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Resenhas
medida em que, efectivamente, vai diminuindo o tempo para a realização da mesma e aumentando as probabilidades de falhar - perpetuando e agravando o problema. A autora
desmonta criteriosamente este mecanismo,
oferecendo meios ao leitor para uma auto-avaliação acerca do comportamento de
procrastinação, bem como propõe exercícios
específicos para ultrapassar esta armadilha.
Simultaneamente, é dada informação sobre o
modo como gerir o tempo, utilidade da planificação das actividades, tipos de planificação
e discutida a questão da motivação e atitudes
perante a tarefa.
Finalmente, no último capítulo (‘Learning
How to Learn’), a autora selecciona um conjunto de informações úteis acerca da aprendizagem, com base nas quais sugere diversos
procedimentos que visam melhorar as competências de estudo. Assim, são focadas questões como a distracção, a memória, decorar
na última hora, enquanto aspectos altamente
imbricados no acto de estudo. O livro termina
com uma lista de indicações de diversa ordem
que devem estar presentes na situação de realização de testes, e que, poderão ajudar a ultrapassar algumas dificuldades inerentes a esta
situação.
Em síntese, tendo em conta o contexto
essencialmente prático e os objectivos de autoajuda, o livro de Susan Johnson disponibiliza
um conjunto de exercícios e técnicas
detalhadamente descritas, conceptualizando a
ansiedade perante os exames como um
fenómeno complexo que envolve aspectos
cognitivos, comportamentais e emocionais e
cuja intervenção deve integrar estes diversos
componentes, antes, durante e depois dos exames. A sua proposta de intervenção é solidamente constituída num conjunto de técnicas
mais focadas sobre o controlo da ansiedade relaxamento, modificação do diálogo interno,
dessensibilização sistemática, modelamento
coberto - para, nos dois últimos capítulos,
focar sobre competências de estudo, isto é,
sugestões que ajudam a centrar a atenção,
parar de procastrinar, fazer uma melhor utilização do tempo e a aprender de forma mais
eficaz e melhor recordar o material.
A questão aqui não é que a simples leitura
deste livro resolve o problema e dispensa a
ajuda de outras alternativas, mas sim que,
necessariamente, o leitor sairá enriquecido
com a visão de que as coisas passam por si,
de que pode ter um papel activo e com maior
consciência de alguns dos processos
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intervenientes. Neste sentido, penso que é um
bom livro para todos aqueles que, de alguma
forma, sentem que gostariam de diminuir a
sua ansiedade perante as situações de avaliação, bem como para todos aqueles que, de
alguma forma, procuram ajudar os outros
nesta área. Por vezes, é necessário este processo (re)construtivo de ser guiado ou promovido em conjunto com um terapeuta. É aqui
que este livro se mostra potencialmente útil,
dando possibilidade ao cliente de acompanhar
a terapia ou aconselhamento, reflectir sobre a
informação, colocar novas questões, ser ele
próprio a estabelecer as suas próprias experiências, ou seja, numa palavra, ser co-autor da
mudança terapêutica.
Marina Cunha
Instituto Superior Miguel Torga
Pierre Lévy. 2000. Cibercultura : Relatório
para o Conselho da Europa no Quadro do
Projecto ‘Novas Tecnologias : Cooperação
Cultural e Comunicação’. Título original:
Cyberculture. Éditions Odile Jacob / Éditions
du Conseil de l’Europe, 1997. Tradução de
José Dias Ferreira. Lisboa : Instituto Piaget.
281 pp. ISBN : 972-771-278-9.
A leitura de Pierre Levy é, necessariamente,
influenciada pelas inúmeras reflexões feitas
sobre a sua obra, a maior parte das vezes confundindo-se o exposto nos seus livros com as
consequências da massificação das entrevistas e conferências dadas por Lévy. Esta obra
está dividida em três capítulos. No primeiro,
o autor define alguns termos mais populares
da cultura da Internet e da utilização digital.
No segundo capítulo, partindo do pressuposto da ‘continuidade histórica no processo de
evolução dos meios de comunicação’, Pierre
Lévy esclarece, na sua óptica, os benefícios
humanos e culturais da Internet. A última parte é dedicada ao comentário crítico dos mitos
criados pelos críticos da rede, frequentemente, segundo o autor, com pouca lucidez para
compreender o potencial humanizante e humanitário das novas tecnologias digitais.
