1 NATUREZA JURÍDICA DOS PARECERES E DAS CONSULTAS

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1 NATUREZA JURÍDICA DOS PARECERES E DAS CONSULTAS
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NATUREZA JURÍDICA DOS PARECERES E DAS CONSULTAS:
RESPONSABILIDADE CIVIL, ADMINISTRATIVA E PENAL DO
ADVOGADO
Carlos Roberto Faleiros Diniz*
1. Advogado e Advocacia 1.l. Prerrogativas dos advogados 1.2.
Liberdade de exercício profissional 1.3. Inviolabilidade do
advogado por seus atos e manifestações 1.4. Inviolabilidade no
exercício do mandato nas entidades de classe, nos Tribunais de
Ética 2. Parecer. Consulta. O que é um e outra. 3.
Responsabilidade criminal pela emissão de pareceres. 4.
Responsabilidade civil pela emissão de pareceres. 5.
Responsabilidade administrativa. 6. Fiscalização do exercício
profissional. 7. Conclusões. 8. Bibliografia
1. Advogado e Advocacia
O mandamento constitucional que apregoa ser o advogado indispensável à
administração da Justiça (CF, art. 133) encontra seu fundamento e estrutura no Estado
de Direito. Sem advogado, ator autônomo e independente do cenário social, não se
provoca a jurisdição, não se defendem direitos, tampouco se atinge a Justiça. É ele o
responsável por concretizar a Justiça, buscar sua efetividade, do plano etéreo para o
plano prático das relações humanas.
Na busca desse intento, não age em nome próprio, mas vale-se de seu
conhecimento e técnica para representar e defender os interesses de outrem, servindo-se,
para tanto, de todos os instrumentos que o Direito garante à sua atuação. Seu trabalho
recebe o status de munus publicum, de uma função social claramente transformadora.
Da singeleza e importância da função que o advogado desenvolve é que
decorre a necessidade de serem preservadas suas atitudes, na busca pela plena satisfação
do direito de seu constituinte e da sociedade, por ele, indiretamente, representada.
A fim de melhor proteger não só a atividade do advogado, como também os
direitos daqueles por ele defendidos, surgiram as prerrogativas, que nada mais são que
certos direitos e garantias a que todos os advogados fazem jus em virtude da gama de
interesses com que lidam.
Não se trata de meros privilégios de categoria profissional (MAMEDE, 1990,
*
Advogado em Franca/SP, ex-Conselheiro Seccional da OAB/SP, ex-Presidente da 13ª Subsecção da
OAB/SP e Presidente da Associação dos Advogados de Franca.
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p. 175), porquanto são direitos indiretamente conferidos a uma coletividade. No dizer de
Ruy A. SODRÉ, não resultam puramente de interesse pessoal, mas são outorgadas à
Advocacia em função do trabalho a que o advogado se submete e da missão que este
desempenha na sociedade (1975, p. 571). Ou seja, elas nada mais são que garantias de
que o exercício da Advocacia sobrevive, principalmente se considerarmos que o arbítrio
e o autoritarismo ainda fazem vozes em nossos meios e se apresentam com nova
roupagem mudando os agentes, apenas. Hoje esse papel restou ampliado e claramente
disposto na Lei nº 8.906/94.
Por outro lado, impende salientar que não se trata, também, de direito
disponível do advogado, porquanto, em razão da natureza público-subjetiva das
prerrogativas, elas estão indissociavelmente ligadas à atividade advocatícia, ao simples
exercício da profissão. Não pode o advogado recusar-se a recebê-las "porque ele é o
intermediário entre o Juiz e o povo, e seu ofício não teria a menor condição de
sobreviver sem independência e intocabilidade" (FERNANDES, 1974, p. 32).
Destaca-se, portanto, que as prerrogativas retiram sua legitimidade da natureza
eminentemente vicária da atividade advocatícia e do dever de socorrer os interesses
sociais. Daí afirmar-se que não é possível proteger a coletividade sem deixar de proteger
aquele que a representa. Com efeito, tal raciocínio resulta na lógica de que o ofício do
advogado está imune a censuras caprichosas, embora seja certo que os excessos
cometidos no exercício da profissão serão punidos pelo órgão disciplinar específico1.
Dessa maneira, diante de uma ameaça a tais direitos, exige-se que o próprio
titular se proteja, vale dizer: o principal defensor das prerrogativas é o próprio
advogado. Sobre seus ombros é que recai, de forma mais incisiva, o ônus de zelar pelas
prerrogativas que a legislação atribui a si e a toda a classe. Ademais, a regra é que todos
os advogados sejam os fiéis defensores das prerrogativas da Advocacia, ainda que o
ofendido seja colega seu.
Ora, para defender as prerrogativas é necessário conhecê-las a fundo, saber
quais as suas principais expressões, e principalmente, como protegê-las e de que
maneira conduzir-se no exercício da profissão. A advocacia se transforma. O advogado
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No caso brasileiro, a Ordem dos Advogados do Brasil, através dos Tribunais de ética Disciplinar,
instituídos em cada Seccional é quem julga a conduta dos advogados que se desviam dos preceitos do
Código de Ética e Disciplina, incumbindo também à Ordem a aplicação das punições disciplinares
estatutariamente previstas, sem prejuízo da responsabilização civil e criminal, conforme a gravidade do
caso.
