universidade católica de angola revista académica lucere

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universidade católica de angola revista académica lucere
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
CENTRO DE ESTUDOS E INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA
REVISTA ACADÉMICA
LUCERE
OUTUBRO DE 2012
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
Índice
APRESENTAÇÃO............................................................................................................................. 5
IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR CATÓLICO DE BENGUELA ............................... 12
3. Universidade Católica: natureza e missão .......................................................................... 13
A) Natureza.............................................................................................................................. 13
Renewable Energy in Angola: A New Paradigm .......................................................................... 17
Economic and Sectoral Context .................................................................................................. 17
Meeting the Challenge of an Energy Crisis.................................................................................. 18
Taking Advantage of Solar Resources ......................................................................................... 22
Attracting Private Sector Participation ....................................................................................... 23
Conclusion ................................................................................................................................... 24
References................................................................................................................................... 26
Critical gaps in maternal and newbornhealth services in the provinces of Luanda and Uíge in
Angola ......................................................................................................................................... 27
A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS ........................................................................... 44
Algumas questões para repensar o futuro de Angola................................................................. 60
Analysis of Interest Rates and Inflation in South Africa .............................................................. 66
Output Estimation ....................................................................................................................... 67
Interest Rate Model ............................................................................................................... 67
The model of interest rate with 2 lags ................................................................................ 69
Regression of residuals of the model number (2) ................................................................ 70
Inflation Model ........................................................................................................................ 72
The model of inflation l with 2 lags ..................................................................................... 74
Regression of residuals of the model number (6) ................................................................ 74
Cointegration Model ............................................................................................................. 76
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Regression of residuals of cointegrated model ................................................................... 78
Conclusion ................................................................................................................................... 79
References and Data ................................................................................................................... 80
OS GRANDES DESAFIOS DO CRESCIMENTO ECONÓMICO DE ANGOLA ATÉ 2017 ...................... 81
Les limites du capitalisme ......................................................................................................... 102
Penser la crise du néolibéralisme et les failles de la pensée économique avec Karl Polanyi - . 102
Autarquias em Angola: Qual o problema do “gradualismo”? ................................................... 114
Introdução: Teorizando o gradualismo no contexto da descentralização ............................ 114
Devolução, desconcentração, gradualismo e a bifurcação do Estado .................................. 118
As autarquias e o gradualismo na Constituição de 2010 ...................................................... 121
Autoridades tradicionais e o gradualismo ............................................................................ 123
Moçambique e a bifurcação do Estado ................................................................................. 125
Gradualismo alternativo: Um modelo para Angola? ............................................................ 130
Eficiência e limites da autoformação profissional e autoemprego No bairro da Sanzala em
Viana.......................................................................................................................................... 148
Julien David Zanzala (PhD) ........................................................................................................ 148
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas / UniPiaget ............................................................. 148
Resumo ..................................................................................................................................... 148
1.
Introdução......................................................................................................................... 148
O Balcão Único do Empreendedor e o Microempreendedorismo em Angola ......................... 155
Breve historial do ISPOCAB ....................................................................................................... 166
RECENSÃO CRÍTICA.................................................................................................................... 171
KICOLA: ESTUDOS SOBRE A LITERATURA ANGOLANA DO SÉCULO XIX .................................... 171
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ARTIGOS
IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR CATÓLICO DE BENGUELA – Eugénio Dal Corso, Bispo de
Benguela
RENEWABLE ENERGY IN ANGOLA: A NEW PARADIGM – Carlos Leite, Managing Director of Solarize
Energy
CRITICAL GAPS IN MATERNAL AND NEWBORNHEALTH SERVICES IN THE PROVINCES OF LUANDA AND
UÍGE IN ANGOLA – Ingrid Hoem Sjursen, Chr. Michelsen Institute
A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS – Alves da Rocha, UCAN/CEIC
ALGUMAS QUESTÕES PARA REPENSAR O FUTURO DE ANGOLA – Adelino Torres, Jubilado do ISEG
ANALYSIS OF INTEREST RATES AND INFLATION IN SOUTH AFRICA – Albertina Delgado, UCAN
OS GRANDES DESAFIOS DO CRESCIMENTO ECONÓMICO DE ANGOLA ATÉ 2017 – Alves da Rocha,
CEIC/UCAN
LES LIMITES DU CAPITALISME – PENSER LA CRISE DU NEOLIBERALISME ET LES FAILLES DE LA PENSÉE
ECONOMIQUE AVEC KARL POLANYI, - Jérôme Maucourant, Université de Lyon
AUTARQUIAS EM ANGOLA: QUAL O PROBLEMA DO GRADUALISMO? – Aslak Orre, Chr. Michelsen
Institute
CEIC – 10 ANOS DE REALIZAÇÕES, - Regina Santos, CEIC/UCAN
EFICIÊNCIA E LIMITES DA AUTOFORMAÇÃO PROFISSIONAL E AUTOEMPREGO NO BAIRRO DA SANZALA
EM VIANA – Julien David Zanzala, Universidade Piaget
O BALCÃO ÚNICO DO EMPREENDEDOR E O MICROEMPREENDEDORISMO EM ANGOLA – Francisco
Miguel Paulo e Precioso Domingos, CEIC/UCAN
DOCUMENTOS
BREVE HISTORIAL DO INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO CATÓLICO DE BENGUELA – Pe. Amadeu Ngula
RECENSÃO CRÍTICA
KICOLA: ESTUDOS SOBRE A LITERATURA ANGOLANA DO SÉCULO XIX DE FRANCISCO SOARES – Nelson
Pestana, CEIC/UCAN
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APRESENTAÇÃO
Os temas tratados neste número da Revista Académica LUCERE, da Universidade
Católica de Angola, são variados, embora apresentem como denominador comum a
preocupação pela existência de sociedades justas, equilibradas, livres, participativas e
democráticas.
O ponto de vista político é essencial para o desenvolvimento. Sociedades
abertas, democráticas, participativas, liberais e responsáveis são um ingrediente
fundamental para a felicidade das pessoas. Cidadãos felizes são trabalhadores,
empresários, professores, investigadores, governantes, escritores e artistas mais
produtivos. Do ponto de vista político, a situação parece ser crítica em Angola. Como
se sabe, as opiniões internas são muitas e divergentes sobre este item e, por isso, para
ilustrar um ponto de vista independente utilizou-se o Democracy Index de 2010 e 2011
construído pelo The Economist, a mais prestigiada revista de economia do mundo1.
O seu estudo sobre as condições de exercício da democracia no mundo já vai na
quarta edição e para os seus autores a situação política no mundo em 2011
apresentou alguns retrocessos. São investigados 167 países, agrupados em
“democracias completas”, “democracias incompletas”, “regimes híbridos” e “regimes
autoritários”. Cabo Verde, em 2011, conseguiu ser a primeira das democracias
incompletas, à frente de alguns países europeus. Ainda dentro desta categoria
aparecem, no contexto da SADC, países como a África do Sul, Botsuana, Lesoto,
Namíbia, Zâmbia e Malawi. As Maurícias foram consideradas como um país de
democracia plena. Angola está classificada em 133º lugar, dentro do grupo dos
regimes autoritários. E a situação piorou de 2010 (131º lugar), para 2011.
Mas também as condições e os modelos económicos. Igualmente as doutrinas
económicas e sociais são relevantes para a construção de sociedades justas. Adelino
Torres (ISEG, UTL) e Jérome Muancourant (Universidade de Lyon) apresentam-se como
críticos de sistemas em que o excesso de liberalismo económico conduz
necessariamente a desigualdades sociais inaceitáveis num mundo onde os progressos
científicos e tecnológicos são constantes, sistemáticos e virados para a melhoria das
condições de vida das populações.
Também nesta perspectiva se coloca a Doutrina Social da Igreja enquanto
conjunto de textos definidores duma linha de comportamento cristão baseado em três
1
Democracy Index 2011 – Democracy Under Stress, A Report From The Economist Intelligence Unit, 2011.
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princípios essenciais: solidariedade, caridade e subsidiariedade. Tendo como centro a
pessoa de Jesus Cristo, a Doutrina Social da Igreja está expressa nos Evangelhos e nas
diferentes Encíclicas Papais que foram sendo escritas ao longo dos tempos. A colecção
de vários textos do magistério da Igreja, para alguns representa a Doutrina Social da
Igreja, ou seja, a manifestação actual de um esforço milenar de anunciar e viver o
Evangelho. A abordagem do cristão aos problemas da economia pode ser resumida
num pensamento muito simples: a economia dirige-se para o homem e o homem
dirige-se para Deus. Desta ideia simples pode extrair-se que a função utilidade dos
cristãos é a de se orientar para todos os homens e o homem todo.
São 12 artigos inseridos neste número da LUCERE: 3 em inglês, um em francês e
8 em português. Claramente está-se numa via de internacionalização da Revista
Académica da UCAN.
D. Eugénio Dal Corso, Bispo de Benguela, colabora neste número da Revista
Académica da Universidade Católica de Angola com o texto da sua conferência em
Benguela por ocasião da comemoração do reconhecimento oficial da criação do
Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela, cuja qualidade suscitou um pedido
de cedência do mesmo para publicação na LUCERE. Uma intervenção de enorme
relevância, em diferentes vertentes: o pequeno historial das Universidades no mundo
e a contribuição da Igreja Católica para o seu aparecimento enquanto centros de saber
universal, o papel das Universidades Católicas na sua função de agregar e transmitir
conhecimento e de educação ética e moral dos cidadãos, dentro de valores
universalmente aceites como enquadradores do comportamento cívico das pessoas, as
dificuldades que rodeiam o exercício e a prática do ensino superior no nosso país e
outros igualmente aliciantes. O radical comum a todas as Universidades Católicas
existentes em todo o mundo foi a Universidade Católica de Bolonha criada em 1088 e
à qual se seguiram a de Pádua (1204), de Paris (1215), de Salamanca (1218), de
Nápoles (1224), de Oxford (1284) e de Coimbra (1290). O século XIII pode, portanto,
ser considerado o das Universidades Católicas na Europa, às quais se foram seguindo
outras de natureza não religiosa. Mas a intervenção de D. Eugénio Dal Corso abarca,
igualmente, a posição, o papel e a função social das Universidades Católicas. A Grande
Federação Internacional das Universidades Católicas, congregando 192 instituições de
ensino superior espalhadas por 52 países é uma estrutura que, porventura, mais
nenhumas outras Universidades dispõem e que confere às Católicas uma verdadeira
vantagem comparativa. É clara a abordagem que D. Eugénio apresenta sobre a
natureza e a missão de serviço das Universidades Católicas. É particularmente feliz o
pensamento do Bispo de Benguela sobre o trabalho de investigação das Universidades
Católicas: diálogo entre a fé e a razão, integração do conhecimento, preocupação ética
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e a perspectiva teológica. Ficaram para trás os tempos em que a religião era a única
fonte de conhecimento, reconhecendo-se, agora, a valia da ciência, da razão e da sua
interligação com a fé.
Carlos Leite – um dos fundadores do Centro de Estudos e Investigação
Científica da Universidade Católica de Angola – dá-nos uma sinopse, logo no início do
seu interessante artigo, sobre as expectativas pós-guerra civil em Angola, referindo as
penosas desigualdades na distribuição do rendimento facilitadas e potenciadas pelo
actual modelo de exercício da política e pela natureza das políticas económicas,
amplamente favoráveis à acumulação de riqueza e à concentração do rendimento. De
resto, uma evidência no quotidiano dos angolanos, mas que teima em se manter e
ampliar, fazendo de Angola um dos países mais desiguais e injustos do mundo. Mas o
foco de Carlos Leite é o das infra-estruturas que continuam em falta no país, com
ênfase para o domínio da electricidade. Não se pode industrializar e diversificar a
economia – um casamento agricultura/indústria/serviços – com geradores, nem se
pode difundir o progresso junto das comunidades rurais sem acesso à electricidade. A
análise de Carlos Leite sobre a problemática energética – renovável e não renovável –
é serena, mas acutilante, valendo a pena interpretar as suas observações e
consequentes propostas. Identifica as mais salientes deficiências do sistema de
electricidade de Angola, o que lhe permite, na base desta reflexão inteligente,
apresentar uma visão sobre a mais adequada estratégia, que combine renovável e não
renovável. Esta rota poderá permitir um crescimento económico de baixo custo
energético e de maior difusão da electricidade junto das famílias e das comunidades.
São relevantes as sugestões que Carlos Leite apresenta sobre uma estratégia para o
sector energético de Angola, ligando-as aos mais recentes desenvolvimentos no
mundo sobre esta matéria. Leite sublinha que nas economias mais desenvolvidas as
estratégias e as políticas energéticas procuram combinar, por uma questão de redução
de custos e maximização de proveitos e utilidades, as fontes renováveis com as fontes
não-renováveis, dando como exemplos a Alemanha, o Canadá e os Estados Unidos.
Mas informa-nos também das experiências da China e de outros países asiáticos. Para
os interessados e estudiosos das matérias energéticas, este artigo é de leitura
recomendada.
O artigo de Ingrid Hoem Sjursen, investigadora do CMI (Christian Michelsen
Institute de Bergen) é baseado nos resultados de um vasto inquérito realizado em
Luanda e no Uíge sobre o fornecimento de serviços de saúde à população. Além de se
explicar que são de fraca qualidade – e também em reduzida quantidade, ficando uma
margem considerável da população sem acesso aos mesmos – em qualquer das
províncias, a autora retira ilações importantes sobre as desigualdades existentes entre
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as mesmas. O défice no fornecimento de serviços de saúde tem implicações sobre o
estado de saúde das pessoas, agravando-se a sua pobreza e minando-se a sua
produtividade. As populações de Luanda estão muito mais bem servidas do que as do
Uíge, sendo mais uma das assimetrias na distribuição do rendimento tão
características de Angola. Ingrid, neste bem arquitectado artigo, mostra todos os
aspectos relacionados com a saúde das populações destas duas regiões do país,
apresentando razões para a baixa qualidade dos serviços prestados e para as
desigualdades detectadas.
Alves da Rocha trata da responsabilidade social das empresas, enquanto tema
da actualidade e das novas estratégias de inserção social das unidades económicas.
Mas sempre na perspectiva da maximização dos seus lucros e não inteiramente na da
inserção das comunidades na partilha dos seus resultados financeiros. Ainda vão ser
necessários muitos anos para que as propostas para um novo paradigma do
capitalismo de Sua Santidade Bento XVI se concretizar. São algumas, embora tímidas,
as tentativas relativamente bem-sucedidas de responsabilidade social das empresas
em Angola.
Adelino Torres é um pensador de reconhecidos méritos e com contribuições
determinantes para o pensamento económico e social em África. É francamente um
afro-optimista e um defensor do papel activo do Estado na economia, regulando e
regulamentando mercados, criando externalidades, promovendo a justiça social e
encarregando-se das infra-estruturas económicas e sociais. Nunca perde oportunidade
de defender o continente africano e de mostrar as suas enormes potencialidades.
Adelino Torres – e a sua vasta obra – é um autor de leitura obrigatória. Neste artigo,
apesar de se basear numa comunicação apresentada num Colóquio da Casa de Angola
em Lisboa em 1999, Adelino Torres reflecte sobre muitas questões de actualidade
inquestionável, porque ainda não resolvidas: democracia, liberdade, boa governação,
transparência, corrupção, melhoria das condições de vida, distribuição do rendimento,
modelos de industrialização e de diversificação da produção e assimetrias várias.
O artigo da Albertina Delgado é eminentemente econométrico e mostra o
domínio que tem sobre estas técnicas matemáticas aplicadas à economia. A sua
preferência foi para o estudo econométrico das taxas de inflação na África do Sul que
pode perfeitamente ser aplicado ao fenómeno inflacionista em Angola.
No segundo artigo que Alves da Rocha apresenta neste número da Revista
Académica da UCAN questionam-se os desafios do crescimento económico em Angola
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até 2017, baseados nas projecções do Fundo Monetário Internacional sobre o
comportamento futuro da economia nacional.
Saúda-se o artigo do Professor Jérôme Maucourant da Universidade de Lyon
(Université Jean Monet) que pode indiciar o início de uma colaboração com a UCAN e
o CEIC em domínios relacionados com estudos do desenvolvimento económico. O
título é sugestivo, num contexto internacional em que as políticas liberais e néoliberais aparentemente entraram em crise ao serem incompetentes para conciliar
reformas estruturais e crescimento económico: “les limites du capitalisme – penser la
crise du neoliberalisme et les failles de la pensée économique avec Karl Polanyi”. A base
do seu artigo é o pensamento de Karl Polanyi um dos maiores historiadores
económicos e da sua grande obra “La Grande Transformation”, onde se analisam os
efeitos perversos do capitalismo liberal ao longo do tempo e se avança com a
eventualidade de se engendrarem regimes fascistas se esta máquina não for contida
em limites de racionalidade económica e viabilidade social. Jérôme Maucourant
passeia-se com grande à vontade pelas principais crises da sociedade de mercado, suas
causas e suas consequências e observa que uma das razões da actual crise económica
europeia e norte americana é a deflação salarial: “une des raisons actuelles qui a
contraint à l’inflation de la dette, via des inégalités croissantes, est le libré-échange:
celui-ci, notammente aux Étas Unis, este porteur de déflation salariale, ce qui va à
l’éncontre de l’ opinio communis des vingt derniéres années”.
O Aslak Orre é um excelente investigador e co-coordena o programa conjunto
CMI/CEIC de pesquisa económica, social e política. É um observador atento e judicioso
da realidade angolana, mormente a de pendor político e tem apresentado muitas
intervenções, escritas e em forma de palestras e conferências, em Angola,
Moçambique, Portugal, Reino Unido, África do Sul, Namíbia, Estados Unidos e
Noruega. O tema do artigo relaciona-se com a importante temática das autarquias em
Angola e sobre o processo da sua criação, teorizando sobre se o gradualismo é a
melhor forma para se criar a regionalização política em Angola. Mesmo o pensamento
oficial e dos seus arautos converge no sentido de se constituírem as autarquias no
país, para assim se contemplar, política e economicamente, uma realidade complexa,
diferenciada e com valores culturais que reclamam ser defendidos e colocar-se mais
próximos das comunidades. O ponto de reflexão de Aslak Orre está na dinâmica da
criação das autarquias e na sua efectiva autonomia e independência face ao poder
central. Aslak defende uma proximidade política genuína com as comunidades locais,
por ser a melhor forma de se expressarem anseios, necessidades, expectativas e a
participação nos processos decisórios. O artigo de Aslak Orre apresenta uma excelente
fundamentação teórica sobre a descentralização – administrativa, política, financeira e
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mesmo económica – e os benefícios da autonomia. Consegue, mesmo, abstrair-se das
excelentes experiências dos países desenvolvidos (em especial a Noruega de onde é
natural) e concentrar-se nas complexas realidades africanas, onde as tradições têm de
ser bem equacionadas para melhor se articularem os níveis da decisão e da
governação. Para Aslak Orre, Angola é o país mais centralizado de África, constatação
não muito abonatória para o regime político angolano. Não apenas em matérias
revertíveis às tomadas de decisão política com incidência sobre as comunidades locais,
mas, igualmente, em termos de receitas fiscais do Estado. Por isso, propõe duas vias: a
da autarquização – processo de criação e implementação de autarquias de modo
imediato, ainda que, naturalmente, assente em estudos específicos – e a da
desconcentração, que para Aslak significa “continuar a administrar os municípios
através de representantes da Administração Central”. Este artigo é estimulante e vale
a pena lê-lo com muita atenção.
A Regina Santos subscreve um artigo relacionado com os 10 anos do CEIC e do
Relatório Económico comemorados em Junho 2012. Trata-se de uma resenha bem
sistematizada e que expressa bem o que se passou durante este período, em que as
dificuldades de funcionamento do Centro foram mais do que evidentes e os apoios,
sobretudo financeiros, tiveram sempre uma origem externa. A despeito de se tratar
duma estrutura funcional e institucional da UCAN o seu funcionamento depende de
ajudas estrangeiras. A Regina retrata bem este percurso sinuoso do CEIC e, da mesma
forma, destaca a determinação dos seus trabalhadores em continuarem a fazer
investigação em condições muito pouco propícias a isso. Seguramente que este
apanhado da Regina Santos pode ser considerado como um documento indispensável
para se começar a escrever a história do CEIC.
O Professor Julien David Zanzala, da Universidade Jean Piaget, é, normalmente,
um reincidente na LUCERE, porque os seus artigos são sempre bem esquematizados,
escritos e apresentados. Desta vez apresenta-nos um muito interessante estudo de
caso sobre a autoformação profissional e o auto-emprego numa comunidade de Viana.
Baseado numa amostra de 200 pessoas que foram questionadas sobre a autoformação
e as consequências sobre a criação de emprego, o autor retira uma série de conclusões
sobre o funcionamento do mercado de trabalho informal. Evidentemente que se trata
do sector informal, mas a sua relevância, enquanto “almofada” social e económica
para as falhas da economia formal e do Governo (nas suas políticas de inclusão e de
disseminação do crescimento) é enorme e por todos confirmada. As dificuldades de
criação de emprego são reconhecidas a nível oficial – estima-se entre 25% e 30% a taxa
de desemprego em Angola – e a formação profissional pode ser uma via para se
ultrapassarem as barreiras à entrada no mercado de trabalho. Mas a formação é,
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sobretudo, um meio para se auferirem melhores salários, respeitando o equilíbrio
microeconómico entre valor da produtividade marginal do trabalho e valor das
remunerações do trabalho. A concorrência é tremendamente desleal face aos
expatriados ocidentais, muitos dos quais, sem experiências profissionais de relevo,
auferem salários “pornográficos” face aos trabalhadores angolanos e aos elevados
índices de insatisfação de necessidades sociais.
Dois jovens promissores investigadores do CEIC – Francisco Miguel Paulo e
Precioso Domingos, actualmente em Portugal a fazerem mestrados na Universidade
Católica de Lisboa – assinam um artigo sobre o micro-empreendedorismo em Angola.
Socorrem-se dos resultados dos inquéritos que a Sociedade Portuguesa de Inovação,
com a colaboração do CEIC, realiza periodicamente em Angola sobre a temática do
empreendedorismo. Estes resultados passaram a integrar o Global Entrepreneurship
Monitor, o Relatório Internacional sobre o estado do empreendedorismo no mundo.
Os autores relacionam os resultados para Angola com as iniciativas governamentais de
estimular a pequena iniciativa privada, nomeadamente pela via do Balcão Único do
Empreendedor e outras iniciativas semelhantes (Angola Investe, Programa de
Desenvolvimento das Micros, Pequenas e Médias Empresas, Programa de Apoio ao
Pequeno Negócio, etc.), concluindo que, por uma série de razões no seu artigo
explicitadas, os resultados têm-se situado bastante aquém do esperado.
Luanda, 6 de Janeiro de 2013
O Director do CEIC
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IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR CATÓLICO DE BENGUELA
CONFERÊNCIA NO INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO CATÓLICO DE BENGUELA
Eugenio Dal Corso
Bispo de Benguela
1.
Introdução
Gostaria, em primeiro lugar, manifestar a minha grande alegria e satisfação pelo
momento muito especial que estamos a viver; podemos dizer que é o nascimento
oficial e público desta instituição que já está a funcionar na diocese de Benguela como
ISUP desde o ano de 2006, e que foi reconhecida pelo governo angolano com decreto
presidencial n. 168/12 do 24 de Junho deste ano. Este é o primeiro acto público da
instituição, que tem o nome oficial de: INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO CATÓLICO
DE BENGUELA.
Grande alegria e profunda satisfação minha pessoal, mas estou certo de que estes
sentimentos podem ser ainda mais fortes noutras pessoas que trabalharam, lutaram e
sofreram para que este nascimento acontecesse; em primeiro lugar o nosso bispo
emérito Dom Óscar Braga e os directores que se sucederam no Instituto Superior
“João Paulo II”, até os actuais dirigentes, padres e leigos, da instituição.
Fui convidado a falar sobre este tema: IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR
POLITÉCNICO CATÓLICO DE BENGUELA. Aceitei com muito agrado; para cumprir esta
tarefa baseio-me principalmente nos documentos oficiais da Igreja Católica, em
particular da Congregação para a Educação católica. O documento que é como a
“magna carta” das universidades católicas no mundo, é a Constituição apostólica EX
CORDE ECCLESIAE do papa Beato João Paulo II de 15 de Agosto de 1990.
2.
Universidade
Para facilitar a exposição e a compreensão, chamarei o nosso Instituto de
Universidade Católica; de facto os mesmos documentos da Igreja se referem
indistintamente quer às universidades católicas propriamente ditas, como aos
Institutos Superiores Católicos.
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Gostaria antes de mais recordar que as Universidades, como hoje estão difundidas no
mundo ocidental, nasceram na Igreja católica. A primeira foi a de Bolonha fundada no
ano de 1088, chamada “Alma mater studiorum”; seguiu a Universidade de Pádua
fundada em 1204; com decreto papal nasce em 1215 a Universidade de Paris; em 1218
è fundada na Espanha a Universidade de Salamanca; em 1224 a Universidade de
Nápoles; a universidade de Oxford foi fundada pelo rei da Inglaterra em 1284; em 1290
é fundada a Universidade de Coimbra, a primeira do Portugal; no século XIV as
universidades difundiram-se na Alemanha (Colónia) e noutras cidades da Europa
oriental.
A Igreja Católica sempre procurou preservar, difundir e aprofundar a cultura
académica em todos os ligares onde ela chegava. Hoje em dia todas as universidades
católicas são unidas na FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DAS UNIVERSIDADES CATÓLICAS,
que está em 57 países com 192 universidades afilhadas. Penso poder afirmar que a
nossa Universidade católica de Benguela é a “kassule” desta grande família de
institutos superiores de ensino da Igreja Católica.
Hoje com o termo “universidade” designa-se uma entidade de direito público ou
privado, que opera no campo do ensino superior, da pesquisa e das actividades
culturais em geral.
A Universidade Católica, enquanto Universidade, é uma comunidade académica que,
dum modo rigoroso e crítico, contribui para a defesa e desenvolvimento da dignidade
humana e para o aumento e a transmissão a herança cultural mediante a investigação,
o ensino e os diversos serviços prestados às comunidades locais, nacionais e
internacionais. Ela goza daquela autonomia institucional que é necessária para cumprir
as suas funções com eficácia, e garante aos seus membros a liberdade académica na
salvaguarda dos direitos do indivíduo e da comunidade no âmbito das exigências da
verdade e do bem comum.
3. Universidade Católica: natureza e missão
A) Natureza
“A Universidade católica é sem dúvida alguma um dos melhores instrumentos que a
Igreja oferece à nossa época, que procura certeza e sabedoria” (Ex corde Ecclesiae,10).
A nossa universidade, enquanto católica, deve possuir as seguintes características
essenciais:
1. Uma inspiração cristã não só dos indivíduos, mas também da Comunidade
universitária enquanto tal; e isto deve aparecer também em sinais exteriores, tais
como o crucifixo nas salas de aula e em todos os ligares de direcção, uma capela onde
celebrar e orar, etc.
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2. Uma reflexão incessante, à luz da fé católica, sobre o tesouro crescente do
conhecimento humano, ao qual procura dar um contributo mediante as próprias
investigações;
3. A fidelidade à mensagem cristã tal como é apresentada pela Igreja;
4. O empenho institucional ao serviço do povo de Deus e da família humana no seu
itinerário rumo àquele objectivo transcendente que dá significado à vida (Ex corde
Eccl. 13).
Numa Universidade Católica, além da actividade do ensino, o trabalho de investigação
compreende necessariamente estes objectivos:
a) perseguir uma integração do conhecimento; b) o diálogo entre a fé e a razão; c) uma
preocupação ética; e d) uma perspectiva teológica
a)Integração do conhecimento: hoje existe uma tendência acentuada ao
fraccionamento do conhecimento; numa universidade católica os estudiosos
universitários deverão empenhar-se num esforço constante no sentido de determinar
a relativa colocação e o significado de cada uma das diversas disciplinas no quadro
duma visão da pessoa humana e do mundo iluminada pelo Evangelho e, portanto, pela
fé em Cristo, Logos, como centro da criação e da história humana.
b) O diálogo entre a fé e a razão: conservando embora cada disciplina académica a sua
integridade e os próprios métodos, este diálogo põe em evidência que a investigação
metódica em todo o campo do saber, se conduzida de modo verdadeiramente
científico e segundo as leis morais, nunca pode encontrar-se em contraste objectivo
com a fé. As coisas terrenas e as realidades da fé têm, com efeito, origem no mesmo
Deus.
c) Uma preocupação com as implicações éticas e morais: «É essencial convencermonos da prioridade da ética sobre a técnica, do primado da pessoa sobre as coisas, da
superioridade do espírito sobre a matéria. A causa do homem só será servida se o
conhecimento estiver unido à consciência. Os homens da ciência só ajudarão
realmente a humanidade se conservarem o sentido da transcendência do homem
sobre o mundo e de Deus sobre o homem» (Ex corde Eccl. N. 18).
d) Uma perspectiva teológica: A teologia desempenha um papel particularmente
importante na investigação duma síntese do saber, bem como no diálogo entre fé e
razão. “Dada a importância específica da teologia entre as disciplinas académicas, cada
Universidade deverá ter uma Faculdade ou, ao menos, uma cátedra de teologia” (Ex
corde Eccl. 19).
A Comunidade universitária de muitas instituições católicas inclui colegas pertencentes
a outras Igrejas, a outras Comunidades eclesiais e religiões. Dos membros não católicos
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espera-se o respeito do carácter católico da instituição na qual prestam serviço,
enquanto a Universidade, por seu lado, respeitará a sua liberdade religiosa.
B) A missão de serviço da universidade católica
A missão fundamental de uma Universidade é a procura contínua da verdade, a
conservação e a comunicação do saber para o bem da sociedade. A Universidade
Católica participa nesta missão com o contributo das características e finalidades
específicas. No serviço à sociedade o interlocutor privilegiado será naturalmente o
mundo académico, cultural e científico da região em que actua a Universidade católica.
São de encorajar formas originais de diálogo e de colaboração entre as Universidades
Católicas e as outras Universidades da Nação em favor do desenvolvimento, da
compreensão entre as culturas, da defesa da natureza com uma consciência ecológica
internacional.
Em síntese:
§ 1. Uma Universidade Católica, como qualquer Universidade, é uma comunidade de
estudiosos, representada por vários campos do saber humano. Ela dedica-se à
investigação, ao ensino e às várias formas de serviço, compatíveis com a sua missão
cultural.
§ 2. Uma Universidade Católica, enquanto católica, inspira e realiza a sua investigação,
o ensino e todas as outras actividades segundo os ideais, os princípios e os
comportamentos católicos. Ela está ligada à Igreja ou através dum vínculo formal
segundo a constituição e os estatutos, ou em virtude dum compromisso institucional
assumido pelos seus responsáveis.
§ 3. Toda a Universidade Católica deve manifestar a sua identidade católica mediante
uma declaração acerca da sua missão ou com outro documento público apropriado a
não ser que doutra maneira seja autorizada pela Autoridade eclesiástica competente.
Ela deve possuir, particularmente no que se refere à sua estrutura e aos seus
regulamentos, meios para garantir a expressão e a conservação de tal identidade.
§ 4. O ensino católico e a disciplina católica devem influir em todas as actividades da
Universidade, respeitando plenamente a liberdade da consciência de cada pessoa.
Cada acto oficial da Universidade deve estar de acordo com a sua identidade católica.
§ 5. Uma Universidade Católica possui a autonomia necessária para realizar a sua
identidade específica e cumprir a sua missão. A liberdade de investigação e de ensino é
reconhecida e respeitada segundo os princípios e os métodos próprios de cada
15
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disciplina, sempre que sejam salvaguardados os direitos dos indivíduos e da
comunidade, e dentro das exigências da verdade e do bem comum.
4. Em Benguela
Falamos de Benguela não só nem principalmente como cidade, mas como território, e
se queremos, como diocese. Benguela tem a sua história plurissecular (1617, são
quase 400 anos), as suas características religiosas, culturais e sociais; está a ganhar
cada dia mais importância também na política e na económica.
A nossa universidade de Benguela, pode e deve contribuir para estes objectivos:
- a investigação científica da história, da literatura, das artes e artistas desta região;
- o crescimento académico e cultural por meio do ensino e da aprendizagem,
estendidos também a outras áreas do interior da diocese e da província e com a
possibilidade de acesso oferecida também a estudantes dotados de inteligência e boa
vontade, mas sem muitos recursos económicos (bolsas de estudo para estudantes
pobres);
- o progresso social e o crescimento económico por meio da formação de pessoal
técnico bem qualificado quer profissionalmente, quer humanamente de nível superior
nas diferentes áreas da agricultura, da industria e do comércio;
- o desenvolvimento ordenado e sustentável da região no sentido do respeito e do
cuidado do ambiente natural;
- o desenvolvimento também do turismo, fazendo conhecer e valorizar as belezas
naturais do território e a variedade da fauna e da flora desta terra.
5. Conclusão
A criatura que hoje é apresentada ao mundo é ainda pequena, mas tem visão, vontade
e, cremos, capacidade para crescer e tornar-se um centro propulsivo e meio
importante para o bem da sociedade, e a difusão do Evangelho, enfim para uma vida
boa presente e futura das pessoas criadas e redimidas por Jesus Cristo. Isto vai
acontecer se todos nós nos comprometemos séria e generosamente para atingir estas
metas, com a certeza de que a ajuda de Deus Pai não só não nos vai faltar, mas vai
iluminar-nos e animar-nos com a sua luz e a sua graça.
16
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Renewable Energy in Angola: A New Paradigm
Carlos Leite
Managing Director of Solarize Energy (www.solarizeenergy.ca)
and formerly Economist at the International Monetary Fund.
Economic and Sectoral Context
Angola is at a decisive stage in its history. The conflict that restrained development for
so many decades has receded and the transition to a new political and economic
dispensation is underway. Along the way, Angola needs to address a complex
situation: high expectations due to substantial natural riches, a massively unequal
distribution of income, and one of the globe’s lowest human development indicators.
Choices made over the next few years will decide which model of development Angola
will follow for the succeeding decades: the Nigeria model of unequal wealth and
arrested development or the Malaysia model of broad-based prosperity and sustained
development.2
One of the principal transmission mechanisms to broad-based prosperity for a country
like Angola involves the provision of improved infrastructure services. In particular,
increased access to modern energy sources ina sustainable manner could help improve
livelihoods directly as well as indirectlythrough the promotion of economic
development.
However, just as in much of sub-Saharan Africa, there is currently a substantial
infrastructure deficit in Angola.As discussed in the first textbox below, thisdeficit tends
to be particularly acute in the power sector across Africa, and in Angola the average
consumption of electricity, at 182kWh per person,is only sufficient to light a 100-Watt
light bulb for 5 hours per day (see the first table below)… clearly insufficient to power
anything like a vigorous manufacturing sector.
Population (2009)
Angola
Nigeria
Namibia
Installed Electricity
Capacity (2008)
18,497,632
154,728,890
2,171,137
1.16
18.14
0.26
2
Electricity Consumption (2008)
Total
Per Capita
3.37
5.90
3.93
182.2
38.1
1,810.1
Both Nigeria and Malaysia emerged in the early 1970’s from severe ethnic conflict and into a period of substantial
revenues from natural resources. Over the course of the next four decades, Nigeria wasted its wealth on foolish
projects and indulged in repeated cycles of corruption and political intrigue. Over the same time period, Malaysia
put in place mechanisms for effective sharing of the nation’s wealth, invested in its people, improved the business
environment, and became a world-class diversified economy.
17
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Portugal
10,632,069
15.76
48.27
4,540.0
Sources: Population data from World Bank; Installed Electricity Capacity (in GigaWatts) and
Electricity Consumption (Total in billion kiloWatt hours, and Per Capita in kWh) from Energy
Information Agency.
Across sub-Saharan Africa, most of the needs for energy are currently met by the use
of traditional biomass, which is principally used for cooking. Meanwhile, access to
modern energy sources is estimated to be less than 10% in the rural areas.3
Unfortunately, biomass fuel (either in the form of wood or charcoal), is highly
inefficient and when used indoors has adverse emissions that can cause severe health
problems; in sub-Saharan Africa
alone, it is estimated that 393,000
The Power Sector in Africa
people died in 2002 due to inhaling
the pollution from biomass fuels
Africa’s largest infrastructure deficit is to be found in
(Davidson et al, 2006).4
the power sector. Whether measured in terms of
Meeting the Challenge of an
Energy Crisis
In the face of a multiplicity of
daunting development challenges
and constrained fiscal resources,
how can the challenge of
increasing access to modern
energy services be met in Angola?
First, it should be noted that
Angola’s prowess in terms of oil
production is distinct from
(although related to) the issue of
electricity
generation
and
consumption.
The
principal
benefits of oil production accrue to
Angola in the form of government
revenues which ideally should be
used strategically to help resolve
generation capacity, electricity consumption, or
security of supply. Africa’s power infrastructure
delivers only a fraction of the service found elsewhere
in the developing world.
The 48 countries of Sub-Saharan Africa (with a
combined population of 800 million) generate roughly
the same amount of power as Spain (with a
population of 45 million). Power consumption, at 124
kilowatt hours per capita per year and falling, is only a
tenth of that found elsewhere in the developing world,
barely enough to power one 100-watt light bulb per
person for three hours a day. Africa’s firms report
losing 5 percent of their sales as a result of frequent
power outages; this rises to 20 percent for informal
sector firms unable to afford backup generation
facilities.
3
Contextually, the lack of reliable statistics on sectoral production and consumption is a significant constraint for
effective planning and project promotion in the energy sector (IEA, 2006, p. 22).
4
In addition, the burning of wood for fuel is one of the main sources of deforestation and the main source of
greenhouse gas emissions in Africa, and even when used outdoors, this source of energy creates significant air
pollution in the form of low-level ozone (a key contributing factor for respiratory illnesses).
Source: Foster (2008).
18
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current development challenges. However, the availability of these revenues for
investment in other energy sub-sectors is currently restricted by previous policies
(particularly the extent of borrowing against future oil revenues) and the competing
demands of other sectors (including health, education, and other sub-sectors of
infrastructure). Thus, it is imperative not only to put in place a sound sectoral strategy
for the electricity sector but also to attract additional project financing from
development and business partners (and the power sector is certainly promising for
private sector participation).
Second, the sectoral strategy for the energy sector should take into account: (i) the
current state of infrastructure assets on the ground, and (ii) recent developments in
the energy sector globally. On the ground:
a) system outages are chronic in Luanda and even worse elsewhere;
b) there are a number of isolated electricity grids which are unlikely to be
connected for some years to come;5
c) substantial maintenance and capital investments are needed in the current
generating plants as well as on the transmission and distribution networks;
d) the capacity of the public sector agencies to finance and manage a significantly
larger portfolio of energy assets is limited;
e) the current reliance on biomass (including charcoal for the peri-urban areas) is
unsustainable, in terms of both its environmental impact and cost to the endusers;6 and
f) therefore, current sectoral plans call for electricity production to double and
levels of access to electricity services to more than double by 2016 (IEA, 2006,
p. 59-61).
Globally, recent price developments significantly favour the deployment of solar
photovoltaic systems as a key source of power generation (as the price of photovoltaic
panels continues to fall steadily), while discouraging reliance on fossil fuels. As a
result, there is a widespread transition from centralised, fossil-fuel-based energy
systems to systems that combine efficient technologies and renewable sources.
Across the globe, new investment in renewable power generation has been greater
than investment in fossil-fuelled technologies since 2008 (UNEP, 2009).
Third, the need for a quick ramp-up in generation capacity together with the
fragmented state of the transmission and distribution network suggest that distributed
5
“Almost all isolated and backup systems run on diesel. Extremely poor conditions on road and rail networks make
fuel supply to these isolated systems difficult and costly.” (IEA, 2006, p. 18)
6
“Severe local deforestation has occurred around most large cities, e.g., extending for a radius of 200-300 km
around Luanda. Such deforested zones are growing yearly, in turn raising the transport costs of charcoal, which
make up the largest part of the price.” (IEA, 2006, p. 19).
19
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(instead of centralized) generation should be favoured over the medium term in
Angola.7 This is primarily due to the combination of:
a) the current situation on the ground with regards to the large costs associated
with rehabilitating existing generation plants and the difficulty in connecting
isolated grids and systems (not just the time and expense but the need for
substantial convergence on technical issues such as connecting and safety
equipment and interconnection procedures and standards);
b) the substantial lead time and upfront capital costs required for new (large)
centralized generating plants;
c) the advantage of project scalability and quick deployment of renewable energy
sources, particularly solar photovoltaic systems(and the imperative to
immediately improve quality of life for local populations); and
d) more broadly, as Angola is currently planning its future power generation and
distribution system, this is the appropriate time to consider a balanced
strategy and a mix of energy sources that take account of local conditions and
enhances both the security and the stability of supply.
Fourth, the technical and financial feasibility of renewable energy technologies are
borne out by the wealth of experiences across the world.8In high-income countries,
such as Germany and Canada, the promotion of a diversity of energy sources is now a
central piece of energy policy, and their incentive programs are helping to drive
innovation and to lower costs on existing technologies. In southern European countries
and in the southern United States, for example, wind and solar energy is already at or
near grid parity,9 and prices of solar photovoltaic panels (which make up
approximately 50% of system costs) are falling on a month-to-month basis as
manufacturing volumes increase consistently. Across the developing world, the
promotion of both wind and solar projects is widespread across Asia, especially in India
7
Distributed generation (DG) refers to a system of generating power from a number of smaller energy sources
rather than centralized large production sites. Some of the key advantages of DG include scalability and quick
deployment of projects, diversification and security of energy sources, cost savings from reduced distribution losses,
and cost savings related to lower investments in expensive high-voltage transmission infrastructure. Thus, DG is
applicable not just as a source of energy for the main grid (as commonly used in developed countries) but also as a
cost-effective solution for populations with unreliable or no electricity service, including in the case of local grids
which are isolated from the main grid (typically due to geographical distances and to cost limitations of extending
the main network).
8
Recent initiatives promoting the development of solar projects include inter alia: the European Union’s Strategic
EnergyTechnology (SET) Plan and the Solar EuropeIndustry Initiative; the European PV Technology
Platform’sImplementation Plan for Strategic ResearchAgenda; the Solar America Initiative (SAI); Japan’s PV roadmap
towards 2030 (PV2030) andthe 2009 update PV2030+; China’s solar energy development plans; India’s Solar
Initiative; Australia’s Solar Flagship Initiative; Feed-In-Tariff programs in Germany, Italy, Spain, and Canada; and
state-level programs in the United States.
9
Grid parity for renewable sources of energy refers to a cost level which is competitive with the power grid
retailprices (i.e. without the benefit of incentive programs and subsidies).
20
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and China; but the adoption of renewables is broad-based, with examples such as:
wind-powered water-pumping systems in Namibia and South Africa; programmes
providing stoves to burn wood, charcoal, ethanol gel and liquid ethanol in Kenya, Mali,
Ethiopia, and Tanzania; and solar water heating systems in South Africa. There has also
been notable success in expanding rural electrification using distributed (or
decentralised) systems in south and southeast Asia, particularly in India, Cambodia and
Vietnam. In addition, countries like Malaysia and Indonesia have managed to
successfully develop programmes for the production of biodiesel, thereby creating
opportunities for new jobs and income streams.10
Fifth, Africans currently pay more for power than people in other developing countries,
contrary to the perception of purchasing power so weak that additional energy supply
cannot be supplied at an affordable price. In the power sector, higher costs are
exacerbated by an over-reliance on diesel-powered generators (see table below) and
high transportation costs for both diesel and kerosene. Thus, whereas tariffs in the
range of US$0.50 per kWh are common across Africa, people in North America pay
only S$0.12-0.17 per kWh while people in Europe pay only US$0.25-0.30 per kWh. That
is, not only do Africans put up with a chronically deficient energy sector, but they tend
to pay more for that unreliable service.
Table 2 Africa’s high-cost infrastructure
SubSaharan
Africa
Other
developing
regions
0.02-0.46
0.05-0.1
Water tariffs(US$/m )
0.86-6.56
0.03-0.6
Road freight
tariffs(US$/ton/km)
0.04-0.14
0.01-0.04
Mobile
telephony(US$/3 min.
call to US)
0.44-12.5
2.0
Internet dial-up service
(US$/mo)
6.7-148.0
11
Power
Tariffs(US$/kWh)
3
10
Examples for applications in the developing world are adapted from EUEI (2009, p. 8).
21
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Source: Africa Infrastructure Country Diagnostic,
2008.
Note: Ranges reflect prices in different countries and
various consumption levels. Prices for telephony and
Internet represent all developing regions, including
Africa.
Moreover, unserved customers often end up having to use alternative sources of
energy—such kerosene—with relatively higher prices than those that the public utility
would need to charge to reach cost recovery, as high as four or five times in many
cases.11 Poor households are only able to afford this by cutting back heavily on the
quantity consumed, but with enhanced access to the electricity grid, even at cost
recovery prices, these households would still be better off than they are today and
they would continue to have the option of restricting consumption to keep their
overall utility bills affordable.12
Taking Advantage of Solar Resources
Solar energy has one key advantage over other renewable options in that this resource
is more evenly distributed throughout the world. Furthermore, the amount of solar
energy reaching a specific point on the earth over the year — solar irradiation — is
known with a greater certainty than are wind or hydropower resources. Therefore, it is
not necessary to spend 1-2 years collecting data before committing to a solar system
(as happens, for example, with wind and hydropower).In Africa, the availability of
excellent solar resources (see table below) and the falling price of solar photovoltaic
panels makes solar photovoltaics a particularly attractive part of the solution for the
current energy crisis.13
Solar Irradiation
2
(kWh/m /day)
6.21
6.18
6.80
6.34
3.98
3.18
Location
Caluquembe, Angola
Menongue, Angola
Windhoek, Namibia
Eldoret, Kenya
Toronto, Canada
Frankfurt, Germany
11
Across Africa, the stories of villagers having to pedal for hours to the nearest town to be able to plug in their cell
phones are common. Typical fees for these services are in the range of $0.25-0.50 per charge, which immediately
makes the market for electricity across Africa substantially more profitable than previously thought (there are
currently some 125 million cellphone users across the continent).
12
For details, see Foster (2008, p. 14).
13
“Solar photovoltaic power is a commercially available andreliable technology with a significant potentialfor longterm growth in nearly all world regions.” (IEA, 2009).
22
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In addition,
1. There is little variation in solar irradiation in Africa over the year, which makes
solar energy an even better choice for a baseload than in northern countries,
such as Canada and Germany.
2. Solar projects have a fast development and deployment cycle (not just in
comparison to large centralized power plants but also in comparison with other
forms of renewable energy). Thus, solar projects can quickly feed isolated
power grids (which makes solar photovoltaics a significant part of a hybrid
mini-grid design and deployment).
3. Solar technology is stable and ready for deployment, and with recent moves in
developed countries to promote solar projects, the cost of solar equipment is
falling quickly as economies of scale in manufacturing take hold.
4. Solar projects are perfectly scalable which ensures adaptation to local needs
and even allows step-by-step implementation.
5. Solar projects provide an economic boost to the local economy, including by:
local sourcing of installation racking, wiring, and other ancillary materials; using
local labour for installation; training local electricians to service equipment; and
training local solar engineers to design and manage projects.
Attracting Private Sector Participation
Given the competing needs for public fiscal resources, solving the current energy crisis
in an expeditious manner would be facilitated by a system that attracts private sector
participation. In this context, success depends on a number of issues related to project
profitability and the regulatory regime.14
Although public utilities in Africa have typically found it difficult to earn sufficient
economic returns to properly fund preventive maintenance and recurrent investment,
the return on investment becomes a key consideration if private capital is to be
mobilized. At a minimum, it is necessary to put in place a tariff regime that offers a
reliable return over a time period sufficient to recover the capital invested. Typically,
this means offering independent power producers a power purchasing agreement over
15 to 20 years, and it also means a predictable regulatory framework. Of course, the
arrangement must be balanced, and it must thereforehave built-in provisions to allow
for flexibility in the event of significant market changes or unintended consequences of
14
The discussion in this section is adapted from USAID (2011).
23
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tariff or incentive schemes (to protect both parties from arrangements that become
uneconomic over time).15
In many developing countries, debt financing may not be available due to the
perception of risk by lenders (due to political or investment environments). In these
cases, investment subsidies and guarantees can help to overcome the barrier of high
initial investment costs for projects with longer horizons for investment returns. Such
incentive programs can take the form of:
a) feed-in-tariffs which reduce the uncertainty over revenue streams (as in the
German and Canadian cases);
b) subsidies for eligible investment costs (which are often in the range of 30-50%
as in the case of Investment Tax Credits in the United States); or
c) low interest loans, long-term loans, loan guarantees and partial risk guarantees
and grants (also used in the case of Germany and some state-level programs in
the United States).
On the technical side, integration of distributed energy assets into existing energy
systems requires adapting the existing system and creating a supporting framework. A
policy that effectively reduces barriers for independent power producers should
address inter alia:
a) uniform technical standards for interconnecting distributed generation to the
grid;
b) rules eliminating or reducing barriers for entities to install and interconnect
systems;
c) publication of reliable data on sector performance and expansion plans; and
d) interconnection rules, including related standards and procedures.
Conclusion
In the face of substantial unmet needs for electricity, the current sectoral strategy in
Angola calls for production to nearly double to 5,505 GWh and household access to
electricity services to more than double to 46%, by 2016. These ambitious targets are
symptomatic of an energy crisis but also warranted based on the positive impact that
increased access to electricity can have on quality of life.
In the end, of course, a sustainable solution to the energy crisis in Angola requires a
combination of approaches (including energy conservation through the use of LED
lights, for example) and a diversified set of energy sources on the generation side
15
At the same time, any such change should be circumscribed within defined parameters that include mechanisms
to measure progress toward agreed goals, to allow for maximum predictability and minimal investment risk.
24
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(including taking advantage of significant solar resources over the short-run, and
tapping into the significant potential for hydroelectric power over the medium-term).
The low levels of electricity access and the lack of transmission infrastructure makes
distributed generation a choice which immediately overcomes existing supply
bottlenecks and avoids large infrastructure costs associated with high-voltage
transmission and distribution (and with a centralized generation model).
The development of renewable energy projects allows access to carbon credits as a
source of financing; the local deployment of these technologies creates new jobs and
business for domestic enterprises; the scalable nature of these technologies allows
adaptation to local conditions and mitigates the environmental and financial risks
associated with larger projects; and the ability to deploy quickly responds most
effectively to the imperative for an immediate ramp-up in production and to the
existence of isolated grids.
In a nutshell, combining different sources of energy into a sustainable approach for a
sustainable energy policy allows the provision of electricity services to underserved
populations to take place at a much faster rate, and the appropriate moment to
incorporate these alternative technologies into a coherent sectoral policy is precisely
at the time that substantial investments in additional capacity are necessary.
Renewable energy technologies are commercially available and technologically reliable
and the price point is now at grid parity levels for sunnier locations such as most
countries in sub-Saharan Africa.
25
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References
Davidson, O.,Chenene, M., Kituyi, E., Nkomo, J., Turner, C., and Sebitosi, B.
(2006).Sustainable Energy in Sub-Saharan Africa. Available: http://www.icsuafrica.org/Resource_centre/ICSU%20ROA%20-%20Report%20I%20%20Sustainable%20Energy.pdf.
Foster, Vivien (2008). Africa Infrastructure Country Diagnostic. Washington: World
Bank.
International Energy Agency (2006). ANGOLA: Towards an Energy Strategy. Paris:
OECD.
International Energy Agency (2009).Technology Roadmap: Solar Photovoltaic Energy.
Paris, OECD.
European Union Energy Initiative (2009). A Strategy for Introducing Renewable Energy
Technologies in Angola.
United Nations Environment Program (2010).Global Trends in Sustainable Energy
Investment 2009.
United States Agency International Development (2011).Encouraging Renewable
Energy Development: A Handbook for International Energy Regulators.
26
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Critical gaps in maternal and newbornhealth services in the
provinces of Luanda and Uíge in Angola
Ingrid Hoem Sjursen
(CMI)
Abstract
Access to, and utilization of, health services during pregnancy and child birth is crucial
for the survival of both the mothers and theirnewbornchildren. According to the World
Health Organization, most maternal deaths can be avoided if all deliveries are attended
by health professionals and emergency obstetric care is available. Similarly, many
newborns could be saved by provision of essential newborn care and early check-ups by
health professionals or community health workers. Universal access to these services is
therefore strongly recommended.
Angola has some of the highest estimated maternal and child mortality rates in the
world.
In the National Health Policy adopted in August 2010, reduction of these rates is
pointed out as one of the five main priorities for the country. More specifically, the
policy aims to reduce under-five and infant mortality with 60%, and maternal mortality
with 85%, by the end of 201316. We have assessed the availability of antenatal, delivery
and postpartum services at 40 health facilities and the utilization of these services in
953 households in the Luanda and Uíge provinces. Our objective was to point to critical
gaps in maternal and child health service delivery that the Angolan health ministry
needs to address if they want to achieve the targeted reductions. The assessment was
based on survey data collected in collaboration between Chr. Michelsen Institute (CMI)
and Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) in 2010.
For nearly all the indicators investigated, availability was found to be substantially
poorer in rural than in urban areas. Utilization of services in the antenatal period was
generally high, and the fraction of women attending four or more antenatal services is
well above the regional average. However, few facilities offer Prevention of Mother To
Child Transmission (PMTCT) services to HIV-positive mothers, and malaria services do
not seem to be an integrated part of antenatal care in all facilities. We found that
coverage of services is lowest at the time when women and newborns face the highest
risk of mortality, namely during, and the first few hours after, delivery17. The situation
is especially grave in rural areas where as few as 32% of women were attended by a
16
Reduction is measured in comparison to mortality data from 2000 (World Health Organization & European Union,
2010)
17
The Partnership for Maternal Newborn and Child Health (2010)
27
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skilled health professional during their last delivery, and no facilities qualify as basic
emergency obstetric and neonatal care providers. There is a serious shortage of
oxytocin and antibiotics at facilities that offer delivery services and only half of the
surveyed hospitals provide caesarean section. Availability and utilization of postnatal
follow-up of mother and child is low, and not all facilities that offer delivery services are
also offering newborn follow-up. Furthermore, coverage is worst for the most
vulnerable parts of the population, i.e. those with the highest calculated under-five
mortality and the poor.
Our findings suggest that the following two interventions should be the main priorities
for the Angolan health ministry in their efforts to reduce maternal and child mortality:
1. Increase skilled attendance at birth for women in rural areas
2. Increase availability of emergency obstetric and neonatal care services,
especially in rural, but also in urban, areas
Introduction
In 2011, the worldwide estimate of under-five deaths was 7.2 million. About 40% of
these deaths occurred during the first 28 days of life. Furthermore, roughly 270 000
women died from causes related to, or aggravated by, pregnancy(Lozano et al., 2011).
Ensuring better access to, and utilization of, health services during pregnancy and child
birth is crucial in improving the chances of maternal and newborn survival.
Estimates of maternal and child mortality in Angola show some of the highest rates in
the World(World Bank, 2011) and reductions are urgently needed. While improvement
of social determinants of health such as poverty, sanitation, access to clean water and
education are important measures in achieving such progress, the focus in this article
is on health services.
Reduction of maternal and child mortality is one of five main priorities in the National
Health Policy adopted in 2010, and the health ministry is ambitiously aiming for a 60%
reduction in under-five and infant, and 85% of maternal, mortality by 2013 (World
Health Organization and European Union, 2010).We have chosen a range of antenatal,
delivery and postnatal health services that are recommended as essential
interventions for obtaining a reduction of maternal and child, especially newborn,
deaths. Investigating the availability and utilization of these services and comparing it
to recommendations given by the World Health Organization, enables us to point out
gaps in Angolan health service delivery that needs urgent attention if the targeted
reductions shall be achieved. A particular emphasis is put on urban-rural and wealthgroup differences because mortality is traditionally found to be higher in these
subgroups of the population(Houweling and Kunst, 2010, Anyamele, 2011,
Ssewanyana and Younger, 2008, Wang, 2003, Pandey, 1998).
The data
28
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We used data collected in collaboration between Chr. Michelsen institute (CMI) in
Bergen and Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) in the provinces of
Luanda and Uíge in 2010. 40 public health facilities (6 hospitals, 19 health centres and
15 health posts) were surveyed. In addition, onehealth worker was interviewed at each
facility. Furthermore, 25 households residing in the catchment area of each of the
facilities were queried on health service utilization, socioeconomic background
variables and health outcomes. About one half of the chosen households were
situated in close vicinity of the facility and the rest at locations of around 5 km
removed. We use the term “closest public health facility” to refer to the facility that
the households were chosen in the catchment area of, and measure availability of
services by provision at this closest facility. While all households interviewed in Luanda
are classified as urban, 60% of the Uíge-households in the sample are rural. In each
province, three municipalities were chosen for the survey: Cazenga, Kilamba Kiaxi and
Ingombota in Luanda, and Uíge, Quitexe and Puri in Uíge.
The rest of the article is organized as follows. Firstly, the recommended essential
antenatal services are presented and the availability and utilization of these are
assessed. The same is done for delivery and postnatal services. We then compare the
identified coverage with mortality risk for mothers and children over the continuum of
care and poverty and calculated mortality is introduced into the analysis. In the last
parts of the article, main findings are underlined and discussed before we make a short
conclusion.
Availability and use of antenatal services
Antenatal care is provided to women during pregnancy and consists of several
important components. First of all, women should be screened and treated for
conditions like anaemia, sexually transmittable diseases, HIV infection and mental
health problems, which are all associated with higher risk of complications during
pregnancy. Secondly, complications with the pregnancy itself should be managed, and
special attention should be paid to signs of pre-eclampsia. Thirdly, preventive
measures including tetanus vaccine, de-worming, iron and folic acid and distribution of
insecticide treated bed-nets, should be taken. Fourthly, advice on healthy behaviour at
home and education on danger signs of complications should be provided.
Furthermore, Prevention of Mother-To-Child Transmission (PMTCT) services should be
offered to HIV-positive mothers. These interventions have a potentially large effect on
the well-being and survival of mother and child, and the World Health Organization
recommends that all women should have at least four antenatal consultations (ANC)
containing the abovementioned services during pregnancy (World Health
Organization, 2003, The Partnership for Maternal Newborn and Child Health,
2006).Furthermore, a recent study conducted in northern Angola found the prevalence
of malaria among pre-school children to be as high as 18.4%(Sousa-Figueiredo et al.,
2012). Malaria is closely linked to both maternal and child mortality. On the basis of a
malaria survey conducted in Angola in 2006-2007, USAID estimates that malaria
accounts for 35% of child, and 25% of maternal, deaths(USAID, 2007).Thus, prevention
29
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of transmission, and treatment of infections, during pregnancy should receive
particular attention in antenatal care in Angola.
Based on the available data material and WHO recommendations, five indicators were
chosen for important services in the antenatal period, namely whether the facilities
offer ANC services, immunization of pregnant women, PMTCT and malaria services
plus stock of anti-malarials. A service is regarded as available to the household if it is
provided at the closest public health facility.
As illustrated in figure 1, the overall availability is relatively high for both ANC and
immunization of pregnant women. However, the differences in availability between
urban and rural households are huge. While 89% of the urban households reside close
to a health facility that offers antenatal services, this fraction is only 23% among rural
households. The coverage of immunization services for pregnant women exhibits a
similar pattern, but has a somewhat higher coverage with 96% for urban and 38% for
rural households. None of the health facilities situated in rural areas offer PMTCT, and
the share of facilities offering this service is only 25% in urban areas. More than 90% of
facilities offer treatment of malaria, but the recorded share of facilities that had antimalaria drugs in stock is only 70%. The availability of drugs differs substantially
between the urban and rural locations.
Figure 1: Availability of antenatal services at the closest public health facility
Comparing the share of households living close to a facility that offers ANC to the share
who report to have attended ANC during the last pregnancy, we find that utilization is
higher than availability, especially in rural areas. As many as 74% of the rural women
reported to have attended four or more antenatal controls during their last pregnancy,
compared to 23% having access at their closest public health facility. Thus, many
women living in rural areas where the closest public health facility does not offer
antenatal consultations seek these services at other facilities. The proportion of
30
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women that received a tetanus vaccine during their last pregnancy is high; 93% and
82% in the urban and rural households, respectively. The fractions of women who
were offered any treatment to prevent malaria and insecticide treated mosquito nets
are smaller than for ANC-attendance and tetanus vaccination, indicating that malaria
prevention is not a part of antental controls in all facilities. There is no data on HIVstatus and utilization of PMTCT-services.
Figure 2: Utilization of antenatal services
Critical gaps in antenatal services
The overall picture of antenatal service coverage looks quite good, and the average
attendance of four or more antenatal visits of 88% is well above the average in other
developing countries (World Health Organization, 2012, Barros et al., 2012). However,
fewer women residing in rural than in urban areas attended the four recommended
antenatal visits. The availability of antenatal and immunization services for these rural
women is very limited. Perhaps the most critical gap found was in the availability of
PMTCT-services. None of the facilities in rural areas are offering services to HIVpositive mothers. Though the estimated prevalence of HIV/AIDS in Angola is currently
below the sub-Saharan average (World Bank, 2011), the low coverage of PMTCTservices is worrying due to their important role in keeping the incidence rate. Provision
of these services does not require advanced equipment and PMTCT should to be
offered at all public facilities(The Partnership for Maternal Newborn and Child Health,
2011). We also found indications that malaria prevention is not an integrated part of
antenatal controls in all facilities. Knowing that malaria accounts for a large fraction of
maternal and child deaths, malaria prevention and treatment should be readily
available at all facilities and for all pregnant women.
Childbirth care services
31
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Labour, birth and the first few hours after delivery is the period with the highest risk of
death for both mothers and their newborns. Availability and utilization of health
services around childbirth is therefore of crucial importance to the survival of both.
Attendance by skilled health personell is considered the single most important
intervention in reducing maternal and neonatal mortality by the United Nations
Populations Fund (2012a).About 15% of pregnant women develop obstetric
complications, and in many cases these cannot be predicted in advance(World Health
Organization, 2005, Women Deliver, 2009).Timely access to essential obstetric services
is central for survival and wellbeing of these women. Consequently, UNICEF, WHO and
UNFPA have identified a number of vital services, or signal functions, for the treatment
of obstetric complications that can be used as a guide for assessing access to them.
These are administration of antibiotics, oxytocics18and anticonvulsants, manual
removal of placenta, removal of retained products, assisted vaginal birth, neonatal
resuscitation, safe blood transfusion and caesarean section. Facilities that offer the
first seven essential services are referred to as Basic Emergency Obstetric and
Neonatal Care (BEmONC), and those who offer all nine are referred to as
Comprehensive Emergency Obstetric and Neonatal Care (CEmONC), providers.
We identified seven indicators of availability of childbirth services based on available
information in the data, namely: delivery services, manual removal of placenta,
removal of retained products, antibiotics in stock, oxytocin in stock, safe 19blood
transfusion and caesarean section. Thus, we do not have any indicators of stock of
anticonvulsants and neonatal resuscitation. When talking about basic and
comprehensive emergency obstetric and neonatal care for the facilities in the sample,
we refer to facilities that qualify according to the indicators we do have information
about and not the whole set of signal functions as defined by the World Health
Organization.
The availability of delivery services and emergency obstetric care is far from universal
in the sample. Only 45% of the interviewed women have access to delivery services at
the closest public health facility, and the urban-rural differences are stark. In fact,
availability is twice as high for urban, than for rural, households (54% vs. 25.5%).All
facilities that offer delivery services also provide manual removal of placenta, and,
with one exception, removal of retained products. However, only 67% of facilities
offering these three services had antibiotics, and 39% oxytocin, in stock at the time of
the survey. Differences in availability between urban and rural locations are large for
all indicators. The data does not contain information about availability of
anticonvulsants and neonatal resuscitation at the facilities, but based on the indicators
we do have data on, only six (15%) of the facilities in the sample satisfy the
requirements for being basic emergency obstetric and neonatal care providers.
18
Oxytocin is a hormone used in late stages of labour to induce contractions, and to prevent and treat postpartum
haemorrhage
19
“Safe”: the facility always use blood from a blood bank
32
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Figure 3: Availability of delivery services and emergency obstetric care
While health posts and health centres may be basic emergency obstetric and neonatal
care providers, caesarean section requires such a level of skills and resources that it
should only be performed in hospitals. However, complications that endanger mother
and/or child and require delivery by caesarean section are expected to occur in 5 to
15% of all pregnancies. All facilities classified as hospitals should offer comprehensive
emergency obstetric and neonatal care services including safe blood transfusion and
caesarean section. The fact that only three out of six surveyed hospitals perform
caesarean section is thus worrying. Furthermore, only two facilities provide blood
transfusion with blood from a blood bank and in the whole sample, one single facility
qualifies as a comprehensive provider, i.e. offers caesarean section and safe blood
transfusion in addition to the basic emergency obstetric and neonatal care signal
functions.
In the sample, both skilled20 birth attendance and facility based delivery is recorded.
Almost all women who delivered in a facility also reported to have been attended by a
skilled health worker. We therefore only graph skilled attendance.
67% of the women interviewed were attended by a skilled health worker the last time
they delivered. The difference in use between the urban and rural residence areas is
large and much more pronounced than in use of antenatal services. In urban areas, the
proportion of women attended by a skilled health worker is more than twice the
proportion in rural areas (82% vs. 32%). In the urban households, the utilization of
delivery services exhibits a similar pattern to ANC-attendance, in the way that that
utilization is higher than the availability measured at the closest public health facility.
20
Here, a “skilled” health worker is a medical doctor, a nurse or a midwife in accordance with the United Nations
Population Fund definition (2012).
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For rural households, on the other hand, availability and utilization of delivery services
is almost identical.
Figure 4: Utilization of delivery services/skilled attendance
Critical gaps in childbirth services
The availability and utilization of childbirth services is markedly lower than for services
in the antenatal category. Most critically, only 32% of women in rural areas reported to
have been attended by a skilled health worker the last time they gave birth. The low
utilization seems to be linked to availability to a much larger degree than antenatal
services. This indicates that improvement of the availability should be part of policies
aimed at increasing this fraction.
In addition to low utilization and availability of skilled attendance at birth we also find
that few facilities offer essential emergency obstetric services. Only one of the
surveyed facilities qualifies for comprehensive and only six for basic, emergency
obstetric and neonatal care status21. These are all situated in urban residential areas.
The poor availability of emergency obstetric care is serious for the estimated 15% of
pregnant women who are likely to need these services. However, most of the facilities
that offer delivery services only lack oxytocin and/or antibiotics in order to qualify
asbasic emergency obstetric and neonatal care providers. Improving access to these
drugs in all facilities that offer delivery services will actually will increase the number of
basic providers from six to seventeen. While this would be a significant improvement it
should be noted that mostly urban households will benefit. Fifteen of seventeen
potential new basic providers are situated in urban areas.
Postnatal services
Availability of health services shortly after child birth is important to discover and treat
dangerous conditions, and to promote healthy behaviour. All mothers and newborns
21
Defined according to available indicators
34
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should be thoroughly checked for warning signals after birth. The timing and number
of check-ups is a much debated subject, especially when resources are scarce. PMNCH
suggests that women who deliver in facilities should be assessed within one hour after
birth and then once more before discharge, and that follow-up visits should be made
at 2-3 days, 6-7 days and 6 weeks after delivery. In the case of home-birth, the women
should be assessed during the first 24 hours. Follow-ups can take place either at a
health facility or at home and be conducted by a skilled professional or community
health worker (The Partnership for Maternal Newborn and Child Health, 2006).
The overall coverage of follow-up services at the facilities is low, and at approximately
the same level as delivery services. 45% and 48% of the women live close to a facility
that offers follow-up of mothers and newborns, respectively. Again the geographical
inequalities are large. In rural areas, 28%of facilities offer maternal follow-up, versus
53% in urban locations. For newborn follow-ups, the inequality is even larger: while
60% of facilities offer newborn follow-up in urban areas, only 20% of the rural facilities
do so.
Figure 5: Availability of postnatal services
As was the case with antenatal services, we find that a larger fraction of women report
to have been checked on within a week after birth, than the fraction of women who
reside close to a public health facility that offers follow-up service. 45% of the facilities
offer follow-up, whereas 60% of the women received a check-up after their last
delivery. The same pattern is observed for newborn check-ups and for both urban and
rural areas.
35
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Figure 6: Utilization of postnatal follow-up
Critical gaps in postnatal services
The availability of postnatal services is poor, particularly in rural areas.Many lives could
be saved by postnatal check-ups and they should be seen as a natural continuance of
childbirth services. Still, not all facilities that offer delivery services provide follow-up
consultations as well.
Coverage and mortality risk
We have now identified some critical gaps in the availability and utilization of health
services during and after pregnancy and delivery. Paradoxically, the coverage in rural
areas seems to be at its worst when the mortality risk for mothers and children is at its
highest. While this is not uncommon for countries with high maternal and child
mortality, (see for example the most recent countdown report by the WHO(World
Health Organization, 2012)), it has important implications for health priorities.
The risk-coverage disparity is illustrated in the figure below, where rural availability
and utilization of ANC, delivery and postpartum services are displayed together with
mortality risk for mothers and children over the continuum of care. The graphing of
mortality risk is only for illustrative purposes and the main point here is to show that
the risk varies over the cause of time, from the antenatal to delivery and the postnatal
period22. Risk curves displayed here should therefore not be interpreted as mortality
estimates, or as a quantitative size. As illustrated, mortality risk can be described by a
curve shaped as an “inverse u” with lower risks before and after birth and a sharp peak
around the time of birth.
22
The graphed mortality risks are based on Figure 2 presented in The Global Campaign for the Health Millennium
Development Goals report, Innovating for Every Woman, Every Child (2011).
36
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The columns in the figure show that, while the availability in rural areas is very low for
all three categories, the utilization of services displays the almost completely opposite
pattern of mortality risk. In the antenatal period when risk is relatively low, the
utilization of services is very high. Around delivery, the risk is almost doubled, but the
utilization of delivery services is less than one third of the utilization of antenatal
services. In the postnatal period where risk (at least maternal) decreases, utilization
increases. This pattern is not as strong for urban households. There, availability of
services display a pattern converse to the risk, but at higher coverage levels, and
utilization is decreasing from antenatal care to delivery services and from delivery
services to postnatal services.
Figure 7: Mortality risk, availability and utilization over the continuum of care, rural
households23
Figure 7 clearly provides a rationale for health authorities to prioritize improvements
in the availability and the utilization of skilled and facility based deliveries. Though
antenatal care and postnatal services are also important components in a holistic
approach towards reducing mortality, delivery services should receive particular
attention in this effort.
Coverage, wealth and calculated child mortality
The coverage of maternal and child services is also poorer in the most vulnerable
subgroups of the population. We constructed a wealth index by application of principal
component analysis to data on household asset ownership, the building material of the
roof, the walls and the floor of the house the family is living in, and land ownership.
The index was subsequently used to divide the households into wealth quintiles. The
23
Utilization of delivery services is measured by proportion of women who attended four or more antenatal visits,
utilization of delivery services is measured by proportion of women who delivered in a facility and postnatal
utilization is measured by the fraction of mothers who were checked upon within a week after delivery.
37
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figure below depicts distribution of availability of delivery and basic emergency
obstetric and neonatal care along with the share of women who delivered in health
facilities between the five wealth groups. For all indicators except manual removal of
placenta, there is a clear socioeconomic gradient in access to, and utilization of,
services. Coverage of services is generally increasing in wealth quintiles. The
differences are most striking for utilization; almost three times as many women were
attended by skilled personnel among the wealthiest 20% of households compared to
the poorest 20%.
This finding is in line with other empirical work. In a recent study,Barros et al. (2012)
analyse data from 54 developing countries (Angola not included) developing countries
and assess inequalities in a number of maternal and child health interventions. They
find large variation in coverage between wealth quintiles, and skilled birth attendance
shows the highest inequality. While the estimated average coverage of skilled
attendance in these countries is almost identical to our estimate for the lowest wealth
quintile, the coverage for the other wealth groups is substantially better in our sample.
However, the distribution is more uneven than for the average of the other 54
countries.
Figure 8: Availability of delivery and emergency obstetric care, and utilization of skilled
attendance by wealth quintiles
The poor are more likely to be exposed to disease-causing agents such as
contaminated water and poor sanitation, hygiene and housing conditions and have
deficient knowledge about disease prevention and treatment. Because they are more
often malnourished and in worse health, the poor are also more likely to fall ill when
exposed to these risk factors. They are thus expected to have a greater need of health
services than the better off(Barros et al., 2010).
38
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That the poor do in fact have worse health outcomes in the sample is illustrated in
figure 8 below. Based on information about the number of children born and the
number that deceased before reaching the age of one and five, we calculated
household mortality rates per thousand children born alive for the households in the
sample. As the survey did not follow all children until they reached the age of five, our
estimated mortality rates are not comparable with conventional measures such as
those presented in the World Development Indicators. They are, however, useful for
comparison between subgroups in the sample. The figure depicts under-five and infant
mortality rates for the wealth quintiles and shows a clear socio economic gradient in
the calculated mortalities in the sample. For both children under-five and infants,
mortality is clearly highest in the two poorest quintiles, decreases in the middle
quintile, and, somewhat surprisingly, increases for the second richest quintile before
decreasing again in the richest quintile.
Figure 9: Child mortality by wealth quintiles
Having both the worst access and the worst health outcomes, it is obvious that
improving health services among the poor should be a priority for the health ministry if
they wish to obtain reductions in maternal and child mortality.
Summary of findings and discussion
We have now pointed out several critical gaps in maternal and newborn health service
delivery in the provinces of Luanda and Uíge.
While the utilization of antenatal services (four or more visits) is actually well above
the regional average for Sub-Saharan Africa, we found availability to be very poor in
rural areas. There was also a severe lack in availability of PMTCT services, and despite
malaria being endemic in Angola, not all mothers were offered malaria prevention
during antenatal controls.
Perhaps the most alarming finding is the low share of women who were attended by a
skilled health professional during delivery in rural areas. The availability of emergency
obstetric and neonatal care is low in both urban and rural locations: only six of the
39
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forty surveyed facilities qualified as basic, and one as comprehensive, providers
defined by available indicators. We also found severe shortage of oxytocin and
antibiotics.
The availability and utilization of postnatal check-ups for mother and newborns is
found to be low, especially in rural areas, and not all facilities that provide delivery
services also provide follow-ups.
In addition to the identification of services that have particularly low availability and
utilization, we also found that the coverage is worse for some subgroups of the
population, namely the households residing in rural locations and the poor. These
groups also had worse health outcomes in terms of child mortality. When taking a
closer look at the distribution of wealth quintiles between urban and rural areas, we
find that as many as 93% of the rural households are grouped in the two poorest
wealth quintiles. Thus, improving coverage for rural households is almost equivalent to
improving coverage for the poor.
We also took a closer look at the distribution of the type of the closest public health
facility between wealth groups and residential area. Not surprisingly, none of the rural,
and thus almost none of the poorest, households had a hospital as their closest public
health facility. A health centre was the closest public health facility for 60% of urban,
and 18% of rural, households, and a health post was the nearest public health facility
for more than 80% of rural households. The low observed coverage of services in rural
areas could, at least in part, be explained by this finding because health posts are at
the lowest level of care and usually provide a smaller range of services and have less
skilled staff than health centres and hospitals.
These findings, combined with knowledge about the distribution of mortality risk for
mother and child during the continuum of care, suggest that the interventions that are
likely to have the largest impact on mortality rates are:1) Increasing the coverage of
skilled attendance at birth, and 2) Improve availability of emergency obstetric care
among the poor, i.e. at health posts in rural areas.
Though our findings might tempt us to conclude that the low utilization of delivery
services and skilled attendance at birth is caused by poor availability of services, there
are some indications that this is not the whole truth. All women who reported that
they did not give birth in a health facility were asked why not. As much as 29% stated
reasons that had nothing to do with availability, namely “More comfortable at home”
and “Tradition”. In order to get these women to give birth in health facilities, it is
probably not enough to improve the availability of services. For instance, health
facilities could make better efforts to make women feel comfortable giving birth there
and allow families to follow birth traditions at facility premises. Informing women and
their local communities about the advantages of facility based deliveries could also be
a means to induce higher utilization. That being said, 23% of women state “long travel
distance” as the reason for not giving birth at a health facility and this shows that
40
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availability is also part of the problem. 42% answered “Other” as their reason. Thus a
large part of the explanations are exempted from our knowledge.
Concluding remarks
Our findings show that there is an urgent need for improvement in maternal and
newborn health service delivery in the surveyed provinces, espescially among the rural
poor where child mortality is highest and the coverage is worst.
Skilled attendence is among the interventions with the lowest utilization, and
emergency obstetric care is among the ones with the poorest availability. At the same
time, these are highlighted by The Partnership for Maternal Newborn and Child Health
(2006)as the interventions with the greatest potential for saving lives.
As mentioned in the introduction, the Angolan health policy adopted in 2010aims at
reducing under-five and infant mortality by 60% and maternal mortality with 85%
(baseline year 2000) by the end of year 2013(World Health Organization and European
Union, 2010).
Based on our findings, increasing the share of women in rural areas that have access to
and utilizeskilled delivery and emergency obstetric servicesstands out as the most
important task for the Angolan health minstry in this respect. The challenges in
acheving this are plentiful: scarsity of human resources, poor infrastructure, shortage
of medical equipment and drugs and more. Policymakers and health professionals
should work jointly to find out how these challenges can be surmounted. However,
even in the case that efficient policiesare made and successfully implemented, the
targeted 60% and 85% reductions in child and maternal mortality are not likely to be
achieved by 2013.
Though our results indicate that health policies should put a particular emphasis on
skilled attendance and emergency obstetric care, antenatal and postnatal services
remain important components, and should be a part of a holistic approach to the
improvement of maternal and neonatal health.
How then should the availability and the utilization of services among the worst off
groups be improved? Because most of the rural poor have health posts as their closest
facility, a possible solution is to expand the range of services offered there.
41
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A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS
Alves da Rocha
Economista e Professor Associado da Universidade Católica de Angola
Director do Centro de Estudos e Investigação da UCAN
Introdução
Começo a minha reflexão sobre o tema em epígrafe com uma afirmação lapidar de
Albert J. Dunlap sobre a essência da empresa num regime capitalista de economia de
mercado – evidentemente diferente dum outro de capitalismo de Estado, em vigor na
China e que quase passou despercebido na ex-União Soviética –: “a empresa pertence
às pessoas que nela investem – e não aos empregados, aos fornecedores, nem à
comunidade onde está instalada”. Declaração forte e radical do que é o capitalismo – o
único sistema económico até hoje implantado e que tem mostrado uma extraordinária
capacidade de transformação e regeneração interna e de ajustamento às crises e
turbulências várias, políticas e sociais – e a economia de mercado. Na perspectiva de
Dunlap, os empregados, os fornecedores, os clientes, o Governo e os representantes
da comunidade – esta, provavelmente, um dos vectores de destrinça entre
responsabilidade económica e responsabilidade social das empresas: a sua capacidade
de inserção nas comunidades e de inter-agir com elas e com os seus elementos24 – não
devem interferir nas decisões tomadas pelos verdadeiros decisores, isto é, os que
investem na empresa. Os verdadeiros decisores, que são os investidores, têm, não só,
o direito de encerrar a empresa e despedir os seus trabalhadores, como declarar
inválidos e irrelevantes quaisquer postulados que tais pessoas possam fazer sobre o
modo como gerem a mesma25.
Como disse, trata-se duma visão restritiva do que deve ser hoje a empresa, em
contextos modernos, democraticamente envolventes e participados e competitivos.
Seguramente que existem outras formas de governar as empresas a que Peter Drucker
tão abundantemente se refere26. Dentre as mesmas avultam as relacionadas com a
24
Como polemizarei mais adiante: as empresas devem ou não agir em favor do combate à pobreza, enquanto
situação que diminui o rendimento e o consumo das famílias (perspectiva económica) e indignifica as pessoas e lhes
afecta o ego (ponto de vista moral e cristão)?
25
Evidentemente que existem leis que estabelecem os limites do despedimento e encerramento das suas
actividades.
26
Os gestores das empresas devem ter um papel e responsabilidade para além da função de maximização do lucro,
para incluir reclamações e interesses de grupos não accionistas.
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Responsabilidade Social das Empresas e os seus defensores contestam a viabilidade de
avaliação económica isolada duma empresa e a curto prazo. Em vez disso, uma
avaliação mais ampla, de longo prazo, englobando todas as operações da empresa27.
Definição de Responsabilidade Social (Teoria da Responsabilidade Social das
Empresas?)
Existem pontos de vista defensores duma teoria da Responsabilidade Social das
Empresas (RSE). Não irei tão longe. No entanto, ao longo dos tempos, o conceito de
RSE (responsabilidade social das empresas) tem sido expandido, esquecido e
reintroduzido por um grande número de académicos, activistas e especialistas de
economia de empresa.
Prefiro, porém, quedar-me por percorrer alguns pontos de vista sob os quais a RSE
pode ser polemizada e começar por perguntar: responsabilidade sobre o quê e com
quem? E quem exige que as empresas sejam responsáveis para com a sociedade? Não
é suficiente a responsabilidade que assumem perante os seus accionistas?
Com efeito e para os evangelistas do mercado, a primeira prioridade da empresa é
produzir bens e serviços que a sociedade quer e precisa, num quadro estratégico de
maximização do lucro individual. Onde meter a responsabilidade social? Na
interdependência entre negócios e sociedade na busca duma envolvente estável entre
necessidades individuais e necessidades colectivas?
Entendi curial reflectir sobre duas dimensões da responsabilidade social das empresas
e tentar fazer a ponte entre elas.
O ponto de vista moral
 Aparentemente este ponto de vista pode coincidir com a ética dos
negócios, com a lealdade de intenções face a parceiros e a terceiros, o
fornecimento de bens e serviços dentro de normas de qualidade e de
respeito das preferências dos consumidores, a publicidade não
enganosa. Deste ângulo de análise, a responsabilidade social
empresarial é a dedicação contínua da empresa a comportamentos
éticos, contribuindo para o desenvolvimento económico e melhorando
as condições de vida dos trabalhadores e das suas famílias, assim como
das comunidades em que estão inseridas.
27
Adivinham-se contornos do que mais tarde Michael Porter veio a denominar “cluster”.
45
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 A componente moral da responsabilidade social exige que os negócios
se façam com honestidade, seriedade e sinceridade e no respeito dos
compromissos assumidos. Igualmente determina que não se tenham
salários em atraso e se paguem as remunerações do trabalho de acordo
com os contratos assinados28.
 Um ponto particular: porque se pede que as empresas se comportem
com responsabilidade social e a mesma postura não é exigida às
pessoas ricas? Estas classes possidentes afectam somas consideráveis a
gastos de extravagância e sumptuosidade privadas29. Estes cidadãos e
classes sociais distanciam-se da imensa maioria da população, em vez
de a ajudarem na caminhada para uma prosperidade comum. Uma
sociedade harmoniosa caracteriza-se pela democracia, pelo imperativo
da lei, pela equidade, pela justiça, pela sinceridade, pela amizade e pela
vitalidade.
O ponto de vista económico (é muito difícil separá-lo do ponto de vista social)
 Os empresários e as empresas são quem devem operar a melhor
combinação produtiva dos factores de produção, com diferentes
finalidades: maximizarem os retornos dos investimentos, poupar
recursos escassos (e, por isso e em alguns casos, caros) e acautelar uma
repartição justa do rendimento gerado no decurso do exercício da
actividade produtiva. Percebem-se elementos sociais nesta função
económica do empresário.
 Assim como se adivinham zonas de contradição e conflito entre a função
económica das empresas e o que desejavelmente deveria ser a sua
função social. E uma delas é quando por razões de eficiência (poupança
de recursos) e de maximização de lucros as combinações factoriais
favorecem o capital (e as suas diversas componentes) em desfavor do
trabalho, optando-se, portanto, por processos de produção intensivos
em tecnologia e capital.
 Observada do ponto de vista da empresa, a RSE pode ser entendida
como parte da gestão de risco, isto é, tomando diferentes medidas
28
O caso, tão divulgado, da Empresa Nacional de Pontes – empresa pública – e dos atritos e conflitos entre Direcção
e trabalhadores quanto às relações laborais e os salários atrasados de quase um ano é um claro mau exemplo de
responsabilidade social das empresas, com a agravante desta empresa ser completamente pública, portanto o
Estado não se apresenta como tendo uma postura com responsabilidade social.
29
Ver Revista Sábado de Setembro de 2011 sobre as extravagâncias dos ricos de Angola.
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estratégicas para assegurar a sobrevivência da empresa no futuro
previsto. Isto faz parte da responsabilidade dos gestores para com os
accionistas e a melhor maneira de o fazer é lutar por um modelo
operacional que crie valor para todos os stakeholders, que, de outra
maneira, poderiam, no longo prazo, tornar a empresa vulnerável.
 A criação de emprego pode ser, provavelmente, a mais importante
responsabilidade social das empresas e dos empresários, embora seja a
consequência económica natural da constituição de actividades
produtivas. Não se pode iniciar uma qualquer acção produtiva sem que
na combinação dos factores entre o trabalho. Marx dizia que o capital
mais não é do que trabalho cristalizado, significando que a origem
essencial do processo de produção – capitalista e não capitalista – é o
trabalho.
 Mas que tipo de emprego? Claro que as empresas não são centros
empregadores tout court. Não o podem ser, porque também têm a
responsabilidade social de acautelar uma racional alocação de outros
recursos e factores escassos. Empregando por empregar, as empresas
desperdiçam capital, escasso sobretudo em economias em
desenvolvimento ou subdesenvolvidas. Então a questão passa a ser:
criar bons empregos em que o empregado se sinta útil a si, à sua família
e à sociedade em geral. Para isso faz-se mister que a força de trabalho
seja bem dotada de educação e de conhecimentos técnicos. De quem é
esta responsabilidade económica e social em simultâneo? É evidente
que não se pode ilibar o Estado e as suas instituições da
responsabilidade de criar as condições para a existência de empregos
bons e úteis.
 Até que ponto a flexibilidade salarial e a livre mobilidade sectorial e
territorial da força de trabalho, reclamadas pelas estratégias
empresariais em nome de mais racionalidade e lucros privados,
prejudica a sua função e responsabilidade social? Liberalizar o mercado
de trabalho e promover a flexibilidade dos salários provoca efeitos
perversos sobre a sociedade, as comunidades e os cidadãos.
 O pagamento de impostos é claramente uma responsabilidade
económica das empresas, como, de resto, de todos os cidadãos. Todas
as Constituições do mundo referem a obrigatoriedade de pagamento de
impostos como universal, se bem que sempre ajustada às diferentes
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capacidades tributárias de agentes, empresas e pessoas, em nome da
justiça tributária. No entanto, a transferência, a título gratuito, de
alguns recursos financeiros empresariais para o Estado pode ser,
igualmente, uma responsabilidade social das empresas, embora estas
apenas actuem como intermediárias num processo de transformação de
dinheiro privado em bens públicos, cuja satisfação compete, por inteiro,
ao Estado. Coloca-se, portanto, o Estado como o agente a quem
compete a tarefa de gerir bem e com critério, em nome do interesse
público, recursos financeiros privados, colocados à sua disposição a
título gratuito pelos cidadãos e empresas, para a satisfação de
necessidades colectivas. Quase que se pode afirmar que os impostos
são uma parceria público-privada, com finalidades muito específicas e
concretas.
 Mas a responsabilidade social, assumindo feições e modalidades
materiais, pode ser uma forma de escamotear a fuga e a evasão fiscais
da parte das empresas: cumpre-se uma determinada responsabilidade
social a troco de pagamento de impostos mais baixos. Ou então,
compram-se descontos fiscais com responsabilidade social, o que não
deixa de ser um contra-senso, perdendo todo o carácter de
responsabilidade social.
As Escolas de Pensamento sobre a Empresa e a sua Responsabilidade Social
Será que existe diferença entre responsabilidade económica e responsabilidade social?
Que escolas de pensamento fazem referência a esta “coligação” e colocam a empresa
como um instrumento da realização de certos objectivos sociais?

