Aeroporto Francisco Sá Carneiro, 2012 – 2020

Transcrição

Aeroporto Francisco Sá Carneiro, 2012 – 2020
Aeroporto Francisco Sá Carneiro,
2012 – 2020: previsão de movimento
e recomendações de governance
num cenário de privatização
Elaborado pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto
para a Área Metropolitana do Porto
com o apoio de
Aeroporto Francisco Sá Carneiro,
2012-2020: previsão de movimento
e recomendações de governance
num cenário de privatização
Junta Metropolitana do Porto
9 de outubro de 2012
Faculdade de Economia da Universidade do Porto | Rua Dr. Roberto Frias, 4200-464 Porto
T. 351 22 557 11 00 | F. 351 22 550 50 50 www.fep.up.pt
1
Equipa Técnica
João F. Proença (Coordenador)
Óscar Afonso
Pedro Mazeda Gil
Rui Henrique Alves
ii
Índice
Sumário executivo
1
Introdução
6
1. Alterações recentes no domínio do transporte aéreo internacional
8
2. Procura de passageiros e carga no Aeroporto Francisco Sá Carneiro
11
2.1. Movimento de passageiros
11
2.1.1. Evolução histórica recente
11
2.1.2. Previsão do movimento de passageiros
14
2.2. Movimento de carga
18
2.2.1. Evolução histórica recente
18
2.2.2. Previsão do movimento de carga
21
2.3. O AFSC no contexto do noroeste peninsular
26
3. Modelos de governance, potenciais efeitos da privatização da ANA e
principais recomendações
3.1. Estruturas de governance e performance dos aeroportos
30
30
3.1.1. Benefícios e custos dos processos de privatização
31
3.1.2. Gestão em rede versus gestão separada
33
3.1.3. Coordenação com os interesses e parceiros regionais e locais
35
3.2. Recomendações a propósito do Aeroporto Francisco Sá Carneiro
37
Referências
43
Apêndice
46
iii
Índice de Tabelas
Tabela 2.1. Movimento de passageiros no AFSC, 1990-2011
12
Tabela 2.2. Tráfego de passageiros por companhia no AFSC, 2006 e 2010
13
Tabela 2.3. Previsões disponíveis para o movimento de passageiros no AFSC
14
Tabela 2.4. Movimento de passageiros no AFSC – previsão própria para 2012-2020
17
Tabela 2.5. Movimento de carga no AFSC, 1990-2011
19
Tabela 2.6. Carga por país no AFSC, 2006 e 2010
20
Tabela 2.7. Principais transportadoras de carga no AFSC, 2006 e 2010
21
Tabela 2.8. Previsões disponíveis para o movimento de carga no AFSC
22
Tabela 2.9. Movimento de carga no AFSC – previsão própria para 2012-2020
24
Tabela 2.10. Movimento de passageiros nos aeroportos do noroeste peninsular,
1990-2010
27
Tabela 2.11. Movimento de carga (toneladas) nos aeroportos do noroeste
peninsular, 2003-2010
28
Tabela 3.1. Benefícios e Custos das Estruturas de Gestão Privada (Concorrencial e
Monopolista)
32
Tabela 3.2. Confronto dos Principais Benefícios de Cada Sistema de Gestão
34
Tabela 3.3. Exemplos de participação de entidades regionais e locais na gestão
aeroportuária
37
Tabela 3.4. Esboço de modelo de órgão consultivo para a participação das entidades
regionais e locais
41
iv
Índice de figuras
Figura 2.1. Distribuição do movimento de passageiros nos aeroportos do noroeste
peninsular, 2010
28
Figura 2.2. Distribuição do movimento de carga nos aeroportos do noroeste
peninsular, 2010
29
Figura A.1. Cronograma para o ajustamento da série do movimento de passageiros
no AFSC
48
Figura A.2. Cronograma para o ajustamento da série do movimento de carga no
AFSC
50
v
Sumário Executivo
1. O presente estudo visa a elencagem de aspectos essenciais que deverão ser tidos
em conta na hora de definir o caderno de encargos da operação de privatização da
ANA, Aeroportos de Portugal, S.A., de molde a alavancar para o Aeroporto Francisco
Sá Carneiro (AFSC) e para a região Norte os potenciais efeitos positivos e a minorar os
eventuais efeitos negativos decorrentes da passagem do aeroporto a um regime de
propriedade e gestão privadas.
2. O estudo socorre-se de quatro elementos fundamentais: um breve enquadramento
da evolução recente na fileira do negócio aéreo e aeroportuário a nível internacional;
uma previsão do comportamento do movimento de passageiros e carga no AFSC até
2020; uma contextualização da importância do AFSC no Noroeste Peninsular; e uma
revisão dos principais contributos da literatura económica no domínio do impacto
(benefícios e custos) da privatização dos aeroportos.
3. No panorama internacional, os aeroportos têm enfrentado custos de capital
crescentes para o financiamento dos investimentos em capacidade, levando a uma
reponderação dos projectos de expansão em curso em termos da sua prioridade, bem
como à perspectivação de possíveis adiamentos de novos investimentos.
4. O AFSC tem evidenciado elevado dinamismo nas últimas duas décadas, ilustrado
sobretudo pelo forte crescimento do volume de passageiros (7,3% de taxa média anual
de crescimento entre 1990 e 2011), o qual se deve manter nos próximos anos, com
uma taxa média anual de crescimento entre 5,5% a 6,5% até 2020, levando a atingir
ou ultrapassar 10 milhões de passageiros/ano neste ano.
1
5. Tendo em conta o plano de expansão do AFSC plasmado no seu Master Plan, estas
previsões relativas ao movimento de passageiros implicam que, ainda durante a
presente década, se atinja o terceiro estágio de desenvolvimento (capacidade de
processamento instalada na ordem dos 9 milhões de passageiros por ano), com
eventual necessidade de passar ao quarto estágio de desenvolvimento (capacidade
de processamento instalada de 11 milhões de passageiros por ano em 2020).
6. O elevado dinamismo do AFSC evidencia-se igualmente pela forte capacidade de
atracção de empresas low cost, de elevação das rotas e de diversificação de serviços.
O movimento de carga cresceu a uma taxa média anual de 5% entre 1990 e 2011,
embora com uma evolução bastante irregular. As previsões apontam para uma taxa de
crescimento média anual até 2020 entre 2,4% e 4,2%, indicando que até final da
década não será esgotada a capacidade instalada de 60.000 toneladas/ano.
7. O AFSC representa um recurso de inegável valia para a região Norte de Portugal e
consegue uma área de atracção que vai muito para além desta, sendo tido até como
o “aeroporto de todos os Galegos”, por apresentar uma excelente conexão com a
cidade do Porto e por possuir um número muito significativo de destinos, com mais
ligações directas e a preços mais competitivos do que os aeroportos da Galiza.
8. A literatura e a evidência empírica apontam como principais riscos da passagem da
propriedade e da gestão dos aeroportos para as mãos privadas os que se associam a
possíveis quebras dos níveis de segurança, de investimento e de qualidade dos
serviços prestados, bem como, particularmente no caso de monopólio privado, a
possível redução significativa da conexão com os interesses e parceiros locais.
9. Como principais vantagens da privatização, a literatura e a evidência empírica
apontam para maior eficiência operacional, maior rentabilidade, maior capacidade
de atracção de companhias low cost e maior diversificação do negócio, a favor dos
aeroportos com maioria de gestão privada e quando comparados com os aeroportos
com maioria de capital público.
2
10. No que respeita aos modelos de gestão – em rede versus separada – os
elementos disponíveis na literatura e na evidência empírica não permitem apontar a
priori qualquer predomínio de um deles em termos de benefícios líquidos, devendo a
situação ser analisada em concreto, atendendo às especificidades de tempo e espaço.
11. No caso do AFSC e no que toca a esta questão, há diversos pontos a ter em conta
para poder concluir sobre o modelo preferível, em particular: a inexistência de
estudos independentes sobre a relevância de potenciais economias de escala no
contexto da rede aeroportuária nacional; a necessidade de confronto da eventual
vantagem da gestão em rede relativa a uma maior robustez financeira com a menor
transparência e eficiência na afectação de recursos que pode decorrer dos processos
de subsidiação cruzada voltados para as operações correntes; o efeito de eventual
substituição dos esquemas de subsidiação cruzada por um regime transparente de
indemnizações compensatórias pela prestação de serviço público; o grau de
probabilidade de se verificar uma excessiva centralização do negócio no aeroporto
de Lisboa, com prejuízo claro para os restantes e para as suas áreas de influência.
12. No que toca às questões de governance, ao nível internacional, a participação das
entidades públicas regionais e locais assume predominantemente um cariz
consultivo, independente da propriedade e modelo de gestão aeroportuária. Os casos
de participação (directa ou indirecta) destas entidades nos órgãos de gestão executiva
ocorrem apenas quando a propriedade é pública ou mista.
13. É conhecida a intenção do Governo de proceder à privatização total da ANA,
incluindo uma parcela maioritária através da negociação particular com um ou mais
investidores. Contudo, não é ainda claro se a privatização vai dar origem a um
modelo de monopólio privado, com o domínio de todos os aeroportos nacionais, ou a
um modelo de gestão privada concorrencial, com a eventual venda isolada,
concomitante ou sucessiva, de algum ou alguns dos aeroportos nacionais.
14. Em qualquer dos casos, a opção do Governo é claramente diversa da
habitualmente seguida a nível europeu, onde a estrutura do tipo parceria público3
privada é frequente, assim como a gestão separada dos aeroportos (com a mesma
sociedade a gerir apenas os aeroportos localizados na mesma cidade, área
metropolitana ou região).
15. A consideração dos elementos anteriores (e de outros que se descrevem ao longo
do trabalho) permitem apontar para cinco aspectos essenciais a que a Junta
Metropolitana do Porto deverá dar particular importância aquando de eventuais
conversações a propósito das condições de privatização da ANA (e do AFSC).
16. O caderno de encargos deve prever que a privatização não dê lugar a uma
alteração relevante das condições de operação oferecidas pelo AFCS às empresas
áereas, com destaque para as low cost (no que a passageiros respeita) e para as
especializadas (no que respeita a carga), as quais são essenciais ao prosseguimento de
uma trajectória desejável de forte crescimento da procura e de liderança no espaço do
Noroeste Peninsular.
17. O caderno de encargos deve prever o respeito integral pelo Master Plan do AFSC,
ou seja, não dê lugar a uma redução substancial dos níveis de investimento
previstos, condição indispensável a que não ocorram estrangulamentos, sobretudo ao
nível da capacidade de processamento de tráfego de passageiros.
