experimental e computacional.
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experimental e computacional.
ii Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Divisão de Informação e Documentação Cividanes, Luciana De Simone Estudo do Efeito da Uréia na Cinética de Cristalização de Mulita: Experimental e Computacional / Luciana De Simone Cividanes Coppio. São José dos Campos, 2009. 136f. Tese de mestrado – Curso de Engenharia Aeronáutica e Mecânica. Área de Física e Química dos Materiais Aeroespaciais – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, 2009. Orientador: Prof. Dr. Gilmar Patrocínio Thim. 1. Mulita. 2. Uréia. 3. Sol-Gel. 4. Cinética. 5. Simulação. I. Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial. Instituto Tecnológico de Aeronáutica. Divisão de Ensino Fundamental. II.Título REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CIVIDANES, Luciana De Simone. Efeito da Uréia na Cinética de Cristalização de Mulita: Experimental e Computacional. 2009. 136f. Tese de mestrado em Física e Química dos Materiais Aeroespaciais – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos. CESSÃO DE DIREITOS NOME DO AUTOR: LUCIANA DE SIMONE CIVIDANES COPPIO TÍTULO DO TRABALHO: EFEITO DA URÉIA NA CINÉTICA DE CRISTALIZAÇÃO DE MULITA: EXPERIMENTAL E COMPUTACIONAL. TIPO DO TRABALHO/ANO: Tese / 2009 É concedida ao Instituto Tecnológico de Aeronáutica permissão para reproduzir cópias desta tese e para emprestar ou vender cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. O autor reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta tese pode ser reproduzida sem a sua autorização (do autor). ___________________________ Luciana De Simone Cividanes Coppio Rua Madre Paula de São José, 86, apartamento 82B. 12243-010 - São José dos Campos - SP iii ESTUDO DO EFEITO DA URÉIA NA CINÉTICA DE CRISTALIZAÇÃO DE MULITA: EXPERIMENTAL E COMPUTACIONAL. Luciana De Simone Cividanes Coppio Composição da Banca Examinadora: Prof.a Prof. Prof. Prof. Dra. Deborah Dibbern Brunelli Dr. Gilmar Patrocínio Thim Dr. Francisco Cristovão Lourenço de Melo Dr. Celso Aparecido Bertran ITA Presidente - ITA Orientador - ITA Membro Interno - AMR/IAE/CTA Membro Externo - IQ/UNICAMP iv DEDICATÓRIA Ao Gustavo Aos meus pais A Deus v AGRADECIMENTOS A Deus, por estar sempre presente em minha vida, por me dar forças nos momentos difíceis e me ajudar a superar cada obstáculo. Ao Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) pela oportunidade de realização do Curso de Mestrado. À CAPES e FAPESP pelas bolsas de estudos concedidas. Ao Prof. Dr. Gilmar Patrocínio Thim pela oportunidade a mim concedida para a realização deste trabalho, por toda orientação, incentivo, confiança e amizade. Ao Prof. Dr. Celso Aparecido Bertran da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), pelo apoio e colaboração ao trabalho. A todos os professores do Departamento de Química do ITA, em especial à Prof.a Dra. Elizabete Yoshie Kawachi e à Prof. a Dra. Deborah Dibbern Brunelli. Ao funcionários do Departamento de Química do ITA, em especial ao Sílvio de Alvarenga Souza, Eduardo Aleixo de Almeida e à Sandra Andréia da Silva, pela colaboração e ajuda nos laboratórios. À Divisão de Materiais (AMR) do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) pelas análises de DRX, em especial ao Sr. Ronaldo Rodrigues da Cunha. Ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) pelas análises de DRX e MEV, em especial ao Sr. Francisco Augusto Souza Ferreira, ao Dr. João Paulo Barros Machado e à Sra. Maria Lúcia Brison. Ao Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) pelas análises de FTIR e TG/DTG. Ao Departamento de Engenharia de Materiais (DEMAR) da Escola de Engenharia de Lorena (EEL/USP) pelas análises de DSC, em especial ao Sr. Bento Ferreira. vi Ao amigos do curso de mestrado: Renata Rivero, Gorete Valus, Felipe Gonçalves, Jony Andrade, Carlos Brito, Robson Fleming, Adriana Pascoli, Mauro de Oliveira, Priscila Gomes, Priscilla Silva, Tiago Moreira e Bruno Cecarelli, pela amizade e por todos os momentos e alegrias. À Taysa Cristina de Oliveira pela colaboração no início do trabalho. Aos meus pais, Lucio e Eliana, pela educação, incentivo, amizade, conselhos, cobranças e apoio. Aos meus irmãos, Rafael e Filipe, pela amizade e apoio. Às pessoas que torceram por mim, em especial à Risolene dos Santos. Ao meu esposo Gustavo Coppio, pelo apoio, compreensão, incentivo e carinho nas horas mais difíceis. À todas as pessoas que contribuíram de forma direta ou indireta para a realização deste trabalho. vii RESUMO Devido às propriedades químicas, físicas e mecânicas da mulita, este material tem sido utilizado em peças sujeitas a grandes esforços mecânicos e submetidas a temperaturas elevadas. Suas propriedades estão correlacionadas com o método de síntese utilizado. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é estudar o efeito da uréia na cristalização da mulita, sintetizada através dos processos sol-gel coloidal e sol-gel polimérico. A adição da uréia em géis coloidais levou à obtenção de materiais mais puros e em temperaturas menores (efeito positivo), ao contrário do que ocorreu para os géis poliméricos (efeito negativo). O efeito da adição da uréia nas amostras coloidais foi estudado através das técnicas de DRX, FTIR, MEV, TG, DSC e simulação computacional. A cinética de cristalização de mulita ortorrômbica foi estudada utilizando o método isoconversional, não isotérmico, de Flynn-Wall-Ozawa. O efeito positivo da presença da uréia nos géis coloidais está relacionado à sua participação nas etapas de hidrólise e condensação do alumínio e do silício, através da interação da uréia com o alumínio, com a água e com o silanol, evitando a intensa segregação de fases, como foi mostrado pela simulação computacional. Já o efeito negativo causado pela uréia nos géis poliméricos ocorreu pela concorrência entre o silanol, o nitrato de alumínio e a uréia pelas poucas moléculas de água presentes nestas amostras. As amostras coloidais com uréia formaram mulita em maior quantidade e em menor temperatura, além de apresentarem maior proporção de silício/alumínio e menor porosidade. A amostra com maior concentração de uréia mostrou-se a mais homogênea, formando mulita em temperatura menor e não segregando a fase α-alumina. Os valores de energia de ativação encontrados para a amostra coloidal sem uréia foram menores em relação às amostras com uréia. Acredita-se que a extensa segregação de fases na amostra sem uréia tenha gerado uma quantidade muito pequena de materiais com elevada homogeneidade. As amostras coloidais apresentaram o mecanismo de Šesták e Berggren (SB) para a reação de cristalização de mulita ortorrômbica. viii ABSTRACT Due to the chemical, physical and mechanical properties of mullite, this material has been used in pieces submitted to large mechanic effort and subjected to high temperatures. Its properties are correlated with the synthesis method used. Thus, the objective of this work is to study the urea effect in the mullite crystallization, synthesized by the colloidal and polymeric sol-gel methods. The urea addition in colloidal gels led to the obtaining of more pure materials and at lower temperatures (positive effect), contrary to what occurred for the polymeric gels (negative effect). The effect of adding urea in colloidal samples was studied through the techniques of XRD, FTIR, SEM, TG, DSC and computational simulation. The orthorhombic mullite crystallization kinetic was studied using the isoconversional, non isothermal, Flynn-Wall-Ozawa method. The positive effect of the urea presence in colloidal gels is related to its participation in the hydrolises and condensation steps of aluminum and silicon, through the urea interaction with the aluminum, with the water and with the silanol, avoiding a intense phase segregation, as shown by computational simulation. But the negative effect caused by urea in polymeric gels occurred by competition between the silanol, aluminum nitrate and urea by the few water molecules present in these samples. The colloidal samples with urea formed mullite in larger amount and at lower temperature, and had higher proportion of silicon/aluminum and lower porosity. The sample with higher urea concentration was shown to be more homogeneous, forming mullite at lower temperature and not segregating the α-alumina phase. The activation energy values found for the colloidal sample without urea were lower than the samples with urea. It is believed that the extensive phases segregation in the sample without urea has generated a very small quantity of materials with high homogeneity. The colloidal samples showed the Šesták and Berggren (SB) model for the orthorhombic mullite crystallization reaction. ix LISTA DE FIGURAS Figura 1: Diagrama de fases do sistema Al2O3·SiO2 . ..................................................................................................18 Figura 2: Desenho esquemático da difusão a curta distância ......................................................................................21 Figura 3. Microscopia eletrônica de transmissão da interface de mulita . ....................................................................22 Figura 4: Mecanismos de reação para diferentes valores de ay e az .............................................................................37 Figura 5: Fluxograma para a síntese do ácido silícico..................................................................................................46 Figura 6: Fluxograma para preparação dos xerogéis pelo procedimento I. ..................................................................49 Figura 7: Fluxograma para preparação dos xerogéis pelo procedimento II .................................................................51 Figura 8: Fórmula estrutural do silanol ........................................................................................................................56 Figura 9: Fórmula estrutural do silanol dimérico .........................................................................................................56 Figura 10: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1000 °C por 2 horas . .............62 Figura 11: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1100 °C por 2 horas. ..............64 Figura 12: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1150 °C por 2 horas . .............65 Figura 13: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1200 °C por 2 horas . .............67 Figura 14: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C por 2 horas . .............69 Figura 15: Difratogramas de raios X das amostras TU-0, TU-1 e TU-3 queimadas a 1000 °C por 2 horas ................73 Figura 16: FT-IR para amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 350 °C.................................................................75 Figura 17: FT-IR para amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C...............................................................77 Figura 18: Razão da intensidade dos picos em 1170 cm-1 e 1130 cm-1 (denominada de I) pela razão molar de uréia e Al3+......................................................................................................................................................................79 Figura 19: Comparação da intensidade I dos espectros de FT-IR com a razão dos picos de mulita e NaCl dos difratogramas de raios X das amostras queimadas a 1250 °C, em função da razão molar de uréia e Al3+. ........80 Figura 20: Relação entre a razão das intensidades das bandas em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 (da análise por FT-IR) e a composição da mulita, x, da fórmula Al4+2xSi2-2xO10-x ....................................................................................81 Figura 21: Micrografias das amostras após serem queimadas a 1250 °C por 2 horas. .................................................83 Figura 22: Curvas de TG e DTG das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 após tratamento térmico por 2 horas a 200 °C..85 Figura 23: Curvas de DSC da amostra AU-0, para as velocidades de 10, 14 e 18 °C/min, utilizando 10 mg de massa em cada análise. ..................................................................................................................................................86 Figura 24: Curvas de DSC da amostra AU-0, para as velocidades de 10, 14 e 18 °C/min, utilizando 30 mg de massa em cada análise. ..................................................................................................................................................87 Figura 25: Deconvolução dos 5 picos exotérmicos da curva de DSC da amostra AU-0 para a velocidade de aquecimento de 10 °C/min..................................................................................................................................88 Figura 26: Curvas de DSC da amostra AU-0 para o pico de cristalização de mulita ortorrômbica no intervalo utilizado para o cálculo cinético..........................................................................................................................89 Figura 27: Fração de conversão de mulita ortorrômbica em função da temperatura para a amostra AU-0..................90 Figura 28: Gráfico de log β por 1/T para a fração de conversão de 5% da amostra AU-0. ..........................................91 Figura 29: Energia de ativação em função da fração de conversão de mulita ortorrômbica para a amostra AU-0. .....92 Figura 30: Energia de ativação em função da fração de conversão de mulita ortorrômbica para as frações de conversão de 5 a 65 % da amostra AU-0 . ..........................................................................................................93 Figura 31: Curvas de DSC das amostras AU-1 e AU-3 para as velocidades utilizadas no cálculo cinético. ...............95 Figura 32: Curvas de DSC das amostras AU-1 e AU-3 no intervalo utilizado para o cálculo cinético........................96 Figura 33: Fração de conversão de mulita em função da temperatura para as amostras AU-1 e AU-3........................97 Figura 34: Gráficos de log β por 1/T para a fração de conversão de 5% das amostras AU-1 e AU-3..........................98 Figura 35: Energia de ativação em função da fração de conversão para as amostras AU-1 e AU-3. ...........................98 Figura 36: Efeito de compensação cinética para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. ..................................................102 Figura 37: Curvas de y(α) e z(α) normalizadas em função da fração de conversão para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. ................................................................................................................................................................104 Figura 38: Gráfico de ln y por ln [αp(1- α)] para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. ..................................................107 Figura 39: Curvas de dα/dT experimental e simulada normalizadas em função da temperatura................................109 Figura 40: Curvas RDF para os átomos Si e Si_; Si = silício do silanol, Si_ = silício do silanol dimérico................110 Figura 41: Curvas RDF para os átomos Ow e Ou; Ow = oxigênio da água, Ou = oxigênio da uréia. ...........................111 Figura 42: Curvas RDF para os átomos Si e Ou; Si = silício do silanol, Ou = oxigênio da uréia................................111 Figura 43: Curvas RDF para os átomos Si_ e Ou; Si_ = silício do silanol dimérico, Ou = oxigênio da uréia.............112 Figura 44: Curvas RDF para os átomos Al e On; Al = Al3+, On = oxigênio do nitrato. ..............................................113 Figura 45: Curvas RDF para os átomos Al e Ow; Al = Al3+, Ow = oxigênio da água. ................................................114 x Figura 46: Curvas RDF para os átomos Al e Ou; Al = Al3+, Ou = oxigênio da uréia. ...............................................114 Figura 47: Gráficos da intensidade dos picos de mulita/NaCl das amostras queimadas a 1250 °C por 2 horas e do número de coordenação do Al em relação ao Ou para as diferentes razões molares de uréia/Al3+; Al = Al3+, Ou = oxigênio da uréia. ..........................................................................................................................................117 Figura 48: Curva RDF para os átomos Al e Si; Al = Al3+, Si = silício do silanol . ....................................................119 xi LISTA DE TABELAS Tabela 1: Resumo de métodos para obtenção de mulita...............................................................................................27 Tabela 2: Equações para f(α) em função do mecanismo cinético da reação.................................................................31 Tabela 3: Reagentes utilizados e suas características ...................................................................................................45 Tabela 4: Características dos géis preparados pela rota aquosa (procedimento I)........................................................49 Tabela 5: Características dos géis preparados pela rota alcoólica (procedimento II) ...................................................50 Tabela 6: Velocidades de aquecimento utilizadas no estudo cinético ..........................................................................55 Tabela 7: Quantidades de íons e moléculas utilizados na simulação computacional. ..................................................56 Tabela 8: Volume final das amostras nas simulações...................................................................................................57 Tabela 9: Resumo dos parâmetros de Van der Waals usados nas simulações .............................................................58 Tabela 10: Fases formadas para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 após a queima a várias temperaturas....................70 Tabela 11: Razão da intensidade do pico de mulita pelo pico de NaCl após a queima das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 a 1150, 1200 e a 1250 °C por 2 horas. ......................................................................................................71 Tabela 12: Posição e atribuição das bandas para os vários modos vibracionais das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 350 °C por 2 horas .........................................................................................................................76 Tabela 13: Posição e atribuição das bandas para os vários modos vibracionais das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C por 2 horas .......................................................................................................................78 Tabela 14: Porcentagem molar de alumina presente na mulita formada para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 após a queima a 1250 °C por 2 horas.............................................................................................................................81 Tabela 15: Temperaturas de pico de cristalização das cinco fases formadas durante a análise de DSC para a amostra AU-0. ..................................................................................................................................................................88 Tabela 16: Valores de Ea e lnA para cada fração de conversão de mulita ortorrômbica da amostra AU-0. .................94 Tabela 17: Valores de Ea e lnA para cada fração de conversão para as amostras AU-1 e AU-3................................100 Tabela 18: Valores de p, n e m encontrados para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. .................................................107 Tabela 19: Número de coordenação (n) do alumínio (Al) em relação ao oxigênio do nitrato (On), oxigênio da água (Ow) e ao oxigênio da uréia (Ou), e distância de cada um deles ao Al. .............................................................115 xii LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AIP Isopropóxido de alumínio AMR Divisão de Materiais do IAE ANN Nitrato de alumínio nonahidratado CuKα Radiação Kα de cobre D1 Mecanismo de difusão em uma dimensão D2 Mecanismo de difusão em duas dimensões (Equação Valensi) D3 Mecanismo de difusão em três dimensões (Equação Jander) D4 Mecanismo de difusão em três dimensões (Equação Ginstling-Brounshtein) DEMAR Departamento de Engenharia de Materiais DRX Difração de raios X DSC Calorimetria exploratória diferencial DTA Análise térmica diferencial DTG Derivada da curva termogravimétrica (TG) EEL Escola de Engenharia de Lorena FIR Infravermelho distante FT-IR Espectroscopia de absorção na região do infravermelho com transformada de Fourier IAE Instituto de Aeronáutica e Espaço INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais IQ Instituto de Química ITA Instituto Tecnológico de Aeronáutica JCPDS Joint Committee on Powder Diffraction Standards JMA Mecanismo de Johnson-Mehl-Avrami KCE Efeito de compensação cinética LAS Laboratório Associado de Sensores e Materiais LFV Leapfrog Verlet LJ Lennard-Jones MET Microscopia eletrônica de transmissão METV Microscopia eletrônica de transmissão com varredura MEV Microscopia eletrônica de varredura xiii MIR Infravermelho médio NIR Infravermelho próximo NPT Isotérmico-isobárico PT Mecanismo de Prout-Tomkins Pz Mecanismo de lei da potência R1 Mecanismo de ordem zero (Equação Polany-Winger) RDF Função de distribuição radial RMN Ressonância magnética nuclear RO Mecanismo de ordem da reação SB Mecanismo de Šesták e Berggren TEOS Tetraetilortossilicato TG Termogravimetria UNICAMP Universidade Estadual de Campinas LISTA DE SÍMBOLOS a Constante do efeito de compensação cinética A Fator pré-exponencial ou fator de frequência A* Absorbância Ai Área sob o pico de cristalização até uma temperatura i (Ti) Al Alumínio At Área total sob o pico de cristalização ay