eisFluências Junho 2012

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eisFluências Junho 2012
ISSN 2177-5761
ISSN 2177-5761
9 772177 576008
revista bimestral
junho/2012
ano II - núm XVII
NAÇÃO CRIOULA E A TEORIA DE BAKHTIN
RESENHA
por Isabel C.S. Vargas
Nação Crioula de autoria de José Eduardo Agualusa, autor nascido em Angola com
amplo conhecimento daquela realidade e profundo interesse pela realidade brasileira,
mostra o romance que ocorreu no século XIX entre Fradique Mendes, um aventureiro
português e Ana Olímpia Vaz de Caminha, uma figura capaz de enriquecer qualquer
narrativa pela vida cheia de situações diferentes e antagônicas, pois embora nascida
escrava foi uma das mulheres mais ricas e poderosas daquela região africana de cultura
portuguesa, ou seja, Angola.
É importante ressaltar que Fradique Mendes é um personagem de Eça de Queirós que
Agualuza tomou por empréstimo para personagem central de seu romance incluindo
na sua narrativa o próprio Eça de Queirós. Misturam-se personagens e pessoas reais.
A história se desenrola entre 1868 a 1900 e é contada através das cartas trocadas por
Fradique Mendes e sua madrinha, Madame Jouarre, entre ele e Ana Olímpia e com Eça
de Queirós.
Nas cartas relata seu trânsito entre personagens ricos, pobres, do clero, malfeitores,
passando por situações inusitadas desde sua chegada em Angola, sua, às vezes,
turbulenta permanência, o encontro casual com Ana Olímpia, por quem de imediato
nutre um sentimento especial e todo o suspense – poderia dizer drama – que envolve
sua amada até poder libertá-la para com ela viver.
Fradique não tem um trabalho, vive da mesada que sua madrinha lhe envia, mesmo
assim tem uma vida de regalias em Angola. As cartas narram os episódios ocorridos em
Angola de 1868 a 1876. Posteriormente, viaja para Pernambuco naquele que talvez
fosse o último navio negreiro da época, o NAÇÃO CRIOULA, para fugir de seus
perseguidores e de Ana Olímpia, pois suas vidas corriam perigo.
A partir daí suas missivas são de Olinda para onde se transferem, a princípio, para casa
de amigos e, mais tarde, para uma propriedade que adquire na Bahia onde passa a viver
de forma abastada reproduzindo a vida de muitos senhores com quem tivera contato em suas andanças, com escravos e bens. Lá tem uma
filha, mas não permanece no Brasil. Posteriormente, vai para a França, onde morre.
Ana Olímpia e a filha Sophia fazem o caminho de volta para África.
O romance termina com uma carta de Ana Olímpia a Eça de Queirós onde ela relata a sua história.
A DIALÓGICA DE BAKHTIN E O DISCURSO ROMANESCO
As imagens romanescas fundamentais são representações dialogizadas interiormente - das
linguagens de outros, dos estilos, das concepções de mundo. (BAKHTIN, 1988, p.367) “Todo
romance, em maior ou menor escala, é um sistema dialógico de imagens” (BAKHTIN, p..371). No
seu processo de surgimento e desenvolvimento inicial a palavra romanesca refletiu a antiga luta de
tribos, povos, culturas e línguas, ela era uma ressonância completa dessa luta (BAKHTIN, p 371).
Bakhtin contrapõe-se aos seus contemporâneos que colocavam os personagens como aqueles de
uma fotografia, isto é, numa cena muda. É a linguagem o campo potencial de representação das
tensões sociais, inclusive as provocadas pelo desajuste entre produção social e apropriação privada
(MACHADO, p.284).
Bakhtin começou seus estudos sobre Dostoievski com seu romance polifônico que foi o núcleo dos
estudos de Bakhtin.
Para Bakhtin o “romance é um texto característico de um estágio na história da consciência não
porque indica a descoberta do EU, mas porque manifesta a descoberta do outro pelo próprio EU”
(M.HOLQUIST, 1990:75, apud MACHADO, p.286).
O romance é multiforme e inacabado e mostra em si vários discursos, gêneros e linguagens. Bakhtin
não acreditava que princípios canônicos rígidos pudessem dar conta de todos os aspectos
multiformes do romance e resultar numa poética consistente.
Para ele o caráter épico do romance situa-se no uso da voz, que Bakhtin estudou nos procedimentos
de transmissão do discurso de outrem, do discurso bivocalizado e do romance polifônico
(MACHADO, p.288).
Vamos citar três particularidades fundamentais que distinguem o romance de todos os gêneros restantes, segundo Bakhtin:
1. A tridimensão estilística ligada à consciência plurilíngüe que se realiza nele;
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2. Transformação radical das coordenadas temporais das representações literárias do romance;
3. Nova área de estruturação da imagem literária no romance, justamente a área de contato máximo com o presente
(contemporaneidade) no seu aspecto inacabado (BAKHTIN, 1988, p.404).
Os aspectos acima citados estão ligados entre si e refletem a mudança da sociedade patriarcal e fechada em direção às novas condições de
relações internacionais e de ligações interlingüísticas, que podemos dizer ocorreu não só na Europa no século passado, mas continua
ocorrendo permanentemente, com o desvelamento, se assim se pode chamar de outras culturas, pelo processo midiático global cada vez
mais intenso.
Terminou o período da “coexistência surda e fechada das línguas nacionais”. (BAKHTIN, 1988, p.404)
O romance se formou e se desenvolveu nas condições de uma ativação aguçada do plurilingüismo exterior e interior. Esse é o seu elemento
natural. É por isto que o romance encabeçou o processo de desenvolvimento e renovação da literatura no plano lingüístico e estilístico
(BAKHTIN, 1988, p.405).
O romance, anteriormente identificado com gêneros inferiores não mais é assim considerado.
O romance está ligado aos elementos do presente inacabado que não o deixam enrijecer, permitindo sua permanência e adequação ao
tempo e espaço. Esta contemporaneidade, entretanto não exclui a narrativa do passado.
O romance mantém estreita relação com os gêneros extraliterários-a vida corrente e a ideologia. (BAKHTIN, p.422)
O romance, em sua evolução, passou a retratar tanto um sermão, quanto um tratado filosófico, quanto questões políticas ou, ainda,
questões íntimas, interiores, através de cartas, diários e bilhetes. Entra em relação com o acontecimento que está se desenvolvendo agora,
no qual o leitor também está ligado de maneira substancial.
Para concluir, vamos às conclusões de Bakhtin sobre o romance:
1. O romance tem caráter inacabado;
2. Se formou no processo de destruição da distância épica, no abaixamento do objeto da representação artística ao nível de uma realidade
atual, inacabada e fluída;
3. Com ele se originou o futuro de toda literatura;
4. É acanônico. É um gênero que eternamente se procura, se analisa e que reconsidera todas as suas formas adquiridas.
CONCLUSÕES
O romance Nação Crioula de José Eduardo Agualusa mostra em seu desenrolar vários discursos, gêneros e linguagens. Nele estão
presentes as vozes dos intelectuais (inclusive pela intertextualidade óbvia com o “empréstimo” do personagem), do homem comum, do
escravocrata, do negro escravo, da mulher – escrava ou liberta.
Mostra o discurso familiar, a voz do oficial, do militar, diferente do discurso do submisso.
Apresenta as três peculiaridades anteriormente citadas, nas quais salientamos o aspecto inacabado, a tridimensão estilística ligada à
consciência plurilíngüe que se realiza nele, além da transformação radical das coordenadas temporais.
Constata-se a mudança da sociedade fechada para uma sociedade internacional, na qual os personagens têm livre trânsito e,
conseqüentemente, mantendo relações interlingüísticas.
O romance em questão apresenta em si aquelas particularidades referentes à vida corrente e a ideologia. Utilizou o autor de recursos que
os romancistas começaram a utilizar já em épocas mais evoluídas do romance, que são as cartas.
O próprio nome nos indica a amplitude do seu conteúdo, pois nação não está afeita a limites territoriais, mas sim a sentimento coletivo;
crioula nos remete à mestiçagem.
Mestiço é um outro sujeito que se constitui a partir de dois sujeitos distintos, guardando em si elementos de cada um , mas que se constitui
em uma terceira voz distinta daquelas que o formou. A partir do título já temos subentendida a polifonia de Bakhtin. Encontramos a voz
de uma África negra, uma África que se diz portuguesa, de uma Nação portuguesa colonizadora da África , que se tem superior e de um
Brasil mestiço que por vezes parece ignorar sua parcela negra.
Temos no corpo do romance, histórias, questionamentos, críticas à história, críticas sociais, dramas pessoais que espelham a dialógica de
Bakhtin e a polifonia núcleo de seus estudos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
AGUALUZA, José Eduardo, Nação Crioula: a correspondência secreta de Fradique Mendes. Rio de Janeiro: Gryphus, 2001.
BAKHTIN, Mickhail. Questões de Literatura e de Estética. 3.ed. SP: UNESP / HUCITEC, 1998. MACHADO, Irene A. O Romance e a voz.
A prosaica dialógica de Bakhtin, Imago / FAPESP.
Isabel C. S. Vargas
Pelotas/Rio Grande do Sul/BR
www.isabelcsvargas.com.
Biografia da Autora
Isabel C.S.Vargas, é professora, advogada, aposentada no serviço público, jornalista, Especialista em
Linguagem Verbal, Visual e suas Tecnologias, com cerca de trezentas publicações no Diário da ManhãPelotas RS; Publicações na Revista Eletrônica Lápis e Luz, no Varal do Brasil (Suíça), do Clube dos
Autores;Publicação acadêmica na Biblioteca on-line de Comunicação Social em Portugal, na Universidade
Leste de Minas Gerais e no Jornal A Página- Portugal. Participa das Antologias on line da CBJE, além de
mais uma centena de publicações em livros.Participou de Antologias Brasileiras lançadas na Argentina,
na França, Portugal e Suíça bem como de Antologias editadas na Argentina em 2011 e 2012. Recebeu
diversas premiações, menções honrosas, destaques em crônica, contos e poesia. Prefaciou obras para a
Editora Celeiro de Escritores, além de revisão literária. Participante de e-books da Editora Beco dos Poetas
e Escritores, ganhadora do Prêmio Literário Alda do Nascimento Sena,pela publicação de livro a solo
PEDAÇOS DE MIM.
Seu site: www.isabelcsvargas.com.
eisFluências Junho 2012 | 03
Poesia de Isabel C. S. Vargas
Rumo Certo
Isabel C S Vargas
Anoitecer
Isabel C S Vargas
Água pura e cristalina,
Em teu curso irreversível,
Lições de vida me passas.
Calma,
Persistência,
Tenacidade
Transparência,
Voltar atrás,
Não te é permitido.
Inexorável segues em frente.
Como tu,
Devo meu curso seguir.
E, nesse percurso sem retorno,
De rumo certo e previsível,
Minhas dores ir sossegando
Para meu espírito aliviar,
Crescer e se purificar
Para no derradeiro encontro
Muita paz ofertar.
Com sofreguidão, vai o sol
Lentamente se recolhendo,
Em suaves e gentis movimentos
Para não macular a beleza alva da lua.
Espalha, suavemente, seu brilho sobre a paisagem
Onde as nuances coloridas da água
Destacam a mansidão do momento,
De plena comunhão da natureza,
Com a harmoniosa convivência dos diferentes,
Que do alto de sua magnitude
Nos emprestam lições de humildade
De respeito, tolerância e amor
Indicando que o equilíbrio é o caminho certo
Para obtenção da paz e felicidade na vida.
NOTÍCIA
Prémio Camões 2012
O Prêmio Camões 2012, o mais importante da literatura lusófona, foi concedido
em 21 de Maio/2012, ao escritor brasileiro Dalton Trevisan.
São poucos os que conhecem, para além da escrita, o brasileiro que foi
anunciado como vencedor do prémio Camões 2012.
Nascido em 1925 em Curitiba, Dalton Jérson Trevisan é um autor enigmático
conhecido por seus relatos, em particular "O vampiro de Curitiba" (1965).
A decisão do júri representa "uma escolha radical em favor da literatura como
arte da palavra", explicou seu presidente, o escritor brasileiro Silviano Santiago,
destacando os "incessantes experimentos" do laureado com a língua portuguesa
e sua "dedicação ao saber literário sem concessão às distrações da vida pessoal e
social".
São obras do autor: "Vozes do Retrato - Quinze Histórias de Mentiras e
Verdades" (1998), "O Maníaco do Olho Verde" (2008), "Violetas e Pavões"
(2009), "Desgracida" (2010) e "O Anão e a Ninfeta" (2011) são algumas das suas
últimas obras.
"Cemitério de Elefantes" foi uma das primeiras obras do escritor editadas em
Portugal, pela Relógio d'Água, na década de 1980.
O Prêmio Camões, de 100 mil euros, foi criado em 1989 por Portugal e pelo
Brasil para premiar autores que contribuam para o reconhecimento da língua
portuguesa.
O prêmio, concedido no ano passado ao poeta português Manuel António Pina,
já foi entregue em edições anteriores aos portugueses Antônio Lobo Antunes (2007) e José Saramago (1995), ao brasileiro Jorge Amado
(1994) e ao angolano Pepetela (1997).
(Fontes: DN ARTES e EXAME.COM)
_________________
Pesquisa e composição de Carmo Vasconcelos
Lisboa/Portugal
04 | eisFluências Junho 2012
ENTREVISTA COM WILSON ARAÚJO DE SOUZA
por Clóvis Campêlo
- Como você definiria a sua formação poética? Quais os autores ou movimentos
literários que mais o influenciaram?
- Minha formação (ou deformação?) poética se deu basicamente com elementos da música
popular. Aquela atmosfera da década de 1960 (a grande década do século breve), com os
compositores muito ilustrados pela cultura de modo geral, fazia fortemente a cabeça da gente
na transição para a universidade. Um poema em especial foi determinante para que minha
vontade de fazer poesia realmente se manifestasse: Acrilírico, de Caetano Veloso, que aliás
não foi musicado. “Olhar colírico/ lírios plásticos do campo/ e do contracampo/ telástico
cinemaScope/ teu sorriso/ tudo isso/ tudo ido e lido e vindo do vivido... ainda canto o ido, o
tido, o dito, o dado, o consumido, o consumado ato do amor morto motor da saudade...”. Meu
primeiro poema foi um pastiche de Acrilírico. Mas foi publicado na revista Equipe (muito
boa) da Sudene. Eu ainda estava em São Luís.
Movimentos, movimentos... A parafernália infernal da tropicália com elementos da poesia
concreta e dos manifestos de Oswald de Andrade. E o movimento diário dos diários de
notícias.
Autores. E autores. Não sei se me influenciaram tanto. Entre a angústia e o êxtase da influência, desconfio que não esteja à altura das
influências. Entrementes entre coração e mente, digo que gosto da minha fluência. Com ou sem influência. Confluências. Sou fã
incondicional da poesia concreta e do paideuma pai de uma proeza nada igual. Mas entendo que não me preparei o suficiente para uma
proeza pró Ezra. Agora tem os autores que admiro muito: Sousândrade, trindade de Andrade, Bandeira da vida inteira, Augusto de
cidadecitycité, Afonso Ávila da vila rica em códigos e signos, Caetano medula e osso, Gil rouxin'roll, anjo Tor(qua)to da (van)guarda,
Leminski in the sky with Lennon, o multitudo Arnaldo Antunes, muito de tudo do Frederico Barbosa. No Recife, gosto muito de Alberto
Cunha belo e sou muitíssimo empolgado com a leveza densa condensada em agudeza de Almir Castro Barros. E a identidade com
pedrAmérico (“meus ais viraram assobios”) e Jomard Muniz de Brito e rito e ritual e ritmo do mito do orfeu do carnaval é total. E João
Cabral de Melo Neto fica sendo o nome mais belo do verso.
- Você nasceu na cidade de São João dos Patos, no interior do Maranhão. Como foi esse percurso de lá até a metrópole,
no caso o Recife, e como isso influiu na sua elaboração poética?
- Nasci na Vila de Sucupira (hoje cidade, Sucupira do Riachão), distrito de São João dos Patos. São João dos pat(h)os. São João dos pathos
e ethos do poeta. Uma cidade pequena, pacata, mas que deu a primeira prefeita (Noca Santos) do Brasil. Chefona política mais durona que
os habituais chefes políticos. Uma cidade sem ginásio, sem cinema, sem padre, sem rua calçada. Fui para Caxias (terra morena de
Gonçalves Dias como diz o xote de João do Vale gravado por Luís Gonzaga). Com 12 anos de idade. Que mudança! Ruas e mais ruas,
calçadas, ginásio, cinema e... bispo! Comparativamente, uma metrópole. Foi meu encontro com a cultura urbana, com o mundo. Já fui,
digamos, pronto pra São Luís (azulejo azul vejo a luz de São Luís). Em São Luís: casa de estudante, sofrimento, cinema e mais cinema,
Sudene, Faculdade, coisas da cultura não mais apenas como diversão. E... o Tropicalismo. Cheguei em Recife (1970), com essas coisas
todas batendo e debatendo no meu sistema (como diz minha irmã Iracema) e já compenetrado de poeta – ou de antipoeta. Foram então
andanças e danças de um sobrevivente com ambição intelectual. A passagem por Caxias foi determinante. Adentrei a labiríntica
pernambucália como um, digamos, ludovicense metropolitano antenado com o movimento soteropolitano-cosmopolita da tropicália.
Aqui fixado, aderi ao fluxo do momo sapiens. Não mais o ir-e-vir(e ir) do homo duplex, mas o passo em vai-e-vém de todas as variedades
do momo sapiens.
- O poeta é um fingidor ou é um demiurgo? Qual o papel do poeta no mundo de hoje?
- Nem a dicção farsesca, nem a convicção messiânica. O poeta é um homem como outro qualquer, só que diferente, pela ambição de ser
antena da raça. Talvez o poeta seja aquele que Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa, poetizou filosoficamente: “Nada sois
que eu não me sinta”. Ou o outro da razão – o eu da loucura. A loucura falando na primeira pessoa (como mostrou Erasmo) – da lucidez.
Se, como disse Descartes, o bom senso é a coisa mais bem partilhada desse mundo, o poeta quer partilhar o nonsense – ou o bom senso
partilhando o nonsense. Pense!
O papel do poeta no mundo de hoje é ser e estar antenado para captar a demanda do mundo (do mundo da oca ao oco do mundo) e o
inusitado (do âmago ao mago). Divago?
- No seu texto a forma e o conteúdo se confundem e se fixam nas aliterações, no ritmo, na sonoridade das palavras.
Você acha que o leitor sempre estará pronto para esse jogo interpretativo? Ou o poeta deve desprezar o feed-back?
- O poeta não tem que desprezar o feed-back. Mas deve construir o poema a seu modo, incômodo que seja. Oswald deu a melhor resposta:
“A massa ainda comerá do biscoito fino que fabrico”. Acho que serei no máximo um cream cracker querendo alimentar feed-back. O que o
poeta quer mesmo é ser comido, digo lido. Lido ou colido?
- Um poema é feito de sangue ou de signos?
- Há uma gota de sangue em cada poema (Mário). Gota gota a gota uma gota nunca pinga abruptamente. Nem impunemente. Gota a gota,
como no piano de Jobim. Bom.
Todos os signos, o signo in-voluntário da pátria minha língua (minha língua é meu sotaque: pedrAmérico).
- Na atual conjuntura da literatura pernambucana, você acha que a sua poesia é devidamente reconhecida ou você se
sente marginalizado?
