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Hepatectomia central - drorlandotorres.com.br
O.J.M. Torres, I.H.I.L.S. Coutinho, J.C.A. Cintra, L.B. de Almeida Júnior, L.R.G. Arraes, A.J. Dominici
R
E L A T O
D E
C
A S O
Hepatectomia central: relato de caso
Central hepatectomy: case report
ORLANDO JORGE MARTINS TORRES, ITÁGORES HOFFMAN I. LOPES S. COUTINHO, JEAN CARLOS ANTUNES CINTRA,
LIORNE BRANCO DE ALMEIDA JÚNIOR, LÍVIA RONISE GARCIA ARRAES, ARNALDO DE JESUS DOMINICI
Disciplina de Clínica Cirúrgica III da Universidade Federal do Maranhão – UFMA
RESUMO
A ressecção hepática é o tratamento apropriado para uma variedade de lesões benignas e
malignas primárias e secundárias. Quando essas
lesões estão localizadas nos segmentos IV, V e
VIII, o problema persiste. A hepatectomia central
é uma forma de minimizar o volume de fígado
ressecado e evitar a insuficiência hepática pósoperatória. O objetivo do presente estudo é registrar um caso de hepatectomia central. Paciente do sexo masculino, 40 anos, apresentava dor
abdominal, perda de peso e saciedade precoce.
A tomografia computadorizada mostrou múltiplos
cistos na localização correspondente aos segmentos IV, V e VIII do fígado. A ressecção da região
central do fígado foi realizada, preservando os
segmentos I, II, III, VI e VII e a recuperação ocorreu sem intercorrências. Os autores concluem que
a hepatectomia central deve ser considerada
como alternativa para ressecções em pacientes
selecionados com lesões primárias ou secundárias localizadas na região central do fígado.
SUMMARY
Hepatic resection is appropriate treatment for
a variety of benign and of primary or secondary malignant lesions. Centrally located lesions
in the segments IV, V, and VIII remain problematic. Mesohepatectomy is one way of minimizing the volume of liver resected and of
preventing postoperative liver failure. The aim
of this study is to report a case of mesohepatectomy. A forty-year old man presented with
abdominal pain, weight loss and early satiety.
The computed tomography showed multiple
cysts in segments IV, V, and VIII of the liver.
Resection of central hepatic segments and sparing segments I, II, III, VI, and VII was performed
and the recovery was uneventful. The authors
concluded that mesohepatectomy should be
considered an alternative to extended hepatectomy for selected patients with primary or secondary hepatic lesions localized in segments
IV, V, and VIII of the liver.
Unitermos – Hepatectomia central; Segmentectomia central;
Hepatectomia alargada.
Keywords – Mesohepatectomy; Central segmentectomy; Extended hepatectomy.
INTRODUÇÃO
A ressecção hepática é o tratamento apropriado
para uma variedade de lesões benignas e malignas,
primárias ou metastáticas. Essas ressecções, quando
ampliadas, devem ser realizadas com segurança e
levar em consideração a quantidade de sangue perdido e o volume de massa hepática funcional removida. Nas lesões benignas ou malignas de localização central, as ressecções podem deixar reserva
hepática funcional insuficiente. Ressecções ampliadas direita ou esquerda podem remover 60% a 85%
do parênquima hepático e estão associadas com
complicações graves, incluindo a insuficiência hepática(1,2). As hepatectomias centrais (segmentos IVa,
IVb, V e VIII de Couinaud) permitem minimizar o
volume hepático ressecado. O fígado preservado
pode tornar-se crucial para evitar a insuficiência
hepática pós-operatória(3).
A primeira descrição de uma ressecção hepática
central (segmentectomia IV, V e VIII) foi registrada
em 1972 por McBride e Wallace(1). O objetivo do
presente estudo é apresentar um caso de hepatectomia central.
