PRINCÍPIOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL EM

Transcrição

PRINCÍPIOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL EM
CENTRO UNIVERSITÁRIO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA – IESB
COMUNICAÇÃO SOCIAL – PUBLICIDADE E PROPAGANDA
JONATHAN JONES DOS SANTOS PEREIRA
PRINCÍPIOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL EM ANÚNCIOS PREMIADOS:
estratégias persuasivas baseadas em comportamentos automáticos e vieses
cognitivos.
BRASÍLIA – DF
2015
JONATHAN JONES DOS SANTOS PEREIRA
PRINCÍPIOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL EM ANÚNCIOS PREMIADOS:
estratégias persuasivas baseadas em comportamentos automáticos e vieses
cognitivos.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao curso de Comunicação Social com
Habilitação em Publicidade e Propaganda do
Instituto de Educação Superior de Brasília,
como requisito parcial para obtenção do grau
de Bacharel em Publicidade e Propaganda.
Orientadora: Profa. Ma. Nívea Pimenta Braga.
BRASÍLIA – DF
2015
JONATHAN JONES DOS SANTOS PEREIRA
PRINCÍPIOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL EM ANÚNCIOS PREMIADOS:
estratégias persuasivas baseadas em comportamentos automáticos e vieses
cognitivos.
Trabalho de Conclusão de Curso aprovado
pela Banca Examinadora com vistas à
obtenção do título de Bacharel em
Comunicação Social, área de concentração:
Publicidade e Propaganda, do Instituto de
Educação Superior de Brasília.
Brasília, DF __ de novembro de 2015.
Banca Examinadora:
_________________________________________________
Profa. Ma. Nívea Pimenta Braga
Orientadora - IESB
_________________________________________________
Prof. Esp. Claudio Roberto Alves Delamare Marinho
Examinador - IESB
_________________________________________________
Prof. Dr. Eladio Antonio Oduber Palencia
Examinador - IESB
DEDICATÓRIA
Ao futuro,
e às aventuras que ele sempre traz.
AGRADECIMENTOS
A Angélica Nascimento de Oliveira, por me inspirar com sua busca pela excelência.
A Gilson José David, cujas dicas de leitura tornaram este trabalho possível.
Aos amigos Matheus Velloso e Robson Rinaldi, que discutiram exaustivamente
muitos desses conceitos comigo.
Ao Prof. Eladio Oduber, que, com muita humildade e paciência, me mostrou o
caminho.
A Profa. Nívea Pimenta Braga, que comprou a briga.
E, claro, aos suspeitos usuais.
EPÍGRAFE
“É possível contar um monte de mentiras
dizendo só a verdade.”
Comercial “Hitler”,
para a Folha de S. Paulo, 1988
RESUMO
Para atingir seus objetivos, a publicidade busca persuadir os consumidores a
adotarem determinados comportamentos. A busca por estratégias e táticas que
assegurem resultados práticos tem, portanto, interessado publicitários desde os
primórdios dessa indústria. Este estudo fundamentou-se em referenciais teóricos da
neurociência do consumidor e da psicologia social para descrever os mecanismos
fisiológicos que levam o cérebro humano a agir com base em comportamentos
automáticos, e como esses procedimentos mecânicos acabam gerando erros
sistemáticos de pensamento que podem ser usados para estimular o desejo de
consumo dos indivíduos. Sobre esse tema, Robert Cialdini identificou seis princípios
psicológicos que baseiam-se em vieses cognitivos especificamente relacionados à
Influência Social. Tendo em vista que essas pesquisas oferecem a possibilidade de
anúncios mais efetivos e baseados em evidência empírica, este estudo tem o
objetivo de verificar o nível de uso dessa ciência por campanhas vencedoras de
prêmios, usando a técnica da análise de conteúdo para identificar o uso desses
princípios em 200 anúncios impressos premiados com Ouro, Prata, Bronze e o
Grand Prix no 62o Cannes Lions Festival Internacional de Criatividade, que ocorreu
em junho de 2015. O estudo revelou que apenas 18 das peças aplicavam os
princípios, um número tido como baixo. Os resultados indicam que os publicitários
pouco aproveitam-se desses princípios ao pensarem peças e campanhas. Dentre as
possibilidades propostas para justificar esses resultados incluem-se os objetivos
artístico-conceituais e estéticos do festival, o possível uso de estratégias
persuasivas ainda a serem estudadas, e o desconhecimento – ou desinteresse – por
parte dos profissionais dessa indústria sobre o assunto.
Palavras-chave: Publicidade e Propaganda. Influência Social. Comportamentos
Automáticos. Vieses Cognitivos. Festival de Cannes.
ABSTRACT
In order to achieve its goals, advertising aims to persuade consumers to adopt
certain behaviors, and the search for strategies and tactics to ensure practical results
interests advertising professionals since the early days of this industry. This study
was based on theoretical frameworks from consumer neuroscience and social
psychology to describe the physiological mechanisms that lead the human brain to
act on automatic behaviors, and how these mechanical procedures end up
generating systematic errors of thought that can be used to persuade consumers. On
this subject, Robert Cialdini has identified six psychological principles that are based
on cognitive biases specifically related to Social Influence. Given that these studies
offer the possibility of more effective ads based on empirical evidence, this study
aims to check the level of use of this science in prizewinner campaigns. Therefore,
using the technique of content analysis, this study aimed to identify the use of these
principles in 200 print ads awarded with Gold, Silver, Bronze and the Grand Prix at
the 62nd Cannes Lions International Festival of Creativity, which took place in June
2015. The study found that only 18 pieces were applying the principles, a number
considered low. The results indicate that advertising professionals do not take a lot of
advantage from those principles to think pieces and campaigns. Among the
hypotheses proposed to explain these results are the artistic and conceptual goals of
the festival, the possible use of persuasive strategies yet to be studied, and
ignorance - or indifference - by the professionals of this industry on the issue.
Keywords: Advertising. Social Influence. Automatic Behaviors. Cognitive Bias.
Cannes Festival.
LISTA DE FIGURAS
Fig. 1 – O cérebro humano
26
Fig. 2 – Anúncio “Pense Pequeno”
42
Fig. 3 – Anúncio da locadora de carros Avis
43
Fig. 4 – A nova Coca-Cola.
47
Fig. 5 – Quadro de princípios operacionalizados
50
Fig. 6 – Quadro de resultados (descritivo)
56
LISTA DE ABREVIATURAS
EEG Eletroencefalografia
IRM Imagem por Ressonância Magnética
IRMf Imagem por Ressonância Magnética funcional
MEG Magnetoencefalografia
PER Potenciais de Eventos Relacionados
SNC Sistema nervoso central
TEE Topografias de Estado Estável
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
11
1.1 Problema
13
1.2 Hipóteses
13
1.3 Objetivos
14
1.3.1 Objetivo Geral
14
1.3.2 Objetivos Específicos
14
1.4 Justificativa
14
2 REFERENCIAL TEÓRICO
17
2.1 Neurociência
17
2.1.1 Neuromarketing e Neurociência do Consumidor
18
2.2 Influência Social
21
2.3 Publicidade e o processo suasório
22
2.3.1 Mídia Impressa
24
2.4 O cérebro e comportamentos automáticos
25
2.4.1 Erros sistemáticos (vieses cognitivos)
30
2.5 Os seis princípios psicológicos de Influência Social
32
2.5.1 Reciprocidade
34
2.5.2 Comprometimento e Consistência
35
2.5.3 Prova Social/Consenso
38
2.5.4 Empatia
40
2.5.5 Autoridade
44
2.5.6 Raridade
46
3 MÉTODO
49
3.1 Critérios de Análise
50
4 RESULTADOS
51
4.1 Princípios nas peças premiadas com o Grand Prix
51
4.2 Princípios nas peças premiadas com Ouro
52
4.3 Princípios nas peças premiadas com Prata
52
4.4 Princípios nas peças premiadas com Bronze
53
5 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
57
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
59
REFERÊNCIAS
62
ANEXO A – Peças contendo os princípios de Influência Social
68
11
1 INTRODUÇÃO
A mensagem publicitária busca persuadir seu público-alvo a assumir um
comportamento favorável ao anunciante, incentivando o consumo de um produto ou
serviço. Esse é, entretanto, um processo complexo e sutil. Por isso, desde os
primórdios dessa indústria, têm-se debatido quais os elementos que originam o
anúncio mais efetivo. Afinal, possuir uma publicidade que realmente influencie
atitudes é uma vantagem estratégica por si só evidente. Ribeiro (1995), por exemplo,
descreve esforços para transformar a publicidade “em uma técnica mais eficiente e
precisa”, que poderia “ser conhecida, controlada e sistematizada em métodos e
princípios teóricos [...]” (RIBEIRO, 1995, p. 58). A um determinado ponto, ele afirma:
“Os empreendimentos teóricos e experimentais alimentaram, ao que
parece, expectativas bastante ambiciosas, como:
•
Provar cientificamente que a propaganda funciona.
•
[...]
•
Descobrir os ingredientes da propaganda mais eficiente para,
provavelmente, poder replicar com segurança as fórmulas de
sucesso.” (RIBEIRO, 1995, p. 58)
O desejo de conferir mais eficiência aos anúncios pode ser rastreado no
tempo. Já na década de 1920, o livro Scientific Advertising declarava que a
publicidade havia atingido o status de uma ciência, e era baseada em princípios
fixos (ARENS; SCHAEFER, 2006).
Outro exemplo icônico é o publicitário David Ogilvy. Ele produzia suas
campanhas de acordo com um conjunto de regras que, afirmava, representavam a
quintessência do que havia aprendido por meio das pesquisas de Clark-Hooper,
Gallup, Harold Rudolph e Starch, sobre os fatores que levavam as pessoas a lerem
anúncios e, posteriormente, a lembrarem aquilo que leram (OGILVY, 2011). Ele
defendia a eficácia de seu método argumentando que grandes artistas, como
William Shakespeare e Wolfgang Amadeus Mozart, criaram suas obras dentro de
uma estrita disciplina, e, ainda assim, produziram trabalhos memoráveis.
Ainda de acordo com Ogilvy (2011), um dos maiores problemas da indústria
publicitária de seu tempo era que as agências de publicidade (principalmente nos
12
Estados Unidos, na França e na Inglaterra) estavam cheias de pessoas que
enxergavam a publicidade como uma forma de arte avant-garde, demonstrando
pouco interesse pelos produtos de seus clientes e apenas ambicionando ganhar
prêmios no Festival de Cannes.
Ogilvy repreendia ainda agências de publicidade que “desperdiçam o dinheiro
de seus clientes repetindo os mesmos erros” e violando o que ele acredita serem
“princípios elementares descobertos há muitos anos” (OGILVY, 2011, p. 20). Sobre
isso, o publicitário declarou:
“Por que razão eles se negam a estudar a experiência? Será que a
publicidade não atrai as mentes inquisitivas? Será porque qualquer método
científico está fora da sua compreensão? Temem que o conhecimento irá
lhes impor alguma disciplina – ou colocará a nu a sua incompetência?”
(OGILVY, 2011, p. 20)
Hoje entende-se que, ao contrário do que pensava Claude Hopkins, a
publicidade “não chega a ser uma ciência” (SAMPAIO, 2013, p. 10). Entretanto, mais
do que nunca, há um interesse por campanhas que atinjam seus objetivos com rigor
– e ele parece justificado. A estimativa é a de que, em 2015, os gastos mundiais
com publicidade cheguem a US$ 592 bi. O Brasil, mais especificamente, caminha
para ocupar o posto de quarto maior mercado publicitário global até 2018
(EMARKETER, 2014). Com cifras dessa magnitude em movimento, é natural que as
agências de publicidade e seus profissionais procurem sempre por formas mais
asseguradas e concretas de garantir o retorno do dinheiro investido pelos
anunciantes. Qualquer esforço no sentido de aumentar as chances de um resultado
positivo – neste caso, alcançar os objetivos enumerados durante a fase de
planejamento das campanhas, por exemplo – deve ser considerado e discutido. A
publicidade é parte integrante do processo mercadológico, cujo “objetivo final é gerar
lucro para a empresa, através da troca de produtos ou serviços com os
consumidores que os procuram ou precisam deles.” (ARENS; SCHAEFER, 2006, p.
6). Partindo-se do pressuposto de que a publicidade tem um objetivo claro – Santos
(2005), por exemplo, defende que as mensagens publicitárias têm a finalidade de
predispor o receptor a praticar um ato específico, como comprar um produto, abrir
13
uma conta em um determinado banco, ou reciclar embalagens – como intensificar as
chances de sucesso?
Uma resposta possível para este problema – a possibilidade analisada por esta
pesquisa – seria assumir o pressuposto de que, para promover o comportamento
anunciado, uma peça precisa se fundamentar em uma teoria empiricamente
evidenciada e seguir princípios de influência social (Bator & Cialdini, 2000 apud
CRUZ, 2015).
Assim, este trabalho emerge do conceito de que as mensagens publicitárias
podem ser mais eficientes se forem derivadas, empírica e teoricamente, de estudos
sobre o cérebro e o comportamento humano.
Para melhor entender este tema, o texto revisa inicialmente as pesquisas
sobre comportamentos automáticos e vieses cognitivos, sob uma perspectiva
transdisciplinar. Para entender a origem desses comportamentos, descreve-se o
cérebro e seus processos mentais. A seguir, resumem-se os seis princípios
psicológicos fundamentais que favorecem a influência identificados por Robert
Cialdini (2006). Esses princípios referem-se a vieses relacionados ao processo
suasório, proveitosos à publicidade. Para mensurar o uso desses princípios, utilizase a análise de conteúdo em 200 peças premiadas no Festival de Cannes de 2015,
de modo a indicar em que grau as peças baseiam-se em estratégias empiricamente
comprovadas. Finalmente, discutem-se esses resultados, assim como suas
possíveis decorrências.
1.1 Problema
Aplicando à publicidade o referencial teórico proposto pela psicologia social,
apresenta-se o seguinte questionamento: as mensagens publicitárias utilizam-se dos
seis princípios de Influência Social identificados por Cialdini (2006)? Se sim, em que
grau?
1.2 Hipóteses
•
As pecas publicitárias utilizam-se dos seis princípios psicológicos de
influência social, mesmo que de forma intuitiva.
14
•
As peças publicitárias pouco utilizam-se ou ignoram completamente os
princípios psicológicos.
1.3 Objetivos
1.3.1 Geral
•
Identificar e discutir o uso de princípios psicológicos de Influência Social em
peças publicitárias, com ênfase na mídia impressa.
1.3.2 Específicos
•
Descrever, de maneira transdisciplinar, os processos psicofisiológicos que
levam o cérebro humano a originar comportamentos automáticos;
•
Delinear o “estado da arte” das pesquisas sobre os erros sistemáticos da
mente (vieses cognitivos);
•
Situar o leitor no tema do uso de evidência e pesquisa em publicidade;
•
Investigar o uso dos seis princípios de influência social propostos por Robert
B. Cialdini em peças publicitárias na mídia impressa.
1.4 Justificativa
A cada dia que passa, aumenta o conhecimento do cérebro e seus
mecanismos de escolha. Rapidamente, essa ciência começa a ser aplicada à
técnica publicitária. Este é um tema extremamente relevante para a publicidade
atual, que encontra-se diante de um momento decisivo. Estar à frente desse
processo, incorporando primeiro esses conceitos, pode ser muito mais do que um
simples “diferencial” para a agência. Este é o futuro, e quem se adaptar primeiro ao
paradigma que se consolida, assegura suas chances de subsistir e prosperar no
extremamente competitivo ambiente publicitário. Este estudo, portanto, proporciona
diversas camadas de utilidade:
Para os colegas acadêmicos, aos quais este trabalho é especialmente
direcionado, recomenda-se enxergar este estudo como mais um esforço honesto na
difícil empreitada de compreender de que forma o comportamento ao comprar é
15
moldado. É importante frisar que muito do que é discutido aqui baseia-se em
estudos bastante recentes, e muito interesse tem sido demonstrado por essas
descobertas.
Divulgar
estes
progressos
é,
portanto,
proveitoso
para
o
desenvolvimento contínuo desta disciplina.
