Revista Aprendizes 2012
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Revista Aprendizes 2012
APRENDER PER ENSINAR GUN RES PON AVALIAR TAR PESQUISAR ENSINAR PER AVA GUN LIARTAR PER GUN TAR PESQUISAR QUI APRENDER AVALIAR SARENSINAR ENSINAR APRENDER AVALIAR AVALIAR ENSINAR APRENDER APRENDER CRIAR FUNDAMENTAR ENSINAR APRENDER APRENDER CRIAR DER APRENDER ENSINAR RES PON DER ARTIGOS RELATOS DE EXPERIÊNCIAS ENTREVISTA COM MARCO ANTONIO FETTER SEMEC Secretaria Municipal de Educação e Cultura www.ivoti.rs.gov.br Realização | Prefeitura Municipal de Ivoti 2009-2012 Secretaria Municipal de Educação e Cultura Comissão Editorial | Adriana Cristina Ahlert, Carla Isabel Haupenthal, Flávio Adolfo Tietze, Iricelda Inês Welter Weber, Juliana Petry, Julici L. Lippert Altenhofen e Raquel Dilly Konrath Revisão Ortográfica | Flávio Adolfo Tietze Capa, Editoração e Revisão | Alphaville Serviços Computadorizados Tel. 51 3563.1095 • [email protected] • www.alphavillepublicidade.com.br SUMÁRIO EDITORIAL | ENTREVISTA Entrevista com Marco Antonio Fetter | 5 ARTIGOS 1. Educação Integral nas Escolas do Campo de Ivoti | 16 2. Atividade física = Qualidade de vida | 18 3. Professor gestor? | 20 4. Dialogando sobre aquisição de linguagem e surdocegueira | 22 5. Família na Atualidade | 25 6. Alterações da Fala ou Alterações da Linguagem? Conhecendo para prevenir na Educação Infantil | 27 7. Sobre o aprender/ensinar em nosso tempo – diferentes modos de olhar | 30 8. Família e escola: práticas educativas para conquistar a aproximação entre ambos e os reflexos na aprendizagem do educando | 32 9. Gestão Democrática e a Gestão Escolar | 34 10. Dança e aprendizagem: experiências de pais e alunos do Programa Lazer Unindo Gerações – PLUG | 36 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 1. Concerto Didático: Uma Aula de Apreciação e de Vivências Musicais | 39 2. O Espetáculo na Infância | 41 3. Afinal, qual foi “A Invenção de Hugo Cabret?” | 43 SUMÁRIO Sumário SUMÁRIO SUMÁRIO Sumário 4. Tesouro Verde: Um olhar sobre a educação a partir da Amazônia | 46 5. “Descobrindo a Arte que está mim!” Projeto dos primeiros anos | 49 6. A árvore que dava dinheiro e rendeu frutos | 52 7. Atendimento Educacional Especializado: Recursos e Serviços que Promovem a Inclusão Escolar | 54 8. Meu Lixo, Teu Lixo, Nosso Lixo! | 56 9. As Formas da Reforma | 58 10. Arte + Geografia = Um Novo País | 60 11. DAVI: Como é Bom Estar Contigo! | 62 12. Projeto: E, no Castelo... | 64 13. Projeto: De volta para casa | 66 14. O brincar e a elaboração de projetos na Educação Infantil | 68 15. Mascote Noelzinho | 70 16. Projeto Adolescer | 73 17. Docência Compartilhada ou Bidocência – Um novo desafio! | 75 18. A agricultura de subsistência e as sementes crioulas | 77 19. Uma Escola com Jardim Suspenso na Cidade das Flores | 79 20. Competição Escolar por Outro Olhar | 81 21. Empreendedorismo Rural: Turismo Rural Pedagógico | 83 22. Descobrindo Formas de Escrever | 85 23. Nossa História Produzida em Detalhes | 87 24. Softwares Educativos JClic e Hot Potatoes: Como Auxiliam no Processo de Ensino e Aprendizagem na Educação Infantil | 89 ENTREVISTA Entrevista com 1. A partir das diversas mudanças na formação familiar, qual seria o atual conceito de “família”? De que forma essas diferentes constituições familiares estão sendo vistas na sociedade atual? A Família é a principal instituição da sociedade. É assim no Ocidente como no Oriente. Sem a Família, qualquer outro tipo de organização, poder, identidade e propriedade teriam que ser reconsiderados de maneira profunda. As famílias são grupos de pessoas que decidem sobre suas vidas cotidianas de maneiras muito diferentes e amplas. Ela é a máxima instituição pública do cotidiano e também a instituição mais instável. A Família, tradicionalmente, se caracteriza desde enfoques filiais, de parentesco, generacionais ou de constituição, desde os quais se reconhece a família nuclear (mãe, pai e filhos) e a família extensa (parentes sanguíneos e consanguíneos). A Família brasileira – de uns tempos até hoje –, está cada vez mais distante do modelo clássico: pai todo-poderoso, mãe dona-de-casa e muitos filhos. Organizações consideradas até pouco tempo “incomuns”, envolvem hoje milhões de brasileiros: mães solteiras, pai solteiro que criam seus filhos sozinhos, aqueles que criam seus filhos nas casas dos pais, mulheres e homens sós – ou juntos – criando filhos... E assim segue. Pessoalmente, fundamento meus trabalhos Sociólogo, Doutor em Sociologia da Família, Consultor da ONU para o Brasil em Assuntos de Família definindo Família como – em sentido estrito – uma constelação de pessoas interdependentes convivendo juntas e repartindo entre si o acesso a um campo afetivo comum. É necessário reconhecer que, mesmo assim, novas formas de organizações familiares existem e se efetivam: aquelas famílias em que existem várias gerações, e em cada uma delas, é possível reconhecer níveis de chefia, por exemplo, a mãe ou a avó. Existe uma discussão importante no significado de vincular a palavra Família com Democracia. Se existe Democracia como forma de governo, também existe a Democracia como uma forma de vida, como um estilo de vida. Quem sabe, como uma Família Cooperativada. Nossas raízes religiosas nos impossibilitam olhares diversos, e apesar das mudanças e movimentos na constituição das famílias, prevalece um modelo único que pressiona para outras famílias distantes a esse modelo único ou radicado no imaginário coletivo. Esse modelo que temos de Família – mãe, pai e filhos – é o modelo de pressão social para outros tipos de famílias. Logo, a Família Brasileira não é única, mas múltipla. Transformações sociais e culturais que se processaram nas últimas décadas reacomodaram as maneiras como as pessoas costumam se agrupar sob um mesmo teto. Para isso, basta abrir as portas e janelas de muitas de nossas casas! | julho 2012 ENTREVISTA Marco Antonio Fetter 5 ENTREVISTA | julho 2012 6 2. Na sua opinião, as diferentes configurações de famílias existentes na sociedade interferem no desenvolvimento integral dos filhos? Será sempre na nossa casa – na nossa comunidade familiar – que o ser humano aprende a oferecer o bem comum que pode, e deve, receber o que necessita para a sua realização. Vivendo juntos na mesma casa, pais e filhos, temos a oportunidade de exercitar uma relação profunda de plena reciprocidade com as pessoas que amamos. Com todas elas. Para nossos filhos, nós, pais, sempre seremos os seus principais modelos de conduta perante a vida, independentemente de qualquer configuração de Família existente. Sendo assim, a melhor maneira existente para o desenvolvimento integral dos nossos filhos, é de um aprender com o outro e vivenciar com intensidade e emoção o cotidiano da vida em Família, o dia a dia de uma casa com os seus fatos e os seus atos. De cada um. O que sempre disse, e vou continuar dizendo, é que temos a obrigação de tentar cada vez mais e com mais intensidade buscar a felicidade com as pessoas que amamos. Na verdade, e pensando bem, o que interfere no desenvolvimento integral dos filhos é que somos capazes de indicar o caminho para eles seguirem e nós, seguirmos outro! 3. Crianças que possuem relações afetivas “tumultuadas”, com pouca demonstração de carinho, amor, afeto, normalmente, mostramse mais carentes, inseguras, e apresentam, algumas vezes, atitudes agressivas, brigam, sentemse rejeitadas. Como trabalhar e lidar com isso na sala de aula, a fim de que, futuramente, elas possam acreditar na família, oferecendo a seus filhos segurança e amor para que todos os membros da família tenham uma vida emocional boa? Neste nosso mundo imediatista, a melhor maneira de auxiliar uma criança, um aluno, um filho, é nunca desistir de acreditar nele. Não desistir de uma criança jamais, e acreditar em todas elas. Este é o melhor caminho. Constata-se que, pelo comportamento e relacionamento dos próprios pais e adultos responsáveis, as crianças poderão ou não acreditar no amor e na vida. Se não vivenciaram as qualidades éticas e morais, como poderão sentilas, vivenciá-las e reproduzi-las em sua vida? Precisamos convencer-nos que os sentimentos de carinho, amor, bondade, solidariedade, gratidão e respeito formarão a base sobre a qual se desenvolverá a autoestima e a autoconfiança, sem os quais não existirá um ser humano equilibrado, crítico, autônomo, responsável e livre para amar a vida em si e no outro. As crianças, todas elas, necessitam de “alguém” seguro que as oriente, mostrando-lhes uma direção com firmeza e ternura. Amanhã, certamente, serão persistentes em continuar um mundo humano e justo, porque o amor e a alegria de viver transformaram-se numa experiência de vida inesquecível! 4. Por que, na medida que os filhos crescem, muitos pais não demonstram o mesmo interesse pela vida escolar dos filhos como faziam quando eles eram menores? Como trazêlos de volta? A Família e a Escola: é um sonho possível? Sim, mas é preciso querer. Os novos contextos familiares existentes geram, muitas vezes – para os filhos –, uma sensação de abandono, pois a ideia de um pai e de uma mãe “cuidadores” dá lugar a diferentes mães e pais “gerenciadores” de filhos que nem sempre são seus. Além disso, essa sociedade tem exigido, por diferentes motivos, que pais e mães assumam posições cada vez mais competitivas no mercado de trabalho. Dessa forma, os seus filhos são “cuidados” por parentes (avós...), estranhos (empregados...), e só encontram seus pais à noite. Muitos pais, em razão da sua vida no mercado de trabalho, delegam a responsabilidade à escola, mas não aceitam com tranquilidade quando, essa mesma escola, exerce o papel que deveria ser deles. Quando os pais colocam a educação de seus 5. Qual o limite da atuação da escola em assuntos familiares, mas que interferem no desenvolvimento da criança? É claro que educar os filhos nunca foi tarefa fácil. Mas ela se torna um pouco menos complexa se os pais “forem educados para educar os filhos”. Por definição, a Família deveria conservar sua função educativa para o bem da sociedade. A sociedade, por sua vez, tem que oferecer a Família a possibilidade de educar os seus filhos. É precisamente aí que encontro uma das principais funções/oportunidades da Escola: a função/oportunidade de educar os pais para educar os seus filhos! Com isso, a Escola interfere decidida, forte e significativamente no processo de desenvolvimento integral da criança. Para melhor! A sociedade atual tenta preencher nossos vazios, especialmente os do coração, e a insatisfação pessoal, pela ausência de ideais com a ilusão do consumo, voltado para o ter, o poder e o prazer na ilusão de ser. Com isso, gera-se cada vez mais individualismo e isolamento. Se somos seres essencialmente de convivência, e somente por meio dela sabemos quem somos e assim nos realizamos, explica-se o porquê do teor explosivo das relações interpessoais. Se tudo isso afeta os adultos, muito mais as crianças, submetidas a esse imaginário poderoso e foco principal do sistema, pois as crianças induzem os pais ao consumo, conforme estudos realizados de tempos em tempos. É possível reverter esse processo. Sim, é possível, até porque não sendo, geraria um sentimento de impotência que seria prejudicial à constituição de famílias fortes e felizes, base para uma sociedade verdadeiramente humana. Dessa maneira, acredito que: - Devemos ter bem claros os valores que consideramos como essenciais para nossa vida em Família e como seres humanos. Mostrar com atitudes que esses valores fazem parte do nosso modo de agir; - Precisamos fortalecer, sempre, a autoestima da criança, elogiando suas qualidades pessoais, e nunca elogiar somente pela roupa que ela usa ou possua. A criança deve se sentir “acreditada” por aquilo que ela é. Uma criança que é amada e aceita por aquilo que é, não vai precisar de coisas para ser reconhecida como alguém muito especial, valorizada e amada; - Os nossos filhos/alunos precisam sentir-se amados de forma incondicional, assim como eles são, e que errar faz parte da vida. Ao corrigir um erro, deixar muito clara a diferença entre criticar o erro e amar a pessoa. Ajudar o filho a se colocar no ENTREVISTA 6. Como fica o desafio de educar, em tempos contemporâneos, diante de tantas pedagogias culturais que ensinam modos de ser e estão além das instituições escolar e familiar? | julho 2012 filhos como prioridade, tudo pode ser diferente. A Família e a Escola são as grandes educadoras das crianças, mas não basta que cada um cumpra o seu papel. É necessário que ambas assumam juntas essa tarefa, que se torna cada vez mais desafiadora frente às dimensões do mundo globalizado, em que os pais têm cada vez menos tempo para convivência com seus filhos. A Escola, ao poder contar com os pais, sempre, no processo educativo, é fundamental, já que a Escola tem o papel de continuar o trabalho educativo, iniciado na Família. Quando Família e Escola andam juntas, quem ganha são os alunos, pois se criam laços afetivos e muita confiança. Aos pais, é necessário entender que a Escola não serve só para transmitir conhecimentos: ela tem a função de aprender a aprender, aprender a se relacionar, aprender a viver em um mundo cada vez mais complexo. É necessário entender que a Escola é, para os nossos filhos, um fator essencial para a inserção social dos mesmos. Sendo assim, aos pais compete entender que, quanto mais eles fizerem parte e contribuírem para a educação dos filhos, mais oportunidades os filhos terão nos caminhos que escolherem trilhar. Para sempre, seja um pai interessado na educação de seu filho! 7 ENTREVISTA lugar do outro e da situação em questão; - Devemos priorizar a qualidade do tempo com os filhos e a Família; - É fundamental a Escola ter entendimento e conhecimento do mundo atual e tudo o que ele representa para cada um de nós e para cada aluno/ criança em partiular. Assim sendo, o desafio de educar torna-se uma oportunidade para todos! | julho 2012 7. O senhor afirma que os pais são os pilares básicos, os responsáveis pelo processo de desenvolvimento humano dos seus filhos. Como a escola pode proceder com alunos que, flagrantemente, não possuem esses “pilares” tão sólidos? 8 Espero nunca dizer que é fácil ter um filho e viver em Família. Pelo contrário, é muito difícil. O que disse, e vou continuar dizendo, é que temos a obrigação de tentar cada vez mais – e com mais intensidade – buscar a felicidade com as pessoas que amamos. Porém, nunca abrir mão da autoridade serena e segura, e ser capaz de dizer não quando é preciso dizer não. Também é importante, ao apontar uma dificuldade qualquer, perguntar: o que você acha disso? Sempre, mas sempre mesmo, ajudar a criança a se colocar no lugar do outro! Quanto mais – e cada vez mais – nos reunimos para trocar ideias sobre questões que envolvem alunos, pais e escola, sobre questões que envolvem vida em Família, educação dos filhos, construção da felicidade, mais segurança e firmeza teremos para resolver os problemas e conflitos que aparecem. Lembrando – claro e lógico – que o desenvolvimento humano é sempre resultado de interações. É precisamente nessas interações que compete a Educação atuar, interagir. 8. O senhor aponta que é na família que os pais transmitem de forma deliberada, verbal e não verbal, a seus filhos, ideias, crenças, valores, sentimentos e condutas. Conforme o senhor acertadamente também aponta, a sociedade vem sofrendo grandes transformações. O ter prevalecendo sobre o ser, a competição extrema, uma quase desvalorização do ser humano. Enquanto escola, lutamos para contribuir com uma formação – na contramão dessa atual tendência – mais humana; mas somos surpreendidos com afirmações de figuras importantes no cenário nacional, que, amparados por poderosos meios de comunicação, acusam a escola e os professores de ativismo social e de usar as crianças em prol de “uma causa” que, na visão deles, nada tem a ver com educação, uma vez que deveríamos nos preocupar apenas em “transmitir” conteúdos. E agora, o que fazemos? A criança é recebida pela primeira vez na Família. Ela nasce na Família como um elemento socialmente virgem, maleável, como jamais voltará a ser. Para uma criança, a Família é o fator mais persistente na sua vida e, por isso, é a sua influência mais profunda. Para ela, criança, a Família está vinculada com a satisfação de todas as suas necessidades, desde materiais até espirituais, destacando-se por ser o lugar para as relações afetivas, onde se dá e recebe amor. Desse modo, o fato de que seja a primeira instituição, a mais persistente, a mais íntima e a mais completa que trata com a criança, explica porque a Família é tão essencial para a formação da personalidade. Proporciona um sentimento de segurança essencial para a saúde mental. Por isso, a Família desempenha um papel tão importante no equilíbrio e no desequilíbrio mental. Os meios de comunicação social promovem – através da maioria dos seus programas e mensagens – os valores e antivalores de um determinado tipo de poder: o poder exclusivo do ter, que contribui, certamente, para anular o verdadeiro sentido da Família. Em uma sociedade onde tudo está valorizado através do prisma da economia, há muito pouco espaço para valores e realidades que aparentemente não são muito lucrativos: os idosos e os doentes são um problema, as crianças e os deficientes um 9. Em que momento perderam os limites, e como retomá-los? Há alguma explicação histórica? O que o senhor, com toda a sua experiência, tem como sugestão para pais e educadores encontrarem o equilíbrio entre Liberdade e Limite? A Escola – assim como a Vida – deve ser percebida como um lugar de todos, e não, o contrário, um espaço de ninguém. Mas com seus direitos e deveres. Para todos. Penso que nos encontramos ainda numa época onde a autoridade dos pais, muitas vezes, é exercida pela força, pelo autoritarismo, e não pelo amor. Os limites, sim, e todos eles, devem ser exercidos pela autoridade dos pais dentro de casa. Não sendo assim, vamos sentir e ver nossos filhos per- ENTREVISTA Por falar em promessas de dias melhores e de novos tempos, foi o que a Família sempre ouviu da classe empresarial, que a usa como material de produção e consumo; dos políticos, que sempre usaram as famílias para os seus objetivos eleitorais; de grupos de poder religiosos, que continuam elaborando teses e tratados como se a Família fosse alguma propriedade divina; e o Estado, com a sua capacidade de alimentar ilusões, continua iludindo famílias com a promessa de que o amanhã será outro e tudo será diferente. A Família cansou. Ela deseja ser o seu próprio centro, e pede que os empresários, os políticos, as Igrejas e o Estado “não se preocupem tanto assim com ela” e deixem a Família em paz. Ela sabe o que quer. É pouca coisa, mas que seja de verdade! A Escola, os professores – depois da Família –, é o que de mais importante existe na vida de uma criança. Por isso, a Educação é necessária todos os dias, porque todos os dias nascem crianças. Quando me perguntam o que fazer, digo: é preciso acreditar em todas as Famílias, em todas as Escolas, em todos os professores, em todos os alunos, em todos os filhos e em todas as crianças, até porque não existe ninguém mais humano que o outro. | julho 2012 entrave, e os que não são rentáveis tornam-se uma carga para os demais. Em verdade, desde muito tempo, a Família tem sido alvo por parte de grupos de poder político, de religiosos, de empresários e do próprio Estado, com a finalidade de exercer sobre a mesma, exercícios de tutela e de chancela. Sempre quiseram, continuam querendo e vão querer exercer sobre a Família uma autoridade que não possuem e um direito que não existe. Ninguém possui direito algum sobre a Família, e muito menos poder para falar em seu nome, porque a Família é uma comunidade natural e é mais antiga que a mesma Humanidade. O caminho mais curto para minimizar o significado da Família para uma sociedade é afirmar que ela encontra-se em uma profunda crise e que merece ser salva para que seja melhor. Puro engano e outro engano. Esquecem, no entanto, todos aqueles que pensam assim, que a verdadeira “crise” que a Instituição Família atravessa é uma “crise transformadora”. O que está sendo transformado, em verdade, é o modelo de Família em que o pai é o responsável pelo sustento familiar e a mãe, além de cuidar da casa, é a responsável pela preservação da moral familiar. Ainda bem, porque a Família está mudando para melhor, mais sólida e mais forte. A Família vai continuar sendo insubstituível, agora mais do que nunca, tanto para as crianças como para os adultos e idosos. Continuará sendo insubstituível para o desenvolvimento, a humanização e a realização das pessoas e da sociedade. Para sempre, caberá à Família tornar humano cada membro que nasce, e nada vai substituir a Família na execução de suas funções de amar, cuidar e educar. Logo, o lugar da Família deve ser sempre a de protagonista da história, da vida cotidiana e da existência. Sem chefes. Ela não precisa – para existir e ser feliz – de nenhuma garantia. Não precisa da tutela de ninguém, nem de alguém que lhe diga palavras bonitas e repletas de significados simbólicos que não interessam para nada, a não ser para continuar enganando-a com promessas de dias melhores e de novos tempos. 9 ENTREVISTA | julho 2012 10 didos e inseguros em relação aos limites da vida. Na Família, os pais que não sabem o que querem ou aonde querem chegar, jamais conseguirão que seus filhos tenham limites, porque os pais os perderam há tempos. A Família e a Escola, exercitando o ato de educar em um ambiente democrático, são capazes de substituir o controle, pela atenção e cuidado; substituir os atos de fiscalização, pelo cuidado com amor, promovendo espaços e momentos de diálogo franco e verdadeiro, sobretudo saber ouvir e não nutrir pré-julgamentos e nem ressentimentos. Especialistas, notadamente os de comportamento, dizem que um dos maiores erros dos pais é considerarem-se responsáveis pela felicidade dos filhos. Na verdade, o verdadeiro papel dos pais, é dar e exigir responsabilidades para que os filhos – e alunos – assumam os erros, e assim experimentem o enfrentamento com as frustrações. Assim, tornam-se cidadãos livres e responsáveis, com senso de competência. Importante repensarmos a tendência que temos em superproteger os nossos filhos como atitude de amor. É importante a segurança dos pais quando necessitamos da construção de regras disciplinares em nossa casa, quando necessitamos dizer não e colocar limites – sem, no entanto, o autoritarismo dos pais, mas com amor, carinho e compreensão para criar envolvimento. Quem sabe, pensar e refletir se não podemos deixar para nossos filhos – e alunos: - A necessidade de “raízes” para que desenvolvam um sentido de identidade, um compromisso social e prudência; - A necessidade de “asas”, ou liberdade de espírito, para que consigam ser independentes, livres e criativos. O ato de proibir nunca deve ter domínio sobre o filho/aluno, mas sim orientação para o seu desenvolvimento, deixando-os receptíveis ao não e às possíveis frustrações que fatalmente surgirão pela vida. O excesso de “mandos”, o abuso da autoridade sobre os nossos filhos/alunos, enfim, a falta de habilidade dos adultos gerará o ato da desobediência. A melhor maneira de se conseguir limites, ainda é o de explicar o real motivo do porquê queremos que a criança execute tal tarefa, ou que ela faça de forma diferente do que estiver fazendo, e não simplesmente interrompê-la. Autoridade excessiva, ordens a todo o momento, castigos constantes não são formas para se conseguir a obediência de um filho ou aluno, mas sim, de suscitar maiores resistências. O fundamental, penso eu, para pais e professores, ainda é conversar e respeitar as opiniões dos filhos/alunos, e, certamente, buscar o equilíbrio entre Liberdade e Limite. Sendo compreendidos e amados, eles saberão retribuir compreendendo, amando e respeitando. Mas – e sempre existe um mas – todos nós sabemos, e muito bem, que isto não é assim tão fácil. Pelo contrário! 10. A sociedade atual, que é extremamente competitiva, pode ter causado algum tipo de crise entre mães e pais em relação à educação de seus filhos? De um ponto de vista mais geral, dois fatores ligados igualmente de modo básico à civilização contemporânea, conduzem ao fenômeno sociológico que foi chamado de “desagregação ou desajustamento da Família”, que foram: a industrialização; e a passagem da economia da fase rural à fase urbana. É possível afirmar que a industrialização e a urbanização intensiva começaram na Europa Ocidental há dois séculos, ganhando terreno e espaço em todo o mundo. Sua incidência sobre o comportamento familiar não pode ser desprezada, desconhecida e, muito menos, deixar de ser levada em consideração. Ela é fundamental, e é ao compasso dessa revolução industrial e urbana que se vai colocando o aspecto social do problema familiar contemporâneo. Se tomarmos o problema dos efeitos das novas estruturas econômicas e sociais, de um ponto de vista global e em seu resultado atual, verificamos que a civilização industrial e urbana tende a ENTREVISTA adaptada à nova sociedade; mas, por outro, suficientemente sólida e capaz de contrabalançar as influências negativas da mesma sociedade e da nova cultura. Este novo modelo de Família não nascerá de uma geração espontânea. Requer tempo, espaço e recursos. Não existem soluções mágicas. É possível, no entanto, oferecer algumas possíveis alternativas de solução. Cito, entre tantas, uma (a que mais acredito): a educação integral básica. Necessitamos de uma mudança radical em nosso sistema educativo. O grande problema, hoje, não é obter a informação, mas sim, o que fazer com ela. Até agora a nossa educação preocupou-se basicamente na transmissão da informação. Em uma sociedade primitiva, a informação é fundamental e necessária. Na sociedade atual, a informação está disponível: os meios de comunicação nos oferecem diariamente uma quantidade de dados, e as redes de informática nos conectam com as principais fontes de informação do mundo inteiro. Os problemas da Humanidade já não são de ordem técnica ou científica, senão de ordem moral. Do ponto de vista científico e tecnológico, já não deveria haver fome no mundo... Quase todos os problemas do homem de hoje são problemas morais, das justas relações entre o homem e a natureza, entre o homem e seus semelhantes, e, principalmente, entre os povos. A educação deve dedicar-se a preparar o ser humano a pensar e a tomar decisões criticamente e por si mesmo, levando em consideração o bem comum. Até hoje, e quase sempre, foram os outros que tomaram as decisões em nosso nome. As ciências e as disciplinas devem estar dirigidas para o homem como princípio e como fim. A promoção do ser humano, antes do poder, do dinheiro e do sistema, deve estar no centro da preocupação. A educação deve prestar uma atenção especial à promoção e a valorização das realidades que nem sempre são quantificáveis, mas que dão sentido à vida. Pela educação devemos um equilíbrio entre os direitos e os deveres, entre a liberdade e a responsabilidade. Quando educamos para os direitos, devemos também educar para cumprir com os deveres. Não existe direito sem dever, e tampouco | julho 2012 criar um novo tipo de Família, bem diferente do antigo. A Família perde, antes de qualquer coisa, sua função econômica. Em uma economia artesanal, a Família é a base não apenas da estrutura social, mas da estrutura econômica. A Família é, então, unidade de produção e de consumo: vive de modo total, sobre si mesma, consumindo diretamente o que produz pelo trabalho de seus membros. Em uma economia industrial, ao contrário, a Família deixa de ser uma unidade econômica de produção e mesmo de consumo. A sociedade dos nossos dias ultrapassa, em muito, o quadro da Família. Os membros da Família vão trabalhar fora, cada um por seu lado. Efetiva-se uma verdadeira dispersão profissional da Família, e os membros da Família muitas vezes passam o dia longe uns dos outros, ocasionando, como resultado desse fato, o esfacelamento da Família. A Família, além disso, perde a sua função de centro de segurança, de instrução e de educação. Fruto dessas transformações nasce um novo tipo de Família: a Família moderna, de características novas e bem determinadas, fundamentalmente, nas seguintes características: - Ela é restrita em suas dimensões; - Individualista quanto a sua constituição e funcionamento; - Despojada de muitas funções que antes lhe pertenciam. Hoje, cada membro da Família trabalha em um local diferente, muitas vezes longe de casa e em turnos diferentes. Os membros da Família pouco se encontram, e a casa quase é um hotel. Assim, observa-se a existência de uma “crise” entre os pais, relacionada à educação dos filhos. Os filhos, no passado, iam juntos à Escola, e seus pais conheciam os professores, que estavam em contato permanente com eles. Se essa sociedade, tal como a vemos hoje, proporciona “dificuldades” em suas relações e vínculos, proporciona, certamente, oportunidade de alguma coisa diferente e, quem sabe, para muitos, melhor. O que necessitamos, sem dúvida alguma, é uma Família com um novo tipo de interação entre seus membros, que seja: por um lado, integrada e 11 ENTREVISTA | julho 2012 12 liberdade sem responsabilidade. Pela educação – com certeza e com plena convicção – é que acredito que teremos melhores condições para fortalecer as relações diárias entre os membros da Família. 