microgastria

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microgastria
CENTRO DE ESTUDO ESPECIALIZADO EM MEDICINA FETAL FETUS
Pós-Graduação em Medicina Fetal sensu lato
JANAÍNA ALENCAR DE MENEZES
ANOMALIAS CONGÊNITAS DO FÍGADO E DAS
VIAS BILIARES
São Paulo
2011
CENTRO DE ESTUDO ESPECIALIZADO EM MEDICINA FETAL FETUS
Pós-Graduação em Medicina Fetal sensu lato
JANAÍNA ALENCAR DE MENEZES
ANOMALIAS CONGÊNITAS DO FÍGADO E DAS
VIAS BILIARES
Monografia de conclusão do curso de
Especialização e Pós-graduação “latu-sensu” em
Medicina Fetal do Centro de Diagnóstico PréNatal e Medicina Fetal – FETUS.
Orientadora: Profª. Laís Guimarães Vieira
São Paulo
2011
AGRADECIMENTOS
A Deus que me guia sempre e transforma meus sofrimentos em experiência e
aprendizado.
Aos meus pais e irmãos que sempre estiveram ao meu lado, nos momentos
alegres e tristes e que suportaram minha ausência pacientemente.
Ao meu marido Jean Fabrício que me apóia diante das dificuldades com amor
e paciência.
Ao meu filho Jean Carlos que apesar de ainda estar em formação desde já é
muito amado.
Ao Dr. Eduardo Isfer, preceptores, companheiros de curso e em especial a
minha amiga Thaysa, e enfim, a todas as pessoas que direta ou indiretamente
contribuíram para a realização deste estudo.
Agradeço especialmente a minha Orientadora Profª. Laís Guimarães Vieira
cuja colaboração foi imprescidível à confecção deste trabalho.
RESUMO
Há mais de 200 anos, as anomalias congênitas do fígado e da vesícula biliar têm
sido investigadas em material de necropsia fetal. O desenvolvimento tecnológico dos
exames de imagem ultrassonográfica e, posteriormente, a ultrassonografia de alta
resolução combinada com Doppler colorido, a ressonância magnética e a tomografia
computadorizada permitiram diagnóstico intra-útero, maior detalhamento das
malformações, prognóstico para os pais e planejamento terapêutico mais adequado.
Mais recentemente, as cirurgias minimamente invasivas somaram-se ao arsenal
terapêutico, que pode ser individualizado a cada caso, reduzindo as taxas de
mortalidade no período pós-natal. Os métodos de imagem ensejaram também
melhor compreensão das modificações morfológicas no desenvolvimento anormal
intra-útero, o que facilitou ainda mais o diagnóstico das anomalias congênitas.
Apesar desses avanços, as anomalias congênitas hepáticas e biliares são de difícil
diagnóstico, por serem raras, cujos estudos se restringem a series de casos e, mais
raramente, a estudos retrospectivos, o que reforça a necessidade de realizar
revisões para análise das evidências acumuladas. O objetivo deste estudo foi
descrever o diagnóstico, o prognóstico e as condutas terapêuticas para as
anomalias congênitas hepáticas e de vias biliares, associando-as ao
desenvolvimento embriológico das estruturas envolvidas. Dentre as anomalias
congênitas hepáticas, foram detalhadas as calcificações, tumores císticos e sólidos,
assim como as vasculares, identificando-se que ainda se constituem em desafio
para o diagnóstico ultrassonográfico, algumas ainda com mau prognóstico. O cisto
de colédoco, a litíase e a atresia biliar foram incluídos nas anomalias biliares. A
análise dos dados publicados entre 1959 e 2010 permitiu identificar que pouco se
sabe ainda sobre a incidência dessas anomalias, mas é consensual a necessidade
do conhecimento detalhado da embriologia de formação do fígado, de suas
estruturas vasculares e da vesícula biliar, para propiciar o diagnóstico mais seguro
por imagem. No futuro, a inclusão das Ciências da Computação permitindo a
reconstrução tridimensional de estruturas embriológicas, a criação de bancos de
dados sobre essas anomalias para análise das evidências, o aprimoramento dos
exames de imagem e de equipamentos de cirurgia minimamente invasiva com
tamanho adequado ao feto e ao neonato, poderão dar melhores condições para
salvar maior número de vidas.
Descritores: Anormalidades Congênitas; Fígado; Vias biliares; Desenvolvimento
embrionário e fetal; Ultrassonografia pré-natal
ABSTRACT
For over 200 years, the congenital abnormalities of the liver and gallbladder have
been investigated in fetal autopsy material. The technological development of
ultrasound imaging and, later, the high-resolution ultrasound combined with color
Doppler, the magnetic resonance imaging and the computed tomography allowed
diagnosis intra-uterus, greater detail of malformations, prognosis for the parents and
most appropriate therapeutic planning. More recently, minimally invasive surgeries
were added to the therapeutic armamentarium, that can be individualized to each
case, reducing mortality rates in the postnatal period. Imaging methods also gave
rise to better understanding the morphological changes in the abnormal development
intra-uterus, which has further facilitated the diagnosis of congenital anomalies.
Despite these advances, liver and billiary congenital anomalies are difficult to
diagnose because they are rare, whose studies are restricted to series of cases and,
more rarely, retrospective studies, which reinforces the need for revisions to the
analysis of accumulated evidence. The aim of this study was to describe diagnosis,
prognosis and treatments for hepatic and billiary congenital abnormalities, as related
to the embryological development of the structures involved. Among the congenital
abnormalities, liver calcifications, cystic and solid tumors, as well as vascular
abnormalities were detailed, identifying that they still constitute a challenge to the
ultrasound diagnosis, some still having a bad prognosis. Choledochal cyst, gallstones
and billiary atresia were included in the billiary abnormalities. The analysis of data,
published from 1959 to 2010, identified that yet little is known about the incidence of
these anomalies, but there is consensus on the need of a detailed knowledge of
embryologic development of liver, its vascular structures, and gallbladder, to provide
the safest diagnostic imaging. In the future, the inclusion of Computer Science
allowing three-dimensional reconstruction of embryological structures, the creation of
databases on these anomalies for analysis of evidence, the improvement of imaging
equipment and minimally invasive surgery with adequate size to fetus and neonate,
will provide better conditions to save a greater number of lives.
Descriptors: Congenital Abnormalities; Liver; Gallblader; Embryonic and fetal
development; Ultrasonography, Pré-natal
SUMÁRIO
RESUMO ................................................................................................................. 4
ABSTRACT.............................................................................................................. 5
1
INTRODUÇÃO ................................................................................................... 11
1.1
2
FUNDAMENTOS EMBRIOLÓGICOS – BASE DAS ANOMALIAS .................... 13
2.1
3
Objetivo ........................................................................................................ 12
Desenvolvimento embriológico do sistema arterial e venoso do fígado ....... 16
ANOMALIAS DO FÍGADO ................................................................................. 19
3.1
Calcificações hepáticas ................................................................................ 19
3.1.1
Definição ................................................................................................ 19
3.1.2
Incidência .............................................................................................. 19
3.1.3
Classificação.......................................................................................... 20
3.1.4
Etiopatogenia ......................................................................................... 21
3.1.5
Anomalias associadas ........................................................................... 23
3.1.6
Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 23
3.1.7
Conduta pré-natal .................................................................................. 23
3.2
Tumores císticos .......................................................................................... 24
3.2.1
Definição ................................................................................................ 24
3.2.2
Incidência .............................................................................................. 24
3.2.3
Classificação.......................................................................................... 24
3.2.4
Etiopatogenia ......................................................................................... 25
3.2.5
Anomalias associadas ........................................................................... 26
3.2.6
Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 26
3.2.7
Diagnóstico diferencial........................................................................... 27
3.2.8
Conduta pré-natal .................................................................................. 28
3.2.9
Conduta obstétrica................................................................................. 29
3.2.10
3.3
Assistência neonatal........................................................................... 29
Tumores sólidos ........................................................................................... 30
3.3.1
Definição ................................................................................................ 30
3.3.2
Incidência .............................................................................................. 30
3.3.3
Classificação.......................................................................................... 30
3.3.4
Etiopatogenia ......................................................................................... 32
3.3.5
Anomalias associadas ........................................................................... 33
3.3.6
Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 34
3.3.7
Diagnóstico diferencial........................................................................... 35
3.3.8
Assistência neonatal .............................................................................. 35
3.4
3.4.1
Definição ................................................................................................ 36
3.4.2
Incidência .............................................................................................. 38
3.4.3
Classificação.......................................................................................... 38
3.5
4
Anomalias vasculares .................................................................................. 36
Etiopatogenia ............................................................................................... 40
3.5.1
Anomalias associadas ........................................................................... 41
3.5.2
Diagnóstico ............................................................................................ 42
3.5.3
Assistência neonatal .............................................................................. 43
ANOMALIAS DAS VIAS BILIARES.................................................................... 45
4.1
Cisto de Colédoco ........................................................................................ 45
4.1.1
Definição ................................................................................................ 45
4.1.2
Incidência .............................................................................................. 45
4.1.3
Classificação.......................................................................................... 46
4.1.4
Etiopatogenia ......................................................................................... 48
4.1.5
Anomalias associadas ........................................................................... 49
4.1.6
Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 50
4.1.7
Diagnóstico neonatal ............................................................................. 50
4.1.8
Assistência neonatal .............................................................................. 51
4.2
Atresia biliar ................................................................................................. 52
4.2.1
Definição ................................................................................................ 52
4.2.2
Incidência .............................................................................................. 53
4.2.3
Classificação.......................................................................................... 54
4.2.4
Etiopatogenia ......................................................................................... 55
4.2.5
Anomalias associadas ........................................................................... 57
4.2.6
Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 58
4.2.7
Diagnóstico neonatal ............................................................................. 59
4.2.8
Assistência neonatal .............................................................................. 61
4.3
Litíase biliar .................................................................................................. 62
4.3.1
Definição ................................................................................................ 62
4.3.2
Incidência .............................................................................................. 62
4.3.3
Etiopatogenia ......................................................................................... 63
4.3.4
Anomalias associadas ........................................................................... 64
4.3.5
Diagnóstico pré e pós-natal ................................................................... 65
4.3.6
Assistência neonatal .............................................................................. 65
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 66
6
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 67
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Desenhos da formação embriológica do fígado ....................................... 14
Figura 2 – Desenhos da formação embriológica das vias biliares............................. 15
Figura 3 – Desenhos da formação embriológica de fígado e vias biliares ................ 16
Figura 4 – Esquema ilustrativo do desenvolvimento embriológico do sistema venoso
hepático ..................................................................................................................... 17
Figura 5 – Calcificação hepática parenquimatosa ..................................................... 19
Figura 6 – Imagem de tumor cístico hepático por ultrassonografia ........................... 26
Figura 7 - Imagem de tumor cístico hepático por ressonância magnética ................ 27
Figura 8 – Esquema ilustrativo da disposição anômala com drenagem para o fígado
ou a veia porta esquerda por um canal comum calibroso ......................................... 38
Figura 9 – Esquema do desenvolvimento do sistema portal extra-hepático normal e
anômalo .................................................................................................................... 41
Figura 10 – Algoritmo para diagnóstico de shunts vasculares hepáticos congênitos, a
partir de ultrassonografia com Doppler ..................................................................... 43
Figura 11 – Tipos de cisto de colédoco segundo classificação de Todani ................ 47
Figura 12 – Anomalia da junção entre ducto biliar comum e ducto pancreático........ 48
Figura 13 – Desenhos de atresia biliar fetal .............................................................. 53
Figura 14 – Representação esquemática dos tipos de atresia biliar ......................... 55
Figura 15 – Possíveis relações causais da atresia biliar ........................................... 56
Figura 16 – Resultados de sobrevida de neonatos com atresia biliar baseados no
registro de atresia biliar do Reino Unido (1999 – 2008) ............................................ 61
Figura 17 – Ultrassom demonstrando feto com vesícula biliar repleta de cáculos...62
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Classificação dos tumores hepáticos neonatais e fetais e das condições
tumor-like................................................................................................................... 31
Quadro 2 – Classificação das anomalias vasculares hepáticas venosas, segundo
Achiron e Fasouliotis e respectivas incidências ........................................................ 39
Quadro 3 – Classificação das anomalias vasculares do fígado ................................ 40
Quadro 4 – Anomalias congênitas associadas a anomalias congênitas vasculares do
fígado ........................................................................................................................ 42
Quadro 5 – Características diferenciais entre atresia fetal e perinatal ...................... 54
LISTA DE ABREVIATURAS
cm – centímetros
mm – milímetros
µm - milimicra
11
1 INTRODUÇÃO
Apesar das anomalias congênitas do fígado e da vesícula biliar serem
descritas há mais de 200 anos, foram os desenvolvimentos na imagem
ultrassonográfica, incluindo a ultrassonografia de alta resolução associada com a
imagem com Doppler colorido, que facilitaram a compreensão e o diagnóstico prénatal dessas malformações (Faseoliotis et al., 2002).
