B99 - PET Engenharia Química - Universidade Federal de Uberlândia

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B99 - PET Engenharia Química - Universidade Federal de Uberlândia
ESTUDO DA INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA, pH E AGITAÇÃO NAS
CARACTERÍSTICAS FLOCULANTES DE Saccharomyces cerevisiae
1
Marina D. B. Sousa, 1 Maria Silvia A. Cecílio, 2 Líbia D. Santos e 3 Eloízio J. Ribeiro
1 Bolsista
de iniciação Científica PIBIC/CNPq/UFU, discente do curso de Engenharia Química
Professor(a) da Faculdade de Engenharia de Alimentos da UFU/MG
3 Professor da Faculdade de Engenharia Química da UFU/MG
2
1,3
Faculdade de Engenharia Química da Universidade Federal de Uberlândia. Av João Naves de Ávila, 2121, Bloco 1K,
Campus Santa Mônica, Uberlândia - MG, CEP 38408-100
2 Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Uberlândia. Av Getúlio Vargas, 230, Centro,
Patos de Minas- MG, CEP 38700-128
e-mail: [email protected]
RESUMO - A volatilidade dos preços dos combustíveis a base de petróleo no mundo e a
segurança do clima brasileiro impulsionam, desde 1970, a pesquisa por fontes de energia
alternativas e o desenvolvimento de pesquisas em biocombustível para a substituição do
petróleo. É neste contexto que, visando o aprimoramento da produção sustentável de etanol, o
emprego da tecnologia de fermentação alcoólica com células floculantes surge como uma
estratégia promissora para obter melhorias no desempenho e na redução de custos desta
produção. O seguinte trabalho teve como intuito avaliar a influência da temperatura, do pH e da
agitação na floculação e no rendimento da fermentação alcóolica utilizando a levedura
Saccharomyces cerevisiae, de características floculantes, cepa C2/00 doada pelo CPQBA. As
faixas de temperatura analisadas foram de 20, 25, 30, 32, 35 e 40°C, com relação ao pH foram
avaliados os seguintes pontos: 2,5; 3,0 ; 3,5; 4,0; 4,5; 5,0 e 6,0 e por fim quanto a agitação os
valores estudados foram: 50, 100 e 150 rpm. Ao final dos experimentos, verificou-se que os
melhores resultados foram obtidos a 32°C, pH na faixa de 4,5 a 5,0 e 150 rpm de agitação.
Palavras-Chave: leveduras floculantes, pH, temperatura
INTRODUÇÃO
O petróleo sempre teve grande destaque
no setor energético nacional e mundial. Entretanto, visando diminuir os problemas ambientais e
devido às perspectivas de esgotamento das fontes não renováveis de combustíveis fósseis, o
biocombustível surgiu como uma opção mais viável para assegurar um futuro sustentável (Abarca,
2005).
Nesse contexto, pesquisas e tecnologias
capazes de melhorar a produção de etanol vêm
aumentando por razões ecológicas e econômicas.
O desafio é identificar os gargalos que limitam os
processos de fermentação industriais e desenvolver processos que forneçam alta produção de
etanol (Alfenore et al., 2004).
Os processos de fermentação alcoólica
conduzidos pelo uso de cepas selecionadas da
levedura Saccharomyces cerevisiae, de características floculantes, vem se tornando uma promissora estratégia para obter melhorias no desempenho e na redução de custos do processo de
produção de etanol. Essas leveduras possuem a
capacidade de se agregarem espontaneamente e
formarem flocos que se concentram no fundo do
reator após a transformação dos açúcares presentes no caldo de cana em álcool. Dessa maneira, a retenção das células floculantes no reator
possibilita sua reutilização, dispensando assim a
centrifugação do vinho fermentado e garantindo
uma economia em termos de aquisição e manutenção de centrífugas (Xu et al., 2005, Zhao et al.,
2009).
Porém, essa inovação ainda vem sendo
estudada, uma vez que além do controle e
regulação genética (espécie, linhagem e
modificação genética), diversos fatores físicos
(temperatura, pressão osmótica), químicos (pH,
oxigenação, nutrientes minerais e orgânicos,
inibidores) e microbiológicos (concentração da
levedura e contaminação bacteriana), podem
afetar a floculação de leveduras, o rendimento da
fermentação e a eficiência da conversão de
açúcar em etanol (Zhao et al., 2009, Lima et al.,
2001).
