Harvard busca alunos, professores e fundos em outros

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Harvard busca alunos, professores e fundos em outros
(FALANDO DA TRANSNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO …)
Harvard busca alunos, professores e fundos em outros países
Fonte: Folha de São Paulo
LUCIANA COELHO – em CAMBRIDGE (EUA)
GILBERTO DIMENSTEIN – Colunista da FOLHA, em CAMBRIDGE (EUA)
A historiadora Drew Faust, 62, é a primeira mulher a dirigir Harvard. Alçada a reitora
em 2007, ela vem comandando a universidade sob a crise económica e uma
expansão global.
No próximo dia 23, vem ao Brasil para uma visita de quatro dias que a levará ao Rio e
a São Paulo, onde se reúne com autoridades educacionais, representantes de
Harvard, universitários e ex-alunos.
Faust recebeu a Folha no último dia 9, quarta-feira, em seu gabinete em Cambridge,
Massachusetts, e concedeu a entrevista abaixo.
.
FOLHA – O que a Sra. espera da viagem ao Brasil?
DREW FAUST – Nunca estive lá. Estou animada em ir, afinal, é obviamente um lugar
vibrante, que está crescendo e se tornando cada vez mais importante no mundo. É um
pais sobre o qual eu comecei a aprender como estudante pesquisando história
comparada nas Américas no colonialismo e na escravidão. Essa foi minha introdução
na história do Brasil, mas nunca tive a chance de estar lá.
Sempre leio a respeito do Brasil, porém, sobre seu crescimento e reivindicação de
uma parte significativa da produção econômica mundial. Também a política do Brasil
tem sido muito interessante nos últimos anos, com o presidente Lula os avanços que
ele promoveu no país.
Estou bem animada em ir, temos professores interessados em promover atividades no
Brasil, como os programas de janeiro, quando os estudantes da escola de governo, da
escola de engenharia e da graduação vão lá estudar água e questões ambientais.
FOLHA – A sra. acha que o Brasil está atraindo mais gente para estudar sobre o
Brasil? Mais gente está interessada?
FAUST – Acho que sim. Acho que a melhor representação disso é a questão dos
BRICs, sobretudo do Brasil, que passou a ser visto como uma das principais forças
emergentes na economia internacional e na ordem mundial. Isso por si só atraiu muita
atenção.
FOLHA – Ainda assim não há tantos estudantes e professores aqui em Harvard,
mesmo quando se compara, proporcionalmente, com outros países latinoamericanos. A universidade está tentando fortalecer estes laços?
FAUST – Estamos, estamos bastante. Temos uma doação muito generosa de um
brasileiro, o Jorge Paulo Lemann, que apoiou nossa expansão em estudos brasileiros,
então avançamos alguns passos e esperamos que continuemos a avançar.
FOLHA – Vocês têm um escritório lá [desde 2006]. Como está indo?
FAUST – Acho que está indo muito bem. Há bastante interesse por parte de nossos
professores e estudantes em fazer conexões e tocar programas lá, como esse que eu
citei.
A [Harvard] Business School está muito interessada em fazer estudos de casos do
Brasil, dada a animação com a economia. Estamos bem otimistas com as nossas
conexões com o Brasil, e minha viagem é para reforçar isso, essa expansão e esse
envolvimento. Espero conseguir intensificar esse momento.
FOLHA – E uma colaboração entre Harvard e universidades brasileiras, como a
USP e a Unicamp, seria interessante?
FAUST – Acho que nossa conexão com universidades internacionais é sempre sadia e
pródiga em construir mais conexões. Estou ansiosa por um encontro.
FOLHA – Como Harvard está se expandindo globalmente e o que está fazendo
para atrair mais estrangeiros, não só estudantes mas também professores?
FAUST – Nós nos tornamos uma universidade muito mais global nos últimos anos em
uma série de aspectos. Tivemos um aumento de 20% no número de estudantes
estrangeiros aqui em Harvard na última década, de forma que hoje 20% dos alunos da
universidade hoje são estrangeiros. Isso varia de escola para escola –a escola de
governo é a mais internacionalizada – mas de modo geral 20% dos alunos são
estrangeiros. E isso é uma mudança significativa na última década.
Outra coisa importante que mudamos nesse sentido é a ênfase, para os alunos de
graduação, à importância de ter uma experiência internacional significativa durante
seu período aqui.