Esses avanços na imagem possibilitaram não apenas o diagnóstico intraútero como também o prognóstico para os pais, dependendo da anomalia
identificada; o planejamento terapêutico possibilitou redução das taxas de
mortalidade no período pós-natal e ampliou as condições para o estudo das
modificações morfológicas no desenvolvimento anormal intra-útero (DeLeve et al.,
2009).
As anomalias congênitas hepáticas e biliares passaram a ter uma
característica marcante no que se refere à decisão terapêutica, porque ela deve ser
individualizada para a maior parte dos pacientes. É primordial identificar com
exatidão a anatomia topográfica das estruturas anômalas para definir a conduta
terapêutica, especialmente considerando o tamanho reduzido das estruturas no
neonato (Fuchs et al., 2010). Além disso, as anomalias do fígado e das vias biliares
são entidades raras, o que pode dificultar o diagnóstico, o qual tem como premissa
básica um conhecimento sólido sobre a embriologia dessas estruturas, visto que a
maior parte das anomalias congênitas deriva de alterações do desenvolvimento
embriológico (Stringer, 2008).
A abertura do que Kiserud e Acharya (2004) denominaram nova era fetal
pelas técnicas de imagem, passou a desafiar radiologistas e cirurgiões pediátricos a
12
buscar explicações para essas anomalias congênitas, na tentativa de programar o
melhor manejo. A literatura pertinente, na maior parte dos artigos, descreve séries
de casos e resultados terapêuticos, nas quais a anatomia da anomalia congênita é
pouco contemplada, o que restringe sua utilização clínica, dada a diversidade
dessas anomalias (DeLeve et al., 2009; Stringer, 2008).
1.1
Objetivo
O objetivo deste trabalho é descrever o diagnóstico, o prognóstico e as
condutas terapêuticas para as anomalias congênitas hepáticas e de vias biliares,
associando-as ao desenvolvimento embriológico das estruturas envolvidas.
13
2 FUNDAMENTOS EMBRIOLÓGICOS – BASE DAS ANOMALIAS
As anomalias congênitas do fígado incluem as distorções de volume, as
calcificações, os tumores císticos e os sólidos, bem como as anomalias vasculares.
As anomalias de vias biliares consistem em cistos de colédoco, atresia e litíase biliar.
Para que se possam compreender tais anomalias, faz-se necessário rever a
embriologia do fígado e das vias biliares.
O broto ou divertículo hepático aparece no meio da terceira semana
gestacional, como evaginação do epitélio endodérmico do intestino anterior, e
prolifera rapidamente (Figura 1A). Em seu extremo distal, forma cordões celulares
que penetram no septo transverso, primórdio do diafragma e da lâmina
mesodérmica entre o pericárdio e o pedúnculo vitelino, a partir da qual se formarão,
na décima semana, as células hematopoiéticas, as células de Kupffer e as do tecido
conjuntivo, quando o fígado representa cerca de 10% do peso corporal do feto
(Figura 1B). Esse peso se deve ao grande número de sinusóides das veias vitelinas
e umbilicais e, em parte, à proliferação dos ninhos de células hematopoiéticas,
função que é gradualmente perdida nos últimos dois meses intra-uterinos, com a
maturação da medula óssea, que passa a ser o centro hematopoiético de
polimorfonucleares e plaquetas.
14
Figura 1 – Desenhos da formação embriológica do fígado
Legenda: A – embrião de aproximadamente 25 dias, mostrando tubo gastrointestinal e formação do
divertículo hepático, derivado do revestimento epitelial endodérmico do intestino anterior. B – Embrião
de aproximadamente 32 dias no qual se vêem os cordões epiteliais hepáticos penetrando no
mesênquima do septo transverso
Fonte: Langman (1985)
Concomitantemente a essa proliferação acentuada no septo transverso, a
conexão entre o divertículo hepático e o intestino anterior (duodeno) estreita-se e
forma o ducto colédoco, do qual se originarão o ducto cístico e a vesícula biliar,
inicialmente maciça, por proliferação de seu epitélio interno (Figura 2).
Gradativamente, ocorre vacuolização do epitélio intrabiliar e a vesícula se
torna oca. Os cordões hepáticos mesclam-se aos seios sanguíneos das veias
vitelínicas e umbilicais, que formam os seios sinusoidais; diferenciam-se em
parênquima hepático e revestem as vias biliares. Aproximadamente na décima
segunda semana, as células hepáticas iniciam a síntese de bile, que já pode fluir
pelos ductos hepático, cístico e colédoco (Langman, 1985).
15
Figura 2 – Desenhos da formação embriológica das vias biliares
Legenda: A – embrião de aproximadamente 30 dias, mostrando a formação da vesícula biliar. B –
Embrião de aproximadamente 35 dias no qual se vêem os ductos hepático, cístico e colédoco,
antecedendo a rotação intestinal
Fonte: Langman (1985)
Dado seu crescimento pronunciado e rápido, no meio da quinta semana, o
fígado torna-se muito volumoso para se confinar no interior do septo transverso e
passa a salientar-se na cavidade abdominal, entre as duas lâminas peritoneais do
mesogástrio ventral. Na face situada entre o fígado e a parede anterior do intestino,
estirada e adelgaçada com a descida do fígado, forma-se a prega ou ligamento
falciforme, em cuja margem livre, caudal, desce também a veia umbilical,
anteriormente situada no mesoderma do septo transverso (Langman, 1985).
Esse mesoderma, igualmente estirado e adelgaçado entre o fígado e o
intestino anterior (estômago e duodeno), forma o omento menor (ligamento gastrohepático e hepato-duodenal), bem como a porção gastro-hepática do mesogástrio
ventral. Na margem livre caudal do omento menor, estão situados o ducto colédoco,
a artéria hepática e a veia porta, entre as duas lâminas peritoneais, formando o
pedículo hepático. Em resumo, com a protrusão do fígado na parede abdominal, o
mesoderma do septo transverso forma: a) o omento menor, localizado entre o fígado
e intestino anterior; b) o ligamento falciforme, entre o fígado e a parede ventral do
16
abdome; c) o mesogástrio ventral, conexão peritoneal entre o intestino anterior e a
parede abdominal ventral (Langman, 1985) (Figura 3).
O mesoderma superficial do fígado diferencia-se em peritônio visceral, exceto
na superfície póstero-superior, na qual se prende ao septo transverso primitivo, que
passa a formar a parte tendínea do diafragma e constitui a área nua do fígado
(Figura 3).
Figura 3 – Desenhos da formação embriológica de fígado e vias biliares
Legenda: A – embrião de aproximadamente 36 dias, mostrando fígado expandido na cavidade
abdominal e condensação do mesênquima entre ele e o pericárdio, primórdio do diafragma. B –
Ligamento falciforme (entre o fígado e a parede abdominal anterior) e omento menor (entre o fígado e
o intestino anterior, ou seja, estômago e duodeno). Observar que o fígado está todo envolto pelo
peritônio, exceto na “área nua”, pela qual se prende ao diafragma
Fonte: Langman (1985)
2.1
Desenvolvimento embriológico do sistema arterial e venoso do fígado
O sistema venoso hepático tem início a partir da quinta semana gestacional.
O par de veias vitelínicas entra no embrião com o saco vitelínico e se anastomosa
ao redor do duodeno em desenvolvimento, passando através do septo transverso do
fígado primitivo para o seio venoso. No septo transverso, elas se dividem em
17
sinusóides e rapidamente proliferam entre os cordões de células hepáticas. A veia
vitelínica esquerda involui e todo o sangue, proveniente da parte esquerda do fígado
primitivo, é redistribuído para a veia vitelínica direita, que aumenta em diâmetro.
Derivações das veias vitelínicas formam a parte terminal da veia cava inferior, das
veias hepáticas e da veia porta (Figura 4).
Figura 4 – Esquema ilustrativo do desenvolvimento embriológico do sistema venoso hepático
Legenda: 1 – anastomose das veias vitelínicas em volta do duodeno, 2 – duodeno, 3 – septo transverso do
fígado, 4 – seio venoso, 5 – veias umbilicais, 6 – ducto venoso, 7 – veia cava inferior, 8 – sistema venoso portal
Fonte: Gallego et al., 2004
O par de veias umbilicais traz sangue oxigenado para o embrião; caminha
pelos dois lados do fígado e termina no seio venoso. Quando entram em contato
com os sinusóides hepáticos, transformam-se de tal forma que toda a veia umbilical
direita e a porção da veia umbilical esquerda entre o fígado e o seio venoso
degeneram. A porção persistente da veia umbilical esquerda passa a levar todo o
sangue da placenta o feto, perfundindo o lobo esquerdo do fígado e dando origem
ao ducto venoso, um vaso de grande diâmetro que se conecta a veia cava inferior,
independente da circulação sinusal do fígado, ligando-se diretamente ao coração
fetal (Gallego et al., 2004). O lobo direito do fígado é irrigado por sangue pobre em
18
oxigênio proveniente da veia porta direita, perfundida pelas veias esplênica e
mesentérica fetal (Achiron et al., 2009; Stringer, 2008).