11. Conhecendo a função das instituições escola e família, e toda a crise vivida por elas atualmente, que possibilidades existem de efetivar a parceria entre elas, pensando no processo de ensino e aprendizagem dos alunos? A prática, nos nossos tempos, nos revela que o vínculo professor-aluno encontra-se em crescente empobrecimento; a Escola vive um mal-estar no seu interior, e a Família não sabe o que fazer com tudo isso. Alguns sentimentos, todos importantes, merecem ser citados como integrantes nesta realidade vincular: o deboche no lugar da admiração, a intriga no lugar da discussão, a agressividade no lugar do diálogo, a “culpa” no lugar da responsabilidade, e, principalmente, o medo ocupando a função do respeito. Entendo que um dos mais relevantes problemas no sistema educacional hoje é o mal-estar do corpo docente. Seu sofrimento é muito maior do que o baixo salário; sua dor não é só física, é moral. Um espaço só é escolar, porque ali existe ao menos um professor. Do contrário, seria só um prédio que se presta para qualquer atividade. É necessário redefinir o espaço escolar – assim como o da Família – como a instituição que representa a força de trabalho do professor. Nessa lógica, a melhor Escola seria, antes de tudo, aquela que tem os melhores professores. Mas a realidade, hoje, é diferente. O fato, hoje, é que a Escola está vazia, sem força institucional, sem respeito e reconhecimento social. A Escola está sofrendo, e sua carência é de identidade, na medida em que vem se garantindo mais na infraestrutura, e não no profissional que lhe dá o sentido de existir: o professor. Quando falo professor, refiro-me não só à pessoa que toma para si a possibilidade de ter por trabalho a docência, mas do sentido que a palavra professor tem, diante da responsabilidade ética de ensinar. Ensinar implica “um destinar”, “fazer sina”, que é mais que apresentar um conjunto de conhecimentos. Ensinar é transmitir o valor que estes conhecimentos têm no contexto cultural e na trajetória da formação que propõe. Que o aluno aprende e o professor ensina, já sabemos. Mas, refletir como é que o professor realiza esse ato, requer estar disposto a viver com intensidade o valor da experiência. Em meu entender, só um ensino é possível: aquele que visa a educar – e não a doutrinar – os sentidos de uma criança, pois: - Não se trata só de conhecimentos, mas o que visamos obter com estes; - Não se trata exclusivamente de uma reforma curricular, mas de repensarmos o que estamos fazendo com nossa espécie, nossa forma de vida, nossos semelhantes. É dizer, quando ensinamos, o que é que ensinamos. E para o professor, qual é a real lição que aprendeu com o conhecimento que se propõe a ensinar. Por quem – e não só para quem – é, realmente, que o professor ensina. Como compreender, por outro lado, o desrespeito, a desconsideração que o estamento político mantém com a Escola? E como essa problemática – entre Escola e Família – reanima o distanciamento da Família em relação à Escola? Há muito tempo sustento uma ideia de que o Estado, ao negligenciar com o valor real da Escola, produz, inevitavelmente, um ambiente problemático para o vínculo profissional do sujeito e a sua função de professor. Ou seja, a chamada profissionalização do professor. Essa inadequação entre o sujeito e a função do professor constitui um elemento forte para tornar cada vez mais instável o processo ensino-aprendizagem, que, por sua vez, intensifica as tensões e atritos nas demais formas de vínculo que se produzem na Escola: professoraluno, professor-escola, professor-família, aluno-aluno e, principalmente, professor-professor. Então, o que é de responsabilidade da Família e o que é de responsabilidade da Escola? Em uma forma muito particular, acredito Algumas considerações... Em definitivo, o mundo da Família é uma fantástica Escola que nos mostra, a cada dia, a diversidade de interesses no interior da mesma. Mostra, ainda, a dificuldade de se conseguir acordos entre as regras, atitudes e valores familiares, e o que cada um acredita que seja o adequado para si. “Todos os lugares” e “todos os dias”, essas expressões, muito mais que palavras, revelam, em seu sentido mais amplo, o espírito científico e inovador da intenção e nos interesses de oferecer essas palavras que são voltadas, desde as suas raízes, para a necessidade de pensar na possibilidade de uma Democracia que deve construir-se conjuntamente, em nossas relações de todos os lugares e em todos os dias: na Família, na Escola, nas organizações comunitárias de que participamos, em lugares que trabalhamos e cidades que vivemos. A Família, assim como a Escola, não consegue mais viver fechada em si mesma. Ela vive com a mídia, com a propaganda, com a educação ou deseducação das crianças, com a globalização e com um mundo on-line. Vivem no mundo do controle remoto. Os novos seres que vêm ao mundo, já não se encontram limitados às quatro paredes do lar. Seus olhos abertos os levam para além delas. Seus olhos os levam para o mundo das imagens, da percepção, da indústria da cultura e para o mundo da informação. Aos pais, em meio a tudo isso, resta a tarefa de amar, criar e educar. Resta aos pais – e isto é fantástico! – promover a vida em Família, promover o diálogo e fazer com que a Família continue sendo o lugar onde podemos, todos nós, desenvolver o amor seguro e mútuo. O mundo marcha à frente e é para lá que temos que ir. Há uma evolução natural das coisas, dos atos e dos fatos. Todos evoluímos, ao menos essa é uma das propostas mais sinceras da nossa espécie. Aprender, evoluir e ser melhor em nossa vida profissional, mas, também não podemos descuidar de nossas vidas pessoais. Todas essas mudanças que estamos presenciando carregam consigo um preço. A Família – como instituição humanizadora da sociedade – é a principal atingida, uma vez que ela é a caixa de ressonância da sociedade. É na Família que vemos o mundo como ele se apresenta: por um lado, ele é cheio de contradições, conflitos e frustrações. De outro, está impregnado de amor, solidariedade e significativas vivências diárias e sonhos. Em uma sociedade onde prevalecem burocracia e a tecnologia, como é a do nosso país, com a imposição de seus valores quantitativos é necessário – e urgente – reforçar a formação humanista de nossas crianças. É necessário ainda, que nessa mesma sociedade, existam modelos de “mulheres e homens” que efetivem, em sua vida diária, um novo estilo de vida que inspire e motive os demais. Afinal, é de se perguntar: por que devemos acreditar que a Família é importante? Quem sabe, é porque acreditamos que é na Família que criamos e solidificamos os nossos vínculos de carinho e de amor mais duráveis? Quem sabe, é na Família que as crianças aprendem valores, sentimentos e atitudes do que é certo e do que é errado? Quem sabe, nos damos conta de que mulheres e homens numa Família são iguais e a condição humana é a mesma. A origem é a mesma e o destino final também é o mesmo. É preciso acreditar na função humanizadora da Família e na humanização da sociedade, em seus valores e nos seus princípios de liberdade e dignidade da pessoa humana. No mútuo e inteli- ENTREVISTA - À Família, compete educar o seu filho, porque tem um amor individual pelo mesmo. Mas, como a Família não foi educada para educar o seu filho, ela deve procurar a Escola para ser ensinada a educar o seu filho; - À Escola, compete ensinar todos os alunos, porque tem um amor pela função que desempenha. Logo, colocamos os nossos filhos na Escola, para que aprendam coisas diferentes do que aprendem na Família. Por isso, a Família tem que continuar tendo a sua função de humanizar os seus filhos e a Escola o seu papel, entre outros, de socializar os seus alunos! Ainda bem... | julho 2012 que: 13 ENTREVISTA | julho 2012 14 gente respeito pelo outro. É possível acreditar na amizade, no afeto, na diversidade, na solidariedade e nas pequenas coisas. Fique sempre do lado de quem você ama, procure entender um pouco melhor o mundo mágico dos seus filhos, busque a felicidade nas pequenas coisas, tenha paz na vida e viva em paz, preserve os seus valores, instintos e convicções e sonhe! Acredite no sonho de um mundo de pessoas que dizem não às drogas, às injustiças sociais e à corrupção. Pode acreditar que o século XXI será o século da comunicação e da Família, porque através da comunicação sempre haverá informação e entretenimento e um lugar para as famílias no processo educativo. E, isso tudo, sem sair de casa. Claro, e lógico, que devemos renegociar os contratos do casal, as relações paternas e maternas, os vínculos dos filhos com os pais e a distribuição de responsabilidades e direitos na vida familiar. Pense que a autorrealização é um mito. Ninguém tem condições de se realizar sozinho. Ainda não temos uma ideia do que a associação de uma mulher e um homem pode realizar. E produzir! Ninguém precisa sair de si para encontrar o outro. Todo e qualquer relacionamento com um “outro” começa dentro das pessoas. Começa com um ato de amor. Não há lei, nem cálculo racional, por mais sábio que pareça, que tenha o poder de suprir a falta de amor. Sendo assim, o futuro da humanidade vai depender, cada vez mais, do que mulheres e homens decidirem realizar juntos e em conjunto e não um contra o outro. Tudo isso, no entanto, só é possível na Família que, mesmo em constante transformação, ainda lhe cabe tornar humano cada membro que nasce. A experiência se dá na Família. Enquanto o indivíduo, por intermédio da ciência, brinca de ser Deus, nada substitui a Família na execução de amar, cuidar e educar. Cuidar da Família, de todas elas e elas todas, é vital para o indivíduo, para a sociedade e para a vida. Claro que, para cuidar da Família, é preciso entender a Família. Para entender a Família, é necessário aprofundar o conhecimento da pessoa humana, sua natureza e seu dinamismo. Somente entendendo a pessoa, se pode entender a Família e finalmente a Sociedade. Logo, para cuidar da Família, não basta um Dia da Família, nem um Mês da Família e tampouco um Ano da Família. Necessita-se uma Vida Toda. É sábio quem pensa que o futuro da Família independe de qualquer espécie de movimento de massas. É uma ilusão pensar que melhores leis e leis mais severas estão fazendo falta. Quem acha – ou acredita – que é preciso reconstruir a Família, para que tudo volte a funcionar como antes “Não vê que o doente não é a Família, mas o seu núcleo central, que é o casal!”. É importante saber que o mundo não pode ser dominado por tecnocratas dum lado e teocratas de outro. Uns falam em nome do progresso e os outros em nome da salvação da humanidade. Sempre vai valer a pena existir o equilíbrio entre um e outro. Não haverá à disposição de ninguém um modelo de Família pronto para consumo. Como não se constrói uma cidade com os restos de um terremoto, do mesmo modo seria irracional reconstruir a Família com que dela sobrou. Existem erros, fracassos, equívocos, injustiças, mas a nossa função no mundo é contribuir para efetivar a justiça numa sociedade de todos e para todos. Este, acredito, é um objetivo que nunca se concluirá, mas do qual não podemos abrir mão e nem desistir. Se o fracasso bater na sua porta, não abaixe a cabeça demais. Se o sucesso chegar, não a levante muito. Por isso, é urgente dizer aos nossos filhos e crianças que podemos ser melhores do que estamos sendo. Tente! Seja feliz! ARTIGOS ARTIGOS ARTIGOS 1 Educação Integral nas Escolas do Campo de Ivoti Carine Vanderléa Dörr Pós-Graduada em Gestão na Escola Coordenadora Pedagógica nas Escolas do Campo | julho 2012 Resumo: No cenário de reflexões sobre professor e aluno, sujeitos inseridos numa sociedade contemporânea trazem-se possibilidades de “dar sentido” à escola que temos por meio da educação integral. Ressalta-se que as discussões sobre a educação integral, não se limitam à ampliação da carga horária de permanência do aluno na escola, mas sim, à concepção que se tem de aluno como um sujeito inteiro, concebendo suas vivências e experiências. 16 A sociedade atual vem sofrendo grandes transformações. A escola, indubitavelmente, não foge à regra, pois ela também vem se modificando. O estudante de hoje, em sua grande maioria, possui uma identidade que tem íntima relação com a cultura tecnomidiática. A partir desses meios, o aluno pode exercer sua autonomia, buscando as informações que necessita. Consequentemente, o perfil de professor também se modificou, pois precisa ajudar o educando a selecionar as informações de que precisa, refletindo sobre sua veracidade e credibilidade, além de ensinar conceitos que possam contribuir no reconhecimento dessas informações. Vindo ao encontro das atuais necessidades de remodelação da escola, como instituição de ensino e aprendizagem, o Ministério da Educação propõe a ampliação da carga horária de permanência dos alunos nas escolas. Dessa forma, caracteriza-se a educação integral pelo reconhecimento da necessidade de ampliar e qualificar o tempo escolar, superando o caráter parcial e limitado que as poucas horas diárias proporcionam, em estreita associação com o reconhecimento das múltiplas dimensões que caracterizam os seres humanos. Nesse cenário, há uma tendência nacional das Escolas do Campo de ampliarem a jornada escolar, pois acreditam que a Educação Integral vem ao encontro dos interesses, das vivências, das linguagens, das curiosidades e das singularidades dos alunos, para que tenham espaço, tempo e oportunidade de se associar ao processo de ensino e aprendizagem. Estudos realizados pelo Ministério da Educação sinalizam para a necessidade de se criar uma Escola do Campo viva, pulsante, em contato com o seu entorno e em diálogo com os seus estudantes. Sabe-se que a educação não é somente função da escola, mas sim de toda a comunidade. Por isso, faz-se necessário que os diferentes segmentos que compõem a comunidade escolar estejam em sintonia. A família e a escola precisam dialogar, Em relação ao contexto em que as Escolas do Campo estão inseridas, é necessário ressaltar que muitos alunos vivem em uma realidade rural, trazendo conhecimentos relacionados a esse local. A partir dessas intervenções do professor, é possível formarmos cidadãos questionadores, participativos, críticos, conscientes não só de seus direitos, mas também de seus deveres; que aprendam a buscar o conhecimento; que possuam bons valores e que contribuam para a melhoria do meio em que vivem. Concorda-se com Freire (2004, p.54), quando diz: “Afinal minha presença no mundo não é a de quem se adapta, mas a de quem nele se insere. E a posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas sujeito também da história.”. Nessa perspectiva, enquanto profissionais da educação das Escolas do Campo, destacamos no Projeto Político-Pedagógico nossas expectativas em relação aos nossos alunos, isto é, queremos que eles sejam cidadãos ativos na sociedade, que contribuam positivamente para seu crescimento. Nós, seres humanos, não só somos seres inacabados e incompletos como temos consciência disso. Por isso, precisamos aprender “com”. Aprendemos “com” porque precisamos do outro, fazendo-nos na relação com o outro, mediados pelo mundo, pela realidade em que vivemos. (GADOTTI, 2003, p. 47). Ensinar e aprender são ações que precisam acontecer a partir da interação com o outro, na vivência e troca de experiências, e não na trans- ARTIGOS Além do conhecimento trabalhado em sala de aula, fundamentado no currículo e no plano de estudos, cada educando traz consigo os conhecimentos e a cultura da realidade em que se insere. Tais conhecimentos devem ser considerados em sala de aula, especialmente, porque “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE, 2004, p. 23). missão de conhecimentos prontos. O aprender não é acumular conhecimento, e sim compartilhar – partilhar, construindo uma nova forma de pensar, de entender e de se reconhecer dentro do contexto. A aprendizagem vai além dos conteúdos básicos. Integra, principalmente, o contexto social, histórico, político e econômico da sociedade em que estamos inseridos. O que aprendemos precisa significar para nós; caso contrário, não tem sentido nenhum estarmos aprendendo. Precisamos aprender para a vida. O aprender precisa extrapolar a sala de aula, ir além das quatro paredes, buscando interagir com o mundo. Referências Bibliográficas: FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 30° ed. São Paulo | Paz e Terra, 2004. GADOTTI, Moacir. Boniteza de um sonho. Novo Hamburgo | Feevale, 2003. | julho 2012 pois só assim os valores e princípios trabalhados por uma das partes coincidirão com os da outra. Através do diálogo entre família e escola, é possível observar o progresso dos educandos e objetivar um futuro melhor para eles. 17 ARTIGOS 2 Atividade Física = Qualidade de Vida Débora Cristina Bork Graduada em Educação Física pela Unisinos Coordenadora de Eventos do Programa “Lazer Unindo Gerações” – PLUG | julho 2012 Resumo: Através desta pesquisa, ressalto a importância da atividade física no cotidiano das pessoas, tendo como objetivo a adesão da população e o reconhecimento da importância da atividade física e dos Profissionais da Educação Física, melhorando a qualidade de vida e evitando o sedentarismo. 18 M uitas vezes deixamos as atividades físicas de lado, por termos outros afazeres. Porém, não podemos deixar de nos exercitar. A atividade física, seja ela qual for, é um bom caminho para nos livrar do sedentarismo e ajudar a manter a forma, além de melhorar o humor, regular o apetite e aliviar a tensão. O envelhecimento é uma sucessão de mudanças naturais que ocorrem nos indivíduos a partir do nascimento, de forma progressiva e irreversível, acompanhando-os até a morte (MAZO, LOPES e BENEDETTI, 2004). Este processo é muito dinâmico, instalando-se nas pessoas de maneira muito individualizada. Por isso, Nahas (2003) destaca a existência da idade cronológica e da idade biológica. A idade cronológica determina a quantidade de anos que a pessoa viveu até a data atual; a idade biológica caracteriza as condições de saúde e a forma como as pessoas vivem. Através de diversas modalidades, pessoas de várias faixas etárias melhoram seu bem-estar físico, mental, emocional e psicológico. Com a idade, geralmente ocorre um decréscimo da massa muscular e, consequentemente, da força muscular. Este quadro pode ser acelerado pela inatividade, ou seja, pelo desuso do sistema muscular esquelético, provocando a atrofia muscular. Com isso, idosos ficam mais susceptíveis às quedas e fraturas, além de perderem gradativamente a capacidade de executar as tarefas do dia a dia, ocorrendo, assim, uma diminuição na capacidade funcional; por isso, a importância da atividade física ser realizada durante toda a vida. Alguns benefícios individuais podem ser notados quando há a prática da atividade física, como, por exemplo, benefícios fisiológicos: controle de níveis de glicose, melhorias na qualidade do sono e na capacidade cardiorrespiratória, manutenção da força, resistência, flexibilidade, equilíbrio, coordenação e velocidade dos movimentos, diminuindo Referências Bibliográficas ARTIGOS | julho 2012 assim, o risco de lesões. Também podem ser notados benefícios psicológicos: redução nos níveis de ansiedade, estresse e depressão, melhorias no estado de espírito, bem-estar geral e melhorias cognitivas. E, não menos importantes, benefícios sociais: integração na comunidade, na rede social e cultural. O alongamento e a mobilidade articular são indispensáveis na fase de aquecimento, devendo ser realizados antes de iniciar a sessão de exercícios, ao término da sessão, deve ser realizado o alongamento e gradativa volta à calma. Barbosa (2000) destaca alguns benefícios que o alongamento pode gerar. Conforme a autora, o alongamento proporciona melhoras na coordenação motora e alívio de tensões musculares e emocionais, além de ampliar os movimentos e ativar a circulação sanguínea. Dessa forma, concluímos que é possível adiar os efeitos do envelhecimento, preservando a autonomia, através da manutenção de atividades físicas, pois torna-se clara a associação entre um estilo de vida fisicamente ativo e a qualidade de vida. Como benefícios, temos a redução do custo com cuidados de saúde e atendimento social, melhorando a participação e a produtividade dos praticantes em atividades comunitárias. Em função disso, nós, educadores, devemos, indiferentemente da nossa área de atuação, pensar em nós mesmos, “arrumando” tempo e não desculpas para não cuidarmos da própria saúde, aliviando, assim, as tensões do dia a dia de educador, que muitas vezes são desgastantes, mas muito gratificantes. BARBOSA, Rita Maria dos Santos Puga. Educação Física Gerontológica: Saúde e qualidade de vida na terceira idade. Rio de Janeiro | Sprint, 2000. MAZO, G.Z; LOPES, M. A; BENEDETTI, T. B. Atividades físicas e o idoso: concepção gerontológica. 2° ed. Porto Alegre | Sulina, 2004. NAHAS, Markus V. Atividade física, saúde e qualidade de vida: conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. 3° ed. Londrina | Midiograf, 2003. 19 ARTIGOS 3 Professor Gestor? Deizi Daiane Habitzreiter Graduada em Letras / Pós-graduanda em Aprendizagem na Língua Alemã Professora da E.M.E.I. Pedacinho do Céu | julho 2012 Resumo: A instituição escolar é formada por inúmeros indivíduos com funções específicas. Delega-se à equipe gestora a tarefa de conduzir a escola. Atualmente, as equipes gestoras mostram-se mais abertas ao diálogo, já que compreendem todos os sujeitos que as constituem como colaboradores. Nessa perspectiva, todos podem contribuir com suas potencialidades para o aperfeiçoamento do espaço escolar. O professor tem funções semelhantes em seu espaço de trabalho, podendo ser considerado também um gestor da sala de aula. 20 S abemos que a escola é constituída por diversos segmentos, entre eles há professores, funcionários, direção, alunos, conselho escolar, pais e responsáveis, orientação e supervisão escolar. A parte essencial, contudo, é o aluno. É por ele, e para ele, que pensamos a Educação. Como nos demais âmbitos da sociedade, na escola também há uma hierarquia de poderes, na qual a coordenação, a direção e a supervisão estão no topo. Elas detêm o poder para tomar as decisões referentes a cada realidade escolar. Atualmente, as equipes gestoras têm se mostrado mais abertas ao diálogo com os demais componentes da comunidade escolar. Todos os elementos constituintes de uma escola são considerados colaboradores da escola de sua comunidade. Sovienski e Stigar (2008, p. 53) acrescentam que “a gestão de pessoas visa à valorização dos profissionais e do ser humano, diferentemente do setor de Recursos Humanos que visava à técnica e o mecanicismo profissional”. Consoante Fagundes (2009), há três fatores básicos para ocorrer a gestão democrática: os poderes da humildade, da aceitabilidade e da delegabilidade. Sendo humildes, os gestores reconhecem que há pessoas capazes de contribuírem para o sucesso de uma instituição, utilizando suas habilidades pessoais. Paralelamente a essa qualidade, é importante que o gestor seja capaz de aceitar sugestões dos sujeitos envolvidos. Por final, é imprescindível que o gestor delegue tarefas para seus colaboradores, pois dessa forma ele demonstra confiança neles. Além disso, a partir dessas atitudes da equipe gestora ou do gestor, os colaboradores desenvolverão um sentimento de participação e de trabalho em equipe. As capacidades intra e interpessoais de um gestor são necessárias para que ele motive os profissionais da escola a serem seres ativos na instituição. Colaboradores ARTIGOS pessoas_e_RH.pdf> – Acesso em 23.05.2012. STEDILE, Maria Inez. O professor como gestor da sala de aula. Maringá : Universidade Estadual de Maringá, 2009. Fonte: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/ arquivos/2145-8.pdf> – Acesso em 23.05.2012. | julho 2012 são mais ativos e autônomos, cooperam e interagem nas decisões com seus gestores; enfim, participam ativamente de sua escola. Na gestão participativa, somam-se as diferentes habilidades de seus colaboradores, a fim de atingir um objetivo em comum. Percebe-se isso na seguinte citação de Fagundes (2009, p. 15): “(...) o ser humano nunca tomou nenhuma decisão sozinho e alcançou plenamente os seus objetivos”. Essa perspectiva de gestão, valorizando as potencialidades de cada indivíduo, é adaptável à sala de aula pelo professor. Dessa forma, compreende-se o professor como um gestor da sala de aula. Quanto a isso, Stedile (2009, p. 5) acrescenta: “(...) a gestão em sala de aula, como um prolongamento da gestão escolar, pressupõe um espaço onde, com a orientação do professor, possam ser produzidos, manifestados e experimentados comportamentos democráticos”. Partindo desse ponto de vista, as características mencionadas como necessárias para o gestor escolar, são também imprescindíveis para um bom trabalho do professor em sala de aula. Há uma redefinição do papel do professor. Logicamente, parte-se de uma visão macro para uma perspectiva micro; contudo, as funções voltadas à gestão de pessoas são semelhantes. Por isso, podemos dizer que o professor também é um gestor. Face ao exposto, o professor gestor – ou o gestor – tem a tarefa de despertar o interesse dos diferentes componentes relativos à escola a participarem da vida escolar e se sentir parte integrante da mesma, contribuindo e interagindo juntos para se obter um bem comum. Dessa maneira, estaremos exercendo a democracia. Referências Bibliográficas: FAGUNDES, Antonio Ribeiro. Gestão Democrática: Uma análise a partir de elementos da obra pedagógica de Paulo Freire. Dissertação de Mestrado. 