se,
também, a um dos melhores exemplos estrangeiros.
Além da dimensão artística, o mais importante em "O homem de mármore" foi a enorme repercussão social
do filme. Esta obra, juntamente com todo o Cinema da Inquietação Moral, conseguiu trazer transformações
na consciência política dos poloneses, as quais em 1980 contribuíram para a criação do "Solidariedade": o
primeiro sindicato independente no bloco dos países comunistas. Provavelmente é por isso que Wajda
considera – e com razão! – "O homem de mármore" o filme da sua vida.
Alguns meses antes do início das greves na região litoral da Polônia, onde estava nascendo o
"Solidariedade", entrou em cartaz "O maestro", um dos últimos filmes do Cinema da Inquietação Moral, o
qual ao cumprir a sua missão, foi descontinuado.
Apresentado em "O maestro" o conflito entre um jovem e despótico chefe de uma orquestra sinfônica
provincial, Adam Pietrzyk (Andrzej Seweryn) – contra o qual se revoltam finalmente todos os músicos – e o
por eles adorado, o antigo maestro, John Lasocki – pessoa de grande e verdadeiro carisma (esse papel foi
desempenhado pelo grande ator britânico John Gielgud), foi uma metáfora legível de dois estilos de poder
executado sobre a sociedade.
Menos óbvia para os espectadores poloneses de "O maestro" foi a intenção de Andrzej Wajda de que na
pessoa de Lasocki – um emigrante polonês que depois de anos de ausência voltou para uma apresentação
na sua pátria – o público visse... Karol Wojtyla, o então recentemente escolhido Papa João Paulo II (durante a
realização do filme, Wojtyla visitou a Polônia pela primeira vez como Papa e ganhou a simpatia de milhões
de poloneses, o que não agradou o autoritário poder comunista).
Em cenas, onde os espiões locais depreciavam o esforço da orquestra e dos dois maestros na preparação da
"Sinfonia n.º 5" de Beethoven, foi notada, sem problemas, a alusão à situação dos artistas na Polônia de
então, muitas vezes desamparados frente às ordens oficiais (assim como no país capitalista eles ficam
limitados por produtores e patrocinadores).
Em todas essas camadas, "O maestro" ainda pertencia ao Cinema da Inquietação Moral. Ao mesmo tempo
apresentavam-se nele características de um cinema diferente, apolítico. O enredo da fascinação de Lasocki
por uma jovem violinista Marta (desempenhado por Krystyna Janda), esposa do regente tirano, concedeu ao
filme de Wajda um tom de drama psicológico. Porém, acima de tudo, "O maestro" – inspirado pela conversa
de Wajda com o grande compositor e regente Andrzej Markowski – foi um dos primeiros, e com o tempo
cada vez mais frequentes filmes, onde a música parou de ter papel somente ilustrativo, adquirindo
qualidade de heroína da história contada na tela, assim como em "Ensaio de orquestra" de Fellini, "Todas as
manhãs do mundo" de Alain Corneau e claro, em "Amadeus" de Milos Forman. Será que o enredo de ciúme
do frustrado Pietrzyk pela leveza de condução da orquestra por Lasocki não nos lembra o conflito do frouxo
Salieri com o genial Mozart?
WAJDA NOSTÁLGICO
"Por sorte nunca fui um maníaco da política no cinema", confessa o diretor de "O homem de mármore" no
livro "Wajda. Os filmes" (Varsóvia, 1996). "Amei o cinema e o seu ambiente sempre foi o conteúdo da minha
vida. Por isso, foi com prazer que toquei nos temas distantes de quaisquer alusões políticas
contemporâneas", diz no primeiro capítulo dedicado a "As senhoritas de Wilko".
Esse filme é uma obra-prima, mesmo tão diferente de "O homem de mármore": um filme calmo, com
reflexão, nostalgia e um tom de melancolia, que traz à tela o mundo da aristocracia agrária dos anos vinte
entre as duas guerras mundiais.
