Pseudomonas aeruginosa: Um alerta aos profissionais de saúde
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Pseudomonas aeruginosa: Um alerta aos profissionais de saúde
Rev Panam Infectol 2010;12(2):44-50. ARTÍCULO DE REVISIÓN/ARTIGO DE REVISÃO Pseudomonas aeruginosa: Um alerta aos profissionais de saúde Pseudomonas aeruginosa: An alert to the professionals of health Helder Ferreira1 Eliane Raquel Peres Lala2 Mestre em Análises Clínicas - Bacteriologia Médica. Professor de Microbiologia. Grupo de Pesquisa em Saúde Coletiva. Departamento de Enfermagem da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Foz do Iguaçu, PR, Brasil. 2 Mestre em Ciências da Saúde - Professora de Bioestatística, Vinculada à Pós-Graduação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Foz do Iguaçu, PR, Brasil. 1 Rev Panam Infectol 2010;12(2):44-50. Conflicto de intereses: ninguno Recibido en 30/3/2009. Aceptado para publicación en 13/1/2010. 44 Resumo Pseudomonas aeruginosa é a principal causa de infecções hospitalares entre os bacilos Gram-negativos não-fermentadores de glicose, acometendo principalmente pacientes imunossuprimidos. No ambiente hospitalar, as fontes de maior contaminação são os aparelhos de respiração, sistemas de hemodiálise, pias e artefatos de limpeza. A colonização de pacientes hospitalizados pode exceder a 50%, principalmente em pacientes internados em UTIs, que facilmente são colonizados devido a constante exposição a procedimentos invasivos. Em pacientes com ventilação mecânica, 75% das pneumonias são causadas por bactérias Gram-negativas, e entre elas, P. aeruginosa é a primeira causa. Outras infecções hospitalares frequentemente causadas por P. aeruginosa são as do trato urinário, peritonites em pacientes submetidos a diálise peritoneal, bacteremias e infecções de cirurgias. As bacteremias e as septicemias ocorrem principalmente em pacientes com neoplasias, renais crônicos, diabéticos e com distúrbios cardiopulmonares, resultando em alta taxa de mortalidade, que chega a 61%. A relevância de P. aeruginosa como um patógeno hospitalar também está associada em sua relativa resistência aos antibióticos e à suscetibilidade diminuída aos antissépticos e desinfetantes. A prevenção e o controle da colonização e da infecção por P. aeruginosa exige o uso prudente de antimicrobianos, adesão definitiva dos profissionais de saúde às práticas de higiene das mãos, precauções criteriosas com amostras multirresistentes e adesão às técnicas de limpeza do ambiente e dos equipamentos médicos e hospitalares. Por ser a P. aeruginosa um micro-organismo causador de inúmeros casos de infecção hospitalar, optou-se por um trabalho de revisão, chamando a atenção para tal micro-organismo. Palavras-chave: Pseudomonas aeruginosa, infecção hospitalar, revisão. Abstract Pseudomonas aeruginosa is the main cause of hospital infections among the Gram negative bacilli no glucose fermentor, mainly attacking immunocompromised patient. In the hospital atmosphere, the sources of larger contamination are the respi- Ferreira H, Peres Lala ER • Pseudomonas aeruginosa: Um alerta aos profissionais de saúde ratory equipments, hemodialysis systems, sinks and cleaning workmanships. The hospitalized patients’ colonization, can exceed to 50%, mainly in patients hospitalized in intensive care units that are colonized due to the constant exhibition to invasive procedures. In patients with mechanical ventilation, 75% of the pneumonias are caused by Gram negative bacterias, and among them, P. aeruginosa is the first cause. Other hospital infections frequently caused by P. aeruginosa are those of urinary tract, peritonites in patients submitted to the dialysis peritoneal, bacteremias and surgery infections, in patients with neoplasias, renal chronic, diabetics and with Cardiopulmonary disorder resulting in high mortality that arrives to 61%. The relevancy of P. aeruginosa as hospital pathogens is also associated with its relative resistance to the antibiotics and the low susceptibility to the antiseptic and disinfecting. The prevention and the control of colonization and infection by P. aeruginosa demands the careful use of antimicrobial, compliance of health professionals with hand hygiene practices, discerning precautions with multirresistents samples and adhesion to the techniques of atmosphere and of the hospital medical equipments cleaning. P. aeruginosa as a microorganism cause of countless cases of hospital infections it opted for a work review, calling the attention of such a microorganism. Key words: Pseudomonas aeruginosa, hospital infections, review. Introdução Características gerais Pseudomonas aeruginosa é um importante patógeno humano que está frequentemente associado a infecções hospitalares, acometendo, principalmente, pacientes imunossuprimidos. Esta espécie bacteriana tem sido considerada um patógeno oportunista, uma vez que, raramente, está associada a infecções comunitárias em indivíduos imunocompetentes.