difusão e campo elétrico na membrana celular: construção de

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difusão e campo elétrico na membrana celular: construção de
ISSN: 1677-2318
No. 01
Public. 09/04/2010
Artigo A
DIFUSÃO E CAMPO ELÉTRICO NA MEMBRANA CELULAR:
CONSTRUÇÃO DE MODELOS DIDÁTICOS FUNCIONAIS
Paulo Henrique Santos Sartori1 e Élgion Lúcio Silva Loreto2
1. Doutorando do PPG em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde, Universidade Federal de
Santa Maria. Endereço para contato: Departamento de Química. Prédio 18, sala 2425, CEP: 97105900 – Santa Maria/RS/Brasil. E-mail: [email protected]
2. Departamento de Biologia, PPG em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde,
Universidade Federal de Santa Maria. Endereço para contato: Prédio 16 B2, CEP: 97105-900 – Santa
Maria/RS/Brasil. E-mail: [email protected]
Resumo:
Propõe-se a construção de alguns dispositivos simples que poderão ser usados na
investigação do fluxo de íons através de uma membrana explorando a influência dos
fenômenos da difusão e do campo elétrico. Este modelo permite simular e visualizar
processos eletroquímicos que ocorrem na membrana celular e explorar, por meio de
atividades sugeridas, os principais elementos e variáveis envolvidos. Espera-se, assim,
promover uma maior interação com a teoria, bem como, contribuir para uma melhor
compreensão dos fenômenos de transportes passivo e ativo.
Palavras-chave: Membrana celular; difusão; campo elétrico; modelo funcional.
Abstract:
This study proposes some simple devices that can be used in the investigation of the flow
of ions through a membrane exploring the influence of the diffusion and electric field
phenomena. This functional model allows to simulate and visualize electrochemical
processes that happen in the cellular membrane, as also to explore the main elements and
variables involved in it, by means of suggested activities. These activities aim to promote a
larger interaction with the theory, while contributing for a better understanding of the
passive and active transports.
Keywords: Cellular membrane; diffusion; electric field; functional model.
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INTRODUÇÃO
Inúmeros estímulos provenientes do ambiente nos atingem e, mediados pelos
sentidos, produzem respostas específicas. Por exemplo, estímulos físicos tais como a luz
(onda eletromagnética cujos fótons desencadeiam o mecanismo da visão) e o som (onda
mecânica que promove o processo da audição); estímulos químicos (moléculas que ativam
o olfato e o paladar) atingem células especializadas que interagem cada qual com um
estímulo específico transformando-os em impulsos elétricos. Tais impulsos correspondem a
informações codificadas que regularão ações correspondentes.
Na base destes fenômenos de interface entre o mundo biológico e o físico, e também
de toda a fisiologia neuro-motora, está a capacidade, ou melhor, a potencialidade de
determinadas células, mais especificamente de suas membranas envoltórias, alterarem seu
estado de equilíbrio eletrostático (chamado de potencial de repouso) para um estado
dinâmico (chamado potencial de ação) de passagem de íons, que gera e propaga o impulso
elétrico. Em resumo, tudo depende do fluxo de íons através da membrana celular.
Uma das questões mais intrigantes a respeito do estudo do transporte de
substâncias, moléculas e íons através da membrana celular é o fato de que, em alguns
casos, tais elementos fluem entre os meios intra e extracelular de maneira direta e, em
outros, há necessidade de consumir energia para que o processo ocorra. Seres humanos e
animais despendem uma grande quantidade de energia metabólica (cerca de 20% da taxa
metabólica basal) para manter o excesso de íons nos lados externo e interno da superfície
celular e as diferenças entre as concentrações iônicas dentro e fora da célula [1].
O que difere estas circunstâncias depende basicamente de alguns fatores como:
tamanho da molécula ou íon, concentração destes dentro e fora da célula, temperatura,
seletividade (permeabilidade) da membrana. Mas a questão básica é: por que, em certos
casos, a célula tem que “pagar” com energia de ATPs (adenosina trifosfato) para fazer
pequenos íons, que facilmente atravessam a membrana, passarem de um lado para outro?