RELATO DO CASO
Paciente do sexo masculino, 40 anos, deu entrada na Disciplina de Clínica Cirúrgica III – UFMA
apresentando dor no hipocôndrio direito, aumento
Endereço para correspondência – Dr. Orlando Torres, Rua Ipanema, 1, Ed. Luggano, Bl. I, apto. 204, São Francisco – 65076-060
– São Luís, MA. E-mail: [email protected]
Recebido em: 25/1/2005 – Aprovado para publicação em: 13/7/2005
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Hepatectomia central: relato de caso
do volume abdominal, constipação intestinal, plenitude pós-prandial e perda de peso.
Ao exame físico, apresentava-se com estado geral e nutricional regulares, mucosas normocoradas,
anictérico e sinais vitais normais. O abdome era plano e indolor à palpação superficial e profunda. O
fígado era palpável a aproximadamente 8cm do
rebordo costal direito, superfície irregular e borda
romba. Espaço de Traube, livre e sem outras alterações.
A investigação laboratorial mostrou hematócrito
– 40%; hemoglobina – 13,8g/dl; leucócitos – 5.470/
mm3; plaquetas – 226.000/mm3; bilirrubina total –
1,0mg/dl; glicose – 91mg/dl; creatinina – 0,6mg/
dl; AST – 23U/l; ALT – 18U/l; albumina – 4,5g/dl;
anti-HbC total positivo (0,01); HBsAg negativo.
Realizou ultra-sonografia do abdome total, que
observou fígado aumentado de volume, com parênquima heterogêneo, apresentando múltiplos cistos de dimensões variáveis. A tomografia computadorizada evidenciou fígado de dimensões
aumentadas, contornos irregulares, apresentando
lesões císticas de tamanhos variados (figura 1). Demais estruturas, normais.
com fios inabsorvíveis. O aspecto final do fígado
preservava os segmentos II, III, VI e VII (figura 2).
Revisão da hemostasia dos segmentos remanescentes, drenagem da cavidade peritoneal com dreno
tubolaminar e síntese da ferida operatória por planos.
Figura 2 – Aspecto final da ressecção hepática central
O paciente permaneceu por cinco dias em unidade de terapia intensiva, onde recebeu transfusão
de duas unidades de concentrado de hemácias.
Apresentou evolução favorável, com exames laboratoriais de controle normais, sendo em seguida
transferido para enfermaria e recebendo alta hospitalar no 13o dia do período pós-operatório, sem intercorrências. O estudo anatomopatológico revelou
lesões císticas circundadas por parênquima hepático normal.
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DISCUSSÃO
Figura 1 – Tomografia computadorizada mostrando lesão
com múltiplos cistos na área central do fígado
Com o diagnóstico pré-operatório de cisto hepático sintomático e após preparo pré-operatório, o
paciente foi submetido a tratamento cirúrgico. Através de incisão subcostal bilateral com prolongamento superior, o fígado foi abordado e macroscopicamente se apresentava aumentado de volume,
contorno irregular e com múltiplas lesões císticas
localizadas particularmente nos segmentos IV, V e
VIII. A liberação do fígado foi realizada por secção
dos ligamentos redondo, falciforme, coronário, triangular direito e esquerdo. Identificação do pedículo
vasculobiliar e realização da manobra de Pringle para
clampleamento intermitente. Realizada ressecção do
parênquima hepático utilizando pinças e ligadura
Em pacientes com lesões benignas, a ressecção é
segura e efetiva quando realizada por sintomas diretamente relacionados ao tumor. Essas ressecções
podem ser realizadas para o alívio dos sintomas
(como dor ou saciedade precoce) na incerteza diagnóstica ou para lesões com potencial maligno. A
maioria dessas lesões pode ser removida com preservação máxima do parênquima normal. Conseqüentemente, lesões como hemangiomas, adenomas, cistos complexos ou hiperplasia fibronodular
são freqüentemente excisados por enucleação ou
ressecções anatômicas com margens limitadas(1,4).