- Eu me sinto (ou me situo) automarginalizado. Discreto que desapareço, reapareço com toda a nitidez da minha timidez. Mas até que sou
um marginal que deu certo. Até título de cidadão recifense eu recebi este ano. Você não tem noção de qual foi a minha emoção. Este ano
andei aparecendo desde o Sesc (Santo Amaro, que encenou meus textos) até esta, digamos, praça Clóvis. Mas sou muito arredio! Só gosto
da badalação nos amigos. Gosto mesmo é de conversa de botequim. De preferência sobre cinema. Mas entendo que tem uma coisa
estranha na minha linguagem que não entranha bem na viagem, digamos, canônica do lugar – talvez seja mediocridade mesmo. Meu ir-evir vai-e-vem num pra-lá-pra-cá meio que por fora do me cita que te cito e juntos citemos Gilberto Freyre ou recitemos Ariano Suassuna.
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- Na minha opinião, a sua poesia é muito mais sonora do que imagética. Como explicaria essa sua paixão pelo cinema e
que relação ele poderia ter com o seu trabalho poético?
- Minha paixão pelo cinema é um vício que é uma virtude: sofro (ou melhor, gozo) de cinefilia. Escurinho do cinema: um onde chamado
desejo. No escurinho do cinema: um Brando chamado desejo, um desejo chamado Gilda. Mas, de fato, os meus textos têm mais relação
com a música. O tropicalismo fez isso. Na verdade faço poesia porque não vinguei como letrista de música. Gosto mais do letrista que do
beletrista. Mas entendo que aqui e acolá há travelling admirando Bogart ou Godard, um film noir ou Renoir. Corte, digo que não vinguei
como letrista, mas para mim a poesia é o almanaque da alma.
- Existe paz na poesia? Ou o poeta vive dividido entre a utopia e a realidade?
- A poesia não tem paz: a vida quer ser poema. O poeta é um apanhador, no campo, de centelhas. O poeta capta e coopta os flagrantes da
vida (sur)real e cheira o pó do ópio da utopia.
- Você se sente um autor engajado? Acha que o poeta, com o seu trabalho, deve ter a pretensão de mudar o mundo?
- Glauber Rocha, a inquietação em pessoa – e no artista, cita Mário Faustino em Terra em Transe, pela boca de Jardel Filho, que faz o papel
principal (um intelectual politicamente engajado): a poesia e a política são demais para uma só pessoa. É realmente difícil ser militante
poético e político num mesmo diapasão. No mesmo diapasão, Marcelo Mário de Melo é esse elo: uma pessoa plenária plena de ária. O que
eu quero ser quando crescer? Marcelo Mário de Melo! Quando fiz ostensivamente militância política como cidadão, servidor público,
sindicalista (tempo de abertura, de redemocratização, de re-organização da sociedade, de re-construção da cidadania), fiz pouca poesia.
Fiz mais palavra de ordem (o preço da cidadania é a eterna militância) para panfletos e manifestos. Mas acho que sou engajado. Inclusive
pela inquietação com a linguagem. Mas também pela inquietação com a realidade – como neste poemeto de circunstância, circunstância
com Daniel Dantas:
TOGA DE COLARINHO BRANCO
o promíscuo
conspurca
o conspícuo
(vide a capa capital de Carta Capital com Gilmar Mendes). E neste poema anterior à crise (a crise fede, quem escafede da crise?)
MADE IN US(UR)A
o inferno
de wall street
são os outros
horror, o horror!
o teor do horror
em estado de terror
em terror de ESTADO
democracia
da suprema corte
e da supremaCIA!
O cidadão é do poeta. O poeta é do cidadão.
Não digo a pretensão de mudar o mundo. Mas te(n)são (tenso, logo existo) de domar a demanda do mundo. Com pulso político e impulso
poético. Com pulsões eróticas e expulsões neuróticas.
- Para finalizar, a internet é uma coisa boa ou ruim para a literatura de um modo geral? Como você lida com essa nova
forma de comunicação?
- A internet é mais ou menos uma redoma? Quem doma a rede? Quem dorme na rede? Meu ir e vir ainda não é do ritual virtual. Ainda
estou mais no lugar que no login. Ainda estou mais no livro sete que no livro site. Ainda estou mais nos arroubos do Emílio que nas arrobas
do e-mail. Mas chego lá, na miríade de ondes (nômades?) e ondas (mônadas) da circunavegação inter(pla)netária.
__________________
Clóvis Campêlo
Recife, 2009
http://geleiageneral.blogspot.pt
"Se tu choras por ter perdido o sol,
as lágrimas te impedirão de ver as estrelas.”
Antoine de Saint-Exupéry
06 | eisFluências Junho 2012
Sonhos
por António Barroso (Tiago)
Sonhei!... Sim, porque quando se deixa a fantasia vaguear, em
liberdade, o sonho toma asas e percorre os espaços.
Foi assim que, num dos meus sonhos, me deparei com Florbela,
numa encruzilhada da Via Láctea e, quando, com euforia, me
apresentei como conterrâneo, encetámos um agradável, mas
informal diálogo, após um longo abraço de confraternização.
Comecei, então, por lhe dizer:
Florbela, que prazer minha alma tem
Por saber que te encontras sempre bela,
Que vagueias, agora, como estrela,
Neste céu que é de todos, de ninguém.
Tomara eu ser um mago que contém
Poder p'ra te fazer a Cinderela,
Serias mais formosa, ainda, que ela,
Voltarias à terra, para alguém.
E essa tua tristeza acabaria,
Porque o amor buscarias, dia a dia,
E sempre, sempre de cabeça erguida.
E sonhei que isso vai acontecer
Para que nunca mais possas dizer:
- Eu sou a que no mundo anda perdida.
Florbela, meditou, um pouco, contemplativa, e respondeu,
sorridente:
- Poeta, pegaste no meu verso e conseguiste transformá-lo numa
promessa de esperança.
- Que, assim tu o queiras, se poderá concretizar...
- ... não, não, o amor, se for esperança, é sempre triste e,
raramente, tem um epílogo feliz. Permite-me, no entanto, que me
defina, que te fale um pouco mais de mim... não só para que me
conheças melhor, mas para te dizer, realmente, que
Eu sou a que, no mundo, anda perdida,
Eu sou a que, na vida, não tem norte
Sou a irmã do Sonho e, desta sorte,
Sou a crucificada... a dolorida...
Sombra de névoa ténue e esvaída,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste, sem o ser...
Sou a que chora sem saber por quê...
Sou talvez a visão que alguém sonhou.
Alguém que veio ao mundo p'ra me ver
E que nunca, na vida me encontrou.
- “Sou a que chamam triste, sem o ser...”, eis uma afirmação que
não corresponde inteiramente à verdade, já que, ao longo de toda
a tua poesia, a tristeza é sempre uma constante.
- Talvez... talvez, mas porque o amor sempre me fugia e nunca
deixou de ser apenas uma mera esperança.
- Porque corrias atrás dele e... não o sabias conservar. Se
tomarmos o teu último verso, até te poderia afirmar:
E que nunca, na vida, me encontrou,
Dizes tu com mágoa e com tristeza.
Porque nunca quiseste, com firmeza,
Ir ao encontro de quem não te achou.
A sombra, na tua alma, se alojou,
E ali, ficou retida, ficou presa,
Sem resquícios de amor e de beleza,
E a lágrima, no rosto, então, brotou.
Dizes que choras sem saber por quê,
É sofrimento atroz que ninguém vê,
Que corre a noite até que o sol desponte.
As horas que curvada, em noite escura,
Passadas, de joelhos, numa jura...
Horas mortas... curvada aos pés do monte.
- Poeta, tomaste o início dum soneto que dedico ao meu
Alentejo...
- ... ao nosso...
- Pois, seja... ao nosso.
- O que é bem raro na tua escrita. Segundo os teus biógrafos, a tua
poesia está totalmente impregnada duma tristeza interior, talvez
reflexo duma infância conturbada, e que te leva a empregar a
palavra “morte” em grande número dos teus sonetos.
- Não tanto como julgas... mas mudemos de tema e... para te
provar que o Alentejo nunca deixou de estar no meu
pensamento...
Horas mortas... curvada aos pés do monte
A planície é um brasido e, torturadas,
As árvores sangrentas, revoltadas,
Gritam a Deus a bênção duma fonte.
E quando, manhã alta, o sol posponte
A oiro a giesta, a arder pelas estradas,
Esfíngicas, recortam, desgrenhadas,
Os trágicos perfis no horizonte.
Árvores! Corações, almas que choram,
Almas iguais à minha, almas que imploram
Em vão, remédio para tanta mágoa!
Árvores! Não choreis! Olhai e vede
- Também ando a gritar, morta de sede,
Pedindo a Deus a minha gota de água!
- Como, habitualmente, é triste o teu soneto. Nele se espalha a
melancolia dum entardecer alentejano. Tem porém, o condão de,
na verdade, referires um Alentejo a que ambos pertencemos.
- Isto é apenas para te confirmar o que dizia. O amor tanto se pode
sentir por quem se almeja, como pela terra onde se nasceu, como
pela árvore que se destaca na charneca.
- E não só a árvore, minha amiga, toda a planície...
Pedindo a Deus a minha gota de água,
Também dizia meu sobreiro amigo
Quando, sedento, falava comigo,
E nem pinga corria duma frágua.
Meu Alentejo seco, a minha mágoa
É não saber se é norma, ou se é castigo
Andar sempre à procura dum abrigo
Numa busca constante, eterna e árdua.
Alentejo, apesar dessa secura,
Que queima esses trigais onde perdura
A languidez e a calma tão plangente,
Amar-te, até mais não, tudo mereces
Quando o calor aperta e tu aqueces.
Meio-dia. O sol a prumo cai ardente.
- Eu poderia responder-te, mas o tempo... não me permite... vou
seguir para outra galáxia...
- Espera... espera... só um pouco mais, que o que temos para
contar, não se compadece com o avanço dos ponteiros do
relógio...
- ... só um pouco mais, mas recordar-te-ás que...
eisFluências Junho 2012 | 07
Meio-dia. O sol a prumo cai ardente,
Dourando tudo... ondeiam nos trigais
D'ouro fulvo, de leve... docemente...
As papoulas sangrentas, sensuais...
Mais delicada e linda neste mundo?
A terra onde nascemos, tão formosa,
Que tem por seu nome Vila Viçosa
De igreja ao alto e com castelo, ao fundo.
Andam asas no ar, e raparigas
Flores desabrochadas em canteiros,
Mostram por entre o ouro das espigas
Os perfis delicados e trigueiros...
Quando se chega e se pára um segundo,
Se contemplam as casas majestosas
Nas ruas perfumadas pelas rosas,
Há um prazer enorme e bem fecundo.
Tudo é tranquilo, e casto, e sonhador...
Olhando esta paisagem que é uma tela
De Deus, eu penso então: onde há pintor,
Por todo o lado, há paz, amenidade,
Há sossego, há amor, felicidade,
E ternura tão simples, tão singela,
Onde há artista de saber fecundo,
Que possa imaginar coisa mais bela,
Mais delicada e linda neste mundo?
Que, nunca mais, alguém pode esquecer
A glória desta terra, por saber
Que em Vila Viçosa nasceu Florbela.
- É lindo, Florbela. Dá-me a tua mão antes de seguires...
- Amigo, não é uma despedida. Se continuares a sonhar, mais
tarde nos encontraremos...
- ... mas, antes, Florbela, escuta apenas esta lembrança que te
deixo, com muito carinho.
- Adeus poeta... de quem não sei o nome... adeus... adeus...
- ... mas o teu porém, jamais se esquecerá, Florbela Espanca.
António Barroso (Tiago)
Parede/Portugal
O desespero do efêmero: memória e tempo em Lúcio Cardoso e Santo Agostinho
por Isabella Lígia Moraes
Sangue de aventureiro, cigano ou saltimbanco
A inquietude é traço marcante nos
Diários de Lúcio Cardoso. Os projetos
nem sempre concluídos, as inúmeras
cidades visitadas e a própria
versatilidade do artista, que se desdobra
entre as tarefas de dramaturgo, escritor,
diretor de cinema, jornalista e poeta, são
reveladores do espírito inquieto que o
habitava. Nascido a 14 de agosto de 1912,
na cidade mineira de Curvelo, Joaquim
Lúcio Cardoso Filho teve ainda na
infância a manifestação dessa vida que
não se fixava.
Filho de Maria Venceslina Cardoso e de
Joaquim Lúcio Cardoso, ele viveu
durante sua formação inicial acompanhando a família em
constantes mudanças entre as cidades de Curvelo, Belo Horizonte
e Rio de Janeiro. Os deslocamentos da família Cardoso eram
devidos ao espírito aventureiro do pai de Lúcio, que não se fixava
em nenhum emprego ou negócio que se propunha realizar. Maria
Helena Cardoso, irmã de Lúcio, narra suas memórias no livro Por
onde andou meu coração, no qual mostra a curiosa personalidade
desse pai que, entre longas ausências devido a trabalhos e algumas
infidelidades no casamento, levava a família consigo a diversas
cidades. A cultura do pai, que tocava piano e conhecia literatura,
impressionava os conhecidos da família
Lúcio Cardoso, como vemos, herdou do pai não apenas o nome. O
gosto pelas artes e a inquietação são também característicos
comuns a ambos. Em seus Diários, o dramaturgo mineiro
reconhece sua própria personalidade quando se define como
possuidor de um sangue aventureiro, de cigano ou saltimbanco,
aliado a uma diabólica fantasia que o fazia considerar-se capaz de
tudo, embora sua experiência muitas vezes revelasse o contrário.
Em certo momento de sua vida, entre 1949 e 1951, Lúcio Cardoso
escreveu o Diário I, que foi publicado em 1961. Sua intenção era a
de escrever uma série de diários, mas ficou impossibilitado de
realizar tal tarefa por sofrer um derrame cerebral em 1962, cujas
sequelas impossibilitaram o exercício da escrita. Com o
falecimento do escritor em 28 de setembro de 1968, o Diário II,
escrito entre 1952 e 1962, foi organizado por Otávio de Faria, e
ambos foram publicados postumamente sob o título Diário
Completo, em 1970.
A escrita do próprio diário, inclusive, pode ser reveladora de uma
necessidade de fixar-se. Ao fazer um ano da data em que iniciara o
diário, por exemplo, o diarista reflete sobre as motivações para sua
escrita. Segundo Lúcio Cardoso, o sentimento de ser percorrido
por tendências e opiniões tão contraditórias teria sido a origem de
seus diários, que nasceram justamente de seu esforço para fixarse. Vemos, assim, no próprio deslocamento físico que
acompanhou o escritor durante sua vida, a representação das
contradições interiores por ele vivenciadas, inclusive no conflito
entre seu pensamento religioso e sua orientação sexual.
A escrita de um diário íntimo passa por diversas motivações, seja a
vivência de um momento importante, ou a necessidade de
construção da própria identidade ao narrar a si mesmo. Embora
seja mais comum na adolescência, a escrita do diário não se atém a
apenas essa fase da vida. Todos os diaristas, embora escrevam por
diferentes razões, têm em comum o gosto pela escrita e a
preocupação com o tempo, de acordo com o estudioso de
autobiografias Phillipe Lejeune. Sendo uma série de vestígios, não
necessariamente regulares, o diário acompanha o fluxo do tempo.
Há, portanto, uma tentativa de reter o tempo que passa, o que
também está intimamente relacionado à angústia de viver e ao
medo da morte.
Relendo as páginas escritas no decorrer dos meses, Lúcio Cardoso
indaga sobre quem teria inventado o gênero diário íntimo. Nessa
reflexão, o diarista conclui que apenas uma alma tocada pelo
desespero do efêmero poderia ter criado o diário. Ele percebe o
quanto mudou e perdeu com o tempo que passa e o conduz,
inevitavelmente, ao aniquilamento. Essa angústia define o tom
melancólico de sua escrita, pois tem a consciência da
impossibilidade de resgatar o passado.
À preocupação do diarista com o tempo aliam-se, portanto, as
memórias impossíveis de serem reconstruídas, pois estas
consistem em fragmentos cujas lacunas apenas podem ser
preenchidas pela imaginação humana. Essa angústia que leva a
pessoa a escrever um diário íntimo é maximizada em Lúcio
Cardoso por sua concepção de tempo cristã, em que a progressão
dos acontecimentos e o escoar vertiginoso do tempo levam
unicamente à morte. Presença constante nos diários de Lúcio, a
morte ronda a todo o tempo o pensamento e a escrita do autor,
cujo medo é responsável por terrores noturnos, manias de
perseguição e pela própria tentativa de sobrevivência através da
escrita.
08 | eisFluências Junho 2012
Ambiguidade e paradoxo: a luta do Bem e do Mal
A leitura do Diário completo de Lúcio Cardoso é reveladora de
uma ambiguidade que, como apontamos, fazia parte de próprio
diarista. Em seu discurso, ele derruba certezas e nunca se revela
por completo. É perceptível em sua escrita, inclusive, o
rompimento com o próprio gênero diário íntimo, visto que o autor
o escreveu para ser lido por outras pessoas e, inclusive, para ser
publicado.
A escrita de um diário pressupõe a não alteração posterior do que
foi escrito no registro de determinada data, pois então o gênero
deslizaria para a autobiografia. Lúcio, entretanto, altera, corrige e
aceita sugestões de amigos para que sua escrita resultasse em uma
melhor recepção por parte dos leitores, quando fosse publicada.
De acordo com Lejeune (2008), é “para si que se escreve um
diário: somos nossos próprios destinatários no futuro”. Lúcio
Cardoso, entretanto, ao escrever sobre os motivos que o levavam a
escrever o diário, afirma o seguinte:
Para mim mesmo, para meu deleite íntimo, confesso que jamais
tentaria salvar estes fragmentos do passado: aos meus olhos,
não possuem nenhum interesse. E depois, tudo o que morre é
porque já teve o seu tempo. Mas insensivelmente penso nos
outros, nos amigos que nunca tive, naqueles a quem eu gostaria
de contar estas coisas como quem faz confidências no fundo de
um bar. Esse diabólico e raro prazer da confidência, que vai se
desfazendo à medida que perdemos a confiança na amizade, que
ela mais e mais se afasta de nós como um bem inacessível...
(CARDOSO, 1970, p. 5-6)
De acordo com Lejeune (2008), a autenticidade do momento é
essencial para a configuração do gênero diário. Assim, a “entrada”
ou o “registro”, ou seja, aquilo que foi escrito sob uma mesma data,
não pode ter seu conteúdo modificado posteriormente: “Um
diário mais tarde modificado ou podado talvez ganhe algum valor
literário, mas terá perdido o essencial: a autenticidade do
momento. Quando soa a meia-noite, não posso mais fazer
modificações. Se o fizer, abandono o diário para cair na
autobiografia.” (LEJEUNE, 2008).
O diário funciona como um instrumento propiciador do
autoconhecimento, como forma de o diarista tentar superar sua
própria ambiguidade e indefinição: “O papel é um espelho. Uma
vez projetados no papel, podemos nos olhar com
distanciamento.” (LEJEUNE, 2008). Essa projeção de si próprio
no papel em branco é comentada por Lúcio Cardoso:
Por que escrevo? (...) é inútil procurar razões, sou feito com estes
braços, estas mãos, estes olhos – e assim sendo, todo cheio de
vozes que só sabem se exprimir através das vias brancas do
papel, só consigo vislumbrar a minha realidade através da
informe projeção deste mundo confuso que me habita.
(CARDOSO, 1970, p. 60)
Aliada a essas preocupações, temos também a preocupação
religiosa com as questões do bem e do mal. Em várias passagens
do Diário completo, seja por seu valor literário, pela religiosidade
ou pela intenção de ser lido, o tom de escrita nos remete às
Confissões de Santo Agostinho, que confessa a Deus e também aos
homens, enquanto Lúcio se confessa a si mesmo e aos leitores.