18. O caderno de encargos deve ser bastante abrangente no que respeita a regras de
segurança e qualidade de prestação de serviços, sob pena da degradação das
condições que foram ditando o sucesso do AFSC.
19. O caderno de encargos deve prover condições de larga autonomia à gestão do
AFSC, no que respeita a atracção de novas empresas, ao aumento do número de
rotas e à diversificação de serviços prestados. Tal é particularmente sensível no caso
de a solução passar pela constituição de um monopólio privado. O cenário ideal seria,
neste caso, o de uma sociedade autónoma que provesse a gestão do AFSC. Esta
solução, se bem operacionalizada, poderá permitir captar os benefícios essenciais dos
dois modelos básicos de gestão, isto é, em rede versus separada.
4
20. O caderno de encargos deve prever um mecanismo que permita às principais
entidades regionais e locais a manutenção de um papel relevante no futuro do AFSC
e da sua articulação com as políticas de promoção e desenvolvimento do território.
Neste contexto, a exemplo do que sucede em outros países europeus, torna-se
relevante a criação de um órgão consultivo com funções nestes domínios e com
participação dos principais players regionais e locais.
21. Este órgão poderá ser constituído pela entidade gestora do aeroporto, devendo
nesse caso constar das obrigações patentes no caderno de encargos, ou ser criado no
âmbito
da entidade reguladora do sector
aeroportuário
e aeronáutico,
nomeadamente se da privatização da ANA resultar um monopólio privado, neste caso
obrigando à reformulação das competências e atribuições do INAC (Instituto Nacional
de Aviação Civil) inscritas no Decreto-Lei nº 145/2007.
5
Introdução
O presente estudo decorre de convite formulado ao ESFEP (Estudos e Sondagens da
Faculdade de Economia da Universidade do Porto) pela Junta Metropolitana do Porto
(JMP) para colaboração no quadro das conversações que este órgão deverá manter
com o Governo no âmbito do processo de privatização da empresa ANA, Aeroportos
de Portugal, S.A., com reflexos importantes sobre o Aeroporto Francisco Sá Carneiro
(AFSC) e consequentemente sobre a realidade económica e social da Área
Metropolitana do Porto e da Região Norte.
A Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP) colaborara já em 2008 com a
JMP, tendo desenvolvido um estudo, Barbot (2008), cujo objectivo fundamental se
centrava na determinação do modelo óptimo de gestão para o AFSC. Em face de uma
alteração fundamental das circunstâncias, o enfoque é agora claramente outro. Uma
vez que está decidida a privatização total da ANA e, como tal, afastados modelos de
gestão que incluam os poderes públicos em funções executivas, a tónica fundamental
do presente estudo centra-se na elencagem de aspectos essenciais que deverão ser
tidos em conta na hora de definir o caderno de encargos da operação de privatização,
de molde a alavancar para o AFSC e para a região os potenciais efeitos positivos e a
minorar os eventuais efeitos negativos decorrentes da passagem a um regime de
propriedade e gestão privadas.
Tendo em vista este propósito, o presente estudo desenrola-se ao longo de três
secções que a seguir descrevemos brevemente. Na primeira secção, procede-se a um
breve enquadramento internacional, descrevendo-se os principais sinais de mudança
estrutural em anos recentes na fileira do transporte aéreo e apresentando-se um
conjunto de factos empíricos relevantes que têm de ser levados em conta no processo
de análise prospectiva do negócio aéreo e aeroportuário, assim como na subsequente
apreciação dos efeitos da passagem do AFSC para um regime de propriedade e gestão
privadas.
6
Na segunda secção, procede-se à descrição da evolução recente do movimento de
passageiros e carga no AFSC, actualizando Barbot (2008), à contextualização da sua
importância no noroeste peninsular e, o que é mais relevante, à previsão do
comportamento da procura de passageiros e carga nos próximos anos, até 2020. Neste
contexto, procura-se complementar as previsões constantes de Barbot (2008)
(actualizadas com base nos dados de passageiros e carga já conhecidos para 2011) com
um novo método para a previsão do comportamento da procura, aproveitando o facto
de a informação estatística actualmente disponível permitir o recurso, de forma
robusta, a uma metodologia baseada na identificação e estimação de um modelo de
regressão com base em dados históricos. Os resultados obtidos são fundamentais para
se perceber em que medida a dinâmica futura da procura dirigida ao AFSC determinará
as suas necessidades ao nível de investimento e financiamento até 2020.
Na terceira secção, faz-se uma breve digressão pela literatura económica ao nível do
impacto das estruturas de governance na performance dos aeroportos, incluindo as
questões dos efeitos da passagem da propriedade e gestão dos aeroportos para o
capital privado, dos principais benefícios e custos associados aos modelos de gestão
em rede e de gestão separada, e das modalidades de articulação entre a gestão dos
aeroportos e os parceiros e interesses regionais e locais. Tendo em conta estes
aspectos, bem como os elementos conhecidos até ao momento no que à operação de
privatização da ANA respeita, a secção encerra com a apresentação de um conjunto de
recomendações relativas a aspectos que parecem dever ser objecto de especial
atenção na discussão sobre o caderno de encargos, dado o seu relevo para a
continuação do sucesso do AFSC e em face do impacto deste sobre a região e a sua
actividade económica e social.
7
1. Alterações recentes no domínio do transporte
aéreo internacional
Desde meados da primeira década deste século que têm ocorrido sinais claros de
mudança estrutural na fileira do transporte aéreo, iniciada ao nível das companhias
aéreas, mas com impacto inevitável ao nível do negócio aeroportuário.
O contexto de crise económica e financeira, espoletado em meados de 2007 com o
colapso do crédito hipotecário de alto risco nos Estados Unidos da América e ainda
com repercussões a fazerem-se sentir actualmente em várias regiões do globo, com
destaque para a Europa, ampliou os efeitos daquela mudança estrutural sobre o
negócio aeroportuário.
As alterações na indústria do transporte aéreo têm percorrido as seguintes linhas:
o Processo de shake-out no sector das companhias aéreas low cost, com uma
selecção e consolidação das empresas presentes no mercado. São exemplos as
aquisições protagonizadas pela Air Berlin na Alemanha (Deustsche BA, Germânia
Express e LTU), pela Easyjet no Reino Unido (GB Airways) e pela fusão da Vueling
com a Clickair em Espanha, bem como os processos de falência nos casos das
europeias Sterling e LTE e de diversas companhias norte-americanas (Frontier, Air
Tran, Skybus). Entretanto, o conceito de longo curso em companhias low cost
parece ter sido parcialmente abandonado no seguimento das falências da Zoom e
da Oásis Hong Kong, precursoras deste modelo de negócio. No seguimento destes
desenvolvimentos, espera-se que, a médio prazo, existam duas ou três grandes
companhias low cost a operar no mercado europeu;
o Tendência de consolidação das maiores companhias aéreas de rede ou tradicionais
(full service carriers), perspectivando-se um cenário de apenas três ou quatro mega
companhias em cada região do globo, concentradas em mega-hubs e nas rotas de
8
longo curso, reduzindo a oferta no pequeno e médio curso ou fazendo o
outsourcing para franchisadas ou para parceiros de alianças. Em paralelo, as
companhias tradicionais de menor dimensão tendem a ser pressionadas, por
razões concorrenciais, para fazer o downsizing do seu segmento de longo curso, ou
mesmo a abandoná-lo, sendo mesmo algumas delas adquiridas pelas candidatas a
mega companhias. São exemplos deste processo a aquisição pela Lufthansa da
Swiss, da Austrian e da Brussels Airlines, a aquisição de 25% da Alitália pela Air
France-KLM e, nos EUA, a fusão entre a Delta e a Northwest;
o Redução na capacidade de transporte disponibilizada pelas companhias aéreas,
como resultado de dois vectores:
o O contexto de aumento das dificuldades de sobrevivência de algumas
transportadoras e de falência de outras tem sido acompanhado de
impactos no tráfego resultantes de processos de consolidação acelerada
que determinam, em regra, a racionalização da oferta;
o A elevada incerteza associada à evolução da procura tem induzido muitas
companhias a procederem ao encerramento, ainda que por vezes
temporário, de rotas menos rentáveis, a adiarem o investimento em novas
aeronaves, a reduzirem as que têm ao seu serviço ou a imobilizarem-nas
temporariamente na perspectiva de minimização de perdas de cash flow,
tendo como efeito imediato uma redução da capacidade disponível no
mercado em busca de um incremento do load factor e de possíveis
aumentos nas tarifas médias praticadas. Associada a estes aspectos tem
estado a criação de formas de taxação de serviços prestados ao passageiro
anteriormente gratuitos;
o Efeitos das reduções de capacidade das companhias e de encerramento de rotas
na conectividade oferecida pelos aeroportos, assim como nos seus proveitos de
tipo aviação e não aviação (dado que menos movimentos de aeronaves tendem a
implicar menos passageiros no terminal). Tendo em conta a elevada rigidez da
9
estrutura de custos, uma possível contracção da procura exercerá pressão
acrescida sobre os cash flows libertos, originando eventuais dificuldades de
tesouraria e reduzindo as possibilidades de recurso ao auto-financiamento.
o Elevados custos de capital devido à escassez de liquidez no mercado bancário e ao
risco crescente associado à actividade bancária, que se reflecte, designadamente,
nos spreads praticados pelas instituições financeiras, na aplicação de comissões de
imobilização e na redução dos prazos de revisão das condições contratadas. Desta
forma, os aeroportos têm enfrentado custos de capital crescentes para o
financiamento dos investimentos em capacidade, levando a uma reponderação dos
projectos de expansão em curso em termos da sua prioridade, bem como à
perspectivação de um adiamento de novos investimentos.
Será este, em síntese, o enquadramento internacional a que importará atender no
processo de análise do comportamento do negócio aéreo e aeroportuário no futuro
próximo, bem como na subsequente apreciação dos efeitos da passagem do AFSC para
um regime de propriedade e gestão privadas.
10
2. Procura de passageiros e carga no Aeroporto
Francisco Sá Carneiro
2.1. Movimento de passageiros
2.1.1 Evolução histórica recente
Depois de um crescimento médio anual de 8,0% na década de 90 do século passado,
que levou a que o número de passageiros embarcados e desembarcados no Aeroporto
Francisco Sá Carneiro (AFSC) mais que duplicasse (passando de cerca de 1,356 milhões
de pessoas em 1990 para 2,938 milhões em 2000; ver Tabela 2.1), registou-se uma
queda acumulada de 10,4% em 2001 e 2002, na linha da retracção da procura do
transporte aéreo ocorrida ao nível mundial, como reflexo, em particular, dos ataques
terroristas de 2001.