Dessa forma, o presente trabalho teve
como objetivo estudar o influência da
temperatura, pH e agitação nas características
floculantes da Saccharomyces cerevisiae e a
resposta na fermentação alcoólica.
MATERIAIS E MÉTODOS
No experimento foi utilizada a levedura
Saccharomyces cerevisiae, com características
floculantes, cepa C2/00 doada pelo Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e
Agrícolas (CPQBA), Campinas, SP. Além disso,
utilizou-se um meio sintético estéril composto de
KH2PO4 (5 g/L), MgSO4 .7H2O (1 g/L), [NH4]2SO4
(2 g/L) ,extrato de levedura (6 g/L) e sacarose
(160 g/L).
Para estudar a influência do pH, o procedimento
experimental foi realizado com 150 mL de meio
estéril, nos valores de pH definidos para cada experimento, com concentração de sacarose de 180
g/L. Cada erlenmeyer foi inoculado com 15 mL de
suspensão celular, obtendo a concentração inicial
de leveduras de 10% (v/v), o que correspondia a
108 células/mL. O pH do meio foi ajustado no início da fermentação com ácido clorídrico 2M ou
hidróxido de sódio 1M e os valores estudados de
pH foram:2,5; 3,0 ; 3,5; 4,0; 4,5; 5,0 e 6,0. O tempo de incubação foi de vinte e quatro horas em
mesa rotatória a 100 rpm e temperatura 28°C.
As temperaturas estudadas foram 20, 25,
30, 32, 35 e 40°C. As fermentações alcoólicas
foram realizadas em erlenmeyers com meio de
cultura em uma concentração inicial de sacarose
de 160 g/L, em mesas rotatórias com agitação de
100 rpm, durante 10 horas. A redução da
concentração de sacarose inicial para 160 g/L nos
testes preliminares, foi baseada na quantidade
alta de açúcar residual encontrada nos
experimentos da influência do pH.
Nos experimentos para estudar a influência
da agitação nos flocos das leveduras com
características floculantes, utilizou-se erlenmeyers
e mesas rotativas nas seguintes agitações, a
saber: 50, 100 e 150 rpm. As fermentações
utilizaram meio sintético com concentração de
sacarose de 160 g/L, pH 4,5, temperatura de
32°C e concentração celular de 10% (v/v) durante
quinze horas.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
O pH exerceu grande influência no
comportamento das células de Saccharomyces
cerevisiae C2/00, pois em valores na faixa de 4,5
à 6,0, as cepas se organizavam de forma mais
uniforme, formando aglomerados cilíndricos
perfeitos e o meio de cultivo se tornava
transparente. Em valores entre pH 4,0 e 3,0
observava-se que as leveduras não se
aglomeravam e se misturavam ao meio tornandoo viscoso e opaco. De acordo como Souza (et al.,
2004), provavelmente, a modificação dos valores
de pH altera a ionização dos ácidos aminados das
lectinas, proteínas de origem não –imunológica,
com a consequente mudança de sua
conformação.
No trabalho do Soares (2010), que estudou
a indução da floculação de leveduras da
fermentação alcoólica por bactérias Lactobacillus
fermentum, é citado que uma redução brusca de
pH promove a dispersão dos flocos, além de
aumentar o tempo de sedimentação das células.
Um comportamento interessante observado
foi em meio de pH 3 o qual ocorreu uma
desfloculação total e quando foi aumentando o
pH, ao atingir 4,5, as leveduras se aglomeram e
voltaram a formar flocos bem definidos, tornando
o meio translúcido.
Segundo Claro (et al., 2007), o pH pode
exercer um efeito profundo na floculação das
leveduras. Para várias cepas, a floculação ocorre
num amplo intervalo de pH (2,5 – 9,0), embora
para algumas cepas este intervalo seja muito
mais estreito (2,5 – 5,5), porém para a maioria
das cepas o pH ótimo para a floculação se situa
entre 3,0 e 5,0.
Os rendimentos e produtividades mais altos
foram obtidos em pH 4 e 4,5, valores
considerados
ótimos
na
maioria
das
fermentações alcoólicas industriais, 93,94%. Em
valores de pH abaixo de 4,0 observa um pequeno
aumento na produção de glicerol, que é uma
resposta ao estresse causado pelo baixo valor de
pH, 3.18 g/L(ANDRIETTA et al., 2008) .Verifica-se
para baixos valores de pH uma baixa conversão
de sacarose, o que implica em uma alta
quantidade de açúcar residual, 106 g/L.