(1) Pseudomonas aeruginosa pertence à família Pseudomonadaceae e apresenta-se na forma de bastonetes de 0,5 a 0,8 µm de largura por 1,5 a 3,0 µm de comprimento. É um bacilo Gram-negativo, aeróbio, não-esporulado, não-fermentador de glicose e móvel devido à presença de um flagelo polar.(2) As células de P. aeruginosa podem ser visualizadas ao microscópio como isoladas, aos pares ou em cadeias curtas.(3) O primeiro relato destes micro-organismos foi realizado por Luke, em 1862, com observação de pus de cor azul esverdeada presente em algumas infecções purulentas.(1) Essa mesma coloração havia sido relatada por outros pesquisadores e, devido a este fato, inicialmente foi chamada Bacillus pyocyaneus. Esta coloração pode realmente ser verificada em quadros infecciosos quando P. aeruginosa é o agente etiológico, pois esta espécie produz com maior frequência os pigmentos piocianina, de cor azul, e pioverdina (fluorescente), que dá a cor verde brilhante característica desta espécie. Além desses pigmentos, algumas amostras produzem outros pigmentos hidrossolúveis, como a piorrubina de cor avermelhada e a piomelanina, de cor marrom e preto.(4,5) P. aeruginosa é uma bactéria relativamente fácil de ser reconhecida em cultura, levando-se em consideração as características de suas colônias, a formação de pigmento e seu odor típico. Suas colônias têm variação morfológica, podendo ser puntiforme, gelatinosa, rugosa ou mucosa.(6) A forma mucoide ocorre devido à produção de grandes quantidades de um polissacarídeo extracelular, o alginato, identificada em amostras clínicas de portadores de fibrose cística.(7) Cepas mucoides formam agregados de colônias mais firmes, que superam os mecanismos de defesa e que permitem maior aderência a superfícies celulares. A composição física e química (polianiônica) da membrana externa deste micro-organismo demonstra poder de barreira à passagem de substâncias, como antibióticos e antissépticos, que precisam saturar toda a sua superfície antes da penetração, conferindo maior resistência a essas cepas.(8) A bactéria P. aeruginosa é invasiva e toxigênica. Além de sua estrutura externa e componentes da superfície celular, produz metabólitos extracelulares (elastases, proteases), que estão envolvidos na patogênese das infecções.(3) P. aeruginosa pode colonizar vários tecidos, devido principalmente à presença de fímbria e à cápsula mucoide (alginato). A cápsula possibilita aderência à superfície da mucosa normal, é antifagocitária e permite também a formação de microcolônias, denominadas biofilme, que são fortemente aderidas e recobertas por um material espesso, constituído pelo próprio alginato, lipopolissacarídeo (LPS) e proteína.(9) Em sua maioria, os biofilmes estão presentes em próteses vasculares, articulares, cateteres, drenos e nos pulmões de indivíduos acometidos por fibrose cística.(10) Em relação à invasão tecidual por P. aeruginosa, fosfatase alcalina, exoenzima S, citotoxina, elastase, exotoxina A, lipase e fosfolipase são os principais produtos extracelulares que estão relacionados a esse processo. P. aeruginosa pode ser isolada de água, plantas, solo e tecidos animais e tem habilidade de utilizar vários substratos orgânicos como fontes de carboidrato. Esta capacidade de sobreviver em diferentes ambientes a torna uma bactéria ubíqua.(3) Sua presença na água do solo contribui para que chegue aos vegetais e até ao intestino humano. Por ter predileção por locais úmi- 45 Rev Panam Infectol 2010;12(2):44-50. dos, P. aeruginosa é encontrada com maior facilidade em áreas do corpo humano como orofaringe, axilas, períneo e mucosa nasal, sendo o trato gastrointestinal sua principal área de colonização. Infecções causadas por Pseudomonas aeruginosa Segundo Carmeli et al.,(11) P. aeruginosa é a principal causa de infecções hospitalares entre os bacilos Gram-negativos não-fermentadores de glicose. No ambiente hospitalar, as fontes de maior contaminação são os aparelhos de respiração, sistemas de hemodiálise, pias e artefatos de limpeza. A taxa de colonização por P. aeruginosa na mucosa e pele de pacientes hospitalizados em uso de antibióticos de amplo espectro, tratamento quimioterápico ou que utilizam mecanismo artificial de respiração pode exceder 50%.