Oskar Lange considera a empresa como a célula básica da actividade
económica, com responsabilidade de dinamizar a economia e promover
uma adequada utilização de recursos produtivos escassos. Então, deste
estrito ponto de vista, a empresa e o empresário devem garantir que
essa alocação de factores se faça da forma mais eficiente. A empresa
aparece, assim, como uma espécie de guardião dos recursos de cuja
utilização tem de prestar contas à sociedade, no sentido de garantir o
equilíbrio inter-geracional. Da afirmação anterior adivinha-se, já, o
sentido social que as empresas têm de ter quando em causa está lidarse com recursos, factores e outras utilidades que são pertença colectiva.
Ou seja, são autênticos bens públicos. Será que esta perspectiva não
colide com os princípios de maximização do lucro, expresso por
diferentes equações de equilíbrio microeconómico?
48
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
Joseph Schumpeter atribui ao empresário uma responsabilidade
económica tremenda, ao colocá-lo no centro do processo de
crescimento económico capitalista e como actor principal das mudanças
estruturais. O núcleo principal destas transformações este economista
austríaco, mais tarde naturalizado americano, coloca-o na destruição
criadora, uma sucessão de avanços e recuos da e na capacidade criativa
durante a qual as inovações acontecem em catadupa, em vários
domínios: produtos, processos, mercados, organização, fontes de
matérias-primas, etc. Foi Schumpeter quem pela primeira vez falou em
empreendedorismo. O grande actor deste processo seria o
entrepreneur, empresário inovador que conseguia a maximização dos
lucros pela via da busca incessante pela inovação.30

A Escola neo-clássica (Milton Friedman, Thomas Sargeant), como seria
de esperar, adopta uma posição muito circunscrita quanto às
responsabilidades da empresa, na senda, aliás, das considerações e
posições de Albert Dunlap. A escola neo-clássica defende que as únicas
responsabilidades sociais das empresas são a criação de emprego e o
pagamento de impostos, em nome da defesa da maximização do valor
para os accionistas e está reflectida na frase de Milton Friedman:
“poucas tendências destruiriam os fundamentos duma sociedade livre
como a aceitação, da parte dos gestores, de outras responsabilidades
sociais que não sejam as de fazer tanto dinheiro quanto possível para os
seus accionistas”31. Este ponto de vista defende, portanto, que os
gestores e as empresas são responsáveis somente perante os
respectivos donos.

A Escola neoliberal ou das expectativas racionais (Robert Lucas, Paul
Rommer, Robert Barro e Robert Solow), apesar da carga negativa que,
aparentemente, a sua designação comporta, tem uma posição mais
moderna e abrangente da função e da responsabilidade social da
empresa. Na verdade, os seus defensores apontam que a adopção de
políticas de responsabilidade social pelas empresas é racional e lucrativa
no longo prazo (em alguns casos no curto prazo), porque estas políticas
atraem procura e factores de produção, como o trabalho e o capital. A
empresa move-se, em todos os mercados, por incentivos e segurança e
os gestores procuram retornos positivos dos empregados, dos
30
Mário Murteira – Os Batoteiros do Grande Casino, Crónica, África 21, Setembro 2011.
31
Friedman, Milton – Capitalism and Freedom, University of Chicago, 1962.
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consumidores e dos investidores, enquanto evitam os riscos duma
intervenção governamental, necessariamente perversa e negativa,
duma exposição adversa aos media, duma queda nas bolsas de valores e
de boicotes.

A Escola da Responsabilidade Social Empresarial ou modelo dos
stakeholders (R.E. Freeman, J.J. Brummer) defende que as empresas
são responsáveis para com todos os intervenientes na sua actividade,
quer se localizem dentro das suas instalações e fazendo parte da
respectiva configuração orgânica e organizacional, quer estejam no seu
exterior como elementos e participantes da comunidade em geral. A
responsabilidade social cria externalidades positivas – em termos de
segurança dos consumidores, protecção ambiental e satisfação dos
empregados – que as empresas individuais podem não ser capazes de
apropriar ou internalizar nas suas decisões de investimento.

A Escola do Terceiro Sector, ao contrário das iniciativas lideradas pelas
empresas ou pelo Governo, elegem o denominado terceiro sector (ONG,
associações empresariais e sindicais, igrejas, fundações, universidades,
etc.) como o motor da responsabilidade social das empresas. O Terceiro
Sector identifica-se com a sociedade civil e as suas instituições procuram
influenciar as decisões políticas, sem serem parte do Governo ou
estarem fortemente ligados aos empresários e investidores. Preenchem,
igualmente, um papel educacional importante, informando os
consumidores, as empresas e os políticos, porque são a charneira entre
governo, empresas e comunidades.
A Condições de Funcionamento das Empresas em Angola para o Asseguramento da
sua Função Social
O que é que se deve dizer acerca das empresas em Angola neste quadro da
responsabilidade social? Não creio existir uma estratégia público-privada de
responsabilidade social empresarial em Angola, assumida e declarada. Provavelmente
nem teria de haver, atendendo à circunstância de os procedimentos e
comportamentos sociais das empresas poder/dever corresponder, afinal, a uma
atitude, mais ou menos, natural da sua parte.
Como se sabe, coexistem dois universos diferentes: o das empresas angolanas e o das
empresas estrangeiras (mesmo que com a capa de empresas de direito angolano e
com parceiros locais os seus efeitos sobre a economia nacional são diferentes dos do
primeiro grupo).
50
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Não existe uma estatística fiável quanto ao número de empresas estrangeiras a
operarem em Angola. Utilizando o ficheiro do CEIC pode estimar-se este conjunto
empresarial em 532 empresas estrangeiras, cabendo a Portugal a maior percentagem
(37,6%), logo seguido pela China (18,8%).
Admitindo que neste universo se encontram as empresas estrangeiras petrolíferas,
diamantíferas e de construção, cálculos grosseiros podem apontar para um controlo
de perto de 60% do PIB nacional.
Uma preocupação a este respeito relaciona-se com as consequências sobre a
independência económica do país, quando percentagem tão elevada da riqueza
nacional, criada anualmente, é controlada por empresas estrangeiras, cujas estratégias
dependem dos centros transnacionais de decisão, podendo, consequentemente, não
ser coincidentes com as estratégias de crescimento nacionais.
Uma outra preocupação relaciona-se com as linhas de crédito postas à disposição das
empresas estrangeiras pelos respectivos países de origem. Mesmo nos casos em que
os contratos entre os dois Estados considerem a possibilidade de as empresas
angolanas poderem aceder aos envelopes financeiros, a grande fatia é, sempre,
reservada às empresas estrangeiras e as empresas angolanas, mesmo que se juntem,
em parcerias, às estrangeiras, acabam por deter uma posição sempre minoritária, para
não dizer subalterna.
A terceira linha de preocupação é do domínio do conhecido spillover effect.
Normalmente espera-se que, mesmo nos casos em que não se constituam parcerias,
se provoque um efeito-imitação (efeito-demonstração ou efeito de arrastamento ou
ainda efeito contágio) sobre as empresas nacionais em diversas áreas, tais como,
gestão, inovação, melhoria da qualidade da força de trabalho, visão estratégica,
conquista de quotas do mercado externo, etc. Até que ponto as 532 empresas
estrangeiras estão contribuindo para a melhoria da qualidade estratégica das
empresas angolanas? Que atitude têm as empresas estrangeiras quanto à abertura às
empresas angolanas dos seus acervos de gestão e planeamento estratégico, incluindo
as inovações?
Valem as considerações anteriores para especificar o seguinte:
 Os dois grupos de empresas não estão em igualdade de circunstâncias,
sendo as estrangeiras muito mais competitivas do que as angolanas,
devido aos apoios dos respectivos países, de que as linhas de crédito
são apenas um deles.
51
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 A responsabilidade social, em situações de desníveis tão acentuados de
condições de exercício da actividade privada, tem de se estender para
além dos aspectos relacionados com a criação de emprego e outros
referidos nos parágrafos anteriores: a partilha de inovação e de
estratégias e modelos de gestão acaba por ser uma responsabilidade
social das empresas estrangeiras para com as angolanas.
E há um outro elemento que reforça esta minha asserção: o ambiente de negócios – a
que me vou referir de imediato – acaba por não afectar da mesma maneira as
empresas angolanas e as empresas estrangeiras, porque estas são beneficiárias das
políticas e estratégias de internacionalização aplicadas pelos governos dos seus países
de origem.
Em última instância, a responsabilidade social das empresas angolanas e das empresas
estrangeiras tem, afinal, de ter contornos diferentes e mover-se em planos distintos.
Para o asseguramento da sua função social, a função económica tem de estar
garantida, no sentido de que a base material das empresas é o suporte para a sua
contribuição para a realização de determinados objectivos sociais gerais. Mas também
pode antever-se que sopesando-se a vertente social, as empresas podem tirar
proveitos económicos significativos, particularmente em termos de produtividade do
trabalho e de visibilidade comunitária, esta com influência no aumento do consumo
privado.
Qual o quadro de exercício da função económica das empresas em Angola: será que
permite às empresas ganhar dinheiro? Ou de outro modo: realizar lucro?32
Os factores macroeconómicos exercem uma grande influência sobre o processo
tomada de decisões microeconómicas. Ambientes caracterizados por excesso
instabilidade actuam perversamente sobre as motivações empresariais, levando
agentes económicos a preferirem o imediato e o especulativo, em detrimento
estruturante e mais prospectivo.
de
de
os
do
Um estudo incidente sobre as principais queixas dos empresários conduziu ao quadro
seguinte.
A INFLUÊNCIA DOS FACTORES MACROECONÓMICOS NAS DECISÕES EMPRESARIAIS
FACTORES MACROECONÓMICOS
PONDERAÇÃO
32
Ganhar dinheiro e realizar lucro são duas coisas diferentes, mesmo na estrita óptica do modo de produção
capitalista. Os verdadeiros empresários – os entrepreneurs, na perspectiva de Schumpeter – sabem muito bem do
que estou a falar.
52
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Acesso ao crédito bancário é complicado e difícil
95
Acesso difícil às divisas
90
Inflação interfere negativamente nas decisões
90
Oscilações do mercado cambial são prejudiciais
87
Direitos de propriedade com efeito negativo nas
decisões
95
Restrictividade da política comercial afecta
negativamente
57
Leis laborais afectam negativamente as decisões
68
Sistema fiscal tem incidência negativa
85
ÍNDICE AFECTAÇÃO DAS DECISÕES EMPRESARIAIS
83,4
Verifica-se que para os empresários privados os factores macroeconómicos que
transmitem maior instabilidade às decisões microeconómicas são o acesso ao crédito,
os direitos de propriedade33, a inflação, e o mercado cambial. Os direitos de
propriedade são já uma velha questão34 e enquanto permanecer como tal inviabilizará
que os activos físicos detidos pelos agentes económicos se possam transformar em
capital35. O acesso ao crédito e as elevadas taxas de juro são, semelhantemente, um
constrangimento apresentado pelos empresários para o funcionamento normal da
actividade privada e que necessita de uma abordagem, pelas autoridades monetárias
do país, mais audaz e consequente com as necessidades de reconstrução e
desenvolvimento. A inflação e a instabilidade dos preços são apontadas como
relevantes pela esmagadora maioria dos empresários privados, enquanto elemento
fustigador das decisões empresariais.
Um outro factor, igualmente muito reclamado pelas associações empresariais, reportase ao sistema fiscal vigente, considerado excessivamente penalizador da formação das
33
Numa nota endereçada pela AIA ao Ministro das Finanças e datada de 22 de Outubro de 2001 era referenciada a
privatização rápida do pequeno sector imobiliário, com as correspondentes escrituras, como um factor importante
para que o empresariado nacional pudesse usá-lo como capital no recurso aos financiamentos bancários e
institucionais. Até hoje pouco ou nada se fez em conformidade.
34
Que não se esgotam, nem por ela serão integralmente resolvidos, na Lei de Terras vigente. Sublinhe-se que a
questão das terras pode vir a ser o próximo grande conflito no país, devido aos constantes atropelos de que as
famílias camponesas são vítimas quando pretendem reocupar terrenos ancestrais.
35
Uma correctíssima e interessante abordagem deste tema é feita por Hernando de Souto em “O Mistério do
Capital- Porque o capitalismo funciona nos países desenvolvidos e fracassa no resto do mundo”.
53
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poupanças empresariais necessárias para constituírem e agregarem o seu
autofinanciamento.
Em síntese, os factores macroeconómicos podem afectar negativamente, em média,
83,4% das decisões empresariais.
Mas existem outros factores, comuns a muitos países africanos36:
 …desta forma, criar um ambiente propício (business friendly) ao
desenvolvimento de um sector privado forte e diversificado à
atracção de investimento privado é uma tarefa primordial,
 …a reactivação do sector produtivo nacional é vital para a criação
de emprego, redução da pobreza e regresso de deslocados à
regiões de origem (rural e urbana) e, consequentemente, para a
estabilidade social e económica destes países37,
 …incentivar o investimento privado com o fito de promover o
empowerment dos mais pobres,
 …as condições em África para o exercício da actividade
empresarial são prejudicadas por várias situações: elevado custo
de se fazer negócios em África (fragilidades dos sistemas legal,
judicial, financeiro e laboral, às regulamentações burocráticas e
administrativas e à corrupção associada), reduzida qualidade das
infraestruturas e das tecnologias de informação e comunicação,
má gestão e instabilidade macroeconómica, risco de recuo das
políticas económicas, fraqueza do sector manufactureiro.
A estabilidade dos preços costuma ser apontada como um dos factores de maior
relevância para o crescimento, o desenvolvimento e, mesmo, a redução da pobreza.
Não é, portanto, por acaso que todas as economias do mundo lhe dedicam medidas de
política económica muito concretas38.
Em Angola, a situação está espelhada no gráfico seguinte.
36
Fátima Roque – A África, a Nepad e o Futuro, Texto Editores, 2007.
37
Em quanto as empresas angolanas e estrangeiras têm colaborado neste desígnio social e também político? Com
quanto emprego e investimento colaboraram as empresas para o processo de regresso dos deslocados de guerra às
suas origens?
38
Para quem estiver interessado nesta problemática da correlação inflação/crescimento consultar o artigo de
Michael Bruno intitulado “A Inflação Desacelera Realmente o Crescimento?”, Finanças e Desenvolvimento (revista
do FMI e Banco Mundial), Setembro de 1995.
54
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Algumas Manifestações de Responsabilidade Social das Empresas
Conforme referi no parágrafo três, existe uma escola de pensamento que defende
claramente a prática da responsabilidade social empresarial, numa concepção
completamente abrangente da actividade da empresa, da sua inserção na comunidade
e do seu relacionamento com os stakeholders.
Algumas manifestações de responsabilidade social das empresas, diferentes – quiçá
específicas – das identificadas como fazendo parte da sua função económica:
 Formação integral das pessoas, desenvolvendo as suas habilidades
técnicas, pessoais e sociais, nas áreas económicas mais portadoras de
futuro e visando qualificar as pessoas das comunidades para o mercado
de trabalho.
 Preservação da natureza e do ambiente, recorrendo a técnicas e
processos de produção respeitadores dos equilíbrios ecológicos e
fazendo os investimentos necessários para tornar os detritos produtivos
mais consentâneos com a capacidade natural de os regenerar.
 Contribuições materiais e imateriais para a mitigação de situações
sociais de catástrofe ou de desequilíbrios demográficos resultantes de
deslocações de população por influência da guerra. Angola já esteve
numa situação destas e todo o esforço adjacente para facilitar o
regresso dos cidadãos aos seus locais de origem foi acomodado pelo
Orçamento Geral do Estado.
55
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 Fomento de parcerias com Universidades para o fomento da
investigação científica e apoio a projectos que visam estudar e conhecer
as realidades económicas, sociais, históricas e culturais do país.
 Apoio a acções que contribuam para a transparência económica e
financeira das instituições públicas e privadas.
 Actividades relacionadas com o turismo sustentado (respeitador do
ambiente e utilizador, em larga escala, dos recursos e factores nacionais
e, particularmente, locais): tendo em conta as características intrínsecas
ao desenvolvimento da actividade do turismo sustentado, o líder deste
tipo de projectos é denominado empreendedor social 39.
A Encíclica de Bento XVI: Caridade Na Verdade
Um tema e uma reflexão incontornáveis na abordagem da responsabilidade social das
empresas: a encíclica Caridade na Verdade de Bento XVI40. O desafio social que se
coloca às empresas está muito para além (beyond) duma mera responsabilidade social,
no sentido mais estrito do termo, tal como anteriormente descrito. Ou seja: a
responsabilidade social empresarial pode não ter como foco essencial e determinante
o interesse social, os problemas sociais, a pobreza, afinal. A responsabilidade social
empresarial pode ser, finalmente, interesseira: atingir determinados objectivos
sociais das comunidades com a finalidade de se melhorar o clima de realização de
lucros empresariais, individuais. A provocação de Bento XVI abala os princípios da
economia de mercado – sem evidentemente cair em considerações de tipo marxista,
socialista ou comunista – e questiona sobre qual deve ser a verdadeira função do lucro
empresarial. Trata-se dum repto no sentido de se encontrar um novo paradigma da
economia de mercado41 – capitalista na sua essência e, portanto, individualista –, já
não assente no lucro individual/empresarial, mas num lucro social: a decisão de
investimento e escolha de actividades deixa de se basear na eficiência marginal do
capital de Keynes (ou taxa interna de rendibilidade), mas numa taxa social de retorno,
que leva em devida boa conta as condições de repartição da renda e de vida das
populações. Estão as empresas preparadas para esta nova responsabilidade social?
39
Ricardo Zózimo: O Empreendedor Social em África – Oportunidades para o Desenvolvimento da Comunidade
Local através do Turismo Sustentado, Caderno de Estudos Africanos, Centro de Estudos Africanos – ISCTE, nº 11/12,
Dezembro 2006/Junho 2007.
40
Frei Luís de França (Professor Universitário na UCAN): Caridade na Verdade – Uma Sinfonia Teológica, Revista
Lucere, Ano VI, nº 7, Junho de 2011, UCAN.
41
Se esta inovadora proposta papal, de cunho essencialmente moral, tiver alguns fundamentos científicos,
seguramente que os laureados com o Nobel da Economia vão tentar construir uma nova axiomática da economia
de mercado e, então, nada será como dantes.
56
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Vale a pena seguir – lendo – o artigo de Frei Luís de França e reter o que de essencial
tem em matéria de descrição e interpretação da encíclica papal Caritas in Veritate de
Bento XVI:

“A caridade na verdade significa que é preciso dar forma e
organização àquelas iniciativas económicas que, embora sem
negar o lucro, pretendem ir mais além da lógica da troca de
equivalentes e do lucro como fim em si mesmo”.

“Caritas in Veritate é um princípio à volta do qual gira a Doutrina
Social da Igreja, princípio que ganha forma operativa com
critérios orientadores da acção moral, como a justiça e o bem
comum”.

“ O princípio de gratuidade e a lógica do dom como expressão da
fraternidade podem e devem encontrar lugar dentro da
actividade económica normal. Isto é uma exigência do homem
no tempo actual, mas, também, da própria razão económica.
Trata-se de uma exigência simultaneamente da caridade e da
verdade”.
A introdução do princípio da gratuidade na lógica de funcionamento duma economia
de mercado é que constitui o grande desafio para a reflexão teórica da Ciência
Económica. Não é a obtenção do bem-estar social (ou nacional) enquanto resultado
eventualmente secundário do exercício duma actividade empresarial/individual – o
exemplo de circuito económico e da realização da função social pela actividade
individual dada por Adam Smith na Riqueza das Nações é absolutamente fenomenal –,
mas de incorporar na lógica das decisões empresariais de afectação de recursos e
factores de produção o princípio (a exigência?) de caridade. Ou seja, a partilha social
do lucro empresarial já não se fará apenas ex-post (através da responsabilidade social
das empresas ou do pagamento de impostos ao Estado e da correspondente satisfação
das necessidades colectivas), mas tem de estar incorporada nos mecanismos e nas
regras de funcionamento da economia de mercado, uma economia individualista por
essência.
O empresário de Joseph Schumpeter – inovador, empreendedor, aceitador do risco e
individualista – tem de se transformar, ou pelo menos incorporar elementos novos,
num empresário social, onde o principal critério de alocação de recursos escassos (por
vezes alheios) é o bem-estar da comunidade e dos seus cidadãos: “… o
desenvolvimento económico, social e político precisa, se quiser ser autenticamente
humano, de dar espaço ao princípio da gratuidade, como expressão de fraternidade”.
57
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Para os empresários e as empresas que se consideram capazes duma responsabilidade
social, a leitura da Encíclica Papal Caritas in Veritate é absolutamente obrigatória
(podendo aí encontrar exemplos de actos e actividades de responsabilidade social). No
mínimo, a leitura do artigo do Frei Luís de França é fortemente recomendada.
58
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ROQUE, Fátima Moura – África, a Nepad e o Futuro, Texto Editores 2007.
FRANÇA, Frei Luís de – Caridade na Verdade: Uma Sinfonia Teológica, Revista LUCERE
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59
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
Algumas questões para repensar o futuro de Angola42
Adelino Torres
Professor Catedrático Jubilado do Instituto Superior de Economia – Universidade
Técnica de Lisboa
Antigo Secretário-Geral da Sociedade Cultural de Angola e redactor do Jornal ABCDiário de Angola em 1961 e director da revista “Episteme-Revista de
Epistemologia e da História das Ciências e das Técnicas da Universidade Técnica
de Lisboa”.
Repensar o futuro de Angola é porventura a tarefa mais importante e difícil com que
os angolanos se deparam na antevisão do pós-guerra. Porém, em termos de acção
concreta, a realização de quaisquer projectos só será exequível depois de preenchidas
pelo menos duas condições sine qua non: uma paz durável e a consolidação de um
Estado de direito garante de um processo democrático efectivo.
É igualmente indispensável não esquecer que a reconstrução do país depende (pondo
de lado condicionalismos externos) tanto da visão e estratégias dos dirigentes
nacionais e dos respectivos partidos políticos, como da capacidade de intervenção da
chamada “sociedade civil”. Desde logo, uns e outros terão futuramente que redefinir
espaços de convergência e de regulação de tensões tendo em conta direitos e deveres
de cidadania à face da lei.
É importante observar igualmente que, falando de “democracia” em Angola, não estou
de modo algum a sugerir que esta só pode resultar da transposição de organizações e
de instituições43 que existem noutras partes do mundo. Se tais modelos podem e
devem ser analisados sem preconceitos, nada impedindo que Angola deles recolha o
que tem merecimento (não se inventa a roda todos os dias), também nada obsta a que
se proceda a adaptações que se revelem adequadas em função da realidade local,
coisa que, demasiadas vezes, os países africanos têm negligenciado desde as
42
Texto apresentado oralmente no Colóquio “E Depois da Guerra Que Futuro Para Angola” a propósito das
comemorações do 24º aniversário da independência de Angola, realizado pela Casa de Angola (Lisboa) em 11 e 12
de Novembro de 1999. Este artigo foi igualmente publicado na Revista Afroletras.
43
É necessário distinguir “organizações” de “instituições”. A questão da economia institucional é uma das mais
actuais na análise do desenvolvimento. Vd. Douglass C. North, Institutions, Institutional Change and Economic
Performance, Cambridge University Press, , 1993; Geoffrey M. Hodgson, Economia e Instituições, trad. port., Lisboa,
Celta, 1994; John Harriss et al. (Ed. by), The New Institutional Economics and Third World Development, Londres,
Routledge, 1995.
60
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
independências. É evidente que a democracia, enquanto tal, é um processo dinâmico
que não se restringe aos instrumentos que a servem.
A liberdade não é incompatível com a existência de um Estado forte e prestigiado,
desde que a sua acção pressuponha uma “good governance” tal como esta é
entendida internacionalmente. É certo que a construção do Estado-nação em África é
uma tarefa particularmente árdua que se defronta com múltiplas tensões ou
disfuncionalidades (étnicas, linguísticas, culturais) onde não é fácil encontrar os pontos
de convergência44. Mas não há motivos para pensar que esse obstáculo seja
intransponível, e menos ainda para aceitar passivamente um qualquer
“afropessimismo” nihilista que nenhuma razão profunda justifica nem, no campo
oposto, um igualmente ilusório “afrocentrismo” gerador de frustrações ainda mais
perigosas45.
Admitindo preenchidas as pré-condições enunciadas pelos dois postulados (paz e
democracia), será talvez então possível debater questões prioritárias, nomeadamente
as mais imediatas para a reconstituição do tecido económico e social da nação.
Não tenho, bem entendido, a pretensão de cobrir no curto espaço deste artigo a
globalidade das problemáticas com relevância para essa reflexão, tanto mais que,
independentemente da dificuldade própria a cada uma delas, todas se inscrevem
numa sistémica feita de complexidade, onde o conjunto não resulta necessariamente
da soma das suas partes. Essas limitações, bem como o seu carácter parcelar, cerceiam
o alcance analítico destas notas que entendo apenas como pontos sucintos para
discussão ulterior.
Uma primeira questão condiciona (e é condicionada por) todas as outras: o
desenvolvimento. Este está articulado com o conceito de “crescimento”, mas
ultrapassa-o na medida em que não se trata apenas de um parâmetro quantitativo
(produto nacional bruto per capita, por exemplo) mas de uma noção complexa onde
estão presentes elementos de ordem qualitativa nem sempre fáceis de definir46.
Para muitos, o motor do desenvolvimento é a industrialização, o que explica o
empenho dos governos africanos em enveredarem por estratégias de industrialização
ditas de “substituição de importações” que, se fizermos o balanço das últimas décadas,
foram, em termos de desenvolvimento, geralmente mal sucedidas.
44
Cf. Jean-François Bayard, L´État en Afrique, Paris, Fayard, 1989; GEMDEV, Les avatars de l´État en Afrique, Paris,
Karthala, 1997
45
Stephen Howe, Afrocentrism: Mythical Pasts and Imagined Homes, Londres, Verso, 1999.
46
Vd por exemplo Partha Dasgupta, An Inquiry Into Well-Being and Destitution, Oxford. Clarendon Press, 1993.
61
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
Esse fracasso tem várias razões: as estratégias de industrialização por substituição de
importações (ISI) foram tomadas como “um fim em si mesmo” em vez de serem
encaradas como “um meio”. Essa obstinação foi altamente gravosa para os países
africanos, como o tinha sido para a América Latina.
Por outro lado as ISI foram acompanhadas por políticas económicas incongruentes,
entre as quais taxas de câmbio sobrevalorizadas, políticas aduaneiras desajustadas,
recurso constante ao endividamento externo, abandono da agricultura, etc.
Por fim faltou-lhes uma integração regional (as comunidades económicas existentes
desde 1975 continuam quase letra morta) sem a qual o desenvolvimento da maioria
dos países africanos é um empreendimento praticamente inviável47.
Em contrapartida, as actuais propostas das instituições de Bretton Woods, relativas ao
abandono da ISI, ao estrito cumprimento das regras do comércio internacional e à
aplicação da chamada “estratégia de promoção de exportações” (EPE), ou seja a
adopção radical de um liberalismo económico, não parece ser, a curto e médio prazo,
inteiramente realista no caso angolano.
É certo que Angola terá, de qualquer modo, de proceder a uma verdadeira
reconstrução do aparelho industrial.
O problema consiste em saber a que filosofia esta deve obedecer. Se está obviamente
excluído repetir os erros da “velha ISI”48, também não parece haver outra alternativa
senão a de voltar a atribuir (mas noutros moldes) um papel activo ao Estado. Com a
diferença porém que qualquer nova política económica desse tipo deverá ser
considerada como um meio transitório, rigorosamente definido por limites temporais e
objectivos que, se possível, recolham o consenso internacional.
É inevitável que a metodologia a aplicar deverá recorrer à utilização de investimentos
estrangeiros. Mas nada impede que o Estado angolano tenha aí também um papel
“regulador” (por exemplo escolhendo os sectores prioritários e zelando pela boa
execução desses investimentos). Embora simplificando bastante, poderíamos dizer que
o que é importante não é tanto a denominação que se dará à nova estratégia a
escolher (se escolha houver!), mas sim a sua filosofia e a maneira como será aplicada
para atingir, dentro de um prazo determinado (suponhamos, apenas para fixar ideias,
47
Vd. Robert J. Berg e Jennifer S. Whitaker, Statégies pour un nouveau développement en Afrique, trad. fr., Paris,
Economica, 1999; e sobretudo o notável Philippe Hugon, l´Economie de l´Afrique, Paris, La Découverte, 2ª ed.
1999 (uma tradução em português será publicada ainda em 1999).
48
Vd Manuel Ennes Ferreira, Indústria e guerra (Angola, 1975-91), Lisboa, Cosmos, 1999
62
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
5 anos), o objectivo último: a consolidação e diversificação da economia angolana por
forma a que a abertura se faça em condições razoáveis de competitividade.
Esse compasso de espera entre o fim da guerra e a liberalização permitiria assegurar,
de maneira lógica, uma transição minimamente adequada aos desafios colocados pela
inserção de Angola na economia dita “global”.
O provável desaparecimento da Convenção de Lomé e o estabelecimento de novas
regras ditadas pela Organização Mundial de Comércio, mostram bem a urgência do
problema e até que ponto estão ultrapassadas as ilusões de autarcia nacionalista.
Outro erro a evitar seria de concentrar a orientação desenvolvimentista
exclusivamente na ideia de “industrialização”. Num país em que a maioria da
população é rural, a agricultura é um vector fundamental desse mesmo
desenvolvimento (entendendo o conceito no sentido amplo).
Por sua vez os resultados nesses dois sectores dependem em grande medida da
formação profissional e, de modo geral, da importância que o Estado atribuir à
educação. É indispensável qualificar os trabalhadores, dar uma formação apropriada a
futuros empresários, preparar funcionários competentes ao serviço de uma
administração eficaz, dispor de quadro técnicos, etc.
É claro que todas as acções não podem ser levadas a cabo ao mesmo tempo e com a
mesma intensidade. O crescimento é inevitavelmente “desequilibrado”49, havendo que
proceder a escolhas de “geometria variável” por assim dizer.
Admitindo a hipótese de uma calendarização por períodos de 5 anos (como já disse o
prazo indicado é meramente exemplificativo) não parece absurdo consagrar uma fatia
importante do orçamento de Estado à educação, e dentro desta, privilegiar
fortemente, durante o primeiro quinquénio, o ensino primário e a formação
profissional (o que supõe a instalação de uma rede de escolas primárias e de
reciclagem profissional em todo o país). Aumentar-se-iam progressivamente, durante
os períodos seguintes, as percentagens do orçamento aplicadas ao ensino secundário,
ao ensino superior politécnico e finalmente ao ensino universitário. Note-se a esse
propósito que a ideia da expansão do ensino primário já foi objecto em 1962 de um
plano em grande escala concebido e corajosamente executado pelo antigo Secretário
Provincial da Educação de Angola, Amadeu Castilho Soares: “Levar a escola à sanzala”.
O plano era tão ousado que deu origem à posterior destituição pura e simples deste
49
Relembram-se as velhas polémicas dos anos 60, nomeadamente os trabalhos de Albert O. Hirschman; Vd.
igualmente William K. Tabb, Reconstructing Political Economy, Londres, Routledge, 1999
63
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
alto funcionário e ao seu afastamento da carreira universitária., para além de uma
perseguição mesquinha de que foi vítima durante anos50
Com as adaptações naturalmente justificadas pela evolução dos tempos, este plano
poderia ainda hoje inspirar uma acção de grande envergadura no ensino primário de
Angola. Tal procedimento não significaria o abandono desta ou daquela área: ele
ilustra apenas, repito, uma escolha pragmática de prioridades e uma variação de
intensidade de investimento ao longo do tempo. A metodologia não se concentra, tão
pouco, numa estratégia de satisfação de “necessidades básicas”, embora estas devam
merecer, desde o primeiro momento, a maior atenção do governo.
No essencial, é necessário não perder de vista que se é imprescindível ocupar o mais
rapidamente possível um espaço em todas as vertentes do desenvolvimento, a faixa da
“terceira revolução industrial” 51 não deve nem pode de modo algum ser excluída (nem
sequer esperar), na medida em que constitui uma condição fundamental da adaptação
do país aos desafios da modernidade, sem a qual o retrocesso parece inevitável.
Um problema urgente que não pode deixar de preocupar as autoridades é a estrutura
das carreiras públicas e a sua dignificação. Neste capítulo, parece aconselhável a maior
prudência. Mais vale, talvez, avançar “por pacotes”, aplicados por fases calendarizadas
e previamente explicadas à opinião pública angolana. Por exemplo, num primeiro
tempo, proceder à elaboração de estatutos de carreira e remuneratórios (método
indiciário) na Defesa, Segurança, Magistratura, Educação e Saúde. Os critérios de
escolha destes cinco sectores, embora discutíveis e de ordem diferente, procuram
colmatar deficiências básicas, atenuando, ao mesmo tempo, tensões corporativistas
potencialmente ameaçadoras num tecido social fragilizado.
Escusado será dizer que os pontos anteriores dependem de uma reforma em
profundidade da moeda e das finanças do país. Sobre este e certos outros aspectos
reenvio para a leitura do importante artigo de Jorge Costa Oliveira, - o melhor
especialista português em matéria de cooperação económica com África - “A
interacção entre a política e a economia (Angola e Guiné-Bissau)”, recentemente
publicado52. Poderíamos citar ainda exemplos como: a criação de uma nova moeda,
ligada ao euro e com uma taxa de câmbio realista, uma reforma completa do sistema
50
Vd. em: Jornal ABC-Diário de Angola (Luanda) de 17 de Setembro de 1962; Boletim Oficial de Angola-Conselho
Legislativo, Acta da sessão, 4 de Novembro de 1963, p. 2345; A Província de Angola (Luanda), 22 de Junho de 1964;
A Província de Angola (Luanda), 13 de Abril de 1964; A Província de Angola (Luanda), 19 de Abril de 1964; A
Província de Angola (Luanda), 16 de Janeiro de 1969; Diário Popular (Lisboa), 15 de Agosto de 1969; Silva Cunha, O
Ultramar, a Nação e o “25 de Abril”, Coimbra, Atlântida, 1977, pág. 103.
51
Vd por exemplo Manuel Castells, L´ère de l´information, 3 vols, trad. fr., Paris, Fayard, 1999.
52
Revista Cadernos de Economia (Lisboa, Ordem dos Economistas), nº de Julho-Setembro 1999, pp. 32-43)
64
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
financeiro em termos de receitas (sistema tributário) e de alocação das despesas, etc.
Para ser breve, diria que se impõe a adopção de uma política global de “ajustamento
estrutural”, esclarecendo todavia que tal “ajustamento”, diferentemente dos
programas do Fundo Monetário Internacional demasiadamente subordinados à óptica
financeira dos equilíbrios de curto prazo, terá que acentuar significativamente o
esforço consagrado ao sector social sem que isso signifique “aumento de
rendimentos” (em numerário) das categorias socioprofissionais mas, tão só,
investimentos nos sectores imediatamente mais carentes como os que atrás foram
referidos.
Com efeito, seria dificilmente suportável, após mais de vinte anos de guerra
consecutivos e calamitosos, impor às populações novos sacrifícios sem que elas
pudessem usufruir de, pelo menos, contrapartidas imediatamente “visíveis” (apoios ao
poder de compra, cuidados de saúde, transportes, escolarização das crianças, etc.).
Quanto aos investimentos propriamente ditos, este devem ser direccionados
criteriosamente: no apoio prioritário à criação de micro-empresas e PME, o qual está
estreitamente ligado à formação e reciclagem de um corpo empresarial nacional e de
trabalhadores especializados; no enquadramento do investimento directo estrangeiro,
que beneficie não só de um código de investimentos favorável, mas sobretudo de um
sistema tão desburocratizado quanto possível onde os procedimentos administrativos
sejam reduzidos ao mínimo (se assim não for o código de investimentos de pouco
valerá, seja qual for o seu grau de liberalidade teórica). A agricultura também deverá
ser objecto de medidas de incentivo especiais, quer na agricultura de exportação, a
qual, contrariamente a um preconceito ainda vivaz, não é necessariamente
incompatível com a alimentar53, quer na pequena agricultura “doméstica”: criação de
cooperativas, encorajamento da livre iniciativa, instalação de uma rede de agências
bancárias de fomento de preferência à banca comercial clássica que se tem revelado
inoperante em todo o continente como o atesta o desenvolvimento informal das
“tontines”54 na África ocidental, etc.
Finalmente, a par destas medidas viradas para a economia interna, é imperativo cuidar
dos aspectos que, em termos económicos e políticos, favoreçam uma melhor
implantação de Angola no âmbito internacional, entre os quais: integração regional na
SADC, estreitamento das relações com a União Europeia, preparação para as “ondas
53
Vd. o belo livro de Serge Michaïlof, Les apprentis sorciers du développement, Paris, Economica, 1984.
54
Uma “tontine” é uma associação cujos aderentes colocam em comum as suas cotisações e recebem, cada um por
sua vez, por sorteio, empréstimos sobre a poupança assim acumulada. As “tontinas” desenvolveram-se para fazer
face à impossibilidade de acesso ao sistema bancário, mas, para lá da sua actividade financeira, contribuem para a
socialização e criam solidariedades. Vd. Bruno Lautier, L´économie informelle dans le Tiers Monde, Paris, La
Découverte, 1994.
65
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
de choque” geradas pelos acordos da Organização Mundial de Comércio e pelo
eventual desaparecimento da Convenção de Lomé, modernização e diversificação do
aparelho produtivo.
Analysis of Interest Rates and Inflation in South Africa
Albertina Delgado
Economist
Assistant Lecturer at UCAN
Master student at CLSBE
Introduction
In this paper I pretend to explore how interest rates and inflation relate with each
other by applying some time series methods of analyses that was given during the
course. In this way the paper will do the analyses between the interest rate and
inflation rate in South Africa.
South African economy is the biggest in Africa and relatively more diversified than the
other countries.
The interest rate in South Africa was recorded at 8.4% in the last quarter of 2011,
historically, during the period of apartheid the interest rate was averaged at 10.2% and
from 1994 to 2011(period after the apartheid), it reaching an average of 11.43%. But
the inflation behaves in the opposite way, in the last quarter of 2011 was at 6.3%,
during the period of apartheid the inflation rate was averaged at 9.09% and after it
reaches an average of 6.07%.
66
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
In order to be possible to do the analyses, data have been collect in quarterly from the
period of 1958 to 2011 and it was organized in stata. The sample in this case is
composed by 216 observations.
This assignment will be analysis of the interest rate and inflation behavior by using
considerable tests, which the final goal is to check if it is possible to cointegrate these
variables as an Autoregressive Distributed Lag (ADL) model type.
Output Estimation
Firstly, we compute the estimation for the interest rate model and then afterwards we
apply the same procedures to estimate an inflation model and see if it acceptable or
not to cointegrate these two variables.
Interest Rate Model
(1)
This variables stand for:
 IR t represents the interest rate in period t;
 IRt-1 represents the interest rate in period t-1;
. reg IR IRlag1
Source
SS
df
MS
Model
Residual
3218.80373
81.9684976
1
213
3218.80373
.384828627
Total
3300.77223
214
15.4241693
IR
Coef.
IRlag1
_cons
.9833477
.193426
Std. Err.
.0107521
.1218232
t
91.46
1.59
Number of obs
F( 1,
213)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
P>|t|
0.000
0.114
=
215
= 8364.25
= 0.0000
= 0.9752
= 0.9751
= .62035
[95% Conf. Interval]
.9621536
-.0467074
1.004542
.4335593
According to the output, it is possible to verify that IR t-1 is a highly significant variable
since we reject the null hypothesis of non-significance for any significance level (pvalue = 0.000 <α=5%). Moreover, the estimation coefficient for IR t-1 (ρ =0,9833477) is
approximately to one, which arises suspicion about the presence of unit roots in the
model.
67
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
. corrgram IR, lags(20)
LAG
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
AC
0.9820
0.9597
0.9404
0.9249
0.9087
0.8929
0.8789
0.8634
0.8508
0.8371
0.8238
0.8133
0.8047
0.7967
0.7840
0.7670
0.7440
0.7206
0.6977
0.6762
PAC
0.9833
-0.1927
0.1432
0.0990
-0.0578
0.0553
0.0518
-0.0971
0.1801
-0.1170
0.0546
0.1668
-0.0512
0.0318
-0.1548
-0.1628
-0.1863
-0.0261
-0.0106
0.0522
Q
211.2
413.84
609.33
799.34
983.63
1162.4
1336.4
1505.2
1669.9
1830.1
1986
2138.6
2288.8
2436.8
2580.8
2719.3
2850.3
2973.8
3090.1
3200
Prob>Q
-1
0
1 -1
0
1
[Autocorrelation] [Partial Autocor]
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
In the
Auto Correlation (AC) function is important to state that it shows a slow decay in the
trend, revealing some persistency behavior, since it takes a while for the values to
revert to zero (the AC it is decreasing gradually its values as the number of lags
increases). The 1º lag assume values very close to one (ρ =0.9820), which suggests
that it may be following a highly persistent AR (1) process with a non-stationary unit
root. Moreover, the Partial AC function is also very close to one for the 1º lag and very
close to zero for the others lags. This fact reinforces even more our previous suspicion.
Another test that is relevant to refer is the Ljung-Box Q-statistic which allows testing if
there is presence of a white noise process in the model:
H0:
H1:
All lags are not auto-correlated (independently distributed)
not independently distributed
Where α stands for the covariance between the error terms (
,
automatically the null hypothesis is rejected because P-value (Prob>Qcolumn) is less
than any critical level, which indicates that this series show a significant
autocorrelation. The rejection of the null means that there is not a white noise process
in the model, namely, the condition
is not satisfied.
In addition, it is also important to understand the best fit for the model, i.e., it should
avoid become over fit in order to diminish errors in the forecasts due to the increase
number of lags. Therefore, it is possible to conduct several tests that help to define the
proper number of lags to include in the model, such as: Akaike’s Information Criterion
(AIC), Schwarz’s Bayesian Information Criterion (SBIC) and the Hannan and Quinn
68
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
. varsoc IR, maxlag(4)
Selection-order criteria
Sample: 1959q1 - 2011q4
lag
0
1
2
3
4
LL
LR
-588.91
-200.048
-195.989
-193.787
-192.736
Endogenous:
Exogenous:
Number of obs
df
p
FPE
AIC
1
1
1
1
0.000
0.004
0.036
0.147
15.2918
.39386
.382656
.378342
.378161*
5.56519
1.90612
1.87726
1.86592
1.86543*
777.72
8.1182
4.4042*
2.1023
=
HQIC
5.57159
1.91891
1.89645
1.89151*
1.89743
212
SBIC
5.58102
1.93778
1.92475*
1.92925
1.9446
IR
_cons
information criterion (HQIC). The decision is based on the fact that typically models
with lower SBIC/AIC/HQIC are preferred.
In this hand, it is observed that all the test statistic diverge with each other in terms of
a unanimity conclusion. Accordingly with Oscar Torres-Reyna, “in the context of VAR
models, that AIC tends to be more accurate with monthly data, HQIC works better for
quarterly data on samples over 120 and SBIC works fine with any sample size for
quarterly data (on VEC models)”. Thus, the decision was made by choosing the SBIC
test that is valid for all types of samples, which suggests an application of a lag 2 in the
IR model.
The model of interest rate with 2 lags
(2)
This variables stand for:
 IR t represents the interest rate in period t;
 IR t-1 represents the interest rate in period t-1;
 IR t-2 represents the interest rate in period t-2;
. regress IR IRlag1 IRlag2
Source
SS
df
MS
Model
Residual
3191.77729
78.881372
2
211
1595.88865
.373845365
Total
3270.65867
213
15.355205
IR
Coef.
IRlag1
IRlag2
_cons
1.174638
-.192673
.2044655
Std. Err.
.0675389
.0672608
.1209979
t
17.39
-2.86
1.69
69
Number of obs
F( 2,
211)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
P>|t|
0.000
0.005
0.093
=
214
= 4268.85
= 0.0000
= 0.9759
= 0.9757
= .61143
[95% Conf. Interval]
1.0415
-.3252623
-.0340541
1.307775
-.0600838
.4429851
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
The increase number of lags had positive impact over the model specification since the
R2 and the Adjust R2have also increased. This means that the proportion of the
variation in the dependent variable can be better explained in this regression with
second lag than in the first with one. Furthermore, the variables are significant since
we reject the null with a significance level of 5% (α =0.05) and the F test indicates that
the model is global significant.
In order to verify the presence of non stationarity in the parameters it will be perform
a unit root test (the Dickey-Fuller test).However, the Dickey-Fuller (DF) test is sensitive
to the presence of autocorrelation in the error terms. Consequently, if that situation
verifies than the DF test is no longer valid and it needs to perform the Augmented
Dickey-Fuller(ADF) test. Thus, it was performed the regression of the errors and
computed all of the tests to verify this situation and after that it will be performed the
DF test for the parameters.
Regression of residuals of the model number (2)
(3)
This variables stand for:
 ei represents the error term of model 2 (with 2 lags);