De 2003 a 2008, voltou a observar-se um período ininterrupto de crescimento, com
uma taxa de variação média anual de 9,5%. A expansão particularmente forte nos anos
de 2007 e 2008 colocaram o AFSC na posição de aeroporto mais dinâmico da rede
ANA. A alavancar tal evolução esteve o tráfego canalizado via companhias aéreas low
cost (cujo início de operações no AFSC se deu em 2004, com a AirBerlin); em particular
em 2008, o tráfego low cost cresceu 51,2% contra um decréscimo de 2,8% verificado
nos passageiros das companhias tradicionais.
Após a ligeira queda em 2009, mais uma vez num quadro de recuo da procura no
panorama internacional, a recuperação do movimento de passageiros nos dois anos
subsequentes foi superior tanto à média nacional como à média do grupo de
referência internacional (peer group) do AFSC. No cômputo do período 2000-2010, o
crescimento médio anual fixou-se em 6,0%.
11
Ainda no que diz respeito à comparação global do AFSC com o seu peer group, a
situação é também ela bastante favorável já que o aeroporto conjuga um crescimento
bastante acima da média com uma dimensão ainda abaixo da média dos seus pares
europeus.
A Tabela 2.1 resume a evolução do tráfego de passageiros no AFSC nas últimas duas
décadas.
Tabela 2.1. Movimento de passageiros no AFSC, 1990-2011
Ano
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
Número de
passageiros
1 355 586
1 454 466
1 637 129
1 745 368
1 896 867
2 028 351
2 169 664
2 284 926
2 540 137
2 832 722
2 938 118
2 771 169
2 633 380
2 675 753
2 944 135
3 108 137
3 402 805
3 986 748
4 534 829
4 508 330
5 279 531
6 004 589
Taxa de variação
7,3%
12,6%
6,6%
8,7%
6,9%
7,0%
5,3%
11,2%
11,5%
3,7%
-5,7%
-5,0%
1,6%
10,0%
5,6%
9,5%
17,2%
13,7%
-0,6%
17,1%
13,7%
Tx var. média anual
7,3%
Fonte: elaboração própria, com base em Barbot (2008) e ANA (2006,
2007, 2008, 2009, 2010)
Como já referido, o tráfego de passageiros canalizado via companhias aéreas low cost
tem mais que compensado a perda de dinamismo das companhias tradicionais no
AFSC. A evolução neste aeroporto reflectiu, contudo, uma estratégia global de
desenvolvimento de rotas dos Aeroportos da rede ANA que tem permitido o
12
crescimento do segmento low cost, possibilitando o incremento das ligações ponto a
ponto.1 Por exemplo, entre 2006 em 2008, foram abertas 23 novas rotas low cost no
Porto (18 em Lisboa e 35 em Faro), aumentando também o número de destinos nesse
período, com mais oito no Porto (mais 10 em Lisboa e três em Faro). Segundo os dados
disponíveis, o AFSC ocupava a 16ª posição no Top 20 dos Aeroportos LCC (low-cost
carrier) com maior crescimento entre 2002 e 2007 ao nível dos lugares oferecidos.
A Tabela 2.2 apresenta a estrutura de tráfego de passageiros por companhia aérea em
2005 e 2010 no AFSC, para as 10 companhias com mais passageiros em 2010. Como se
pode verificar, estas companhias movimentaram 95,0% do total de tráfego de
passageiros em 2010, o que representou um incremento de 8,9 p.p. em apenas quatro
anos (note-se, para mais, que a Easyjet e a Transavia ainda não operavam em 2006).
Por outro lado, em 2010 apenas 40,3% do total de tráfego de passageiros correspondia
a companhias tradicionais, contra 63,5% em 2006, o que evidencia o forte incremento
do peso do segmento low cost em pouco anos de presença no AFSC.
Tabela 2.2. Tráfego de passageiros por companhia no AFSC, 2006 e 2010
Companhia
TAP
Ryanair
Easyjet Airlines
Easyjet Switzerland
Deutsche Lufthansa
Transavia France
Air Nostrum
Sata International
Aigle Azur
Air Berlin
2010
Número de
passageiros
1 720 206
1 678 872
346 003
310 691
286 778
208 837
146 645
118 989
102 436
90 599
2006
Quota
32,6%
31,8%
6,6%
5,9%
5,4%
4,0%
2,8%
2,3%
1,9%
1,7%
95,0%
Número de
passageiros
1 818 137
521 475
236 596
91 798
104 744
54 795
101 781
Quota
53,4%
15,3%
7,0%
2,7%
3,1%
1,6%
3,0%
86,1%
Fonte: ANA (2006, 2010).
Nota: tráfego para a TAP em 2006 inclui tráfego da Portugália.
1
A evolução da estrutura do tráfego de passageiros nos Aeroportos do Grupo ANA evidencia o forte
crescimento do tráfego low cost (entre 2003 e 2008, crescimento em média 37,5% ao ano, traduzido
num acréscimo de 21,6 pontos percentuais de quota de mercado em 5 anos), em detrimento
principalmente das companhias tradicionais (redução de 14,6 p.p de quota de mercado em 5 anos), mas
também das companhias charter (menos 7 p.p de quota de mercado).
13
2.1.2 Previsão do movimento de passageiros
Como enquadramento, interessará atentar, em primeiro lugar, às previsões disponíveis para o
tráfego de passageiros ao nível mundial e, em particular, para a Europa. Segundo a Airports
Council International, ACI, a previsão para a evolução do tráfego no período 2010-2020 é de
uma taxa de variação média anual de cerca de 4,0% à escala mundial e de 3,5% ao nível
europeu (ver ACI, 2007).
A evolução descrita reflectirá tanto o aumento do número movimentos de aeronaves como do
número de passageiros por movimento. Em particular, espera-se uma modificação da
configuração das frotas de aeronaves, a qual, associada à previsão de uma subida do load
factor, deverá implicar um aumento do número de passageiros por partida de 2,0% em média
anual ao nível europeu e de 1,1% ao nível mundial (ACI, 2007).
Quanto às previsões disponíveis para o tráfego de passageiros no AFSC, apesar da diversidade
de metodologias usadas e de resultados obtidos para as taxas de crescimento previstas, elas
apontam, em qualquer caso, para uma expansão acima das médias internacionais (ver Tabela
2.3).
Tabela 2.3. Previsões disponíveis para o movimento de passageiros no AFSC
Estudo
Período de
previsão
Parsons (2002)
ANA (2007b)
Barbot (2008)
2002-2035
2005-2015
2007-2020
Nº. de passageiros previstos
para 2020, a partir do nº. de
passageiros observado em 2011
5,0%
9 315 088
9,0%
13 041 326
5,9%
10 058 817
Taxa de variação média
anual prevista
Fonte: elaboração própria a partir de Barbot (2008) e Estatísticas Mensais de Tráfego da ANA
(www.ana.pt/pt-PT/Topo/Institucional/SobreANA/publicacoes).
Nota: Barbot (2008) – previsão correspondente ao cenário de privatização do AFSC/ANA considerado
nesse estudo.
Com o objectivo de complementar os estudos apresentados na Tabela 2.3, procedeuse à elaboração de previsões próprias, aproveitando o facto de, passados quatro anos
relativamente ao último daqueles estudos, a informação estatística agora disponível
permitir o recurso, de forma mais robusta, a uma metodologia baseada na
identificação e estimação de um modelo de regressão com base em dados históricos.
14
Como referido anteriormente, o comportamento recente do tráfego de passageiros no
AFSC via companhias low cost e via companhias tradicionais foi bastante distinto,
ficando claro o papel das primeiras como motor na significativa expansão verificada na
segunda metade da década passada até ao presente. Por isso, é muito importante para
a estimação de um modelo estatístico de previsão a existência de dados históricos que
cubram todo o período de operação das companhias low cost no AFSC, iniciado em
2004. É também importante a existência de um número elevado de dados históricos
para garantir a qualidade da estimação. Com recurso à base de dados on-line do INE
(acessível em www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_base_dados) e às
Estatísticas
Mensais
de
Tráfego
da
ANA
(acessíveis
em
www.ana.pt/pt-
PT/Topo/Institucional/SobreANA/publicacoes), foi possível obter uma série temporal
com frequência mensal para o número de passageiros embarcados e desembarcados
no AFSC, com início em Janeiro de 2004 e fim em Julho de 2012, num total de 103
observações, o que satisfaz ambas as condições mencionadas em cima.
Relativamente à especificação, a escolha recaiu sobre um modelo de regressão
bivariado, com o objectivo de se combinar uma estrutura parcimoniosa (i.e., com
poucas variáveis explicativas) com uma boa capacidade explicativa do comportamento
passado da variável em estudo (tráfego de passageiros). As variáveis explicativas
consideradas no modelo foram (ver Apêndice): (i) a própria variável em estudo
desfasada no tempo, de modo a captar os processos autoregressivos usuais em séries
temporais; os desfasamentos temporais incluídos tiveram, em particular, o propósito
de captar a forte sazonalidade presente na série para o tráfego de passageiros; (ii) uma
proxy para a actividade económica (o índice mensal de produção industrial do INE),
também desfasada no tempo, de modo a captar a ligação habitualmente observada
entre o dinamismo macroeconómico e os segmentos de negócios e turístico de
passageiros
(IATA,
Airline
Industry
Forecast,
www.iata.org/ps/publications/Pages/airline-industry-forecast.aspx).
15
Seguindo a metodologia habitual de identificação e estimação de modelos de
regressão multivariados em séries temporais (ver, por ex., Wei, 1990), obtiveram-se os
resultados apresentados no Apêndice.
Finalmente, com vista à previsão do tráfego de passageiros para o período 2012-2020
a partir do modelo de regressão descrito acima, consideraram-se os seguintes
pressupostos:
a) O segmento low cost prosseguirá uma trajectória de maturação ao nível
internacional ao longo da presente década, depois da fase de shake-out que o
caracterizou até recentemente, como assinalado na Secção 1;
b) O contexto de privatização do AFSC (via ANA) não implicará uma alteração
relevante das condições de operação oferecidas às companhias aéreas, com
destaque para as low cost;
c) O Plano Director (Master Plan) do AFSC será cumprido, de modo a que não
ocorram estrangulamentos no que toca a capacidade de processamento de tráfego
de passageiros até 2020 (último ano do horizonte de previsão), tendo em conta os
níveis aqui previstos para o número de passageiros até essa data.
d) A produção industrial crescerá à mesma taxa que o PIBpm (preços constantes), o
que significa que, depois de um longo processo de ajustamento estrutural, sob o
qual a indústria perdeu peso na estrutura produtiva do país, se espera que ocorra
uma estabilização durante a presente década. A evolução para o PIBpm foi
calculada a partir das previsões do FMI, World Economic Outlook Database,
(www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2012/01/weodata/index.aspx)
para
2012-
2017.
