Irmãos gêmeos: iguais em quê?

Transcrição

Irmãos gêmeos: iguais em quê?
COMPORTAMENTO
Irmãos gêmeos:
iguais em quê?
É
difícil diferenciar as irmãs
Elena e Eloise Riegel, 14. Elas são
gêmeas – univitelinas, o que
quer dizer idênticas. “Eu tenho uma
pintinha na sobrancelha, e a Eloise
tem o nariz mais empinadinho.
Temos uma colega que, para saber
quem é quem, coloca a mão no nosso
nariz”, diz Elena. Ser gêmea é assim
mesmo: você é você por causa de uma
pintinha, de uma tonalidade do
cabelo mais clara ou mais escura
(pelo menos à primeira vista...).
O Fábio e o Fabiano Vier, 16, não
são gêmeos idênticos. O Fábio é
moreno, e o Fabiano é loiro.
Os parentes e amigos agradecem.
“Somos totalmente diferentes”, se
apressa em dizer o Fabiano. Ok, eles
são mesmo – o que só aumenta a
surpresa das pessoas que os
conhecem como gêmeos. “Ficam
comparando quem é o mais forte.
Não entendem como um é loiro e o
outro é moreno”, diz Fabiano. Como
se vê, em qualquer situação, nascer
junto com outra pessoa é muito
curioso (para os outros, claro,
porque quem tem gêmeo não
consegue se imaginar sem).
Mesmos amigos e gostos
A Jocélia Natargiacomo, 15, nunca
imaginou sua vida sem a Gislaine, sua
irmã gêmea. “Parece que falta uma
coisa”, diz ela. “É complicado isso,
passamos a ser muito depedentes
uma da outra, mas, por enquanto, isso
ainda não está incomodando.” Como a
Elena e a Eloise, a Jocélia e a Gislaine
fazem praticamente os mesmos
programas, estudam na mesma
escola, na mesma sala e têm os
mesmos amigos. Não raro, quando
uma não quer ir a um lugar, a outra
desiste. Tanto a Elena quanto a
Eloise usam aparelho nos dentes.
E especificamente a Jo e a Gis tocam
na mesma banda e o mesmo
instrumento. Sem falar que, quando o
assunto é guri, o gosto também é
parecido. A saída? Revezamento
(não do mesmo, mas da vez).
Já o Fábio e o Fabiano são mais
independentes. Embora tenham os
mesmos amigos, nem sempre fazem
programas juntos, nem estudam na
Estigmas que dão a maior confusão
Minha história não é diferente.
Entendo quando o pessoal diz que é
legal ter um irmão ou uma irmã
gêmea. Tenho uma. Sim, é verdade
mesma sala. “Eu saio na sexta, ele sai
que temos sempre companhia. Sim, é
no sábado. Se ele sai na sexta, eu saio
verdade que a gente desenvolve uma
no sábado. Quase nunca a gente sai
ligação forte, meio cósmica, sei lá. E é
junto. E, quando estamos nos
verdade que a gente se
mesmos lugares, quase
diverte com a
EX DO GUGA
não nos falamos.
admiração dos
A ex-namorada do
outros (todo
Não que não sejamos
campeão
Guga,
Vanessa
mundo acha
amigos. Somos
Shultz,
participará
de
um
chat
legal, mesmo
muito amigos”, diz
no iG Papo. Depois de posar para quando é o caso
Fabiano. Rola até
o site Morango e para a revista
de irmãs
competiçãozinha,
Playboy, ela responde a
bivitelinas, como
no futebol, na
perguntas dos usuários do iG,
é o meu – ou
na próxima terça-feira, às
paquera. “Um quer
ainda
“mais” neste
17h30min. O endereço:
ser melhor do que o
caso, do tipo: como
www.ig.com.br
outro”, conta Fábio.
podem ser gêmeas se
“Se um fica com uma guria
são tão diferentes?). Irmão
e o outro não, este diz que a
gêmeo é curtição, sim, mas há
guria é feia”, exemplifica Fabiano.
um outro lado sobre o qual só me dei
conta há pouco tempo. Ter uma
Comparações e diferenças
pessoa que em tese deve ser igual a
você ou viver sempre, de certa forma,
As diferenças entre essas duplas de
condicionada social ou familiarmente
gêmeos acabam por aí. No mais, tudo
a outra pessoa se choca demais com
igual. Todos se acostumaram a
a ânsia de ser diferente, característica
ganhar o mesmo presente de
aniversário, a ouvir comparações
(“Com os guris, é pior: teu irmão é tão
legal, você tão chato”, lembra Fábio), a
Uma das tarefas essenciais da
atender chamados por um nome que
adolescência é estruturar a identidade.
não é o seu e a responder pelo
Isso leva tempo, implica crescimento, o
ausência do irmão, caso cheguem
que dói, implica perdas. Em gêmeos, o
sozinhos a algum lugar. “Quando
tempo dos dois pode não ser o
querem falar com uma e não sabem
mesmo. É neste momento que eles
qual das duas, chamam-nos por
conseguem construir uma identidade
Maninha. Nós duas olhamos e então
diferente do irmão. A família, a escola,
percebemos com quem querem falar”,
a sociedade devem ajudar, permitindo
conta Gislaine. É típico de gêmeos
que cada um ocupe um espaço
também acentuar as diferenças, por
diferenciado, cuidando os
mais bobas que sejam. “Eu adoro
comentários comparativos (seu irmão
lasanha, o Fabiano prefere massas.
está conseguindo isso, você não).
Minha mãe tem que alternar, sempre
Os adolescentes não suportam ser
dá briga”, conta Fábio.
confundidos (mesmo os que não são
Loraine Luz
gêmeos). Eles se esforçam para ser
inerente da adolescência. Você já
pensou sob este ângulo? Você nunca
é só a Fulana. Você é a Fulana-irmãda-Sicrana. E vice-versa. Você nunca
tem uma festa de aniversário só sua...
(Já fui convidada para a festa
surpresa de aniversário da minha
irmã. Pô, era minha também: foi-se a
surpresa...) Você nunca tem um tipo
de presente só seu (que parente se
arrisca a dar coisas diferentes para
gêmeos?). Confundem o seu nome e
você se acostuma a atender a um
chamado pelo nome que não é o seu.
E chegar a um lugar sozinha, então?
Fatalmente alguém pergunta: cadê
sua irmã? Além disso, você cresce
convivendo com a comparação, o
que eu considero mais perigoso,
porque a gente acaba alimentando
estigmas que necessariamente não
são características genuínas: essa é
mais alta, aquela mais baixinha; essa
mais magra, aquela mais gordinha;
essa mais estudiosa, aquela mais
festeira. E por aí vai. E se a quietinha
quiser ser alegre? E se a alegre quiser
se deprimir um pouquinho? Dá a
maior confusão. (Loraine Luz)
Não aceite apelidos depreciativos
diferentes. É comum os gêmeos
buscarem desde a infância posições
antagônicas: o quieto e o barulhento,
o brabo e o alegre, o esportista e o
intelectual. O que acontece muitas
vezes é a construção de estigma.
É difícil ser pai de gêmeos, mais ainda
de univitelinos. Temos que fazer um
esforço para desde cedo não
comparar, não estigmatizar e ajudar
a criar identidades próprias – e não
aceitar que as pessoas de fora os
diferenciem por sinais depreciativos
ou por apelidos.
Magda Outeiral, psicóloga e mãe de
gêmeos
Sexta-feira, 16 de junho de 2000
Zerou 5