ICPP Brazil Without Poverty Plan and the Family Grant Program

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ICPP Brazil Without Poverty Plan and the Family Grant Program
II International Conference on Public Policy -­‐ ICPP Brazil Without Poverty Plan and
the Family Grant Program Carolina Raquel Duarte de Mello Justo (UFSCar)• [email protected] 1.a Versão em português, não revisada Milão/Itália 01 a 04 de julho de 2015 •
Mestre em Ciência Política e Doutora em Ciências Sociais pelo IFCH/UNICAMP, professora adjunta do Abstract: This paper analyses the ways by which the Brazilian Social Protection System has been able of evaluating, stimulating, coordinating and institutionalizing descentralized policies -­‐ from the federal level to the local one -­‐, through two linked strategies or tools of management, evaluation and implementation of a set of policies linked to the so-­‐called Brazil Without Poverty Plan and the Family Grant Program : the single register and the Decentralized Management Index . Through the comparison of the results obtained by various municipalities for this index, the article analyzes what are the political and institutional factors responsible for local and federal differentiation of results and suggests which individual and collective actors have influence on them. Resumo: O artigo compara um conjunto de municípios do estado de São Paulo, selecionados pelo seu porte, em termos da evolução dos resultados obtidos por eles quanto à gestão descentralizada do Programa Bolsa Família, medida através do Índice de Gestão Descentralizada (IGD), que é calculado pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), no período de 2005 a 2014. O objetivo foi o de buscar evidências da influência da gestão local sobre o desempenho deste índice ao longo do tempo. Teriam os partidos políticos atuações diferenciadas quanto à gestão local do Bolsa Família conforme sua posição frente ao governo federal -­‐ de aliança ou oposição? Haveria um boicote ao sucesso do programa por parte das gestões municipais de oposição ao governo federal? Haveria maior cooperação das gestões municipais de partidos aliados ao governo federal visando ao sucesso do programa? Ou favorecimento de tais municípios por parte do governo federal? Ou, ainda, teria o Programa obtido consolidação institucional ao longo do tempo, através de mecanismos de estímulo, que teriam barrado a influência dos partidos, e favorecido ações inovadoras da gestão local, estas passando, então, a serem as responsáveis majoritárias pela diferenciação de desempenho do IGD entre os municípios? A análise dos dados, utilizando o software estatístico SPSS, tende a corroborar esta última hipótese e sugere a replicação da pesquisa, bem como a investigação de quais são estes fatores inovadores da gestão local do Bolsa Família. No caso do estado de São Paulo, verificou-­‐se que, no início do período estudado, havia um pequena tendência a que os municípios governados pela oposição ao governo federal, dentre os estudados, tivessem um menor número de cadastros e de famílias beneficiadas pelo Bolsa Família, sugerindo um possível boicote. No entanto, esta tendência se desfaz ao longo dos anos, sugerindo consolidação institucional do programa. No entanto, como os dados apresentados também não mostram uma tendência geral para o conjunto de municípios, seja de aumento ou diminuição das coberturas locais – pelo contrário, há grande variação da sequência histórica da Taxa de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) dos municípios –, é possível concluir que apesar dos estímulos do governo federal à gestão intersetorial descentralizada e do ganho de legitimidade e institucionalização do programa, tanto do ponto de vista de aceitação, quanto de regulamentação, tais fatores também não são suficientes para explicar as trajetórias municipais quanto à cobertura do programa, de modo que provavelmente o fator decisivo para explicar tais trajetórias é a gestão local, sendo que provavelmente não importa, como mostram os dados, se ela é de aliança ou oposição partidária ao governo federal – o que não quer dizer que os partidos não importam! Daí a necessidade de estudos comparativos quanti e qualitativos para averiguar quais, como e porque as gestões partidárias locais importam e se diferenciam. 1
INTRODUÇÃO Este trabalho trata da complexa relação entre o federalismo brasileiro, os partidos políticos, governos partidários e a gestão de políticas públicas. Tem por objetivo contribuir para a compreensão de uma questão persistente: afinal, os partidos políticos importam para a forma como atuam os governos e, consequentemente, sobre a gestão de políticas públicas, sob as condições de funcionamento do federalismo brasileiro, tanto no que diz respeito às regras do jogo eleitoral, quanto às atribuições dos distintos entes federativos (União, estados e municípios)? Para tanto, utiliza como objeto de estudo o Programa Bolsa Família (PBF) do governo federal, considerado hoje o carro-­‐chefe do sistema de proteção social brasileiro (SILVA, YASBEK e GIOVANNI, 2004; SILVA, 2008), e um dos grandes responsáveis pela redução dos níveis de pobreza e desigualdade de renda no país a partir de 2001 (SILVA, 2008). O PBF é também o maior programa de transferência condicionada de renda do mundo, atingindo atualmente mais de 12 milhões de famílias no país (BICHIR, 2010; MDS, 2011). Do ponto de vista federativo, não são estabelecidas, constitucionalmente, quais são as atribuições de cada ente federativo no que diz respeito à