Por exemplo, o diarista utiliza um vocabulário religioso para falar
de coisas mundanas. Vejamos a seguinte passagem, que trata de
política:
Escrevendo as linhas acima, outras ideias me surgem, e imagino
que é preciso não somente acentuar o mal, mas tentar também
encontrar uma possibilidade de salvação. A mim pois,
salvadores de última hora, rasgadores de véus que ocultam
miríficas batalhas econômicas... deixai simplesmente que o
abismo venha a nós, como a graça de Deus. (CARDOSO, 1970, p.
52).
É importante ressaltarmos que o Catolicismo praticado e
defendido por Lúcio é “anti-moderno, barroco, paradoxal”
(BARROS, 2004, p. 37), no qual não vemos a dicotomização do
Bem e do Mal. A concepção religiosa do escritor mineiro
aproxima-se daquela do cristão do século XVII, que acreditava na
salvação através do sofrimento e do martírio, sendo que o valor do
pecador arrependido era considerado maior que o do bom
religioso.
Como Lúcio Cardoso, Octavio de Faria crê no pecado como um
caminho legítimo de se atingir a Graça, pois, “contrário ao
cristianismo moralista e virtuoso da modernidade burguesa, o
catolicismo de Lúcio Cardoso e de Octavio de Faria conserva, pois,
a dimensão sagrada do erotismo” (BARROS, 2004, p. 39). Não só
em seus textos, mas também em sua vida, Lúcio Cardoso, teria
buscado alcançar a Graça através do pecado, como vemos nas
memórias de sua irmã Maria Helena Cardoso:
Sou daqueles sobre os quais disse: "Ai dos mornos, eu os
vomitarei pela boca." Antes o pecado, mesmo mortal, que a
indiferença que não conduz a nada. Nonô nunca foi morno,
errou muito, mas sempre amou a deus com violência. Quisera ter
sido uma grande pecadora para agora arrepender-me do fundo
do coração. Assim como sou, não sou nada: incolor, inodora e
insípida aos olhos de Deus. (CARDOSO, 1973, p. 133).
Em seus Diários, Lúcio Cardoso revela essa dualidade de sua
personalidade e assume estar vivendo uma fase de transição, na
qual o homem antigo e o novo convivem. Vejamos a entrada de 30
de abril de 1950:
Sei muito bem que atravesso agora uma hora escura de
transição; ou adquiro o aspecto do novo homem que surge
dentro de mim ou pereço sob os fragmentos do antigo. (...) Se
mudamos assim tão fundamentalmente, é que nos aproximamos
mais largamente de nossa essência. Neste minuto agora, para
citar um exemplo, sinto-me extraordinariamente mais próximo
da minha morte. E que é a morte senão a essência de todos nós?
(CARDOSO, 1970, 51)
Nessa passagem ecoa o trecho das Confissões de Santo Agostinho
na qual o filósofo fala sobre duas vontades que lutam em si, a
carnal e a espiritual:
Deste modo minhas duas vontades, a velha e a nova, a carnal e a
espiritual, lutavam entre si e, nessa luta, dilaceravam-me a
alma. Entendi, por experiência própria, o que havia lido: a carne
tem desejos contra o espírito, e o espírito contra a carne. Eu vivia
ao mesmo tempo a ambos, embora mais o que aprovava em mim
do que o que em mim desaprovava. Com efeito, nesta última
parte de mim eu era passivo e constrangido, mais do que ativo e
livre. (AGOSTINHO, 2011).
Se Lúcio Cardoso, em sua concepção de religiosidade, acreditava
na possibilidade de se alcançar a graça por meio do pecado,
possivelmente se identificava com a filosofia de Santo Agostinho,
pois o filósofo confessa ter sido um homem mundano até que,
através de um milagre, foi redimido pela conversão.
A concepção de tempo
Lejeune ressalta ser a data a base do diário, sob a qual é escrito um
“registro” ou “entrada”, pois “um diário sem data, a rigor, não
passa de uma simples caderneta” (LEJEUNE, 2008). A escrita
dessa entrada pressupõe a ignorância quanto ao futuro, além da
não modificação posterior do conteúdo. Ressalta, ainda, que o
diário é composto de uma série de registros que acompanhe,
assim, o fluxo do tempo, embora não precise ser quotidiana ou
regular.
Vemos, portanto, uma das principais características do diarista,
sua preocupação com o tempo e a necessidade de acompanhar –
ainda que ilusoriamente – seu fluxo no decorrer da existência. O
próprio Lúcio Cardoso, em seu diário, cita alguns autores que se
fixaram na noção de tempo:
Homens, artistas a quem a noção do tempo aprisionou – Proust,
Joyce, Virgínia Woolf – é inútil a causa. O tempo é um cavalo sem
cor que emerge de um mar sem fundo. Não discutamos sua
razão, o que nos consome é sua verdade sem razão. O tempo é
reversível – decerto é um cavalo que emerge, mas para felicidade
nossa apenas corre, sem nunca deixar o mar. (CARDOSO, 1970,
p. 49).
Associada ao catolicismo de Lúcio Cardoso, a questão do tempo
assume uma faceta ainda mais angustiosa. Na concepção cristã de
tempo, linear, contrária à concepção circular pagã, todos os
acontecimentos encaminham para o fim, a morte.
eisFluências Junho 2012 | 09
Conforme já aproximamos o tom de escrita de Lúcio Cardoso ao
de Santo Agostinho, é fundamental que façamos uma breve
exposição sobre a concepção agostiniana de “tempo”. Segundo
Santo Agostinho, teria sido o próprio Deus quem criou o tempo.
Quando se interroga sobre em que consiste o tempo, o filósofo
formula a questão: “O que é, por conseguinte, o tempo? Se
ninguém mo pergunta, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer
a pergunta, já não sei.” (Santo Agostinho, 2011).
Vem daí a originalidade da concepção agostiniana sobre o tempo.
Segundo Santo Agostinho, o que seria próprio do tempo é o nãoser. Isso porque, de acordo com o filósofo, o passado não existe
mais, o futuro ainda não existe e o presente torna-se pretérito a
cada instante. O presente seria um momento tão ínfimo no tempo
que corre que, ao tomar consciência dele, ele já passou. O passado
existe, de acordo com sua concepção, através da memória que o
presentifica. Da mesma forma, o futuro existe apenas como
expectativa do que virá, ou seja, acontece também no presente.
Haveria, portanto, três tempos: presente das coisas passadas,
presente das coisas futuras e presente das coisas presentes. O
tempo seria, portanto, subjetivo, pois o modo como nos referimos
às coisas depende totalmente da subjetividade, manifesta na
memória ou no sentimento.
O mais interessante é como a ideia de Lúcio Cardoso acerca do
ontem, do hoje e do amanhã se aproxima da concepção de Santo
Agostinho sobre o tempo:
Ontem a esta hora, X estava aqui e eu sentia a casa inteira cheia
de sua presença. Mas que é ONTEM? Somos, cega e
deploravelmente, apenas hoje, apenas o que nos vive. Entre essas
ilhas de noite e de alvorada que se chamam passado e futuro, o
hoje, o instante que nos faz respirar e nos possui entre seus dedos
implacáveis, colore-se com a única tinta possível. Mas nem
sempre é real, nem sempre nos eleva a uma categoria perfeita de
verdade. (CARDOSO, 1970, p. 33)
Nesse sentido, Lúcio Cardoso considera apenas a existência do
hoje, do instante. Ontem e amanhã seriam “ilhas de noite e de
alvorada”, como miragens ou sonhos inexistentes.
Na escrita do diário, essa relação com o tempo é evidenciada. O
diarista escreve sobre o passado, pois ainda que o acontecimento
seja o mais recente possível, é necessário que seja rememorado.
Então a escrita já não é fiel ao acontecimento, visto que a
memória, responsável pela presentificação e, portanto, pela
existência do passado, trabalha com fragmentos. Esses
fragmentos são preenchidos inconscientemente pelo próprio
escritor. Lúcio afirma: “Não são os acontecimentos que fazem um
diário, mas a ausência deles.” (CARDOSO, 1970, p. 60).
Talvez dessa angústia surja a necessidade de se escrever sobre o
próprio ato da escrita. Em diversos momentos, Lúcio Cardoso se
indaga sobre as razões de se escrever o diário. E ele diz na entrada
do dia 07 de maio de 1950, utilizando o tempo presente:
Escrevo – e minha mão segue quase automaticamente as linhas
do papel. Escrevo – e meu coração pulsa. Por que escrevo?
Infindável é o número de vezes que já fiz a mesma pergunta e
sempre encontrei a mesma resposta. Escrevo apenas porque em
mim alguma coisa não quer morrer e grita pela sobrevivência.
Escrevo para que me escutem – quem? um ouvido anônimo e
amigo perdido na distância do tempo e das idades... – para que
me escutem se morrer agora. (CARDOSO, 1970, p. 60)
De acordo com Lejeune, um dos motivos que leva a pessoa a
escrever um diário é a ânsia de sobreviver, para fixar um tempo
passado que se esvanece atrás de nós e, também, por apreensão
diante de nosso esvanecimento futuro. Da angústia em relação ao
tempo nasce o desejo de fixar-se e sobreviver para um tempo
posterior, quando o diarista será lido e lembrado.
No centenário do escritor Lúcio Cardoso (1912 - 2012), a leitura de
seus diários é reveladora da inquietude e da angústia que
perpassam suas obras, frutos da preocupação do artista com o
tempo que – em sua concepção cristã – escoa vertiginosamente
rumo à morte. Reveladores de uma alma que não se fixava, seus
diários são angustiados apelos de um artista por constância e
sobrevivência.
Sua angústia em relação ao tempo e à religiosidade se evidencia
nas passagens que ecoam trechos das Confissões de Santo
Agostinho, pois o filósofo é emblema do homem mundano
redimido através do milagre e da conversão. Lúcio Cardoso, nesse
sentido, esperava alcançar a graça através do pecado, e tal
ambiguidade está manifesta no uso da linguagem de cunho
religioso para falar de trivialidades. Além disso, a semelhança da
concepção de tempo no diarista e no filósofo, que acreditam
apenas na existência do tempo presente, vem ao encontro da
presentificação do passado através da memória no exercício de
escrita do diário.
Referências
AGOSTINHO. Confissões. Disponível em:
<http://www.scribd.com/doc/19808723/CONFISSOES-DESANTO-AGOSTINHO> Acesso em: 26 maio 2011.
BARROS, Fernando Monteiro de. A poética de Lúcio Cardoso: o
catolicismo da transgressão. SOLETRAS, Ano IV, N° 08. São
Gonçalo: UERJ, jul./dez. 2004.
CARDOSO, Lúcio. Diário completo. Rio de Janeiro: Livraria José
Olympio Editora / Instituto Nacional do Livro, 1970.
CARDOSO, Maria Helena. Por onde andou meu coração. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1967.
CARDOSO, Maria Helena. Vida-vida: memórias. Rio de Janeiro:
José Olympio; Brasília: INL, 1973
LEJEUNE, Philippe. O pacto autobiográfico: de Rousseau à
Internet. Trad. Jovita M. G. Noronha; Maria Inês C. Guedes. Belo
Horizonte: UFMG, 2008.
Biografia actualizada da Autora
Isabella Lígia Moraes: Mestre em Literaturas de Língua Portuguesa pela Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais (PUC Minas / CNPq), com a pesquisa intitulada Mito e alegoria em Cláudio
Manuel da Costa: "Fábula do Ribeirão do Carmo" e Vila Rica. Atua como editora na ContraPonto e como
colaboradora na Revista Capitu e em blogs culturais.
10 | eisFluências Junho 2012
CONSIDERABLES GESTIONES DE LA MUJER EN EL 2012
El Liderazgo En El 2012 Y La Discriminación En El Lenguaje
(II Parte do artigo publicado na Revista anterior)
de María Cristina Garay Andrade
Notoriamente como he demostrado en toda esta investigación del lenguaje podemos apreciar visiblemente y en demasía el complejo de
palabras hacia el género femenino definido a manera de discriminación en abundancia y violento atropello a nuestra autoestima.
La arbitrariedad de la expresión es un ultraje a nuestra vilipendiada personalidad detallada minuciosamente en el diccionario y debe ser
tomado como grave agravio consumado por la autocracia manejadora de valores y conceptos humanos determinados en antiquísimas
palabras preconcebidas que acarrea el idioma peninsular.
En la exposición anterior sobre el liderazgo de la mujer en el 2012, bien dejo sentado la opinión que me merece la inminente toma de poder
y por consiguiente con esta nueva exposición manifestada al descubierto enfatizo que es tiempo de hacernos cargo de nuestra legitima
potestad y modificar infranqueables incoherencias del sistema cultural que nos humilla y nos cosifica, no podemos seguir estando sujetas
a desigualdades lingüísticas la mitad de las integrantes en un total de habitantes globales.
Según los últimos datos estadísticos la población mundial alcanza a los 7 mil millones de seres de ambos sexos y en el 2011 advertimos que
quedó atrás el mito de que a los hombres les tocan varias mujeres para cada uno, a nivel mundial hoy los hombres han pasado a ser
mayoría sobre el sexo femenino, dejando atrás el cuento de que había mujeres “por montones para cada hombre” y que los machos podían
estar tranquilos porque a cada uno le correspondían varias medias naranjas a elección, pues al paso que van los cambios demográficos, si
se sigue asesinando niñas a mansalva, en vez de abundancia habrá una seria escasez de mujeres, de acuerdo con la actualización de datos
hecha por la Oficina del Censo de los Estados Unidos. Según sus estimativos, en el 2010 hay casi 50 millones de hombres más que mujeres.
Es turno entonces de tomar el espacio usurpado con piratería malintencionada, el lenguaje hispanoparlante carece de legitimidad si
involucra un desnivel al señalar una marcada diferencia de apreciaciones entre los géneros o sexos.
En una estadística de entre casa podemos afirmar que con un hombre y diez mujeres en 9 meses podemos duplicar la humanidad
proyectando de tener por cada mujer únicamente un hijo, pero si invertimos los números de 10 varones y una mujer la consecuencia es
grave puesto que si parimos una vez al año tardaríamos 10 años consecutivos para lograr la reproducción de la misma cantidad de
personas, entonces cuidado con tanto descrédito y eliminación del único medio de concretar la concepción.
Para una economía de mercado las mujeres estamos consideradas como la reproducción de la fuerza del trabajo, no se tiene en cuenta que
si decidiéramos impedir la proliferación como esta pasando en algunos países de Europa a cambio de sociedad de consumo, se vería más
que comprometida no solo la administración financiera del sistema sino también los recursos de manutención entre otras diversas
consecuencias trascendentales.
Veremos como democracia implica de acuerdo con la definición de Wikipedia en síntesis: "que es una forma de organización de grupos de
personas, cuya característica predominante es que la titularidad del poder reside en la totalidad de sus miembros, haciendo que la toma
de decisiones responda a la voluntad colectiva de los miembros del grupo. En sentido estricto la democracia es una forma de organización
del Estado, en la cual las decisiones colectivas son adoptadas por el pueblo mediante mecanismos de participación directa o indirecta que
les confieren legitimidad a los representantes. En sentido amplio, democracia es una forma de convivencia social en la que los miembros
son libres e iguales y las relaciones sociales se establecen de acuerdo a mecanismos contractuales.
La democracia se define también a partir de la clásica clasificación de las formas de gobierno realizada por Platón primero y Aristóteles
después, en tres tipos básicos: monarquía (gobierno de uno), aristocracia (gobierno "de los mejores" para Platón), democracia (gobierno
de la multitud para Platón y "de los más", para Aristóteles). El término democracia proviene del antiguo griego (äçìïêñáôßá) y fue
acuñado en Atenas en el siglo V a. C. a partir de los vocablos ä?ìïò («demos», que puede traducirse como «pueblo») y êñÜôïò (krátos, que
puede traducirse como «poder» o «gobierno») si bien la terminología es mas compleja en realidad, esto nos da la pauta del sentido de
democracia.”
Vivir en democracia al parecer es una ilógica utopía o solo una definición errónea debido al mal comportamiento social por una de las
partes intervinientes al institucionalizar palabras y propagar su uso. Tal vez llame la atención sobremanera mi irrupción en el tema
especifico, pero no se debe a un cuestionamiento político sino exclusivamente de análisis gramatical. Concretando entonces que
democracia es el gobierno de un pueblo, un pueblo esta comprendido por personas de diferentes sexos y ha sido singularmente
comandada por varones en tiempo y forma como lo viene escribiendo la historia, no tiene otro sentido que el que conocemos
explícitamente, estamos frente a un patriarcado encubierto con un término erróneo reconocido como "democracia". Esta situación bajo
presión e impulso de las mujeres resueltas y creadoras de un nuevo mundo se esta revirtiendo aceleradamente.
Lo extraño del caso entonces es la denominación que el gobierno de las mujeres tiene adjudicado es "ginecocracia" o matriarcado. En el
marco legal y jurídico este término no debiera existir dado a que las mujeres gozamos al igual de inteligencia, conciencia para discernir,
autonomía, integridad, capacidad de mando y metafóricamente suficientes ovarios para conducir una nación, pueblo, alcaldía, etc. Los
genitales son exclusivamente órganos reproductores de nuestro organismo y no conductores de gobiernos populares.
En el sistema sátrapa actual en el que permanecemos para hacer una justa equivalencia, irónicamente sugiero cambiar la palabra
"democracia" por los términos de: "falocracia, testículocracia o penecracia" por así sugerir algunas terminologías y dejando a criterio de
cada lectora (persona) más aplicaciones para tal fin, sin embargo democracia encubre al fatídico patriarcado tras una palabra cuyo origen
griego aparentemente los condiciona desde entonces y hasta la actualidad a aplicarlo genéricamente (Que es común o se refiere a un
conjunto de elementos del mismo género).
Por otra parte sería conveniente así mismo aclarar la terminología "Pornocracia" atribuida al gobierno de las cortesanas, cuyo término es
originario según Wikipedia: «Saeculum obscurum» para otras acepciones, véase siglos oscuros. El término pornocracia, acuñado en el
siglo XVI por el cardenal César Baronio, se conoce una etapa de la historia de la Iglesia católica caracterizada por la influencia que sobre el
papado van a ejercer dos mujeres: Teodora, esposa del senador romano Teofilacto I, y la hija de ambos Marozia. Dicho periodo, conocido
como Saeculum obscurum y como "gobierno romano de las cortesanas", se inicia en el año 904 con la elección como papa de Sergio III, y
finaliza en el año 935 cuando el papa Juan XI, hijo de Marozia, y esta misma fueron encarcelados por Alberico II, hijo también de Marozia
fruto de su primer matrimonio.
Por consiguiente si "dama cortesana" es el equivalente en la actualidad a "ramera o meretriz" y por derivación ambas sinónimos de
"prostituta", evidencia que la mujer desde tiempos muy remotos habiendo llegado al poder "a través de…" arroja como resultado final que
su sexualidad es sumamente impugnada y no así la del varón.
eisFluências Junho 2012 | 11
Son estamentos culturales que se vienen arrastrando formativamente desde épocas ancestrales, el resultante de desenmarañar tantos
términos desempoderantes es lograr llegar a la esencia misma de cada mujer en su valoración innegable como integrante de la sociedad
sin segregaciones ni arbitrariedad.
Comencemos a descubrir nuestro propio altruismo.