Fração de conversão para o máximo da função y(α) az Fração de conversão para o máximo da função z(α) b Constante do efeito de compensação cinética Cu Carbono da uréia d Espaço interplanar do cristal Ea Energia de ativação f(α) Mecanismo da reação g(α) Integral do mecanismo da reação H_ Hidrogênio do silanol xiv H2 Hidrogênio do silanol dimérico Hu Hidrogênio da uréia Hw Hidrogênio da água I Razão entre a intensidade dos picos em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 do FT-IR k Constante de velocidade da reação m Parâmetro cinético m* Porcentagem molar de alumina da mulita M0 Massa inicial do material Mf Massa final do material Mt Massa do material em um tempo t n Parâmetro cinético n* Número de coordenação N Número de mol nd Ordem da difração Nn Nitrogênio do nitrato Nu Nitrogênio da uréia O_ Oxigênio do silanol dimérico (centro) O1 Oxigênio do silanol (pontas) O5 Oxigênio do silanol dimérico (pontas) On Oxigênio do nitrato Ou Oxigênio da uréia Ow Oxigênio da água P Pressão p Parâmetro cinético q Carga elétrica R Constante dos gases rcut Raio de cutoff rij Distância entre duas moléculas e/ou íons R * Fator de correlação Rn Mecanismo controlado pela fronteira da fase Si Silício do silanol xv Si_ Silício do silanol dimérico t Tempo T Temperatura T* Transmitância Tamb Temperatura ambiente Tm Temperatura no pico de cristalização x Lacunas de oxigênio por célula unitária de mulita α Fração de conversão β Velocidade de aquecimento ε0 Constante de permissividade elétrica no vácuo εij Profundidade do poço de potencial θt Tempo generalizado θ Ângulo de difração λ Comprimento de onda da radiação incidente ρ Densidade numérica σij Distância de equilíbrio υ Número de ondas xvi SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................................17 1.1 MULITA ..............................................................................................................................................................17 1.2 PROCESSO SOL-GEL ...........................................................................................................................................23 1.3 EFEITO DA URÉIA ................................................................................................................................................25 1.4 CINÉTICA DE CRISTALIZAÇÃO ............................................................................................................................27 1.5 CÁLCULO DOS PARÂMETROS CINÉTICOS PELO MÉTODO ISOCONVERSIONAL .......................................................31 1.6 TÉCNICAS DE CARACTERIZAÇÃO EMPREGADAS ..................................................................................................37 1.6.1 Difração de Raios X (DRX) .......................................................................................................................37 1.6.2 Espectroscopia de absorção na região do infravermelho com transformada de Fourier (FT-IR) ............38 1.6.3 Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) ...........................................................................................39 1.6.4 Análises Térmicas: Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC), Análise Térmica Diferencial (DTA) e Termogravimetria (TG). .....................................................................................................................................40 1.7 SIMULAÇÃO ........................................................................................................................................................41 2 OBJETIVOS ............................................................................................................................................................44 3 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS.............................................................................................................45 3.1 REAGENTES UTILIZADOS.....................................................................................................................................45 3.2 PREPARAÇÃO DO ÁCIDO SILÍCICO .......................................................................................................................45 3.3 TRATAMENTO DA RESINA DE TROCA IÔNICA .......................................................................................................46 3.4 DETERMINAÇÃO DA CONCENTRAÇÃO DO ÁCIDO SILÍCICO...................................................................................47 3.5 PREPARAÇÃO DO SOL/GEL/XEROGEL ..................................................................................................................48 3.5.1 Procedimento I – Processo Sol-Gel Coloidal ............................................................................................48 3.5.2 Procedimento II – Processo Sol-Gel Polimérico .......................................................................................50 3.6 DESCRIÇÃO DAS ANÁLISES E DA PREPARAÇÃO DAS AMOSTRAS ..........................................................................52 3.6.1 Análise por DRX ........................................................................................................................................52 3.6.2 Análise por FT-IR ......................................................................................................................................53 3.6.3 Análise por MEV........................................................................................................................................53 3.6.4 Análise por TG / DTG................................................................................................................................54 3.6.5 Análise por DSC para cálculo cinético......................................................................................................54 3.7 ANÁLISE POR SIMULAÇÃO ..................................................................................................................................55 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................................................................................60 4.1 COMPARAÇÃO DOS GÉIS PREPARADOS PELOS PROCEDIMENTOS I E II..................................................................60 4.2 CARACTERIZAÇÃO POR DRX..............................................................................................................................61 4.3 CARACTERIZAÇÃO POR FT-IR ............................................................................................................................74 4.4 CARACTERIZAÇÃO POR MEV .............................................................................................................................82 4.5 CARACTERIZAÇÃO POR TG / DTG ......................................................................................................................84 4.6 CÁLCULO CINÉTICO............................................................................................................................................86 4.6.1 Cálculo dos parâmetros cinéticos (Ea e lnA) da amostra sem uréia (AU-0)..............................................86 4.6.2 Cálculo dos parâmetros cinéticos (Ea e lnA) das amostras com uréia (AU-1 e AU-3)..............................94 4.6.3 Efeito de compensação cinética para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3..................................................102 4.6.4 Cálculo do modelo da reação para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 .....................................................103 4.7 CARACTERIZAÇÃO POR SIMULAÇÃO .................................................................................................................109 5 CONCLUSÕES .....................................................................................................................................................121 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................124 6.1 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS ..........................................................................................................124 6.2 PRODUÇÃO CIENTÍFICA .....................................................................................................................................124 6.2.1 Artigos publicados em periódicos............................................................................................................124 6.2.2 Artigos Publicados em Anais de Congressos / Participações em Congressos.........................................125 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................................................126 17 1 INTRODUÇÃO 1.1 Mulita O primeiro diagrama de equilíbrio de fases do sistema Al2O3·SiO2 foi publicado em 1909 por Shepherd e colaboradores [1]. Até o momento (1909), acreditava-se que esse composto binário estável se referia à fase silimanita, cuja fórmula molecular é Al2O3·SiO2. Em 1924, Bowen e Greig mostraram que o aluminossilicato estável presente no sistema Al2O3·SiO2 tem composição 3Al2O3·2SiO2 (3/2) ao invés de Al2O3·SiO2 (1/1). Eles descobriram cristais do mineral com fase 3/2 em rochas naturais da Ilha de Mull, na Escócia. Sua formação ocorreu pelo aquecimento de aluminossilicatos, causado por atividade vulcânica. Bowen e Greig então propuseram denominar este mineral de mulita [2]. Mulita é a única fase cristalina estável no diagrama de equilíbrio de fases do sistema Al2O3·SiO2, sob pressão atmosférica, como é observado através da Figura 1 [3, 4]. Pelo diagrama de fases apresentado na Figura 1, observa-se a formação de uma solução sólida estável de mulita para uma composição no intervalo de 59 a 62,1 % em mol de Al2O3. Abaixo deste intervalo, há a formação de mulita juntamente com sílica, e, acima desta faixa, mulita coexiste com a fase alumina. Mulita ainda pode ser encontrada até uma composição de aproximadamente 75,5 % em mol de Al2O3 na fase metaestável. O material mulita apresenta duas estruturas cristalinas estequiométricas: a tetragonal (2Al2O3·SiO2) e a ortorrômbica (3Al2O3·2SiO2). A estrutura ortorrômbica, mais estável, corresponde a uma cela unitária de parâmetros: a=0,76 nm, b=0,77 nm, c=0,29 nm, sendo que o cristal apresenta um desdobramento do pico no difratograma de raios X próximo a 26° (2θ CuKα), referente aos planos cristalinos 120 e 210 [5-8]. 18 Figura 1: Diagrama de fases do sistema Al2O3·SiO2, adaptado de [4]. Por outro lado, a estrutura tetragonal (a=b), fase metaestável, é caracterizada por um único pico no difratograma de raios X em 26o (2θ - CuKα) [5-8]. Uma outra fase que pode aparecer na síntese de aluminossilicatos é uma fase intermediária do tipo espinélio, com uma cristalinidade reduzida e que é caracterizada pelos picos no difratograma de raios X em 46 e 67º [9-11]. Até o momento, a composição desta fase intermediária é controversa. Low e McPherson [12], a partir de investigações por espectroscopia de absorção no infravermelho, mostraram que a 19 composição da fase espinélio era de 2Al2O3.SiO2, ou seja, 2/1, enquanto que Wei e Halloran [13] e Komarneni e Roy [14], com base na microscopia eletrônica de transmissão e RMN de 29 Si, concluíram que a fase é composta essencialmente de um óxido de alumínio puro. Okada e Otsuka [15] compararam o espectro de infravermelho da γ-alumina pura com a fase espinélio derivada de um gel e mostraram que a relação Al2O3/SiO2 na fase espinélio é de 6/1. Schneider e colaboradores [16] re-examinaram a composição da fase espinélio entre as temperaturas de 350 e 1150 °C e concluíram que, acima de 350 °C, esta fase contém cerca de 12 % em mol de SiO2, sendo que até 750 °C a composição permanece constante. Porém, acima desta temperatura, o conteúdo de SiO2 aumenta gradualmente até chegar a 18% em 1150 °C. A formação da fase espinélio na síntese da mulita é um indicativo da falta de homogeneidade dos precursores, resultante, por exemplo, da dificuldade do controle da velocidade de hidrólise dos alcóxidos empregados [17]. Mulita é um material refratário com grandes aplicações tecnológicas. Este material tem tido um interesse considerável em décadas recentes devido às suas propriedades, dentre elas: baixa expansão térmica e conseqüentemente alta estabilidade térmica, baixa densidade, baixa condutividade térmica, boa resistência mecânica e resistência à fluência, boa estabilidade em ambientes químicos severos, entre outras [18-19]. Por possuir essas propriedades, a mulita é utilizada na fabricação de tijolos, cadinhos, tubos e revestimentos para fornos, termopares e trocadores de calor de alta temperatura (1450 ºC), substratos de circuitos integrados, e ainda como janelas ópticas em uma faixa de comprimento de onda no infravermelho (3 a 5 µm) [2024]. Os mecanismos das reações para a formação da mulita podem variar consideravelmente de acordo com os precursores e os métodos empregados [20]. Precursores quimicamente 20 sintetizados se convertem em mulita em uma faixa de temperatura entre 850 e 1350 °C, sendo que a sua escala de homogeneidade química é quem determina o mecanismo de formação da mulita e, conseqüentemente, a sua temperatura de cristalização. Quando o precursor apresenta um alto grau de homogeneidade, a temperatura mínima de formação de mulita é baixa [25]. Na literatura verifica-se uma variedade de metodologias de síntese de materiais cerâmicos, entre elas: misturas de reagentes no estado sólido, coprecipitação de misturas de sais em solução, sol-gel, "spray" pirólise, etc [20]. Cada um desses métodos apresenta a sua peculiaridade, que dependendo da aplicação e do valor agregado ao produto final, justifica a sua aplicação. O processo sol-gel tem sido muito utilizado por gerar produtos com elevada pureza e homogeneidade, além de sua versatilidade e boa reprodutibilidade [26]. Os géis obtidos no processamento sol-gel têm sido divididos em dois tipos: monofásico e difásico [13, 19, 27]. Géis monofásicos ocorrem quando o alumínio e o silício são misturados em nível atômico. Estes géis são formados pela substituição do elemento silício, da rede tridimensional de sílica, por átomos e/ou moléculas hidrolisadas de alumínio, originando ligações Al-O-Si similares àquelas formadas durante a etapa de cristalização da mulita [19-20, 28-29]. Os géis monofásicos cristalizam a mulita ortorrômbica (a fase mais estável) sem a cristalização de fases intermediárias, a uma temperatura de aproximadamente 980 °C [20, 30-32]. Uma mistura de sílica e alumina em escala atômica pode ser originada por hidrólises lentas de uma mistura de alcoóxidos e soluções salinas [20]. Acredita-se que o processo de cristalização de mulita seja controlado pela etapa de nucleação, visto que a velocidade deste processo é dependente da presença de agentes nucleantes [33-34]. A energia de ativação para cristalizar mulita a partir de géis monofásicos está na faixa de 290 a 400 kJ/mol [20]. 21 Já géis difásicos são formados quando a escala de homogeneidade encontra-se entre 1 e 100 nm. Para este tipo de precursor normalmente há a formação de fases transientes anteriormente à cristalização da mulita, que em geral ocorre em temperaturas próximas a 1300 °C. Géis difásicos podem ser formados através de hidrólise rápida de soluções alcoóxidas ou salinas. Para este tipo de gel, a energia de ativação para a cristalização de mulita é da ordem de 1000 kJ/mol [20]. W. C. Wei e colaboradores [13] mostraram, em 1988, que mulita proveniente de gel difásico se cristaliza por volta de 1200 °C, a partir da seguinte reação química: 3( δ -Al2O3) + 2(SiO2-amorfo) → 3Al2O3.2SiO2 (1) O estudo realizado resultou na proposta de um modelo para o processo de cristalização baseado na formação de uma interface de mulita entre os grãos de alumina e sílica, e o mecanismo de crescimento seria controlado pela difusão de silício e alumínio nesta interface (Figura 2). Somente em 2001, G. Ziegler e colaboradores [33] mostraram claramente, através de microscopia eletrônica de transmissão, a formação desta interface entre as partículas (Figura 3). Figura 2: Desenho esquemático da difusão a curta distância [13]. 22 Figura 3. Microscopia eletrônica de transmissão da interface de mulita [33]. Sundaresan e colaboradores [29] propuseram, em 1991, que o processo de cristalização de mulita se inicia com a etapa de dissolução de alumina na fase de sílica amorfa. Quando a concentração de alumina atinge o limite de solubilidade ocorre precipitação de mulita, dando início, nestes pontos, à nucleação de mulita. Portanto, a velocidade de crescimento dos grãos de mulita seria controlada pela velocidade de dissolução de alumina na matriz amorfa [29, 35]. Os estudos realizados por Wei (1988) [13] e Sundaresan (1991) [29] mostraram que a matriz amorfa se cristaliza diretamente em mulita tetragonal e posteriormente em mulita ortorrômbica [13, 29]. Por outro lado, vários autores têm descrito a formação de uma fase intermediária do composto aluminossilicato, concomitantemente à formação de mulita tetragonal, que precede a formação da mulita ortorrômbica [10, 36]. O trabalho desenvolvido por Jaymes e colaboradores [19], em 1996, utilizando pós-precursores de mulita provenientes de géis mono e difásicos, mostrou mudanças no número de coordenação de átomos de Si e de Al durante o processo de cristalização de mulita. Jaymes verificou que o tipo de transformação envolvida 23 dependia do arranjo a curta distância ao redor dos átomos de alumínio. A análise dos pósprecursores obtidos por géis monofásicos mostrou que a concentração de cátions alumínio hexacoordenado diminuía significativamente - aumentando a de tetracoordenado - por volta de 980 °C e ocorria a cristalização de mulita ortorrômbica. Enquanto que pós-precursores obtidos de géis difásicos levavam à formação do intermediário aluminossilicato (espinélio) apresentando uma maior concentração de alumínio hexacoordenado [19]. Apesar do gel monofásico cristalizar mulita a uma temperatura menor do que o gel difásico, a densificação das cerâmicas induzida pela sinterização é mais difícil de ocorrer neste material. Isso porque a difusão da mulita é um processo muito lento, e então não há tempo suficiente para a densificação na cristalização dos géis monofásicos. Esse problema é solucionado no caso de géis difásicos [3, 37]. 1.2 Processo Sol-Gel O processo sol-gel é uma rota sintética capaz de gerar boa mistura e uniformidade dos materiais iniciais, em escala nanométrica, resultando em uma distribuição muito homogênea dos componentes. Como conseqüência do alto grau de homogeneidade do precursor, a temperatura requerida para a formação de mulita é relativamente baixa (entre 1000 e 1350 °C) se comparada com métodos tradicionais, como mistura de pós reativos (entre 1500 e 1700 °C) [28-29, 32, 38]. O sol é constituído de uma suspensão de partículas coloidais com dimensão entre 1 e 1000 nm em um líquido. Já o gel é formado pela estrutura rígida de partículas coloidais (gel coloidal) ou de cadeias poliméricas (gel polimérico) que imobilizam a fase líquida nos seus interstícios [39]. 24 Sol-gel é uma denominação aplicada a qualquer processo que envolve uma solução ou um sol que passa por uma transição chamada sol-gel. Nessa transição, a solução ou sol transforma-se em gel pelo estabelecimento de ligações químicas entre as partículas ou entre as espécies moleculares, levando à formação de uma rede sólida tridimensional [39-40]. Após a transição sol-gel, o solvente é removido através de secagem convencional, utilizando-se estufas ou secagem natural, formando os xerogéis, ou pode ser removido por secagem supercrítica, dando origem aos aerogéis [41]. O método sol-gel pode ser dividido basicamente em dois tipos: o coloidal e o polimérico. O primeiro parte de uma dispersão coloidal, onde o gel é formado através das interações partícula-partícula e partícula-solvente de um sistema coloidal. Já o segundo tem como precursores os alcóxidos metálicos, que são hidrolisados para a formação do gel [42]. Por exemplo, a formação do gel a partir de um sol de ácido silícico ocorre pela reação de condensação das espécies presentes no sol, e, neste caso, temos um processo sol-gel coloidal. [40]. Um exemplo do método sol-gel polimérico é o sistema tetraetilortossilicato (o TEOS, que é um alcóxido de silício), água e etanol. Neste caso o processo pode ser dividido em duas etapas: a hidrólise e a condensação dos precursores [43]. A água hidrolisa sucessivamente os grupos etóxi (Si(OC2H5)) do TEOS, formando silanol (SiOH) e etanol. A condensação pode ocorrer entre o silanol e um grupo etóxi, dando origem ao grupo formado pela ligação Si-O-Si, ou pode ocorrer entre dois grupos silanóis [44]. HIDRÓLISE: ≡Si(OC2H5) + H2O → ≡SiOH + C2H5OH (2) CONDENSAÇÃO: ≡Si(OC2H5) + HOSi≡ → ≡SiOSi≡ + C2H5OH (3) ≡SiOH + HOSi≡ → ≡SiOSi≡ + H2O (4) 25 A hidrólise ocorre simultaneamente à condensação. Assim que o grupo silanol é formado, ele pode reagir com o grupo etóxi formando as ligações Si-O-Si. Muitos fatores influenciam as velocidades das reações de hidrólise e condensação, as quais, por sua vez, ditam as propriedades do material final. Entre estes fatores estão o pH do meio, a quantidade de água, a natureza e a concentração do catalisador e o tipo do precursor alcóxido. As propriedades físicas do xerogel dependem fortemente dos parâmetros utilizados no processo de sol-gel. Por exemplo, preparações em meio ácido e com baixo teor de água produzem, em geral, materiais densos com menor tamanho de poros, enquanto soluções básicas e com grande quantidade de água produzem materiais mais porosos. Isto porque, sob condições de catálise ácida, a condensação ocorre preferencialmente entre os grupos silanóis localizados em monômeros ou no final de cadeias poliméricas. Esta condensação leva à formação de géis compostos de cadeias poliméricas lineares, as quais, após secagem, formam uma matriz de baixo volume de poro. Já sob condições básicas, a condensação ocorre preferencialmente entre oligômeros altamente ramificados, os quais levam à formação de géis particulados que, após secagem, produzem materiais com alta porosidade. O tamanho do grupo alcóxido também influencia a velocidade das reações de hidrólise e condensação, devido a fatores estéricos. Um aumento no tamanho do grupo alcóxido diminui a velocidade de hidrólise [45-47]. 