Ademais, o foco primário deste estudo é trazer mais ciência para a
publicidade. E o motivo é simples: a ciência é uma ferramenta que complementa e
enriquece o entendimento que se possui do universo. O uso das tecnologias
descritas neste estudo significam um aumento significativo na qualidade dos
esforços publicitários. Em resumo: a ciência aplicada à publicidade é o futuro, e este
estudo visa fornecer um vislumbre de como esse futuro pode ser.
Para os profissionais de publicidade (e todos aqueles relacionados, de
alguma forma, com a indústria do consumo), este trabalho proporciona mais
familiaridade com conceitos e técnicas que podem ser valiosos ao seu ofício. Para a
realidade profissional, prática, uma perspectiva mais profunda a respeito de como o
cérebro do consumidor funciona pode ser bastante útil aos publicitários que, hoje,
desenvolvem campanhas de maneira intuitiva. Este estudo tem por objetivo dar a
esses profissionais a oportunidade de traduzir a ciência que se possui da mente em
sólidas estratégias, podendo, assim, justificar suas escolhas perante o cliente com
base nas mais recentes pesquisas. A publicidade é uma busca incessante pela
novidade, pelo ousado. Hoje, a Influência Social é a novidade.
Para o consumidor, este trabalho oferece a oportunidade de compreender,
com mais pormenores, de que maneira ocorrem os processos psicológicos usados
para mudar comportamentos. Permitindo-lhe, dessa forma, desenvolver uma postura
mais crítica e responsável durante o ato de consumo. O poder do homem aumentou
desproporcionalmente à sua sabedoria, e, por isso, é vital que o público domine os
meios necessários para resistir ao emprego antiético destas táticas sutis. É
importante ressaltar, dessa forma, que proteger-se contra vieses é um trabalho
árduo. De fato, Kahneman (2012) afirma que manter uma vigilância constante contra
os erros que o cérebro comete envolve um grande esforço. Entretanto, para ele, a
chance de evitar equívocos graves pode valer a pena. Pesquisas recentes sugerem
que até algoritmos complexos, utilizados em programas de computador, apresentam
vieses de preconceito (THE UNIVERSITY OF UTAH, 2015). E se, para Cialdini
(2006), a evidência sugere que esse tipo de ataque se tornará mais e mais
prevalente no futuro, é importante, portanto, estar preparado.
16
Finalmente, para o autor, este trabalho oferece uma oportunidade única: a de
aprender mais sobre o tema e, ao mesmo tempo, contribuir. Redigir este estudo
envolveu um esforço intenso e transformador. Este trabalho é um passo crucial rumo
à maturidade científica, ao aperfeiçoamento pessoal e à firme busca pela excelência
humana.
17
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Este capítulo apresenta, de maneira pragmática, os embasamentos teóricos
necessários ao pleno entendimento deste trabalho, da seguinte maneira: primeiro,
de modo a compreender o cérebro humano e seus processos de pensamento, este
estudo utiliza-se, em diversos graus, de conceitos emprestados da neurociência com ênfase na neurociência do consumidor; e da psicologia social, mais
particularmente a Influência Social. Por isso, cada um desses campos é definido e
brevemente abordado.
Posteriormente, contextualiza-se o leitor a respeito da publicidade moderna: o
que é, onde é comumente produzida e como operam seus processos suasórios.
Descreve-se as características da mídia impressa, meio utilizado nesta análise.
A seguir, utilizando muitos dos conceitos anteriormente apresentados de
neurociência e psicologia social, dá-se uma análise transdisciplinar de como o
cérebro funciona e de onde provêm os comportamentos automáticos. Explica-se as
bases
fisiológicas
desses
processos,
de
acordo
com
diversos
autores.
Posteriormente, avalia-se de que maneira esses comportamentos automatizados
podem levar a erros sistemáticos de pensamento, ou vieses cognitivos.
Exemplificam-se diversos desses erros, especialmente os estudados por Ariely
(2008) e Kahneman (2012). Por fim, analisam-se vieses relacionados à Influência
Social, mais especificamente os seis princípios identificados pelo psicólogo social
Robert B. Cialdini, cuja utilidade à publicidade fica evidente devido aos objetivos
semelhantes: entender os mecanismos por trás do processo de influência entre
indivíduos e grupos.
2.1 Neurociência
A neurociência estuda o sistema nervoso e tem por objetivo compreender as
bases biológicas do comportamento (PLASSMAN; RAMSØY; MILOSAVLJEVIC,
2012; RAMSØY, 2014b). A neurociência possui um escopo bastante amplo, indo do
estudo de células únicas (neurociência nelular) à como diferentes áreas do cérebro –
ou sistemas cerebrais complexos, tais como o sistema visual – interagem
(neurociência de sistemas). Neurocientistas estudam uma grande variedade de
espécies, das mais primitivas (caracóis marinhos, moscas de fruta, sanguessugas)
18
às mais complexas (mamíferos e primatas, por exemplo). A neurociência também
difere da pesquisa clínica, mais conhecida como “neurologia”, porque estuda as
respostas de consumo em indivíduos saudáveis. A neurologia, ao contrário,
interessa-se primariamente por desordens do sistema nervoso, traumas, tumores e o
comportamento de pacientes, entre outros (RAMSØY, 2014b).
2.1.1 Neuromarketing e Neurociência do Consumidor
O Neuromarketing é o uso comercial das ferramentas da neurociência para
melhorar insights do consumidor e analisar efeitos mercadológicos. Em outras
palavras: o Neuromarketing refere-se ao interesse comercial e prático em
ferramentas da neurofisiologia, tais como o rastreamento ocular, resposta
eletrodérmica, Eletroencefalografia (EEG), e Imagem por Ressonância Magnética
funcional (IRMf) para conduzir pesquisas de mercado específicas para empresas
(PLASSMAN; RAMSØY; MILOSAVLJEVIC, 2012).
A neurociência do consumidor, por outro lado, refere-se à pesquisa
acadêmica na confluência entre a neurociência e a psicologia do consumidor. É o
exercício acadêmico de utilizar a neurociência para melhor compreender a
psicologia e o comportamento do consumidor. A maioria dos estudos de
neurociência do consumidor foca em processos mentais em seres humanos, embora
alguns poucos analisem respostas em outras classes de animais (PLASSMAN;
RAMSØY; MILOSAVLJEVIC, 2012).
Os estudos da neurociência do consumidor comprovam, por exemplo, que
95% dos pensamentos, sentimentos e aprendizado de uma pessoa ocorrem de
forma inconsciente (ZALTMAN apud DOOLEY, 2012). A pesquisa de mercado
tradicional – grupos focais, questionários, levantamentos, entre outros – é, em
grande parte, pouco confiável, simplesmente porque existe toda uma área de
pensamento e sentimento que permanece fora da consciência e, portanto,
transcende os limites da linguagem.
Dessa forma, a neurociência do consumidor utiliza-se de diversas
ferramentas para obter respostas diretamente do cérebro (ZURAWICKI, 2010). Uma
delas é a Imagem por Ressonância Magnética (IRM), na qual um campo magnético
muito forte, combinado à ondas de rádio, produz sinais que, embora fracos, mostram
detalhes das estruturas cerebrais. Durante o procedimento – que, geralmente, dura
19
cerca de uma hora – o paciente fica deitado em uma cama, com sua cabeça cercada
por um grande magneto que tem o poder de alinhar os prótons (partículas
subatômicas) dentro do cérebro, com o campo magnético. Um pulso de ondas de
rádio é direcionado à cabeça, com o objetivo de desarranjar os prótons que,
gradualmente, voltam para o alinhamento anterior, emitindo ondas de rádio no
processo. Um aparelho monitorador recebe as ondas e, finalmente, constrói uma
imagem do cérebro. Cada parte do cérebro emite sinais de rádio ligeiramente
diferentes, graças, entre outros fatores, à quantidade de água e gordura da área, e,
por isso, o computador consegue distinguir as diferentes estruturas cerebrais
(ZURAWICKI, 2010).
Outra técnica é a Imagem por Ressonância Magnética funcional (IRMf).
Considerada a mais avançada técnica de rastreamento cerebral disponível
atualmente, o rastreamento com Imagem por Ressonância Magnética funcional
(IRMf) é feito por uma máquina de 32 toneladas, do tamanho de um carro, e que
custa US$ 4 mi (LINDSTROM, 2009). Seu conceito é baseado no do scanner de
IRM convencional, mas com melhorias (ZURAWICKI, 2010). O instrumento mede a
quantidade de sangue oxigenado no cérebro, graças às propriedades magnéticas da
hemoglobina, presente nos glóbulos vermelhos. Tudo isso porque o fluxo de sangue
oxigenado aumenta quando uma área específica do cérebro está trabalhando.
(LINDSTROM, 2009). Nos últimos 10 anos, o IRMf se tornou uma técnica bastante
popular para se obter imagens do cérebro.
Já a Eletroencefalografia (EEG) é uma das mais populares tecnologias desta
área, devido, em grande parte, ao seu relativo baixo custo e à facilidade de manejo
dos equipamentos utilizados. A Eletroencefalografia é uma técnica endossada por
uma vasta literatura científica. Funciona medindo, no escalpo, a força de campos
elétricos muito pequenos gerados pela atividade cerebral. A Eletroencefalografia é,
entretanto, um método pouco confiável para se medir a atividade elétrica nas zonas
mais profundas do cérebro (GENCO; POHLMANN; STEIDL, 2013).
Na Magnetoencefalografia (MEG), um capacete com magnetômetros
supercondutores é aplicado ao escalpo do indivíduo para indicar atividade cerebral
(ZURAWICKI, 2010). Desta forma, consegue-se medir mudanças no campo
magnético produzido pelo cérebro, minuto a minuto. Apesar das muitas vantagens, o
MEG requer o uso de um equipamento extremamente caro: os experimentos só
podem ser conduzidos em uma câmara especializada que obstrua a interferência
20
gerada pelo campo magnético terrestre (ZURAWICKI, 2010), entre outras
exigências.
A Topografia de Estado Estável (TEE) é uma técnica que usa uma série de
sensores para medir pequenos sinais elétricos em doze áreas diferentes do cérebro
humano. A TEE mede sinais elétricos várias vezes por segundo, proporcionando um
registro em tempo real da atividade no cérebro (LINDSTROM, 2009).
Outra técnica possível é a da resposta eletrodérmica, que mede os níveis de
suor a partir das pontas dos dedos para mensurar os estímulos ao sistema nervoso
(GENCO; POHLMANN; STEIDL, 2013).
A técnica de rastreamento ocular, por outro lado, consiste em medir o
movimento dos olhos e o aumento das pupilas enquanto observa-se um objeto ou
uma cena. É mais uma das tecnologias empregadas pela neurociência, provendo
indicadores valiosos a respeito do quanto os consumidores podem estar atentos,
atraídos ou interessados. O rastreamento ocular também é muito útil para
complementar pesquisas utilizando outras técnicas (GENCO; POHLMANN; STEIDL,
2013).
A mais financeiramente acessível de todas, a neurociência computacional
baseia-se em um programa de computador chamado “NeuroVision”. O NeuroVision
é um modelo de neurociência nomputacional, cientificamente validado para predizer
os resultados de rastreamento ocular com um rigor médio total de 84%. O
NeuroVision é baseado em um algoritmo proprietário que prevê o que as pessoas
veem automaticamente. Ele funciona da seguinte maneira: ao se deparar com uma
imagem, os itens imediatamente selecionados pelos olhos constituem as chamadas
“saliências visuais”. O NeuroVision procura prever a ocorrência das tais “saliências”.
Este é um método de alta confiabilidade e pode ser utilizado na análise de anúncios
impressos, páginas na Internet, outdoors, o desenho de prateleiras, lojas e assim por
diante. É um sistema automático, armazenado na “nuvem” (cloud-based), e com
uma plataforma online do tipo “faça-você-mesmo” (RAMSØY, 2014c).
As agências de propaganda deste século enfrentam diversos desafios. Entre
eles, a necessidade de melhor compreender o “modo como os consumidores
pensam” e como reagem às mensagens publicitárias, assim como identificar seus
hábitos de compra e consumo. (SAMPAIO, 2013, p. 65). A neurociência do
consumidor parece dispor, portanto, de mecanismos eficientes para auxiliar os
profissionais da publicidade.
21
2.2 Influência Social
A influência social aborda o tema de como e por que as pessoas mudam os
pensamentos, sentimentos e o comportamento de outras através de processos
como a conformidade, a mudança de atitude e a condescendência, apenas para
nomear alguns (PRATKANIS, 2007).
Historicamente, a psicologia social tem sido a principal disciplina interessada
neste assunto (PRATKANIS, 2007). Autores como Aronson, Wilson e Akert (2002, p.
3) defendem, inclusive, que “no próprio âmago da psicologia social está o fenômeno
da influência social: todos nós somos influenciados por outras pessoas.”
A psicologia social refere-se ao estudo científico de como indivíduos pensam,
sentem e se comportam em um contexto social (KASSIN; FEIN; MARKUS, 2008).
DeLamater e Ward (2013) explicam que os interesses dessa disciplina incluem o
impacto de um indivíduo sobre o outro; o impacto de um grupo em seus membros; o
impacto de indivíduos sobre os grupos aos quais pertencem, e o impacto de um
grupo sobre outro. Ferreira (2011) descreve a existência de duas modalidades dessa
disciplina, a psicologia social psicológica e a psicologia social sociológica. “Os
psicólogos sociais da primeira vertente tendem a enfatizar principalmente os
processos intraindividuais, enquanto os da segunda tendem a privilegiar as
coletividades sociais.” (FERREIRA, 2011, p. 13). Entretanto, Cook, Fine e House
(1995 apud DELAMATER; WARD, 2013) defendem que a psicologia social é
interdisciplinar, envolvendo e exigindo uma síntese de trabalhos relevantes
pertencentes às duas disciplinas das quais provêm.
Em 1895, Gustav Le Bon popularizou o conceito de “mente grupal”, e o
quadro teórico por ele proposto serviu de base para pesquisas posteriores sobre
influência no período pré-guerra mundial. Em 1898, Norman Triplett conduziu o
primeiro experimento investigando processos de influência – e até hoje este é o
método de pesquisa favorito dos estudiosos desse tema. De acordo com Pratkanis
(2007), esses dois eventos marcaram o início do estudo científico da influência
social.
Pratkanis descreve que as trágicas consequências da Primeira Guerra
Mundial alimentaram uma crença generalizada entre os indivíduos comuns de que a
propaganda de guerra os havia ludibriado, e os estudos subsequentes ao conflito
22
concentraram-se, entre outros, em documentar esses efeitos suasórios. Métodos
experimentais foram utilizados; procedimentos e técnicas para mensurar atitudes
foram desenvolvidas. Na publicidade mercadológica, aplicou-se a teoria da
aprendizagem com o intuito de tornar os anúncios mais eficientes. Da mesma forma,
a Segunda Guerra Mundial também mudou os rumos das pesquisas. Como parte do
esforço de guerra, acadêmicos como Carl Hovland, Gordon Allport, Irving Janis, Kurt
Lewin, Leo Postman e Leonard Doob debruçaram-se sobre o tema da influência
social. Após a contenda, eles retornaram para suas respectivas universidades e
passaram a estudar fenômenos que estavam no cerne do conflito, tais como a
conformidade, o preconceito, o poder e a obediência à autoridade, entre outros.
Como resultado disso, a partir de 1945 as pesquisas sobre influência social
floresceram, partindo de uma variedade de perspectivas e abrangendo uma
diversidade de tópicos, da mídia de massa à dissonância cognitiva, compondo o
quadro atual e oferecendo um escopo amplo de possibilidades de pesquisa.
2.3 Publicidade e o processo suasório
Sant’Anna, Rocha Júnior e Garcia (2011) explicam que o vocábulo
“publicidade” deriva do latim publicus e designa a qualidade do que é público. De
acordo com Arens e Schaefer (2006, p. 6), “o papel da publicidade é o de promover
– informar, persuadir e lembrar grupos de consumidores, ou mercados, do valor
satisfatório dos produtos e serviços oferecidos pela companhia”. Os autores
ressaltam ainda que anunciar é uma atividade antiga, com arqueólogos tendo
encontrado evidências de mensagens desse tipo em 3.000 a.C., entre os babilônios.