Adicionalmente, considerou-se um cenário de mudança estrutural no comportamento
da série temporal do movimento de passageiros ao longo do horizonte de previsão,
por exemplo, reflectindo uma política comercial mais agressiva junto das companhias
low cost num contexto de privatização do AFSC/ANA. Em concreto, pressupôs-se que
16
as taxas de crescimento anuais previstas com o modelo de regressão viriam acrescidas
de 1 p.p. a partir de 2013. A Tabela 2.4. apresenta os resultados do exercício de
previsão obtidos directamente do modelo de regressão bivariado estimado e sob o
cenário alternativo de mudança estrutural no comportamento da série temporal.
Tabela 2.4. Movimento de passageiros no AFSC – previsão própria para 2012-2020 com
modelo de regressão bivariado
Ano
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
2020
Sem efeito de mudança estrutural
Com efeito de mudança estrutural
Número de
Número de
passageiros
Taxa de variação
passageiros
Taxa de variação
5 991 710
0,64%
6 043 312
0,64%
6 497 638
8,44%
6 614 030
9,44%
6 739 200
3,72%
6 926 060
4,72%
7 176 434
6,49%
7 444 677
7,49%
7 596 134
5,85%
7 954 512
6,85%
8 067 099
6,20%
8 527 242
7,20%
8 577 717
6,33%
9 152 257
7,33%
9 122 171
6,35%
9 824 702
7,35%
9 714 904
6,50%
10 561 330
7,50%
Tx var. média anual:
5,59% Tx var. média anual:
6,48%
Fonte: elaboração própria.
Nota: a previsão para 2012 incorpora os dados já conhecidos para o movimento de passageiros de
Janeiro a Julho.
De acordo com a previsão baseada no modelo de regressão, à significativa perda de
dinamismo do tráfego de passageiros no AFSC no corrente ano, deverá seguir-se uma
expressiva recuperação em 2013. A volatilidade das taxas de crescimento deverá
manter-se até 2014, ocorrendo uma estabilização sensivelmente em torno dos 6,3% a
partir daí. A taxa de variação média anual para a totalidade do horizonte de previsão é
de 5,6%,2 valor que fica apenas ligeiramente abaixo (0,3 p.p.) da previsão em Barbot
(2008) (ver Tabela 2.3). No caso do cenário alternativo, a taxa de variação média anual
2
Merece nota o facto de uma previsão por mera extrapolação da tendência implícita nos dados para o
tráfego de passageiros entre Janeiro de 2004 e Julho de 2012 (calculada por ajustamento de um modelo
de regressão exponencial) indicar uma taxa de variação média anual de 11,0%.
17
fixar-se-á em 6,5%, neste caso um pouco acima do constante em Barbot (2008), mas,
ainda assim, bastante abaixo da previsão mais optimista constante da Tabela 2.3.
Globalmente, estes números significam que se deverá esperar, na presente década,
um dinamismo do AFSC em termos de movimento de passageiros acima do apontado
para o panorama internacional, mas com um abrandamento face ao verificado nas
duas décadas anteriores. Do ponto de vista do plano de expansão do AFSC plasmado
no seu Master Plan, as previsões incluídas na Tabela 2.4 implicam que, ainda antes do
final da presente década, se atinja, necessariamente, o terceiro estágio de
desenvolvimento no caso do cenário base, com uma capacidade de processamento
instalada na ordem dos 9 milhões de passageiros por ano. Sob o cenário alternativo, já
será necessário apontar para o quarto estágio de desenvolvimento, com uma
capacidade de processamento instalada de 11 milhões de passageiros por ano em
2020-2021.
2.2. Movimento de carga
O AFSC está dotado de um Centro Logístico de Carga Áerea (CLCA) moderno e
funcional, com capacidade instalada de 60.000 toneladas/ano. Esta infraestrutura
reflecte a posição do aeroporto como referência no Noroeste Peninsular, e visa
responder às necessidades do tecido empresarial português, principalmente no que
toca à exportação e internacionalização.
Refira-se que o CLCA foi concebido para
potenciar a intermodalidade no transporte de carga, permitindo-lhe equiparar-se cada
vez mais aos grandes centros de negócio e distribuição do centro da Europa.
2.2.1 Evolução histórica recente
Conforme se pode verificar na Tabela 2.5, nos últimos 22 anos a evolução anual do
movimento de carga no AFSC foi muito irregular. Depois de um crescimento médio
anual de 8,4% entre 1990 e 2000, que originou um que o volume de carga passasse de
18
18729 toneladas para 40730 toneladas (praticamente triplicou), registou-se entre 2000
e 2003 uma queda acentuada, fruto da já referida retracção da procura do transporte
aéreo a nível mundial devido, sobretudo, aos ataques terroristas de 2001.
Tabela 2.5. Movimento de carga no AFSC, 1990-2011
Ano
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
Volume de carga
(toneladas)
18 729
18 070
21 041
19 579
20 663
21 921
24 244
29 167
30 762
34 252
40 730
n.d.
34 326
25 148
27 026
28 084
37 518
36 143
36 638
32 392
35 275
34 078
Taxa de variação
-3,5%
16,4%
-6,9%
5,5%
6,1%
10,6%
20,3%
5,5%
11,3%
18,9%
-26,7%
7,5%
3,9%
33,6%
-3,7%
1,4%
-11,6%
8,9%
-3,4%
Tx var. média anual
5,0%
Fonte: elaboração própria, com base em Barbot (2008), ANA (2006, 2007,
2008, 2009, 2010). Plano Director do AFSC e Estatísticas Mensais de Tráfego
da ANA (www.ana.pt/pt-PT/Topo/Institucional/SobreANA/publicacoes).
Nota: n.d. significa não disponível.
De 2003 a 2011, voltou a observar-se um período de crescimento médio, com uma
taxa de variação média anual de 4,6%; contudo, neste período, os anos de 2007, 2009
e 2011 registaram uma taxa de variação negativa, decorrente da crise económica e
19
financeira. Neste contexto, no cômputo do período 2000-2009 a taxa de variação
média anual acabou por ser negativa. A irregularidade da evolução anual está também
patente na amplitude das variações anuais, vão desde -26,7% em 2009 a +33,6% em
2006.
De acordo com a Tabela 2.6, tomando o ano de 2010 como referência constata-se que a
grande maioria do tráfego de carga no AFSC tem origem ou destino em quatro países da União
Europeia (Alemanha, Espanha, Bélgica e França). O movimento interno é relativamente
pequeno (12,1% do total), em consequência da reduzida dimensão do país e da existência de
uma boa rede de estradas. Os valores para o ano de 2006, sugerem que não terá havido uma
alteração significativa na estrutura. Em todo caso, parece poder afirmar-se que, entre 2006 e
2010, o Reino Unido e os outros destinos perderam peso enquanto a Alemanha e Espanha
ganharam importância.
Tabela 2.6. Carga por país no AFSC, 2006 e 2010
Pais
Portugal
Alemanha
Espanha
Bélgica
França
América do Norte
América do Sul
Reino Unido
Africa
Outros
2010
Volume de carga
(toneladas)
4 272
10 606
7 330
3 418
2 807
2 600
1 764
1 600
487
391
Quota
12,1%
30,1%
20,8%
9,7%
8,0%
7,4%
5,0%
4,5%
1,4%
1,1%
2006
Volume de carga
(toneladas)
3 149
8 751
6 077
3 298
2 196
481
2 154
3 867
125
7 420
Quota
8,4%
23,3%
16,2%
8,8%
5,8%
1,3%
5,7%
10,3%
0,3%
19,8%
Fonte: elaboração própria, com base em Barbot (2008) e ANA (2007).
De acordo com a Tabela 2.7, tendo ainda em conta o ano de 2010, verifica-se que as
companhias aéreas que transportam mais carga de e para o AFSC são empresas dedicadas
exclusivamente a esta finalidade (51,0%), seguindo-se a TAP e a Air France. Essa estrutura não
foi significativamente diferente no ano de 2006. A maioria das companhias low cost não
transporta carga, o que acontece com todas as que operam no AFSC. Dentro das maiores LCCs
apenas a americana Southwest Airlines efectua esse serviço. Na Europa isso não acontece com
20
a generalidade das LCCs, nem faz parte do seu business model, baseado em produtos e
processos simples e de rápida execução.
Tabela 2.7. Principais transportadoras de carga no AFSC, 2006 e 2010
Transportadoras
Star Air
EAT
TAP
Air France
TNT Airways
Lufthansa
Swiftair
Sata internacional
Air Berlin
Outras
2010
Volume de carga
(toneladas)
9 960,7
8 039,5
5 005,7
4 310,6
3 164,5
2 148,1
1 202,1
370,8
160,9
698,5
Quota
28,2%
22,8%
14,2%
12,2%
9,0%
6,1%
3,4%
1,1%
0,5%
2,6%
2006
Volume de carga
(toneladas)
9 136,7
9 092,1
5 814,0
1 850,2
2 251,1
2 482,4
967,1
444,8
41,8
5 437,8
Quota
24,4%
24,2%
15,5%
4,9%
6,0%
6,6%
2,6%
1,2%
0,1%
14,5%
Fonte: elaboração própria, com base em Barbot (2008) e ANA (2007).
O volume de carga depende da intensidade das relações comerciais, internas e
externas, e dos preços e do tempo de movimentação dos outros meios de transporte.
Relativamente a este tempo, já foram efectuadas substanciais melhorias na rede de
estradas de acesso aos países europeus que mais movimento têm no AFSC.
2.2.2 Previsão do movimento de carga
Mais uma vez como enquadramento, importará ter em mente as previsões disponíveis
para o movimento de carga ao nível mundial e, em particular, para a Europa. Note-se
que o crescimento dos movimentos de carga requer um eficiente funcionamento da
intermodalidade, que deverá escapar mais à gestão do aeroporto que os movimentos
de passageiros. Segundo a ACI, a previsão para a evolução da carga no período 20102020 é de uma taxa de variação média anual de cerca de 5,5% à escala mundial e de
5,0% ao nível europeu (ver ACI, 2007).
21
Quanto às previsões disponíveis para o tráfego de passageiros no AFSC, a Tabela 2.8
mostra que elas apontam para uma progressão em linha com as médias internacionais.
Tabela 2.8. Previsões disponíveis para o movimento de carga no AFSC
Período de
previsão
Estudo
ANA (2007b)
Barbot (2008)
2005-2015
2007-2020
Movimento de carga previsto
Taxa de variação média
para 2020, a partir do
anual prevista
movimento observado em 2011
(ton.)