1.3 Efeito da uréia A diferença de reatividade dos materiais de partida utilizados no pocesso sol-gel pode ocasionar uma segregação de fases. Entretanto, o nível de homogeneidade pode ser controlado pela ação de aditivos químicos, como a uréia, o ácido cítrico, EDTA, entre outras. Estes aditivos atuam no processo de síntese através do controle das etapas de complexação, hidrólise e 26 condensação dos materiais de partida, alterando a cinética de cristalização de materiais cerâmicos [40, 48-49]. A uréia pode ainda evitar um dos mais sérios problemas da produção de géis sintetizados a partir do processo sol-gel, que é a fratura e quebra da amostra durante a conversão de gel para xerogel. Esta quebra ocorre devido às forças capilares que aparecem durante a secagem. Já foi demonstrado que o uso de aditivos como a formamida, o ácido oxálico e a uréia controlam eficientemente a formação de poros durante o processo de secagem. Os géis preparados com a adição destes aditivos apresentam distribuições uniformes de poros, evitando posteriores fraturas que poderiam ser causadas devido à diferença de forças capilares nas paredes dos poros [42]. Thim e co-autores [50], em 2001, estudaram xerogéis precursores de mulita obtidos através de géis preparados com sol de sílica, nitrato de alumínio e uréia. Eles verificaram, através de análises de ressonância magnética nuclear (RMN) de 27Al, a presença de picos que indicavam a presença de átomos de Al em diversos ambientes químicos. Cálculos matemáticos, utilizando Monte Carlo, mostraram que a uréia substitui duas moléculas de água na primeira esfera de coordenação do alumínio [50]. Estudos posteriores, realizados por Campos e colaboradores, mostraram que precursores formados por ácido silícico, nitrato de alumínio e uréia cristalizavam mulita com energia de ativação de 730 ± 150 kJ/mol, em temperaturas próximas de 1200 °C, passando pela etapa de formação do composto aluminossilicato tipo espinélio [51]. De tudo o que foi exposto até aqui, pode-se concluir que existem diversas formas para se obter mulita. A Tabela 1 mostra um resumo de alguns métodos encontrados na literatura para a preparação do precursor, com os principais reagentes utilizados e a temperatura de cristalização de mulita e/ou outras fases. 27 Tabela 1: Resumo de métodos para obtenção de mulita Reagentes TEOS + sec-Al(OC4H9)3 + (álcool + cetona) ou + (álcool + água) TEOS + ANN + água T(°C) 1200 Fases formadas espinélio → mulita ortorrômbica Ref. 52-53 1300 52 TEOS + ANN + etanol TEOS + ANN + etanol + NH3 TEOS + ANN + água + NH3 TEOS + ANN + água + uréia TEOS + ANN + AIP + água TEOS + AIP + etanol + água 980 1200 1300 1300 1000 1200 espinélio → α-alumina + espinélio → mulita ortorrômbica + α-alumina (1200 °C ) → mulita ortorrômbica mulita tetragonal espinélio → mulita tetragonal mulita tetragonal + espinélio (1200 °C ) → mulita tetragonal mulita tetragonal (980 °C) → mulita ortorrômbica mulita tetragonal (traços) → mulita tetragonal espinélio + mulita ortorrômbica (1000 °C ) → mulita ortorrômbica espinélio → mulita ortorrômbica baierita → δ-alumina → (δ,θ)-alumina → mulita* + (δ,θ)alumina (1250 °C) → mulita* θ-alumina → mulita* + cristobalita mulita tetragonal (980 °C) → mulita ortorrômbica mulita tetragonal (980 °C) → mulita ortorrômbica TEOS + boemita + água 1250 1350 TEOS + AlCl3.6H2O + água + álcool + NH3 Sílica coloidal + ANN + água 1200 Ac. silícico + ANN + uréia 1300 TESPA + ANN + água + ác. 1300 cítrico + NH3 AIP: isopropóxido de alumínio (Al(OC3H7)3), boemita: γ-AlOOH, TESPA: (C2H5O)3Si(CH2)3NH2, Al(NO3)3.9H2O, *não especifica qual tipo de mulita. 31, 53-54 31 53 28, 55 31, 56 57 58 11 59 19 19 ANN: Pode ser observado pela Tabela 1 que a temperatura de cristalização, assim como as fases cristalizadas, diferem bastante de acordo com as fontes de sílica e alumínio utilizadas, a presença ou não de aditivos, o tipo de solvente utilizado etc. 1.4 Cinética de Cristalização Cinética química é uma ciência que estuda a velocidade das reações. Apesar de existir muitas razões para se quantificar a velocidade de uma reação química, dois motivos são particularmente importantes. O primeiro é que obtendo um mecanismo da velocidade da reação em função de variáveis estáveis como temperatura, pressão e concentração, a velocidade da reação pode ser prevista para quaisquer outras condições, não importando se a velocidade foi medida ou não nessas condições. O segundo grande motivo para estudar a cinética é investigar os mecanismos de reação [60]. Isso porque pequenas variações nas rotas de sínteses de materiais podem levar a bruscas mudanças no mecanismo da reação de cristalização, nos valores de energia 28 de ativação de nucleação, cristalização ou difusão, e nas constantes de velocidade [61-62]. Mudanças nos mecanismos podem originar síntese de materiais com estequiometria diferente das desejadas, levando à formação de fases (cristalinas ou não) metaestáveis. Alterações nos valores de energia de ativação e constantes de velocidade podem gerar um aumento significativo da energia por mol por tempo e/ou do tempo necessário para se completar uma transformação química ou física [62]. Dados de cinética do estado sólido são de interesse para um grande e crescente número de processos tecnológicos importantes, como decomposição térmica de sólidos cristalinos e materiais energéticos, oxidação térmica e decomposição de polímeros, cristalização de materiais cerâmicos e polímeros e solidificação de ligas metálicas. As técnicas experimentais mais comuns empregadas no estudo cinético de reações ativadas termicamente são: termogravimetria (TG), calorimetria exploratória diferencial (DSC) e análise térmica diferencial (DTA). A técnica de TG, por exemplo, mede a perda de massa de uma amostra devido à formação de gás em função do tempo e/ou temperatura durante um programa de aquecimento específico. A velocidade de reação encontrada pelo TG corresponde à velocidade de formação do gás, que pode ou não ser um processo interessante. Já a técnica de DSC mede a energia necessária para manter a amostra e um material de referência na mesma temperatura através de um programa de temperatura. Similarmente, a técnica de DTA mede a diferença de temperatura entre a amostra e um material de referência quando ambos são submetidos ao mesmo fluxo de calor [60, 63-64]. A cinética de reações estimuladas termicamente é normalmente estudada sob condições de aquecimento isotérmico ou não isotérmico. O principal problema do experimento isotérmico é o tempo que a amostra requer para alcançar a temperatura experimental [60]. Em experimentos isotérmicos é necessária a execução de um salto repentino da temperatura no início da análise. 29 Essa temperatura não é alcançada instantaneamente, além de ser necessário um tempo para a estabilização do equipamento [63]. Durante este período de aquecimento não isotérmico, a amostra passa por algumas transformações que podem afetar os resultados da análise cinética. A situação gera ainda mais erros no caso de processos típicos do estado sólido, em que a velocidade máxima de reação ocorre no começo da transformação. Um aquecimento não isotérmico resolve este problema, e tem se tornado mais popular do que os experimentos clássicos isotérmicos [60]. Entretanto, estudos cinéticos não isotérmicos são sujeitos a críticas por apresentarem resultados muito diferentes dos realizados pelo método isotérmico. Isso ocorre principalmente por dois motivos: a diferença na faixa de temperatura em que são conduzidos os experimentos isotérmicos e não isotérmicos, e o ajuste forçado de um mecanismo de reação aos dados não isotérmicos [63]. O primeiro motivo vem das condições experimentais, já que análises não isotérmicas geralmente são realizadas em uma faixa maior de temperatura. Assim, para um processo de várias etapas onde cada uma delas tem uma energia de ativação diferente, a contribuição relativa dessas energias para a reação global varia com a temperatura. Isso significa que a energia de ativação para o processo global será diferente em regiões de temperatura distintas. Brown e colaboradores [65] recomendaram o uso de baixas velocidades de aquecimento par alcançar uma melhor correspondência entre os resultados obtidos de experimentos isotérmicos e não isotérmicos. O motivo mais claro para a inconsistência dos parâmetros cinéticos oriundos de experimentos isotérmicos e não isotérmicos é o fato de, geralmente, se forçar o ajuste de um mecanismo de reação aos dados experimentais. Há dois problemas para o método que ajusta um mecanismo de reação [63]. O primeiro é que ele não é aplicável a dados obtidos não isotermicamente , pois quando se trabalha em condições não isotérmicas, a velocidade da reação em todos os tempos depende tanto 30 do mecanismo da reação, f(α), como da constante de velocidade, k(T). Isto pode ser observado através da fórmula geral que descreve a velocidade de uma reação no estado sólido [60, 66, 67]: dα = k (T ). f (α ) dt (5) Em que α é a fração de conversão, t é o tempo, k(T) é a constante de velocidade da reação e f(α) é o mecanismo da reação. Assim, a determinação de f(α), do fator pré-exponencial ou fator de freqüência, A, e da energia de ativação, Ea, chamados de tripleto cinético, é um problema interligado. Portanto, o ajuste de um mecanismo de reação a dados não isotérmicos geralmente falha em encontrar uma clara separação entre f(α) e k(T), já que tanto α como T variam simultaneamente [63, 66]. O segundo problema fundamental é que a aplicação de um mecanismo de reação resulta em um único par dos parâmetros de Arrhenius (Ea e A). Mas a maioria das reações do estado sólido não são processos simples de uma única etapa, e sim uma combinação de etapas elementares em série ou paralelas, o que pode mudar a energia de ativação durante a reação. Então a energia de ativação varia com a extensão da reação, ou seja, Ea varia com α [63]. Parâmetros cinéticos confiáveis só podem ser encontrados quando não há a dependência de um mecanismo de reação, ou seja, quando se utiliza método livre de mecanismo. Os métodos livres de mecanismos são melhor representados pelo método isoconversional, o qual calcula a energia de ativação e o fator pré-exponencial para cada fração de conversão [60, 63]. A principal vantagem do método isoconversional está na determinação da energia de ativação sem haver a necessidade de supor um mecanismo cinético, ou seja, de se presumir a forma da função f(α). Esse método, livre de mecanismo, tem como suposição básica que a velocidade da reação a uma conversão constante depende somente da temperatura, e o mecanismo da reação não depende da temperatura ou da velocidade de aquecimento, e sim apenas da fração de conversão [66]. 31 Portanto, o método isoconversional produz resultados cinéticos consistentes tanto para experimentos isotérmicos como não isotérmicos [63]. 1.5 Cálculo dos parâmetros cinéticos pelo método isoconversional Como já foi mostrado pela Equação 5, a velocidade da reação depende do mecanismo da reação, f(α). Na Tabela 2 estão listadas várias fórmulas para f(α) [68-75]. Tabela 2: Equações para f(α) em função do mecanismo cinético da reação. Mecanismo Šesták e Berggren (autocatalítico, mecanismo geral) Johnson-Mehl-Avrami (nucleação e cresimento) Ordem da Reação Símbolo SB (m, n) f(α) JMA (n*=0,5;1; 1,5; 2; 2,5; 3; 4) n(1 − α )[− ln(1 − α )]1−1 / n RO (n) (1 − α ) n Controlado pela fronteira da fase Rn (n=2:contração de área, n=3: contração de volume) R1 n(1 − α )1−1 / n 1 D1 D2 1 / 2α − (1 / ln(1 − α )) D3 3(1 − α ) 2 / 3 /(2[1 − (1 − α )1 / 3 ]) D4 3 /( 2[(1 − α ) −1 / 3 − 1]) PT α (1 − α ) zα [1−(1 / z )] Ordem Zero (Equação Polany-Winger) Difusão em uma dimensão Difusão em duas dimensões (Eq. Valensi) Difusão em três dimensões (Eq. Jander) Difusão em três dimensões (Eq. Ginstling-Brounshtein) Prout-Tomkins Lei da Potência Pz α m (1 − α ) n *Quando a velocidade de crescimento do núcleo é proporcional à área da interface o valor de n é um número inteiro, e quando a velocidade de crescimento é controlada pela difusão do núcleo, n não é um número inteiro. A fração de conversão α pode ser definida como: α= M0 − Mt M0 − M f (6) Em que M0 é a massa inicial do material que se deseja estudar a cinética, Mt a massa da amostra em um tempo t e Mf a massa final. 32 A partir de curvas de DSC/DTA, pode-se determinar a fração de conversão do material analisado através da Equação 7, α= Ai At (7) Em que Ai é a área sob o pico de cristalização do material até uma temperatura Ti, e At é a área total. Integrando a Equação 5 obtém-se a Equação 8 [66, 68, 70]: α g (α ) = ∫ 0 d (α ) = k ⋅t f (α ) (8) Em que g(α) é a integral representativa do mecanismo da reação. A dependência da temperatura com a constante de velocidade é descrita pela Equação de Arrhenius [63, 67]: k = A ⋅ e − Ea / RT (9) Em que A é o fator pré-exponencial (ou fator de freqüência), Ea é a energia de ativação, T é a temperatura absoluta e R é a constante dos gases. Substituindo a Equação 9 na Equação 5, e a Equação 9 na Equação 8, encontra-se, respectivamente, as Equações 10 e 11: dα = A ⋅ e − Ea / RT ⋅ f (α ) dt (10) g (α ) = A ⋅ e − Ea / RT ⋅ t (11) Os parâmetros cinéticos podem ser obtidos a partir de dados não isotérmicos através da transformação da velocidade da reação, como é mostrada na Equação 12 [67, 70, 74]: dα dα dt = ⋅ dT dt dT (12) 33 Em que dt 1 = dT β (13) dT dt (14) e β= Em que T é a temperatura e β é a velocidade de aquecimento. A velocidade da reação isotérmica é dα/dt, enquanto que a velocidade da reação não isotérmica é dα/dT. Substituindo as Equações 10 e 13 na 12 encontra-se uma expressão para a velocidade não isotérmica da reação [67, 70, 73]: dα A.e − Ea / RT = ⋅ f (α ) β dT (15) Integrando a Equação 15: g (α ) = A T e β∫ − E a / RT ⋅ dT (16) 0 Substituindo Ea/RT por x e transformando os limites da integral [66, 67, 73]: g (α ) = A ⋅ Ea β ⋅R ∞ e−x ∫x x 2 ⋅ dx (17) Que pode ser escrita como: g (α ) = A ⋅ E a ⋅ p( x) β ⋅R (18) Em que: ∞ e−x ⋅ dx 2 x x p( x) = ∫ (19) 34 A integral exponencial p(x) não tem solução analítica, mas muitas aproximações. O método de Flynn-Wall-Ozawa é um método isoconversional que utiliza a aproximação linear de Doyle [75, 76] para p(x), através da qual a Equação 18 é transformada na Equação 20: log β = log A ⋅ Ea E − 2,315 − 0,457 ⋅ a g (α ) ⋅ R RT (20) Diferenciando e supondo α constante [66, 67, 69]: d log β ⎛ 0,457 ⎞ = −⎜ ⎟ ⋅ Ea d (1 / T ) ⎝ R ⎠ (21) Assim, plotando log β por 1/T para cada α, encontra-se a Ea a partir do coeficiente angular da curva, o que permite calcular uma energia de ativação para cada fração de conversão. Além disso, pode-se verificar se o mecanismo de reação é o mesmo para todas as velocidades de aquecimento e para todas as amostras, através do efeito de compensação cinética [77]. Um problema do método original de Flynn-Wall-Ozawa é não sugerir uma forma direta para o cálculo do fator pré-exponencial ou do mecanismo da reação. Porém, após estimar a energia de ativação pelo método livre de mecanismo, muitos métodos podem ser utilizados para determinar o mecanismo da reação e o fator pré-exponencial. Entretanto, para todos estes métodos, a determinação do fator pré-exponencial só é possível assumindo um mecanismo de reação [60]. O fator pré-exponencial pode ser determinado pelo método de Kissinger para uma reação de primeira ordem, ou seja, para f(α) = 1-α. Assim, a Equação 15 transforma-se em [63]: dα A.e − Ea / RT = ⋅ (1 − α ) dT β Derivando a Equação 22 encontra-se a Equação 23: (22) 35 E ⎞ d 2α ⎛ A ⎞⎛ E a ⎞ − Ea / RT ⎛ A ⎞ − Ea / RT ⎛ dα − ⎜⎜ ⎟⎟ ⋅ e ⋅⎜ + α ⋅ a2 ⎟ = ⎜⎜ ⎟⎟⎜ ⎟e 2 2 dT RT ⎠ ⎝ dT ⎝β ⎠ ⎝ β ⎠⎝ RT ⎠ ( ) (23) Quando a velocidade de reação é máxima (o que ocorre no pico máximo da curva de DTA/DSC), a Equação 23 é igualada a zero, ou seja: d 2α =0 dTm2 (24) Ea dα α ⋅ E a = + 2 RTm dT RTm2 (25) Em que Tm é a temperatura no pico da curva de DTA/DSC. Substituindo a Equação 22 na Equação 25 e rearranjando obtém-se [63]: A= β ⋅ Ea ⋅ e E RTm a / RTm 2 (26) Assim, pode-se calcular o valor de A para cada fração de conversão, uma vez que os valores de Ea para cada fração de conversão já foram determinados. A forma da curva da energia de ativação pelo fator de conversão ajuda a descobrir a complexidade do processo. Se a energia de ativação variar com o grau de conversão, então a reação tem um mecanismo complexo. Caso contrário, isto é, quando a energia de ativação não variar, pode-se concluir que a reação ocorre em uma única etapa [60, 70]. A relação linear entre lnA versus Ea, o chamado efeito de compensação cinética (KCE), é verificada na literatura para reações similares ou para uma mesma reação sob diferentes condições experimentais. Esta linearidade indica que o mecanismo de reação é o mesmo para a reação estudada. O efeito de compensação cinética pode ser expresso pela Equação 27 [66, 68, 77]: ln A = a + (b ⋅ E a ) (27) 36 Em que a e b são constantes relacionadas às características da reação estudada. Após determinar a energia de ativação é possível encontrar o mecanismo cinético que melhor descreve a reação. O mecanismo da reação pode ser encontrado através das funções y(α) e z(α), definidas a partir do conceito de tempo generalizado, θt, introduzido por Ozawa [78, 79]: θ t = ∫ e −E a / RT ⋅ dt (28) Diferenciando a Equação 28: dθ t = e − Ea / RT dt (29) Substituindo a Equação 14 na 28: θt = ∫ e − Ea / RT β ⋅ dT (30) Combinando as Equações 10, 14 e 29 e rearranjando, encontra-se a Equação 31 [71, 80]: y (α ) = dα dα = A ⋅ f (α ) = ⋅ β ⋅ e Ea / RT dθ t dT (31) Em que dα/dθt corresponde à velocidade generalizada da reação, obtida pela extrapolação de dα/dt a uma temperatura infinita. Integrando a Equação 31 e rearranjando-a: α g (α ) = ∫ 0 θ t dα = A ⋅ ∫ dθ t = A ⋅ θ t f (α ) 0 (32) Pela combinação das Equações 31 e 32, pode-se obter uma expressão geral para a função z(α) [72]: z (α ) = y (α ) ⋅ θ t = dα ⋅ θ t = f (α ) ⋅ g (α ) dθ E então substituindo a Equação 30 na Equação 33: (33) 37 z (α ) = y (α ) ⋅ ∫ e − Ea / RT β ⋅ dT (34) Assim, pode-se encontrar as funções y(α) e z(α), e desta forma determina-se o mecanismo da reação através dos máximos dessas funções, ay e az, respectivamente, de acordo com a Figura 4 [72, 81]. As siglas dos mecanismos mostradas na Figura 4 estão de acordo com a Tabela 2 anteriormente mostrada. convexo az > 0,633 → RO (n < 1) ay = 0 linear az = 0,633 → JMA (n = 1) az = 0,834 → D2 az = 0,704 → D3 y(α) côncavo az = 0,776 → D4 az < 0,633 → RO (n > 1) az = 0,633 → JMA (n < 1) az = 0,633 → JMA (n > 1) 0 < ay < az az ≠ 0,633 → SB (m, n) Figura 4: Mecanismos de reação para diferentes valores de ay e az [72, 81]. 1.6 Técnicas de caracterização empregadas 1.6.1 Difração de Raios X (DRX) Esta técnica permite realizar estudos morfológicos em materiais, determinando sua estrutura cristalina, através da incidência da radiação em uma amostra e na detecção dos fótons 38 difratados. A geração de raios X ocorre pelo bombardeamento de um alvo com feixe de elétrons de alta energia. Os alvos mais comuns são de cobre, molibdênio e cobalto. O funcionamento do equipamento segue a lei de Bragg [64]: nd.λ = 2.d.senθ (35) Sendo nd a ordem da difração, λ o comprimento de onda da radiação incidente (que tem o valor de 1,54 Å para o cobre), d corresponde ao espaço interplanar do cristal e θ é o ângulo de difração. 1.6.2 Espectroscopia de absorção na região do infravermelho com transformada de Fourier (FT-IR) Espectroscopia é o estudo da interação da radiação eletromagnética com a matéria, e a espectroscopia vibracional estuda a transição das vibrações normais moleculares. As vibrações normais que as moléculas apresentam podem ser do tipo estiramento de ligação (ou deformação axial) e deformação angular [64]. A espectroscopia de absorção no infravermelho pode ser dividida em três regiões: de 10 a 400 cm-1, que corresponde ao IR distante (FIR), de 400 a 4000 cm-1, relativo ao IR médio (MIR) e de 4000 a 12820 cm-1, que é a faixa do IR próximo (NIR). A maior parte dos estudos de IR referem-se à região média (MIR), pois nesta faixa se localizam as freqüências vibracionais fundamentais [64]. Certos grupos de átomos dão origem a bandas no espectro de infravermelho que ocorrem aproximadamente no mesmo número de onda (cm-1), independentemente da estrutura da molécula a qual pertencem. Devido à presença destas bandas características é possível identificar 39 a estrutura dos compostos analisados a partir dos espectros de infravermelho e da consulta a tabelas com o número de onda de cada grupo. As intensidades das bandas nos espectros de infravermelho podem ser expressas na forma de transmitância (T*) ou absorbância (A*). A transmitância é a porcentagem de luz emitida, ou seja, é a razão entre a energia radiante transmitida por uma amostra e a energia radiante que nela incide. Já a absorbância é o logaritmo do inverso da transmitância, ou seja, A* = log (1/T*). Transmitância e absorbância são grandezas complementares, isto é, sua soma (para a mesma energia e comprimento de onda incidente) é aproximadamente igual a 1, ou 100% [82]. As posições das bandas nos espectros são apresentadas em números de ondas (ν), que tem unidade do inverso do centímetro (cm-1). 1.6.3 Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) A estrutura fina e a morfologia dos materiais são estudadas principalmente através das técnicas de microscopia eletrônica: microscopia eletrônica de transmissão (MET), de varredura (MEV) e de transmissão com varredura (METV) [64]. Os microscópios eletrônicos utilizam elétrons, diferentemente dos microscópios ópticos, que usam luz para a formação da imagem. A principal vantagem em se utilizar o microscópio eletrônico é sua capacidade de gerar imagens com alta ampliação e resolução. Enquanto um microscópio óptico tem uma resolução de cerca de 200 nm e um poder de ampliação de 2 a 2.000 vezes, o microscópio eletrônico de varredura tem uma resolução de 10 nm e pode aumentar de 20 a 100.000 vezes [64]. 