Imprimir artigo

Transcrição

Imprimir artigo
1
PUNIBILIDADE, ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS E CAUSAS EXTINTIVAS DA
PUNIBILIDADE
PUNISHMENT, EXCUSES ACQUITTALS AND EXTINCTIVE CAUSES OF
CRIMINALITY
Claudemir Lopes Bozzi1
RESUMO
Este artigo versa sobre punibilidade, escusas absolutórias e as causas extintivas da punibilidade.
Sendo punibilidade possibilidade jurídica de impor pena ao violador da lei penal, observando
causas de extinção do poder de punir do Estado. Destaca-se surgir fatos ou atos jurídicos que
extingam punibilidade, garantias individuais frente poder estatal punitivo. Causas de extinção
da punibilidade enquanto fatos/atos jurídicos a impedir o Estado de exercer seu direito de punir
infratores da lei penal. Em certas hipóteses agente é isento de pena por expressa determinação
legal. Mesmo ocorrendo prática do delito - ação ou omissão típica, antijurídica e culpável - a
imposição de sua consequência (pena/medida de segurança) resta obstada por causa de natureza
pessoal, fundada em razões de conveniência e oportunidade. Portanto, escusas absolutórias são
taxativa e expressamente consignadas nos textos legais. Causas extintivas da punibilidade são
atos ou fatos que impedem a aplicação da sanção penal ou, seja, as escusas absolutórias são
causas pessoais de isenção de pena. As condições objetivas de punibilidade são estruturadas de
forma objetiva; já as escusas absolutórias são formuladas de modo negativo, afastando a
punibilidade do mesmo. Em ambas, crime encontra-se perfeitamente estruturado, somente a
possibilidade de aplicação da pena é sobrestado por considerações político-criminais. Causas
de extinção da punibilidade implicam renúncia, pelo Estado, do exercício do direito de punir,
seja pela não-imposição de uma pena, seja pela não-execução ou interrupção do cumprimento
daquela já aplicada. Por fim, destaca-se, que há rol não taxativo das causas extintivas da
punibilidade: morte do agente, abolitio criminis, anistia, indulto, graça, decadência, perempção,
prescrição, perdão do ofendido, renúncia, retratação e perdão judicial (artigo 107 do Código
Penal). Há, ainda, outras causas extintivas: cumprimento do período de prova do sursis da pena
e do sursis processual sem revogação.
Palavras-chave: Punibilidade. Escusas Absolutórias. Causas Extintivas da Punibilidade.
ABSTRACT
This article versa on criminal liability, absolving excuses and extinctive causes of criminality.
It is punishability legal possibility of imposing penalty to the violator of the criminal law, noting
extinction causes the power to punish the state. It is noteworthy arise facts or legal acts that
extinguish criminal liability, earmarking power forward punitive state. Causes of extinction of
1
BOZZI, Claudemir Lopes. É advogado, professor, assessor jurídico da Pastoral Carcerária do Estado
do Paraná. Formado em Filosofia (UEL) e Direito (UEL). Especialista em Filosofia Política e Jurídica
(UEL). Especialista em Direito Penal e Processo Penal (UEL). Especialista em Direito Civil e Processo
Civil (UEL).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
2
criminal liability as facts / legal acts to prevent the State from exercising its right to punish
offenders of criminal law. In certain assumptions agent is exempt from punishment by express
legal determination. Even occurring commission of the offense - typical action or omission,
wrongful and culpable - the imposition of its consequences (penalty / security measure) remains
hampered because of a personal nature, founded on convenience and opportunity reasons.
Therefore absolving excuses are exhaustively and expressly set out in the legislation. extinctive
causes of punishment are acts or facts which prevent the application of criminal sanctions, or
is, absolving excuses are personal causes of exemption from punishment. The objective
conditions of criminality are structured in an objective manner; already the acquittals excuses
are formulated in a negative way, removing the criminality of it. In both cases, crime is perfectly
structured, only the possibility of application of the penalty is halted for political-criminal
considerations. Causes of extinction of punishment imply renunciation by the State of the right
to punish, or by non-imposition of a sentence, or by non-performance or interruption of the
fulfillment of that already applied. Finally, it is emphasized that there is no exhaustive list of
extinctive causes of punishment: death of the agent, abolitio criminis, amnesty, pardon, grace,
decay, Abatement, prescription, forgiveness of the victim, resignation, withdrawal and judicial
pardon (Article 107 the Penal Code). There are also other extinctive causes: compliance with
the probation period of test pen and procedural probation without repeal.
Key- words: Punishment . Excuses acquittals . Extinctive causes of Punishment.
1 INTRODUÇÃO
Neste artigo científico pretende-se apresentar, de forma sucinta, a questão da
punibilidade, bem como das chamadas escusas absolutórias e as causas extintivas da
punibilidade.
O que se compreende pelo conceito jurídico-penal o termo “punibilidade”? Seria ele
um conceito unívoco, equívoco, uníssono? Tratar-se-ia, apenas, de possibilidade jurídica de
impor pena ao violador da lei penal? Há que se considerar, também, o estudo das causas de
extinção do poder de punir do Estado? Quais seriam os fatos ou atos jurídicos que extinguem a
punibilidade? Ou seja, as denominadas “causas de extinção da punibilidade”, que se configuram
enquanto garantias individuais frente ao poder estatal punitivo, ou seja o grande Leviatã? Poderse-ia inferir que as causas de extinção da punibilidade são aqueles fatos ou atos jurídicos que
impedem o Estado de exercer seu direito de punir os infratores da lei penal?