(5) A relevância de P. aeruginosa como um patógeno hospitalar também está associada em sua relativa resistência aos antibióticos e a suscetibilidade diminuída aos antissépticos e desinfetantes.(6) Em um estudo multicêntrico, Andrade et al.(12) demonstraram que, em 21 hospitais brasileiros, cerca de 15 a 35% das amostras eram resistentes a todos os antimicrobianos disponíveis comercialmente em nosso país. As infecções causadas por P. aeruginosa variam desde lesões superficiais na pele até septicemias fulminantes.(2) Relatos de redução da suscetibilidade da P. aeruginosa aos antimicrobianos vêm sendo publicados no Brasil e em outros países, destacando-se a diminuição de sensibilidade aos antibióticos de maior espectro de ação, como os carbapenêmicos e as cefalosporinas antipseudomonas, que são as principais opções terapêuticas.(12,13) As infecções por P. aeruginosa adquiridas na comunidade são raras e normalmente tendem a ser localizadas e podem ser associadas com água contaminada, resultando em foliculites e otites.(2) No hospital, infecções por P. aeruginosa, estão associadas principalmente a pacientes internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Esses pacientes são facilmente colonizados devido à constante exposição a procedimentos invasivos, como uso de cateteres, sondas, instrumentos e aparelhos auxiliares para ventilação mecânica. Em processos de infecção crônica, como o caso daqueles ocorridos em pacientes hospitalizados ou da comunidade portadores de fibrose cística, esta bactéria apresenta-se normalmente na forma de fenótipo mucoide, o que favorece a sua aderência ao epitélio do trato respiratório. Em pacientes com ventilação mecânica, 75% das pneumonias são causadas por bactérias Gramnegativas, e entre elas, P. aeruginosa é a primeira causa.(6) Entre as infecções hospitalares, a pneumonia hospitalar é uma das mais importantes causas de 46 óbito. Dados de estudos multicêntricos mostram que a pneumonia é a infecção mais frequente nas UTIs da Europa, e a segunda infecção mais frequente nos hospitais americanos; as taxas de mortalidade chegam a 60%.(14-16) Outras infecções hospitalares frequentemente causadas por P. aeruginosa são as do trato urinário, peritonites em pacientes submetidos a diálise peritoneal, bacteremias e infecções de cirurgias. As bacteremias e as septicemias, principalmente em pacientes com neoplasias, renais crônicos, diabéticos e com distúrbios cardiopulmonares, resultam em alta taxa de mortalidade, que chega a 61%.(2,6) As infecções do trato urinário são capazes de provocar lesões necróticas e infartos.(6) A disseminação desta bactéria é facilitada pela sua natureza ubíqua.(2,17) A prevenção e o controle da colonização e da infecção por P. aeruginosa exigem o uso prudente de antimicrobianos, adesão definitiva dos profissionais de saúde às práticas da higiene das mãos, precauções criteriosas com amostras multirresistentes e adesão às técnicas de limpeza do ambiente e dos equipamentos médicos e hospitalares.(18) Resistência de P. aeruginosa aos antimicrobianos A resistência bacteriana aos agentes antimicrobianos pode ser intrínseca ou adquirida. A resistência intrínseca é uma propriedade natural da célula bacteriana e comumente se manifesta pela diminuição da captação dos agentes ou pela produção de enzimas que inativam o agente químico. A resistência adquirida pode ser obtida pela bactéria por meio de mutações ou por processos de recombinação gênica.(19,20) As infecções por P. aeruginosa adquiridas em hospitais são marcadas por uma forte característica: a multirresistência.(21) A maioria das amostras resistentes é isolada nas UTIs, o que reflete o maior uso de antimicrobianos nesse ambiente e possivelmente a transmissão de cepas multirresistentes entre os pacientes.(22) Esses dados podem ser confirmados através do relatório anual do sistema National Nosocomial Infections Surveillance (NNIS) de 2004, que relata a resistência a ciprofloxacina, imipenem, ceftazidima e piperacilina 1,5 a 3 vezes maior em amostras isoladas de pacientes internados em UTIs do que nas amostras de pacientes internados em enfermarias e ambulatórios. O Sentry Antimicrobial Surveillance Program (SENTRY), sistema de vigilância que monitora a resistência a antimicrobianos em várias regiões do mundo, revela que as maiores taxas de resistência, para todos os antimicrobianos, são encontradas na América Latina, seguida pela Ásia para os b-lactâmicos e pela Europa para as quinolonas.