40 1.6.4 Análises Térmicas: Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC), Análise Térmica Diferencial (DTA) e Termogravimetria (TG). A análise térmica é definida como um grupo de métodos pelos quais as propriedades físicas ou químicas de uma amostra são medidas como funções de temperatura ou tempo, enquanto a amostra está sujeita a um programa de temperatura controlada. Entre elas pode-se citar a calorimetria exploratória diferencial (DSC), a análise térmica diferencial (DTA) e a termogravimetria (TG) [64]. A técnica de DSC foi desenvolvida para complementar as informações obtidas a partir do DTA. As curvas obtidas pelo DSC são parecidas com as obtidas pelo DTA, mas representam realmente a quantidade de energia elétrica fornecida para o sistema, e não apenas a variação de temperatura [82]. Os equipamentos de DSC podem ser divididos em dois tipos: DSC de fluxo de calor e DSC de compensação de potência. No primeiro tipo a propriedade física medida é a diferença de temperatura entre a amostra e o material de referência, enquanto ambos são submetidos a uma programação de temperatura. Já no DSC de compensação de potência, mede-se diretamente a energia envolvida nos eventos térmicos [64]. Há uma grande semelhança entre os equipamentos de DTA e DSC. A diferença é a curva que se obtém das análises: para o DTA é registrada a diferença de temperatura entre a amostra e a referência em função da temperatura/tempo, e para o DSC é obtida a diferença de energia térmica fornecida para a amostra e para a referência em função da temperatura/tempo. Assim, o DTA fornece apenas uma análise qualitativa dos eventos térmicos sofridos pela amostra, enquanto que o DSC consegue quantificar estes eventos, por medir o calor trocado através de uma diferença de temperatura (DSC de fluxo de calor) ou fornecer ao sistema um fluxo de calor quantificado, de 41 forma que esta energia seja suficiente para anular a diferença de temperatura entre a amostra e a referência (DSC de compensação de potência) [83]. Já a termogravimetria (TG) mede a massa da amostra quando o material é submetido a uma programação de temperatura. O equipamento nos fornece esta massa em função da temperatura ou do tempo. A análise por TG pode ser usada para monitorar qualquer reação que envolve uma fase de gás, como a oxidação ou a desidratação [63, 64]. A derivada da curva de TG é chamada de DTG, e com ela, em geral, é mais fácil a identificação da temperatura ou tempo em que ocorre cada reação. 1.7 Simulação A simulação computacional pode auxiliar a compreensão do que está acontecendo em um sistema químico. Através dela pode-se encontrar, por exemplo, o número de coordenação dos átomos pertencentes ao sistema ou a probabilidade de se encontrar determinado átomo i próximo a um átomo j. A simulação através da técnica de dinâmica molecular baseia-se na resolução numérica das equações do movimento (Leis de Newton) para cada átomo a cada instante de tempo, através do emprego de algoritmos integradores [84]. Um modelo matemático para descrição de um potencial interatômico consiste principalmente em duas partes: uma função potencial atrativa e uma função repulsiva. A função exponencial atrativa representa a situação de coesão entre os átomos, e a função repulsiva impede que os átomos se aproximem além de certo limite para não criar uma situação de colapso. Existe uma distância de equilíbrio, onde o potencial atinge seu valor mínimo [85]. Há vários modelos que descrevem os potenciais de interação entre átomos e moléculas. Entre eles, pode-se citar os potenciais de Lennard-Jones (LJ). A expressão mais geral para o 42 potencial interatômico LJ é mostrada na Equação 36, onde εij é a profundidade do poço de potencial, σij é a distância de equilíbrio e rij é a distância entre duas moléculas e/ou íons, q representa a carga elétrica e ε0 é a constante de permissividade elétrica no vácuo. A primeira parcela da soma apresentada na Equação 36 representa o potencial de Lennard-Jones, e a segunda parcela representa o potencial referente à força de Coulomb presentes entre moléculas polares. Para os casos onde a parte eletrostática é nula, a equação se resume ao próprio potencial de Lennard-Jones [84, 86]. ⎡⎛ σ ij V (rij ) = 4ε ij ⎢⎜ ⎜ ⎢⎝ rij ⎣ 12 6 ⎞ ⎛ σ ij ⎞ ⎤ qq ⎟ −⎜ ⎟ ⎥+ i j ⎟ ⎜ r ⎟ ⎥ 4πε r 0 ij ⎠ ⎝ ij ⎠ ⎦ (36) O software utilizado neste trabalho para a simulação computacional foi o DL_POLY2® [87]. Este software calcula, a partir da Equação 36, a função de distribuição radial (RDF ou g(r)). As curvas RDF representam valores da probabilidade de se encontrar um determinado átomo i a certa distância (r) em relação a um outro átomo i ou j. Portanto, os picos das curvas RDF (ou g(r)) revelam as posições r com elevada probabilidade de se encontrar o átomo i ao redor do átomo i ou j. Já o número de coordenação é calculado pelo DL_POLY2® a partir da Equação 37, onde ρ é a densidade numérica, isto é, o número de partículas dividido pelo volume [88]. r' n(r ) = 4 ⋅ π ⋅ ρ ⋅ ∫ g (r ) ⋅ r 2 ⋅ dr 0 (37) O número de coordenação de um átomo i em relação a um outro átomo j, em uma distância r, representa o número de átomos j que estão ao redor do átomo i em um raio r. A curva g(r) é uma curva média calculada pelo DL_POLY2® a partir de todas as curvas obtidas após o sistema atingir o equilíbrio químico. Portanto, a quantidade de átomos j ao redor do átomo i é uma quantidade média, analisada durante todo o tempo de simulação após o 43 equilíbrio químico. Assim, é possível encontrar números de coordenação fracionários. Neste caso, os números de coordenação representam a probabilidade de se encontrar o íon com uma determinada coordenação. Por exemplo, considerando-se uma molécula com a fórmula AB3,7C2,3, o número de coordenação de A é 6. Durante o período de simulação, o complexo apresentou as fórmulas AB4C2 e AB3C3, sendo que em 70% das distribuições analisadas foi observada a fórmula AB4C2 e em 30 % das distribuições foi observada a fórmula AB3C3. Portanto, o número de coordenação é um indicativo da probabilidade de se encontrar uma determinada espécie durante a simulação, e, conseqüentemente, as concentrações relativas [89]. 44 2 OBJETIVOS Neste trabalho será estudada a cinética de cristalização de mulita ortorrômbica, obtida através do método sol-gel, utilizando como aditivo químico a uréia. Os géis precursores serão secos e transformados em xerogéis. O material obtido através da queima dos xerogéis será analisado por: DRX, FT-IR, MEV, TG/DTG e DSC. Também será feita uma simulação computacional das soluções precursoras dos géis à temperatura ambiente. Através dos resultados obtidos por estas análises e pela simulação espera-se obter a caracterização do xerogel em termos de: número de coordenação do alumínio, fases formadas, segregação de fases, quantidade de mulita formada e determinação dos parâmetros cinéticos da reação de cristalização de mulita ortorrômbica. Os valores dessas energias, associadas com as informações provenientes das outras análises, serão utilizados para o estudo do efeito da uréia na cinética de cristalização de mulita. O estudo cinético será feito utilizando o método isoconversional de Flynn-Wall-Ozawa. Através deste método não-isotérmico, serão obtidos a energia de ativação (Ea), o fator préexponencial de Arrhenius (A) e o mecanismo cinético [f(α)] das reações de cristalização de mulita ortorrômbica para as diferentes amostras. 45 3 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS 3.1 Reagentes utilizados A Tabela 3 resume as características dos reagentes utilizados durante o procedimento experimental. Tabela 3: Reagentes utilizados e suas características Reagente Fórmula Metassilicato de sódio penta hidratado Nitrato de alumínio nonahidratado Uréia Ácido nítrico Ácido clorídrico Hidróxido de Sódio (pastilhas) Biftalato de potássio Fluoreto de Sódio Ácido fluorídrico Tetraetilortossilicato (TEOS) Etanol Na2SiO3·5H2O Al(NO3)3.9H2O CO(NH2)2 HNO3 HCl NaOH C8H5KO4 NaF HF Si(OC2H5)4 C2H5OH Grau de Pureza ou Concentração (%) 98,00 98,00 99,00 65,00 37,00 97,00 99,95 99,00 48,00 98,00 99,50 Fornecedor Aldrich Vetec Synth Synth Synth Vetec Vetec Merck Vetec Aldrich Synth Além destes reagentes, utilizou-se também o ácido silícico, que foi preparado quimicamente, e a rota de síntese encontra-se logo abaixo. 3.2 Preparação do ácido silícico O ácido silícico foi obtido por passagem de metassilicato de sódio (Na2SiO3·5H2O) em solução aquosa (10% m/m) através de uma coluna com resina de troca iônica (IR120 – Rohm and Haas). A Figura 5 mostra um fluxograma para a obtenção do ácido silícico. 46 Tratamento da Resina (Teste de Chama) Preparação da solução de metassilicato de sódio Passagem da solução pela coluna de troca iônica Obtenção do ácido silícico (Teste de Chama) Determinação da concentração do ácido silícico Figura 5: Fluxograma para a síntese do ácido silícico Para controlar a ausência de sódio, utiliza-se o teste de chama, tanto após o tratamento da resina como durante a obtenção do ácido silícico, pois o sódio afeta a velocidade de formação do gel, gerando propriedades indesejáveis para a mulita, além de alterar a composição do material após a queima. Por isso é muito importante controlar a ausência deste íon na ativação da resina e na obtenção do ácido silícico. O ácido silícico obtido deve ser mantido sob refrigeração por um tempo máximo de aproximadamente 7 dias, e deve ser utilizado para a preparação do sol durante este período. Isso porque a sílica está em meio aquoso, e então sua polimerização torna-se excessiva com o passar do tempo, e isto dificulta a posterior formação de mulita a baixas temperaturas. 3.3 Tratamento da resina de troca iônica Primeiramente, adicionou-se à resina de troca iônica uma solução de ácido nítrico 2 mol/L, em quantidade suficiente para cobrir a resina. Após um período de tempo de 24 horas, a resina foi lavada com água destilada até que o pH do filtrado atingisse o pH da água de lavagem, 47 medido com papel indicador. Em seguida, foi realizado um teste qualitativo da presença de sódio (teste de chama). Com o resultado do teste negativo, a resina está em condições de ser utilizada. Após a utilização da resina, esta foi tratada com uma solução aquosa de hidróxido de sódio 3 mol/L, em quantidade suficiente para cobri-la totalmente por 24 horas. A seguir, ela foi lavada com água destilada até que o pH da água sobrenadante fosse o mesmo da água de lavagem. Após esta etapa, a resina foi tratada com uma solução de ácido clorídrico 2 mol/L e armazenada, estando então em condições para ser novamente utilizada. 3.4 Determinação da concentração do ácido silícico Para a preparação do sol com a composição estequiométrica da mulita, é necessário conhecer a concentração de silício do ácido obtido após a passagem do metassilicato de sódio pela resina. Este teor foi determinado através da titulação do ácido silícico com hidróxido de sódio padronizado. A solução de hidróxido de sódio foi preparada a partir de pastilhas de NaOH e sua padronização foi feita com o biftalato de potássio. Foram retiradas duas alíquotas de 10 mL do ácido silícico, e, para cada uma delas, fez-se o procedimento descrito a seguir: foi adicionado uma solução de 3 g de NaF dissolvidos em 20 mL de água destilada, e, após a dissolução, foram adicionadas 33 gotas de HF e 40 gotas do coquetel de indicadores composto por fenolftaleína, na concentração 0,1% (m/m), azul de bromotimol, na concentração 0,2% (m/m), etanol e água destilada. Com o uso de uma bureta preenchida com a solução de hidróxido de sódio padronizada de concentração próxima a 3 mol/L, foram adicionadas algumas gotas da solução até obter-se uma coloração azul-esverdeado. A seguir foram adicionados 200 mL de água destilada em ebulição. O volume de NaOH gasto foi anotado e a titulação prosseguiu até que a solução apresentasse uma coloração de azul intenso. A 48 variação do volume de NaOH gasto foi utilizada para a determinação da concentração de silício, pois sabe-se que a titulação ocorre segundo a reação química: SiF62-(aq) + 4OH-(aq) → Si(OH)4(aq) + 6F-(aq) (38) 3.5 Preparação do sol/gel/xerogel Duas rotas de síntese de mulita foram realizadas para estudar a influência da uréia na formação de mulita. A primeira foi realizada em meio aquoso, pelo processo sol-gel coloidal (procedimento I), e a segunda em meio alcoólico, por sol-gel polimérico (procedimento II). O objetivo seria avaliar em qual dos dois procedimentos a uréia iria auxiliar na formação de mulita, e, então, prosseguir os estudos apenas com as amostras em que a uréia exercesse efeito positivo. Todo o trabalho de síntese foi desenvolvido no Departamento de Química do Instituto Tecnológico de Aeronáutica – ITA. 3.5.1 Procedimento I – Processo Sol-Gel Coloidal Para a preparação do sol pela primeira rota, utilizou-se como fonte de sílica a solução obtida pela passagem da solução de metassilicato de sódio através da coluna contendo a resina de troca iônica. Como fonte de alumínio foi utilizado o nitrato de alumínio nonahidratado. Silício e alumínio foram utilizados na proporção estequiométrica de mulita, ou seja, na razão molar de Si/Al igual a 1/3. A uréia foi utilizada nas razões molares de uréia / Al3+ iguais à 0/1, 1/1, e 3/1, e estas amostras foram denominadas AU-0, AU-1, e AU-3, respectivamente. AU simboliza os reagentes utilizados, ácido silícico e uréia. Na Tabela 4 há um resumo das características das amostras. 49 Tabela 4: Características dos géis preparados pela rota aquosa (procedimento I) Nomenclatura AU-0 AU-1 AU-3 Fonte de sílica Ácido silícico Ácido silícico Ácido silícico Razão molar uréia / Al3+ 0/1 1/1 3/1 Ao ácido silícico foram adicionados o nitrato de alumínio e a uréia (ambos sólidos). As quatro soluções resultantes foram mantidas em repouso, à temperatura ambiente, até a formação dos géis (10 dias). Então estes géis foram colocados em estufa a 80 °C por um tempo de 30 dias, até a formação dos xerogéis. Os materiais obtidos pela queima dos xerogéis foram submetidos às análises de DRX, FT-IR, MEV, TG/DTG e DSC. A Figura 6 mostra um fluxograma do procedimento I. Prepararação do ácido silícico Adição do nitrato de alumínio e da uréia ao ácido silícico Sóis mantidos a Tamb até formação dos géis (10 dias) Géis mantidos a 80 °C até formação dos xerogéis (30 dias) Figura 6: Fluxograma para preparação dos xerogéis pelo procedimento I. 50 3.5.2 Procedimento II – Processo Sol-Gel Polimérico Na segunda rota de síntese de mulita, utilizou-se o TEOS (tetraetilortossilicato) como fonte de sílica. A fonte de alumínio foi a mesma utilizada na primeira rota: o nitrato de alumínio nonahidratado. As proporções de silício e alumínio utilizadas também foram as mesmas, ou seja, razão molar de Si/Al igual a 1/3, assim como as razões molares de uréia / Al3+ também foram iguais às utilizadas na primeira rota, ou seja, 0/1, 1/1 e 3/1. Estas amostras foram denominadas TU-0, TU-1 e TU-3, respectivamente. TU simboliza os reagentes utilizados, TEOS e uréia. O solvente utilizado para esta rota foi o etanol. A Tabela 5 resume as características destes géis. Tabela 5: Características dos géis preparados pela rota alcoólica (procedimento II) Nomenclatura TU-0 TU-1 TU-3 Fonte de sílica TEOS TEOS TEOS Razão molar uréia / Al3+ 0/1 1/1 3/1 A preparação do sol foi iniciada com a mistura da uréia com o etanol, para as amostras TU1 e TU-3. Como a uréia não se dissolvia no solvente à temperatura ambiente, a mistura de etanol e uréia foi aquecida a 45 °C por 5 minutos. A seguir, esperou-se que esta solução alcançasse a temperatura ambiente e acrescentou-se o nitrato de alumínio. No caso da amostra TU-0, que não contém uréia, a etapa de aquecimento da mistura de uréia e etanol não foi realizada, adicionando-se o nitrato de alumínio diretamente ao etanol. Após a adição do nitrato de alumínio, todas as soluções foram mantidas sob agitação por 5 minutos, e, ainda sob agitação, adicionou-se o TEOS. A agitação foi mantida por mais 2 minutos e então as soluções foram transferidas para estufa a 60 °C, para a formação dos géis, por um tempo de 14 dias. Após a gelificação, aumentou-se a temperatura da estufa para 80 °C para a formação dos xerogéis, o que levou 30 dias. 51 A Figura 7 apresenta um fluxograma do procedimento II. Dissolução da uréia em etanol a 45 °C* Adição de nitrato de alumínio a Tamb Agitação por 5 minutos Adição de TEOS sob agitação Agitação mantida por 2 minutos Sóis mantidos a 60 °C até formação dos géis (14 dias) Géis mantidos a 80 °C até formação dos xerogéis (30 dias) Figura 7: Fluxograma para preparação dos xerogéis pelo procedimento II, *etapa não realizada para amostra que não contém uréia. Neste caso o nitrato de alumínio é adicionado diretamente ao etanol. Para efeito de comparação, preparou-se uma amostra apenas com uréia e etanol, da mesma forma que foi preparada a amostra TU-3, porém sem adição de nitrato de alumínio e TEOS. Esta mistura foi mantida em estufa à temperatura de 60 °C por um longo período (cerca de 4 meses), e foi denominada U-3, simbolizando que foi preparada apenas com uréia e etanol e com a mesma quantidade de uréia da amostra TU-3. 52 3.6 Descrição das análises e da preparação das amostras 3.6.1 Análise por DRX Para a identificação das fases cristalinas formadas, os xerogéis AU-0, AU-1 e AU-3 foram queimados por 2 horas em 5 temperaturas diferentes: 1000, 1100, 1150, 1200 e 1250 °C. Já os xerogéis TU-0, TU-1 e TU-3 foram queimados apenas a 1000 °C por 2 horas. A velocidade de aquecimento utilizada foi de 10 °C/min. Anteriormente a cada queima, cada amostra foi tratada a 500 °C por 2 horas para eliminação de material orgânico. Os pós resultantes das queimas a 1000 e 1100°C foram moídos em um almofariz de ágata com o auxílio de um pistilo, até alcançarem um tamanho de partículas menor que 63 µm (através de passagem por uma peneira com abertura 250 mesh). Esses pós foram então submetidos à análise de DRX. Para os pós resultantes da queima às temperaturas de 1150, 1200 e 1250 °C, foi feito o mesmo procedimento, porém adicionou-se (após a queima e após a moagem e peneiramento das amostras) 10 % (massa/massa) de NaCl sólido (Carlo Erba, moído e peneirado da mesma forma que os xerogéis). O NaCl foi utilizado como padrão para quantificar a fase mulita formada. Rigorosamente falando, este método somente é válido se o coeficiente de absorção mássico de todas as amostras forem exatamente iguais. Porém, é possível determinar a quantidade relativa de mulita, uma vez que a composição química de todas as amostras é muito parecida [90]. As fases cristalinas presentes nas amostras queimadas a 1000 e a 1100 °C foram identificadas por difratometria de raios X em um difratômetro Philips modelo PW 1830/1840, usando radiação CuKα, operando a 40 kV e 25mA, no intervalo de 10 ° ≤ 2θ ≤ 90 °, com ∆θ = 0,02 °, a uma velocidade de varredura do ângulo 2θ de 0,050 °/s, e com um tempo por etapa de 0,40 s. Estas análises foram realizadas no Laboratório Associado de Sensores e Materiais / Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – LAS / INPE . 53 Já as amostras queimadas a 1150, 1200 e a 1250 °C foram submetidas à análise por difratometria de raios X em um difratômetro PANalytical modelo X’Pert PRO MPD 3060 usando radiação CuKα e operando a 45 kV e 25mA, no intervalo de 10 ° ≤ 2θ ≤ 80 °, com ∆θ = 0,017 °, a uma velocidade de varredura do ângulo 2θ de 0,42 °/s, e com um tempo por etapa de 5,1 s. Estas análises foram realizadas na Divisão de Materiais do Instituto de Aeronáutica e Espaço – AMR / IAE. 3.6.2 Análise por FT-IR As amostras foram caracterizadas através de espectroscopia no infravermelho após serem submetidas às temperaturas de 350 °C e 1250 °C por 2 horas. Este estudo foi realizado utilizando-se o espectrofotômetro (FT-IR) Arid-Zone Modelo B102, na região de 3000 a 400 cm1 , com resolução de 4 cm-1, após 32 acumulações, empregando-se a técnica de pastilha de KBr com aproximadamente 1% de amostra (m/m). As análises foram realizadas no Instituto de Química / Universidade Estadual de Campinas – IQ / UNICAMP. 3.6.3 Análise por MEV A microscopia eletrônica de varredura foi utilizada com o objetivo de observar as características morfológicas das partículas, após a queima a 1250 °C por 2 horas. As amostras foram preparadas pela adição de cerca de 30 mg de pó macerado a 5 mL de isopropanol, em um béquer de 10 mL. Após a mistura por 5 minutos em agitação no ultra-som, retirou-se uma gotícula da mistura, com auxílio de um conta-gotas, e esta foi depositada sobre o porta-amostras, anteriormente polido. A secagem ocorreu em alguns minutos, e então os pós depositados foram recobertos com filme de ouro e analisados no microscópio eletrônico. As análises de MEV foram realizadas no microscópio Jeol JSM-5310, do LAS / INPE. 54 3.6.4 Análise por TG / DTG As amostras AU-0, AU-1 e AU-3 foram aquecidas a 200 °C por 2 horas para reduzir a quantidade do material orgânico e reduzir a eliminação de gases durante a análise, e depois foram submetidas à análise simultânea por TG / DTG. As curvas de TG /DTG foram obtidas entre 200 e 1100 °C, com velocidade de aquecimento de 10 °C/min, em um equipamento TG 6200 SII, Exstar 6000, no IQ / UNICAMP. Foram utilizadas amostras de aproximadamente 2 mg, aquecidas em cadinho de platina. 