Vejamos inicialmente as relações entre estas variáveis e os principais elementos e
fenômenos envolvidos e, posteriormente, simular algumas situações para melhor
compreensão desta questão.
MÉTODOS
1. Composição e Estrutura da Membrana Celular
A membrana celular (citoplasmática) é constituída por um mosaico de moléculas
protéicas incrustadas em uma bicamada de fosfolipídios de consistência fluídica (Figura 1).
Esse modelo da membrana, conhecido como mosaico fluido, apresenta moléculas com uma
cabeça polar (hidrofílica) e caudas apolares (hidrofóbicas) - os fosfolipídios. Na presença de
água, estas moléculas se organizam espontaneamente de modo que os componentes
hidrofóbicos voltam-se para dentro da bicamada (caudas) e os hidrofílicos para a água
(cabeça). Vários tipos de proteínas, com as mais diversificadas propriedades funcionais,
estão espalhados na bicamada fosfolipídica. Todas as membranas compartilham entre si,
propriedades fundamentais, mas de acordo com o tipo de célula, possuirá atividades
biológicas específicas [2].
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Figura 1 – Micrografia eletrônica da membrana celular (de uma hemácia humana)
vista em corte transversal (a). Representação tridimensional da membrana celular (b).
Estrutura molecular espacial de um fosfolipídio (c) onde, geralmente, a cabeça é formada por
colina, fosfato e glicerol e as caudas, por ácidos graxos. Adaptado de Daniel S. Friend,
extraído de [3].
A membrana celular funciona como uma espécie de barreira semipermeável entre os
meios intra e extracelular que atua seletivamente, permitindo que moléculas e íons
essenciais, tais como glicose, aminoácidos, lipídios, K+, Na+ e Ca2+, penetrem na célula,
que compostos metabólicos permaneçam no seu interior e, também, que o produto tóxico
do metabolismo seja expelido [4].
2. Potencial Elétrico, Concentração Iônica e Campo Elétrico
Dispondo de um milivoltímetro (instrumento que mede a diferença de potencial
elétrico entre dois pontos) suficientemente sensível, ao se colocar seus microeletrodos na
solução extracelular que banha a célula, não se detecta nenhuma mudança no valor
medido pelo dispositivo quando os eletrodos são deslocados ao longo da solução. Da
mesma forma isto ocorrerá no interior da célula. Íons contidos nas soluções intra e
extracelulares – sódio (Na+), potássio (K+), cloro (Cl-), cálcio (Ca2+) – movem-se
livremente através delas, conferindo-lhes pequena resistência elétrica e tornando-as boas
condutoras [5].
Quando um eletrodo é colocado dentro da célula e outro do lado de fora, verifica-se
que há uma queda na diferença de potencial elétrico (ddp) de, aproximadamente, 60 a 70
mV em média (Figura 2). Como a única “coisa” que separa os dois meios é a membrana,
conclui-se que este potencial é devido à membrana que por ser fixo para cada tipo de
célula, é denominado potencial de repouso da membrana celular. Na maioria das células
este valor permanece inalterado, desde que não sofra influências externas. Diferentes
células apresentam valores constantes e característicos. Células de fibras nervosas e
musculares de animais de sangue quente apresentam valores entre -55 mV e -100 mV;
enquanto as de músculos lisos, entre -30 mV e -55 mV [1-5].
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Figura 2 – Esquema do procedimento de medição, por meio de um milivoltímetro, da
diferença de potencial da membrana celular, cuja espessura média é em torno de 8,0 nm.
O interior da célula é cerca de 60 mV menor quando comparado com o meio
extracelular [6]. Importa esclarecer que não existem potenciais negativos ou mesmo, que
o aparelho utilizado na medição indique valor com sinal negativo. Este sinal indica que a
diferença de potencial entre os meios externo e interno da célula (que corresponde a sua
membrana) está 60 mV abaixo de um valor tido como referência.