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já não exerce a profissão isoladamente, mas em grupo. Essas mudanças devem ser
contempladas e acompanhadas por todos, de forma a fortalecer a classe e propiciar a
efetivação das prerrogativas.
1.1. Das prerrogativas
É certo que não se deve confundir prerrogativas com privilégios pessoais dos
advogados, uma vez que elas são instrumentos para o exercício da função de advogado.
Traduzem-se num feixe de direitos legalmente assegurados ao advogado a fim
de lhe garantir atuação eficaz e plena, razão porque seu fulcro encontra-se difuso por
toda a classe (MAMEDE, 1990, p. 175).
A natureza das prerrogativas é eminentemente pública. É um direito
público subjetivo do advogado, sendo importante destacar que a existência dessas
prerrogativas não prejudica as garantias e direitos de que este dispõe enquanto cidadão,
quais sejam, o respeito às convicções, à liberdade de expressão, à igualdade, à
dignidade, entre outros.
O presente texto tem a pretensão de enfocar, tão-somente, a prerrogativa que o
advogado possui de manifestar-se de forma independente e livre, com destemor em
cumprimento ao quanto dispõe o art. 1º, inc. I e II , da Lei nº 8.906/94.
1.2. Liberdade de exercício
Dentre as mais importantes prerrogativas inerentes ao exercício da profissão, a
partir da qual se desenvolvem todas as demais, está aquela que assegura ao advogado
plena liberdade no exercício de sua profissão, em todo o território nacional.
Com efeito, tal liberdade está em conformidade com o preceito constitucional
segundo o qual é livre o exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer (CF, art. 5o, XII). No caso da
Advocacia, contudo, a liberdade alcança patamares ainda mais elevados, vale dizer: a
liberdade não é apenas uma garantia para que o profissional exerça sua atividade, é
antes um pressuposto dela, requisito ínsito à profissão. Conforme clássica lição de Ruy
Sodré, "o advogado é livre, só prestando contas à própria consciência" (1975, p. 574).
A prática da Advocacia não é apenas o exercício de mais uma atividade
profissional, como as demais, as quais merecem nosso mais profundo respeito. É, na
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verdade, um serviço público, um munus publicum com uma função social muito bem
definida, qual seja, a de representar e defender os interesses não apenas individuais
como sociais, contribuindo, de forma contundente à administração da Justiça e à
construção da cidadania (COMPARATO, 1984, p. 267).
Nessa esteira, o papel do advogado reveste-se de uma tônica diferente daquele
exercido pelos demais operadores e aplicadores do Direito, vez que, se por um lado o
Ministério Público atua em nome do Estado e da sociedade, fiscalizando a correta
aplicação da lei, promovendo a Justiça, e se o juiz aplica a lei, emprestando sua voz ao
Estado em cada caso concreto, a função do advogado transcende da mera aplicação, da
mera legalidade. É ele quem age em nome de outro e o defende, defendendo
indiretamente toda a sociedade que assiste à lesão a um direito. O ministério
exclusivamente privado da Advocacia dá lugar à defesa de interesses difusos e
coletivos, seja através da atuação em dissídios coletivos de trabalho ou, ainda, através
da ação popular. A Advocacia moderna abre-se, principalmente, para a defesa dos
interesses sociais. Por isso, a ele deve-se atribuir legitimidade, ainda que concorrente,
para aforar ações civis públicas, para a proteção de direitos difusos ou homogêneos.
Por outro lado, não se pode negar que a atividade do advogado está
intimamente ligada à independência da OAB, a qual sempre ocupou seu papel de
paladina defensora das liberdades e garantias públicas ao longo da história brasileira.
Assim como a OAB não pertence a nenhuma categoria estatal, nem a um dado
fragmento da sociedade civil, o advogado não pode ser tido como representante de uma
dada parcela social, senão da sociedade em seu todo.
Dessa sorte, pertencendo a uma categoria profissional autônoma e
independente, outra não poderia ser a conduta exigível do advogado senão de autonomia
e independência. O advogado não deve sujeitar-se à Magistratura, nem ao Ministério
Público, tampouco à parte contrária ou ao seu cliente2. O exercício da Advocacia está a
exigir atores que respeitem os demais partícipes da peça judicial, que os tratem com a
devida consideração e urbanidade, mas que, acima de tudo, façam respeitar suas
prerrogativas, as quais, conforme já dito, não se referem à sua pessoa, mas à função que
exercem, enfim, à cidadania.
A advocacia é uma profissão de coragem e altivez, não sendo admissível que o
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Nesse sentido, ver acr. 131.399-3 do TJSP – Rel. Des. Bittencourt Rodrigues – j. 07.11.1994.