3.6.5 Análise por DSC para cálculo cinético As amostras AU-0, AU-1 e AU-3 foram aquecidas a 500 °C por 2 horas para eliminar quase todo o material orgânico, de forma a reduzir a eliminação de gases durante a análise e não causar danos ao equipamento. Estas amostras tratadas a 500 °C foram submetidas à análise por DSC, em um intervalo de temperatura de 500 a 1400 °C. As análises foram feitas em um equipamento DSC/TG LABSYS™, no DEMAR / EEL. O cadinho utilizado durante as análises térmicas foi de alumina. Cada amostra foi submetida a quatro velocidades de aquecimento: 10 °C/min, 14 °C/min, 18 °C/min e 20 °C/min, de forma a, posteriormente, escolher três curvas em que a amostra permanece com o mesmo mecanismo para proceder o estudo cinético. Esta escolha foi feita através da análise do coeficiente de correlação dos gráficos de log β por 1/T. Um coeficiente de correlação baixo é indício de que o mecanismo está variando. A Tabela 6 mostra as velocidades de aquecimento utilizadas no cálculo cinético para cada amostra. 55 Tabela 6: Velocidades de aquecimento utilizadas no estudo cinético Amostras Velocidades de aquecimento (°C/min) AU-0 10, 14 e 18 AU-1 10, 14 e 20 AU-3 10, 14 e 20 A quantidade de massa utilizada nas análises foi de cerca de 10 mg para cada velocidade das amostras AU-0, AU-1. Já para a amostra AU-3 foi utilizado 10 mg para as velocidades de 14 e 20 °C/min, e 5 mg para as velocidades de 10 e 18 °C/min. Como a curva de DSC da amostra AU-0 não apresentou o pico característico da cristalização de mulita, as análises foram repetidas para as amostras AU-0 com uma quantidade maior de material: aproximadamente 30 mg. Para a obtenção dos parâmetros cinéticos (Ea e A) da reação de cristalização de mulita, foi utilizado o método isoconversional de Flynn-Wall-Ozawa, a partir das curvas de DSC. Após a determinação dos valores de Ea e A para cada fração de conversão, foi calculado o efeito de compensação cinética e o mecanismo cinético da reação através do cálculo da função f(α). 3.7 Análise por simulação A simulação computacional do sistema foi realizada através do software DL_POLY2®. O trabalho de simulação foi desenvolvido no Departamento de Química do Instituto Tecnológico de Aeronáutica – ITA. Os sistemas simulados foram os sóis AU-0, AU-1 e AU-3, à temperatura ambiente. Cada sistema é constituído por um cubo de, inicialmente, 35 Å de aresta, contendo Al3+, NO3-, água, silanol, silanol dimérico (formado pela condensação de duas moléculas de silanol) e uréia (com 56 exceção da amostra AU-0, à qual não foi adicionada uréia). O silanol e o silanol dimérico estão representados nas Figuras 8 e 9. OH HO OH Si OH Figura 8: Fórmula estrutural do silanol OH OH HO Si O OH Si OH OH Figura 9: Fórmula estrutural do silanol dimérico A Tabela 7 mostra as quantidades de cada íon e de cada molécula utilizados na simulação. Tabela 7: Quantidades de íons e moléculas utilizados na simulação computacional. Amostra AU-0 AU-1 AU-3 Al3+ 6 6 6 NO318 18 18 Água 420 420 420 Silanol 1 1 1 Silanol dimérico 1 1 1 Uréia 0 6 18 O algoritmo integrador utilizado neste trabalho foi o Leapfrog Verlet (LFV). Utilizou-se o ensemble (condições físicas de contorno) denominado isotérmico-isobárico (NPT), onde a temperatura (T), a pressão (P) e número de mol (N) são mantidos constantes. Foi 57 utilizado este ensemble, pois o volume real das moléculas e dos íons presentes na simulação é desconhecido, uma vez que não se conhece as suas densidades. A temperatura dos sistemas simulados foi de 298 K e a pressão de 1 atm. O sistema simulado é constituído, inicialmente, por um cubo de 35 Å de aresta. Este volume (42875 Å3) foi uma suposição inicial. O DL_POLY2, através do ensemble NPT, recalcula o valor do volume a cada iteração. Após um certo número de passos, o sistema atinge o equilíbrio químico e o seu volume fica praticamente constante. O total de iterações foi de quatrocentos mil, onde metade deste número correspondeu ao tempo para o sistema atingir o equilíbrio termodinâmico. O passo temporal foi de 0,3 fs. Portanto, os primeiros 60 ps foram descartados do processo de análise. Depois deste tempo, o sistema rodou por mais 60 ps e os dados foram coletados e utilizados para as análises. Os volumes finais de cada caixa de simulação são mostrados na Tabela 8. Tabela 8: Volume final das amostras nas simulações Amostra AU-0 AU-1 AU-3 Volume final (Å3) 13943 14358 15270 O volume, como pode ser observado pela Tabela 8, é bastante reduzido em relação ao volume inicial suposto. Isto ocorre porque, nas condições de temperatura e pressão que são dadas inicialmente (e são fixas), o sistema proposto é um líquido. Porém, o volume de 42875 Å3 corresponde ao volume do sistema gasoso. Então o DL_POLY2 recalcula o volume até alcançar o volume característico do sistema líquido. O tempo de relaxação do termostato foi de 5.10-3 ps e do barostato foi de 5.10-1 ps. 58 O raio de cutoff (rcut), que refere-se à distância máxima na qual as forças de interação serão consideradas, foi de 11 Å. As interações eletrostáticas entre as moléculas polarizadas foram descritas através de um algoritmo baseado nas somas de Ewald. Os parâmetros de energia e de tamanho do Potencial de Lennard-Jones (ε e σ) e o valor da carga elétrica (q), todos valores utilizados pelo DL_POLY2 através da Equação 36, são apresentados na Tabela 9. Nesta Tabela também é mostrado a representação de cada átomo presente na simulação. Tabela 9: Resumo dos parâmetros de Van der Waals usados nas simulações [91-95]. Átomo Alumínio Oxigênio da água Hidrogênio da água Nitrogênio do nitrato Oxigênio do nitrato Silício do silanol Oxigênio do silanol (pontas) Hidrogênio do silanol Silício do silanol dimérico Oxigênio do silanol dimérico (centro) Oxigênio do silanol dimérico (pontas) Hidrogênio do silanol dimérico Carbono da uréia Oxigênio da uréia Nitrogênio da uréia Hidrogênio da uréia Representação Al Ow Hw Nn On Si O1 H_ Si_ O_ O5 H2 Cu Ou Nu Hu ε (eV) 0,30138 0,16000 0,00000 0,00239 0,03585 0,09500 0,15910 0,09880 0,09500 0,14967 0,15910 0,09880 0,10500 0,21000 0,17000 0,00000 σ (Å) 1,29720 3,19600 0,00000 3,15000 3,03700 3,76900 2,97900 2,00500 3,76900 2,98193 2,97900 2,00500 3,75000 2,96000 3,25000 0,00000 Carga elétrica (q) +3,00000 -0,82000 +0,41000 +1,08800 -0,69600 +1,20720 -0,76730 +0,46550 +1,24150 -0,74960 -0,72660 +0,43770 +0,14200 -0,39000 -0,54200 +0,33300 Os parâmetros ε e σ cruzados, referentes a duplas de átomos diferentes um do outro, foram calculados a partir das relações de combinação de Lorentz-Berthelot, apresentadas nas Equações 39 e 40 [96, 97]: 59 σ ij = σi +σ j 2 ε ij = ε i ⋅ ε j (39) (40) Todas as moléculas e íons presentes nas simulações foram descritos mantendo-se fixas as distâncias relativas entre os átomos de cada molécula. As geometrias (ângulos e distâncias) foram determinadas através do software Molden® [98]. As distribuições das espécies químicas dentro das caixas de simulação foram obtidas através do software Packmol® [99]. 60 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Comparação dos géis preparados pelos procedimentos I e II Três principais diferenças podem ser notadas ao se comparar as duas rotas de síntese citadas anteriormente. A primeira diferença é a fonte de sílica utilizada, sendo ácido silícico na primeira rota e TEOS na segunda rota. A segunda diferença é o meio no qual os reagentes foram misturados, sendo o meio aquoso na primeira rota, e alcoólico na segunda. Por fim, uma terceira diferença ainda pode ser observada: a temperatura na qual os sóis foram submetidos para se transformarem em géis. Na primeira rota, os sóis foram deixados à temperatura ambiente até a formação dos géis. Isso porque o processo de secagem à temperatura ambiente para rotas aquosas de síntese de mulita resulta no aumento da elasticidade do gel, na diminuição do seu volume e na ausência de exsudação de líquido com o corte, mantendo sua homogeneidade [42]. Já na segunda rota de síntese, os sóis, assim que foram preparados, foram expostos à temperatura de 60 °C para a formação dos géis. As soluções não foram mantidas em temperatura ambiente, pois o nitrato de alumínio é muito menos solúvel a 25 °C do que a 60 °C, quando o solvente utilizado é o etanol. A solubilidade do nitrato de alumínio em etanol a 60 °C aumenta cerca de 7 vezes quando comparada com a sua solubilidade a 25 °C, como foi observado por Okada e colaboradores [100]. Eles também mostraram que sóis preparados com TEOS, nitrato de alumínio e etanol formavam uma quantidade muito pequena de mulita a 1000 °C quando mantidos em temperaturas iguais ou inferiores a 50 °C durante a secagem, ao contrário do que acontecia quando mantidos a temperaturas de 60 °C. Este fato está diretamente relacionado à maior solubilidade do nitrato de alumínio em etanol a 60 °C, o que faz com que as amostras tenham uma homogeneidade muito maior quando a secagem ocorre a essa temperatura do que em temperaturas menores [100]. 61 Os sóis preparados por ambas rotas mostraram-se todos transparentes e aparentemente muito homogêneos assim que foram preparados. Entretanto, os sóis TU-1 e TU-3, ao contrário dos AU-0, AU-1, AU-3 e TU-0, após alguns dias na estufa a 60 °C, mostraram precipitação de pequenas partículas brancas (não identificadas). Esta precipitação mostra uma menor homogeneidade dos géis preparados pelo procedimento II com a adição de uréia. Um motivo que poderia explicar esta diminuição da homogeneidade seria a dificuldade da uréia se dissolver no etanol, mesmo após o aquecimento a 45 °C. Porém, a amostra U-3, preparada apenas com uréia e etanol, manteve-se homogênea e incolor por um longo período de tempo (4 meses, até onde foi observado). Portanto, após o aquecimento a 45 °C, a uréia se torna totalmente solúvel no etanol. Sendo assim, conclui-se que a redução da homogeneidade ocorre após a adição do nitrato de alumínio e do TEOS. Isto pode ser explicado pela grande afinidade das moléculas de silanol, de nitrato de alumínio e da uréia pela água, como será posteriormente mostrado através da simulação computacional. No caso do gel preparado pelo procedimento I, há uma grande quantidade de água. Já no procedimento II, a quantidade de água que existe é pequena: somente a água de cristalização do nitrato de alumínio. Assim, as moléculas de silanol, de nitrato de alumínio e de uréia concorrem pelas poucas moléculas de água. A adição de grande quantidade de uréia acaba gerando heterogeneidade, como foi observado através da precipitação de pequenas partículas brancas. 4.2 Caracterização por DRX A Figura 10 mostra os difratogramas de raios X para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1000 °C por 2 horas. 62 α α α 20 α α α e α 40 A U -0 α e 60 80 Intensidade (u.a.) e A U -1 e 20 40 60 80 A U -3 e e 20 40 60 80 2 θ (g ra u s ) Figura 10: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1000 °C por 2 horas, α = α –alumina, e = espinélio. 63 Pela Figura 10 pode-se observar que, após a queima a 1000 °C, houve formação do espinélio para as três amostras. O difratograma de raios X da amostra AU-0 mostrou ainda, além da formação do espinélio, a formação da α-alumina, indicando segregação de fase e maior heterogeneidade desta amostra. A Figura 11 mostra os difratogramas de raios X para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1100 °C por 2 horas. Pela Figura 11 observa-se que, a 1100 °C, continua ocorrendo a formação do espinélio para todas as amostras, assim como a fase α-alumina continua presente na amostra AU-0. A principal diferença entre os difratogramas feitos após a queima a 1100 °C em relação aos realizados após a queima a 1000 °C é a formação de mulita tetragonal para a amostra AU-3, indicando a maior homogeneidade desta amostra em relação às outras duas. A mulita é identificada como tetragonal através da observação do pico em 26 ° do difratograma de raios X: este pico não apresenta o desdobramento característico da fase ortorrômbica. Assim, a amostra AU-3 é mais homogênea, pois, além de não apresentar segregação de fase, formou mulita na faixa de temperatura de 1100 °C, diferentemente das outras amostras, que até esta temperatura não cristalizaram mulita. A Figura 12 mostra os difratogramas de raios X para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1150 °C por 2 horas. Neste caso foi adicionado 10 % em massa de NaCl após a queima, moagem e peneiramento, para possibilitar a quantificação relativa de fases formadas. Observa-se pela Figura 12 que a amostra AU-0, após a queima a 1150 °C, continua formando espinélio e α-alumina, e ainda não mostrou a cristalização de mulita. No entanto, a amostra AU-1 não apresentou mais a formação da fase espinélio, e sim a critalização de mulita ortorrômbica. A amostra AU-3 continuou apresentando a formação da fase espinélio, e também a cristalização da fase ortorrômbica da mulita. 64 α α α A U -0 α α e 20 40 α α α α e 60 α α 80 A U -1 Intensidade (u.a.) e e 20 40 60 80 A U -3 e e 20 40 60 80 2 θ (g ra u s ) Figura 11: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1100 °C por 2 horas; α = α –alumina, e = espinélio, para a amostra AU-3. = mulita; em destaque a formação de mulita tetragonal 65 e α α 20 AU-0 α α α 40 α α α 60 80 AU-1 Intensidade (u.a.) e 20 40 60 80 AU-3 e 20 40 60 80 2θ (graus) Figura 12: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1150 °C por 2 horas; α = α –alumina, e = espinélio, = mulita, = NaCl, = não formação de espinélio; em destaque a formação de espinélio para as amostras AU-0 e AU-3, enquanto para a amostra AU-1 isto não ocorre, e a formação de mulita ortorrômbica para as amostras AU-1 e AU-3. 66 Assim, a amostra AU-1 deve ter formado mulita ortorrômbica a 1150 °C partir da fase espinélio, já a amostra AU-3 possivelmente formou mulita ortorrômbica a 1150 °C a partir da mulita tetragonal formada a 1100 °C. A Figura 13 mostra os difratogramas de raios X para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1200 °C por 2 horas. Neste caso também foi adicionado 10 % em massa de NaCl após a queima, moagem e peneiramento, para possibilitar a quantificação de mulita formada. A Figura 13 mostra que, após a queima a 1200 °C, a amostra AU-0, apesar de ainda apresentar a formação da fase α-alumina, formou mulita ortorrômbica. Além disso, esta amostra não apresenta mais a formação do espinélio. As amostras AU-1 e AU-3 mostraram a formação de uma única fase cristalina: mulita ortorrômbica. Comparando a Figura 13 com a Figura 12, observa-se que amostra AU-1 a 1200 °C continuou apresentando a cristalização da mesma fase formada a 1150 °C. Já a amostra AU-3 não apresentou mais a formação da fase espinélio que existia a 1150 °C, e sim apenas a cristalização de mulita ortorrômbica. Ou seja, a fase espinélio da amostra AU-3 deve ter sido transformada em mulita ortorrômbica em uma faixa de temperatura entre 1150 e 1200 °C para a amostra AU-3. Sendo assim, a quantidade de mulita ortorrômbica formada através da queima da amostra AU-3 a 1200 °C teve duas origens: a transformação da fase tetragonal em ortorrômbica em uma temperatura entre 1100 e 1150 °C, e a transformação da fase espinélio em mulita ortorrômbica em uma temperatura entre 1150 e 1200 °C. Ainda pode ser observado uma última diferença entre os difratogramas de raios X da amostra AU-0 queimada a 1150 e a 1200 °C. Comparando as Figuras 12 e 13, nota-se um aumento na quantidade de α-alumina cristalizada para a amostra AU-0 queimada a 1200 °C em relação à mesma amostra queimada a 1150 °C. 67 AU-0 e α α 44 α α α 40 α α α 60 80 Intensidade (u.a.) 20 46 AU-1 20 40 60 80 AU-3 e 20 40 60 80 2θ (graus) Figura 13: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1200 °C por 2 horas; α = α –alumina, = mulita, = NaCl; em destaque a formação de mulita ortorrômbica para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3, a formação de α-alumina para a amostra AU-0, e a não formação de espinélio para as amostras AU-0 e AU-3. 68 Este aumento da quantidade de α –alumina pode ser calculado determinando a razão entre a intensidade do pico em 2θ = 43,4° (maior pico do difratograma de raios X da α-alumina, JCPD 10-0173) e em 2θ = 31,7 (maior pico do difratograma de raios X do NaCl, JCPDS 05-0628). Esta razão tem o valor de 0,23 para a amostra AU-0 queimada a 1150 °C, e de 0,36 para a mesma amostra queimada a 1200 °C. Ou seja, entre 1150 e 1200 °C ocorre uma nova cristalização da fase α-alumina para a amostra AU-0. A Figura 14 mostra os difratogramas de raios X para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C por 2 horas. Aqui também foi adicionado 10 % em massa de NaCl após a queima, moagem e peneiramento, para possibilitar a quantificação de mulita formada. Pela Figura 14 observa-se que a amostra AU-0, a 1250 °C, continua formando α-alumina e mulita ortorrômbica, como ocorreu a 1200 °C. Ainda observando a Figura 14, nota-se que a amostra AU-3, a 1250 °C, também continua apresentando a cristalização da mesma fase formada a 1200 °C: apenas a cristalização de mulita ortorrômbica. Entretanto, a amostra AU-1, quando queimada a 1250 °C, cristalizou também, além da mulita ortorrômbica já formada anteriormente, a fase α-alumina. Ou seja, a amostra AU-1 não estava tão homogênea quanto a amostra AU-3, e, desta forma, parte do material foi transformado em α-alumina quando esta amostra foi queimada a 1250 °C. A amostra AU-3 é, portanto, a mais homogêna, seguida da AU-1, e a amostra menos homogênea é a AU-0. Isto porque a amostra AU-3 foi a que formou mulita em menor temperatura (1100 °C), além de ter sido a única amostra que não segregou α-alumina em nenhuma das temperaturas a que foi submetida. Já a amostra AU-1 formou mulita a 1150 °C, mas segregou α-alumina a 1250 °C. Enquanto isso, a amostra AU-0, a menos homogênea, só formou mulita a 1200 °C, além de ter segragado segregou α-alumina desde 1000 °C. A Tabela 10 resume as fases formadas para cada amostra após a queima a cada temperatura analisada. 69 AU-0 α α α 20 α α 40 60 AU-1 Intensidade (u.a.) α 20 40 80 60 80 AU-3 20 40 60 80 2θ (graus) Figura 14: Difratogramas de raios X das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C por 2 horas; α = α –alumina, = mulita, = NaCl; em destaque a formação de mulita ortorrômbica para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 e a formação de α-alumina para as amostras AU-0 e AU-1. 70 Tabela 10: Fases formadas para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 após a queima a várias temperaturas. Temperatura (°C) Amostra Fases formadas Temperatura (°C) Amostra Fases formadas Temperatura (°C) Amostra Fases formadas Temperatura (°C) Amostra Fases formadas Temperatura (°C) Amostra Fases formadas AU-0 espinélio α-alumina AU-0 espinélio α-alumina AU-0 α-alumina espinélio AU-0 mulita ortorrômbica α-alumina AU-0 mulita ortorrômbica α-alumina 1000 AU-1 espinélio 1100 AU-1 espinélio 1150 AU-1 mulita ortorrômbica 1200 AU-1 mulita ortorrômbica 1250 AU-1 mulita ortorrômbica α-alumina AU-3 espinélio AU-3 espinélio mulita tetragonal AU-3 mulita ortorrômbica espinélio AU-3 mulita ortorrômbica AU-3 mulita ortorrômbica Com a relação entre a intensidade do maior pico de mulita ortorrômbica (2θ = 26,2°; JCPDS 15-0776) e do maior pico de NaCl (2θ = 31,7°; JCPDS 05-0628) obtida dos difratogramas de raios X mostrados nas Figuras 12, 13 e 14, foi possível construir uma tabela da razão das intensidades destes picos para amostras queimadas a 1150, 1200 e a 1250 °C. Estas informaçõs são apresentadas pela Tabela 11. Portanto, a Tabela 11 mostra a quantidade relativa de mulita formada após a queima das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 a 1150, 1200 e a 1250 °C por 2 horas. 71 Deve ser ressaltado que foi utilizada sempre a mesma concentração de NaCl para possibilitar a comparação. Tabela 11: Razão da intensidade do pico de mulita pelo pico de NaCl após a queima das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 a 1150, 1200 e a 1250 °C por 2 horas. Temperatura (°C) 1150 1200 1250 Intensidade dos picos mulita/NaCl AU-0 AU-1 AU-3 0 0,66 0,25 0,36 0,91 0,95 0,47 0,93 1,16 Através da Tabela 11, observa-se que a quantidade de mulita formada nas três temperaturas para as amostras AU-1 e AU-3 é consideravelmente maior do que para a amostra AU-0, mostrando a melhora na homogeneidade das amostras preparadas pelo processo sol-gel coloidal devido à adição de uréia. Pela Tabela 11 nota-se também um aumento esperado na quantidade de mulita formada à medida que a temperatura de queima é aumentada. Além disso, observa-se que a amostra AU-3 apresenta uma menor quantidade de mulita formada em relação à amostra AU-1 quando queimadas a 1150 °C. Isto pode ser explicado devido às diferentes origens da mulita ortorrômbica formada a 1150 °C. Enquanto a amostra AU1 forma mulita a 1150 °C a partir do espinélio, a amostra AU-3 forma mulita ortorrômbica a 1150 °C a partir da fase tetragonal cristalizada a 1100 °C. Portanto, a quantidade da fase espinélio da amostra AU-1 formada a 1100 °C deve ser maior do que a quantidade de mulita tetragonal da amostra AU-3 formada na mesma temperatura. Através da Tabela 11, pode ainda ser observado que, a 1200 e a 1250 °C, ao contrário do que ocorre a 1150 °C, a amostra AU-3 forma maior quantidade de mulita quando comparada com 72 a amostra AU-1. Quando submetidas à temperatura de 1250 °C, esta diferença na quantidade de mulita formada é ainda mais evidente. Assim, a quantidade de mulita cristalizada para as amostras sintetizadas a partir do método sol-gel coloidal e queimadas a 1200 ou a 1250 °C por 2 horas é crescente à medida que se aumenta a quantidade de uréia adicionada. Isto ocorre devido à diferença de quantidade e de tipo de material precursor de mulita ortorrômbica nas duas amostras. Como já foi discutido, a amostra AU-3 queimada a 1150 °C apresentou a formação da fase ortorrômbica proveniente da fase tetragonal, que existia em pequena quantidade. Enquanto isso, a amostra AU-1 queimada a 1150 °C apresentou a formação da fase ortorrômbica de mulita proveniente do espinélio, que existia em maior quantidade. Entretanto, a 1200 °C, a amostra AU-3 também mostrou cristalização de mulita a partir do espinélio. Então, a quantidade de mulita formada a 1200 °C para a amostra AU-3 é a soma da quantidade de mulita formada a partir do espinélio com a quantidade de fase tetragonal transformada em ortorrômbica. Além disso, a 1250 °C, a amostra AU-1 formou menor quantidade de mulita em relação à amostra AU-3 pois parte do seu material foi transformado em α-alumina. Já a amostra AU-3 não apresentou a segregação de α-alumina, e assim conseguiu formar maior quantidade de mulita. Portanto, a presença da uréia aumenta a homogeneidade das amostras preparadas pela rota aquosa. Esta melhora na homogeneidade tem uma relação linear com o aumento da concentração de uréia. A Figura 15 mostra os difratogramas de raios X para as amostras TU-0, TU -1 e TU -3 queimadas a 1000 °C por 2 horas. 