A diferença de potencial através da fina membrana de bicamada lipídica com
proteínas embutidas que envolve todas as células depende das concentrações iônicas em
cada lado desta membrana e de sua permeabilidade para esses íons [5]. Como exemplo, a
Tabela 1 traz dados a respeito das concentrações de alguns íons em um particular tipo de
célula. O somatório das ddp de todos os íons corresponde à ddp da membrana da célula.
Tabela 1 - Concentração de alguns íons dentro e fora de um neurônio de mamífero; suas
proporções dentro e fora da célula e seus respectivos potenciais de equilíbrio (equivalente a ddp
para cada íon).
Íon
K+
Na+
ClCa2+
A-
Concentração (mmol/L)
Meio
Meio
Extracelula Intracelular
r
5
150
150
15
125
9
2
0,0001
108
Proporção
Fora :
Dentro
1:30
10:1
14:1
20000:1
-
Potencial de
Equilíbrio (mV)
- 86
+ 58
- 66
~ + 250
Não aplicável
Os potenciais de equilíbrio foram calculados à temperatura ambiente de 20 °C. Estes
valores poderão aumentar 6% se a temperatura for a do corpo humano (37 °C). Arepresenta ânions orgânicos impermeáveis à membrana, principalmente proteínas,
aminoácidos e íons fosfato. Devido estes ânions não atravessarem a membrana, eles não
têm um potencial de equilíbrio. Baseado em Hille (1992), Ganong (1997) e Matthews
(1991), apud [5].
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Para melhor entender os processos elétricos que ocorrem na membrana celular,
fazemos uso de modelos e analogias com outros sistemas já bem estudados e que podem
contribuir para um bom entendimento dos fenômenos envolvidos.
Um dos modelos sugere a comparação da membrana celular com um capacitor, um
dispositivo há muito tempo utilizado em circuitos elétricos que, basicamente, serve para
armazenar cargas elétricas. É formado por um material isolante (dielétrico) que separa dois
meios condutores. Na célula encontramos uma estrutura de configuração similar: duas
soluções condutoras estão separadas por uma delgada camada isolante – a membrana
(Figuras 3-a-b-c). Membranas biológicas apresentam capacitâncias da ordem de picofarads
(1 pF = 10-12 F); praticamente a mesma de um simples capacitor comumente usado em
um típico circuito elétrico de rádio [1-6].
Figura 3 – Representações da distribuição do excesso de íons - cátions (+) e ânions (-) em torno da membrana celular. Visão geral da célula (a). Detalhes ampliados da membrana,
denotando a bicamada lipídica (b) e os canais protéicos (c). Analogia entre o modelo
biológico (b) e o físico (d): a distribuição de cargas faz surgir um campo elétrico invisível E;
as setas indicam a direção e o sentido deste campo.
Como os fluidos dentro e fora da célula são sempre neutros, isto é, a concentração
de ânions em qualquer local é sempre igual à de cátions, não pode haver um acúmulo local
de cargas elétricas nesses fluidos. Então, em torno da membrana celular, as cargas
elétricas em excesso se distribuem, ficando a superfície interna da membrana recoberta
pelo excesso de ânions e a externa, pelo mesmo excesso de cátions, dando origem a uma
pequena ddp (o potencial de membrana) que pode ser mensurada como foi visto na Figura
2. Além disso, importa salientar, que esta configuração faz surgir um campo elétrico na
membrana (Figuras 3-b-d) que é responsável pelas forças elétricas que atuaram sobre os
íons que tentarem atravessá-la [1].
Graças à membrana celular, são mantidas as diferenças de composição entre as
soluções intra e extracelular. Porém, a membrana não é completamente impermeável a
íons. Se isso fosse o caso, a ddp pela membrana seria zero. Existem passagens pela
membrana conhecidas por canais iônicos, formadas por proteínas (Figura 3-c). A célula
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pode controlar a passagem de íons através de sua membrana regulando a atividade dos
canais, os quais podem ser seletivos para determinados íons [1-5].