Em uma dessas mansões aristicráticas, surpreendentemente, reaparece um solteirão de quase 40 anos,
Wiktor Ruben (Olbrychski). Quando esteve lá pela última vez, há quinze anos, fugiu do amor oferecido pelas
jovens irmãs – intituladas "senhoritas de Wilko". Porém, agora já é tarde demais para isso. Essa história
sobre a vida vazia e carente foi baseada em um conto do excelente escritor polonês, Jaroslaw Iwaszkiewicz.
Na literatura polonesa, poucos autores sabiam escrever sobre o amor, a inevitável passagem do tempo e
sobre a morte de maneira tão bonita como Iwaszkiewicz. Wajda teve uma sorte excepcional com a prosa
desse autor. Com sucesso mergulhou nela não só em "As senhoritas de Wilko", mas também no maravilhoso
"O bosque de bétulas" (1970), no espetáculo de televisão "Uma noite de junho" (2001) e em "Cálamo",
sobre o qual ainda falaremos.
Apesar do herói principal de "As senhoritas de Wilko" ser um homem, foram as mulheres que deram o
nome ao filme. Wajda rodeou Olbrychski de excepcionais atrizes: Maja Komorowska, Anna Seniuk,
Stanislawa Celinska e Krystyna Zachwatowicz (que na realidade é a esposa do próprio diretor). A mais nova
das irmãs foi interpretada por uma atriz francesa Christine Pascal, que morreu tragicamente em 1996.
Um homem idoso que aparece na tela em alguns momentos de "As senhoritas de Wilko" é o próprio
Jaroslaw Iwaszkiewicz. Ele passeia – sempre sozinho! – pelos arredores da mansão. Ele vive por si mesmo
personagens criados do conto e do filme. O escritor transfere-se então para os tempos antigos – será que
para os próprios sentimentos e recordações? No final troca olhares significantes com Wiktor – como se fosse
com ele mesmo em anos passados?
As mesmas perguntas são provocadas pela presença de outro grande autor (e diretor de cinema), Tadeusz
Konwicki, num segundo filme nostálgico de Wajda, realizado com base no romance dele seis anos depois de
"As senhoritas de Wilko" - "Crônica dos acidentes amorosos". Konwicki interpreta o Desconhecido, uma
personagem do seu livro - uma encarnação adulta de Wicio (Piotr Wawrzynczak), um aluno de ginásio, que
um pouco antes da II Guerra Mundial apaixona-se por uma jovem da mesma idade, uma senhorita de boa
família, Alina (Paulina Mlynarska). Para esse rapaz a vida só está começando, mas o mundo pretende chegar
ao fim, o que no filme é anunciado pela galopante cavalaria e os ainda vivos judeus, que logo serão vítimas
do Extermínio. O Desconhecido já sabe de tudo isso, mas Wicio ainda ficará sabendo. Daí os encontros deles
na filmagem de "Crônica dos acidentes amorosos" que refletem muito bem o clima de quase toda a criação
literária e cinematográfica de Konwicki, cheia de junções excepcionais entre o presente, o passado e o
futuro.
A epopeia "Senhor Tadeu", que serviu de inspiração para a versão filmada de Wajda, será outra
oportunidade para os espectadores conhecerem na nossa mostra, um dos mais importantes poetas
poloneses do romantismo, Adam Mickiewicz, que usou a expressão "o país dos anos de infância". Konwicki
utilizou-se dessa expressão como referência de "Crônica dos acidentes amorosos". A ação do livro se passa
no seu "país dos anos de infância" – em Vilnius, que até a guerra situava-se na fronteira do leste da Polônia
de então, mas logo depois do estouro da guerra foi anexada à União Soviética e hoje é a capital da Lituânia
independente.
Para Konwicki, o maduro autor de "Crônica dos acidentes amorosos", Vilnius foi então apenas uma
recordação distante no tempo, porém, próxima ao coração. E de igual modo, Wajda também mostra essa
cidade: na tela, embrulhada por uma leve neblina, aparece como se fosse um lindo sonho. Na verdade, não
era a verdadeira Vilnius. Quando em 1985 nascia o filme, as autoridades cinematográficas do nosso país,
ainda socialista, não deixaram Wajda realizar o filme no cenário real. Vilnius foi criada na frente das câmeras
por várias cidades da Polônia.