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advogado, temendo uma atitude mais ríspida ou desrespeitosa de alguns magistrados,
submeta-se ao arbítrio, sob pena de perderem-se todas as conquistas pelas quais nossos
colegas anteriormente lutaram, enfim, sob pena de padecer a Justiça (GOMES, 1990, p.
09). Do advogado espera-se força para que não ceda às pressões e formas de ingerência
que tentam desviar o processo de seu real destino: a verdade e a Justiça.
Cumpre também asseverar que, assim como os advogados autônomos devem
portar-se com objetividade e independência, o mesmo espera-se dos advogadosempregados das empresas, dos advogados públicos, vez que nada justifica sua
submissão e subordinação. Apenas a subordinação econômica - ainda assim, com
ressalvas – é que se aceita nos empregados advogados. Ademais, a isenção técnica de
que gozam no exercício de suas atividades atesta ainda mais a imperiosa necessidade de
independência de todo profissional (EAOAB, art. 18, par. único).
Na grande maioria dos casos, o desrespeito às prerrogativas dos advogados
provém de membros da Magistratura e do Ministério Público. Em que pese a
combatividade e a energia que devem ser empregadas pelo advogado no exercício de
seu mister, é de se observar que, na prática, muitos deles, tanto os mais novos como os
mais experientes, receiam fazer consignar seus protestos, temem peticionar requerendo
redesignação de audiência, requerer diligência ou dilação de prazo, por exemplo, ainda
que com motivo justificado, por temor ao talante de alguns julgadores.
No mais das vezes, os magistrados são jovens, recém saídos dos bancos
acadêmicos e conservam ainda um certo orgulho e uma certa altivez, esquecendo-se de
que a Constituição consagrou aos advogados e demais órgãos essenciais à Justiça
independência, e não subordinação, sendo enfática ao estabelecer que não há hierarquia
entre órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Advocacia.
Esse tratamento indigno e achincalhado que compromete de forma tão severa o
exercício de nossa profissão, não pode ser aceito por nenhum de nós, advogados.
Fundamental que não apenas o neófito, como também o experiente patrono, tenham
consciência de suas prerrogativas e saibam defendê-las quando ofendidos em sua
função, comunicando o fato à Subsecção da OAB, ou mesmo à Seccional na qual
estejam inscritos, solicitando a assistência da entidade de classe que o representa e, em
sendo o caso, o desagravo, conforme a relevância da ofensa.
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1.3. Inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações
Consoante dispõe o art. 2o, § 3° da Lei n° 8.906/94, o advogado possui
imunidade no exercício de sua profissão:
"Art. 2° - O advogado é indispensável à administração da justiça.
§ 3° - No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e
manifestações, nos limites desta Lei". (grifamos)
Caso não se reconheça que o advogado possui imunidade no que se refere aos
seus atos e manifestações, não atuará ele com a independência, autonomia e liberdade
que são necessárias para o exercício profissional. Não deve ele deter-se na emissão de
opinião acerca daquilo de que está efetivamente convencido. Ninguém pode ser
processado ou condenado por emitir opinião.
Tal prerrogativa não é um privilégio do advogado, mas trata-se, por outro lado,
de verdadeira garantia para que possa realizar a função constitucional que ele está
adstrito a cumprir, velando pela defesa da própria sociedade e contribuindo para a
realização efetiva da justiça, nos moldes estabelecidos no art. 133 da Constituição
Federal.
Perfilhando-se acerca deste assunto, o Eminente Juiz Ênio Santarelli Zuliani
assim se posiciona:
"A imunidade não é um privilégio corporativista; é uma bandeira erguida para
defesa da soberania da função, sem o que o profissional não se encoraja na luta pela
preservação da liberdade e dos demais direitos alheios" (ZULIANI, 2003, p. 127).
Nesse sentido, também, a mensagem do ex-Min. Sydney SANCHES, do
Supremo Tribunal Federal, emitida quando do IV Seminário de Valorização
Profissional do Advogado:
"E exercido (advocacia) com a segurança necessária, para que o advogado não
se atemorize diante dos poderosos, dos truculentos e dos arbitrários, pois esse temor
enfraquece a defesa do direito de seu constituinte e repercute na obtenção da verdadeira
Justiça" (RT 648/249).
Mister transcrever, na íntegra, a ementa do RHC n° 7.165/RO, julgado pelo
Superior Tribunal de Justiça, que acabou por determinar o trancamento da ação penal
promovida em face de Procuradora do Estado, prestigiando a tese de que o advogado
possui autonomia e independência no exercício de sua profissão, não podendo ser
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processado e julgado pela prática de atos e manifestações em conformidade com a
ordem
jurídica
e
com
as
normas
que
regulamentam
a
sua
profissão.
RHC - DISPENSA DE LICITAÇÃO - PACIENTE QUE,
NA QUALIDADE DE PROCURADORA DO ESTADO,
RESPONDE CONSULTA QUE, EM TESE, INDAGAVA
DA POSSIBILIDADE DE DISPENSA DE LICITAÇÃO DENÚNCIA COM BASE NO ART. 89, DA LEI N° 8.666/93
- ACUSAÇÃO ABUSIVA - MERO EXERCÍCIO DE SUAS
FUNÇÕES, QUE REQUER INDEPENDÊNCIA TÉCNICA
E PROFISSIONAL.