represents the error term in period t-1;

represents the error term in period t-2;
. regress ei eilag1 eilag2
Source
SS
df
MS
Model
Residual
1.15604907
77.7035022
2
209
.578024533
.371787092
Total
78.8595513
211
.373741949
ei
Coef.
eilag1
eilag2
_cons
.031193
-.1179689
.0010529
Std. Err.
.0686957
.0687385
.0418774
t
0.45
-1.72
0.03
Number of obs
F( 2,
209)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
P>|t|
0.650
0.088
0.980
=
=
=
=
=
=
212
1.55
0.2137
0.0147
0.0052
.60974
[95% Conf. Interval]
-.1042324
-.2534786
-.0815033
.1666183
.0175409
.0836092
Test of
autocorrelation in the residuals
To test for autocorrelation in the residuals it is necessary to perform the BreuschGodfrey test. Still, it is only possible to perform this test with presence of conditional
Homoskedasticity. Hence, it was computed the Breusch-Pagan test, as it is seen below,
which indicates that the null hypothesis of constant variance is rejected, meaning that
the model has presence of Heteroskedasticity. So the errors should be corrected by
using the robust standard errors for the performance of other tests.
70
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. estat hettest
Breusch-Pagan / Cook-Weisberg test for heteroskedasticity
Ho: Constant variance
Variables: fitted values of ei
chi2(1)
Prob > chi2
=
=
21.77
0.0000
Since the model has Heteroskedasticity, the Breusch-Godfrey test will no longer be
applied. Instead, an alternative test of Durbin-Watson(DW) will be used:
H0: Absence of serial correlation
H1: Serial correlation
. prais ei eilag1 eilag2, vce(robust)
Prais-Winsten AR(1) regression -- iterated estimates
Linear regression
Number of obs
F( 2,
209)
Prob > F
R-squared
Root MSE
ei
Coef.
eilag1
eilag2
_cons
.4412365
-.3016422
.0011573
rho
-.425204
Semirobust
Std. Err.
t
.0893425
.0768281
.0292438
4.94
-3.93
0.04
P>|t|
0.000
0.000
0.968
=
=
=
=
=
212
13.88
0.0000
0.1953
.60469
[95% Conf. Interval]
.2651086
-.4530995
-.0564934
.6173644
-.1501848
.058808
Durbin-Watson statistic (original)
2.030111
Durbin-Watson statistic (transformed) 1.986936
As a result, the DW statistic is approximately to 2 then it concludes that do not reject
the null hypothesis for absence of autocorrelation in error term. In this way, is possible
to use the DF test based on first differences in order to analyze the unit roots for the
parameters.
Test of unit roots in parameters
Once is proved there is no autocorrelation in the residuals it is computed the DF test
by taking the first differences of the dependent variable. Thus, is used the following
equation:
(4)
H0: Series with unit root (non-stationarity)
H1: Series without unit root (stationarity)
71
PAC of Inf
0.50
Partial autocorrelations of Inf
0.50
AC of Inf
0.00
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
1.00
1.00
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0.00
-0.50
. dfuller IRD, trend regress
Dickey-Fuller test for unit root
20
40
Lag
Z(t)
60
80
0
-12.129
Bartlett's formula for MA(q) 95% confidence bands
=
214
-0.50
-1.00
Test
Statistic
0
Number of obs
Interpolated Dickey-Fuller
1% Critical
5% Critical
10% Critical
Value
Value
Value
20
-4.002
40
60
-3.435
Lag
80
-3.135
95% Confidence bands [se = 1/sqrt(n)]
MacKinnon approximate p-value for Z(t) = 0.0000
D.IRD
Coef.
IRD
L1.
_trend
_cons
-.8219084
-.000819
.1006367
Std. Err.
.0677642
.0006826
.0846227
t
P>|t|
-12.13
-1.20
1.19
0.000
0.232
0.236
[95% Conf. Interval]
-.95549
-.0021647
-.0661775
-.6883269
.0005266
.2674509
Since the observed test statistic >critic value (for any level of significance), the null
hypothesis is rejected which reveals that there is no presence of a unit root in the
series. This leads to the conclusion that after the first differences are taking into
account the variable Interest Rate become stationary, and so integrated with order 2.
Inflation Model
(5)
This variables stand for:
i. Inft represents the inflation in period t;
ii. Inf t-1 represents the inflation in period t-1;
. regress Inf Inflag1
Source
SS
df
MS
Model
Residual
5169.90763
351.208817
1
213
5169.90763
1.64886769
Total
5521.11645
214
25.7996096
Inf
Coef.
Inflag1
_cons
.9664478
.2825113
Std. Err.
.0172596
.1649145
t
55.99
1.71
Number of obs
F( 1,
213)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
P>|t|
0.000
0.088
=
215
= 3135.43
= 0.0000
= 0.9364
= 0.9361
= 1.2841
[95% Conf. Interval]
.9324263
-.0425622
1.000469
.6075849
According to the estimated output, it is possible to verify that Inft-1 is a significant
variable since we reject the null hypothesis of non-significance for any significance
72
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level (p-value <α) and this coefficient (ρ = 0,9664478) is also very close to one, which
arises suspicion about the presence of unit roots in the model.
. corrgram Inf, lags(20)
LAG
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
AC
0.9659
0.9167
0.8633
0.8054
0.7774
0.7591
0.7381
0.7190
0.6916
0.6585
0.6311
0.6156
0.6134
0.6220
0.6323
0.6310
0.6214
0.6077
0.5891
0.5820
PAC
Q
0.9664
-0.2537
-0.0196
-0.0858
0.5124
-0.1339
-0.0797
-0.1124
0.1860
-0.0981
0.0813
0.1478
0.1815
-0.0271
-0.0148
-0.0933
0.1515
0.0067
-0.0325
0.1053
Prob>Q
204.32
389.22
553.98
698.05
832.93
962.13
1084.9
1201.9
1310.7
1409.8
1501.3
1588.8
1676.1
1766.2
1859.9
1953.7
2045
2132.9
2215.8
2297.2
-1
0
1 -1
0
1
[Autocorrelation] [Partial Autocor]
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
0.0000
In the AC and the PAC function the Inflation shows a different behavior as the Interest
Rate model: reveal a more decline in the trend, no persistency behavior and the values
of AC are also decreasing as the number of lags increases but more sharply. The 1º
and 2ºlag of the PAC function assumes statistical significance which indicates suspicion
of an AR (2) process for the inflation model. By applying the Ljung-Box Q-statistic for
the presence of a white noise process in the model is possible to conclude that the null
hypothesis is rejected because P-value<critical level, which indicates that this series
show a significant autocorrelation.
In addition, was also conducted the AIC/SBIC/HQIC tests like it was done previously in
the other model, in order to help to decide which is the proper number of lags to
include in this model.
. varsoc Inf, maxlag(4)
Selection-order criteria
Sample: 1959q1 - 2011q4
lag
0
1
2
3
4
LL
LR
-644.971
-353.631
-346.497
-346.453
-345.666
Endogenous:
Exogenous:
582.68
14.268*
.08833
1.5733
Number of obs
df
1
1
1
1
p
0.000
0.000
0.766
0.210
FPE
25.9504
1.67721
1.58291*
1.59725
1.60048
Inf
_cons
AIC
6.09406
3.35501
3.29714*
3.30616
3.30817
=
HQIC
212
SBIC
6.10046
3.36781
3.31634*
3.33176
3.34017
6.1099
3.38667
3.34464*
3.36949
3.38734
this case all tests
73
In
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have a unanimity decision about the number of lags to include in the model, that
follow are previous suspicion, which did not happen before with the IR case. So, it was
decided to include lags 2 to perform the tests in the Inflation model.
The model of inflation l with 2 lags
(6)
This variables stand for:
 Inft represents the inflation in period t;
 Inf t-1 represents the inflation in period t-1;
 Inf t-2 represents the inflation in period t-2;
. regress Inf Inflag1 Inflag2
Source
SS
df
MS
Model
Residual
5177.76395
328.562268
2
211
2588.88198
1.55716715
Total
5506.32622
213
25.8512968
Inf
Coef.
Inflag1
Inflag2
_cons
1.212309
-.2536861
.3433503
Std. Err.
.0666338
.0665709
.1616686
Number of obs
F( 2,
211)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
t
P>|t|
18.19
-3.81
2.12
0.000
0.000
0.035
=
214
= 1662.56
= 0.0000
= 0.9403
= 0.9398
= 1.2479
[95% Conf. Interval]
1.080956
-.3849153
.0246576
1.343662
-.122457
.6620429
As we can see all parameter in the model are highly significant as per t test and
p- value, and the R- squared have increase in this model if we compare it to the model
(3).
Meanwhile, it is required to verify the presence of stationarity in the
parameters by performing a unit root test - the Dickey-Fuller test – as well as other test
like it was done previously for the IR model.
Regression of residuals of the model number (6)
(7)
This variables stand for:
 ei represents the error term of model 6 (with 2 lags);

represents the error term in period t-1;

represents the error term in period t-2;
74
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. regress ej ejlag1 ejlag2
Source
SS
df
MS
Model
Residual
.017098255
326.205059
2
209
.008549127
1.56078976
Total
326.222157
211
1.54607657
ej
Coef.
ejlag1
ejlag2
_cons
-.0054894
-.0047344
.0083393
Std. Err.
Number of obs
F( 2,
209)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
t
.0691861
.0689693
.0858045
P>|t|
-0.08
-0.07
0.10
=
212
=
0.01
= 0.9945
= 0.0001
= -0.0095
= 1.2493
[95% Conf. Interval]
0.937
0.945
0.923
-.1418815
-.140699
-.160814
.1309026
.1312303
.1774926
Test of autocorrelation in the residuals
In this case, the null hypothesis of the constant variance is not reject for any level of
significance (p-value> α). This means the model has presence of Conditional
Homoskedasticity and thus, it is possible to compute the Breusch-Godfrey test
normally without assuming its alternative test (Durbin-Watson test).
. estat hettest
Breusch-Pagan / Cook-Weisberg test for heteroskedasticity
Ho: Constant variance
Variables: fitted values of ej
chi2(1)
Prob > chi2
=
=
3.69
0.0548
. estat bgodfrey
Breusch-Godfrey LM test for autocorrelation
lags(p)
1
chi2
df
0.160
Prob > chi2
1
0.6888
H0: no serial correlation
As a result the p-value > any critical level, so the null is not rejected, meaning there is
no autocorrelation in error term. Thus, the DF test for parameters can be computed.
Test of unit roots in parameters
The test of unit root is computed by considering the first differences of the dependent
variable. Thus, is used the following equation:
(8)
H0: Series with unit root (non-stationarity)
H1: Series without unit root (stationarity)
. dfuller InfD, trend regress
Dickey-Fuller test for unit root
Z(t)
Number of obs
Test
Statistic
1% Critical
Value
-11.450
-4.002
=
214
Interpolated Dickey-Fuller
5% Critical
10% Critical
Value
Value
-3.435
75
-3.135
MacKinnon approximate p-value for Z(t) = 0.0000
D.InfD
Coef.
InfD
L1.
_trend
_cons
-.7674993
-.0005389
.0656231
Std. Err.
.0670283
.001401
.173688
t
-11.45
-0.38
0.38
P>|t|
0.000
0.701
0.706
[95% Conf. Interval]
-.8996302
-.0033007
-.2767629
-.6353684
.0022229
.4080091
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This case lead to the same conclusion: test statistic > critic value (for any level of
significance), thus the null hypothesis is rejected which means no existence of a unit
root in the model. So after taking into account the first differences, it is possible to
state that the variable Inflation become stationary and integrated with order 2.
Cointegration Model
As it was seen before, the variables analyzed where stationary and integrated with the
same order 2. This is one of the conditions to verify that these variables can be
cointegrated. Although, a second condition must also be verified: absence of unit roots
in the residuals of the model cointegrated by applying the Engle Granger test (test for
co-integration). This test will be computed below as well with the interpretation of the
co-integrated model.
Regression of co-integration model
(9)
. regress IR IRlag1 IRlag2 Inf Inflag1 Inflag2
Source
SS
df
MS
Model
Residual
3194.74945
75.9092177
5
208
638.949889
.364948162
Total
3270.65867
213
15.355205
IR
Coef.
IRlag1
IRlag2
Inf
Inflag1
Inflag2
_cons
1.133368
-.1721547
.0800135
-.1057017
.0491954
.2346447
Std. Err.
.0698564
.0688633
.034292
.0517996
.034015
.1213561
t
16.22
-2.50
2.33
-2.04
1.45
1.93
Number of obs
F( 5,
208)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
P>|t|
0.000
0.013
0.021
0.043
0.150
0.055
=
214
= 1750.80
= 0.0000
= 0.9768
= 0.9762
= .60411
[95% Conf. Interval]
.9956509
-.3079142
.012409
-.2078213
-.017863
-.004601
1.271085
-.0363951
.147618
-.003582
.1162538
.4738903
The model is global significant (F test) and the R2allows concluding that the variables
explain 97.68% of the Interest Rate behavior. If other variables remain constant, an
increasing on interest rate of last period
by 1%, implies that interest rate of the
current period will also increase in 1.13%. If other variables remain constant, an
increasing on inflation of last period
increase by 1%implies a decreasing of
0.105% of the interest rate.
76
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The variable Inflag2 is only non-significant variable for a level of 5%. For that reason, it
is important to perform the test of joint significance of the variable inflation as
following:
. test Inf Inflag1 Inflag2
( 1)
( 2)
( 3)
Inf = 0
Inflag1 = 0
Inflag2 = 0
F(
3,
208) =
Prob > F =
2.71
0.0459
Thus, the null hypothesis that all coefficients of β are equal to 0 is rejected, meaning
that the variable inflation is relevant for the model. So is possible to state that inflation
has a causality relation over the interest rate.
0
5
10
15
20
Trend of IR and Inf
1960q1
1970q1
1980q1
1990q1
2000q1
2010q1
Time
IR
Inf
By looking into the graph is possible to observe the trend between the two variables
and state its main conclusions: the behavior of the joint variables does not change over
time which indicates that maybe they are stationary. Moreover, the variables show a
positive trend from 1970 until 1985 and afterwards that they start to oscillate leading
to a decrease in the trend almost to the initial values of the sample.
After interpreted the co-integrated model it will proceed to the second condition to
guarantee the co-integration of the variables. For that an Engle & Granger test must be
computed.
77
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Regression of residuals of cointegrated model
This output represents the residuals that result from the relation between interest rate
and the inflation. Therefore, it is necessary to present the following estimation and
tests before applying the Engle & Granger computation.
. regress ek eklag1 eklag2
Source
SS
df
MS
Model
Residual
.985384565
74.9011388
2
209
.492692282
.358378654
Total
75.8865233
211
.359651769
ek
Coef.
eklag1
eklag2
_cons
.0014819
-.1140159
.000684
Std. Err.
.0687211
.0687639
.0411153
t
0.02
-1.66
0.02
Number of obs
F( 2,
209)
Prob > F
R-squared
Adj R-squared
Root MSE
P>|t|
0.983
0.099
0.987
=
=
=
=
=
=
212
1.37
0.2552
0.0130
0.0035
.59865
[95% Conf. Interval]
-.1339936
-.2495757
-.0803699
.1369573
.0215439
.081738
Prais-Winsten AR(1) regression -- iterated estimates
Linear regression
Number of obs
F( 2,
209)
Prob > F
R-squared
Root MSE
ek
Coef.
eklag1
eklag2
_cons
.4300509
-.304822
.0008839
rho
-.4440543
Semirobust
Std. Err.
.0812922
.0727699
.0283156
t
5.29
-4.19
0.03
P>|t|
0.000
0.000
0.975
=
=
=
=
=
212
16.89
0.0000
0.1913
.59313
[95% Conf. Interval]
.2697931
-.4482791
-.0549368
.5903088
-.1613648
.0567046
Durbin-Watson statistic (original)
2.030822
Durbin-Watson statistic (transformed) 1.992942
Test of autocorrelation in the residuals of the co-integrated model
The Breusch-Pagan test was computed, as it is seen below, in order to understand if
we are in a presence of conditional Homoskedasticity or not. Thus, the null hypothesis
of the constant variance is rejected for any level of significance (p-value<α), meaning it
is assumed the alternative (Durbin-Watson test) instead of the Breusch-Godfrey test
and the errors should be corrected by using the robust standard errors to performance
the tests.
. prais ek eklag1 eklag2, vce(robust)
78
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
. dfuller ek, trend regress
Dickey-Fuller test for unit root
Number of obs
Test
Statistic
1% Critical
Value
-14.473
-4.002
Z(t)
=
213
Interpolated Dickey-Fuller
5% Critical
10% Critical
Value
Value
-3.435
-3.135
MacKinnon approximate p-value for Z(t) = 0.0000
D.ek
Coef.
ek
L1.
_trend
_cons
-.9988362
.0000897
-.009704
Std. Err.
.0690152
.00067
.0826795
t
P>|t|
-14.47
0.13
-0.12
0.000
0.894
0.907
[95% Conf. Interval]
-1.134888
-.001231
-.1726922
-.8627849
.0014105
.1532842
Breusch-Pagan / Cook-Weisberg test for heteroskedasticity
Ho: Constant variance
Variables: fitted values of ek
chi2(1)
Prob > chi2
=
=
18.10
0.0000
As a result, the DW statistic is approximately to 2, which means that do not reject the
null hypothesis for absence of autocorrelation in error term. In this way, is possible to
use the DF test in order to analyze the unit roots for the residuals.
Test for the co-integration (Engle & Granger)
This test is identical to the DF test previously made by the two variables separately, but
now it will be computed for the residuals of the co-integrated model to analyze if there
is no unit root in the residuals in order to verify the cointegration after all. This test it
will also considered the first differences over the residual, such as following:
(10)
H0: Unit root in cointegrating regression’s residuals (no cointegration)
H1: Residuals from cointegrating regression are stationary (cointegration)
Accordingly to the Engle & Granger test the test statistic > critical value (for any
significant level), which indicates the rejection of the null hypothesis of an existence of
unit root in the residuals, meaning that it is possible to cointegrate this model. At the
end, the second condition is also verified leading us to an integrated model with a
similar behavior as an Autoregressive Distributed Lag (ADL) model.
Conclusion
79
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
After performing the econometrics tests and analysis is possible to be driven to the
following conclusions:
Firstly, the Interest Rate and Inflation are both stationary variables for the estimated
period, meaning they are somehow identically distributed and any correlation can be
observed throughout the period. Moreover, both variables had a model with 2 lags
because R2 was higher in this model than in the model with one lag and it allowed to
explaining better the behavior of the parameters.
Secondly, a DF test was performed which drive to the conclusion that there is no unit
root in the parameters by rejection of null hypothesis, which means that there is no
unit roots in the estimated parameters(stationarity). Beside that these variables were
cointegrated in a model to explain its behavior and in that model the residuals also
showed to have no unit roots, therefore, the variables had all the condition to be
cointegrated. This new cointegrated had a similar structure and behavior like an ADL
(2, 2) and showed to be global significant with an explanation of 97.68% of South
Africa’s interest rate.
Finally, the model showed that the variables of Interest Rate and Inflation have a
relationship, which in this case it is an inverse one. This relation can allow to state that
the results of the estimation coincide and are consistent with the economic theory.
References and Data
Hamilton, J. (1994). Time Series Analysis. New Jersey: Princeton University Press.
Azevedo, J. (2012). Time Series Econometrics classes notes. Lisbon.Portugal: Católica
Lisbon School of Business and Economics.
Blackwell, Matt.Multiple Hypothesis Testing: The F-test.2008. Available in:
http://www.mattblackwell.org/files/teaching/ftests.pdf
Organisation for Economic Co-operation and Development. South Africa's Statistics
Profile. Available in: http://stats.oecd.org/WBOS/index.aspx
Reyna, O. (n.d.). Time Series notes of Princeton University. Available in:
http://dss.princeton.edu/training/TS101.pdf
80
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
OS GRANDES DESAFIOS DO CRESCIMENTO ECONÓMICO DE
ANGOLA ATÉ 2017
Alves da Rocha
Economista e Professor Associado da Universidade Católica de Angola
Director do Centro de Estudos e Investigação da UCAN
Num recente relatório da prestigiada Economist Intelligence Unit dava-se conta de que
a economia angolana poderia ultrapassar a nigeriana e sul-africana até 2016. É
inquestionável a dinâmica de crescimento revelada por Angola desde que a guerra civil
deixou de atormentar a população e de consumir recursos financeiros do Orçamento
de Estado. No entanto, as informações disponíveis parecem não indicar ainda nesse
sentido.
Na verdade, e tomando 2009 a base de comparação, verificam-se os desníveis
seguintes, em termos de valor absoluto do PIB (mil milhões de dólares):
Nigéria/Angola – 2,7 e África do Sul/Angola – 4,155. Inverter este hiato em sete anos
exige um esforço anual de crescimento do PIB angolano de 22,3% face à economia sulafricana e 15% para se ultrapassar a nigeriana56. Adicionalmente devo referir que o PIB
estimado para Angola em 2017 – 153,5 mil milhões de dólares57 - é inferior ao da
Nigéria (184,7 mil milhões de dólares) e da África do Sul (284 mil milhões de dólares)
em 200958.
Portanto, é este o desafio do crescimento: existem condições internas para promover
e garantir um crescimento do PIB suficiente para se ultrapassar aqueles dois países?
Mas muito mais importante: estar-se-á em circunstância de se financiar um tão
elevado crescimento quando o sector petrolífero começa a dar sinais preocupantes de
exaustão e o investimento privado estrangeiro a tornar-se negativo?59
A Mini-Idade de Ouro do Crescimento em Angola
55
World Bank - World Development Indicators, 2011.
56
Admitindo-se crescimento zero para África do Sul e Nigéria durante este período.
57
International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring, August 2012.
58
World Bank - World Development Indicators, 2011.
59
CNUCED – World Investment Report 2012.
81
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
O período compreendido entre 2002 e 2008 foi o de mais elevadas taxas reais de
crescimento do PIB no país. O clima interno envolvente facilitou-o e o enquadramento
externo foi do melhor desde a independência:

Resolução do conflito militar depois de 27 anos de guerra
(provavelmente a de maior duração em África).

Primeiros resultados positivos de um programa de estabilização
macroeconómica concebido pela equipa económica do Governo
depois de 1999 (a taxa de inflação, no início da nova política de
recuperação dos equilíbrios macroeconómicos fundamentais, era
de 105,6% e em 2008 estabeleceu-se em 13,2%). Estes sucessos
foram estimulados e ajudados pela excelente conjuntura das
receitas fiscais (4,5 mil milhões de dólares em 2002 e 42,4 mil
milhões de dólares em 2008).

A economia mundial encontrava-se numa fase de rápido
crescimento, não apenas do lado das economias mais
desenvolvidas, como, sobretudo, das economias emergentes,
como a China, a Índia, o Brasil, a Coreia, a Rússia e a Índia.
FONTE: IMF – World Economic Outlook, April 2012

O preço do petróleo – o regulador dos financiamentos e
investimentos internos – apresentou um comportamento
sempre ascendente ao longo do período, tendo atingido, em
2008, o valor de 93,7 dólares o barril. O preço médio entre 2002
e 2008 foi de 52,6 dólares o barril.
82
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
Ainda que a actuação do Governo tivesse sido consequente com as novas condições
políticas e solicitações económico-sociais, dir-se-ia que o crescimento tinha
naturalmente de acontecer. A instabilidade militar sempre foi o pior cenário para as
economias crescerem, porque aumenta a incerteza e o risco dos investimentos
públicos e privados, constrange a livre circulação dos factores de produção e das
mercadorias, diminui a performance das empresas e das instituições do Estado e
influencia negativamente os índices de produtividade dos factores. Por outro lado,
numa economia tão dependente do mercado internacional de petróleo, a sua boa
performance, no período em referência, ajudou a alavancar financeiramente os
projectos de investimento público e a estimular os investimentos privados.
Pondo momentaneamente de lado considerações sobre a efectiva e real capacidade
de absorção da economia nacional, a questão está em se saber se todo o potencial
financeiro propiciado pelas receitas do petróleo foi, na verdade, usado em benefício
do sistema económico e do sistema social60.
Neste período, Angola foi identificada como uma das economias de maior crescimento
no mundo, passando a ser um dos países mais procurados pelos investimentos
privados.
FONTE: Balanços dos Programas de Governo e Relatórios Económicos do CEIC.
Entre 2002 e 2008 a taxa média anual de cariação do PIB foi de 14,9% e se for excluído
2003 a taxa média anual atingiu a cifra de 17,2%. A taxa de 5,3% registada em 2003
ficou a dever-se, por um lado, ao elevado peso do sector do petróleo na economia
60
Através de que processos se acumularam as extraordinárias fortunas da elite política e quais foram as fontes
usadas para tal.
83
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(50,5%) e, por outro, à quebra do ritmo de crescimento da produção petrolífera em
relação ao ano precedente (de 20,8% para -2,2%)61.
O extraordinário clima enquadrante da nova economia em Angola propiciou aumentos
consideráveis das receitas fiscais, pela via dos impostos petrolíferos, com um aumento
de mais de 53% na sua representatividade relativa no PIB. Os recebimentos fiscais não
petrolíferos não foram além de 8-9% do PIB.
Por outro lado, a percentagem média dos rendimentos governamentais no nível geral
da actividade económica foi de quase 43%, numa progressão anual sempre crescente.
FONTE: International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post
Program Monitoring, August 2012.
Em 2008 ocorreu um aumento inusitado das despesas públicas, afastando o respectivo
rácio dum valor estável abaixo dos 38% registado entre 2003 e 2007. Como
consequência, aumentou o rácio do défice fiscal do Estado (-5,6% do PIB), mesmo
antes da crise financeira e económica mundial do ano seguinte, quando o saldo
negativo das contas públicas se aproximou dos 10% do total da actividade económica.
61
Do que resultou uma contribuição de – 1,7 pontos percentuais para a taxa global de variação do PIB.
84
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FONTE: International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post
Program Monitoring, August 2012.
Foi graças a estas folgas orçamentais que se deu início ao importante programa de
reinfraestruturação do país, com um investimento público acumulado no período de
28,6 mil milhões de dólares.
A intensidade do crescimento económico, a relativa consolidação das finanças públicas
e a estabilização dos agregados macromonetários – cujo processo, conforme se disse,
se iniciou em 1999 – e a evolução positiva do stock de reservas internacionais
melhoraram a imagem externa de um país que necessitou de 27 nos para pôr fim ao
desperdício de recursos ocasionado pela guerra civil. A consequência, natural e quase
imediata, foi o afluxo de investimento estrangeiro directo e o acesso ao financiamento
internacional, veiculado pelas linhas de crédito.
SALDO (ENTRADA E SAÍDA) DE FLUXOS DE INVESTIMENTO ESTRANGEIRO DIRECTO EM ANGOLA
Milhões de dólares
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
1672
3505
1449
-1304
-38
-893
1679
FONTE: World Investment Report 2012.
Desafios do futuro e o Crescimento Sustentado (Angola 2012-2017)
O crescimento foi desde sempre um dos temas de investigação mais cativantes das
ciências económicas. Este fascínio provém das diversas expectativas sociais
projectadas neste conceito. Ou seja, sem crescimento aparentemente mais nada pode
85
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acontecer: nem emprego, nem distribuição de renda, nem melhoria das condições de
vida.
Seja qual for a perspectiva de abordagem, o crescimento refere-se antes de tudo à
evolução da produção62. Até à Revolução Industrial o crescimento era principalmente
referenciado à produção agrícola, constituíndo, portanto, um indicador da capacidade
de sobrevivência em função de um ciclo natural de boas e más colheitas.
O crescimento por habitante ainda serve para comparar os países em termos de nível
de vida, jogando o factor demográfico o papel de ponderador da evolução da
produção. No entanto, outros indicadores são hoje muito mais expressivos para se
entender em que estádio de evolução se encontram os países. E um deles é o
desenvolvimento – muito mais vasto que crescimento – ao incluir, não apenas,
aspectos relacionados com com a distribuição dos rendimentos e da riqueza, como,
igualmente, diferenças culturais e padrões de valores.
São conhecidas divergências em relação aos meios e às políticas mais adequadas para
alimentar um processo de crescimento. De um lado, insiste-se no investimento em
capital, enquanto do outro se salienta a importância da inovação e do progresso
tecnológico em geral. Ao estabelecer-se uma relação entre entre capital e trabalho
obtém-se um indicador prático para exprimir a intensidade capitalística da produção
(K/L). Com o tempo, quanto maior o valor desta relação, mais elevada a quantidade de
capital por trabalhador, presumindo-se, em decorrência, que a produção se torna
progressivamente intensa em capital. Ou seja, a reserva de capital cresce mais
rapidamente do que a de trabalho. Finalmente, estabelece-se uma relação positiva
entre a produção por trabalhador (Q/L) e quantidade de capital por trabalhador (K/L),
alavancando-se o crescimento. O progresso tecnológico existe quando, com a mesma
quantidade de K/L, se consegue aumentar a produção.
O crescimento sustentado está relacionado com o crescimento dado na perspectiva
anterior (aumento sistemático da quantidade de bens e serviços produzidos
anualmente) e com a preservação do ambiente e utilização racional dos recursos
naturais (renováveis e não renováveis). Pretende-se, em última análise, deixar às
gerações vindouras o que se recebeu das anteriores, retirando-se da sua utilização
benefícios individuais e colectivos presentes. Quando um país apresenta uma
sequência temporal relativamente longa de taxas de crescimento do PIB de um certo
valor, então pode afirmar-se que do ponto de vista estritamente quantitativo a rota da
62
Lewis, Arthur W. – La Théorie de La Croissance Économique, Payot, 1971.
86
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sustentabilidade pode ter condições de se afirmar63. A China há mais de três décadas
que vem crescendo a mais de 10% ao ano (duplicação do PIB a cada ciclo de 7 anos e
meio) e o Botswana cresceu entre 1980 e 2008 a uma cadência anual de mais de 8%
(duplicação do PIB em cada 9 anos)64.
O desenvolvimento e a distribuição dos rendimentos e da riqueza foi primeiramente
tratado por Simon Kuznets, na sequência de uma série de observações sobre a
evolução das desigualdades sociais nos Estados Unidos65. Estes estudos culminaram
com a construção de uma figura geométrica denominada Curva de Kuznets: à medida
que o crescimento económico ocorre desenha-se uma tendência para a diminuição das
disparidades na distribuição de rendimentos e riqueza. Nas fases iniciais, a curva de
Kuznets aponta para um agravamento destas desigualdades (são os mais ricos quem
primeiro beneficiam do crescimento), mas à medida que o crescimento se torna mais
extensivo (envolvendo mais sectores e regiões) e mais inclusivo (abrangendo mais
pessoas, mais emprego e mais factores nacionais), o efeito contágio (também
denominado “efeito escoamento” ou “spillover effect”) aparece. Graficamente, esta
curva apresenta-se como uma relação entre o coeficiente de Gini e o valor do PIB por
habitante.
CURVA DE KUZNETS DAS DISPARIDADES SOCIAIS
63
Existem outras condições necessárias para isso, como por exemplo, a quantidade de capital físico por habitante, o
capital humano, crescimento e diversificação das exportações (Joseph Stiglitz et all. – Principes d’Économie
Moderne, troisiéme édition, Ouvertures Économiques, Groupe De Boeck, 2011).
64
Joseph Stiglitz et all. – Principes d’Économie Moderne, troisiéme édition, Ouvertures Économiques, Groupe De
Boeck, 2011.
65
Kuznets, Simon – Economic Growth and Income Inequality, American Economic Review, nº49, 1955.
87
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No entanto, a relação entre as desigualdades sociais e o crescimento económico
continua a ser muito contestada, nomeadamente nos países em desenvolvimento66. As
evidências empíricas têm demonstrado existir uma relação estreita e inversa entre
democracia e disparidades sociais (mais democracia e menos desigualdades). Nas
sociedades politicamente autoritárias, com baixos índices de transparência e altos
níveis de corrupção (em particular das elites políticas) as disparidades sociais tendem a
agravar-se mesmo com a subida do rendimento por habitante propiciada pelo
crescimento económico. Cabo Verde e Botswana são verdadeiros casos de estudo
neste domínio da redução das disparidades sociais através de mais crescimento, mais
democracia, mais transparência e menos corrupção. O coeficiente de Gini varia entre
0,45 e 0,47 para Cabo Verde e entre 0,39 e 0,42 para o Botswana e o índice de
democracia é de 7,92 e 7,63 respectivamente67. As Maurícias, com um índice de Gini
de 0,3868, são classificadas no índice de democracia como uma democracia plena,
respeitadora dos valores da transparência e da boa governação69. A África do Sul temse aproximado do funcionamento pleno da sua democracia, mas apresenta, por
enquanto, valores ainda elevados do Índice de Gini, explicados, em parte, pelas
elevadas taxas de desemprego, em todas as faixas etárias.
66
Os Estados Unidos da América são, do ponto de vista histórico, o país-exemplo da curva de Kuznets. No entanto,
os mais críticos desta relação entre crescimento económico e redução das desigualdades rejeitam a sua
generalização, afirmando a sua especificidade em relação a alguns países e em determinadas condições (Beat
Burgenmeir – A Economia do Desenvolvimento Sustentável, Instituto Piaget, 2005).
67
Democracy Index 2011, Economist Intelligence Unit.
68
UNDP – Africa Human Development Report 2012. Angola, numa média para 2000-2010, apresentava um índice de
Gini de 0,59.
69
Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca aparecem como democracias plenas, com baixos coeficientes de
disparidade social (0,26) e elevados indicadores de transparência e boa governação.
88
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De que modo se coloca a questão da sustentabilidade do crescimento económico em
Angola? Apesar das reservas levantadas sobre a validade universal da curva de
Kuznets, tem-se verificado ou não uma atenuação das desigualdades sociais com o
crescimento económico? Não existem estudos sobre esta matéria, mas é seguro que a
falta de transparência e a generalizada corrupção têm limitado uma maior extensão do
efeito contágio do crescimento económico, tal como no início destas reflexões
coloquei.
A base da análise da economia nacional, deste ponto de vista da sustentabilidade do
seu crescimento, tem como suporte estatístico o Relatório do Fundo Monetário
Internacional intitulado “Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program
Monitoring” de Agosto de 2012. O período de avaliação é de 18 anos, entre 2000 e
2017.
As linhas tendenciais de evolução do PIB entre 2000 e 2017
Quais têm sido as rotas do crescimento económico de longo prazo? Entre 2000 e 2011
a taxa média anual de crescimento do PIB foi de praticamente 10%. Adicionando o
período 2012 a 2017 verifica-se que a recta de tendência de longo prazo se estabelece
em torno de 8,5%. A perda de dinâmica de crescimento da economia nacional é, assim,
evidente. O gráfico seguinte é elucidativo.
FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de Agosto
de 2012.
Vale a pena segmentar o período longo 2000-2017 em diferentes subperíodos, para se
aquilatar melhor da quebra dos ritmos médios de crescimento do PIB.
89
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FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de Agosto
de 2012.
A influência da crise financeira e económica internacional 2008/2009 sobre a
capacidade de crescimento a longo prazo está bem patente no sub-perído 2009/2011.
No entanto, já em 2008 tinha ocorrido uma quebra de 38,8% na taxa de crescimento
face a 2007.
Desdobrando a economia nos dois sectores correntemente considerados para efeitos
de análise, verificam-se dois comportamentos distintos:

O PIB petrolífero mostra-se muito atreito às variações
internacionais do mercado, em termos de preços e de
quantidades.
90
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Um comportamento relativamente caótico, sem uma tendência
claramente definida de variação, a atestar a dependência deste
sector de actividade e o carácter aleatório das receitas que gera.