DÚVIDAS E ESPERANÇAS
Nos falta ainda descrever mais quatro filmes de Andrzej Wajda dos anos 1989-2009 ("Korczak", "Senhor
Tadeu", "A Vingança", "Cálamo"), filmes realizados já na Polônia independente, democrática e não
comunista.
O início da transformação do sistema foi para os nossos cineastas um momento difícil. É óbvio que em
debates no ambiente prevalecia a alegria das transformações acontecidas no país, mas ao mesmo tampo
aparecia uma insegurança quanto à direção para qual iria o cinema polonês. Antes o cinema tinha um
objetivo claro a seguir: uma possível crítica ao inimigo, ou seja, ao sistema, este, apesar de mais ameno que
em outros países do bloco comunista, não era aceito pela maioria da sociedade. Daí surgiu o sucesso de "O
Homem de mármore", bem como de todo o Cinema da Inquietação Moral. Agora esse inimigo havia deixado
de existir, por isso a realização dos filmes políticos parecia não ter mais razão de ser, pelo menos
temporariamente. Isso foi entendido pelo famoso diretor de filme Krzysztof Kieslowski, falecido em 1996. O
cineasta, que anunciou o Cinema da Inquietação Moral com "O Pessoal", subiu para o alto com "Amador", e
nos anos 80 continuou perto da política em "Acaso" e "Sem fim", feito já na nova realidade, em "A dupla
vida de Verônica", dirigiu-se às regiões da psicologia e metafísica, para se estabilizar nestas em filmes
posteriores.
Os jovens cineastas, não encarregados pela missão de luta contra o sistema, apostaram no cinema de
entretenimento, situado na realidade polonesa, porém, em seu estilo tinham como referência os exemplos
do cinema de Hollywood. Encontraram uma linguagem comum com o novo público de cinema entre os 1525 anos de idade, que especialmente venerou os filmes de Wladyslaw Pasikowski: "Kroll", "Cachorros" e
"Cachorros 2: O último sangue".
No início parecia que Andrzej Wajda encontrava-se em uma nova época, apesar de não lisonjear o público
jovem, nem declarar, que a partir de então iria realizar somente dramas psicológicos como "As senhoritas de
Wilko". Muito pelo contrário, com o filme "Korczak", feito de acordo com o roteiro de Agnieszka Holland em
coprodução polono-alemã, Wajda voltou para um dos seus temas preferidos – a ocupação nazista na Polônia
durante a segunda guerra mundial. Wajda utilizou a liberdade de criação que antes não possuía, para filmar
esse tema de maneira que antigamente não era bem visto pelo governo. Em "Korczak" Wajda mostrou a
complexa realidade do Gueto de Varsóvia e além das atitudes heróicas dos poloneses – como, por exemplo,
do motorista do bonde que clandestinamente jogava pães para os famintos e por causa disso foi assassinado
por um nazista alemão – Wajda mostrou, também, aquelas atitudes, que não podem ser o objeto de nosso
orgulho.
Porém, o que mais importa no filme de Wajda é a atitude do herói principal, um pedagogo, médico e escritor
Janusz Korczak (pseudônimo de Henryk Goldszmit), conhecido também como "o Velho Doutor". A sua
atitude na hora da maior prova assegurou-lhe um lugar imortal. "Korczak" é uma imagem modesta, em
preto e branco, com a comovente interpretação de Wojciech Pszoniak no papel principal e excelente
fotografia do internacionalmente conhecido operador holandês Robby Muller, que colaborou com Wim
Wenders em "Paris, Texas", fez a fotografia de "Daunbailó" e "Dead Man" de Jim Jarmusch, bem como
"Ondas do Destino" de Lars von Trier.