3. O Jogo das Forças que atuam sobre os Íons
Quando duas placas planas paralelas próximas estiverem carregadas eletricamente,
cada uma com a mesma carga, porém de sinais contrários, na região do espaço entre elas
forma-se um campo elétrico. Devido à intensidade deste campo ser constante em qualquer
ponto entre as placas, diz-se que o campo é uniforme. Tal campo é capaz de exercer uma
força elétrica sobre partículas eletricamente carregadas como prótons, elétrons e íons. A
similitude entre o modelo físico (capacitor de placas paralelas) e o biológico (membrana) é
representada na Figura 4.
Figura 4 – Representação de um capacitor de placas planas paralelas (a) com
indicação do sentido das forças elétricas F que atuam sobre partículas com cargas positiva e
negativa. Representação da membrana celular como análogo biológico do capacitor (b)
indicando a força elétrica FE que atuaria sobre uma partícula de peso P positivamente
carregada. O sentido do campo elétrico E está grafado na seta sobre cada desenho.
O sentido do campo elétrico é, por convenção, sempre da placa positiva para a
negativa. Uma partícula positivamente carregada situada num campo elétrico uniforme
tende a mover-se, pela ação da força elétrica, na direção do campo, enquanto que uma
carga elétrica negativa tende a deslocar-se no sentido contrário, como mostra a Figura 4-a
[7].
Por exemplo, supondo que um cátion monovalente, como o íon Na+ (que possui
carga elétrica líquida igual à carga de um próton, ou seja, +1,60 x 10-19 C), fique situado
na membrana celular (Figura 4-b). Ele ficará sujeito a uma força elétrica FE cuja
intensidade é igual ao produto do campo elétrico na membrana E pela sua carga e a
direção e sentido será da parte externa da membrana para a interna (“empurrando” o íon
para dentro da célula). Se fosse um ânion monovalente, a força elétrica teria a mesma
intensidade, porém, atuaria no sentido contrário (“expulsando” o íon da célula). Em geral
esta força elétrica é muito maior que o peso P destes íons (Figura 4-b) e atua como uma
das forças que tenderá a movê-lo.
A outra força de relevante influência é a força de difusão, uma força de arraste
devida à agitação térmica (Figura 5). Toda a substância, íon ou molécula que esta mais
concentrada em uma determinada região tende a difundir-se (deslocar-se) para regiões
onde se encontra menos concentrada, tentando atingir um equilíbrio; ou seja, o fluxo
ocorre contra o chamado gradiente de concentração (que vai da menor concentração para
a maior concentração). Em termos gerais, este fluxo depende muito da natureza, da
temperatura e da viscosidade do fluido onde ele está ocorrendo. Depende também, de
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propriedades das próprias moléculas, substâncias ou íons que estão se difundindo.
Moléculas de grandes massas ou dimensões difundem-se menos quando comparadas as de
pequenas massas ou menores [1].
Figura 5 – O íon sódio encontra-se mais concentrado fora da célula do que dentro,
enquanto que o íon potássio está mais concentrado no interior da célula. Considerando
apenas o efeito difusivo, a tendência é que o Na+ entre na célula e que o K+ saia.
A resultante das forças que atuam sobre o íon definirá o sentido de seu
deslocamento: para dentro ou para fora da célula.
4. Transporte Transmembrana
Didaticamente costuma-se dividir o transporte de moléculas e íons através da
membrana celular, tendo como critério o envolvimento ou não de energia, em dois tipos.
Quando tais elementos fluem de um lado para outro da célula sem necessidade de usar
energia chamamos de transporte passivo; a difusão e a osmose são exemplos dessa
categoria. Havendo gasto de energia, denominamos transporte ativo, como ocorre no
processo conhecido por bomba de sódio e potássio [8].
O transporte ativo ainda pode ser subdividido em primário (com gasto de energia em
forma de ATP) e secundário (onde o transporte de uma substância depende do transporte
de uma segunda) [9]. Trataremos aqui apenas do primeiro tipo.
No transporte ativo primário existem estruturas capazes de transportar o soluto para
dentro da célula – são as chamadas proteínas carreadoras – que se ligam a substâncias
específicas e as transferem através da membrana, sofrendo mudanças em sua
conformação e expondo seu sítio de ligação. A ativação dessas proteínas se dá pela
degradação por hidrólise da ligação covalente da adenosina trifosfato (ATP) ou de algum
outro composto fosfatado de alta energia, utilizando a energia liberada [9].
