Em nova fase, Al-Qaeda expande suas atividades

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Em nova fase, Al-Qaeda expande suas atividades
TERRORISMO
Em nova fase, Al-Qaeda expande suas atividades
Terceira geração de combatentes, treinada no Iraque, reorganiza a rede e
começa a fazer estragos em países como Líbano e Argélia
Silvio Queiroz
Da equipe do Correio
Primeiro, foi a legião árabe que Osama bin Laden reuniu no Afeganistão para
combater a ocupação soviética, nos anos 1980. Na década seguinte, foram os
milhares de jovens de todo o mundo islâmico que passaram pelos campos de
treinamento no santuário afegão, até a dispersão que se seguiu ao 11 de setembro
de 2001 e a invasão norte-americana. Agora, a terceira geração de combatentes
da Al-Qaeda, temperada nos campos de batalha do Iraque, começa a sair a
campo. Eles já se fizeram notar na Argélia, atacando com carros-bomba a sede do
governo e o quartel-general da polícia. Foram notados também na Somália, no
estratégico estreito que separa a África da Península Arábica.
Mais recentemente, deram as caras em um campo de refugiados palestinos
no Líbano, possível rampa de lançamento para ataques a Israel. Essa expansão
corresponde, em termos gerais, ao plano estratégico traçado pela rede terrorista,
como foi descrito em setembro último, no quinto aniversário dos atentados, pelo
jornalista norte-americano Lawrence Wright, da revista New Yorker, ganhador do
prêmio Pulitzer com seu livro O vulto das torres — sobre os ataques de 2001.
Wright cita como fonte o jornalista jordaniano Fuad Hussein, autor de uma
biografia do representante de Bin Laden no Iraque.
“É claramente visível uma tendência para a reorganização da Al-Qaeda
depois da dispersão sofrida com a invasão americana do Afeganistão, após 2001”,
analisa o especialista alemão em terrorismo Guido Steinberg, da Fundação Ciência
e Política (SWP, em alemão), instituto com sede em Berlim. Após os atentados de
Argel, em abril, Steinberg alertou sobre as novas tendências detectadas no
funcionamento da rede terrorista de Osama bin Laden. Em primeiro lugar, não
mais com um comando central, como no período que precedeu o 11 de setembro:
por razões operacionais, mas também políticas, a Al-Qaeda se comporta cada vez
mais como “uma associação fluida entre organizações localizadas, com
considerável autonomia, tendo em comum a matriz ideológica e um certo modus
operandi”.
Fontes dos serviços de inteligência europeus e norte-americanos identificam
pelo menos quatro núcleos da rede. Além do antigo comando central, no
Afeganistão, do qual são remanescentes Bin Laden e seu número dois, o egípcio
Ayman Al-Zawahiri, opera hoje com desenvoltura a filial iraquiana, iniciada pelo
jordaniano Abu Mussab Al-Zarqawi, morto há cerca de um ano sob bombardeio dos
EUA. Os ataques de Argel trouxeram à luz a Al-Qaeda do Magreb, que agrupa
argelinos, tunisianos, líbios e marroquinos. A quarta frente se desenvolve no Chifre
da África, com base na Somália em guerra civil e projeções em direção ao Sudão e
à Eritréia. Lá, a conexão é quase direta com os remanescentes da rede no Iêmen,
na margem oposta do Bab Al-Mandab, estreito que liga o Mar Vermelho ao Mar da
Arábia e é um dos gargalos na rota dos petroleiros entre o Mediterrâneo e o Golfo
Pérsico.
Confiantes
Steinberg cita fontes do Seviço Federal de Informações (BND), o órgão de
inteligência alemão, segundo as quais a rede reconstituiu, nos últimos anos, sua
estrutura de campos de treinamento nas áreas tribais da fronteira AfeganistãoPaquistão. Favorecidos pela pouco notada efervescência política, que obrigou o
presidente Pervez Musharraf a retirar tropas paquistanesas das áreas tribais, Bin
Laden e Al-Zawahiri “já mostram muito mais autoconfiança e segurança”, segundo
comentou na revista Der Spiegel um oficial do BND. O estudioso do instituto
berlinense fala em um processo de “paquistanização” da rede: “Já tínhamos no
Paquistão uma infra-estrutura terrorista e uma oferta de voluntários, a novidade é
a Al-Qaeda tirar partido disso”.
Especialistas norte-americanos, citados pelo jornal Los Angeles Times,
chamam a atenção para outro movimento, complementar e igualmente
esclarecedor. A recomposição da rede terrorista em sua antiga base está sendo
financiada com recursos levantados no Iraque, hoje sua frente de atuação mais
promissora, a ponto de exportar para o Afeganistão técnicas como a dos homensbomba — fenômeno que os especialistas chamam de “iraquização” da frente afegã.
Além do dinheiro, obtido principalmente com seqüestros extorsivos, a Al-Qaeda
iraquiana se tornou exportadora de quadros experimentados. Lá se formaram
como combatentes alguns dos recrutas sauditas, iemenitas e oriundos da Ásia
Central e do Sudeste Asiático. Agora, eles cumprem uma nova instrução de Bin
Laden, para que retornem aos países de origem — ou às colônias estabelecidas no
Ocidente — e rearticulem as células locais. “A Al-Qaeda está voltando para casa”,
adverte um analista do BND alemão.
É claramente visível uma tendência para a reorganização da Al-Qaeda
depois da dispersão sofrida com a invasão americana do Afeganistão, após 2001
Guido Steinberg, especialista alemão em terrorismo da Fundação Ciência e
Política, de Berlim
Jornal CORREIO BRAZILIENSE
http://www.exercito.gov.br/Resenha - Acessado em 28/05/2007