Com "Korczak" Wajda começou uma série de corajosos filmes sobre o Holocausto, excedendo Steven
Spielberg em "A Lista de Schindler" e Roman Polanski como diretor de "O Pianista", mas depois ele se
perdeu. Os próximos dramas de guerra e ocupação, realizados com base na prosa de Aleksander ŚciborRylski e Jerzy Andrzejewski, que na época do comunismo não foram possíveis de realizar por causa de
censura, como: "Um anel com uma águia de coroa" (1992), "Semana Santa" (1995), "A senhorita Ninguém"
(1996) – filme baseado em um romance do best-seller de Tomasz Tryzna direcionado aos os jovens – não
trouxeram ao diretor, o qual admitiu pessoalmente várias vezes, um reconhecimento especial da crítica e
dos espectadores.
Houve pessoas que anunciavam o fim da carreira do criador do filme "Cinzas e diamante".
O que se revelou a salvação de Wajda foi a volta à fonte de grandes sucessos do passado: a tradição familiar
do romantismo polonês e a literatura clássica da Polônia, já filmada com êxito em "Cinzas" (1965), baseada
na epopeia de Stefan Zeromski, "A festa de casamento" (1972), baseada no drama de Stanislaw Wyspianski e
"A Terra Prometida", uma adaptação do romance de Wladyslaw Reymont. Foram os filmes históricos que
levaram o espectador para um passado mais ou menos distante da Polônia.
Em uma das entrevistas Wajda revelou um oculto objetivo político de ressuscitar épocas passadas. Tratavase de relembrar à sociedade polonesa que a história do país onde moravam não começou pela República
Popular da Polônia (comunista) e que antigamente existiram, também, outras Repúblicas.
Porém, após 1989, quando a Polônia comunista também passou para a história, perdeu-se o sentido de fazer
referências às obras da literatura clássica para ofuscar a realidade. Então, Wajda empenhou-se na adaptação
de duas obras da época do romantismo que mostram a vida da aristocracia polonesa do início do séc. XVIII –
do poema de Adam Mickiewicz "Senhor Tadeu" e da comédia de Aleksander Fredro "A Vingança". Com esta
escolha, Wajda colocou como objetivo outra tarefa: revelar o caráter nacional dos poloneses que, em traços
gerais, em cada época da história continua sendo igual.
Os poloneses têm várias virtudes, como o grande patriotismo e a hospitalidade, mas como todas as nações,
não estão livres de defeitos. Se alguém tentasse fazer uma lista deles, o gosto de guerrear e a persistência
em conflitos não ficariam em últimos lugares. Um exemplo disso está ilustrado em "Senhor Tadeu".
Enquanto um dos protagonistas está organizando um levante nacional – pois está vendo uma chance dos
poloneses recuperarem o próprio país dividido entre os invasores, ao lado do César francês Napoleão
Bonaparte – outros estão muito ocupados com uma luta insaciável por um castelo. Em "A Vingança" ocorre
um conflito parecido, dessa vez pelo muro de divisão do castelo, porém sem o contexto patriótico e em um
tom mais satírico. Um dos diretores de arte do filme, Maciej Karpinski, esperava que aquele muro fosse
associado ao Muro de Berlim, cuja queda em 1990 tornou-se um dos símbolos do final do comunismo.
Quando Wajda levava à tela "Senhor Tadeu" e "A Vingança", na passagem dos anos 90 para 2000,
infelizmente, a jovem democracia polonesa também estava envolvida em vários conflitos por "castelos" e
"muros" e não se livrou deles até hoje. O diretor vestiu, então, esse figurino histórico como uma visão
crítica, mas também cheia de humor, sobre a realidade contemporânea do seu país.
É difícil constatar se essa mensagem chegou a todos os espectadores. Mas uma coisa é certa: o primeiro dos
dois filmes, feito em coprodução com a cinematografia francesa, "Senhor Tadeu" – cuja estreia teve lugar no
final de 1999, no Teatro Grande de Varsóvia – quebrou uma onda infeliz de Andrzej Wajda. Realizado com
uma ostentação épica, grande, o espetáculo colorido trouxe aos cinemas mais de seis milhões de
espectadores, enquanto a audiência nos filmes poloneses costuma atingir em média trezentas mil pessoas.