A publicidade evoluiu bastante desde a Antiguidade. Hoje em dia, os
anunciantes contam com as agências de propaganda, empresas especializadas em
produzir publicidade. As primeiras agências apareceram no século XIX, em países
como a Alemanha, Estados Unidos, França e Inglaterra, na forma de um
desdobramento dos serviços de corretor de anúncios e, em princípio, apenas
vendiam espaço em jornais (SANT’ANNA; ROCHA JÚNIOR; GARCIA, 2011).
Atualmente, a estrutura mínima de uma empresa desse tipo requer a existência de
pelo menos três áreas ou setores – atendimento/planejamento, departamento
criativo e mídia – diretamente relacionados às principais etapas do trabalho que
presta (SAMPAIO, 2013):
23
•
Atendimento/Planejamento:
presta
assistência
aos
clientes,
administrando as contas publicitárias dentro da agência;
•
Departamento criativo: cria ideias, para serem transformadas nas
mensagens publicitárias;
•
Mídia: seleciona os veículos (meios) mais adequados para atingir o
público-alvo/target nos momentos mais propícios, buscando a maneira
mais econômica e indicada para cada caso.
Ao conceituarem a publicidade, Arens e Schaefer (2006, p. 4) destacam sua
natureza geralmente persuasiva. Sampaio apresenta uma perspectiva semelhante
ao afirmar que a publicidade visa promover comportamentos em benefício do
anunciante, através de uma abordagem persuasiva (SAMPAIO, 2013, p. 35).
Persuadir parece ser, portanto, parte importante da atividade publicitária.
Como aponta Carrascoza (2004), a palavra “persuadir” contém a raiz latina
svad, a mesma da palavra “suave”. Figueiredo esclarece, em seu texto, que “[...]
persuadir tem mais a ver com concordar com algo que o consumidor já pensa e, por
meio dessa concordância, trazê-lo para o produto que se quer anunciar.”
(FIGUEIREDO, (2005, p. 53). Sobre esse tema, Feinberg e Willer (2015) conduziram
seis estudos online envolvendo 1.322 participantes, e descobriram que o segredo
para persuadir oponentes políticos era argumentar com base em suas crenças e
valores morais.
Da mesma maneira, a publicidade partiria, em sua essência, de um contexto
psicológico preexistente – daí a importância de melhor compreender os processos
mentais internos de um indivíduo. Sant’Anna, Rocha Júnior e Garcia corroboram
essa perspectiva ao defenderem que “a publicidade baseia-se no conhecimento da
natureza humana.” (2011, p. 80). Sobre isso, Figueiredo defende que “processos
publicitários eficientes frequentemente levam mais em conta as crenças do
consumidor do que as características do produto.” (2005, p. 54). Mudar atitudes.
está, portanto, diretamente atrelado a melhor entender o indivíduo a quem se intenta
persuadir. Em outras palavras: influenciar comportamentos só é possível quando os
motivos que conduzem os diversos públicos a agirem da forma como agem alinhamse com a estratégia do persuasor.
24
2.3.1 Mídia Impressa
Arens e Schaefer (2006) afirmam que já na Era Pré-Industrial ocorreram
progressos significativos que propiciaram o nascimento da publicidade moderna,
como a prensa de Gutenberg, inventada na década de 1440.
O surgimento da publicidade profissional está, portanto, diretamente atrelado
à mídia impressa – um termo que refere-se, entre outros, à jornais, revistas, listas
telefônicas e aos veículos da chamada mídia exterior.
O jornal é a segunda mídia mais utilizada pela publicidade no Brasil (a TV é a
primeira), ficando com 8,6% dos investimentos totais (MÍDIA DADOS BRASIL 2015,
2015). Via de regra, dirige-se ao público geral (SAMPAIO, 2013). De acordo com a
Pesquisa Brasileira de Mídia 2015, este é o meio mais confiável, com 58% dos
entrevistados afirmando que confiam muito no que é publicado (BRASIL, 2015). “O
fato de ser diário e, frequentemente, lido com essa regularidade por seus leitores e
anunciantes permite que fale com intimidade ao consumidor.” (FIGUEIREDO, 2005,
p. 90). Figueiredo aponta ainda que um dos fatores negativos mais associados à
publicidade nesse meio é o acabamento gráfico, que pode comprometer a qualidade
do trabalho final.
Revistas representam 4,4% dos investimentos totais da publicidade brasileira
(MÍDIA DADOS BRASIL 2015, 2015) e têm como característica a extrema
seletividade de público consumidor (SAMPAIO, 2013). “[...] por apresentarem perfis
bastante completos de seus consumidores, [as revistas] permitem que as agências
criem peças bem direcionadas para seus públicos-alvo.” (FIGUEIREDO, 2005, p.
95). Elas representam, ao lado dos comerciais televisivos, a fatia nobre da
propaganda, graças, sobretudo, à sua melhor qualidade e durabilidade. A revista
também permite o uso de anúncios sequenciais, com títulos em dois ou três tempos.
Um dos seus pontos negativos é que, por ser uma mídia bastante segmentada, o
impacto gerado também é limitado (FIGUEIREDO, 2005).
Listas telefônicas e guias configuram um gênero de mídia de caráter diretivo –
ou seja, que leva o consumidor, já predisposto a comprar, a procurar um
determinado fornecedor/vendedor. Devido às mudanças tecnológicas e dos hábitos
de compra, está rapidamente migrando para a internet (SAMPAIO, 2013).
Correspondem a 0,4% dos investimentos brasileiros em publicidade (MÍDIA DADOS
BRASIL 2015, 2015).
25
Para Sant’Anna, Rocha Júnior e Garcia (2011), a publicidade ao ar livre difere
substancialmente das demais, por seus anúncios serem percebidos de passagem,
mais ou menos casualmente. O outdoor, por exemplo, precisa ser lido, decodificado
e compreendido pelo consumidor em apenas um olhar. Por isso, Figueiredo (2005)
defende que o redator, ao criar para este meio, precisa ter em mente que a síntese é
o princípio fundamental para um eventual sucesso. “É mais importante ter em mente
que uma frase em ordem direta (sujeito, verbo, complemento) é mais fácil de ser
compreendida. O mesmo vale para o uso de palavras pertencentes ao vocabulário
cotidiano do público-alvo.” Sant’Anna, Rocha Júnior e Garcia (2011, p. 172)
apresentam uma perspectiva concordante ao afirmarem que “o outdoor é um resumo
da síntese.”
De acordo com Figueiredo (2005, p. 103), “atualmente, a mídia outdoor é
utilizada como apoio à propaganda em outros meios e é muito apreciada por suas
características de alto impacto.” O outdoor pode ainda ser utilizado para
complementar uma mensagem publicitária, sustentar uma campanha por meses,
impactar o público com peças mais diferenciadas e dar destaque a um produto ou às
suas partes fundamentais (SANT’ANNA; ROCHA JÚNIOR; GARCIA, 2011).
Outras formas de mídia exterior encontradas atualmente incluem o busdoor
(placas e laterais exteriores de ônibus), o taxidoor (adesivos e adornos em táxis),
placas indicativas de ruas, painéis de metrô/aeroportos e rodoviárias, front-lights
(painéis iluminados com holofotes especiais), painéis eletrônicos e o vídeo wall
(vários monitores de TV acoplados), entre muitos outros. Essa mídia apresenta uma
ampla cobertura e frequência, ficando exposta, em alguns casos, 24 horas por dia
(SANT’ANNA; ROCHA JÚNIOR; GARCIA, 2011). Outdoor, mobiliário urbano, móvel,
painel e eletrônicos representam 4,0% dos investimentos em mídia no Brasil (MÍDIA
DADOS BRASIL 2015, 2015).
2.4 O cérebro e processos automáticos
“Há uma certa lógica em supor-se que uma entidade que compreende seja
mais complexa que o objeto a ser compreendido. Pode-se argumentar que
todas as abstrusas facetas da matemática moderna e da física sejam
apenas reflexos das facetas do universo físico que devem ser mais simples
em estrutura que a mente humana.” (ASIMOV, 2002, p. 320).
26
Estudar de que forma o sistema nervoso central (SNC) origina e controla o
comportamento pode ser útil para um melhor entendimento da estrutura por trás das
mensagens publicitárias mais persuasivas e, portanto, contribuir para o processo de
desenvolvimento criativo das campanhas. Este é um trabalho árduo: a complexidade
da mente tentando decifrar a si mesma “é o maior dos desafios para a inteligência
humana.” (ASIMOV, 2002, p. 320). A persistência ao pesquisar este tema, porém,
tem recompensado os acadêmicos: em 2015, cientistas obtiveram êxito ao projetar,
em laboratório, um cérebro a partir de células da pele de seres humanos adultos – o
primeiro desse tipo (CALDWELL, 2015).
Na raça humana, a base para a capacidade de perceber, adaptar-se e
interagir com o ambiente ao redor provem do sistema nervoso central. O sistema
nervoso central é constituído pelo cérebro e a medula espinhal, ambos cobertos por
ossos; o cérebro está protegido pelo crânio e a medula espinhal está envolvida pela
coluna vertebral. A medula espinhal é um feixe aproximadamente cilíndrico de fibras
neurais e reúne uma série de células nervosas que se estendem do cérebro até o
centro das costas (STERNBERG, 2000).
Fig. 1 – O cérebro humano
1
Fonte: The Human Brain Info
O cérebro está situado no topo da hierarquia corporal e controla mais
diretamente os processos de pensamento e os músculos. Segundo Carlson (2002),
o cérebro humano adulto possui aproximadamente um quilo e quatrocentos gramas,
cerca de 2% do peso total do corpo, embora seu peso líquido seja reduzido a quase
80 gramas quando mergulhado no fluido cerebrospinal. O cérebro é formado,
1
Disponível em: <http://www.thehumanbrain.info/other_brains/development.php> Acesso em: 30 out.
2015.
27
essencialmente, por dois tipos de células: os neurônios – que constituem cerca de
metade do volume do SNC, responsáveis por processar e transmitir dados –, e as
neuroglias – ou “colas neurais”, que circundam os neurônios e mantém o SNC coeso
(CARLSON, 2002). O cérebro recebe continuamente um grande fornecimento de
sangue – quase 20% do que é bombeado – e está quimicamente vedado pela
barreira hematoencefálica – uma rede de finos vasos sanguíneos que filtra a maior
parte das substâncias e microrganismos nocivos (STERNBERG, 2000).
Os sentidos funcionam como receptores e informam ao cérebro o que
acontece no ambiente ao redor. O cérebro interpreta esses estímulos externos e
produz respostas químicas e físicas que se convertem em pensamentos e
comportamentos (ZURAWICKI, 2010).
Todos os dias, o cérebro do consumidor é exposto, através dos sentidos, a
uma quantidade gigantesca de dados: aproximadamente 10.000.000 de bits por
segundo – incluindo aí os 86.500 comerciais de TV anuais (RIES, A.; RIES, L.,
2002). “Você e eu existimos em um ambiente de estímulos extraordinariamente
complicados, facilmente o mais móvel e complexo que já existiu neste planeta.”
(CIALDINI, 2006, p. 6). Apesar disso, a capacidade de processamento do cérebro é
limitada: apenas 50 bits, de acordo com Wilson (2002 apud PLASSMAN; RAMSØY;
MILOSAVLJEVIC, 2012). O ser humano é um animal predominantemente visual e,
por isso, os olhos acabam sendo responsáveis por receber grande parte desses
estímulos (KOCH, 2004 apud PLASSMAN; RAMSØY; MILOSAVLJEVIC, 2012). Um
quarto do volume do cérebro é, portanto, destinado ao processamento de imagens
visuais – mais do que qualquer outro sentido (ZURAWICKI, 2010). Como visto, a
mente lida com dados de forma muito distinta: estima-se que a capacidade de
armazenamento da memória cerebral é de aproximadamente 2.5 petabytes2 – o
equivalente a 300 anos de conteúdo televisivo (REBER, 2010).
A energia usada para processar todos esses dados – e manter o restante do
cérebro funcionando – chega através dos vasos sanguíneos, na forma de glicose, e
é consumida vorazmente. Isso porque, para funcionar, o cérebro necessita de uma
grande quantidade dela: de acordo com Jabr (2012), o cérebro gasta 20% da Taxa
Metabólica Basal3, o equivalente a 260 calorias por dia, aproximadamente 12 watts.
É – expressivamente – mais do que qualquer outra parte do corpo recebe.
2
3
15
Um petabyte (PB) equivale a 10 bytes, ou 1.000.000 de gigabytes (GB).
A quantidade de energia consumida pelo corpo em um dia de repouso.
28
Em termos energéticos, estar consciente é uma atividade custosa – um
processo fatigante per se. Desse modo, o cérebro estará sempre atento à
quantidade de energia gasta nela (RAMSØY, 2014a). Com o objetivo de liberar força
mental para atividades mais importantes, sempre que houver oportunidade, e o mais
rápido possível, o cérebro se tornará inconsciente e passará a utilizar o “piloto
automático”, ou seja, processos automáticos que funcionam como “atalhos”. O
“piloto automático” é rápido, efetivo, exige pouco esforço e serve para resolver
problemas específicos, de baixa flexibilidade, como pedalar uma bicicleta, dirigir um
carro ou estar com um amigo próximo (RAMSØY, 2014a). De acordo com Lindstrom
(2009), o cérebro está no “piloto automático” em 85% dos casos.
Cialdini (2006) explica que um comportamento mecânico e estereotipado
prevalece quase sempre porque é a forma mais eficiente de comportamento. O
“piloto automático” é simplesmente necessário. O autor afirma que a mente precisa
de atalhos para lidar com a complexidade e a variedade de estímulos que recebe.
Ele esclarece que reconhecer e analisar todos os aspectos de pessoas, eventos e
circunstâncias exigiria uma quantidade de tempo, energia e capacidade que nenhum
ser humano possui:
“Ao invés disso, precisamos, muito frequentemente, usar nossos
estereótipos e regras de bolso para classificar coisas de acordo com
algumas poucas características-chave, e responder sem pensar quando
uma ou outra dessas características-gatilho estiver presente.” (CIALDINI,
2006, p. 6)
O uso de comportamentos automáticos, “atalhos”, é necessário para que o
cérebro consiga lidar com a quantidade de dados que recebe diariamente, a cada
segundo. Damásio (apud LINDSTROM, 2009) refere-se a esses atalhos cognitivos
como “marcadores somáticos” e explica que eles se baseiam em experiências
passadas de recompensa e castigo – uma espécie de lembrete do cérebro,
ajudando a reduzir de forma instantânea as possibilidades disponíveis em um
determinado cenário, na tentativa de gerar o melhor resultado – ou o menos
doloroso.
O vencedor do Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel
Daniel Kahneman (2012) elucida, didaticamente, que existem dois sistemas na
mente: o Sistema 1 e o Sistema 2, ambos fictícios: nenhum deles existe de fato no
cérebro ou em qualquer outra parte e os dois servem apenas como uma forma
29
simples de se referir a dois diferentes processos mentais. O Sistema 1, portanto,
descreve “procedimentos operacionais padronizados” (KAHNEMAN, 2012, p. 65).
Ele age de forma mecânica, rápida e sem controle voluntário. Seus eventos mentais
“ocorrem automaticamente e exigem pouco ou nenhum esforço.” (KAHNEMAN,
2012, p. 30). O Sistema 2, por outro lado, é consciente, raciocinador, e responsável
por atividades mentais laboriosas, como a busca deliberada de memória, cálculos
complexos, planejamento e escolha. A grosso modo, o Sistema 2 refere-se ao “eu”
lógico e racional.
O Sistema 1 – foco deste estudo - “monitora continuamente o que está
acontecendo fora e dentro da mente” (KAHNEMAN, 2012, p. 116) e avalia, a todo
instante, os principais problemas que um organismo precisa resolver para sua
sobrevivência: Como andam as coisas? Existe alguma ameaça ou grande
oportunidade? Tudo está normal? Deve-se aproximar ou evitar?
Kahneman (2012, p. 30) exemplifica algumas das atividades automáticas
atribuídas ao Sistema 1, em ordem aproximada de complexidade:
•
Detectar que um objeto está mais distante que outro;
•
Identificar hostilidade em uma voz;
•
Responder 2 + 2 = ?;
•
Ler palavras em cartazes grandes;
•
Dirigir um carro por uma rua vazia,
•
Compreender sentenças simples, entre muitos outros.