Na membrana de todas as células de um organismo, encontram-se milhares de
bombas de sódio e potássio (ou sódio-potássio-adenosina-trifosfatase). Cada uma delas é
capaz de levar três íons sódio para fora da célula (contra a força difusiva e contra a
ação do campo elétrico) ao mesmo tempo em que traz dois íons potássio para dentro
(contra a força difusiva e a favor da ação do campo elétrico). Possuem fundamental
papel biológico pois, além de manterem as concentrações de K+ e Na+ constantes,
conservam o pH e regulam a osmolaridade impedindo que a célula se rompa. Porém, suas
atividades consomem cerca de 1/3 da energia celular, chegando a 2/3 em células nervosas
[1-9].
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O funcionamento simplificado de uma bomba de sódio e potássio pode ser descrito
da seguinte forma: três íons Na+ ligam-se em seus sítios correspondentes; a face
citoplasmática da bomba é fosforilada por ATP e isso induz a uma mudança conformacional
da proteína transferindo os íons Na+ para a face exterior. Ao atravessar a membrana, os
íons Na+ combinam-se com moléculas transportadoras formando um complexo
eletricamente neutro. Desta forma, nenhuma carga elétrica percorre a membrana,
anulando a ação do campo elétrico, economizando energia. Logo depois, dois íons K+
ligam-se nos sítios da proteína na face extracelular e a desfosforilação do lado interno faz
com que a proteína volte a ter sua conformação inicial e transfira os íons K+ para dentro da
célula, também via acoplamento com moléculas transportadoras que formam um complexo
eletricamente neutro [1-9].
5. Modelos Didáticos Funcionais da Membrana Celular
Sugerimos algumas montagens que poderão ser feitas a partir da disponibilidade de
material e familiaridade que melhor aprouver ao leitor. Alguns projetos requerem maior
habilidade e/ou técnica na montagem, bem como o uso de ferramentas mais
especializadas.
As dimensões e especificações técnicas de cada material listado correspondem às
dos materiais utilizados pelos autores os quais poderão ser substituídos ou adaptados por
similares.
5.1) Modelo Básico
Consiste de uma pequena caixa plástica retangular com eletrodos e um sistema de
encaixe e vedação para uma membrana divisória.
Figura 6 – Cuba de acrílico como divisória em formato de “U” e dois eletrodos em cada
compartimento (a). Disposição do sistema de encaixe e vedação composto por uma placa
acrílica e borrachas de EVA (b).
Material:
- Caixa plástica retangular de 8,0 x 6,0 x 4,0 cm (ou tamanho aproximado);
- Pedaço de borracha de Etil Vinil Acetato (EVA) com 2,0 mm de espessura e 11,6 x 8,0 cm
(suficiente para fazer 2 retângulos de 5,8 x 4,0 cm);
- Dois retalhos de acrílico de 5,9 x 4,0 cm; um com 5,0 mm de espessura e outro com 2,0
mm.
- Fio de aço inox para aparelho ortodôntico de 0,70 mm de diâmetro e 17,0 cm de
comprimento;
− Adesivo epóxi.
Montagem:
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Na parte central da caixa cola-se a placa de acrílico mais grossa que deve ser
previamente recortada em forma de “U” retirando um retângulo de 3,5 cm de comprimento
e 3,0 cm de altura. Cortar as borrachas de EVA e a placa de acrílico mais fina, do mesmo
tamanho e formato. Fazer pequenos orifícios nas laterais da caixa para atravessar os fios
de aço de modo que esses fiquem paralelos a divisória central e aproximadamente no meio
dos compartimentos. Vedar muito bem os orifícios com adesivo epóxi para evitar
vazamentos.
5.2) Modelo Comparativo
Composto por uma caixa plástica com dois compartimentos separados, cada qual
com um eletrodo e sistema de encaixe e vedação para membrana divisória. Permite o
acompanhamento simultâneo de duas situações distintas.