Quais seriam as hipóteses em que o agente é isento de pena por expressa determinação
legal? Não obstante a prática do delito (ação ou omissão típica, antijurídica e culpável) a
imposição de sua consequência (pena/medida de segurança) resta obstada por causa de natureza
pessoal, fundada em razões de conveniência e oportunidade? Estariam as escusas absolutórias
taxativa e expressamente consignadas apenas em textos legais? As causas extintivas da
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
3
punibilidade são atos ou fatos que impedem a aplicação da sanção penal ou, seja, as escusas
absolutórias são causas pessoais de isenção de pena? Uma vez configurado o delito, presentes
as escusas absolutórias não ocorrerá a imposição da pena abstratamente cominada?
Quais seriam as condições objetivas de punibilidade e em que se diferem das escusas
absolutórias? Se o crime encontra-se perfeitamente estruturado, as razões político-criminais
podem sobrestar a aplicação da pena?
A que se condição objetiva de punibilidade, sua ausência exclui a punibilidade do
delito em relação aos demais coautores ou partícipes? Ainda mais, diversamente, a escusa
absolutória – instituída de modo taxativo pela lei – não se comunica aos eventuais partícipes
que não apresentem as características personalíssimas exigidas, pois são causas pessoais de
isenção de pena?
Quais seriam as diferenças entre as causas extintivas da punibilidade e as causas de
isenção de pena? As causas de extinção da punibilidade implicam renúncia, pelo Estado, do
exercício do direito de punir, seja pela não-imposição de uma pena?
Qual seria o rol não taxativo das causas extintivas da punibilidade no ordenamento
jurídico-penal? Haveria outras causas extintivas da punibilidade? É o que veremos neste artigo
científico!
2 CONDIÇÕES OBJETIVAS DE PUNIBILIDADE E ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS
Pretende-se apresentar, de forma sumária, (1) as condições objetivas de punibilidade,
bem como as (2) escusas absolutórias e, por fim, (3) causas extintivas da punibilidade
(prescrição).
2.1 As condições objetivas de punibilidade
Antes, porém, há que relembrar a sistemática referente a crime. Como bem ressalta Luiz
Regis Prado (2004: 705) crime é ação ou omissão típica, antijurídica e culpável. Assim, a
culpabilidade não integra, segundo Prado, o conceito analítico de delito. Desta feita, com a
realização de um ilícito penal, o direito de punir do Estado (antes abstrato) torna-se concreto,
surgindo assim a punibilidade. Portanto, a punibilidade é a aplicabilidade da pena, isto é, a
possibilidade jurídica de impor a sanção penal, destaca Régis Prado (com fundamento em
ANTOLISEI). Portanto, a punibilidade é mera condicionante ou pressuposto da consequência
jurídica do delito (enquanto pena ou medida de segurança).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
4
Com bem destaca Régis Prado (2004: 705), a punibilidade constitui um momento
posterior em relação ao delito, e neste tem sua origem. Algumas vezes, está subordinada ao
implemento de uma condição extrínseca ao delito – condição objetiva de punibilidade – já em
outras, o agente está isento de pena em razão de uma condição de natureza pessoa – caso de
escusa absolutória); estas duas situações são condições de punibilidade positivas (ou seja,
condições objetivas de punibilidades) ou negativas, ou seja, escusas absolutórias; por
derradeiro, há casos em que a punibilidade (inicialmente configurada) é declarada extinta, os
casos de extinção da punibilidade.
Neste sentido, também se manifestou René Ariel Dotti, sobre as condições objetivas de
punibilidade, observando que também são independentes as noções de punibilidade e de
condição objetiva de punibilidade. Esta é exterior à conduta típica, mas a lei estabelece como
indispensável para a punibilidade. Conforme autorizada doutrina (FRAGOSO, 1985. p. 225),
não existe crime antes que a condição objetiva de punibilidade se verifique. Antes dela não se
pode falar em crime condicional ou condicionado e muito menos de crime de punição
condicionada, como querem alguns autores italianos, porém um fato irrelevante para o Direito
Penal. O fato somente se torna punível a partir do momento em que a condição se realiza. A
condição objetiva de punibilidade geralmente é referida no preceito ou na sanção, podendo, no
entanto, resultar de uma norma geral, como bem destaca o eminente jurista Dotti.
Neste mesmo diapasão, segundo Kalinca de Carli, no Direito Penal, a punibilidade não
constitui requisito do crime, mas sua consequência jurídica. Os requisitos do crime, sob o
aspecto formal, são o fato típico e a antijuridicidade. A culpabilidade constitui o pressuposto da
pena. Assim, a prática de um fato típico e ilícito, sendo culpável o sujeito, faz surgir a
punibilidade.
Ainda Conforme leciona Damásio de Jesus:
Quando o sujeito pratica um crime, surge a relação jurídico-punitiva: de um lado,
aparece o Estado com o jus puniendi; de outro, o réu, com a obrigação de não
obstaculizar o direito de o Estado impor a sanção penal. Com a prática do crime, o
direito de punir do Estado, que era abstrato, torna-se concreto, surgindo a
punibilidade, que é a possibilidade jurídica de o Estado impor a sanção (JESUS, 1990:
589).