Quanto ao suprimento arterial, que tem início a partir da oitava semana
gestacional, portanto mais tardiamente que os vasos venosos, origina-se do tronco
celíaco junto do hilo hepático, perto da veia porta extra-hepática fetal. Na décima
semana gestacional, são visíveis os primórdios arteriais intra-hepáticos no
parênquima, ao longo dos ramos intra-hepáticos do sistema portal, com distribuição
restrita às regiões centrais. Acompanhando os ramos intra-hepáticos do sistema
portal, os primórdios arteriais estendem-se até a periferia do fígado, que passam a
irrigar a partir da décima quinta semana gestacional, progredindo seu crescimento
até que o fígado atinja seu tamanho definitivo (Collardeau-Frachon, Scoazec, 2008).
O desenvolvimento da circulação arterial do fígado, portanto, é intimamente
dependente daquele do sistema portal intra-hepático, que se comporta como um
guia para o desenvolvimento do suprimento arterial. Esse suprimento depende
também do desenvolvimento do sistema biliar para a formação das respectivas
artérias, de tal forma que investiga-se a hipótese de as células biliares sintetizarem
substâncias sinalizadoras da arteriogênese (Lu et al., 2004).
19
3 ANOMALIAS DO FÍGADO
3.1
Calcificações hepáticas
3.1.1 DEFINIÇÃO
Consistem na presença de concreções sólidas localizadas na superfície do
fígado, no parênquima ou na região subcapsular da veia porta (Bronshtein, Blazer,
1995; Nguyen, Leonard, 1986; Wax et al., 2001) (Figura 5).
Figura 5 – Calcificação hepática parenquimatosa
Fonte: Hawass et al. (1990)
3.1.2 INCIDÊNCIA
É uma condição rara cuja incidência não é referida na literatura, porque a
maior parte da informação deriva de séries de fetos espontaneamente abortados,
autópsia de recém-nascidos ou neonatos com estado gera muito comprometido. Os
primeiros relatos de detecção pré-natal de calcificação no fígado surgiram em
20
meados de 1980 e apenas poucos casos têm sido publicados (Bronshtein, Blazer,
1995; Wax et al., 2001).
Hawass et al. (1991) justificam a falta de informação sobre incidência dessa
anomalia congênita no fato dela se acompanhar de outras anomalias mais graves,
para as quais o observador dedica mais atenção, o que aumenta a possibilidade de
seu subdiagnóstico.
Bronshtein e Blazer (1995), analisando 24.600 gestações consecutivas de
nuligestas por ultrassonografia endovaginal, entre a 14ª e a 16ª semana gestacional
ou abdominal, entre a 18ª e a 26ª semana gestacional, determinaram incidência de
1:1.750 nascidos vivos e alertaram que calcificações hepáticas fetais detectadas por
ultrassonografia, durante o segundo trimestre de gravidez, não são uma entidade
rara e sinalizam para a necessidade da investigação de infecções por testes
sorológicos e cariotipagem por amniocentese. Se esses exames estiverem normais,
então as calcificações usualmente não são prejudiciais e têm bom prognóstico.
3.1.3 CLASSIFICAÇÃO
As calcificações hepáticas são classificadas em três categorias principais,
conforme sua localização: peritoneal, parenquimatosa ou vascular. As calcificações
hepáticas peritoneais são a causa mais frequente de calcificação abdominal e
consistem em concreções presentes na superfície do fígado (Bronshtein, Blazer,
1995; Hawass et al., 1990; Nguyen, Leonard, 1986; Wax et al., 2001).
Parenquimatosas que apresentam-se como uma massa complexa que podem
conter áreas de ecogenicidade aumentada, com ou sem sombra acústica, sugerindo
21
calcificação usualmente no quadrante superior direito (Hawass et al., 1990; Nguyen,
Leonard, 1986).
As vasculares são visualizadas no tromboembolismo de veia porta e na
insuficiência
vascular
com
infartos
isquêmicos.
As
calcificações
por
tromboembolismo da veia porta são subcapsulares e estão confinadas no lobo
direito ou no esquerdo, frequentemente associadas a ouras anormalidades
(Bronshtein, Blazer, 1995; Hawass et al., 1990; Nguyen, Leonard, 1986; Wax et al.,
2001).
3.1.4 ETIOPATOGENIA
As peritoneais têm como principal causa a peritonite por mecônio e a
peritonite plástica, devido à ruptura do hidrometrocolpo (Nguyen, Leonard, 1986). A
peritonite por mecônio é secundária a uma obstrução, mecânica ou funcional,
acarretando inspissação do mecônio e subsequente calcificação (Hawass et al.,
1990).
As parenquimatosas têm como etiologia infecções intra-útero por varicela,
toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus, sífilis e Herpes simplex vírus. Essas
infecções transplacentárias se manifestam como áreas nodulares difusas de
ecogenicidade aumentada e frequentemente se associam a múltiplas anormalidades
congênitas e calcificação em outros órgãos (Bronshtein, Blazer, 1995; Hawass et al.,
1990; Nguyen, Leonard, 1986; Wax et al., 2001).
Hawass et al. (1990) referem que tais calcificações podem ser complicações
secundárias de um feto gravemente enfermo, cuja imobilidade ou uma torção de
22
cordão umbilical, sem movimento reverso, podem ser fatores predisponentes. Outras
causas
incluem
tumores
hepáticos
primários,
incluindo
hemangioma,
hemangioendotelioma, hamartoma, hepatoblastoma, teratoma e neuroblastoma
metastático, bem como distrofias idiopáticas parenquimatosas (Bronshtein, Blazer,
1995).
As vasculares provavelmente são secundárias à necrose em topografia distal,
a uma obstrução ou perifericamente a um trombo ou êmbolo em sistema vascular de
fluxo sanguíneo centrífugo (veia porta e veia hepática). Os infartos isquêmicos,
entretanto, são distribuídos no fígado, não apresentando predileção pela região
periférica ou lobar, uma vez que o insulto vascular é generalizado a todo o sistema
portal sem que se possa identificar uma anormalidade intravascular. O mecanismo
de calcificação hepática isquêmica não está totalmente esclarecido, mas tem sido
associado ao choque anêmico no feto, acarretando infarto sem trombose venosa
secundária. O prognóstico da necrose hepática isquêmica no feto não é conhecido.
Em exames de imagem as áreas envolvidas acompanham o arranjo centrolobular do
sistema portal, de sorte que as calcificações podem se dispor uni ou bilateralmente.
No entanto, quando a localização sonográfica da calcificação é periférica sugere o
processo na veia porta, enquanto que o envolvimento difuso parece estar mais
relacionado ao infarto isquêmico (Beluffi et al., 2004; Bronshtein, Blazer, 1995).
Outra causa de calcificação hepática vascular é o hematoma subcapsular
(Bronshtein, Blazer, 1995).
23
3.1.5 ANOMALIAS ASSOCIADAS
As calcificações hepáticas fetais frequentemente se associam a múltiplas
anormalidades, dentre as quais estão: higroma cístico, coarptação do arco aórtico,
rins em ferradura, hipoplasia da aorta ascendente, má rotação intestinal,
microgastria, hipoplasia vesical, das artérias umbilicais, destrocardia, persistência da
veia cava esquerda superior, microcólon, hipoplasia segmentar múltipla intestinal,
hérnia diafragmática, cardiomegalia hipertrófica e volvo do íleo (Hawass et al., 1990;
Wax et al., 2001).
3.1.6 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL
O diagnostico pré-natal das calcificações hepáticas fetais é ultrassonográfico
e se constitui em um achado do exame pré-natal (Bronshtein, Blazer, 1995; Hawass
et al., 1990; Nguyen, Leonard, 1986; Wax et al., 2001).
3.1.7 CONDUTA PRÉ-NATAL
Na maioria dos casos, são diagnóstico com mau prognóstico e indicativa da
possibilidade de interrupção da gravidez. Wax et al. (2001), ao relatarem um caso de
calcificação hepática vascular, referem que esse diagnóstico tem como principal
benefício o aconselhamento adequado aos pais para que tenham tempo de tomar
sua decisão.
24
3.2
Tumores císticos
3.2.1 DEFINIÇÃO
São formações raras, geralmente benignas e visualizadas no terceiro
trimestre gestacional, de conteúdo líquido ou semi-sólido (Hackmon-Ram et al.,
2000; Saxena, van Tuil, 2006; Wax et al., 2009).
3.2.2 INCIDÊNCIA
Na literatura, os autores afirmam que os tumores císticos hepáticos
congênitos são raros, mas a incidência é desconhecida. Foley et al. (2003), em
estudo retrospectivo de 10 anos, em um centro australiano de cuidados pré-natais,
com 22.000 nascimentos por ano, identificaram incidência de 1:7.300.
Nos países em que a ultrassonografia pré-natal não integra a assistência
como rotina, Charlesworth et al. (2007) ressaltam a necessidade da divulgação
dessa anomalia, dado que o diagnóstico por imagem pode representar um problema
prático para decisão da estratégia de manejo.
3.2.3 CLASSIFICAÇÃO
Os tumores císticos congênitos, originados no parênquima hepático, podem
ser classificados morfologicamente (unilocular ou multilocular), histologicamente,
com base na natureza do epitélio e na presença ou ausência de músculo liso na
parede (hamartoma mesenquimal ou parenquimal simples) (Mittermayer et al.,
2002), ou com base no conteúdo (com ou sem bile). Os cistos contendo bile, por
25
indicarem presença de malformação colédoco intra-hepática, são classificados como
tipo V no critério de Todani et al. (1977).
3.2.4 ETIOPATOGENIA
A etiologia dos tumores císticos hepáticos é desconhecida. As hipóteses
sugerem obstrução dos ductos biliares aberrantes ou ainda a inclusão de um resto
de epitélio celômico no fígado em desenvolvimento, com base na similaridade do
epitélio delineante com o mesotélio. Independente da etiopatogenia, os autores
sugerem que a acumulação fluida, que acarreta a dilatação cística, ocorre
predominantemente no terceiro trimestre da gravidez (Macken et al., 2000).
Hackmon-Ram et
al.
(2000) sugerem que
esses
tumores
císticos,
embriologicamente, podem representar interrupções no desenvolvimento da árvore
biliar intra-hepática, mas essa hipótese precisa ser confirmada.
Rogers et al. (2007) apresentam como causas de tumor cístico solitário:
hamartoma mesenquimal, cisto colédoco intra-hepático, cisto epidermóide e
linfangioma.
26
3.2.5 ANOMALIAS ASSOCIADAS
Há referências da associação de tumores císticos hepáticos com hiperplasia
do vilus placentário (Kitano et al., 2000), hidropsia por dilatação aneurismática das
veias placentárias atribuída à compressão intra-útero da veia umbilical (Tsao et al.,
2002) ou hipoplasia pulmonar (Hackmon-Ram et al., 2000).
3.2.6 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL
O diagnóstico pré-natal de tumores císticos hepáticos é predominantemente
descrito como ultrassonográfico, bi ou tridimensional, mas há referência do emprego
de tomografia computadorizada ou imagem por ressonância magnética para os
casos de cistos grandes ou que geram dúvida diagnóstica (Charlesworth et al., 2007;
Rogers et al., 2007) (Figuras 6 e 7).
Figura 6 – Imagem de tumor cístico hepático por ultrassonografia
Fonte: Adaptado de Wax et al. (2009)
27
Figura 7 - Imagem de tumor cístico hepático por ressonância magnética
Fonte: Adaptado de Rogers et al. (2007)
Devido à necessidade de diferenciar tumor cístico hepático de malformação
vascular, pode ser necessária a ultrassonografia com Doppler, por ter maior
sensibilidade, especialmente quando o tumor estiver adjacente a vasos portais e à
artéria hepática (Hackmon-Ram et al., 2000).