1. Não comete crime quem, no exercício de seu cargo, emite
parecer técnico sobre determinada matéria, ainda que pessoas
inescrupulosas possam se locupletar às custas do Estado,
utilizando-se desse trabalho. Estas devem ser processadas
criminalmente, não aquele.
2. Recurso provido, para trancar a ação penal contra o paciente.
(STJ - 6a T. - RHC - 7.165/RO - Min. Rei. Anselmo
Santiago).
E continua o relator do v. acórdão acima mencionado a expor, de forma
bastante taxativa, no que consiste a denúncia de advogados que se cingem a emitir mero
parecer técnico, atuando de forma independente: "Fácil é de ver que a denúncia é
despropositada, abusiva até. Não é plausível a persecutio criminis contra quem
simplesmente, no pleno exercício de suas funções, emite opinião sobre matéria teórica".
Este também é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, ao deferir
Mandado de Segurança interposto em favor de advogado parecerista, garantindo a
inviolabilidade das prerrogativas do advogado:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL
DE CONTAS. TOMADA DE CONTAS: ADVOGADO.
PROCURADOR. CF, ART 70, PARÁGRAFO ÚNICO,
ART. 71, II. ART. 133. LEI Nº 8.906, DE 1994, ART. 2º, § 3º,
ART. 7º, ART. 32M ART. 34, IX.
1. Advogado de empresa estatal que, chamado a opinar, oferece
parecer sugerindo contratação direta, sem licitação, mediante
interpretação da lei das licitações. Pretensão do Tribunal de
Contas da União em responsabilizar o advogado solidariamente
com o administrador que decidiu pela contratação direta.
Impossibilidade, dado que o parecer não é ato administrativo,
sendo, quando muito, ato de administração consultiva, que visa
a informar, elucidar, sugerir providências administrativas a
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serem estabelecidas nos atos de administração ativa. Celso
Antônio Bandeira de Mello, “Curso de Direito Administrativo”,
Malheiros Ed., 13ª ed., p. 377.
2. O Advogado somente será civilmente responsável pelos danos
causados a seus clientes ou a terceiros, se decorrentes de erro
grave, inescusável, ou de ato ou omissão praticado com culpa
em sentido largo: Cód. Civil, art. 159; Lei nº 8.906/94, art. 32.
3. Mandado de Segurança deferido.
(STF – MS 24.073-3 - DF, Rel. Min Carlos Velloso, j.
06.11.02, v. u.)
Por fim, reproduz-se decisão proferida pelo Tribunal Regional Eleitoral de São
Paulo, em ação de “Habeas Corpus” impetrada em favor de advogado acusado de
cometer crimes previstos no Código Eleitoral e na Lei nº 9.666/93, em virtude de ter
emitido parecer tido como infundado, dirigido à Administração Pública, favorável à
contratação de serviço público sem a necessidade de processo licitatório:
HABEAS CORPUS. CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS
89, DA LEI Nº 9.666/93, ART. 1º, II, V, E IX, DO DECRETOLEI Nº 201/67 E ARTIGO 299 DO CÓDIGO ELEITORAL.
CONEXÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL.
ADVOGADO. PARECER TÉCNICO. DISPENSA DE
LICITAÇÃO. ATOS E MANIFESTAÇÕES. FALTA DE
JUSTA CAUSA CARACTERIZADA. TRANCAMENTO DO
PROCESSO. ORDEM CONCEDIDA.
(TRESP HC Nº 10 – Pedregulho - Rela. Juíza Suzana
Camargo, j. 23.11.2004).
Em seu voto a Relatora afirma que “as provas carreadas nos autos dão conta de
que a conduta do paciente se resumiu a proferir o apontado parecer, não havendo
qualquer indício de que tenha agido em concurso com a pessoa de D. P. no tocante à
ilegal dispensa do certame”. E, mais adiante, deixa claro seu posicionamento, ao
reconhecer a inviolabilidade e independência do advogado no exercício da profissão:
Independência esta que quer dizer, gramatical e filosoficamente, liberdade,
livre arbítrio, não sujeição a outros, nem a idéias de outros....porque o
advogado a ninguém está sujeito, de ninguém depende, é livre de se
determinar....
Assim é que, sob esses ângulos enfocados, a denúncia ofertada apresenta-se
em descompasso com a ordem constitucional e infra-constitucional vigente,
não sendo plausível acusar-se alguém da prática de crime por haver, no
exercício de suas funções, emitido parecer técnico, devendo a ação punitiva
recair sobre aqueles que se utilizaram mal do parecer, para praticar, em tese,
crime de corrupção.
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1.4. Inviolabilidade no exercício de mandato nas entidades de classe, nos Tribunais
de Ética.