O Sistema 1 distingue o surpreendente do normal; infere e inventa causas;
negligencia ambiguidade e suprime dúvida; é propenso a acreditar e confirmar;
exagera consistência emocional (efeito halo); foca na evidência existente e ignora a
evidência ausente; equipara intensidades entre escalas; dá peso excessivo a
probabilidades baixas, entre outros (KAHNEMAN, 2012). Kahneman (2012, p. 34)
frisa que: “O Sistema 1 tem vieses, porém, erros sistemáticos que ele tende a
cometer em circunstâncias específicas.”
Do ponto de vista psicológico, parece ser possível utilizar os erros
sistemáticos do cérebro, as “brechas” do Sistema 1, como um meio de guiar a mente
por um caminho decisório específico. Petty e Cacioppo (apud PRATKANIS;
ARONSON, 2002, p. 35) defendem que existem dois caminhos para se persuadir
uma pessoa – o central e o periférico. Na rota central, o receptor da mensagem
30
analisa
cuidadosamente
os
verdadeiros
méritos
do
que
é
apresentado,
argumentando contra ou procurando respostas para questionamentos adicionais, por
exemplo. Na rota periférica, o receptor destina pouco esforço ao processamento da
mensagem, e baseia-se em pistas simples para ser persuadido, como a atratividade
do comunicador ou a concordância das pessoas ao redor – ou seja, o Sistema 1 da
mente. Carrascoza (2004) compartilha desse pensamento ao afirmar que o texto
publicitário transita entre dois cânones ou pólos, o apolíneo e o dionisíaco (ele
utiliza-se de uma terminologia estabelecida pelo filósofo Friedrich Nietzsche). O
autor explica que, no apolíneo, destacam-se os elementos racionais, enquanto o
dionisíaco é dominado por procedimentos que visam explorar aspectos emocionais.
Em muitos casos, o cérebro interpreta de forma instintiva aspectos relevantes
da realidade – e a próprio pensamento racional baseia-se nesses conceitos. Aí
surgem as vulnerabilidades cognitivas que, se aproveitadas, podem favorecer o
consumo de forma sensível, entre outras finalidades.
Um anúncio cuja premissa básica é um viés cognitivo pode aumentar de
forma relevante seu poder de influência entre os consumidores. No que diz respeito
a esse aspecto, especificamente, Cialdini (2006) possui estudos que podem ser
úteis à esta análise.
2.4.1 Vieses cognitivos (erros sistemáticos)
Vieses cognitivos referem-se à instâncias situacionais de desvio no
julgamento, geralmente decorrentes de um estímulo (NARAYANASWAMI, 2011), e
podem ser desencadeados por uma variedade de motivos. Suas origens podem ser
traçadas até um comportamento mental que evoluiu para decidir como reagir a
novos cenários e contextos da forma mais rápida possível. No entanto, esses vieses
também podem ser manipulados por estímulos artificiais para induzir determinadas
respostas no público-alvo.
O cérebro, portanto, comete certos erros de forma sistemática, como
explicam Ariely (2008) e Kahneman (2012). Ariely é um estudioso da Economia
Comportamental (ou “discernimento e processo decisório”), uma disciplina que
busca compreender como as pessoas escolhem em contextos reais.
Para Ariely, nem mesmo uma vasta experiência parece corrigir esses erros de
pensamento, e Stanovich (apud Kahneman, 2012) argumenta que até inteligências
31
elevadas têm vieses. “Você sabe muito menos sobre si mesmo do que sente saber.”
(KAHNEMAN, 2012, p. 68).
Existem, portanto, diversos erros mentais que determinam o comportamento
humano, guiando atitudes e escolhas. De acordo com Ariely (2008), por exemplo, o
cérebro está programado para comparar coisas continuamente e decide-se com
base em contextos. Avaliar as alternativas ao redor determina, portanto, as escolhas
subsequentes. É possível, inclusive, aproveitar-se desse mecanismo automático
para obter-se vantagens práticas. A pesquisa demonstrou, por exemplo, que diante
de três alternativas, a maioria das pessoas escolherá a do meio – por isso
recomenda-se colocar aí o produto que intenta-se vender; e, em restaurantes, os
consumidores tendem a pedir o segundo prato mais caro – o que pode ser
convenientemente utilizado para gerar uma alta margem de lucro. Contudo, a
verdade é que vieses cognitivos permeiam praticamente todos os aspectos da vida
humana – modificando a forma como a realidade é decodificada.
Ariely (2008) explana que a escalada em praticamente qualquer conflito – do
israelo-palestiniano ao servo-croata – pode ser explicada por processos enviesados.
Nestes casos, indivíduos de ambos os lados têm acesso aos mesmos livros de
história e aos mesmos fatos, e, ainda assim, interpretam a realidade de forma
inteiramente diferente.
Partem de Kahneman (2012) diversas descobertas a respeito de vieses
cognitivos. O autor afirma que o Sistema 1 enxerga o mundo como sendo mais
coerente, previsível e simples do que ele realmente é e, por isso, “acreditamos
compreender o passado, o que implica que o futuro também deva ser conhecível,
mas na verdade compreendemos o passado menos do que acreditamos
compreender.” (KAHNEMAN, 2012, p. 252). Esse fenômeno leva as pessoas a
subestimar em que medida foram surpreendidas por eventos passados, dando
origem ao “viés retrospectivo” – ou efeito “eu-sempre-soube” – a tendência de
revisar o histórico de crenças pessoal à luz do que realmente aconteceu, um viés
particularmente cruel para todos os que precisam assumir riscos - assistentes
sociais, CEOs, consultores financeiros, diplomatas, médicos e políticos, entre vários
outros. Para Kahneman (2012), quanto piores as consequências, maior o viés
retrospectivo.
Kahneman também estudou de que forma vieses geram uma miragem de
habilidade, e cita o exemplo da Bolsa de Valores. “Você deve esperar pouco ou
32
nada de consultores de investimentos de Wall Street que imaginam ser mais
precisos que o mercado em prever o futuro dos preços.” (KAHNEMAN, 2012, p.
276).
O “viés confirmatório” é um dos mais onipresentes e explica, entre outros, o
grande sucesso de teorias conspiratórias (FRENCH apud BUCKLEY, 2015). Existe
no ser humano uma tendência natural a dar mais peso às evidências que sustentam
suas crenças anteriores, e ignorar as que as contradizem. Com frequência, os
eventos que tornam-se o cerne de teorias conspiratórias tendem a ser
intrinsicamente
complexos
e
obscuros,
e
relatos
iniciais
podem
conter
ambiguidades, contrassensos ou mesmo erros, aos quais os conspiracionistas
tendem a se ater, de modo a validar seus argumentos.
Há uma série de outros vieses cognitivos que explicam a atratividade de
teorias conspiratórias, como o “viés de proporcionalidade”, ou seja, a tendência que
as pessoas apresentam de acreditar que grandes eventos possuem causas
igualmente grandes. Esse viés esclarece, por exemplo, o porquê de tantas pessoas
acreditarem que um complô de larga escala assassinou, nos anos 60, o Presidente
norte-americano John F. Kennedy – ao invés de um perturbado atirador solitário.
2.5 Os seis princípios psicológicos de Influência Social
Iglesias e Damasceno (2013) explicam que, no início da década de 1970,
tomando como ponto de partida um programa de pesquisas sobre fenômenos de
conformidade e aquiescência, Cialdini passou a testar em campo e em laboratório
alguns procedimentos característicos da área de vendas que a psicologia social
ainda estava por investigar sistematicamente.
Valendo-se “tanto do arcabouço teórico-conceitual da psicologia social quanto
de sua experiência de pesquisa participante em campo, trabalhando disfarçado de
vendedor de vários produtos e serviços” (IGLESIAS; DAMASCENO, 2013), Cialdini
agrupou os resultados de centenas de pesquisas na área de Influência Social em
seis tendências básicas de comportamento humano (atalhos/vieses cognitivos) que
aumentam consideravelmente as chances de uma resposta positiva a um pedido.
Para Pratkanis (2007), o livro no qual ele descreve esses seis princípios é um dos
mais importantes da psicologia social. Os princípios universais por ele identificados
configuram um quadro teórico que fornece, há quase 30 anos, a base para muitos
33
estudos de comportamento do consumidor (IGLESIAS; DAMASCENO, 2013). Com o
passar dos anos, sua linha de pesquisa expandiu-se para englobar a influência
normativa, comportamentos pró-ambientais, o consumo online na internet, entre
outros. Os seis princípios podem ser resumidos da seguinte maneira (GOLDSTEIN;
MARTIN; CIALDINI, 2010):
•
Reciprocidade (as pessoas sentem-se obrigadas a devolverem
favores);
•
Comprometimento/Consistência (há um desejo obsessivo em agir-se
consistentemente com comprometimentos e valores prévios);
•
Prova Social (as pessoas guiam-se pelo comportamento dos outros ao
seu redor);
•
Empatia (gostar aumenta as chances de consentir);
•
Autoridade (especialistas mostram o caminho);
•
Raridade (um recurso menos disponível é mais desejado).
•
Há uma certa hierarquia conceitual que apresenta princípios como sendo de
mais
alta
ordem
que
estratégias,
e,
abaixo
dessas,
táticas
(IGLESIAS;
DAMASCENO, 2013). É vital recomendar o trabalho de Pratkanis (2007), que
compilou, com detalhes instrutivos, 107 diferentes táticas experimentalmente
testadas de Influência Social, cujo conhecimento pode vir a complementar,
enriquecer e dar mais profundidade a este tema. Da mesma forma, Guéguen (2010)
reuniu em sua obra estudos sobre o poder de cheiros, cores, músicas e palavras,
entre outros, sobre o comportamento do consumidor.
A seguir, explicitam-se, com mais pormenores, todos os seis princípios, assim
como suas características.
2.5.1 Reciprocidade
De acordo com Cialdini (2006), a regra da reciprocidade é uma das mais
potentes armas de influência. Esse princípio psicológico fundamental determina que
um favor deve ser sempre devolvido, e em termos mais ou menos iguais. Ou seja:
ao ser auxiliado por um benefício, urge-se corresponder com um igual; ao receber-
34
se um presente, deve-se enviar outro em retorno. Em outras palavras, o princípio de
reciprocidade “descreve uma espécie de norma social generalizada de que é
adequado e esperado retribuir um favor recebido, seja de conhecidos ou de
estranhos.” (IGLESIAS; DAMASCENO, 2013). É-se obrigados a dar, a receber, e a
pagar de volta (MAUSS apud CIALDINI, 2006).
Aparentemente, todas as sociedades humanas parecem respeitar o princípio
da reciprocidade (GOULDNER apud CIALDINI, 2006): no decorrer de sua história
evolucionária, um forte e amplamente compartilhado sentimento de compromisso e
dever futuros tornou possível aos indivíduos darem, com a confiança de que
receberiam de volta, criando, assim, uma rede de dívidas baseada em honra: um
mecanismo adaptativo particular dos seres humanos, que permitiu a troca dos mais
diferentes bens e serviços, e o desenvolvimento de uma aglomerado de
interdependência que “costurou” indivíduos em unidades altamente eficientes. A
regra da reciprocidade está profundamente entranhada no convívio humano, e seus
membros devem ser treinados, desde a mais tenra idade, para aquiescer, acreditar e
viver de acordo com seus preceitos, como um requisito para a vida em sociedade.
Axelrod (2006 apud IGLESIAS; DAMASCENO, 2013) esclarece, inclusive, que
algumas culturas adotam protocolos rigorosos para punir os transgressores dessa
norma. Pinker (2013) sugere que uma maior quantidade de redes de reciprocidade
reduziu o uso da violência entre os seres humanos – inferindo-se que o interesse
prevalece sobre a moralidade. Ele explica que o comércio, por exemplo, tornou os
outros seres humanos mais úteis vivos. Cialdini (2006) elucida também que a
reciprocidade é uma regra de grande poder social, cuja força deixa marcas visíveis,
inclusive, na linguagem. A palavra “obrigado”, por exemplo, utilizada para expressar
agradecimento, é um sinônimo para “coagido” e “forçado” em diversos idiomas. O
receptor do benefício é, portanto, socialmente compelido a retribuir.
A regra da reciprocidade pode ser explorada por qualquer um que conheça
seu poder, de políticos a vendedores profissionais. Cialdini (2006) exemplifica
diversos usos práticos desse princípio: mulheres frequentemente comentam a
respeito do difícil sentimento de precisar retribuir um favor a um homem que
presenteou-lhe com um objeto caro ou pagou por um jantar suntuoso. A
aparentemente ingênua técnica da amostra grátis é outra forma de aplicar esse
conhecimento, ativando o impulso automático de retribuir.
35
A reciprocidade governa os processos de compromisso. Existem, portanto,
diversas técnicas simples que utilizam como base esse princípio. Burger (1986 apud
GUÉGUEN, 2010) demonstrou que levar o cliente a acreditar que o vendedor lhe
deu um desconto “pessoal” ativava o mecanismo de reciprocidade, induzindo os
consumidores a comprarem. Em um experimento, Regan (apud GOLDSTEIN;
MARTIN; CIALDINI, 2010) constatou que pessoas que recebiam um pequeno e
inesperado presente de um estranho (uma lata de Coca-Cola, mais especificamente)
compravam duas vezes mais bilhetes de rifa dele do que as que deixaram de
receber o presente. Uma pesquisa conduzida por Strohmetz (apud GOLDSTEIN;
MARTIN; CIALDINI, 2010) em um restaurante revela o valor que presentes
significativos, inesperados e personalizados têm na influência. Strohmetz dirigiu um
experimento para determinar que efeito dar um pequeno doce aos clientes, no final
de um almoço ou jantar, surtiria nas gorjetas. No primeiro teste, os doces (um para
cada pessoa à mesa) foram entregues juntos com a conta – e isso causou um
aumento pouco expressivo de 3.3%. No segundo teste, os garçons deram dois
doces para cada pessoa à mesa. As gorjetas mais que quadruplicaram, o que é
coerente com o princípio de que quanto mais se dá, mais se recebe de volta. No
terceiro teste, os garçons deram um doce para cada pessoa e se afastaram da
mesa, como se estivessem indo embora. Entretanto, antes de deixarem a área por
completo, eles se voltavam novamente para a mesa, retiravam mais doces dos
bolsos e os entregavam aos clientes – e esse simples gesto causou um aumento
relevante de 23% nas gorjetas.
2.5.2 Comprometimento e Consistência
O princípio psicológico da consistência descreve o anseio praticamente
obsessivo que as pessoas apresentam de serem (e parecerem) coerentes com seus
comportamentos anteriores (CIALDINI, 2006). Em outras palavras: ao decidir-se ou
posicionar-se, o indivíduo é pressionado – a nível pessoal e interpessoal – a agir de
forma compatível com esse comprometimento inicial, e suas respostas precisam,
necessariamente, justificar e respeitar as escolhas feitas previamente. O princípio da
consistência está relacionado à teorias fundamentais da psicologia social, como a
dissonância cognitiva (FESTINGER, 1957 apud IGLESIAS; DAMASCENO, 2013).
36
De acordo com Kiesler, um teórico do comprometimento, o indivíduo age de
acordo com essa retórica comportamental
“porque intimamente pensa que esse ato corresponde àquilo que ele busca,
que está ligado à sua personalidade, com aquilo que intimamente ele deseja
realizar.
O
comportamento
nos
ajuda
a
justificar
por
que
nos
comportamentos de tal maneira.” (KIESLER, 1971 apud GUÉGUEN, 2010,
p. 196-197).
Para Cialdini (2006), o desejo pela consistência é um motivador central no
comportamento humano. Isso explica porque a tendência à atitudes congruentes é,
portanto, forte a ponto de ser utilizada como uma das mais contundentes estratégias
de influência social. A necessidade de ser consistente – e de aparentar tal
característica – constituem mecanismos altamente eficientes para conduzirem
pessoas a agirem de forma claramente contrária aos seus próprios interesses.
O autor explica que há um porquê para isso. Na maioria das circunstâncias, a
consistência é adaptável e muito apreciada. Sua ausência confere traços detestáveis
à personalidade. Uma pessoa cujos atos, crenças ou palavras pareçam
contraditórios ou discrepantes será comumente rotulada como sendo confusa,
duvidosa ou mentalmente instável. Por outro lado, um alto grau de consistência é
comumente associado à força, pessoal e intelectual, uma parte essencial da
estabilidade, da lógica, da honestidade e da racionalidade.
