Deformidades flexurais em eqüinos: revisão bibliográfica
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Deformidades flexurais em eqüinos: revisão bibliográfica
Deformidades flexurais em eqüinos: revisão bibliográfica Rodrigo Romero Corrêa Mestre em cirurgia pelo departamento de cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo Professor da Universidade Anhembi Morumbi e-mail: [email protected] André Luis do Valle de Zoppa Doutor em cirurgia pelo departamento de cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo Professor da Universidade de São Paulo e-mail: [email protected] Resumo Abstract A restrição de uma articulação em posição flexionada ou a inabilidade de estendê-la completamente é chamada de deformidade flexural dos membros. As deformidades flexurais dos eqüinos podem ser classificadas como congênitas ou adquiridas após o nascimento. Em muitos casos, a única anormalidade encontrada é a diminuição de mobilidade da articulação acometida. A palpação dos tendões envolvidos combinada com a avaliação radiográfica é de grande valia para a confirmação da suspeita clínica. Os animais podem ser submetidos à terapia clínica ou cirúrgica, ou ainda tratados com a associação das duas modalidades, de acordo com cada caso. A melhor resposta à terapia é observada nos casos onde o diagnóstico é realizado precocemente. O prognóstico varia de acordo com o grau de acometimento, tempo de evolução e tipo de tratamento instituído. The flexural limb deformities are defined as the restriction of a joint in the flexion position or the inability to extend it. Equine flexural deformities are classified as congenital or acquired after birth. In many cases, the only abnormal finding is a reduction of the movement of the affected joint. Palpation of the involved tendons combined with radiographic evaluation is important in confirming a diagnosis. The affected horses may be submitted to clinical or surgical therapies, or to a combination of both, according to the clinical examination and ancillary methods results. The best response to a treatment is observed when an early diagnosis is made. Prognosis varies according to the deformity degree, time of development and therapy used. Key-words: equine, locomotor limb, flexural deformity, tendon. Palavras-chave: eqüino, membro locomotor, deformidade flexural, tendão. Introdução As deformidades flexurais dos membros locomotores em eqüinos são consideradas como inabilidade dos animais em estender os membros completamente. Geralmente, a hiperflexão resulta em diferenças do comprimento das unidades musculotendíneas em relação aos ossos da região acometida. Diferentes estruturas anatômicas podem estar envolvidas, incluindo os tendões flexores, o aparelho suspensor, a cápsula articular, a fáscia da região, ossos e pele (HUNT, 2003). O termo deformidade flexural ou tendões contraídos tem sido utilizado tradicionalmente para representar várias deformidades flexoras nos membros. Todavia, o potencial para contração deste tecido é limitado. O defeito primário não está necessariamente no tendão (STASHAK, 1994). Deformidades flexurais congênitas As deformidades flexurais congênitas geralmente 37 são identificadas nas articulações metacarpo-falangeana ou rádio-cárpica-metacárpica, e menos freqüentemente nas articulações interfalangeana distal e tíbio-társicametatársica (EMBERTSON, 1994; GREET; CURTIS, 2003). Etiologia Trabalhos específicos são necessários para o entendimento de todas as variáveis que levam às deformidades. As causas das alterações parecem ser multifatoriais em sua origem, e freqüentemente são de difícil explicação. Doenças adquiridas pela égua durante a prenhez podem causar o desenvolvimento de deformidades flexurais em potros. Ingestão de agentes teratogênicos e alterações genéticas têm sido associadas (AUER; STICK, 2006; WAGNER, 1994). Alterações neuromusculares, defeitos na formação de elastina e problemas relacionados à aderência das fibras de colágeno podem também estar envolvidos com a patogênese (HUNT, 2003). Existe a hipótese de que a base etiológica da síndrome seja a instabilidade articular associada às malformações ósseas que resultam em contratura muscular compensatória (STASHAK, 1994). Sinais clínicos Muitos potros nascem com leve deformidade flexural metacarpo-falangeana, causando discreta flexão que se resolve dentro das primeiras horas de vida. Nestes casos, a deformidade flexural é bilateral, ou acomete os quatro membros. A alteração que ocorre no tendão flexor digital superficial resulta em