María Cristina Garay Andrade
Monte Grande – Buenos Aires – Argentina
http://mariacristinadesdemissilencios.blogspot.pt/
ÁMAME POETA
María Cristina Garay Andrade
ESCRIBIR
María Cristina Garay Andrade
Ámame amor sin tiempo y sin cordura
Con esa pasión tan particular y tan sentida
Que marca en mi cuerpo la hermosura
De tus manos recorriendo mi entrega concedida
Escribir tan solo escribir para decir
Escribir desde el alma que no sabe mentir
Escribirle al amor que vive dormido
Escribirle al amigo que te confinó en el olvido
Háblame susurrando despacito melodías
Los ensueños de utopías hechos poesías de amor
Que mi piel sedienta de ti se alimenta con dulzor
De tus versos enaltecidos de caricias todos los días
Escribir en soledad sin que nadie te vea
Escribir por pasión de que alguien te lea
Escribirle al silencio para que te responda
Escribirle a la espina que se clavo muy honda
Bésame con la palabra enternecida
Bésame con la suavidad del alma conmovida
Bésame el corazón que por tu devoción suspira
Bésame con la pluma que con fervor te inspira
Escribir el contenido más profundo y sentido
Escribir para decir adiós por algún motivo
Escribirle al hastío, en un día sombrío
Escribir de corazón al mundo en desafío
Tiéntame a perderme en tus jardines más sublimes
Que entre aromas de rosas, lirios y jazmines
En contemplación mi admiración esgrime
El amarte en silencio cuando sutilmente escribes
Escribir con fervor despojada de falacias
Escribir simplemente dándote gracias
Escribirle a Dios siendo el único testigo
De mi cariño hacia ti poeta, como un mendigo
Escribe humildemente estas palabras
NOTÍCIA
A Revista eisFluências parabeniza o prezado membro do seu
Conselho de Redação, Escritor e Poeta, CARLOS LÚCIO GONTIJO, pelo lançamento do seu Livro
“QUANDO A VEZ É DO MAR”, no passado dia 27 de Abril, em Belo Horizonte, bem como pelo
PRÊMIO MÉRITO LITERÁRIO POETA ANTÔNIO FONSECA, que lhe foi concedido pela Academia
Betinense de Letras (ABEL).
Veja pronunciamento do autor, em:
http://www.youtube.com/watch?v=5IYFSYHpYMw
12 | eisFluências Junho 2012
PATROCÍNIO EM FAMÍLIA
(Artigo exclusivo para a Revista eisFluências)
por Carlos Lúcio Gontijo
Um ditado é certo nesta vida
Sorrir é sempre o melhor remédio
Como a lágrima, não paga dívida
Mas pelo menos nos espanta o tédio.
No livro “Vintém de Cobre”, de Cora Coralina, a festejada poetisa semeou o poema “O poeta e a poesia”, em que assinala: “(...) Poeta é a
sensibilidade acima do vulgar./ Poeta é operário, o artífice da palavra./ E com ela compõe a ourivesaria de um verso./ (...) Poeta, não
somente o que escreve./ É aquele que sente a poesia,/ se extasia sensível ao achado/ de uma rima, à autenticidade de um verso./ O
autêntico sabe que jamais chegará ao prêmio Nobel/ O medíocre se acredita sempre perto dele”.
Não aprendemos com os primeiros passos: o aprendizado é fruto da caminhada que amadurece, substituindo passadas por bater de asas.
Os poetas e pintores descrevem ou desenham o mar e nós escutamos a brisa e o vento movimentando as marés. Os políticos discursam
sobre os oceanos e percebemos o naufrágio das embarcações.
Jesus Cristo, ao reunir os apóstolos em torno de si, nos deixou a prova concreta de que devemos evitar a caminhada solitária, pois tudo
nesta vida deve ser dividido: a vitória em conjunto se transforma em festa de todos, ao passo que o fracasso é inegavelmente menos
doloroso quando contamos com o ombro de algum amigo fraterno.
Não há espaço para lamentar ausência ou indiferença, pois a festa da vida é feita com pessoas que marcam presença e respondem
efetivamente aos nossos apelos ou convites. Por isso, faço absoluta questão de registrar o espontâneo apoio do amigo Olívio dos Santos
Lima, residente em Contagem/MG, um ser humano que me veio pelas mãos do desígnio literário. Ou seja, mais um desconhecido leitor
que entrou em contato e se transformou em amigo do peito. Ele não foi procurado por mim para me apoiar na edição, mas ao tomar
conhecimento de minha luta me telefonou e pediu o número de minha conta bancária, com o objetivo tanto de me ajudar a cobrir os custos
de impressão quanto de expressar a sua amizade e apreço por minha literatura.
Foi dessa forma que ele se juntou a mim (bafejado pela providencial sorte de contar com algum recurso disponível, graças à venda de sítio
de herança, após 22 anos da morte de minha mãe Betty Rodrigues Gontijo, que me socorreu, mesmo habitando os mistérios do invisível).
Minha filha Amanda de Oliveira Gontijo, que me concedeu a glória de experimentar tal gesto em vida. Meu irmão Marcílio Múcio Gontijo,
que pouco tem, mas que muito passou a ter, à medida que se dispôs, sem que nada lhe houvesse pedido, a me ajudar, provando-me que o
apoio advém do verdadeiro desejo interior e não de portentosa riqueza material.
Depois me apareceu o engenheiro Eli Antônio de Oliveira, sobrinho de minha esposa Nina, amigo que muito frequentou a
confraternização vivenciada pela família no Sítio do Choro, próximo de Pedra do Indaiá e Santo Antônio do Monte, e não se fez de rogado.
E em último lugar, porém em iluminado grau de adesão, meu pai (o “paitrocinador”) José Carlos Gontijo, que na realidade puxou a fila,
levado pela sabedoria de seu caminhar de homem de 88 anos, para a materialização deste 14º livro.
É por abençoadas manifestações como essas, que não me recuso a estimular os poetas e escritores que me procuram para elaboração de
prefácio ou a emissão de algum parecer sobre o mundo da literatura, cada vez mais envolto no abissal caos da falta de leitores e da opção
editorial por produtos intelectuais desprovidos de valor capaz de auxiliar na edificação de uma sociedade melhor.
Enfim, ainda bem que o esforço que realizei no transcorrer de minha trajetória é reconhecido por pessoas sensíveis ou por companheiros
de empreitada na área do exercício da arte da palavra escrita, amenizando a triste constatação de que tem gente que não lê nada, que não
prestigia nem apoia qualquer projeto cultural, agindo como se conhecimento e livros não fizessem parte da cesta básica necessária à
sobrevivência digna de todo e qualquer ser humano.
Carlos Lúcio Gontijo
Poeta, escritor e jornalista
www.carlosluciogontijo.jor.br
ESCAFANDRISTA
Carlos Lúcio Gontijo
A VEZ DO MAR
Carlos Lúcio Gontijo
No imenso mar de águas e gente
Viver é tão ingente quanto navegar
Quem não sente o contratempo não caminha
Tudo se aninha ao entender natural da maré
O conhecimento jamais se sobrepõe à fé
É preciso ter fé para aprender o vento
A síntese da matemática não está na exatidão
Já que só é entendida no acerto da repartição
Bom jangadeiro não se dispõe a enfrentar tempestade
Reconhece humildemente quando a vez é do mar
Só os incautos se entregam ao simplismo da vontade
A humanidade não avança pela tecnologia
Mas pela magia multiplicadora da divisão
Mola propulsora da verdadeira felicidade
Quando toda vaidade cede espaço à convivência
Uma ciência dependente do amor ao próximo
Quando eu morrer traga-me o escafandrista
Não me deixe sofrer na mão do médico-legista
Minha alma requer quem entenda de espírito
Alguém com a profundidade mediúnica de Chico Xavier
Capaz de mergulhar em mim com a túnica dos olhos
E me vislumbrar navegando para a prometida eternidade
Remando rumo ao mar de luzes com sobriedade e afã
Como se eu fosse irmão gêmeo de toda manhã!
eisFluências Junho 2012 | 13
FIESTAS DE PRIMAVERA EN ANDALUCÍA
de María Sánchez Fernández
FERIA DE ABRIL EN SEVILLA
Y llegó la primavera… Y se durmió el silencio del duro invierno en su nido vacío
de perfumes y de cálidos gorjeos. Y sueña acurrucado…, vencido…, cansado…
Y despertó la savia, saliendo a la luz como un torito bravo que pinta su bravura
con pinceles y paleta de colores en las plazoletas y en los jardines; en los
parques y en las avenidas; en las almas y en los corazones…
Y Andalucía hierve en azahares y en jazmines; en manzanilla de oro; en trotes
de caballos tordos; en requiebros de miel y luna entre rejas cuajadas de claveles
rojos mientras una copla rasga el aire enredándose en las cuerdas de una
guitarra.
Y las fuentes ríen y las estrellas callan mirando con embeleso a Sevilla que entra
escoltada por alazanes blancos como una reina gitana en su gran feria de abril.
Revuelos de volantes recamados de encajes y lunares pasean a la grupa de
acompasados trotes guiados por juncales mozos tocados con sombrero de ala
ancha, ceñidos por chaquetilla corta y calzados con ricas espuelas de plata;
mantones alfombrados de jardines ciñen con grandes flecos la esbeltez de
cinturas quebradizas; repiqueteos de castañuelas al compás de sevillanas
rompen los silencios de la noche que se ilumina retando a la luna con miles de
farolillos de colores mientras corre el vino fino, el rebujito, la alegría y la copla.
Y Sevilla ríe, como mocita casadera, a la sombra mañanera de los naranjos
cuajados de azahar; entre lluvia de jazmines en el atardecer dorado; entre el
rumor adormecido de las aguas de su río Guadalquivir que abrazan mimosas la
Torre del Oro. ¡Sevilla! ¡Sevilla! Engalanada siempre de sol y piedra enredada de jazmines trepadores; enamorada siempre de su Puente de Triana
mientras se mira en el redondel blanco y albero de la Maestranza.
Y allá, más arriba…La Giralda…
En el alto campanario el Giraldillo vela. Sus pájaros de bronce voltean en la mañana, enloquecidos, cantando con sus picos de badajo bienvenidas
y alboradas entre bandadas de palomas blancas.
¡¡SEVILLA!!
¡Ay, Sevilla…., Sevilla!
Me perderé en tus plazas
cuando el azahar se encienda
en hogueras de nieve.
Cuando el rumor del agua
se funda con el aire
y crines de alazanes,
tan blancos como lunas,
se enreden en los dedos de la tarde.
¡Ay, Sevilla…, Sevilla!
Me perderé en tus calles
cuando el día se apague
y el horizonte prenda
sus candeleros rojos.
Cuando escuche el silencio
de mudos muecines
recitando reclamos
en el alto alminar
de tu vieja mezquita.
¡Ay, Sevilla…, Sevilla!
Me perderé en tus puentes
cuando el alfanje plata
de ese río agareno
te multiplique en risas de colores.
Cuando la noche abra
sus cofres de fragancias
y te lluevan jazmines como vuelos
de mariposas locas.
¡Ay, Sevilla…, Sevilla!
Me perderé en tu alma. ¡Ay, Sevilla!
Sevilla – del poemario “En los silencios del alma”
14 | eisFluências Junho 2012
LA CRUZ DE MAYO EN ANDALUCÍA
*La celebración de la Cruz de Mayo en España es tan antigua que aparece en
todos los calendarios y fuentes litúrgicas mozárabes. Dice la Historia, dentro de
sus matices de leyenda, que el Emperador Constantino, en el sexto año de su
reinado y estando luchando en plena batalla, vio una cruz brillante en el cielo
sobre la cual se distinguían unas palabras “ In hoc signo vinci” (Con esta señal
vencerás) Ordenó construir una cruz de madera que llevaba al frente de su
ejército venciendo así al enemigo. De vuelta a la ciudad averiguó el significado
de la Cruz. Se hizo bautizar en la religión cristiana y mandó edificar numerosos
templos. Su madre, Santa Elena, fue a Jerusalén, a petición de Constantino, y
consiguió de sabios y sacerdotes la confesión del lugar donde crucificaron a
Cristo. Hallaron tres cruces ocultas. Para averiguar cual de ellas era la verdadera
las pusieron una a una sobre un hombre muerto el cual resucitó al serle
impuesta la tercera. Era la cruz de Jesús. Santa Elena murió rogando a todos los
que profesaban la fe cristiana que celebraran la conmemoración del día en que
fue encontrada: el tres de Mayo. Y Andalucía en estos días de avanzada
primavera hierve de flores, de bailes, de música, de convivencia… El día tres de
Mayo se celebrara la gran Fiesta de la Cruz. “La fiesta de las cruces” como la
llama el pueblo llano. Donde el pueblo llano engalana sus calles, sus plazas, sus
patios vecinales, sus jardines… sus corazones. El tres de Mayo en Andalucía!
¡Cualquier rincón es engalanado con una cruz de flores! El vecino se vuelca en
rivalizar con el vecino más próximo. Saca de sus arcas mantones, colchas
floreadas, trajes de flamenca, guitarras, utensilios de cobre heredados de las
abuelas, vajillas de barro de vivos colores, quizás desconchados, pero de alto valor sentimental porque pertenecieron a un tiempo ya pasado… y
tiestos de geranios, de margaritas y de rosas y todo rodea a la Cruz que preside majestuosa el lugar. Allí está erigida, sobre un altar cubierto con
una fina sábana de hilo con rica blonda encajes. Allí está erigida, por una tradición que viene desde muy lejos en el tiempo. Y se arma la fiesta. Y el
día se apaga y se encienden las almas con la llama de la alegría hasta altas horas de la madrugada donde la música acompaña el revuelo de volantes
y el repiqueteo de castañuelas. El rebujito corre de copa en copa y más tarde, cuando el día clarea, el humo pegajoso de las churrerías hace su
llamada matizando el aire con el aroma embriagador del chocolate.
Y llega el cuatro de Mayo y todo rincón es desarmado con el mismo amor que se armó.
Y la Fiesta de la Cruz seguirá…, y seguirá cada año mientras el alma de la gente sepa respetar la cultura y las tradiciones de su pueblo.
LA ROMERÍA DEL ROCÍO
¡¡Y el Rocío!! Los caminitos que llevan a Huelva se olvidan del polvo y del calor y
se alfombran de carretas enjaezadas por pacíficos y adornados bueyes; por
guirnaldas de flores y cintas de colores; por coplas y sevillanas; por batas de
flamenca; por botas camperas y sombreros del más puro estilo andaluz; por
requiebros y guitarras; por sudor y fina manzanilla; por risas y lágrimas…, sí
también lágrimas, ¡¡ son tantas las promesas del romero al hacer el camino hasta
El Rocío!!
La aldea de Almonte se vuelve gran ciudad al ser la casa grande de miles de
personas que van a honrar a la Blanca Paloma en esos días en que el sol también
está de fiesta. Numerosas hermandades rocieras se dan cita cada año y se
encuentran; se saludan; se abrazan como un deber que hay que cumplir; como
un fraternal homenaje de amor a la Virgen del Rocío.
Y María sale de su Santuario a dar un paseíto sobre su trono de flores mientras
cientos de brazos se alzan hacia Ella porque quieren tocarla; sentirla más
cercana. Y la Virgen sonríe contenta, como una romera más, mientras es bamboleada y jaleada y llevada casi al vuelo por el sentir popular.
Allá en las alturas, el aire que mece las marismas matiza las voces exaltadas de las gentes que invocan a la Virgen del Rocío; a la Blanca Paloma.
Cuando la algarabía termina y el cuerpo pide descanso el alma del romero sueña su regreso. Sueña que pronto llegará otra cita…, otro nuevo año.
FESTIVALES DE MÚSICA Y DANZA
La primavera se cierra con un broche de alta joyería. En las ciudades de Granada y Úbeda se celebran en los meses de
Mayo y Junio los ya legendarios Festivales de Música y Danza.
En Granada dentro del maravilloso entorno de la Alhambra o el Jeneralife. Allí la música se mezcla con el murmullo de las
fuentes y el rumor de sus jardines morunos. En Úbeda se expande en sus patios renacentistas o se encierra recatada en el
soberbio marco de numerosos palacios de piedra dorada y luminosa; tallada y viva. Allí la música y la danza se recuestan
y tienen ensoñaciones de siglos.
Nos visitan los más prestigiosos artistas de fama internacional como grandes orquestas sinfónicas; orquestas de cámara;
solistas; maravillosos ballets…
Convivimos día tras día en elevados diálogos de alma con alma, con Beethoven, con Mozart, con Bach, con Tchaikovsky,
con Laló, con Haydn; con Stravinsky; con Sibelius; con Manuel de Falla…
Este año el festival de Música y Danza de Úbeda está dedicado al compositor gaditano Manuel de Falla. Podremos
deleitarnos entre otras de sus muchas obras con EL AMOR BRUJO; EL SOMBRERO DE TRES PICOS; EL RETABLO DE
MAESE PEDRO; NOCHES EN LOS JARDINES DE ESPAÑA… ¡Qué maravilla amigos! ¡Tener la música viva, palpitante,
tan cerca, al alcance de nuestros sentidos!
Y la primavera termina en Andalucía con un regusto de fiesta, de convivencia, de alegría, de hermandad, de saber estar. Con un regusto de
elevación del alma que alcanza también el misticismo. La música es su colofón; su rúbrica.
¡¡Andalucía es así!!
Una edición de
María Sánchez Fernández
Úbeda – España 2012
eisFluências Junho 2012 | 15
Rivkah Cohen
Suas Prosas e Poesias
Sou Rivkah,
Rivkah no Brasil é Rebeca, na Itália
é Regina, na França é Rejane.....
Geminiana, com Ascendente em
Gêmeos também, sou uma pessoa
muito voltada a tudo na vida.
Fiz Ciências Sociais, mas gosto
muito do Estudo Esotérico. Estudei
sobre BhavaChakra, Arqueômetro e
a Kabalah.
Meu interesse é pela evolução do
espírito, pois acho que estamos
aqui para crescer espiritualmente.
Como boa geminiana que sou, amo
duas Pátrias, o Brasil e Israel e
pertenço aos dois.
Resido em Brasília e sinto como se fosse minha terra natal. Há
quem a critique, pois não sabe compreendê-la, mas Brasília não é só
o Governo que aqui está sediado, Brasília é a confluência do Brasil,
mas além de tudo, seus habitantes, é a feliz visão de Don Bosco e
justamente desse maravilhoso lugar que avisto o mundo e daqui
escrevo.
Sempre fui de jogos, competições atléticas,
disputas em geral.
Na verdade,
enquanto as meninas de minha
idade trocavam de namorados
eu só queria saber de jogos
e colecionar medalhas.
Como não sou grande,
parecia mais uma moleca,
enquanto as outras
se preocupavam em cruzar
as pernas na hora certa
para chamar atenção dos rapazes.
Teve um ano que consegui onze medalhas
e isso era a glória para mim,
em compensação tinha que estudar muito,
pois não tinha "colher de chá" nas provas orais.
Sempre detestei História!
Lia, lia e pensava...
Isso aconteceu nada!
Quem ganha é que conta a história
e quem me garante que isso é real?!
Prova final.....
Estudei horrores sobre a história da Rússia.
Coloquei na cabeça
que era isso que ia cair para mim,
tenho essas manias...
Como meu nome começa com R eu era uma das últimas
e estava só reparando que cada uma que ia lá,
dava uma cruzada de pernas
e as perguntas eram as mais corriqueiras possíveis
e eu ficando quente da cara com aquilo.
Até que chegou minha vez...
Fechei a cara,
não dei o risinho das anteriores
e não cruzei perna nenhuma!
Aí só escutei a sentença:
Rivkah....
falemos sobre Revolução Francesa!!!!
Claro que me ferrei,
mas com a prova escrita
passei raspando, como sempre eram minhas notas
de História.
Anos passaram,
já não era mais aquela moleca,
e quem eu vejo?
O famigerado professor de história!
Ele não me reconheceu, é claro!
Veio com um olhar de
"sou mais eu"
e me disse:
Não nos conhecemos de algum lugar?
Sou Rivkah,
quer falar sobre Revolução Francesa, SENHOR!