O filósofo francês começa por fornecer,
introdutoriamente, àqueles que ainda estão
off-line meios de vocabulário para avaliarem
o universo on line. De facto, seria difícil para
o cibernauta de primeira viagem compreen-
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Interacções
der os temas mais provocativos desenvolvidos ao do livro sem o acesso às definições
iniciais. Desde o início, Pierre Lévy deixa clara
a sua intenção de deixar de fora as questões
económicas e da globalização tão comuns na
discussões da cultura electrónica, concentrando-se nas implicações propriamente culturais,
incluindo a cultura política da cidadania digital. A questão do autor, assim, é que a rede de
computadores é ‘universal sem totalitarismo’,
ou seja, permite a todos os que estiverem ligados construir e partilhar a inteligência colectiva, sem se submeterem a restrições políticoideológicas. Partindo deste princípio, encara
a Internet como um agente humanizador, porque democratiza a informação, e humanitário,
porque permite a valorização das competências individuais e a defesa dos interesses das
minorias. O cidadão ligado à Web electrónica
tem condições potencialmente eficazes para
interferir directamente no controlo das decisões públicas, sem mediadores, o que pode
ajudar a descentralizar, democratizar e
optimizar os serviços públicos.
Apesar de defender as vantagens da vida
on line, Pierre Lévy mantém-se distante, porém, do equívoco de que a ligação à rede substitui ou substituirá a interacção social e o contacto entre as pessoas. Pelo contrário, a sua
convicção é que a Internet possibilita contactos mais frequentes e produtivos, na medida
em que aproxima os actores sociais antes
mesmo dos acontecimentos colectivos e aqui
reside o seu papel ou sentido humanizador. A
prática da pesquisa na Internet à procura de
informações torna evidente para o utilizador
como a rede é uma ferramenta útil e indispensável. Todavia, não uma ferramenta única. Por
essa razão, Pierre Lévy coloca no centro da
discussão os processos da comunicação escrita e verbal, fornecendo ao leitor informações produtivas sobre estas formas da comunicação humana. Assim como a escrita pressupõe a linguagem oral que não substituiu, o
armazenamento e transmissão de textos on
line depende da escrita e não irá condená-la
ao desaparecimento, mesmo que daqui para a
frente ela esteja mais do que nunca associada
à imagem. A rede possibilita a navegação entre textos afins, instantaneamente. Além disso, nunca se editou e publicou tanto como na
actualidade, contradizendo as mistificações
acerca do perigo de a digitalização conduzir a
uma pura substituição da cultura escrita.
O livro fornece um panorama amplo das
consequências socioculturais da univer-
salização da informação. Pierre Lévy defende,
essencialmente, a tese de que a rede impossibilita o monopólio do saber e de se conferir,
fausticamente, poderes absolutos a indivíduos ou pequenos grupos: ‘A partir do século
XX, com a ampliação do mundo, a progressiva descoberta da sua diversidade, o crescimento cada vez mais rápido dos conhecimentos científicos e técnicos, o projecto de domínio do saber por um indivíduo ou por um
pequeno grupo, tornou-se cada vez mais ilusório.’
No segundo capítulo, o autor aborda as
implicações culturais do desenvolvimento do
ciberespaço sobre a educação, arte, expansão
do conhecimento. A educação é o tema que
recebe maior atenção. O futuro papel do professor não será de difusor de conhecimentos,
afirma, mas de ‘animador da inteligência colectiva’ dos estudantes, estimulando-os a trocar os seus conhecimentos. O ciberespaço
fomenta a partilha da memória e o potencial
da imaginação criativa colectiva. Daí, segundo o autor, a necessidade de repensar a função dos sistemas de ensino, aprendizagem e
avaliação. Neste sentido, critica o facto de o
diploma continuar ainda a ser o único método
de reconhecimento da aprendizagem e aprova
a integração de sistemas de educação
presencial e à distância. Por fim, propõe um
método informatizado de controle global de
competências que inclui tanto os conhecimentos especializados e teóricos, como os saberes básicos e práticos.
Na última parte, intitulada ‘Problemas’,
Lévy comenta as críticas mais populares à
cultura da Web: a substituição da realidade
por sistemas puramente virtuais; aumento de
novas formas de exclusão e desigualdade; caos
da informação; hegemonia do inglês; a ruptura dos valores fundadores da modernidade
europeia. No primeiro caso, a convicção de
Lévy é que os modos de relação, conhecimento e aprendizagem da cibercultura não paralisam, nem substituem os já existentes. Pelo
contrário, como se viu no caso da escrita, favorecem o aumento da sua complexidade: ‘As
críticas à Cibercultura traduzem a ignorância
e o desejo de manutenção de poder (...), porque há poderes e monopólios que estão ameaçados. Muitos intelectuais são directores de
colecção em editoras, professores que animam
revistas e assim, com a rede, há todo um movimento de comunicação que escapa às redes
tradicionais’. No caso da exclusão, admite que
as tecnologias produzem excluídos, mas apon-
Resenhas
ta para o aumento do número de ligações, a
diminuição de preços dos serviços e alerta
que ‘mais do que garantir o acesso, é preciso
assegurar as condições de participação no
ciberespaço’. Quanto ao domínio actual da
língua inglesa, responde que é mais uma questão de iniciativa do que um genuíno constrangimento hegemónico, o que parece querer
dizer que o inglês é mais a língua que facilita
o desenvolvimento inicial da nova cultura do
que um determinante da sua continuidade.