No exercício do mandato, nas entidades de classe como a OAB, em suas várias
posições hierárquicas, o advogado ao praticar atos funcionais típicos não responde nem
civil, nem criminalmente por tais atos.
É que, além de estar protegido, como advogado que é, pela inviolabilidade de
suas manifestações, nos limites da Lei, a função por ele exercida como que amplia essa
garantia de inviolabilidade, porque deixa de ser só um direito, mas uma obrigação de
agir, em nome de classe que representa, ou então frente ao próprio cargo, como
acontece com os julgadores do Tribunal de Ética.
Um Presidente de Seccional ou de Subseccional quando representa contra uma
autoridade relapsa ou faltosa, apontando atos praticados ou omissões nocivas à
sociedade, ou à própria administração da Justiça, não comete crime, não pratica ilícito
civil e muito menos administrativo.
Se agir em consonância com a Lei não tem satisfação alguma a dar a tais
autoridades, eis que é da essência de sua função a prática da tal ato. Este é o
entendimento do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, cuja decisão foi proferida em
sede de Habeas Corpus, concedendo a ordem e determinando o trancamento da ação
penal movida contra advogado, membro da Comissão de Disciplina da OAB, por falta
de justa causa:
HABEAS CORPUS. CRIME DE INJÚRIA PROFERIDA
CONTRA MAGISTRADO DO TRABALHO. CRÍTICA
GENÉRICA
EXARADA
EM
AUTOS
DE
PROCEDIMENTO DISCIPLINAR NA ORDEM DOS
ADVOGADOS. IMUNIDADE. RECONHECIMENTO.
AÇÃO PENAL TRANCADA.
1. Nos crimes contra a honra de funcionário público não pode o
Ministério Público agir sem a representação da parte ofendida.
A representação oferecida por entidades de classe só é
admissível se os crimes forem cometidos por meio da imprensa.
2. O advogado é inviolável no exercício de suas atividades, em
juízo ou fora dele. Em autos de procedimento disciplinar
instaurado contra advogado perante seu órgão de classe os
membros da Comissão de Ética e Disciplina exercem múnus
público, e atos privativos de advogado, estando assim cobertos
pela imunidade prevista no art. 133 do texto constitucional, nos
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artigos 2º, parágrafo 3º, e 7º, parágrafo 2º, do Estatuto da
Advocacia e no artigo 142, I, do Código Penal.
3. Opiniões desfavoráveis genéricas a respeito da conduta de
uma classe de profissionais, se não proferida por meio de
imprensa, não confere legitimidade a um único membro dessa
classe para, sentindo-se ofendido em sua honra subjetiva,
representar ao Ministério Público. Ademais, a configuração da
injúria não pode ter como único parâmetro as susceptibilidades
do suposto ofendido, devendo-se buscar o sentido das
expressões tidas por injuriosas no senso comum, normal e
razoável.
4. Ordem concedida.
(TRF3 - 2ª T., HC nº 98.03.007704-0, Rel Desa. Sylvia
Steiner, j. 23.03.1999).
É prerrogativa da função de dirigente da classe dos advogados a comunicação
de fatos aos superiores hierárquicos de autoridades, de sorte a coibir ilegalidades
praticadas ou omissões intoleráveis.
O advogado em particular tem tais deveres, mas ao dirigente de entidade é
obrigatória a comunicação de atos ilegais, pena de prevaricar, tais as responsabilidades
perante a classe e a própria cidadania que representa.
É tão importante a função de dirigente da OAB, que os serviços prestados são
classificados como serviço público relevante “inclusive para fins de disponibilidade e
aposentadoria” (v. art. 48 da Lei nº 8.906/94).
Sendo dessa relevância a função, é claro que esse tempo de serviço há de ser
contado como “público” para aquele dirigente que passe a prestar serviço como
funcionário público, como membro do judiciário, do Ministério Público, por concurso
público, ou membro do Judiciário, pelo quinto constitucional.
Então, relevante o serviço, nada mais justo que se lhe atribua as qualidades da
imunidade e inviolabilidade, de sorte a permitir-lhes a livre prática de atos
indispensáveis ao cumprimento dos fins precípuos da OAB (art. 44, incisos I e II e §§ 1º
e 2º, da Lei nº 8.906/94).
Também por isso, eventual excesso verbal praticado em representações
administrativas, que porventura atinjam melindres, suscetibilidades das autoridades
representadas, não podem ser usadas como motivo de ações indenizatórias, por ofensa à
moral da autoridade. Não obstante, o dirigente da OAB deve se controlar no exercício
da função, dosando o uso das palavras e expressões, não deixando, porém, de reagir
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firme e contrariamente às irregularidades detectadas, permanecendo sempre dentro dos
limites do ético e do legal. Não se deve deixar levar pela ânsia em solucionar os
problemas.
Se, exemplificando, um Presidente de Seccional da OAB representar contra um
juiz, perante a Corregedoria, e disser que pelas atitudes aquele magistrado tem sido
imparcial, - e isto é voz corrente -, está apenas cumprindo a obrigação de comunicar o
fato. Cabe ao Tribunal investigar e usar os seus poderes investigatórios e certificar-se da
verdadeira situação.