73 TU-0 24 26 20 40 60 80 Intensidade (u.a.) e TU-1 e 20 40 60 80 e TU-3 e 20 40 60 80 2θ (graus) Figura 15: Difratogramas de raios X das amostras TU-0, TU-1 e TU-3 queimadas a 1000 °C por 2 horas; e = espinélio, = mulita; em destaque a formação de mulita tetragonal para a amostra AU-0. Pela Figura 15 é possível observar que ocorreu a formação de mulita tetragonal para a amostra TU-0 queimada a 1000 °C por 2 horas, enquanto que para as outras amostras TU-1 e TU- 74 3, todas preparadas com a adição de uréia, isso não ocorreu. Para estas amostras a única fase formada após a queima a 1000 °C por 2 horas é o espinélio. Sendo assim, como já havia sido observado no item 4.1, a uréia apresentou um efeito negativo para a formação de mulita nas amostras preparadas pela rota alcoólica, devido à concorrência da uréia, do silanol e do nitrato de alumínio pelas poucas moléculas de água. Como a uréia gerou heterogeneidade nas amostras sintetizadas pela rota alcoólica, o estudo das amostras TU-0, TU-1 e TU-3 foi encerrado com a realização das análises de DRX. Apesar da amostra TU-0, preparada pelo processo sol-gel polimérico, ter cristalizado mulita a 1000 °C, e a amostra AU-3, preparada pelo processo sol-gel coloidal, ter formado o material apenas a 1100 °C, esta temperatura de cristalização ainda pode ser considerada baixa. Outros métodos de síntese apresentam temperatura de formação de mulita, em sua maioria, superior a 1250 °C [11, 25, 42, 52, 58]. Além disso, a rota de síntese em que se utiliza o TEOS como fonte de sílica gera custos maiores em relação à rota em que o ácido silícico é utilizado [101]. Escolheu-se, portanto, as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 para dar prosseguimento ao estudo da influência da uréia na cinética de cristalização de mulita. 4.3 Caracterização por FT-IR A Figura 16 mostra os espectros no infravermelho para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3, tratadas a 350 °C por 2 horas. 75 45 AU-1 AU-0 50 40 45 Transmitância (u.a.) 40 35 Bandas com intensidades relativas diferentes 1647 cm 35 30 30 25 1089 cm 25 20 1383 cm 466 cm -1 665 cm -1 2000 1800 1600 1400 1200 1000 800 1089 cm 573 cm 1383 cm 400 -1 -1 20 -1 600 -1 -1 458 cm -1 -1 Bandas com intensidades relativas semelhantes 15 2000 1800 1600 1400 1200 1000 800 600 400 60 AU-3 50 40 Bandas com intensidades relativas semelhantes 30 1647 cm -1 20 10 1383 cm -1 1074 cm 0 2000 1800 1600 1400 1200 1000 -1 447 cm 592 cm 800 -1 -1 600 400 Número de onda (cm-1) Figura 16: FT-IR para amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 350 °C. Observando a Figura 16, nota-se a presença de cinco bandas em cada amostra, sendo estas bandas aproximadamente as mesmas para todas as amostras. Estas bandas estão em torno dos picos em 1640 cm-1, 1383 cm-1, 1080 cm-1, uma banda mais larga na faixa entre 560 e 660 cm-1, e ainda uma última banda em torno de 450 cm-1. Essas cinco bandas são mostradas na própria Figura 16, e a atribuição a cada uma delas está mostrada na Tabela 12. 76 Tabela 12: Posição e atribuição das bandas para os vários modos vibracionais das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 350 °C por 2 horas [3, 102]. Número de onda (cm-1) 1640 1383 1080 560 - 660 450 Atribuição da banda OH NO3SiO4 AlO6 SiO4 Uma outra observação que pode ser feita a partir da Figura 16, é em relação à intensidade das bandas relativas aos grupos AlO6 (vibração na faixa entre 560 e 660 cm-1), e do grupo SiO4 (vibração em torno de 450 cm-1). Analisando a intensidade destas bandas nas amostras, nota-se que as duas bandas possuem intensidades relativas semelhantes nas amostras com uréia (AU-1, AU-3), diferentemente da amostra sem uréia (AU-0), em que a banda de AlO6, na faixa entre 560 e 660 cm-1, é bem maior do que a banda de SiO4 em torno de 450 cm-1. A maior intensidade de alumínio hexacoordenado indica a maior heterogeneidade da amostra AU-0, como já foi observado pelas análises de DRX [19]. A Figura 17 mostra os espectros no infravermelho para as amostras AU-0, AU -1 e AU -3, tratadas a 1250 °C por 2 horas. Pela Figura 17 observa-se que, a 1250 °C, a banda do grupo NO3- (em 1383 cm-1) não existe mais em nenhuma das amostras. Isso ocorre devido à decomposição do nitrato de alumínio, que ocorre até 500 °C, como será posteriormente mostrado pela análise por TG. Os espectros de todas as amostras queimadas a 1250 °C, representados na Figura 17, mostram picos em aproximadamente 1170 cm-1, 1130 cm-1, 900 cm-1, 820 cm-1, 730 cm-1, 560 cm-1 e 460 cm-1. Todos este picos são característicos dos espectros de mulita. Isso está de acordo com os resultados dos difratogramas de raios X da Figura 14, que mostrou a formação de mulita para todas as amostras quando queimadas a 1250 °C. 77 50 AU-0 28 AU-1 26 45 24 40 -1 1640 cm 22 35 20 30 18 Transmitância (u.a.) -1 -1 872 cm 1170 cm 1115 cm 829 cm 2000 1800 1600 1400 1200 1000 462 cm 14 -1 -1 733 cm -112 444 cm -1 589 cm 10 -1 15 -1 16 25 20 1635 cm -1 800 600 400 -1 558 cm -1 -1 825 cm 1168 cm 1130 cm-1 -1 -1 733 cm 905 cm 2000 1800 1600 1400 1200 1000 800 600 400 75 AU-3 70 65 60 55 50 -1 45 -1 1168 cm 40 1127 cm -1 -1 905 cm 2000 1800 1600 1400 1200 1000 473 cm -1 725 cm -1 553 cm -1 823 cm 800 600 400 -1 Número de onda cm Figura 17: FT-IR para amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C. Os espectros da Figura 17 também mostram picos em torno de 1640 cm-1, devido à absorção de água pelas pastilhas de KBr e pelas próprias amostras. A atribuição a cada um destes picos é mostrada na Tabela 13. Pela Figura 17 pode-se também notar uma diferença na intensidade das bandas em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 entre as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. 78 Tabela 13: Posição e atribuição das bandas para os vários modos vibracionais das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C por 2 horas [3, 102]. Número de onda (cm-1) 1640 1170 1130 900 820 730 560 460 Atribuição da banda OH SiO4 AlO4 AlO4 AlO4 T-O-T, T = Al, Si AlO6 SiO4 Estudos [3, 103] já mostraram que a razão entre a intensidade das bandas em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 tem uma relação linear com a composição da mulita, definida como Al4+2xSi 2xO10-x. 2- Neste fórmula, x representa a quantidade de lacunas de oxigênio por célula unitária. O valor de x está relacionado à substituição de íons de silício (Si4+) por íons de alumínio (Al3+) dentro dos sítios tetraédricos da estrutura do material e à formação simultânea de lacunas de oxigênio. Seu valor varia em função da concentração molar de Al2O3, de acordo com a Equação 41 [104]: x = 10 – 6 [(m* + 200) / (m* + 100)] (41) Onde m* é a porcentagem molar de alumina. Chamando a razão entre a intensidade dos picos em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 de I, foi mostrado que, quanto maior o valor de I, maior é a razão molar entre o silício e o alumínio do material [3, 103]. A partir da Figura 17, pode ser medida a intensidade dos picos em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 dos espectros das amostras AU-0, AU-1 e AU-3. Com estes valores, pode-se determinar a razão entre a intensidade dos dois picos, anteriormente denominada por de I. Os valores de I, 79 para cada amostra, foram plotados em função da proporção de uréia utilizada no preparo das amostras. Este gráfico está mostrado na Figura 18. Intensidade de I -1 -1 (razão dos picos 1170cm /1130cm ) 1,06 1,04 1,02 1,00 0,98 0,96 0,94 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3+ Razão molar Uréia/Al Figura 18: Razão da intensidade dos picos em 1170 cm-1 e 1130 cm-1 (denominada de I) pela razão molar de uréia e Al3+. Pela Figura 18, observa-se que as amostras com proporção molar de uréia e Al3+ de 1/1 (AU-1) e de 3/1 (AU-3) são as que apresentam maior razão entre a intensidade dos picos em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1, ou seja, apresentam maior valor de I. Já a amostra sem uréia (AU-0) mostra o contrário, ou seja, o menor valor de I. Para efeito de comparação, foi plotado, na Figura 19, o gráfico da Figura 18 juntamente com o gráfico da quantidade relativa de mulita formada para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a 1250 °C, construído a partir dos dados da Tabela 11. Assim, a Figura 19 nos ajuda a comparar a razão entre os picos em 1170 cm-1 e 1130 cm-1 dos espectros de FT-IR das três 80 amostras com a respectiva razão da intensidade dos picos de mulita e NaCl dos difratogramas de raios X. 1,10 Intensidade de I -1 -1 (razão dos picos 1170cm /1130cm ) Intensidade dos picos mulita/NaCl 1,4 1,2 1,0 0,8 0,6 1,05 1,00 0,95 0,90 0,4 0 1 2 Razão molar Uréia/Al 3 3+ 0 1 2 Razão molar Uréia/Al 3 3+ Figura 19: Comparação da intensidade I dos espectros de FT-IR com a razão dos picos de mulita e NaCl dos difratogramas de raios X das amostras queimadas a 1250 °C, em função da razão molar de uréia e Al3+. Observando a Figura 19, percebe-se que as amostras AU-1 e AU-3, que apresentaram maior valor de I em relação à AU-0, são justamente as amostras que apresentaram a maior quantidade de mulita formada após serem queimadas a 1250 °C. Já a amostra AU-0, que, ao contrário, mostrou o menor valor de I, apresentou também a menor quantidade de mulita formada após a queima a 1250 °C. 81 A relação linear entre a razão das intensidades das bandas em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 com a composição da mulita, x, pode ser observada pela Figura 20. Figura 20: Relação entre a razão das intensidades das bandas em 1170 cm-1 e em 1130 cm-1 (da análise por FT-IR) e a composição da mulita, x, da fórmula Al4+2xSi2-2xO10-x [3]. Consultando a Figura 20, juntamente com a Equação 41, é possível determinar a composição da mulita formada para as amostras queimadas a 1250 °C. Os valores encontrados para a composição da mulita para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 são apresentados na Tabela 14. Tabela 14: Porcentagem molar de alumina presente na mulita formada para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 após a queima a 1250 °C por 2 horas. Amostra AU-0 AU-1 AU-3 Porcentagem molar de alumina (%) 64,6 60 60,4 Através da Tabela 14, pode ser observado que a composição de mulita é praticamente a mesma para as amostras AU-1 e AU-3, e corresponde à composição da mulita ortorrômbica. Já a 82 amostra AU-0 apresenta uma composição referente à fase metaestável da mulita. Entretanto, os difratogramas de raios X mostraram a formação de mulita ortorrômbica (através do desdobramento do pico em 26 °) para a amostra AU-0 queimada a 1250 °C por 2 horas. Ou seja: a amostra AU-0, queimada a 1250 °C, apresenta tanto a formação de mulita tetragonal como de mulita ortorrômbica. A presença da fase tetragonal de mulita não é detectada pelos difratogramas de raios X, pois o pico da fase tetragonal se sobrepõe ao pico da ortorrômbica. Além disso, o intervalo de temperatura em que as amostras foram tratadas para serem submetidas às análises de DRX é consideravelmente grande (50 °C). Portanto, a amostra sem uréia queimada a 1250 °C forma tanto a fase tetragonal da mulita, que é metaestável, como a fase ortorrômbica, que é estável. Enquanto isso, as amostras AU-1 e AU-3 formam apenas a fase ortorrômbica da mulita a 1250 °C. Isto prova mais uma vez a maior heterogeneidade da amostra sem uréia: ela forma mulita metaestável após a queima a 1250 °C, ao contrário das amostras com uréia, que formam apenas a fase estável da mulita. 4.4 Caracterização por MEV As micrografias dos xerogéis AU-0, AU-1, e AU-3 queimados a 1250 °C por 2 horas são mostradas na Figura 21. Através das micrografias da Figura 21, pode ser observado que as partículas estão distribuídas em uma grande faixa de granulometria. Como o método sol-gel gera partículas da ordem de nanômetros, estas devem estar formando aglomerados de diversos tamanhos. Além disso, é possível notar que estes aglomerados possuem cantos mais arredondados na amostra AU-0, diferentemente das amostras AU-1 e AU-3, que mostram formas mais definidas e cantos mais retos. 83 AU-0 40 µm AU-1 40 µm AU-3 40 µm AU-0 4 µm AU-1 7 µm AU-3 7 µm Figura 21: Micrografias das amostras após serem queimadas a 1250 °C por 2 horas. 84 Pode-se ainda notar que todas as amostras apresentam crescimento de cristais em camadas, o que é característico do crescimento dos cristais [105]. As micrografias da Figura 21 também revelam que as partículas de mulita das amostras AU-1 e AU-3 estão crescendo na forma de placas. Esta forma de crescimento já foi observada por outros autores [11, 51]. A amostra AU0 ainda não apresentou este formato de placas devido à pequena quantidade de mulita formada, observado anteriormente pelos difratogramas de raios X. Ainda pode ser observado que a amostra AU-0, sem uréia, tem uma porosidade grande, diferentemente das outras amostras preparadas com uréia. 4.5 Caracterização por TG / DTG A Figura 22 mostra as curvas de TG / DTG das amostras AU-0, AU-1 e AU-3, após o prévio tratamento térmico a 200 °C por 2 horas, para redução de matéria orgânica. As curvas de TG das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 revelam uma perda total de massa de, respectivamente: 70, 67 e 63% (em relação à massa inicial), o que está de acordo com a quantidade de uréia adicionada em cada amostra. Ou seja, quanto maior a quantidade de uréia adicionada durante a preparação do gel, maior deve ser a perda de massa durante o aquecimento. Pela Figura 22 pode-se observar que as curva de DTG das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 são semelhantes. Elas mostram dois picos em comum: um de maior intensidade em aproximadamente 120 °C, e outro menor e mais largo em torno de 420 °C. O pico em torno de 120 °C é característico da perda de água residual do gel e da água de cristalização do nitrato de alumínio nonahidratado [31, 106]. O pico mais largo em torno de 420 °C da curva de DTA ocorre devido à decomposição térmica do nitrato de alumínio e de matéria orgânica [107]. 85 AU-0 300 105 250 95 113 °C AU-1 100 95 200 90 85 150 80 100 75 50 200 90 150 85 100 80 Massa (%) 75 400 °C 70 0 0 200 400 600 800 1000 1200 424 °C 50 70 0 65 0 200 400 600 Temperatura (°C) 105 250 350 118 °C AU-3 100 95 300 800 1000 1200 Derivada da Massa (%/ °C) 127 °C 100 250 90 200 85 150 80 100 75 440 °C 70 50 65 0 60 0 200 400 600 800 1000 1200 Temperatura (°C) Figura 22: Curvas de TG e DTG das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 após tratamento térmico por 2 horas a 200 °C. A Figura 22 também revela que, para todas as amostras, a grande perda de material ocorre até aproximadamente 500 °C. Após esta temperatura, a perda de massa é bem pequena: a amostra AU-0 perde cerca de 5% em massa de material, e as amostras AU-1 e AU-3 perdem aproximadamente 3% em massa de material. Assim, um tratamento térmico das amostras a 500 °C é uma boa opção para reduzir a eliminação de gases durante o aquecimento. Este prévio tratamento térmico foi necessário para submeter as amostras ao equipamento de DSC, que não possuía módulo de proteção contra a corrosão. 86 4.6 Cálculo Cinético 4.6.1 Cálculo dos parâmetros cinéticos (Ea e lnA) da amostra sem uréia (AU-0) A Figura 23 apresenta as curvas de DSC da amostra AU-0, para as velocidades de 10, 14 e 18 °C/min, quando foi utilizada uma quantidade de massa de 10 mg. 70 AU-0 60 ∆H (u.a) 50 40 30 10 °C/min 14 °C/min 18 °C/min 20 10 0 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600 Temperatura (°C) Figura 23: Curvas de DSC da amostra AU-0, para as velocidades de 10, 14 e 18 °C/min, utilizando 10 mg de massa em cada análise. Observando a Figura 23, pode ser notado apenas um pico exotérmico (em alta temperatura, na região de interesse) de forma clara. Este pico está em torno da temperatura de 1000 °C, e ocorreu devido à cristalização da fase espinélio ou da fase alumina, como foi anteriormente observado pela análise de DRX. O pico de cristalização da mulita não aparece claramente na Figura 23, e sim apenas alguma ondulação. Isto ocorreu devido à pequena quantidade de massa utilizada na análise. Como a quantidade de mulita formada nesta amostra é pequena, foi necessário repetir estas análises com maior quantidade de massa, cerca de 30 mg, de forma a evidenciar o pico de cristalização de mulita. As análises de DSC para a amostra AU-0 87 nas velocidades de 10, 14 e 18 °C/min e com quantidade de massa de 30 mg estão mostradas na Figura 24. AU-0 70 60 ∆H (u.a) 50 40 30 20 10 °C/min 14 °C/min 18 °C/min 10 0 -10 -20 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600 Temperatura (°C) Figura 24: Curvas de DSC da amostra AU-0, para as velocidades de 10, 14 e 18 °C/min, utilizando 30 mg de massa em cada análise. Pela Figura 24 pode ser observada a presença de cinco picos exotérmicos em cada curva de DSC. Com o objetivo de separar mais claramente cada pico, foi feito a deconvolução das curvas (ajustando os pontos para curvas gaussianas). A Figura 25 ilustra a deconvolução dos cinco picos exotérmicos para a velocidade de aquecimento de 10 °C/min. Este processo de deconvolução foi feito para as outras duas velocidades de aquecimento também. Com as curvas separadas, é possível determinar a temperatura de pico de cada uma, para cada velocidade de aquecimento. Estas temperaturas estão mostradas na Tabela 15. 88 10 9 2 8 ∆H (u.a) 7 6 5 4 1 3 3 2 4 1 5 0 -1 600 700 800 900 1000 1100 1200 1300 1400 Temperatura (°C) Figura 25: Deconvolução dos 5 picos exotérmicos da curva de DSC da amostra AU-0 para a velocidade de aquecimento de 10 °C/min. Tabela 15: Temperaturas de pico de cristalização das cinco fases formadas durante a análise de DSC para a amostra AU-0. Pico 1 Pico 2 Pico 3 Pico 4 Pico 5 10 °C/min 871,69 989,72 1145,95 1243,93 1280,84 14 °C/min 879,26 994,37 1164,00 1251,25 1287,32 18 °C/min 888,64 997,11 1177,46 1258,26 1297,30 O material que está sendo cristalizado em cada pico pode ser determinado comparando as temperaturas mostradas na Tabela 15 com os difratogramas de raios X das Figuras 10 a 14, juntamente com as conclusões retiradas a partir dos resultados da análise de FT-IR da Tabela 14. Desta comparação, pode-se concluir que os picos 1 e 2 se referem à cristalização da α-alumina e do espinélio, não necessariamente nesta ordem. Como o que se pretende é estudar a cinética da mulita ortorrômbica, não há necessidade de especificar qual das duas fases corresponde ao pico 1 89 e 2. Continuando a comparação da Tabela 15 com os difratogramas de raios X e os resultados da análise de FT-IR, pode-se concluir que o pico 3 se deve a uma nova cristalização da α-alumina, e os picos 4 e 5 ocorrem devido à cristalização da mulita tetragonal e ortorrômbica. Como a cristalização da mulita tetragonal ocorre a temperaturas menores do que a cristalização da mulita ortorrômbica [19, 28, 55], o pico 4 se refere à cristalização da mulita tetragonal e o pico 5 à cristalização da mulita ortorrômbica. Assim, o estudo cinético foi feito para o pico 5, que se refere à cristalização da mulita ortorrômbica. A Figura 26 mostra as curvas de DSC da amostra AU-0 nos intervalos considerados para o cálculo cinético de cristalização de mulita ortorrômbica. 3,5 AU-0 10 °C/min 14 °C/min 18 °C/min 3,0 ∆H (u.a) 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 1100 1200 1300 1400 Temperatura (°C) Figura 26: Curvas gaussianas ajustadas para as curvas de DSC da amostra AU-0 para o pico de cristalização de mulita ortorrômbica no intervalo utilizado para o cálculo cinético. 90 Como era esperado, observa-se pela Figura 26 que, quanto maior a velocidade de aquecimento, mais elevada é a temperatura de pico da curva de DSC para a cristalização da fase mulita. A partir das curvas de DSC da Figuras 26, pode-se determinar as curvas de fração de conversão de mulita ortorrômbica em função da temperatura, através da Equação 7. α= Ai At (7) Assim, determina-se as curvas de fração de conversão em função da temperatura da amostra AU-0, que são mostrada na Figura 27. AU-0 Fração de conversão 1,0 0,8 0,6 0,4 0,2 10 °C/min 14 °C/min 18 °C/min 0,0 1200 1250 1300 1350 Temperatura (°C) Figura 27: Fração de conversão de mulita ortorrômbica em função da temperatura para a amostra AU-0. Com os valores de fração de conversão para cada temperatura, é possível encontrar o valor da energia de ativação para cada fração de conversão, traçando o gráfico do logaritmo da 91 velocidade de aquecimento pelo inverso da temperatura. A energia de ativação é encontrada através do coeficiente angular desta curva, como mostrado pela Equação 21. d log β ⎛ 0,457 ⎞ = −⎜ ⎟ ⋅ Ea d (1 / T ) ⎝ R ⎠ (21) O gráfico da Figura 28 mostra a curva de log β por 1/T para a fração de conversão de 5% para a amostra AU-0. A mesma curva foi traçada para as outras frações de conversão, encontrando assim a energia de ativação para cada valor de α. 1,30 AU-0 1,25 log ß 1,20 R*=1 -1 Ea= kJ.mol 1,15 1,10 1,05 1,00 0,646 0,648 0,650 0,652 0,654 0,656 -1 1/T (K ) Figura 28: Gráfico de log β por 1/T para a fração de conversão de 5% da amostra AU-0. A curva de energia de ativação pela fração de conversão, acompanhada dos respectivos erros, é mostrada na Figura 29. 