No plano de "Senhor Tadeu", Wajda conseguiu reunir um imponente elenco, composto por excelentes
atores, de grande popularidade. Eles se tornaram uma atração para o público. Entre eles, não faltou
Boguslaw Linda – adorado pelo público jovem por papéis onde interpretou um homem "durão" como nos
filmes de Pasikowski; também Daniel Olbrychski, Andrzej Seweryn e a linda e sensual Grazyna Szapolowska.
No papel da jovem Zosia, estreou Alicja Bachleda-Curus, que posteriormente virou parceira de Colin Farrell
em "Ondine" de Neil Jordan.
Houve certo receio sobre como iriam soar dos lábios desses conhecidos atores os diálogos deste poema de
Adam Mickiewicz. Esses receios foram parcialmente tirados pelo sucesso da anterior adaptação feita por
Wajda de uma obra em poema: "A Festa de casamento" de Stanisław Wyspianski. Certamente tais receios
verificaram-se inúteis, pois todos os monólogos e conversas no filme "Senhor Tadeu" eram tão fluentes e
naturais, como se os atores conversassem em versos todos os dias.
O mesmo pode ser dito sobre a adaptação cinematográfica de "A Vingança", uma obra-prima do maior
escritor de comédia na história de literatura polonesa – Aleksander Fredro. Wajda se esforçou para esconder
na tela a origem teatral do modelo literário, por exemplo, transferindo uma parte da ação para o cenário de
inverno, o que tinha vantagem de dar uma linda e tonalizada cor ao filme. "A Vingança" de Wajda ficou
afastada da versão teatral também pelo formato panorâmico da tela, o que tornou possível a encenação
baseada nos movimentos dinâmicos dos atores em espaço amplo.
"A Vingança" de Wajda não teve um sucesso tão espetacular como "Senhor Tadeu". Porém, nas memórias
dos espectadores ficou gravada a atuação comediante dos atores desse filme. Justamente por este motivo,
este filme deveria ser mostrado também ao público brasileiro, principalmente contendo uma surpresa de
elenco: um dos heróis principais é interpretado por nada mais nada menos que... Roman Polanski.
UM PORTO SEGURO
O ano de 2007 na cinematografia polonesa foi o ano de "Katyn" – segundo filme Andrzej Wajda, depois de
"Korczak", que fala sobre a guerra. Um filme realizado na Polônia independente, onde se poderia contar o
que precisava ser omitido na época do antigo sistema político. Wajda mostrou no filme o crime que foi
cometido na primavera de 1940 pelos funcionários da polícia política soviética (NKVD), matando em Katyń,
um lugarejo perto da cidade de Smolenski na ex-União Soviética, mais de vinte mil cidadãos poloneses, não
somente os altos oficiais do exército, mas também civis. Mostrou, também, a tão chamada mentira de
Katyn, imposta à sociedade polonesa: a ordem de manter silêncio sobre o assunto, com exceção de atribuir
o crime aos nazistas, conforme mostrava a propaganda oficial.
A realização de "Katyn" foi para Andrzej Wajda muito esgotante, não só em virtude do significado do tema e
do caráter épico do filme, mas também por razões pessoais: entre as vítimas da limpeza soviética da
sociedade polonesa estava o próprio pai do diretor, oficial do Exército Polonês de antes da guerra, o capitão
Jakub Wajda.
Talvez justamente esse grande esforço psicológico colocado na preparação e realização de "Katyn" fez o
artista, na passagem dos oitenta anos de idade, fazer outro filme, mais modesto, íntimo e calmo. Voltou
então às novelas de Jaroslaw Iwaszkiewicz, como se fosse um porto seguro, ao qual – lembremos – já antes
tenha explorado com sucesso em: "O bosque de bétulas", "As senhoritas de Wilko" e a apresentação de
televisão "Uma noite de junho".
Trata-se do filme "Cálamo". A heroína da novela que serviu para a base do filme, Marta, uma mulher
instruída de meia-idade, um pouco descuidada pelo marido, sofre de uma doença mortal. Os filhos dela
morreram na guerra e de repente ele descobre uma fascinação rejuvenescedora por um simples rapaz de
vinte anos, Boguslaw. Essa fascinação dá um sentido à sua vida, que sem misericórdia segue na direção do
seu fim.