Neste sentido, a sanção criminal corresponde à medida com que o Estado reage em face
da violação da norma punitiva. É a resposta dada pelo Estado ao infrator da norma
incriminadora. Conforme Flávio Augusto Monteiro Monteiro de Barros, pena é “uma sanção
consistente na privação de determinados bens jurídicos, que o Estado impõe contra a prática de
um fato definido na lei como crime” (BARROS, 2001: 359).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
5
No tocante às “condições objetivas de punibilidade”, sua existência foi pioneiramente
assinalada por Binding, que as disciplinou com fundamento em sua teoria das normas
(Fragoso). De acordo com Binding há nas leis penais momentos objetivos – estranhos ao delito
– que constituem pressupostos da punibilidade, conforme destaca Régis Prado (2004: 708). São
condições ulteriores da punição, alheias ao ato delituoso e que, em razão disso, devem ser
analisadas em separado. Posteriormente, ao sistematizar as características do delito, Ernst von
Beling afirmou que as circunstâncias constitutivas de uma condição de punibilidade (objetivas
e extrínsecas) não pertencem ao tipo de delito, distinguindo-se de seus elementos constitutivos
por não serem necessariamente abarcadas pelo dolo do agente, como explica Luiz Régis Prado
(2004: 708).
Ainda conforme leciona Régis Prado:
Em que pese a ampla aceitação alcançada pelas condições objetivas de punibilidade,
certos autores negam peremptoriamente sua existência, sob fundamentos diversos.
Alegam, por exemplo, que tais condições afrontariam o princípio da culpabilidade e
que parte delas não passaria de autênticos elementos do tipo ou de pressupostos
processuais (PRADO, 2004: 708).
Neste contesto, de acordo com Régis Prado, quanto à definição e a exata natureza
jurídica das condições objetivas de punibilidade é “questão tormentosa”. Por um lado, parte da
doutrina considera-as como acontecimentos futuros e incertos, cuja realização é indispensável
para a integração jurídica do delito. Admitindo-se a punibilidade como elemento do conceito
de crime, argumenta-se estar “fora de dúvida não haver delito enquanto não se verifique a
ocorrência da condição. Faltaria, aqui, um elemento que, no caso específico, é pressuposto para
a existência de um requisito essencial do delito” (BATTAGLINI, apud PRADO, 2004: 709).
De outra parte, defende-se que as condições objetivas de punibilidade integram a noção
de tipo penal em sentido amplo, isto é, aquele que engloba não apenas os elementos que
fundamentam positivamente o injusto, mas também os que condicionam sua punibilidade. As
condições objetivas de punibilidade pertenceriam, pois, ao tipo penal porque condicionariam
sua objetiva relevância penal.
Além disso, destaca Régis Prado (2004:709), uma terceira posição, diversa das
anteriores, entende que as condições objetivas de punibilidade pressupõem um delito completo
em todos os seus elementos constitutivos, funcionando, portanto, como condicionantes da
aplicação concreta da pena. Segundo essa corrente de pensamento, tais condições não
constituem requisitos do delito – como postulam aqueles para os quais a punibilidade é
elemento do crime –, mas apenas dizem respeito à imposição da sanção penal, visto que o crime
já estaria perfeito em todos os seus elementos estruturais. Logo, a função dessas condições não
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
6
seria certamente a de permitir a punibilidade de um delito pelo seu concurso ao aperfeiçoamento
do mesmo, mas sim a de, excepcionalmente, “suspender a punibilidade, submetendo-a à
ocorrência de um evento ulterior e extrínseco de um delito já perfeito” (BELLINI, apud
PRADO, 2004: 710).
Neste sentido, tem-se que as condições objetivas de punibilidade são alheias à noção de
delito (ação ou omissão típica, ilícita ou antijurídica e culpável) e, de conseguinte, ao nexo
causal. Ademais, destaca Régis Prado:
Atuam objetivamente, ou seja, não se encontram abarcadas pelo dolo ou pela culpa.
São condições exteriores à ação e delas depende a punibilidade do delito, por razões
de política criminal (PRADO, 2004: 710).
Cumpre reconhecer, destaca Régis Prado, que a esfera das condições de punibilidade é
pouco estável e que, conforme Maurach, “o número de condições unanimemente reconhecidas
como tais é muito inferior ao daquelas que têm a sua natureza discutida” (apud PRADO, 2004:
710). Um exemplo ilustrativo é o resultado de morte ou lesão grave previsto no crime do artigo
122 do Código Penal. Nessa hipótese legal, embora consumado o delito com o simples
induzimento, instigação ou auxílio, a punibilidade encontra-se condicionada à consumação ou
tentativa de suicídio, quando esta resulta em lesão corporal de natureza grave.
Ressalta-se ainda que, de acordo com Régis Prado:
A presença ou não das condições de punibilidade é indiferente para a consumação do
crime. Consuma-se, pois, o delito independentemente do advento da condição.
Todavia, não se verificando a condição objetiva de punibilidade, o delito não será
punível, nem sequer como tentado. Como decorrência lógica, tampouco a participação
poderá ser punida, em razão da não satisfação da condição de punibilidade exigível
pelo delito. O termo inicial da prescrição nos delitos de punibilidade condicionada,
porém, não começa a correr a partir do dia em que o crime se consumou (art. 111, I,
CP), mas sim com o implemento da condição objetiva. E isso porque, sendo a
prescrição causa extintiva de punibilidade, uma vez não configurada esta não há falar
em extinção (PRADO, 2004: 711).