No presente estudo, a ressecção direita ou esquerda ampliada deixaria um remanescente hepático pequeno com possibilidade de evoluir com insuficiência hepática e a enucleação não foi possível. A
localização central com envolvimento vascular poderia levar à necrose de um dos segmentos anatômicos residuais.
A preocupação com a hemorragia incontrolável
é o principal impedimento para a utilização das res-
O.J.M. Torres, I.H.I.L.S. Coutinho, J.C.A. Cintra, L.B. de Almeida Júnior, L.R.G. Arraes, A.J. Dominici
secções hepáticas como uma forma efetiva de terapia. Por outro lado, a técnica operatória tem melhorado de forma significante e os centros mais experientes têm relatado significativa redução da perda
sanguínea e da necessidade de transfusão, mesmo
após ressecções ampliadas(5-7).
A hepatectomia central requer duas secções parenquimatosas e preserva os segmentos I, II, III, VI
e VII. Alguns estudos mostram que esse procedimento resulta em menor taxa de morbidade que as
hepatectomias ampliadas. A duração do procedimento é semelhante e o sangramento intra-operatório é significativamente menor do que nas ressecções ampliadas. Por ser menor o segmento
ressecado, as complicações relacionadas à reserva
funcional hepática são menos freqüentes(8-10). No
presente estudo não houve transfusão sanguínea no
intra-operatório e apenas duas unidades de concentrado de hemácias foi utilizado durante toda internação hospitalar.
A hepatectomia central é considerada uma ressecção quadrissegmentar da área central do fígado.
A determinação operatória da ressecabilidade através da palpação manual é útil e a ultra-sonografia
operatória tem-se mostrado essencial; entretanto,
não está disponível em nosso serviço. A relação
anatômica da lesão com estruturas vasculares e biliares que devem ser preservadas define a realização de um procedimento seguro. Quando há envolvimento da veia cava, a ressecção não deve ser
realizada(9,10).
Concluímos que esse procedimento deva ser visto como complexo por envolver o segmento mé-
dio do fígado e necessitar de especial atenção para
evitar lesões cirúrgicas da veia hepática, da veia
porta e do sistema biliar. Entretanto, preserva mais
parênquima hepático e sua complexidade não deve
ser o determinante de sua aplicabilidade em casos
selecionados.
REFERÊNCIAS
1. McBride CM, Wallace S. Cancer of the right lobe of the
liver: a variety of operative procedures. Arch Surg 1972;
105: 289-96.
2. Povoski SP, Fong Y, Blumgart LH. Extended left hepatectomy. World J Surg 1999; 23: 1289-93.
3. Strasberg SM. Terminology of liver anatomy and liver resection: coming to grips with hepatic babel. J Am Coll Surg
1997; 184: 413-34.
4. Torres OJM, Ribeiro WG, Alencar SN, Macedo EL, Nunes
PMS, Barbosa Jr JB. Ressecção hepática alargada por doença cística do fígado. GED 2000; 19: 42-4.
5. Hansen PD, Isla AM, Habibe NA. Liver resection using total
vascular exclusion, scalpel division of the parenchyma, and
a simple compression technique for hemostasis and biliary
control. J Gastrointest Surg 1999; 3: 537-42.
6. Man KM, Fan ST, Neg IO. Tolerance of the liver to intermittent pringles maneuver in hepatectomy for liver tumors. Arch
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7. Ryan JA, Faulkner DJ. Liver resection without blood transfusion. World J Surg 1989; 157: 472-5.
8. Hasegawa H, Makuuchi M, Yamazaki S, Gunven P. Central
bisegmentectomy of the liver: experience of 16 patients.
World J Surg 1989; 13: 786-90.
9. Scudamore CH, Buczorviski AK, Shayan H, Ho SG, Chung SW,
Owen DA. Mesohepatectomy. Am J Surg 2000; 179: 356-60.
10. Wu CC, Ho WL, Chen JT. Mesohepatectomy for centrally
located hepatocellular carcinoma: an appraisal of a rare
procedure. J Am Coll Surg 1999; 188: 508-15.
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