Uma redução da capacidade de crescimento do sector não
petrolífero, denunciando, talvez, que o efeito construção e obras
públicas começou a esbater-se (esgotar-se?) depois de 2007 e a
crise financeira mundial de 2008/2009 acentuou a tendência
regressiva do PIB não petrolífero. Novas folgas e capacidades de
crescimento devem ser encontradas na agricultura e na indústria
transformadora.
91
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FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program
Monitoring” de Agosto de 2012.
O mercado interno não tem, por enquanto, dimensão suficiente
para alavancar a diversificação, donde ser nas exportações
transaccionáveis não petrolíferas que devem ser encontradas as
bases para a redução desta dependência sectorial. Mas para isso
é essencial produtividade, desburocracia, boa governação,
transparência, …, numa palavra, a longo prazo a competitividade
deve estar na qualidade dos produtos a exportar e numa rede de
empresas com real e efectiva capacidade exportadora,
significando habilidade e competência para se fidelizarem os
clientes externos.
É, sobretudo, a partir de 2011 que aparecem as tendências para uma menor
capacidade de crescimento da economia nacional. A incerteza quanto à eminência de
uma nova crise internacional, a situação de descontrolo financeiro na Europa da
moeda única, uma provável retracção nos fluxos de investimento privado estrangeiro,
uma redução na produção de petróleo e a prevalência de estrangulamentos a um
funcionamento mais eficiente e competitivo da actividade económica podem ajudar a
compreender a estabilização da taxa de crescimento do PIB na vizinhança de 5%, do
PIB petrolífero abaixo de 3% e a da economia não petrolífera em redor de 6%.
FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de
Agosto de 2012.
92
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A redução da taxa de pobreza em 50%, de acordo com os Objectivos de
Desenvolvimento do Milénio para 2015, exige uma taxa de crescimento do PIB de
cerca de 7,5% ao ano, para além de políticas de redistribuição da renda mais
extensivas, inclusivas e impactantes sobre as condições de vida da população.
O comportamento tendencial do PIB por habitante
Do ponto de vista das condições de vida da população o indicador utilizado nesta
minha reflexão é o PIB por habitante, na ausência do coeficiente de Gini (numa
perspectiva temporal) e de outros indicadores relacionados com as disparidades
sociais.
É evidente que a evolução deste indicador não aponta, necessariamente, para uma
melhoria na repartição do rendimento nacional, nem, tão pouco, para um benefício
nas condições gerais de vida da população. Para além de políticas adrede
direccionadas para a intervenção do Estado nos mecanismos, ex-ante e ex-post, de
repartição do rendimento nacional, tem de haver vontade política de actuar sobre os
esquemas que favorecem as eleites (políticas e empresariais) no acesso às
oportunidades e às fontes de enriquecimento. Distribuir melhor não depende apenas
do crescimento económico, pois, como ficou assinalado, desenvolvimento e progresso
social têm outros ingredientes que os diferenciam do simples crescimento.
FONTE: IMF, op.cit.
O valor do PIB por habitante tem subido ao longo do tempo (2000-2008), tendo
passado de 635 dólares para 4671 dólares. Se este rendimento fosse igualmente
distribuído (coeficiente de Gini igual a zero), caberia a cada angolano um rendimento
93
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diário de 12,8 dólares, incompatível com a garantia de um conjunto básico de
condições dignas de vida.
Os incrementos anuais registados na linha tendencial de variação do PIB por habitante
apontam para ganhos marginais anuais negativos depois de 2009, explicados, entre
2008 e 2009, pelos choques advenientes da crise internacional e entre 2011 e 2017
pela menor capacidade de crescimento da economia, para uma variação mais ou
menos constante do factor demográfico.
A melhor distribuição da renda nacional, ainda que possa acontecer – embora as
actuais desigualdades sejam de tal maneira profundas que só algumas décadas
poderão ajudar a mitigá-las, havendo vontade política para isso – acabará por revelarse através de incrementos marginais quase insignificantes na melhoria das condições
de vida da população. Não sendo alterados os canais de acesso à renda petrolífera e
diamantífera – enquanto existirem na dimensão presente – dificilmente se poderão
tornar mais inclusivos os benefícios do crescimento económico.
De resto, até 2017 não se conseguirá reduzir a estrutura de dependência do
rendimento médio por habitante da renda petrolífera, dada a débil força muscular do
sector não petrolífero, conforme se mostrou anteriormente. Ou seja: as expectativas
de crescimento do PIB por habitante entre 2011 e 2017 são fracas e,
consequentemente, menor a capacidade da economia distribuir mais.
94
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O gráfico anterior mostra justamente que depois de 2011 e até 2017 – período
durante o qual se esperam variações anuais baixas nos preços do barril do petróleo e
na respectiva produção – os incrementos anuais de rendimento médio por habitante
rondarão apenas 200 dólares por ano.
Mas a questão não está tão-somente na míngua de rendimento para distribuir. O
actual sistema de redistribuição da renda nacional está estruturado em redor duma
minoria de cidadãos e o seu funcionamento articula-se em torno de regras opacas
baseadas numa rede de conhecimentos e de influências difícil de penetrar 70. Não há,
portanto, garantias de que a maior fatia do incremento anual de 200 dólares não seja
captada pela franja dos mais ricos.
A probabilidade do estado estacionário de Solow
Foi Robert Solow quem primeiro se debruçou sobre a ocorrência do “estado
estacionário” no processo de crescimento económico71. O estado estacionário
corresponde ao ponto onde o montante de capital por trabalhador permanece
constante. Este ponto corresponde à igualdade sy = (n+d)k, onde s – taxa de
poupança/investimento, y – taxa de crescimento do PIB, d – taxa de depreciação do
70
Apesar de não existirem estimativas e estudos sobre a real dimensão do efeito escoamento (“spillover effect”),
pode presumir-se pela sua relativa reduzida expressão, justamente devido à natureza do sistema nacional de
distribuição e redistribuição do rendimento nacional.
71
Solow, Robert – A Contribution to the Theory of Economic Growth, Quarterly Journal of Economics 70 February,
1956.
95
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capital físico, n – taxa natural de crescimento demográfico e k – rácio capital por
trabalhador. O estado estacionário não significa não crescimento, mas apenas, por
razões várias, uma situação em que a taxa de variação real do PIB não consegue cobrir
a taxa de variação demográfica e a depreciação do capital físico por trabalhador. À
direita desse ponto, o montante de investimento suprido pela economia é menor do
que o necessário para manter constante a razão capital-trabalho inicial72.
Explicado de outro modo: no estado estacionário ou equilíbrio de longo prazo,
produto, capital e população crescem a taxas iguais, donde não ocorrer
desenvolvimento económico medido pela taxa de crescimento do rendimento médio
por habitante73.
Simplificando a equação anterior pela sua redução ao crescimento do PIB e da
população – não se dispõem de dados sobre o stock de capital fixo, a taxa de
depreciação, a taxa de investimento e a taxa de poupança – a probabilidade do estado
estacionário em Angola pode ser vista no gráfico seguinte74.
FONTE: IMF, op.cit.
Considerando-se uma taxa de depreciação do capital fixo da economia de 5% (vida útil
de cerca de 20 anos dos equipamentos e infraestruturas económicas e sociais) concluise pela clara insuficiência de crescimento económico para renovar activos físicos e
72
Jones, Charles I. – Introduction to Economic Growth, W.W. Norton & Company, 1998.
73
Graça, Job – Economia do Desenvolvimento (Sebenta das Lições da UCAN), INIC, 2012.
74
Estranhamente as informações do FMI existentes no documento de base utilizado para esta reflexão referem
uma taxa de crescimento da população de 4,4% em 2017.
96
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população e manter a economia numa rota adequada de melhoria do rendimento
médio por habitante.
Para além de políticas tendentes a aumentar a capacidade de crescimento da
economia – das quais os pólos industriais e regionais e as zonas económicas especiais
podem ser um exemplo – surge a necessidade de se reflectir sobre as políticas
demográficas.
Um cálculo aproximado à rendibilidade dos investimentos públicos
Aparentemente, os investimentos públicos têm funcionado como uma das alavancas
do crescimento económico do país, tendo-se investido entre 2000 e 2011 a fantástica
soma de 56,1 mil milhões de dólares (4,7 mil milhões por ano). Em quanto estas
aplicações de capital têm, na realidade, contribuído para os incrementos do PIB ainda
está por calcular.
No entanto, uma aproximação pode ser tentada através do coeficiente marginal de
capital do investimento público.
FONTE: IMF, op.cit.
A rendibilidade dos investimentos públicos, medida pelo coeficiente marginal de
capital75, é baixa, provavelmente devido a:
75

Deficiente programação.

Fraca fiscalização.
Coeficiente marginal de capital: uma unidade de capital gera x unidades de produto.
97
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
Ausência de estudos de viabilidade.

Incumprimento dos preceitos legais da contratação pública.

Corrupção.

Generalizada baixa qualidade das obras públicas (num ciclo infernal de
construção/deficiências/reconstrução que eleva os custos das obras, sem
contrapartidas económicas).

Demora/atrasos substanciais no cumprimento dos prazos de entrega das
obras.