gestão da política de assistência social, da qual faz parte o PBF, mas tão somente diretrizes para a consecução da política, um dos fatores responsáveis pela sobreposição de ações ou, ao contrário, pela ausência das mesmas quanto a aspectos, setores ou grupos populacionais específicos (ALMEIDA, 2001). No entanto, a partir de 2005 o governo federal passou a firmar termos de adesão com estados e municípios visando à definição dos papeis e responsabilidades de cada ente quanto à gestão e implementação do PBF (BICHIR, 2010). Como parte desta estratégia, e também do movimento de centralização federativa do qual o PBF é exemplar (já que o executivo federal é responsável pelas decisões de gestão, financiamento e mesmo parte da execução do programa), em 2006 foi criado o Índice de Gestão Descentralizada municipal (IGD-­‐M), um indicador, calculado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), com base em um conjunto de fatores que visam aferir o desempenho das gestões locais quanto às suas incumbências frente ao programa, dentre as quais: cadastramento e atualização dos cadastros dos (possíveis) beneficiários, acompanhamento das condicionalidades de saúde e educação exigidas das famílias para continuarem a receber o benefício. Como forma de incentivo e constrangimento a que as metas e objetivos estabelecidos para o PBF pelo governo federal sejam atendidos pelos níveis subnacionais, com base no valor do IGD-­‐M obtido pelos municípios são repassados a eles recursos diferenciados, a serem utilizados pela gestão local na busca por melhorias que repercutam em aumento do IGD-­‐M – e consequentemente em mais recursos para os municípios), o que não deixa de ser uma estratégia do nível central de busca pela uniformização dos serviços relativos ao programa (possivelmente inclusive para angariar votos), mesmo quanto ao que é executado pelo nível local. 2
Tal estratégia sugere uma série de implicações. Por um lado, trata-­‐se de uma brecha institucional que favorece o executivo federal (já que a responsabilidade específica sobre tal tipo de política não é atribuída a nenhum ente federativo), num movimento de centralização das políticas de transferência de renda, que tiveram sua origem no Brasil em âmbito municipal, na década de 1990. Do ponto de vista fiscal, as restrições orçamentárias dos municípios (principalmente daqueles mais pobres) para financiar uma política de maior porte, capaz de beneficiar a quantidade de famílias atendidas pelo PBF, mostraram-­‐se um desestímulo à continuidade dos programas municipais. Devido a isso, e à visibilidade alcançada pelo Bolsa Família, a manutenção de programas locais como estratégia eleitoral foi deixando de se tornar atrativa, principalmente para as gestões municipais de partidos de oposição ao governo federal, já que a competição pelos votos do mesmo público, se baseada na transferência de renda, se mostra em certa medida desleal, principalmente devido à baixa capacidade de cobertura de programas municipais frente ao federal. Ainda assim, uma série de programas estaduais e municipais subsistem, às vezes mesmo em cooperação com o PBF. Através de acordos firmados com o governo federal, via MDS, desde 2011, estados e municípios passaram a complementar com recursos próprios o PBF – seja quanto ao valor repassado, seja quanto ao número de famílias atendidas (JUSTO, 2014). Do ponto de vista eleitoral, imprimir sua logomarca ao cartão do PBF não deixa de ser uma tentativa dos governos de estados e municípios, sejam eles da base aliada ou de opsição ao governo federal, de compartilhar os possíveis louros e votos associados ao Bolsa Família. Alguns trabalhos, baseados em pesquisas de opinião pública, têm demonstrado evidências de algum tipo de associação entre a decisão de voto para presidente da república e ser beneficiário (a) ou conhecer alguém que seja beneficiário (a) do PBF (ZUCCO, RENNÓ, 2013; KERBAUY, 2014). Portanto, os referidos acordos de coordenação federativa englobando os programas de transferência de renda do nível federal e dos níveis subnacionais podem ser entendidos como uma solução subótima para os interesses envolvidos nesta negociação, se arriscarmos utilizar os termos da teoria da escolha racional: na carona do Bolsa Família, mandatos de aliados ou de oposição ao governo federal nos níveis subnacionais podem com os possíveis efeitos eleitorais do programa angariar votos, especialmente junto às camadas mais pobres, beneficiárias prioritárias do PBF, sem prejuízo para o Partido dos Trabalhadores (PT), cabeça de chapa da coalizão que ocupa a presidência de república há quatro mandatos consecutivos (desde 2003) no que diz respeito aos possíveis votos associados ao PBF deste mesmo público para o executivo federal. Já para as eleições para governadores dos estados e prefeitos dos municípios, tais acordos podem se mostrar prejudiciais aos candidatos do PT e de seus aliados, quando estes sejam de oposição aos governos que firmaram os acordos. Problematização É nesta mesma linha de análise que procuramos entender, neste artigo, a atuação e relação do governo federal e dos governos dos entes subnacionais – no caso, 3