Isso é uma mudança cultural para nossos alunos de graduação, que costumavam ser
praticamente desestimulados a passar um tempo fora de Cambridge. Mas agora os
exortamos a fazer, e temos inclusive apoio financeiro para ajudá-los a fazer caso eles
venham de famílias que não tenham meios de arcar com isso.
Também temos uma série de programas que pode ligá-los a oportunidades no mundo,
achar estágios dos quais eles possam se beneficiar em empresas e organizações sem
fim lucrativo e outros tipos de atividades que lhes possam ser significativas, além de
identificarmos uma série de oportunidades para estudar fora.
A reação dos nossos estudantes foi impactante –1/4 deles teve alguma experiência
internacional significativa no ano passado.
Se você considerar que um quarto deles vá a cada ano, e que eles fiquem aqui quatro
anos, praticamente todo mundo acaba fazendo tendo uma dessas experiências.
Se olharmos a forma como nossos professores pesquisam, isso também mudou
drasticamente. Temos uma proliferação de professores viajando para trabalhar e
buscando os serviços que nosso departamento internacional fornece.
Nós aumentamos o número de escritórios desses nos últimos anos e temos um novo
modelo em Shangai, que é mais do que só um escritório, é um espaço com salas de
aula, para ensino, e oferece oportunidades para atividades em vez de apenas manter
um escritório.
Estamos experimentando ainda qual o melhor modelo, qual o melhor roteiro, qual a
melhor forma de fortalecer as oportunidades para estudos e pesquisa.
FOLHA – Harvard recebe fundos de fora?
FAUST – Nos últimos anos temos recebido algumas doações bem generosas para
apoiar estudantes que vêm de outros países, como a doação do Lemann, que inclui
apoio aos alunos que vêm do Brasil e isso tem sido um fator importante para trazer
alunos para cá.
FOLHA – E apoio para pesquisa?
FAUST – Em alguns casos há, já que alguns dos estudantes em questão são
doutorandos com pesquisa a desenvolver.
FOLHA – Qual a relação de Harvard com o governo federal e as instituições
privadas no que diz respeito ao financiamento de pesquisa? E como esse
financiamento é distribuído?
FAUST – A Fundação pela Pesquisa Científica nos EUA, desde a Segunda Guerra,
tem sido uma parceria entre as universidades e o governo federal. Há essencialmente
uma decisão tomada, da qual as universidades nos EUA estão bem cientes, de que a
pesquisa científica seria amparada por dinheiro do governo federal, e essas
universidades seriam o local das pesquisas mais importantes.
Nós recebemos uma proporção substancial, maioritária de nosso financiamento à
pesquisa do governo federal. Está em cerca de 21% de nosso orçamento total hoje [de
US$ 3,7 bilhões] – e isso só para pesquisa patrocinada, não é todo o investimento
federal. E ainda temos cerca de US$ 600 milhões por ano de fontes federais para
pesquisa em ciências e ciências sociais.
Nosso orçamento também conta com uma contribuição significativa de nosso fundo de
doações [endownment], que é um modelo de operação próprio das universidades
privadas e que algumas universidades públicas agora tentam adotar.
Hoje cerca de 35% de nosso orçamento operacional vêm desse fundo. Está um pouco
abaixo de dois anos atrás, era 38%, e estamos tentando diversificar. E depois temos a
anuidade, que também perfazem uma boa parte de nosso orçamento.
FOLHA – O fundo sofreu nos últimos dois anos, não? Como foi lidar com a crise
económica?
FAUST – [A crise] nos obrigou a termos um olhar mais duro com o que estávamos
fazendo, ver como poderíamos ser mais eficientes, estabelecer prioridades e decidir o
que poderíamos passar sem. O fundo de fato caiu 27%, e ele bancava 38% do nosso
orçamento. Foi um momento de auto exame intenso na universidade, e acabamos
fazendo algumas mudanças. De forma geral, eu diria que o resultado foi esse auto
exame que não necessariamente teria motivo sem a disciplina financeira imposta pela
crise. Mas acho que no longo prazo seremos uma instituição mais forte por conta
disso.
FOLHA – As mudanças foram mais administrativas, certo? Pelos números, o
investimento em pesquisa não caiu, até cresceu. É a prioridade máxima?
FAUST – É a prioridade, junto com a ajuda financeira aos estudantes. Tentamos olhar
para a estrutura administrativa para fazer os cortes, o que poderia torná-la mais
eficiente. Mas também desaceleramos as contratações académicas por um ano e
revisamos a forma como desenvolvemos nosso trabalho académico.