O pensamento de Lévy é, desta forma, fundamentalmente conduzido pela ideia de que a
cibercultura é herdeira do legado da filosofia
das Luzes e difunde valores de fraternidade,
igualdade e liberdade: ‘A rede é antes de tudo
um instrumento de comunicação entre indivíduos, um lugar virtual no qual as comunidades ajudam os seus membros a aprender o
que querem saber’. Diante da profusão do fluxo informativo e do caos emergente que poderá causar, defende a ideia de que a rede tem a
sua própria forma de controle: a opinião pública e as instituições democráticas que dela
fazem parte.
Francisco Amaral
Escola Superior de Educação/ Instituto
Superior Politécnico de Coimbra;
Instituto Superior Miguel Torga
Joaquim Ferreira Gomes. 2001. Novos Estudos de História da Educação. Coimbra.
Quarteto Editora. 265 pp. ISBN: 972-871710-15.
Durante décadas, a história das ideias pedagógicas confundiu-se com a história dos grandes pedagogos. Recitava-se e receitava-se um
conjunto de verbetes que acolhiam notas biográficas, a par com alguns enunciados das
propostas pedagógicas, num registo
historiográfico que nem aprofundava as obras
dos mais significativos pedagogos, nem abria
as suas propostas à pensabilidade do facto
educacional, como agente transformador, e à
análise da sua aplicabilidade, em registo
diacrónico. O panorama do necessário
aprofundamento dá-se entre nós - e podemos
acentuar que também no meio universitário
europeu - com Joaquim Ferreira Gomes, a
quem se deve uma lição outra sobre os grandes marcos da pedagogia, a que junta uma
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exaustiva investigação e uma nova visão
interrogante que nos possibilitou o conhecimento de obras fundamentais, convenientemente anotadas, só possível a quem, como é
o caso, domina com profundidade e rigor a
língua latina e o grego clássico.
Os seus estudos, marcados por uma penetrante reflexão historiosófica, solicitam-nos
a compreensão do facto histórico enquanto
tal, mas, ao mesmo tempo, pelo rigor
hermenêutico e pela limpidez do comentário,
abrem a possibilidade de novas leituras e
consequente clarificação das transformações
que se foram operando a partir delas ou a
verificação dos estratégicos alheamentos das
sociedades que especificamente as motivaram.
Se lhe devemos, entre muitos de insuperável
interesse, trabalhos fundamentais sobre as
reformas pombalinas, sobre a universidade
conimbricense, a par de modelares estudos
da história da educação em Portugal, nunca
será demais exaltar a importância da divulgação da espantosa obra de Coménio, pela via
da exemplar edição da Didactica Magna (Fundação Calouste Gulbenkian, 1966) e da
Pampaedia (Instituto de Estudos Psicológicos
e Pedagógicos, Universidade de Coimbra,
1971), do mesmo autor.
Digo espantosa para fixar quão surpreendentes, pela intemporalidade, são as propostas do clérigo nascido na Boémia por finais
do século XVI, de tal sorte que quanto se escreveu depois, em matéria de intervenção pedagógica, pouco ou nada acrescenta. Transcorridos mais de trezentos anos sobre a publicação daquelas duas obras, surpreendemonos na verificação da sua inovação e actualidade, sobretudo nós, os filhos de uma pátria
que, há umas décadas atrás, ainda consagrava
em textos doutrinários as virtudes da ignorância, separava rapazes de raparigas no domínio das aprendizagens, sonegava o conhecimento em nome de bafientas moralidades ou
do comprazimento religioso, consagrava, enfim, em cursos de formação feminina, no antigo Ensino Técnico, a ‘boa dona de casa’ como
paradigma da estabilidade familiar, investindo em disciplinas como culinária, economia
doméstica e lavores femininos, em desfavor
do elenco disciplinar dado aos rapazes nos
demais cursos. Para que se perceba o peso
desse obscurantismo, confrontem-se as ‘reformas educativas’ do salazarismo com os textos produzidos por Coménio no Sec. XVII,
obras que Joaquim Ferreira Gomes exaustivamente tem posto à disposição não só dos es-

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