A consistência pessoal é, assim, profundamente valorizada pela cultura, e
funciona como uma bússola útil, vantajosa e verossímil para o convívio em
sociedade. A consistência, de maneira geral, representa sempre o melhor interesse
para os indivíduos.
Entretanto, cair no hábito de ser automaticamente consistente pode ser
desastroso (CIALDINI, 2006). Como outras formas de resposta espontânea e
mecânica, a consistência funciona como um “atalho” cognitivo através da densidade
da vida moderna. Consistência cega dá aos indivíduos a oportunidade de lidar de
forma mais conveniente, fácil e hábil com os ambientes complexos e a torrente de
fatos relevantes com os quais se deparam diariamente – tudo isso sem a
necessidade de despender energia mental para pesar prós e contras ou avaliar com
cuidado alternativas complicadas.
37
Pesquisas mostram que é possível aplicar esse princípio no cotidiano.
Freedman e Fraser (1966 apud GUÉGUEN, 2010) estudaram de maneira científica a
técnica do “pé na porta”, em que um pedido menor antecedia um pedido mais
custoso e significativo, constatando que aceitar o primeiro predispunha os sujeitos a
concordarem com o segundo.
A técnica do “pé na boca”, descrita por Howard (1990 apud GUÉGUEN,
2010), afirma que o simples ato de responder favoravelmente a frases rituais do tipo
“como vai o senhor?” pressionou os interpelados a adotar um comportamento
condizente com a resposta.
Para Cialdini (2006), uma das mais ilustrativas histórias a respeito do uso
desse princípio aconteceu em um campo para prisioneiros, durante a Guerra da
Coréia. Ao invés de ataques físicos, os comunistas chineses, que controlavam o
campo, optavam por empregar uma sofisticada abordagem psicológica para sujeitar
e submeter os soldados norte-americanos capturados. A princípio, eles geralmente
solicitavam aos prisioneiros que emitissem frases muito simples contra os EUA e a
favor do comunismo. Assim que um desses pedidos prosaicos era atendido, pedidos
mais substanciais eram feitos. Por exemplo, um homem que concordasse com o
interrogador chinês que os Estados Unidos possuíam problemas poderia ser
convidado a dar exemplos. Esses exemplos deveriam ser compilados em uma lista
pelo próprio soldado, ao final da qual ele deveria assinar seu nome. Depois, o
soldado poderia ser convocado a ler sua lista para um grupo de outros prisioneiros.
Posteriormente, poderiam requisitar que ele escrevesse um texto discutindo esses
problemas em detalhes. Por fim, era comum que os chineses utilizassem seu nome
e seu texto em uma rádio de propaganda antiamericana, transmitindo suas palavras
dentro e fora do campo, para as forças norte-americanas posicionadas na Coréia do
Sul. Repentinamente, o soldado se veria como um “colaborador”, tendo ajudado o
inimigo. Para o autor, os resultados dessa técnica de lavagem cerebral eram
espantosos: ciente de que havia escrito o texto sem qualquer ameaça séria ou
violência, o homem poderia, em muitos casos, mudar sua imagem pessoal para ser
condizente com a de um colaborador – o que, frequentemente, resultava em atos
muito mais concretos de auxílio ao inimigo, como o desvendamento de segredos
militares ou a denúncia a um compatriota. “De fato, diz-se que quase todos os
prisioneiros norte-americanos em campos chineses colaboraram com o inimigo de
uma forma ou de outra.” (CIALDINI, 2006, p. 70). Os comunistas chineses
38
compreendiam que as pessoas utilizam, primariamente, seu próprio comportamento
como uma forma de determinar suas crenças e valores – e que comprometimentos
públicos tendem a ser comprometimentos duradouros – daí a efetividade de seu
método.
Baseando-se
em
técnicas
fundamentadas
na
chamada
“teoria
do
comprometimento”, Pascual e Guéguen (2002 apud GUÉGUEN, 2010) conduziram
uma série de experiências que demonstraram a força que referências semânticas à
liberdade podem ter sobre o comportamento. O simples uso da frase “você é livre
para aceitar ou recusar, mas...” antes de um pedido aumentou de maneira sensível
as chances de consentimento por parte da pessoa interpelada.
Conclui-se, assim, que o princípio da consistência é, portanto, uma
ferramenta psicológica útil a qualquer um interessado em modificar atitudes, tendo
sido aplicada, com sucesso, a uma variedade de contextos.
2.5.3 Prova Social/Consenso
De acordo com o princípio da prova social, “observar o comportamento do
outro serve para explicar o mundo circundante, interpretar os acontecimentos ou
formar um julgamento.” (GUÉGUEN, 2010, p. 248). Um comportamento é, portanto,
considerado “mais apropriado” na medida em que outras pessoas ajam da mesma
maneira, especialmente quando os indivíduos utilizados como ponto de referência
assemelham-se ao observador (CIALDINI, 2006).
Como os outros vieses cognitivos, a prova social oferece um “atalho”
conveniente que determina como as pessoas devem se comportar no dia-a-dia.
Cialdini (2006) esclarece que o princípio da prova social, como uma regra, é, na
maior parte dos casos, benéfico: as pessoas cometem menos erros ao agir de
acordo com a evidência social do que quando optam por contrariá-la. Entretanto, ao
mesmo tempo, guiar-se pelo comportamento dos outros ao seu redor acaba
tornando os usuários dessa resposta mecânica suscetíveis e vulneráveis aos
ataques de aproveitadores: pessoas que tiram proveito da preferência humana por
atalhos cognitivos e da tendência a reagir-se automaticamente com base em
evidência parcial.
O ser humano é um animal gregário e, por isso, utilizar o comportamento dos
outros como modelo é cômodo e instintivo (CIALDINI, 2006). O princípio da prova
39
social é, portanto, aplicado aos mais diferentes contextos, guiando a forma como as
pessoas devem comportar-se: de dirigir em alta velocidade por uma via até como
comer um determinado prato em um jantar.
O princípio da prova social é poderoso e largamente utilizado em diversos
campos. A pesquisa de Nosanchuck e Lightstone (1974 apud GUÉGUEN, 2010)
mostrou que executivos de TV, por exemplo, exploram esse princípio ao utilizarem o
som artificial de um público rindo, a “risada enlatada”, para estimular os
telespectadores a rir. Para Cialdini (2006), é alarmante observar que o simples som
de pessoas gargalhando funcione como a própria essência do humor – instigando as
pessoas a rirem quando nenhum motivo verdadeiro realmente existe.
Várias pesquisas foram conduzidas sobre o tema. Ching Biu Tse, Sin e Yim
(2002 apud GUÉGUEN, 2010), mostraram que fotografias de um restaurante lotado
resultaram em um julgamento mais positivo do mesmo; e Guéguen (2007 apud
GUÉGUEN, 2010) demonstrou que pessoas oferecem mais favoravelmente
donativos em uma padaria se quem as precedeu também doou.
Em publicidade, anunciar que um produto é “o mais vendido” funciona como
uma forma direta de utilizar o princípio da prova social para persuadir o público a
comprá-lo. O mesmo princípio psicológico de influência social está, em grande parte,
por trás de diversas formas de religiosismo e culto à personalidade (CIALDINI, 2006,
p. 152). Em sua pesquisa, Phillips (apud CIALDINI, 2006) expôs que suicídios
ostensivamente cobertos pela mídia (como o de celebridades), causavam um
aumento significativo nos índices de suicídio nas semanas posteriores ao fato. E
para exemplificar o poder desse princípio, Cialdini (2006) descreve, inclusive, casos
de crianças que apresentavam ataques de pânico quando na presença de cachorros
– curadas ao assistirem a outras crianças brincando com esses animais – em muitos
casos, em meros videoclipes.
O escritor de televendas Colleen Szot aumentou consideravelmente o número
de produtos comprados em seu programa de TV ao mudar, de modo singelo, sua
chamada. Ele substituiu o tradicional apelo “Operadores à espera, por favor, ligue
agora!” por “Se os operadores estiverem ocupados, por favor, ligue de novo!”. A
segunda frase refere-se a linhas congestionadas, o que insere a ideia de outros
telespectadores assistindo e ligando – a prova social aplicada (GOLDSTEIN;
MARTIN; CIALDINI, 2010). O princípio da prova social está embasado em processos
de conformidade tidos como universais, porém Bond e Smith (1996 apud IGLESIAS;
40
DAMASCENO, 2013) afirmam que eles podem ser mais fortes em culturas
coletivistas, como a do Brasil.
2.5.4 Empatia
Como regra, prefere-se dizer “sim” a um pedido feito por alguém conhecido e
gostado (CIALDINI, 2006). O calor, a segurança e a simpatia da amizade funcionam
como um instrumento poderoso de influência. Em muitos casos, simplesmente
mencionar o nome de um amigo é mais do que o suficiente para ativar o
consentimento: esse é o caso de vendedores de porta-em-porta que apresentam-se
informando que foram indicados por um amigo da pessoa prospectada.
Há uma série de fatores que levam uma pessoa a ganhar a empatia de
outras: a beleza é uma delas, e seu alcance e grandeza têm surpreendido os
cientistas sociais. Cialdini (2006) explana que a atratividade física dispara uma
resposta automática conhecida como “efeito halo”, em que uma característica
positiva domina a maneira com que uma pessoa é vista pelas outras. Guéguen
(2010) aponta que, para alguns pesquisadores, certas características morfológicas
seriam mais comumente apreciadas, principalmente as que aparentassem ser mais
perfeitamente resultantes do processo evolutivo. Pesquisas comprovam que
comumente atribui-se traços favoráveis – tais como benevolência, honestidade,
inteligência e talento – à pessoas esbeltas (REINGEN; KERNAN, 1993 apud
GUÉGUEN, 2010). Há um favoritismo evidente no que diz respeito a políticos e réus
bonitos, assim como a candidatos à vagas de empregos.
A similaridade – de ideias, traços de personalidade, experiências ou estilos de
vida – é outro fator extremamente poderoso para o convencimento (CIALDINI,
2006). Semelhança pode ser demonstrada em uma variedade de formas e, por mais
triviais que possam parecer – como ter a mesma idade ou o mesmo hábito de fumar
– todas parecem aumentar as chances de uma resposta positiva a um pedido.
Diversas peças publicitárias utilizam-se desse conceito: “Se o homem tende a
procurar apoio em pessoas iguais a si mesmo, uma peça publicitária em cujo
discurso se encontrar uma visão do mundo similar àquela manifestada pelo
consumidor será agradável aos seus olhos e ao seu coração.” (FIGUEIREDO, 2005,
p. 59).
41
Elogios constituem outro fator de grande importância para gerar empatia
(CIALDINI, 2006). Declarar afinidade por outra pessoa provoca respostas
automaticamente positivas – mesmo quando o enaltecimento soa claramente falso.
Estudos sobre priming4 semântico conduzidos por Bargh, Chen e Burrows (1996
apud GUÉGUEN, 2010, p. 48) explicam que “um indivíduo iniciado com palavras
ligadas à cortesia tem menos probabilidades de ser grosseiro e de interromper o
outro.”
A familiaridade é outro fator que afeta a empatia (CIALDINI, 2006). A
evidência comprova, portanto, que contato prévio engendra favorecimento. Os
estudos de Kahneman (2012) explicam que a familiaridade é dificilmente distinguível
da verdade. “Se a resposta me parecesse familiar, eu presumia que provavelmente
era verdadeira.” (KAHNEMAN, 2012, p. 82). O que reforça resultados obtidos por
estudos como o do mere-exposure effect de Zajonc: “o simples fato de ser exposto é
suficiente para mudar o julgamento das pessoas.” (ZAJONC, 1968 apud GUÉGUEN,
2010, p. 52) e explica, em grande parte, porque anunciantes que investem mais em
folhetos, panfletos e cartas promocionais ganham a preferência do público
(BURTON; LICHTENSTIEN; NETEMEYER, 1999 apud GUÉGUEN, 2010). A origem
desse viés vem do fato biológico de que “para sobreviver em um mundo
frequentemente perigoso, um organismo deve reagir cautelosamente a um estímulo
novo, com retraimento e medo.” (KAHNEMAN, 2012, p. 88).
O princípio geral do condicionamento afirma que estar associado a coisas
positivas ou negativas influencia a forma como as pessoas se sentem a respeito de
um indivíduo ou de um produto (CIALDINI, 2006). Persuasores eficientes buscam
associar-se – e associar seus produtos – às coisas que seus clientes gostam: daí o
sucesso de comerciais com atletas de alto nível e celebridades – ou o motivo pelo
qual, em outdoors, mulheres atraentes sempre aparecem ao lado de um caro carro
esportivo. A pesquisa de Buschman (1998 apud GUÉGUEN, 2010) demonstrou que
a capacidade de memorizar uma peça publicitária está intimamente ligada ao
contexto imediato e aos acontecimentos que a antecedem. Para ele, um filme
violento conduz a uma lembrança pior da mensagem de um comercial, assim como
das características do produto exibido ou do nome da marca. Outro uso prático do
4
O efeito priming evidencia que uma atividade efetuada pode interferir sobre um comportamento
posterior. (GUÉGUEN, 2010)
42
condicionamento pode ser observado nos “rótulos embelezados” (WANSINK;
PAINTER; VAN ITTERSUM, 2001 apud GUÉGUEN, 2010), onde nomes que
referenciam aspectos afetivos, geográficos e sensoriais levam a um aumento
considerável na escolha do produto e a um julgamento mais positivo deste. Da
mesma forma, argumentar contra seus próprios interesses – o que inclui mencionar
uma desvantagem em suas propostas ou produtos – sinaliza crédito e honestidade.
A efetividade desse princípio explica o grande sucesso da campanha publicitária
“Pense Pequeno” (Fig. 2), para promover o Fusca, veiculada no fim dos anos 50.
Fig. 2 – Anúncio “Pense Pequeno”.
5
Fonte: Advertising Age
Os anúncios - até hoje famosos na indústria publicitária como peças de
grande sucesso (GARFIELD, 1999) – exploravam, criativamente, defeitos inócuos do
5
Disponível em: <http://adage.com/article/special-report-the-advertising-century/ad-age-advertisingcentury-top-100-campaigns/140918/> Acesso em: 30 out. 2015.
43
carro, como sua aparência pouco convidativa, e isso trouxe mais confiabilidade às
qualidades divulgadas, como a durabilidade, a economia e o preço do carro
(GOLDSTEIN; MARTIN; CIALDINI, 2010).
A locadora de automóveis Avis empregou uma estratégia parecida ao admitir,
em seu lema: “Somos o número 2, mas nos esforçamos mais.” (Fig. 3)
(GOLDSTEIN; MARTIN; CIALDINI, 2010).
Fig. 3 – Anúncio da locadora de carros Avis
6
Fonte: Página na Internet da agência DDB
6
Disponível em: <http://www.DDB.com/BillBernbachSaid/Why_Bernbach_Matters/RevolutionaryWork> Acesso em: 30 out. 2015.
44
Existem diversas outras maneiras de demonstrar empatia. A pesquisa de Tidd
e Lockard (1978 apud GUÉGUEN, 2010) mostrou que sorrisos amplos rendiam
gorjetas maiores para garçonetes, especialmente se fossem dirigidos a homens. Lau
(1989 apud GUÉGUEN, 2010) também observou que pessoas sorridentes eram
avaliadas como sendo mais amigáveis, sociáveis e inteligentes.
2.5.5 Autoridade
A obediência à autoridade é outro potente motivador do comportamento
humano (CIALDINI, 2006), e parece haver um número abundante de justificativas
para isso: um sistema de autoridade amplamente aceito e com muitas camadas
confere
vantagens
formidáveis
à
uma
sociedade,
tornando
possíveis
o
desenvolvimento de sofisticadas estruturas de comércio, defesa, gerenciamento de
recursos e controle social, entre muitos outros. Ocorre-se, portanto, um processo de
condicionamento, desde a infância, cuja mensagem primordial ensina o respeito à
autoridade legítima (CIALDINI, 2006). Por conseguinte, a alternativa à autoridade, a
anarquia, é um estado conhecido por seus efeitos pouco benéficos aos grupos
culturais.