Um dos aspectos da crise que acabou nos ajudando foi o pacote de estímulo fiscal
aprovado pelo governo, que incluiu bastante fundo para ciência. Nós recebemos um
apoio significativo para ciência [US$ 190 milhões; R$ 315 milhões] _ a lógica é que a
ciência gera crescimento, gera atividade económica, então isso seria uma contribuição
importante para a recuperação.
FOLHA – A Sra. pode citar exemplos de como Harvard tem contribuído para o
crescimento económico do país?
FAUST – Bom, em primeiro lugar, nós criamos muitos postos de trabalho na região. E
há as descobertas feitas nas nossas pesquisas científicas, que muitas vezes levam à
criação de empresas e de patentes, que se tornam a base para novos trabalhos, para
a comercialização, para descobertas. É um efeito cascata para a inovação.
FOLHA – Como o Facebook?
FAUST – Isso, e a Vortex, uma empresa surgida de cientistas ligados a Harvard que
fez uma descoberta importante para o tratamento da fibrose cística. Foi extraordinário,
indivíduos de 20 e poucos anos, que estavam na cadeira de rodas após serem
acometidos por essa doença, voltaram a andar. Uma descoberta dessa é um motor
económico e um motor humano. E essas descobertas não se restringem aos pósgraduandos, também temos estudantes de graduação cheio de ideias, como foi o caso
do Facebook.
Tem uma história que eu adoro, de um grupo da graduação na escola de engenharia,
que é super interessado no mundo em desenvolvimento e em usar tecnologia para
criar um mundo melhor. Um dos projetos deles foi uma bola de futebol que, quando
você chuta, gera energia em uma bateria. Ou seja, após jogar futebol, você volta para
casa, pluga no seu telefone celular ou em algum outro electrónico e recarrega. Foi
usado na África, onde eles gostam de futebol. Temos esse grupo de graduandos
chamado Soccket [trocadilho entre 'soccer', futebol, e soquete] que está disseminando
essa ideia e buscando um meio de comercializá-la.
FOLHA – Como Harvard recruta esses alunos? Há a força da marca, e a ajuda
financeira tem sido fundamental, recentemente, para garantir a diversidade do
campus nos últimos. Mas quão ativa a universidade é para manter a excelência
do corpo estudantil da mesma forma que mantém no docente?
FAUST – Tentamos mandar essa mensagem que queremos ter aqui gente talentosa
independentemente da situação financeira e localização geográfica, que queremos
trazê-los para cá.
Fazemos isso por meio de nosso escritório de admissões, que viaja pelo país e o
mundo todo, contando a história de Harvard e dizendo que eles deveriam considerar
Harvard como uma opção, mesmo que imaginem que não têm como. E procuramos
reforçar isso com um pacote de ajuda financeira, que faz a universidade parecer
acessível. E, nos últimos anos, criamos uma série de iniciativas para famílias de baixa
renda. Famílias que ganham menos de US$ 60 mil ao ano [R$ 8.300 ao mês] não
precisam pagar a anuidade nem moradia e alimentação.
Famílias que ganham entre US$ 60 mil e US$ 80 mil a contribuição familiar é
drasticamente reduzida, e famílias que ganham de US$ 80 mil a US$ 180 mil [R$ 11
mil a R$ 24,9 mil], você paga mais ou menos 10% de sua renda, que é menos do que
em qualquer outra universidade pública nos EUA e achamos bem acessível para
nossos alunos e suas famílias.
Isso é uma mensagem que diz “venha a nós, queremos seu talento aqui”, porque uma
grande parte da experiência de aprendizagem dos alunos é aquilo que aprendem uns
com os outros, e a animação de conviver com outros indivíduos extraordinários que
são criativos e engajados.
Com essa mensagem, conseguimos 35 mil inscrições neste ano [7.036 se formaram
em 2009], que é uma medida do nosso sucesso em transmitir essa mensagem.
Foi interessante quando eu estive em Londres em novembro e um ex-aluno de
Harvard veio contar que na antiga escola dele, embora ninguém tivesse se inscrito em
Harvard recentemente, 18 pessoas se inscreveram neste ano por conta do filme “A
Rede Social”.
FOLHA – Quão importante é ter os melhores aqui? Quanto eles aprendem uns
com os outros?
FAUST – Não tenho como dar um percentual, mas, veja, este é um ambiente muito
mais diverso do que qualquer outros em que os estudantes já tenham vivido ou
venham a viver. São pessoas diferentes deles, às vezes de outras partes do mundo,
com outras ideias, outros talentos, e isso é muito enriquecedor. E o nível de talento em
várias áreas é muito alto, o que leva nossos estudantes a passar a ver a excelência
em diferentes níveis.