5,0%
52 868
4,8%
51 968
Fonte: elaboração própria a partir de Barbot (2008) e Estatísticas Mensais de Tráfego da ANA
(www.ana.pt/pt-PT/Topo/Institucional/SobreANA/publicacoes).
Nota: Barbot (2008) – previsão correspondente ao cenário de privatização do AFSC/ANA considerado
nesse estudo.
Tal como para o caso dos passageiros (ver Secção 2.1.2), também para os movimentos
de carga se desejou complementar os estudos apresentados na Tabela 2.8,
procedendo-se à elaboração de previsões próprias, aproveitando o facto de, como já
referido, passados quatro anos relativamente ao último daqueles estudos, a
informação estatística agora disponível permitir o recurso, de forma mais robusta, a
uma metodologia baseada na identificação e estimação de um modelo de regressão
com base em dados históricos. Para obter um número elevado de dados históricos
com frequência mensal de modo a assegurar uma boa qualidade da estimação,
recorreu-se
então
à
base
de
dados
on-line
do
INE
(acessível
em
www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_base_dados) e às Estatísticas Mensais
de
Tráfego
da
ANA
(acessíveis
em
www.ana.pt/pt-
PT/Topo/Institucional/SobreANA/publicacoes). O número de observações obtidas foi
de 103, já que se atendeu ao período entre Janeiro de 2004 e fim em Julho de 2012.
Também neste caso, a selecção da especificação recaiu sobre um modelo de regressão
bivariado, com o objectivo de se combinar uma estrutura parcimoniosa com uma boa
capacidade explicativa do comportamento passado da variável em estudo
22
(movimentos de carga em toneladas). As variáveis explicativas consideradas no
modelo foram (ver Apêndice): (i) a própria variável em estudo desfasada no tempo, de
modo a captar os processos autoregressivos usuais em séries temporais; (ii) uma
variável avaliadora do volume de comércio externo de mercadorias – especificamente
o valor das importações mais exportações de mercadorias, deflacionado com o índice
de preços da produção industrial –, de modo a captar a ligação habitualmente
observada entre o dinamismo do comércio externo e os movimentos de carga, tal
como
é
sugerido
pela
IATA,
Airline
Industry
Forecast
(www.iata.org/ps/publications/Pages/airline-industry-forecast.aspx).
Seguindo de novo a metodologia usual de identificação e estimação de modelos de
regressão multivariados em séries temporais, obtiveram-se os resultados apresentados
no Apêndice.
Com vista à previsão do movimento de carga para o período 2012-2020 a partir do
modelo de regressão identificado, consideraram-se os seguintes pressupostos:
a) O contexto de privatização do AFSC (via ANA) não implicará uma alteração
relevante das condições de operação oferecidas às companhias aéreas, em
particular às especializadas;
b) O Plano Director (Master Plan) do AFSC será cumprido, de modo a que não
ocorram estrangulamentos no que toca a capacidade de processamento de carga
até 2020 (último ano do horizonte de previsão), tendo em conta os níveis aqui
previstos para o volume de carga até essa data.
c) As importações crescerão à mesma taxa que o PIBpm (preços constantes)
português, enquanto as exportações crescerão a uma taxa que resulta da média
ponderada da taxa de crescimento do PIBpm (preços constantes) da União
Europeia e das economias emergentes e em desenvolvimento. A evolução para o
PIBpm é calculada a partir das previsões do FMI, World Economic Outlook
Database,
23
(http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2012/01/weodata/index.aspx)
para
2012-2017.
Finalmente, considerou-se um cenário adicional, em que as taxas de crescimento
previstas com o modelo de regressão vêm acrescidas de 2 p.p. a partir de 2013. Este
novo cenário assenta no pressuposto de uma mudança estrutural no comportamento
da série temporal para o movimento de carga ao longo do horizonte de previsão,
devido, por exemplo, a uma política comercial mais agressiva a este nível por parte da
administração do AFSC no período pós-privatização, dada a capacidade instalada de
60.000 toneladas/ano. A Tabela 2.9. apresenta os resultados do exercício de previsão
obtidos directamente do modelo de regressão bivariado estimado e sob o cenário
alternativo de mudança estrutural no comportamento da série temporal.
Tabela 2.9. Movimento de carga no AFSC – previsão própria para 2012-2020 com o modelo
de regressão bivariado
Ano
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
2020
Sem efeito de mudança estrutural
Carga (toneladas)
37 214
39 103
39 432
39 855
40 290
40 716
41 150
41 605
42 071
Tx var. média anual:
Com efeito de mudança estrutural
Taxa de variação
Carga (toneladas)
37 214
9,20%
39 847
5,08%
40 980
0,84%
42 239
1,07%
43 544
1,09%
44 875
1,06%
46 251
1,07%
47 688
1,11%
49 176
1,12%
2,40% Tx var. média anual:
Taxa de variação
9,20%
7,08%
2,84%
3,07%
3,09%
3,06%
3,07%
3,11%
3,12%
4,18%
Fonte: elaboração própria.
Nota: a previsão para 2012 incorpora os dados já conhecidos para o movimento de carga de Janeiro a
Julho.
Ao dinamismo evidenciado pelo movimento de carga no corrente ano e também em
2013 deverá seguir-se uma significativa redução na taxa de variação anual no período
subsequente. A perda de dinamismo deverá manter-se até 2020, ocorrendo uma
estabilização sensivelmente em torno dos 1,1% e 3,1% nos casos base e cenário
24
alternativo, respectivamente. De referir ainda que a taxa de variação média anual para
a totalidade do horizonte de previsão é de 2,4% e de 4,18% nos casos base e cenário
alternativo, respectivamente. Estes números indicam que a dinâmica esperada para a
presente década é insuficiente para esgotar a capacidade instalada de 60000
toneladas/ano.
De notar que mesmo valor mais alto apontado para a taxa de crescimento média anual
fica abaixo da previsão em Barbot (2008) – ver Tabela 2.8. Saliente-se que nesse
estudo se considerou que, atendendo à origem e destino da maioria do tráfego de
carga no AFSC, a previsão a tomar para o cenário de base seria idêntica à previsão
disponível (da Airbus, para o período 2006-2025) para o movimento intra-Europa
Ocidental, que era de 5,0% de taxa de variação média anual. Esta foi a referência para
se estabelecer depois a taxa de variação média anual de 4,8% sob o cenário de
privatização do AFSC/ANA em Barbot (2008) para o período 2007-2020.
De registar, contudo, que os dados entretanto disponíveis revelaram uma forte
disparidade entre o comportamento do movimento de carga no AFSC e a média
europeia: por exemplo, no período 2006-2010,3 a taxa de variação média anual foi de 1,2% no primeiro, enquanto na União Europeia (tráfego intra região) foi de 3,5%,
segundo
o
Eurostat
(base
de
dados
on-line,
disponível
em
http://epp.eurostat.ec.europa.eu/portal/page/portal/transport/data/database). Dado
que a previsão avançada acima (Tabela 2.9) se baseia num modelo de regressão
estimado a partir dos dados históricos para o movimento de carga no AFSC, então
aquela reflectirá, naturalmente, o facto de, no cômputo dos últimos oito anos, se ter
verificado uma tendência ascendente muito modesta no AFSC,4 em contraste com o
ritmo de crescimento observado no panorama europeu.
3
Recorde-se que os dados históricos mais recentes para o movimento de carga no AFSC incluídos em
Barbot (2008) respeitavam ao ano de 2006.
4
A tendência implícita nos dados para o movimento de carga entre Janeiro de 2004 e Julho de 2012
(calculada por ajustamento de um modelo de regressão exponencial) revela uma taxa de variação média
anual de 0,5%.
25
2.3. O AFSC no contexto do noroeste peninsular
A presente secção tem como propósito fazer uma breve análise da oferta
aeroportuária que exerce concorrência directa ao AFSC e que, como é sabido, é
constituída sobretudo pelos três aeroportos que servem a Galiza.
Um aspecto a ter, desde logo, em conta é o facto do noroeste da Península Ibérica
evidenciar uma enorme concentração de oferta aeroportuária. Veja-se, por exemplo,
que ao passo que existem quatro aeroportos comerciais entre o Porto e a Corunha,
sendo a distância Porto – Vigo da ordem dos 100 km e inferior para Vigo – Santiago e
Santiago – Corunha, nos cerca de 450 km que separam as cidades do Porto e Faro
existem três aeroportos comerciais (Faro, Lisboa e Porto), cujas distâncias entre si são
de aproximadamente 210 km (Lisboa – Faro) e 250 km (Porto – Lisboa). Como
consequência, o sudoeste peninsular regista uma densidade aeroportuária cerca de
três vezes inferior ao da restante fachada atlântica no noroeste (Eixo Atlântico, 2006).
Por outro lado, o AFSC dispõe de uma área de influência (catchment area) bastante
significativa, que envolve cerca de quatro milhões de pessoas a uma distância
rodoviária de 90 minutos e seis milhões a uma distância de 120 minutos, sendo assim a
maior de entre as de todos os aeroportos que cobrem a fachada atlântica da Península
Ibérica (ANA, 2007b), incluindo os três aeroportos da Galiza.
A área de influência do AFSC, que inclui o Norte e parte do Centro de Portugal e ainda
a zona Sul da Galiza, constitui assim factor potenciador do crescimento e
desenvolvimento do AFSC, mas também de ameaça. Destaca-se, em particular, a
sobreposição da área de influência do AFSC com as áreas de influência dos aeroportos
de Vigo (Peinador) e de Santiago de Compostela (Lavacolla). Este aspecto é acentuado
pelo facto dos perfis de tráfego do AFSC e dos seus concorrentes na Galiza serem
relativamente aproximados.
O AFSC e os aeroportos da Galiza, com os quais interage directamente, têm
apresentado sinais de evolução positiva mas com claro predomínio do primeiro. A
26
Tabela 2.10, com os movimentos de passageiros, e a Tabela 2.11, com os movimentos
de carga, são bem elucidativas.
Entre 1990 e 2010, o crescimento no tráfego no noroeste espanhol (Galiza) passou de
1.323.065 para 4.367.453 passageiros, a que corresponde uma taxa de crescimento
média anual de 6,2%. Entre os aeroportos galegos, o aeroporto de Santiago foi o que
apresentou sempre maior movimento de passageiros, embora o aeroporto da Corunha
tenha revelado maior dinamismo. No mesmo período, o número de passageiros no
AFSC passou de 1.355.586 para 5.279.531; ou seja, registou uma taxa de crescimento
médio anual de 7,3% (Tabela 2.10). Como consequência, o AFSC representava, em
2010, mais de metade (54,7%) do movimento de passageiros no conjunto dos
aeroportos comerciais do noroeste peninsular (Figura 2.1).