Na maioria dos casos, a obediência funciona como um atalho confiável para
determinar
o
comportamento,
e
acontece
de
forma
automática,
com
questionamentos conscientes ficando de lado. Como Milgram (apud CIALDINI, 2006,
p. 218) sugere,
“sujeitar-se às ordens de figuras de autoridade sempre teve uma genuína
vantagem prática para nós. Desde cedo, essas pessoas (por exemplo, pais,
professores) sabiam mais do que nós, e descobrimos que seguir seus
conselhos provou-se proveitoso – em parte por causa de sua maior
sabedoria, e em parte porque eles controlavam nossas recompensas e
castigos.”
Para Cialdini (2006), os mesmo benefícios, e pelos mesmos motivos,
continuam a persistir na vida adulta, embora agora as figuras de autoridade sejam
empregadores, juízes e líderes políticos – que, teoricamente, possuem muito mais
acesso a conhecimento e poder. A obediência à autoridade é, via de regra,
recompensadora – daí a facilidade de se explorar esse princípio como uma potente
45
arma de influência social. À vista disso, responder à autoridade de forma automática
e mecânica pode ser danoso e levar ao erro.
O autor demonstra que a mera “aparência” de autoridade é o suficiente para
colocar esse princípio psicológico em efeito. Segundo ele, as pessoas reagem aos
símbolos da mesma forma que à genuína substância – e existem vários desses
signos. Títulos, por exemplo – Doutor, Excelência, Professor –, demonstram o status
de um indivíduo. Da mesma forma que roupas – batinas, jalecos brancos, uniformes
policiais, ternos. As experiências de McElroy e Morrow (1994 apud GUÉGUEN,
2010) demonstraram de que forma utilizar um traje adequado parece influir no
comportamento das pessoas. Green e Giles (1973 apud GUÉGUEN, 2010) explicam
que até mesmo elementos menores parecem ser importantes, como o uso da
gravata. Todos esses sinais, portanto, recebem deferência automática, por motivos
mais ou menos semelhantes.
Ornamentos, como joias, também sinalizam poder. Aprendeu-se cedo na
história humana que utilizar a arte como um adorno pessoal engrandecia o status de
um indivíduo, tornando-o mais persuasivo. Um túmulo de aproximadamente quatro
mil e quinhentos anos encontrado perto de Stonehenge revelou o esqueleto de um
homem enterrado com diversos artefatos pequenos, entre eles dois ornamentos de
ouro trabalhados com esmero – provavelmente os únicos objetos desse tipo em toda
a Inglaterra pré-histórica. O homem, cuja análise posterior indicou ser um
estrangeiro vindo da Europa Central, teria deslumbrado os moradores locais com
suas peças de ouro, um metal especialmente raro à época, criando para si a
imagem de um líder (HOW..., 2005).
Uma recepcionista que apresente seus colegas de trabalho junto com suas
credenciais (“Fale com a Angélica, ela tem mais de 15 anos de experiência nessa
área!”), utilizando, portanto, o princípio da autoridade, será responsável por um
aumento no número de agendamentos (GOLDSTEIN; MARTIN; CIALDINI, 2010). Do
mesmo modo, pendurar seus diplomas, certificados e prêmios na parede o ajudará a
ganhar mais facilmente a confiança do público (GOLDSTEIN; MARTIN; CIALDINI,
2010). De acordo com Carrascoza (2004, p. 41), a publicidade também emprega de
forma sistêmica o princípio psicológico da autoridade, “usando dentistas, médicos,
atletas, figuras do show business etc. para tornar mais crível e ‘verdadeira’ sua
mensagem.”
46
2.5.6 Raridade
O princípio psicológico da raridade afirma que oportunidades parecem mais
valiosas quando sua disponibilidade é limitada (CIALDINI, 2006). De acordo com
seus pressupostos, a ideia de perda potencial é um grande incentivador do
comportamento humano. “De fato, as pessoas parecem ser mais motivadas pelo
pensamento de perder algo do que pelo pensamento de ganhar algo de valor
semelhante.” (CIALDINI, 2006, p. 238). Colecionadores conhecem a influência do
princípio da raridade ao determinar o valor de um item. Como regra, se algo é raro –
ou está se tornando raro – é mais valioso.
Cialdini (2006) aponta que o poder da raridade vem de duas grandes fontes.
A primeira delas é o seu valor como um “atalho” cognitivo: tipicamente, o que é mais
difícil de se obter é melhor do que o que é mais fácil, e é possível julgar de forma
rápida e precisa a qualidade de um item por sua disponibilidade. Geralmente,
conduzir-se pelo princípio da raridade significa estar certo, e de uma maneira
bastante eficiente.
A segunda fonte de poder desse princípio está no desejo que as pessoas têm
de preservar suas prerrogativas estabelecidas; a vontade de manter sua capacidade
de continuar obtendo com a mesma facilidade produtos, serviços ou mesmo artigos
mais abstratos, como o conhecimento.
Worchel, Lee e Adewole (1975 apud GUÉGUEN, 2010) avaliaram os efeitos
que aumentar ou diminuir a quantidade de biscoitos disponíveis causavam em
mulheres jovens e descobriram que, quando o produto se tornava raro, elas o
estimavam como mais tentador e de maior qualidade, além de possuir um preço
mais elevado. Cialdini resume o assunto da seguinte maneira: “Portanto, quando a
raridade crescente – ou qualquer outra coisa - interfere em nosso acesso prévio a
algum item, reagiremos à interferência desejando e tentando obter o item mais do
que antes.” (BREHM apud CIALDINI, 2006, p. 245-246).
Especialistas em vendas utilizam o princípio da raridade de forma ampla,
diversificada, frequente e sistemática. “É suficiente tornar a raridade digna de
crédito, e, aparentemente, algumas palavras habilmente empregadas podem
conseguir isso.” (GUÉGUEN, 2010, p. 80). Cialdini (2006) relata que o uso mais
direto desse princípio provavelmente ocorre na tática da “quantidade limitada”,
quando o consumidor é informado que o estoque de um certo produto está reduzido
47
e, portanto, caminhando para seu esgotamento. Outra técnica parecida é a do “por
tempo limitado”, em que alguma data oficial é colocada na oportunidade que o
consumidor tem de obter o produto ou serviço. Para Cialdini (2006), o princípio
psicológico da raridade está na origem do fascínio que a censura e o proibido
exercem no ser humano, explicando que, na maioria dos casos, reprimir apenas
aumentará consideravelmente o interesse do público.
Aggarwal e Vaidyanathan (2003 apud GUÉGUEN, 2010) tentaram medir a
eficácia comparada de diferentes técnicas e descobriram que mensagens que
restringem a oferta no tempo produzem um impacto mais forte.
O princípio da raridade explica o fiasco por trás de uma tentativa da
multinacional Coca-Cola, em 1985, de retirar do mercado sua tradicional fórmula e
introduzir uma nova, mais doce (Fig. 4). Apesar de validada por toda a sua pesquisa,
a estratégia contrariava esse princípio fundamental da psicologia humana: as
pessoas detestam perder algo que já têm. Retirar a Coca-Cola original do mercado
imediatamente tornou-a a favorita e causou uma revolta instantânea nos
consumidores (GOLDSTEIN; MARTIN; CIALDINI, 2010).
Fig. 4 – A nova Coca-Cola.
7
Fonte: Página da Coca-Cola na Internet.
7
Disponível em: <http://www.coca-colacompany.com/stories/coke-lore-new-coke> Acesso em: 30 out.
2015.
48
Em 2003, ao anunciar que descontinuaria o Oldsmobile devido às baixas
vendas, a General Motors viu as vendas desse automóvel subirem de maneira
impressionante (GOLDSTEIN; MARTIN; CIALDINI, 2010), outro exemplo prático
desse princípio agindo sobre o mercado.
49
3 MÉTODO
Este capítulo descreve os métodos e técnicas empregados na pesquisa – ou
seja, de que forma estudou-se o problema (GÜNTHER, 2003). Dessa forma, este
trabalho inicia-se com uma pesquisa bibliográfica, tomando como base o quadro
teórico proposto por Robert B. Cialdini e relacionando-o, principalmente, aos estudos
de Daniel Kahneman, Martin Lindstrom e Thomas Z. Ramsøy.
Günther (2003) define o trabalho científico como um “exercício de organizar
ideias e dados”. Para ele, logo que o rumo do trabalho é apresentado, o pesquisador
deve dirigir-se aos estudos anteriores do tópico, para verificar o que se sabe sobre o
assunto. Optou-se, dessa forma, por uma pesquisa bibliográfica, já que esta, de
acordo com Martins e Theóphilo (2009, p. 54), “procura explicar e discutir um
assunto, tema ou problema com base em referências publicadas em livros,
periódicos, revistas, enciclopédias, dicionários, jornais, sites, CDs, anais de
congressos etc.”
A pesquisa realizada em seguida parte da proposta da análise de conteúdo
(BARDIN, 1977), procurando identificar os seis princípios de Influência Social
apresentados por Cialdini (2006) em 200 peças premiadas no 62o Cannes Lions
Festival Internacional de Criatividade, que ocorreu em junho de 2015.
Frequentemente descrito como “o maior festival de publicidade do mundo”
(CHAMIKUTTY, 2010), o Festival de Cannes acontece anualmente no Palais des
Festivals et des Congrès, localizado na Riviera Francesa (Côte d'Azur), e recebe
campanhas de todo o mundo. Esta análise, portanto, representa um diagnóstico
inicial a respeito do uso desses princípios mundialmente.
As peças analisadas encontravam-se na categoria “impresso”, todas tendo
vencido, no Festival realizado no ano de 2015, alguma modalidade do prêmio, sendo
ela o “Grand Prix”, “Ouro”, “Prata” ou “Bronze”. As 200 peças constituem as
unidades de análise e foram selecionadas porque, de acordo com a webpage do
evento, os prêmios do Festival de Cannes estabelecem uma referência mundial para
o que um trabalho criativo de qualidade deve parecer (CANNES LIONS
INTERNATIONAL FESTIVAL OF CREATIVITY). Ou seja, por representarem o que o
meio publicitário elegeu como trabalhos da mais alta qualidade.
As peças podem ser verificadas através do seguinte endereço eletrônico:
<http://www.canneslionsarchive.com/winners/entries/cannes-lions/press>.
50
3.1 Critérios de Análise
A seguir, esclarecem-se os critérios utilizados para perceber os seis princípios
nas peças. Resumidos, todos eles baseiam-se em exemplos práticos fornecidos por
Cialdini (2006) em seus estudos. É importante frisar que o quadro abaixo contempla
apenas parcialmente as potencialidades dos princípios de Cialdini, que podem
manifestar-se das mais diferentes formas, e serve apenas como uma tentativa de
estabelecer
meios
para
esta
análise.
Os
princípios
foram,
portanto,
operacionalizados da seguinte maneira:
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Reciprocidade
Uso da tática da amostra grátis;
Uso de um texto que gere a necessidade do consumidor retribuir algum favor; o anúncio
concede ou menciona um benefício exclusivo, gerando um sentimento de dívida do potencial
consumidor para com o anunciante.
Comprometimento e Consistência
Rotular o consumidor com estereótipos que o incentivem a agir de forma semelhante (por
exemplo, mencionar que pessoas preocupadas em economizar sempre se preocupam com
preços baixos);
Texto utiliza-se do conceito de que o consumidor deve ser consistente com suas atitudes
anteriores (por exemplo, já ter adquirido o produto antes).
Prova Social
Anúncio mostra várias pessoas consumindo o produto;
Informar que o produto é “o mais vendido”;
O texto ou a imagem relatam o comportamento de outros clientes.
Empatia
Utilizar a imagem de pessoas atraentes;
Tentativa do texto de produzir familiaridade: invocar similaridade de ideias, traços de
personalidade, experiências ou estilos de vida do consumidor potencial;
Uso de elogios ao leitor; declarar afinidade;
Associar a marca ou o produto à celebridades (o uso de imagens de pessoas famosas).
Autoridade
Anúncio utiliza-se de títulos (Doutor, Excelência, Professor) para embasar seus argumentos;
Anúncio centra-se em pessoas vestindo roupas específicas (batinas, jalecos brancos,
uniformes policiais, ternos);
Anúncio apresenta pessoas usando acessórios específicos (jóias, carros caros);
Texto invoca o uso geral de credenciais para justificar o comportamento desejado.
Raridade
Uso da estrutura semântica “por tempo limitado” – ou de sua ideia;
Uso da estrutura semântica “quantidade limitada” – ou de sua ideia;
Mencionar que existem poucas unidades do produto;
O texto remete à ideia de que o produto é raro ou pode estar acabando.
Fig. 5 – Quadro de princípios operacionalizados
Fonte: o próprio autor.
51
4 RESULTADOS
Este estudo analisou 200 peças publicitárias diferentes, todas premiadas no
62o Cannes Lions Festival Internacional de Criatividade, que ocorreu em junho de
2015, na França. As peças pertenciam à categoria impresso. Dessas, 4 foram
premiadas com o Grand Prix, 20 receberam o prêmio Ouro, 57 receberam Prata, e
119 receberam Bronze. Os textos analisados encontravam-se em inglês, e foram
traduzidos livremente pelo autor, buscando preservar, da forma mais rigorosa
possível, o sentido originalmente empregado.
As quatro peças que venceram o Grand Prix haviam sido premiadas
anteriormente com Ouro, e, portanto, encontravam-se nas duas categorias. Optouse, portanto, por uma análise única destas e atribuí-las apenas ao primeiro prêmio,
mais significativo, desconsiderando sua presença no segundo, de modo a evitar
duplicidade de análise. Por motivos desconhecidos, algumas das peças repetiam-se
em outras categorias, tendo sido igualmente ignoradas.
Das 200 peças publicitárias premiadas no Festival de Cannes que este
estudo analisou, apenas 18 delas (menos de 10%) utilizavam-se dos seis princípios
psicológicos de Influência Social identificados por Cialdini. Os resultados da
pesquisa foram descritos na tabela e no quadro abaixo. Os critérios foram definidos
a partir da literatura disponível sobre o tema, revisada no capítulo anterior.
4.1 Princípios nas peças premiadas com o Grand Prix
Quatro peças pertenciam à essa categoria: os cartazes “Baby”, “Dog”, “Moths”
e “Squirrel”, sobre o sistema de bicicletas públicas da cidade de Buenos Aires. A
campanha recebeu o Grand Prix (“grande prêmio”) da categoria impresso. As peças
utilizavam-se de desenhos caricaturais para apresentar a ideia de movimento
contínuo – um bebê perseguindo seios, um cachorro atrás da própria cauda,
mariposas atraídas por uma lâmpada e um esquilo tentando alcançar nozes. O texto
informava que o sistema de bicicletas da cidade agora funcionava 24 horas por dia,
durante toda a semana. Apesar de ter recebido o prêmio mais importante da
categoria, nenhum desses cartazes utilizou-se, de maneira direta e evidente, dos
princípios de Cialdini aqui operacionalizados.
52
4.2 Princípios nas peças premiadas com Ouro
Nenhuma das 20 peças analisadas apresentou o uso dos princípios.
Entretanto,
algumas
campanhas,
por
exemplo,
utilizaram-se
de
contextos
provavelmente familiares aos consumidores potenciais, em um possível uso do
princípio da empatia. A campanha para a Volkswagen do Brasil, por exemplo,
utilizava-se de cenas rotineiras para explorar a ideia de que “pessoas sentem coisas
de forma diferente”. Cabe-se discutir se este pode ser considerado um uso prático
do princípio da empatia, já que é possível argumentar que, de uma forma ou de
outra, todos os seres humanos compartilham experiências muito semelhantes. A
familiaridade pode dar-se pelo indivíduo ter vivido diretamente a cena descrita ou por
tê-la visto ou ouvido por terceiros, um filme, ou mesmo uma reportagem jornalística.
Como estabelecer, de forma clara, o que pode ser definido como “familiar”? Diante
dessa dificuldade prática, optou-se por desconsiderar esta tática, já que, como dito,
poderia argumentar-se que todas as 200 peças os contêm, de uma forma, ou de
outra.
O mesmo problema repetiu-se em outras categorias. Por exemplo, na análise
dos premiados com Bronze, poderia argumentar-se que as peças “Boyfriend”, “Job”
e “Big Girl”, para a Garnier, exploravam muito claramente semelhanças de vida com
o público, usando o princípio da empatia.