dos municípios do estado de São Paulo com mais de duzentos mil habitantes – no que diz respeito à gestão e implementação descentralizada do PBF, mais especificamente quanto à evolução da Taxa de Cobertura do Bolsa Família (TCBF), um dos fatores do IGD-­‐M, e que corresponde ao número de famílias beneficiadas em relação à estimativa de pobres (calculada pelo IBGE para cada município), público-­‐alvo do programa1. Algumas hipóteses podem ser aventadas para estas atuações e relações dos governos federal e municipais, no que diz respeito à TCBF, com base em distintos pressupostos teóricos e nas condições do sistema partidário-­‐eleitoral brasileiro. Duas das principais referências na análise dos sistemas de proteção social europeus e representantes da chamada vertente que enfatiza a luta de classes na abordagem marxista, Ian Gough e Esping-­‐Andersen (1990) nos permitem concluir, com base em seus estudos clássicos, que os partidos políticos importam, sim, na condução de governos e gestão de políticas públicas. Este seria o motivo pelo qual, apesar dos imperativos da acumulação capitalista, configuraram-­‐se distintos modelos de proteção social na Europa ou, em outras palavras, políticas sociais com conteúdos diferenciados: a partir da pressão e organização da classe trabalhadora, de seus recursos de poder e da matriz de poder em que estão inseridos, e dadas certas condições, como sufrágio universal e crescimento econômico, os partidos de esquerda, especialmente aqueles que fundaram a social-­‐democracia, conseguiram implementar políticas redistributivas de fato, atendendo aos interesses dos trabalhadores. Por outro lado, os também clássicos estudos de Scokpol, Evans e Ruschemeyer procuraram enfatizar a importância das instituições políticas e, a partir da análise de 1
O cálculo do IGD-­‐M é feito da seguinte maneira: IGD-­‐M = Fator I x Fator II x Fator III x Fator IV “De acordo com o art. 3º da Portaria10 GM/MDS nº 754, de 20 de outubro de 2010, o IGD-­‐M é calculado pela multiplicação de quatro fatores: 1. Fator de Operação: corresponde à média aritmética simples das seguintes variáveis (cálculo das taxas de cadastro e de condicionalidades: TCQC + TAC +TAFE + TAAS/4), onde: • TCQC – Taxa de Cobertura Qualificada de Cadastros, calculada pela divisão do número de cadastros válidos de famílias com perfil Cadastro Único, no município, pela quantidade de famílias estimadas como público-­‐alvo do Cadastro Único no município. • TAC – Taxa de Atualização Cadastral, calculada pela divisão do número de cadastros válidos de famílias com perfil Cadastro Único, no município, atualizados nos últimos dois anos, pelo número de cadastros válidos com perfil Cadastro Único no município; • TAFE – Taxa de Acompanhamento da Frequência Escolar, calculada pela divisão do número de crianças e adolescentes pertencentes às famílias beneficiárias do PBF no município, com informações de frequência escolar, pelo número total de crianças e adolescentes pertencentes a famílias beneficiárias do PBF no município; e • TAAS – Taxa de Acompanhamento da Agenda de Saúde, calculada pela divisão do número de famílias beneficiárias com perfil saúde no município com informações de acompanhamento de condicionalidades de saúde, pelo número total de famílias com perfil saúde no município. 2. Fator de adesão ao Sistema Único de Assistência Social (Suas), que expressa se o município aderiu ao Suas, de acordo com a Norma Operacional Básica (NOB/Suas); 3. Fator de informação da apresentação da comprovação de gastos dos recursos do IGD-­‐M, que indica se o gestor do FMAS lançou no sistema informatizado do MDS (SuasWeb) a comprovação de gastos ao CMAS; e 4. Fator de informação da aprovação total da comprovação de gastos dos recursos do IGD-­‐M pelo CMAS, que indica se o referido Conselho registrou no SuasWeb a aprovação integral das contas apresentadas pelo gestor do FMAS” (MDS, 2013). 4
casos históricos, nos permitem relativizar a importância dos partidos como chaves para a compreensão dos rumos das políticas públicas. A adoção de políticas keynesianas na Grã-­‐Bretanha, por exemplo, que seria do interesse dos trabalhadores, não emplacou com a ascensão do Partido Trabalhista ao poder, nos anos 1930, quando supostamente estariam satisfeitas as condições vislumbradas por Gough e Esping-­‐Andersen para tal. A explicação estaria no tradicional modo de funcionamento do parlamento inglês, bastante fechado – ou insulado – e assim pouco permeável à entrada de novas ideias e pressões na agenda de governo. Ambas as argumentações têm peso e forte capacidade explicativa, mas não são de todo incompatíveis. De qualquer maneira, se ideias, valores, referenciais e ideologias formam distintas culturas políticas, partilhadas por distintos grupos sociais, que vão lutar, dar suporte e formar coalizões na busca por que seus interesses sejam atendidos na arena governamental, como resultados de políticas públicas, como defendem os autores da chamado enfoque cognitivo (Pierre Muller, Bruno Jobert, Yves Surel, Lipsky, entre outros), é de se supor que, apesar dos constrangimentos das instituições e regras do jogo político, distintos partidos carreguem consigo uma gama de prioridades governamentais, ideologicamente definidas, que a depender de tais constrangimentos terão maiores ou menores probabilidades de serem efetivadas uma vez que conquistem o poder. E as políticas de transferência de renda são provavelmente um dos principais indicadores destas clivagens ideológicas, quer apareçam mais ou menos claras em termos de clivagens partidárias. No Brasil, as primeiras experiências de programas de transferência de renda foram adotadas, ainda em âmbito municipal e no distrito federal, pelos dois principais partidos que polarizam as eleições majoritárias – PT e PSDB (Partido da Social-­‐