É....
um dia é da caça
e o outro é do caçador.
No meu caso,
o caçador se deu mal do final..
Rivka Cohen
Brasília/BR
ISRAEL
por Rivkah Cohen
Seu nome significa 'venceu com (Yisrah) D'us (El)', em hebraico.
Israel é também o segundo nome do patriarca Jacó, cujos
descendentes, na tradição hebraica, são chamados bnei Yisra'el,
'filhos de Israel'.
O registro histórico mais antigo que se conhece sobre o nome Israel
está mencionado na Estela de Merneptah (num poema dedicado ao
faraó Merneptah), em que o nome é associado a um povo, mas não a
uma localização geográfica. Ao que se sabe, o Povo de Israel surgiu de
grupos nômades que habitavam a Mesopotâmia há cerca de cinco mil
anos.
No fim do século XVII a.C., este povo foi atacado e escravizado pelos
egípcios. Após o fim do cativeiro no Egito, os hebreus vagaram pela
região da Península do Sinai até que reconquistaram, sob o comando
do rei Saul, uma parte de seu território original, as terras de Canaã,
por volta de 1029 a.C.. Saul foi sucedido por David, em torno do ano
1000 a.C., que expandiu o território de Israel e conquistou a cidade de
Jerusalém, onde instalou a capital do seu reino. Israel alcançou seu
apogeu durante o reinado de Salomão, entre os anos 966 a.C. e 926
a.C.. Porém, pouco depois do fim do reinado de Salomão, Israel foi
dividido em dois: a Norte, o Reino das Dez Tribos, também chamado
de Reino de Israel, e ao Sul, o Reino das Duas Tribos, também
chamado de Reino de Judá, cuja capital ficou sendo Jerusalém - do
nome Judá nasceram as denominações: judeu e judaísmo.
Entretanto, o território dos judeus foi sendo conquistado e
influenciado por diversas potências de sua época, entre elas: assírios,
persas, gregos, selêucidas e romanos.
Em 586 a.C. o imperador Nabucodonosor invadiu Jerusalém e
obrigou os israelitas ao exílio. Levados à força para a Babilônia, os
prisioneiros de Judá e Israel passaram cerca de 50 anos como
escravos sob o domínio dos babilônios. O fim do Primeiro Êxodo
possibilitou a volta dos israelitas a Jerusalém, que foi reconstruída.
Mais tarde, os romanos invadiram e dominaram a região e
estabeleceram que o reino judeu seria seu protetorado. A primeira
grande revolta contra o domínio romano e sua intromissão nos
assuntos religiosos se iniciou no ano 66 e durou até 70 d.C., quando o
general Tito invadiu a região e destruiu Jerusalém e o seu Templo. A
região então foi transformada em província romana e batizada com o
nome de Provincia Judaea. A segunda e última rebelião contra os
romanos foi a Revolta de Bar Kochba. A rebelião foi esmagada pelo
imperador Adriano em 135 d.C. e os judeus sobreviventes foram feitos
escravos e expulsos de sua terra, na chamada 'diáspora'. Naquele
mesmo ano, Adriano rebatizou a Provincia Judaea para Provincia
Siria Palaestina, um nome grego derivado de 'Filistéia' como tentativa
de desligar a terra de seu passado judaico. A Mishná e o Talmude
Yerushalmi (dois dos textos sagrados judaicos mais importantes)
foram escritos na região neste período.
Depois dos romanos os bizantinos e posteriormente os muçulmanos
conquistaram a Palestina em 638. Seu território foi controlado por
diferentes Estados muçulmanos ao longo dos séculos (à exceção do
controle dos cristãos cruzados, no Século XI) até fazer parte do
Império Otomano, entre 1517 e 1917.
O sionismo (termo derivado de Sion, nome de uma colina da antiga
Jerusalém), surgiu na Europa em meados do século XVII.
Inicialmente de caráter religioso, pregava a volta dos judeus à Terra
de Israel, como forma de se proteger sua religião e cultura ancestral.
Entre os séculos XIII e XIX o número de judeus que fizeram aliá (ato
de um judeu imigrar para a Terra Santa) foi constante e sempre
crescente, estimulado por periódicos surgimentos de crenças
messiânicas e de perseguições anti-judaicas. Estas perseguições
tinham quase sempre um caráter político-religioso. Os judeus que
retornaram à Palestina se estabeleceram principalmente em
Jerusalém, mas também desenvolveram significativos centros em
outras cidades nos arredores. Os judeus já eram a maioria da
16 | eisFluências Junho 2012
população de Jerusalém no ano de 1844, convivendo com
muçulmanos, cristãos, armênios, gregos e outras minorias, sob o
domínio turco-otomano. A estes migrantes religiosos foram se juntar
os primeiros migrantes seculares a partir da segunda metade do
século. Eram em geral judeus da Europa Central e adeptos de
ideologias socialistas. Porém, o sionismo moderno - fundado por
Theodor Herzl, a partir de 1896 - aos poucos foi ganhando peso entre
os judeus de outras partes do mundo. Começaram então novas ondas
de imigrações judaicas para a província palestina, com os que lá
chegavam adquirindo terras dos árabes e estabelecendo colônias e
fazendas coletivas (Kibutsim).
A escolha da causa sionista pelo território da então província palestina
derivava de todo o significado cultural e histórico que a antiga Israel
bíblica possuía para o povo judeu. Os sionistas defendiam a criação de
um estado judaico em todo o território original de Israel, o que
incluiria hoje a atual Jordânia, embora propostas de cessão de
territórios na Patagônia, no Chipre e em Uganda tenham sido
estudadas.
Ao término da Segunda Guerra Mundial, com a Europa destruída e os
sentimentos anti-semitas ainda exaltados, milhões de judeus de todo
o mundo se uniram aos sionistas na Palestina. Mas a política de
restrição à imigração judaica foi mantida pelo Mandato Britânico.
Como forma de burlar as determinações inglesas, grupos militantes
judaicos sionistas procuravam infiltrar clandestinamente o maior
número possível de refugiados judeus na Palestina. Enquanto isso,
retomavam os ataques contra alvos britânicos e repeliam ações
violentas dos nacionalistas árabes. Como as pressões foram se
avolumando, a Grã-Bretanha decidiu abrir mão da administração da
Palestina e entregou a administração da região à Organização das
Nações Unidas (ONU).
O aumento dos conflitos entre judeus, ingleses e árabes forçou a
reunião da Assembléia Geral da ONU, realizada em 29 de novembro
de 1947 e presidida pelo brasileiro Osvaldo Aranha, que decidiu pela
divisão da Palestina Britânica em dois estados, um judeu e outro
árabe, que deveriam formar uma união econômica e aduaneira. A
decisão foi aceita pela maioria das lideranças sionistas, embora tenha
recebido críticas de outras organizações, por não permitir o
estabelecimento do estado judeu em toda a Palestina. Mas a Liga
Árabe não aceitou o plano de partilha. Eclodiu então um conflito
armado entre judeus e árabes.
Em 14 de maio de 1948, algumas horas antes do término do mandato
britânico sobre a Palestina, David Ben Gurion assinou a Declaração de
Independência do Estado de Israel. Em janeiro de 1949, Israel
realizou suas primeiras eleições parlamentares e aprovou leis para
assegurar o controle educacional, além do direito de retorno ao país
para todos os judeus. No período entre a Declaração de
Independência e a Guerra de Independência, Israel recebeu cerca de
850 mil imigrantes, em especial sobreviventes de guerra e judeus
oriundos dos países árabes (Sefaraditas e Mizrahim). A Guerra dos
Seis Dias (de 5 a 10 de junho de 1967) gerou uma onda de antijudaísmo nos países sob a esfera de influência soviética. Os judeus da
União Soviética eram proibidos de deixar o país, mas a partir de 1969 a
reivindicação dos judeus soviéticos pelo direito a imigração
possibilitou um ligeiro incremento no número destes em Israel. Na
Polônia, em 1967, mais de cinco mil judeus imigraram. Até 1973, ano
da Guerra do Yom Kippur, 260 mil judeus desembarcaram em Israel,
a maioria de países socialistas. Atualmente Israel vive um intenso
conflito armado contra seus vizinhos árabes, e mesmo assim sua
economia floresce. (extraído de
http://www.ibge.gov.br/paisesat/main.php)
Este símbolo tem várias conotações místicas, como as que referem a
união do poder divino, o Céu, para o qual aponta um dos triângulos e a
Terra no qual aponta o outro triângulo. Na bandeira, a Estrela de
David se encontra entre duas faixas azuis sob um campo branco. A
disposição das faixas segue o modelo do Talit, o manto ritual de
orações.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Bandeira_de_Israel)
Rivkah Cohen
http://www.rivkah.com.br/
Quem sabe
esse encontro que não houve,
o olhar para o nada,
esse vazio que ninguém soube,
a ausência amarga,
essa falta de um bom riso,
um dia possa mudar?
Bandeira de Israel
Tratando-se de um país novo, os judeus
dispersos pelo mundo reavivaram o Idioma
assim como seus símbolos nacionais, dos
mais simples a Estrela-de-David, cujo
significado de cada ponta é um dos
patriarcas do povo Judeu, (entre outras
teorias) teria sua origem no fato de David,
após a vitória numa guerra, ter mandado
mesclar dois Dalet (o "D" hebraico, de seu nome, e que tem a forma de
um triângulo).
Rivkah Cohen
http://www.rivkah.com.br/
Bobagem minha!
Não liga
para o champagne aberto,
às taças arrumadas,
bobagem minha..
Só não quero
que falte nada,
muito menos
que fiquem vazias.
A economia de guerra,
estou ciente,
deixou seqüela
difícil de superar,
por isso o receio
e antes que não tenha
ou que alguém se ausente,
vem esse louco desejo de brindar!
Você não entende
e jamais entenderá..
São dores que se enraizaram,
fizeram seus galhos
e ficam pela mente
a questionar:
Haverá tempo?
Estaremos presentes?
Dúvidas que germinam
sem que se queira pensar!
Bobagem minha,
se não for em minha companhia
sempre haverá com quem brindar..
rivkahcohen
***
Quem sabe?
No tempo um encontro marcado,
lembranças chegam antes da mão se tocar,
uma eternidade ignora a nossa urgência,
pesadas distâncias nos impedem de chegar.....
Quem sabe numa próxima vivência,
não tenhamos que esperar?
Quem sabe
um dia fale de encontros,
de realização de sonhos,
não fale sou, mas "somos",
do amor que suponho
e ao mundo possa contar?
Quem sabe?
rivkahcohen
eisFluências Junho 2012 | 17
As almas vêm em grupos
Rivkah Cohen
Apesar de todo contratempo
Rivkah Cohen
Não é à toa que as identificações ocorrem.
Não é à toa que gostamos de certas pessoas.
Mesmo sentindo que as lembranças fogem,
nos harmonizamos quando seu nome soa.
Em um solo vermelho,
surgi..
De manhã
o sol açoitava,
de noite,
tremendamente frio.
O vento
que por ali passava
chegou a parar,
quis me afastar
ou me arrastar dali.
Pelos meus pés
a terra caminhava,
parecendo
não dar sustento a nada
e apesar
de toda adversidade,
permaneci.
Acostumei-me
a olhar as manhãs
e fechar-me
nas madrugadas.
Um dia,
aproveitei
a terra orvalhada
e me ergui.
Hoje, radiante,
danço com o vento,
fito o sol que me dá
uma sombra pequena.
A noite, o sereno,
meu rosto molha
para que eu possa dormir
e apesar de todo contratempo,
meio faceira,
meio dengosa,
digo a quem me olha:
SOBREVIVI!
Não precisamos nem ver-lhe o rosto,
pois sabemos dela gostar.
No meio da multidão, aposto,
saberíamos nos identificar.
Assim como os mergulhadores buscam as pérolas
e elas se deixam encontrar,
vamos pela vida encontrando as almas
para com elas nos harmonizar.
***
A LOUCA
Rivkah Cohen
Fechem portas e janelas
que ela vai chegar!
Vem falando
sobre o que não existe mais.
Vem com idéias loucas
Prendam-na
antes que seja tarde demais!
Pronto!
A levaram!
Todos estão livres!
Só falta condenar!
Antes de ir à forca
Perguntaram ao primeiro...
Qual seu desejo antes de morrer?
Quero cantar La Marseillaise
responde o rapaz
e cantou...
Ao perguntar à louca
ela gritou:
QUERO FALAR DE PAZ!
RUBÊNIO MARCELO, um expoente das letras
brasileiras. (finalização)
por Marco Bastos
Rubenio Marcelo, que tem o soneto como uma das suas composições
poéticas preferidas, assim enfatiza: “Gosto de comparar o soneto a
uma gaiola encantada que nos prende, mas nos fascina pelo desvelo
da liberdade buscada através da procura do belo na precisão da
mensagem poética. Vezes, pensa-se que se tem o domínio do soneto,
porém sempre temos que ser conscientes de que é preciso muita
afinidade com as musas do parnaso para que consigamos, assim,
vislumbrar uma justa e perfeita luz brotando dos quatorze vitrais
daquele misterioso templo”. Aliás, em seu “Soneto Sonâmbulo”,
Rubenio Marcelo denota a sua profunda identificação com esta arte
poética:
“À noite - enquanto eu durmo - o meu soneto
sorri de mim e sai em grã jornada...
Contempla a vastidão da madrugada
e vai errando os erros que eu cometo...
Ao som transcendental de um minueto,
segue altaneiro na fragosa escada...
Alcança o topo azul da caminhada
e vê pulsar ao longe um amuleto...
Ele - em fascínio - do mirante pula,
levita, e sonha, e sangra, e perambula,
mas sempre volta... Sim, ele não tarda!
Rivka Cohen
Brasília/BR
http://www.rivkah.com.br/
Assim, sem nem tocar a campainha,
ele retorna e, bem de manhãzinha,
já está comigo... Ah meu anjo da guarda!”
Produção literária no MS:
Neste tocante, assevera Rubenio Marcelo: “No nosso Estado do Mato
Grosso do Sul, temos uma produção fértil e diversificada de criações
literárias: obras em verso e prosa produzidas, geralmente, de maneira
independente. A quantidade de lançamentos é considerável. Temos
algumas editoras especializadas nestas edições, e os Fundos Estadual
e Municipal de Cultura (respectivamente FIC/MS e FMIC) que – de
certa forma – têm aprovado projetos específicos e publicado livros de
bons autores regionais. O que se precisa é de maiores incentivos
institucionais e a ampliação de recursos destinados a programas
visando o efetivo fomento da literatura estadual. Ressalte-se também
o elogiável trabalho do Instituto Histórico e Geográfico de Mato
Grosso do Sul – que inaugurou, há pouco tempo, a Sala do Escritor
Sul-Mato-Grossense (com a finalidade de expor obras regionais) – e
que tem resgatado parte relevante da história e memória do Estado
(publicando importantes volumes específicos, através de excelentes
edições e reedições).
Dentre os diversos livros lançados no MS, no ano de 2011, dois
trataram especificamente da Literatura Estadual. Foram eles:
1) "A Literatura Sul-Mato-Grossense na ótica de seus
Construtores” (Ed. Life, 352 páginas), da autoria das
escritoras/professoras Maria da Glória Sá Rosa e Albana Xavier
Nogueira. Esta obra , que foi publicada com apoio do FIC/MS e tem
18 | eisFluências Junho 2012
Prefácio do escritor José Fernandes (Doutor em Letras pela UFRJ e
membro da Academia Goiana de Letras), enfoca 21 escritores e 4
críticos literários do Estado (Escritores: Manoel de Barros, Abílio de
Barros, Adair José de Aguiar, Augusto César Proença, Brígido
Ibanhes, Cláudio Valério da Silva, Emmanuel Marinho, Flora Thomé,
Geraldo Ramon Pereira, Guimarães Rocha, Heliophar Serra,
Henrique de Medeiros, José Couto V. Pontes, José Pedro Frazão,
Lucilene Machado, Orlando Antunes Batista, Raquel Naveira,
Reginaldo Araújo, Rubenio Marcelo, Samuel Medeiros e Thereza
Hilcar. Críticos Literários: Afonso de Castro, Marcelo Marinho, Maria
Adélia Menegazzo e Paulo Nolasco). "Além de cristalizar aspectos
existenciais revelados pelos escritores que figuram nesta obra,
imprescindíveis a uma análise profunda de componentes intrínsecos
às suas produções, este livro de Albana Xavier Nogueira e Maria da
Glória Sá Rosa abre caminhos para pesquisas futuras (...)", assim
afirmou o professor e escritor José Fernandes num dos trechos do seu
prefácio. Já a autora Maria da Glória Sá Rosa, em texto seu publicado
acerca do livro, expressou: "A presente obra brotou do desejo de
caminhar ombro a ombro com os sujeitos da pesquisa, os criadores
de histórias, poemas, contos, numa tentativa de desbravar os
caminhos da escrita pela força de depoimentos em que a memória
organizou, de forma cronológica, as lembranças definidoras dos
traços distintivos de uma literatura multifacetada, onde cabem
influências de toda ordem. De certa forma, foi uma viagem ao reino
dos mitos, à descoberta do “quem das coisas”, diálogo dos avessos,
que se escondem no interior das palavras".
2) “Grandezas da Literatura Sul-Mato-Grossense” (Ed. Life,
312 páginas), da autoria do poeta escritor e acadêmico Guimarães
Rocha. Patrocinado pelo FIC/MS, o livro timbra o reconhecimento de
grandes vultos da literatura e de escritores da atualidade (membros
da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras), tendo sido prefaciado
pelo acadêmico José Couto Vieira Pontes, e apresentado pelo
professor Orlando Mongelli. Vieira Pontes reconhece no livro “Um
esforço bem sucedido, digno de um grande resultado”, e Mongelli
assegura que a obra representa um “Trabalho de vulto, dirigido,
com habilidade, perscrutado no mais íntimo dos trabalhos dos
denodados acadêmicos”. Já o escritor e acadêmico Américo Calheiros
(atual presidente da Fundação de Cultura do Estado de Mato Grosso
do Sul) afirma “ser uma obra referencial que tem foco centrado na
Academia Sul-Mato-Grossense de Letras e seus 40 anos de
existência”. A obra possui ilustrações feitas a crayon por Fausto
Furlan.”
Posse na ASL:
No ano de 2002, indicado pelos acadêmicos Geraldo Ramon Pereira,
Jorge Antônio Siufi (de saudosa memória) e Reginaldo Araújo,
Rubenio Marcelo concorreu à Academia Sul-Mato-Grossense de
Letras e foi
eleito (por unanimidade), assumindo a titularidade da cadeira 35 da
ASL (cujo patrono é Múcio Teixeira). A posse solene ocorreu na noite
de 27 de setembro de 2002. Sobre este acontecimento, Rubenio
expressa no soneto “Meu Tributo à Academia”:
Foi numa sexta-feira, vinte e sete,
Ano dois mil e dois, mês de setembro.
Inesquecível noite... Não deslembro:
Eu e minha emoção, num tête-à-tête.
Rejubilado, ouvi a grã claquete
Do Sodalício que me dava assento.
E logo, em fraternal acolhimento,
Eu fui saudado pelo egrégio escrete.
Em seguida, e contendo a emoção,
Solenemente, alcei minha oração
Perante o silogeu em sãos auspícios...
– Tenho poucos amores nesta vida.
E esta Casa de Ulisses consolida
Um destes meus amores vitalícios!
Voo de Polens – 100 sonetos & outros rebentos
poéticos
(novo livro de Rubenio Marcelo, lançamento em
10/04/2012):Projeto aprovado pelo FMIC (Fundo Municipal de
Investimentos Culturais – Fundação Municipal de Cultura de Campo
Grande/MS). Livro (poesia), 192 páginas, 100 sonetos e 40 poemas de
versos livres. Editora Life.