4.3 Princípios nas peças premiadas com Prata
Oito peças, pertencentes à duas campanhas diferentes, apresentaram
características condizentes com os princípios identificados por Cialdini. As peças
“Bikini”, “Shirt” e “Shoe”, para a Harvey Nichols, utilizavam a ideia de que a procura
por suas roupas era muito intensa, e que, portanto, o consumidor deveria apressarse para visitar uma de suas lojas, ou ficaria apenas com os produtos que
sobrassem, em um uso muito claro e elaborado do princípio da prova social. A
primeira peça analisada mostrava uma mulher que parecia vestir um biquíni muito
grande para o seu corpo. O biquíni ultrapassava seus seios e ficava pendurado
sobre o abdômen. Ao lado, o título da imagem lançava seu apelo: “melhor chegar lá
cedo”. A ideia repetia-se em todas as peças seguintes, com a mesma mensagem. A
segunda (“Shirt”) continha a imagem de um homem vestindo uma camisa social
53
muito pequena para seu tronco. O mesmo texto, sempre à direita, acompanhava a
fotografia. Por fim, a peça “Shoes” apresentava um par de pés femininos, calçados
em sapatos de salto alto menores do que o idealmente adequado: os calcanhares
saltavam para fora e os dedos tocavam o piso de madeira. O conceito da campanha
valia-se do princípio da prova social ao valorizar, mesmo que sutilmente, o
comportamento de outros clientes: diversas outras pessoas chegaram antes, mais
cedo, e o consumidor ficou apenas com as sobras delas. Como destacado
anteriormente, o ser humano é um animal social que guia-se pelas atitudes e
preferências dos outros ao seu redor. Daí a origem do poder desta tática.
Já as peças “Old Axl”, “Old Dylan”, “Old McCartney”, “Old Richards” e “Old
Tyler”, todas partes da mesma campanha para a rádio Mariscal, apresentavam as
fotografias de músicos internacionalmente conhecidos, utilizando, portanto, o
princípio da empatia. Fotos tiradas durante a juventude de Axl Rose, Bob Dylan,
Paul McCartney, Keith Richards e Steven Tyler apareciam ao lado de fotos mais
recentes dos mesmos artistas, ao lado de uma frase curta sobre a atemporalidade
de suas obras e grandes sucessos. Utilizar a figura de celebridades em uma peça
publicitária é uma forma segura de associar-se emocionalmente aos sentimentos
que a pessoa ali representada traz consigo, influenciando, de maneira poderosa, o
comportamento do consumidor. Apesar de simples, a tática do condicionamento,
prevista pelo princípio geral da empatia, possui uma força já comprovada por muitos
estudos.
4.4 Princípios nas peças premiadas com Bronze
Esta é a categoria com a maior quantidade de peças contendo princípios, o
que pode ser explicado pelo grande número de campanhas premiadas (119). Dentre
os anúncios que receberam Bronze, as peças “Andy Warhol” e “George Lucas”, com
o objetivo pró-social de engajar potenciais doadores de sangue na cidade argentina
de Buenos Aires, apresentavam, como indicam seus títulos, referências à
celebridades, tática descrita pelo princípio da empatia. Apesar de utilizarem-se
apenas de textos (nenhuma imagem das celebridades retratadas acompanhava o
anúncio), esta abordagem já caracteriza, por si só, o uso desse princípio. Ambos os
textos possuíam um caráter biográfico, e descreviam a vida e carreira dos
personagens indicados no título, desde seu nascimento. A determinado ponto, todas
54
mencionavam um acidente e a necessidade de receber sangue doado, e a coluna de
texto, inicialmente em preto, tornava-se vermelha a partir da palavra “sangue”. Ao
lado da assinatura, a frase “dê mais do que sangue” .
As peças criadas para o Santa Teresa Rum (“Output”, “Choose”, “Hard Day” e
“Philosophy”) informavam que a empresa produzia sua bebida há muito tempo,
demonstrando credenciais (princípio da autoridade). A campanha destacava um
diferencial criativo da empresa: o casamento de dois universos aparentemente
distantes, a bebida alcóolica e o esporte. Com títulos do tipo “Se tivéssemos que
escolher entre rum e rúgbi, escolheríamos rum. E rúgbi.” e “Após um dia de trabalho
duro, descansamos jogando rúgbi.”, as peças mostravam os funcionários da
empresa, trajando uniformes típicos do esporte acima mencionado, preparando-se
para uma partida, jogando agressivamente ou desempenhando as tarefas rotineiras
de seu trabalho, como empurrar pesados barris de rum ou uma caminhonete atolada
na lama. Por fim, a assinatura: “Santa Teresa – Nós jogamos rúgbi. Nós produzimos
rum”. O princípio da prova social é empregado nesta campanha quando, no corpo do
texto, afirma-se que a empresa está envolvida neste processo há muitos anos,
invocando a credibilidade que somente a experiência confere.
As peças “Be The Painter of Your Dreams”, “Be The Tailor of Your Dreams” e
“Explore Your Dreams”, da List General Contractors, utilizavam a técnica de atribuir
rótulos, prevista pelo princípio da consistência, ao afirmarem, em seu texto, que
confeccionam interiores excepcionais para “indivíduos excepcionais”. Todas as
peças iniciavam-se com o título “resista ao ordinário” e apresentavam cenas
oníricas. Na primeira, uma mulher jovem apoia um pincel longo sobre o ombro,
posando ao lado de um balde contendo tinta verde, entre faixas cumpridas de
plantas, todas da mesma cor, sugerindo que as plantas foram pintadas por ela. A
segunda peça mostrava um cenário semelhante, mas, agora, as plantas eram roxas,
e a mulher puxava uma grande faixa de tecido da mesma cor, cobrindo a terra
marrom-escuro. Na terceira e última peça, uma mulher de longos cabelos castanhos,
usando um vestido branco, encontra-se de pé sobre um barco azul, em um cenário
igualmente
azulado.
“Construímos
interiores
excepcionais
para
indivíduos
excepcionais”, afirma o corpo do texto em todas as três imagens, estabelecendo um
rótulo que determina o seguinte: apenas indivíduos especiais e diferenciados optam
por estes interiores. Portanto, se o consumidor se enxerga como (ou ambiciona ser)
excepcional, ele naturalmente procurará pelos serviços desta empresa.
55
A peça “Rocket”, para a Sneaker Freaker Boogazine, utilizava o mesmo
princípio psicológico (a empatia) ao definir-se como sendo “para os sonhadores dos
sonhos de tênis”. Nela, um único tênis com uma pequena turbina na parte de trás
decola dos pés de uma pessoa (apenas uma das pernas aparece em quadro),
deixando espirais circulares e espessas de fumaça para trás. O tênis aparece no
centro da peça, em primeiro plano, sobre um fundo branco. De seu interior, lançamse diversas espaçonaves e foguetes, dos mais variados tipos. A peça é um desenho
em preto-e-branco. Ao especificar que seu calçado tem como consumidores apenas
pessoas com uma determinada característica, a Sneaker Freaker Boogazine rotula
seu público e o liga a uma atitude. Apenas “os sonhadores dos sonhos de tênis”
escolhem esse produto e, portanto, qualquer pessoa que identifique-se com esse
enunciado vê-se compelida a adquiri-lo: “se penso assim, preciso agir assim”, como
estipula o princípio da consistência.
Prêmio
recebido
Grand
Prix
Ouro
Prata
Bronze
Quantidade
Reciprocidade
4
0
20
57
119
Comprometimento/
Consistência
0
Prova
Social
0
Autoridade
Empatia
0
0
0
0
0
4
0
5
2
0
0
0
0
0
0
0
0
3
0
4
0
Tabela 1 – Tabela de resultados (resumo)
Fonte: o próprio autor
Raridade
O quadro abaixo descreve, com mais pormenores, os resultados encontrados
em termos de prêmio recebido, princípio de Influência Social identificado, nome da
peça, anunciante (o cliente, ou, se for o caso, sua marca), agência contratada para o
serviço, segmento de mercado da empresa anunciante e ano. Este estudo
considerou que destacar tais fatores poderia ser relevante, porque, em um outro
contexto, dados como esses podem vir a fornecer matéria-prima para estudos
futuros, em termos de entender, por exemplo, se um determinado segmento utilizase mais comumente de um princípio psicológico que outro, ou se uma das agências
aqui relacionadas parece aplicar mais sistematicamente essas estratégias, ou
mesmo se uma certa tática tem recebido, com mais frequência, algum dos prêmios
do Festival. Como explicitado anteriormente, todas as peças aqui compiladas
referem-se ao ano de 2015.
Por fim, uma análise dos dados obtidos pode ser encontrada no capítulo
seguinte, onde discute-se as inferências possíveis e levantam-se possibilidades para
explicá-las.
56
Prêmio
Prata
Princípio
Prova Social
Peça
Bikini
Prata
Prova Social
Shirt
Prata
Prova Social
Shoe
Prata
Empatia
Old Tyler
Prata
Empatia
Old
Richards
Prata
Empatia
Old
McCartney
Prata
Empatia
Old Axl
Prata
Empatia
Old Dylan
Bronze
Empatia
Andy
Warhol
Bronze
Empatia
George
Lucas
Bronze
Autoridade
Output
Bronze
Autoridade
Choose
Bronze
Autoridade
Hard Day
Bronze
Autoridade
Philosophy
Bronze
Comprometimento,
Consistência
Bronze
Comprometimento,
Consistência
Bronze
Comprometimento,
Consistência
Be The
Painter of
Your
Dreams
Be The
Tailor of
Your
Dreams
Explore
Your
Dreams
Rocket
Bronze
Cliente
Harvey
Nichols
Harvey
Nichols
Harvey
Nichols
Mariscal
Rock
Radio
Mariscal
Rock
Radio
Mariscal
Rock
Radio
Mariscal
Rock
Radio
Mariscal
Rock
Radio
City of
Buenos
Aires
City of
Buenos
Aires
Santa
Teresa
Rum
Santa
Teresa
Rum
Santa
Teresa
Rum
Santa
Teresa
Rum
List
General
Contractor
Agência
Adam &
Eve/DDB
Adam &
Eve/DDB
Adam &
Eve/DDB
TAPSA/Y&R
Segmento
Lojas de
Varejo
Lojas de
Varejo
Lojas de
Varejo
Mídia
TAPSA/Y&R
Mídia
TAPSA/Y&R
Mídia
TAPSA/Y&R
Mídia
TAPSA/Y&R
Mídia
The
Community
Levantamento
de fundos
The
Community
Levantamento
de fundos
SCPF
Bebidas
Alcóolicas
SCPF
Bebidas
Alcóolicas
SCPF
Bebidas
Alcóolicas
SCPF
Bebidas
Alcóolicas
Reichl und
Partner
Fotografia
List
General
Contractor
Reichl und
Partner
Fotografia
List
Reichl und
General
Partner
Contractor
Comprometimento,
Sneaker
BBDO New
Consistência
Freaker
York
Boogazine
Fig. 6 – Quadro de resultados (descritivo)
Fonte: o próprio autor.
Fotografia
Ilustração
57
5 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
É importante ressaltar, antes de tudo, que o quadro contendo os princípios
descritos (ou seja, os critérios de análise que o autor usou) descreve apenas
parcialmente as possibilidades das pesquisas sobre Influência Social conduzidas por
Cialdini, o que, por si só, previne inferências muito contundentes a respeito dos
resultados. É importante considerar-se, igualmente, o fato de que uma quantidade
relevante de táticas previstas pelas pesquisas baseiam-se, idealmente, em uma
abordagem interpessoal, isto é, pessoas persuadindo pessoas. Dessa forma,
empregar certos princípios nas peças (como o da reciprocidade) pode ser mais
complexo do que o esperado, simplesmente porque as táticas demandam o
dinamismo de dois indivíduos interagindo: seria muito difícil para um anúncio (geral e
dirigido à massa) emular de forma convincente a tática do “desconto pessoal”, por
exemplo.
Entretanto, ainda assim, tomando como base o quadro aqui sugerido,
constatou-se um uso muito baixo dos princípios. Das 200 peças selecionadas,
apenas 18 (menos de 10%) utilizaram-se deles, de acordo com os critérios aqui
estabelecidos. Interessantemente, os resultados parecem contrariar o receio comum
de que a publicidade vale-se de estratagemas psicológicos sofisticados para atingir
seus objetivos e transformar os indivíduos em consumidores compulsivos. A verdade
parece ser outra: aparentemente, poucas táticas comprovadas têm sido utilizadas.
O estudo constatou ainda que dois dos princípios (reciprocidade e raridade)
foram
completamente
omitidos
nas
peças
verificadas.
Os
princípios
de
comprometimento/consistência e empatia foram os mais usados (duas campanhas
cada, em um total de 11 peças. Comprometimento e consistência: 4; empatia: 7).
Existem várias hipóteses possíveis para explicar os resultados obtidos. A
primeira refere-se às propostas do Cannes Lions Festival Internacional de
Criatividade, de onde as peças foram retiradas. Este é, como seu próprio nome
adverte, um evento que almeja premiar as ideias e peças publicitárias mais criativas.
É aceitável, portanto, supor que as campanhas vencedoras podem ser mais
artísticas e conceituais, destoando bastante do que é comumente produzido no dia a
dia pelas agências de publicidade, simplesmente porque esta é a finalidade primária
do concurso. O foco das peças inscritas seria o de buscar possibilidades mais
inéditas e inovadoras, de maneira a garantir mais prêmios, o que justificaria, em
58
parte, a ausência dos princípios psicológicos. Isso explicaria o porquê de nenhuma
das peças ter empregado o princípio da raridade, geralmente associado à peças do
quotidiano e produtos mais populares, de varejo.
É importante observar que o Festival de Cannes é, entretanto, responsável
por lançar diversas tendências no meio publicitário. Já que prêmios representam
prestígio – o que é útil para captar e manter clientes, – a indústria publicitária
mundial acaba moldando-se para atender aos critérios e expectativas do Festival –
mesmo que, na prática, isso signifique deixar de lado o uso de evidência e pesquisa
científica. Afinal, a verdade é simples: nenhum festival publicitário (ou, pelo menos,
nenhum famoso o bastante) premia as campanhas por funcionarem.
Uma hipótese alternativa é a de que as peças publicitárias analisadas possam
estar se utilizando de estratégias e táticas ainda pouco estudadas, e que precisam,
portanto, ser identificadas e testadas. Recomendam-se estudos futuros acerca do
tema, de modo a esclarecer este aspecto, buscando, por exemplo, características
compartilhadas pelas peças. A seguir, devem-se realizar testes empíricos, através
de experimentos, para atestar a eficiência das mesmas. Observou-se, por exemplo,
que várias das peças apresentavam um tom humorístico (como as da Harvey
Nichols e da Alghanim Motors). Recomendam-se estudos sobre as abordagens
utilizadas, para verificar seus efeitos.
Outra hipótese que precisa ser considerada refere-se à possibilidade dos
criadores de propaganda desconhecerem ou ignorarem esses princípios, pelos mais
diferentes motivos. O processo formativo dos publicitários, tanto acadêmico quanto
profissional, pode estar dando uma ênfase muito grande à criatividade e a um
enfoque intuitivo do comportamento humano. A técnica da criatividade tem uso
prático, evidentemente, ao dar visibilidade à peça, mas o uso de fundamentos
empíricos da psicologia social no desenvolvimento das campanhas pode
complementar essa abordagem e reforçar o poder suasório dos anúncios, trazendo
mais ciência para a técnica publicitária. É possível, ainda, que os publicitários, de
fato, conheçam esses princípios e, mesmo assim, optem por outras estratégias.
Neste caso, sugerem-se estudos futuros a respeito do tema, utilizando uma
amostragem por escolha racional, buscando entrevistar publicitários pertencentes ao
departamento criativo das agências (redatores e diretores de arte, mais
especificamente), de maneira a verificar o nível de familiaridade deles para com
essas táticas e compreender o que pensam a respeito de seu uso.
59
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo reuniu conceitos e teorias de duas grandes áreas, a neurociência
do consumidor e a psicologia social, para analisar campanhas premiadas no 62o
Cannes Lions Festival Internacional de Criatividade. A pesquisa procurou identificar
de que forma o conhecimento disponível sobre comportamentos automáticos e
vieses cognitivos é aplicado em peças publicitárias, tomando como referência central
os seis princípios propostos por Robert B. Cialdini. Os princípios de Cialdini foram
escolhidos por basearam-se em vieses cognitivos especificamente relacionados à
Influência Social, relevantes à publicidade, já que esta usa-se de estratégias e
táticas persuasivas – ou seja, justamente o objeto de estudo deste campo.