(23) Ferreira H, Peres Lala ER • Pseudomonas aeruginosa: Um alerta aos profissionais de saúde A membrana externa das bactérias Gram-negativas, assim como outras membranas biológicas, é fundamentalmente formada por uma bicamada lipídica, que apresenta pouca permeabilidade a solutos hidrolíticos, como os nutrientes. A penetração e a expulsão de compostos ocorrem por meio de canais proteicos de difusão inespecíficos, denominados porinas. Esses canais de difusão foram detectados em todas as espécies de bactérias Gram-negativas.(24) Além das porinas, são partes constituintes das membranas bacterianas outros canais de difusão constituídos por proteínas triméricas, chamadas bombas de efluxo. A bomba de efluxo é o mecanismo desenvolvido pela bactéria para expelir compostos tóxicos de seu interior, incluindo-se os agentes antibacterianos. Alterações nestes canais poderão dificultar a entrada de antibióticos. Ambos os sistemas podem atuar em conjunto, fato muito comum em amostras de P. aeruginosa, potencializando suas ações, tornando a bactéria com resistência plena a alguns antibióticos.(25-27) Entre os mecanismos envolvidos na resistência intrínseca de P. aeruginosa destacam-se: 1. A produção de b-lactamases induzíveis do tipo AmpC, codificadas por genes cromossômicos que são responsáveis pela resistência a b-lactâmicos como cefalotina e ampicilina;(28) 2. Os sistemas de efluxo, os quais removem principalmente fluoroquinolonas e macrolídeos, além de corantes e detergentes;(29) 3. A baixa permeabilidade da membrana externa; ou a ausência de porinas de alta permeabilidade, resultando na diminuição da sensibilidade a vários antimicrobianos, como por exemplo os carbapenéns;(30) 4. A produção de enzimas inativadoras de aminoglicosídeos.(31) Vários antibióticos, como algumas penicilinas, cefalosporinas, carbapenéns, monobactâmicos, aminoglicosídeos, fluoroquinolonas, além das polimixinas, conseguem vencer os mecanismos inerentes a estas bactérias e podem ser ativos contra muitas amostras. Entretanto, os processos de mutação ou aquisição de novos genes podem levar à resistência a estes antimicrobianos. A mutação pode ocorrer de maneira natural, levando à seleção de micro-organismos mais resistentes e em P. aeruginosa estes processos ocorrem em maior velocidade, chegando a um mutante para cada 10.000 novas Unidades Formadoras de Colônias (UFC), e o que normalmente ocorre nas outras espécies é um mutante para cada 109 UFC. Este fato favorece o processo adaptativo de amostras pertencentes a esta espécie. Um exemplo importante em relação ao processo de resistência mediada por mutações é a resistência de P. aeruginosa às quinolonas. Por meio de mutações sequenciais no genes gyrA e parC estas amostras alteram as topoisomerases, sítio de ação das quinolonas, e poderão tornar-se resistentes tanto às fluoroquinolonas como às 8 metoxiquinolonas, dificultando a terapêutica por esta classe de droga tão importante.(28,32) Dentre os processos de recombinação gênica, o principal exemplo para P. aeruginosa é a resistência aos carbapenêmicos, resultando na maioria das vezes na produção de enzimas do tipo metalo-b-lactamase que, de modo geral, são codificadas por elementos móveis, possibilitando a sua transferência para outras espécies bacterianas.(28,32) Amostras clínicas de P. aeruginosa resistentes aos carbapenêmicos têm sido detectadas em várias partes do mundo e é urgente o seu controle, pois os carbapenens são as drogas de escolha para o tratamento das infecções causadas por essa espécie bacteriana.(22,28,32,33) Para estas amostras, apesar de mais tóxicas, as polimixinas têm sido utilizadas. No Brasil, P. aeruginosa apresenta taxas de resistência aos carbapenêmicos bastante elevadas, chegando a até 61,2% em alguns hospitais.(34) Também existem relatos de isolamento de amostras de P. aeruginosa suscetível apenas a polimixina.