Prefácio de Astenio Cesar Fernandes (Academia Paraibana de Letras).
Apresentação de José Couto Vieira Pontes (da Academia Sul-MatoGrossense de Letras). Breves comentários de escritores nacionais e
críticos de arte, dentre os quais Marco Bastos.
Prefácio do Livro Voo de Polens:
NA FINA POEIRA, A LEVITAÇÃO ANÍMICA
Os prefácios, disse Otto Maria Carpeaux (1900 – 1978), também têm
seus destinos. Quando o importante poeta e jornalista francês
Théophile Gautier (1811 – 1872) prefaciou Les fleurs du mal, do ainda
desconhecido poeta Charles Baudelaire (1821 – 1867), não percebeu
que recomendava obra de um dos maiores poetas de todos os tempos.
Fácil é entender a responsabilidade de quem dá conhecimento a uma
obra, retratando o artista em um texto introdutório. O prefácio
representa, apenas, um item da obra. Não deve ser tão extenso como
aquele, monumental e singular, de Jean-Paul Sartre (1905 – 1980),
“Saint Genet, ator e mártir”, convertido no primeiro volume de Obras
completas de Jean Genet (1910 – 1986), escritor, poeta e dramaturgo
francês.
"Voo de polens - 100 sonetos e outros rebentos poéticos", sem dúvida,
é um livro promissor no contexto do admirável trabalho literário de
Rubenio Marcelo, poeta, escritor e compositor. Entre os seus livros de
poesia, destacam-se também “Graal das metáforas - sonetos e outros
poemas” e “Uma saga do cotidiano”. Tive o prazer de apresentar as
duas obras, respectivamente, em João Pessoa e Campo Grande.
Quando residiu no Estado da Paraíba, Rubenio travou amizade com
Ronaldo Cunha Lima, seu poeta guru e ex-governador do Estado.
Atualmente, tem nos visitado com frequência, lançando livros,
viajando pelo interior ao lado do médico-poeta Fernando Cunha
Lima, participando de ágapes na residência do cronista e poeta
Damião Cavalcanti, interagindo com confrades da Academia
Paraibana de Letras.
Não é difícil, por conseguinte, aclamar o poeta cearense que ganhou a
graça, ao viver na bela capital de Mato Grosso do Sul, Campo Grande.
É membro titular do Conselho de Cultura do Estado, bem como das
Academias Maçônica de Letras de MS e Sul-Mato-Grossense de
Letras. É ainda cidadão honorário sul-mato-grossense, cidadão
honorário campo-grandense e cidadão honorário anastaciano.
Poeta, Rubenio Marcelo usa o soneto como gênero literário predileto
e, através dele, se expressa com desenvoltura e beleza. Sua poesia é
essencialmente lírica, emotiva, provindo do seu íntimo. É diferente da
poesia substantiva, próxima da prosa, vista em Drummond e João
Cabral, ícones da poesia brasileira. Rubenio consegue ser confessional
sem ser piegas. Admiro a sua poesia, mesmo quando assemelhada a
uma confissão, por ser expressão do seu mundo exterior, mas
indissociável de sua personalidade. Como prova disso, transcrevo o
seu poema abaixo:
PECADO
Preso ao pecado que trago latente
em minha mente, vou rumo ao penedo
onde eu esmago o meu corpo dolente
que se ressente de um ditoso enredo...
Às vezes sonho livre da corrente,
na senda ardente que eu sempre enveredo...
Porém cansado, ante o cruel tridente,
eu sigo em frente neste meu degredo.
Carrego em mim a marca da peçonha
que não conhece a minha alma risonha
e vai traçando um destino infecundo...
Tecendo a herança deste meu pecado,
assim me encontro para sempre atado
ao tal pecado que eu herdei do mundo.
Sobre a importância da forma, enfatiza Leonor Scliar Cabral: “Não
mitifico o exercício da poesia: é um trabalho que exige domínio formal.
É preciso que o poeta esteja consciente do seu ofício: o que quer dizer,
mas principalmente como. Dominar as formas que transpõem a
palavra-comunicação para o estético, eis o fazer poético”. A inspiração
de Rubenio Marcelo é pautada por um jogo entre emoção e razão, sem
olvidar o domínio formal. Sua poesia conjuga inspiração e arte.Neste
novo livro, Rubenio acrescenta outros rebentos permanecendo lírico,
por exemplo, no poema Transcender:
eisFluências Junho 2012 | 19
“Eu vivo o cio/ da visão do
enlevo/ e vivencio/ aquilo
que escrevo.../ Assim, exofício/ eu vi vencido/ o meu
cilício”. Elegi como exemplo
este poema conciso.
Todavia, observo em todos
os outros a expressão do
mesmo vate emocional e
incontido, refletido nos
sonetos.
Admiro a poesia de Rubenio
Marcelo porque ela exercita
a fé e a crença de quem
registra caminhadas e
emoções, deixando pegadas
de seus pés no chão de seu
mundo. Pés que preferem o
barro cru aos cristais,
submetidos ao pensamento
de Michel de Montaigne
(1533 – 1592), que afirmou
ser ele a matéria do seu livro.
o Cel. Agostinho Perlingeiro Perissé, comandante da Base Aérea de
Campo Grande; Antônio Mendes Canale, prefeito Municipal de
Campo Grande; Humberto Canale Neto, presidente da Câmara
Municipal de Campo Grande; Dr. Athayde Nery de Freitas, juiz de
Direito, ; Assaf Trad, cônsul do Líbano; João Batista Fernandes,
cônsul de Portugal; Armando Silvestrini, cônsul da Itália; Dr.
Arnaldo Estevão d e Figueiredoex-governador de Mato Grosso; Cel.
Afrânio Fialho de Figueiredo e Cel. José de Oliveira Lavor, da 9ª
Região Militar; Horácio Lemos, do comércio e pecuária sul-matogrossenses; Sras. Constança Correa Serra e Marly Serra, esposa e filha
do inesquecível fundador da ASL; Noninho e Gisele, netos de Ulisses
Serra. Após a solenidade no Hotel Campo Grande, houve uma
confraternização no Rádio Clube. Os escritores Ivan Lins e Hernani
Donato receberam várias homenagens dos homens de letras e da
sociedade de Campo Grande. Hernani Donato, em seu discurso,
afirmou: 'Esta Academia vem para afirmar-se, destruindo alguns
tabus. Pois ela tem o atrevimento de instalar-se numa sexta-feira,
dia treze, ostentando o talento de quatro mulheres,
excepcionalmente bem dotadas para o ofício literário'. Realmente, a
Academia Sul-Mato-Grossense de Letras, antecipando-se à escolha
pela Academia Brasileira de Letras da escritora Raquel de Queiroz, já
em 1971 admitia em seus quadros Oliva Enciso, Inah Machado
Metello, Henedina Hugo Rodrigues e Maria da Glória Sá Rosa,
tornando-se pioneira nacional na quebra deste tabu.”
Atualmente, a ASL possui sua sede própria à Rua Rui Barbosa nº 2624
– Centro – Campo Grande/MS, atendendo, como referência cultural,
a todos que buscam seus serviços, principalmente sua biblioteca e
acadêmicos (para entrevistas e solicitações de palestras e
apresentações). Na manhã do dia 14/12/2011, com a presença de
acadêmicos e autoridades convidadas, houve o lançamento da Pedra
Fundamental da nova sede da Academia Sul-Mato-Grossense de
Letras (local: Rua 14 de Julho em frente ao nº 4668 – Campo
Grande/MS), em terreno da entidade.
Aprecio a poesia lírica, porque entendo ser ela uma expressão de
fenômeno misto: endógeno e exógeno. Já a poesia substantiva, seca,
chamada antilírica, não expõe a intimidade do poeta. Mas, mesmo
voltando-se para fora, o poeta
não se afasta de emoções do seu
eu, jamais, embora seja um
desmedido fingidor.
Inegavelmente, os prefácios têm
os seus destinos. Théophile
Gautier prefaciou o grande
Charles Baudelaire e se
imortalizou mais que em todos
os seus poemas. Hoje, muito
além dos meus modestos versos,
penetro nuvens, voejo em polens metafísicos. Com Rubenio Marcelo,
levito em arroubo anímico, acima da terra, em busca dos céus!...
A ASL mantém projetos tradicionais importantes como o “Concurso
de Contos Ulisses Serra” (que possui inscrições gratuitas e é destinado
a escritores de MS), o “Chá Acadêmico” (que acontece sempre na
última segunda-feira de cada mês, apresentando uma palestra de
interesse da sociedade), o “Suplemento Cultural” (publicado aos
sábados no Jornal Correio do Estado) e a “Revista da ASL” (que já vai
na sua 20ª edição), dentre outros.
Astenio Cesar Fernandes
Médico e poeta - Membro da Academia Paraibana de
Letras
Da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras (ASL):
A atual diretoria da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras é assim
constituída: Presidente - acad. Reginaldo Alves de Araújo; Vicepresidente - acad. Abrão Razuk; Secretário-geral - acad. Rubenio
Marcelo; Secretário - acad. José Pedro Frazão; Tesoureiro - acad.
Francisco Albuquerque Palhano; e Segundo-tesoureiro – acad. Enilda
Mougenot Pires.
Comemorou – em 30/10/2011 – o seu 40º aniversário de fundação.
Nascida à sombra de uma árvore, em Campo Grande, no dia 30 de
outubro de 1971, na estância Gisele (de propriedade do saudoso
escritor Ulisses Serra), a ASL – o mais alto e representativo Sodalício
Literário do Estado – mantém ao longo da sua existência uma história
marcante voltada para a defesa do vernáculo e o cultivo da autêntica
arte literária, zelando e incentivando todas as derivações da cultura
nacional e estadual.
Maiores detalhes e informações encontram-se no site oficial da
instituição: www.acletrasms.com.br .
Fundada pelos ilustres escritores Ulisses Serra, Germano Barros de
Souza e José Couto Vieira Pontes, a instalação oficial da Academia
Sul-Mato-Grossense de Letras se deu numa sexta-feira 13 (noite de 13
de outubro de 1972). A ausência mais sentida por todos, nesta
solenidade, foi exatamente a de Ulisses Serra: o principal idealizador
da entidade falecera a 30 de junho de 1972.
Altaneiras formigas, calmamente,
Amanhecem cumprindo o dom da sina;
Com destrezas, vão indo, em disciplina,
Tecendo os seus misteres, sempre em frente...
Sobre este importante evento histórico, o eminente
acadêmico/fundador José Couto V. Pontes assim escreveu: “A
instalação da ASL – no dia 13.10.72, então Academia de Letras e
História de Campo Grande – revestiu-se de inegável pompa. Estavam
presentes, no salão nobre do Hotel Campo Grande, o acadêmico Ivan
Lins, representante da Academia Brasileira de Letras (ABL); o
escritor Hernâni Donato, da Academia Paulista de Letras; Hugo
Pereira do Vale, da Academia Mato-Grossense de Letras; acadêmico
Paulo Coelho Machado, representante do Dr. José Fragelli,
governador de Mato Grosso; o General Reynaldo Mello de Almeida,
comandante da 9ª Região Militar; o General Heitor Luis de Almeida,
comandante da 4ª Divisão de Cavalaria;
Dois sonetos e dois poemas inéditos (do livro “Voo de
Polens”):
SAGA ALTIVA DAS FORMIGAS
Respeitando os ditames da corrente,
Elas não são escravas da rotina;
Curtem seus feromônios, em surdina,
Desfrutando os prazeres do presente.
São sempre intimoratas... Com elã,
Trabalham... Exercitam nobre afã
E depois se recolhem sem zumbidos...
Bem no meio da noite, nas colônias,
As formigas sorriem das insônias
Dos temerários homens corrompidos.
20 | eisFluências Junho 2012
CORPO A CORPO
Com meu corpo fechado, o coração
não me faz corpo mole, está presente
com seu corpo de guarda diligente
sempre de corpo e alma em prontidão...
Através da corporificação
de anticorpos altivos, sou prudente:
corpo a corpo, eu enfrento o renitente
corpo estranho e carente da paixão.
Assim sigo feliz, com o corpo isento
do corporativismo turbulento
da emoção do meu ser coloquial...
Quando o amor quer ganhar um corpo acromo,
tiro o corpo, pois sou tão leve como
corpo de baile do Municipal.
***
Nota: Esse texto corresponde à finalização da matéria publicada sobre o autor na Revista eisFluências do mês de fevereiro/2012, sob
o mesmo título.
Marco Bastos
Salvador/Bahia/BR
ENTREVISTA COM CIDA SEPULVEDA
por Oleg Almeida
Os textos de Cida Sepulveda não se enquadram nos velhos esquemas da teoria literária, portanto os denomino simplesmente “textos”, de
modo neutro e como que hesitante. Sem rima nem métrica, livres de falsa sentimentalidade, crus e, por vezes, cruéis com aquela chocante
exatidão de uma fotografia em preto e branco, que os permeia, eles fogem dos padrões clássicos da poesia; claros, concisos e bem
lapidados – nem uma palavra a mais, nem um pingo de ironia a menos –, perturbadores com sua visão, eu diria, clínica da realidade e, ao
mesmo tempo, fascinadores com o lirismo contido de suas descrições breves, mas em caso algum cerebrais, tampouco são prosaicos. O
que seriam então? – Poemas em prosa, cuja inspiração remonta ao sinistro e cativante Esplim de Paris baudelairiano, ou contos poéticos,
cujo tom lembra, em certos momentos, as short stories de Hemingway? As angústias de Clarice Lispector, os desafios de Marina
Tsvetáieva e os questionamentos de Angela Carter sob a mesma capa, ou, sabe-se lá, um novo, ainda indefinido, tipo de percepção
estética? É sobre todos esses aspectos que converso hoje com a escritora paulista Cida Sepulveda...
Oleg Almeida: Antes de tudo, a minha pergunta tradicional. Como você se tornou escritora? Foi um processo gradual e
demorado ou, pelo contrário, uma explosão espontânea que desencadeou toda uma série de obras literárias?
Cida Sepulveda: Caro Oleg, eu me tornei escritora porque na infância e adolescência não tive acesso a outras ferramentas para construção
do saber e da expressão artística, além dos livros. Eu ouvia rádio e lia livros. O contato com livros começou na escola pública. Aos onze
anos eu já tinha hábito de ir à biblioteca municipal de São Pedro/SP e passar tempo em busca de leituras, de forma aleatória, deixando-me
levar pela capa, pelos títulos, pelos comentários nas orelhas e contracapas. Eu explorava a biblioteca por curiosidade. Ninguém me
ensinou isso. Assim me lembro de ter descoberto A ladeira da memória, de José Geraldo Vieira, Jean Christophe, de Romain Rolland –
uma coleção superamarelada (marrom mesmo) pelo tempo e ainda com as folhas grudadas (ninguém lera, concluí), li o romance todo que
era em vários volumes, ia abrindo as folhas com uma régua, O advogado do diabo, de Morris West, que me impressionou demais, me
deixou chocada... Essas são algumas lembranças do ler. Eu também gostava muito do desafio de fazer resumos de romances, solicitados
pelas professoras do ginásio. Mais tarde, no ensino médio, o incentivo do professor de Língua Portuguesa que nos apresentou revistas,
jornais, teatro, poesia, letras de música – um professor inesquecível. A partir daí comecei a escrever meus desabafos que não eram
poucos, fui uma adolescente pobre, curiosa, comunicativa, revoltada, sedenta de ter o melhor que o mundo oferecia, mas a miséria me
tolhia, me humilhava, me traumatizava. Até pouco tempo, me considerava uma escritora anônima. A admiração pelo meu trabalho
demonstrada pelo filósofo Roberto Romano e pelo poeta Manoel de Barros foi essencial para eu tomar a atitude de publicar, mesmo
intuindo que poderia ser um processo desgastante e frustrante.
OA: Quais foram os autores nacionais e estrangeiros que mais incentivaram a sua criatividade? Que precursores e
maîtres à penser você teve?
CS: Há vários clássicos, em particular, na minha estante interior: Dostoiévski, Graciliano Ramos. Fernando Pessoa é a raiz de toda a
poesia. Cecília Meireles é uma referência poética forte. Os autores do Modernismo tiveram muito peso na minha formação: Oswald de
Andrade com Os condenados, A morta, Um homem sem profissão, sob as ordens da mamãe, Mário de Andrade, com Macunaíma e
poemas. Sartre e Simone de Beauvoir. Sartre com As palavras, Kafka, Scott Fitzgerald. Há mais... Machado de Assis, Guimarães Rosa,
Nelson Rodrigues, Manoel de Barros. Todos e outros mais me presentearam com suas obras essenciais. Mas, não posso deixar de falar do
cinema: Bergman, Fassbinder, Wim Wenders, Truffaut, Saura. Entre os pintores, Van Gogh, com suas Cartas a Théo. Etc.
OA: Você publicou, até agora, quatro livros: dois em verso e dois em prosa. Você é poeta ou contista por excelência?
Qual é seu gênero preferido: poema, narrativa ficcional ou, talvez, aquele híbrido de poesia e prosa que mencionei no
início da entrevista?
CS: Até o momento, meu trabalho se caracteriza pelo híbrido, como você muito bem mencionou. Não é isto ou aquilo, é indefinível.
eisFluências Junho 2012 | 21
OA: “O leitor fecha o volume e não vê saída” – assim se refere ao seu mais recente livro Todo amor tem seu dia de
punhal a professora da Unicamp Suzi Sperber. “Contos são traçados rápidos na página agonizante” – essa frase serve
de epígrafe ao próprio livro. Gostaria que você comentasse um pouco sobre o aflitivo realismo de sua obra. Seu
objetivo consiste em fazer o leitor refletir ou apenas sofrer?
CS: Nem de longe fazer sofrer, mas fazer sentir, abrir os olhos, tocar a ferida exposta e reagir, sensibilizar-se com o Outro, desejar
conhecê-lo. Mas, isso não explica o essencial: eu apenas leio e escrevo o mundo, para isso, desenvolvi uma forma que pode ser chamada de
estilo que, embora não cristalizado, mantém certos elementos básicos, gerados no processo formativo da escritora que inclui: vivência
humana, vivência de leitura e escrita, intelecto e sensibilidade trabalhados à exaustão.
OA: Sei que, além de escritora prolífica, você tem sido editora de várias revistas virtuais: Vagalume, Grafite e,
ultimamente, Coruja. A meu ver, essa sua tentativa de suprir as gritantes carências despercebidas pelas mídias de
largo alcance merece toda a nossa atenção. Como você avalia, de modo geral, o papel da mídia cultural no Brasil de
hoje?
CS: Caro escritor, você conhece a dificuldade de se “enturmar” no Brasil, a partir de afinidades ideológicas e estéticas. O meio cultural
institucionalizado é tomado por interesses mil que não a própria arte. Quando descubro um autor criativo, forte, nossa, eu me
entusiasmo, eu elogio, desejo vê-lo brilhar. Mas, a maioria do povo que está dominando a mídia só pensa em termos de Eu. Felizmente, a
internet permite que a gente faça contatos fora do círculo oficial e vá construindo um espaço alternativo. Nas revistas que editei, sempre
procurei aglutinar artistas desfocados, embora seja inegável que os leitores, em geral, também valorizem o que está estabelecido.
Importante frisar que o estabelecido, muitas vezes, é fraco esteticamente. Hoje, mais do que nunca, farei do espaço virtual, um lugar de
pequenos, mas essenciais encontros. Estou em contato com uma escritora iniciante que tem um texto impecável, Sonia Regina Ferreira de
Oliveira. Ela publica no Coruja, mesmo não tendo nome, nem currículo para se apresentar. E não o faço porque é amiga. Tornou-se amiga,
depois que conheci sua literatura. Assim também nasceu minha amizade com Manoel de Barros. São encontros de artistas - só os que os
experimentam conhecem o prazer da transcendência pela poesia.