3.2.7 DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
O diagnóstico diferencial do tumor cístico unilocular inclui: duplicação cística,
cisto mesentérico, linfangioma cístico, cisto do úraco, cisto do colédoco e, em feto do
sexo feminino, cisto ovariano (Macken et al., 2000).
Tumores císticos, em geral, devem ser diferenciados de cistos biliares,
hepatoblastoma, hamartoma mesenquimal e malformações vasculares (HackmonRam et al., 2000).
28
Os tumores císticos hepáticos múltiplos devem ser diferenciados da doença
policística congênita, fibrose hepática congênita e dilatação dos ductos biliares intrahepáticos. Se a origem hepática do cisto não puder ser demonstrada, o diagnóstico
diferencial inclui cistos renais, adrenais e intestinais (Bronshtein et al., 2009).
3.2.8 CONDUTA PRÉ-NATAL
A presença de tumores císticos hepáticos requer acompanhamento com
exames de imagem para identificação do aumento do volume, que pode causar
compressão das estruturas adjacentes, bem como para decisão do tipo de parto
(Hackmon-Ram et al., 2000).
Os cistos volumosos (maiores que 10 cm de diâmetro) podem ser
puncionados e aspirados, usando ultrassonografia por guia. A análise do conteúdo
cístico tem ainda a vantagem de permitir um diagnóstico mais acurado e,
consequentemente, melhor planejamento da assistência pós-natal (Hackmon-Ram
et al., 2000).
Os tumores císticos simples, aspirados intra-útero, podem ter regressão
espontânea pós-natal, mas os multiloculares exigem investigação pós-natal da
origem do cisto, porque sua etiopatogenia não é conhecida e eles apresentam
positividade para marcadores imunoistoquímicos de proliferação celular (Fujishiro et
al., 2005; Mittermayer et al., 2002).
29
3.2.9 CONDUTA OBSTÉTRICA
Tumores císticos volumosos podem dificultar o parto vaginal por favorecerem
distócia. Por isso, em alguns casos, o parto cesáreo está indicado. No entanto, essa
avaliação deve ser cuidadosa devido ao relato de partos transvaginais, sem
complicação, em presença de cistos volumosos (Hackmon-Ram et al., 2000;
Mittermayer et al., 2002; Wax et al., 2009).
3.2.10 ASSISTÊNCIA NEONATAL
Mais recentemente, além da aspiração percutânea do conteúdo cístico e da
cirurgia a céu aberto, para retirada da membrana cística, a cirurgia laparoscópica,
minimamente invasiva, tem sido empregada com sucesso, embora ainda exija
cuidado redobrado, quando comparada à técnica em crianças, dada as dificuldades
das pequenas dimensões das estruturas e de uma parede abdominal relativamente
fina que restringe a fixação e diminui a segurança das portas de trabalho. É possível
que o desenvolvimento de instrumental menor viabilize maior número de cirurgias
(Saxena, van Tuil, 2006).
O tratamento cirúrgico está indicado nos casos de cistos grandes associados
a deslocamento diafragmático e dificuldade respiratória, bem como compressão
gastrintestinal e dificuldade de aleitamento (Wax et al., 2009).
30
3.3
Tumores sólidos
3.3.1 DEFINIÇÃO
São uma massa detectada por ultrassonografia pré-natal ou exame físico no
período neonatal que se caracterizam como processos neoplásicos, benignos ou
não, usualmente grandes. Incluem uma vasta gama de doenças e são
potencialmente perigosos (Isaacs Jr. 2007; Keslar et al., 1993).
3.3.2 INCIDÊNCIA
Correspondem de 1% a 4% dos tumores em criança e 5% do total de
neoplasias de vários tipos em fetos e neonatos (Chan et al., 2007; Isaacs Jr. 2007).
3.3.3 CLASSIFICAÇÃO
No Quadro 1, está a classificação dos tumores sólidos hepáticos neonatais e
fetais e as condições de tumor-like, dentre os quais os mais frequentes são o
hemangioma (taxa de incidência de 4% a 5% em crianças brancas), o hamartoma
mesenquimal e hepatoblastoma, os três com apresentação clínica como massa
abdominal diagnosticada por ultrassonografia pré-natal. Os demais tumores sólidos
hepáticos são metastáticos mais que primários (Isaacs Jr, 2007).
Nesta monografia são detalhados esses três tumores mais frequentes, dado
que seu diagnóstico é firmado no período pré-natal.
31
Tipos tumorais
Hemangioma infantil
Focal ou solitário
Multifocal
Hemangioendotelioma tipo I
Hemangioendotelioma tipo II (angiosarcoma)
Hamartoma mesenquimal
Cisto unilocular solitário
Adenoma
Hiperplasia nodular focal
Hepatoblastoma
Epitelial
Fetal
Embrionário
Misto: epitelial e mesenquimal
Anaplásico
Tipos tumorais
Carcinoma hepatocelular
Tumor de células germinativas
Teratoma
Tumor de saco vitelínico
Coriocarcinoma
Tumor rabdóide
Sarcoma hepático
Sarcoma indiferenciado (embrionário)
Rabdomiosarcoma
Neoplasia metastática
Neuroblastoma
Leucemia
Tumores renais (Wilms)
Tumor de saco vitelínico
Tumor rabdóide
Coriocarcinoma
Quadro 1 – Classificação dos tumores hepáticos neonatais e fetais e das condições tumor-like
Fonte: Adaptado de Isaacs Jr (2007)
Histologicamente há dois subtipos de hemangioma: tipo I, mais frequente, que
consiste de camada simples ou ocasionalmente múltipla de agrupamentos de
células endoteliais, com raras figuras de mitose; tipo II, no qual as células são
pleomórficas, grandes, mais hipercromáticas do que do tipo I, com células
endoteliais mais ramificadas dando a impressão de estarem livres no interior dos
espaços vasculares (Keslar et al., 1993).
Em 2007, Christison-Lagay et al. propuseram um critério classificatório para
os hemangiomas em lesões focais, lesões multifocais e lesões difusas. As lesões
focais são assintomáticas e raramente se acompanham por hemangiomas cutâneos;
são detectáveis à ultrassonografia pré-natal e parecem ser a forma hepática do
hemangioma congênito cutâneo de involução rápida. O hemangioma de lesões
multifocais acompanha-se de alargamento das artérias e veias hepáticas e da
presença de shunts arteriovenosos. Também são assintomáticos, porém, detectados
apenas no período pós-natal associado à insuficiência cardíaca de alto débito,
secundária a shunts arteriovenosos ou portovenosos. As lesões difusas são
32
extensas, envolvendo quase todo parênquima hepático e o substituindo por um
inumerável conjunto de lesões dispostas centripetamente.
3.3.4 ETIOPATOGENIA
Os tumores sólidos do fígado derivam de alteração mitótica que se inicia no
período embrionário, mas evolui rapidamente no período pós-natal, podendo involuir
lentamente durante a infância (Christison-Lagay et al., 2007).
Hemangioma,
também
denominado
hemangioendotelioma,
deriva
do
aumento das anastomoses vasculares, do tipo capilar e sinusoidal, entremeadas de
grandes espaços, do tipo cavernoso, possivelmente originadas do processo de
maturação ou de regressão da lesão. Os espaços vasculares podem conter células
hematopoiéticas extra-medulares ou trombos e pequenos ductos biliares podem
estar presentes, demonstrando o processo mitótico desordenado (Keslar et al.,
1993).
Para o hamartoma mesenquimal há quatro hipóteses etiopatogênicas: de
desenvolvimento, vascular, por insulto tóxico e neoplásica. De acordo com a
hipótese de desenvolvimento, essa neoplasia se originaria de uma má formação da
placa ductal, desenvolvendo-se tardiamente na embriogênese, a partir do
mesênquima do trato portal, crescendo nas ilhas de parênquima hepático. Dessa
forma, seriam explicadas suas semelhanças com as anormalidades ductulares
biliares observadas na doença de Caroli e na fibrose hepática congênita. Okeda
(1976)
sugeriu
que
um
insulto
vascular
localizado
no
fígado
fetal
em
desenvolvimento provocaria defeito de desenvolvimento biliar focal e formação
cística, como consequência de modificações reativas à isquemia regional
(Mascarello, Krous, 1992; Rakheja et al., 2004).
33
Estudos imunoistoquímicos demonstraram que as células estromais no tumor
podem expressar proteínas encontradas nas células sinusoidais de armazenamento
de lipídeos do fígado normal. Daí a hipótese tóxica advoga a possibilidade de um
insulto tóxico desencadear as modificações neoplásicas (Mascarello, Krous, 1992;
Rakheja et al., 2004).
Na hipótese neoplásica, admite-se que haveria uma desorganização celular
benigna, cuja proliferação estaria limitada a células maduras normalmente
encontradas no sítio de crescimento, portanto um hamartoma, mas atualmente se
advoga que essa neoplasia seja classificada como neoplasia verdadeira. Estudos
mais recentes de citogenética têm demonstrado translocação gênica com
aneoploidia típica de tumores malignos (Mascarello, Krous, 1992; Rakheja et al.,
2004).
Os hepatoblastomas se originam de células imaturas precursoras do fígado
com características morfológicas anormais, que mimetizam o desenvolvimento
hepático normal, possivelmente devido a uma transdução gênica aberrante da
catenina-Wntbeta, hipótese que vem sendo testada (Willert, Dahl, 2010).
3.3.5 ANOMALIAS ASSOCIADAS
Podem se associar ao hemangioma uma cardiomegalia, alargamento da aorta
proximal e da artéria hepática, bem como das veias hepáticas e shunt arteriovenoso
(Keslar et al., 1993).
O hamartoma mesenquimal do fígado se associa a anormalidades
placentárias, como trombose vascular ou sangramento, provavelmente por
34
obliteração da veia umbilical pelo tumor. Pode haver também hiperplasia vilosa
mesenquimal da placenta causada pela expansão edematosa difusa dos vile
placentários. No entanto, não há consenso se essa alteração é uma anomalia
associada ou derivada da obstrução da veia umbilical pelo tumor (Gow et al., 2009;
Laberge et al., 2005).
No
hepatoblastoma,
várias
anomalias
congênitas
e
síndromes
de
malformação ocorrem, dentre elas, a hemi-hipertrofia, a síndrome de BeckwithWiedemann e a síndrome da polipose adenomatosa intestinal (Isaac Jr, 2007).
3.3.6 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL
No feto, a apresentação mais comum do hemangioma é uma massa hepática,
detectável por ultrassonografia, que se acompanha por anemia, hidropsia,
poliidrâmnio, insuficiência cardíaca congestiva, trombocitopenia e coagulação
intravascular disseminada, que contribuem para o óbito Os tumores sólidos do
fígado derivam de alteração mitótica que se inicia no período embrionário, mas
evolui rapidamente no período pós-natal, podendo involuir lentamente durante a
infância (Isaacs Jr., 2007).
No neonato, a hepatomegalia é o achado mais marcante. Podem estar
presentes insuficiência cardíaca congestiva, hemangioma cutâneo, dispnéia,
cardiomegalia, trombocitopenia e aumento da concentração da alfa-feto proteína.