(34) Suscetibilidade de Pseudomonas aeruginosa a biocidas Biocida é um termo amplo adotado para aqueles agentes químicos que inativam micro-organismos. Neste grupo de compostos químicos estão incluídos os antissépticos, os desinfetantes e os conservantes. Os biocidas são amplamente utilizados em hospitais e em outros setores da área de saúde como parte de programas de controle de infecção. Em particular, esses agentes são essenciais nos processos de prevenção e controle das infecções hospitalares. O uso contínuo de biocidas produz um processo seletivo, principalmente em ambiente hospitalar e induz o aparecimento de micro-organismos resistentes. Desse modo, a falta de padronização e o uso inadequado desses agentes pode dificultar tanto o controle da disseminação quanto a erradicação dos patógenos hospitalares.(35) Como na resistência a antibióticos, a resistência a biocidas pode ser intrínseca ou adquirida.(36) Na bactéria, seja antibiótico ou biocida, os mecanismos de resistência são similares, como a modificação ou inativação do antimicrobiano, diminuição da permeabilidade celular e bomba de efluxo, mas a resistência intrínseca para o biocida está associada a uma enzima de degradação, sendo comumente ligada à permeabilidade bacteriana, e a resistência adquirida é mediada por plasmídeos.(37) Um estudo realizado no Rio de Janeiro por Guimarães et al.,(38) com a finalidade de avaliar a atividade bactericida de alguns desinfetantes contra bactérias 47 Rev Panam Infectol 2010;12(2):44-50. suscetíveis e resistentes a antibióticos isoladas em hospital, demonstrou que 52% dos patógenos resistentes a antibióticos eram resistentes a quaternário de amônio. Entre as amostras estudadas, 38% apresentaram resistência a compostos fenólicos e 3 cepas Gram-negativas (P. aeruginosa, Enterobacter cloacae e Proteus mirabilis) foram resistentes a ambos os desinfetantes. Um estudo recente, realizado com amostras clínicas de P. aeruginosa multirresistentes isoladas em hospitais brasileiros, demonstrou que 43% das cepas apresentavam redução da suscetibilidade a um desinfetante quaternário de amônio (hipoclorito de potássio) comumente empregado nos setores de saúde.(39) Atualmente, uma grande variedade de biocidas está disponível comercialmente para ser utilizada como antisséptico, desinfetante ou ambos. Entre esses produtos, a clorexidina tem sido amplamente utilizada no ambiente hospitalar e em serviços de odontologia. A clorexidina é provavelmente o biocida mais utilizado como antisséptico, principalmente em procedimentos de controle da microbiota das mãos e da cavidade oral. Também é utilizada, em menor escala, como desinfetante e conservante. Este agente atua primariamente na membrana da célula bacteriana, causando extravasamento de material intracelular, além de inibir a atividade respiratória e coagular o material citoplasmático. As bactérias Gram-negativas são menos suscetíveis a clorexidina do que as Gram-positivas, em particular P. aeruginosa, que são intrinsecamente resistentes por inibir o acesso da clorexidina através da membrana externa da parede celular.(20) A clorexidina, um biguanídeo composto com propriedades catiônicas, caracteriza-se pela capacidade de destruir os micro-organismos por contato, é de baixa toxicidade e tem efeito residual.(40) É uma molécula estável, disponível nas formas de sais de gluconato, digluconato ou acetato. O digluconato de clorexidina é a forma mais indicada, pois tem maior solubilidade em água. A clorexidina é o componente ativo mais efetivo contido nos enxaguatórios bucais utilizados para prevenir a placa dentária e a gengivite. Quando ingerida é excretada pelas vias normais, sendo que a pequena porcentagem retida no organismo não é tóxica.(41) A ação da clorexidina é ampla, abrangendo bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, leveduras, dermatófitos e alguns vírus polifílicos.(42) Stickler et al.(43) relataram resistência a esse biocida e a cinco antibióticos em bactérias Gram-negativas isoladas de infecções de trato urinário. Diante desses resultados, os autores sugerem que o uso difundido de clorexidina seria responsável por selecionar cepas resistentes a antibiótico. Um outro estudo(44) demonstrou a re- 48 sistência a clorexidina em 84,2% das amostras de P. aeruginosa isoladas de lesões, em concentração de 0,05%. Estudo realizado por Russell et al.,(19) com cepas de Pseudomonas stulzeri, demonstrou o desenvolvimento de resistência após exposição deste micro-organismo a concentrações crescentes de clorexidina. O tratamento local com esse antimicrobiano tem se apresentado efetivo na prevenção de infecções do trato urinário, respiratório, redução de infecções maternas e neonatais durante o parto e decréscimo de mortalidade por sepse intra-abdominal experimental.