posicionamento vertical das articulações; se os tendões flexores profundos também apresentarem alteração, os talões também sofrerão elevação (WAGNER, 1994). Potros recém-nascidos apresentando deformidade em região interfalangeana distal poderão apresentar apoio do membro somente na região das pinças dos cascos. As deformidades em região metacarpo ou metatarso-falangeanas poderão algumas vezes impedir que o animal se mantenha em estação. A região cárpica também comumente apresenta este tipo de alteração. O animal poderá se manter em posição quadrupedal, mas manterá seu peso deslocado para os membros posteriores (AUER; STICK, 2006). Nos casos de deformidades flexurais decorrentes do comprometimento dos tendões flexores digitais, em graus que obriguem o potro apoiar involuntariamente a articulação metacarpo-falangeana e interfalangeana distal no solo, a lesão cutânea pode aprofundar-se, expondo 38 as estruturas componentes da articulação e causar artrite infecciosa extremamente grave (ADAMS, 1990; THOMASSIAN, 1996). Mais raramente poderão estar envolvidos os tendões flexores carpo-radial e carpo-ulnar, mantendo a articulação carpiana em permanente posição de flexão. Secundariamente, poderão estar envolvidos os ligamentos caudais da articulação rádio-cárpicametacárpica, o que conferirá irreversibilidade ao processo (THOMASSIAN, 1996). As anormalidades flexurais congênitas rádiocárpica-metacárpicas variam desde muito brandas até muito graves. A cápsula articular e os ligamentos intercarpianos podem ser os elementos constritores. A avaliação radiográfica da articulação nestes casos é recomendável antes do início da terapia, para que se garanta a ausência de anormalidades ósseas (GREET; CURTIS, 2003; WAGNER, 1994). Diagnóstico As características demonstradas por potros com deformidades flexurais facilitam o diagnóstico em muitos casos. A região acometida deve ser palpada e manipulada com o animal sustentando o peso, e com o membro em flexão. Em muitos casos, a única anormalidade encontrada é a diminuição de mobilidade da articulação acometida, ou da região articular. A avaliação radiográfica tem sido indicada para determinar a existência de alterações ósseas associadas (AUER; STICK, 2006). Necroscopicamente os potros com graves deformidades flexurais, em que o membro não pode ser estendido, exibem alinhamento anormal do membro, mesmo quando todos os tendões e músculos são removidos após a morte. As cápsulas articulares e ligamentos intra-articulares parecem ser as influências constritoras (WAGNER, 1994). Tratamento As deformidades flexurais congênitas devem ser tratadas imediatamente após o seu diagnóstico, com a severidade da deformidade ditando o quão agressivo será o tratamento. Quanto mais novo for o potro, maior a resposta ao tratamento, devido ao fato de que os tecidos se tornam menos responsivos ao tratamento com o passar do tempo (EMBERTSON, 1994). Se o potro for capaz de permanecer em estação sem necessidade de auxílio, as terapias específicas para as deformidades flexurais são desnecessárias. O potro deve ser submetido a exercícios controlados, como permanecer em um pequeno piquete com a égua durante 1 hora por dia (GREET; CURTIS, 2003). O objetivo do exercício controlado é auxiliar o relaxamento da musculatura contraída e dar elasticidade aos tecidos moles palmares ou plantares, enquanto protege o membro do uso excessivo (ADAMS; SANTSCHI, 1999). Muitos potros com deformidades leves a moderadas respondem favoravelmente à fisioterapia, por meio de extensão manual dos membros a cada 4 a 6 horas, em sessões de 15 minutos de duração, ou forçando o animal a se movimentar (ADAMS, 1990; HUNT, 2003). O tratamento irá variar de acordo com a localização anatômica envolvida e com a severidade da alteração (HUNT, 2003). Alguns potros melhoram espontaneamente, e esta categoria inclui a maioria dos potros cuja deformidade está associada com um mal posicionamento uterino. O restante deste grupo geralmente responde bem à utilização de talas. O princípio básico do tratamento é a extensão forçada do membro para induzir o reflexo miotático inverso e conseqüente relaxamento dos músculos flexores (STASHAK, 1994). Quando se faz o uso de talas, o clínico deve tomar extremo cuidado em relação à indução de feridas por compressão. As talas devem ser utilizadas por curtos períodos, sendo programadas para serem mantidas por 4 a 6 horas, e retiradas por mais 4 a 6 horas. Os gessos são mais efetivos, e desde que adequadamente aplicados, requerem menores cuidados e resultam em menores