Não está o denunciante cometendo infração alguma, mas cumprindo uma
função precípua de velar pelo cumprimento da lei e pela boa administração da Justiça.
Se o Tribunal averiguar a representação, não caberá ação contra o dirigente da OAB.
Ocorrendo retaliação ou ações contrárias aos dirigentes da OAB, os fins da
entidade não poderão ser cumpridos, e inibidas estarão as ações dos dirigentes, seja por
ameaça de ações de indenização, seja por outros tipos de processos.
A liberdade, bem como a imunidade e inviolabilidade não podem ser
suprimidas sob pretexto algum, senão as autoridades agirão despoticamente,
ditatorialmente, inibindo as ações fiscalizadoras da entidade de classe, que tem como
fim precípuo defender a boa aplicação das leis, a administração rápida da justiça e a
defesa de ordem jurídica e da constituição.
Toda a fiscalização disciplinar fica afeta à OAB, com exclusividade, de sorte
que eventuais excessos a ela incumbe penalizar.
2. Parecer. Consulta. O que é um e outra.
O parecer é opinião, ponto de vista sobre alguma questão. Segundo Houaiss
parecer é opinião de um especialista em resposta a uma consulta. Parecer jurídico, nas
palavras de José Lopes ZARZUELA, "é opinião emitida por um jurisconsulto sobre
uma questão de ordem jurídica, a qual, baseada em razões doutrinárias e legais, conclui
por uma solução que deve ser adotada no caso em questão e que traduza concepção de
seu autor. Em regra, o parecer jurídico é provocado por uma consulta, na qual o
consultante evidencia os pontos discutíveis ou controvertidos da questão a serem
analisados e debatidos pelo consultado" (1957, p. 118).
O parecer lavrado por advogado, sobretudo no que diz respeito a questões
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atinentes à Administração Pública, não tem qualquer caráter de vinculação. Isto porque
o parecer, conforme definição acima trazida à baila, é meramente opinativo, não
vinculando, de forma alguma, a Administração, que pode optar pelo caminho
mencionado no parecer ou não.
Neste sentido, vale destacar o sempre atual posicionamento de José
CRETELLA JÚNIOR, observando o que vem a ser o parecer facultativo solicitado pela
Administração Pública:
Pareceres facultativos são os que a Administração solicita sem nenhuma
norma, legislativa ou regulamentar, que a obrigue, e, pois, apenas fundada na
oportunidade, discricionariedade valorada, de ouvir a opinião do órgão
consultivo. Nem mesmo existe dever da Administração de ater-se ao
conteúdo do parecer; ao contrário, tais pareceres são, de regra, destituídos de
qualquer relevância jurídica, no âmbito externo (p. 377-378).
Na verdade, o administrador, em ato próprio e discricionário, decide acerca das
questões referentes à gestão pública. Trata-se, sempre, de ato praticado pelo
administrador, único que tem competência para se manifestar a respeito da prática de
determinado ato, quer utilizando-se dos fundamentos da opinião legal do advogado,
quer não seguindo o seu posicionamento. Corroborando com o entendimento acima
sufragado está o voto do Min. Anselmo Santiago, do E. Superior Tribunal de Justiça,
que observa que quem emite parecer, que se consubstancia em ato técnico, não pode ser
punido pela sua má ou transviada utilização:
"Jamais quem manifestou sua opinião, em tese, repita-se, sobre
determinada matéria, no mero exercício de suas funções, parecer
esse que, além do mais, não vinculava a Administração Pública,
que dele poderia discordar, deixando, de lhe dar efeitos
concretos" (STJ - RHC n. 7165/RO).
3. Responsabilidade criminal do advogado pela elaboração de pareceres
A doutrina e a jurisprudência têm dedicado uma parte substancial de tempo,
versando sobre a questão da possibilidade de imputação de responsabilidade penal pela
emissão de parecer por parte de advogado, sempre em concurso de agentes com quem
praticou determinado delito.
Maria Sylvia Zanella DI PIETRO tratou sobre a responsabilidade do advogado
que profere entendimento dispensando ou inexigindo a licitação. É este o entendimento
por ela esposado:
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Há que se atentar, no entanto, para o fato de que as leis, muitas vezes,
admitem interpretações diversas; não se pode concluir, em grande parte dos
casos, que um ato acarrete responsabilidade só porque a interpretação adotada
pelo Tribunal de Contas é diferente daquela adotada pelo advogado que
proferiu o parecer. Se o parecer está devidamente fundamentado, se defende
tese aceitável, se está alicerçado em lição de doutrina e jurisprudência, não há
como responsabilizar o advogado ... Em assunto tão delicado e tão complexo
como a licitação e o contrato (principalmente diante de uma lei nova, não tão
bem elaborada e sistematizada como seria desejável), a responsabilidade só
pode ocorrer em casos de má-fé, dolo, culpa grave, erro grosseiro, por parte
do advogado (2001, p. 163).