Democracia Brasileira). E também no âmbito federal estes dois partidos disputam a paternidade do atual Bolsa Família, já que ele resultou da unificação de programas de transferência de renda pré-­‐existentes, em especial o Bolsa-­‐Escola, criados pelo governo peessedebista de Fernando Henrique Cardoso. Se o aprendizado com a experiência de que resultou o PBF for analisado sobretudo sob o ponto de vista neoinstitucionalista da dependência de trajetória, a paternidade deveria ser então atribuída ao PSDB. Por outro lado, como defendo, se as mudanças por que passou o PBF forem consideradas como mudança de projeto e referencial, sua paternidade deveria ser atribuída ao PT. Tais mudanças, que caracterizam o diferencial do PBF – grande ampliação da cobertura (atualmente cerca de um quarto (1/4) da população brasileira é beneficiária do programa), elevação do tempo de permanência de vínculo das famílias ao programa (no Bolsa-­‐Escola deveria ser restrito a dois anos) e acompanhamento das condicionalidades (em contraposição ao controle das contrapartidas) – e o aproximam do ideal da Renda Básica de Cidadania – o direito universal e incondicional a uma renda básica –, juntamente com a visibilidade que o programa obteve, ao se tornar destaque no sistema de proteção social brasileiro e bandeira do governo petista, são razões para supor que o programa seja alvo destacado de competição político-­‐ideológica e/ou político partidária. Daí, pois, a suspeita, que move este estudo, de que o maior ou menor sucesso do programa seja objeto de importante disputa política e de que, portanto, os governos subnacionais, na medida em que são responsáveis por parte da gestão e implementação do programa, venham a adotar posturas e estratégias de colaboração 5
ou entrave, obstaculização e mesmo boicote a ele, conforme se posicionem, respectivamente, como aliados ou opositores do governo federal. Por outro lado, porém menos provável, existe a hipótese de que o governo federal, no intuito de garantir o apoio de suas bases eleitorais nos municípios e estados governados pelo PT e seus aliados, venha a priorizá-­‐los na gestão do PBF, por exemplo selecionando e inserindo no programa maior número de beneficiários (a despeito da estimativa de possíveis beneficiários, público-­‐alvo do programa, com base no qual é calculada a taxa de cobertura, que em alguns municípios ultrapassa 100%). Assim, uma das formas de verificar os resultados destas posturas e estratégias de atuação e relação entre governos de diferentes partidos e entes federados é através da comparação das Taxas de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) entre municípios governados por partidos da base aliada ou de oposição ao governo federal. Por outro lado, existe também a possibilidade de que o programa tenha ganhado institucionalização ao longo do tempo, ou seja, de que o governo federal, no intuito de fortalecer o programa e torná-­‐lo imune às possíveis ações de boicote acima aventadas, tenha criado uma série de normas, regras, procedimentos e mecanismos de enrijecimento e padronização das ações relativas à implementação do PBF, dessa forma dando pouca margem à autonomia municipal. A criação do IGD-­‐M provavelmente enquadra-­‐se como parte deste intuito, já que exige das gestões locais o repasse periódico ao MDS de uma série de informações que visam a conhecer e garantir que os parâmetros estabelecidos pelo nível central para a gestão e implementação do PBF nos níveis locais sejam atendidos, como a atualização dos cadastros de (possíveis) beneficiários periodicamente, o acompanhamento e cálculo da frequência escolar dos filhos de beneficiários e o acompanhamento e repasse dos dados de saúde das crianças e gestantes. O elemento mais constrangedor, padronizador e institucionalizador do IGD-­‐M consiste em condicionar o repasse de recursos financeiros aos municípios de acordo com o seu desempenho no IGD-­‐M, o que funciona como estímulo para que os parâmetros estabelecidos pelo nível central sejam buscados, de forma a repercutir em valores de IGD-­‐M cada vez maiores e, com eles, os repasses. A análise comparativa referente à gestão intersetorial do PBF, isto é, incluindo os dados sobre saúde e educação, será objeto de outro estudo. Nesta pesquisa inicial, o foco se concentra na gestão da cobertura do programa, ou seja, na capacidade de os municípios realizarem corretamente o cadastro de possíveis beneficiários, assim garantindo a validade dos cadastros, de buscarem novos beneficiários, especialmente quando a cobertura está abaixo de 100%, o que indica que há famílias potencialmente parte do público-­‐alvo do programa ainda não cadastradas, e por fim de realizarem a atualização dos cadastros periodicamente, para detectar possíveis alterações de condições sócio-­‐econômicas que influenciem no recebimento do benefício, como, por exemplo, o nascimento de uma criança (este último fator, Taxa de Atualização Cadastral, TAC, no entanto não fará parte dos cálculos). Teriam os partidos políticos atuações diferenciadas quanto à gestão local do Bolsa Família conforme sua posição frente ao governo federal -­‐ de aliança ou oposição? Haveria um boicote ao sucesso do programa por parte das gestões municipais de oposição ao governo federal? Haveria maior cooperação das gestões municipais de partidos aliados ao governo federal visando ao sucesso do programa? Ou 6
