a autobiografia do personagem
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a autobiografia do personagem
Ugo Breyton Silva 2emB Língua Portuguesa e Literatura Professoras: Maíra Carmo Marques e Angela Kim Arahata 2o Trimestre – 2012 21.08.2012 A AUTOBIOGRAFIA DO PERSONAGEM JT Leroy surgiu quando, em 1999, lançou seu primeiro livro, chamado "Sarah". Um livro que possui um caráter autobiográfico, relatando a história de um garoto, nascido em outubro de 1980, na Virgínia, "que com cinco anos de idade era vendido pela mãe para fregueses pedófilos, aos dez vestia-se de mulher e fazia ponto em parada de caminhões com o apelido de Cherry Vanilla, com quinze anos passou a se chamar JT Leroy" (Retirado do texto de apresentação da peça de teatro “JT, Um conto de fadas punk”.). JT Leroy (ou Jeremiah Terminator Leroy), explodiu, interessou e impressionou diversas pessoas, entre eles, Lou Reed, Courtney Love, Madonna, Bonno Vox, Gus Van Sant e uma série de outros artistas e famosos. Porém, em meados de 2006, JT Leroy foi desmascarado: na verdade, quem escreveu "Sarah" (1999), "The Heart is Deceitful Above All Things" (“Maldito Coração” na tradução para o português brasileiro) (1999), "Harold's End" (2005) e "Labour" (2007), além do roteiro original do filme "Elephant", de Guns Van Sant, assinando JT Leroy, foi Laura Albert, uma punk-rocker de São Francisco especializada em sexo por telefone e escritora de pouco sucesso. Além de Laura, por telefone, em aparições públicas, JT Leroy (menino baixo, loiro, de óculos, chapéu e paletó, tímido, difícil, esquisito, introspectivo) era "interpretado" por Savannah Knoop, irmã do namorado de Laura, Geoffrey Knoop. Ambas, Laura Albert e Savannah Knoop foram, por algum tempo, simultaneamente e paralelamente às suas vidas, "JT Leroy". Falavam como JT, apareciam (apenas Savannah) como JT, assinavam como JT. Criaram durante este período, entre o lançamento do primeiro livro, as entrevistas por telefone e as primeiras aparições, um “personagem” e suas características, seu 1 modo de se vestir, falar e uma série de outras ações. Viveram, em paralelo a suas vidas, uma segunda, uma alternativa, um segredo, um personagem criado por Laura na escrita, mas que obteve uma imagem física, corporal, em Savannah. Sim, existiu um JT Leroy, Savannah não era Savannah quando entrevistada como JT, Laura não era Laura quando atendia e mantinha uma conversa com Madonna e Courtney Love, jornalistas, escritores e críticos interessados em seus textos, seus jeitos, seus gestos, sua face e sua história. Criou-se na mídia, um grande enigma em torno deste novo escritor que surgia. Por algum tempo Laura Albert sustentou a própria farsa pelo telefone, mas com o aumento da popularidade de JT, na mídia e no interesse geral dos leitores, e com a crescente dúvida entre jornalistas americanos sobre este enigma de quem realmente seria JT Leroy, tornaram-se necessárias as aparições públicas do autor que, na verdade, não existia. Pelo menos em carne e osso. Havia ainda, dentre os jornalistas, rumores de que o escritor e artista Dennis Cooper ou o diretor de cinema Gus Van Sant, pessoas com quem JT mantinha algum contato, pelo menos pelo telefone, e pessoas que se interessavam pelo "jovem escritor", eram, em segredo, o próprio JT Leroy. A atriz Natália Lage, que interpreta Savannah Knoop (que se tornava JT para entrevistas e leituras publicas) na peça "JT, Um conto de fadas punk", define a necessidade de aparições públicas de Leroy como, "uma demanda contemporânea". A demanda por uma face e um corpo a qualquer pessoa que produz algum trabalho artístico. Neste momento, Savannah Knoop "surge" como JT Leroy, travestindo-se como um menino com cara de menina, um sujeito estranho, sempre de óculos escuros e peruca loira, que o faria parecido ou pelo menos lembrava, intencionalmente ou não, o artista americano Andy Warhol. Além desta demanda contemporânea por um corpo, uma imagem, como ressaltou a atriz que interpreta Savannah, existe, na sociedade atual, uma demanda e quase um “culto” à biografia de cada artista. As opções sexuais, a origem, a religião, as opiniões políticas, entre outras coisas, que, junto com a imagem (corpo, rosto, roupas) parecem em muitos casos serem mais importantes