63 páginas. São Leopoldo | Escola Superior de Teologia, 2009. SOVIENSKI, Fernanda; STIGAR, Robson. Recursos Humanos X Gestão de Pessoas. Gestão – Revista Científica de Administração, v. 10, n. 10, jan/jun 2008. Fonte: <http:// www.opet.com.br/artigos/pdf-pg-artigos/Gestao_de_ 21 ARTIGOS 4 Dialogando Sobre Aquisição de Linguagem e Surdocegueira Fernanda Cristina Falkoski Tradutora/intérprete de Língua de Sinais Graduanda em Letras pela Unisinos e em Educação Especial pela UFSM [email protected] Resumo: Compreende-se que a linguagem é um dos requisitos fundamentais para estabelecer a comunicação entre as pessoas, que ela é própria dos seres humanos e pode ser manifestada de diversas formas. | julho 2012 A 22 inda hoje, ao se falar sobre o aluno com deficiência, a maioria das pessoas para para pensar e se questionar sobre como se dá o processo de ensino e aprendizagem desse sujeito; como desenvolver um trabalho para incluí-lo na sociedade e oferecer-lhe oportunidades de acordo com as suas especificidades. Um problema que faz com que o trabalho seja mais difícil é a escassez de conhecimentos acerca desse assunto, bem como a falta de preparo dos profissionais que trabalham na área. Assim, acontece com a especificidade do aluno surdocego. Algo que deve ainda ser levado em consideração é se esse aluno for um surdocego pré-linguístico. O que fazer? Como fazer? Talvez a primeira pergunta, e mais importante, a ser respondida seja: O que é um surdocego pré-linguístico? Parece necessário iniciar com uma definição mais completa de surdocegueira: Uma deficiência única que apresenta a perda da audição e visão de tal forma que a combinação das duas deficiências impossibilita o uso dos sentidos de distância, cria necessidades especiais de comunicação, causa extrema dificuldade na conquista de metas educacionais, vocacionais, recreativas, sociais, para acessar informações e compreender o mundo que o cerca. (AGAPASM, 2011) Há duas distinções importantes a serem esclarecidas sobre a surdocegueira, dividida em pré-linguística e pós-linguística. É fundamental compreender essa diferença, pois é a partir disso que o trabalho será moldado, de acordo com o sujeito a ser atendido. O surdocego pré-linguístico é aquele que nasce já com a deficiência ou que a adquire nos primeiros anos de vida, antes do processo de aquisição de uma língua – seja ela oral ou visual. A surdocegueira pós-linguística, por sua vez, é aquela que o indivíduo adquire ao longo da vida, depois de já ter uma língua estruturada, ou seja, depois de ter adquirido todos os componentes da língua e utilizá-la em situações cotidianas na interação com se definirmos o pensamento como atividade mental consciente, podemos primeiramente observar que pensamento ou pelo menos cer- Nesse exemplo, é possível perceber o pensamento sem a linguagem. Essa música poderia ser expressa através de uma melodia, um ritmo, sem o uso de uma única palavra, e sem que fosse necessário ativar recursos linguageiros para compreendê-la. Portanto, a discussão sobre essa relação, pensamento e linguagem, traz uma situação interessante: o momento em que uma pessoa quer dizer algo, expressar uma ideia, mas não sabe como, que palavras usar. Nesse momento, poderíamos comprovar que o pensamento pode existir sem a linguagem, pois o indivíduo está pensando, mas não está usando uma linguagem. De acordo com esses questionamentos e conceitos relatados, exemplifico, na prática, como se dá o processo de aquisição de linguagem de um sujeito surdocego pré-linguístico, com base em quais evidências posso comprovar que esse indivíduo possui linguagem. A partir da organização de um trabalho bem específico para o desenvolvimento da linguagem, com o uso de objetos de referência, sinais e atividades adaptadas, consigo estabelecer alguns indícios de uma comunicação com determinado aluno. Esses objetos de referência servem para antecipar ao aluno o que irá acontecer em seguida; ou seja, antes de ir ao banheiro, o sujeito precisa ser informado que isso acontecerá, e como isso poderá ser feito se não posso usar nem a fala, nem a imagem visual? Através do tato, apresentando-lhe um objeto que foi convencionado para referenciar aquele momento – no caso, uma toalha. Esse é um exemplo de atividade a ser desenvolvida com esse sujeito, lembrando que o mais importante a ser pensado nesse trabalho é como antecipar ao aluno o que acontecerá. No momento em que ele compreender e antecipar o que acontecerá, poderei dizer que ele tem linguagem, que ele pensa e que ele se comunica. ARTIGOS tos tipos de pensamento podem existir completamente independentes da linguagem. O exemplo mais simples é a música. (1980, p. 45) | julho 2012 seus pares. Depois de conceituar algumas das propriedades da deficiência a ser pensada, trago reflexões acerca da teoria a ser confrontada com a prática. Discutiremos sobre as propriedades da linguagem e o que ela implica no desenvolvimento do ser humano. A linguagem é um dos constituintes básicos para que se tenha uma língua. Um questionamento que sempre me fiz em relação à linguagem, é se a pessoa deve ter a língua e a linguagem paralelamente. E assim me deparei com a seguinte teoria: uma pessoa que tem linguagem não precisa, necessariamente, ter uma língua, mas no momento em que ela tem uma língua, obrigatoriamente precisa da linguagem para compreendê-la. Outro fator que deve ser discutido é a comunicação, que pode ocorrer de formas distintas, mas que sempre terá a mesma finalidade, informar algo a alguém, e será sempre estabelecida através da linguagem. Também é importante ressaltar que a linguagem está associada ao pensamento, ou seja, uma pessoa só possui linguagem se pensar, só usa desse mecanismo, a linguagem, no momento em que consegue pensar o porquê, o para quem e o como vai se comunicar. Assim, também se conclui que o pensamento pode existir sem a linguagem, mas a linguagem necessariamente precisa do pensamento para existir. O pensamento sempre ocorre a partir de uma motivação, seja ela qual for, por exemplo: fome, sede, dor, necessidades fisiológicas – enfim, a pessoa pensa por causa de alguma coisa. Com base nessa afirmação, o seguinte questionamento se faz necessário: Como saber se uma pessoa que não fala, não ouve e não vê, pensa? A partir de quais reações posso comprovar que existem o pensamento, a linguagem e a comunicação? Quando e como saber se existe uma comunicação entre a pessoa e as que a rodeiam? Assim, devemos nos questionar sobre a linguagem e o pensamento, se existe relação entre ambos. Segundo Langacker, 23 ARTIGOS | julho 2012 24 Referências Bibliográficas: GARCIA, Alex. Multideficiente/Surdocego. Disponível em: http://www.agapasm.com.br/multideficiente.asp Acesso em 05.03.2012. GARCIA, Alex. Surdocegueira Empírica e Científica. (s/d) LANGACKER, Ronald W. A linguagem e sua estrutura. Rio de Janeiro | Vozes, 1980. ARTIGOS 5 Família na Atualidade Resumo: Os pais da atualidade têm pouco tempo para ficar com seus filhos, e quando estão com eles, demonstram não estar preocupados em educar e sim em desfrutar com os filhos momentos de prazer. E a quem acaba ficando a tarefa de educar? Acaba ficando para a escola. A família pós-moderna busca na escola uma “parceira” na educação de seus filhos, que passam mais tempo em atividades escolares do que com suas famílias. Palavras-Chave: Família. Escola. Educação. “F amília: núcleo parental formado por pai, mãe e filhos. Pessoa do mesmo sangue; parentela. Linhagem; estirpe.” (LUFT, p. 321). Segundo Anthony Giddens (2000, p. 67), só uma minoria vive hoje no que poderia ser chamado de “a família padrão da década de 1950”, ambos os pais morando juntos com os filhos nascidos de seu casamento, sendo a mãe uma dona de casa em tempo integral e o pai assegurando o sustento. O que existe hoje é uma diversidade de formas de famílias; a maior parte da vida familiar foi transformada pelo surgimento do casal informal e da união informal. Segundo o autor, estatisticamente o casamento ainda é condição normal, mas para a maioria das pessoas seu significado se transformou completamente. O casamento significa que um casal está vivendo uma relação estável, e pode na verdade promover essa estabilidade, uma vez que envolve uma declaração pública de compromisso. No entanto, ele não é mais a principal base definidora da união. E como ficam as crianças que vivem em meio as mais diversas e variadas formas de relações familiares, com padrastos/madrastas, meio-irmãos (biológicos ou adotivos)? As mudanças não estão apenas na configuração e na estrutura familiar; o que também preocupa muito são as práticas educativas familiares. As famílias deixam de ter formas claras de educar seus filhos; a autoridade e a hierarquia não são mais respeitadas. Segundo Giddens (2000), valorizamos tanto as crianças hoje porque elas se tornaram mais raras, e em parte porque a decisão de ter um filho é agora muito diferente do que foi para gerações anteriores. Na família tradicional, os filhos eram uma vantagem econômica. Enquanto hoje, nos países ocidentais, um filho, ao contrário, representa um grande esforço financeiro para os pais. As mães também passaram a ter uma partici- | julho 2012 Julici Lúcia Lippert Altenhofen Licenciada em Letras pela Unisinos Coordenadora Pedagógica da E. M. E. F. 25 de Julho 25 ARTIGOS | julho 2012 26 pação mais efetiva na sociedade, na política (até uma presidenta elegemos) e no mercado de trabalho. Ficando assim a educação dos filhos para terceiros (tias, creches, avós...). Os pais da atualidade têm pouco tempo para ficar com seus filhos, e quando estão com eles, demonstram não estar preocupados em educar e sim em desfrutar com os filhos momentos de prazer. E a quem acaba ficando a tarefa de educar? Acaba ficando para a escola. A família pós-moderna busca na escola uma “parceira” na educação de seus filhos, que passam a maior parte de seu tempo em atividades escolares, e não mais com suas famílias. A educação dessas novas gerações é um tema que preocupa as instituições de ensino, que têm como função não apenas a transmissão de conhecimentos, mas a veiculação de uma determinada filosofia de vida. A família busca na escola respostas para a educação e para o mundo seu e de seus filhos. A escola precisa estar atenta: não basta construir conhecimento, é preciso viabilizar que o aluno construa sua identidade, sua autonomia, com responsabilidade e cidadania. Isso só é possível se a família e a escola andarem juntas, sendo, ambas, sujeitos do processo educativo. Com essa parceria todos ganham, e juntos passam a ser sujeitos da educação. Sabe-se que é na família que se forma o caráter. A escola depende da participação familiar, em alguns momentos apenas para incentivar, em outros para participar da forma efetiva no aprendizado, ajudando a pesquisar, refletindo com o filho temas/assuntos que o filho traz da escola. Uma escola, por mais bem preparada que esteja, nunca irá suprir uma família ausente. A família (pai, mãe, avó ou avô, tios, ou quem quer que tenha responsabilidade pela educação da criança) deve acompanhar de perto o que acontece na escola. Não resta dúvida de que a escola é um lugar privilegiado; porém, não é só na escola que se dá a educação: a educação se dá na vida e para a vida. Referências Bibliográficas: GIDDENS, Antony. Mundo em Descontrole: O que a globalização está fazendo de nós? Rio de Janeiro | Record, 2000. LUFT, Celso Pedro. Minidicionário da Língua Portuguesa. 22° ed. São Paulo | Ática, 2009. ARTIGOS 6 Alterações da Fala ou Alterações da Linguagem? Conhecendo para Prevenir na Educação Infantil Marliese Christine Simador Godoflite Especialista em Reabilitação em Fonoaudiologia com ênfase em Linguagem Especialista em Atendimento Clínico com ênfase em Psicopedagogia Coordenadora Geral do PLUG A habilidade de falar é tão importante que se torna difícil conceber a vida sem linguagem. Antes de discorrermos sobre a linguagem, é interessante fazermos uma diferenciação entre fala, voz e linguagem. Por fala, compreende-se a exteriorização do pensamento abstrato, feita através do uso sistemático de emissões ou expressões de símbolos verbais ou palavras contidas no código de uma língua. Assim, consideramos que a fala é a articulação e a emissão dos fonemas de uma língua. Por voz, entende-se o som produzido pelo homem, que o identifica, quanto a sua idade, sexo, tipo físico, raça, procedência, característica de personalidade e estado emocional. E finalmente, por linguagem, concebemos o todo necessário para comunicação de nossos pensamentos e ideias. Sendo entendida como algo interior, a linguagem pode ser tanto verbal quanto não-verbal. A linguagem é verbal quando expressada por intermédio da fala. A linguagem não-verbal é aquela que envolve o uso de gestos indicativos e/ou representativos, expressão corporal e facial, manifestados através de qualidades e características vocais específicas (FREIRE, 1997). Alterações da fala ou alterações da linguagem | julho 2012 Resumo: A habilidade de falar é tão importante que se torna difícil conceber a vida sem linguagem. Diferenciação entre fala, voz e linguagem. Alterações da fala ou da linguagem. A comunicação, além de satisfazer uma necessidade básica do ser humano, é um dos mais penetrantes, complexos e importantes aglomerados de seu comportamento social. Nossas vidas cotidianas são afetadas seriamente pelas nossas comunicações com os outros, e é na educação infantil que muitas alterações podem ser prevenidas e/ou tratadas. Segundo Zorzi (2002), pensamentos, ideias e desejos vão se transformando em palavras de acordo com condições pragmáticas, morfossintáticas e semânticas que os usos e a normas da língua determinam. Estamos falando da etapa de processamento simbólico ou de planejamento. Porém, para que estes símbolos, que ainda se encontram no interior de nossa mente, possam chegar até nos- 27 ARTIGOS | julho 2012 28 sos interlocutores, há necessidade de transformá-los em sons (no caso da palavra falada), ou em letras (no caso da palavra escrita). Estamos, agora, referindo-nos ao aspecto da execução ou da realização motora das palavras. Mas, antes que as palavras sejam pronunciadas, deve ocorrer uma programação dos movimentos que os órgãos envolvidos na produção da fala deverão realizar para produzir os fonemas que compõem as palavras, assim como há necessidade de que seja programada a velocidade dos movimentos e a intensidade com que os sons serão produzidos. Distúrbios da Linguagem: Dificuldades ou alterações que podem compreender o uso da linguagem com fins comunicativos, a capacidade de produzir e compreender enunciados gramaticalmente estruturados e/ou semanticamente apropriados. Ou seja, distúrbios que prejudicam aspectos ligados à fase do planejamento, assim como da própria compreensão da linguagem. Distúrbios da Fala: Correspondem às alterações que afetam os padrões de pronúncia ou de produção dos sons da língua. Tais distúrbios estão ligados, principalmente, às fases de programação e/ou execução neuromotora. Tipos de alterações mais comuns: • Adição ou inserção de sons que não deveriam estar presentes na palavra. • Distorção, ou pronúncia aproximada de um fonema, permitindo sua identificação com o fonema padrão. • Imprecisão articulatória, que corresponde às produções pouco diferenciadas, ou com pouca clareza, dos sons, dificultando a identificação deles com o que deveria ser padrão. • Omissão ou ausência de fonemas que deveriam fazer parte da palavra. • Substituições de um som da fala por outro. Alterações de Origem Músculo-Esqueletais ou Anomalias Orofaciais: Correspondem aos distúrbios causados por problemas nas estruturas ósseas e musculares envolvidas na produção da fala. Fazendo parte deste grupo, encontramos as fissuras, as lesões ou remoções de partes ósseas ou musculares, e alterações de forma ou de tamanho dessas mesmas estruturas. Desvios Fonológicos: Correspondem a dificuldades que dizem respeito ao domínio do padrão fonêmico da língua, na ausência de alterações orgânicas detectáveis como perdas auditivas e anormalidades anatômicas ou neurofisiológicas. O termo, de uso muito difundido até hoje, originalmente empregado para definir esse tipo de desvio tem sido “distúrbio articulatório funcional”. Nessa terminologia, a palavra “funcional” refere-se, precisamente, ao fato de não serem encontradas alterações nas estruturas responsáveis pelo ato da fala. Também tem sido empregado, para fazer referência a esse tipo de alteração, o termo “dislalia”. Aqui podemos fazer uma distinção entre desvios fonéticos e desvios fonológicos. Os distúrbios neurogênicos e os distúrbios de origem músculo-esqueletais podem ser considerados como alterações fonéticas, uma vez que dizem respeito a comprometimento nas estruturas envolvidas na produção de fala propriamente dita: centros nervosos da fala, vias e terminações nervosas, músculos e ossos. Por outro lado, os desvios fonológicos ocorrem na ausência de tais comprometimentos, assim como de comprometimentos auditivos, correspondendo a problemas de aquisição de traços fonêmicos, como se fosse uma falha na aprendizagem de regras de combinação de traços distintivos. Não se observa uma inabilidade articulatória propriamente dita, mas uma organização falha do sistema dos sons da língua. A comunicação, além de satisfazer uma necessidade básica do ser humano, é um dos mais penetrantes, complexos e importantes aglomerados de seu comportamento social. Nossas vidas cotidianas são afetadas seriamente pelas nossas comunicações com os outros, e é na educação infantil que muitas alterações podem ser prevenidas e/ou tratadas. Referências Bibliográficas: FREIRE, Regina Maria. A Linguagem como Processo Terapêutico. São Paulo | Plexus, 1997. GERBER, Adele. Problemas de Aprendizagem Relacio- ARTIGOS | julho 2012 nados à Linguagem: Sua Natureza e Tratamento. Porto Alegre | Artes Médicas, 1996. VYGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. 3° ed. São Paulo | Ícone, 1991. ZORZI, Jaime Luiz. Aquisição da Linguagem Infantil: Desenvolvimento, Alterações, Terapia. São Paulo | Pancast, 1993. ZORZI, Jaime Luiz. A Intervenção Fonoaudiológica nas Alterações da Linguagem Infantil. 2° ed. Rio de Janeiro | Revinter, 2002. 29 ARTIGOS 7 Sobre o Aprender/Ensinar em Nosso Tempo – Diferentes Modos de Olhar Queli Wagner Psicopedagoga do Núcleo de Apoio a Inclusão – NAI “Não há saber mais ou saber menos: Há saberes diferentes.” Paulo Freire | julho 2012 Resumo: A partir de um movimento de ideias sobre o aprender/ensinar em nosso tempo, busco fazer algumas aproximações dos diferentes modos de olhar sobre o processo de ensino e aprendizagem, articulando algumas reflexões acerca do ato de educar na atualidade. 30 F rente ao novo alvorecer da Escola, somos conduzidos incessantemente para um olhar mais heterogêneo sobre o sujeito e suas relações. Surge, assim, a constante reflexão de que a escola não pode ser apenas transmissora de conhecimento, assumindo a necessidade emergente da ressignificação do processo de aprendizagem dos sujeitos envolvidos: o papel do educador, configurando uma postura mediadora do processo, e a figura do aluno, desconstruindo o papel de receptor e delineando uma postura criadora, assumindose protagonista do seu conhecimento. Conforme Vygotsky, o educando é sujeito de sua própria aprendizagem, processo no qual o professor potencializa seu trabalho na sala de aula, promovendo atividades produtivas e desafiadoras, colocando à tona todas as experiências e hipóteses do aluno e estimulando a interação com seus pares. O conhecer, nesse enfoque, supõe a experimentação, remetendo-se ao movimento de provar, mexer, pensar, refletir, em um constante processo de (re)criar. Deste modo, alçar o sujeito a apropriar-se de novas formas de aprender e de relacionar-se com o conhecimento, torna-se tarefa primordial da educação e um grande desafio a ser enfrentado pelo sistema educacional. Como afirma Esteves (2004), vivemos um período singular no processo educacional, onde a educação passa a ser, não mais apenas um direito de ingresso, mas de permanência com qualidade. Onde se busca que o aluno recebido na escola, participe efetivamente do processo de ensino e aprendizagem, e que se instrumentalize para participar ativamente da sociedade. E será por meio desse novo olhar, acerca do sujeito que aprende, permeado por suas singularidades funcionais, orgânicas ou sintomáticas, que a escola delineará sua prática, buscando na essência da diversidade, promover possibilidades de ARTIGOS aprendizagem. Nesse contexto, as dificuldades de aprendizagem colocam-se não enquanto fracasso, mas como consignas que fazem parte do próprio processo, inferindo a desacomodação em busca da condição humana, em olhar individualmente para o sujeito dessa relação. Pois, conforme Fernández (2001), tampouco podemos aprender se não abrimos espaço ao não saber. A escola é palco para a conjunção destas possibilidades, onde as necessidades do sujeito são plausíveis, promovendo o interdiscurso e lendo as entrelinhas, analisando as fraturas e compreendendo as especificidades dos indivíduos. Frente a essa modalidade, a avaliação confere-se a uma etapa onde professor e aluno possam, juntos, se avaliar, na perspectiva de um (re)olhar sobre o processo e a metodologia, buscando novos métodos e novos caminhos no processo ensino-aprendizagem contínuo e processual. Encaminha-se, assim, rumo a uma educação permanente, com a renovação constante do conhecimento, onde a aprendizagem passa a ser vista num processo de “aprender a aprender”, cuja ação vem transformar a prática educacional. ESTEVE, J. M. A terceira revolução educacional: a educação na sociedade do conhecimento. São Paulo | Moderna, 2004. FERNÁNDEZ, Alicia. Os Idiomas do Aprendente. Porto Alegre | Artmed, 2001. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 4° ed. São Paulo | Martins Fontes, 1991. | julho 2012 Referências Bibliográficas: 31 ARTIGOS 8 Família e escola: práticas educativas para conquistar a aproximação entre ambos e os reflexos na aprendizagem do educando Roseli dos Santos Barella Técnica em Informática Educativa, cursando Pedagogia (ISEI) Supervisora de Serviços Administrativos do PLUG | julho 2012 Resumo: Sabemos a importância da presença da família no ambiente escolar do educando. No presente artigo, serão apresentadas ações educativas que pais e instituição, juntos, podem realizar para auxiliar no desenvolvimento do educando, como também conquistar a aproximação entre ambos, contribuindo assim para o planejamento e desenvolvimento de uma educação saudável, onde possa haver momentos de trocas, entre a escola e a família. 32 A tualmente, discute-se muito a importância da presença da família no âmbito escolar do educando. Há diversas questões referentes a esse assunto que podem ser analisadas. Dentre elas, podemos destacar: quais ações as escolas podem adotar para aproximar os pais, quais influências essa aproximação pode causar, e também se esses pais se sentem preparados para auxiliar seus filhos nas tarefas escolares. Apresentar o espaço físico e os funcionários que a integram, explicar qual a função de cada um, especialmente o grupo gestor que coordena a instituição, realizar uma entrevista com os pais e os alunos, são ações que podem auxiliar nestas questões e, acima de tudo, mostrar que a escola está comprometida com a aprendizagem. Quando o assunto é aprendizagem, o papel de cada um está bem claro – da escola, ensinar, e dos pais, acompanhar e fazer sugestões. Porém, se o tema é comportamento, as ações exigem cumplicidade redobrada. Ao perceber que existem problemas pessoais que se refletem em atitudes que atrapalham o desempenho em sala de aula, os pais devem ser chamados e ouvidos, e as soluções, construídas em conjunto, sem julgamento ou atribuições de culpa. […] (REVISTA NOVA ESCOLA – GESTÃO ESCOLAR, 2009, p. 26) O espaço familiar pode ser de afeto, felicidades e segurança, mas pode ser também de medos, rejeições e violência. Realizar visitas às famílias dos alunos nas suas casas é muito importante, pois é uma maneira de estreitar os laços e conquistar a aproximação, uma vez que conhecer o âmbito familiar é um ponto essencial para entendermos os comportamentos da criança, e isto pode servir de suporte ao planejamento das tarefas escolares. Quando abordamos esse assunto, precisamos estar cientes da realidade de muitas famílias, que por sua vez nos revelam questões que precisam ser reavaliadas. Há, de fato, aquelas que possuem [...] Educar, portanto, não é uma tarefa fácil, exige muito esforço, paciência e tranquilidade. Exige saber ouvir, mas também fazer calar quando é preciso educar. O medo de magoar ou decepcionar deve ser substituído pela certeza de que o amor também se demonstra sendo firme no estabelecimento de limites e responsabilidades. [...] (REVISTA ESCOLA DE PAIS DO BRASIL, 2010, p. 15) Entretanto, muitas vezes, a falta de tempo para conviver com os filhos torna a tarefa de muitos pais um pouco mais difícil. Porém, eles devem estar cientes de que sua participação na educação dos mesmos pode se realizar através de praticas simples: estimulá-los a serem bons estudantes e incentivá-los a irem para a escola já é um grande começo. Ou ainda: estar presentes na vida educacional das crianças, demonstrar interesse, buscar saber o que os filhos estão aprendendo, ter e dar tempo aos filhos, falar com eles, ouvi-los, ajudá-los nas lições escolares, oferecer um espaço tranquilo e harmonioso em casa para que eles realizem as tarefas. Ao refletir sobre o tema proposto nesse artigo, concluímos que a presença da família, no âmbito escolar do educando, é fundamental, e faz toda a diferença na aprendizagem do mesmo. Pais e mães precisam “tirar” um tempo para seus filhos, acompanhar e auxiliar nas tarefas escolares, assim como participar das programações propostas pelas escolas, colaborando e apresentando sugestões. A escola, por sua vez, precisa estar de portas abertas para acolher esses pais e filhos, oferecendo suporte ARTIGOS e mostrando que, sim, é possível essa parceria dar certo. Escola e família precisam caminhar juntas, em busca de um objetivo comum, contribuindo para a formação de indivíduos críticos e com opinião própria, resultado de uma educação saudável e de uma relação construtiva entre a instituição e os pais. Referências Bibliográficas: Revista Escola de Pais do Brasil. Família e Escola – Um sonho possível... Basta querer!!! São Paulo | 2010. pp.14 e 15. Revista Nova Escola – Gestão Escolar. A Escola da Família. Abril, 2009. p. 24. SZYMANSKI, Heloisa. Práticas educativas familiares: a família como foco de atenção psicoeducacional. Estudos Psicológicos [on line]. Campinas : 2004. Vol. 21, n. 2, pp. 5-16. | julho 2012 pouco ou nenhum grau de escolaridade, sendo esta, muitas vezes, a razão para que se sintam impossibilitadas de auxiliar os filhos na aprendizagem. Também há questões estruturais, que influenciam na transmissão dos valores. Pode-se perceber que, ao longo dos anos, a família, por força das circunstâncias já citadas, transfere para a escola a tarefa de formar e educar. Por esse motivo, é preciso trazer a família para dentro da escola, para que ela passe a colaborar no processo educativo de forma efetiva, compartilhando assim as responsabilidades, e não as transferindo. 