favorecimento de tais municípios por parte do governo federal? Ou, ainda, teria o Programa obtido consolidação institucional ao longo do tempo, através de mecanismos de estímulo, que teriam barrado a influência dos partidos, e favorecido ações inovadoras da gestão local, estas passando, então, a serem as responsáveis majoritárias pela diferenciação de desempenho do IGD entre os municípios? Desenho da Pesquisa e Aspectos Metodológicos Para entender, então, as atuações e relações do governo federal e dos governos municipais no que diz respeito à gestão e implementação do PBF, com o objetivo de saber se os partidos importam e têm algum tipo de influência, conforme sejam aliados ou de oposição ao governo federal, sobre os resultados que os municípios governados por eles obtêm no Índice de Gestão Descentralizado Municipal (IGD-­‐M) e, mais especificamente, sobre um dos elementos que compõem tal índice, a Taxa de Cobertura do Bolsa Família (TCBF), foram selecionados 39 municípios do estado de São Paulo, que têm em comum o fato de possuírem mais de 200 mil habitantes, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010. Tais municípios estão listados na Tabela 1, no anexo 1, juntamente com outros dados sócio-­‐econômicos, obtidos junto ao PNUD: IDH e faixa de IDH nos anos de 2000 e 2010; mortalidade infantil em 2000 e 2010; porcentagem de crianças de até seis anos que não vão à escola em 2010; porcentagem de pobres em 2000 e 2010; porcentagem de vulneráveis à pobreza em 2000 e em 2010; taxa de desocupação em 2000 e em 2010; dados políticos, obtidos junto ao TSE: partido do prefeito em 2004, 2008 e 2012; situação do governo municipal em relação ao governo federal nestes mesmos mandatos (2005-­‐2008, 2009-­‐2012 e 2013-­‐2016), se de aliança ou oposição; continuidade ou alternância do governo local nos mandatos entre 2005 e 2012; e, finalmente, os dados do IGD-­‐M, obtidos junto ao MDS: Taxa de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) de 2005 a 2013, e a média da TCBF durante os mandatos de 2005 a 2008 e de 2009 a 2012 , calculada por nós a partir das taxas anuais. Com estes dados foi montada uma base no programa estatístico SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), a partir do qual foram feitos cálculos, tabelas e gráficos que nos permitiram realizar as análises que se seguem. Antes de proseguirmos, porém, à exposição e análise dos dados, algumas observações e ponderações metodológicas são necessárias. A primeira e talvez mais relevante delas é a de que não se trata de uma amostra estatisticamente representativa do todo ou universo, ou seja, os dados e análises apresentados aqui não são generalizáveis, pois o critério adotado para a escolha da amostra (municípios com mais de 200 mil habitantes do estado de São Paulo) foi aleatório e baseado apenas na tentativa de estabelecimento de algum parâmetro de comparação, a partir do qual pudéssemos dar início a este programa de pesquisa, que deve ser aprimorado e sistematizado. Portanto, as análises aqui apresentadas referem-­‐se tão somente ao grupo dos 39 municípios mencionados, pois uma amostra de 39 casos é bastante pequena e, embora tenha a vantagem de permitir a visualização e mesmo intuição de possíveis tendências e correlações, não é extensível a quaisquer outros. Ainda assim, 7
tais análises têm a relevância de permitirem a formulação de hipóteses a partir das quais pesquisas futuras possam ser realizadas, com amostras maiores e estatisticamente significativas. Uma segunda observação importante é a de que, para facilitar as análises, especificamente quanto ao que nos interessa aqui, ou seja, a comparação entre mandatos e gestões partidárias locais, conforme classificadas como sendo de aliança ou oposição com relação ao governo federal, foi calculada a média por mandato das Taxas de Cobertura do Bolsa Família (TCBF), de tal modo que obtivemos apenas três grupos de variáveis numéricas (em porcentagem), entre as quais buscou-­‐se observar se haveria alguma tendência – de aumento, diminuição ou manutenção das TCBF: a média da TCBF para o mandato de 2005 a 2008, a média da TCBF para o mandato de 2009 a 2012 e a média anual da TCBF em 2013 (último ano do qual dispúnhamos dos dados). Para análises mais apuradas e aprofundadas, especialmente de tendências, é recomendável que se utilize a evolução histórica das TCBF anuais, ou mesmo de intervalos menores de tempo, já que a média pode ocultar tendências internas ao período por ela englobado – por exemplo, no caso aqui estudado, não é possível saber como se comportou sequencialmente a TCBF de cada município ao longo dos quatro anos de cada um dos mandatos, no interior de cada um dos quais pode ter variado muito. Uma terceira ponderação refere-­‐se ao critério utilizado para fracionar as variáveis numéricas (percentuais) “média da TCBF”, a fim de transformá-­‐las em categorias ou subgrupos e, com isso, facilitar as análises. As porcentagens foram então subdividias em grupos de 10% em 10%, a partir de 50% de cobertura, já que são muito poucos e raros os casos de coberturas menores que justificassem subdivisão maior. Com isso foram criados seis (6) subgrupos para a variável Média da TCBF 2005-­‐2008, sete (7) subgrupos para a variável Média da TCBF 2009-­‐2012 e nove (9) subgrupos para a variável Média da TCBF 2013. Esta variação se deve ao fato de haverem mais casos de coberturas inferiores a 50% no segundo período e a mais casos de coberturas muito superiores a 100% no terceiro período, o que justificou a criação de grupos para coberutras superiores a até 120%. Este fracionamento, por um lado, nos permite observações mais específicas quanto a predominâncias de casos em cada uma destas faixas de cobertura e é mais recomendável para a aplicação em amostras bem maiores, inclusive para o agrupamento de clusters em