que a própria produção artística do indivíduo ou grupo. A fama de JT Leroy tem como “base” um grande enigma. Há um grande desejo entre leitores, críticos, jornalistas e todos que chegam de algum modo a esta história do jovem autor, a construir dúvidas e cada vez mais suposições sobre JT, seus escritos e sua personalidade. Dúvidas e suposições construídas a partir desta falta de certeza causada pela sua imagem, ou a falta de uma 2 imagem, enquanto JT ainda não “estava” disfarçado no corpo de Savannah, que talvez marque o início de todas estas questões. Um anonimato em questão de um corpo, de uma imagem, enquanto tínhamos em mãos, uma possível grande biografia de sua vida e suas histórias “cabulosas”. O anonimato que “garante” a JT seu estrelato, todas as suposições, todas as dúvidas, as milhares questões sobre a pessoa erguem a sua fama. “Dê ao homem a máscara, e ele lhe dirá a verdade” A descoberta de que JT Leroy não existe, representou uma queda bem significativa na venda de seus livros e milhares de críticas à Laura Albert, feitas por telefone, diretamente a ela e por textos publicados em diversos veículos de imprensa pelo mundo. Houve entre muitos dos leitores, jornalistas e críticos algo como um “sentimento de traição”. Pergunto-me por quê? Será que um autor, um nome e uma face, nos dias de hoje, valem mais do que um livro? Inicialmente, lembro-me que há muitos séculos, as histórias eram conhecidas por serem passadas de boca em boca, contadas. Não se sabia quem teria as inventado, e cada um transformava um pouco a história, com o seu jeito de contá-la. Em contraponto à referência do último parágrafo, um período em que as histórias eram contadas de boca em boca, e nada se sabia sobre seus autores “originais”, penso no Romantismo, um movimento da escrita em que, como comenta Anatol Rosenfeld em seu texto “Romantismo e Classicismo” (2002): “o que prevalece (...) não é propriamente o objeto criado, mas o ato de criação e o sujeito criador”. O romantismo foi um período onde aconteceu uma renovação libertadora para os escritores, em relação à forma e ao conteúdo de seus textos, com esta transformação e maior abertura aos autores eles “chegam”, ou “ganham” a posição de gênios, onde “a obra valida-se na medida em que exprime o ser profundo do autor”. O caso de JT é um belo exemplo dos resquícios da grande transformação na relação do autor e sua obra do período romântico. Laura Albert cita Oscar Wilde para explicar o que foi JT Leroy, além de uma bela enganação ao mundo. “Dê ao homem a máscara, e ele lhe dirá a verdade”, com esta frase de Wilde, Laura afirma em entrevistas mais recentes, após a descoberta sobre sua farsa, em 2006, que usou a “pessoa” Jeremiah Terminator Leroy como um disfarce para poder contar histórias. Um véu que dava a ela a possibilidade de falar coisas que a atormentavam e que ela não 3 conseguia por no papel como Laura Albert. A maioria delas, histórias que, segundo ela, ouviu em suas internações em clínicas psiquiátricas, e que juntas, “formam” a pessoa criada por ela e Savannah. Histórias que ficaram em sua cabeça e que precisavam ser exploradas. Os dois primeiros versos do poema “Identidade” de Mia Couto, expressam, a meu ver, bem, o sentimento de Laura em contar estas histórias, e a necessidade de “construir” um personagem que “possa”, ou simplesmente consiga dizer estas coisas. Coisas que fazem parte da sua formação como indivíduo, que, segundo ela, ouviu em suas passagens por clínicas psiquiátricas e que a tocaram, pois, de certo modo, possuem uma relação com a sua pessoa e sua vida. “Preciso ser um outro; Para ser eu mesmo”. BIBLIOGRAFIA: BEACHY, STEPHEN. New York Magazine. Who is the real JT LeRoy? . A search for the true identify of a great literary hustler. 2005. RICH, NATHANIEL. The Paris Review. Being JT Leroy. VICE, JOSI. Malevolência em má companhia 2008 (Blog). JT LeRoy. (Outra referência foi a peça de teatro “JT, um conto de fadas punk” escrita por Luciana Peçanha, e o texto de apresentação da peça escrita pela própria autora do texto, o diretor da peça, Paulo José, e pelo “SESC”) (Mais uma referência, a entrevista da atriz Natália Lage que interpreta Savannah Knoop na peça “JT, um conto de fadas punk”, no programa Jô Soares, na Rede Globo) 4