quantidades de feridas por compressão (HUNT, 2003). Quando se consegue o posicionamento desejado do membro após a utilização das talas ou gesso, o animal deverá ser exercitado diariamente, possivelmente com a associação de fármacos antiinflamatórios, para manutenção da mobilidade adquirida. Em casos de deformidades severas, deve-se assegurar que o animal será mantido em local seguro e com piso macio, para prevenir lesões de tecidos moles e parede dorsal dos cascos por impacto contra o solo (AUER; STICK, 2006). A aplicação de prolongamentos acrílicos ou placas metálicas em região da pinça do casco do membro com deformidade flexural tem sido utilizada no tratamento da afecção (ADAMS, 1990; ADAMS; SANTSCHI, 1999). Além de proteger a região contra o impacto excessivo e indesejado, este prolongamento induz o alongamento do tendão flexor digital profundo durante a movimentação do membro (AUER; STICK, 2006). Altas doses de oxitetraciclina têm sido usadas com sucesso para o tratamento de deformidades flexurais. É recomendada a administração de 2 a 4 gramas deste fármaco no tratamento das deformidades flexurais congênitas em eqüinos. O medicamento deve ser administrado por via intravenosa, lentamente, e não deve ser utilizada em neonatos que não apresentem valores normais de creatinina sérica. A oxitetraciclina é utilizada uma vez ao dia, ou a cada dois dias, perfazendo um total de três a quatro doses (ADAMS; SANTSCHI, 1999; HUNT, 2003). Complicações deste tratamento incluem insuficiência renal, diarréia, e mais comumente, relaxamento excessivo de outras articulações normais (EMBERTSON, 1994; HUNT, 2003; KASPER et al., 1995; LOKAI, 1992). Tem se postulado que a oxitetraciclina é capaz de quelar os íons de cálcio livres e prevenir o influxo do mesmo nas fibras musculares, induzindo o relaxamento muscular (AUER; STICK, 2006; EMBERTSON, 1994). Isto pode resultar em passivo aumento do comprimento muscular e concomitante correção da deformidade em 24 a 48 horas (AUER; STICK, 2006). Fármacos antiinflamatórios não esteroidais podem auxiliar na resolução do problema, mas deve-se ter cuidado com a possibilidade de indução de úlcera gástrica (ADAMS, 1990). Eles são indicados no combate à dor induzida pelo alongamento dos tecidos moles contraídos causados pela sustentação do peso, imobilizações ou gesso, ou exercícios de alongamento passivo (EMBERTSON, 1994). Nas deformidades metacarpo-falangeanas, acredita-se que o ligamento acessório do flexor digital superficial exerça um limite funcional para a extensão da superfície dorsal interfalangeana. A liberação deste ligamento pode permitir a movimentação do boleto (BARR; SCHRAMME, 1998). A técnica cirúrgica pode ainda ser associada às terapias não cirúrgicas (talas, gesso, fisioterapia, ferrageamento com prolongamento das pinças) (ADAMS, 1990). A desmotomia do acessório do flexor digital profundo pode ser usada como tratamento da deformidade induzida pela alteração deste músculo, e foi introduzida por Lysholt e Sonnichsen em 1969. Este procedimento cirúrgico mostra alta taxa de recuperação em todas as raças nos casos de deformidades flexurais interfalangeanas e evita consideravelmente os riscos associados com a secção do tendão flexor (SONNICHSEN, 1982). Não é recomendada a transecção dos tendões flexores ou do ligamento suspensor do boleto em animais que futuramente irão desenvolver atividades atléticas (ADAMS; SANTSCHI, 1999). 39 Deformidades flexurais adquiridas Incidência As deformidades flexurais adquiridas ocorrem comumente desde os primeiros dias até o segundo ano de vida do animal. Envolvem com maior freqüência a articulação interfalangeana distal, a articulação metacarpo-falangeana e rádio-cárpica-metacárpica (HUNT, 2003). Estes tipos de deformidades são as que apresentam maior incidência, manifestando-se, em geral, a partir da desmama e acometendo os dois membros anteriores dos potros. Raramente a afecção se manifesta nos membros posteriores, causando quadros de impotência funcional motora grave (THOMASSIAN, 1996). Foram relatados cinco casos de deformidades flexurais adquiridas metacarpo-falangeanas em cavalos adultos, onde se observou que a idade dos animais acometidos variou entre 8 e 14 anos (McDIARMID, 1999). Etiologia O desenvolvimento destas alterações está muitas vezes relacionado à dor. Qualquer manifestação de dor em um membro irá iniciar um reflexo de flexão para a retirada do membro do solo, o que resulta em contração dos músculos flexores e posição alterada da articulação. A dor pode se originar de fisite, osteocondrite