33 ARTIGOS 9 Gestão Democrática e a Gestão Escolar Sibele Roesler Nikititz Especialista em Gestão Escolar, licenciada em Matemática Diretora da EMEI Jardim dos Sonhos Presidente da Associação dos Professores Municipais de Ivoti Resumo: Investigação sobre a gestão democrática como um motivador do grupo de professores de educação infantil, expressando resultado de trabalho de conclusão de Especialização em Gestão Escolar. | julho 2012 E 34 m meu trabalho de conclusão de Especialização em Gestão Escolar, tive o objetivo de investigar a gestão democrática como um motivador do grupo de professores de educação infantil, resgatando a história da mesma e, também, fazendo uma análise de entrevistas realizadas com uma amostra deste corpo docente, onde pude traçar algumas conclusões importantes. Um dos principais objetivos da gestão democrática é a construção coletiva de suas propostas de trabalho. No passado, a maneira como as instituições eram administradas estava baseada em um modelo ultrapassado de gestão, agindo de forma controladora, gerando um quadro de verdadeira fobia em perderem seu juízo de valor, de conseguirem fazer valer o seu poder. A gestão, por mais que devesse ser democrática, ainda não o era, estava em transição; porém, as falas diziam ser democráticas, quando, na verdade, o que acontecia era uma falsa democracia, e esta demagogia trazia maior desmotivação para os professores de educação infantil. Percebo que, no geral, as equipes gestoras já estão mudando seu pensamento sobre gestão democrática, estão buscando envolver todos nos processos que norteiam a escola, além da construção dos Projetos Político-Pedagógicos (PPP). Estão buscando um planejamento democrático, entendendo que os desafios (crise) que enfrentam, não são empecilhos que ameaçam, pois é na crise que conseguimos abrir nossa mente para um novo olhar da situação, onde refletimos buscando a melhor solução e o melhor caminho a trilhar para apreciar a vida organizacional. Além disso, pensa-se em uma gestão democrática, que vai muito além do nome, segundo Lück (2007, p. 53): [...] a utilização do termo gestão não corresponde a simples substituição terminológica, baseada em considerações semânticas. Trata-se, sim, da proposição de um novo entendimento de organização educacional e de seus LÜCK, Heloísa. Gestão educacional: uma questão paradigmática. 3° ed. Petrópolis | Vozes, 2007. ARTIGOS Nessa direção, buscando alternativas e melhorias que pudessem contribuir para as mudanças necessárias, ao encontro de um ambiente acolhedor e motivador, alinhado com um aprendizado satisfatório dos alunos da escola, é que lancei bases de uma investigação onde pude concluir que uma das alternativas que poderiam melhorar nessa questão, é o gestor estar junto do seu grupo docente, vivenciando suas rotinas, suas práticas, seus projetos, suas ideias e suas dificuldades diárias. Também percebi o PPP como um aliado da escola, se pensado de forma democrática; pois, se pensado apenas para cumprir a lei, como em outras épocas, não traz sustentação para a escola. O PPP deve trazer a “cara” da escola, sendo construído de forma que todos estejam envolvidos nesta construção, pensando e dando forma a ele, mostrando o modo como a maioria da escola pensa, e não somente a maneira que a equipe gestora pensa, pois ela é apenas um mediador desta construção. O PPP é a vida da escola, e a vida que pulsa dentro da escola é a comunidade escolar, ou seja, são os alunos, pais, professores e funcionários. Assim, como considerações finais do meu trabalho, pude afirmar que um bom gestor é aquele que consegue perceber, nas pessoas com quem trabalha, aqueles líderes naturais, os quais às vezes empurram o grupo para cima, ou que às vezes também são justamente aqueles que estão puxando o grupo para baixo. Neste momento, ele deve ensinar que tudo é possível, mesmo quando há descrédito, extraindo o melhor do seu docente, desafiando-o e acompanhando-o passo a passo, pois os outros professores percebem isso naturalmente, sem ser necessário chamar a atenção e mostrar que é possível ir além. Um bom gestor gera líderes capazes, e sabe conquistar o seu coração. Ser um bom gestor é saber dar o exemplo e tomar atitudes motivacionais com a dose certa de fé, persistência, moral e coragem. Referência Bibliográfica: | julho 2012 processos e, para além disso, das relações da educação com a sociedade e das pessoas dentro do sistema de ensino e da escola. 35 ARTIGOS 10 Dança e Aprendizagem: Experiências de Pais e Alunos do Programa Lazer Unindo Gerações – PLUG | julho 2012 Talita Camargo Raimundo Graduanda em Educação Física – Universidade Feevale Coordenadora de Projetos Esportivos do PLUG 36 Resumo: A dança é uma forma de integração e expressão, tanto individual, quanto coletiva, e é um meio viável para o desenvolvimento integral dos educandos, possibilitando uma vivência diferenciada que auxilie na construção de uma nova cultura, que valorize as diferenças e oportunize experiências tanto corporais como sociais. O presente artigo busca analisar um melhor entendimento sobre a motivação que leva as pessoas (pesquisa feita com algumas alunas do PLUG e seus responsáveis) a procurarem as aulas de dança e se manterem nelas, como também analisar as percepções dos pais dessas alunas em relação ao desenvolvimento dos filhos, tanto em relação às possíveis contribuições da dança para a vida das praticantes, quanto como se dá o envolvimento dos pais nestas atividades. Refletindo sobre isso, compreende-se que a dança contribui no que se refere aos aspectos físicos, comportamentais e sociais. “Em cada passo percorremos diversos caminhos, em cada giro viajamos o mundo, em cada olhar transmitimos desejos, em cada toque multiplicamos sensações, em cada queda transcendemos a emoção, em cada dança sonhamos; com os pés no chão.” Rinaldo Donizete de Freitas A dança, dentre vários aspectos, é uma forma de expressão, sendo uma das mais significativas, pois através dela é possível co- nhecer os hábitos e os costumes de uma sociedade. Por isso, devemos dar uma maior importância ao desenvolvimento da dança, em qualquer que seja a área de atuação (RANGEL, 2002). A dança deve servir como um dos meios de desenvolver os aspectos relacionais do educando, utilizando o movimento como meio expressivo. Para que possamos utilizar mais a dança nos ambientes de aprendizagem, é importante termos consciência de alguns de seus benefícios, como destaca Rangel (2002), quando descreve que, quando deixamos fluir do aluno suas emoções, anseios e desejos, através de movimentos, que não precisam ser técnicos, permitimos que ele revele-se e desperte para o mundo, numa boa relação consigo e com os outros. Os benefícios que a dança pode trazer para o desenvolvimento das crianças, se executada de forma correta, segundo as autoras Santos, Lucarevsky e Silva (2005), são a facilitação nos relacionamentos interpessoais, na autoestima, no senso de responsabilidade e no desenvolvimento do potencial criativo e imaginativo do educando. Mais do que isso, a dança proporciona uma melhora nos aspectos físicos, como aumento da resistência corporal, melhor postura e flexibilidade. Além Você me diz que seus pais não te entendem, mas você não entende seus pais. Você culpa seus pais por tudo, isso é absurdo. São crianças como você, o que você vai ser quando você crescer? (Legião Urbana) Os pais transmitem aos seus filhos, verbal ou não verbalmente, ideias, crenças, valores, sentimentos e condutas que eles esperam deles. Mesmo que em alguns casos os próprios pais não saibam o que esperar – pois, como coloca Calligaris (2000), eles aparentemente não sabem –, a partir daí a adolescência passa a assumir a tarefa de interpretar o desejo inconsciente, ou simplesmente esquecido, dos adultos. O adolescente é ótimo intérprete do desejo adulto, ele acaba reproduzindo estes ideais reprimidos. Durante a pesquisa realizada, houve exemplos bem claros de que os pais possuem muitas influências sobre as adolescentes, como o cuidado em cobrar delas a organização, mostrar interesse no que elas estão produzindo (vendo ou ouvindo), e valorizar o que elas tanto gostam de fazer. Às vezes, julgamos que adolescentes são rudes e não se importam com o que os pais pensam; porém, diante desta pesquisa, foi provado o contrário, o quanto para o desenvolvimento delas esse vínculo é importante. ARTIGOS Ao identificar os principais motivos que as levaram a escolher a prática da dança, elas pontuaram o fato de terem afinidade com a dança desde a infância, muitas vezes influenciada, direta ou indiretamente, pelos pais. As principais justificativas da permanência delas nas aulas foram os benefícios físicos que esta prática traz a elas, o convívio social entre as alunas e a professora, e a constante motivação por parte da professora na suas aulas. Além dos benefícios físicos, a dança também trouxe a essas meninas os benefícios comportamentais: elas se sentem mais alegres, desinibidas, confiantes; e os aspectos sociais: a amizade e o companheirismo foram das questões mais apontadas. A cumplicidade entre elas e a criação de um grupo com as mesmas afinidades, também foi algo descrito pelos pais como ponto positivo. Referências Bibliográficas: CALLIGARIS, Contardo. A adolescência. São Paulo | Publifolha, 2000. FERNÁNDEZ, Alicia. A inteligência aprisionada: abordagem psicopedagógica clínica da criança e sua família. Porto Alegre | Artmed, 1991. RANGEL, Nilda Barbosa Cavalcante. Dança, Educação, Educação Física: propostas de ensino da dança e o universo da Educação Física. Jundiaí | Fontoura, 2002. SANTOS, Josiane; LUCAREVSKY, Juliana; SILVA, Renata. Dança na escola: benefícios e contribuições na fase pré-escolar. Trabalho de Conclusão do curso de Pedagogia. Londrina | Universidade UniFil, 2005. | julho 2012 dos aspectos físicos, a dança deve possibilitar o desenvolvimento de um sujeito, para que ele possa ter consciência do seu papel como criador da sua história e conhecedor do seu próprio corpo. Mas de que forma isso ocorre? Com relação à transmissão do conhecimento, Fernández (1991) coloca que não se transmite o conhecimento, mas, sim, sinais desse conhecimento, para que possa ser transformado pelo sujeito e reproduzido, pois o conhecimento é do outro. Somente aprendemos daquelas pessoas que conhecemos e sentimos confiança. Toda aprendizagem passa pelo corpo, fazendo uma relação direta com o prazer, pois o corpo coordena, e a coordenação resulta em prazer, o prazer do domínio, ou seja, o organismo bem estruturado é uma boa base para a aprendizagem, e as perturbações que possa sofrer condicionam dificuldades nesse processo. 37 RELATOS RELATOS DE EXPERIÊNCIA DE EXPERIÊNCIA RELATOS DE EXPERIÊNCIA 1 Concerto Didático: Uma Aula de Apreciação e de Vivências Musicais O educando traz vivências musicais de seu convívio familiar e extraescolar, porém sem um discernimento ou ouvido crítico. Assim, é importante promover uma vivência de escuta sensível e crítica, onde haja a compreensão de que apreciar vai muito além de ouvir, tornando o aluno um ouvinte ativo, intérprete, compositor e improvisador da prática musical. A aprendizagem precisa ser significativa e atraente e, por isso, a Comunidade Aprendente de Música, formada pelos professores de Música da Rede Municipal de Ensino de Ivoti, organizou e elaborou a proposta pedagógica de um CONCERTO DIDÁTICO, com apoio da SEMEC e do Instituto de Educação Ivoti, onde os alunos do 4° e 5° Anos podem assistir à Orquestra Sinfônica Jovem Ivoti, para apreciar diversas peças musicais eruditas, populares e do folclore brasileiro. Segundo Souza (2000, p.164), “a aula de música só pode obter êxito se transformada numa ação significativa, o que pressupõe uma permanente abertura para o novo e o confronto com a realidade”. Desse modo, os processos de ensino e de aprendizagem se tornam mais significativos, e fica mais fácil “promover experiências com possibilidades de expressão musical e introduzir conteúdos e as diversas funções da música na sociedade sob condições atuais e históricas” (ibid., p. 176). A ideia de Concerto Didático é válida em outros âmbitos. Ela possibilita aprendizagens mais | julho 2012 Aline Bühler Licenciada em Música, Escola 25 de Julho Ângela Dilly Graeff Licencianda em Música, Escola Engº Ildo Meneghetti Daniel Kich Licenciando em Música, Escolas Aroni Aloísio Mossmann e Guilhermina Mertins Luis Rodrigo Flesch Licenciando em Música, Escola Engº Ildo Meneghetti Mariana Valim Samaniêgo Licenciada em Pedagogia, Escola Engº Ildo Meneghetti Marina Bencke Licenciada em Letras, Escola Concórdia 39 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 40 profundas do que a apresentação da orquestra em si, pois são trabalhadas também a origem de cada instrumento, regras de convivência e etiqueta, bem como a regência e a expressão musical. Dos bastidores ao palco Os professores, em sala de aula, preparam os alunos para o Concerto, trabalhando os seguintes aspectos: família, naipes e disposição dos instrumentos da orquestra, função do maestro, peças com dois ou mais movimentos, protocolos de comportamento, a importância de cada músico na harmonia do grupo e o estilo de música apresentado. As escolas recebem o programa do Concerto previamente, para que possam apreciá-lo juntamente com os alunos, familiarizando-os com as melodias a serem executadas. Sendo assim, quando chegam ao Concerto, entendem, reconhecem e aproveitam melhor a programação. O Concerto Didático tornou-se um evento anual; em 2012, estará ocorrendo sua terceira edição, onde participam, em média, 450 alunos, envolvendo as escolas Aroni Aloísio Mossmann, Concórdia, Engº Ildo Meneghetti, Guilhermina Mertins, Jardim Panorâmico, Nicolau Fridolino Kunrath e 25 de Julho. As edições ocorrem no auditório do Instituto de Educação Ivoti, geralmente divididas em quatro apresentações, para que os músicos e alunos consigam interagir, pois a proposta didática do concerto é que haja uma breve explanação de cada instrumento, seu timbre, e o funcionamento da orquestra. Novas possibilidades A partir dessa experiência, constatou-se a importância deste momento, muitas vezes único, na vida das crianças. Cada rosto que se volta para a orquestra, com interesse e encantamento, é o resultado de muito empenho de todos os envolvidos, pois a concretização do Concerto Didático só foi possível por haver profissionais envolvidos e com o desejo da valorização da educação musical, podendo contar também com o apoio e a parceria da SEMEC e do Instituto de Educação Ivoti. Acreditamos que “a música ensina os homens a ver com o seu ouvido e a ouvir com seu coração” (Gibran), pois percebemos o crescimento e o discernimento adquiridos após essa rica aula de vivências, auxiliando o aluno na descoberta da sua identidade musical. Referências Bibliográficas: GIBRAN, Khalil. A divina música. SOUZA, Jusamara (org.). Música, cotidiano e educação. Porto Alegre | Programa de Pós-Graduação em Música do Instituto de Artes da UFRGS, 2000. O Espetáculo na Infância RELATOS DE EXPERIÊNCIA 2 Aline Brito de Oliveira Acadêmica do curso de Psicologia da Universidade Feevale Raiama Trenckel Acadêmica do curso de Licenciatura em Dança da Universidade Luterana do Brasil/RS Nascendo a Dança por barreiras e fronteiras entre o individual e o coletivo, o humano e o inumano, etc. O devir que deve ser entendido como movimento, “processualidade”, trajetos, como forças intensivas. No ritmo da infância A criança necessita de experiências de expressão e comunicação que possibilitem o desenvolvimento de sua sensibilidade, criatividade e interpretatividade. Atividades da Dança fluirão tanto como alegria no aspecto lúdico de movimentar-se livre, como poderão retratar o seu humor na força dos movimentos, emoções à flor da pele liberadas em outra dimensão contida no inconsciente. Uma maneira de extrapolar expressões de alegria, tristeza, euforia, fará vazar sentimentos reprimidos, contidos no seu mundo interior. | julho 2012 A Escola Municipal Guilhermina Mertins, por meio de sua equipe gestora – composta pela diretora Andréia Schilling, a coordenadora pedagógica Carla Haupenthal e a estagiária de Psicologia Aline Brito de Oliveira –, oferece uma proposta de formação voltada para o desenvolvimento da integralidade e consciência sociocultural dos alunos. A equipe acredita na infância, vendo esses alunos como atores sociais, e apostando em suas competências de ação e intervenção em seus mundos. E acredita que, oferecendo-se como modelo de identificação, os educadores têm a tarefa de cuidar da criança em sua integridade física, emocional e social, conforme cita Oliveira (2009). Trabalhando com crianças, sabe-se que há sempre algo em devir¹, que nada tem a ver com um vir-a-ser adulto, mas sim, um devir criança. Há crianças que conseguem realizar o seu devir, outras não. O devir como uma capacidade de trans- 41 RELATOS DE EXPERIÊNCIA O sucesso, a alegria, a realização que as crianças experimentam a partir da Dança, permitirão às mesmas fortalecer seu autoconhecimento, sua autoestima, sua autoconfiança e sua autoimagem, sentimentos tão fundamentais para a estruturação de sua personalidade (NANNI, 2003). A Dança permite imaginar, fantasiar, criar um mundo mágico, onde a cada batida da música uma nova emoção surge. A fantasia deve ser presente a cada segundo da infância, pois através dela as crianças encontram expressão para seu mundo interno, facilitando sua integração com o mundo externo. Oliveira (2009) traz essa ideia, quando compreende os contos de fada na infância, dando importância e fundamento à vivência da fantasia infantil. Sendo capaz de imaginar e fantasiar durante a infância, é possível para a criança compreender seu mundo psíquico de forma simples e dar sentido aos seus conflitos internos. ta pela professora para ser vivenciada pelas turmas de 2º e 3º anos. Esta modalidade tem como essência as faculdades imaginativas e sensíveis que geram os movimentos, gestos, expressões inspiradas nos poderes intuitivos dos dançarinos. Criar e não reproduzir é a base principal dessa dança. Nas turmas de 4º e 5º anos, o interesse foi pela Dança de Salão (HAAS, 2006), conhecida também por Dança Social, que é praticada por diversão, integração em bailes e festejos. É considerada uma das mais relaxantes formas de exercitar o corpo, favorecendo uma boa postura e tonificando-o. Confirmando que esses alunos já despertam olhares para a adolescência, essa modalidade foi aceita de forma imediata pela turma. ¹ “Devir é jamais imitar, nem fazer como, nem ajustar-se a um modelo, seja ele de justiça ou de verdade. Não há um termo de onde se parte, nem um ao qual se chega ou se deve chegar. Tampouco dois termos que se trocam. A questão ‘o que você está se tornando’? é particularmente estúpida. Pois à medida que alguém se torna, o que ele se torna muda tanto quanto ele próprio.” (DELEUZE; PARNET. 1998, p. 10) | julho 2012 A coreografia final 42 Dançar é movimentar-se pelo espaço, é sentir o corpo livre, é comunicar-se consigo mesmo, é desfrutar, liberar-se... Convidar para dançar é animar a quebrar preconceitos, medos, vergonhas... (HAAS, 2006) A aula de Dança, coordenada semanalmente pela professora Raiama Trenckel, é dirigida a alunos da Educação Infantil ao 5º ano, durante 50 minutos em cada turma. Somente ao conhecer o ritmo, o sentido, as características de cada aluno e de cada turma, a professora pode saber a dança que mais desperta aquele grupo, pois cada classe tem sua própria personalidade e funcionamento. A Educação Infantil e o 1º ano desenvolvem Danças Folclóricas (HAAS, 2006), que permeiam o lúdico, sendo realizadas pelo divertimento, integração dos dançarinos, perpetuando as características, costumes e lendas da região. Trabalham valores familiares, culturais e tradições, ensinadas de geração para geração. A Dança Criativa (HAAS, 2006) foi propos- Referências Bibliográficas: DELEUZE, Gilles; PARNET, C. Diálogos. Trad Eloísa Araújo Ribeiro. São Paulo | Escuta, 1998. 179 pp. HAAS, Aline Nogueira. Ritmo e Dança. 2° ed. Canoas | Ed. ULBRA, 2006. NANNI, Dionísia. Dança – Educação: pré escola à universidade. 4° ed. Rio de Janeiro | Sprint, 2003. OLIVEIRA, M. L. (org.) (Im)pertinências da educação: o trabalho educativo em pesquisa [on line]. São Paulo | Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 3 Afinal, qual foi “A Invenção de Hugo Cabret”? “Ele frequentemente imaginava que sua própria cabeça era repleta de engrenagens, como uma máquina, e sentia uma conexão com qualquer mecanismo que o tocasse.” (SELZNICK, 2007. p. 126) A proprio-me da metáfora das engrenagens para socializar uma das experiências mais significativas que já tive no cinema, falando também da minha tentativa de sensibilizar outros educadores a assistirem o filme que tanto me impactou: “A invenção de Hugo Cabret”. Por um bom tempo, dias até, podia sentir as rodas e engrenagens da minha cabeça rodopiando em todas as direções, procurando fazer links com diferentes possibilidades educativas, pois esta produção cinematográfica de Martin Scorsese, mesmo voltada a uma temática infantil, constitui-se em uma carta de amor à sétima arte. Conforme o jornalista Marcos Rolim (25/03/2012), este célebre diretor de cinema oferece a todos uma obra-prima com este seu último filme, que, baseado no livro homônimo de Brian Selznick, apresenta uma poesia de imagens em cada detalhe, trazendo à tona uma questão fundamental: “O que é a vida que vale a pena ser vivida?” Esclareço que eu não me sentira atraída pelo título do filme, mas o fato de estar na mídia em virtude das 11 indicações ao Oscar, destacando-se nas categorias de arte, animou-me um pouco mais. Passei a perceber a abrangência desta produção, ao ler algumas reportagens salientando a riqueza do enredo, voltado a narrar a história fictícia de um menino órfão (Hugo, interpretado por Asa Butterfield), que vive sozinho em uma estação de trem parisiense, e que se esforça sobremaneira para manter os relógios da estação funcionando; e, ao mesmo tempo, ressignificando a história de vida do mágico George Méliès, um dos precursores do cinema, pai dos efeitos especiais, que com muita ousadia aplicava truques na montagem dos filmes, feitos a partir de cenários fantásticos criados por ele. Assim, ao me inteirar do enredo, de imediato pensei nas suas possibilidades de trabalho em sala de aula, já que o estudo do cinema faz parte do conteúdo listado nos Planos de Estudos de Arte no Ensino Fundamental, e foi com certeza isso que me motivou a assisti-lo. Foi um momento de grande imersão e encantamento; saí da sala de cinema com a convicção de oportunizar essa atividade a | julho 2012 Andréa Cristina Baum Schneck Mestre em Educação (UFRGS) [email protected] 43 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 44 todos os meus alunos, considerando que a narrativa era de fácil entendimento, a técnica em 3D maravilhosa, e a abordagem profunda e humanizante. Alguns colegas foram ver o filme, e apesar de diferentes impressões, comungávamos de que não poderíamos perder a oportunidade de problematizar a respeito em sala de aula. Refletindo com a equipe diretiva e a coordenação pedagógica sobre os objetivos que poderiam justificar a ida ao cinema, avaliando necessidades e interesses dos alunos, optamos por construir um projeto interdisciplinar voltado às turmas da 7ª série. Agendamos uma sessão especial para o dia 05/03/2012. Era grande a expectativa diante do estímulo que havíamos dado às três turmas, 71, 72 e 73, levando em conta que, para muitos desses alunos, essa ainda seria a primeira ou segunda ida ao cinema. No retorno, era nítida a satisfação de todos, pois o filme de fato surpreendera, mobilizando uma infinidade de emoções. Muitos alunos e professores haviam feito registros durante a sessão, frases e cenas que consideravam importante discutir em sala, o que foi fundamental para iniciarmos a construção do projeto propriamente dito. Uma multiplicidade de olhares e sugestões permitiu uma rica troca de ideias, envolvendo as áreas da Arte, Português, Língua Inglesa e Matemática, resultando no “Projeto de Cinema”, tendo como objetivo geral despertar possibilidades de leituras e releituras das diferentes linguagens a partir da narrativa fílmica. Somente depois que já tínhamos iniciado o projeto, descobri que o diretor se baseara num livro e que, provavelmente, deve ter se deleitado nessa trama literária tão cativante, pois a própria escrita e ilustração do livro convidam o leitor a, antes de virar a página, imaginar-se sentado no escuro, como no início de um filme. “Na tela, o sol logo vai nascer, e você será levado em zoom até uma estação de trem no meio da cidade [...]” (SELZNICK, 2007, p.1) O livro antecipa as cenas do filme, que teve poucas modificações no seu texto. Entretanto, o que mais me fascinou foram as belíssimas imagens a grafite, feitas pelo próprio escritor, que por si só permitem uma leitura imagética intensa, aproximando o es- pectador dos planos de filmagem necessários para se obter um bom filme, agregando além dos desenhos sobre o enredo, fotografias dos primeiros filmes, bem como esboços das inventividades de Méliès (figurinos, cenários, alegorias). Retomando..., cada professor elencou seus objetivos específicos, conectando-os com os outros conteúdos pré-estabelecidos para essa série, tendo como norte todo o universo dessa narrativa, e como meta a valorização das invenções dos próprios alunos, culminando com a criação de um curta-metragem, utilizando a dinâmica de grupos para a maioria das propostas. Em Arte, os alunos foram sensibilizados a uma imersão ainda maior na história assistida. criando um banco de dados sobre ele. Focados na história de George Méliés, eles apreciaram esteticamente alguns dos filmes por ele produzidos, realizaram pesquisas sobre a história do cinema, compreendendo as características dos produtos de cada tempo, desde o cinema mudo ao contemporâneo, e atentando para as imagens em movimento representadas na arte rupestre, que são tidas como precursoras do cinema. Investiu-se tempo na análise de outras imagens, fotografias do filme, obras de arte com representações similares, comparações entre as imagens do livro e as do filme, imagens publicitárias, observação de engrenagens, desenhos explorando técnicas de grafite, e outras releituras. Na tentativa de agregar novas informações sobre cinema, introduzir discussões sobre planos de filmagem e linguagem cinematográfica, e ampliar conhecimentos, organizou-se um Seminário de Cinema, em parceria com o Grupo BisSTOP, do IEI, que desenvolve um projeto de cinema desde 2011, tendo na sequência uma aula de enquadramento e uma prática sobre planos de filmagem, com o professor Edmar Galiza. Voltaram-se, finalmente, à produção de seus filmes, integrando todas as disciplinas participantes do projeto e versando sobre vários assuntos. Em Português, o trabalho iniciou com uma produção textual sobre o primeiro filme que haviam assistido no cinema, e depois direcionou-se para criação de um diário de bordo coletivo que deveria ser usado para registrar tudo o que fossem Referências Bibliográficas: Reportagens do Correio do Povo e Zero Hora. ROLIM, Marcos. A Invenção de Hugo Cabret. Reportagem na Zero Hora. 25/03/2012. SCORSESE, Martin. A Invenção de Hugo Cabret [filme]. SELZNICK, Brian. A Invenção de Hugo Cabret. São Paulo | Edições SM, 2007. RELATOS DE EXPERIÊNCIA Equipe de professores em planejamento inicial Seminário de Cinema no IEI Desenho de observação de engrenagens | julho 2012 fazendo. Assistiram ao filme “Tempos Modernos”, de Charles Chaplin, contextualizando-o com outros temas; aprenderam a construir uma ficha técnica e uma narrativa de cinema, conhecimentos que utilizaram ao construírem a sua proposta de vídeo. Em Língua Inglesa, produziram frases curtas a partir das cenas gravadas nos vídeos, utilizando o verbo to be (ser/estar) e o present continuous tense (presente contínuo). Em Matemática, puderam conhecer outras engrenagens, tipos de relógios, formas geométricas, trabalhar noções de volume e sólidos. Saliento que todas essas áreas deram suporte para que os alunos desenvolvessem seus filmes, contando ainda com o apoio do setor de Informática, por meio do professor Lucas Breunig, especialmente durante as filmagens e a edição dos vídeos. Cada professor comprometeu-se com alguns grupos, o que permitiu, de fato, um trabalho coletivo e de muita aprendizagem. Partiu-se, então, para a criação de folhetos e cartazes de cada produção, e que, neste exato momento antecipam: “Em breve nos cinemas, as produções inéditas dos alunos da Ildo Meneghetti!”