Tabela 2.10. Movimento de passageiros nos aeroportos do noroeste
peninsular, 1990-2010
Ano
1990
1995
2000
2005
2010
Corunha
90 572
295 286
589 000
852 325
1 101 208
Santiago
893 194
1 203 262
1 334 550
1 843 211
2 172 669
Vigo
339 299
391 374
721 608
1 108 718
1 093 576
Galiza
1 323 065
1 889 922
2 645 158
3 804 254
4 367 453
Porto
1 355 586
2 028 351
2 938 118
3 108 137
5 279 531
Fonte: elaboração própria, com base em Eixo Atlântico (2006), AENA (2010) e ANA
(2010).
27
Figura 2.1. Distribuição do movimento de passageiros nos aeroportos do
noroeste peninsular, 2010
11,4%
22,5%
54,7%
11,3%
Corunha
Santiago
Vigo
Porto
Fonte: elaboração própria, com base em AENA (2010) e ANA (2010)
Os dados para os movimentos de carga mostram que o AFSC tem um predomínio
ainda mais claro no noroeste peninsular, concentrando 91,9% do movimento de carga
do noroeste peninsular em 2010 (Figura 2.2). Entre 2003 e 2010, foi também bem mais
dinâmico que os aeroportos galegos, os quais viram aliás diminuído o movimento de
carga (Tabela 2.11). O aeroporto de Santiago foi aquele que também movimentou
maior volume de carga, tendo sido responsável no ano de 2010, por 63,1% da carga
movimentada nos aeroportos da Galiza.
Tabela 2.11. Movimento de carga (toneladas) nos aeroportos do noroeste
peninsular, 2003-2010
Ano
2003
2005
2010
Corunha
542
423
245
Santiago
5 319
3 805
1 964
Vigo
1 134
1 363
901
Galiza
6 995
5 591
3 110
Porto
25 148
28 084
35 275
Fonte: elaboração própria, com base em Eixo Atlântico (2006), AENA (2010) e ANA
(2010)
28
Figura 2.2. Distribuição do movimento de carga nos aeroportos do noroeste
peninsular, 2010
0,6%
5,1%
2,3%
91,9%
Corunha
Santiago
Vigo
Porto
Fonte: elaboração própria, com base em AENA (2010) e ANA (2010)
Neste contexto, poderá dizer-se que o AFSC apresenta uma ameaça para os
concorrentes da Galiza. Essa ameaça decorre da estratégia da ANA nos últimos anos, a
qual tem passado, por exemplo, por oferecer serviços de transporte directo para a
Galiza, por possuir uma sala de espera especial para os Galegos (o AFSC considera-se
aliás o “aeroporto de todos os Galegos”), por apresentar uma excelente conexão com
a cidade do Porto – via metro – e por possuir um número muito significativo de
destinos.
De acordo com Gonzalez (2009), esta situação estará também associada ao facto de a
gestão dos aeroportos espanhóis se realizar de uma forma individualizada, desde
Madrid, tornando difícil desenhar, a nível da Galiza, uma estratégia que aproveite as
sinergias dos seus três aeroportos regionais. Assim, “em vez de se especializarem e
competirem conjuntamente frente ao emergente AFSC, os aeroportos galegos
competem entre eles, o que permite ao AFSC oferecer mais ligações directas e a
preços mais competitivos” (p. 279, tradução dos autores).
29
3. Modelos de governance, potenciais efeitos da
privatização da ANA e principais recomendações
3.1. Estruturas de governance e performance dos aeroportos
As questões do impacto das estruturas de governance no desempenho, eficiência,
rentabilidade, investimento e outras variáveis importantes ligadas com a actividade
dos aeroportos têm vindo a merecer uma importância acrescida para os economistas e
gestores estratégicos essencialmente desde os anos 90 do século anterior.
Como refere Gillen (2011), durante muito tempo, os aeroportos foram detidos e
geridos pelos poderes públicos, que os tratavam essencialmente como uma utilidade
pública e, com frequência, os utilizavam como uma das armas para iniciativas mais
alargadas de política. Eram raros os estudos relativos a avaliações económicas da
performance dos aeroportos e assumia-se que a gestão pública colocava os
rendimentos próximos dos custos, assim como providenciava a gama de serviços que
os utilizadores estariam dispostos a pagar.
A situação alterou-se de modo significativo a partir dos anos 90, com diversos estudos
relevantes a verem a luz do dia, mostrando o impacto dos modos de governance na
performance dos aeroportos (apenas alguns exemplos: Francis et al., 2002; Gillen e
Niemeier, 2008; Halpern e Pagliari, 2007; Oum et al., 2006; Oum et al., 2008; Vasigh e
Gorjidooz, 2006; Vogel, 2006), desmistificando algumas das “crenças” anteriores
(apenas alguns exemplos: Armstrong et al., 1994; Advani e Borins, 2001; Morrison e
Winston, 2008) e contribuindo para a formulação de elementos de política
aeroportuária, nos domínios da propriedade, gestão e regulação.
Esta mudança esteve naturalmente associada à profunda alteração que se observou a
nível mundial, a partir da mesma altura, no contexto da propriedade, governance e
controlos institucionais. Na senda de processos de privatização ou, pelo menos, de
abertura ao capital privado, os aeroportos passaram a ser vistos como pontos onde o
30
sector privado poderia legitimamente providenciar os necessários serviços e
investimento.
3.1.1. Benefícios e custos dos processos de privatização
Tendo em conta o contexto descrito, para o presente trabalho relevam essencialmente
os resultados dos estudos que foram desenvolvidos sobre os eventuais impactos, isto
é, vantagens e desvantagens, dos processos de abertura do negócio aeroportuário (e
sua governance) ao capital privado, aplicados depois ao caso do AFSC.
Barbot (2008) debruçou-se sobre esta questão, embora sob um panorama distinto. Na
altura, relevava a questão do modelo de governance preferível para o AFSC,
discutindo-se, então, os custos e benefícios associados a diferentes estruturas, desde o
monopólio público ao monopólio privado, passando pelas hipóteses das parcerias
públicas e público-privadas e pela gestão privada concorrencial.
Neste momento, é conhecida a decisão do governo (Presidência do Conselho de
Ministros, 2012) de transferir para o sector privado a propriedade e gestão dos
aeroportos nacionais, através da privatização da totalidade da ANA. Ora, neste quadro,
passa a ser fundamentalmente relevante conhecer os custos e benefícios associados
aos modelos de propriedade e gestão privados, com particular destaque para os
custos. Essa constitui-se na melhor forma de identificar aspectos essenciais para o
aeroporto e para a região, que devam ser devidamente acomodados no caderno de
encargos e sobre os quais a Junta Metropolitana do Porto deverá ter especial atenção
em eventuais conversações sobre o assunto.
Os estudos disponíveis têm vindo a acentuar a ideia de que a performance dos
aeroportos, medida por diversos indicadores, tende a aumentar com a privatização
(ou, pelo menos, com a entrada de parceiros privados no negócio), ou seja, que o
ritmo de crescimento associado à procura e às actividades do aeroporto se eleva
nestas cicunstâncias.
31
Comparando aeroportos com maioria de capital público com aeroportos com maioria
de gestão privada, a generalidade dos estudos aponta para uma maior eficiência
destes últimos em termos de custos, para a obtenção de margens operacionais
superiores, para uma maior diversificação do negócio (incluindo uma superior quota
de receitas de actividades concessionadas, não aeronáuticas) e para uma maior
capacidade de atracção das companhias low-cost, em face da maior velocidade e
simplicidade dos processos aeronáuticos.
Em contrapartida, a comparação apresenta-se desfavorável às estruturas de maioria
privada no domínio do risco, tanto pela maior insegurança e possibilidade de acidentes
como pela ausência de cobertura por capitais públicos de situações financeiras
eventualmente menos favoráveis. De igual modo, os estudos apontam para a
possibilidade de reduções na qualidade de alguns serviços prestados. Finalmente,
apesar do provável aumento do volume de lucros, existe alguma probabilidade de
menores níveis de investimento, dada a natural maior ênfase que se colocará na
distribuição de lucros, ficando menos meios financeiros disponíveis para novas
despesas de capital.
Tabela 3.1. Benefícios e Custos das Estruturas de Gestão Privada
Benefícios
Custos
Maior eficiência
Risco adicional de segurança
Maior rentabilidade
Possibilidade de redução do nível
de qualidade dos serviços prestados
Maior capacidade de atracção de
companhias low cost
Risco de menor investimento,
maior ênfase na distribuição de
lucros
Maior taxa de crescimento da
procura dos serviços
Menor nível de coordenação com
os interesses e parceiros locais
Fonte: elaboração própria, com base na literatura consultada
32
A Tabela 3.1. sintetiza o conjunto de beneficios e custos decorrentes de um processo
de privatização, constituindo-se num primeiro elemento essencial de apoio à
elencagem de um conjunto de recomendações que deverão ser tidos em conta nas
conversações entre a JMP e o governo, a propósito da privatização da ANA.
3.1.2. Gestão em rede versus gestão separada
Um outro elemento relevante que tem sido tratado na literatura refere-se à discussão
das vantagens e desvantagens da gestão em rede dos aeroportos por comparação com
a gestão em separado dos mesmos.
Importa referir que não se trata estritamente da discussão entre modelo de monopólio
privado versus modelo concorrencial, por duas razões principais: por um lado, pode
existir uma situação de propriedade única de vários aeroportos com gestão separada
ou amplamente autónoma de cada um destes; por outro lado, ambos os sistemas
podem existir qualquer que seja o regime de propriedade, isto é, pública, privada ou
mista.
A Tabela 3.2. apresenta sinteticamente os principais benefícios que têm sido
associados a cada um dos sistemas de gestão.
Merece destaque o facto de quer a literatura quer a evidência empírica não
permitirem apontar a priori qualquer predomínio de um modelo sobre o outro,
devendo a situação ser analisada em concreto, caso a caso, atendendo às
especificidades de tempo e espaço.