Figura 7 – Disposição dos elementos do modelo comparativo: fios de aço que
servirão como eletrodos e sistema de encaixe e vedação junto às duas divisórias da
caixa plástica que foram recortadas em formato de “U”.
Material:
- Caixa plástica (tipo porta-trecos ou organizador) com 5 compartimentos e tamanho 15,5
x 8,5 x 3,3 cm;
- Pedaço de borracha de Etil Vinil Acetato (EVA) com 2,0 mm de espessura e 10,0 x 6,6 cm
(suficiente para fazer 4 retângulos de 5,0 x 3,3 cm);
- Fio de aço inox para aparelho ortodôntico de 0,70 mm de diâmetro e 34,0 cm de
comprimento;
− Pistola elétrica com bastão de silicone
Montagem:
Recortar um retângulo de 3,0 cm (base) por 2,0 cm (altura) de cada parede divisória
de dois compartimentos vizinhos da caixa (Figura 7).
Cortar o fio de aço inox ao meio e moldá-los de maneira que fiquem no formato da
Figura 8-a, para que se encaixem nos compartimentos da caixa conforme mostra a Figura
7. Durante a execução das atividades, convém colar com silicone quente as regiões onde o
fio se apoia no topo das paredes divisórias para que fiquem firmes em suas posições.
Recortar em forma de “U” os quatro retalhos de EVA, retirando um retângulo de 3,0
cm (base) por 2,0 cm (altura) (Figura 8-c). Aproveitar a própria tampa da caixa para fazer
duas plaquinhas do mesmo formato e tamanho (Figura 8-b).
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Figura 8 – Componentes do modelo comparativo: fios de aço moldados de forma a se
encaixar no espaço entre os compartimentos da caixa plástica (a); placa de plástico (b) e
borracha de EVA (c) em formato de “U”.
6. Atividades.
Recomenda-se extrema cautela no manuseio dos equipamentos energizados.
Assegurar-se de que as providências necessárias para evitar riscos de choques elétricos.
Seguir todas as normas de segurança no manejo de produtos químicos.
Material:
- Fonte de alimentação de corrente contínua de 18 V. Pode ser um pequeno transformador
em que se pode comutar a voltagem (também conhecido como adaptador ou fonte
universal). Geralmente só fornece até 12 V (valor nominal) mas na prática a saída é em
torno de 18 V (valor real). Isso pode ser confirmado medindo-se com o multímetro. Para
obter os resultados mais rapidamente aconselha-se voltagens maiores. Utilizamos uma
ponte de diodos retificadora para transformar a tensão da rede doméstica de 127 V de
corrente alternada em corrente contínua;
- Fios para conexões elétricas;
- Duas garras tipo jacaré (opcionais);
- Papel celofane para assar;
- Prendedores de roupa preferencialmente de plástico com boa abertura;
- Soluções de Corantes: azul de metileno, corante vermelho para bolo e violeta de
genciana (violeta cristal);
- Solução fisiológica de cloreto de sódio 0,9% (ou uma pitada de sal de cozinha dissolvida
em um copo d’água);
- Solução alcoólica de fenolftaleína (ou dissolver um comprimido de lacto-purga em 20 ml
de álcool etílico 95º GL);
Para a realização das atividades sugeridas a seguir, o procedimento básico consiste
em recortar pequenos retângulos de celofane, do mesmo tamanho da borracha de EVA,
fazendo um “sanduíche”: borracha/celofane/borracha. Com auxílio da placa de plástico ou
acrílico e dos prendedores, apertar este sanduíche junto à parede das divisórias em “U”.
Certificar-se de que a vedação entre os compartimentos está adequada enchendo apenas
um lado e verificando se ocorre ou não infiltração para o outro lado. Em seguida, preencher
os compartimentos com as soluções sugeridas em cada atividade, conectar os eletrodos
aos pólos positivo e negativo da fonte e, por último, ligá-la.
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6.1) Visualização dos fenômenos por meio de substâncias coloridas.