Rui STOCO, comentando a Lei de Licitações, assegurou que
competência e atribuição de autorizar a não realização de certame são
exclusivas da autoridade a que a lei cometeu a tarefa ... Essa a razão pela qual
afirmamos que os agentes que atuam nas fases intermediárias do
procedimento não são sujeitos ativos do crime em estudo ... A indagação é se
esses pareceristas vinculam-se ao ato e respondem pelo crime previsto no art.
89 da Lei 8.666/93. A resposta é negativa ... a manifestação adequada,
juridicamente assentada, de acordo com as questões líricas, apresentada com
independência e calcada em entendimento jurídico razoável e defensável, não
pode merecer punição, nem se amolda ao preceito penal em estudo. Isto só
pela razão de que a autoridade competente para a dispensa pode, ou não,
acolher o parecer; adotá-lo ou repeli-lo. Poderá, ainda, consultar outras
pessoas e solicitar outros pareceres. Caso aprove o parecer, a
responsabilidade será exclusivamente sua (grifamos).
Portanto, não há fundamento para a propositura de ação penal contra
advogados, pela prática de eventual crime em concurso de agentes com os
administradores públicos. Nos casos em que os advogados são indiciados em razão
deste fato, vislumbra-se flagrante ausência de justa causa, porquanto é impossível
estabelecer a ligação da conduta do advogado (lícita, porquanto estribada no
exercício autônomo da profissão) à suposta conduta ilícita do administrador (não
vinculada ao parecer exarado pelo advogado).
A isto tudo se alia a determinação legal, que todo profissional ocupante do
ministério da advocacia deve respeitar, qual seja, a independência e o direito de
exercer com liberdade a profissão, tal qual preceituado no art. 7º, inc. I, da Lei n°
8.906/94.
Ademais, à atuação do advogado, no exercício pleno de seus direitos de
advogar, "não se pode atribuir nada", esta é a lição de Günther JAKOBS (2000, p.
58).
A conduta do advogado, nestes casos, não é injusta, mas sim decorrente do
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direito que ele tem de exercer livremente a profissão de advogado e de oferecer
opinião jurídica, como ato privativo seu (consoante o art. 1°, da Lei 8.906/94).
Pelo que foi até o presente momento exposto, vislumbra-se que não há
responsabilidade, no campo penal, de advogado que se cinge meramente a elaborar
parecer ou opinião legal a respeito de determinada matéria, ainda que proferido em
processo licitatório ou de dispensa de licitação, ou outros processos administrativos.
O advogado fica fora do alcance da Lei, e também, com mais razão, ficam fora os
advogados dirigentes de classe, quando praticam atos decisórios, ou em
cumprimento de função pública que exerce. Os votos proferidos em processos
disciplinares e pareceres neles oferecidos, de igual forma, estão fora do alcance de
qualquer lei incriminadora.
4. Responsabilidade civil
No que tange à responsabilização em âmbito cível do advogado face à
emissão de pareceres e consultas no âmbito administrativo, também se observa a
ausência total de responsabilidade por parte do profissional da advocacia.
Há uma tendência em se atribuir ao advogado responsabilidade civil
solidária com os administradores e agentes públicos face às decisões e atos
administrativos concretizados por estes, pois o conteúdo dos pareceres seria o
fundamento para a realização dos atos. No entanto, como já afirmado, estes
pareceres não se vinculam aos atos administrativos emanados da Administração
Pública, posto que são elaborados pelos advogados pareceristas no exercício de sua
função constitucionalmente garantida.
O Código Civil de 2002, em seu artigo 186, traz a definição legal de ato
ilícito, sendo aquele cometido por alguém que, por dolo ou culpa, viole direito ou
cause dano a outrem. Por outro lado, o Código de Defesa do Consumidor dispõe que
“a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante
verificação de culpa” (art. 14, §4º).
Nesse sentido, para a atribuição de responsabilidade civil ao advogado
parececista, é necessário que seja cabalmente provada sua conduta culposa, que
tenha concorrido para a ilegalidade de ato praticado por administrador público. A
responsabilidade é subjetiva, e condicionada à comprovação da omissão,
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negligência ou desídia do advogado. Do contrário, está totalmente isento de
responsabilidade, até porque o art. 188 do Código Civil de 2002 deixa claro que não
constituem atos ilícitos “os praticados em legítima defesa ou no exercício regular
de um direito reconhecido” (inciso I) (grifamos).
O exercício da advocacia está legalmente reconhecido e respaldado pela
Constituição Federal, art. 133 e pela EAOAB, art. 7º, inciso I. Sendo assim, o
profissional da advocacia não comete nenhum ato ilícito quando elabora pareceres e
responde a consultas e, consequentemente, não pode ser responsabilizado civilmente
em razão de exercício de sua profissão.
Este entendimento, contudo, não se aplica nos casos em que o advogado
tenha agido intencionalmente, havendo disposição expressa no Estatuto da OAB, no
art. 32 e seu parágrafo único.