92 AU-0 Energia de ativação (kJ/mol) 1500 1000 500 0 20 40 60 80 100 Fração de conversão (%) Figura 29: Energia de ativação em função da fração de conversão de mulita ortorrômbica para a amostra AU-0. Pela Figura 29, pode-se observar uma grande variação na intensidade das barras de erro de cada energia de ativação. Alguns erros são muito grandes, e isto ocorre devido ao baixo coeficiente de correlação do gráfico de log β por 1/T. O baixo coeficiente de correlação pode indicar mecanismos diferentes de reação do material cristalizado para as três velocidades de aquecimento. Quando o coeficiente de correlação é baixo, o erro do coeficiente angular é grande, o que se reflete em um maior erro da energia de ativação. É muito difícil analisar os resultados experimentais quando as barras de erros são muito grandes. Sendo assim, foi considerado apenas os valores de energia de ativação quando o coeficiente de correlação do gráfico de log β por 1/T é aproximadamente 1. Estes valores correspondem às frações de conversão de 5 a 65 %. Refazendo o gráfico da Figura 29 somente para estes pontos, chega-se ao gráfico apresentado na Figura 30. 93 1200 Energia de ativação (kJ/mol) AU-0 1000 800 600 400 200 0 0 10 20 30 40 50 60 70 Fração de conversão (%) Figura 30: Energia de ativação em função da fração de conversão de mulita ortorrômbica para as frações de conversão de 5 a 65 % da amostra AU-0. Pela Figura 30, pode ser observado o comportamento da energia de ativação em função da fração de conversão para a reação de cristalização de mulita ortorrômbica da amostra AU-0. Nota-se que a energia de ativação torna-se maior à medida que o fator de conversão aumenta. Este comportamento é característico de mecanismos de reação que são complexos e envolvem mais de uma etapa [60, 70]. Com os valores da energia de ativação para cada fração de conversão, é possível calcular o valor do fator pré-exponencial para cada fração de conversão, a partir da Equação 26. A= β ⋅ Ea ⋅ e E RTm 2 a / RTm (26) Os valores de Ea e lnA para cada fração de conversão de mulita são apresentados na Tabela 16. 94 Tabela 16: Valores de Ea e lnA para cada fração de conversão de mulita ortorrômbica da amostra AU-0. AU-0 α (%) 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 Ea (kJ.mol-1) 458 498 527 552 574 595 614 633 652 672 693 714 737 - lnA (min-1) 35 38 40 42 44 45 47 48 50 51 53 54 56 - Através da Tabela 16 pode ser observado que os valores de energia de ativação para a cristalização de mulita ortorrômbica da amostra AU-0 variam bastante com o decorrer da reação de cristalização. Estes valores serão posteriormente comparados com os valores de energia de ativação das amostras preparadas com uréia. 4.6.2 Cálculo dos parâmetros cinéticos (Ea e lnA) das amostras com uréia (AU-1 e AU-3) A Figura 31 apresenta as curvas de DSC das amostras AU-1 e AU-3 para as velocidades que foram utilizadas nos cálculos cinéticos. 95 80 80 AU-3 ∆H (u.a) AU-1 70 70 60 60 50 50 40 40 30 30 20 20 10 °C/min 14 °C/min 20 °C/min 10 0 10 °C/min 14 °C/min 20 °C/min 10 0 -10 -10 -20 -20 0 300 600 900 1200 1500 0 300 600 900 1200 1500 Temperatura (°C) Figura 31: Curvas de DSC das amostras AU-1 e AU-3 para as velocidades utilizadas no cálculo cinético. Pela Figura 31 nota-se o aumento esperado da temperatura de pico à medida que aumenta a velocidade de aquecimento para as amostras AU-1 e AU-3, como foi também observado anteriormente para a amostra AU-0. Observando a Figura 31, também pode ser notado um pico exotérmico de forma clara, em uma temperatura de aproximadamente 1250 °C para as amostras com uréia. Este pico ocorre devido à cristalização da mulita ortorrômbica, como foi anteriormente mostrado pelos difratogramas de raios X. A cristalização da fase espinélio pode ser observada pelas curvas de DSC da Figura 31 através de uma leve ondulação em torno de 1000 °C. A cristalização de mulita tetragonal para a amostra AU-3 e de α-alumina para a amostra AU-1 não podem ser claramente visualizadas nos gráficos, devido à pequena quantidade de amostra utilizada. 96 O pico de cristalização de mulita para a velocidade de aquecimento de 10 °C/min da amostra AU-3 tem menor intensidade em relação aos outros picos da Figura 31 devido à menor quantidade de massa utilizada nesta análise, em torno de 5 mg (metade da quantidade usada nas demais análises). Entretanto, isto não interfere nos resultados, uma vez que o valor da fração cristalizada é o mesmo, pois é encontrado através da Equação 7: α= Ai At (7) Ou seja, se a massa for maior, a Ai e a At será proporcionalmente maior, e o valor da fração cristalizada calculado será o mesmo. Assim, o estudo cinético foi feito para o pico que se refere à cristalização da mulita ortorrômbica. A partir das curvas de DSC da Figura 31, foi selecionado o intervalo em que ocorre a cristalização de mulita ortorrômbica. A Figura 32 mostra este intervalo para as amostras AU-1 e AU-3 nas velocidades utilizadas para o cálculo cinético. 9 9 AU-3 ∆H (u.a) AU-1 8 8 7 7 6 6 5 5 4 4 10 °C/min 14 °C/min 20 °C/min 3 2 2 1 1 0 0 -1 1100 10 °C/min 14 °C/min 20 °C/min 3 -1 1200 1300 1400 1200 1300 1400 Temperatura (°C) Figura 32: Curvas de DSC das amostras AU-1 e AU-3 no intervalo utilizado para o cálculo cinético. 97 A partir das curvas de DSC da Figuras 32, pode-se determinar as curvas de fração de conversão em função da temperatura para cada velocidade de aquecimento, como foi mostrado para a amostra AU-0. Estas curvas são apresentadas na Figura 33. AU-1 Fração de conversão 1.0 0.8 0.8 0.6 0.6 0.4 0.4 0.2 10 °C/min 14 °C/min 20 °C/min 0.0 1200 1220 1240 1260 AU-3 1.0 0.2 10 °C/min 14 °C/min 20 °C/min 0.0 1280 1220 1240 1260 1280 1300 Temperatura (°C) Figura 33: Fração de conversão de mulita ortorrômbica em função da temperatura para as amostras AU-1 e AU-3. Com os valores de fração de conversão para cada temperatura, foi possível encontrar o valor da energia de ativação para cada fração de conversão, através do coeficiente angular do gráfico de log β por 1/T, como mostra a Equação 21. d log β ⎛ 0,457 ⎞ = −⎜ ⎟ ⋅ Ea d (1 / T ) ⎝ R ⎠ (21) Os gráficos da Figura 34 mostram as curvas de log β por 1/T para a fração de conversão de 5% para as amostras AU-1 e AU-3. As mesmas curvas foram traçadas para as outras frações de conversão, encontrando assim a energia de ativação para cada valor de α. 98 1,35 1,35 AU-1 1,30 1,25 R* = 1 -1 Ea = 1022 kJ.mol 1,20 log ß AU-3 1,30 1,25 1,20 1,15 1,15 1,10 1,10 1,05 1,05 1,00 1,00 0,664 0,665 0,666 0,667 0,668 0,669 0,670 R* = 0,99 -1 Ea = 952 kJ.mol 0,655 0,656 0,657 0,658 0,659 0,660 0,661 0,662 -1 1/T (K ) Figura 34: Gráficos de log β por 1/T para a fração de conversão de 5% das amostras AU-1 e AU3. As curvas de energia de ativação pela fração de conversão, acompanhada dos respectivos erros, são mostrados na Figura 35. 1200 Energia de ativação (kJ/mol) AU-1 1350 AU-3 1150 1200 1100 1050 1050 900 1000 750 950 600 900 0 20 40 60 80 100 0 20 40 60 80 100 Fração de conversão (%) Figura 35: Energia de ativação em função da fração de conversão para as amostras AU-1 e AU-3. 99 Pela Figura 35 pode ser observado que, para as amostras AU-1 e AU-3, a energia de ativação fica praticamente constante para os diferentes valores de fração de conversão, diferentemente do que aconteceu para a amostra AU-0. A amostra preparada sem a adição de uréia mostrou valores de energia de ativação variando em função da fração de conversão. Ou seja, enquanto a amostra sem uréia cristaliza mulita através de um mecanismo complexo que envolve várias etapas, as amostras com uréia formam mulita através de uma única etapa. Com os valores da energia de ativação para cada fração de conversão, foi possível calcular o valor de A para cada fração de conversão, a partir da Equação 26. A= β ⋅ Ea ⋅ e E RTm a / RTm 2 (26) Os valores de Ea e lnA para cada fração de conversão são apresentados na Tabela 17. Comparando a Tabela 17 com a Tabela 16, pode-se perceber que os valores da energia de ativação em função da quantidade de uréia adicionada na preparação das amostras também seguem a mesma tendência mostrada pelos difratogramas de raios X. Ou sejam, as amostras AU1 e AU-3 possuem valores de energias de ativação maiores em relação à amostra AU-0. Esta conclusão parece, a princípio, discordar dos resultados encontrados até aqui: a amostra AU-0 cristalizou mulita ortorrômbica a temperaturas maiores e em menor quantidade em relação às amostras com uréia. Se a amostra AU-0 tem menor energia de ativação, deveria cristalizar maior quantidade de mulita. Dois motivos poderiam explicar a menor energia de ativação da amostra AU-0, sendo que os dois podem estar interligados entre si. O primeiro motivo é mais global, o segundo mais específico. A primeira razão é o fato de a amostra AU-0 ser composta por um material muito heterogêneo, apresentando partículas grandes e pequenas de sílica e alumina. 100 Tabela 17: Valores de Ea e lnA para cada fração de conversão de mulita ortorrômbica das amostras AU-1 e AU-3. AU-1 α (%) 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 Média DP Ea (kJ.mol-1) 1037 1037 1040 1040 1039 1040 1039 1041 1040 1040 1040 1041 1040 1041 1041 1042 1041 1040 1041 1040 1 AU-3 lnA (min-1) 82 82 82 82 82 82 82 82 82 82 82 83 83 83 83 83 83 83 83 82 1 Ea (kJ.mol-1) 952 948 946 941 939 936 933 929 927 923 920 916 913 909 903 897 890 880 864 919 24 lnA (min-1) 75 75 74 74 74 73 73 73 72 72 72 71 71 71 70 70 69 68 67 72 2 Dentro desta distribuição, devem existir poucas regiões com elevada homogeneidade e muitas regiões (a maioria delas) com muito baixa homogeneidade. Portanto, a energia de ativação calculada refere-se à cristalização de mulita ortorrômbica proveniente de uma região com elevada homogeneidade, no entanto a extensão da reação deve ser muito pequena. Um outro motivo que explica a menor energia de ativação da amostra AU-0, que pode estar ligado à primeira explicação, é o fato desta amostra ter sido a única que segregou α-alumina anteriormente à formação de mulita. Desde 1000 °C já existiam regiões com α-alumina segregada, e, desta forma, a sílica fica em excesso em relação à alumina disponível para a formação de mulita. A alumina 101 que está disponível para reagir com a sílica é a alumina da interface sílica/alumina, como foi mostrado anteriormente pela Figura 3. Assim, por estar em excesso, a sílica se liga mais facilmente à alumina da interface. Sendo assim, a energia de ativação é menor para a amostra AU-0. Entretanto, a quantidade de mulita formada é pequena devido à menor quantidade de alumina disponível para a reação com a sílica, que é a alumina da interface sílica/alumina. O conteúdo do interior das partículas de α-alumina não estão em contato com a sílica, e assim não pode se transformar em mulita nesta temperatura. Os valores de energia de ativação encontrados para a amostra AU-0 está de acordo com os resultados encontrados por Wei e Rongti [108], que ao produzirem mulita a partir de misturas de α-alumina e quartzo, encontraram uma energia de ativação de 650 kJ/mol. Os valores médios de energia de ativação encontrados para as amostras AU-1 e AU-3 estão um pouco mais elevados do que o valor de energia de ativação encontrado para a cristalização de mulita a partir de precursores formados por ácido silícico, nitrato de alumínio e uréia, determinado por Campos e colaboradores [51]: 730 ± 150 kJ/mol. Porém, nesta ocasião, foi utilizado o método de Johnson–Mehl–Avrami–Kolmogorov (JMAK) para o cálculo cinético. Já os resultados obtidos por Oliveira [107], que utilizou o mesmo método aqui utilizado (método isoconversional de Flynn-Wall-Ozawa) para o cálculo cinético, mostraram valores de energia de ativação de 1015 ± 272 kJ/mol para a cristalização de mulita a partir de misturas de TEOS, nitrato de alumínio, água e etanol. Este valor de energia de ativação está de acordo com os valores aqui encontrados para as amostras AU-1 e AU-3. 102 4.6.3 Efeito de compensação cinética para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 O efeito de compensação cinética foi então calculado para cada amostra, traçando os gráficos de lnA em função da Ea. Estes gráficos são mostrados na Figura 36. 60 AU-0 55 50 45 R*=1 40 -1 lnA (min ) 35 450 500 550 600 650 700 750 Ea (kJ/mol) 76 AU-1 82,8 AU-3 74 82,5 72 70 82,2 R*=0,99 68 81,9 R*=1 66 1020 1025 1030 1035 1040 1045 1050 1055 855 870 885 900 915 930 945 Ea (kJ/mol) Figura 36: Efeito de compensação cinética para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. Pela Figura 36, pode-se notar a linearidade entre a energia de ativação e o logaritmo do fator pré-exponencial (o fator de correlação dos gráficos é 1). Esta linearidade, chamada de efeito de compensação cinética, ocorre quando o mecanismo de reação é o mesmo durante o intervalo estudado. Neste caso, uma mudança na energia de ativação é compensada pela mesma mudança no logaritmo do fator pré-exponencial. Assim, o mecanismo da reação de cristalização de mulita ortorrômbica é o mesmo para a amostra AU-0 no intervalo de fração de conversão considerado, e para as três velocidades de aquecimento utilizadas. O mesmo ocorre para as amostras AU-1 e AU-3. Desta forma, determinando o mecanismo de reação para qualquer velocidade de 103 aquecimento (dentre as que foram utilizadas neste trabalho) para uma determinada amostra, será determinado também o mecanismo das outras velocidades de aquecimento para esta mesma amostra. A partir das médias da energia de ativação e do logaritmo do fator pré-exponencial, seria possível construir um gráfico de lnA em função da Ea para todas as amostras. Desta forma, poderia ser verificado o efeito de compensação cinética para todas as amostras. Porém, como a amostra AU-0 apresenta valores de Ea muito diferentes para cada fração de conversão, a média não seria um valor coerente com a reação que está acontecendo nesta amostra. Sendo assim, não foi verificado o efeito de compensação cinética para as médias de Ea e de lnA das amostras AU-0, AU-1 e AU-3. Para determinar o mecanismo da reação de cristalização de mulita ortorrômbica das amostras AU-0, AU-1 e AU-3, serão utilizadas as curvas de análise térmica para a velocidade de aquecimento de 10 °C/min. 4.6.4 Cálculo do modelo da reação para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3 O mecanismo da reação de cristalização de mulita ortorrômbica a partir dos resultados da análise de DSC das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 será estudado utilizando os resultados provenientes da amostra aquecida na velocidade de 10 °C/min. Deve ser ressaltado que o mecanismo da reação de cristalização de mulita que será encontrado para a amostra AU-0 representa apenas uma parte da reação: de 5 a 65% de fração de conversão de mulita. Com os valores de Ea, é possível encontrar as curva de y (α) e z (α) pelas Equações 31 e 34. 104 y (α ) = dα dα = A ⋅ f (α ) = ⋅ β ⋅ e Ea / RT dθ t dT z (α ) = y (α ) ⋅ ∫ e − Ea / RT β (31) (34) ⋅ dT Assim é possível determinar os valores máximos das funções y(α) e z(α), respectivamente ay e az. As curvas de y (α) e z (α) e os valores de ay e az são mostrados na Figura 37. 1,0 AU-0 y(α) z(α) 0,8 0,6 0,4 ay= 0,33 0,2 az= 0,53 y(α) ou z(α) 0,0 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 Fração de conversão (α) 1,0 AU-1 y(α) z(α) 1,0 0,8 0,8 0,6 0,6 0,4 0,4 0,2 az= 0,54 0,0 0,2 0,4 0,6 y(α) z(α) 0,2 ay= 0,39 0,0 AU-3 ay= 0,38 az= 0,54 0,0 0,8 1,0 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 Fração de conversão (α) Figura 37: Curvas de y(α) e z(α) normalizadas em função da fração de conversão para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. 105 Com os valores de ay e az, e consultando a Figura 4, é possível a determinação do mecanismo de cristalização de mulita ortorrômbica das amostras. convexo az > 0,633 → RO (n < 1) ay = 0 linear az = 0,633 → JMA (n = 1) az = 0,834 → D2 az = 0,704 → D3 y(α) côncavo az = 0,776 → D4 az < 0,633 → RO (n > 1) az = 0,633 → JMA (n < 1) az = 0,633 → JMA (n > 1) 0 < ay < az az ≠ 0,633 → SB (m, n) Figura 4: Mecanismos de reação para diferentes valores de ay e az [72, 81]. Como, para todas as amostras, ay é um valor maior que zero e menor do que az, e az é diferente de 0,633, pode-se concluir, a partir da Figura 4, que o mecanismo da reação de cristalização de mulita das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 é melhor representado pelo modelo de Šesták e Berggren (SB). A Tabela 2 anteriormente mostrada apresentou a Equação do modelo de SB: f (α) = αm(1- α)n (42) 106 Para determinar os parâmetros m e n deste modelo, utiliza-se a relação entre ay e os parâmetros, que é definida como [109]: ay = m m+n (43) A razão dos expoentes cinéticos, definida como p, é: p= m n (44) Substituindo a Equação 44 na Equação 43 e rearranjando, encontra-se a Equação 45: p= ay (45) 1− ay Substituindo a Equação 42 na Equação 31 anteriormente mostrada, encontra-se a Equação 46: y (α ) = A ⋅ f (α ) y (α ) = A ⋅ α m ⋅ (1 − α ) (31) n (46) Substituindo a Equação 44 na Equação 46, tirando o logaritmo de ambos os lados e rearranjando, encontra-se: ln y (α ) = ln A + n ⋅ ln[α p ⋅ (1 − α )] (47) Assim, traçando o gráfico de ln y por ln [αp(1- α)], para valores de α entre 0,2 e 0,8, podese encontrar o parâmetro n do modelo de SB através do coeficiente angular da curva [109]. Os gráficos de ln y por ln [αp(1- α)] são mostrados na Figura 38. Assim, após obter os valores de p e de n, pode-se calcular o parâmetro m deste modelo, através da Equação 43. Os valores de p, n e m para cada reação de cristalização de mulita estão apresentados na Tabela 18. 107 Observando a Tabela 18, pode-se notar que os valores de p, n e m para as amostras AU-1 e AU-3 são muito parecidos. Já a amostra AU-0 mostra valores de p, n e m com alguma discrepância. Sabe-se que os expoentes cinéticos n e m são característicos de um processo particular de cristalização, porém é complicado de se encontrar um significado físico real para estes parâmetros [110]. 46,2 AU-0 46,0 45,8 45,6 45,4 ln[y(α)] 45,2 45,0 -1,8 -1,7 -1,6 -1,5 -1,4 -1,3 -1,2 -1,1 -1,0 -0,9 p ln[α (1-α)] 72,4 82,6 AU-1 AU-3 72,2 82,4 72,0 82,2 71,8 82,0 71,6 81,8 71,4 -1,8 -1,7 -1,6 -1,5 -1,4 -1,3 -1,2 -1,1 -1,0 -1,8 -1,7 -1,6 -1,5 -1,4 -1,3 p ln[α (1-α)] Figura 38: Gráfico de ln y por ln [αp(1- α)] para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. Tabela 18: Valores de p, n e m encontrados para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. Amostra AU-0 AU-1 AU-3 Valor de p 0,50 0,64 0,61 Valor de n 1,27 1,18 1,18 Valor de m 0,63 0,75 0,72 -1,2 -1,1 -1,0 108 Como os parâmetros do mecanismo de SB são bastante semelhantes para as amostras AU1 e AU-3, pode-se concluir que o processo de cristalização de mulita ortorrômbica é o mesmo para as amostras com uréia. A amostra AU-0, apesar de também cristalizar mulita ortorrômbica pelo mecanismo de SB, apresenta um processo de cristalização particular. Substituindo a fórmula do mecanismo de SB, apresentado pela Equação 42, na Equação 15, encontra-se a equação simulada para dα / dT, apresentada pela Equação 48. dα A.e − Ea / RT = ⋅ f (α ) dT β dα A.e − Ea / RT = ⋅ α m .(1 − α ) n β dT (15) (48) Então é possível comparar a curva de dα/dT simulada, representada pela Equação 48, com a curva de dα/dT obtida experimentalmente. Estas curvas podem ser observadas na Figura 39. Pela Figura 39 pode-se perceber que, para todas as amostras, o ajuste do mecanismo de reação de SB e dos parâmetros m e n são muito bons, pois as curvas simuladas e experimentais estão praticamente sobrepostas uma à outra. Assim, pode-se concluir que o mecanismo cinético de SB descreve bem a reação de cristalização de mulita ortorrômbica para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. O mecanismo cinético de SB é um modelo autocatalítico, ou seja, a velocidade da reação vai aumentando à medida que o produto vai se formando. Este modelo descreve um processo de cristalização complexo, envolvendo uma nucleação sobreposta ao crescimento de fases [110]. O processo de cristalização pode ser complexo devido à variação de parâmetros como tamanho de partículas, temperatura, sítios de nucleação e estado de tensão em um mesmo sistema. 109 Experimental Simulada 1.0 AU-0 0.8 0.6 0.4 0.2 dα/dT 0.0 1200 1220 1240 1260 1280 1300 1320 1340 Temperatura (°C) AU-1 Experimental Simulada 1.0 0.8 0.8 0.6 0.6 0.4 0.4 0.2 0.2 0.0 0.0 1200 1210 1220 1230 1240 1250 Experimental Simulada 1.0 1260 1220 1240 AU-3 1260 1280 Temperatura (°C) Figura 39: Curvas de dα/dT experimental e simulada normalizadas em função da temperatura. 4.7 Caracterização por simulação A Figura 40 mostra as curvas de função de distribuição radial (RDF ou g(r)) para os átomos Si (silício do silanol) e Si_ (silício do silanol dimérico) em função da posição r, para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. 110 1,2 AU-0 2,0 AU-1 1,0 1,5 0,8 0,6 1,0 0,4 0,5 0,2 g (r) 0,0 0,0 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 10,0 10,2 10,4 10,6 10,8 11,0 11,2 r (Å) AU-3 0,4 0,3 0,2 0,1 0,0 10,2 10,4 10,6 10,8 11,0 r (Å) Figura 40: Curvas RDF para os átomos Si e Si_; Si = silício do silanol, Si_ = silício do silanol dimérico. Pela Figura 40 pode ser observado que, para a amostra AU-0, há uma grande probabilidade de se encontrar átomos de Si_ em um raio de aproximadamente 4,5 Å em torno do átomo Si. Esta distância poderia, a princípio, ser considerada grande. No entanto, deve-se considerar que as interações entre o Si_ e o Si acontecem através dos grupos -OH de cada molécula de silanol. Já as curvas RDF das amostras AU-1 e AU-3, que contém uréia em sua composição, não apresentam picos. Em 10,7 Å aparece algum aumento de intensidade nas curvas RDF destas amostras, mas este aumento pode ser considerado como ruído. 111 Assim, pode-se concluir que ocorre a polimerização das moléculas de silanol na amostra sem uréia (AU-0), e nas outras não. Ou seja, a uréia impede a polimerização do silanol e a formação de longas cadeias de silício nos sóis precursores de mulita preparados pelo método solgel coloidal. Para entender como a uréia impede o processo de polimerização da sílica, foi construído os gráficos das curvas RDF das amostras AU-1 e AU-3 para as seguintes interações: Ow-Ou (oxigênio da água-oxigênio da uréia), Si-Ou (silício do silanol e oxigênio da uréia) e Si_Ou (silício do silanol dimérico e oxigênio da uréia). Estas curvas encontram-se representadas nas Figuras 41, 42 e 43. 