Por fim, cabe não confundir as condições objetivas de punibilidade e as condições de
procedibilidade, que é de natureza processual, destaca Régis Prado. As de natureza processual
“não influem na punibilidade do crime, mas representam tão-somente obstáculo ao início ou
prosseguimento da ação penal” (PRADO, 2004: 711).
Em suma, praticado o delito, pode a lei exigir a presença de uma condição objetiva para
considerar punível o fato praticado. Como esclarece Julio Mirabete:
Há casos [...] em que a punibilidade, por razões de política criminal, está na
dependência do aperfeiçoamento de elementos ou circunstâncias não encontradas na
descrição típica do crime e exteriores à conduta. São chamadas de condições objetivas
porque independem para serem consideradas como condições para a punibilidade, de
estarem cobertas pelo dolo do agente (Não registra a lei penal brasileira, contudo,
disposição geral expressa a respeito das chamadas condições objetivas de punibilidade
(MIRABETE, 1986: p.368).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
7
Damásio de Jesus exemplifica um caso de condição objetiva de punibilidade:
Art. 7º, § 2º, b e c, do CP. Na extraterritorialidade condicionada da lei penal brasileira,
as circunstâncias de ‘ser o fato punível também no país em que foi praticado’ e ‘estar
o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição’
constituem condições objetivas de punibilidade. Elas se encontram fora do crime
praticado pelo agente e a sua ocorrência não depende do dolo do agente, pois este faz
parte do tipo. A separação, porém, tem em vista tornar mais clara a compreensão. Se
a punibilidade não é requisito do crime, a circunstância que a condiciona não pode
encontrar-se no crime, mas fora dele. Assim, a circunstância de o fato ‘ser punível
também no país em que for praticado’ não se acha no delito cometido pelo agente,
mas fora dele. Além disso, essa circunstância não depende da vontade do sujeito. No
que tange à extradição, a circunstância não faz parte do fato cometido pelo sujeito e
não depende de sua vontade (JESUS, 1990: 590).
2.2 Escusas absolutórias
Definida a punibilidade enquanto possibilidade jurídica de impor pena ao violador da
lei penal parte-se para o estudo das causas de extinção do poder de punir do Estado. Nesse
passo, observa-se que podem surgir fatos ou atos jurídicos que extingam a punibilidade – as
denominadas “causas de extinção da punibilidade” –, que se configuram enquanto garantias
individuais frente ao poder estatal punitivo. Por isso, como destaca Celso Delmanto, diz-se que
as “causas de extinção da punibilidade são aqueles fatos ou atos jurídicos que impedem o Estado
de exercer seu direito de punir os infratores da lei penal” (DELMANTO, 2002: 202).
A esse propósito, faz–se mister trazer à colação o entendimento do eminente Professor
Luiz Regis Prado, que assim propõe:
Existem hipóteses em que o agente é isento de pena por expressa determinação legal.
Assim, não obstante a prática do delito – ação ou omissão típica, antijurídica e
culpável-, a imposição de sua consequência (pena/medida de segurança) resta
obstada por causa de natureza pessoal, fundada em razões de conveniência e
oportunidade. As escusas absolutórias encontram–se taxativa e expressamente
consignadas nos textos legais, mormente na parte especial dos Códigos Penais
(PRADO, 2004: 712).
Portanto, as causas extintivas da punibilidade são atos ou fatos que impedem a aplicação da
sanção penal ou, nos dizeres de Régis Prado:
As escusas absolutórias são causas pessoais de isenção de pena. Embora configurado
o delito em todos os seus elementos constitutivos, presentes as escusas absolutórias
não ocorrerá a imposição da pena abstratamente cominada (PRADO, 2004: 713).
No tocante à natureza jurídica das escusas absolutórias, trata-se de condições de
punibilidade negativamente formuladas que excluem a punibilidade do crime no tocante a
determinadas pessoas, como destaca Welzel (apud PRADO, 2004: 713).
De acordo com Régis Prado, as escusas absolutórias antecipam-se ao momento
consumativo do delito, ou seja, excluem a imposição da pena ab initio; as condições objetivas
de punibilidade, ao contrário, são acontecimentos futuros e incertos, destaca Régis Prado.
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
8
Cabe observar ainda que, de acordo com Régis Prado:
Em se tratando de condição objetiva de punibilidade, sua ausência exclui a
punibilidade do delito em relação aos demais coautores ou partícipes; diversamente,
a escusa absolutória – instituída de modo taxativo pela lei – não se comunica aos
eventuais partícipes que não apresentem as características personalíssimas exigidas,
pois são causas pessoais de isenção de pena (PRADO, 2004: 714).
As condições objetivas de punibilidade são estruturadas de forma objetiva, isto é, seu
advento fundamenta a punibilidade do delito; já as escusas absolutórias são formuladas de modo
negativo, afastando a punibilidade do mesmo. Assim, em ambas situações, o crime encontra-se
perfeitamente estruturado, somente a possibilidade de aplicação da pena é sobrestado por
considerações político-criminais, conclui Régis Prado (2004: 714).
3 Causas de extinção da punibilidade
Cabe destacar que a diferença entre as causas extintivas da punibilidade e as causas de
isenção de pena é que nessas últimas o fato, desde logo, não é punível, enquanto, nas primeiras
o fato é, a princípio, punível, mas em decorrência de um fato jurídico, o poder de punir se
extingue.