Com relação ao efeito da temperatura, os
resultados experimentais obtidos em erlenmeyer
revelaram que um aumento na temperatura
implica numa redução do tamanho dos flocos da
levedura, como ilustra a figura 1. Estes resultados
estão de acordo com o trabalho de Stratford
(1992) que afirmou que a incubação de leveduras
na faixa de 35 a 37°C conduz a uma redução da
floculação. Os autores (Taylor e Orton, 1975)
afirmaram que ocorre uma provável desnaturação
das lectinas da floculação a altas temperaturas,
assim
se
as
leveduras
floculantes
permanecessem por alguns minutos numa
temperatura entre 50 e 60°C promoveria a
completa dispersão dos flocos, mas de forma
reversível.
Além dos tamanhos dos flocos, a
temperatura influenciou no rendimento e
produtividade, conforme os resultados após 10
horas de fermentação, ilustrados pela tabela 1.
Observa-se, pela tabela 1, que a temperatura na
qual se obteve os melhores resultados de concentração de açúcar residual e de álcool foi a temperatura de 32°C. Nesta temperatura observou-se
que os flocos foram uniformes e de menor tamanho. Em temperaturas mais baixas a fermentação
não é favorecida, restando mais açúcar no final
da fermentação e a agregação celular foi maior
resultando em flocos grandes, na ordem de 10
mm de diâmetro em média.
Os resultados desse estudo sobre a
influência da temperatura indicou a faixa de
temperatura de 30 a 35°C ser a mais indicada
para o processo. Essa faixa é muito conhecida e
utilizada nas fermentações alcoólicas com
leveduras livres. Assim optou-se por utilizar a
temperatura
de 32°C para o trabalho
subsequente.
influenciava no tamanho dos flocos. De acordo
com o autor (Zhao et al., 2009), é necessário um
valor mínimo de agitação para ocorrer a
floculação, pois a agitação mecânica permite
aumentar a energia cinética das células o que
supera a repulsão mútua entre elas. Sabendo que
quanto maiores os flocos, menor é a superfície de
contato das leveduras com o meio fermentativo,
foram estudadas três condições de agitação em
Shaker para observar a diferença no tamanho dos
flocos e a influência desse tamanho no resultado
da fermentação alcoólica (ANDRIETTA et al.,
2008)
Com os resultados apresentados pela figura e a tabela 1 pode-se constatar que ocorreu
um aumento do rendimento alcoólico com a diminuição do tamanho dos flocos. Na agitação de
150 rpm os flocos ficaram mais uniformes, de tamanho reduzido com 1 mm de diâmetro em média e isso resultou no maior resultado obtido entre
todos os testes realizados, na produção de 82,26
g/L de etanol e 96,11% de rendimento. Com uma
menor agitação, 50 rpm, as células se agregaram
formando flocos maiores de 10 mm de diâmetro
em média e o rendimento da fermentação foi o de
menor valor obtido igual a 82,35%.
CONCLUSÃO
Figura 1 – Representação da influência da
temperatura do tamanho dos flocos da cepa
Saccharomyces cerevisiae C2/00.
Tabela 1 – Resultados da influência da
temperatura empregando a cepa C2/00, para
uma concentração inicial de 168,42 g/L de
ART, a pH 4,5, em 10 h de fermentação
Temperatura(°C)
ART residual (g/L)
Álcool (g/L)
Rendimento
(%)
20
38,73±1,9
44,5±1,9
67,15±3,8
25
23,42±0,9
53,44±2,7
72,12±4,1
30
8,21±0,5
71,05±3,2
86,79±4,2
32
5,32±0,2
76,23±3,9
91,46±4,8
35
0,69±0,03
77,26±3,8
90,14±4,4
40
2,53±0,11
66,11±3,3
77,99±3,9
Foi
observado
durante
os
testes
preliminares utilizando a cepa Saccharomyces
cerevisiae floculante C2/00 que a agitação
O pH, a temperatura e a agitação influenciaram
na formação dos flocos e no rendimento e produtividade da fermentação alcoólica. Valores de pH
abaixo de 4,0, temperaturas acima de 35°C e agitação acima de 100 rpm provocaram uma dispersão dos flocos no meio. Valores de pH na faixa de
4,0 a 5,0 foram os mais adequados ao processo
por conduzirem aos melhores resultados de rendimento e produtividade, além de manter a levedura floculada;
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AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a FAPEMIG,
CNPq e CAPES pelo apoio financeiro. Ao CPQBA
pela doação da levedura.