Uma das coisas que mais gosto neste trabalho é ver o desempenho dos estudantes.
Pode ser falando de sua tese, ou indo à feira de computação, na qual têm de criar um
aplicativo ou um programa e há investidores de olho para achar o novo Facebook;
pode ser no palco, tocando piano, dançando – temos alunos que trancam a matrícula
para serem dançarinos e músicos profissionais e depois voltam…
FOLHA – Mesmo com tanta tecnologia disponível, ensino remoto, não há como
substituir a convivência …
FAUST – A tecnologia mudou muita coisa no ensino e possibilita que mudemos nosso
foco – temos um curso em egiptologia que nos permite reconstruir as tumbas quando
foram descobertas e andar lá como se fosse o arqueólogo que as descobriu, que é
muito diferente do jeito como eu aprendi história do Egito, lendo e com fotos. Temos
professores que colocam suas aulas online, os estudantes assistem antes, anotam as
dúvidas, o professor as lê e na sala de aula há o debate sobre as questões. A sala de
aula deixa de ser para transmitir informação e passa a ser para debatê-la.
A tecnologia fortaleceu a experiência ao vivo. Mas achamos que esse tipo de
aprendizado, pela convivência com gente diferente, é essencial. Temos até o sistema
de alojamento, no qual os graduandos aprendem a viver juntos, dividir o banheiro, o
refeitório, os projetos. Aprender vai além do computador.
E tem outra coisa: essas conexões não existem apenas pelo tempo em que você está
aqui. Elas duram a vida toda. Depois de conviverem, elas contarão umas com as
outras pelo resto de suas vidas. Elas voltam aqui a cada cinco anos, mas também
fazem parte dessa rede de conexões que persiste fora daqui.
FOLHA – Isso é enfatizado em Harvard, certo? Networking é fundamental não só
entre alunos mas também entre alunos e professores.
FAUST – Com certeza.
FOLHA – O presidente Barack Obama tem enfatizado muito a educação pública –
e no Brasil temos o mesmo problema. Qual o papel de Harvard em melhorar a
educação pública aqui? O que é possível fazer?
FAUST – O que podemos fazer depende do que as escolas já tiverem feito.
Financiamentos generosos aos estudantes para atingir uma parcela mais ampla [da
população] não significaria nada se não conseguíssemos achar estudantes bem
preparados para dar conta dos estudos aqui. Logo, o que vem antes, o ensino médio,
é fundamental para o que fazemos aqui.
Temos uma escola de educação profundamente envolvida nisso e que quer
revolucionar o que escolas do tipo fazem; uma escola onde acreditam que as escolas
de educação não usam ainda as ferramentas das ciências sociais para analisar o que
funciona e não funciona em ensino, como nosso conhecimento em neurociência pode
afetar o modo de ensinar; como podemos fazer avaliações melhores etc. E eles
também acreditam que uma parte significativa de melhorar a educação é liderança.
Então acabamos de criar um curso de liderança em educação, que recebeu bastante
atenção. A chave desse programa é integrar o que a escola de educação sabe sobre a
forma como os alunos aprendem, o que a Business School pode ensinar sobre
administrar organizações e o que a escola de governo oferece sobre política e
políticas de educação a fim de formar pessoas que possam chegar nas escolas e
mudar o quadro, que entendam o sistema educacional e o sistema em si para ver o
que é preciso fazer em termos de reformas sistemáticas que possam lidar com os
desafios que enfrentamos aqui.
Também temos outras pessoas, em outros departamentos e escolas, lidando com
questões educacionais. E temos mais de 100 programas apoiados por nós nas
escolas da região.
FOLHA – A Sra., já explicou o recrutamento de alunos. E como vocês fazem para
atrair e manter os melhores professores? Há muitos rumores sobre salários
altos, que chegariam a US$ 1 milhão ao ano …
FAUST – Não, isso não é verdade!
FOLHA – Mas ainda assim a folha de pagamento consumiu US$ 1 bilhão no ano
passado. Além de bons salários e da marca, o que Harvard oferece aos docentes
e pesquisadores?
FAUST – Um dos aspectos importantes tem muito a ver com o que eu disse sobre os
estudantes: tentamos ter a base mais diversificada possível para garantir que não
estamos ignorando ninguém para ficar com a escolha mais óbvia ou mais conhecida
de quem cuida das contratações.