. 45 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 4 Tesouro Verde: Um Olhar Sobre a Educação a Partir da Amazônia | julho 2012 Andréa Mignoni (org.) Licenciada em Letras: Português/Inglês Andréa Cristina Baum Schneck Mestre em História da Educação Danielle Kayser Sauter Mestre em Educação em Ciências e Matemática Elisa Feilstrecker Fortes Mestre em Metodologia do Ensino de 1º Grau Miriam Bonilha de Vargas Abadie Licenciada em Ciências Físicas e Biológicas E. M. E. F. Eng.º Ildo Meneghetti 46 N o mês de março de 2012, nós, professores da 6ª série da Escola Municipal Engº Ildo Meneghetti, tínhamos como meta desenvolver um projeto significativo com essas turmas, pois todo trabalho com projetos desencadeia saberes interligados, de forma dinâmica e prazerosa. Segundo Hernández (1998), a função de um projeto é favorecer a criação de estratégias de organização dos conhecimentos escolares relativos ao tratamento da informação, a relação entre os diferentes conteúdos em torno de problemas ou hipóteses que facilitem aos alunos a construção de seus conhecimentos, e a transformação da informação procedente dos diferentes saberes disciplinares em conhecimento próprio. Mangás Japoneses (acervo da Irmã Teruko Takada) Assim, as professoras das disciplinas de Arte, Ciências, Geografia, Matemática e Língua Portuguesa se reuniram para planejar esse projeto, que surgiu a partir do diagnóstico inicial realizado nas aulas de Arte e a partir do gibi da Turma da Mônica Jovem: “Tesouro Verde”. Percebeu-se que o interesse dos discentes estava voltado para um trabalho com histórias em quadrinhos, em estilo mangá. Convém destacar que este achado foi o ponto culminante para um trabalho em conjunto, e com a leitura do texto “Análise Sociológica e Estética Midiática: Reflexões sobre a Aparência e os Impactos das Histórias em Quadrinhos Japonesas”, foi possível sustentar teoricamente essa proposta interdisciplinar voltada à arte dos mangás. Momento da leitura do gibi na aula de Língua Portuguesa Já nas aulas de Língua Portuguesa, antes da leitura do gibi, a professora trouxe o vídeo da música “Amazônia”, de Roberto Carlos, como atividade de sensibilização perante os problemas enfrentados pelo meio ambiente. Após, ocorreu uma explosão de ideias a partir das imagens e da mensagem que a música deixou para os estudantes. Em seguida, foi realizada a leitura da revista em aula, fazendo um link com o conteúdo e com as cenas da música. Também foram observados, durante a leitura, alguns aspectos estruturais de uma HQ (conteúdo da história, personagens, RELATOS DE EXPERIÊNCIA De acordo com essas informações, nas aulas de Arte, o enfoque recaiu sobre as diferenças entre os mangás e as HQs produzidas no Brasil e em todo o ocidente. Através da apreciação de várias revistas (japonesas e brasileiras), os estudantes verificaram que os mangás têm características próprias. Em seguida, ocorreram pesquisas na internet sobre o tema mangá e sobre a relação de Maurício de Souza e Ozamu Tezuka, “Pai do Mangá.” Com a leitura do gibi já realizada nas aulas de Língua Portuguesa, os alunos partiram para as suas criações, inventando seus próprios personagens a partir de técnicas específicas desenvolvidas na área de Arte. | julho 2012 Professoras envolvidas no projeto, em momento de planejamento cenários, tipos de balões, tipo de letra, o uso frequente das onomatopeias, entre outros). A partir dessas observações, serão produzidas tirinhas sobre a temática do projeto, utilizando o site “Toondoo”, além da produção de um gibi, envolvendo as disciplinas de Arte e de Língua Portuguesa, como produto final deste projeto. Conforme Koch & Vilela (2001), a linguística do texto/discurso se ocupa das manifestações culturais produzidas pelos falantes de uma língua em situações concretas, sob determinadas situações de produção. Por outro lado, nas aulas de Matemática foi realizado o cálculo de área de quadrados e retângulos, usando a multiplicação de números decimais. Após estabelecer o conceito de área, foi possível definir e compreender o significado da palavra “hectare”, presente ao longo da história. Através de leituras, pesquisas, análises de mapas e gráficos, os estudantes conheceram, nas aulas de Geografia, o relevo, a hidrografia e o clima da Amazônia como determinantes de sua exuberante vegetação. Também foram coletados dados referentes à sua ocupação e integração com outras regiões, além de programas que o Governo Federal incentiva no sentido de implantar um desenvolvimento sustentável. As comunidades tradicionais (indígenas) e o inevitável confronto com empresas exploradoras da atualidade foram assuntos abordados. O tema gerador do projeto “Amazônia” foi trabalhado com o propósito de conhecer para preservar, nas aulas de Ciências. Foi possível exercitar conteúdos básicos para a série, como, por exemplo, nomenclatura científica de espécies amazônicas, até o uso sustentável dos recursos naturais do bioma. Através do projeto, a biodiversidade da Amazônia pôde ser analisada pelo exercício da pesquisa e debate. Assim, os alunos puderam registrar suas expectativas quanto à preservação do bioma, mas, principalmente, produziram práticas para proteção do próprio ambiente. Com certeza, este é um projeto que vem oportunizando aos discentes conhecimentos variados, todos interligados pelas diferentes disciplinas envolvidas. Ao longo do desenvolvimento do 47 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 48 mesmo, vem percebendo-se a dedicação e o envolvimento de todos, e, muitas vezes, ainda um desafio para nós docentes, principalmente no que diz respeito ao trabalho interdisciplinar. Referências Bibliográficas: BRAGA JÚNIOR, Amaro Xavier. Análise sociológica e estética midiática: Reflexões sobre a aparência e os impactos das histórias em quadrinhos japonesas. História, imagem e narrativas. Nº 12, abril/2011 - ISSN 1808-9895 - http://www.historiaimagem.com.br HERNÁNDEZ, Fernando; VENTURA, Montserrat. A organização do currículo por projetos de trabalho. Porto Alegre | Artmed, 1998. KOCH, I.; VILELA, M. Gramática da língua portuguesa. Coimbra | Almedina, 2001. SOUSA, Maurício de. Turma da Mônica Jovem: Tesouro Verde. Edição 43. Panini Comics, 2012. Projeto dos Primeiros Anos RELATOS DE EXPERIÊNCIA 5 “Descobrindo a Arte que Está Mim!” “Arte é vida. Arte é liberdade. Arte é uma manifestação do meu desejo. As coisas que eu imagino se realizam no meu trabalho. O conjunto disso tudo entra na história da arte. A arte são fábulas, mitos [...]. É um caminho, UMA DAS FORMAS DE VIDA EXISTENTES.” (LEONILSON, 2003 – artista plástico contemporâneo) Q ue maravilha poder falar da arte dessa maneira! Vida, liberdade, desejo, imaginação, caminho... Não qualquer caminho, mas um caminho fascinante e colorido, em que se pode ressignificar a cada nova forma, textura ou cor, um modo singular de existir, descobrindo que a arte esta em mim, em nós! É nessa perspectiva que nos autorizamos a falar de um Projeto de Arte que inauguramos este ano na Escola Municipal Engº Ildo Meneghetti, no âmbito do 1º ano. O projeto, denominado “Descobrindo a Arte que está mim!”, é desenvolvido desde março, sob a coordenação da arte-educadora Andréa Schneck, que semanalmente se encontra com as professoras Eliandra Silva e Sandra Klein, titulares das turmas, para planejamentos conjuntos que incluem estudos teóricos, troca de idéias e vivências de arte. E uma vez por mês, é desenvolvida alguma atividade de sensibilização, apreciação e produção em arte com os alunos das três turmas envolvidas no Projeto. Os encontros realizados até agora, são sempre momentos muito aguardados por todos. A partir de uma reflexão inicial, optamos por priorizar atividades voltadas ao desenho, que, juntamente com a pintura, é o meio pelo qual as crianças registram conceitos, sentimentos e percepções do meio. O projeto fundamenta-se na importância da arte como um dos componentes essenciais do desenvolvimento integral da criança, não em busca de mudar aspectos externos dos desenhos, mas em compreender o processo total de criação, conforme Victor Lowenfeld (1977). A expressão artística da criança é um registro de sua personalidade, é um ato de inteligência, uma forma de apropriar-se do mundo e do espaço em que está inserido, como bem lembra Aurora Ferreira (2010). Assim, decorre pensar que a arte não está fora da gente; de | julho 2012 Andréa Cristina Baum Schneck (org.) Mestre em Educação Eliandra Goreti de Almeida Silva Normal Superior – Anos Iniciais do Ensino Fundamental Sandra Regina Klein Pós-Graduação em Educação Infantil e Anos Iniciais 49 RELATOS DE EXPERIÊNCIA fato somos o conteúdo essencial da arte, materializado em nossas expressões artísticas. Iniciamos o primeiro encontro de cada turma explorando a noção de desenho, concebendo-o como “marcas”, descobrindo inicialmente os desenhos que estão em nossas digitais, no corpo, que estão na natureza, nas roupas, nas nossas coisas, enfim, há desenhos em tudo, basta aguçarmos o olhar para ver. Os alunos têm sido motivados a realizar essas atividades a partir do reconhecimento do próprio corpo e dos sentidos que nos conectam a este mundo. Partimos de observações e explorações pelo pátio da escola, verificamos que em tudo há possibilidades de desenho, as britas do pátio podem formar desenho, na areia podemos registrar linhas, traçados, experimentar texturas. (Eliandra Silva) | julho 2012 Descobrimos que podemos desenhar de várias formas e em vários suportes, até mesmo com papéis de seda coloridos, que soltam tinta ao serem molhados e deixam suas marcas depois de secos – uma técnica que muitas vezes aplicamos somente em casquinhas de ovos, mas os papéis também ficam maravilhosos! 50 Os alunos ficaram encantados e surpresos! A atividade nesta turma conectou-se com um trabalho já iniciado neste período em que estávamos refletindo sobre os preparativos para Páscoa a partir de várias histórias: “O Galinheiro do Bartolomeu”, em que fizeram uma releitura de uma parte do livro, fazendo um link com a obra “Chicken Power”, de Flávio Scholles; “Páscoa no Galinheiro”, “A Vaca que Botou um Ovo”[...] Estavam, portanto, motivados para novas descobertas e relações. (Sandra Klein) No segundo encontro, focamos o olhar sobre o desenho do corpo e suas partes, cantando, inicialmente, a música “Cabeça, Ombro, Joelho e Pé”, explorando gestos e movimentos corporais, atentos às expressões uns dos outros. Cada aluno desenhou seu corpo na folha colorida produzida no primeiro encontro, procurando registrar cuidadosamente cada parte, sendo auxiliados através de exercícios de lembrar. Foi possível perceber que os desenhos ficaram mais ricos em detalhes em função das intervenções da professora durante o trabalho, lembrando-os das partes do corpo várias vezes. (Sandra Klein) Empolgamo-nos riscando os contornos uns dos outros sobre grandes folhas de papel pardo. Conversamos um pouco sobre a atividade realizada e percebemos que somos diferentes, assunto este abordado constantemente durante as aulas, buscando a valorização e o respeito por cada um. Segundo Sandra, no livro “A Galinha Preta”, os alunos puderam refletir sobre o respeito às diferenças e a importância da inclusão. Posteriormente, os desenhos/contornos foram recheados de simbolismos ligados a sentimentos os mais diversos, como: alegria, tristeza, medo, fé, paz, raiva, amizade. Descobrimos que há coisas que vemos e outras que só sentimos, e que podemos desenhar tudo isso, cada um do seu jeito. Estava trabalhando a história “Olhos para ver as coisas que Deus faz” com meus alunos, que traz esta questão dos sentimentos, e por isso a atividade tornou-se bastante significativa. [...] Trabalhamos essas primeiras experiências do conhecimento de si através de muitas outras histórias: “O tamanho da gente”, “O pintor”, “Os olhos mágicos do João”. (Eliandra Silva) Percebemos que cada professor seguiu com atividades bem singulares, e que as “conversas-trocas” entre as professoras permitiram fazer as amarrações também com o corpus teórico da área da arte. O projeto está em andamento e tem se fortificado a cada novo encontro, confirmando a importância da arte como caminho para o ser e o fazer, tanto dos docentes quanto dos seus alunos. Está sendo uma experiência muito positiva, pois assim, é possível integrar as atividades de arte com o conteúdo trabalhado em sala de aula, tendo liberdade de organizar e dar continuidade. É gratificante ver o que os alunos comentam e o que recordam dos encontros. (Sandra Klein) O autoconhecimento e a representação do que vemos e sentimos têm sido um elo fundamen- A arte possibilita experiências relacionais de intensa vibração, afetividade, prazer, ressignificação! Não está desconectada da vida e do conhecimento que construímos a cada novo dia, à medida que surgem nova problemáticas. Ser educador envolve muitos desafios [...] a responsabilidade de iniciar as crianças ao mundo letrado é muito grande, envolve desejo e prazer. O projeto com as artes não é diferente [...] Assim como nas primeiras produções de escrita espontânea, o aluno diz não saber escrever, diz também “não sei desenhar”. Mais que ensinar a ler, a escrever, a desenhar, é necessário despertar na criança a visão de mundo, motivando-a a olhar para si, ver para se apropriar, ler a realidade, percebê-la e transformá-la, isso é aprendizagem! (Eliandra Silva) Fontes, 2000. HIRATSUKA, Lúcia. Páscoa no galinheiro. São Paulo | Paulinas. LOWENFELD, Victor. Desenvolvimento da capacidade criadora. São Paulo | Mestre Jou, 1977. ROCHA, Ruth. O coelhinho que não era de Páscoa. São Paulo | Salamandra, 1994. RODARI, Gianni. O pintor. São Paulo | Berlendis e Vertecchia, 2010. RUSSEL, Ayto. A vaca que botou um ovo. São Paulo | Salamandra. RELATOS DE EXPERIÊNCIA tal para o desenvolvimento desse trabalho. Já podemos constatar, através das falas dos alunos e dos objetos trazidos para a sala de aula, que eles estão atentos e motivados pelo que tem sido realizado a cada encontro, com a professora Andréa. Um exemplo disso foi o fato de uma aluna, na véspera do Dia das Mães, ter coletado uma pedra num passeio realizado pela escola dizendo que a daria a sua mãe, porém não era uma pedra qualquer, ela tinha a forma de um coração! (Eliandra Silva) Referências Bibliográficas: ATIHE, Eliana. Olhos para ver as coisas que Deus faz. São Paulo | Paulinas, 1992. BARBIERI, Marô. Os olhos mágicos de João. Porto Alegre | MB Empreendimentos/INNOVA, 2005. CISALPINO, Murilo. O tamanho da gente. Belo Horizonte | Autêntica, 2009. DIAS, Cristina. O galinheiro do Bartolomeu. São Paulo | Nova América, 2005. FERREIRA, Aurora. Arte, Escola, Inclusão. Petrópolis | Vozes, 2010. GIDER, Iskender. A galinha preta. São Paulo | Martins | julho 2012 Com o desenrolar do trabalho é possível constatar a importância do trabalho integrado e a troca entre nós, professoras de anos iniciais e professora de arte, engajadas no projeto. (Sandra Klein) 51 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 6 A Árvore que Dava Dinheiro e Rendeu Frutos Angela Windmöller Especialista em Educação Especial Janine Boll Graduada em Letras/Português-Inglês E. M. E. F. Eng.º Ildo Meneghetti | julho 2012 O 52 foco maior de toda ação docente é o “aprender” significativo do aluno. Para isso ocorrer, é necessário que o próprio indivíduo construa seu conhecimento. Segundo Ausubel (1988), a aprendizagem é muito mais significativa à medida que o conteúdo é incorporado às estruturas de conhecimento de um aluno e adquire significado para ele a partir da relação com seu conhecimento próprio. Atualmente, as estratégias de ensino mais utilizadas para o desenvolvimento de um trabalho pedagógico interdisciplinar são os projetos. Por meio desses, os professores podem introduzir o estudo de temas que não pertencem a uma disciplina específica, mas que envolvem outras. Os projetos são feitos com o propósito de construir boas situações de aprendizagem, nas quais se evite compartimentalizar o conhecimento, e dar aos alunos um sentido do esforço de aprender. Com intuito de abrir novas possibilidades de aprendizagem aos estudantes da 8ª série da Escola Municipal Eng.º Ildo Meneghetti, as disciplinas de Língua Portuguesa e Arte desenvolveram um trabalho à luz da leitura do livro de Domingos Pellegrini “A árvore que dava dinheiro”. Aproveitamos a oportunidade da presença do autor na 30ª Feira Municipal do Livro para conhecer sua obra. É uma narrativa alegórica, em que o autor parte de um fato fantástico – uma árvore que produz dinheiro –, para traçar uma análise bastante realista dos tempos em que vivemos hoje. Por isso, através da leitura realizada em aula, assuntos como consumismo, crise, inflação, ganância foram constantemente debatidos e discutidos. Com a intervenção da professora de Língua Portuguesa, os alunos foram instigados a observar as diferentes etapas que a cidade de Felicidade atravessava no desenrolar da trama, as semelhanças e as diferenças entre as narrativas do livro e as fábulas tradicionais, os elementos reconhecíveis da realidade cotidiana que se misturavam aos elementos fantásticos na narrativa e as ilustrações do livro, procurando estabelecer a relação entre texto e imagens. Após a leitura e as reflexões, os discentes RELATOS DE EXPERIÊNCIA projetos de trabalho. Porto Alegre | Artmed, 1998. MORAN, José Manuel. A educação que desejamos: Novos desafios e como chegar lá. Campinas | Papirus, 2007. NOGUEIRA, Nilbo Ribeiro. Pedagogia dos projetos: uma jornada interdisciplinar rumo ao desenvolvimento das múltiplas inteligências. São Paulo | Érica, 2007. PELLEGRINI, Domingos. A árvore que dava dinheiro. São Paulo | Moderna, 2002. SANTOS, Júlio César Furtados. Aprendizagem significativa: modalidade de aprendizagem e o papel do professor. Porto Alegre | Mediação, 2008. | julho 2012 participaram de um bate-papo com o escritor Domingos Pellegrini, podendo confrontar suas percepções e dúvidas sobre o livro com as colocações do autor. Pellegrini tratou dos temas discutidos em aula e trouxe a fábula para a realidade dos jovens. Ao nos aproximarmos do final da história, os leitores perceberam que da euforia consumista que se espalhava pela cidade devido a essa árvore de flores extraordinárias, passaram à descoberta da depressão: as notas, tão perfeitas, tão novinhas, esfarelavam-se completamente quando alguém as levava para além da ponte que delimitava a fronteira do município. Mas não tardaria até a televisão e os jornais descobrirem essa árvore prodigiosa, fazendo com que a cidade voltasse a se encher de dinheiro, mas dinheiro de verdade, dinheiro que não se esfarelava, dinheiro trazido pela profusão de turistas ansiosos. Entretanto, outros problemas surgiram e os munícipes continuavam tristes, apesar da riqueza. A partir do debate diante das atitudes das pessoas da cidade, surge a proposta às turmas de uma atividade interdisciplinar, incentivando os alunos a construírem relações entre os diferentes conteúdos presentes nessas disciplinas. Os alunos precisaram criar sua própria árvore, utilizando material alternativo e de sucata. Percebe-se, neste momento, a habilidade individual de cada aluno, o envolvimento para o exercício da criação e o quanto a interação entre as diferentes áreas do conhecimento facilitou o resultado final do trabalho. Era necessária, além da criatividade, a reflexão do que realmente importava em suas vidas. O exercício era chegar a um consenso e defender seus valores. Cada dupla apresentou sua árvore aos colegas, explicando o material utilizado e justificando a escolha das palavras. Bela aula de cidadania e, dessa forma, nosso projeto começava a contemplar outras áreas... Referências Bibliográficas: AUSUBEL, David et al. Psicologia educativa: un punto de vista cognoscitivo. Cidade do México | Trillas, 1988. HERNÁNDEZ, Fernando. A organização do currículo por 53 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 7 Atendimento Educacional Especializado: Recursos e Serviços que Promovem a Inclusão Escolar | julho 2012 Ângela Windmöller Especialista em Educação Especial – SRMF da E. M. E. F. Eng.º Ildo Meneghetti Rejane Patro Pós-Graduação em Neuropsicopedagogia e Educação Especial Inclusiva (em curso) SRMF da E. M. E. F. Jardim Panorâmico Sheila Poliana Berghan Especialista em Educação Especial – SRMF da E. M. E. F. Jardim Panorâmico Sidione Alice Schöninger Metz Pós-Graduação em Neuropsicopedagogia e Educação Especial Inclusiva (em curso) SRMF da E. M. E. F. Eng.º Ildo Meneghetti e E. M. E. F. Aroni Aloísio Mossmann [...] para os defensores da inclusão escolar é indispensável que os estabelecimentos de ensino eliminem barreiras arquitetônicas e adotem práticas de ensino adequadas às diferenças dos alunos em geral, oferecendo alternativas que contemplem a diversidade, além de recursos de ensino e equipamentos especializados que atendam a todas as necessidades educacionais dos educandos com ou sem deficiência, mas sem discriminações. (MANTOAN, 1999, p. 42-3) S 54 egundo a Resolução CNE/CEB 04/2009, os sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação (AH/SD) nas classes comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional Especiali- zado (AEE). Conforme o Ministério da Educação (MEC), entende-se por deficiência os alunos que têm algum impedimento, como: cegueira, baixa visão, surdez, deficiência auditiva, surdocegueira, deficiência física, deficiência intelectual, deficiência múltipla, transtornos globais do desenvolvimento (TGD) e AH/SD, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. A Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva define a educação especial como uma modalidade de ensino transversal a todos os níveis, etapas e modalidades, que disponibiliza recursos e serviços e realiza o AEE de forma complementar ou suplementar ao Referências Bibliográficas: RELATOS DE EXPERIÊNCIA possibilita aos alunos com AH/SD o enriquecimento curricular, através de projetos e estudos que estimulem suas habilidades. O professor deve ter formação inicial que o habilite para o exercício da docência e formação específica em Educação Especial. São objetivos do AEE: • Identificar as habilidades e necessidades educacionais específicas dos alunos, a definição e a organização das estratégias, serviços e recursos pedagógicos e de acessibilidade; • Produzir materiais didáticos e pedagógicos acessíveis; a partir dos objetivos e das atividades propostas no currículo; • Estabelecer a articulação com os professores da sala de aula comum e com os demais profissionais da escola, visando à disponibilidade dos serviços e recursos e ao desenvolvimento de atividades para a participação e aprendizagem dos alunos nas atividades escolares; • Estabelecer parcerias com as áreas intersetoriais, na elaboração de estratégias e na disponibilidade de recursos de acessibilidade; • Orientar os demais professores e as famílias sobre os recursos pedagógicos e de acessibilidade utilizados pelo aluno, de forma a ampliar suas habilidades, promovendo sua autonomia e participação. Deste modo, a educação especial afirma o direito à igualdade de acesso e permanência na escola, oferecendo recursos e serviços de apoio, considerando as necessidades específicas de cada sujeito. | julho 2012 espaço da sala de aula. Esse deve integrar a proposta pedagógica da escola, contemplar a participação da família e ser realizado em articulação com as demais políticas públicas. Os alunos identificados, no Censo Escolar, com alguma deficiência, TGD e/ou AH/SD receberão, quando necessário, adaptação curricular, proporcionando a flexibilização de conteúdos, objetivos, metodologias, avaliações e tempos diferenciados para o desenvolvimento de suas atividades. O AEE pode ser ofertado em salas de recursos multifuncionais (SRMF) da própria escola ou de outra de ensino regular, em centros de atendimento educacional especializado da rede pública ou em instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos conveniadas com a Secretaria de Educação, preferencialmente em turno inverso ao horário em que os alunos frequentam a classe regular. O cronograma de trabalho variará de acordo com cada aluno, podendo ter o atendimento individual ou em pequenos grupos; e ainda, em alguns casos, o acompanhamento poderá ocorrer somente com interferências na sala de aula. Não cabe ao AEE escolarizar. As atividades desenvolvidas neste espaço diferenciam-se daquelas realizadas em sala de aula comum, não sendo substitutivas à escolarização. As SRMF são de natureza pedagógica, dispõem de recursos de tecnologia assistiva e de acessibilidade, material didático e mobiliário específicos. Realiza-se neste espaço atividades que estimulem o desenvolvimento dos processos mentais: atenção, percepção, memória, raciocínio, imaginação, criatividade, linguagem, entre outros; proporcionando ao aluno o conhecimento de seu corpo, levando-o a usá-lo como instrumento de expressão consciente na busca de sua independência e na satisfação de suas necessidades. Também Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução Nº 4, de 2 de outubro de 2009. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial. Brasília: MEC/ SEESP, 1994. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Decreto Nº 6.571, de 17 de setembro de 2008. MANTOAN, Maria Teresa Égler. Inclusão escolar: O que é? Por quê? E como fazer? São Paulo | Moderna, 2003. 