análises multivariadas. Por outro lado, no presente caso, justamente por se tratar de uma amostra pequena, agregações em intervalos ou frações maiores é recomendável no intuito de se atingirem os critérios estatísticos para o estabelecimento de correlações significativas, muito difíceis de serem obtidas e observáveis quando o índice de correlação é pequeno e as variáveis, sendo muito fracionadas, numa amostra pequena, acabam por, nos cruzamentos entre elas, subdividirem os casos em muitas “janelas” ou “caselas”, muitas das quais com frequências nulas ou bastante pequenas de casos, o que dificulta ou impede a obtenção de testes estatíticos de correlação válidos. Também por este motivo vale frisar o aspecto descritivo e apenas sugestivo das análises feitas aqui. Finalmente, a quarta e última observação metodológica, não de caráter estatístico, mas de suma importância, refere-­‐se ao critério utilizado para classificar os governos municipais como sendo da base aliada ou de oposição ao governo federal 8
nos três mandatos considerados. Um aspecto central que facilitou, por um lado, esta definição, foi o fato de que, durante todo o período analisado, o executivo federal foi ocupado pela mesma cabeça de chave ou coalizão, o Partido dos Trabalhadores (PT), do qual são representantes o ex-­‐presidente Luís Inácio Lula da Silva (de 2003 a 2010) e a presidente Dilma Roussef (de 2011 a 2014, quando foi reeleita). Portanto, ao longo de todo o período em foco todos os demais partidos foram considerados por seu posicionamento em relação ao PT. Mesmo que tal posição tenha variado com o tempo, o referencial do governo federal manteve-­‐se o mesmo. Ademais, se tivesse havido alternância de partido e coalizão governante no nível federal, um outro complicador para o estabelecimento dos posicionamentos seria a necessidade de possível “quebra” ou subdivisão dos mandatos municipais em mais de um posicionamento (isto é, ora de apoio, ora de oposição ao longo de um mesmo mandato), já que as eleições para presidente da república e para prefeitos dos municípios não coincidem no tempo, havendo um intervalo de dois anos entre elas. Por outro lado, a definição das bases de apoio e oposição ao governo federal é dificultada, no caso brasileiro, por uma característica do nosso sistema eleitoral, que é a flexibilidade federativa para a formação de coligações ou, em outras palavras, a autonomia dos partidos, nos diferentes níveis federativos, para a formação de coligações, que não necessariamente devem seguir os acordos definidos para as disputas nacionais. Por conta disso, um partido que tenha definido apoio ao PT nas eleições para presidente pode ser adversário político do mesmo PT no nível municipal. De modo inverso, um partido que tenha definido oposição ao PT nas eleições presidenciais pode ser aliado dele nas municipais2. Apesar desta flexibilidade, deve-­‐se considerar, no entanto, que mesmo que com alguma variação, há razões para se confiar na validade das distinções partidárias no espectro ideológico e na coerência e frequência das coligações que, em boa parte das vezes com base nelas, se formam entre os partidos. Em estudo clássico, Figueiredo e Limongi (1995), ao estudarem o comportamento dos partidos políticos nas votações nominais da Câmara dos Deputados entre 1989 e 1993, constataram alto grau de consistência e coesão interna (acima de 70%, em média). Apesar da frequência das coligações e do número de partidos envolvidos em cada chapa ter aumentado a partir de 2002, como efeito do incentivo da “verticalização” (ver nota de rodapé 2), principalmente para as eleições de deputados federais, e apesar do intuito de replicação das coligações do nível federal para os estaduais da norma de verticalização não ter gerado os efeitos desejados ou esperados para as eleições majoritárias, há que se considerar que a variabilidade das coligações não é tão grande quanto poderia, se motivada tão somente pelos imperativos da competição eleitoral. Em estudo de 1996, Sousa (apud Fleischer, 2007) mostrou a frequência com que os partidos se coligaram uns aos outros nas eleições para deputados federais nos 27 estados brasileiros em 1994, em que foi possível notar a 2
No intuito de evitar coligações “esdrúxulas”, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em março de 2002, numa interpretação do Artigo 6.º da Lei Eleitoral n.º 9.504, de 30 de setembro de 1997, estabeleceu a chamada “verticalização” das coligações, que valeu em 2002 e 2006. “A verticalização obrigava partidos coligados na eleição presidencial a replicarem essas coligações no nível estadual” (FLEISCHER, 2007: 336). Até por serem realizadas em momentos distintos, tal regra não foi válida para as eleições municipais. 9