dissecante, artrite séptica, ferimentos nos tecidos moles ou infecções dos cascos, com ou sem comprometimento da falange distal (HUNT, 2003; STASHAK, 1994). Outras causas comuns incluem fatores genéticos para crescimento rápido e as alterações alimentares (HUNT, 2003). Tanto a superalimentação quanto as rações não balanceadas são incriminadas como causas destas alterações. No entanto, a relação não é consistente, sendo ainda necessária uma prova definitiva que o excesso de energia cause deformidades flexurais nos eqüinos (STASHAK, 1994). Deformidades flexurais interfalangeanas Este tipo de deformidade envolve o tendão flexor digital profundo. Muitas podem ser as causas destas deformidades, e mais de uma causa pode estar presente em um mesmo animal (WAGNER, 1994). Os sinais clínicos iniciais incluem projeção dorsal da região supra-coronária, aumento da altura dos talões 40 em comparação com o tamanho da pinça e falta de contato dos talões com o solo após casqueamento. Eventualmente, os cascos podem se tornar achatados na região da pinça, e a parede dorsal se tornar plana (HUNT, 2003). As deformidades flexurais interfalangeanas podem ser classificadas da seguinte maneira: - Grau I: Ocorre discreta elevação do talão com tensão aumentada no tendão flexor digital profundo. A muralha do casco tende à perpendicularização em relação ao eixo podofalangeano-solo. O ângulo metacarpofalangeano permanece inalterado. - Grau II: A muralha do casco adquire completa perpendicularidade em relação ao eixo podofalangeano-solo, com crescimento anormal dos talões e tendência ao encastelamento. Ocorre desgaste da pinça. - Grau III: Observa-se evidente projeção cranial da muralha podendo até, nos casos mais graves, onde o ligamento suspensor do boleto participa do processo da contratura, ocorrer o apoio da região cranial das articulações interfalangeanas no solo. Nesta situação haverá crescimento exagerado do casco que não sofre desgaste, e em alguns casos, poderão ser observados ferimentos profundos da articulação metacarpofalangeana ou metatarso-falangeana (THOMASSIAN, 1996). O diagnóstico baseia-se na apresentação clínica do processo, no diferencial quanto às estruturas atingidas, e na ocorrência de fatores etiológicos predisponentes. Nos graus de deformidades mais graves, os exames radiográficos e ultrassonográficos permitem que se avalie o nível de comprometimento de estruturas articulares que podem interferir nos resultados dos tratamentos a serem instituídos, assim como a evolução das alterações que puderem ser diagnosticadas (THOMASSIAN, 1996). O tratamento clínico deve ser baseado na associação de terapias e mudanças de manejo, como descrito a seguir: - Correção da dieta: o balanço nutricional é importante para o normal desenvolvimento do esqueleto e da ossificação endocondral. Se necessário, os ajustes devem ser realizados imediatamente após a identificação do desequilíbrio. - Antiinflamatórios não-esteroidais: o alongamento passivo dos tendões é um processo doloroso. Deve-se fazer a utilização de baixas doses de antiinflamatórios visando facilitar a sustentação do animal em posição quadrupedal e a deambulação. - Exercício: a combinação da utilização de analgésicos e a proteção dos cascos, associadas ao exercício podem permitir o alongamento da estrutura muscular e corrigir o problema. - Extensão na pinça dos cascos: a aplicação de extensões nas ferraduras na região da pinça dos cascos é uma das formas mais efetivas de tratamento das deformidades flexurais. O objetivo deste tratamento é proteger a pinça e evitar o uso excessivo desta região. Adicionalmente, estas extensões movem a distribuição do peso do animal para as porções posteriores do casco, e ainda atrasam o momento de saída do casco do chão, gerando maior tensão sobre os tecidos moles palmares ou plantares da região falangeana. - Imobilização com gesso: a imobilização do membro causa relaxamento temporário dos tendões, e este fato pode ser aplicado ao tratamento das deformidades flexurais. Devido às complicações associadas com esta forma de tratamento, elas são raramente utilizadas (AUER; STICK, 2006). A terapia cirúrgica é bem sucedida quando realizada precocemente, portanto devem-se fazer avaliações periódicas do progresso do membro acometido, se a terapia inicialmente escolhida for conservadora. Caso não se observe nenhuma melhora substancial em 3 a 4 semanas, a intervenção cirúrgica é indicada. Nestes casos, geralmente se realiza a desmotomia do acessório do tendão flexor digital profundo, associada