55 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 8 Meu Lixo, Teu Lixo, Nosso Lixo! Caroline dos Santos dos Santos Kátia Andrea Reinheimer Professoras do 4º ano na EMEF Engº Ildo Meneghetti P | julho 2012 artindo do pressuposto de que todos devem tomar consciência dos males causados à natureza e ao meio ambiente pela não separação e reciclagem adequada do lixo, buscamos desenvolver um projeto com ideias simples e possíveis para amenizar este problema sério (que vem atingindo o mundo todo), não só na escola, mas na comunidade local. 56 Ao longo da história, o homem transformou-se pela modificação do meio ambiente, criou cultura, estabeleceu relações econômicas, modos de comunicação com a natureza e com os outros. Mas é preciso refletir sobre como devem ser essas relações socioeconômicas e ambientais, para se tomar decisões adequadas a cada passo, na direção das metas desejadas por todos: o crescimento cultural, a qualidade de vida e o equilíbrio ambiental. (SCHWINN: 2011) Segundo Marilene Sant’Ana Schwinn, professora e supervisora escolar de Gravataí/RS, autora de matéria publicada na “Revista do Professor”, em abril/julho de 2011, é fundamental en- tender que não precisamos ser super-heróis para podermos ser agentes transformadores de um mundo melhor, mas que podemos realizar pequenos gestos e ações, às vezes mais eficazes que grandes obras, desde que partam de um grupo com o mesmo objetivo: melhorar o ambiente em que vivemos. O embasamento teórico para que isso acontecesse, encontramos na formação para o trabalho com projetos, ministrada pela professora Zuleica Rangel, onde todos os professores de séries/anos elaboraram metas de trabalho para com seus alunos sobre essa temática, visando a desenvolver a cidadania conforme os PCNs, o respeito e a responsabilidade sobre um espaço que não é só meu, teu ou nosso, mas sim um espaço que nos foi emprestado e que temos obrigação de devolver nas mesmas condições que o encontramos, ou até melhor. Para isso, nosso objetivo geral foi retomar a separação de lixo em nossa escola, conforme artigos 25 e 26, do capítulo III da Política Ambiental Municipal, encontrada no Plano Diretor do Município de Ivoti, mantendo um programa contínuo Não jogue lixo no chão Ele é meu ganha-pão Sou catador de papelão Latinha é na minha mão Você que separa o lixo, você é um cidadão. Esse nosso compromisso, reconstrói uma nação. Pra onde vai esse lixo seco? Reciclagem Pra onde vai esse outro lixo? Compostagem. A natureza agradece! (Música do CD Escolinha do Pimpolho.) RELATOS DE EXPERIÊNCIA Rap da reciclagem – cantado e dançado pelos alunos do 4º ano Referências bibliográficas: BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília | 1997. p. 25-7. http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro081.pdf Município de Ivoti. Lei Municipal nº 2260, de 10 de outubro de 2006. REVISTA DO PROFESSOR. Ano 2011, n° 106, abril/junho de 2011. p. 23-9. | julho 2012 de sensibilização quanto à redução e a produção desnecessária de lixo. Um exemplo que nos foi trazido pelos alunos do 4º ano, depois de analisarem o lixo da escola, e que repercutiu entre as famílias, foi o consumo muito grande de alimentos aglutinados em várias embalagens, que ao final somam um amontoado de lixo. Com esse trabalho atingimos as diversas áreas do conhecimento: trabalhos artísticos com sucata, música e dança tiveram o seu espaço garantido, mostrando, mais uma vez, que a união faz a grande diferença, quando se opta em trabalhar por projetos. Nossos alunos ficaram realmente muito curiosos em saber o destino final do lixo produzido por eles (usina de triagem em Lindolfo Collor e aterro sanitário em Minas do Leão), e chocados ao terem ciência dos valores gastos para esse fim pelo Município. Gráficos nos auxiliaram na apresentação dessas informações, assim como aquelas por eles trazidas de casa, mostrando a quantidade em quilos de lixo produzido pelas famílias. Contribuíram com muitas informações sobre a reciclagem de latinhas, garrafas e papelão, sendo este movimento já feito pelas famílias ou conhecidos. Outros recursos, como desenho animado, literatura, pesquisas, também foram usados para ilustrar, de diferentes ângulos, questões acerca do desperdício, coleta seletiva, tempo de decomposição, reciclagem e reutilização. No decorrer das aulas, muitas ideias foram discutidas, mas a conscientização do papel de cada ser no meio ambiente e, especialmente, a importância da própria postura frente a essas questões, é que nos motivaram a compartilhar a experiência. Fez-se pouco daquilo que ainda se quer fazer, mas o pouco já feito é muito diante de um nada começado. Para 2012, o projeto continua... Lembrando que, com motivação e criatividade, podemos atingir o alvo desejado: pessoas cada vez mais conscientes dos seus atos, preocupadas com o bem-estar social e, principalmente, engajadas nas questões ambientais. 57 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 9 As Formas da Reforma Cecília Luiza Etzberger Pós-graduada em Arte-Educação pela Universidade Feevale Professora de Arte na E. M. E. F. 25 de Julho e na E. M. E. I. Bem Querer | julho 2012 O 58 ano letivo de 2012 iniciou com a concretização de um sonho: a tão esperada ampliação da Escola 25 de Julho. Com uma grande expectativa em relação a esse processo, pus-me a pensar como poderia relacionar este fato tão importante na Escola com o ensino de arte. Martins (2005, p. 52) traz que “é necessário reconhecer que em todos os campos do conhecimento existe o inesperado, o fato novo que traz a desordem e um novo processo de reorganização por meio da criação”. Poderia a construção em questão ser objeto de ensino e aprendizagem? Após perceber que este poderia ser um tema rico para o desenvolvimento de um projeto, iniciei minha pesquisa por quais relações poderiam ser estabelecidas entre os objetivos traçados para o grupo de alunos e as provocações artísticas trazidas pela reforma. Uma das expectativas maiores era em relação ao som da obra e de sua interferência nas aulas. As primeiras aulas das turmas do sexto ano, então, foram destinadas a “ouvir” a reforma. Partindo desta escuta, os alunos anotaram os sons que ouviram e foram desafiados a criar imagens que pudessem representá-los. Passado o momento do registro no papel, os alunos fizeram gravações destes sons. Posteriormente, os alunos criaram pequenas composições sonoras partindo das gravações feitas, utilizando o programa Audacity. Nesta etapa, os alunos, juntamente com os professores, descobriram algumas das possibilidades do programa. Os resultados foram satisfatórios, entretanto, percebeu-se que há mais a ser descoberto neste recurso tecnológico. A reforma da escola está ocorrendo no espaço onde anteriormente havia a sala de arte. Quando a obra estava na etapa da demolição desta sala, questionei os alunos acerca de que materiais sobravam deste momento da reforma. Eles elencaram diversos itens, entre eles a madeira. Na semana seguinte, munidos de pregos e martelos, cada aluno escolheu um pedaço de madeira – que antes formava a sala de arte – e, partindo dele, criou uma escultura. Diante do constante uso do prego e do martelo e da sonoridade oriunda do uso destas ferra- [...] quando um estudante realiza uma atividade vinculada ao conhecimento artístico, a pesquisa evidenciou algo que, por óbvio, muitos esquecem: que não só potencia uma habilidade manual, desenvolve um dos sentidos (...) ou expande sua mente, mas também, e sobretudo, delineia e fortalece sua identidade em relação às capacidades de discernir, valorizar, interpretar, compreender, representar, imaginar, etc., o que o cerca e também a si mesmo. A reforma da Escola continua, e o projeto “As Formas da Reforma” também. Muita arte ainda está por ser feita, muitos objetivos a serem alcançados. Quando a reforma estiver pronta, perceberemos que não se construiu apenas um novo prédio, mas também novos conhecimentos, através de criativas e significativas vivências. HERNÁNDEZ, F. Cultura visual, mudança educativa e projeto de trabalho. Porto Alegre | Artmed, 2000. MARTINS, Miriam Celeste (org.) Mediação: provocações estéticas. 1° ed. São Paulo | Instituto de Artes/Unesp. Pósgraduação, 2005. RELATOS DE EXPERIÊNCIA Referências Bibliográficas: | julho 2012 mentas estarem presentes nas aulas, apresentei aos alunos as obras de Jorge Macchi “Gnocturno” e “Shadows Theatre”, que nos fazem refletir sobre a relação entre som e imagem. Diante da provocação do artista, os alunos fizeram um trabalho utilizando uma placa de madeira como base. Cada um criou uma pintura e acrescentou a ela pregos, que serviram como pontos para a amarração de fios de diversas cores e espessuras, material com o qual os alunos formaram diferentes imagens. Decorrente dessa produção, está em desenvolvimento uma nova pesquisa envolvendo a criação sonora. Os alunos estão criando sons, partindo de marteladas em pregos e manipulando-os no já referido programa. Este trabalho está ainda em andamento, mas já traz indícios de boa qualidade. Próximo do final de cada trabalho, foi realizado um momento de avaliação conjunta, em que os alunos apreciaram todos as criações e fizeram comentários buscando destacar pontos positivos e a melhorar acerca das mesmas. Após esta parada, cada aluno teve a oportunidade de enriquecer sua produção durante mais uma aula, aprimorando, assim, seu trabalho. Ao refletir sobre a prática de atividades artísticas, Fernando Hernández (2000, p. 42) diz que: 59 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 10 Arte + Geografia = Um Novo País Cecília Luiza Etzberger Pós-graduada em Arte-Educação pela Universidade Feevale Professora de Arte na E. M. E. F. 25 de Julho e na E. M. E. I. Bem Querer Inês Maria Leichtweis Licenciada em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria Professora de Geografia na E. M. E. F. 25 de Julho | julho 2012 D 60 iante das provocações lançadas pela 8ª Bienal do Mercosul, realizada no segundo semestre de 2011, foi desenvolvido um projeto de estudos unindo as áreas de Arte e Geografia. Nas obras expostas, notou-se a presença de elementos que traziam informações sobre países, como bandeiras e mapas. Tais obras provocaram a reflexão sobre questões relacionadas à territorialidade e fronteiras, entre outros aspectos sociais. Partindo da apreciação da mostra presente na Bienal sobre o país de Sealand, uma micronação fundada em 1967 e que conta com apenas 500m2 de território, foi proposto aos alunos refletir acerca da possibilidade de invenção de um país. O que um país precisa ter para ser um bom local para se viver? E seu sistema político, como deve funcionar? Após estas e outras provocações terem sido feitas, tendo como base o material educativo for- necido pela Bienal do Mercosul, no curso voltado aos professores ministrado pelos organizadores da mostra, foi lançado aos alunos da sétima série da Escola 25 de Julho o projeto “Arte + Geografia = Um novo país”. Foi solicitado aos alunos que, organizados em duplas, pensassem como seria um país inventado por eles. Após as trocas de ideias iniciais, foram entregues orientações acerca do que cada dupla deveria considerar ao criar o seu país, juntamente com um cronograma para a realização do trabalho. Dentre os itens a serem considerados na criação do país estavam: nome do país, capital, líder, língua, localização, área, bandeira, sistema político, economia, população, fatos históricos importantes e aspectos culturais. Paralelamente à criação do país, cada dupla desenvolveu um estudo acerca de um país real situado na América do Sul, considerando os mesmos critérios. Este estudo paralelo possibilitou aos Referência Bibliográfica: HERNÁNDEZ, F.; VENTURA, Montserrat. A organização do currículo por projetos de trabalho: o conhecimento é um caleidoscópio. 5° ed. Porto Alegre | Artmed, 1998. RELATOS DE EXPERIÊNCIA alização de atividades interdisciplinares favorece o trabalho em sala de aula, tornando os alunos autores de sua aprendizagem. Mapa de Hárfia Visita à Bienal 2011 Mapa de Hárfia | julho 2012 alunos compreenderem um país como um todo, percebendo as relações entre suas diferentes áreas. Desta forma, os dados criados para o país inventado, apesar de poderem ser irreverentes e curiosos, deveriam ter relações lógicas entre si. Durante o processo de criação, foram feitas leituras de obras de Mayana Redin, em que a artista criou mapas fictícios partindo do traçado de mapas reais. Após, os alunos criaram os mapas de seus países partindo de recortes de mapas reais, assemelhando-se à estratégia utilizada pela artista. O desenvolvimento do projeto demandou sete encontros de dois períodos cada um, indo além do tempo previsto inicialmente. Ao final, foi feita a socialização das criações, e os resultados foram surpreendentes. Surgiram os mais variados países. Alguns bastante jovens, outros mais antigos. Surgiram inúmeras ilhas, países de grande áreas em contraponto a países muito pequenos. Houve países localizados na Coordenada Geográfica zero, enquanto outros estavam próximo do Polo Norte. Diferentes foram os sistemas políticos e econômicos elaborados, cada um com aspectos muito peculiares. Próximo da finalização do trabalho, os alunos tiveram a oportunidade de visitar a 8ª Bienal do Mercosul e ver as obras, já conhecidas por reproduções. Este momento foi de extrema importância para o crescimento dos alunos, uma vez que os colocou em contato com exemplares da arte contemporânea. Neste trabalho, Arte e Geografia andaram juntas de tal maneira que, por diversos momentos, não foi possível dizer qual disciplina estava em destaque. Hernández e Ventura (1998, p. 61) nos trazem que a realização de projetos de forma interdisciplinar está vinculada à perspectiva do conhecimento globalizado e relacional (...). Ao criar uma bandeira com materiais recicláveis, por exemplo, está se pensando mais na visualidade do trabalho ou nos elementos que compõem a bandeira e que se representam o país? Ao final do projeto, percebeu-se grande crescimento nos alunos, uma vez que o percurso desenvolvido caracterizou-se por constantes trocas e pesquisas. Este trabalho mostrou que a re- 61 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 11 DAVI: Como é Bom Estar Contigo! Cíntia Dexheimer Fonoaudióloga do NAI Nara Jaqueline Gallon Psicóloga do NAI Queli Wagner Psicopedagoga do NAI Rejane Patro Professora do AEE | julho 2012 E 62 ra um menino muito engraçado, 12 anos de idade, não sabia quem era, nem onde estava. Mas, o olhar brilhava, a boca pedia e o corpo falava. Assim começa nossa trajetória com DAVI, um entre tantos e todos os meninos e meninas atendidos no NAI – Núcleo de Apoio à Inclusão, do Município de Ivoti, RS. Uma história complexa, estimulante e emocionante de um sujeito que, ao chegar para os primeiros encontros, perguntava se era ele ou o irmão quem estava ali presente. DAVI coloca-nos lá no início de tudo, quando a relação com o Outro não inscreve marca e não convoca adequadamente, com a devida intensidade para a vida. [...] a saúde mental, portanto, é produto de um cuidado incessante que possibilita a continuidade do crescimento emocional [...] os distúrbios que podem ser reconhecidos e clas- sificados como psicóticos têm sua origem no desenvolvimento emocional anterior à fase em que a criança já se tornou visivelmente uma pessoa total, em condições de relacionar-se por inteiro com pessoas totais. (WINNICOTT, 2000, p. 306-7) O protagonista deste texto tem, ainda hoje, comportamentos de autorreconhecimento e fortalecimento de autoestima. Busca com muita força, e empenho, aprender, e quer estar no mundo como sujeito atuante. O entendimento da passagem do tempo vem de coisas do cotidiano, acompanhadas de questionamentos e destaque para o antes e depois, e com a rotina diária registrada de forma visual. A falta de convívio social e atividades motoras resultaram em dificuldades na participação nas aulas de Educação Física, recreios e outras atividades proporcionadas a ele na escola. A falta de vivência do corpo e do “eu” também se refletia [...] o objetivo [...] é proporcionar condições e liberdade para que o aluno com deficiência intelectual possa construir sua inteligência, dentro do quadro de recursos intelectuais que lhe é disponível, tornando-se agente capaz de produzir significado/conhecimento. (MEC, 2007, p. 25) Seu tema atual de interesse são as águas-vivas, que “queimam”, que impõem limite ao contato do humano, o contato com o outro, ao que ele consegue significar: eu não sou assim. Assim, para concluir, reportamo-nos a Jerusalinsky, quando coloca que o primeiro trabalho a ser feito é deslocar esse sujeito de um rótulo e dar lugar ao indizível; mais do que dar respostas, aprendemos a ouvir as perguntas, conjugando novos questionamentos, pois o avanço não está nas respostas dadas, mas na busca de novos questionamentos, pois são neles que reside a reflexão. RELATOS DE EXPERIÊNCIA com o olhar a confirmação das suas capacidades. *DAVI é um nome fictício. Referências Bibliográficas: Ministério da Educação. Atendimento Educacional Especializado – Deficiência Mental. Brasília | MEC, 2007. DOLTO, Françoise. As etapas decisivas da infância. São Paulo | Martins Fontes, 2007. FERNANDEZ, Alícia. O saber em jogo: a psicopedagogia propiciando autorias de pensamento. Porto Alegre | Artmed, 2001. PAÍN, Sara. A função da ignorância. Porto Alegre | Artes Médicas, 1999. WINNICOTT. Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas por Donald Woods. Rio de Janeiro | Imago, 2000. | julho 2012 nos desenhos de Davi. Vários personagens, todos iguais, olhos sem expressão. “Quantos dedos tem? Que cor são seus olhos?” “[...] a inteligência, os mecanismos cognitivos, objetivantes, trabalham sobre a dramática do sujeito com o suporte das significações.” (FERNANDEZ, 2001, p. 41) Para além do diagnóstico psicológico e/ou comorbidade com este, DAVI tem um déficit cognitivo importante, o que faz com que a aprendizagem seja um grande desafio. Confirmando, assim, que a escola, atendendo-o, aprende muito e pode valer-se dessa experiência para tantos outros alunos, com dificuldades de aprendizagem ou não. Aprender pela experimentação, repetição, significado, o que é para todos importante, para DAVI é imprescindível, é a busca do que na vida vai ajudar-lhe a ser “alguém” (leia-se alguém, como uma pessoa habilitada a estar e se sair bem no social, no afetivo, na vida. Que possa trabalhar, circular autonomamente, constituir relacionamentos amorosos, ter amigos, saber de seus direitos e deveres). Desde o princípio dos atendimentos a esse menino, observamos como era necessário que ele pudesse ter resgatado/restituído ou constituído seu lugar como sujeito, para que pudesse aprender. Buscamos, assim, estabelecer um espaço de construção de possibilidades para ele se inscrever numa sociedade que respeite seus limites e valorize seu potencial. Ressignificando primeiramente o seu processo de aprendizagem, criando espaços para fazer um deslocamento daquilo que DAVI trazia em seu sintoma, para, a partir disso, criar maneiras de marcar a realidade e instrumentalizar sua construção. E é nessa direção que temos trabalhado incansavelmente, com estudo, empenho, afeto e disposição. Nós, NAI e ESCOLA. Hoje ele manifesta claramente o que quer, sabe quem é, sabe que é diferente, e outro em relação ao irmão, sorri, está aprendendo a fazer carinho, relata o que aprende na escola, gosta de estar com os colegas. Vem descortinando suas possibilidades, buscando construir algo em tudo que vai anunciando – repete e processa; vai e vem. Ensaia a leitura de palavras e frases, buscando sempre 63 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 12 Projeto: E, no Castelo... Denise Beatris Holler Führ Rosane Würzius E. M. E. I. Pedacinho do Céu | julho 2012 A 64 s rodas cantadas fizeram parte da nossa infância e continuam alegrando a garotada até os dias de hoje. Foi, a partir de uma dessas brincadeiras, que surgiu o nosso projeto “E, no Castelo...”, no ano de 2011. Após cantarmos e dramatizarmos a cantiga de roda “A linda Rosa Juvenil”, as crianças pediram que a fizéssemos várias vezes, pois queriam ser, pelo menos uma vez, cada um dos personagens que aparecem nela (bruxa, rei e Linda Rosa). Segundo Moyles, esse momento de brincar oportuniza as crianças a praticarem habilidades físicas e mentais, repetindo-as quantas vezes acharem necessário. Tínhamos como objetivo proporcionar a todos que fossem príncipes e princesas, possibilitando que desenvolvessem a imaginação, criassem as suas regras para a brincadeira e entrassem nesse mundo mágico e encantado. Esse tipo de jogo propicia um maior desenvolvimento da criança. Através do faz-de-conta a criança pode, também, reviver situações que lhe causam excitação, alegria, medo, tristeza, raiva ou ansiedade. Elas podem, nesse jogo mágico, expressar e trabalhar as fortes emoções muitas vezes difíceis de suportar. É a partir de suas ações nas brincadeiras que elas exploram as diferentes representações que têm destas situações difíceis. (CRAIDY, 2001, p. 106) Além dessa brincadeira de roda, exploramos outras histórias que falassem de príncipes, princesas e castelos. Realizamos diversas atividades (interpretação, compreensão, desenhos, pinturas, jogos, construção de castelos...) baseadas nelas. Também criamos um salão de beleza, trouxemos roupas especiais e outros acessórios, a fim de que se caracterizassem. Conforme o Referencial Curricular Nacional: Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança [...] (RCNEI, v.1, p. 23) Durante o andamento do projeto, os pais RELATOS DE EXPERIÊNCIA também foram envolvidos. Cada família deveria criar um livro contando a história de vida do seu príncipe ou da sua princesa, o que possibilitou que conhecêssemos um pouco mais sobre a vida de cada um dos nossos alunos. Todos os pais participaram e foram bastante criativos na elaboração dos livros, os quais ficaram muito bonitos e interessantes. Segundo Shores e Grace (2008), “torna-se fundamental que professores e demais educadores envolvam os pais como parceiros nos programas de educação infantil (...)” Assim, com a participação e comprometimento de todos, tivemos aprendizagens significativas e superamos grandes desafios através da ludicidade e do faz-de-conta. Referências Bibliográficas: | julho 2012 BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília | 1998. CRAIDY, Carmen; KAERCHER, Gládis. Educação infantil pra que te quero? Porto Alegre | Artmed, 2001. MOYLES, Janet. Só brincar? O papel do brincar na educação infantil. Porto Alegre | Artmed, 2002. SHORES, Elizabeth; GRACE, Cathy. Manual de portfólio: um guia passo a passo para o professor. Porto Alegre | Artmed, 2008. 65 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 13 Projeto: De volta para casa | julho 2012 Dirce Stumm Reiter Licenciatura em Letras Português/Alemão – Unisinos Especialização em Língua e Literatura Alemã pelo Instituto Goethe, Alemanha Professora de Língua Alemã na E. M. E. F. Engº Ildo Meneghetti Elisa Feilstrecker Fortes Mestrado em Metodologia do Ensino de 1º Grau Professora de Ensino Religioso, Geografia e História na E. M. E. F. Engº Ildo Meneghetti Elisângela Schorn Holler Especialista em Gestão na Escola Professora de Língua Portuguesa na E. M. E. F. Engº Ildo Meneghetti 66 C om o objetivo de incentivar a leitura, foi adotada a obra “O Mágico de Oz” para todas as turmas de 6º Ano da Escola Municipal Engº Ildo Meneghetti. Lendo o livro, refletindo sobre projetos e percebendo a realidade dos alunos, professores, coordenação pedagógica e direção pensaram em criar um projeto a partir da obra literária citada. Um projeto “é, a princípio, uma irrealidade que vai se tornando real, conforme começa a ganhar corpo a partir da realização de ações e, consequentemente, as articulações destas” (NOGUEIRA, 2003, p. 90). Além disso, “todas as coisas podem ser ensinadas por meio de projetos, basta Teatro de Fantoches que se tenha uma dúvida inicial e que se comece a pesquisar e buscar evidências sobre o assunto” (HERNANDEZ, 2000, p.198). Sendo assim, o projeto “De volta para casa” surgiu para ampliar o conhecimento de si e do mundo, valorizando suas experiências e vivências por meio das diferentes áreas do conhecimento, através de aprendizagens significativas, decorrentes do clássico literário “O Mágico de Oz”. Este projeto ainda está em andamento. Nas aulas de Língua Portuguesa foi realizada a leitura do livro, sendo cada capítulo distribuído para um grupo de alunos, que foi responsável por apresentar de alguma forma o conteúdo/a informação do capítulo para os demais colegas. Os alunos logo se empenharam nesta tarefa e foram muito criativos na apresentação. Enquanto isso, na Língua Alemã, a partir da pergunta “Dorothy mora com seus tios. Por quê?”, os alunos fizeram sua árvore genealógica, pesquisando a história de cada família. A descoberta de familiares adotados ou também criados e educados por tios ou avós, os fez perceber que na linha Dinâmica realizada na reunião de pais do 6º Ano 2, a partir da ideia do coração, do cérebro, da coragem e do caminho necessários para que os filhos aprendam e sejam felizes RELATOS DE EXPERIÊNCIA da apreciação da obra literária, inicialmente pela própria professora Andréa Schneck: “A cada página um elemento novo, uma cor, uma textura, uma forma, um sentimento, uma ideia criativa”. Seguiu-se um mergulho muito singular na obra, associando materiais, técnicas e temáticas do interesse dos alunos, adequadas a suas reais necessidades. Desenhos a grafite, maquetes do ciclone, pesquisas virtuais de algumas imagens e ilustrações, o primeiro filme de Oz de 1925, o musical de 1939, outras montagens teatrais e cinematográficas, a confecção dos personagens, a introdução de outros personagens ligados às nossas raízes indígenas e seus mitos, pinturas de cenários, fotografias monocromáticas, exploração das sonoridades, ritmos e estilos também da música tema “Além do Arco-Íris”, dentre outras coisas, foram alguns dos “tijolos multicores” percorridos nas aulas de Arte em suas múltiplas linguagens. Sonhos, fantasias, alegorias, inventividades, surpresas, busca de soluções criativas frente aos muitos desafios, possibilitaram uma dinâmica e prazerosa construção do conhecimento em Arte. Para finalizar, nas aulas de Língua Portuguesa está previsto que cada grupo crie um novo capítulo para o livro, no qual terão que integrar a personagem inventada na aula de Arte. | julho 2012 do tempo de cada família também acontecem fatos parecidos com os do livro, e assim muda o conceito de família “de sangue” para a “família grupo de acolhimento e pertencimento”. Os alunos perceberam a importância dessa pesquisa como valor histórico, uma vez que os registros ficam guardados como documento. Esta parte do trabalho não está concluída, uma vez que muitos alunos precisam voltar às suas cidades de origem para poder terminá-la. Essas informações também serão usadas na Língua Portuguesa, para criar um álbum da família, no qual constarão fotos, fatos e descrição detalhada de cada parte abordada pelo aluno na sua família. Em Geografia, “Quem teve a ideia de dar vida a um espantalho e a um homem de lata? Será que a bruxa Malvada e a Bruxa Boa são pessoas da vivência do autor? A pessoa que escreveu a história já morreu?” – estas e inúmeras outras indagações inspiraram os alunos a conhecerem a história da pessoa que deu vida a personagens tão inusitados. Então organizaram os fatos mais marcantes da vida de Lyman Frank Baum, através de uma linha do tempo. Também nas aulas de Geografia, o fenômeno natural que provoca o início das aventuras de Dorothy foi objeto de pesquisa e investigação. Assim, os alunos descobriram o que provoca os ciclones, em que lugares do Planeta ocorrem com maior frequência, os danos que causam e outras curiosidades. Referências Bibliográficas: Maquete sobre o ciclone realizada em Arte Na área da Arte, o projeto permitiu tecer muitas relações sensíveis com conteúdos previstos no Plano de Estudos do 6º ano, ressignificando a história e sua estética, especialmente a partir BAUM, L. Frank. O Mágico de Oz. 3° ed. São Paulo | Ática, 2000. HERNÁNDEZ, F. Cultura Visual, Mudança Educativa e Projeto de Trabalho. 