5. Responsabilidade administrativa
O exercício regular da advocacia é regulado pela Ordem dos Advogados do
Brasil, que tem a competência e o poder de fiscalizar e, se necessário, punir os
advogados que desrespeitam as disposições do EAOAB e do Código de Ética e
Disciplina. Por se tratar de órgão de classe, que a regulamenta e fiscaliza, as sanções
aplicadas aos inscritos em seus quadros são de caráter administrativo. Nesse sentido,
a responsabilização do advogado parecerista restringe-se ao descumprimento das
normas que regulam a profissão, em especial o art. 32 da Lei nº 8.906/94.
O referido artigo dispõe que o advogado é responsável pelos atos que
pratica no exercício de sua profissão, culposa ou dolosamente. O profissional da
advocacia é inviolável no exercício de suas funções, e sua independência é garantida
constitucionalmente. Por isso, somente quando comprovados, à farta, estes
elementos caracterizadores da conduta ilegal, tal como se exige no âmbito da
responsabilização civil, é possível se lhe aplicar punição. Do contrário, não há que
se falar em responsabilidade administrativa, posto que o advogado é livre para a
emissão de pareceres e consultas, respeitadas as normas que regem a classe. Além
disso, a responsabilidade administrativa deve ser necessariamente apurada em
procedimento próprio, respeitando os princípios do devido processo legal e da ampla
defesa.
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De igual forma, não há como responsabilizar administrativamente o
advogado parecerista que, no exercício de sua profissão, elabora pareceres e
consultas para a Administração Pública, com base na Lei nº 8.112/90, que trata dos
servidores públicos.
O art. 124 da referida Lei dispõe expressamente que “a responsabilidade
civil-administrativa resulta de ato omissivo ou comissivo praticado no desempenho
do cargo ou função” (grifamos). Nesse sentido, vê-se que somente a comprovação
da conduta culposa ou dolosa praticada pelo advogado, no exercício profissional, é
capaz de responsabilizá-lo pelos fatos decorrentes de suas atitudes. A simples
emissão de opinião, através de parecer fundamentado, e que não vincula as decisões
tomadas pelo administrador, não possibilita aplicação de punição ao profissional.
O advogado, portanto, não pode ser responsabilizado administrativamente
pela emissão de pareceres e consultas para a Administração pública, uma vez que,
ao fazê-lo, está exercendo livremente sua profissão.
6. Fiscalização do exercício profissional
Os atos praticados pelos advogados no exercício de sua profissão devem ser
fiscalizados pela Ordem dos Advogados do Brasil, uma vez que é o órgão responsável
pela organização da classe. O dever de fiscalização é uma incumbência da OAB, assim
como ocorre com o CRECI, CREMESP, CRC, e outras entidades de fiscalização de
exercício profissional.
É de fundamental importância que a Ordem atue firmemente no sentido de
divulgar e esclarecer os advogados acerca de suas prerrogativas e do grau de
responsabilidades relacionadas ao exercício da profissão, como a emissão de pareceres e
consultas, de forma a impedir a ingerência do Ministério Público e dos Juízes nas
opiniões emitidas pelos advogados, posto que não têm condição de avaliar a conduta
destes e aplicar-lhes sanção alguma.
Os atos praticados pelos agentes públicos após a consulta a parecer emitido por
advogado não vinculam este último aos seus resultados, muito menos acarreta em
responsabilidades, sejam elas penal, cível ou administrativa, exceto nos casos em que há
a comprovação de dolo ou culpa por parte do causídico.
Assim, somente um controle e fiscalização atuante da OAB permitirão a correta
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apuração das reais responsabilidades de seus inscritos e, consequentemente, promoverão
o fortalecimento da classe. A fiscalização intensa e profissionalizada não é exercida pela
OAB, que se mantém eqüidistante, aguardando eventuais denúncias. Esse é um de seus
erros, porquanto a fiscalização preventiva há de ser exercida com freqüência, de sorte a
melhorar a imagem da classe perante a sociedade.
7. Conclusões
Diante de todo o exposto, concluímos que é dever de todo advogado e também
da Ordem dos Advogados do Brasil defender os membros da classe quando ofendidos
em seus direitos e prerrogativas. O exercício profissional da advocacia é um direito
garantido pela Constituição Federal de 1988, um munus publicum, que deve ser
plenamente efetivado, sob pena de violação das liberdades de opinião e trabalho do
advogado.
Assim, a emissão de pareceres e consultas para órgãos da Administração
Pública, a pedido desta, não poder servir de elemento para instauração de eventual ação
penal, ou para apuração de responsabilidade civil-administrativa, pois nem o advogado
parecerista, nem seu parecer estão vinculados ao ato administrativo emanado do órgão
público.
Os casos de caracterização da conduta dolosa ou comprovadamente culposa do
profissional devem ser apurados pela OAB e, se efetivamente constatada a
irregularidade, a punição deve ser dada por este órgão de classe, valendo-se do seu
dever de fiscalização e disciplina da classe e sempre se obedecendo aos princípios do
contraditório e do devido processo legal.
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