33
Tabela 3.2. Confronto dos Principais Benefícios de Cada Sistema de Gestão
Gestão em Rede
Gestão Separada
Aproveitamento de sinergias
associadas a efeitos de escala, em
particular no que toca a capacidade
negocial com companhias aéreas e
outros parceiros de negócio
Fixação de preços mais ajustada à
procura quer das companhias
aéreas quer dos passageiros em
cada aeroporto
Maior robustez da estrutura
financeira, acomodando distintos
ciclos de investimento nos
diferentes aeroportos
Fim da subsidiação cruzada e
aumento da transparência na
utilização dos recursos
Menor risco de dependência de
companhia aérea e mercado
dominante
Aumento do nível de concorrência
entre aeroportos, em particular no
que respeita à procura pelas
companhias aéreas
Maior capacidade de articulação
com os interesses e parceiros
regionais e locais
Fonte: elaboração própria, com base na literatura consultada
No que toca à situação que importa aqui analisar, do AFSC, os pontos seguintes
parecem essenciais para uma conclusão sobre o modelo preferível:
o Não é conhecida a existência de análises independentes sobre a relevância de
potenciais economias de escala no contexto da rede aeroportuária nacional, sendo,
pois, questionável, a sua dimensão no quadro de aeroportos geograficamente algo
distantes (como no caso de Porto e Lisboa);
o A eventual vantagem da gestão em rede relativa a uma maior robustez financeira
pode ser aferida por analogia à lógica de constituição e financiamento das
actividades de um conglomerado, onde as necessidades financeiras são
essencialmente satisfeitas por uma espécie de “mercado fechado” dentro do
34
próprio grupo; no caso da rede aeroportuária, este elemento poderá ser relevante
na acomodação de diferentes ciclos de investimento nos diversos aeroportos;
o Esta eventual vantagem deve ser confrontada com a menor transparência e
eficiência na afectação de recursos que pode decorrer dos processos de
subsidiação cruzada voltados para as operações correntes, aspecto que pode ser
particularmente significativo no caso português; por outro lado, a substituição de
tais esquemas por um regime transparente de indemnizações compensatórias pela
prestação de serviço público apresentaria igualmente largas vantagens;
o No contexto da gestão em rede, existirá uma probabilidade significativa de, no caso
de não existirem cláusulas de salvaguarda da autonomia dos aeroportos de menor
dimensão e menos centrais, se verificar uma excessiva centralização do negócio no
aeroporto maior (neste caso, o de Lisboa), com prejuízo claro para os restantes e
para as suas áreas de influência;
o O modelo de gestão separada possibilita, sem dúvida, uma melhor articulação com
os interesse regionais e locais, preservando a capacidade de uma resposta mais
eficiente às necessidades dos agentes da respectiva área de influência e permitindo
uma participação mais efectiva dos principais actores económicos e sociais.
Ponderados todos estes elementos, parece haver sustentação para uma solução que
consagre a gestão separada (ou pelo menos forte autonomia) para o AFSC, mesmo no
caso de um regime de monopólio privado em termos de propriedade da rede
aeroportuária nacional. Esta solução, se bem operacionalizada, poderá permitir captar
os benefícios essenciais de ambos os modelos de gestão (em rede versus separada).
3.1.3. Coordenação com os interesses e parceiros regionais e locais
No que respeita ao caso que nos interessa, do AFSC, importa ainda notar um outro
resultado relevante da literatura teórica e empírica nos domínios que temos vindo a
analisar. Trata-se do nível de coordenação com os interesses e parceiros regionais e
35
locais, com consequências relevantes ao nível da adequação e da velocidade de
concretização de investimentos no aeroporto, e do respectivo impacto sobre as
actividades e a economia da região. Não será de estranhar que os estudos apontem, a
este nível, maioritariamente para desvantagens do modelo de gestão privada, quando
comparado sobretudo com modelos de parceria público-privada, em que as autarquias
e eventualmente também entidades locais possam ter um papel relevante a
desempenhar.
Esta desvantagem tende a ser menos acentuada no quadro de um modelo de gestão
separada do que no contexto de uma gestão em rede, dado que, no primeiro caso, os
gestores tenderão a efectivar esforços adicionais para o crescimento dos respectivos
aeroportos e, nesse quadro, a desenvolver maior articulação com os interesses
económicos e sociais da região.
Por seu turno, independentemente do modelo de gestão adoptado, existem diversos
modelos possíveis de relacionamento dos aeroportos com as entidades regionais e
locais. Casos ilustrativos na Europa são, por exemplo, os da Alemanha, Espanha e
Reino Unido (ver Tabela 3.3).
Os casos ao nível internacional mostram que a participação das entidades públicas
locais e regionais assume predominantemente um cariz consultivo, independente da
propriedade e modelo de gestão aeroportuária. Os casos de participação (directa ou
indirecta) destas entidades nos órgãos de gestão executiva são minoritários e ocorrem
apenas quando a propriedade é pública ou mista.
Todavia, a participação das entidades regionais e locais em órgãos consultivos
abrange, tipicamente, diversas áreas relevantes para o sistema aeroportuário,
estendendo-se a funções de alinhamento estratégico, de desenvolvimento comercial e
de rotas e de desenvolvimento de infraestruturas e de gestão ambiental.
36
Tabela 3.3. Exemplos de participação de entidades regionais e locais na
gestão aeroportuária
Propriedade e
modelo de gestão
executiva
Participação das
entidades
regionais e locais
Espanha
Alemanha
Reino Unido
Propriedade do Estado,
com titularidade e
gestão dos aeroportos
atribuídas à empresa
pública AENA.
Estrutura accionista
envolvendo a
República Federal
e/ou Estado, Região,
Autarquia e privados.
Os accionistas
integram o Conselho
de Supervisão, que
nomeia a Comissão
Executiva.
Conselhos Económicos Consultivos, formados por economistas, académicos,
associações locais e
regionais, empresas
relevantes para o
sector aeroportuário
(por ex., companhias
aéreas, companhias
de transporte
ferroviário e bancos).
Propriedade privada.
Por exemplo, no caso
do Grupo BAA, o
modelo de gestão
inclui um Conselho
de Administração e
uma Comissão
Executiva, para o
Grupo, e Direcções
de aeroporto.5
Comités Consultivos,
compostos por
autoridades e
comunidades locais,
empresas com
interesses no
aeroporto,
representantes dos
passageiros e o
gestor aeroportuário.
- Comités de Rotas,
formados por
respresentantes dos
governos locais e
regionais, agentes
económicos e da AENA.
- Conselhos Consultivos, formados por
entidades locais e
empresariais e a AENA,
para o desenvolvimento de iniciativas de
marketing regional.
Fonte: elaboração própria, com base na literatura consultada, www.aena.es e www.baa.com.
3.2. Recomendações a propósito do caso do AFSC
Tendo em conta os elementos até aqui apresentados, com particular relevância para
os seguintes:
(i) O AFSC tem evidenciado elevado dinamismo nas últimas duas décadas, ilustrado
sobretudo pelo forte crescimento do volume de passageiros, o qual se deve
5
O Grupo BAA detém, actualmente, cinco aeroportos: Heathrow (Londres), Stansted (Londres),
Southampton, Glasgow e Aberdeen.
37
manter nos próximos anos, com uma taxa média anual de crescimento entre 5,5%
a 6,5% até 2020, levando a atingir ou ultrapassar 10 milhões de passageiros/ano
nesta data. De igual modo, tem mostrado uma elevada capacidade de atracção de
empresas low cost, de elevação das rotas e de diversificação de serviços.
(ii) O AFSC representa um recurso de inegável valia para a região Norte do nosso País e
consegue uma área de atracção que vai muito para além desta, sendo tido até
como o “aeroporto de todos os Galegos”, por apresentar uma excelente conexão
com a cidade do Porto – via metro – e por possuir um número muito significativo
de destinos.
(iii) A literatura e a evidência empírica apontam como principais riscos da passagem da
propriedade e da gestão dos aeroportos para as mãos privadas os que se associam
a possíveis quebras dos níveis de segurança, de investimento e de qualidade dos
serviços prestados, bem como, particularmente no caso de monopólio privado, a
possível redução significativa da conexão com os interesses e parceiros locais.
(iv) Um outro aspecto relevante da literatura e da evidência empírica refere-se à
questão dos benefícios e custos do modelo de gestão em rede versus o modelo de
gestão separada. Os elementos disponíveis não permitem apontar a priori
qualquer predomínio de um dos modelos, devendo a situação ser analisada em
concreto, atendendo às especificidades de tempo e espaço; para o caso da rede
aeroportuária portuguesa, salienta-se ainda o facto de não haver estudos
independentes que abordem esta temática.
(v) Os casos ao nível internacional mostram que a participação das entidades públicas
regionais e locais assume predominantemente um cariz consultivo, independente
da propriedade e modelo de gestão aeroportuária. Os casos de participação
(directa ou indirecta) destas entidades nos órgãos de gestão executiva ocorrem
apenas quando a propriedade é pública ou mista.
(vi) No panorama internacional, os aeroportos têm enfrentado custos de capital
crescentes para o financiamento dos investimentos em capacidade, levando a uma
38
reponderação dos projectos de expansão em curso em termos da sua prioridade,
bem como à perspectivação de um adiamento de novos investimentos.
Tendo em conta o que neste momento é conhecido relativamente à privatização da
ANA, em particular que:
(i) A ANA deverá ser objecto de privatização total, incluindo uma parcela maioritária
através da negociação particular com um ou mais investidores e uma parcela
minoritária através de oferta pública de venda dirigida aos seus trabalhadores.
(ii) Não é ainda totalmente claro se a privatização vai dar origem a um modelo do tipo
monopólio privado, com o domínio de todos os aeroportos nacionais, ou a um
modelo de gestão privada concorrencial, com a eventual venda isolada,
concomitante ou sucessiva, de algum (ou alguns) dos aeroportos nacionais.
(iii) Em qualquer dos casos, a opção é claramente diversa da habitualmente seguida a
nível europeu, onde a estrutura do tipo parceria público-privada é frequente,
assim como a gestão separada dos aeroportos (com a mesma sociedade a gerir
apenas os aeroportos localizados na mesma cidade, área metropolitana ou
região).
Parece-nos que os pontos seguintes deverão ser objecto de particular atenção na
discussão sobre o caderno de encargos, dado o seu relevo para a continuação do
sucesso do AFSC e em face do impacto deste sobre a região e a sua actividade
económica e social:
(i) O caderno de encargos deve prever que a privatização do AFSC não dê lugar a uma
alteração relevante das condições de operação oferecidas às empresas áereas, com
destaque para as low cost (no que a passageiros respeita) e para as especializadas
(no que respeita a carga), as quais são essenciais ao prosseguimento de uma
39
trajectória desejável de forte crescimento da procura e de liderança no espaço do
Noroeste Peninsular.
(ii) O caderno de encargos deve prever o respeito integral pelo Master Plan do AFSC,
ou seja, não dê lugar a uma redução substancial dos níveis de investimento
previstos, condição indispensável a que não ocorram estrangulamentos, sobretudo
ao nível da capacidade de processamento de tráfego de passageiros, tendo em
conta as previsões da procura que foram avançadas neste trabalho.
(iii) O caderno de encargos deve ser bastante abrangente no que respeita a regras de
segurança e qualidade de prestação de serviços, sob pena da degradação das
condições que foram ditando o sucesso do AFSC.