1° ed. Porto Alegre | Artmed, 2000. NOGUEIRA, Nilbo Ribeiro. Pedagogia dos Projetos: uma jornada interdisciplinar rumo ao desenvolvimento das múltiplas inteligências. 3° ed. São Paulo | Érica, 2001. 67 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 14 O Brincar e a Elaboração de Projetos na Educação Infantil Helena Maria de Marichal Licenciada em Pedagogia (UFRGS) Professora na E. M. E. I. Bem Querer | julho 2012 É necessário que o educador insira o brincar em um projeto educativo, o que supõe intencionalidade, ou seja, ter objetivos e consciência da importância de sua ação em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem infantis. (FORTUNA, 2003/2004, p. 9) 68 A credito que os projetos devem ser pensados a partir dos interesses e necessidades da turma, ser adequados à faixa etária das crianças e pressupor atividades planejadas, que se relacionem aos conhecimentos com os quais pretendemos trabalhar. Embasada nesses pressupostos e nos Planos de Estudos da Rede Municipal de Ensino de Ivoti, desenvolvi no Maternal 2B, com a colaboração das demais professoras da turma, um projeto no qual se inseriu o brincar. Através do projeto “Contos e brincadeiras de ontem e de hoje”, realizado no segundo semestre de 2011, foram abordados contos de fadas, fábulas, cantigas de roda, brincadeiras e brinquedos tradicionais e demais elementos do folclore brasileiro. Histórias, vídeos e dinâmicas referentes aos temas do projeto foram pontos de partida para ampliarmos a compreensão, a identificação e as características de seus enredos e personagens. Os alunos tiveram livros a sua disposição para que manuseassem e pudessem solicitar a leitura de algum deles ou fazer sua própria leitura. Por meio de trava-línguas desenvolvemos a articulação das palavras, o conhecimento de novos vocábulos e seus significados. A letra inicial do nome de cada criança foi associada à de elementos ou personagens dos contos de fadas abordados. Na Semana Farroupilha, a turma vivenciou costumes dos gaúchos, como tomar chimarrão, comer carreteiro e churrasco, usar roupas típicas, cantar e dançar músicas gauchescas. Conheceu também as bandeiras do Brasil e do Rio Grande do Sul, o Hino Rio-Grandense, a lenda da erva-mate e a peteca – os dois últimos, de origem indígena. Referências Bibliográficas: FORTUNA, Tânia Ramos. O Brincar na Educação Infantil. Pátio Educação Infantil, n° 3, dez. 2003/mar. 2004, p. 6-9. GOULART, Iris Barbosa. Piaget: experiências básicas para utilização pelo professor. Petrópolis | Vozes, 2008. IVOTI. Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Planos de Estudos da Rede Municipal de Ensino. 2011. RELATOS DE EXPERIÊNCIA da Educação Infantil e de outros níveis de ensino. Como afirma Fortuna (2003/2004), o brincar pode também ser intencional e fazer parte de um projeto educativo. Para tanto, cabe ao professor pensá-lo previamente, tendo em vista o que será proposto, como e com que finalidade. Contação da lenda de origem africana da boneca Abayomi Fazendo sapatinhos da Cinderela com argila O faz-de-conta na brinquedoteca da escola | julho 2012 Durante uma semana, igualmente, lembramos a cultura africana e afrobrasileira, contando a lenda da boneca de pano Abayomi e distribuindo uma para cada aluno. A sequência lógica das histórias foi retomada através de suas ilustrações. Ampliamos a identificação das cores presentes nos ambientes da escola e nos pertences das crianças. Contagens orais e representações de quantidades até dez foram introduzidas, utilizando músicas e parlendas (“A galinha do vizinho”, “Um, dois, feijão com arroz”, etc.). O brincar livre e o dirigido com elementos de faz-de-conta e a representação de ideias por meio de diferentes formas de linguagem simbólica – oral, musical, gráfica e dramática – foram enfatizados. Introduzimos alguns jogos de regras, como o bingo, o jogo da memória e o jogo da velha, com personagens das histórias lidas em aula. Da mesma forma, foi proposta a reversibilidade de ações concretas, através de percursos de ida e volta, ou colocando e tirando algum elemento do cenário. A participação das famílias no projeto foi muito importante. Cada uma confeccionou um brinquedo tradicional para seus filhos brincarem na escola. Além disso, os livros de história escolhidos semanalmente para leitura em casa também foram integrados a sua temática. No decorrer do projeto “Contos e brincadeiras de ontem e de hoje” foi possível perceber que se manteve a motivação das crianças em ouvir e contar o que já sabiam sobre as histórias conhecidas e em escutar novas histórias. Além do mais, como as temáticas eram bastante abrangentes, o projeto que, a princípio, teria dois meses de duração, se estendeu por quatro meses. Vários pais relataram que seus filhos estavam mais interessados em contar e nomear as cores dos objetos que observavam em casa, em narrar atividades e contos trabalhados em aula. As crianças traziam garrafas de água, chinelos e mochilas com personagens de contos de fadas para mostrar às professoras e aos colegas. Ao final do projeto, a maioria da turma ampliou sua capacidade de recontar histórias corretamente. Portanto, ressalto a potencialidade que o brincar desempenha na aprendizagem dos alunos 69 RELATOS DE EXPERIÊNCIA 15 Mascote Noelzinho Juliana Irene Kissmann Graduada em Pedagogia Professora do Pré B da E. M. E. F. Jardim Panorâmico | julho 2012 E 70 m meio às nossas conversas sobre a proximidade do Natal, na rodinha, a turma do Pré B pensou em ter um companheiro cotidianamente. Então, elencou em novembro de 2011 um mascote natalino. Este boneco foi confeccionado artesanalmente pela mãe da professora, que o tricotou e preencheu com fibra, para que ficasse fofinho, sendo batizado carinhosamente como o “filho do Papai Noel”, o Noelzinho. Segundo Weffort (1995), “só podemos olhar o outro, e sua história, se temos conosco mesmo uma abertura de aprendiz que se observa, se estuda, em sua própria história (...). Na ação de se perguntar sobre o que vemos é que rompemos com as insuficiências”. Junto à brincadeira, Noelzinho, nosso fiel escudeiro, passando de mão em mão foi embalado, mimado e aconchegado por entre panos. Percorreu diferentes caminhos por entre os blocos de madeira, viajando nos caminhões e carrinhos, degustou uma infinidade de pratos nos restaurantes, e neles teve que usar babador para não sujar sua bela roupa natalina, fez atividades nos grupos de trabalho, jogou memória e quebra-cabeça. Até caiu da cadeira e “chorou”, mas foi socorrido, acalentado e enfaixado, parecendo uma múmia! Reconhecemos a brincadeira quando se estabelece a conjugação do inesperado, a combinação do diverso, a articulação da disparidade. É essa possibilidade de surpreender que faz o batimento cardíaco do brincar: surpreender a mim mesmo e em primeiríssimo lugar! E surpreender ao outro por mera consequência. Para a brincadeira acontecer precisamos apenas de um olhar. (DIAS E NICOLAU, 2003, p. 41) Enquanto arrumávamos nosso galho natalino e trabalhos referentes a esta festa, fazíamos a escuta de muitas músicas natalinas, principalmente de Wilson Paim, como “Papai Noel”. Surgiu, também, como a predileta, entoada e dançada pela turminha, de braços dados com Noelzinho, “Ursinho Pimpão”. Com este breve trecho para relembrar: Vem meu ursinho querido Meu companheirinho Ursinho Pimpão Vamos sonhar aventuras [...] É ainda um verbo recíproco: legitima o outro porque a comunicação é um dos modos fundamentais de dar forma ao pensamento, e o ato comunicativo que se realiza através da escuta produz significativas e recíprocas mudanças, seguramente enriquecedoras, para os participantes dessa forma de troca. (RINALDI, apud OSTETTO, 2000, p. 194) Todas as famílias participaram e se dedicaram incansavelmente ao projeto do mascote. Den- “Hoje fomos congratulados com a presença de um rapaz muito lindo, o Noelzinho.” (Família da aluna Pietra Prieb) “Enquanto almoçávamos houve um incidente, Bob, nosso cãozinho quase abocanhou o filho do Papai Noel.” (Família do aluno Vinícius Eduardo Caruccio) “Antes de dormir, oramos ao Papai do Céu pedindo proteção a nossa família, a dos nossos colegas e a do mascote.” (Família da aluna Vitória Casagrande Pfeifer) “Olhamos bem juntinhos o jogo do Internacional e não é que ele foi pé quente! Nosso time venceu!” (Família do aluno Eduardo Rafael Sörensen) “Pedi para minha mãe e também para o Papai Noel um Noelzinho de presente, igual a esse!” (Família da aluna Vitória Caneppele Geroldi) “Estávamos ansiosos para a tão esperada chegada do mascote. E finalmente chegou!” (Família do aluno Gabriel Alceu Broering Vogel) “Poder fazer parte de uma corrente do bem foi ser presenteado com a oportunidade de deixar uma mensagem aos vizinhos, amigos e até desconhecidos deixando-nos felizes e agradecidos.” (Família da aluna Ana Clara Clauss) “Andando de carro, nós dois com o cinto de segurança, já cansados de tanto brincar, adormecemos.” (Família da aluna Ágatha de Castilhos Weber) “Eu, minha mana e Noelzinho, após a almoço, fomos tirar aquela soneca.” (Família da aluna Tayná Stefany Pereira da Costa) “Ele chegou justo no dia da faxina da minha casa, então ajudou na arrumação de meu quarto.” (Família da aluna Tauana Melissa da Silva) “Hoje foi um dos dias mais felizes do ano porque aguardávamos ansiosos essa visita.” (Família do aluno Pedro Henrique Batista) “Enfim chegou à minha casa. Agora vai nos ajudar a montar a árvore de Natal!” (Família do RELATOS DE EXPERIÊNCIA Essa companhia e a possibilidade de dar “asas” a nossa imaginação suscitaram um compartilhamento dessa magia e alegria com nossa família. E assim, ao findar de cada aula, Noelzinho e seu diário de bordo percorreram o lar de cada um de nossos colegas, ou seja, vinte e seis residências. O aguardo em levá-lo gerava uma grande expectativa até nos pais que, no portão da escola, pediam a visita do filho do Papai Noel. No dia posterior líamos o relato feito pela família, e também ouvíamos a criança contar as suas peripécias com o mascote. Era difícil a despedida e a entrega para o colega seguinte, dando mais um abraço, um beijo, um colinho... Junto ao diário de bordo, as famílias puderam também expressar, através da escrita e de imagem, o significado do Natal. Conforme o artista Oliver Sacks, “o ato de ver, de olhar, não é só olhar para o que é visível, mas olhar também para o invisível. De certa forma, é isso que quer dizer imaginação” (DIAS E NICOLAU, 2003, p. 236). Nos relatos em evidência surgiram inúmeras vivências com o filho do Papai Noel, como a premissa que dentre os símbolos natalinos essa figura causou euforia, emoção, alegria, risos, choro, companhia, cuidado, proteção, reencontro familiar, partilha nas refeições, diálogo, reflexão sobre as dádivas recebidas no ano transcorrido, afetividade, passeio, diversão e o maior de todos os desejos para si e para aos demais, o imensurável AMOR. tre muitos depoimentos registrados no diário de bordo, faço o recorte de algumas situações que geraram diversão, convivência e inúmeras aprendizagens. Alguns fragmentos: | julho 2012 co) Voar nas alturas Da imaginação... (A Turma do Balão Mági- 71 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 72 Gabriel Luis Teixeira) “Recebemos em nossa casa uma visita ilustre.” (Família do aluno Matheus Luiz Kopper) “Dia feliz, um privilégio estar em sua companhia.” (Família do aluno Vitor Hugo Costa) “Participou até do banho, sentado ao lado do box.” (Família da aluna Jenifer Camile Mota dos Santos) “Quando a mamãe chegou e viu ele foi uma alegria só!” (Família do Itor Paulo Müller) “Ele pode conhecer meus avós e fazer uma refeição em família.” (Família da aluna Mariana Breier Schilling) “Corremos com ele nos braços para mostrar ao papai.” (Família da aluna Ana Laura Ramires Schuster) “Essa visita trouxe muita diversão à minha casa.” (Família do aluno Gustavo Hermann) “Foi muito legal ensinar ele a andar de bicicleta.” (Família do aluno Matheus Augusto Teixeira) “Apresentei meu quarto ao mascote e também minha coleção de desenhos.” (Família do aluno Gean Darlei Bombardelli) “No mesmo dia: conheceu minha dinda e nosso pinheirinho.” (Família do aluno Felipe Menezes Welzbacher) “Levei ele num passeio numa outra cidade, Presidente Lucena, lá conheceu o “verdadeiro” Papai Noel.” (Família do aluno Artur Luís Hausmann Esswein) “Não aguentei mais de sono e adormeci abraçadinho nele.” (Família do aluno Henrique Matias Miotti Hanauer) “Em boa companhia, eu, meus manos e Noelzinho assistimos as aventuras do desenho animado do Pica Pau.” (Família do aluno Arthur Telesca Rocha) “Eu, minha família e o mascote percorremos vários lugares na cidade de Ivoti e muitas pessoas queriam conhecê-lo.” (Família da aluna Tainara Taís Conchy) Referências Bibliográficas: A TURMA DO BALÃO MÁGICO. Ursinho Pimpão. CD. Sony Music. DIAS, Marina Célia Moraes; NICOLAU, Marieta Lúcia Machado (orgs). Oficinas de sonho e realidade na formação do educador da infância. Campinas | Papirus, 2003. OSTETTO, Luciana Esmeralda (org.). Encontros e encantamentos na educação infantil: partilhando experiências de estágios. Campinas | Papirus, 2000. PAIM, Wilson. Natal gaúcho. CD. Usa Discos, 1996. WEFFORT, Madalena Freire. Observação, registro, reflexão: instrumentos Metodológicos I. São Paulo | Espaço Pedagógico, 1995. Juliana Petry Pós-graduada em Gestão Escolar Miriam Bonilha de Vargas Abadie Graduada em Ciências Físicas e Biológicas Rodrigo Mestriner Fernandes Graduando em Psicologia Úrsula Miotti Graduada em Psicologia E. M. E. F. Engº Ildo Meneghetti A sexualidade tem seu desenvolvimento desde o nascimento do sujeito, porém é na adolescência que ela se mostra marcante e desafiadora. O adolescente, além das muitas tarefas que tem quanto ao seu desenvolvimento integral, precisa se deparar com um corpo novo, repleto de sensações e sentimentos. Poder lidar com a sexualidade com confiança e responsabilidade é uma dessas grandes tarefas. O tema sexualidade é amplo o bastante para traduzir preocupações de todo o País, sendo atualmente um dos temas transversais que compõem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), enquanto aspecto indispensável para construção da cidadania. Presente nos espaços escolares, ultrapassa fronteiras disciplinares e de gênero, permeia conversas entre meninos e meninas e é assunto a ser abordado na sala de aula pelos diferentes especialistas da escola; é tema de capítulos de livros RELATOS DE EXPERIÊNCIA Projeto Adolescer Grupo de alunas da 8ª série durante encontro didáticos, bem como de músicas, danças e brincadeiras que animam recreios e festas. Todavia, além de estar em pauta nas diversas disciplinas escolares, foi percebida a necessidade de um espaço específico na Escola Municipal de Ensino Fundamental Engenheiro Ildo Meneghetti, como atividade extraclasse, para tratar da questão da sexualidade, de acordo com o interesse e disponibilidade dos alunos para tal. Ligar a informação, o entendimento dos aspectos biológicos, com o aspecto afetivo, emocional do desenvolvimento dessa fase, é fundamental. Os adolescentes, do 6º ano à 8ª série, foram convidados a participar de um espaço, coordenado pela professora de Ciências e pelo setor de Psicologia, destinado à discussão da sexualidade na adolescência. Desde o início deste ano letivo, semanalmente e em turno contrário, esses grupos, quatro no total, divididos por séries e gênero, reúnem-se e | julho 2012 16 73 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 74 discutem informações sobre os sistemas reprodutivos, DSTs, métodos contraceptivos, gravidez na adolescência, drogas, além de terem um espaço para falar de suas próprias experiências, sentimentos e expectativas. Trabalhamos com foco no plano de vida enquanto via para construção de um jovem e adulto com responsabilidade, autonomia e satisfação pessoal. “Entendemos que esse jovem, assim constituído, será capaz de um desenvolvimento saudável, porque será agente de escolhas, sujeito de projetos, de ações, de transformação.” (Liebesny e Ozella, 2002) Na concepção do projeto, houve um cuidado especial em oferecer aos adolescentes atividades estimulantes e atuais de aprendizagens: dinâmicas, debates, filmes, documentários, cartazes, visualização de materiais – como, por exemplo, os contraceptivos –, além de jogos didáticos específicos sobre sexualidade e adolescência. Com a mediação dos profissionais e o uso dos diversos recursos, está sendo possível facilitar o desenvolvimento de um melhor pensamento e aprendizagem dos assuntos pertinentes à adolescência. Durante os encontros, o grupo percebe e discute situações com mais clareza e maior profundidade, permitindo, assim, que, no futuro, com o conhecimento adquirido, e a articulação dos saberes, possam tomar decisões com maior propriedade. Referências Bibliográficas: LIEBESNY, B.; OZELLA S. Projeto de vida na promoção de saúde. In: Adolescência e Psicologia: concepções, práticas e reflexões críticas. Brasília | Conselho Federal de Psicologia, 2002. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais – Orientação Sexual. Brasília | MEC/SEF, 1997. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 17 Docência Compartilhada ou Bidocência – Um novo desafio! “E u... Tu... Nós... Construindo aprendizagens significativas” é o tema deste ano letivo na Escola Municipal Engº Ildo Meneghetti. Este lema busca uma maior integração e coletividade de toda a comunidade escolar, e que juntos possamos todos compartilhar estas construções. Mas qual é o conceito de compartilhar? No dicionário Aurélio (2001, p. 167), compartilhar é o mesmo que “ter ou tomar parte em, participar de, partilhar, compartir”. Esse tema está sendo visto como chave fundamental em nossa turma de 4º ano, onde há bidocência ou docência compartilhada. Uma turma composta por 24 alunos, incluindo um aluno com Síndrome de Down, o que demanda dois docentes: o professor titular e o auxiliar. Sem dúvidas, é um grande desafio para ambos os profissionais, pois partilhar ideias, preparar atividades, aplicá-las e refletir sobre a prática pedagógica em parceria não é algo fácil de fazer, principalmente quando este espaço somente é ocupado por um profissional. Cabe aqui destacar fala de Hardy e Platone (2004, p. 15-18): “ninguém ensina sozinho”. O fato de estar acompanhado de outro docente na sala de aula, não significa que o professor vá perder a sua autonomia, iniciativa e individualidade, pois em muitos momentos ele deverá dar conta, sozinho, do ensino e da aprendizagem de seus alunos. Para nós duas, a bidocência é uma experiência nova, e a cada dia aprendemos com nossos acertos e tropeços, refletindo juntas sobre as decisões tomadas, as quais precisamos definir para dar continuidade ao nosso trabalho. Claro que nossas reflexões e indagações sempre são amparadas e apoiadas pela equipe pedagógica da escola e pelo NAI, a partir da perspectiva de Titton e Fernandes (2008), onde uma pessoa sozinha pode aprender, mas o aprendizado realizado coletivamente é mais rentável. Segundo Mittler (2003), o ideal seria que o professor auxiliar pudesse trabalhar com a turma toda, enquanto o professor titular passasse por períodos de interação individual com este aluno, trabalhando assim em uma meta de um plano edu- | julho 2012 Kátia Andréa Reinheimer Magistério, Professora na E. M. E. F. Engº Ildo Meneghetti Monique Larissa Wolf Arnhold Graduanda em Pedagogia, Professora auxiliar na E. M. E. F. Engº Ildo Meneghetti 75 RELATOS DE EXPERIÊNCIA cacional individual e, então, os papéis seriam invertidos. Seguindo essa fala de Mittler, estamos oportunizando essa troca, unindo a teoria à prática. Compartilhar a docência vem a ser, então, beneficiar-se dos diferentes estilos de ensino, da colaboração entre profissionais e da utilização de alternativas de ensino. O ensino compartilhado traz muitos benefícios ao rendimento dos alunos. Esses benefícios podem estar relacionados às trocas de informações, conhecimentos e técnicas de ensino que os professores têm condições de por em prática nesta metodologia, ampliando, assim, os horizontes da aprendizagem. Quando falamos em interdisciplinaridade e multidisciplinaridade no âmbito educacional, essa metodologia de ensino compartilhado vem ao encontro de tudo que vem sendo ressaltado por alguns estudiosos da educação: interação, reciprocidade e trabalho em equipe, é a receita para alcançarmos os melhores resultados na aprendizagem de nossos alunos. | julho 2012 Referências Bibliográficas: 76 FERNANDES, Denise Armani Nery; TITTON, Maria Beatriz Pauperio. Docência Compartilhada: o desafio de compartilhar. Disponível em: http://rc-sp.forums-free.com/ docencia-compartilhada-o-desafio-de-compartilhar-t11.html . Acesso em: 20 maio 2012. FERREIRA, Marina Baird; ANJOS, Margarida dos. Mini Aurélio Século XXI Escolar: o minidicionário da língua Portuguesa. 4° ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro | Nova Fronteira, 2001. MITTLER, Peter. Educação Inclusiva: contextos sociais. Trad. Windyz Brazão Ferreira. Porto Alegre | Artmed, 2003. PLATONE, Françoise; HARDY, Marianne (org.). Ninguém ensina sozinho: responsabilidade coletiva na creche, no ensino fundamental e no ensino médio. Porto Alegre : Artmed, 2004. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 18 A agricultura de subsistência e as sementes crioulas Márcia Cristina Licodiedoff Engenheira Agrônoma – Escolas do Campo Mônica Pilger Feilstrecker Licenciada em Matemática – Escolas do Campo é um sistema de produção agrícola que visa a sobrevivência do agricultor e de sua família. É caracterizada pela utilização de recursos técnicos pouco desenvolvidos. Os instrumen- tos agrícolas mais usados são: enxada, foice e arado. Raramente são utilizados tratores ou outro tipo de máquina. A produção é baixa em comparação às grandes propriedades rurais mecanizadas. (http://www.suapesquisa.com/o_que_e/agricultura_subsistencia.htm ) O que nossas famílias – assim como a maioria das que trabalham com a agricultura de subsistência – produzem são hortaliças, arroz, feijão, batata, mandioca, milho, pipoca... As sobras da produção são vendidas ou trocadas por outros produtos que não existem na propriedade. É desta forma que as famílias proporcionam a sua autossuficiência. Segundo dados da Secretaria de Agricultura Familiar (SAF) do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros são provenientes da agricultura familiar, a saber: mandioca (83,9%); feijão (67,2%); leite de vaca (52,1%); suínos (58,5%); milho (48,6%); arroz (30,9%); café (25,5%); soja (31,6%), entre outros. (KLUTHCOUSKI, 2012) | julho 2012 N as Escolas do Campo, no componente curricular de Empreendedorismo Rural, com os alunos de 7ª e 8ª séries, estávamos estudando a forma de germinação das leguminosas e de algumas gramíneas. Surgiu então a ideia de fazermos um resgate das sementes e mudas cultivadas antigamente, as quais hoje praticamente não encontramos mais. Passamos a chamar estas de “crioulas”. Também tivemos o cuidado de saber um pouco da história da planta: quem a forneceu, de onde a pessoa conseguiu a muda, qual é o período em que deve ser plantada... A partir daí, os alunos passaram a rotular, pesquisar, registrar e armazenar os materiais, para posteriormente cultivá-los na área da escola, para com elas promovermos uma tarde de campo com a comunidade. Nas comunidades das Escolas do Campo muitas famílias ainda trabalham com a agricultura de subsistência, que 77 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 Desta forma, conseguimos atingir não só as famílias dos alunos das escolas, mas as três comunidades do campo como um todo, pois os alunos foram em busca de mudas e sementes na comunidade. Conseguimos trazer a família para dentro da escola, com os pais de alunos fazendo canteiros, auxiliando na preparação do solo e na sua drenagem. Esse trabalho permite desenvolver no aluno diferentes aspectos, os quais já começamos a instigar, e serão nossos objetivos de estudo no decorrer do ano: •Estimular o aluno a trabalhar em sua propriedade, com a família, e a produzir parte das frutas e hortaliças, bem como grãos e carnes para seu sustento; •Vender o excedente de sua produção, para contribuir com a renda familiar; •Incentivar o cultivo de uma horta e um pomar, observando os tipos de frutas e hortaliças mais adaptados a nossa região; •Conhecer formas de plantio, adubação, capina, poda e controle de pragas e doenças; •Desenvolver boas práticas de colheita e manipulação de alimentos (desde o ponto de colheita, limpeza dos alimentos e utensílios, até o ambiente a ser usado para processar os alimentos); •Realizar beneficiamento de frutas e hortaliças, visando ao aproveitamento das frutas e verduras na forma de doces, schmiers, compotas e conservas. A forma de avaliação dos alunos é a sua participação nas aulas práticas e teóricas, suas posturas e opiniões nos assuntos que estão sendo abordados. Usamos como recursos a área da escola onde se encontram o pomar e a horta, utensílios agrícolas, visitas, pesquisas na internet, a comunidade, entre outros. Referências Bibliográficas: 78 <http://www.suapesquisa.com/o_que_e/agricultura_subsistencia.htm> Acesso em: 23 maio 2012. KLUTHCOUSKI, João. Revista DBO Agrotecnologia. Abril/Maio 2012. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 19 Uma Escola com Jardim Suspenso na Cidade das Flores V ivemos em Ivoti, Cidade das Flores. Muitos são os jardins floridos que já deram à nossa cidade o título de cidade mais florida, com belos jardins – porém simples. Conforme Diogo Ricou (2009), o uso que atribuímos ao jardim é que pode torná-lo diferente e mais ou menos importante – para um biólogo ou ornitólogo um jardim pode ser uma fonte de estudo; já para um escritor ou pintor, o mesmo poderá ser uma fonte de inspiração; para outros, apenas contemplação, descanso, lazer, etc. O jardim poderá ser usado para mostrar riqueza, impressionar, ou como fonte de subsistência. Em 2011, alunos e professores da Escola Municipal Nicolau Fridolino Kunrath foram visitar a Feira das Flores e se encantaram com os jardins que viram; mas um, em especial, chamou a nossa atenção – o Jardim Suspenso, feito com caixas de verduras. Talvez tenha sido este o mais atraente, por estarmos ali com alunos da área rural, onde essas caixas servem para transportar frutas e verduras – mas lá viram que elas podem ter outro destino, e muito belo! Em 2012, iniciamos o ano planejando as atividades dos componentes curriculares da Escola Integral e a organização do jardim da Escola. Lembramo-nos daquele jardim e decidimos que iríamos colocá-lo em prática. Assim, com os alunos do turno regular da Escola Nicolau, juntamente com as turmas de 7ª e 8ª séries (nas aulas de Práticas Agroecológicas) e dos 3º ao 5° anos (nas aulas de Empreendedorismo Rural) que vêm para essa Escola nas segundas-feiras à tarde, resolvemos desenvolver essa ideia original. Inicialmente, propusemos aos alunos que tivessem caixas de verduras de madeira, e que pudessem doar, as trouxessem para a escola. Paralelamente, solicitamos para participar de uma Oficina no Centro de Educação Ambiental do Município de Ivoti (CEAMI), onde plantamos gerânios, lisimáquias e maringás. Lá tivemos uma aula prática de preparação da terra para o plantio e aprendemos a fazer a estaquia para a obtenção da muda. As mudas ficaram no local, onde as man- | julho 2012 Mônica Pilger Feilstrecker Licenciada em Matemática Roberta Konrath Schallenberger Licenciada em Pedagogia E. M. E. F. Nicolau Fridolino Kunrath 79 RELATOS DE EXPERIÊNCIA tiveram na sombrite até que estivessem próprias para o transplante. Já na Escola, as mudas foram transplantadas pelos alunos, usando o composto orgânico, ali produzido, com restos das cascas que sobravam da merenda escolar. Junto com o professor de Educação Física, prendemos as caixas na parte externa da escola, organizamos as plantas e continuaremos, no decorrer do ano, tomando os cuidados necessários, como: regar, transplantar, podar... Os jardins da nossa cidade são, ou deveriam ser, o local de encontro das crianças, e o início do aprendizado sobre a beleza e a conservação da natureza. Na nossa Escola estamos plantando a semente. Esse espaço abre a possibilidade de observar diversas formas, cores, flores, texturas, aromas, e ainda pequenos animais como borboletas, beija-flores, tucanos e demais aves atraídas ao local. Oportunizaremos a visitação deste espaço às crianças que nasceram e cresceram em grandes cidades, fazendo uso da função pedagógica do jardim como objeto de estudo de diferentes temas da sala de aula no decorrer do ano. Referências Bibliográficas: | julho 2012 LAMAR, Ramon. A importância dos jardins. Blog do Ramon Lamar, 2011. Disponível em: <http://ramonlamar. blogspot.com.br/2011/06/importancia-dos-jardins.html> . Acesso em: 22 maio 2012. 80 RICOU, Diogo. A importância do Jardim. Revista: Tudo sobre jardins, 2009. Disponível em: <http://www.portaldojardim.com/pdj/2009/03/02/a-importancia-do-jardim/>. Acesso em: 22 maio 2012. 8 maneiras de fazer um jardim vertical. Revista Natureza. Disponível em: <http://www.ciclovivo.com.br/noticia.php/3302/8_maneiras_de_fazer_um_jardim_vertical/> acesso em 22 maio 2012. Alunos preparando as mudas no CEAMI Alunos transplantando as mudas Alunas arrumando as mudas nas caixas RELATOS DE EXPERIÊNCIA 20 Competição Escolar por Outro Olhar N os últimos anos, a educação física escolar vem quebrando paradigmas. Há poucas décadas atrás, tínhamos no Brasil uma educação física escolar baseada no desenvolvimento da aptidão física para o desporto competitivo, na formação de atletas e na busca do gesto motor perfeito para as práticas desportivas tradicionais: voleibol, futebol, basquete. Para esta metodologia da educação física deu-se o nome de tecnicista. O governo brasileiro assegurou este papel da escola na Lei N° 6.251/75, que determinava os objetivos da educação física em âmbito nacional, assegurando seu caráter de aprimoramento técnico desportivo da população. Entretanto, novas correntes metodológicas, os Parâmetros Curriculares Nacionais e as novas legislações trouxeram à tona uma mudança nessa visão de desporto escolar, prevendo que o mesmo deveria desenvolver os alunos nas aptidões físicas para desporto rendimento, mas também deveria dar conta de aspectos cooperativos, sociais, integracionistas (CASTELLANI F°,1998) e de práticas desportivas diferentes das usuais, tais como esportes de aventura, danças, lutas, etc. Nesse contexto, alguns desafios se apresentam na hora de elaborar projetos e planos para essa disciplina. Uma das principais indagações, é como trabalhar a competição (caracterização do desporto de rendimento e elemento essencial na construção da personalidade do sujeito) sem que essa seja o principal foco da atividade. E, ainda, que os demais objetivos da prática (integração, união, trabalho em equipe), também fundamentais na formação do sujeito, não fiquem menosprezados. Na busca por essa integração de objetivos, organizei em duas escolas em que leciono, no município de Ivoti, um “Festival de Goleirinha”. Uma turma de cada escola participou da proposta, sendo ambas multisseriadas de 4° e 5° ano. Esse evento foi constituído por várias etapas, sendo o marco final uma competição entre times formados dentro da mesma turma, para disputa de um torneio de futebol utilizando goleiras pequenas. Primeiramente, precisávamos elaborar o regulamento do campeonato. Esse foi feito em conjunto com cada turma. Todos tiveram que re- | julho 2012 Pablo Silveira Graduado em Educação Física – Feevale Professor das Escolas do Campo e da Escola Guilhermina Mertins 81 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 82 digir uma cópia. Nesse quesito, minha intervenção foi criar critérios de pontuação para chegarmos ao campeão do festival. O importante no festival não seria ganhar o jogo, mas que mais integrantes do time fizessem gols. Um time em que 3 alunos tivessem feito gols, mesmo perdendo a partida, ganharia mais pontos do que aquele em que apenas um tivesse feito gols. O que tiraria pontos de um time seriam brigas, desrespeito com seus próprios colegas de time, com os adversários ou com o árbitro. As equipes foram formadas por sorteio e compostas por três ou quatro alunos. Outro aspecto que precisaríamos contornar era a falta de goleirinhas e de uniformes. Para tanto, os alunos confeccionaram com madeiras as duas goleirinhas, serrando, martelando, medindo e calculando. Como uniforme, todos trouxeram camisetas velhas e, juntamente com a professora titular, foi confeccionado com tinta de tecido um uniforme para cada time, com o nome do jogador e do time nas costas. Com o intuito de trabalhar a organização e a responsabilidade pelo evento que estavam criando, a arbitragem do festival foi feita pelos próprios alunos; para isso, também foi necessário que a turma aprendesse a preencher uma súmula. Além dos árbitros, os alunos foram incumbidos de escolher um câmera e um narrador. Estes tiveram a responsabilidade de gravar e narrar os jogos, de forma que fosse feito um DVD com os jogos, para que cada aluno pudesse levar a filmagem do campeonato para casa. Ao final do evento houve times vencedores e perdedores. Alguns tiveram que lidar com a frustração da derrota, e outros precisaram controlar a ânsia de vangloriar-se em excesso pela vitória. Porém, este foi apenas um aspecto de uma grande construção. O ganho em outros aspectos superou o chute ruim do futebol, o erro do gol, a marcação errada do juiz. Todos queriam e lutaram para ganhar, mas até ali já tinham ganhado conhecimento, organização, cooperação e integração. Ah... E o prêmio? O prêmio foi a possibilidade de ajudar o próximo, pois todos os alunos trouxeram algum alimento não perecível como inscrição no campeonato, e a equipe vencedora pode entregar pessoalmente estes alimentos a uma entidade carente do município de Ivoti. Referências Bibliográficas: BRASIL. Decreto N° 69.450, de1° de novembro de 1971. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D69450.htm>. Acesso em: 23 de maio de 2012. BRASIL. Lei N° 6.251, de 8 de outubro de 1975. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/ LEIS/1970-1979/L6251.htm>. Acesso em: 23 de maio de 2012. CASTELLANI F°, Lino. Política Educacional e Educação Física. Campinas | Autores Associados, 1998. MATA, Dinalba F. A Educação Física no Brasil: com uma visão transformadora na educação básica, transpirando menos e pensando mais. Lato & Senso, Belém, v. 2, n° 3, p. 30-3, julho 2001. Disponível em: <http://www.nead.unama. br/site/bibdigital/pdf/artigos_revistas/52.pdf>. Acesso em: 22 de maio de 2012. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 21 Empreendedorismo Rural: Turismo Rural Pedagógico A atividade de turismo no ambiente rural deve estar em harmonia com os seguintes interesses: da comunidade local, do turismo, e do meio ambiente. A harmonização desses elementos significa garantir a sustentabilidade da atividade através dos três elementos básicos: culturais/antrópicos, ecológicos e econômicos (ZIMMERMANN, 1998). Pensando nisso, surgiu a disciplina de Empreendedorismo Rural nas Escolas do Campo de Ivoti. Dentro de uma proposta de Educação Integral, desenvolve-se a disciplina de Empreendedorismo Rural, com alunos do 6° Ano e da 6ª Série. Ela é coordenada por dois professores, de Ciências e de Informática, e as atividades que ocorrem são interdisciplinares. Como proposta inicial, a atividade que está sendo desenvolvida denomina-se “Turismo Rural Pedagógico”. Assim, os alunos foram reunidos em grupos, e cada um criou um Roteiro Rural Pedagógico, envolvendo potenciais pontos turísticos nas localidades em que estão inseridas as escolas: Escola Nelda Julieta Schneck (Nova Vila), Escola Olavo Bilac (Picada Feijão) e Escola Nicolau Fridolino Kunrath (Picada 48 Alta). Os objetivos são: proporcionar aos educandos atividades que despertem o espírito empreendedor, para que atuem e explorem sustentavelmente os potenciais turísticos do campo; desenvolver atividades que promovam o autossustento das famílias do campo; executar projetos inovadores para o desenvolvimento sustentável no meio rural. As atividades desenvolvidas até este momento foram: levantamento dos potenciais turísticos existentes nas três localidades, criação de um Roteiro Pedagógico, construção do mapa desse roteiro; pesquisa sobre o histórico dos potenciais turísticos; passeio de estudo. Primeiramente, os alunos, reunidos em grupos, pesquisaram as potencialidades existentes. Foram citados potenciais turísticos já existentes e apareceram alguns novos, como as propriedades rurais dos próprios familiares dos alunos. Em | julho 2012 Patrícia Fries Mestre em Educação em Ciências e Matemática Janete Politowski Técnica em Informática Educativa Escolas do Campo de Ivoti 83 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 84 seguida, os alunos organizaram o roteiro observando o espaço geográfico e a sequência lógica. Organizaram as visitas aos espaços determinados, delimitando o tempo e o objetivo de cada visita. Sequencialmente, os educandos organizaram o roteiro em um mapa escrito, e posteriormente passaram para o programa KolourPaint, de acordo com as aprendizagens e sob coordenação da professora de Informática. Após, apresentaram e explicaram os roteiros para os colegas e decidiram, em grupo, qual deles seria realizado por todos os alunos. Num primeiro momento, faremos apenas o roteiro escolhido coletivamente, para posterior reflexão e avaliação, dando continuidade aos trabalhos. Logo, elaboraram a proposta de roteiro no BrOffice Impress, com imagens dos pontos a serem visitados, o histórico de cada um, aprendendo a criar os links e hiperlinks. Pretende-se tornar os Roteiros uma fonte alternativa de conhecimento, desenvolvimento e rendimento sustentável. Futuramente, viabiliza-se a ocorrência do Turismo Rural Pedagógico como uma prática pedagógica contínua nas Escolas do Campo. O Turismo Rural Pedagógico indica uma direção na busca da redução das desigualdades regionais e a expansão de desenvolvimento, com a implementação na economia local e uma melhoria na qualidade de vida, tão desejada por todos, visando ao desenvolvimento local sustentável e ao espírito empreendedor. Referência Bibliográfica: ZIMMERMANN, A. Planejamento e organização do turismo rural no Brasil. In ALMEIDA, J. A.; RIEDLY, M.; FROEHLICH, J. M. (org.). Turismo Rural e Desenvolvimento Sustentável. Santa Maria | Universidade Federal de Santa Maria, 1998. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 22 Descobrindo Formas de Escrever Introdução D esde o início do ano letivo de 2011, foi possível perceber que a turma do 5º ano da Escola Nicolau Fridolino Kunrath apresentava dificuldades na área de português, ou seja, na maneira de se expressar em sala de aula, na construção de textos, na leitura oral e na interpretação de perguntas simples relacionadas a textos lidos. Para esses alunos, era muito difícil realizar tarefas como participar de um simples jogo de “stop”. Percebi que, para eles, escrever um texto era fazer um amontoado de frases que, muitas vezes, não tinham sentido entre si. Apresentavam dificuldades em ordenar suas ideias, em descrever uma simples jogada com coerência, e o espaço destinado na folha com linhas era muito grande para ser preenchido com escritas próprias. Como o Projeto foi Construído Foi pensada uma proposta pedagógica que fizesse com que esses alunos pudessem progredir em suas construções textuais, melhorar sua leitura, perceber a escrita correta das palavras, conseguir ordenar suas ideias com mais facilidade. Como profissional da educação, não pude fechar os olhos frente às dificuldades enfrentadas pelos alunos, pois, mesmo já estando eles numa série mais avançada, ainda não havia sido possível superar algumas dificuldades. Para Jolibert (1994, p. 36), [...] não se ensina uma criança a escrever, é ela quem ensina a si mesma (com a nossa ajuda e de seus pares). Cada criança possui seu caminho próprio; é preciso que ela viva as situações de aprendizagem que lhe permitam ao mesmo tempo ter referenciais constantes e construir suas próprias competências. Objetivos •Desenvolver a expressão oral e escrita, considerando a leitura e a escrita em diferentes textos. •Empregar corretamente a pontuação na es- | julho 2012 Roberta Konrath Schallenberger Graduada em Pedagogia E. M. E. F. Nicolau Fridolino Kunrath 85 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 86 crita e na leitura. •Ler, analisar e formar a própria opinião sobre notícias de jornal. •Interpretar e construir textos com coerência. a história da Chapeuzinho Vermelho, em diversas versões: na visão do lobo, da vovó, da própria Chapeuzinho, em forma de poema, como história em quadrinhos, e o filme “Deu a louca na Chapeuzinho”. Procedimentos Conclusão A primeira atitude tomada para desenvolver mais segurança ao aluno na hora de escrever foi diminuir o número de linhas na folha e acrescentar um espaço para a ilustração. Com esse processo em desenvolvimento, foi agregado o projeto “Jornal NH na Sala de Aula”, e também a retirada, na biblioteca, de livros com conteúdo maior. Para auxiliar na ordenação das ideias, todos os jogos precisavam ser descritos por escrito para um colega. Inventamos muitos personagens e depois criamos histórias onde eles apareciam, usando como “cola” um cartaz construído na sala que mostrava os diversos passos a serem seguidos: Quem? Onde? Como? Quando? O quê? Escolhemos, para trabalhar, o livro “Casa Botão”, de Hermes Bernardo Junior, autor presente na Feira do Livro do município. A partir de sua leitura, fomos lendo e escrevendo diversos poemas, aventurando-nos nos mais variados assuntos. Durante esse período letivo, também contamos com a grande ajuda da escritora Marcia Funke Dieter, que vinha regularmente à escola contar histórias e ler poemas. Nas aulas de Informática, tivemos ajuda da professora Janete Politowski, numa pesquisa sobre as diversas raças de cães. Exploramos diversos filmes onde “eles” eram os astros, incluindo “Sempre ao seu lado”, sendo explorada a sequência didática e a reescrita da história, criando um outro final. “Apareceu” na sala uma caixa-surpresa, contendo gibis, e através deles estudamos os tipos de textos empregados nesse material, a constituição dos balões, a sequência das histórias, o tipo de pintura usada em cada personagem. Desenvolvemos algumas atividades usando O crescimento apresentado pelos alunos foi visível e podia ser notado todos os dias. No final do ano, já era possível ler textos grandes, repletos de informações. A interpretação da turma melhorou significativamente, assim como a leitura. A leitura quase diária do jornal trouxe uma nova visão de mundo para os alunos, que tinham muita dificuldade de ter acesso à informação, pois poucos tinham acesso à internet, a revistas e a bons livros. Precisamos enfrentar um dia após o outro; temos ainda uma longa caminhada, mas todo esforço dedicado a esses alunos, com certeza fará uma enorme diferença na vida de cada um. Referências Bibliográficas: JOLIBERT, Josette. Formando crianças produtoras de texto. Porto Alegre | Artmed, 1994. REVISTA NOVA ESCOLA. São Paulo | Abril, ago. 2007, n. 204. Ano XXII. São Paulo : Abril, set. 2011, n. 245. Ano XXVI. REVISTA PÁTIO – Educação Infantil. Porto Alegre | Artmed, jul/set. 2010, n. 24. Ano VII. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 23 Nossa História Produzida em Detalhes Roberta Konrath Schallenberger Graduada em Pedagogia Silvane Horst Karling Graduada em Língua Alemã e Graduanda em Licenciatura em Educação do Campo E. M. E. F. Nicolau Fridolino Kunrath Q uem sou eu? De onde vim? “São perguntas que palpitam (...) no subconsciente infantil.” (SILVA, 2008, p. 56) Muitas respostas podem ser encontradas no resgate das histórias dos antepassados, das tradições e dos costumes. O tema da identidade, a busca das próprias origens, o lugar e o modo de viver, ajudam a criança a se conhecer melhor. Justamente, indo ao encontro dessas ideias, começamos o ano de 2011 com o projeto “Sei Quem Sou e Onde Estou?” Segundo Silva (2008, p. 58), a preservação dos costumes e das tradições de fiar, tecer, coser e bordar, apreciar comidas e danças típicas, e principalmente a língua materna, são manifestações culturais que asseguram a identidade de cada indivíduo. Objetivos •Conhecer e valorizar as diferentes variações linguísticas faladas e escritas, analisando-as criticamente. •Ler, compreender, interpretar e dialogar a partir de diferentes textos, assim, estimulando a escrita. | julho 2012 Justificativa Aluna do 4º ano 87 RELATOS DE EXPERIÊNCIA •Resgatar e valorizar o patrimônio histórico, social e cultural, percebendo-se como sujeito ativo da história de sua comunidade. Juntamos a esses propósitos, a necessidade de fazer com que os alunos do 4º e do 5º anos escrevessem mais e com mais qualidade, e para isso escolhemos o gênero poesia para dar início às atividades. Durante os trabalhos deste projeto, surgiu a oportunidade de explorar o livro “Casa Botão”, de Alunos do 5º ano Hermes Bernardi Jr., uma vez que no mês de maio ocorreu a 29ª Feira do Livro de Ivoti, com a presença desse autor. | julho 2012 “Criança gosta de poesia?” 88 Desde bebê, ou talvez já muito antes, a criança escuta sua mãe cantando, dizendo versinhos, e quando entra na escola ela já traz um repertório com ela, sejam adivinhas, cantigas de roda, versinhos que ela já escutou de algum familiar: avô, avó, tio, tia, babá... Formar crianças [...] letrados é dar-lhes instrumentos para obter informações, atualizar-se, lutar por um emprego, conhecer o ponto de vista de pessoas próximas ou distantes, e ainda viver as emoções narradas pelos autores de obras literárias. (CARVALHO, 2010, p. 18) O poema chave usado foi “O buraco do tatu”, de Sergio Caparelli, que oportunizou aos alunos interagirem e criarem novos versos. Além dele, trabalhamos com poemas de outros autores, como Cecília Meireles e Mario Quintana. A forma proposta para o registro dessas cri- ações foi uma colcha de retalhos, construída para registrar tudo aquilo que foi criado pelo aluno e que fosse importante para ele. Registramos também a tradição da Páscoa, e outras tradições oriundas da imigração relacionadas aos alunos, trabalhando com músicas, versinhos em português e versinhos em alemão. “Produzir bons leitores é um desafio para a escola em todas as partes do mundo.” (CARVALHO, 2010, p. 9) Colcha Referências Bibliográficas: CARVALHO, Marlene. Guia prático do alfabetizador. 1° ed. São Paulo | Ática, 2010. BERNARDI JR., Hermes. Casa Botão. 1° ed. São Paulo | DCL, 2007. SILVA, Vera Maria Tietzmann. Literatura infantil brasileira: um guia para professores e promotores de leitura. 1° ed. Goiânia | Cânone, 2009. RELATOS DE EXPERIÊNCIA 24 Softwares Educativos JClic e Hot Potatoes: Como Auxiliam no Processo de Ensino e Aprendizagem na Educação Infantil O presente trabalho objetivou analisar como as crianças interagem com as atividades digitais proporcionadas, em especial, as realizadas através dos softwares educacionais JClic e Hot Potatoes. O foco da análise seria quanto à atratividade e ao envolvimento dos alunos, verificando como essas práticas podem, ou não, auxiliar no desenvolvimento de habilidades e na construção de novos conhecimentos e aprendizagens. Segundo Viccari (1996, p. 13), Software Educacional é um programa que visa atender necessidades e possui (ou deve possuir) objetivos pedagógicos. Todo software pode ser considerado educacional, desde que sua utilização esteja inserida num contexto e numa situação de ensino-aprendizagem, onde existe uma metodologia que oriente o processo. Porém, vale lembrar que a principal qualidade de um software educativo não é a sua caracterização, mas sim, a maneira com que ele consegue favorecer os processos de ensino e aprendizagem. Deve oportunizar ao aluno construir conhecimentos, relacionando-os com o conteúdo aplicado em sua disciplina. A turma analisada nas aulas de Informática foi a do Nível 4 da E. M. E. I. Bem Querer, em Ivoti, com crianças na faixa etária de 4 a 5 anos, e com a qual eu atuava, no ano de 2010. A observação da prática em sala de aula, com a utilização dos softwares educativos JClic e Hot Potatoes, aconteceu no Laboratório de Informática da E. M. E. F. 25 de Julho, no mesmo município. A proposta de atividades nessas práticas educativas, com a utilização dos softwares, fundamenta-se na criação de desafios (através de jogos) voltados para essa faixa etária. Muitas vezes, havia me chamado a atenção, o interesse da maioria das crianças dessa turma em participar dessas aulas, e comecei a me questionar o porquê de tanto interesse. Todos os dias perguntavam ou exclamavam: - Professora, hoje é dia de informática? - Quantos dias faltam para a aula de informática? | julho 2012 Tania Maria Gnatta Graduada em História/Unisinos Especialista em Mídias na Educação/UFRGS Professora da E. M. E. I. Bem Querer 89 RELATOS DE EXPERIÊNCIA | julho 2012 90 - Oba! Hoje tem informática! Também percebia-se a frustração deles quando, por algum motivo, não teriam aula de informática. Ouvia-se muito: ca! - Que pena, hoje não tem aula de informáti- - Quando vamos ter aula de informática de novo? - Hoje de novo não tem aula de informática? Conforme Kenski (2004), as novas tecnologias de comunicação e informação trouxeram mudanças consideráveis e positivas para a educação. Vídeos, programas educativos na televisão e no computador, sites educacionais, softwares diferenciados transformam a realidade da aula tradicional, dinamizam o espaço de ensino-aprendizagem, onde, anteriormente, predominava a lousa, o giz, o livro e a voz do professor. As aulas de informática ocorreram todas as quintas-feiras, no período da tarde, com duração de trinta minutos. A turma era composta por vinte alunos, os quais todos participavam das aulas. Muitas atividades e jogos eram desenvolvidos utilizando os softwares educacionais JClic e Hot Potatoes. Dentre as diversas atividades possíveis, cito as mais utilizadas para os alunos da Educação Infantil: jogo da memória, quebra-cabeças, encaixes, pinturas, desenhos, ligar as imagens, etc. Nessas atividades, ficou evidente o que muitos autores abordam, entre os quais Assunção (2003, apud SILVA): “os softwares infantis devem ser de forma simples, os jogos devem ser atrativos, coloridos, com movimentos, muitas figuras para envolver os alunos no processo”. Neste caso, as imagens utilizadas eram muito coloridas e interessantes para eles, e isso fez com que as crianças realizassem as atividades com determinação e entusiasmo, ou seja, divertindo-se. Analisando as aulas de informática e o envolvimento dos alunos, pudemos constatar que a interatividade da maioria dos alunos com os jogos digitais é fascinante: jogam, falam, gritam, vibram, comemoraram, trocam ideias consigo mesmos e com os colegas ao lado... Assim, através dessas trocas construtivas, vão adquirindo e construindo novos conhecimentos e aprendizagens. Na maioria das atividades apresentadas, percebia-se o interesse em começar logo e concluir a atividade com êxito. Percebemos, também, que o importante, para que essas trocas aconteçam, não é ter uma enorme quantidade de jogos e atividades digitais, e sim, ter professores que saibam selecionar, construir com seus alunos e utilizar esses recursos de forma e na faixa etária adequada, oportunizando descoberta e exploração. Os softwares JClic e Hot Potatoes, assim como outros existentes no mercado, demonstraram ser ferramentas importantes para desenvolver atividades educacionais de acordo com as faixas etárias e assuntos estudados em sala. Possibilitam também a criação de exercícios que apoiam diversas habilidades, entre elas a motora e a intelectual; aquisição de novos conhecimentos, com troca de informação entre os pares; e principalmente a interatividade entre o sujeito (aluno) e o objeto (jogo), além do relacionamento social e ajuda mútua. Os jogos desenvolvidos tiveram como objetivos principais desenvolver habilidades e aprendizagens voltadas à identificação, classificação, atenção, concentração, coordenação visomotora e levantamento de hipóteses. Além de propor jogos que desenvolvem algumas potencialidades, o uso dos softwares analisados também permite que os professores criem atividades adequadas e contextualizadas, conforme a realidade e a expectativa da turma. Dessa forma, é possível gerar trabalhos e projetos significativos, reconhecendo os softwares educativos JClic e Hot Potatoes como recursos didáticos que podem enriquecer a prática pedagógica, desde a Educação Infantil. Assim, podemos concluir que os jogos educacionais podem aumentar a possibilidade de aprendizagem em qualquer disciplina, pois os aprendizes se envolvem na trama do jogo, fazendo o possível para vencer determinados desafios. Em KENSKI, Vani Moreira. Tecnologias e ensino presencial e a distância. 4° ed. Campinas | Papirus, 2004. SILVA, Maria José L. da. Projetos: A informática na educação escolar como instrumento de inclusão e ampliação dos conhecimentos dos educandos com necessidades educativas especiais. Disponível em: <http://www.slideshare. net/ mariajoselpoes/projetos-de-informitica>. Acesso em: 18 dez 2010. VICCARI, Rosa Maria; Giraffa, L. Sistemas tutores inteligentes: abordagem tradicional X abordagem de agentes. XIII SBIA, Curitiba, 1996. Quebra-cabeça: personagens Disney (Hot Potatoes) RELATOS DE EXPERIÊNCIA Referências Bibliográficas: | julho 2012 consequência, aprendem os conteúdos inseridos no jogo e em outras atividades. Acabam levantando hipóteses na tentativa de compreender os problemas que lhes são propostos, tentando resolvê-los e obtendo êxito em cada etapa, aprendendo de forma divertida e prazerosa. Os jogos também podem estimular a autoaprendizagem, a descoberta, além de despertar a curiosidade, incorporar a fantasia e o desafio. Jogo da memória: esportes (JClic) Jogo de ligar as imagens (JClic) 91