(45,46) Bondar e colaboradores,(46) com a intenção de verificar a eficácia da clorexidina como agente redutor de infecção abdominal, provocaram infecção abdominal em ratos, utilizando o modelo de ligadura e punção cecal. Cateteres intra-abdominais foram instalados nos animais para a realização do lavado peritoneal no pós-operatório. Além do grupo controle, um grupo de animais foi tratado com cefoxidina e outro com Ringer lactato. Observou-se que a lavagem de clorexidina resultou em uma redução de 50% na mortalidade e em uma diminuição significativa na contagem bacteriana em comparação com o grupo controle, indicando que o lavado peritoneal no pós-operatório com clorexidina a 0,05% pode ser útil no tratamento de infecção intra-abdominal. Pedersen e colegas(47) observaram que a clorexidina auxilia na redução de infecções maternas e neonatais durante o parto. Realizaram uma pesquisa com o objetivo de verificar se a ducha vaginal com clorexidina reduzia a transmissão vertical de micro-organismos vaginal. Em uma investigação prévia isolaram bactérias em 78% das mulheres durante o parto, levando a transmissão vertical em 43% dos recém-nascidos. Aplicando a ducha vaginal de clorexidina a 0,2% reduziu-se a taxa de transmissão vertical em 35%; concomitantemente, foram observadas menor infecção do trato urinário materno e uma redução da morbidade infecciosa precoce nos recém-nascidos, demonstrando que a ducha vaginal com clorexidina a 0,2% durante o parto pode reduzir significativamente a morbidade infecciosa materna e neonatal. A pneumonia associada à ventilação mecânica (PAVM) é uma infecção frequente nas unidades de terapia intensiva (UTI), e antissépticos bucais são utilizados preventivamente. Beraldo e Andrade(48) revisaram ensaios clínicos randomizados indexados no Medical Literature Analysis and Retrieval System e Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature sobre o uso tópico da clorexidina na prevenção da pneumonia associada à ventilação mecânica; dos artigos revisados, em sete (87,5%) a clorexidina diminuiu a colonização da orofaringe, e em quatro (50%) houve redução de Ferreira H, Peres Lala ER • Pseudomonas aeruginosa: Um alerta aos profissionais de saúde PAVM. A clorexidina parece diminuir a colonização, podendo reduzir a incidência da PAVM. Sem dúvida, o uso clínico dos antimicrobianos exerce papel fundamental na resistência e provavelmente é a principal causa da resistência, sobretudo a observada em hospitais, onde o uso destas drogas é maior. Atualmente, se discutem, inclusive, as possíveis ligações entre o uso de substâncias catiônicas biocidas, tais como clorexidina, e a seleção de bactérias resistentes a antimicrobianos.(20) Estudos de Chapman(49) alertam que o seu trabalho com resistência a antibióticos e a biocidas indica que não há agente químico antimicrobiano que não possa, eventualmente, induzir resistência nos micro-organismos. Essas observações aumentam a necessidade de saber manejar o risco do desenvolvimento de resistências, assim como responder rapidamente a sua eventual ocorrência. Conclusão O texto indica taxas bastante elevadas de P. aeruginosa resistentes a múltiplos fármacos, dificuldades nas opções de fármacos para tratamentos combinados e a necessidade de vigilância individualizada do perfil de resistência em cada instituição. Destacam-se a necessidade de adesão definitiva dos profissionais de saúde às práticas da higiene das mãos, precauções criteriosas com amostras multirresistentes e adesão às técnicas de limpeza do ambiente e dos equipamentos médicos e hospitalares, assim como o uso prudente de antimicrobianos. Essas informações devem auxiliar na adoção de políticas concretas de utilização racional dos antimicrobianos, de redução da disseminação das cepas resistentes nas instituições e principalmente na mudança de condutas profissionais. Referências 1. Lyczak JB, Cannon CL, Pier GB. Establishment of Pseudomonas aeruginosa infection: lessons from a versatile opportunist. Microbes and Infection 2000;2:1051-1060. 2. Kiska DL, Gillian PH. Pseudomonas. In: Manual of Clinical Microbiology. Murray PR, Baron EJ, Pfaller MA, Jorgensen JH, Yolken RH. 8ª ed. Manual of Clinical Microbiology. American Society for Clinical Microbiology, Washington DC. 3. Pollack M. Pseudomonas aeruginosa. In: Mandell D. 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