Adjudicações políticas e por tráfico de influências.
Excepção feita aos investimentos petrolíferos (cuja rendibilidade é bem mais elevada,
mesmo levando em conta as imobilizações financeiras na prospecção, estudos e
desenvolvimento), todos os restantes não devem ser portadores de taxas de
rendibilidade muito superiores às dos investimentos do Estado, donde não
surpreender o reduzido índice de competitividade da economia angolana.
FONTE: IMF, op.cit.
Graças ao programa de re-infraestruração levado a cabo pelo Governo, a capitação do
investimento público passou de 39 dólares em 2000 para 460 dólares em 2011.
Abstraíndo-se da qualidade das obras e respectiva durabilidade – normalmente uma
obra pública, respeitando padrões de qualidade normais e ciclos de conservação e
manutenção consentâneos, não pode durar menos de 20 anos, de modo a assegurar
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retrono macroeconómico e microeconómico e utilidade social – os valores do gráfico
sinalizam uma melhoria das condições gerais de vida da população.
Atendendo às projecções do Fundo Monetário Internacional, entre 2012 e 2017 o
Estado deverá investir 84,7 mil milhões de dólares, num acumulado 2000-2017 de
140,8 mil milhões de dólares. Ou seja, vai investir-se mais em menos anos
(investimento anual médio de 4,7 mil milhões para 2000/2011 e de 14,1 mil milhões
para 2012/2017).
Haverá capacidade de programação, avaliação, controlo e fiscalização?
Notas Finais
 Depois de um período dourado de crescimento, com taxas médias anuais entre
15% e 17%, o horizonte 2017 pode alterar bastante as expectativas sobre a
capacidade de crescimento do país.
 Entre 2012 e 2017 está projectada uma taxa média anual de crescimento de
5,5%, mais de 3 vezes inferior à do período 2002/2008. Enquanto as primeiras
propiciaram uma duplicação do PIB em 5 anos, a última apenas consentirá essa
multiplicação em 13,5 anos.
 Ainda que exista real vontade política em o fazer, a melhoria na distribuição do
rendimento pode estar limitada pela menor capacidade de crescimento da
economia. Isto não invalida, no entanto, que se possa evitar uma maior
concentração da riqueza em poucas pessoas e se opere uma substancial
transferência de rendimentos de quem tem para quem não tem.
 Os incrementos anuais do PIB por habitante entre 2012 e 2017 serão
marginalmente pouco expressivos, em média à volta de 200 dólares por ano.
Este panorama não é bom para a melhoria dos rendimentos médios da maioria
da população, nem para a alteração das suas actuais condições de vida.
 Pode estar a aproximar-se o estado estacionário da economia nacional, na
acepção de Solow. Significa dizer não haverem condições para o aumento do
rendimento médio por habitante, com consequências negativas sobre a
distribuição do rendimento e a melhoria das condições de vida dos cidadãos.
Porém, pode haver tempo para se operacionalizarem políticas de inversão
desta tendência e os investimentos públicos podem ser um dos instrumentos.
Necessita-se de vontade política para reverter os esquemas actuais de acesso à
renda.
99
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 Porém, se a rendibilidade das aplicações de capital do Estado nas
infraestruturas não melhorar significativamente, os efeitos sobre o aumento da
intensidade de crescimento não se verificarão numa dimensão conveniente.
 A capacidade de crescimento do sector não petrolífero – o alfobre da
diversificação da economia – estará reduzida a uma taxa média anual de cerca
de 6%. Manifestamente insuficiente face aos desafios da diversificação,
melhoria das condições de ida, estruturação mercado interno e da redução do
peso do petrolífero.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (listadas à medida da sua indicação no texto)
World Bank – World Development Indicators 2011.
International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post Program
Monitoring, August 2012.
CNUCED – World Investment Report 2012.
Lewis, Arthur W. – La Théorie de la Croissance Économique, Payot 1971.
Stiglitz, Joseph et all. – Principes d’Économie Moderne, 3ª Édition, Ouvertures
Économiques, Groupe De Boeck 2011.
Kuznets, Simon – Economic Growth and Income Inequality, American Economic
Review, 49, 1955.
Economist Intelligence Unit – Democracy Index 2011.
United Nations Development Program – Africa Human Development Report 2012.
Burgenmeir, Beat – A Economia do Desenvolvimento Sustentável, Instituto Piaget
2005.
Solow, Robert – A Contribution to the Theory of Economic Growth, Quarterly Journal
of Economics 70, February 1956.
Jones, Charles I. - Introduction to Economic Growth, W.W. Norton & Company, 1998.
Graça, Job – Economia do Desenvolvimento (Sebenta das Lições da UCAN), INIC, 2012.
101
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Les limites du capitalisme
Penser la crise du néolibéralisme et les failles de la pensée
économique avec Karl Polanyi -76
Jérôme Maucourant
Université de Lyon (Université Jean Monnet), UMR 5206 Triangle, France.
Il est une notion étrangère au monde construit par le capitalisme, celle de limite.
Aristote avait déjà fort bien compris que le principe d’autovalorisation de l’argent
impliquait une vie déréglée, asservie à des besoins multiples, antagonique de la vie
bonne reposant sur des besoins limités77. Ce que de grands Anciens comprenaient ainsi
comme une pathologie sociale est devenu, notamment au XVIIIième siècle, avec des
auteurs comme Mandeville ou Smith, la vertu d’un monde nouveau : que chacun
s’adonne à sa soif de profit, à son envie de jouissance privée, et il adviendra un univers
de marchands pacifiques, qui est le meilleur des mondes possibles et qui bien éloigné
des temps jadis, dans lesquels la violence et la politique jouaient un rôle essentiel.
Certes, les premiers narrateurs de la fable libérale, celle de l’autorégulation
économique de la société, semblent faire bien peu de cas des pauvres dont les corps
doivent être exploités sans borne et la dignité bafouée pour que se développe la
logique du profit. Mais, ce que nous analysons comme une inhumanité propre à ce
processus de prolétarisation est conçu alors comme la moins mauvaise façon de
résoudre la question du paupérisme qui hante l’Europe, dès le début des formes
agraires du capitalisme.
Nous retrouvons ici la manière typique à Polanyi d’interpréter l’histoire économique
et sociale. Une thèse majeure de son maître ouvrage, La Grande Transformation, n’est
autre que la description des effets pervers tenant à la dynamique même du
capitalisme libéral, machine sans limite pouvant engendrer le fascisme. Nous voulons
76
Ce texte est un extrait remanié de la postface du livre suivant : Avez-vous lu Polanyi ?, Flammarion, Paris, 2011. Il
existe une traduction en espagnol : Descubrir a Polanyi, Barcelone, traduit par José Miguel González Marcén,
Edicions Bellaterra, 2006.
77
Aristote, La Politique, I, 8 et 9. Si l’« appétit de vivre » est certainement « illimité », comme le sont les moyens de
le satisfaire, précise Aristote, il convient de ne pas oublier, selon lui, que vivre n’est pas bien vivre.
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maintenant, à la lumière des enseignements de Polanyi, tenter d’éclairer le capitalisme
néolibéral comme forme nouvelle de cette machine sociale, qui, depuis trois décennies
s’est constitué sur les ruines des compromis sociaux qui avaient fondé le monde
d’après la Grande Transformation, c’est-à-dire ce demi-siècle qui commence avec la
crise des années 1930. Quel est, en 2011, le trait saillant de ce monde ? C’est dans le
pays frappé par l’atome militaire, le Japon, que la soif de profit a permis que l’on
construisît des centrales nucléaires sur des failles sismiques. Le drame japonais ouvre
ainsi le monde d’après : il n’est plus possible d’occulter la propension du capitalisme à
nier la vie. Peut-être que 2011 sera l’équivalent de ce que fut 1986, pour le système
soviétique de domination : Tchernobyl a signé le début de sa fin.
Ce monde d’après, ce monde de la révélation de notre devenir catastrophique, était
pourtant annoncé, entre autres, par la première grande crise du XXI ième siècle : 2008
a signé la démesure de l’esprit capitaliste qui, dans sa forme financière et mondialisée,
n’a trouvé de limite que dans l’effondrement. Sans l’intervention massive des Etats,
dont les néolibéraux ne cessaient de regretter l’excessive importance, les
conséquences humaines et économiques auraient été bien pires qu’en 1929, comme
beaucoup s’accordent à le reconnaître. Et, maintenant, l’accroissement des dettes
publiques exprime, pour une bonne part, ce qu’il faut payer comme prix des errances
de la finance et de la cupidité des intérêts dominants.
Néanmoins, il ne manquait pas de consciences critiques pour mettre en garde contre
les conséquences désastreuses de la renaissance, il y a trois décennies, d’un projet
libéral à hauteur du monde. Les réflexions, qui commençaient à intégrer la
problématique de Polanyi, participaient à cette vigilance. À ce moment, l’URSS quittait
la scène et la Chine acceptait de s’intégrer dans ce qu’on dénommera « globalisation ».
Polanyi, qui fut un critique de la première société de marché, celle qui meurt entre
1918 et 1933, offre une perspective78 toujours féconde pour comprendre la
signification de la deuxième, qui naît au début des années 1980. Ainsi, nous
discuterons d’abord de la crise actuelle selon un point de vue inspiré par Polanyi ; nous
évoquerons, ensuite, une approche institutionnelle concurrente ; nous conclurons à un
nécessaire retour à l’historicité dans le monde d’après.
La seconde crise de la société de marché
Polanyi, dans La Grande Transformation, dénonce, très explicitement le caractère
utopique de la « société de marché ». Pas d’économie de marché cohérente sans
« société de marché », c’est-à-dire sans des institutions et une idéologie particulières.
78
Il nous semble que l’intérêt du travail de Polanyi soit à chercher d’abord à ce niveau général. Cf. G. Dale, Karl
Polanyi – The Limits of the Market, Polity Press, 2010.
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La société de marché contient donc un idéal performatif79 : les mots participent de la
construction des choses. C’est là, sans doute, une spécificité de Polanyi par rapport à
Marx, voire une différence. Mais, il n’y a rien, ici, des fausses oppositions construites à
l’époque de la crise du marxisme80, durant les années 1980, à un moment où Polanyi
était utilisé par d’anciens marxistes mélancoliques en quête d’une critique
radicalement alternative. L’idée, typiquement polanyienne, du capitalisme comme
utopie a une conséquence de taille : nombre de traits du système économique
relèvent de la contingence, c’est-à-dire du politique, et non pas d’une pure nécessité,
qu’il faudrait chercher dans l’état des techniques ou des exigences économiques. Il ne
s’agit pas de nier les déterminations, qui pèsent sur les formes sociales, mais de rejeter
le déterminisme techno-économique faisant du capitalisme libéral et mondialisé une
nécessité. La politique et la culture ont donc leur place dans l’invention d’autres
sociétés.
Les néolibéraux sont, d’ailleurs, si persuadés que nous aurions trouvé la clef du
meilleur des mondes, dans ces années 1990, qu’ils prétendent que les maux
économiques de notre temps seraient le fruit d’un manquement à la pleine logique
capitaliste : ils dénoncent l’obsession du plein emploi qui aurait politisé le
capitalisme81. Nos néolibéraux raisonnent comme si les politiques d’argent bon
marché et la prolifération de la dette ne s’inscrivaient pas dans une nécessité qui
s’impose à l’élite : conserver un taux de croissance suffisant, qui est la condition de
possibilité de cette mondialisation inégalitaire dont se nourrit sa domination. C’est ce
point essentiel que nous voulons démontrer, qui implique que, si les Etats-Unis avaient
tranché en faveur d’une protection sociale digne de leur puissance, et renoncer aux
facilités de la finance et du « libre-échange », cette folie du crédit n’aurait pas été
nécessaire.
Une des raisons actuelles qui a contraint à l’inflation de la dette, via des inégalités
croissantes, est le libre-échange : celui-ci, notamment aux Etats-Unis, est porteur de
déflation salariale, ce qui va à l’encontre de l’opinio communis des vingt dernières
années. Les fameux excédents chinois, contrepartie comptable d’une partie du déficit
commercial américain, ne font qu’exprimer un mode d’accumulation désindustrialisant
et financiarisé. La croissance américaine d’avant crise doit donc beaucoup aux
79
Voir N. Brisset, « Une lecture performativiste de Karl Polanyi », XIIIième Colloque Charles Gide, 2010 et S.
Plocinizcak, « Au-delà d’une certaine lecture standard de la Grande Transformation », La Revue du MAUSS, n° 29,
2007.
80
La conception de l’échange comme « forme d’intégration » provient du chapitre premier du Capital : M. Cangiani,
« Karl Polanyi : une voix du siècle passé ? », Revue du MAUSS, 2, n° 34, p. 2009, pp. 336-348.
81
Souvenons-nous, d’ailleurs, que les libéraux des années 1930 avait déjà pointé, dans le laxisme monétaire,
l’origine de la crise de 1929.
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« progrès » des techniques de la finance, occultant à court terme les conséquences
d’un endettement excessif, et à la mondialisation, qui a permis de compenser, par la
baisse des prix relatifs de certains biens importés, la tendance à la baisse de la
demande, elle-même résultat inéluctable d’une redistribution des gains de
productivité à une très mince couche sociale.
Les discours orthodoxes, souvent aussi hypocrites que rétrospectifs, fustigeant les
mauvaises pratiques financières, masquent que celles-ci sont une composante décisive
de cette mondialisation dont ils se font les chantres. Sans disséminer ses dettes dans le
monde, sans rendre liquides ses créances, le capitalisme bancaire américain n’aurait
pas pu développer son activité de prêt avec l’énergie qu’on sait. Sans ce marché
financier si attractif parce qu’inventif, les Etats-Unis n’auraient pas bénéficié de toute
l’épargne du monde, et jamais la croissance mondiale n’eût été suffisante, dans ce
système-monde polarisé autour de l’étalon-dollar. Comment peut-on dénoncer
sérieusement l’« aveuglement » supposé de gouverneurs de banque centrale, alors
que ceux-ci ne faisaient que rendre possible la dynamique capitaliste : à un moment
critique, celle-ci nécessitait de la monnaie bon marché et des garanties étatiques au
crédit hypothécaire qui facilitaient l’endettement. Ces gouverneurs n’ont pas de
mandat pour expérimenter une stagnation économique, voire une dépression, assurés
qu’ils seraient du bon fonctionnement de la « main invisible » sur le « long terme »,
car, dans le temps de cette expérience, ce sont les fondements de la société de marché
qui auraient été ébranlés, voire détruits.
Ce sont donc bien les contraintes globales du capitalisme réellement existant et non
les « erreurs » d’un président du Federal Reserve System, jugé trop à l’écoute de la
démocratie, qui ont configuré les paramètres de la politique monétaire. Déplorer la
montée de la dette privée, comme le font les néolibéraux, en faisant comme si elle ne
s’inscrivait pas dans les nécessités du système économique des années 1990-2000,
revient à vouloir poursuivie la chimère de la société de marché sans que ne soit jamais
payé le coût de sa perpétuation82.
De ce point de vue, le schéma d’analyse que propose Polanyi pour comprendre la
Grande Crise de 1929 est utile pour saisir certaines dimensions de l’effondrement de
2008 : la société de marché ne peut fonctionner sans des dettes, qui expriment sa
82
Après avoir constaté que « la part des revenus du travail dans la richesse mondiale tend à se réduire », un ancien
expert du patronat français écrit, avant la crise de 2008, à propos de la « corporation des économistes médiatisés »,
si silencieuse à l’égard des politiques monétaires expansionnistes et acharnée à défendre sans relâche la
mondialisation : « La beauté idéologique du projet nécessite d’ensevelir la question théorique et pratique de la limite
qu’il conviendrait de poser à la capacité d’emprunt croissante des ménages occidentaux, capacité sans laquelle le
processus serait voué à s’arrêter ». Cf. J-L Gréau, La trahison des économistes, Gallimard, 2008. Voir aussi
l’important travail de l’anthropologue P. Jorion qui annonce, dès 2004, le mécanisme de la crise (La revue du MAUSS
publiant un extrait de ce livre en 2005).
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condition sociale de possibilité83, et il n’y a aucune « main invisible » permettant aux
antagonismes sociaux de se dissoudre dans l’économie. Seuls des compromis
institutionnalisés, qui construisent socialement diverses formes d’action collective et
les mécanismes de marché, peuvent stabiliser les conflits de classes et d’autres
intérêts sociaux, dans la perspective d’une vie viable. En réalité, les marchés ne
fonctionnent pas dans un vide social et culturel, sans des institutions qui sont des legs
de l’histoire et expriment des rapports de force. Toutefois, en 1929 comme en 2008,
ces institutions ne vivent pas de l’air du temps. La finance de marché contemporaine a
ainsi rendu possible une croissance, que l’inégalité de nos temps exige
structurellement, mais selon des prises croissantes de risque ; à court terme, celles-ci
ont engendré des profits privés considérables qui impliquaient, à moyen terme,
toutefois, une crise grave et une importante socialisation des coûts.
L’école néoinstitutionnaliste a-t-elle relevé le défi de Polanyi ?
Ce constat sévère mais réaliste, que nous suggérons pour le capitalisme en début du
XXIième siècle, n’est hélas pas possible dans le cadre de l’économie orthodoxe84, dont
la cécité vis-à-vis des mécanismes de la crise est remarquable85. L’analyse d’un courant
important de la pensée dominante, le « néo-institutionnalisme », qui aime à croire
qu’il peut intégrer et dépasser les analyses de Polanyi, est, en réalité, elle aussi, d’une
cécité étonnante vis-à-vis du monde réel : la raison provient, essentiellement, de ses
tendances à l’apologie implicite du capitalisme américain.
Dès 1977, D. North, a voulu relever le « défi » que constituaient les catégories forgées
par Polanyi. Néanmoins, le fonctionnalisme et la perspective téléologique propres à D.
North empêchaient que le néoinstitutionnalisme, notamment dans la tendance
illustrée par cet auteur, pût constituer une objection de taille à l’analyse de Polanyi86.
83
Voir K. Polanyi, « Le mécanisme de la crise économique mondiale », pp. 337-351, dans M. Cangiani, J. Maucourant
dir., Essais de Karl Polanyi, Seuil, 2008.
84
À l’inverse, l’économiste hétérodoxe doute du caractère autorégulateur du marché et de la capacité supposée
des forces de celui-ci à promouvoir efficacement et spontanément les institutions nécessaires à la reproduction
sociale. Celle-ci s’organise depuis 2009 : http://www.assoeconomiepolitique.org/
85
Il ne s’agit pas d’affirmer que la fonction de l’économiste soit de prédire la crise : on pourra objecter que
l’annonce journalière d’un effondrement a toujours quelque chance d’être confirmé par les faits …Mais, sauf à
sombrer dans l’insignifiance, la « science économique », qui se veut la reine des sciences sociales, se doit de mettre
en lumière ce à quoi nous expose le mode d’accumulation financière. Il ne s’agit pas, comme peut le soutenir une
certaine épistémologie de la physique, d’exiger des expériences ou des conjectures cruciales permettant la
réfutation d’une théorie, mais bien de demander, à une science empirique, qu’elle jette de la lumière sur les
processus et les structures de son objet, de façon à penser les modes de reproductions et de ruptures. De ce point
de vue, l’économie encore dominante est plus un discours normatif qu’une science empirique.
86
J. Maucourant, « Le néoinstitutionnalisme à l'épreuve de quelques faits historiques », Economie Appliquée (56), 3,
septembre 2003, pp. 111-131.
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Toutefois, il est vrai que l’on opposait souvent, à ce type de critiques, que le
néoinstitutionnalisme avait évolué durant ces années 1990 et que le livre de North,
paru en 2005, pouvait être considéré comme la preuve d’un « nouveau
néoinstitutionnalisme ». Dans le meilleur des cas, ces « évolutions » qui prétendent
nous éloigner encore de la théorie néoclassique tombent, finalement, dans d’autres
impasses, comme un culturalisme attardé ou la redécouverte stérile de vieux
problèmes. Bref, le défi de Polanyi n’est pas près d’être relevé par l’économie
orthodoxe, même en ses marches87.
Ainsi, North critique la « théorie néoclassique », qui fait l’impasse sur la question
essentielle de l’origine des perceptions des individus, car on ne peut supposer que
« les gens savent ce qu’ils font ». Dès que des choix complexes sont en jeu : « on ne
dispose que d’informations incomplètes, interprétées à l’aide de modèles subjectifs ».
La science économique ne devrait plus seulement être une théorie des choix, elle
devrait être aussi une théorie des « échafaudages », conçus par l’espèce humaine, qui
sont en deçà des choix. Ces échafaudages sont, en fait, assimilés au « contexte
culturel » qui « encadre les interactions humaines »88. Ce faisant, il serait possible
d’expliquer le « processus du changement économique » et de rendre compte de ce
que l’histoire économique est souvent une histoire malheureuse.
North a ainsi produit une critique des « économistes néo-classiques », naïvement
attachés à un laissez faire intégral, c’est-à-dire s’exerçant en dehors des institutions
typiques que l’Occident a développées : les difficultés de la transition vers le
capitalisme, dans la Russie des années 1990, le prouverait, selon lui, à l’envi. Des
économistes hétérodoxes ont ainsi pu croire que North avait rejoint leurs positions
…Pourtant, la critique de cette naïveté néoclassique est de relever, très simplement,
que, dans un laps de temps aussi court et compte tenu du poids du passé récent, les
bonnes institutions ne s’imposent pas si aisément et si facilement. Il est presque
surprenant que ces remarques de North, qui combinent aussi bien le simple bon sens
que la croyance discutable en la centralité du marché, aient laissé penser qu’un
changement théorique majeur se produise, actuellement, en économie. En réalité,
l’« évolution » de North n’est pas une rupture avec son économisme originel.
En aucune façon, en effet, ses travaux des années 1970 ne sont niés : il s’agit
simplement de comprendre pourquoi les « structures incitatives » à l’origine de
87
Toutefois, dans le cadre de l’approche économique, il y a eu des progrès notables, comme en témoigne cette
suggestion d’ajouter une forme d’intégration à la problématique polanyienne : M. Vahabi, « Ordres contradictoires
et coordination destructive : le malaise iranien », Revue canadienne d’études du développement (30), n° 3-4, pp.
361-392, 2009.
88
D. North, Le processus du changement économique, Editions d’organisation, 2005, p. 74.
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« l’essor du monde occidental » n’ont pas été adoptées ailleurs. Le privilège occidental
de la création de « marchés efficients »89 serait à relier à la nature des croyances
religieuses90. Il souligne que les « systèmes de croyances religieux comme le
fondamentalisme islamique ont joué et jouent un rôle majeur dans l’orientation du
développement social »91 (souligné par nous). Ainsi, le « monde islamique » n’aurait
pas élaboré des institutions permettant de favoriser les « échanges impersonnels » qui
sont des conditions nécessaires de la croissance. On pourrait, certes, ouvrir un débat
sur le rapport des différentes civilisations à leurs structures économiques, mais ce que
vise North n’est pas tant l’islam comme civilisation que comme religion. Il assène le fait
suivant, qui souligne la singularité, non pas de la différence occidentale, mais bien de la
différence chrétienne. À supposer que l’impersonnalité des échanges soit l’ingrédient
critique du développement, il n’est nulle part rigoureusement démontré par North que
la théologie musulmane eût constitué un obstacle à cet égard.
L’efficacité de la rhétorique de North tient sans doute à cette confusion, que peuvent
entretenir nos temps actuels, entre l’islam comme politique – ce fait récent qu’il
prétend ancien et qu’il qualifie de « fondamentalisme islamique » - et l’islam comme
civilisation. On pourrait avoir de bonnes raisons de penser que l’islam politique, en
tant qu’idéologie justifiant le pouvoir d’une bourgeoisie militaire, comme c’est le cas
en Iran par exemple en ce moment, peut être un facteur de cohésion d’un
« capitalisme politique » régressif, dont la logique est essentiellement rentière et dont
l’assise est un Etat néopatrimonial. Mais, dans d’autres partie du « monde
musulman », l’islam politique joue un rôle différent dans la dynamique sociale : il peut
s’agir autant d’un produit d’une crise de la modernisation qu’une raison première de
cette crise. Ce signifiant labile - « islam » - dont on ne sait trop s’il décrit une réalité
politique, culturelle ou civilisationnelle, est utilisé comme pièce d’une rhétorique
confusionniste que North dévoile en conclusion de son ouvrage : « Et l’agitation du
monde musulman (à la fois à l’intérieur de ce monde et de ses frontières), jette une
ombre épaisse sur les perspectives de l’humanité »92.
Pourtant, le rôle des Etats-Unis et de leurs guerres préventives n’aurait-il pas quelque
responsabilité décisive dans cette « agitation » qui menacerait l’humanité même ? Et,
si l’humanité est menacée, en tant que telle, n’est-ce pas plutôt en raison de
l’interaction létale entre l’écosystème et l’économie capitaliste, tant vantée par North
89
Ibid., p. 165.
90
Ibid., p. 15.
91
Ibid., p. 37. North pense que les religions expriment des « contraintes démographiques/et de ressources » propres
aux sociétés. Cf. p. 175.
92
Ibid., p. 216.
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et ses épigones, qu’en raison de dérives fascisantes observables dans certaines parties
de ce conglomérat problématique, le « monde musulman » ? Les mouvements
révolutionnaires, en Iran et dans les nations arabes, qui se développent entre 2009 et
2010 et qui ont surpris autant des dictatures proches de l’Occident que leurs supposés
ennemis – les islamistes – montrent par ailleurs que le travail de North, englué dans
ses a priori idéologiques, ne nous apprend rien du monde réel.
Il eût fallu sans doute prendre au sérieux les mots mêmes adoptés par North pour
comprendre que le néoinstitutionnalisme n’est qu’un avatar de l’ « impérialisme de
l’économie » à l’égard des autres sciences sociales. Les « économies politiques », qui
sont au cœur de son analyse du développement, ne désignent que les logiques de
l’organisation politique des sociétés ; l’« économie politique » revendiquée par les
néoinstititionnalistes est à comprendre comme l’économie du politique. Quant à
l’« efficience », elle renvoie à un état techno-économique où « le marché présente les
coûts de productions et de transaction les plus bas possibles »93 : le lien est donc total
entre « marché » et « efficience ». On comprend que ces « économistes du politique »
aient été incapables de théoriser une protection sociale efficace et peu coûteuse et
que naisse, sous leur plume, cet étonnant syntagme : le « marché économique ». Il
nous semble ainsi que North qui voulait explicitement relever le défi de Polanyi ne l’a
pas relevé : des catégories comme les « coûts de transaction » ou les « échafaudages »
n’ont pas de force explicative sérieuse, que l’on considère les problèmes économiques
actuels du « monde musulman », les difficultés de la transition postsoviétique ou la
question de l’origine du capitalisme.
Conclusion : l’empire fragile des marchandises fictives
La catastrophe nucléaire japonaise de cette année 2011 accroîtra les contraintes
pesant sur ce qui a constitué, longtemps, un facteur crucial de légitimation du
capitalisme : la croissance. Il se peut que l’idéologie économique perde de sa capacité
à organiser le réel. Dès 2008, dans le sillage de travaux nombreux, F. Neyrat nous
avertissait de ce que la notion de « risque », cœur de l’économie contemporaine, était
impuissante à appréhender les déterminations catastrophiques de notre monde, où
l’interdépendance croissante entre économie et écosystème vide de sens la notion de
« risque naturel ». Au minimum, admettons que le risque, qui compte pour l’économie
et la société, est absolument non probabilisable : ceci est le cauchemar de la science
économique encore dominante. C’est la fin de la logique assurantielle, pivot de
l’orthodoxie en économie et de nombres d’institutions économiques, laquelle peut
être masquée par une socialisation croissante des coûts privés.
93
Ibid., p. 33, n.3.
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Deux évolutions sont possibles. Nous pouvons persévérer dans la logique létale de la
société de marché ou de ses fausses alternatives, que sont les « capitalismes
politiques » à la chinoise ou à l’iranienne. Nous devons d’ailleurs être conscients que la
célébration de l’identité, via une habile mobilisation des mécanismes de réciprocité,
peut être un avantage pour assurer la perpétuation de la société de marché. Si la
revendication de certains modes de vie constitue parfois un obstacle dressé contre
certaines extensions du Capital, il n’en reste pas moins que, faute d’une alternative
politique globale, la politique de l’enracinement, la création de communautés, peut se
substituer aux interventions de l’Etat pour ce qui est de la stabilité sociale. Le
néolibéralisme trouve ainsi un allié aussi inattendu que solide dans ces « formes
d’appartenance à des communautés organiques définies à partir de la parenté, de
l’ethnicité et de la religion »94. L’idéologie du capitalisme mondial est une foire aux
identités aux vertus bien conservatrices, ce que ne comprennent pas certains
contestataires médiatiques de la société de marché.
Mais, bien loin du projet néolibéral et de ses alliés identitaires ou religieux, voire de
ses opposants qui ne font que revisiter les formes du vieux fascisme européen, nous
pourrions nous saisir de la réalité des catastrophes pour redonner, comme l’a soutenu
justement L. Loty, aux fictions utopiques leurs capacités à susciter une imagination
alter-réaliste, contre l’optimisme libéral qui nous fait accroire que le monde actuel est
le meilleur des mondes. D’une certaine façon, il serait ainsi possible de quitter nos
temps postmodernes pour aller vers une altermodernité. F. Jameson a justement
caractérisé notre époque finissante « comme celle du déclin de notre historicité, de
notre capacité vécue à faire activement l’apprentissage de l’histoire »95. Le domaine
esthétique est sans doute celui qui avait le plus exprimé ce moment historique,
« dépression mélancolique » selon N. Bourriaud, liée au travail de deuil de l’idéologie
des progrès techniques, politiques et culturels96.
Cet auteur soutient également qu’une altermodernité travaillerait déjà le champ
esthétique où, après la si postmoderne assignation aux origines, expression de
l’idéologie de la fin des idéologies, viendrait le temps d’un « espace déhiérarchisé, celui
d’une culture mondialisée et préoccupée par de nouvelles synthèses »97. Ne pas
renoncer à l’approfondissement d’une culture commune à l’échelle du globe, ce qui est
94
Nous nous inspirons ici de l’analyse de A. Bugra, « Karl Polanyi et la séparation institutionnelle entre politique et
économie », Raisons politiques – études de pensée politique, 20, 2005, pp. 37-55.
95
F. Jameson, Le Postmodernisme ou la logique culturelle du capitalisme tardif, Ecole supérieure nationale des
Beaux-Arts de Paris, 2007, p. 62.
96
97
Nicolas Bourriaud, Radicant – pour une esthétique de la globalisation, Denoël, 2009.
Ibid., p. 215. La référence botanique aux radicants « qui font pousser leur racine au fur et à mesure de leur
avancée » (p. 58) est essentielle : le sujet contemporain est ici « tenaillé entre la nécessité d’un lien à son
environnement et les forces du déracinement, entre la globalisation et la singularité ».
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un acquis positif des tendances récentes de la civilisation, tout en refusant les logiques
d’assignation, les injonctions à l’authenticité, pourrait être un constituant d’une vie
bonne pour ce XXIième siècle. Seule cette conception de la vie, qui pose la question de
savoir ce que nous avons envie d’être, pourrait nous permettre de ne pas fuir dans
l’avoir, qu’offre l’idéologie économique mortifère. Or, la crise du capitalisme
mondialisé et le choc écologique sont justement des faits majeurs susceptibles de
réveiller la politique, c’est-à-dire ipso facto de nous rétablir dans l’historicité, de
traduire l’exigence de la vie bonne pour aujourd’hui. On l’aura compris : ce
rétablissement ne pourra pas être un retour à l’identique, l’altermodernité n’est pas
une néomodernité.
Polanyi, en son temps, avait déjà mis en question la modernité libérale, d’où était issue
l’« impasse fasciste »98. Plus tard, il a opposé la nécessité de l’habitation raisonnée du
monde à l’amélioration pourvoyeuse de profit99, intitulant un chapitre de la Grande
Transformation, « Le marché et la nature », qui se finissait ainsi : « On ne peut séparer
nettement les dangers qui menacent l’homme de ceux qui menacent la nature »100. La
crise de la modernité ne mettait donc pas en cause un seul projet humain (la
démocratie sociale contre la société de marché) mais, peut-être, le monde lui-même
au-delà de l’homme ? La question ici n’était plus de vivre mais de survivre, suite au
productivisme impliqué par le Grand Marché. Près de cinquante ans après la mort de
Polanyi, ne serait-il pas temps de prendre au sérieux ces questions, même si, en
Occident, nous avons cru, un peu vite, que notre vie postmoderne impliquait un mode
de vie postindustriel101 ?
Malay, le 15 juin 2011
98
K. Polanyi, « L’essence du fascisme », pp. 369-395, dans M. Cangiani, J. Maucourant dir., op. cit.
99
« Habitation contre amélioration » est le sous-titre du chapitre 3 de La Grande Transformation.
100
K. Polanyi, La Grande Transformation, op. cit., p. 253
101
La mondialisation est accumulation du capital à l’échelle mondiale, avec une division du travail telle que se pose
avec moins de vigueur la question de la production industrielle en Occident, la baisse de son coût relatif aidant à
cette négligence. Mais, la nécessité de la démondialisation, en temps écologiquement difficiles, et d’une
réindustrialisation non productiviste peut rebattre les termes de la question industrielle. Il faut noter qu’une
démondialisation de l’économie ne signifie pas nécessairement la démondialisation culturelle portée, entre autres,
par les flux d’information.
111
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Bibliographie
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M. CANGIANI « Karl Polanyi : une voix du siècle passé ? », Revue du MAUSS, 2, n° 34, p.
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J-L GREAU, La trahison des économistes, Gallimard, 2008.
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supérieure nationale des Beaux Arts de Paris, 2007,
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J. MAUCOURANT, « Le néoinstitutionnalisme tardif et l’histoire économique », Topoi –
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D. NORTH, Le processus du changement économique, Editions d’organisation, 2005.
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Transformation », La Revue du MAUSS, n° 29, 2007.
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Cangiani, J. Maucourant dir., Essais de Karl Polanyi, Seuil, 2008.
K. POLANYI, « L’essence du fascisme », pp. 369-395, dans M. Cangiani, J. Maucourant
dir., Essais de Karl Polanyi, Seuil, 2008.
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
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M. VAHABI, « Ordres contradictoires et coordination destructive : le malaise iranien »,
Revue canadienne d’études du développement (30), n° 3-4, pp. 361-392, 2009.
113
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Autarquias em Angola: Qual o problema do “gradualismo”?
Aslak Orre, Chr. Michelsen Institute
Introdução: Teorizando o gradualismo no contexto da descentralização
Na sequência das “eleições gerais” de 2012, Angola está pronto para entrar num
período de grandes transformações na área da governação local. A introdução da
reforma autárquica – segundo o Ministro da Administração do Território prevista para
2015102 – será de certeza a mudança mais importante na governação local, desde a
independência. Quando as autarquias forem criadas, os Angolanos vão pela primeira
vez eleger políticos para gerir o governo local. No entanto, a Constituição prevê, nas
suas normas transitórias, a introdução gradualista das autarquias e políticos e
tecnocratas do governo actual enfatizam, desde há muitos anos, a necessidade do
processo de descentralização e desconcentração ser guiado pelo princípio de
gradualismo.
A expressão “gradualismo” parece algo pacífico, pouco controverso ou até banal –
significando apenas que as coisas se farão pouco-a-pouco e não tudo de uma vez –
mas implicações, da sua aplicação, no contexto político e constitucional angolano,
podem ser diversas, na medida em que a aplicação progressiva das autarquias locais
seja em relação ao território ou em relação as matérias de governação. . Urge, por
tanto, discutir com algum pormenor qual o significado do “gradualismo” na
governação local em Angola.
A criação de autarquias em Angola responde à necessidade essencial de qualquer
Estado moderno de criar instituições de governação descentralizada. Simplesmente
não é possível responder às demandas de milhões de cidadãos, não é possível garantir
direitos e serviços públicos para milhões de pessoas e não é possível consolidar uma
base tributária universalizada, sem que haja um mínimo de autonomia, capacidade e
sofisticação burocrática local para responder às exigências dos cidadãos. A história dos
Estados evidencia que os órgãos do Estado central tiveram que fortalecer a sua
capacidade burocrática e institucional ao nível descentralizado. Daí, em particular no
fim do último século, a descentralização ter recebido muita atenção na teorização do
“desenvolvimento”, nomeadamente colocando forte entusiasmo sobre os grandes
102
Ver entrevista de Bornito de Sousa, Ministro da Administração do Território, aa Expansão, 6 de Abril, 2012, e
notícia da Angop,25 de Outubro de 2012.
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benefícios que a descentralização iria criar. Um governo descentralizado seria mais
próximo dos eleitores; mais responsável (accountable); mais eficaz na satisfação dos
interesses dos munícipes, prestando-lhes melhores serviços, sejam pobres ou ricos.
Logo levantaram-se dúvidas (Crook and Manor 1999). Em grande parte, o optimismo
tomava como ponto de partida que “todos” convergiram no desejo de descentralizar.
Recentemente, os estudos dos resultados dos processos de “descentralização” têm
sido menos encorajadores, – devido ao facto destes, muitas vezes, não terem passado
do nível retórico para a prática –. Houve mesmo um retornar do pêndulo e
actualmente bastante literatura visa explicar ou teorizar os desapontamentos através
de processos de recentralização – ou mesmo estratégias para enredar a
descentralização ou torná-la num instrumento dos executivos que por muito tempo
têm dominado os seus Estados (O’Neill 2003; Dickovick 2011; Poteete and Ribot 2011).
Neste artigo não se especula sobre as razões explicativas da lentidão do processo de
descentralização em Angola e os adiamentos da implementação das autarquias. O que
se pretende é analisar a introdução das autarquias, no seu contexto histórico,
utilizando a experiência de autarquização de Mozambique como um “espelho” para
Angola.
Ao contrário dos teóricos da descentralização dos anos 1990 que se inspiraram nas
expectativas ideológicas,103 este estudo baseia-se no “realismo histórico” que estuda a
governação local no seu contexto histórico e de maneira comparativa. Autores como
Mamdani (1996), Herbst (2000) e Boone (2003) olhavam sempre qualquer reforma
corrente na governação local nos países Africanos como uma nova volta na dança
histórica entre os níveis centrais e locais – em que a capacidade do nível central em
impor a sua ordem nos territórios periféricos do Estado é, comparada com os países
mais “avançados”, bastante reduzida. A descentralização não é, nessa óptica, uma
novidade. A novidade nos anos 1990 era o verniz ideológico (positivo) associada à
descentralização. Enquanto todos os países Africanos têm as suas especificidades
institucionais e socio-económicas – a comparação revela isto – os países Africanos
também se confrontam com desafios que são comuns e especificamente africanos. A
experiência colonial era comum, o modo de colonialismo era diferente. A
descolonização aconteceu mais ou menos na mesma altura, com variações sim, mas
sobre temas recorrentes.
103
De certa forma, houve uma convergência temporária de vários correntes ideológicos que favorecia a
“descentralização” como modelo de desenvolvimento. Por um lado, houve o optimismo da esquerda ocidental que
via na descentralização uma maneira de fortalecer o “povo” perante os Estado dominado pelos interesses das
elites. Por outro lado, o Banco Mundial e outros propagantes da descentralização via nela uma maneira de melhorar
os serviços e no mesmo tempo conter o poder central do Estado e limitar a sua intervenção no mercado livre.
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Um dos argumentos fundamentais de Mamdanique se debruça sobretudo sobre a
experiência dos países anglófonos, é que a governação descentralizada era uma
estratégia comum dos regimes coloniais no tempo do “indirect rule” (dominação
indirecta). Não lhes importava o “despotismo local” dos chefes tradicionais, e os
chefes foram delegados poderes e competências significativas para governar o dia-adia nas suas “comunidades”. Bastava que esses se mantivessem fiéis à supremacia dos
oficiais coloniais (Mamdani 1996:37-61). Pois a governação descentralizada não é uma
novidade e hoje, como no tempo colonial, a questão é a de saber se levará a
“despotismo” ou democracia local, é a de analisar a quem beneficiam as reformas –
não pela retórica em que as reformas são embrulhadas, mas na sua prática.
No caso de Angola, a preocupação principal a discutir, neste artigo, é se o
“gradualismo” vai, eventualmente, significar uma bifurcação do Estado e a contínua
divisão entre o meio rural e urbano.
A seguir este artigo começa por recordar as principais características da governação
local actual e as autarquias, assim como estão visadas na Constituição. Ligaremos logo
o significado do gradualismo com o problema da bifurcação do Estado que é um dos
problemas historicamente herdados e que é comum em muitos países Africanos.
Primeiro far-se-á uma recapitulação teórica do problema e segundo olhs para um
exemplo concreto e bastante relevante para Angola, que é o caso de Moçambique.
Finalmente, o artigo atreve-se a sugerir uma maneira alternativa de pensar em
gradualismo e descentralização democrática.
O país Africano mais centralizado
Angola é possivelmente o país Africano mais centralizado – quer olhemos para o
sistema político, administrativo ou financeiro. É excepcional a centralização financeira,
se verificarmos como a receita fiscal angariada localmente é recolhida pelo Ministério
das Finanças e depositada na Conta Único do Tesouro (CUT) – tal como é excepcional a
maneira como o investimento público é dirigido da capital do país. Uma das
consequências, bastante provável mas não inevitável, é a formidável concentração em
Luanda das despesas públicas correntes e do investimento público (Rocha 2010). Com
a recente ênfase colocado no processo de “desconcentração”, o município alcançou o
estatuto de “unidade orçamental” no Orçamento Geral d Estado (OGE). No este novo
estatuto não tem resultado na disponibilidade de grandes fundos, pois a grande parte
dos investimentos públicos tendem a ser implementados como programas provinciais
ou mesmo centrais. Em 2007-2008, aproximadamente 68 municípios foram dotadas de
uma verba correspondente a cinco milhões de dólares americanos – abrindo assim um
relacionamento directo entre os administradores municipais e o Ministério das
Finanças, ultrapassando assim o nível provincial (Orre 2009; Santos 2012a:5). Não foi
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publicado (ao nosso conhecimento) nenhuma avaliação dos resultados desta
“experiência” de desconcentração, mas acabou por ser “sol de pouca dura”, pois o
programa foi descontinuado e substituído pelo actual Programa Municipal Integrado
de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza(PMIDRCP), que passou a ser gerido a
partir da Casa Civil do Presidente da República104 (Santos 2012b:8-9), o que faz que a
mão central se mantenha muito forte na gestão desses programas.
Angola também se distingue, mesmo comparado com os seus pares Africanos, pelo
seu grau de centralização politico-administrativa. A Constituição de 2010 confere ao
Presidente da República a prerrogativa de nomear os governadores e os vicegovernadores nas províncias. Actualmente, isto significa que mais que 70 líderes da
governação central no território são directamente nomeados pelo PR. Um governador
é, segundo, o artigo nº 201, ‘representante da administração central na respectiva
Província, a quem incumbe, em geral, conduzir a governação da província’. A
Constituição remete por tanto às futuras autarquias criarem instituições que
represente os cidadãos locais, já que os governadores respondem política e
institucionalmente perante o PR (artigo 201, CRA). Os governadores, sendo assim os
“confidés” do PR, nomeiam, por sua vez, todos os administradores municipais e
comunais (e ainda os seus adjuntos), embora sob consulta do Ministro da
Administração Territorial. A Constituição não prevê o funcionamento da administração
municipal ou comunal (já que a administração local do Estado é feita pelo governo
provincial). No entanto, segundo a mais recente “Lei sobre os Órgãos da Administração
Local do Estado (Lei 17/10), o relacionamento dos administradores municipais e
comunais com o governador provincial é assimilável ao deste com o PR, pois estes
representam o governador nos seus respectivos territórios e são responsáveis perante
quem os nomeiam, isto é, os seus superiores hierárquicos.
Não há, por tanto, nenhum dispositivo constitucional ou legal que garanta que os
líderes político-administrativos locais prestem contas aos seus munícipes. É importante
salientar que neste ponto, a prática político-administrativa não parece fugir muito à
legislação vigente. É o que se pode constatar em estudos nos municípios (Orre 2009).
Angola é, por isso, um dos países mais centralizados, em termos financeiros e politicoadministrativos, em toda a África.105
104
Ao máximo, esse programa pode financiar obras nos municípios até USD 2,5 milhões.
105
Em Moçambique, o sistema de governação é também muito centralizado zonas rurais, embora os Órgãos Locais
do Estado no nível distrital (que corresponde ao município em Angola) devam e podem angariar fundos localmente
que se usam no financiamento de planos concebidos localmente. Moçambique também avançou com a
autarquização das cidades em 1998.
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Devolução, desconcentração, gradualismo e a bifurcação do Estado
A descentralização em Angola pode tomar duas vias. Uma delas é a autarquização, que
vai ser estudada em baixo e refere-se ao processo de criação e implementação de
autarquias. Seria esta a via que representaria mais uma descentralização democrática.
A outra via é o que na terminologia Angolana tende a ser referido como
desconcentração, o que significa continuar a administrar os municípios através de
representantes da administração central mas colocando mais recursos financeiros e
humanos ao dispor desses escalões inferiores da administração local do Estado
centralista. Os esforços e a prática do governo angolano têm até hoje em dia sidos
focados nesta via. Daí que o Ministro da Administração Territorial, Bornito de Sousa,
enfatizou a estratégia de fortalecer a administração municipal.106 Associado à via de
desconcentração podemos assinalar também a possível transferência ou delegação
gradual de poderes às autoridades tradicionais. O que se tem que entender, é que o
gradualismo na introdução das autarquias irá levar, no mais provável, a uma
combinação das duas vias. O nosso argumento a seguir é que essa combinação pode
acabar por entrar em conflito com o objectivo de autarquização e a descentralização
democrática. Irá possivelmente contribuir para a contínua bifurcação do Estado ao
longo da divisão rural-urbano. O conceito será explicado a seguir, após uma breve
recapitulação dos princípios que criam uma autarquia.
Deve-se fazer uma tentativa de desembalar os conceitos em questão. Para começar, o
processo de descentralização democrática implica por definição que o Estado transfira
competências, recursos e poder real para uma autoridade local que representa os
cidadãos locais, e que é por eles eleita e que presta contas perante os eleitores locais.
É um processo que também tem sido referido como devolução (Crook and Manor
2000; Hadenius 2003; Olowu and Wunsch 2004) em que o Estado renuncia a
administração local, ao nível do município. Por seu lado, como alternativa, o Estado
pode desconcentrar recursos para escalões inferiores da administração local do
Estado, ao nível do município. A diferença entre descentralização democrática e
desconcentração é que esta não tem como objectivo criar mais autonomia política
local, mas limita-se a criar alguma autonomia administrativa dentro da hierarquia
estatal.
Não sendo o processo de descentralização político-administrativa realizado em
simultâneo, pode-se fazer gradualmente. Mas, sabendo que essa descentralização
106
O Ministro é citado: ‘Consideramos um desafio reduzir o aparelho central e reforçar os municípios...’ e ‘...a visão
será priorizar a municipalização, isto é, a criação de quantos municípios se mostrarem necessários para aproximar
os serviços aos cidadãos’. Ainda é citado: ‘...é necessário que todos tenham em primeira linha a importância que
constitui o município, como elemento da cadeia de governação que permite uma maior proximidade e uma maior
participação dos cidadãos na resolução dos seus problemas’. (Expansão, 6 de Abril, 2012)
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pode ser abordada do ponto de vista do seu desdobramento no território nacional ou
pelo conjunto de competências que o Estado-central transfere para as colectividades
territoriais geridas de forma autónoma, é relevante, ao analisarmos a autarquização,
distinguir dois tipos de gradualismo: gradualismo funcional e gradualismo geográfico.
O primeiro tipo refere-se ao processo de transferência gradual de funções e
competências para órgãos das autarquias locais (ou mesmo para os órgãos
desconcentrados do Estado). Quer dizer, por exemplo, que numa primeira fase do
processo a responsabilidade para o embelezamento público (parques, ruas e
património) é transferida às autarquias, a transferência de tarefas e competências
mais “pesadas” (como policiamento ou a educação secundária) é adiada para fases
posteriores. O segundo significa um processo em que a autarquização começa apenas
em algumas zonas (por exemplo, municípios mais desenvolvidos) do país. Essas são
“convertidas” em autarquias, ganham estatuto jurídico como autarquias e devem