Como bem destacou Régis Prado:
As causas de extinção da punibilidade implicam renúncia, pelo Estado, do exercício
do direito de punir, seja pela não-imposição de uma pena, seja pela não-execução ou
interrupção do cumprimento daquela já aplicada (PRADO, 2004: 718).
Observa-se que há rol não taxativo das causas extintivas da punibilidade no artigo 107
do Código Penal: morte do agente, abolitio criminis, anistia, indulto, graça, decadência,
perempção, prescrição, perdão do ofendido, renúncia, retratação e perdão judicial. Fora destas,
há outras causas extintivas, como o cumprimento do período de prova do sursis da pena e do
sursis processual sem revogação.
3.1 Morte do agente
Como a pena não passará da pessoa do condenado (artigo 5.º, XLV, da CF) – em respeito
ao princípio da pessoalidade da pena -, a morte do sujeito extingue a punibilidade. Entretanto,
como destaca Régis Prado, os efeitos civis da condenação transitada em julgado subsistem,
podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos
da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor patrimonial
transferido (conforme enunciado do artigo 5.º, XLV, 2.ª parte, CF).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
9
E se a extinção da punibilidade for declarada com base em certidão/informação falsa, já
tendo transitado em julgado? Há duas posições sobre esta temática: (a) a sentença é inexistente
e, assim, o processo pode continuar normalmente; (b) sentença existe desde que proferida por
juiz investido no cargo e, assim, gera efeitos até que uma outra decisão a rescinda ou declare
nula.
No processo penal brasileiro não há instrumento processual para atacar a coisa julgada
contra o réu (consequência do direito de não ser julgado duas vezes pelo mesmo fato), uma vez
que a revisão criminal só é possível em sentença condenatória e o habeas corpus tem como
função exclusiva a proteção da liberdade. Assim, ante a inexistência de instrumento hábil ao
reconhecimento do vício da sentença (independentemente de se tratar de vício d emérito o
suficiente para causar nulidade), a coisa julgada deve prevalecer, não havendo como reformar
a extinção da punibilidade.
Portanto, a morte é causa pessoal de extinção da punibilidade (artigo 107, I, Código Penal).
Logo, conforme Régis Prado, não há falar em comunicabilidade da mesma aos demais coautores ou partícipes da infração penal (PRADO, 2004: 720).
3.2 Anistia, graça e indulto
A Anistia é a lei que promove o esquecimento jurídico-penal do fato. Todos os efeitos
penais são afastados, devendo ser imediatamente reconhecida a extinção da punibilidade.
Como observa Régis Prado, o poder de graça açambarca a anistia, a graça em sentido
estrito, o indulto e a comutação. Todos esses atos configuram manifestações de indulgência
soberana (PRADO, 2004: 720).
Assim, a anistia é ato do Congresso Nacional (artigos 21, XVII, e 48, VIII, CF) e,
quando concedida antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, extingue seus efeitos
penais. De acordo com Régis Prado (2004: 721):
Objeto preponderante da anistia são os delitos políticos, o que não exclui sua aplicação
– em caráter excepcional – aos crimes comuns. Concedida a anistia, o juiz, de ofício,
a requerimento do interessado ou do Ministério o Público, por proposta da autoridade
administrativa o do Conselho Penitenciário, declarará extinta a punibilidade (artigos
107, II, CP; 187, LEP).
A anistia não pode ser recusada pelo destinatário, salvo quando condicionada, uma vez
concedida, inadmite revogação, destaca Régis Prado.
O indulto e a graça são atos privativos do Presidente da República (artigo 84, XII, da
CF). Portanto, indulto e graça são formas de indulgências soberanas. É poder – que pode ser
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
10
delegado a determinadas autoridades – do Presidente da República, mediante decreto,
“perdoas” condenados.
Ambos, porém, não se confundem, já que o indulto apresenta caráter coletivo e a graça,
individual.
A graça é solicitada, enquanto o indulto é espontâneo. Assim, a concessão da graça
poderá ser provocada por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do
Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa (conforme redação do artigo 188, da
LEP). O indulto, a seu tempo, independe de qualquer solicitação. O indulto parcial é chamado
de comutação.
O indulto pode ser pleno, quando extingue completamente a punibilidade, ou parcial,
quando diminui a pena. Observa-se que inadmite recusa por parte do beneficiário, salvo em se
tratando de comutação da pena ouj de indulto condicionado. Diversamente do indulto parcial,
a comutação consiste na substituição da pena imposta por outra de menor gravidade e admite
recusa por parte do condenado, destaca Régis Prado.
Neste diapasão, após a concessão da graça ou do indulto, cabe ao juiz declarar extinta a pena
ou ajustar a execução aos termos do decreto presidencial, no caso de comutação (artigos 192 e
193, da LEP). A graça e o indulto, ao contrário da anistia, pressupõem o trânsito em julgado da
condenação e não extinguem os efeitos penais da mesma.
Há destacar o não cabimento de anistia, graça e indulto para os crimes hediondos, a prática de
tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo, conforme dispositivo
legal (arts. 5.º, XLIII, CF; 2.º, I, da Lei 8.072/1990, e 1.º § 6.º, da Lei 9.455/1997).
3.3 Abolitio criminis
Abolitio criminis é a norma penal que revoga o tipo incriminador, determinando o
imediato reconhecimento da extinção da punibilidade do processo na fase em que estiver. Faz
desaparecer todos os efeitos penais em caso de já existir sentença condenatória.