OA: E a literatura brasileira contemporânea em si, o que você acha dela? Os grandes nomes e, principalmente, as
grandes ideias ainda fazem parte de nosso cenário cultural?
CS: Não vejo gente idealista no meio literário, com raras exceções. José Castello, além de grande escritor, é aberto ao diálogo, escreve
sobre a arte literária com maestria e delicadeza. Álvaro Alves de Faria, grande poeta, grita contra a barbárie do marketing literário,
solitário. Maurício Melo Júnior, do programa Leituras, da TV Senado, atua democraticamente, dando espaço a tantos autores,
conhecidos ou não. Há gente muito boa fora do métier. Uma vez de fora, desconhecido e com poucas chances de crescer, já que sem
estímulo, sem reconhecimento, enfim, sem suporte, quem segura a onda?
OA: Não é nada fácil ser artista, tanto no Brasil como em qualquer outro país do mundo, o fato não se discute...
Finalizando a nossa conversa, queria abordar uma questão filosófica: vale a pena ser escritor? Qual é, digamos assim,
o custo-benefício desta vocação?
CS: Vale, se a pessoa tiver um mínimo de condições de sobrevivência fora da arte, até para não precisar vender a alma ao diabo. O prazer de
realizar um trabalho artístico pertence ao universo do sonho, do desejo e do gozo.
OA: Muito obrigado, Cida, pelas respostas interessantes. Espero que os leitores da EisFluências gostem de sua
entrevista e queiram conhecer algumas das suas obras.
_________________________
EXCERTOS DO LIVRO DE CONTOS
“ TODO AMOR TEM SEU DIA DE PUNHAL”
Conto: Oreiúda
“...Marta nasceu linda. O pai a chamava Oreiúda. A menina se olhava no espelho e pensava: Um lado meu é raso, outro, abismo. Um dia o
rancho pegou fogo. O malvado esfolou a filha no chicote: Queima, desgraçada...”
Conto: O circo
“...Arquibancadas rugiam mais do que leões, palhaços, acrobatas e comedores de fogo. Apertamo-nos entre homens, mulheres, crianças.
Pipoca, refrigerante, amendoim, maçã do amor, algodão doce, eram vendidos por moleques esquálidos.
Sob a lona mística, no tablado sujo, entre músicos desnutridos, o jovem cantava. A voz potente e doce, desafinada, batia em meu corpinho
e se imprimia desejo...”
Conto: Estações de Virginia
“...Vozes me vem letárgicas. Vem dos dicionários da alma. Rasuro-me em páginas que a terra comerá. Ouço Deus no silêncio pasmo de
vulvas. Enfio o dedo na borrasca. Sai um molhado transparente, viscoso.
O calendário pendurado na parede lateral, com a reprodução de Matisse – Mulher lendo, 1894, me repousa. O coque da mulher, o facho de
luz em seu pescoço, o abajur delicado, são bolhas de sonho que o pintor assopra...”
EXCERTOS DO LIVRO DE CONTOS “CORAÇÃO MARGINAL”
Conto: Breve Sesta
Numa tarde de março ela acordou de breve sesta, foi à janela, viu o pedreiro com a braguilha aberta e o corpo rente à parede. Ele dava
corcovas e urros. Ela virou as costas à cena. Outros pedreiros trabalhavam absortos.
Escondeu-se atrás da cortina e voltou a espiar. O pedreiro já se preparava para assentar tijolos, tinha o corpo relaxado e o rosto pálido, ele
sofria asma, além de anemia por falta de feijão na marmita.
22 | eisFluências Junho 2012
O pedreiro pegou a colher, a massa, a pilha de tijolos, e trabalhou. De meia em meia hora, sem mudar de posição, interrompia o movimento
e pensava. Seus pensamentos foram gravados na parede que, depois de rebocada e pintada, não deixou resquício de esperma e pensar.
Ela observou até começar a escurecer, quando o pedreiro se tornou apenas um bocado de noite. Então, acendeu as luzes da varanda,
trancou as portas e se enterrou na cama. Uma música suave a entristeceu.
O pedreiro, depois da parada no boteco, tomou mais um lotação. Sentou-se no banco duro, fedia. O lotação encheu até a boca e derramou.
POEMA DO LIVRO: SANGUE DE ROMÃ
POEMAS DO LIVRO “FRONTEIRAS”
SUBSISTÊNCIA
OUTONAL
A tarde aqui
A roseira conta Deus
E entrega perfumes
Recomeçar, amor... daquela conversa fiada, esboçada
Construir... vexames, para depois limpar a casa
Beija-me...no amor de ontem
Viajo por teus escuros
Sob sol de rachar coquinhos
Ponteio finais
Outono se esvai
Sem saboreio
Perguntas não aplacam
Ameaças e medos
Penteio desvelos
***
A LIBERDADE
Um furor de palavras
Consome bocas
Só cabe neste segundo
O corpo se desloca
Em tua direção
Carregadas de pasmo
E demoras
O silêncio subsiste na balbúrdia
Na contramão, destinos
Nascida em Piracicaba, criada em São Pedro e radicada e Campinas, Cida Sepulveda é autora de quatro livros
publicados: Sangue de romã (Scortecci, 2004), Coração marginal (Bertrand Brasil, 2007), Fronteiras (Pontes,
2008) e Todo amor tem seu dia de punhal (7Letras, 2011) e um na área de Linguística, em coautoria com a
professora da UNICAMP, Ângela Kleiman, Oficina de Gramática (Pontes, 2012).
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Oleg Almeida, Brasília/DF, Brasil
www.olegalmeida.com
LEMBRANDO EUGÉNIO DE ANDRADE
(Falecido a 13 de Junho de 2005)
Por Carmo Vasconcelos
EUGÉNIO DE ANDRADE nasceu na freguesia de Póvoa de Atalaia (Fundão) em 19 de Janeiro de 1923.
Fixou-se em Lisboa aos dez anos, com a mãe, que entretanto se separara do pai. Frequentou o Liceu Passos
Manuel e a Escola Técnica Machado de Castro, tendo escrito os seus primeiros poemas em 1936, o
primeiro dos quais, intitulado “Narciso”, que publicou três anos mais tarde.
Em 1943 mudou-se para Coimbra, onde regressa depois de cumprido o serviço militar convivendo com
Miguel Torga e Eduardo Lourenço. Uma transferência de serviço levá-lo-ia a instalar-se no Porto em 1950,
numa casa que só deixou mais de quatro décadas depois, quando se mudou para o edifício da extinta
Fundação Eugénio de Andrade, na Foz do Douro. Durante os anos que se seguem, o poeta fez diversas
viagens, foi convidado para participar em vários eventos e travou amizades com muitas personalidades da
cultura portuguesa e estrangeira, como Miguel Torga, Carlos Oliveira, Eduardo Lourenço, Joaquim
Namorado, Sophia de Mello Breyner Andresen, Teixeira de Pascoaes, Vitorino Nemésio, Jorge de Sena,
Mário Cesariny, Ángel Crespo, Luis Cernuda, Jaime Montestrela, Marguerite Yourcenar, Herberto
Helder, e muitos outros. Torna-se mais conhecido em 1942 com o livro de versos “Adolescente”. A sua
consagração acontece em 1948, com a publicação de “As mãos e os frutos”, que mereceu os aplausos de
críticos como Jorge de Sena ou Vitorino Nemésio. A obra poética de Eugénio de Andrade é essencialmente
lírica, considerada por José Saramago como uma poesia do corpo a que se chega mediante uma depuração contínua.
Recebeu um sem número de distinções, entre as quais o Prémio da Associação Internacional de Críticos Literários (1986), Prémio D. Dinis da Fundação
Casa de Mateus (1988), Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores (1989) e Prémio Camões (2001).
Entre as dezenas de obras que publicou encontram-se, na poesia, “Os amantes sem dinheiro (1950), As palavras interditas (1951), Escrita da Terra
(1974), Matéria Solar (1980), Rente ao dizer (1992), Ofício da paciência (1994), O sal da língua (1995) e Os lugares do lume (1998).”
Em prosa, publicou “Os afluentes do silêncio (1968), Rosto precário (1979) e À sombra da memória (1993)”. Foi também tradutor de algumas obras, como
dos espanhóis Federico García Lorca e Antonio Buero Vallejo, da poetisa grega clássica Safo (Poemas e fragmentos, em 1974), do grego moderno Yannis
Ritsos, do francês René Char e do argentino Jorge Luís Borges.
Faleceu a 13 de Junho de 2005, no Porto, após uma doença neurológica prolongada.
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Fontes: Wikipedia e Biblioteca da Autora (oportunamente publicaremos poesia do autor)
Carmo Vasconcelos
eisFluências Junho 2012 | 23
NOTÍCIA
Luto no Panorama Musical Português
por Carmo Vasconcelos
O panorama musical português está de luto. Morreu Bernardo Sassetti , de 41
anos de idade, no dia 10 do passado mês de Maio. O pianista terá caído de uma
falésia junto à praia do Abano, ao Guincho, em Cascais (Portugal), ao que
consta, enquanto tirava fotografias.
Era o filho mais novo de Sidónio de Freitas Branco Pais e de sua mulher Maria
de Lourdes da Costa de Sousa de Macedo Sassetti. Era bisneto de Sidónio Pais
e sobrinho-neto de Luís de Freitas Branco.
Bernardo Sassetti iniciou os seus estudos de piano clássico aos nove anos com
a professora Maria Fernanda Costa e, mais tarde, com o professor António
Meneres Barbosa, tendo frequentado também a Academia dos Amadores de
Música. Dedicou-se ao jazz, estudando com Zé Eduardo, Horace Parlan e Sir
Roland Hanna. Em 1987 começa a sua carreira profissional, em concertos e
clubes locais, com o quarteto de Carlos Martins e o Moreiras Jazztet; participa
em inúmeros festivais com músicos tais como Al Grey, John Stubblefield,
Frank Lacy e Andy Sheppard. Desde então, nos primeiros quinze anos de
carreira, apresenta-se por todo o mundo ao lado de Art Farmer, Kenny
Wheeler, Freddie Hubbard, Paquito D´Rivera, Benny Golson, Curtis Fuller,
Eddie Henderson, Charles McPherson, Steve Nelson, integrado na United
Nations Orchestra e no quinteto de Guy Barker com o qual gravou o CD "Into
the blue" (Verve), nomeado para os Mercury Awards 95 - Ten álbuns of the year. Em Novembro de 1997, também com Guy Barker, gravou
"What Love is", acompanhado pela Orquestra Filarmónica de Londres e tendo como convidado especial o cantor Sting.
Como compositor destacam-se as suites "Ecos de África", "Sons do Brasil", "Mundos", "Fragments (Of Cinematic Illusion)", "Entropé"
(para piano e orquestra) e "4 Movimentos Soltos" (para piano, vibrafone, marimba e orquestra). O seu primeiro trabalho discográfico
como líder, Salsetti (Groove/Movieplay), foi gravado em Abril de 1994 com a participação de Paquito D'Rivera, o segundo, Mundos
(Emarcy/Polygram), em Janeiro de 1996. “Nocturno", lançado pela editora Clean Feed em 2002, foi distinguido com o 1.º Prémio Carlos
Paredes. "Indigo" e "Livre" são outras das suas mais recentes gravações de piano solo para a mesma editora.
O pianista foi um dos artistas mais ativos a compor música para a sétima arte em Portugal, sendo da sua autoria bandas sonoras de filmes
como Alice, de Marcos Martins, Um Amor de Perdição, de Mário Barroso, ou Second Life, de Alexandre Valente.
Em Novembro de 1997, Sassetti gravou "What Love is", acompanhado pela Orquestra Filarmónica de Londres e tendo como convidado
especial Sting.
Dedicava-se regularmente à música para cinema, tendo realizado vários trabalhos, de entre os quais se destaca a sua participação no filme
do realizador Anthony Minguella - "O Talentoso Mr. Ripley" (Paramount/Miramax). Para este projecto gravou "My Funny Valentine"
com o actor Matt Damon, entre outros temas. Compôs igualmente, em parceria com o trompetista Guy Barker, uma série de temas para
serem apresentados na estreia deste filme realizada em Los Angeles, Nova Iorque, Chicago, Berlim, Paris Londres e Roma.
Os seus mais importantes trabalhos de composição para cinema são os seguintes: "Maria do Mar" de Leitão Barros, "Facas e Anjos" de
Eduardo Guedes, "Quaresma" de José Álvaro Morais, "O Milagre Segundo Salomé" de Mário Barroso, "A Costa dos Murmúrios" de
Margarida Cardoso, "Alice" de Marco Martins, o documentário "Noite em Branco" de Olivier Blanc e a curta-metragem "As Terças da
Bailarina Gorda", de Jeanne Waltz. Como solista, participou também no filme "Pax" de Eduardo Guedes e na curta-metragem
"Bloodcount" de Bernard McLoughlan.
Como concertista, apresenta-se em piano solo, em trio com Carlos Barretto e Alexandre Frazão ou em duo com o pianista Mário Laginha,
com quem gravou os CD's "Mário Laginha/Bernardo Sassetti" e "Grândolas" (uma homenagem a Zeca Afonso e aos 30 anos do 25 de
Abril).
De entre muitos discos gravados (como solista, acompanhador e compositor) podem destacar-se os seguintes: Conrad Herwing e Trio de
Bernardo Sassetti - "Ao vivo no Guimarães jazz"; Orquestra Cubana Sierra Maestra - "Dundumbanza" e "Tibiri tabara"; Carlos Barreto "Impressões" e "Olhar"; Carlos Martins com Cindy Blackman - "Passagem"; Luis Represas - "Cumplicidades"; Carlos do Carmo "Ao vivo
no Coliseu"; Guy Barker - "Into the blue", "Timeswing" e "What love is"; Perico Sambeat - "Perico"; Guillermo McGill - "Cielo" e
"Oración"; Tetvocal - "Desafinados"; Djurumani - "Reencontro" e Andy Hamilton - "Jamaica by night", entre muitos outros.
O corpo do pianista e compositor esteve em câmara ardente na Basílica da Estrela onde o músico foi homenageado com um concerto a que
assistiram familiares e amigos, seguido de longos momentos de sentidos aplausos.
Fontes diversas (várias jornais e revistas à data)
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Pesquisa e composição de Carmo Vasconcelos
Lisboa/Portugal
A Morte não é nada
Santo Agostinho
A morte não é nada./ Eu somente passei para o outro lado do Caminho./ Eu sou eu, vocês são vocês./ O que eu era para vocês, eu
continuarei sendo./ Me dêem o nome que vocês sempre me deram, falem comigo como vocês sempre fizeram./ Vocês continuam
vivendo no mundo das criaturas, eu estou vivendo no mundo do Criador./
Não utilizem um tom solene ou triste, continuem a rir daquilo que nos fazia rir juntos./ Rezem, sorriam, pensem em mim./ Rezem por
mim./ Que meu nome seja pronunciado como sempre foi, sem ênfase de nenhum tipo./ Sem nenhum traço de sombra ou tristeza./ A
vida significa tudo o que ela sempre significou, o fio não foi cortado./ Porque eu estaria fora de seus pensamentos, agora que estou
apenas fora de suas vistas?/ Eu não estou longe, apenas estou do outro lado do Caminho./ Você que aí ficou, siga em frente, a vida
continua, linda e bela como sempre foi.
24 | eisFluências Junho 2012
As eleições estão à porta…
por Nuno Rebocho
Duas pistas de tartan alberga, de um dia para o outro, o arquipélago de Cabo Verde: na ilha do Sal e na ilha de Santiago, a pista “Adega”, na
capital, a cidade da Praia – 150 mil habitantes. Leu bem? Precisamente, cento e cinquenta mil habitantes. Atletismo é que, por enquanto,
só esperanças!
São dez ilhas e algumas ilhotas. Quatro aeroportos internacionais, duas ilhas ainda sem qualquer aeroporto e passagens aéreas das mais
caras do mundo (em termos relativos). Vinte e duas cidades. Vinte e dois municípios. Quatrocentos e cinquenta mil habitantes, ao todo.
Isso mesmo: não é nenhum engano.
Numa ilha, Santo Antão, foi construída uma estrada alcatroada em volta, com túneis… mas a população existe é no seu interior, na
montanha, e sofre por boas estradas de penetração. Noutra ilha, a de Santiago, a principal, foi construída uma estrada alcatroada, cerca de
15 km de quatro fachas, meia dúzia de rotundas, separadores ao meio. Automóveis? Para contar cem, é preciso quase um dia.
O Primeiro-Ministro destas dez ilhas e 450 000 habitantes ganha um prémio na Suécia pela sua dita excelente contribuição e apoio ao
cluster do mar, e mais de metade da população não sabe nadar, barcos quase não existem, plataforma marítima quase não tem – as ilhas
quase caem a pique sobre o mar.
Electricidade? Tem dias que só à luz das velas (que, infelizmente, não alimentam computadores) se pode iluminar qualquer coisa. Não há
quedas de águas, portanto não há hidro-electricidade. E barragens de água, neste momento há apenas uma (a de Poilão, as outras estão
em construção), servida por um fio de água que tem o curioso nome de Ribeira Seca, o que só por si diz tudo.
E, orgulhosamente, possui no Mindelo um campo de golfe, de terra batida, bunkers que são pedregulho, arvoredo e lixo, cujo “green” se
chama, por isso, “black” e os golfistas recebem o nome de “lordes”.
Desemprego há muito, que as dez ilhas se debatem com todo o tipo de carências. Mas as pessoas são felizes. É Cabo Verde. E Cabo Verde é
música, muito e boa.
Como, periodicamente, há eleições – é aquilo batizado de democracia, embora falcatrua seja mais do que muita –, acontecem por vezes
suaves milagres. As pistas de tartan acabaram por nascer do nada: foram inauguradas a tempo de encher o olho, as eleições estão aí à
porta!
O arquipélago é pequeno. Mas o seu coração é grande. E a mania do gigantismo vale a América. Como diz um amigo meu da cidade da
Praia: “tem calma, Nuno, que Portugal ainda será nosso”.
Pátria dos insólitos
por Nuno Rebocho
Cabo Verde vai, aos poucos, alcançando a modernidade: sucedem-se as manifestações (foi contra a falta de eletricidade – aconteceu na
cidade da Praia; foi contra o programa governamental “Casa para todos”, que as más-línguas traduziram por “Casa para alguns”; foi
contra as carências de água – aconteceu no Salineiro) recebidas pelo Primeiro-Ministro com bonomia e comentários públicos: “é natural
que a juventude proteste”, “se eu fosse jovem, da idade deles, talvez estivesse entre os manifestantes”. Foi, mais ou menos, assim. Agora,
as centrais sindicais (viva o pluralismo!: existem duas, quase à imagem e semelhança de Portugal, tudo tirado a papel químico) juntam-se
num acordo e ameaçam o Governo com uma - oh, coisa nunca dantes vista! – greve geral. Sem mais! Conclui-se que a “sociedade civil”, à
força de levar coices e ser menosprezada, finalmente desperta da sua letargia e dá sinais da sua existência.
Portanto, provado é: não há fome que não dê em fartura. Tomaram-lhe o gosto e, com raiva, a maçã do progresso é mordida com o mesmo
entusiasmo que os cabo-verdianos usam pôr nas coisas. E o seu Primeiro-Ministro, José Maria das Neves, olha sardonicamente para os
factos e sorri: com o habitual à-vontade com que tem superado as crises e se perpetua no galarim (dizem as más-línguas, sempre as máslínguas, que com recurso a “chapeladas” em três eleições consecutivas e a “compra de votos”), Neves vai fazendo pela vida e tentando
atravessar esta fase já dita de fim de ciclo. Se alguma amargura lhe cabe, vai-se revendo no filho, acabadinho de se formar e já com altos
cargos de gestão em empresas dependentes do Estado e opinion maker, como convém: ao fim e ao cabo, costuma dizer-se que “quem sai
aos seus, não degenera” e que “filho de peixe sabe nadar”.