(iv) O caderno de encargos deve prover condições de larga autonomia à gestão do
AFSC, no que respeita a atracção de novas empresas, ao aumento do número de
rotas e à diversificação de serviços prestados. Tal é particularmente sensível no caso
de a solução passar pela constituição de um monopólio privado, a qual poderia
determinar, na ausência de restrições adequadas, o risco de uma excessiva
centralização e de uma perda sucessiva de relevância e de financiamento do AFSC
face ao aeroporto de Lisboa. O cenário ideal seria, neste caso, o de uma sociedade
autónoma que provesse a gestão do AFSC. Esta solução, se bem operacionalizada,
poderá permitir captar os benefícios essenciais dos dois modelos básicos de gestão,
isto é, em rede versus separada.
(v) Não se vislumbrando que, procedendo-se à privatização da ANA, seja juridicamente
possível obrigar à participação executiva de entidades regionais e locais na gestão
do AFSC, torna-se importante assegurar um mecanismo que permita àquelas
entidades a manutenção de algum papel relevante no futuro do aeroporto e da sua
articulação com as políticas de promoção e desenvolvimento do território. Neste
contexto e a exemplo do que sucede diversos países europeus, torna-se relevante a
criação de um órgão consultivo com funções em domínios afins aos referidos e com
participação dos principais players regionais e locais.
40
A propósito deste último ponto, a Tabela 3.4 apresenta uma proposta concreta de
órgão consultivo, organizado em três comités especializados. Note-se que tal órgão
poderá ser constituído pela entidade gestora do aeroporto, devendo nesse caso
constar das obrigações patentes no caderno de encargos, ou ser criado no âmbito da
entidade reguladora do sector aeroportuário e aeronáutico, nomeadamente se da
privatização da ANA resultar um monopólio privado, neste caso obrigando à
reformulação das competências e atribuições do INAC (Instituto Nacional de Aviação
Civil) inscritas no Decreto-Lei nº 145/2007.
Tabela 3.4. Esboço de modelo de órgão consultivo para a participação das
entidades regionais e locais
Comité Estratégico
Funções
Discutir o
desenvolvimento a
médio e longo prazo do
aeroporto,
considerando:
- o alinhamento
estratégico dos
stakeholders;
- aspectos económicos
globais ou sectoriais
relevantes para o
aeroporto;
- propostas para
potenciar a contribuição
do aeroporto para o
desenvolvimento da
região;
- a identificação de
oportunidades de
desenvolvimento a
realizar de modo
coordenado.
Comité de
Desenvolvimento
Comercial
Comité de
Infraestruturas e
Ambiente
Analisar a performance
comercial actual e
esperada do aeroporto,
apoiando-o na:
- realização de estudos
de mercado para a
detecção de
oportunidades de
abertura de novas rotas;
- identificação de
incentivos e estratégias
de negociação para a
abertura de novas rotas;
- angariação de fundos
regionais para a
promoção de rotas;
- definição e execução
de planos de lançamento e manutenção de
rotas;
- comunicação e
elaboração de eventos
para promover rotas.
Discutir e acompanhar a
carteira de investimentos significativos e/ou
projectos de expansão
do aeroporto e a sua
envolvente ambiental e
de acessibilidades,
enfatizando:
- a comunicação do
plano de investimentos
e de potenciais impactos
negativos às entidades
locais;
- o incentivo à resolução
atempada de problemas, envolvendo a
comunidade local;
- a identificação de
necessidades a médio e
longo prazo em termos
de acessos, transportes,
urbanismo e ambiente.
41
Até 15 membros
Até 9 membros
Até 11 membros
Representantes dos
agentes económicos da
região (até 6 membros):
- empresários e
gestores da região,
- membros da
Associação comercial do
Porto,
- membros da Entidade
Regional de Turismo
Porto e Norte de
Portugal.
Representantes dos
agentes económicos da
região (até 3 membros):
- empresários e
gestores da região,
- membros da
Associação comercial do
Porto,
- membros da Entidade
Regional de Turismo
Porto e Norte de
Portugal.
Representantes dos
agentes económicos da
região (até 3 membros):
- empresários e gestores
da região,
- membros da
Associação comercial do
Porto,
- membros da Entidade
Regional de Turismo
Porto e Norte de
Portugal.
Representantes da
Junta Metropolitana do
Porto (até 3 membros).
Representantes da
Junta Metropolitana do
Porto (até 2 membros).
Representantes da Junta
Metropolitana do Porto
(até 2 membros).
Representantes da
CCDR (até 2 membros).
Representantes da
CCDR (até 2 membros).
Representantes da CCDR
(até 2 membros).
Académicos da
Universidade do Porto
especialistas em áreas
relevantes (até 4
membros).
Académicos da
Universidade do Porto
especialistas na áreas
(até 2 membros).
Académicos da
Universidade do Porto
especialistas na áreas
(até 2 membros).
Composição
Representantes de
associações ambientais
(2 membros).
Fonte: elaboração própria, com base na literatura consultada
42
Referências
Bibliografia consultada
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www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_base_dados.
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45
Apêndice
Modelo de regressão para o movimento de passageiros no AFSC
A metodologia de previsão utilizada neste estudo baseia-se nos procedimentos
conhecidos de identificação e estimação de modelos de regressão multivariados em
séries temporais (por ex., Wei, 1990).6
Como primeiro passo, fez-se a análise do correlograma das séries para as variáveis a
incluir no modelo. Tendo-se detectado a presença de não-estacionaridade quer na
componente sazonal quer na componente não sazonal da série para o tráfego de
passageiros, procedeu-se à conveniente transformação de variável, obtendo-se
Z t ≡ D( X t ,1,12) = ( X t − X t −1 ) − ( X t −12 − X t −13 ) , onde X t representa o tráfego de
passageiros no mês t. Do mesmo modo, procedeu-se à transformação do índice de
produção
industrial
(em
dados
corrigidos
de
sazonalidade),
tal
que
Wt ≡ D(Yt ,1) = Yt − Yt −1 , onde Yt representa o índice de produção industrial em t.
De seguida, empregando-se a metodologia usual de identificação do modelo, obtevese a seguinte especificação:
Z t = Φ 1 Z t −12 + Φ 2 Z t −24 + Φ 3Wt −2 + Φ 4Wt −12 + a t
onde at representa o termo estocástico. Os resultados da estimação do modelo
proposto, obtidos segundo método de estimação não linear, foram:
6
Coeficiente
Estimativa
Estatística t
Φ1
-0,9677
-2,9425
Φ2
-0,2889
-8,4573
Φ3
2225,3410
3,9691
Φ4
2469,4200
3,8323
O software utilizado foi o Econometric Views versão 7.0.
46
Depois da estimação, passou-se à fase do controlo de diagnóstico, de modo a verificarse a qualidade do ajustamento do modelo à série temporal da variável em estudo.
Concluiu-se que:
o Os parâmetros são estatisticamente significativos, dados os valores (em módulo)
das estatísticas t observadas.
o O comportamento dos resíduos de estimação (ât) assemelha-se a um ruído branco:
o
O cronograma dos resíduos não mostra uma tendência ou um padrão
sistemático, parecendo existir uma variância aleatória em torno do zero (ver
Figura A.1).
o
O correlograma dos resíduos mostra todos os valores estimados da FAC
(função de autocorrelação) e FACP (função de autocorrelação parcial) dentro
da banda de não-significância dos dois desvios-padrões.
o
A estatística Q de Ljung-Box não é significativa, uma vez que χ 2 = 13,208
(para o lag 24), o que corresponde a p-value = 0,927. Deste modo, não se
rejeita a hipótese conjunta de todos os valores da FAC (para os primeiros 24
desfasamentos) serem nulos.
47
Figura A.1. Cronograma para o ajustamento da série do movimento de passageiros no
AFSC
120,000
80,000
40,000
0
60,000
-40,000
40,000
-80,000
20,000
0
-20,000
-40,000
-60,000
I
II
III IV
I
2007
II
III IV
2008
I
II
III IV
I
2009
II
III IV
I
2010
II
III IV
I
2011
Resíduos
Observado
Ajustamento
Fonte: elaboração própria com recurso ao software Eviews 7.0.
Modelo de regressão para o movimento de carga no AFSC
A análise do correlograma das séries para as variáveis a incluir no modelo conduziu à
detecção de não-estacionaridade. Procedeu-se, assim, à conveniente transformação
das variáveis, obtendo-se
Z t ≡ D( X t ,1) = X t − X t −1 , onde
Xt
representa o
movimento de carga no mês t e Wt ≡ D(Yt ,1) = Yt − Yt −1 , onde Yt representa o volume
de comércio externo de mercadorias (valor das importações mais exportações de
mercadorias, deflacionado com o índice de preços da produção industrial) em t.
De seguida, empregando-se a metodologia de identificação do modelo, obteve-se a
seguinte especificação:
48
Z t = Θ1 Z t −1 + Θ 2Wt + a t
onde at representa o termo estocástico. Os resultados da estimação do modelo
proposto, obtidos segundo método de estimação não linear, foram:
Coeficiente
Estimativa
Estatística t
Θ1
-0,4622
8,5412
Θ2
2,41E-05
-5,0842
A fase do controlo de diagnóstico permitiu concluir que o modelo está bem ajustado à
série temporal da variável em estudo, uma vez que:
o Os parâmetros são estatisticamente significativos, dados os valores (em módulo)
das estatísticas t observadas.
o O comportamento dos resíduos de estimação (ât) assemelha-se a um ruído branco:
o
O cronograma dos resíduos não mostra uma tendência ou um padrão
sistemático, parecendo existir uma variância aleatória em torno do zero (ver
Figura A.2).
o
O correlograma dos resíduos mostra todos os valores estimados da FAC e
FACP dentro da banda de não-significância dos dois desvios-padrões.
o
A estatística Q de Ljung-Box não é significativa, uma vez que χ 2 = 29,50
(para o lag 24), o que corresponde a p-value = 0,164. Deste modo, não se
rejeita a hipótese conjunta de todos os valores da FAC (para os primeiros 24
desfasamentos) serem nulos.
49
Figura A.2. Cronograma para o ajustamento da série do movimento de carga no AFSC
1,000
500
0
800
-500
400
-1,000
0
-400
-800
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
Resíduo
Observado
Ajustamento
Fonte: elaboração própria com recurso ao software Eviews 7.0.
50
www.fep.up.pt
Faculdade de Economia da Universidade do Porto
Rua Dr. Roberto Frias
4200-464 Porto
Portugal
T.: +351 225 571 100
F.: +351 225 505 050
[email protected]
51

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