Como bem esclarece Régis Prado:
Perfaz-se a abolitio criminis quando lei posterior não mais tipifica como delito fato
anteriormente previsto como ilícito penal. Ou seja, com o advento da lei nova a
conduta perde sua característica de ilicitude penal, extinguindo-se a punibilidade (art.
107, III, CP). A lei posterior mais benigna (Lex mitior) retroage para alcançar
inclusive fatos definitivamente julgados (art. 2.º, CP). Assim, são afastados por
completo os efeitos penais da condenação, persistindo unicamente os efeitos civis
(PRADO, 2004: 722).
3.4 Renúncia
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
11
Renúncia ao direito de queixa é a abdicação do direito de promover a ação penal privada
pelo ofendido ou por seu representante legal.
Como bem elucida Régis Prado (2004: 722), se antes de iniciada a ação penal o ofendido
manifesta sua vontade de não exercer o direito de queixa, extingue-se a punibilidade pela
renúncia (art.107, V, CP). Assim, trata-se de ato unilateral, pelos quais os efeitos alcançam
todos os co-autores do delito (trata-se, portanto, de critério extensivo, conforme art. 49, do
CPP).
No tocante ao cabimento da renúncia, somente nas ações penais exclusivamente
privadas. Fora do sistema dos Juizados Especiais Criminais não é possível renúncia ao direito
de representação (na ação penal pública condicionada).
Há controversa na possibilidade de renúncia no caso de ação penal privada subsidiária
da pública. Incontroverso, porém, que mesmo se possível tal ato, dele não resultaria extinta a
punibilidade, pois o Ministério Público poderia, de qualquer forma, oferecer a denúncia.
Segundo Régis Prado:
É perfeitamente cabível a renúncia em se tratando de ação penal privada subsidiária.
Não obstante, poderá o Ministério Público oferecer denúncia, desde que outra causa
extintiva da punibilidade não tenha ocorrido (PRADO, 2004: 722).
Quanto ás formas de renúncia: trata-se de expressa ou tácita (art. 104, caput, CP). A
renúncia expressa, se por manifestação explícita, e tácita, caso exista a prática de ato
incompatível com a vontade de processar (chamar para ser padrinho de batismo). O casamento
da vítima com o agente, que antes extinguia a punibilidade nos crimes contra os costumes,
continua com tal força quando se tratar de crime de ação penal privada, pois o casamento é,
obviamente, prática de ato incompatível com a vontade de processar.
A renúncia, quando tácita, admite todos os meios de prova (art. 57, CPP). Já a renúncia
expressa, obrigatoriamente clara e inequívoca, constará de declaração assinalada pelo ofendido,
por seu representante legal ou procurador com poderes especiais (art. 50, CPP), como bem
observa Régis Prado.
Cabe ainda destacar, seguindo os passos de Régis Prado, que na possibilidade de dupla
titularidade, a renúncia do representante legal do menor que houver completado dezoito anos
não privará este do direito de queixa, nem a renúncia do último excluirá o direito do primeiro
(art. 50, parágrafo único, CPP). De forma similar, tampouco a renúncia ao exercício do direito
de queixa por um dos ofendidos obsta a propositura da ação penal pelos demais, conclui Prado
(2004: 722).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
12
3.5 Perdão do ofendido
Perdão do ofendido é o ato pelo qual, iniciada a ação penal exclusivamente privada, o
ofendido (querelante) ou seu representante legal desiste de seu procedimento. Tem sentido de
desistência e por isso é sempre posterior à propositura da queixa, ou seja, é facultado ao
querelante, no curso da ação penal privada, perdoar o querelado (ofensor), extinguindo-se assim
a punibilidade do delito, conforme art. 107, V, do Código Penal. Por conseguinte, o perdão do
ofendido, nos crimes em que somente se procede mediante queixa, obsta, portanto, o
prosseguimento da ação, artigo 105, do Código Penal.
Perdão do ofendido tem cabimento apenas na ação exclusivamente privada, pois no caso
de ação penal privada subsidiária incumbirá ao Ministério Público retomar a ação como parte
principal. Pode ser oferecido até o trânsito em julgado da sentença condenatória, mesmo se
interposto recurso extraordinário, como destaca Mirabete.
Deve-se observar as diferenças entre o perdão do ofendido e o perdão judicial. O perdão judicial
é concedido pelo juiz e não pelo ofendido e incide nos caso previstos em lei, seja a ação pública
ou privada. Já no o perdão do ofendido, não há casos previstos expressamente em lei, mas tão
somente a previsão genérica do artigo 105 e seguintes, do Código Penal, e assim, sempre será
possível na ação penal privada.
No tocante às formas de perdão, ele pode ser processual ou extraprocessual, conforme seja
oferecido nos autos do processo ou fora dele. Pode como a renúncia, ser expresso ou tácito.
Quanto à aceitação do perdão, este é um ato jurídico bilateral, ou seja, depende da
aceitação do querelado. Assim, a aceitação do perdão pode ser tácita ou expressa. Oferecido o
perdão, o querelado será intimado para se manifestar e, no silêncio, será considerado aceito o
perdão, declarando-o extinta a punibilidade, de acordo com o art. 58 do CPP.
Cabe destacar que o perdão é uma causa, por força do princípio da indivisibilidade,
comunicável, o querelante não pode escolher quem vai perdoar; ou perdoa todos ou não perdoa
ninguém. Se perdoar um, o juiz oferecerá a todos a aceitação. Se apenas um aceitar, o processo
continuará em relação aos outros (art. 1016, I e II, CP).