O problema de pesquisa formulado no começo deste estudo buscava
desvendar o seguinte: as técnicas persuasivas utilizadas nas peças publicitárias
aproximam-se ou afastam-se do quadro teórico proposto por Cialdini?
A resposta para essa pergunta é: muito pouco. Das 200 peças publicitárias
que este estudo escolheu, apenas 18 apresentaram elementos antecipados pelos
princípios, um número pouco significativo.
Assim sendo, os resultados da análise de conteúdo terminaram refutando, em
certa medida, a primeira hipótese de pesquisa apresentada ao começo deste
trabalho (“as pecas publicitárias utilizam-se dos seis princípios psicológicos de
Influência Social, mesmo que de forma intuitiva”). A verdade é que poucas das
campanhas empregaram esses princípios, por motivos que ainda necessitam ser
esclarecidos em pesquisas posteriores. É digno de nota que dois dos princípios
(reciprocidade e raridade) foram completamente omitidos, por motivos ainda a serem
estudados. Os princípios de comprometimento/consistência e empatia foram os mais
utilizados, seguidos por autoridade e prova social. Dentre as possibilidades
levantadas para explicar esses resultados, considerou-se o caráter artísticoconceitual dos prêmios distribuídos pelo Festival de Cannes (a amostra), o uso de
estratégias persuasivas fora do radar, e o desconhecimento dos profissionais de
publicidade sobre o assunto. Por fim, novos estudos foram sugeridos.
É importante reconhecer que a pesquisa aqui apresentada possui limites, e
que certos cuidados poderiam ter aumentado seu valor, qualitativamente. Na fase de
desenvolvimento, a validade do quadro com os critérios usados para perceber os
princípios nas peças poderia ter sido avaliada por um acadêmico estudioso do tema,
60
para assegurar sua consistência; de maneira a reduzir o nível de subjetividade da
análise, mais de um pesquisador poderia ter aferido, de forma independente, as
peças. Assim, os resultados de ambos os julgamentos teriam sido comparados e
discutidos, tornando-os mais contundentes.
Este
estudo
buscou
contribuir,
essencialmente,
com
possibilidades
alternativas para o processo de desenvolvimento de peças publicitárias, baseandose em um entendimento teórico de como o cérebro opera – e de como usar esse
conhecimento de forma prática no mercado. Os procedimentos automáticos da
mente geram vieses cognitivos que podem favorecer a influência das peças
publicitárias. A aplicabilidade dessas pesquisas, em campanhas comerciais ou em
políticas de utilidade pública, confere a possibilidade de programas mais precisos e,
consequentemente, mais econômicos.
Parece haver, neste momento, uma tendência mundial de incorporar métodos
mais quantificáveis à prática publicitária. O advento da Internet propiciou métricas
precisas sobre o que é visto e apreciado; a neurociência tem descortinado os
procedimentos do cérebro, e a psicologia social debruçou-se sobre as atitudes
relacionadas à influência, só para mencionar alguns poucos sinais desse processo.
A publicidade, portanto, tem à sua frente um futuro cheio de potencialidades, e seus
profissionais têm uma oportunidade rara de trabalharem com estratégias mais
aguçadas. Como destacado no início deste estudo, o uso dessas tecnologias pode
trazer um aumento significativo na qualidade dos esforços publicitários.
Apesar de seu caráter exploratório, a pesquisa mostrou, por fim, que a
publicidade tem pouco se utilizado dos aspectos conceituais e teóricos aqui
discutidos. Este estudo recomenda o uso desses princípios como uma forma de
aumentar a eficiência dos anúncios, produzindo campanhas embasadas em
evidência empírica.
Entende-se que os publicitários muito se preocupem, corretamente, com o
aspecto mais difícil apresentado a quem atua nessa área: ser notado e lembrado. A
publicidade é uma indústria altamente competitiva, que envolve muitas empresas,
dinheiro e pessoas, originando ou consumindo os anúncios. Este estudo prossegue,
portanto, a partir daí: ao obter-se a curiosidade do público-alvo, como levá-lo, a
seguir, ao ponto de venda e ao consumo?
61
Por fim, outro ponto importante a ser abordado aqui refere-se à ética do uso
desses princípios psicológicos: poderiam essas técnicas ser usadas para
“zumbificar” os indivíduos, transformando-os em consumidores automáticos?
Este é um questionamento válido, e o publicitário Washington Olivetto parece
ter uma resposta adequada: “A pior coisa que pode acontecer a um mau produto é
ter boa publicidade. Todo mundo vai ter curiosidade sobre ele, vai consumir, vai
perceber que ele é ruim.” (RACY, 2014). Dessa forma, o consumidor perceberá o
engodo e jamais consumirá o produto novamente. E, como efeito colateral disso, a
confiança na marca ficará estremecida de maneira prejudicial. O julgamento final
pertence sempre ao consumidor.
Há, ainda, um outro adendo relevante: apesar de ser o foco deste estudo, é
preciso lembrar que a publicidade está longe de ser a única a utilizar-se dessas
técnicas. Líderes políticos e religiosos, assim como grupos extremistas, por
exemplo, amparam-se em métodos semelhantes para convencer eleitores, cativar
fiéis ou recrutar simpatizantes. Conhecer essas táticas é um primeiro passo rumo a
proteger-se de seus efeitos.
62
REFERÊNCIAS
ARENS, William F.; SCHAEFER, David H. Essentials of Contemporary
Advertising. New York: McGraw-Hill/Irwin, 2006.
ARIELY, Dan. Previsivelmente Irracional: como as situações do dia-a-dia
influenciam as nossas decisões. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.
ARONSON, Elliot; WILSON, Timothy D.; AKERT, Robin M. Psicologia Social. Rio
de Janeiro: LTC – Livros Técnicos e Científicos Editora S.A., 2002.
ASIMOV, Isaac. O Cérebro Humano: Suas Capacidades e Funções. [S.l.]: Humus
S.A., 2002.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.
BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Comunicação Social. Pesquisa
brasileira de mídia 2015: hábitos de consumo de mídia pela população brasileira.
Brasília: Secom, 2014.
BUCKLEY, Thea. Why Do Some People Believe in Conspiracy Theories? Scientific
American. [S.l.], jun. 2015. Disponível em: <http://www.scientificamerican.com/article/whydo-some-people-believe-in-conspiracy-theories> Acesso em: 6 ago. 2015.
CALDWELL, Emily. Scientist: Most complete human brain model to date is a “brain
changer”. The Ohio State University News Room. Columbus, ago. 2015.
Disponível em: <https://news.osu.edu/news/2015/08/18/human-brain-model> Acesso
em: 20 ago. 2015.
CANNES LIONS INTERNATIONAL FESTIVAL OF CREATIVITY. Welcome to
Cannes Lions. [S.l.: s.n.]. Disponível em: <http://www.canneslions.com> Acesso em:
30 out. 2015.
CARLSON, Neil R. Fisiologia do Comportamento. 7. ed. Barueri: Editora Manole
Ltda., 2002.
CARRASCOZA, João Anzanello. Razão e Sensibilidade no Texto Publicitário. 2.
ed. São Paulo: Futura, 2004.
CHAMIKUTTY, Preethi. World's biggest ad festival to kick off in Cannes. The Economic
Times. [S.l.], jun. 2010. Disponível em: <http://articles.economictimes.indiatimes.com/201006-09/news/27583196_1_cannes-lions-entries-promo-activation> Acesso em: 26 out. 2015.
CIALDINI, Robert B. Influence: The Psychology of Persuasion. New York:
HarperCollins Publishers, 2006.
CRUZ, Ligia Abreu Gomes. Framing Effects and Pro-Environmental Behavior:
Persuasive Strategies in Signs and a Measure of Goal-Frames. 2015. 104 f.
Dissertação (Mestrado) - Universidade de Brasília, Brasília, 2015.
63
DELAMATER, John; WARD, Amanda (Ed.). Handbook of Social Psychology. 2.
ed. [Dordrecht]: Springer, 2013.
DOOLEY, Roger. Brainfluence: 100 Ways To Persuade And Convince Consumers
With Neuromarketing. Hoboken: John Wiley and Sons, Inc., 2012.
EMARKETER. Advertisers Will Spend Nearly $600 Billion Worldwide in 2015. [S.l.],
dez. 2014. Disponível em: <http://www.emarketer.com/Article/Advertisers-WillSpend-Nearly-600-Billion-Worldwide-2015/1011691> Acesso em: 15 maio 2015.
FEINBERG, Matthew; WILLER, Robb. From Gulf to Bridge: When Do Moral Arguments
Facilitate Political Influence? Personality and Social Psychology Bulletin. [S.l.], out. 2015.
Disponível em: <http://psp.sagepub.com/content/early/2015/10/06/0146167215607842.full>
Acesso em: 30 out. 2015.
FERREIRA, Maria Cristina. Breve História da Moderna Psicologia Social. In:
TORRES, Cláudio Vaz; NEIVA, Elaine Rabelo (Org.). Psicologia Social: principais
temas e vertentes. Porto Alegre: Artmed, 2011. Cap. 1.
FIGUEIREDO, Celso. Redação Publicitária: Sedução pela Palavra. São Paulo:
Pioneira Thomson Learning, 2005.
GENCO, Stephen J.; POHLMANN, Andrew P.; STEIDL, Peter. Neuromarketing For
Dummies. Mississauga: John Wiley and Sons Canada, Ltda, 2013.
GOLDSTEIN, Noah J.; MARTIN, Steve J.; CIALDINI, Robert B. Yes! 50
Scientifically Proven Ways To Be Persuasive. New York: Free Press, 2010.
GUÉGUEN, Nicolas. Psicologia do Consumidor: Para Compreender Melhor De
Que Maneira Você É Influenciado. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2010.
GÜNTHER, Hartmut. Como Elaborar um Relato de Pesquisa. Série: Planejamento
de Pesquisa nas Ciências Sociais, no 02. Brasília, DF: UnB, Laboratório de
Psicologia Ambiental, 2003.
HOW Art Made The World. Direção de Martin Wilson. Produção de Mark Hedgecoe.
[S.l.]: British Broadcasting Corporation; KCET Hollywood, 2005. 2 DVDs (290min),
NTSC, son., color.
JABR, Ferris. Does Thinking Really Hard Burn More Calories? Scientific American.
[S.l.], jul. 2012. Disponível em: <https://www.scientificamerican.com/article/thinkinghard-calories> Acesso em: 24 maio 2015.
GARFIELD, Bob. Ad Age Advertising Century: The Top 100 Campaigns.
Advertising Age. [S.l.], mar. 1999. Disponível em: <http://adage.com/article/specialreport-the-advertising-century/ad-age-advertising-century-top-100campaigns/140918/> Acesso em: 10 ago. 2015.
RACY, Sonia. ‘Adoro fazer propaganda de produto que o consumidor possa devolver’
Estadão. [S.l.], set. 2014. Disponível em: <http://cultura.estadao.com.br/blogs/direto-da-
64
fonte/adoro-fazer-propaganda-de-produto-que-o-consumidor-possa-devolver> Acesso em:
30 out. 2015.
IGLESIAS, Fabio; DAMASCENO, Raissa. Estratégias persuasivas de vendedores:
As percepções de consumidores em lojas de varejo. Revista Psicologia:
Organizações e Trabalho, v. 13, p. 61-76, 2013.
KAHNEMAN, Daniel. Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2012.
KASSIN, Saul; FEIN, Steven; MARKUS, Hazel Rose. Social Psychology. 8. ed.
Belmont: Cengage Learning, 2008.
LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo. Verdades e Mentiras Sobre Por Que
Compramos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.
MARTINS, Gilberto de Andrade; THEÓPHILO, Carlos Renato. Metodologia da
Investigação Científica para Ciências Sociais Aplicadas. 2. ed. São Paulo: Atlas,
2009.
MÍDIA DADOS BRASIL 2015. Catálogo Mídia Dados Brasil. São Paulo: Grupo de
Mídia São Paulo, 2015. Disponível em: < http://gm.org.br/midia-dados> Acesso em:
30 ago. 2015.
NARAYANASWAMI, Karthik. Analysis of Nazi Propaganda: A Behavioral Study.
Cambridge: Harvard University, 2011.
OGILVY, David. Confissões de um Publicitário. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2011.
PINKER, Steven. Os Anjos Bons da Nossa Natureza: Por que a violência diminuiu.
São Paulo: Companhia das Letras, 2013.
PLASSMANN, Hilke; RAMSØY, Thomas Zoëga; MILOSAVLJEVIC, Milica. Branding
the brain: A critical review and outlook. Journal of Consumer Psychology, [S.l.], v.
22, p. 18–36, jan. 2012.
PRATKANIS, Anthony R. The Science of Social Influence: Advances and Future
Progress. New York: Frontiers of Social Psychology, 2007.
______.; ARONSON, Elliot. Age of Propaganda: The Everyday Use and Abuse of
Persuasion. New York: Holt Paperback, 2002.
RAMSØY, Thomas Zoëga. Attention & Conscioussness. Copenhagen:
Copenhagen Business School, 2014a. Arquivo digital em formato MP4 (17min30),
son., color. (vídeo-aula).
______. Introduction to Neuromarketing and Consumer Neuroscience. Rørvig:
Neurons Inc ApS, 2014b.
65
______. Tools - NeuroVision. Copenhagen: Copenhagen Business School, 2014c.
Arquivo digital em formato MP4 (14min45), son., color. (vídeo-aula).
REBER, Paul. What Is the Memory Capacity of the Human Brain? Scientific American.
[S.l.], jun. 2010. Disponível em: <http://www.scientificamerican.com/article/what-is-thememory-capacity/> Acesso em: 20 ago. 2015.
RIBEIRO, J. et al.. Tudo Que Você Queria Saber Sobre Propaganda e Ninguém
Teve Paciência para Explicar. São Paulo: Editora Atlas S.A., 1995.
RIES, Al; RIES, Laura. A Queda da Propaganda: Da mídia paga à mídia
espontânea. Rio de Janeiro: Campus, 2002.
SAMPAIO, Rafael. Propaganda de A a Z: Como Usar a Propaganda para Construir
Marcas e Empresas de Sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda, 2013.
SANT’ANNA, Armando; ROCHA JÚNIOR, Ismael; GARCIA, Luiz Fernando Dabul.
Propaganda – Teoria, Técnica e Prática. São Paulo: Cengage Learning, 2011.
SANTOS, Gilmar. Princípios da Publicidade. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005.
STERNBERG, Robert J. Psicologia Cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
2000.
THE UNIVERSITY OF UTAH. Programming and Prejudice: Utah Computer
Scientists Discover How to Find Bias in Algorithms. Salt Lake City: UNews, 14 ago.
2015. Disponível em: <http://unews.utah.edu/programming-and-prejudice> Acesso
em: 30 ago. 2015.
ZURAWICKI, Leon. Neuromarketing: Exploring the Brain of the Consumer. Berlim:
Springer, 2010.
66
ANEXO A – Peças contendo os princípios de Influência Social
Peça: Bikini – Cliente: Harvey Nichols
Peça: Shirt – Cliente: Harvey Nichols
Peça: Shoe – Cliente: Harvey Nichols
67
Peça: Old Tyler – Cliente: Mariscal Rock Radio
Peça: Old Richards – Cliente: Mariscal Rock Radio
68
Peça: Old McCartney – Cliente: Mariscal Rock Radio
Peça: Old Axl - Cliente: Mariscal Rock Radio
69
Peça: Old Dylan - Cliente: Mariscal Rock Radio
Peça: Rocket – Cliente: Sneaker Freaker Boogazine
70
Peça: Andy Warhol – Cliente: Cidade de Buenos Aires
71
Peça – Cliente: Cidade de Buenos Aires
72
Peça: Output – Cliente: Santa Teresa Rum
73
Peça: Choose – Cliente: Santa Teresa Rum
74
Peça: Hard Day – Cliente: Santa Teresa Rum
75
Peça: Philosophy – Cliente: Santa Teresa Rum
76
Peça: Be The Painter of Your Dreams – Cliente: List General Contractor
77
Peça: Be The Tailor of Your Dreams – Cliente: List General Contractor
78
Peça: Explore Your Dreams – Cliente: List General Contractor

Documentos relacionados