à utilização de ferraduras corretivas (WAGNER, 1994; WAGNER et al., 1985b). Casos severos deste tipo de deformidade flexural, onde a parede dorsal do casco forma um ângulo de menos de 90 graus com o solo, têm sido tratados com sucesso através da tenotomia do flexor digital profundo. A transecção deste tendão é procedimento radical, e somente em casos onde há contração secundária da cápsula articular e dos tecidos moles periarticulares, o animal não levantará a pinça do casco do chão como acontece em casos de ruptura traumática deste tendão (HUNT, 2003; JANSSON; SONNICHSEN, 1995). O prognóstico para cavalos jovens com deformidades leves ou moderadas da articulação interfalangeana distal é bom para o uso atlético do animal. Animais que necessitam a desmotomia do acessório do flexor digital profundo têm desenvolvido atividades de corrida com sucesso. Cavalos que necessitam de tenotomia do flexor digital profundo para resolução da deformidade têm sido utilizados somente para trabalhos leves (ADAMS; SANTSCHI, 1999). Deformidades flexurais metacarpo / metatarsofalangeanas Três estruturas sustentam a articulação metacarpofalangeana durante a fase de sustentação do peso do animal: o tendão flexor digital superficial, o tendão flexor digital profundo e o ligamento suspensor do boleto. As deformidades flexurais metacarpo-falangenas podem ser primariamente causadas por um encurtamento das unidades musculotendíneas do flexor digital superficial. Secundariamente, pode ocorrer o encurtamento das mesmas unidades do flexor digital profundo, que faz com que esta estrutura limite o retorno da articulação à posição normal. Raramente, o ligamento suspensor do boleto pode ser a estrutura limitante (ADAMS; SANTSCHI, 1999). As deformidades metacarpo-falangeanas podem ser classificadas em: - Grau I: Ocorre apenas ligeiro desvio cranial da articulação metacarpo-falangeana com discreto aumento de seu ângulo anterior. - Grau II: Ocorre perpendicularização do eixo metacarpo-falangeano. - Grau III: Observa-se evidente projeção cranial da articulação metacarpo-falangeana. Nestas condições poderá ocorrer tensão do tendão extensor digital lateral que fica proeminente na face crânio-lateral do metacarpo (THOMASSIAN, 1996). Em função das estruturas acometidas, e do grau de deformidade, o animal apresentará quadro clínico bem definido e fácil de ser identificado. Quando apenas o tendão flexor digital superficial encontra-se envolvido no processo, o cavalo terá projeção cranial da articulação metacarpo ou metatarso-falangeana, caracterizando o que popularmente é denominado de emboletamento. Esta apresentação estática do animal em termos de aprumos irá proporcionar sobrecarga na articulação envolvida, e perda da capacidade da absorção de impacto mecânico, predispondo a região a graves traumatismos. O animal apresentará claudicação variável, tendendo a um forte movimento cranial da articulação, e tem-se a sensação que ocorrerá, mesmo que momentaneamente, a perda da capacidade de sustentação do corpo (THOMASSIAN, 1996). O tratamento clínico consiste na associação de mudanças de manejo, utilização de fármacos, casqueamento e ferrageamento corretivos, e fisioterapia 41 como descrito a seguir: - Avaliação e correção do manejo e da alimentação: o principal grupo acometido é dos potros que são submetidos à superalimentação e exercícios para serem vendidos precocemente. - Casqueamento e ferrageamento corretivos: os prolongamentos da ferradura em região de pinça podem ser utilizados com sucesso nestes casos. No momento da mudança de passo do animal, o casco irá demorar mais tempo para sair do chão, e maior tensão será exercida sobre os tendões flexores durante a fase caudal do passo, facilitando a extensão do membro. - Antiinflamatórios não esteroidais: podem ser utilizados com o intuito de obter controle da dor, facilitando o alongamento dos tendões flexores e seus ligamentos acessórios. - Fisioterapia: a manutenção do membro contralateral em elevação faz com que o animal distribua maior carga de peso sobre o membro acometido, forçando a realização do movimento de extensão. Adicionalmente, o animal deve ser estimulado a andar desta forma. - Imobilizações: podem facilitar a resolução das deformidades, principalmente nos casos diagnosticados de forma precoce. Deve-se ter cuidado para prevenir a indução de feridas por compressão. - Ferraduras com barras verticais: A utilização de ferraduras com barras verticais unidas a tubos que podem ser fixados em região proximal à articulação do boleto pode ser