Ainda de acordo com Régis Prado (2004: 723), é possível a concessão do perdão pelo
ofendido a qualquer tempo, desde que não haja sentença condenatória transitada em julgado
(art. 106, § 2.º, do Código Penal).
3.6 Perdão Judicial
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
13
Perdão judicial é a possibilidade de o juiz deixar de aplicar a pena nas hipóteses previstas
em lei. Neste sentido manifesta Régis Prado:
Embora perfeito o delito em todos os seus elementos constitutivos – ação ou omissão
típica, ilícita e culpável -, é possível que o magistrado, diante de determinadas
circunstâncias legalmente previstas, deixe de aplicar a sanção penal correspondente,
outorgando o perdão judicial. Trata-se de direito subjetivo do réu, e não mera
faculdade judicial (PRADO, 2004: 723-724).
Neste diapasão, tem como pressuposto básico, o perdão judicial, reconhecimento da
culpabilidade do acusado, ou seja, reconhece que o sujeito praticou fato típico, ilícito e culpável,
e depois o juiz perdoa. Só pode ocorrer quando o texto legal assim o autorizar. Exemplos: art.
121, § 5.º; art. 129, § 8.º; art. 140, § 1.º; art. 180, § 5.º, do Código Penal.
Perdão judicial é causa extintiva da punibilidade (art. 107, IX, do CP) que opera
independentemente de aceitação do agente, sido concedido na própria sentença ou acórdão,
observa Régis Prado. Trata-se se de sentença declaratória de extinção da punibilidade, assim
definida pela epígrafe na Súmula 18 do STJ: “A sentença concessiva do perdão judicial é
declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”.
É cabível o perdão judicial na Lei 9.807/1999, em seu artigo 13 – Lei de proteção a
vítimas e testemunhas ameaçadas e a acusados ou condenados que tenham voluntariamente
prestado efetiva colaboração em investigação policial ou processo criminal, desde que presentes
os requisitos objetivos e subjetivos do artigo 13. Também é possível, pela mesma lei, a
aplicação da causa de diminuição de pena prevista no artigo 14 da mesma lei.
3.7 Retratação
Retratação é o ato de desdizer-se, de retirar o que foi dito. Cuida-se, conforme Régis
Prado, de ato unilateral que independe de aceitação por parte do ofendido, que tem por escopo
buscar e resguardar a verdade, interesse superior da justiça, destaca Prado (2004: 725-726). Por
tratar-se de ato pessoal, a retratação é feita por um dos querelados não se aplica aos demais.
Sendo irrelevante a espontaneidade da declaração, como também os motivos que a fundaram,
entretanto, destacam Régis Prado, é imprescindível sua voluntariedade.
A retratação extingue a punibilidade do agente apenas nos casos em que a lei assim o
admitir (art. 107, VI, CP), como são os casos crimes de calúnia e difamação (art. 143, CP);
crimes contra a honra praticados através da imprensa (art. 26, Lei 5.250/1967); crimes de falso
testemunho e falsa perícia (art. 342, § 2.º, do CP).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
14
3.8 Decadência e perempção
A decadência consiste na perda do direito de ação pelo decurso do tempo. É a perda do
direito de oferecer queixa ou de representar. Com efeito, inadmissível seria o direito de queixa
ou de representação subsistisse indefinitivamente. Estipula-se, de conseguinte, destaca Régis
Prado, determinado prazo decadencial (fatal e improrrogável) e, com o seu término, há a
extinção da punibilidade (artigo 107, IV, do CP).
No eixo da decadência está o transcurso do tempo. No fundo, é uma sanção processual
àquele que se mantém inerte, que perde a oportunidade de exercer a ação ou de fornecer a
condição objetiva de procedibilidade da representação.
Assim, decadência só existe em ação penal privada ou pública condicionada e prescrição pode
acontecer em qualquer tipo de ação.
A vítima tem o prazo de 6 meses do conhecimento da autoria para representar ou para
oferecer a queixa (art. 38 do CPP).
De acordo com Mirabete, no caso de crime continuado, a decadência deve ser
considerada em relação a cada fato.
A perempção é sanção jurídica imposta ao querelante desidioso que deixa de promover
o devido andamento à ação penal.
Como bem descreve Régis Prado:
[...] a perempção consiste na perda do direito de ação pela inércia do querelante.
Assim, após o início da ação penal privada a inatividade do querelante presume a
desistência quanto ao seu prosseguimento. O âmbito de aplicação dessa causa
extintiva de punibilidade circunscreve-se à ação penal exclusivamente privada (art.
107, IV, CP), já que na ação penal privada subsidiária da pública confere ao Ministério
Público a possibilidade de, a todo tempo, retomá-la como parte principal, no caso de
negligência do querelante [...] (PRADO, 2004: 729).
Extingue, assim, a punibilidade. A perempção somente é possível na ação penal
exclusivamente penal. Na subsidiária, o Ministério Público retomará a ação, não havendo
extinção da punibilidade.
No Código de Processo Penal (artigo 60) estão enumeradas as causas de perempção (nos
crimes perseqüíveis mediante ação penal privada:
Inciso I – quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo
durante trinta dias seguidos;
Inciso II – quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer
em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de sessenta dias, qualquer das pessoas
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
15
a quem couber fazê-lo (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, art. 31, CPP), ressalvado o
disposto no artigo 36, II;
Inciso III – quando o querelante deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais
(art. 539, § 3.º, CPP), ou deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do
processo a que deva estar presente;
Inciso IV – quando, sendo o querelante pessoa jurídica (art. 37, CPP), esta se extingue sem
deixar sucessor.