O maior problema da transferência de "Cálamo" para a tela consistia no fato de que a novela de
Iwaszkiewicz é bastante curta e com a sua história não se podia encher um filme de longa-metragem. Vários
métodos de complementação do roteiro foram usados, mas finalmente a parte faltante foi escrita pela
própria vida. Ou melhor, pela morte.
No set de filmagem de "Cálamo" deveriam ter se reencontrado, depois de trinta anos, três amigos: a
interpretadora do papel de Marta - Krystyna Janda, Andrzej Wajda e o operador de câmera, na vida real
marido de Janda - Edward Klosinski. Anos antes eles fizeram juntos: "O homem de mármore", "Sem
anestesia" e "O homem de ferro". Infelizmente eles não conseguiram desfrutar a volta comum à tela:
Edward Klosinski morreu de câncer na realização do filme "Cálamo", onde foi substituído por Pawel
Edelman, com quem Wajda tinha colaborado também em "Senhor Tadeu", "A Vingança" e "Katyn". No filme
"Cálamo", Edelman registrou um tocante monólogo de Krystyna Janda sobre os últimos dias da vida e sobre
a morte do seu marido. Foi justamente esse depoimento íntimo da atriz que completou o conto sobre a
Marta (interpretada por ela) e a sua fascinação por um jovem tímido, cuja ação se passa no final dos anos
50.
Em seguida, Wajda mostra também Janda na vida real no plano do filme "Cálamo". Além disso, vemos
também a equipe de filmagem e o próprio diretor. Desse modo a ação do filme e a realidade são
entrelaçadas - como antes em "Tudo à venda", mesmo que de maneira diferente.
Janda, interpretando Marta, faz uma sensual criação, na qual um grande mérito atribui-se a uma nova e
surpreendente estilização do rosto da atriz. Boguslaw, um jovem cuja aparência lembra um pouco Mateusz
Birkut em "O homem de mármore" (quase a mesma época e moda!) foi interpretado por Pawel Szajda, ator
americano de origem polonesa. Um grande aplauso encontrou a modesta criação do notável ator e diretor
de teatro, Jan Englert, no papel do marido de Marta. Há cinquenta anos Englert fez sua estreia de cinema
também no filme de Wajda, em "Canal".
Pela quarta vez, Andrzej Wajda não se desiludiu com a prosa de Jaroslaw Iwaszkiewicz. Mesmo que a
filmagem de "Cálamo" ceda lugar às encenações anteriores, principalmente de "O bosque de bétulas" e "As
senhoritas de Wilko", continua sendo um filme de extremo valor cultural. A sutileza de “Cálamo” pode ser
ouvida na música composta por Pawel Mykietyn, tão diferente das potentes sonantes, porém, igualmente
excelentes partituras do clássico da música polonesa Wojciech Kilar, em "Crônica dos acidentes amorosos",
"Korczak", "Senhor Tadeu" e "A Vingança".
O valor pitoresco das imagens é mais uma virtude de "Cálamo", mas isso não faz distinguir muito esse filme
das outras obras de Wajda, já que a maioria delas tem a mesma virtude. Lembremos que o diretor de
"Katyn" é graduado não somente de legendária Escola Superior Estadual de Cinema de Lodz, mas também
na Academia de Belas Artes de Cracóvia.
No contexto do conjunto da criação do autor de "Cinzas e diamantes" registra-se o seu caráter reflexivo. O
próprio Wajda constatou, ao receber o Oscar pelo conjunto de sua obra e criação artística:
"A minha tarefa, como diretor, não é proporcionar às pessoas um divertimento prazeroso para a noite. A
minha tarefa consta em incentivá-las a pensar".
Varsóvia, junho de 2011
A.Wajda
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Andrzej Bukowiecki
Jornalista, crítico de cinema. Escreve resenhas de filmes para vários jornais poloneses.
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