afinidade do PT com alguns partidos, de acordo com o número de parcerias com eles estabelecidas: 13 com o PCdoB, 12 com o PSB, 10 com o PPS, 8 com o PV, 6 com o PMN e também 6 com o PSTU, 5 com o PDT e apenas 2 com o PP e uma com o PSDB (FLEISCHER, 2007: 324). Nas eleições majoritárias de 2006, Fleischer observou a frequência das coligações e afinidades entre os partidos nos estados, em que ressalta a parceria entre PT e PCdoB em 25 estados, coligação que recebeu a adesão do PSB em 15 estados (FLEISCHER, 2007: 336 e 337). Sendo assim, embora o comportamento dos partidos na esfera municipal, no que diz respeito à formação de coligações, à condução de governos partidários e à fidelidade às orientações dos diretórios nacionais, tenha suas particularidades e distinções diante do que ocorre na esfera estadual, não é sem fundamento a suposição, adotada no presente estudo, de que faça algum sentido a classificação dos governos partidários municipais – em base “aliada” ou de “oposição” ao governo federal petista – com base nas coligações estabelecidas para a disputa presidencial. Deste modo, foram então classificados como formando a base aliada do governo federal, além do PT, no primeiro mandato do presidente Lula (2003-­‐2006), os seguintes partidos: PCB, PCdoB, PL, PMN e PV (coligação “Lula Presidente”); do segundo mandato (2007-­‐2010), formalmente apenas o PCdoB, mas informalmente o PL, o PMDB, o PRB (constituído de parte do PL), o PSB e o PTB (coligação “A Força do Povo”); e do primeiro mandato da presidente Dilma Roussef (2011-­‐2014), o PCdoB, o PDT, o PMDB, o PR, o PRB, o PSB, o PSC, o PTC e o PTN3 (coligação “Para o Brasil Seguir Mudando”). Foi, portanto, com base nestas coligações que os governos partidários municipais aqui estudados foram classificados, segundo o posicionamento do partido do prefeito quando eleito, em base aliada ou de oposição ao governo federal. Reconheço e destaco que tal critério e escolha metodológios, baseados nas coligações formalizadas a partir do nível federal para as eleições presidenciais, são problemáticos e não estão imunes a outras dificuldades e dilemas de pesquisa, além das já mencionadas acima. Trata-­‐se, certamente, de uma das principais incertezas e dilemas enfrentados na condução desta pesquisa, que, no entanto, se tem alguma validade e justificativa, só poderia ser levada adiante a partir dos esforços e escolhas iniciais, sujeitos, como são bem-­‐vindos, a críticas, sugestões e revisões. Sendo assim, a seguir são apresentados e discutidos os seus resultados. Apresentação e Análise dos Dados 3 Lista de siglas dos partidos citados no anexo 2 do artigo. Os dados das coligações para cada eleição e mandato foram obtidos junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE): TSE. Disponível em http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-­‐anteriores/eleicoes-­‐2004/resultado-­‐da-­‐
eleicao-­‐2004 Acesso em 13 de maio de 2014. TSE. Disponível em: http://www.tse.jus.br/hotSites/estatistica2008/est_result/resultadoEleicao.htm Acesso em 13 de maio de 2014. TSE. Disponível em http://www.tse.jus.br/eleicoes/estatisticas/estatisticas-­‐eleicoes-­‐2012 Acesso em 13 de maio de 2014. 10
Com o objetivo de verificar se há alguma correlação e tendência no comportamento e relações dos governos partidários federal e locais, no que diz respeito à gestão e implementação do PBF pelos 39 municípios com mais de 200 mil habitantes do estado de São Paulo, especificamente quanto à Taxa de Cobertura do Bolsa Família, de 2005 a 2013, os dados obtidos junto ao MDS e TSE foram analisados utilizando o SPSS, a partir do qual foram produzidos os gráficos e tabelas que se seguem, além dos testes estatísticos que permitem ou não afirmar o tipo e grau de correlação possivelmente existentes. Vamos a eles: Gráfico 1: Taxas Médias de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) nos períodos de 2005
a 2008 e de 2009 a 2012 para os municípios paulistas com mais de 200 mil habitantes
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MDS.
Conforme se pode observar no gráfico 01, acima, não se observa uma tendência de continuidade na Taxa de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) entre os municípios paulistas com mais de 200 mil habitantes na passagem do mandato do governo local, do período de 2005 a 2008 (eixo x), para o novo mandato, correspondente ao período de 2009 a 2012 (eixo y). Se, a despeito do início de um novo mandato – seja ele de apoio ou oposição ao governo anterior no município e ao governo federal –, houvesse uma tendência geral entre os municípios de manutenção da taxa de cobertura do programa, os pontos do gráfico estariam alinhados em torno da linha diagonal, onde 11
as taxas de cobertura são as mesmas no período de 2005 a 2008 e de 2009 a 2012. Se fosse observada uma mesma tendência de aumento da taxa de cobertura do programa entre todos os municípios, haveria uma concentração dos pontos acima da linha de referência diagonal. Entretanto, o que se observa é que, para os municípios paulistas de grande porte (os 39 contabilizados na amostra em análise), há uma grande variação na TCBF de um mandato para o outro. Em menos da metade da amostra há a manutenção de um mesmo padrão de taxa de cobertura da passagem de um mandato para outro, sem muita variação, seja para baixo, seja para cima. O que chama a atenção no gráfico é uma dispersão grande entre os municípios: muitos em que a TCBF aumenta bastante de um mandato para o outro (representados pelos pontos localizados acima e distantes da linha diagonal) e muitos em que, por outro lado, a TCBF diminui bastante do mandato de 2005-­‐2008 para o subsequente (representados pelos pontos localizados abaixo e distantes da linha diagonal). Estes dados sugerem, diferentemente do que poder-­‐se-­‐ia imaginar, que não há, pelo menos para os municípios paulistas de grande porte aqui em foco, uma tendência de consolidação e institucionalização do PBF no que se refere a um crescimento e manutenção de taxas elevadas de cobertura. Gráfico 2: Taxas Médias Anuais de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) no período de 2005 a 2008 para os municípios paulistas com mais de 200 mil habitantes, segundo a posição do governo municipal frente ao federal, se da base aliada ou de oposição Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MDS e do TSE.