Vamos empregar alguns corantes que em meio aquoso se dissociam formando íons
que migram em direção ao eletrodo positivo ou negativo, conforme o esquema:
Azul de Metileno: (+) ---> (-)
Violeta de Genciana: (+) ---> (-)
Corante Vermelho para bolo: (-) ---> (+)
6.1.1) Difusão Simples
Nesta situação não se faz uso da fonte de corrente contínua, apenas de uma solução
de um dos corantes a escolher. Esta deverá ser colocada em um dos compartimentos do
modelo básico e o outro, preenchido com água até que fiquem no mesmo nível. Após
algumas horas (ou de um dia para o outro) – dependendo da diferença de concentração,
temperatura ambiente, etc – observa-se que o corante começa a migrar, através do
celofane (que representa a membrana) do lugar onde está mais concentrado para onde
está menos concentrado, ou seja, o fluxo do íon (corante) se dá contra o gradiente de
concentração.
6.1.2) Difusão versus Campo Elétrico
Estabelecer, no modelo comparativo, as conexões elétricas dispondo os eletrodos,
por exemplo, de modo que o eletrodo positivo fique no lado direito (compartimentos 2 e 4)
e o eletrodo negativo, no lado esquerdo (compartimentos 1 e 3), como mostrado na Figura
9. Os compartimentos 1 e 4 são preenchidos com a solução de violeta genciana diluída e os
compartimentos 2 e 3 com a solução concentrada. A tendência devido à diferença de
concentração é que ocorra difusão no sentido indicado pelas setas na Figura 9-a. Porém a
ação do campo elétrico (sentido do eletrodo positivo para o negativo) tende a carrear o
corante para o eletrodo negativo. Após 5 minutos (Figura 9-b) observa-se que os
compartimentos 2 e 4 começam a clarear, ficando praticamente transparente ao final de 15
minutos (Figura 9-c) indicando a migração dos corantes para o lado esquerdo. Entre os
compartimentos 1 e 2 isso ocorre contra o gradiente de concentração (as forças difusiva e
elétrica agem no mesmo sentido), enquanto que nos compartimentos 3 e 4, ocorre a favor
do gradiente de concentração (as forças difusiva e elétrica atuam em sentidos contrários).
Figura 9 – Distribuição da solução de violeta de genciana nos compartimentos.
Distribuição inicial (a), onde as setas indicam a tendência do sentido de migração do corante.
Situação após 5 minutos (b). Situação após 15 minutos (c).
6.1.3) Fluxo de Íons em Sentidos Opostos
O compartimento 1 do modelo básico é preenchido com solução de corante
vermelho para bolo e o compartimento 2 com solução de azul de metileno. As
conexões elétricas foram dispostas de tal modo que o eletrodo negativo fique no lado
esquerdo e o positivo no lado direito, como mostra a Figura 10. A ação do campo
elétrico estabelecido forçará o carreamento de cada um dos íons (corantes) para o
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lado oposto. Nesta situação, forças difusivas e elétricas trabalham juntas, reforçando
o fluxo dos íons de um compartimento para outro através da membrana.
Figura 10 – Situação inicial da distribuição dos corantes e eletrodos no modelo básico (a).
Diferentes estágios da migração dos corantes após ligar a fonte de alimentação (b – c – d).
Sugere-se, ainda, outras variações destas atividades, tais como:
- misturar dois íons diferentes (representados pelos corantes) em um dos compartimentos
e verificar a migração de cada um;
- estabelecer um fluxo forçado, colocando em um dos compartimentos uma solução de
corada previamente aquecido (maior agitação molecular afetará sua difusão). Pode-se
alternar a polaridade dos eletrodos e verificar o que ocorre em cada situação.
6.2) Visualização dos fenômenos por meio de indicadores.
Numa solução aquosa do cloreto de sódio estão presentes os íons Na+ e Cl-,
resultantes da dissociação iônica e, há também, cátions H+ e ânions OH- provenientes da
auto-ionização da água, de modo que haverá uma disputa pela descarga nos eletrodos.