Note-se que essa proteína, em neonatos normais, está muito elevada nos primeiros
dois meses de vida (Isaacs Jr., 2007).
35
3.3.7 DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Tomando o hemangioma como parâmetro de comparação, o hepatoblastoma
ocorre mais tardiamente, ao primeiro ano de vida ou após e apresenta concentração
de alfa-feto proteína maior, bem como na imagem por tomografia computadorizada é
mais heterogêneo, especialmente após injeção de contraste (Keslar et al., 1993).
O hamartoma mesenquimal ocorre em infantes e tal como o hemangioma não
se associa ao aumento da concentração da alfa-feto proteína. Pode, em exame de
imagem,
ocasionalmente
assemelhar-se
ao
hemangioma
por
apresentar
características histológicas que se superpõem. A principal diferença é que o
hamartoma mesenquimal aparece com massa cística multilocular e raramente como
lesão sólida, como o hemangioma. Quando o hamartoma mesenquimal é sólido
apresenta hipovascularização ou avascularização (Keslar et al., 1993).
3.3.8 ASSISTÊNCIA NEONATAL
A terapêutica dos tumores sólidos hepáticos pode ser limitada devido à idade
gestacional
e
à
maturidade
do
feto.
Os
hemangiomas
podem
involuir
espontaneamente, por isso, são tratados com corticoterpia, conservadoramente,
especialmente se assintomáticos. Após ter sido localizado, e em presença de
sintomas a excisão cirúrgica está recomendada. Pode ser feita ligação ou
embolização da artéria hepática exclusivamente nos casos de insuficiência cardíaca
não responsiva à terapêutica ou coagulopatia de consumo (Isaacs Jr, 2007).
O harmatoma mesenquimal, uma lesão benigna, tipicamente assintomática,
quando tratado cirurgicamente, oferece ótimo prognóstico (Isaacs Jr, 2007).
36
O hepatoblastoma é o principal tumor maligno do feto e do neonato e, se não
tratado por excisão, é fatal em dois anos (Isaacs Jr, 2007).
3.4
Anomalias vasculares
3.4.1 DEFINIÇÃO
As anomalias vasculares do fígado, do ponto de vista embriológico, consistem
na persistência de vasos que, no desenvolvimento embriológico, deveriam involuir,
na duplicação de vasos únicos e na formação de interligações anômalas (Yagel et
al., 2010).
Do ponto de vista da hemodinâmica, consistem em shunt anormal dos vasos
sanguíneos dentro e ao redor do fígado, que têm sido mais bem estudadas,
recentemente, em exames de imagem. Incluem shunt da artéria hepática à veia
hepática (shunt arteriovenoso ou arterioepático), da artéria hepática para a veia
porta (shunt arterioportal) e da veia porta para a circulação sistêmica (shunt
portossistêmico ou portoepático). Esses três tipos podem coexistir na presença de
telangiectasia hemorrágica hereditária, condição rara cuja manifestação clínica
ocorre em adultos, apesar de ser anomalia congênita (Deleve, Valla, Gracia-Tsao,
2009).
O Consenso da Associação Americana para Estudo das Doenças Hepáticas,
em 2008, considerou malformações congênitas vasculares isoladas apenas aquelas
não associadas à telangiectasia hereditária familiar e usualmente diagnosticada em
neonatos ou crianças, por serem raras e terem diagnóstico e manejo menos
referidos na literatura (Deleve, Valla, Gracia-Tsao, 2009).
37
Pelo fato de as anomalias vasculares do fígado serem diversificadas, é
preciso definir cada uma delas:
a) Malformações arteriovenosas – anormalidades congênitas na formação dos
vasos sanguíneos que misturam o sangue por meio de conexões arteriovenosas
diretas, sem tecido neoplásico anormal entre os vasos anômalos, usualmente
localizadas em um lobo do fígado;
b) Fístulas arterioportais – consistem em canais intra ou extra-hepáticos
comunicando artérias ao sistema porta e podem se associar à atresia biliar,
síndrome de Ehlers-Danlos e telangectasia hemorrágica hereditária;
c) Shunt portossistêmico – consiste na formação de interligação congênita do
sistema porta à circulação sistêmica, derivada de anomalia do desenvolvimento
da veia cava inferior intra e extra-hepática e das veias vitelínicas;
d) Shunts portovenosos – consistem na persistência do ducto arterioso;
e) Retorno venoso total pulmonar anômalo – consiste na formação cardíaca
anormal na qual as veias pulmonares não se conectam ao átrio esquerdo, mas
drenam o sangue para o sistema porta ou para o ducto venoso (Figura 8).
38
Figura 8 – Esquema ilustrativo da disposição anômala com drenagem para o fígado ou a veia
porta esquerda por um canal comum calibroso
Fonte: Adaptado de Gallego et al. (2004)
3.4.2 INCIDÊNCIA
Embora as anomalias congênitas vasculares do fígado sejam tema de
diversos trabalhos, devido a sua raridade, estes consistem descrições de séries de
casos, habitualmente com pequeno número de pacientes, para apresentar a técnica
cirúrgica ou relatar a sobrevida. Por isso, as informações sobre incidência são
escassas, como se percebe nas lacunas do Quadro 2, para as quais após consulta
em 26 trabalhos não foi possível identificar.
3.4.3 CLASSIFICAÇÃO
Considerada a embriologia da circulação hepática, cujas características são
complexas, as anomalias vasculares podem ser classificadas em duas categorias:
39
venosas e arteriais. As anomalias venosas apresentam quatro subtipos, segundo a
veia embriológica comprometida (Quadro 2).
Veia fetal
comprometida
Anomalia vascular
venosa
Malformações complexas
Cardinal
Malformações isoladas
Umbilicais
Falha primária da
formação de anastomoses
críticas
Persistência da veia
umbilical direita (1:250 a
1:570) com ou sem veia
umbilical esquerda ou
ducto venoso
Variações da veia
umbilical (1:1.000)
Vitelínicas
Falha primária da
formação de anastomoses
críticas
Exemplos
Síndromes heterotáxicas ou erro de lateralização
incompleta (1:1.000)
Persistência da veia cava superior (9% dos fetos
com anomalia cardíaca) ou inferior esquerda,
persistência da veia cava esquerda superior ou
inferior; duplicação da veia cava superior ou
inferior e interrupção da veia cava inferior
Conexão anormal das veias umbilicais com
agenesia do ducto venoso (6:1.000)
Agenesia completa do sistema porta (shunt
portossistêmico)
Agenesia parcial dos ramos portais direito,
esquerdo ou bilateral (shunt portoepatossistêmico)
Conexão anômala Total (1:17.000)
pulmonar venosa
Parcial (6,8:100.000)
Quadro 2 – Classificação das anomalias vasculares hepáticas venosas, segundo Achiron e
Fasouliotis e respectivas incidências
Fonte: Adaptado de Achiron et al. (2009), Fasouliotis et al. (2002) e Yagel et al. (2010)
Segundo a classificação de Mullicken e Glowacki, as anomalias vasculares
hepáticas são subdivididas em: fluxo rápido (fístula arterioportal), fluxo lento (shunt
portossistêmico e fístula portossistêmica) e forma combinada.
No Quadro 3, estão apresentadas as anomalias vasculares hepáticas para as
quais há classificação em subtipos.
40
Shunt portossistêmico
Tipo
Extra-hepático
Intra-hepático
Formação de um vaso calibroso, único, que
conecta a veia portal direita à veia cava inferior
I
Ausência das veias porta intra-hepáticas
I-A
veias esplênica e mesentérica superior drenam
separadamente para a veia cava inferior
I-B
Veias esplênica e mesentérica superior formam um
tronco comum antes de drenar para a veia cava inferior
II
O sistema porta está intacto, mas parte do fluxo portal
é desviado para a veia cava através da comunicação
extra-hepática para um lado ou para outro
Shunt periférico em que há uma ou mais
comunicações no segmento hepático único
III
Conexão aneurismal entre as veias porta e hepática
O shunt consiste de um aneurisma
IV
Múltiplas conexões entre as veias hepática e porta,
difusamente em ambos os lobos
Presença de comunicações múltiplas entre as
veias portais periféricas e as veias hepáticas,
em diversos segmentos
Quadro 3 – Classificação das anomalias vasculares do fígado
Fonte: Adaptado de Witters et al. (2008) e Gallego et al. (2004)
3.5
Etiopatogenia
A etiopatogenia das anomalias congênitas vasculares do fígado é a presença
de alterações no processo de desenvolvimento embrionário e, de certa forma, se
confunde com a própria classificação dessas anomalias. Embora o Quadro 1 seja
elucidativo, optou-se por descrever mais detalhadamente alguns dos mecanismos
do desenvolvimento vascular hepático.
No shunt portossistêmico extra-hepático tipo 1, a ausência congênita da veia
porta tem sido atribuída a uma involução excessiva da alça venosa vitelínica
perintestinal ou à total falha de as veias vitelínicas estabelecerem anastomose crítica
com os sinusóides hepáticos ou com as veias umbilicais. Outra hipótese é que esses
shunts têm origem devido à persistência da anastomose subcardinoepática com as
veias vitelínicas. Nesse tipo, a anomalia vascular é subdividida em um grupo no qual
as veias esplênica e mesentérica superior terminam separadas das veias sistêmicas
e, em outro, em que as veias esplênica e mesentérica superior se unem para formar
41
um tronco comum que desemboca na veia cava inferior, no átrio direito ou nas veias
ilíacas (Figura 9).
Canal
cárdiohepático
direito
Plexo
vitelínico
invadido pelo
fígado
Proliferação
de células
hepáticas
Veia
umbilical
direita
atrófica
Veia
umbilical
esquerda
Veia vitelínica
direita (cranial)
Seio
venoso
Veia vitelínica
esquerda
(cranial)
Comunicação
dorsal
Veia
esplênica
Veia vitelínica
direita (caudal)
Veia vitelínica
esquerda
(caudal)
Veia
mesentérica
superior
Veia
umbilical
esquerda
Veia
vitelínica
direita
persistente
Veia
esplênica
Veia porta
principal
Veias vitelínicas préhepáticas atróficas
Veia
mesentérica
superior
Figura 9 – Esquema do desenvolvimento do sistema portal extra-hepático normal e anômalo
Fonte: Florio et al. (1998)
Admite-se que a origem dos shunts portossistêmicos intra-hepáticos é a
persistência da comunicação entre as veias vitelínicas do sistema onfalomesentérico
e o venoso sinusal, devido à ausência focal de formação dos sinusóides
3.5.1 ANOMALIAS ASSOCIADAS
Tal como se verificou nas definições, nas classificações e nas incidências, as
anomalias associadas mantêm características comuns ao tipo de malformação
vascular embriológica (Quadro 4).