Tentamos primeiro construir uma base bem ampla, e aí nossos professores passam
bastante tempo analisando o trabalho dos possíveis candidatos, lendo tudo, pedindo
cartas de colegas com depoimentos e avaliações.
Depois há uma série de avaliações até a contratação. Começa com gente no mesmo
campo, depois vai para a diretoria da respectiva escola até chegar a mim ou ao próreitor. Temos uma comissão ad-hoc, que traz gente de fora da universidade,
especialistas, que passam três horas examinando as credenciais do individuo e
avaliando se aquela pessoa deve ser contratada. Esse processo todo é feito para ser
muito rigoroso, tanto na procura quanto na avaliação das credenciais de um professor.
Para convencê-los a vir aqui, a razão mais atraente é sempre as pessoas em volta e a
oportunidade intelectual.
Um departamento vibrante, outros académicos que vão ajudar a aprimorar o trabalho
daquele indivíduo, desafiando-o de forma a conseguir seu melhor trabalho, essa é
nossa ferramenta mais importante.
Também tentamos criar um ambiente para um indivíduo desenvolver seu melhor
trabalho, o que pode significar fornecer recursos em um laboratório, uma boa
biblioteca, chances de pesquisa, financiamento de viagens se a pessoa precisa
pesquisar em outros lugares.
E na questão salarial, estamos no mercado para atrair talentos académicos. A pessoa
nos diz quanto está ganhando, quanto precisa, e nós respondemos dentro do
mercado.
FOLHA – Há duas questões controversas recentes …
FAUST – Só duas? (risos)
FOLHA – As que estão em debate agora. Uma é fraude acadêmica e plágio,
sobretudo após o escândalo como o biólogo Marc Hauser [que fraudou
conclusões de um estudo], outra é a questão do conflito interesses, que ficou
exposta tanto no recente documentário “Trabalho Interno”, que mostra as
ligações entre académicos promovendo determinadas ideias e o mercado
financeiro, e também na renúncia do reitor da London School of Economics, há
duas semanas, por aceitar financiamento do ditador líbio Muammar Gaddafi.
Como Harvard está lidando com as duas questões, houve mudanças recentes?
FAUST – Na questão do conflito de interesses, estabelecemos uma nova política no
ano passado que abrange toda a universidade. E diferentes escolas estão
desenvolvendo cada uma sua forma de implementar, já que conflito de interesse
assume diferentes formas e em diferentes campos. Cada parte da universidade lidou
com isso com uma intensidade diferente nos últimos anos – foi alvo de tremenda
preocupação, e algo levado a público, na área médica. Houve muito debate e todos na
escola de medicina estão muito atentos.
Em outras partes há diferentes significados – na escola de arquitetura isso é diferente
de em pesquisa económica, por exemplo. Há muitas possibilidades, e cada um está de
olho no impacto em suas áreas.
Uma coisa que sabemos é que a universidade está hoje muito mais envolvida no
mundo do que estava 15 ou 10 anos atrás. Isso é uma boa coisa, porque traz
experiências do mundo real para suas pesquisas, e as torna muito mais conectadas
com problemas que requerem soluções, envolve mais os estudantes, que lidam com o
mundo que vão encontrar depois…
Mas tudo isso levantou questões que a universidade não havia enfrentado. Estamos,
de algum modo, reagindo a essa mudança de circunstância com uma reavaliação do
que é conflito de interesses. Ainda não terminamos esse processo, mas conseguimos
algumas coisas ao lidar com questões sobre as quais as pessoas ainda não haviam
pensado porque não haviam se visto naquela situação.
Sobre a integridade académica, isso é fundamental para tudo que fazemos e a forma
como nos vemos, então precisamos continuar lidando com isso.
Isso, aliás, também mudou, pois com a tecnologia é tão fácil para as pessoas, para os
estudantes, usarem material na internet… E uma coisa que vemos às vezes nos
estudantes é que eles não estão tão conscientes do que integridade académica
significa, então parte disso é educar os estudantes, parte é ajustar nossa
compreensão sobre a disponibilidade de materiais e parte é apenas reforçar os valores
que achamos tão importantes.
FOLHA – Última coisa que você já deve ter respondido milhares de vezes.
Depois das declarações do [ex-reitor] Larry Summers sobre a capacidade
feminina menor para as ciências, como é ser a primeira reitora mulher de
Harvard? Faz diferença?
FAUST – Primeiro recebi um monte de cartas, chamou atenção. Mas agora acho que
as pessoas já se acostumaram.