Afirma um meu amigo que desde que vira um porco andar de bicicleta – deve ter sido num circo, porque só em tal sítio se enxergam
anomalias – já nada o surpreende. Provavelmente, tem razão, porque para tudo neste mundo devemos de estar preparados.
Consequentemente, que se tome por coisa normal o nunca visto de, um dia destes, depararmos com um Primeiro-Ministro liderando uma
manifestação a pedir a demissão do (seu) Governo. Acontecerá em Cabo Verde (poderia lá ser noutro Pais?), que certos qualificam, com
acertado humor, de pátria dos insólitos.
eisFluências Junho 2012 | 25
Forjada nova “estrela” da canção cabo-verdiana
por Nuno Rebocho
Sílvia Medina é a nova voz (“estrela”) da canção cabo-verdiana:
saída do concurso “Estrela Pop”, que teve grande impacte
televisivo – na televisão do Estado daquele país, TCV – e da
chamada Academia Musical de Cidade Velha, do impulsionador
do concurso, João Pires, Medina apresentou-se entre 12
concorrentes que foram seleccionados para frequentar, durante
cinco semanas (mês e meio), a referida Academia.
O concurso decorreu por eliminatórias, com espetáculos-seleção
que tiveram lugar, perante muito público, no auditório da
Assembleia Nacional. Na gala final, com uma orquestra dirigida
por Kim Alves (que foi também professor em Cidade Velha),
apresentaram-se apenas cinco candidatos – alinhados segundo a
classificação final: Sílvia Medina, Lucibela Santos, Fatu Djakité,
Yannick Martins e Olavo Rodriges – que ombrearam com
grandes vultos da canção cabo-verdiana, como Zeca di Nha
Rinalda, Zé Espanhol, Princezito e o são-tomense Juka.
A classificação final ficou – erradamente – dependente do voto
público, por telefonemas efetuados (SMS). A maioria decidiu-se,
bem, por Sílvia Medina – que aliava extraordinária voz a boa
apresentação, mas, levado certamente pelo peso bairrista,
pronunciou-se mal para com o representante da pequena ilha
Brava, Olavo Rodrigues, de longe um dos melhores candidatos que esteve nesta final. O júri, presidido por Teresa Araújo e do qual fazia parte o
compositor e músico Daniel Spencer, não teve aqui o efeito corretor que lhe deveria caber.
Com esta gala da “Estrela Pop”, que atingiu excelente qualidade, o inesgotável alfobre da canção cabo-verdiana enriqueceu-se com uma nova
estrela, cujo nome convém fixar e está, desde já, encaminhada para uma significativa carreira internacional: Sílvia Medina. Está a ser preparado o
primeiro CD dela os cinco vão ter uma digressão longa que os vai trazer ocupados durante um ano.
Nuno Rebocho
Cidade da Praia- Cabo Verde
A POESIA DE NUNO REBOCHO
NOITES ANDALUZAS
(Continuação)
3.
(o jardim dos perfumes)
atiro o problema para trás das costas
mas as macieiras descobrem-me: sou a sombra
e o murmúrio. e se calço as alpergatas do silêncio
sobra-me o espanto. por então falo
das coisas corriqueiras que me acontecem
- ou o tépido beijo da morte
a limpidez das madrugadas sóbrias
os olhos dos planetas que escurecem
ou a morte súbita dos rios amarelos.
4.
corria o cometa na noite de andaluzia e era febre
enquanto o tempo se consumia no sofrimento da memória.
a noite e o plaino era a parede de fechar o mundo
à angústia do corpo vivido. o caminho encurta
quando agarramos a felicidade com desconfiança
(e devemos confiar ou morder a língua?).
o cometa era indiferente à noite de andaluzia
e eu queria falar-lhe dos campos secos
do sangue das batalhas de outrora
do corpo desgastado pelas palavras da ausência
mas o cometa era luz e corria - corria para lá dos olhos
na noite de andaluzia.
desde então eu quis casar
com a filha do rei
e desde então fiquei à espera
que entrasses na minha casa
e me dissesses a palavra mágica
para que a minha alma fosse salva.
desde então eu estou à espera
que me digas aquela palavra mágica.
(Nuno Rebocho é Jornalista, Escritor e Poeta.
É o nosso Correspondente em Cabo Verde)
26 | eisFluências Junho 2012
MORTE SOB VERNIZ FERVENTE
por Humberto Rodrigues Neto
O Sr. Letil, conceituado fabricante de vernizes nos arredores de Paris, era homem assaz honrado, possuidor de índole doce e benevolente, de
modo que não era apenas admirado, mas muito estimado por todos aqueles que o conheciam.
Todavia, em abril de 1864, num lamentável descuido do serviço, uma caldeira de verniz de sua oficina tombou e pegou fogo, vindo o líqüido
fervente a derramar-se por inteiro sobre ele. Coberto pela resina em ebulição, percebeu, num átimo de segundo, que estava perdido.
Praticamente só na oficina, pois ali tinha a assisti-lo apenas um jovem e inexperiente aprendiz, teve a determinação de reunir todas as forças e
correr para casa, que distava dali cerca de duzentos metros.
Ao lhe serem dados os primeiros socorros, as carnes estavam profundamente queimadas, soltando-se do corpo e caindo aos pedaços pelo chão! Os
ossos de uma parte do corpo e da face estavam à vista, horrivelmente expostos! Seu martírio durou infinitas doze horas, durante as quais suportou
tenazmente os mais atrozes padecimentos!
Durante todo esse tempo, entretanto, conservou sua presença de espírito até o último instante, mantendo lúcida a idéia e demonstrando perfeita
concatenação de pensamentos. De índole bondosa e pacífica, como dissemos, não se ouviu dele um lamento, um murmúrio sequer contra o
fatídico acontecimento, mas apenas orações a Deus rogando-lhe misericórdia e resignação, dons estes derivados, certamente, do fato de ter
abraçado as idéias espíritas! Evocado na Sociedade Espírita de Paris poucos dias após sua morte, e ainda sob o impacto da cena de que fora vítima,
disse ele:
— Que tristeza profunda me oprime! Ainda sob os horrores de morte tão trágica, creio-me vergastado pelo ferro de um carrasco! Quanto sofri!
Oh! Quanto sofri! Ainda estou tremendo! Parece-me sentir ainda o odor fétido que minhas carnes queimadas lançavam ao redor! Que agonia,
meu Deus, a daquelas doze horas! Oh, minha esposa amada, não chores mais por mim! Na realidade, não sofro agora, mas a lembrança
parece-me doer mais que a realidade! Aqui, o que me vale é crer no Espiritismo, pois sei, agora, que, sem tal crença, estaria ainda no delírio em
que fui jogado por minha morte horrível! Meu anjo protetor esteve sempre ao meu lado e falei-lhe da minha bem-amada esposa e do desejo de
vê-la. Procurei então minha casa, na qual o anjo me permitiu entrar: que quadro terrível ver todos ali em lágrimas! Não pude aguentar tal
visão e pedi-lhe que me levasse dali. Depois sofri menos: diria, mesmo, que se não visse minha esposa em tal estado de angústia, seria quase
feliz. Perguntei ao meu anjo a causa de morte tão pavorosa e de tão lancinante suplício. Sempre a confortar-me, disse ele o seguinte:
— Há cerca de dois séculos viveste na Itália e chegaste ao cargo de Juiz do Santo Ofício, no qual exercias a função de Inquisidor da Igreja. Foste
então chamado a investigar o caso de uma menina de l2 a l4 anos, acusada de cúmplice num atentado contra a política sacerdotal. Sem que o
soubesses, estavas diante de uma menina inocente, como inocentes costumam ser todas as meninas em tal idade! Os carrascos não ousaram
tocar-lhe o frágil corpo! Tu mesmo, foste o juiz e o carrasco! Sem atinar para o que fazias, fizeste estendê-la sobre uma fogueira, em cima da
qual morreu a esmoer-se, durante horas, em gritos lancinantes de uma dor cujos tormentos só tu agora conheces!
— Calou-se o anjo da guarda. Então entendi que Deus foi bom e justo, permitindo que eu resgatasse, na mesma moeda, meu nefando crime!
Tortura-me, agora, a lembrança sempre presente de minha pobre vítima, que irei procurar por onde for, a fim de rogar-lhe perdão!
(Excertos do livro O Céu e o Inferno, de Allan Kardec - Capítulo VIII, fls. 348/351)
Humberto Rodrigues Neto
São Paulo/Brasil
CAMBALACHO CELESTE
Humberto Rodrigues Neto
Quando do fruto proibido,
foi Eva então condenada
a servir ao seu marido
como fêmea e empregada.
Não teve a pena sucesso
pois toda Eva é escolada;
deu-lhe alforria o progresso
e a pena não deu em nada.
O vil delito de Adão
impôs-lhe o mais rude malho,
pois só comeria o pão
com o suor do trabalho.
Mas a mecanização
trouxe folga ao povaréu,
e a punitiva expiação
lá se foi pro beleléu!
Só a serpente vem cumprindo
sua cruel condenação,
a vida inteira rostindo
seu gasto ventre no chão!
Hoje os tribunais dão penas
só a quem não seja eminente,
pois a lei protege apenas
ao que é rico ou influente.
Também foi por tal regime
julgado o bíblico fato:
Eva e Adão são réus de um crime
e a cobra é que paga o pato!
eisFluências Junho 2012 | 27
ANJINHA
por Luiz Poeta – Luiz Gilberto de Barros
Anjinha estava preocupada.
Todas as noites ela saía de um cantinho de céu azul que Deus deu para ela, atravessava uma nuvenzinha muito branca e ficava esperando um
ventinho bom que soprava à tardinha, para ganhar impulso e voar como um passarinho para uma casinha da Terra onde uma criança precisava
dormir.
Era uma menininha de cinco anos muito agitada: pulava, dançava, desenhava, rabiscava tudo, até as paredes do quarto - quando ninguém via brincava com massinhas e transformava tudo o que achava no chão da sala em uma personagem das suas estorinhas.
Uma tampinha vermelha de garrafas pet podia ser uma pessoa que ficava com raiva à toa; outra tampinha - a azul - representava uma garotinha
que sonhava muito; a verde, era um soldadinho do exército... cada estorinha era parecida com a outra e sempre terminava com todo mundo sendo
feliz, até a tampinha raivosa ria no finalzinho.
Anjinha adorava observar a brincadeirinha da sua protegida e até participava às vezes, dando sugestões que só a garotinha escutava. – Por que
você não faz de conta que a tampinha branca é uma enfermeira ? ... a amarela pode ser uma pessoa que gosta de contar piadas sem graça. A
menininha nem sempre aceitava a ajuda e às vezes até gritava com Anjinha.
Um dia, gritou tão alto, que sua mãe se assustou:
- O que foi, Dudinha ? ( Ah, esqueci de falar, o apelido dela era Dudinha porque se chamava Maria Eduarda ).
- Ah, mãe... eu não quero que a tampinha branca seja uma enfermeira ! Ela parece um carneirinho!
- Ué, então, faz de conta que ela é um carneirinho – dizia a mãe dando um belo sorriso enquanto caminhava na direção da cozinha. O miojo estava
com um cheirinho maravilhoso. E o bolo de chocolate? Ela adorava!
Mas voltando a estorinha, Anjinha tinha uma missão muito importante: ela entrava no soninho daquela criancinha e inventava um sonho muito
bonito para ela ser feliz enquanto dormia.
Ela adorava fazer aquilo e usava uma flautinha dourada que tocava para a a menina dormir.
As notas eram fininhas e até faziam cosquinhas nos ouvidos de Dudinha. Mas era uma cosquinha muito boa que deixava o corpinho da menina
levinho, levinho. Os olhinhos de Dudinha iam ficando molinhos, molinhos... molinhos... até que ela dormia ali mesmo, no chão da sala, sobre o
tapete.Era o momento ideal para Anjinha. Ela ficava esperando um sorriso. Quando Dudinha, mesmo dorminho, sorria, pronto: Anjinha entrava
no sorriso e ficava soltinha no sonho dela.
- Que sonho vamos sonhar hoje? … deixa ver... ah, vamos brincar de arco-íris? Arco-íris? O que é arco-íris?
- São sete cores lindinhas, que formam um arco quando a chuva vai parando bem devagarzinho.
- Como um arco de cabelo? - É, menina! Dizem que existe um potinho de ouro embaixo do arco-íris e quem acha fica rico.
- Puxa... eu queria achar um potinho desses. Todos os dias mamãe diz que está sem dinheiro. Se eu achasse o potinho, bem que podia dar um
pouquinho pra ela.
E aí começava o sonho. Quando ele ficava mais bonito, brilhante e azulzinho, Dudinha dava um sorriso bem grande, maior que o céu. Então,
Anjinha saía, dava uma olhadinha nela, beijava sua testa e voava de volta para o céu.
Ah... sabe por que Anjinha estava preocupada?
Um dia, o soninho de Dudinha ficou muito estranho porque ela não quis sonhar o sonho que Anjinha trouxe. Era um pesadelo!
Sabe o que é pesadelo?
É quando o sonho da gente fica nublado como um dia de chuva com trovões, relâmpagos e tudo. Parece até que a gente sente os pingos da chuva. E
foi isso que aconteceu no sonho.
Anjinha ficou com medo porque a chuva era tão intensa que suas asas ficaram encharcadas e ela nem conseguia voar direito, Parecia uma
estabanada querendo ajudar Dudinha: bateu com as asas na lâmpada, caiu deitada no tapete do quarto, quase derruba os sete sinos presos no teto.
Como? Ué, ela saiu do sonho e não podia voltar porque só podia fazer isso se Maria Eduarda sorrisse... e ela não sorria, ficava se mexendo pra lá e
pra cá na caminha. Até a Barbie e o ursinho de pelúcia que dormiam com ela caíram no chão.
E tudo ficou pior ainda quando ela chorou. O choro era como uma grade que não permitiria mesmo que Anjinha voltasse.
Puxa... mas como Anjinha não podia entrar no soninho dela se ela era um Anjo? Um anjo não tem corpo, é só uma imagem como uma nuvenzinha
em forma de gente que voa.
Mas não adiantava, Anjinha tentava, tentava, mas não conseguia voltar pro soninho de Dudinha.
...até que, de repente, vários anjinhos foram chegando, voltando do sonho de outras criancinhas.
- Você esqueceu sua flauta? – perguntou um coleguinha – Toque e ela vai sorrir.
- Puxa, Gabrielzinho... por que eu não pensei nisso antes ?
E Anjinha começou a tocar sua flautinha dourada, porém Maria Eduarda não sorria.
- Espera aí, disse Miguelzinho, um anjinho mais esperto. Por que não tocamos juntos?
E todos cantaram e tocaram harpinhas, sininhos, flautinhas e alguns instrumentos do tempo do antigo testamento.
Porém Maria Eduarda continuava chorando. E o pior: soluçando!
- Pera aí, gente! Vamos mudar essa música.
- Vamos tocar o quê?
- Alguma coisa interessante, que Dudinha goste.
- O que, por exemplo?
- Um rock?
- Rock?
- E Deus gosta de rock?
- Deus gosta de tudo que faça uma pessoa feliz.
- Tá bom: um, dois, três e...
E a banda angelical deu um verdadeiro show. Querubinzinho pegou sua guitarrinha e tirou uns sons muito maneiros. Serafinzinho atacou de
teclado, a bateria ficou por conta de Gabrielzinho e Miguelzinho arrasou no baixo, enquanto o coro em volta cantava um rock celestial, desses que
fazem uma criança dançar o tempo todo.
O sorriso da Dudinha foi imediato. Aliás, um sorrisão muito maior que o universo! Cheio de notas musicais maravilhosas.
Todos anjinhos entraram no sonho dela. Foi uma festa onde todos se divertiram muito e ela dormiu até de madrugada.
A preocupação de Anjinha foi sumindo como o soninho de Dudinha.
Lá no céu, no seu cantinho azul, deitada em uma nuvem branquinha, Anjinha agora era quem sonhava.
E sabe quem estava no sonho dela?
Dudinha!
Luiz Poeta
(Às 23 h do dia 8 de março de 2012 do Rio de Janeiro - Texto infantil publicado em língua inglesa e portuguesa nos Estados Unidos da
América e no Brasil pela Associação Internacional de Artistas e Escritores - Literarte ( Histórias para dormir e sonhar )
www.luizpoeta.com
28 | eisFluências Junho 2012
Tradição das Maias uma Prática tradicional e intercultural
Recordação cristã e pagã
por António Justo
Segundo a tradição em parte do norte de Portugal, na noite de 30 de Abril para 1 de Maio, muitas pessoas colocam maias (giestas floridas)
nas portas das casas para lembrarem o tempo da fuga de Jesus para o Egipto. Noutras terras colocam maias no ferrolho da porta para
serem protegidos das doenças e dos espíritos maus. Em torno de Maio há muitos outros costumes de diferentes tradições.
Nalgumas terras alega-se que esta tradição remonta ao tempo de Jesus, aquando da sua fuga para o Egipto devida à perseguição de
Herodes que ordenara a procura e morte do menino Jesus. Segundo a lenda, tendo sido identificada a casa onde a sagrada família
pernoitava, um denunciador teria colocado um ramo de giesta na porta daquela casa para que os soldados de Herodes, depois de avisados,
pudessem identificar a casa e levá-lo. Por milagre, quando os soldados se dirigiram à cidade depararam com todas as portas enfeitadas
com ramos de giesta florida. Assim os soldados não puderam cumprir a ordem do mal contra o bem. Noutras terras as maias recordam o
caminho da sagrada família para o Egipto: Maria para se poder orientar no regresso terá colocado giestas no seu caminho.
Em Maio condensam-se as celebrações de usos e costumes símbolos da fertilidade, por toda a Europa.
O ressurgir da natureza é festejado por todas as culturas ao longo da História, reflectindo diferentes expressões religioso-culturais
conforme o espírito do tempo e da cultura envolvente.
Quando a natureza acorda para a juventude, celebra-se, com festas e ritos, a vida, a luz, o fogo e esconjura-se a treva. Estes ritos ganham
expressão em tradições como a das maias, Florais, o burro, a rainha de Maio, coroa das maias, leilão de donzelas, a festa do mastro/árvore
(esta festa também da virilidade encontra-se no norte da Europa e em Penafiel - costume celta?), etc. No Norte da Europa há lugares onde
se comemora a chegada de Maio onde, outrora, moças em idade de casar eram apresentadas no leilão de Maio.
Maio recebeu o nome do deus Maius que era o deus da Primavera e do crescimento. Para outros vem de Maia, mãe de Mercúrio. As
celebrações em honra de Flora, a deusa das flores e da juventude (mãe da Primavera), iniciavam o novo ano agrícola e atingiam, na Roma
antiga, o seu clímax nos três primeiros dias de Maio.
A Igreja católica declarou Maio como o mês de Maria, a mãe e rainha. Dos 54 países que celebram o Dia da Mãe, 36 festejam-no em Maio.
Também no Norte da Europa havia a tradição dos rapazes colocarem um arbusto à porta da sua amada como declaração de amor,
paralelamente ao costume de serem nesse dia leiloadas as donzelas em idade de “casar”. Há tradições semelhantes em Portugal. Aqui,
nalgumas terras, havia a tradição da “coroa das maias”, elaborada em papel com fitas de cores e que os rapazes, colocavam à porta das suas
pretendidas, como manifestação do seu amor.
António da Cunha Duarte Justo
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