42
Anomalia congênita vascular
Shunt intra-hepático
Anomalias congênitas associadas
Dismorfismo
Testa proeminente
Rebaixamento da posição das orelhas
Defeito septal atrial menor
Fibrose cística
Shunt portocava tipo I
Poliesplenia
Destrocardia
Hepatoblastoma
Coarctação da aorta
Anormalidades cardíacas
Shunt portocava tipo II
Síndrome de Down
Shunt extra-hepático
Atresia biliar
Má rotação intestinal
Poliesplenia anormal
Veia cava inferior intra-hepática anormal
Shunt portossistêmico
Galactosemia
Persistência do ducto venoso patente
Defeito ventrículo-septal
Patência do ducto arteriosos
Agenesia de veia porta
Hidrotórax
Fístula arteriovenosa
Cardiomegalia
Quadro 4 – Anomalias congênitas associadas a anomalias congênitas vasculares do fígado
Fonte: Stringer (2008), Sakura et al. (2001), Ono et al. (1998)
3.5.2 DIAGNÓSTICO
Pode ser feito, com segurança, empregando exame ultrassonográfico com
Doppler colorido, imagem por ressonância magnética, angiografia, tomografia
computadorizada e ecocardiograma, obedecendo a um algoritmo de decisão,
conforme apresentado na Figura 10.
43
Ultrassonografia com doppler
Veia vertical?
Sim
Não
Artéria hepática
Aumento do índice
de resistividade
Índice de resistividade
normal
Veia porta
Veia porta?
Hepatocentrípeto
Hepatocentrífugo
Cintilografia
de glóbulos
vermelhos
Angiografia, MR
Fístula arterioportal
Ausente
Ausência congênita
da veia porta
Malformação
arteriovenosa
Ecocardiograma
Ligações
intra-hepáticas?
TC e IRM
IRM
Hemangioma
Presente
Ausente
TC e IRM
Desvio portossistêmico
extra-hepático
Presente
Infra-diafragmática
Derivação portossistêmica
intra-hepática
Figura 10 – Algoritmo para diagnóstico de shunts vasculares hepáticos congênitos, a partir de
ultrassonografia com Doppler
Fonte: Adaptado de Gallego et al. (2004)
Recentemente o aprimoramento da ressonância magnética e tomografia
computadorizada, associadas a programas de informática médica para construção
de modelo anatômico tridimensional, permite análise e planejamento cirúrgico mais
preciso e mais seguro (Fuchs et al., 2010).
3.5.3 ASSISTÊNCIA NEONATAL
A conduta terapêutica para as anomalias vasculares do fígado deve ser
cuidadosamente planejada, considerando o tipo de anomalia, a condição do
nascimento, a idade do neonato e as condições anatômicas do sítio cirúrgico, dada a
44
complexidade da circulação hepática e as possibilidades da existência de variantes,
evitando a hipertensão portal e a encefalopatia hepática causadas pela oclusão do
shunt (Stringer, 2008).
Nem todas as anomalias vasculares do fígado devem ser tratadas com
terapêutica cirúrgica, porque o manejo clínico e a expectação podem permitir
sobrevida em boas condições de saúde, bem como atualmente é possível o
emprego da cirurgia laparoscópica minimamente invasiva com sucesso. Em casos
extremos, pode ser necessário transplante hepático (Lee et al., 2010).
45
4 ANOMALIAS DAS VIAS BILIARES
4.1
Cisto de Colédoco
4.1.1 DEFINIÇÃO
Cisto de colédoco, também denominado cisto congênito do ducto biliar, é uma
lesão relativamente rara que consiste na dilatação cística do ducto biliar comum,
descrito pioneiramente por Vater e Ezler, em 1723, mas publicado por Douglas, em
1853, com a descrição clínica completa do caso e a hipótese da origem congênita
(Besner et al., 2008).
Outros autores referem-se a cisto congênito de colédoco como a dilatação do
ducto biliar extrapancreático ou dos ductos biliares intra-hepáticos e extra-hepáticos
(Kamisawa et al., 2009).
4.1.2 INCIDÊNCIA
Estima-se que os cistos de colédoco apresentem uma incidência variando de
1:13.500 a 1:2.000.000 nascidos vivos nos países orientais, sendo a doença mais
frequente na Ásia (Besner et al., 2008; Mabrut et al., 2010; Roquete, 2000). Quanto
à prevalência, 25% dos casos são diagnosticados no período antenatal ou no
primeiro ano de vida; 60%, durante a primeira década de vida e aproximadamente
20%, permanecem não diagnosticados até a idade adulta. Essa variação de
prevalência tem sido atribuída tanto à falta de atenção para a doença em regiões
46
com baixa prevalência como a melhor acurácia dos estudos de imagem não
invasivos (Mabrut et al., 2010).
4.1.3 CLASSIFICAÇÃO
O cisto de colédoco foi classificado por Alonso Lej (1959) em três categorias,
com base no tamanho do ducto biliar dilatado: tipo cístico (tipo I), diverticular (tipo II)
e cístico no duodeno (tipo III), sendo o tipo I frequentemente associado à anomalia
congênita da junção pancreatobiliar, raramente presente nos tipos II e III.
Em 1997, Todani modificou a classificação de Alonso Lej, gerando uma
padronização internacional. Na classificação de Todani, há cinco tipos de cisto de
colédoco, classificados de acordo com a localização (extra-hepático e intrahepático), extensão (segmentar ou completa) e forma (cística ou sacular e fusiforme)
(Besner et al., 2008; Haller, 1991; Mabrut et al., 2010; Roquete, 2000) (Figura 11):
a) tipo I – dilatação da árvore biliar extra-hepática, classificada como I-A cística
(encontrada em 70% a 90% dos casos), I-B segmentar, I-C fusiforme;
b) tipo II – divertículo da árvore biliar extra-hepática supraduodenal, presente em
2% a 5% dos casos;
c) tipo III – dilatação da porção intraduodenal da árvore biliar extra-hepática,
também denominada coledococele (encontrada em 4% dos casos);
d) tipo IV – também denominado forma frusta, consiste em múltiplas dilatações,
integradas por dilatação cística ou fusiforme do ducto biliar comum associada à
dilatação dos ductos biliares intra-hepáticos. Seus subtipos são: IV-A (encontrada
47
a 10% a 20% dos casos), quando há dilatação intra e extra-hepática da árvore
biliar e IV-B, na presença de dilatações múltiplas e segmentares da árvore biliar
extra-hepática;
e) tipo V – dilatação segmentar, múltipla, cística, fusiforme ou sacular, estritamente
limitada à
árvore
biliar intra-hepática, sem
componente extra-hepático,
correspondendo a 1% dos casos. Quando associada à fibrose hepática, é
denominada doença de Caroli, que se associa também a doença de rins
policísticos e ectasia tubular renal (Haller, 1991).
I -C
IV - A
II
IV - B
Figura 11 – Tipos de cisto de colédoco segundo classificação de Todani
Fonte: Adaptado de Besner et al. (2008) e Mabrut et al. (2010)
III
V
48
4.1.4 ETIOPATOGENIA
Não há uma etiologia universalmente aceita para a formação dos cistos de
colédoco. Para os tipos I a IV, diversas hipóteses têm sido propostas, admitindo
derivar de fraqueza do ducto biliar comum nos estágios de desenvolvimento que
possibilitaria a dilatação, em resposta a uma obstrução distal. Essa hipótese tem por
base a alta associação entre cistos colédocos e atresia biliar em neonatos (Haller,
1991). A hipótese mais aceita denomina-se teoria do canal comum longo de Babbitt,
Starshak e Clement (1973), baseada na detecção de altas concentrações de
enzimas pancreáticas na bile desses pacientes. A teoria admite que a presença de
uma junção pancreático-biliar com um canal comum longo, maior que 10 mm a 15
mm, e a junção pancreático-biliar mais proximal do que o usual ao esfíncter de Oddi,
devido a falha da separação normal, podem permitir o refluxo do suco pancreático
para
o
canal
biliar
comum,
resultando
em
colangite
com
inflamação,
enfraquecimento das paredes do ducto biliar comum e aumento da pressão
intraductal que acarreta dilatação ductal secundária (Figura 13) (Babbitt, Starshak,
Clement, 1973).
Figura 12 – Anomalia da junção entre ducto biliar comum e ducto pancreático
Nota: Observar que em condição normal, o canal colédoco e o ducto pancreático dispõem de esfíncteres
distintos, o que não ocorre na condição anômala, permitindo refluxo do suco pancreático
Fonte: Haller (1991)
49
Outras hipóteses etiopatogênicas para cisto de colédoco dos tipos I a IV
incluem obstrução anatômica ou funcional da parte distal da árvore biliar extrahepática; oligoganglionose da parte distal da árvore biliar extra-hepática resultante
de uma inervação autonômica inadequada do ducto biliar, que promoveria alteração
na motilidade e obstrução funcional do ducto biliar comum, raciocínio idêntico ao que
se emprega para explicar a acalásia esofágica e a doença de Hirschsprung (Mabrut
et al., 2010).
Para o tipo V da classificação de Todani, admite-se ser resultante de
malformação embriológica da placa ductal. Essa anormalidade é responsável pela
proliferação ductular biliar na configuração da placa ductal, que pode ser
macroscópica e microscopicamente identificada. Se os ductos biliares intrahepáticos largos são afetados, resulta na doença de Caroli, enquanto que ductos
biliares interlobulares pequenos resultam em fibrose hepática congênita. Quando
todos os níveis da árvore biliar são afetados, estão presentes tanto a fibrose
hepática congênita quanto a doença de Caroli, condição denominada Síndrome de
Caroli, a qual pode estar associada a doenças renais desde ectasia tubular até rins
policísticos (Kamisawa et al., 2009; Nagorney,2000).
4.1.5 ANOMALIAS ASSOCIADAS
Não se encontrou na literatura referência a anomalias associadas ao cisto de
colédoco, possivelmente porque as anomalias, nesse caso, confundem-se com a
própria etiopatogenia. Alguns autores referem a obstrução gástrica incompleta
consequente ao cisto de colédoco grande, como complicação, não como anomalia
associada (Besner et al., 2008).
50
No entanto, parece importante ressaltar que esta entidade nosológica se
associa a adenocarcinoma no ducto biliar comum induzido pela presença de
anomalia na junção pancreatobiliar, que promove refluxo de enzimas proteolíticas
pancreáticas, cuja estagnação causaria injúria no epitélio biliar induzindo hiperplasia
e metaplasia, condições de promoção da progressão da neoplasia (Kamisawa et al.,
2009).
4.1.6 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL
O diagnóstico pode ser firmado por ultrassonografia, a partir da 15ª semana
gestacional, que corresponde ao tempo da formação das enzimas pancreáticas,
como uma estrutura cística abaixo do fígado (Besner et al., 2008).
Outros autores referem que o cisto de colédoco pode se apresentar como
uma estrutura cística na porta hepatis, distinta da vesícula biliar. O exame pode
evidenciar comunicação direta entre o ducto hepático comum e o ducto cístico. Por
outro lado, se a estrutura cística apresenta-se à ultrassonografia em uma imagem
inicial, devem ser realizados exames com medicina nuclear, no período neonatal,
para verificar se a estrutura cística comunica-se com a árvore biliar e determinar a
presença de obstrução distal (Haller, 1991).
4.1.7 DIAGNÓSTICO NEONATAL
O diagnóstico pode ser firmado por ultrassonografia ou por cintigrafia
hepatobiliar, tanto para cistos de colédoco isolados como para aqueles associados à
51
atresia biliar extra-hepática. A visualização da radioatividade no intestino exclui
atresia biliar enquanto que a não visualização significa estase biliar ou ausência de
comunicação da árvore biliar com o trato intestinal (Haller, 1991).