2,1 AU-1 AU-3 1,5 1,8 1,2 1,5 g (r) 1,2 0,9 0,9 0,6 0,6 0,3 0,3 0,0 0,0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 r (Å) Figura 41: Curvas RDF para os átomos Ow e Ou; Ow = oxigênio da água, Ou = oxigênio da uréia. 3,5 1,8 AU-1 3,0 AU-3 1,5 2,5 1,2 g (r) 2,0 0,9 1,5 0,6 1,0 0,5 0,3 0,0 0,0 -0,5 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 4 5 6 7 8 9 10 11 12 r (Å) Figura 42: Curvas RDF para os átomos Si e Ou; Si = silício do silanol, Ou = oxigênio da uréia. 112 5 1,8 AU-1 AU-3 4 1,5 g (r) 1,2 3 0,9 2 0,6 1 0,3 0,0 0 4 5 6 7 8 9 10 2 11 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 r (Å) Figura 43: Curvas RDF para os átomos Si_ e Ou; Si_ = silício do silanol dimérico, Ou = oxigênio da uréia. Como pode ser observado pela Figura 41, há uma grande probabilidade de se encontrar átomos de Ou em torno do Ow em uma esfera de coordenação de aproximadamente 2,7 Å, tanto para a amostra AU-1 como para a amostra AU-3. Esta interação entre a uréia e a água é um dos fatores que explica o fato de a uréia evitar a polimerização da sílica, uma vez que a água acelera a polimerização da sílica. Pela Figura 42 pode-se notar que existe uma grande probabilidade de se encontrar átomos de Ou em torno do Si em um raio de aproximadamente 4 Å para a amostra AU-1, enquanto que para a amostra AU-3 isto não ocorre. Esta amostra apresenta alguma interação entre estes dois átomos apenas próximo a 8 Å. Já a Figura 43 mostra o contrário da Figura 42: enquanto a amostra AU-1 não apresenta claramente uma interação entre os átomos Ou e Si_, a amostra AU-3 apresenta esta interação bem evidenciada em torno de 3,3 Å. Ou seja, o mecanismo pelo qual a uréia impede a polimerização da sílica também é explicado pelo fato de a uréia interagir com moléculas de silanol na amostra AU-1 e com 113 moléculas de silanol dimérico na amostra AU-3. Assim, a uréia impede a formação de grandes aglomerados de sílica, bloqueando os sítios do silanol e do silanol dimérico responsáveis pela condensação das moléculas, levando à formação de xerogéis com uma maior homogeneidade. As Figuras 44, 45 e 46 mostram as curvas RDF (ou g(r)) para os átomos Al (alumínio) e On (oxigênio do nitrato), Al e Ow (oxigênio da água), e Al e Ou (oxigênio da uréia), em função da posição r, para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3. 70 AU-1 AU-0 50 60 40 50 30 40 30 20 20 10 10 g(r) 0 0 0 2 4 6 8 10 12 0 2 4 6 8 10 r (Å) AU-3 50 40 30 20 10 0 0 2 4 6 8 10 12 r (Å) Figura 44: Curvas RDF para os átomos Al e On; Al = Al3+, On = oxigênio do nitrato. 12 114 30 35 AU-0 AU-1 30 25 25 20 20 15 15 10 10 5 5 0 g (r) 0 0 2 4 6 8 10 12 0 2 4 6 8 10 12 r (Å) 35 AU-3 30 25 20 15 10 5 0 0 2 4 6 8 10 12 r (Å) Figura 45: Curvas RDF para os átomos Al e Ow; Al = Al3+, Ow = oxigênio da água. 35 50 AU-3 AU-1 30 40 25 g (r) 30 20 15 20 10 10 5 0 0 0 2 4 6 8 10 0 12 2 4 6 8 10 r (Å) Figura 46: Curvas RDF para os átomos Al e Ou; Al = Al3+, Ou = oxigênio da uréia. 12 115 Pelas Figuras 44, 45 e 46 nota-se que, para a amostra AU-0, há uma elevada probabilidade de se encontrar átomos de On e Ow em um raio de aproximadamente 2 Å em torno do átomo Al. Para as amostras AU-1 e AU-3, além dos átomos de On e Ow, ainda existe elevada probabilidade de se encontrar átomos de Ou em torno do átomo Al, no raio de aproximadamente 2 Å. Os números de coordenação do Al em relação aos átomos On, Ow e Ou (ou seja, o número de átomos de On, Ow e Ou que estão em torno do Al), em sua primeira esfera de coordenação (raio de aproximadamente 2 Å), estão mostrados na Tabela 19. Tabela 19: Número de coordenação (n) do alumínio (Al) em relação ao oxigênio do nitrato (On), oxigênio da água (Ow) e ao oxigênio da uréia (Ou), e distância de cada um deles ao Al. Amostra n(Ow) n(On) n(Ou) n(total) AU-0 5,35 0,65 - 6,0 AU-1 5,17 0,66 0,17 6,0 AU-3 5,17 0,49 0,34 6,0 r médio até o Al 1,86 Å 1,60 Å 1,90 Å - Pela Tabela 19 pode ser observado que o número total de átomos em torno do Al é 6,0 para todas as amostras em um raio de aproximadamente 2 Å. Ou seja, o cátion alumínio é hexacoordenado nos três sóis estudados. O que varia é o número de átomos de oxigênio provenientes do nitrato, da água e da uréia, que estão na vizinhança do Al. Deve-se enfatizar que o número de coordenação deveria ser um número inteiro. Porém, o seu cálculo é baseado na análise das distribuições das moléculas no interior da caixa de simulação durante o transcorrer do tempo após o período de equilíbrio. Os números fracionários indicam que nem todo o tempo foi observado a presença do referido complexo no interior da caixa. 116 Assim, o número de coordenação fracionário está relacionado com a probabilidade de se encontrar uma determinada espécie durante o período de simulação. Durante todo período de simulação e em todas as amostras, o alumínio apresentou-se na forma hexacoordenado. A amostra AU-0 apresentou n(Ow)= 5,35 e n(On)=0,65. Isto significa que, durante a simulação, foram encontradas duas estruturas contendo alumínio para a amostra AU-0: [Al(H2O)6]3+ e [Al(H2O)5NO3]2+. A estrutura [Al(H2O)6]3+ tem 35 % de probabilidade de ser encontrada, e a estrutura [Al(H2O)5NO3]2+ tem 65 %. A amostra AU-1 apresentou n(Ow)=5,17, n(On)=0,66 e n(Ou)=0,17. Neste caso, o íon alumínio pode formar três complexos: [Al(H2O)6]3+, [Al(H2O)5NO3]2+ e [Al(H2O)5(uréia)]2+. A probabilidade da formação da espécie [Al(H2O)6]3+ é de 17 %, a probabilidade de formação da estrutura [Al(H2O)5NO3]2+ é de 66 %, e a probabilidade de formação da espécie [Al(H2O)5(uréia)]3+ é de 17 %. Para a amostra AU-3 foi observado: n(Ow)= 5,17, n(On)= 0,49 e n(Ou)= 0,34. Novamente é observada a formação das mesmas três estruturas já observadas para a amostra AU-1: [Al(H2O)6]3+, [Al(H2O)5NO3]2+ e [Al(H2O)5(uréia)]3+. Neste caso, o que varia é a probabilidade de se encontrar estas estruturas durante o transcorrer da simulação: 17 % para a estrutura [Al(H2O)6]3+, 49 % para a espécie [Al(H2O)5NO3]2+ e 34% para a estrutura [Al(H2O)5(uréia)]3+. Assim, os resultados destas simulações indicam que, nos sóis preparados com uréia, há a formação de um composto entre o alumínio, a água e a uréia, cuja fórmula é [Al(H2O)5.(uréia)]3+. Também foi observado em simulações por Monte Carlo [50] de misturas de água, alumínio e uréia em excesso, um composto entre o alumínio, a água e a uréia. Nesta ocasião foi determinado que a uréia complexa o alumínio através da seguinte fórmula: [Al(H2O)4.(uréia) 2]3+. A diferença no número de moléculas de uréia ligadas ao alumínio pode ser explicada devido ao fato deste estudo citado não ter utilizado moléculas de nitrato na simulação. O nitrato ocupa espaço dentro da primeira esfera de coordenação do alumínio. Embora o número de moléculas de uréia seja 117 diferente nos dois casos, em ambos o alumínio é hexacoordenado, sendo que a uréia substitui moléculas de água na esfera de coordenação do alumínio. A partir da Tabela 19, pode-se traçar um gráfico do número de coordenação do Al em relação ao Ou, que é mostrado na Figura 47. Nesta Figura também foi colocado o gráfico da intensidade dos picos de raios X de mulita/NaCl para as diferentes amostras queimadas a 1250 °C por 2 horas, que já havia sido mostrado anteriormente na Figura 19. 0,4 Número de coordenação do Al em relação ao Ow Intensidade dos picos mulita/NaCl 1,2 1,0 0,8 0,6 0,4 0,3 0,2 0,1 0,0 -0,1 0 1 2 Razão molar Uréia/Al 3 3+ 0 1 2 3 3+ Razão molar Uréia/Al Figura 47: Gráficos da intensidade dos picos de mulita/NaCl das amostras queimadas a 1250 °C por 2 horas e do número de coordenação do Al em relação ao Ou para as diferentes razões molares de uréia/Al3+; Al = Al3+, Ou = oxigênio da uréia. Através da Figura 47, pode-se notar a mesma tendência nos dois gráficos: um aumento crescente na quantidade de mulita formada a 1250 °C e no tempo em que existe o complexo 118 [Al(H2O)5.(uréia)]3+ no sol precursor de mulita à medida que a quantidade de uréia adicionada é maior. Isso indica que, para as amostras AU-0, AU-1 e AU-3, a formação de mulita está ligada à formação do complexo [Al(H2O)5.(uréia)]3+. Isso porque, com a formação de compostos entre o alumínio, a água e a uréia, a formação de longas cadeias de Al–O–Al deve torna-se mais lenta. Assim, a redução da velocidade da reação de condensação das moléculas de oxihidróxido de alumínio, juntamente com a redução da velocidade da polimerização do silanol, são os motivos que explicam o efeito positivo que a uréia causa nos precursores de mulita preparados pelo método sol-gel coloidal. Deve-se ressaltar que o motivo pelo qual foi explicado o efeito negativo que a uréia causou nas amostras preparadas pelo método polimérico foi a interação, tanto da uréia como do silanol e do nitrato de alumínio, com as poucas moléculas de água. Através dos resultados das simulações apresentados na Figura 41 pode-se provar que existe esta interação entre a uréia e a água. A interação entre o íon Al3+ com a água pode ser visualizada através dos resultados das simulações mostrados na Figura 45. A Figura 48 apresenta as curvas RDF (ou g(r)) para os átomos Al e Si. Pelas curvas da Figura 48, observa-se que, para as amostras AU-0 e AU-3, há uma grande probabilidade de se encontrar átomos de Si em torno de Al em um raio de aproximadamente 4,5 Å. Observa-se que as amostras AU-0 e AU-3 formam estruturas de alumínio com a primeira esfera de coordenação ao redor de 4,5 Å, sendo que a amostra AU-3 apresenta uma segunda esfera de coordenação ao redor de 7 Å. Já a curva RDF da amostra AU-1 não apresenta os picos característicos das amostras AU0 e AU-3. Enquanto nas amostras AU-1 e AU-3 as posições dos átomos é claramente definida, na amostra AU-1 tanto a posição é indefinida como as intensidades dos picos são muito baixas quando comparadas com as primeiras. Portanto, a probabilidade de existir átomos de Si em torno 119 do Al na amostra AU-1 deve ser pequena. Assim, o sol precursor da amostra AU-1 ainda não mostra interações entre Al e Si. 25 3,0 AU-1 AU-0 2,5 20 2,0 15 1,5 10 1,0 5 0,5 g (r) 0 0,0 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 6 7 8 9 10 11 35 AU-3 30 25 20 15 10 5 0 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 r (Å) Figura 48: Curva RDF para os átomos Al e Si; Al = Al3+, Si = silício do silanol. Pela Figura 48 também pode ser observado que a amostra AU-3 apresentou grande probabilidade de existir uma interação entre o Al e o Si. Isso está de acordo com os difratogramas de raios X, que mostraram que a amostra AU-3 cristaliza mulita a uma temperatura baixa. Como o sol precursor da amostra AU-3 já apresenta uma estrutura semelhante à da mulita, esta se cristaliza a temperaturas mais baixas. 120 Entretanto, a amostra AU-0 foi a amostra que apresentou, através dos difratogramas de raios X, a menor quantidade de mulita formada. Ou seja, mesmo o sol precursor da amostra AU-0 apresentando interações entre o Al e o Si, este precursor mostrou ser o pior para a formação de mulita. A polimerização do silanol e do oxihidróxido de alumínio nesta amostra deve ter sido grande o suficiente para prejudicar a formação de mulita, mesmo já havendo alguma interação entre os átomos de Al e Si no sol precursor. A uréia pode, portanto, exercer dois efeitos na formação dos géis precursores de mulita: atua tanto no controle da hidrólise e condensação do íon alumínio, como na hidrólise e condensação do silício. Assim, ao controlar as etapas de hidrólise e condensação dos íons alumínio e silício, a uréia evita uma intensa segregação de fases de alumina e sílica, facilitando então a formação de mulita. 121 5 CONCLUSÕES Foi observado que a uréia ajuda a aumentar a homogeneidade dos géis preparados através do procedimento I (processo sol-gel coloidal). Entretanto, ela prejudica a formação de mulita quando os géis são preparados pelo procedimento II (processo sol-gel polimérico). Isso porque tanto a uréia como o silanol e o nitrato de alumínio têm afinidade pela água, e, no caso do processo sol-gel polimérico, as únicas moléculas de água presentes são as que fazem parte da água de cristalização do nitrato de alumínio nonahidratado. Dessa forma, a uréia, o silanol e nitrato de alumínio concorrem pelas poucas moléculas de água presentes no gel preparado pelo procedimento II. Assim, a adição de uréia acaba dando origem a partículas brancas precipitadas, gerando heterogeneidade nos géis. Porém, o efeito da uréia na cristalização da mulita foi positivo quando houve grande quantidade de água disponível no meio. Foi mostrado através de simulação computacional que, no caso de sóis preparados pelo procedimento I, a uréia atua no controle da hidrólise e condensação do íon alumínio e do silício. Isso ocorre através da formação do composto [Al(H2O)5.(uréia)]3+, o que torna mais lenta a formação das longas cadeias de Al–O–Al. Além disso, a simulação também mostrou que a uréia impede a polimerização das moléculas de silanol. Isso porque a uréia interage com a água, e, desta forma, reduz a quantidade de moléculas de água disponíveis para a formação das longas cadeias de Si–O–Si. Além disso, a uréia interage com as moléculas de silanol na amostra AU-1 e com as moléculas de silanol dimérico na amostra AU-3, bloqueando os sítios do silanol e do silanol dimérico responsáveis pela condensação, evitando a polimerização da sílica. Assim, a uréia evita uma intensa segregação de fases de alumina e sílica das amostras preparadas pelo processo sol-gel coloidal, facilitando então a formação de mulita. 122 Nas amostras preparadas pelo processo sol-gel coloidal, a uréia reduziu a temperatura de cristalização de mulita, aumentou a quantidade de mulita formada, aumentou a proporção de silício/alumínio das amostras e ainda reduziu a porosidade das partículas. Dentre as amostras preparadas pelo procedimento I, a que mostrou maior formação de mulita após a queima a 1200 e a 1250 °C foi a amostra AU-3. Além disso, a amostra AU-3 revelou a menor temperatura de formação de mulita dentre as amostras preparadas pelo processo sol-gel coloidal: 1100 °C, que é uma temperatura de cristalização baixa quando comparada com a literatura. Ainda pode ser destacado que esta foi a única amostra que não segregou a fase αalumina após o aquecimento até uma temperatura de 1250 °C. Os valores da energia de ativação encontrados para a amostra AU-0 foram menores em relação às amostras AU-1 e AU-3. Isto pode ser explicado por dois motivos, sendo um mais global e outro mais específico. O primeiro motivo, mais global, é a existência de uma quantidade muito pequena de materiais com elevada homogeneidade na amostra sem uréia, causada pela extensa segregação de fases. A segunda razão que explica a menor energia de ativação da amostra AU-0 é a segregação da fase α-alumina nesta amostra desde 1000 °C, temperatura anterior à formação de mulita. Desta forma, a sílica fica em excesso em relação à alumina disponível para a formação de mulita, que é a alumina da interface sílica/alumina. Então a sílica, estando em excesso, liga-se mais facilmente à alumina da interface, e a energia de ativação da reação é menor. A quantidade de mulita formada para a amostra AU-0 é, no entanto, pequena, pois a quantidade de alumina disponível para reação é menor, uma vez que o conteúdo do interior das partículas de α-alumina não estão em contato com a sílica. As amostras preparadas pelo procedimento I apresentam o mesmo mecanismo da reação de cristalização de mulita ortorrômbica: o mecanismo de Šesták e Berggren (SB). Este mecanismo descreve um processo de cristalização complexo, onde a nucleação ocorre 123 concomitantemente ao crescimento de fases. Os parâmetros do mecanismo SB encontrados para as amostras AU-1 e AU-3 foram muito semelhantes. Já os parâmetros encontrados para a amostra AU-0 mostraram alguma discrepância em relação aos valores apresentados pelas amostras com uréia. Ou seja, enquanto o processo de cristalização para as amostras preparadas por sol-gel coloidal e com a adição de uréia são semelhantes, a amostra sem uréia apresenta um processo particular de cristalização de mulita ortorrômbica. 124 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 6.1 Sugestões para trabalhos futuros A seguir são apresentadas sugestões para o prosseguimento do presente trabalho: - Aplicação da técnica de RMN às amostras AU-0, AU-1 e AU-3, queimadas a várias temperaturas, para melhor entendimento do efeito da uréia em cada uma delas. - Aplicação da técnica de MEV acoplado ao EDS e mapeamento das amostras AU-0, AU-1 e AU-3 queimadas a várias temperaturas, mostrando as regiões de sílica, alumina e mulita. - Preparação de amostras com diferentes porcentagens de mulita/NaCl, para submetê-las à análise de DRX, com o objetivo de obter uma curva de calibração para quantificar a formação de mulita. 6.2 Produção científica Durante a execução deste trabalho foram publicados 2 artigos em periódicos e 4 artigos em anais de Congressos. 6.2.1 Artigos publicados em periódicos -SILVA, N. T.; NASCIMENTO, N. F.; CIVIDANES, L. S.; BERTRAN, C. A.; THIM, G. P. Kinetics of cordierite crystallization from diphasic gels. Journal of Sol-Gel Science and Technology, v. 47, p. 140-147, 2008. -PELA, R. R.; CIVIDANES, L. S.; KAWACHI, E. Y.; ZANETTI, S. M.; THIM, G. P. Kinetic study of α-BZN crystallization obtained from chemical method. Materials Research, v. 11, p. 512, 2008. 125 6.2.2 Artigos Publicados em Anais de Congressos / Participações em Congressos -CAMPOS, T. M. B.; CIVIDANES, L. S.; GARCIA, R. B. R.; KAWACHI, E. Y.; THIM, G. P. Efeito do Tratamento Térmico e do Ácido Cítrico na Cristalização da Mulita. In: 63º Congresso anual da ABM, 2008, Santos. 63º Congresso Anual da ABM, 2008. -GARCIA, R. B. R.; PASCOLI, A. S. ;CIVIDANES, L. S.; THIM, G. P.; KAWACHI, E. Y. Influência do Ácido acético na formação de mulita por sol-gel. In: 63º Congresso Anual da ABM, 2008, Santos. Anais do 63º Congresso Anual da ABM, 2008. -CIVIDANES, L. S.; GARCIA, R. B. R.; KAWACHI, E. Y.; BERTRAN, C. A.; THIM, G. P. Efeito da Uréia na Cristalização da Mulita. In: 18º Congresso Brasileiro De Engenharia e Ciência dos Materiais - CBECiMat, 2008, Ipojuca - PE. Anais do 18º CBECiMat, 2008. -GARCIA, R. B. R.; CIVIDANES, L. S.; LIU, A. S.; THIM, G. P.; KAWACHI, E. Y. Obtenção de Filmes Finos de Sílica/Zircônia e Mulita/Zircônia pelo Processo Sol-Gel. In: 18º Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais – CBECiMat, 2008, Ipojuca - PE. Anais do 18º CBECiMat, 2008. 126 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] SHEPHERD, E.S.; RANKIN, G.A.; WRIGHT, W. The binary system of alumina and silica, lime and magnesia. American Journal of Science, v. 28, p. 301, 1909. Citado em: SCHNEIDER, H.; KOMARNENI, S. Mullite. Weinheim: Wiley-VCH, 2005. [2] BOWEN N.L.; GREIG J.W. The system Al2O3-SiO2. Journal of the American Ceramic Society, v. 7, p. 238-410, 1924. Citado em: SCHNEIDER, H; KOMARNENI, S. Mullite. Weinheim: Wiley-VCH, 2005. [3] SCHNEIDER, H.; KOMARNENI, S. Mullite. 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AUTOR(ES): Luciana De Simone Cividanes Coppio 7. INSTITUIÇÃO(ÕES)/ÓRGÃO(S) INTERNO(S)/DIVISÃO(ÕES): Instituto Tecnológico de Aeronáutica - ITA 8. PALAVRAS-CHAVE SUGERIDAS PELO AUTOR: Mulita, uréia, sol-gel, cinética, simulação 9.PALAVRAS-CHAVE RESULTANTES DE INDEXAÇÃO: Mulitas; Uréia; Cristalização; Processos sol-gel; Cinética das reações; Síntese (Química); Simulação; Engenharia química 10. APRESENTAÇÃO: X Nacional Internacional ITA, São José dos Campos. Curso de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Aeronáutica e Mecânica. Área de Física e Química dos Materiais Aeroespaciais. Orientador: Gilmar Patrocínio Thim. Defesa em 11/08/2009. Publicada em 2009. 11. RESUMO: Devido às propriedades químicas, físicas e mecânicas da mulita, este material tem sido utilizado em peças sujeitas a grandes esforços mecânicos e submetidas a temperaturas elevadas. Suas propriedades estão correlacionadas com o método de síntese utilizado. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é estudar o efeito da uréia na cristalização da mulita, sintetizada através dos processos sol-gel coloidal e sol-gel polimérico. A adição da uréia em géis coloidais levou à obtenção de materiais mais puros e em temperaturas menores (efeito positivo), ao contrário do que ocorreu para os géis poliméricos (efeito negativo). O efeito da adição da uréia nas amostras coloidais foi estudado através das técnicas de DRX, FTIR, MEV, TG, DSC e simulação computacional. A cinética de cristalização de mulita ortorrômbica foi estudada utilizando o método isoconversional, não isotérmico, de Flynn-Wall-Ozawa. O efeito positivo da presença da uréia nos géis coloidais está relacionado à sua participação nas etapas de hidrólise e condensação do alumínio e do silício, através da interação da uréia com o alumínio, com a água e com o silanol, evitando a intensa segregação de fases, como foi mostrado pela simulação computacional. Já o efeito negativo causado pela uréia nos géis poliméricos ocorreu pela concorrência entre o silanol, o nitrato de alumínio e a uréia pelas poucas moléculas de água presentes nestas amostras. As amostras coloidais com uréia formaram mulita em maior quantidade e em menor temperatura, além de apresentarem maior proporção de silício/alumínio e menor porosidade. A amostra com maior concentração de uréia mostrou-se a mais homogênea, formando mulita em temperatura menor e não segregando a fase α-alumina. Os valores de energia de ativação encontrados para a amostra coloidal sem uréia foram menores em relação às amostras com uréia. Acredita-se que a extensa segregação de fases na amostra sem uréia tenha gerado uma quantidade muito pequena de materiais com elevada homogeneidade. As amostras coloidais apresentaram o mecanismo de Šesták e Berggren (SB) para a reação de cristalização de mulita ortorrômbica. 12. GRAU DE SIGILO: (X ) OSTENSIVO ( ) RESERVADO ( ) CONFIDENCIAL ( ) SECRETO
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