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No gráfico 2, acima, é possível notar que, no primeiro período (ou mandato municipal) estudado, de 2005 a 2008, a Taxa de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) média entre os municípios governados por partidos aliados do PT no nível federal é maior que a mesma média calculada entre os municípios governados pela oposição. No gráfico, as barras da mesma cor são sempre maiores entre os municípios governados por partidos da base aliada do que entre aqueles governados pelos partidos de oposição. Estes dados e primeira observação sugerem que, pelo menos para os municípios aqui estudados, talvez tenha havido maior atenção, seja do governo federal em garantir a eficácia do programa, no que diz respeito à inclusão de famílias beneficiárias, para os municípios governados pelos seus aliados políticos, seja a destes municípios em colaborar com o governo federal, através de uma gestão e implementação eficaz e eficiente do cadastramento de beneficiários sob seu território de ação, repercutindo numa taxa de cobertura mais elevada. No entanto, observa-­‐se que a diferença entre as barras de mesma cor no gráfico – ou seja, a diferença entre as médias das taxas de cobertura de municípios governados pela base aliada ou pela oposição – diminui ao longo dos anos já neste primeiro mandato. Gráfico 3: Taxas Médias Anuais de Cobertura do Bolsa Família (TCBF) no período de 2009 a 2012 para os municípios paulistas com mais de 200 mil habitantes, segundo a posição do governo municipal frente ao federal, se da base aliada ou de oposição Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MDS e do TSE.
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No segundo período analisado, o mandato de 2009 a 2012, retratado no gráfico 3, nota-­‐se que a tendência inicialmente observada, de maior cobertura do Bolsa Família entre os municípios governados por partidos da base aliada ao governo federal, vai deixando de existir, como já sugeria o final da análise do gráfico 2. O gráfico 3 mostra que a tendência ainda é observável, no ano de 2009, representado pelas barras azuis, em que a média das taxas de cobertura dos municípios governados pela base formalmente aliada é um pouco maior que a média das taxas daqueles governados por partidos apenas informalmente aliados do PT no governo federal, que por sua vez é um pouco maior que a média das taxas de cobertura dos municípios governados pela oposição. A partir de 2009, no entanto, a tendência fica bem mais amena, sobressaindo-­‐se com maiores coberturas, na média, os municípios governados pelos partidos da base de apoio informal ao governo federal, enquanto que as médias das taxas de cobertura daqueles que compõem formalmente as bases aliada e de oposição ao governo federal têm coberturas muito próximas (e menores), representadas no gráfico pelas barras verde, bege e roxa nos anos de 2010, 2011 e 2012, respectivamente. Estes dados sugerem, portanto, que se nos primeiros anos de existência do PBF, já no governo do presidente Lula, após a unificação do Bolsa Escola e demais programas de transferência de renda criados ao longo do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), poderia haver algum tipo de privilegiamento ou maior atenção aos municípios governados por partidos da base aliada pelo governo federal, no que diz respeito à inclusão de famílias e consequente ampliação da cobertura, ou um maior empenho e colaboração destes governos com o executivo federal, no cadastramento, validação e atualização de cadastros de beneficiários que também pudesse repercutir em aumento da cobertura, ou, ainda, uma terceira hipótese, não excludente às demais, de algum tipo de boicote imprimido ao PBF por parte dos governos municipais de oposição ao federal, que levasse à diminuição da cobertura (desaceleração e ineficácia na validação dos cadastramentos e atualizações de cadastro, por exemplo), enfim, quaisquer que tenham sido possivelmente estas ações, elas vão perdendo força, pois a tendência inicialmente verificada diminui. Uma outra observação importante, no gráfico 3, é a de que se observa, ao longo dos anos deste mandato, ou seja, de 2009 a 2012, uma tendência geral, inversa à verificada no período e no gráfico anteriores (de 2005 a 2008), de queda das taxas de cobertura, independentemente do posicionamento político-­‐partidário dos governos municipais. As barras azuis, no gráfico, que representam o ano de 2009, são maiores do que as verdes e beges, que, por sua vez, são muito maiores que as roxas, que representam o último ano do mandato, 2012. Esta tendência de queda geral provavelmente se deve à mudança feita pelo MDS quanto à forma de calcular a estimativa de pobres e, com ela, o público alvo do programa, alterando consequentemente também o cálculo da cobertura. 14