Atualmente, o padrão-ouro para diagnóstico e estadiamento do cisto de
colédoco é a colangeopancreatografia por ressonância magnética, método não
invasivo que possibilita identificar com segurança anatomia, tamanho, localização e
forma da dilatação do ducto biliar, detectar junção pancreatobiliar sem risco de
pancreatite ou colangite que pode ocorrer na colangeopancreatografia endoscópica
retrógrada (Mabrut et al., 2010).
Clinicamente, os sintomas e sinais são indistinguíveis daqueles encontrados
na atresia biliar, exceto pela possibilidade de palpação de uma massa no lado direito
do abdômen, sugestiva de cisto de colédoco. Outros sintomas como vômito, febre e
dor abdominal com hiperamilasemia, são infrequentes e a icterícia não se manifesta
antes da primeira a terceira semana de vida (Besner, et al., 2008).
4.1.8 ASSISTÊNCIA NEONATAL
O tratamento cirúrgico do cisto de colédoco deve ser feito logo após o
nascimento, porque o retardo pode resultar em cirrose com hipertensão portal,
colangite, litíase hepático-colédoco, cirrose biliar e pancreatite na criança, bem como
adenocarcinoma no adulto (Haller, 1991).
Embora seja considerado muito raro, há relato de perfuração espontânea de
cisto de colédoco, com peritonite biliar secundária, cuja etiologia é obscura na
maioria dos casos, ocorrendo antes dos quatro anos de idade e, em média, aos 22
52
meses de idade (Besner et al., 2008). Nyamannawar e Das (2007) consideram que a
descompressão cística intra-útero não é um procedimento seguro, dada a
possibilidade de peritonite biliar. Recomendam o procedimento cirúrgico após
estabilização do quadro clínico do neonato.
4.2
Atresia biliar
4.2.1 DEFINIÇÃO
A atresia biliar é uma colangiopatia obliterativa, inflamatória, destrutiva, que
afeta extensões variáveis dos ductos biliares extra e intra-hepáticos, exclusivamente
em neonatos, já que em adultos e crianças não há processo patológico análogo
(Nakanuma et al., 1997). A obliteração, não associada a cálculo, neoplasia ou
ruptura, promove obliteração extra-hepática fibrosa, ductopenia dos ductos biliares
intra-hepáticos e cirrose biliar (Kahn, 2004), levando a óbito à idade de dois anos, se
o tratamento não for instituído a tempo (Hartley, Davenport, Kelly, 2009) (Figura 14).
Essa anomalia se constitui na principal causa de transplante hepático e
responde por 75% desse procedimento em menores de dois anos de idade (Hartley,
Davenport, Kelly, 2009; Kahn, 2004).
53
Figura 13 – Desenhos de atresia biliar fetal
Legenda: A – obliteração do ducto colédoco, com dilatação, a jusante, dos ductos hepáticos e da
vesícula biliar. B – presença de duplicação da vesícula biliar
Fonte: Langman (1985)
4.2.2 INCIDÊNCIA
A incidência da atresia biliar sofre grandes variações na literatura. Kahn
(2004) refere ser uma anomalia rara com taxa de incidência de 1 para 8.000 a
18.000 nascidos vivos, sem predominância por sexo em indivíduos da raça branca,
mas com maior incidência no sexo feminino, na raça amarela.
Hartley, Davenport e Kelly (2009), em revisão da literatura do período de 1948
a 2009, referem taxa de incidência de 1:17.000 a 19.000 nascidos vivos, na França e
no Reino Unido; 1:15.000, no sudeste dos Estados Unidos da América; 1:19.000, na
Holanda, e 1:5.000, nos países do leste asiático. Embora a anomalia possa ocorrer
em indivíduos de todas as raças, esses autores referem que pesquisa realizada nos
Estados Unidos permitiu concluir que mulheres negras têm chance duas a cinco
vezes maior de parir neonatos atrésicos, quando comparadas a mães brancas.
54
4.2.3 CLASSIFICAÇÃO
Kahn (2004) e Chardot (2005) referem o critério classificatório relativo ao
período em que a anomalia ocorreu, cujas características estão apresentadas no
Quadro 5.
Características diferenciais
Incidência
Época do insulto
Icterícia
Período de ocorrência da anomalia
Perinatal ou não
Fetal ou síndrômica
síndrômica
10% a 25%
Comum
antenatal
perinatal
precoce, sem interrupção após icterícia
neonatal
tardia, após a segunda
semana de vida
Infecção
Apoptose ou necrose
Fatores patogênicos
celular
fibrose
Quadro 5 – Características diferenciais entre atresia biliar fetal e perinatal
Fonte: Adaptado de Kahn (2004) e Chardot (2005)
Alterações genéticas
Mal formação da placa ductal
Atualmente, a atresia biliar é classificada morfologicamente em três graus,
com incidências variáveis. O tipo I corresponde a 5% dos casos e consiste na
patência luminal até o ducto biliar comum e o ducto biliar cístico, podendo estar
associado a um elemento cístico proximal; o tipo II, presente em aproximadamente
2% dos casos, tem patência até o ducto hepático comum, e o tipo III, identificado em
mais de 90% dos casos, apresenta a parte mais proximal do trato biliar, junto à porta
hepática, completamente sólida, não havendo qualquer visualização de ductos à
ultrassonografia (Figura 15) (Sinhá ,Davenport, 2008).
55
Tipo I
Obstrução ao nível
do ducto biliar
comum
Tipo II
Obstrução ao nível
do ducto hepático
comum
Tipo III
Obstrução ao nível
da porta hepatis
Figura 14 – Representação esquemática dos tipos de atresia biliar
Fonte: Adaptado de Sinhá e Davenport (2008)
Chardot (2005), membro do Comitê Inglês de Estudo de Atresia Biliar, explica
que essa gradação é empregada no Japão, Estados Unidos da América e Reino
Unido, mas, na França, há um sistema no qual se admitem quatro graus anatômicos,
porque o grau III é subdividido em tipo 3, com incidência de 19%, no qual estão
patentes a vesícula biliar e os ductos cístico e biliar comum, e tipo 4, identificado em
72% dos casos, no qual há atresia biliar extra-hepática completa.
4.2.4 ETIOPATOGENIA
A etiopatogenia da atresia biliar tem se modificado ao longo do tempo.
Inicialmente foi considerada uma malformação congênita, para, posteriormente, ser
considerada uma anomalia adquirida, mas, atualmente, se admite não ser uma
entidade única e, sim, a expressão fenotípica de diferentes insultos (Kahn, 2004).
56
Parece ser de natureza multifatorial, tendo por resultado final comum a colangiopatia
obliterativa (Hartley, Davenport, Kelly, 2009).
Embora não se possam precisar as causas da atresia biliar, admitem-se
diversos fatores possíveis, genéticos, infecciosos, inflamatórios e mesmo tóxicos,
como ilustrado na Figura 6, os quais podem variar conforme a fase embriológica em
que a atresia ocorre (Figura 16).
Anomalia do desenvolvimento do ducto biliar
Precoce (1º trimestre)
Tardio (2º trimestre)
Síndrome de atresia biliar
com malformação esplênica
Atresia biliar isolada
Possibilidade de ação
de fatores genéticos
Fatores maternos
predisponentes (diabetes)
Anomalia com ductos biliares extra-hepáticos normais
Possível desregulação
imunológica
Possível susceptibilidade
genética
Hiperfunção de genes próinflamatórios
Virose hepatotrófica perinatal
Figura 15 – Possíveis relações causais da atresia biliar
Fonte: Adaptado de Hartley, Davenport e Kelly (2009)
Alguns autores afirmam que nas anomalias fetais, já se têm identificados
casos com associação de atresia biliar e mutações gênicas, como por exemplo: no
gene Kartagener (associado ao situs inversus), no gene CFC1 (responsável pela
regulação axial direita-esquerda na embriogênese, podendo promover poliesplenia,
isomerismo pulmonar e topografia gástrica à direita), bem como no gene JAG1
(responsável pela diferenciação celular e pela morfogênese). A mutação no gene
57
JAG1 é aquela para a qual se tem maior número de evidências: está presente na
Síndrome de Alagille; tem sido comprovada por reação de cadeia de polimerase,
como também por imunoistoquímica no epitélio de ductos biliares e em hepatócitos
de recém-nascidos atrésicos (Kahn, 2004).
O papel das viroses na atresia biliar tem sido exaustivamente estudado,
incluindo citomegalovírus, vírus sincicial respiratório, vírus Epstein-Barr, papiloma
vírus humano, vírus da hepatite, reovírus tipo 3 e rotavírus tipos A e C, mas sua
ação é controversa, apesar de a presença viral poder atuar facilitando mau
prognóstico (Sinhá, Davenport, 2008).
Quanto à desregulação de genes pró-inflamatórios ou desregulação do
sistema imunológico, as pesquisas indicam a possibilidade da superexpressão da
interferona gama e da expressão de gens imunorreguladores no início da obstrução
do ducto biliar, mas não há evidências suficientes para conclusão (Chardot, 2005;
Hartley, Davenport, Kelly, 2009).
4.2.5 ANOMALIAS ASSOCIADAS
A atresia biliar, em 20% dos casos está associada a outras anormalidades
anatômicas congênitas, sendo a mais comum a síndrome da má formação esplênica
(por poliesplenia, asplenia ou duplicação esplênica, presente em 100% dos casos),
associada a situs inversus, em 37% dos casos, veia porta pré-duodenal,
acometendo 40% dos neonatos, má rotação intestinal, em 60% dos casos, ausência
de veia cava inferior (incidindo em 70%), defeitos septais atriais e ventriculares, bem
como hipoplasia do coração esquerdo e pâncreas anular (Hartley, Davenport, Kelly,
58
2009). Além dessas malformações, outros autores referem a trissomia dos
cromossomos 18 ou 21 e a Síndrome de Turner, anormalidades renais e do trato
urinário em 59% dos casos.
4.2.6 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL
O diagnóstico pré-natal permanece uma condição excepcional. Nas atresias
dos tipos I e II, que são raras, pode se suspeitar nas imagens ultrassonográficas,
quando é visualizada uma estrutura cística no hilo hepático. Nesses casos, o exame
pós-natal deve ser feito com brevidade já que a forma cística da atresia biliar é uma
urgência cirúrgica, enquanto que para o cisto de colédoco, o procedimento pode ser
postergado (Chardot, 2005).
No início da gravidez, ou seja, até 16ª semana gestacional, a não visualização
da vesícula biliar fetal pode estar associada a anomalias fetais severas, incluindo
síndromes de polimalformação, aberrações cromossômicas e fibrose cística,
exigindo investigação por amniocentese. Pode também a vesícula biliar ser
visualizada tardiamente na gravidez, o que sugere um retardo em seu processo de
recanalização. Nesses casos, se a vesícula permanecer indetectável por imagem
após o nascimento, a hipótese diagnóstica de atresia biliar deve ser cuidadosamente
investigada (Sinhá, Davenport, 2008; Roskams, Desmet, 2008;).