eleger os órgãos de governação autárquica, Enquanto outras zonas têm que esperar
por uma outra oportunidade.
Nota aqui que a escolha da palavra “zona”, em vez de por exemplo “município”, não é
por acaso. Em Angola, não existe clareza se os municípios vão ser “convertidos” em
autarquias, assim que todo o território dum dado município passa a ser a jurisdição da
autarquia. Também pode acontecer que apenas certas zonas urbanas vão ser
separadas dos municípios e que se criarão novas delimitações geográficas. A
Constituição também abre a possibilidade de criação de autarquias que se estendam
pelos territórios de vários municípios.
A bifurcação do Estado e reforma de governação local
Neste artigo seguiremos o conceito do Estado bifurcado, desenvolvido por Mahmood
Mamdani na sua obra “Citizen and Subject” (Mamdani 1996). A bifurcação do Estado é
um rótulo dado ao cenário bastante típico dum Estado Africano em que uma série de
dicotomias caracteriza a situação historicamente herdada. O colonialismo instituiu
uma separação rígida entre as cidades onde residiam os brancos/Europeus e zonas
periféricas e rurais, onde viviam os nativos/bantus. Os primeiros eram considerados
cidadãos, com os devidos direitos e deveres codificados na lei escrita. Em caso de
transgressões e litígios, encontravam-se sob jurisdição do sistema judicial baseado no
direito Europeu. Os segundos, os “nativos”, consideravam-se sujeitos da sua
“comunidade”, “tribo” ou “grupo étnico” e a liderança do seu chefe tradicional (seja
esse verdadeiramente “tradicional” ou imposto pelo Estado colonial). A lei que se
aplicava nessas jurisdições, era principalmente a “lei consuetudinária”, isto é, os usos e
costumes como definido pelo grupo, família, linhagem ou clã dominante numa
determinada área. Enquanto os cidadãos das cidades pagavam uma variedade de
119
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impostos (sob rendimento, renda, venda, etc.) os nativos nas zonas rurais pagavam
imposto por cabeça (head tax) ou por agregado familiar (“imposto de palhota”),
geralmente cobrado pelo chefe tradicional.
Um caso paradigmático dessa separação é o próprio Estatuto dos Indígenas que se
aplicava no império Português a partir de 1954 (que veio a confirmar o que já era
praticado). Resumido por Feijó (2012:327): ‘... este diploma prescreve que os indígenas
se regem, salvo disposição em contrário, por usos e costumes locais’. Isto,
evidentemente, colocava os chefes tradicionais reconhecidos pelo governo colonial
numa posição de poder perante a população que cabia na “jurisdição” deles, pois os
chefes funcionaram como intérpretes ou guardiãs dos “usos e costumes”.
Enquanto o caso do colonialismo Português não é um exemplo democrático, mesmo
nas colónias Portuguesas as cidades e vilas experimentavam com autarquias cuja
liderança gozava de bastante autonomia do poder central – claro, isto era privilégio
dos colonos brancos e dos “assimilados”. As autarquias e freguesias administravam
muitos serviços urbanos. Nas zonas rurais, o conceito de “serviços públicos” era quase
inexistente, e não havia hipótese nenhuma de eleger o administrador local, pois este
era nomeado do Estado central e respondia perante o Estado central.
Na sua análise, Mamdani conclui que os regimes pós-coloniais enfrentaram a
bifurcação do Estado de maneira diferente, mas não a conseguiram eliminar. Seria
demais referir todo o argumento aqui, mas por via de conclusão, a solução para os
regimes de “nacionalismo radical” (Mamdani 1996:291) – o Estado do MPLA contavase entre estes – visavam eliminar o despotismo descentralizado associado às
chefaturas. Mesmo assim, acabaram por substituir o despotismo descentralizado com
o centralismo não muito menos autoritário. Tipicamente, tirando a euforia inicial da
independência e o “poder popular”, a administração local do Estado acabou por ser
uma máquina burocratizada e centralizada e pouco virada a satisfazer as necessidades
da população local. Pela incapacidade de prestar serviços públicos e de marcar a sua
presença mais que nominalmente (em particular durante tempos de guerra), o Estado,
em Angola (tanto como, por exemplo, em Moçambique) acabou por, pouco a pouco,
aceitar o papel dos chefes tradicionais na governação local (Orre 2010). Nas cidades,
onde o governo teve uma presença forte, os cidadãos respondiam perante o sistema
jurídico e judicial do Estado, nas zonas rurais os “usos e costumes” continuavam
dominantes.
É seguro dizer que é esta a situação que se vive em Angola hoje em dia. Se restar
alguma dúvida, a própria Constituição a consagra, nomeadamente nos artigos 223 e
224. Voltaremos já a esse assunto. Constituiu-se por tanto, uma legislação e sistema
administrativo para as cidades, e outro para as zonas rurais que é o domínio das
120
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autoridades tradicionais. A tendência tem sido esta em vários países na África austral
recentemente.
As autarquias e o gradualismo na Constituição de 2010
Embora a implementação das autarquias já tenha sido prevista a partir da Lei
Constitucional de Setembro de1992, houve relativamente pouco debate em Angola
sobre a sua realização: Qual o desenho institucional? Qual o sistema eleitoral? Quais
atribuições, prerrogativas e competências iriam ter uma autarquia? Quais fontes de
rendimento iriam ser concedidas às autarquias? Como iria conviver e dividir tarefas e
autoridade com os representantes dos órgãos locais do Estado? Estas e outras
perguntas são muito pertinentes a ponderar e discutir para um país como Angola,
porque as suas respostas terão, com certeza consequências das mais variadas, até
mesmo no dia-a-dia do povo Angolano.
Mesmo se a Constituição de 2010, veio dar resposta a uma boa parte das perguntas
supra colocadas, e isto com apenas um debate público mínimo sobre o assunto, ela
determina um modelo específico, fechando a porta para o que deveria constituir uma
discussão pública significativa. Mais problemático ainda é o facto do nível de detalhe
constitucional tornar mais difícil fazer ajustes institucionais após a implementação das
autarquias. A constituição preludia, por isso, uma flexibilidade institucional que poderse-ia provar valiosa caso a implementação e a prática revelassem dificuldades.
Recapitulamos aqui os principais parâmetros ditados pela Constituição. A autarquia
Angolana terá uma assembleia composta por representantes dos cidadãos locais. Os
representantes são eleitos em eleições locais onde todos cidadãos locais podem votar.
Nessa mesma eleição - livre, directa, secreta e periódica – também se vai eleger um
presidente da autarquia. O presidente eleger-se-á da mesma maneira (bastante
idiosincratica Angolana) que o Presidente da República é eleito, isto é, o cabeça da lista
mais votada para a Assembleia torna-se presidente da autarquia. O “executivo” da
autarquia é o órgão colegial composto do seu líder, o presidente, e dos secretários por
ele nomeados que politicamente responsável perante a assembleia autárquica.
A Constituição Angolana de 2010 introduz, no seu artigo 242 nº 1, a seguinte
“disposição final”: ‘A institucionalização efectiva das autarquias locais obedece ao
princípio do gradualismo.’ Parece uma afirmação que pouco diz, além do óbvio que
não se pode fazer tudo de uma vez. Mas continua no nº 2:
Os órgãos competentes do Estado determinam por lei a oportunidade da sua criação, o
alargamento gradual das suas atribuições, o doseamento da tutela de mérito e a
transitoriedade entre a administração local do Estado e as autarquias locais.
121
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Concretizando assim o significado do “gradualismo”, este parágrafo visa duas
ambiguidades centrais que são destinadas a causar muita polémica nos anos que vêm.
Primeiro, afirma que uma lei (futura) vai determinar quando e, necessariamente, onde
se vai introduzir uma autarquia – isto é, grudualismo geográfico. Segundo, o parágrafo
dita que num período de transição as tarefas atribuídas às autarquias possam ser
transferidas gradualmente, o que chamaremos gradualismo funcional.
Abrimos aqui um parêntese para comentar que, de certa forma, a Constituição (como
tantos outros) introduz princípios que podem ser mutuamente contraditórios. A
Constituição não diz explicitamente que o voto para escolher os representantes do
governo local (autárquico) é um direito. A questão que se coloca é a de saber se o
gradualismo significa que alguns Angolanos podem votar para eleger o governo local,
enquanto outros Angolanos não podem (ou têm que esperar até que o gradualismo
eventualmente os faça cidadãos de uma autarquia). Enfim, o gradualismo vai ou não
vai chocar com outros princípios constitucionais?
Visto no seu conjunto, uma série de artigos constitucionais apontam para o
universalismo e não para o gradualismo. O artigo 22º evoca o “princípio da
universalidade”, significando que todos os cidadãos têm os mesmos direitos e deveres.
O artigo 23º garante a “igualdade” – que todos são iguais perante a lei, e que ninguém
pode ser prejudicado ou privilegiado (mesmo se em razão do seu local de nascimento
ou condição económica). O artigo 52º cria uma norma particularmente forte: ‘Todo o
cidadão tem o direito de participar na vida política e na direcção dos assuntos
públicos, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos’.
Finalmente, o artigo 54º garante que ‘[T] odo o cidadão, maior de dezoito anos, tem o
direito de votar e ser eleito para qualquer órgão electivo do Estado e do poder local e
de desempenhar os seus cargos ou mandatos, nos termos da Constituição e da lei.’ A
ênfase foi introduzida pelo autor para chamar atenção aos parágrafos que, ao nosso
ver, de forma legalo-retórico – indicam o contrário ao princípio de gradualismo
geográfico na introdução das autarquias. Isto é, esses parágrafos sugerem que os
“direitos autárquicos” devem ser introduzidas ao mesmo tempo para todos os
cidadãos.
Para já deixaremos para as lutas políticas e jurídicas a interpretação desses parágrafos.
Seguiremos, em vez disto, utilizando comparativamente algumas experiências das
ciências políticas e para discutir os pontos teóricos relevantes para o caso de Angola.
Embora não sendo o foco deste artigo, vale a pena uma nota para chamar atenção
para um exemplo, ao nosso ver, de sobredeterminação constitucional em Angola. Ao
consagrar que o executivo autárquico provém dos políticos eleitos para a assembleia
autárquica existe a possibilidade duma excessiva “politização” da autarquia. Em
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qualquer país, com governos locais funcionais, deve-se encontrar um equilíbrio entre o
poder político local e o poder “administrativo” – este último composto pelos oficiais e
funcionários que eventualmente trabalharão na prestação de serviços autárquicos (nas
áreas de saneamento, educação, saúde, ambiente, etc.). A Constituição Angolana nada
diz sobre a composição da administração burocrática da autarquia (o que não constitui
em si qualquer problema, pois isto pode ser determinado por lei comum) mas sim
garante que a liderança autárquica vai ser alterada com cada ciclo eleitoral, o que
pode criar distúrbios e descontinuidade na administração. Uma tarefa que se coloca
perante a administração local de Angola é a sua despolitização, senão mesmo
despartidarização, e o estabelecimento duma administração local da coisa pública
baseado em meritocracia. O “equilíbrio apropriado” “balanço fino” na governação
local supramencionado, é o resultado da negociação entre a opinião profissional dos
funcionários públicos e a opinião política dos partidos. A preocupação aqui é a ênfase
do lado da “politização” das autarquias e a ausência total de discussão da
“profissionalização” da mesma autarquia.
Autoridades tradicionais e o gradualismo
O discurso, e se calhar ainda a prática, de gradualismo também se aplica num outro
campo da governação local em Angola, sendo esse o da relação entre o Estado e as
“autoridades tradicionais”, vulgo “sobas”.107 A diferença em relação ao gradualismo
em relação às autarquias, neste caso, trata-se de transferência de responsabilidades,
competências e recursos para figuras que não são democraticamente eleitas.108
Esta problemática também entra pela porta da Constituição. Uma governação
democrática local visa criar uma entidade que toma conta de “assuntos públicos
locais” que não serão administrados ou geridos directamente pelo Estado central (nem
pelos seus órgãos desconcentrados). A autarquia funciona, por tanto, num patamar
intermédio entre o Estado e a esfera privada e da sociedade civil. É o que a
Constituição Angolana refere como Poder Local. Só que, a autarquia não é o único
poder local existente segundo a Constituição, porque o poder local compreende, além
das autarquias locais, as ‘instituições do poder tradicional’ (artigo 213). A Constituição
107
A partir de agora deixarei de colocar autoridades tradicionais entre aspas, não porque é um termo
absolutamente claro ou que não deixa de ser um eufemismo, mas apenas porque colocá-lo entre aspas em nada
ajuda a clarificar a matéria.
108
Isto não é o mesmo que dizer que as autoridades tradicionais não possam gozar de legitimidade, mas é
fundamentalmente diferente que a autarquia. Enquanto a legitimidade da autarquia vai ser a eleição democrática,
os sobas (como “autoridades tradicionais”) são – segundo a Constituição – poderes tradicionais que tem a sua
origem até antes do Estado e a Constituição. Por isso, o Estado reconhece a legitimidade das autoridades
tradicionais. Teoricamente, independentemente da legitimidade que um soba goza dentro da comunidade, ele
pode evocar a sua linhagem para legitimar-se perante o Estado e obter o seu reconhecimento.
123
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não clarifica satisfatoriamente o fenómeno do “poder tradicional”, embora possa darnos uma pista:
O reconhecimento das instituições do poder tradicional obriga as entidades públicas e
privadas a respeitarem, nas suas relações com aquelas instituições, os valores e
normas consuetudinários observados no seio das organizações político-comunitárias
tradicionais e que não sejam conflituantes com a Constituição nem com a dignidade da
pessoa humana. (artigo 223º, CRA)
A Constituição reconhece a existência do pluralismo jurídico no país, e aceita a sua
aplicação mas é pouco explicita sobre onde e quando se aplica a jurisdição
“tradicional”. Suspeitamos que vai ser nas “comunidades rurais” que se venha a aplicar
tal jurisdição. O que sabemos é que outorga um papel especial para o que na prática
tendem a ser os sobas, cujo autoridade e poder é respeitada principalmente nas zonas
rurais:
As autoridades tradicionais são entidades que personificam e exercem o poder no seio
da respectiva organização político-comunitária tradicional, de acordo com os valores e
normas consuetudinários e no respeito pela Constituição e pela lei. (artigo 224º, CRA)
A questão das autoridades tradicionais em Angola vai necessariamente sofrer um
tratamento superficial neste texto. Para já, apesar de que a grande maioria de
Angolanos, no meio rural, sabe quem é o soba, não é nada claro que tipo de
autoridade tem ou deve ter aquele indivíduo que é reconhecido pelo Estado como
“autoridade tradicional”. E porquê tradicional, já que o soba é normalmente um
indivíduo pago e fardado pelo Estado e assim parece manifestamente moderno? Mais
relevante para essa nossa discussão: qual é ou deve ser a sua jurisdição e quais as suas
competências? Funciona essa autoridade tanto na cidade como no campo, ou será
uma autoridade reservada para as zonas rurais? A Constituição simplesmente relega
esta importante questão para futura legislação. A prática, no entanto, é que os sobas
têm o seu domínio no meio rural, junto às terras de origem dos seus clãs e
antepassados.
Carlos Feijó, que teve um papel importante na elaboração da presente Constituição
Angolana, argumenta na sua tese de doutoramento que se deve transferir – de modo
gradual – ‘competências e poderes do Estado para os órgãos do poder tradicional,
designadamente para as autoridades tradicionais que o representam’ (Feijó 2012:457).
Há de certeza forças significativas no país que se digladiam com os problemas jurídicolegais de institucionalizar o papel das autoridades tradicionais na governação local. Ao
nosso ver, o conceito de que o “poder local” é reconhecido como um poder “anterior”
ao do Estado e, por isto, merece reconhecimento, não passa de a uma mistificação. Os
124
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problemas práticos acima mencionados terão que ser atacados porque diariamente
levantam dilemas na governação local no interior das províncias. Por exemplo: quem
vai abrir um processo contra um réu acusado de furto e de feitiçaria maligna? O Estado
ou as cortes do poder local? Quem vai garantir o seu julgamento justo, os tribunais da
República ou as autoridades tradicionais?
A prática comum que faz com que os sobas e seculos, em muitos lugares de Angola,
apareçam como vinculados ao Estado é a segunda razão pela qual devemos prestarlhes atenção na discussão sobre as futuras autarquias. Segundo informações do MAT,
há, em 2012, cerca de 41 mil autoridades tradicionais que recebem subsídios do
Estado, num dispêndio anual de cerca de 100 milhões de dólares americanos. Em
milhares de aldeias e bairros Angolanos (como é o caso em vários outros países
Africanos) os chefes tradicionais jogam um papel importante como intermediários em
dois sentidos: a) entre o Estado e os que residem na “sua área” – sendo qual for essa –
e b) entre os vivos e os antepassados. Como intermediários tem um papel fulcral e
decisivo em várias áreas da vida da população local. São bastante influentes em
questões como a posse da terra, matrimónio, acusações de crimes e feitiçaria, litígios
locais e muito mais. Na sua governação – eles participam efectivamente na governação
local na prática, e o governo é completamente dependente deles em muitas zonas
rurais – os chefes tradicionais referem às leis codificados do Estado e orientações do
“administrador”, tantos como eles referem aos direitos e costumes consuetudinários
como fonte da lei.109
Em paralelo com a estratégia de desconcentração – o fortalecimento gradual dos
órgãos locais do Estado, principalmente a administração municipal – as autoridades
tradicionais foram reconhecidos e integrados, de facto, na governação local do Estado.
Um pouco em paralelo com a situação do tempo colonial – o Estado apoia-se na
capacidade administrativa dos chefes tradicionais. Voltaram a ficar, nas palavras dum
sociólogo, “chefaturas administrativas” (Trotha 1996).
Moçambique e a bifurcação do Estado
Também em Moçambique, o gradualismo tem sido um dos “princípios” que guia a
introdução das autarquias e todo o processo de descentralização e desconcentração
(Weimer 2012a). A mesma distinção entre o gradualismo funcional e geográfico é
muito relevante para explicar a situação, porque o resultado tem sido a continuação
do Estado bifurcado ou uma descentralização em duas vias diferentes.
109
No periurbano, onde existem são na maior parte dos casos vegetativos ou exercem um papel de polícia do
regime para controlar cidadãos que não lhes reconhecem papel nenhum. Para além de que é preciso dizer que hoje
são sempre tidos como órgãos auxiliares da administração, sendo hierarquicamente inferiores aos administradores
respectivos, municipais ou comunais
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O acordo geral de paz entre o governo da Frelimo e a Renamo em 1992 preparou o
terreno para um sistema de governação democrática e multipartidária em
Moçambique. Um elemento central no acordo era também a promessa de
descentralização que visava uma possível partilha de poder. Em 1994 a legislação
preparada (Lei 3/94) para a descentralização visava a conversão de todos os 128
distritos (que corresponde, grosso modo, aos municípios em Angola) em autarquias
em que o governo local seria eleito. A implementação das autarquias aconteceria
simultaneamente em todo o território. A grande parte das funções dos órgãos locais
do Estado passariam para as autarquias (ordem pública, postos de saúde, educação
primária, etc.). Pelo menos, isto era a expectativa geral até 1996 (Guambe 1996),
porque a Frelimo decidiu revogar essa legislação que visava uma descentralização tão
radical (Faria and Chichava 1999).110 Subitamente, a Frelimo introduziu uma reforma
(Lei 2/97) que consagrava o “gradualismo” como princípio de descentralização, isto é,
gradualismo geográfico além de funcional. Argumentava-se no seio do governo que
era necessário “criar as condições sócio-económicas”, antes da autarquização.
Segundo Weimer (2012a), uma razão importante pela importância do gradualismo na
introdução de autarquias foi a hesitação duma boa parte da elite política da Frelimo
que, acostumada ao poder a todos os níveis, temia perder “autarquias” para a
oposição, e assim “dividir o país”.
Como resultado, em 1998, as primeiras autarquias viram a luz do dia, mas apenas em
23 cidades e 10 vilas (uma por província, em regime de “experiência-piloto”). Em 2008,
mais 10 vilas foram incluídas, assim o número total de autarquias passou para 43. Os
cidadãos das cidades e vilas que foram autarquizadas já gozam da possibilidade de
eleger regularmente um presidente para o conselho autárquico e os membros da
assembleia municipal.111 Embora com as dificuldades em conseguir um consenso sobre
a legitimidade do processo eleitoral, e apesar dos problemas associados à fraca
capacidade administrativa e financeira da grande parte delas, as autarquias estão
irreversivelmente instaladas no sistema político-administrativo de Moçambique
(Weimer 2012b). Utilizando entre outras fontes de financiamento os impostos
recolhidos localmente, os políticos que governam as autarquias definem as suas
prioridades sempre com um olhar virado para a vontade dos eleitores locais.
Constroem postos de saúde e escolas em bairros de carência, pavimentam ruas,
embelezam parques e conseguem negociar directamente com instituições públicas e
110
Muitos alegavam que um motivo da Frelimo era o seu assusto com os resultados eleitorais nas eleições gerais
em 1994. Esses mostravam que a Renamo era capaz de ganhar a metade ou mais dos municípios – inclusivamente
grandes cidades.
111
Para as eleições locais em Moçambique, o eleitor tem de escolher dois boletins de voto: um para a sua
preferência de partido, coligação ou lista de cidadãos para a Assembleia Municipal, o outro para a sua preferência
de edil (Presidente do Conselho Municipal).
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privadas para resolver problemas de planificação urbana. Até nas vilas pequenas
funcionam, embora com as mesmas deficiências que se encontram, pelo menos à
mesma escala, em vilas que ainda não foram autarquizadas.
No entanto, as autarquias foram dotadas de uma “jurisdição” geográfica pequeníssima
à volta das zonas urbanas, enquanto as zonas rurais (com toda a população e os
recursos naturais que lá se encontram) ainda continuam administrados directamente
pelos órgãos locais do Estado central, com administradores distritais nomeados
centralmente e que principalmente são responsáveis perante os seus superiores na
hierarquia estatal, e não perante a população local. A maioria da população
Moçambicana, se calhar dois terços, continua a viver nas zonas distritais que não são
autarquias. Eles continuam a não ter a possibilidade de eleger os seus governantes
locais.
Sob forte pressão interna e externa (dos doadores), o governo da Frelimo não podia
deixar de reformar a governação local também nas zonas distritais. Por isso, durante a
última década o governo esforçou-se na aplicação de um processo que denominavam
por desconcentração. Este implicava o reforço dos órgãos locais do Estado, dando-lhes
gradualmente mais recursos e autonomia administrativa (embora hierarquicamente
sempre dependentes das orientações do Estado central). No contexto político de
Moçambique muitas ONG e doadores, em particular, estavam comprometidos com a
participação popular como ideal para a governação. Por isso seria impossível não criar,
pelo menos, os vestígios de uma participação popular institucionalizada. Criou-se, um
pouco por todo o país, os chamos “conselhos locais”. Os conselhos locais organizam-se
como órgãos de apoio ao governo distrital mas sem terem poderes deliberativos
significativos. São compostos por representantes locais, escolhidos por serem bons
representantes de categorias de pessoas que são predefinidas – tal como autoridades
tradicionais, mulheres, jovens, organizações da sociedade civil e os membros do
governo local. Não são, por tanto, eleitos num sufrágio universal e como era de
esperar, num regime político completamente dominado pelo partido Frelimo, os
representantes nos conselhos locais são, na grande maioria, membros ou gente muito
próxima desse partido no poder (Forquilha and Orre 2012). De facto, a composição
social e política, e o modo da sua constituição, faz com que os conselhos locais sejam
bastante assimiláveis aos Conselhos de Auscultação e Concertação Social (CACS) em
Angola (Orre 2010:cap.7).
Mas o governo Moçambicano também apostou num outro factor, a reforma das zonas
não autarquizadas. O Estado e o partido Frelimo têm feito uma reviravolta de 180
graus na sua relação com os chefes tradicionais. Enquanto no tempo imediatamente
depois da independência, por orientação político-ideológica, os chefes tradicionais (os
127
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régulos) foram perseguidos, em todo o território Moçambicano. Na década dos
anos1990, os régulos foram tacitamente aceites, e a partir de 2002 foi-lhes atribuído
um papel fulcral no sistema de governação rural. Isto é, os régulos e cabos de terra
foram denominados “líderes comunitários” e, tal como em Angola, foram restituídos
politicamente e formalmente reconhecidos pelo Estado (Buur and Kyed 2007). Na
mesma altura passaram a ter direito de hastear a bandeira nacional, a receber um
subsídio do Estado e a vestir um fardamento para ocasiões formais. Hoje em dia, tal
como em Angola, os chefes tradicionais em Moçambique actuam em vários domínios:
No sistema judicial comunitário; na recolha de impostos e podem, em algumas
localidades, reter uma percentagem das receitas; na distribuição de terras; e no
regulamento da vida familiar, matrimonial e sexual das pessoas que vivem nas áreas
rurais. Funcionam como intermediários em dois sentidos, pelo menos: entre o Estado e
a população local e entre a população viva e os antepassados. Por isto são também
intérpretes importantes na vida mágico-religiosa dos vivos. Em importantes áreas, o
Estado “entregou” ou “delegou” a governação local para chefes locais que não são
eleitos, e que – por actuarem com um olhar à lei escrita Moçambicana e outro ao
direito consuetudinário local – actuam fora dos trâmites legais do Estado (Kyed 2006;
Kyed 2007; Bertelsen 2009). Eles aplicam a sua governação nas suas “comunidades”. O
problema fundamental é um jogo de espelhos em relação ao período colonial: A
tendência de tratar os residentes rurais como um grupo, ou “membros de
comunidades” em vez de cidadãos individuais (Kyed and Buur 2006). Dito a maneira de
Mamdani: os residentes rurais são considerados súbditos de uma qualquer
“chefatura”, “regulado” e não cidadãos da República.
A integração dos régulos também tem sido um êxito político para Frelimo, que por
muito tempo sofreu os efeitos políticos negativos da alienação dos régulos no período
imediatamente depois da independência. Foi uma situação de que a Renamo se
aproveitou e explorou politicamente, conseguindo o apoio dos régulos que viam neste
partido uma possibilidade de serem compensados pela humilhação que lhe foi infligida
pela Frelimo. Por isto, no novo contexto, é a própria Frelimo que para as dissociar da
Renamo que lhes restituiu a dignidade e lhes deu as mordomias que gozavam no
tempo colonial (Orre 2010).
Olhando para atrás, o esforço do Estado moçambicano na desconcentração (nas áreas
distritais) tem sido igual ou maior que o da descentralização democrática. A reforma
de governação local de 1996-97, reconfirmado na Constituição de 2005, consagra a
bifurcação do Estado em Moçambique. Quanto ao gradualismo, este veio perpetuar,
ou mesmo eternizar, a bifurcação do Estado. Não só porque a constituição parece
sugerir que apenas cidades, vilas e povoações são autarquizadas enquanto as zonas
rurais e os seus residentes ficam sempre fora. Mesmo assim, foram criadas apenas 43
128
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das 544 autarquias possíveis e o alargamento da reforma a mais autarquias parece
estar cada vez mais longínquo porque a criação de mais autarquias depende
alegadamente de “condições socio-económicas” ideais. O problema é que quanto
menor são os centros populacionais que eventualmente a autarquizar, menos provável
é que apresentem as condições sócio-económicas necessárias para se qualificarem
como autarquias. O modelo gradualista escolhido por Moçambique já deu um “tiro nos
pés” das zonas rurais ainda não autarquizadas. Se os centros urbanos próximos já
foram autarquizados, retirou-se ou extraiu-se, como escreveu Weimer (2012c), ‘o
“coração” económico, fiscal e administrativo de uma região empobrecida que
permanece uma parte do distrito e privada de recursos importantes, tal seja a receita
das transacções do mercado...’.
Neste texto, inclui-se Moçambique como um espelho para Angola, porque este país é –
apesar de tantas diferenças – o que mais se parece com Angola, em termos históricos
e político-institucionais. Mais importante, já avançou com a autarquização, pelo
menos, 15 anos antes de Angola. As lições que se retiram para Angola são várias:
 Efectivamente tem-se criado um sistema bifurcado do Estado. Nas cidades e
algumas vilas, os cidadãos podem eleger o seu governo local, e os cidadãos são
governados pela lei escrita. Nos distritos (as zonas rurais e a as vilas e
povoações ainda não autarquizadas) a população depende dos oficiais
nomeados centralmente dos governos distritais e ainda das autoridades
tradicionais (régulos, mwenes e cabos). Esses garantem uma aplicação dos
“usos e costumes” como fonte de direito misturados com o direito “positivo”,
abrindo o caminho para bastantes situações de arbitrariedade na aplicação da
lei.
 O processo de autarquização parece estar parado. Quinze anos após a criação
das primeiras autarquias, apenas 43 das 544 possíveis foram criadas. A maioria
da população Moçambicana parece, por isto, permanentemente desprovida da
possibilidade de eleger um governo local.
 A desconcentração tornou-se um concorrente à autarquização e à
descentralização democrática. Em vez de ser visto como um passo gradual para
a autarquização, o investimento do governo nos órgãos locais do Estado passou
a ter um carácter permanente, uma solução permanente para as zonas rurais.
 Os órgãos locais do poder são de controlo garantido do partido dominante, a
Frelimo, já que este partido controla as rédeas em Maputo, e pode nomear e
controlar os distritos, postos administrativos e localidades. O partido Frelimo
enfrenta uma forte concorrência dos partidos da oposição nas eleições
autárquicas – e dois partidos da oposição já conseguiram ganhar a liderança
autárquica em cidades importantes, como Beira e Quelimane.
 A “despartidarização” dos órgãos de representação local nos distritos (rurais)
também tem jogado a favor da Frelimo.
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 As autarquias funcionam, mas não englobam o território todo. Isto é uma das
razões pelas quais o Estado não investe toda a sua energia em melhorá-las. Em
muitas vilas, a administração local do Estado sobrepõe se às autarquias e fica
difícil determinar as respectivas funções, competências ou o relacionamento
hierárquico (Weimer 2012b).
 A corrente “aliança” entre a Frelimo e as autoridades tradicionais tem
contribuído para forte dominação da Frelimo, e o enfraquecimento constante
da oposição partidária nas zonas rurais.
Gradualismo alternativo: Um modelo para Angola?
O Ministro de Administração do Território em Angola, Bornito de Sousa, foi citado nos
media após um discurso que fez no Bailundo, em Outubro de 2012:
Uma ideia é de que deveríamos escolher um conjunto de municípios e cidades, começar
por aí e avançar progressivamente. Outra ideia diz que uma vez que temos dois anos
pela frente, porque não prepararmos tudo e fazermos tudo de uma única vez?
A sua resposta parece ir no sentido do gradualismo:
...a própria Constituição aponta para um sentido de alguma prudência, o que não
exclui naturalmente a realização de experiências-piloto em 2014 ou eventualmente
antes. (Angop, 25 de Outubro, 2012)
A introdução duma reforma grande de maneira gradual faz todo o sentido. A ideia de
seguir um caminho cauteloso, em que se introduza instituições menos complicadas e
que permita a avaliação das primeiras experiências, teria de certeza o mérito de
melhor corrigir erros iniciais do que se tudo se fizesse como um “big bang”.
Depois de definir a nossa problemática, avançámos uma leitura da Constituição que
possa suportar outra conclusão daquela referida pelo Ministro. De facto, há várias
passagens na Constituição que se podem evocar para defender a introdução
simultânea (“universal”) das autarquias, e não gradualmente. Isto não exclui a
possibilidade de avançar gradualmente na transferência de funções.
Recentemente, o processo de desconcentração em Angola tem gradualmente
fortificado os municípios como órgãos de administração local do Estado (Santos
2012b). Embora a Constituição não fale da administração municipal – esta parece
constar nos planos do Ministério da Administração do Território. Até hoje, não foi
clarificado se alguns municípios vão ser convertidos em autarquias, com todo o seu
território – e assim essa administração municipal é extinta ou, alternativamente,
continuam, e assim existem quatro possibilidades:
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1) Coexistência completa: A administração municipal vai continuar a existir, enquanto
divide os recursos, património, quadros, funções e competências com a autarquia
dentro do mesmo território;
2) Coexistência parcial: a situação de Moçambique, onde a administração municipal
cede uma parte do território para a autarquia que toma conta da maioria dos
serviços públicos. A administração municipal continua a administrar as zonas rurais
e ainda mantém a responsabilidade para certos serviços dentro da área autárquica
(por exemplo, as escolas primárias);
3) Separação: o território da autarquia é separado completamente do município e
passam a ter uma jurisdição cada;
4) As autarquias constituem-se como entidade governante dos municípios e a
administração municipal do Estado desaparece, nos termos da Constituição de
2010, passando este a administrar a província no seu conjunto e dentro das suas
competências.112
Seria útil para o debate sobre as autarquias em Angola se o MAT pudesse propor um
modelo, ou modelos alternativos para a autarquização. Um debate mais concreto de
certeza ajudaria a implementar a reforma e minimizaria as margens de erro.
Há toda a razão de chamar atenção para as lições de Moçambique. É que, se a
administração municipal vai continuar a existir, vai sobrepor-se às autarquias como em
Moçambique? Quem vai mandar na autarquia, o administrador municipal ou o
Presidente da Autarquia? Levantam-se uma série de problemas de coexistência que
terão de ser resolvidos.
Mais grave ainda e o ponto mais importante deste artigo é o facto do gradualismo
geográfico na introdução das autarquias parecer levar, na teoria e na prática, para a
bifurcação do Estado. Assim como vimos em Moçambique, isto privou uma grande
parte dos cidadãos rurais da possibilidade de eleger a sua liderança local através do
sufrágio universal – e de ter os mesmos direitos e deveres perante a Constituição e a
lei, porque, enfatizamos os residentes nas zonas rurais são igualmente cidadãos. A
Constituição de Moçambique introduz a inconsistência de considerar que todos têm os
mesmos direitos políticos e civis, enquanto a população rural não pode participar nas
eleições locais. Será que a Constituição de Angola permite isto? A Constituição
angolana parece incluir outra dúvida, relacionada com o papel dado às autoridades
112
Pode-se dizer que é isto que já acontece, nos termos da nova repartição de competências entre o
município e a província, nomeadamente em relação a concessão de terra. Actualmente os
administradores municipais somente estão autorizados a conceder terrenos não superiores a mil metros
quadrados (tendencialmente para habitação) enquanto compete ao governador autorizar a concessão
de terras para exploração económica superior a mil metros quadrados, quando no passado, os
administradores municipais tinham competência para autorizar a concessão de terra para exploração
produtiva até cinco hectares.
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tradicionais nas zonas rurais, a quem, segundo um dos autores da própria Constituição,
vão gradualmente serem transferidos mais poderes e competências.
O gradualismo não deve servir como uma “desculpa” para adiar a clareza sobre o
modelo a adoptar, respondendo-se se vão ou não as zonas rurais serem incluídos nas
autarquias num futuro previsível? Vão andar na direcção da integração e assimilação
ou vão se separar administrativamente sob liderança dos sobas – assim emulando o
período colonial?
Avaliámos em cima os problemas associados às duas formas de gradualismo, assim a
sua experiência em Moçambique. É, portanto, possível propor um modelo alternativo,
baseado em princípios simples como os descritos a seguir. Para evitar a bifurcação do
Estado e a tendência de separação rural/urbano, introduzir-se-ia um modelo de
autarquização “gradual” e “universal”. Isto significaria a aplicação dos seguintes
princípios:
1. Universalismo geográfico: As autarquias introduzem-se simultaneamente em todo o
país, o que significa fazer eleições locais em que todos os angolanos possam votar.
Assim, nenhum cidadão vai ser desprovido dum direito fundamental e importante,
consagrado na Constituição (direito de sufrágio, artigo 54º, CRA).
2. Gradualismo funcional: Por existir uma grande variação e diversidade em Angola
(como em quase todos os países) – capacidade fiscal, actividades económicas, quadros
nos serviços públicos, densidade populacional, escolaridade e alfabetização – cada
autarquia receberia uma dotação financeira do Estado que corresponde às suas
capacidades e às competências a ela transferidas. Certas competências, como por
exemplo a embelezamento de espaços públicos, recolha de resíduos sólidos,
bibliotecas, construção de escolas primárias (não as despesas correntes), podem
certamente ser transferidas imediatamente para todos os Executivos Autárquicos.
Outras competências tipicamente de responsabilidade local – como a canalização de
água, pavimentação de vias principais, iluminação pública, policiamento local – são
possivelmente fora do alcance de muitas autarquias rurais, mas dentro da capacidade
de gestão dos governos locais das cidades maiores.
3. Balanço entre o Executivo eleito e a Administração Autárquica. O gradualismo tem
sido, em Moçambique, como acima argumentado, deve-se evitar a “politização”
completa da administração autárquica. Isto para evitar as descontinuidades que se
apliquem se toda a assembleia autárquica e o Executivo são trocados após eleições. É
importante manter uma capacidade técnica que sustente a autarquia e os seus
serviços, enquanto a direcção geral é dos políticos. Segundo, assim sendo, “perder”
uma autarquia não vai constituir um “desastre” para o partido perdedor, pois apenas
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um número pequeno dos seus quadros é dependente de empregos no Executivo. Vai
se habituando que a essência da autarquia é um órgão público que serve os cidadãos
locais, não “pertence”, de nenhuma forma, ao partido que a governar. Pelo contrário,
a autarquia é permanente, enquanto o seu Executivo vai ser temporariamente
ocupado por políticos de cores variadas.
Certamente, em Moçambique há os que argumentam que uma autarquia (com altos
níveis de autosuficiência e autonomia) só se pode organizar onde existir capacidade
sócio-económica, administrativa e financeira para suportar a autarquia. Mas mesmo
em Moçambique, não há autarquias que sobrevive sem apoio do Estado central de
qualquer maneira, e porque é que não deveriam contar com o apoio financeiro e
técnico do Estado? E ainda, o que é que sugere que um governo não eleito produz
resultados melhores na sua governação que um edil eleito?
Embora a bifurcação do Estado, o pluralismo legal e a diversificação governativa entre
as zonas urbanas e as zonas rurais provavelmente vai continuar em Angola por muito
tempo, uma autarquização universal – embora gradual – teria a vantagem de travar a
tendência de bifurcação.
As vantagens são ainda a possibilidade de estender o direito de eleger os políticos que
governam localmente para toda a população. Os governantes menos populares,
incompetentes ou ineficientes poderiam ser removidos através do voto. Ainda cria a
possibilidade de que partidos da oposição possam ganhar uma ou outra autarquia e
assim ganhar experiência importante para governar. Se a população não gostar de
nenhum dos partidos, podem também apostar em listas de cidadãos que se organizam
localmente.
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CEIC – 10 ANOS DE REALIZAÇÕES
Regina Santos
Economista
Investigadora do CEIC
A Universidade Católica de Angola (UCAN) foi constituída, a 22 de Fevereiro de 1999,
contando, nesse momento, com quatro licenciaturas, ministradas pelas Faculdades
seguintes-- de Economia e Gestão, de Direito, de Ciências Humanas e de Engenharia de
Informática.
Cedo foi compreendido que a missão académica e científica da UCAN não poderia
deixar de ter em conta a existência de um centro de estudos e investigação, voltado
para o meio académico e para a prestação de serviços à comunidade, autónomo de
qualquer uma das Faculdades existentes, mas em estreita ligação com elas,
nomeadamente com a Faculdade de Economia e Gestão, e possuindo autonomia
financeira e administrativa.
Foi assim que, a 6 de Março de 2002 e por Despacho do Magnífico Reitor Dom Damião
Franklin, se criou o Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade
Católica de Angola.
De acordo com os seus Estatutos, o Centro de Estudos e Investigação Científica
(abreviadamente CEIC) é um local de investigação e de prestação de serviços, sem fins
lucrativos, visando, sobretudo, fomentar a investigação científica fundamental e
aplicada. Para além disso, ele pretende incentivar a investigação nos campos
económico, social, cultural e histórico, procurando articulá-la com uma visão
pluridisciplinar. Assim, ele, apoia a UCAN, não só a desenvolver o seu potencial de
investigação e de ensino, mas também a contribuir para o desenvolvimento das
capacidades nacionais na área da formulação e da avaliação de políticas públicas e de
estratégias de desenvolvimento.
Os membros do CEIC podem ser docentes da Universidade Católica de Angola que
pretendam participar na sua actividade, bem como docentes e investigadores de
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instituições académicas e/ou de pesquisa, nacionais ou estrangeiras, com trabalho
relevante sobre as realidades, angolana, africana e mundial.
O CEIC, enquanto instituição vocacionada para a investigação e a promoção de estudos
sobre a realidade nacional, assume um carácter independente, aberto à franca
discussão na abordagem ampla de temas.
Para levar a efeito estes objectivos, o CEIC dispõe de um orçamento próprio,
resultante, em simultâneo, de receitas, provenientes da captação de financiamentos
obtidos através de parcerias com instituições privadas ou públicas, nacionais e
estrangeiras e de vendas das suas publicações, mas ainda de apoios pontuais.
O Centro tem instalações próprias no edifício da Universidade Católica, contando com
pessoal qualificado e uma infra-estrutura técnica moderna para o suporte das
actividades que tem desenvolvido.
Apesar de no momento da sua constituição se ter nomeado um corpo directivo,
composto por um director executivo e um director académico (que solicitou o seu
afastamento menos de um ano após a sua nomeação) não existiam condições para
que se estruturasse uma actividade sustentada de investigação e pesquisa. Um novo
director académico foi nomeado, mas quer a sua actividade, quer a do director
executivo exercia-se em tempo parcial.
Nos dois primeiros anos, o CEIC teve portanto de se organizar, de iniciar o seu
trabalho, para isso, contou nessa altura com colaboradores interessados na
investigação, confiando também na vontade de outros profissionais que durante um
tempo não manifestaram essa preocupação, desejada pelo CEIC. Por conseguinte,
viveu-se durante esse período uma fase de implantação e de reconhecimento, não só
do potencial próprio, como igualmente dos recursos disponíveis e, ainda nesse âmbito,
da estratégia seguida pela direcção da UCAN.
Mas mesmo assim, em 2003 foi possível lançar o “Projecto Palanca Negra”, que
almejava ao tempo demonstrar a sobrevivência deste símbolo nacional após o conflito
armado. Esse trabalho, que conseguiu eco internacional, traduziu- se na publicação de
um Relatório.
As actividades do CEIC foram inicialmente financiadas por subsídios da GTZCooperação Alemã para o Desenvolvimento. Entre 2004 e 2006, o CEIC beneficiou de
um importante financiamento da Agência Americana para o Desenvolvimento - USAID,
operado através do Fundo de Assistência à Educação para Angola-AEAF que permitiu
começar a pensar-se na estruturação do CEIC em termos mais efectivos e duradouros.
Foi durante este período, que a Reitoria nomeou uma directora executiva a tempo
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inteiro e se começou a admitir pessoal com alguma experiência no domínio da
investigação.
De 2004 a 2007, o Centro foi-se estruturando e organizando, deste modo, ele
desenvolveu trabalho e ganhou visibilidade, portanto, ganhou solidez e qualidade de
trabalho, assegurados por um corpo permanente de investigadores dedicados
exclusivamente à sua actividade e apaixonados pelo projecto em si e por aquilo que
ele representava – o pioneirismo da cultura da investigação em ciências sociais no
nosso país.
Desde a sua criação, o CEIC evoluiu em diversos planos, tendo em conta não só a
actividade a realizar, de acordo com os objectivos, o espírito de missão, a visão da
direcção e dos seus colaboradores e a relação com os doadores ou financiadores, mas
também com o contexto económico e social angolano.
Como objectivo central, ele deseja manter vivo o projecto e dar-lhe uma dinâmica
académica e de pesquisa permanentemente actualizada, através do labor a ser
realizado em núcleos de investigação.
Um Centro de pesquisa, como qualquer outra instituição académica, além de técnicos
especializados, necessita do apoio de um secretariado, da organização da
contabilidade e das finanças, para o desenvolvimento da sua actividade e para o
desempenho de tarefas administrativas. Para tal, ele elaborou um manual de
procedimentos, tendo em conta o regime geral de trabalho em Angola, o quadro legal
em vigor sobre a ciência e a tecnologia, a carreira do investigador e o pessoal
administrativo.
Adquiriu, em Dezembro de 2006, um software de contabilidade para assegurar
internamente a elaboração dos balancetes contabilísticos, passando a KPMG, empresa
contratada para o efeito desde Janeiro de 2004, apenas a fazer os Relatórios sobre a
Contabilidade Revista Trimestralmente e um Relatório Final Anual. O CEIC estabeleceu,
também, contratos de prestação de serviços, para a manutenção do equipamento
geral do escritório, com empresas especializadas.
Em 2005, na intenção de estreitar a relação com a Sociedade Civil e com o corpo
docente e discente da UCAN, instituiu-se a realização de um Ciclo Anual de Palestras e
de Conferências com temas diversos da actualidade e ainda a publicação e o
lançamento do Relatório Económico, da Economia da Energia, do Barómetro de
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Conjuntura, assim como outras publicações, livros, brochuras e reflexões. Todo este
material, relativo antes do mais a Angola, foi colocado à disposição do público.
Assim, de Maio de 2005 a Maio de 2007 foram realizadas 24 Palestras e 9
Conferências, a que assistiram 2.531 pessoas.
Em 2005, o Projecto Palanca ganhou grande notoriedade com a obtenção e a
publicação das primeiras fotografias da Palanca Preta Gigante em mais de 20 anos, que
provaram, desta maneira, a sua existência no Parque Nacional da Cangandala. Após
este sucesso, o projecto ganhou novo dinamismo passando a focar-se na conservação
e no estudo do animal.
Foram realizados dois grandes estudos de consultoria, que tiveram impacto sobre
decisões políticas e acções do Governo nos seus programas de desenvolvimento. O
RAAAP, Relatório solicitado pelo MINARS e pela UNICEF e, depois, o Diagnóstico sobre
as Micro, Pequenas e Médias Empresas em Angola para o Programa Empresarial
Angolano (PEA) solicitado pelo PNUD.
No ano de 2006, o Projecto de Conservação da Palanca foi reconhecido
internacionalmente, com a outorga do prestigiado prémio Whitley Award for Nature,
(Prémio concedido a projectos das Ciências da Natureza) recebido pelo coordenador
do projecto das mãos da Princesa Anne de Inglaterra em cerimónia realizada no Royal
Geographic Society em Londres.
Datam de 2007, os primeiros contactos com a Embaixada da Noruega em Angola e os
primeiros financiamentos noruegueses ao CEIC começaram a fluir. Este apoio permitiu
admitir três investigadores a tempo inteiro e a começar a pensar-se num programa
consistente de estudos. E é de 2008, a parceria com o Chr. Michelsen Institute,
instituição norueguesa de pesquisa, com quem o CEIC vem desenvolvendo
importantes projectos de investigação em Angola.
Paralelamente a estas actividades o CEIC promoveu:
 A publicação da Revista Académica da Universidade Católica de Angola
“LUCERE”, com um primeiro número subordinado ao tema do fim do ciclo da
guerra e o início duma fase de paz;
 O estabelecimento duma rede de contactos com Centros de Investigação
congéneres na África do Sul, nos Estados Unidos da América, em Portugal, em
França e no Reino Unido;
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 A instituição duma rede de colaboradores científicos do Centro, constituída por
investigadores nacionais e estrangeiros renomados e instituições de pesquisa
congéneres;
 A realização de ciclos de palestras, para docentes, discentes e público em geral,
sobre temáticas sociais, culturais e económicas de actualidade;
 O estabelecimento dum sistema complementar de financiamento das
actividades do Centro integrado por algumas organizações nãogovernamentais, estrangeiras e internacionais;
 O aprofundamento e alargamento do projecto de investigação ambiental sobre
a Palanca Preta Gigante;
 A publicação trimestral do Barómetro de Conjuntura;
 O lançamento de pesquisas no domínio da interconexão culturadesenvolvimento-modernidade;
 O lançamento de dossiês, livros e brochuras sobre temas variados.
Para o prosseguimento e consolidação das suas actividades, O CEIC tem contado com o
apoio financeiro e institucional dos seus parceiros habituais de doadores,
nomeadamente, a Embaixada da Noruega.
O programa de parceria com o Christian Michelsen Institute foi assinado em Junho de
2008 na Noruega e teve um primeiro período até 2010.
No programa estiveram contemplados 17 projectos divididos nos seguintes domínios:




Aumento da Capacidade Administrativa e de Investigação do CEIC
Paz e Democracia
Gestão das Finanças Públicas
Sector Privado e Pobreza
Uma das vertentes desta parceria incidiu no reforço da capacidade administrativa do
CEIC em aspectos relacionados com o manual de procedimentos contabilísticos, no
processamento de honorários, no modelo de elaboração das folhas de presença
(timesheets) e das folhas de rentabilidade (timerecords) dos investigadores em cada
projecto, bem como, mais importante, ainda no modelo de monitorização e de
avaliação dos progressos e de resultados das actividades de cada projecto do CEIC.
Outros projectos, neste domínio, recaíram no ICT e no WEBSITE, de acesso fácil e
rápido à internet e, ademais, na criação da intranet e do website do CEIC.
O âmbito de acção alargava-se e, ao mesmo tempo, aumentava a inquietude de fazer
corresponder a expectativa dos seus principais contribuidores de fundos e a da
sociedade angolana em geral, relativamente às competências e potencialidades do
CEIC.
140
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O CEIC está, neste momento, organizado em Departamentos de Pesquisa e quer ainda
expandir Núcleos anteriores, designadamente, o Departamento de Estudos
Económicos, o Departamento de Estudos Empresariais, o Departamento de Estudos
Sociais, o Departamento de História e Cultura, o Departamento de Conferências e
Palestras e o Departamento de Administração e Finanças. Cada um dos
Departamentos tem um Coordenador.
Como trabalhos mais relevantes de cada Departamento podem destacar-se:
Departamento de Estudos Económicos
O Relatório Económico de Angola foi o primeiro grande resultado da pesquisa
económica e social desta área de pesquisa.
Outros resultados:
 Relatório Económico Anual desde 2002, lançado em Outubro de 2003 e
ininterruptamente nestes 10 anos
 Base de Dados sobre a economia angolana
 Modelo econométrico sobre a economia angolana
 Barómetro de Conjuntura que é um indicador que mede o ambiente de fazer
negócios no país, particularmente em Luanda.
 Relatório de Energia em Angola que visa dar resposta à necessidade de uma
abordagem económica científica para sustentar o processo de desenvolvimento
de um sistema energético integral, seguro e sustentável.
 Observatório das Relações Angola-China: recolha, sistematização e actualização
de informação e apoio a estudantes estrangeiros em acções de mestrado e
doutoramento sobre o assunto, publicação de um ensaio específico
(workpaper) e a participação no Livro a ser editado em Julho: China&Angola a
Marriage of Convenience?
Departamento de Estudos Empresariais
Espera-se que, cada vez mais, a economia angolana se estruture na base dum sector
privado, competente, competitivo, presciente, empreendedor e com responsabilidade
social.
Principais realizações deste departamento
 Relatório Anual GEM Angola, projecto em parceria com a SPI (Sociedade
Portuguesa de Inovação) e o BFA. Melhor conhecimento sobre o nível de
empreendedorismo em Angola e sua comparação com outros países, bem
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como, principais barreiras e limitações das pequenas e das médias empresas
em Angola.
 Acções de Formação em Empreendedorismo
Departamento de Estudos Sociais
A sua missão é pesquisar as questões sociais relevantes para as condições de vida da
população. Actividades:
 Relatório Social de Angola que pretende apresentar uma análise, a mais
detalhada possível, da situação social do país a partir de indicadores
estatísticos, dados sistémicos e análise conjuntural.
 Pobreza no Meio Rural com o relançamento do projecto sobre a pobreza no
meio rural, com o estudo de um município da província do Uige.
 Pobreza, Água e Saneamento, Livro publicado em 2011
Departamento de História e Cultura
Grande projecto de pesquisa intitulado “História Económica de Angola no período
contemporâneo 1850 -1975”
 A primeira parte deste projecto propõe-se fazer o levantamento e a
classificação das fontes, nos principais arquivos disponíveis em Portugal e em
Angola, relativas à História Económica de Angola de meados do século XIX à
independência.
 A segunda parte será a elaboração de dois volumes de História Económica de
Angola com estudos sectoriais de maior fôlego ou, quando possível, de cariz
macroeconómico. O Primeiro Volume de 1850 a 1930 e o Segundo Volume de
1930 a 1975.
Departamento de Ambiente
Actualmente e com a entrada em cena de outros parceiros, o Projecto Palanca passou
a concentrar-se essencialmente em acções de investigação científica associadas à
conservação deste antílope emblemático para Angola. Neste contexto, o coordenador
está a desenvolver uma Tese de Doutoramento sobre a biologia da Palanca, ao passo
que a assistente do projecto terminou já uma Tese de Mestrado acerca do tema.
O Departamento dedica-se à pesquisa científica relativas à ecologia, à genética, à
geofagia, à reprodução, às técnicas de inventariação e à detecção remota aplicadas à
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palanca. Para além do trabalho citado, ele possui igualmente um sector consagrado à
ornitologia.
Departamento de Conferências e Palestras
As Conferências e Palestras são realizadas com a finalidade de se debaterem temas
relevantes, actuais, oportunos e de conteúdo científico. Elas propõem-se a envolver
em debates as mais diferentes personalidades da vida intelectual de Luanda e
procuram incentivar os alunos da UCAN a fazerem da pesquisa e a aumentar o seu
acervo de conhecimentos científicos e práticos. Aliás, isto tem como alvo, instigar a
uma atitude de estudo permanente. Tem-se alargado o leque de temas e de
intervenientes, convidando, para esse fim, instituições quer nacionais quer
estrangeiras de elevada reputação.
Departamento de Administração e Finanças
Tem como principais funções a gestão financeira e de projectos dos diversos
departamentos, bem como, de administração, logística e de apoio aos diversos
membros do CEIC e seus parceiros de investigação.
Preparação do Relatório e Contas e produção de informações financeiras que possam
influenciar as decisões dos doadores com a máxima eficácia e eficiência.
Actualmente o CEIC tem as seguintes Publicações:
Relatório Económico, Relatório Social e Relatório da Energia.
Revista Académica LUCERE,
Barómetros de Conjuntura.
Pobreza no Meio Rural (Caderno)
Colectânea de Teses de Mestrado
Cadernos Literários – Literatura angolana do séc. XIX
Pobreza, Água e Saneamento Básico
Opiniões e Reflexões
Introdução à Economia Internacional e Integração Regional
Desigualdades e Assimetrias Regionais em Angola – Os factores de Competitividade
Territorial
Finanças Públicas
“Expedição à Palanca Negra Gigante” 2003
“A Redescoberta da Palanca Negra Gigante” 2006
Tese de Mestrado da Assistente do Departamento de Ambiente
Publicações CEIC/CMI
MODUCAN – Modelo de Previsão Econométrica
Infraestruturas num contexto Regional
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
Mitos e Percepções Sobre as Empresas Chinesas entre Trabalhadores Angolanos
Fortificando as barreiras contra a corrupção na infraestrutura pública em Angola Relatório a publicar
Why Collect Local Taxes in Oil Rich Angola?
Angola Political Parties.
Efeitos das Eleições em Angola
Sistema Parlamentar - Presidencial ou Presidencialismo Extremo?
Dez Desafios na Construção Pública - Caderno
A Dupla Derrota: Como o Financiamento Público dos Partidos Políticos contribui para
um Ciclo Vicioso para os Partidos da Oposição em Angola
O que Faz um Grupo de Crédito Funcionar?
Grandes Desigualdades Regionais nos Serviços de Saúde em Angola
Reformas ao Processo Orçamental e Gestão das Finanças Públicas de Angola, A crise
foi um sinal de alarme?
O CEIC em 2011 foi convidado pela Universidade Lusíada, Pólo de Benguela a
apresentar o RE e o RS de Angola. Com a ADRA estabeleceu uma parceria para difundir
em Benguela, Huambo e Huíla os Relatórios e outros produtos do CEIC.
Neste momento, um importante projecto está a ser levado a cabo entre o CEIC e o CMI
sobre a Diversificação da Economia Angolana cujas primeiras abordagens estão já
espelhadas no Relatório Económico que aqui se apresenta.
Em 2012 irão continuar os esforços tendentes a que o CEIC ultrapasse as estreitas
fronteiras do espaço territorial angolano e mesmo lusófono, para se projectar, com
mais propriedade, para outras paragens, dando a conhecer a realidade nacional e a sua
capacidade de conhecimento da mesma.
Os vectores de internacionalização do CEIC são vários, mas para os seus propósitos são
seis: a língua inglesa, a melhoria da capacidade de pesquisa, trabalhos conjuntos com
instituições congéneres estrangeiras, participação em conferências internacionais,
publicação de artigos em revistas/jornais estrangeiros e a publicação de boletins
informativos (newsletters).
Agora cabe-nos identificar alguma da problemática que nos preocupa
Quais as possíveis Ameaças?
Falta de Recursos Humanos – Professores, Investigadores qualificados em regime de
exclusividade;
144
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
Falta de dedicação e de qualidade do Ensino;
Existência de outras Universidades a poder oferecer um serviço equivalente;
Surgimento de projectos mais bem apetrechados e providos de estratégia, estrutura e
sustentação mais sólida.
Fim do apoio financeiro
E Quais os seus Pontos Fortes?
Inovação e Dinâmica;
Organização, estrutura, processos de trabalho e RH qualificados, motivados e
dedicados ao projecto;
Reputação da UCAN
As Faculdades, os Cursos, as realizações, a actividade, os produtos, e os resultados;
Interesse do mercado e da sociedade em geral pelos produtos do CEIC (publicações,
estudos, palestras, conferências);
Possibilidade de disseminação de informação actualizada resultante dos artigos de
investigação, comunicações, palestras e conferências, através da instauração de um
website dinâmico.
Parceria com instituições fortes e reputadas;
Desenvolvimento da cultura do ensino com qualidade e princípios e centrada na
pesquisa;
Sustentação do projecto em objectivos bem delineados e delimitados.
Agradecimentos
São devidos vários agradecimentos:
 Ao Magnífico Reitor da UCAN, que sempre incentivou e apadrinhou a
actividade do CEIC, e o tem considerado uma das bandeiras da qualidade da
UCAN.
 Aos Fundadores do CEIC, Magnifico Reitor, Dr. Carlos Leite, Dr. Emílio Grinõn,
Dr. Adão Avelino, Dr. Ennes Ferreira, Dr. Alves da Rocha e Dr. Justino Pinto de
Andrade.
145
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
 Ao Monsenhor José Manuel Cachadinha pelo apoio constante, pelas sugestões
pertinentes, pelas referências elogiosas ao trabalho dos seus investigadores,
colaboradores e administrativos.
 Aos financiadores, sem o apoio dos quais a sua actividade permanente não se
teria concretizado, nomeadamente USAID/Embaixada dos EUA e Embaixada do
Reino da Noruega.
 Aos financiadores de projectos de pesquisa concretos, como a Fundação Open
Society, a Fundação Friedrich Ebert, a GTZ, a World Learning, o FIDA, a
Embaixada de Portugal em Angola, o BNA, o BFA, o BNI, a ENI, a Statoil, a ESSO,
a Total, a Associação do Bloco 15, a Endiama, o BAI, o Ministério das Finanças e
o Ministério do Urbanismo e Ambiente.
 Aos investigadores colaboradores do Centro de Estudos e Investigação
Científica.
 Aos investigadores permanentes do CEIC e a todos os seus membros.
 Aos dois primeiros directores executivos – Emílio Griõn e Noelma Viegas
D'Abreu e ao primeiro director académico Professor Ennes Ferreira.
 Aos demais departamentos da UCAN que têm colaborado com o CEIC
A Finalizar
A preocupação fundamental do CEIC/ UCAN é poder contribuir de algum modo para:
 O desenvolvimento da cultura de investigação e da pesquisa fundamental;
 O aumento e actualização da qualificação e da formação de Professores e
Investigadores da UCAN;
 Contribuir para o aumento do saber, da formação e da especialização de
profissionais;
 O Diálogo e a troca de conhecimentos e de cultura, em áreas importantes para
a UCAN e para a sociedade angolana.
Foram estabelecidas parcerias importantes com Instituições que o reconhecem como
um parceiro respeitável e com quem se está a realizar trabalho com visibilidade, são
exemplos: O Christian Michelsen Institute (CMI) com protocolos no período 2008-2010
e seguinte período de 2010-2013; O Center For Energy Economics (CEE) da Houston –
Texas University com um acordo para a elaboração conjunta do Relatório sobre a
Energia; O Centro de Estudos Africanos (CEA) do ISCTE – Portugal –, o IRD – Institute de
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
Recherche pour le Développment, a Chattam House, a Universidade de Durham, a
Open Society Angola e o Codesria.
O CEIC recebeu congratulações de pessoas a título individual e em nome de
Instituições do Estado Angolano, do corpo diplomático acreditado em Angola, venceu
o Whitley Award e é referenciado em vários Relatórios elaborados por Centros
congéneres, Universidades, Organizações não-governamentais e foi motivo de artigos
elogiosos na imprensa nacional e estrangeira.
Até ao momento, o CEIC demonstrou eficiência, interesse e resultados mensuráveis
através dos produtos já publicamente apresentados.
A UCAN foi pioneira no ensino privado superior e tem a oportunidade de o ser ao nível
da investigação académica. Por estas razões, acreditamos na importância e no papel
do CEIC e consideramos ser necessária competência e vontade por parte daqueles que
estão envolvidos na obra de construção e continuidade do trabalho deste Centro, além
naturalmente de uma visão estratégica por parte da Reitoria da UCAN.
Ao longo do tempo e do trabalho desenvolvido no Centro, a atracção de Instituições
que manifestaram o seu interesse em serem parceiras da UCAN e do CEIC e de
académicos que usaram o CEIC como instituição de suporte e de consulta das suas
pesquisas, dão-nos a confirmação de que é oportuna a existência do Centro e é
possível desenvolver um trabalho sério e útil na sociedade angolana.
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Eficiência e limites da autoformação profissional e autoemprego No bairro da
Sanzala em Viana
Julien David Zanzala (PhD)
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas / UniPiaget
Resumo
Esta pesquisa pretende verificar a relevância, eficiência e limites da autoformação
profissional e autoemprego na economia informal no bairro da Sanzala em Viana. No
primeiro capítulo define-se e discute-se o conceito de Autoformação profissional sua
relação com a autoemprego e apresenta-se um corpus teórico, na perspectiva de
fundamentar a pesquisa. Aplicou-se um questionário a 200 pessoas que assinalam as
profissões que assumem, a forma como adquiriram a experiência profissional e quais
as razões que determinaram a ocupação de muitas profissões. A pesquisa confirma a
hipótese científica: A autoformação profissional e autoemprego no bairro da Sanzala
em Viana têm bastante relevância no emprego informal. As dificuldades do sector
público em promover o pleno emprego, as desigualdades de acesso ao mercado de
trabalho, a pobreza e os baixos rendimentos estimulam as pessoas a redimensionarem
constantemente as suas qualificações que combinam com a ocupação de muitas
profissões. No entanto, essas alternativas não garantem rendimentos seguros, o que
convida a reflectir se os esforços públicos ou privados visando combater a pobreza e a
desigualdade não deverão ser orientados para o trabalho assalariado.
Palavras-chave: Autoformação profissional; Autoemprego; Rendimentos;
Desemprego.
1. Introdução
O desemprego estrangula hoje todas as economias modernas e tem sido, em grande
medida, a discussão quotidiana nos bares, nos lares, nas empresas, na média, na
academia nos parlamentos e na sociedade civil como um todo. É uma das realidades
contemporâneas presentes em economias desenvolvidas como em vias de
desenvolvimento, trazendo argumentos para refutar as teorias clássicas do
desemprego voluntário. As suas dramáticas consequências psicológicas, económicas e
148
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sociais são objecto de análises em vários fóruns. Nas economias em vias de
desenvolvimento, tem contribuído muito para a expansão do sector informal que por
seu lado permite a formação de rendimentos de remedeios.
As estratégias de sua redução encontram-se formuladas tanto a nível das instâncias
internacionais como do governo central ou local. Existem ainda estratégias familiares
ou individuais de saída. E estas são várias no contexto de baixo nível de escolarização,
falta ou fraca formação profissional, pobreza generalizada, restrições orçamentais e
políticas sociais selectivas. A autoformação profissional e o autoemprego são algumas
que são referenciadas na análise económica. A outra estratégia decorrente das duas
primeiras é a ocupação ou exercício de várias profissões cuja emergência tem sido
percebida em Angola tanto na economia formal como informal. Sendo a economia
informal segmentada, há evidências de no seu seio existirem diferenças de rendimento
(Mosca;2010). Quando se pretende aumentar os rendimentos, parece ser necessário
combinar as três estratégias. Procura-se de certo modo valorizar um conjunto de
saberes práticos nem sempre certificados, adquiridos geralmente em acções de
formação de curta duração ou directamente no terreno. Mesmo quando certificados, a
sua qualidade não facilita um reconhecimento generalizado. Por fim, convém assinalar
que não se regista uma literatura abundante sobre os custos destas estratégias, os
seus benefícios e a sua contribuição real na formação do rendimento nacional. Qual a
relevância destas estratégias e qual a sua eficiência no contexto informal angolano?
Para dar um contributo a este grande debate pretendeu-se desenvolver esta pesquisa
que tem como objectivo geral verificar a relevância, eficiência e limites da
autoformação profissional e do autoemprego no sector informal no bairro da Sanzala
do município de Viana (Luanda). Apostar neste tipo de pesquisa possibilita estabelecer
critérios mais consistentes de selecção para programas de apoio ao autoemprego,
melhorar a eficiência desses programas e aprimorar o monitoramento dos seus
resultados.
2. Breve resenha da literatura sobre autoformação profissional e autoemprego
A autoformação é um dos modelos que emerge com grande significado no cenário
actual do mercado de trabalho em que “formar-se em” não significava mais “tornar-se
profissional em”. Pois, as novas tecnologias hoje facilitam e agilizam determinadas
tarefas e os trabalhadores se defrontam-se com exigências de aquisição de habilidades
e atitudes, sob risco de obsolescência inexorável. Na perspectiva de Pineau, citado por
Couceiro (1992), compreende-se como processo de apropriação completa do seu
poder de formação, o processo através do qual a pessoa constrói seus conhecimentos,
desenvolvendo habilidades e valores a partir de experiências próprias. É um processo
que se desenrola ao longo do tempo e que se traduz numa dupla apropriação do poder
149
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de se formar. Dupla apropriação porque a pessoa, unidade central neste processo, é
simultaneamente chamada a ser agente da sua formação e a ser ela própria sujeito
dessa formação. Autoformar-se é formar-se. É "dar-se uma forma" (Couceiro;1992). De
acordo com Demaizière (1996), a autoformação é uma nebulosa galáxia, um conceito
ou uma prática com perímetro variável. A sua massiva aparição é corolário da
introdução das novas tecnologias de informação e comunicação nos processos de
aprendizagem ou, mais especificamente, do surgimento, nos anos 70 e 80, das
formações assistidas por computadores. Deste modo, toda a inovação propondo uma
forma de individualização ou utilizando a informática é qualificada de autoformação.
Para Albero (2003), quatro factores socioeconómicos promovem esta modalidade: o
aumento e a diversificação dos públicos estudantis, a rápida evolução tecnológica nas
diversas tarefas, a pressão internacional sobre o desenvolvimento do espaço numérico
e o apoio político aos programas de formação ao longo da vida. Quando aplicada ao
mercado de trabalho, ela permite fazer face aos desafios profissionais. Pois, os
empregadores esperam que os empregados descubram por si próprios como melhorar
e agilizar o seu próprio trabalho, de modo que estes precisam analisar situações,
pensar criativamente e solucionar problemas, fazer perguntas e esclarecer o que não
compreendem para poder sugerir melhorias de maneira constante e contínua (Lobo da
Fonseca; 2005). O que se verifica é uma constante reavaliação do ambiente,
autoavaliação pessoal e profissional, estabelecimento de metas e busca ou
aproveitamento das oportunidades de melhoria e criação de microempresas. A
autoformação contribui para ampliar a visão sobre as oportunidades de trabalho. No
contexto da pobreza e do desemprego, ela estimula frequentemente uma atitude
empreendedora ou de autoemprego. Quando recebe incentivos dos governos e
instituições de diferentes tipos, insere-se numa lógica socioeconómica de criação de
emprego e renda.
No que diz respeito ao conceito de autoemprego, Pamplona (2002) observa que não se
encontra ainda na literatura especializada uma definição precisa e padrão. Pela
heterogeneidade da situação de autoemprego, há dificuldades em estabelecer uma
distinção consensual entre emprego e autoemprego. Assim, diferentes expressões têm
sido usadas como equivalentes do autoemprego: trabalho autónomo, trabalho
independente e auto-ocupação. Para alguns autores rigorosos, o conceito de emprego
assume o sentido estrito de trabalho assalariado, portanto não seria lógico falar de
autoemprego. Porém, de acordo com a concepção apresentada por Marx, o
trabalhador independente é uma espécie de “patrão de si mesmo” que “autoempregase como assalariado”. De acordo com Pamplona (idem), o conceito é bem consagrado
na literatura e tem algumas características consensuais: independência, autonomia e
controlo sobre o processo de trabalho (actividade em si, matérias-primas, meios de
150
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
produção). O autoemprego é visto como situação em que o proprietário dos meios de
produção participa directamente da actividade produtiva; com a renda não
previamente definida, porque depende do trabalho, do capital e da demanda directa
do mercado de bens e serviços; com o objectivo primordial de prover seu próprio
emprego (meio de subsistência) e não valorizar seu capital (acumulação de capital).
Além disso, Pamplona (idem) assinala as duas abordagens, positiva e crítica, do
autoemprego na literatura internacional.
A primeira interpreta-o como um fenómeno socioeconómico predominantemente
promissor, fonte de crescimento económico e de novos trabalhos. É aquela que
acredita que o crescimento do autoemprego resulta de estímulos à oferta, de
incentivos que os produtores passaram a ter, como redução de impostos, novas
tecnologias, novos nichos de mercado, maior facilidade para contratar e demitir e do
espírito empreendedor. É a chamada pull theory.
A segunda considera-o como um fenómeno predominantemente adverso, “solução
para os males do mercado de trabalho”, “manifestação dos males do mercado de
trabalho”, “resultado da crise do assalariamento. Traduziria a queda qualitativa e
quantitativa da oferta de empregos assalariados de tempo integral. Mudanças
estruturais da economia, recessão e desemprego empurrariam as pessoas para o
autoemprego. É a conhecida push theory que vê o crescimento do autoemprego como
um indicador da crescente insegurança do mercado de trabalho.
Análise empírica
Este estudo é essencialmente qualitativo e exploratório. As expressões autoformação
profissional e autoemprego foram usadas na perspectiva de investimentos individuais
autónomos, através das formas alternativas e flexíveis de preparação profissional que
os respondentes julgaram lucrativos empreender para o desenvolvimento de
habilidades, capacidades e comportamentos susceptíveis de aumentar a
produtividade, por um lado, proporcionar rendimentos, por outro. O autoemprego não
corresponde necessariamente a criação de microempresas. As estratégias de
autoformação, autoemprego e exercício de várias profissões formuladas pelos
respondentes do questionário não são baseadas inteiramente em alguma realidade
objectiva de posicionamento competitivo, mas ao contrário, são respostas limitadas às
exigências do mercado.
A presente pesquisa buscou resposta para a questão: Qual a eficiência e os limites da
autoformação profissional e autoemprego na economia informal no bairro da Sanzala
em Viana? Os pressupostos são que quanto mais acções autoformativas o trabalhador
151
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
adquirir, mais polivalente se torna, e ao mesmo tempo, mais eficiente para enfrentar o
mercado de trabalho; Quando não aparece um emprego ou quando os rendimentos
auferidos são insuficientes ou substitutos precários, surge a necessidade de investir em
mais uma formação profissional.
A amostra, objecto de estudo, foi intencional e constituída por 200 jovens que
solicitavam uma formação nos centros do MAPESS de Luanda, no intuito de se
qualificar, entrar no mercado de trabalho, auferir bons rendimentos e melhorar o
desempenho organizacional. Selecionou-se um conjunto de actividades que possuem
um certo potencial para influenciar positivamente o crescimento económico, excluindo
aquelas ligadas à mera sobrevivência. Dentre os respondentes, apenas 2 afirmam
terem uma única profissão; 117 pretendem possuir capacidades em duas profissões,
70 em três profissões e 11 em quatro profissões. Maioritariamente, são pedreiros
(38%) e mecânicos (26%). Os pedreiros, na segunda e terceira profissões são
ladrilhadores (21%), pintores (12%) e canalizadores (12%). Os mecânicos, na segunda
profissão são motoristas (25%). Verificou-se que Relojoaria, Reparação de aparelhos,
Condução, Alfaiataria, Técnica de frio, assim como Carpintaria, Serralharia, Operador
de grua e Jardineiro não foram assinaladas como profissões principais.
Grande número dos respondentes considera-se mestres qualificados (82%),
trabalhadores independentes (87%), polivalentes (75%), com uma elevada capacidade
de trabalho (83%), de adaptação a novos empregos (85%) e de inovação (91%). As
competências foram adquiridas pela autoformação profissional (65%) ou num centro
de formação do MAPESS (55%). Nota-se também que os mestres qualificados, as
oficinas, os familiares e amigos ofereceram algumas formações, respectivamente, a
87%, 70%, 44% e 30% de respondentes. No entanto, 96% dos respondentes sentem a
necessidade de melhorar a qualificação. A maioria concorda haver facilmente
oportunidades para melhorar a qualificação já adquirida. Quanto ao que levou a ter
muitas ocupações: 88% apontam o motivo de garantir um bom rendimento familiar,
89% pretendem garantir a empregabilidade e 88% procuram adequar-se às exigências
do mercado do trabalho. Assim, observa-se que as estratégias de autoformação
profissional e autoemprego no bairro da Sanzala têm muita relevância no emprego
informal. A pobreza, o desemprego e a falta de rendimentos levam a recorrer a estas
estratégias que combinam com a posse de várias qualificações. No entanto, as mesmas
referenciadas como estratégias de saída do desemprego, da pobreza e de formação de
rendimentos apresentam limitações. Devem ser usadas permanentemente. Quando se
pretende aumentar os rendimentos no contexto informal, parece ser necessário
combinar as três estratégias: autoformação, autoemprego e posse de várias
qualificações. Procura-se de certo modo valorizar um conjunto de saberes práticos
nem sempre certificados, adquiridos geralmente em acções de formações de curta
152
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duração ou directamente no terreno. Mesmo quando certificados, a sua qualidade não
facilita um reconhecimento generalizado. A baixa produtividade, a falta de qualificação
e as exigências do mercado de trabalho formal vulnerabilizam estas pessoas. Quando o
emprego não aparece ou quando os rendimentos auferidos são substitutos precários,
exercitarem-se novos ciclos de formação para aprender outras profissões e aumentar a
empregabilidade. Estes ciclos vão aumentando os investimentos e custos de formação
cujos proveitos, a curto e médio prazos, não são garantidos (Gulyani e Talukdar 2010,
Harris-White 2010). Conhecer os custos e benefícios das referidas estratégias poderá
ser objecto de uma futura pesquisa com um tamanho da amostra maior.
Conclusão
Esta pesquisa pretendia verificar a relevância, eficiência e limites da autoformação
profissional e autoemprego na economia informal no Bairro da Sanzala em Viana. No
primeiro capítulo definiu-se e discutiu-se o conceito de autoformação profissional e a
sua relação com a autoemprego e apresentou-se um corpus teórico, na perspectiva de
fundamentar a pesquisa. Aplicou-se um questionário a 200 pessoas que assinalaram as
profissões que assumem, a forma como adquiriram a experiência profissional e quais
as razões que determinaram a ocupação de muitas profissões.
A análise revelou que as estratégias de autoformação, autoemprego e ocupação de
muitas profissões no bairro da Sanzala têm muita relevância no emprego informal, mas
são dispendiosas. Os respondentes redefinem frequentemente suas acções e
experiências profissionais, reavaliando as escolhas, as decisões tomadas e o impacto
das mesmas nos rendimentos. Assim, as referidas estratégias não são eficientes para
sair verdadeiramente da pobreza, amentar os rendimentos ou promover o
desenvolvimento socioeconómico. O facto de os respondentes indicarem uma
disponibilidade para melhorar a qualificação, sugere mais reflexões sobre
autoformação e autoemprego nos bairros desfavorecidos.
Devido da não representatividade da amostra, os resultados postos em evidência
nesta pesquisa não devem ser generalizados. No entanto, interpelam a reflectir se os
esforços públicos ou privados visando a ajudar as pessoas que nesta situação se
encontram não deverão ser orientados para o trabalho assalariado. As futuras
pesquisas deverão utilizar outros métodos, verificar a incidência de outras variáveis
económicas e sociais assim como os custos e benefícios económicos das referidas
estratégias.
153
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
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Referências bibliográficas
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Gulyani, S. Debabrata, T. Inside informality: the links between poverty,
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nº 12, 1710-1726. Elsevier, 2010.
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mercado de trabalho: Estudo de caso. Rev. ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina,
v.10, n.2, p. 207-223, Jan./Dez. 2005.
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Castel-Branco, Sérgio Chichava, António Francisco. Maputo: IESE, 83-98. 2010
Pamplona, J.B. O autoemprego e os determinantes de seu sucesso. Rio de Janeiro.
Fundação Konrad Adenauer. 2002
O Balcão Único do Empreendedor e o Microempreendedorismo
em Angola
Francisco Miguel Paulo
Investigador CEIC
Precioso Domingos
Economista, CEIC UCAN
Factos sobre o Empreendedorismo em Angola
Desde 2008 o Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de
Angola e a Sociedade Portuguesa de Inovação, com o apoio do Banco de Fomento de
Angola, e desde 2010 com o grupo Media nova, publicam bianualmente O Relatório
GEM Angola em parceria com o Global Entrepreneurship Monitor (GEM).
O Global Entrepreneurship Monitor é o maior estudo de empreendedorismo realizado
em todo o mundo. Tem como objectivo analisar a relação entre o nível de
empreendedorismo e o nível de crescimento económico em vários países e,
simultaneamente, determinar as condições que fomentam e travam as dinâmicas
empreendedoras em cada país113.
Este projecto foi iniciado em 1999, com 10 países (numa iniciativa conjunta do Babson
College – EUA, e da London Business School – Reino Unido), e tem vindo a expandir-se,
contando, em 2008, com 43 países, incluindo Angola, que participava pela primeira
vez.
Os dados são obtidos por meio de inquéritos efectuados a população com idade
compreendida entre os 18 e 64 anos, utilizando um questionário padronizado para
113
Relatorio GEM Angola 2008 pagina vii
155
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
todos os países participantes no GEM. Em 2008 em Angola foram inqueridas 1500
pessoas e em 2010 a amostra foi aumentada para 2000 pessoas. O relatório de 2008
foi publicado em 2009 e o de 2010 foi publicado em Junho de 2011.
O índice ou o indicador principal do GEM, ë a taxa de Actividade Empreendedora EarlyStage (TEA), que mede a proporção de indivíduos adultos envolvidos quer num
negócio em fase nascente (negócio que proporcionou remuneração salarial por um
período não superior a 3 meses), quer na gestão de um negócio existente ou novo
(negócio que proporcionou remuneração salarial por um período de 3 a 42 meses).
Os principais resultados destes dois relatórios apresentam o quadro geral do
empreendedorismo em Angola durante o período entre 2008 e 2010.
Quadro Geral do Empreendedorismo em Angola
Características da Actividade Empreendedoras em Angola (%)
Taxa de Actividade Empreendedora Early-Stage (TEA)
Empreendedores de negócios nascentes (até 3 meses)
Empreendedores a gerir novos negócios (de 3 meses a 3,5 anos)
Empreendedores early-stage do Sexo Masculino
Empreendedores early-stage do Sexo Feminino
Empreendedores no Sector Terciário
Empreendedores no Sector Secundário
Empreendedores no Sector Primário
Empreendedores movidos por Necessidades de Sobrevivência
Empreendedores movidos pela Oportunidade de Aumentarem Rendimento
Empreendedores movidos por Outros Motivos
Empreendedores que declaram enfrentarem muita concorrência
Empreendedores que declaram enfrentarem pouca ou nenhuma concorrência
Empreendedores que Desistiram de um negócios nos 12 meses antes Entrevista
Empreendedores que Desistiram por Falta de Lucros
Empreendedores que Desistiram por Razoes Pessoais
Empreendedores que Desistiram por Falta de Financiamento
Dados em branco não disponível no primeiro relatório
2008
22,7
19,3
4,1
20,3
25,2
47,0
16,0
25,0
55,3
6,7
19,4
-
Fonte: Relatório GEM Angola 2008, 2010
Segundo o quadro, em 2008, a taxa TEA em Angola foi de 22,7%, o que significa que
quase 23 adultos em cada 100 estiveram envolvidos em start-ups. A taxa TEA angolana
era a quarta mais alta dos 43 países GEM 2008, ficando acima do dobro da média
destes países (10,5%) e significativamente acima da taxa registada pelos restantes
países africanos participantes neste estudo: Egipto (13,1%) e África do Sul (7,8%).
156
2010
31,9
15,9
16,3
32,9
31,0
85,7
7,1
1,5
42,3
27,1
14,1
53,9
21,8
14,4
32,4
17,6
5,7
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Já em 2010, Angola registou uma Taxa TEA de 31,9%, o que significa que existiam cerca
de 32 empreendedores early-stage (indivíduos envolvidos em start-ups ou na gestão
de novos negócios), por cada 100 indivíduos em idade adulta. A Taxa TEA de Angola,
em 2010, foi a 5ª mais alta do universo GEM 2010 no total de 59 países.
No quadro acima nota-se ainda que a necessidade é o factor que motiva cerca de
metade da actividade empreendedora em Angola (constituindo 47% da TEA em 2008 e
42% em 2010), a seguir vem a oportunidade de aumentar o rendimento que
notavelmente passou de 16% em 2008 para 27,1% em 2010.
No que diz respeito à distribuição da actividade empreendedora early-stage angolana
por sector em 2010, verifica-se que mais de três quartos da mesma (78,6%) se
concentra no sector orientado ao consumidor, que inclui todos os negócios
direccionados para o consumidor final, como o retalhista, bares, restauração,
alojamento, saúde, educação e lazer, entre outros. Seguem-se, depois, o sector da
transformação (12,8%), o sector orientado ao cliente organizacional (7,1%), e, por
último, o sector extractivo, com apenas 1,5%
Em termos de entraves ao empreendedorismo em Angola os aspectos destacados
pelos especialistas entrevistados114 como obstáculos ao fomento da actividade
empreendedora no País foram:
1. Dificuldade de acesso ao crédito (na condição estrutural Apoio Financeiro);
2. Dificuldades das empresas novas e em crescimento obterem a maioria das
autorizações e licenças no prazo de uma semana, fruto da burocracia (na
condição estrutural Políticas Governamentais);
3. O grau em que as infra-estruturas físicas proporcionam um bom apoio às
empresas novas e em crescimento (na condição estrutural Acesso a Infraestruturas Físicas);
4. Falta de qualificação da população (na condição estrutural Educação e
Formação);
5. E as limitações de eficiência e aplicação da legislação anti trust (na condição
estrutural Abertura do Mercado/Barreiras à Entrada).
114
Especialistas ligados ao empreendedorismo em Angola, incluindo líderes do sistema financeiro, funcionários do
governo, académicos e empreendedores de renome.- GEM Angola 2008, 2010
157
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Alguns Programas
empreendedorismo
desenvolvidos
REVISTA ACADÉMICA LUCERE
pelo
Executivo
para
o
fomento
do
Nos últimos anos, o mundo tem dado especial atenção a questão do microcrédito com
vista a promoção do empreendedorismo. Do ponto de vista do investimento, o
microcrédito implica de certo modo a disseminação do risco, evitando naturalmente a
concentração de avultadas somas de capital, num grupo reduzido de agentes
económicos.
Em Angola, o Estado e as instituições financeiras privadas (bancárias e não bancárias),
tem desenvolvido programas e produtos financeiros que estão em sintonia com esta
tendência.
O microcrédito é normalmente entendido como sendo um financiamento com um
limite estabelecido e relativamente baixo, direccionado a pessoas de baixo rendimento
que realizam uma determinada actividade económica no sector informal (ao que após
a concessão do referido microcrédito a passarão a realizar).
Este é um mecanismo que torna possível o acesso ao sistema financeiro, por parte
daqueles agentes económicos (no fundo, o publico em geral) que não tem fundos para
iniciar o seu próprio negócio.
Recentemente, a Executivo angolano, deu passos concretos nesse sentido, apoiando
os agentes económicos no acesso ao crédito. E importante perceber as inúmeras
vantagens que podem resultar deste processo de globalização do acesso ao crédito.
De um modo geral, o agente económico informal realiza uma determinada actividade
económica para sobreviver e fá-lo a margem da lei, sem estar sujeito as obrigações
inerentes a essa mesma actividade (geralmente comercial) e, por outro lado, sem
poder beneficiar dos direitos que possui qualquer agente económico formal. O peso
enorme da economia informal e uma característica muito vincada da nossa economia.
O Executivo angolano, apresentou recentemente o Programa de Desenvolvimento das
Micro, Pequenas e Medias Empresas (PDMPMEs), com o objectivo de potenciar este
sector empresarial. Tal iniciativa, trouxe ao de cima outras debilidades do sistema,
como é o caso da inexistência de um quadro legal que permitisse a execução de
programas do género.
Tem-se dito que é das contradições que surge o desenvolvimento e como não poderia
deixar de ser, foi aprovada a Lei nº 30/11 de 13 de Setembro, das Micro, Pequenas e
Medias Empresas possibilitando assim "a formulação da estratégia e estruturação das
politicas e programas dirigidas as referidas empresas, bem como a criação ou
158
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REVISTA ACADÉMICA LUCERE
capacitação de organismos e instituições com autoridade publica para coordenação e
avaliação permanentes do alcance das politicas a implementar". O referido programa
possibilitara ao Poder Executivo gerir mais um instrumento de promoção de
desenvolvimento económico e social do país. No entanto, não seria sério e nem
suficientemente assertivo, se não se tivesse em conta a necessidade de prestar uma
atenção especial a um sector fundamental, o sector informal.
Para o efeito, o Executivo apresentou também o Programa de Apoio ao Pequeno
Negocio - PROAPEN -, que propicia uma luz ao fundo do túnel aos agentes económicos
que realizam actividades económicas de pequena dimensão, facilitando-lhes o acesso
ao crédito de acordo com a dimensão e natureza do seu negócio. No âmbito deste
programa há ainda a possibilidade de aceder a outras vantagens, nomeadamente um
programa de capacitação profissional dos utilizadores no sentido de obterem
formação enquanto gestores.
O Estado não pode facultar mecanismos de financiamento em condições vantajosas
para o sector informal. Portanto a pergunta seria Como e que estes agentes
económicas informais poderão aceder a programas do género?
Obviamente, tal só será possível se estes agentes económicos procederem a
legalização das suas actividades, o que nas condições actuais (há algumas semanas) só
será possível no Guiché Único de Empresa.
Este serviço, embora necessário, e ainda relativamente oneroso e simplesmente
impossível de utilizar para os micro empreendedores. Só o montante necessária para a
constituição da empresa, pode em muitos casos superar o montante de investimento
que o micro empreendedor necessita, sem falar ainda da própria burocracia que o
processo acarreta.
Para dar consistência e coerência ao programa, o Executivo criou também o BUE Balcão Único do Empreendedor - que e um serviço publico que concentra num único
local diversos serviços administrativos públicos, cuja finalidade e simplificar o processo
de constituição, licenciamento de empresas, regulação de empreendedores que se
encontram no mercado informal e actos conexos115.
O BUE é um serviço tal como definido na lei, mas deve, também, ser entendido como
uma ferramenta (muito importante) do já referido PROAPEN.
Existem três objectivos principais no programa, a saber:
115
Decreto Presidencial nº 40/12 de 13 de Março
159
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 A formalização da actividade económica realizada ou que pretende realizar o
micro empreendedor, a custo zero;
 A possibilidade de aceder a formação gratuita, através do Instituto de Emprego
e Formação Profissional (INEFOP) tutelado pelo MAPESS;
 A possibilidade de aceder ao financiamento (uma parte em kits de trabalho de
acordo com a actividade que realiza ou pretende realizar e/ou 20% do valor do
kit em dinheiro para despesas correntes ou fundo de maneio) através dos
bancos operadores comerciais, nomeadamente o BPC e o BCI, sem necessidade
de dep6sito para abertura de conta.
O primeiro destes três objectivos, só é possível através do crédito BUE, avaliado em
679 mil kwanzas por empreendedor, um prazo de carência de 12 meses à uma taxa de
juros de 2% ao ano e com um prazo de 60 meses (ou seja, 5 anos). O dinheiro é cedido
em forma de material já pago, porém, os utentes recebem entre 5 a 20% do valor em
dinheiro para despesas de fundo de maneio.
Passos necessários para concessão de crédito, constituição e licenciamento de uma
empresa no BUE
1. O Empreendedor que não tenha a sua documentação pessoal em dia deve
dirigir-se em primeiro lugar ao Registo Civil do BUE para tratar do seu Registo
Civil para efeitos de Bilhete de Identidade.
2. Com a Certidão de Registo Civil deve dirigir-se à Identificação Civil e Criminal do
BUE para tratar do Bilhete de Identidade.
3. O Empreendedor deve dirigir-se à U.T.M (Unidade Técnica Municipal) presente
no BUE para ”Entrevista de Avaliação”. Caso a entrevista seja positiva a U.T.M
deverá apoiar o Empreendedor a preencher a Ficha de Negocio e
Documentação, obtendo para o efeitos de concessão de crédito o “ Aval
Moral” do Banco.
4. O Empreendedor dirige-se à área de Atendimento da Administração Municipal
para obter a declaração para efeitos de pagamento de Imposto Industrial.
160
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5. O Empreendedor dirige-se à área de Atendimento do Ficheiro de
Denominações Sociais para preencher o formulário de pedido de Certificado de
Admissibilidade de Denominação Social. Anexar 1 cópia do B.I. do requerente.
6. O Empreendedor dirige-se à área de Atendimento da Direcção Nacional de
Impostos para obter o número de Identificação Fiscal, a Declaração de Início de
Actividade e o Comprovativo de Isenção de Impostos. O Empreendedor que já
possua o Número de Identificação Fiscal deve dirigir-se a Repartição Fiscal de
jurisdição para anular o actual número e declarar as actividades a exercer.
7. Após obtenção dos documentos acima referidos, o Empreendedor deverá
dirigir-se à área de Atendimento do Registo Comercial, para efeitos de
organização do processo e registo do Comerciante em Nome Individual:

Entrega de 1 cópia do Bilhete de Identidade;

Preencher o formulário para efeitos de pedido de registo
comercial.
Documentos a Reunir Para a Constituição da Empresa:
 Declaração da Administração Municipal;
 Certificado de Admissibilidade;
 Número de Contribuinte e a Nota de Fixação, do Documento de
Arrecadação de Receitas (DAR)
 Fotocópia do B.I.;
 Requerimento do Comerciante em Nome Individual preenchido;
 Requisição do Registo Comercial preenchida.
8. Constituído o Comerciante em Nome Individual, o Empreendedor deverá
dirigir-se à área de licenciamento Especial da Administração Municipal ou da
Direcção Provincial do Comercio, consoante a actividade a exercer.
Certificação das MPME Documentos Necessários
Formulário de Certificação MPME devidamente preenchido; Assinatura do Termo de
Responsabilidade MPME; Cópia do Estatuto ou Pacto Social, Número de Identificação
Fiscal, Cópia do Alvará ou do comprovativo de entrada para o efeito; Declaração da
Empresa sobre o número de trabalhadores efectivos, Comprovativo do pagamento do
Imposto sobre o Rendimento de Trabalho do mês anterior, com folha de salário
161
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validada pela Direcção Nacional de Impostos; Comprovativo do pagamento do Imposto
Industrial; Certidão Negativa da situação fiscal da MPME.
Valores a Pagar
As Pessoas Singulares que se dediquem às micro actividades constantes do Anexo I do
decreto Presidencial nº 43/12 de 13 de Março, estão isentas do pagamento de taxas
emolumentares devidas pela constituição e licenciamento de actividades durante 2
anos. As Micro Empresas estão isentas só do pagamento de taxas devidas pelo
procedimento de licenciamento durante 2 anos.
Visão crítica do programa
O programa BUE esta avaliado num montante global de 21,34 mil milhões de kwanzas
(ou seja, 220 milhões de dólares americanos ao câmbio oficial de 2012)116. Tendo em
conta que o crédito disponível para cada empreendedor é de 679 mil kwanzas (ou seja
7.000,00 USD), podemos antever a possibilidade de beneficiarem cerca de 31.428
empreendedores.
Até que ponto este programa possibilitara diminuir o desemprego? Pode-se esperar
geração de emprego ou auto-emprego? Relativamente às questões colocadas,
podemos abrir dois cenários:
Primeiro cenário: auto-emprego. Vamos assumir que o empreendedor não tenha
trabalhadores assalariados, ou seja, emprega membros da sua família que trabalham
sem remuneração, visto que o negocio e familiar e o lucro e usufruído por todos
(servindo para arcar as despesas com alimentação, saúde, educação, transporte, etc.).
Esta assunção leva-nos a uma relação de um emprego por cada crédito concedido, ou
seja, espera-se gerar 31.428 postos de trabalho (em auto-emprego).
Segundo cenário: Assumindo que o empreendedor, para além de si emprega mais
duas pessoas117, espera-se uma geração de 94.284 postos de trabalho.
É prematuro medir a eficiência real deste programa por se encontrar numa fase
embrionária. Todavia, não podemos deixar de sublinhar alguns elementos associados à
forma de funcionamento do programa, nomeadamente, a não concessão, na
totalidade dos valores monetários correspondentes a 7.000,00 USD. Isto é, o
116
Comunicado de Imprensa da Casa Civil do Presidente da República, 13 de Março de 2012
117
A evidência empírica sobre o pequeno negócio em Luanda dá conta que em média, cada um destes
empreendedores trabalha com duas pessoas.
162
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empreendedor só recebe até 20% em dinheiro e o restante em forma de materiais e
equipamentos.
Eventualmente, a lógica do Executivo de conceder até apenas 20% do montante em
dinheiro e o restante em materiais e equipamentos é de evitar o Azar Moral118. No
entanto, pergunta-se, até que ponto tais materiais e equipamentos são de interesse do
empreendedor em termos de qualidade, preço e fornecedor.
Não estaria o Executivo a desvirtuar um dos pressupostos fundamentais da economia
de mercado ao adjudicar o fornecimento de materiais e equipamentos a certos
agentes económicos? O que dizer acerca dos empreendedores que já tiverem
materiais e equipamentos? Serão estas empresas as mais eficientes do mercado?
Quem são os proprietários das empresas fornecedoras de materiais e equipamentos
no âmbito deste programa? Não estaria o executivo a promover o negócio destas
empresas à custa do erário público? Não se estaria a resvalar para o sistema de
planificação em que o Estado definia as necessidades a serem satisfeitas? Deixamos
que os leitores e o tempo esclareçam as questões colocadas.
De acordo com a agência noticiosa ANGOP119, o Programa Angola Jovem teve início em
2008 e tem como objectivo proporcionar aos jovens a criação dos seus negócios. Os
critérios de selecção são, ter de 18 a 30 anos de idade e estar agrupado em
cooperativa de cinco elementos.
O Crédito Jovem é um programa nacional inserido no “Angola Jovem”, uma parceria
entre o Instituto Nacional de Apoio a Pequenas e Médias Empresas (INAPEM), Banco
de Poupança e Crédito (BPC) e o Ministério da Juventude e Desporto.
Montantes gastos com o Credito Jovem
Ano
Valor (milhões de kwanzas)
Valor (milhões de USD)
2008
n.d.
n.d.
2009
1.447,04
17,43
2010
n.d.
n.d.
118
Uma situação em que os 7.000,00 USD são aplicados numa área contrária à aquela que motivou o credor a
conceder crédito.
119
http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/economia/2012/8/36/Cem-jovens-beneficiam-creditojovem,a660e9d4-7f26-4e78-af26-d112ef1fab3c.html
163
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2011
815,74
8,59
2012
481,20
4,91
FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério das Finanças
Até agora não existem relatórios sobre a eficiência deste programa no âmbito do
fomento ao empreendedorismo, ou seja, quantas pessoas já beneficiaram deste
programa? Terão os mutuários criado ou expandido o seu negócio? Como está a
questão do reembolso?
No que concerne ao BUE, até que ponto os seus beneficiários não são os mesmos que
do Crédito Jovem? Que dizer dos beneficiários do microcrédito proporcionado pelo
Banco Sol (comparticipado pelo Governo)?
É interessante notar que o programa Crédito Jovem foi lançado em 2008 e o crédito
BUE em 2012. Será que podemos esperar um outro programa em 2017? Existirá
alguma relação entre estes programas e os ciclos eleitorais120?
À guisa de conclusão, temos a dizer o seguinte:
 Apesar das incertezas sobre a eficiência real deste programa no âmbito do
fomento do empreendedorismo e apoio aos reais empreendedores, pode-se
ver que, o BUE poderá permitir (em certa medida) o registo e legalização dos
agentes económicos que operam no mercado informal duma forma rápida e a
custos reduzidos.
 O BUE, até um certo ponto, pode ser considerado uma forma de redistribuição
de rendimento a grupos que não têm acesso ao mercado formal de
financiamento, pese embora, uma parte considerável do dinheiro e entregue
em espécie (pelo menos 80% do total), o que na verdade beneficia os reais
proprietários das empresas fornecedoras de materiais e equipamentos.
 O crédito afigura-se bonificado e competitivo, dada a taxa de juro de 2% ao ano
e o prazo de reembolso de 5 anos precedido por um ano de carência. Porém,
isto exige uma grande capacidade de monitorização por parte do credor ao
longo deste período (praticamente 6 anos), sob pena de haver muito crédito
mal parado.
 Os altos níveis de empreendedorismo que o país apresenta, exigem apoios
sérios e sustentados por parte de quem governa, de modo a facilitar a criação
120
Cfr. Teoria do ciclo político de negócios.
164
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de emprego e a redução da pobreza. Não se deve depender de ciclos eleitorais,
caso se queira promover e apoiar o empreendedorismo.
Bibliografia
SPI; CEIC. Relatório GEM Angola 2008/2010.
Decreto Presidencial nº 40/12 de 13 de Março
Comunicado de Imprensa da Casa Civil do Presidente da República, 13 de Março de
2012.
CEIC. Relatório Económico de Angola, 2011.
http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/economia/2012/8/36/Cemjovens-beneficiam-credito-jovem,a660e9d4-7f26-4e78-af26-d112ef1fab3c.html
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DOCUMENTOS
Breve historial do ISPOCAB
Pe. PhD. Amadeu Ngula
Excelência Rvma. D. Eugenio Dal Corso, Bispo da Diocese de Benguela e digníssimo
Chanceler deste Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela,
Senhor Padre Doutor José Brinco, Director adjunto do Instituto,
Distintos chefes de Departamentos,
Caros Docentes e Discentes,
Abnegados Funcionários,
Convidados e amigos!
Estou aqui, neste momento não para fazer propriamente a descrição histórica e
cronológica do surgimento desta nossa e jovem Instituição, mas apenas para traçar
algumas pinceladas sobre um breve historial daquilo que a memória registrou nesses
breves anos. Quanto à história como tal, deixaremos o trabalho para os historiadores.
Eduardo Galeano, historiador, dizia: “a história é um profeta com o olhar voltado para
trás: pelo que foi e contra o que foi, anuncia o que será.”
Começo a minha breve abordagem com esta frase, porque acredito que ela encerra a
súmula das vicissitudes e peripécias pelas quais passou esta Instituição que hoje temos
a honra e o gaudium de inaugurar de modo oficial.
Na verdade, debruçando-nos sobre o breve passado desta Instituição, podemos
afirmar que o homem é feito de tempo e a história é a interpretação da acção
transformadora do homem. O homem se insere no tempo: o presente humano não se
esgota na acção que realiza, mas adquire sentido pelo passado e pelo futuro. Espero
166
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que o nosso recuar no passado não possa ser interpretado como exercício de
saudosismo, mera curiosidade ou simples erudição. Os pioneiros desta Instituição
acreditam que o passado não está morto, porque nele se fundam as raízes do
presente.
É compreendendo o passado desta Instituição que podemos dar sentido ao presente
que estamos a celebrar e projectar o futuro airoso que nos é dado esperar.
Senhoras e Senhores,
Vivemos horas maiores, porquanto podemos dizer com veemência «legem habemus».
O Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela, abre com serena confiança os
seus braços ao futuro que há-de assegurar-lhe a desejada continuidade. Não foi fácil
chegar aqui onde nós estamos hoje. Que o digam todos aqueles que assistiram desde a
primeira hora o raiar deste projecto!
Foi por ocasião do encerramento do ano lectivo 2005 do ICRA que o então Bispo D.
Óscar Braga anunciava a intenção de criar a exemplo de Luanda o ISUP- JPII. Enviada a
carta de pedido à CEAST, obteve-se a resposta a 19 de Março de 2006 que autorizava o
Bispo diocesano a avançar com o projecto, já que o decreto de criação o previa.
Foi a partir daí que tudo começou… O Titular da Diocese cria a provisão n.4/06 que
nomeava a primeira direccão, mais tarde homologada pelo Chanceler do ISUP-JP II, D.
Pedro Luís Scarpa.
Dia 19 de Março o Chanceler, (D. Pedro Luis Scarpa) do ISUP-JP II presidia à Eucaristia
da erecção do Instituto na Paróquia de S. José da Caponte e dava tomada de posse à
direcção que era composta pelo sub-escrito e pelo PhD. Paulino Lukamba.
Apenas começava aquele ano lectivo uma nuvem de incerteza irrompia sobre o
horizonte do projecto e o tornava quase num pesadelo:
Éramos aventureiros (como fomos chamados por alguns e malucos e imaturos por
outros, mas cheios de esperança) porque sempre acreditamos que o futuro deste
projecto se anunciava grandioso.
Para agudizar ainda mais este quadro sombrio que se abatia sobre o projecto
nascente, no dia 19 de Abril de 2006, a Secretaria de Estado para o Ensino Superior
enviava um ofício que inviabiliza o projecto por falta de licenciamento.
Consequentemente, outra carta de censura do projecto vem do frei João Domingos, de
quem esperávamos apoio dizia que nos tínhamos precipitado ao começar. Tínhamos
perdido o chão. O Consenso começou a vir menos dentro e fora da Diocese.
167
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Foi a partir daí que começamos a encetar contactos para contornarmos a situação.
Recebidos por Sua Excelência Sr. Arcebispo de Luanda, então Presidente da CEAST e
Reitor da UCAN, fora-nos indicado o então Padre Imbamba como seu homem de
contacto sobre o “dossier” Benguela.
Para cada má notícia, para cada apunhalada houve sempre uma notícia de alento e de
esperança. Estávamos assustados mas com a ideia de que se o projecto era de Deus
ninguém o faria parar. Na verdade sentíamos a falta de muitos companheiros de
caminhada que tinham pensado que havíamos um salto no vazio… Houve dias difíceis
como o dia 18 de Fevereiro de 2008 em que recebíamos o segundo aviso do Secretário
de Estado para o Ensino Superior que ameaçava tomar medidas apropriadas em
conformidade com a lei. Nesse dia, rezámos em umbundu juntos a oração de S.
Bernardo à Nossa Senhora: “nunca se ouviu dizer que os que recorreram à vossa
protecção fossem por Vós abandonados: «Katchikakulimbe». Agarrámo-nos em Maria
como se fosse a última coisa que nos restava em mãos.
Nesta esperança retomámos contactos. Sua Eminência Alexandre Cardeal do
Nascimento foi um dos que fomos contactar. Guardamos como tesouro em nosso
coração os seus conselhos. Suas palavras foram de alento, de conforto mas também de
esperança: Deus se encarregará de tomar conta do que é seu, dizia. Ainda
acrescentava: “é bom que história seja escrita não pelos caçadores, mas pelos
caçados”. Na verdade só hoje compreendemos o alcance destas sábias palavras. Deunos conselhos com base na sua experiência enraizada na fé e na sua visão sobre o
futuro do País. Foram palavras de um gigante d´Africa que nos devolveram a força de
continuar a lutar por aquilo que acreditamos.
Enquanto percorríamos o País, cujas viagens eram pagas com os nossos próprios
esforços, para construir um consenso externo sobre o projecto, e percorríamos Luanda
a pé entre dicastérios da CEAST e dos ministérios, uma nova situação tornou a
assombrar os nossos esforços:
As Irmãs Doroteias já não podiam hospedar mais o ensino superior nas suas
instalações. Devíamos deixar os espaços que ocupávamos. Teve que intervir o Bispo da
Diocese para que nos fosse deixado um tempo até termos um espaço alternativo. Foi
nessa altura que começamos com as obras que nos acolhem neste momento. Iniciadas
pelo Pe. Castilho, que Deus o tenha, muito cedo Deus o retirava do nosso convívio,
para agudizar mais ainda o projecto que já estava ameaçado. A partir daí o Dr.
Lukamba passou pessoalmente a fiscalizar os trabalhos porque precisávamos de entrar
já. Transportou o material no seu carro pessoal, comia com os operários, como um
comandante que come com a tropa, quase que vivia na obra. É uma singela
homenagem a este ilustre pioneiro desta obra. Como se não bastasse, mal terminava a
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obra, pesava sobre nós a urgência de deixarmos com urgência o espaço porque não
era do agrado de alguns paroquianos… interveio o Bispo e sobreveio a bonança…
Outro grande alento nos veio dos contactos com o D. Filomeno Vieira Dias, Bispo de
Cabinda, na altura Presidente da Comissão Episcopal para o Ensino Superior. Foi
determinado o seu envolvimento e o seu engajamento pessoais. Foi sob a sua
orientação que renovámos a esperança de termos retomado o caminho. Os seus
contactos com as mais altas esferas do Estado foram decisivos para as nossas relações
com o Ministério. D. Filomeno sabia bem quantas frentes (internas e externas) que
este projecto enfrentava e soube dar-nos conselhos vitais para a percepção do
problema e das formas de o enfrentar. Outros contactos foram encetados com o
arcebispo Metropolita do Huambo, D. Alves Queirós, com o arcebispo do Lubango D.
Gabriel Mbilingui… Outros contactos de topo dos órgãos de soberania foram
efectuados bem como as nossas autoridades locais que não nos retiraram o seu apoio.
Mas existiram sempre as linhas de discenso:
 Dos que nos aconselhavam a abandonar o projecto;
 Dos que nos ligavam para manifestar o seu total desagrado porque estávamos a
pôr mal a Diocese;
 Dos que pensavam que não estávamos em altura de liderar o processo;
 Dos que enfim, procuravam minar o projecto desde o princípio e encetar
vermes no ventre do projecto.
A estas vozes discordantes soubemos sempre respeitar e como estávamos ocupados
demais deixámos sempre que o tempo se encarregasse de dizer que estavam do lado
errado.
Nesse mesmo contexto D. Óscar deixa o governo da Diocese e entra em cena o actual
Bispo de Benguela, D. Eugenio. Tomadas as rédeas da Diocese, o novo Bispo não
perdeu tempo. Informado sobre o dossier” e conhecedor da realidade do país reuniu
esforços e criou consensos. Foram feitas outras diligências junto da CEAST e Junto do
Ministério de Ensino Superior e depois de tantos esforços eis-nos aqui hoje coroados
de júbilo.
Caros discentes e docentes,
Esta intervenção, quer ser também uma singela homenagem a todos vós, porque
acreditastes neste projecto desde a primeira hora. Vivestes também vós momentos de
angústia e de incertezas. Muitos por temor desistiram ou se transferiram para outras
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instituições onde se sentiam mais seguros. Mas vós quisestes aceitar o desafio da
incerteza. Aí está a vossa grandeza.
É por demais sabido, na fértil experiência da história, que as instituições apenas
permanecem quando os homens estão convencidos de que há valores morais que os
transcendem. Não acreditem nos arautos da luta permanente contra os valores
cristãos e do respeito das tradições seculares dos nossos antepassados. A verdade é
que fora de um ideal de amor e de vinculação às formas mentais superiores nenhuma
sociedade pode erguer-se sobre alicerces sólidos e espalhar a semente de esperança
nos homens que lhe incumbe lançar à vida.
Termino agradecendo em nome de todos aqueles que estiveram desde o dealbar deste
projecto a oportunidade que nos destes de deixar registado o nosso testemunho sobre
o percurso tortuoso, trabalhoso e duro que levou à criação deste Instituto; percurso
este que pôs à prova tudo em que acreditamos. Nada me resta senão terminar com as
palavras do salmista:” Se o Senhor não estivesse connosco os homens ter-nos-iam
devorado vivos no furor da sua ira…!
Dado no Lobito, na festa de S. Francisco de Assis, aos 4 dias do mês de Outubro de
2012.
By Pe. PhD. Amadeu Ngula
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RECENSÃO CRÍTICA
KICOLA: ESTUDOS SOBRE A LITERATURA ANGOLANA DO SÉCULO XIX
Nelson Pestana (Ph.D.), Investigador-Coordenador do CEIC
“Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX”121 é o livro que Francisco
Soares acaba de publicar, pelas edições Mayamba e que teve lançamento na
Universidade de Letras, da Universidade Agostinho Neto.
O título do livro, “Kicola”, tem um sentido irónico. Como o próprio autor explica numa
nota inicial do livro. Kicola é uma expressão kimbundu que quer dizer: “não pode ser”.
Ou seja, “é impossível”, sendo a “possibilidade” aqui associada à “transgressão” e
“impossibilidade” ao facto de não se querer desrespeitar uma regra social ou cultural
estabelecida. Isto é, “não pode ser”, na medida que isso vai contra os valores
estabelecidos e que devem ser respeitados, porque estão na ordem natural das coisas.
“Kicola” tem pois um sentido transcendental, é uma impossibilidade quase metafísica.
A apropriação de “Kicola”, no sentido irónico que lhe é atribuído pelo autor é correlato
ao cepticismo exclamativo das pessoas sobre a possibilidade de Angola ter uma
literatura, no século XIX. E, ainda mais, uma literatura à altura da exigência estética do
seu tempo e ao nível da literatura que se fazia em outras latitudes, nomeadamente no
Brasil e em Portugal.
Como a primeira reacção das pessoas, quando se falava da literatura angolana do
século XIX, era de espanto e de incredulidade, surgia sempre um, “não pode ser”,
agora como impossibilidade histórica, já que a noção que se tinha (ou tem) de África é
a de que não havia nada de “civilizado”, antes da intervenção do colonialismo
moderno (apontado para à ocupação efectiva, decidida na Conferência de Berlim,
1884-1885). Esta noção é muito inculcada pelas ciências de sociais francófona e
anglófona que durante muito tempo, determinados pela experiência das suas colónias,
apresenta a África como uma realidade homogénea e como terra de literatura, a partir
da emergência de escritores africanos, no pós IIª Guerra Mundial.
121
Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX, Francisco Soares, Luanda, Mayamba Editora, 2012.
171
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Ora Angola é um caso específico, historicamente determinado que deve ser
compreendido através de um olhar de longa duração. Este permite decantar uma
literatura angolana do século XIX que infelizmente continua mal conhecida, apesar do
esforço meritório de publicistas e historiadores desta literatura, como Júlio de Castro
Lopo, sobretudo através do estudo pioneiro sobre o jornalismo angolano, Mário
António Fernandes de Oliveira que se multiplicou em estudos sobre alguns dos mais
representativos escritores do século XIX e da sua sociedade (Maia Ferreira, Cordeiro da
Matta, Pedro Machado, Pedro da Paixão Franco entre outros) e Gerald Moser, a quem
devemos, entre outras coisas, a descoberta do livro "Espontaneidades da Minha
Alma", de Joaquim da Silva Maia Ferreira, na Library of Congress, de Washington,
dando a oportunidade de recomeçarmos, desde então, a refazer a Historia da
literatura angolana.
Neste movimento, em que sobressaí Carlos Erverdosa, com o seu "Roteiro da literatura
angolana", é justo incluir os nomes de Mário de Andrade e Costa Andrade, pelo seu
trabalho de divulgação no estrangeiro, durante o período da ditadura colonial, e, para
o período posterior à proclamação da independência, primeiro, Henrique Guerra,
pelos vários trabalhos que produziu, depois, a revista Archote, pelo seu trabalho de
divulgação e teorização, onde se destacava o esforço de divulgação da literatura
angolana do século XIX do indivíduo que vos fala que aí publicou vários trabalhos e,
posteriormente resgatou, prefaciou e promoveu a publicação sucessiva, pela Imprensa
Nacional-Casa da Moeda (Lisboa), de dois importantes livros que estava dados como
perdidos, Delírios, de Cordeiro da Matta, (2003) e “Cenas de África”, de Pedro Félix
Machado (2004).
Luis Kandjimbo, com os seus vários artigos no suplemento literário do Jornal de Angola
e agora com os seus verbetes no site da ebonet.net e Carlos Pacheco com os seus três
livros dedicados ao pioneiro da literatura angolana, Maia Ferreira, dois biográficos e
um crítico. E, “last but not least”, há a destacar o trabalho de pesquisa e divulgação de
Francisco Soares, que localizou um exemplar dos sonetos, de Pedro Félix Machado,
primeiro, numa biblioteca americana, a Library of New York, depois, um outro
exemplar, na Biblioteca da Faculdade de Letras do Porto. Este professor de literatura
africana de língua portuguesa, também prefaciou e impulsionou, junto da Imprensa
Nacional-Casa da Moeda (Lisboa) uma nova publicação desse conjunto de sonetos,
"Sorrisos e Desalentos".
“Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX” surge neste contexto.
Primeiro como um livro de divulgação e agora como um verdadeiro manual de
literatura que coloca “as mãos na arqueologia literária do país”, como o próprio
Francisco Soares dizia no seu “Notícia da literatura angolana” (edição da IN-CM, Lx,
2001); um livro denso de história e teoria da literatura angolana que está para lá da
simples “notícia” e é uma das melhores obras publicadas no género porque reúne as
qualidades do rigor factual e teórico.
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Neste livro, “Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX”, agora
retrabalhado e ampliado, Francisco Soares reafirma o seu mérito, a sua elevada
qualidade pela coerência da sua economia de texto e a capacidade produtiva de
sentido da sua escrita.
A sua intenção é a de fazer um estudo em 2 volumes: o primeiro volume dedicado à
análise formal da produção poética dos autores de Angola, no século XIX, e o segundo
volume versando sobre as leituras, na Angola do século XIX.
Neste livro minuciosamente dedicado à análise formal dessa produção poética, o
autor estuda quase meio século de literatura (1856-1900), distribuído por dois
períodos: 1ª fase; 1856-1877 e a 2ª fase; 1878-1900. Porém o livro está estruturado,
não em termos cronológicos mas em função do seu conteúdo. Aparece pois dividido
em duas partes: a primeira parte: “Circunscrições” e a segunda parte: “Análise
estilística do corpus escolhido”.
Em Circunscrições, depois de uma introdução, em que apresenta a sua problemática,
FS apresenta o seu corpus, por uma selecção e exclusão de poemas, determinada pelo
critério escolhido e faz alude aos autores e obras de referência, também estrangeiros,
já que uma literatura não surge sozinha, isolada mas em interacção com outras. Faz
também um apuramento teórico e conceptual tecendo considerações sobre os seus
conceitos operatórios (como seja verso, estrofe simples e composta, hierarquização,
distribuição rimática e sistema.
Na Análise estilística do corpus escolhido, Francisco Soares, primeiro, divide as 119
composições seleccionadas em função do número de versos das estrofes, constituindo
diferentes grupos de análise.
1º - o das estrofes com 4 versos, que são os mais comuns, também “na poesia
romântica e ultra-romântica portuguesa” e que Olavo Bilac considera serem “as
estrofes mais cultivadas”.
(verificam-se 64 ocorrências para versos em decassílabos e 5 para
dodecassílabos)
2º - o das estrofes com 5 versos
(2 tipos: decassílabos (ABBA) e heptassílabos (ABBA) e um mesmo autor:
Cândido Furtado).
3º - o das estrofes com 6 versos
(12 ocorrências)
4º - o das estrofes com 7 versos
5º - o das estrofes com 8 versos
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6º - o das estrofes com 9 versos
7º - o das estrofes com 9 versos
8º - o das estrofes com 9 versos…
A partir daí Francisco Soares centra o seu propósito “na maneira de construir os versos
e as estrofes”, nos meios de produção dessa poesia, isto é, na apreciação das formas
artesanais que permitiram a construção técnica dos poemas e do corpus poético
societal angolense, nessa época.
O autor procura, pelo método comparativo transnacional e pela transferência de
informação,
 apreender a filiação literária do grupo de produtores poéticos;
 rastrear notas fundamentais do tráfego literário angolense;
 ultrapassar as questões (recorrentes ainda hoje) de classificações
ideológicas (positiva ou negativa e de legitimação
 abrir caminho a hipóteses comparativas abrangentes;
Levando em consideração,
 o caldeamento de cultura em que são formados e alimentados os
produtores (recurso já experimentado, para outro corpus, por Mário
António de Oliveira, de quem Francisco Soares é discípulo confesso)
Conclui que
 estes artesãos revelam-se frequentadores dos poetas dos poetas
ultra-românticos portugueses e brasileiros;
 do lado português lidera Camilo Castelo Branco, a quem se juntam
Casimiro de Abreu e outros
 do lado brasileiro, Gonçalves Dias e Gonçalves Crespo soa
acompanhados por Fagundes Varela, Alvarez de Azevedo
 entre os angolanos e estrangeiros residentes (ditos “aclimatados”)
havia pessoas esclarecidas, actualizadas e pensantes que produziam
literatura à altura da Europa e da América daquele tempo;
 ou seja havia uma comunidade de literatos que demonstravam
“uma consciência depurada no trato formal do poema;
 no entanto, os produtores e a poesia produzida eram
conservadores, submetidos à função social ou socializadora que era
atribuída à poesia à época;
 por isto, esta poesia, pela sua função social não podia ser muito
erudita, tinha que ficar ao nível da comunidade a que se destinava,
restando ao nível dos cânones populares.
 Por isto a timidez nas inovações não é determinada pela ignorância
mas por razões de eficácia social da produção poética
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