Como este fenômeno depende diretamente do potencial de oxidação dos íons envolvidos,
observa-se que:
- no eletrodo positivo, entre os ânions Cl- e OH-, se descarrega em primeiro lugar aquele
que apresenta maior potencial de oxidação, neste caso, o Cl-;
- no eletrodo negativo, entre os cátions Na+ e H+, se descarrega em primeiro lugar aquele
que apresenta menor potencial de oxidação, neste caso, o H+;
No experimento aqui proposto, isto produzirá gás hidrogênio no eletrodo negativo e
gás cloro no eletrodo positivo. Os íons que “aguardam” para se descarregarem, também
poderão atravessar a membrana e interagir com outros íons. Por exemplo, o íon Na+
acabará se juntando ao OH- e isto produzirá hidróxido de sódio - uma base cuja presença é
facilmente detectável pela fenolftaleína [10].
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Usando o modelo comparativo, coloca-se, conforme disposição da Figura 11, o
eletrodo positivo no lado esquerdo (compartimentos 1 e 3) e o negativo no lado direito
(compartimentos 2 e 4). Os compartimentos 2 e 3 são preenchidos com a solução
fisiológica de cloreto de sódio 0,9% (ou uma pitada de sal de cozinha dissolvida em um
copo d’água). Nos compartimentos restantes (1 e 4) coloca-se água. Pingar uma gota de
solução alcoólica de fenolftaleína em cada compartimento.
Devido à presença de inúmeros cátions e ânions diferentes nas soluções deste
experimento, poderão ocorrer diversas reações químicas, muitas delas dirigidas pela ação
do campo elétrico e pela competição de deposição dos íons nos eletrodos. Focalizaremos
apenas uma que evidencia o propósito desta atividade.
Para atender ao objetivo de demonstrar que ocorre mesmo o fluxo do íon sódio (por
ação do campo elétrico e da difusão) através da membrana, a fenolftaleína tornará
“visível”, no lugar onde “só havia água” (íons H+ e OH-), que ele atravessou a membrana e
juntou-se ao íon OH-, conforme esquematizado na Figura 11-a (compartimentos 3 e 4) e
verificado na Figura 11-b (compartimento 4).
Figura 11 – Configuração inicial da distribuição das soluções, água e eletrodos no
modelo comparativo (a). Após ligar a fonte de alimentação (b), a mudança na coloração
indicará a reação do cátion Na+ com o ânion OH-.
O compartimento 3 (Figura 11) também apresentará (em menor intensidade e
duração) mudança na coloração, característica do indicador de presença de uma base,
devido a presença “residual” do íon sódio.
7. Considerações Finais
A manutenção da diferença de concentração iônica dentro e fora da célula e
fundamental para evitar a perda da capacidade funcional da mesma, visto que não poderia
mais, por exemplo, gerar os impulsos elétricos. É por isso que a célula promove o
deslocamento de íons de um lado para outro da membrana, mesmo contra forças de
oposição. Isso justifica a necessidade de energia para promover o fluxo de pequenos íons
que facilmente atravessariam a membrana.
Sartori, P.H.S. & Loreto, E.L
No.01/2010
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Figura 12 – Esquema do gasto energético que seria necessário para fazer um mol de
íons sódio sair da célula. No total, 14.531 J. Baseado em [6].
Para cada mol de íon sódio que sair da célula é necessário vencer duas forças
contrárias: uma devido à difusão e outra, à ação do campo elétrico. O trabalho necessário
para fazer isso equivale a 14,5 kJ. Porém, graças ao acoplamento entre os íons e as
moléculas transportadoras ser eletricamente neutro, o transporte através da membrana
ocorre sem a influência do campo elétrico, o que diminui o gasto de energia necessário.
REFRÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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A15
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Contra Transporte, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis:
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[10] A. Sardella, E. Mateus (1986) Curso de Química: Físico-Química, vol. 2, Ática, São
Paulo.
Edição semestral, publicada pela Sociedade Brasileira de Bioquímica e Biologia Molecular (SBBq), disponibilizada a todos os interessados no site
http://www.sbbq.org.br/revista, com artigos e materiais didáticos, softwares e outros assuntos.
Editores: Bayardo B. Torres, Eduardo Galembeck - Fone: (19) 3521-6138 Fax: (19) 3521-6129

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