uma forma efetiva de tratamento. Com este material, o membro é forçado a se manter em extensão durante todo o tempo (AUER; STICK, 2006). A desmotomia do acessório do flexor digital profundo é um tratamento efetivo para as deformidades metacarpo-falangeanas. Devido a este tipo de deformidade ser associada ao tendão flexor digital superficial, o papel da desmotomia do acessório do flexor digital profundo na sua correção é de difícil explicação. Acredita-se que a deformidade metacarpofalangeana é conseqüência de graus variados de envolvimento dos tendões flexores superficial e profundo e ligamento suspensor do boleto (WAGNER et al, 1985b). Os resultados dos tratamentos cirúrgicos nas deformidades flexurais da articulação metacarpofalangeana são menos previsíveis que nas deformidades interfalangeanas distais. Vários tratamentos cirúrgicos estão à disposição. Se o tendão flexor digital superficial 42 é o mais tenso, tanto a tenotomia do flexor digital superficial quanto a desmotomia de seu acessório podem ser realizadas. A desmotomia tem obtido bons resultados, porém existem citações de falhas na obtenção de melhora utilizando esta técnica. (STASHAK, 1994). O prognóstico para cavalos com deformidades flexurais adquiridas leves da articulação metacarpofalangeana depende da resposta à terapia instituída. Nos casos de deformidades severas, dificilmente conseguese a correção da lesão (ADAMS; SANTSCHI, 1999). Deformidades flexurais cárpicas Deformidades flexurais cárpicas adquiridas são normalmente resultado de trauma com subseqüente desuso ou não sustentação do peso sobre o membro acometido. O carpo é projetado anteriormente, e com o tempo, se torna restrito à posição flexionada (ADAMS; SANTSCHI, 1999). O tratamento para as deformidades flexurais cárpicas em potros é baseado na eliminação da causa primária, e se o problema for reconhecido precocemente, o tratamento conservativo geralmente é efetivo. As deformidades podem demorar semanas ou até meses para serem corrigidas. Talas, bandagens ou a utilização sistêmica de oxitetraciclina podem auxiliar o tratamento (HUNT, 2003). Em casos que não respondem à terapia clínica, a tenotomia do ulnar lateral e do flexor carpo ulnar podem ser realizadas com bons resultados. A manipulação passiva da região cárpica pode demonstrar a grande mobilidade obtida com este procedimento (AUER; STICK, 2006). Discussão A classificação das deformidades flexurais em animais jovens pode ser difícil de se realizar no momento do exame clínico, se o animal não é acompanhado desde o nascimento. Para se classificar as deformidades adquiridas em potros, torna-se necessária a identificação da causa primária da deformidade, fato que em alguns casos pode ser um fator limitante. O envolvimento de fatores genéticos, como o rápido desenvolvimento, pode impossibilitar a diferenciação entre deformidade congênita ou adquirida. Concordando com Auer e Stick (2006), o diagnóstico das deformidades flexurais congênitas deve ser baseado na apresentação clínica do animal. O exame físico de rotina neste tipo de alteração é baseado no posicionamento do animal quando em posição quadrupedal, e na capacidade de extensão e flexão da articulação envolvida. A palpação dos tendões e ligamentos regionais deve ser realizada com o membro em apoio e em elevação. O principal exame auxiliar a ser realizado é o radiográfico, visando a avaliação da integridade óssea e articular. O tratamento para os animais deve ser instituído imediatamente após o diagnóstico da afecção. A agressividade do tratamento e a determinação de seus tipos variam de acordo com a severidade das lesões, concordando com Embertson (1994). Os procedimentos cirúrgicos devem ser realizados de acordo com as futuras necessidades de atividades esportivas do animal. Conclusão As deformidades flexurais dos eqüinos, embora tratadas com sucesso por meio de métodos clínicos ou cirúrgicos, ainda apresentam falhas no seu completo entendimento. O tema foi foco de estudos nas décadas de 80 e 90, e atualmente não recebe a devida importância. Maiores pesquisas são necessárias para tornar as deformidades flexurais mais transparentes à ciência, e ainda, para permitir o uso de novas técnicas diagnósticas e terapêuticas. Referências Bibliográficas ADAMS, B. S.; SANTSCHI, E. M. Management of flexural limb deformities in young horses. 1999. Equine Practice, v. 21, n. 2, p. 9-15, 1999. ADAMS, R. Noninfectious orthopedic problems. In: KOTERBA, A. M.; DRUMMOND, W. H.; KOSCH, P. C. 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