A síndrome da malformação esplênica associada à atresia biliar deve ser
investigada, porque pode ser diagnosticada à ultrassonografia antenatal. Essa
recomendação é importante dada sua associação a cardiopatias e malformação de
veia cava inferior, a qual pode ser uma entidade isolada e benigna (Chardot, 2005).
59
4.2.7 DIAGNÓSTICO NEONATAL
A atresia biliar, logo após o nascimento, apresenta-se tipicamente com
icterícia persistente, acolia fecal e hiperbilirrubinúria, em neonatos com peso ao
nascer normal. Todos os recém-nascidos a termo que permanecem ictéricos após
14 dias e os pré-termos, após 21 dias, devem ser investigados para doença
hepática, inicialmente com a avaliação da bilirrubinemia total e conjugada. Aqueles
com icterícia fisiológica ou derivada do aleitamento apresentam aumento da
concentração sérica da bilirrubina não conjugada, enquanto que a forma conjugada
aumenta na icterícia secundária à maior parte das doenças hepáticas. Se houver
esplenomegalia de apresentação tardia, é um indicativo de hipertensão portal
(Maisels, 2006).
Outros exames laboratoriais podem ser solicitados, como a gamaglutamiltransferase sérica, cuja concentração é maior na atresia biliar do que em
outras causas de colestase neonatal, especialmente quando correlacionada com a
idade. Além disso, nesses casos a trigliceridemia estará normal, mas associada à
hipercolesterolemia (Hartley, Davenport, Kelly, 2009; Sinhá, Davenport, 2008).
Além dos dados laboratoriais, os seguintes métodos diagnósticos podem ser
utilizados (de Bruyne et al., 2010):
a)
ultrassonografia hepática, após 12 horas de jejum com infusão endovenosa
de dextrose – suspeita-se de atresia biliar quando a vesícula está contraída,
apesar do jejum, quando o hilo hepático mostra-se hiperecóico ou quando há
um cisto no hilo hepático. Nos casos de atresia biliar fetal, o recém-nascido
60
pode apresentar outras anomalias, como: poliesplenia, ausência de veia cava
retro- hepática ou situs inversus abdominal;
b) colangiografia – indicada para análise de morfologia e patência da árvore biliar,
quando a vesícula biliar parece normal na imagem por ultrassonografia. Pode ser
realizada via percutânea por punção da vesícula biliar, endoscopicamente ou a
céu aberto;
c) biópsia hepática – os achados histológicos sugestivos de atresia biliar são
proliferação ductular, obstrução biliar, edema ou fibrose portal, bem como pode
estar presente a transformação de células gigantes, como em qualquer causa de
colestase neonatal;
d) uso de sonda nasoduodenal – muito empregada nos centros japoneses e
chineses, alcançando o terço superior do duodeno, o que possibilita aspiração
contínua para identificação de bile, cuja simples presença indica não ser
necessária cirurgia. Aspirado claro e secreção intestinal não corada por bile,
colhida por mais de 24 horas, é sugestiva de atresia biliar (Hartley, Davenport,
Kelly, 2009).
Esses exames devem ser solicitados com prudência para que permitam
diagnóstico diferencial, especialmente com Síndrome de Alagille, colangite
esclerosante de início neonatal, deficiência de alfa-1-antitripsina, fibrose cística e,
mais raramente, colestase intra-hepática familiar progressiva (Chardot, 2005).
61
4.2.8 ASSISTÊNCIA NEONATAL
Atualmente não se dispõe de conduta pré-natal para atresia biliar, envolvendo
o manejo terapêutico cirúrgico, em dois passos. Em primeiro lugar faz-se uma
portoenterostomia, tal como descrita por Kasai, em 1950, no período neonatal, na
tentativa de restaurar o fluxo biliar. Em crianças para as quais não se obteve
sucesso com a cirurgia de Kasai, e para aquelas com complicações de cirrose biliar,
está indicado o transplante de fígado. Apesar disso, os estudos publicados entre
1999 e 2008 apresentam resultados pouco alentadores, conforme se apresenta na
Figura 18.
Atresia biliar isolada (± 90%)
Síndrome de má formação
esplênica com atresia biliar (± 10%)
± 2%
Portoenterostomia > 90% ± 5% Transplante primário
de Kasai
de fígado (± 5%)
Morte sem intervenção
atribuída a outras
anormalidades
5 % -10%
Morte pós-operatória
50%
Morre
aguardando
transplante
5%
Transplante secundário
de fígado
Vivos sem transplante
(± 50%)
5 % -10%
Vivos com transplante
(> 90%)
Figura 16 – Resultados de sobrevida de neonatos com atresia biliar baseados no registro de
atresia biliar do Reino Unido (1999 – 2008)
Fonte: Hartley, Davenport e Kelly (2009)
62
4.3
Litíase biliar
4.3.1 DEFINIÇÃO
A litíase biliar ou colelitíase consiste na presença de cálculos no interior da
vesícula biliar ou nos ductos biliares (Stringer et al., 1996) (Figura 17).
Figura 17 – Ultrassom demonstrando feto com vesícula biliar repleta de cáculos.
Fonte: Portal São Francisco (2011)
4.3.2
INCIDÊNCIA
Antes de 1980, poucos casos eram relatados de colelitíase em neonatos ou
crianças e estavam associados à anemia hemolítica. Com o aumento do uso do
ultrassom abdominal, esses diagnósticos tornaram-se mais frequentes, com
prevalência em crianças entre 0,13% e 0,5% (Boëchat et al., 2007).
A incidência da colelitíase em recém-nascidos tem sido atribuída a
prematuridade, nutrição parenteral, jejum prolongado, ressecção ileal, desidratação,
fototerapia, anomalias congênitas do trato biliar, sepses, doenças hemolíticas,
63
terapia
com
furosemida,
pseudo-hipoaldoesteronismo
e
antibioticoterapia,
particularmente com ceftriaxona. Apesar disso, um percentual significante de recémnascidos com litíase biliar não apresenta fatores predisponentes e, no mínimo em
alguns casos, os cálculos biliares têm origem fetal (Bor et al., 2004).
Uma pesquisa sobre colelitíase apontou incidência de 0,39%, incluindo fetos
sem fator predisponente, associado à ausência de fatores obstétricos (Agnifili et al.,
1998). Friesen e Roberts (1989) analisaram 693 casos de colelitíase sintomática,
publicados na literatura, bem como 35 casos por ele operados no período de sete
anos e declararam incidência de 1:1000 nascidos vivos e chamaram a atenção para
a raridade dessa ocorrência.
Boëchat et al. (2007), investigando, por ultrassonografia abdominal, 547
crianças com síndrome de Down, com idade entre um e três dias de vida, referiram
incidência de 9,1% e recomendaram esse exame para neonatos com Síndrome de
Down, mesmo em ausência de outro fator de risco associado.
4.3.3
ETIOPATOGENIA
A formação de cálculos biliares no período pré-natal tem sido pouco referida
na literatura e os poucos casos estão associados a anemia hemolítica e
anormalidades estruturais do trato biliar, os quais predispõem à formação de
cálculos devido a estase. Nos casos em que a anomalia do trato biliar leva à
redução do lúmen dos ductos, pode ocorrer a formação de rolha biliar, que consiste
na obstrução mecânica do ducto biliar comum bloqueando as secreções biliares,
mas tendem à resolução espontânea (Haller, 1991).
64
Outro fator que pode levar à formação de cálculo biliar é a doença de Caroli,
que consiste na má formação biliar associada a uma dilatação cística generalizada
dos ductos intra-hepáticos (classificada como forma pura ou tipo I), mas não à
fibrose hepática congênita, classificada como tipo II (Haller, 1991).
A infecção da vesícula biliar por Escherichia coli tem sido associada à
formação de cálculos biliares devido à produção de beta-glicuronidase pela bactéria,
resultando no aumento da saturação da bile por hidrólise do diglicuronato de
bilirrubina à forma não conjugada ou monoconjugada, o que favorece a formação de
bilirrubinato de cálcio (Citak et al., 2001). Tal como na infecção por Escherichia coli,
a infecção por Streptococcus B pode causar edema do canal hepático comum e do
cístico, gerando retardo do débito biliar (Alissa et al., 1996).
4.3.4
ANOMALIAS ASSOCIADAS
A litíase biliar pode estar associada à atresia biliar tipos I e II, doença de
Caroli dos tipos I e II, como também à síndrome de Down, conforme demonstrado
em diversas séries, para a qual tem sido sugerida como causa uma
hipercolesterolemia durante a vida intrauterina (Boëchat et al., 2007; Bocconi et al.,
1997), mas há relatos de fetos sem alterações da árvore biliar e com presença de
lama biliar ou mesmo cálculos biliares em ausência de fatores predisponentes
(Stringer et al., 1996).
A presença de colelitíase tem sido implicada na formação de cisto de
colédoco, perfuração, dano hepático ou pancreatite (Haller, 1991).
65
4.3.5 DIAGNÓSTICO PRÉ E PÓS-NATAL
É feito por exame ultrassonográfico no qual se observa material ecogênico no
interior da vesícula biliar, predominantemente após a trigésima semana gestacional,
independente da história de litíase biliar materna (Haller, 1991; Stringer et al., 1996).
Gertner e Farmer (2004) relataram um caso de litíase biliar em um neonato de
16 dias de vida, diagnosticado por imagem ultrassonográfica que não evidenciava
estenose pilórica ou colelitíase. O diagnóstico foi firmado após dois exames
ultrassonográficos quando observaram dilatação ductal intra-hepática, dificuldade de
visualização do ducto comum e presença de cálculos pequenos, múltiplos em
vesícula biliar, descrição comum a outros trabalhos (Alissa et al., 1996; Citak et al.,
2001; Haller, 1991).
4.3.6 ASSISTÊNCIA NEONATAL
A litíase biliar neonatal frequentemente é assintomática e, por esse motivo,
quando diagnostica no período intra-útero exige monitoramento do neonato porque
os cálculos biliares podem ter resolução espontânea durante um período de
semanas a meses. Em ausência de sintomas, a conduta mais indicada é o
acompanhamento, não devendo haver procedimento agressivo apenas baseado no
diagnóstico da presença de litos biliares (Alissa et al., 1996; Citak et al., 2001).
66
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final dessa revisão da literatura, que incluiu trabalhos clássicos bem como
aqueles recentemente publicados, dois aspectos merecem destaque. O primeiro é a
necessidade do conhecimento detalhado da embriologia de formação do fígado, de
suas estruturas vasculares e da vesícula biliar, para propiciar o diagnóstico mais
seguro por imagem. O segundo aspecto, extremamente relevante, é a importância
que esses exames de imagem vêm ganhando ao longo do tempo pela evolução
tecnológica, e mais recentemente, das Ciências da Computação.
Considerando que o tratamento das anomalias congênitas de fígado e
vesícula biliar depende primordialmente de uma visualização segura, é de se
esperar no futuro que a reconstrução gráfica tridimensional permita o avanço do
tratamento, bem como a compreensão dessas injúrias. Espera-se também, no
futuro, que iniciativas como as referidas em Boston, sejam incentivadas para a
criação de bancos de dados sobre anomalias congênitas, permitindo avaliar
aspectos como detalhes de topografia, incidência e prevalência.
67
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