Por fim, cabe destacar que será perempta a ação penal com a morte do querelante na
hipótese de ação pena privada personalíssima (arts. 236 e 240, CP), destaca Régis Prado
(2004P729-730).
3.9 Prescrição
O Estado tem o poder de punir, visando diminuiu e/ou controlar a violência. No
momento em que uma infração penal é praticada, o poder abstrato se concretiza. No momento
em que ocorre a infração penal, começa pra o Estado a possibilidade da punição, isto é, o dever
de subordinar o interesse alheio de liberdade a seu poder punitivo. Daí a ideia da pretensão
punitiva. O Estado tem, por conseguinte, a obrigação de demonstrar que seu poder existe e pode
ser exercido contra determinado indivíduo em espaço de tempo limitado, em prol de exigência
de ordem política e mesmo processual.
Cabe observar, desde Cesar de Beccaria, que a pena só é justa se célere. De qualquer
forma a demora na punição ocasionaria a perda dos fins da pena, a descrença no ordenamento,
a sensação de legitimação da reação informal da sociedade (através de linchamentos,
vinganças).
Por outro lado, como a imposição da pena é demonstração de poder, se o Estado demora,
é sancionado com a perda de tal poder. Focalizando o próprio autor do crime, o longo passar
do tempo permitiu sua reconstrução pessoal, e a pena tem grande chance de ter efeito deletério
sobre sua personalidade. Por fim, as provas já teriam se esvaído com o passar do tempo.
Daí a existência do instituto da prescrição. Trata-se de sanção ao Estado pela demora
em seu proceder. Pode se referir à pretensão punitiva e à pretensão executória. Como bem
define Régis Prado:
A prescrição corresponde, portanto, à perda do direito de punir pela inércia do Estado,
que não o exercitou dentro do lapso temporal previamente fixado. O não-exercício do
jus puniendi estatal conduz á perda em face do lapso temporal transcorrido (PRADO,
2004: 730).
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
16
Assim, há prescrição da pretensão punitiva nos casos em que o Estado não providencia,
no limite temporal fixado pela lei, a certeza da culpa (com o trânsito em julgado da sentença
condenatória).
Como bem salientou Lídio Rosa de Mesquita Junior:
A prescrição, ao contrário de extinguir apenas o direito de queixa ou de representação,
extingue o próprio direito de punir. Esse é tido em sentido amplo, pois inclui o direito
de aplicar penas, bem como o de executar as que foram aplicadas. Assim, a prescrição
atinge diretamente a punibilidade (MESQUITA JUNIOR, 2007: 46).
Por outro lado, há prescrição da pretensão executória nos casos em que o Estado não
providencia, no lapso temporal determinado em lei, a efetivação da sanção já certa (ao menos
para a acusação).
Os prazos são verificados no art. 109 do Código Penal, que traz tabela relacionando a
pena a ser aplicada com o prazo prescricional. Os prazos são penais, isto é, utiliza-se a regra do
art. 10 do CP, uma vez que a prescrição trata diretamente da alteração u extinção do poder de
punir do Estado.
Cabe destacar que a regra geral de prescritibilidade de todas as infrações penais não é
absoluta, uma vez que a Constituição Federal de 1988 determina a imprescritibilidade a prática
do racismo e a ação de grupos armados, civis e militares, contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático (art. 5.º, incisos XLII e XLIV).
3.9.1 Prescrição da pretensão punitiva
Praticado o fato típico, nasce a punibilidade, ou seja, o Estado passa a ter o direito de
utilizar-se dos meios próprios para iniciar a persecução criminal, que culminará na aplicação da
pena ou da medida de segurança, isto é, surge para o Estado o poder de punir o criminoso.
Assim, até o trânsito em julgado da decisão, o Estado tem apenas uma pretensão punitiva,
destaca Mesquita Júnior (2007: 71).
De acordo com Régis Prado, a prescrição da pretensão punitiva produz-se antes de a
sentença penal condenatória galgar foros de definitividade. Assim, o reconhecimento da
pretensão punitiva encontra-se, regra geral, lastreado na pena máxima abstratamente cominada.
Mas, é possível que a prescrição anterior ao trânsito em julgado da sentença
condenatória tenha por base a pena concreta (prescrição superveniente e prescrição retroativa),
desta Régis Prado.
Neste sentido, quando a prescrição da pretensão punitiva baseia-se na pena em abstrato,
deve-se considerar, para efeitos de contagem o prazo prescricional, o limite máximo previsto
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
17
para a pena privativa de liberdade cominada ao delito perpetrado, conforme o art. 109, Caput,
do Código Penal.
Portanto, o lapso prescricional está diretamente vinculado à pena abstrata (prescrição
da pretensão punitiva) ou concreta (prescrição da pretensão superveniente, prescrição
retroativa e prescrição da pretensão executória).
Do que se depreende, naturalmente, é que o prazo prescricional, tanto o da prescrição
da pretensão punitiva, quanto o da prescrição da pretensão executória, toma por base a pena
máxima cominada, ou aplicada, obedecendo ao contido no art. 109 do Código Penal.
Assim, poderíamos apresentar o seguinte quadro esquemático:
Pena máxima cominada ou aplicada
Prazo prescricional
(base para o cálculo prescricional)
Inferior a 1 ano
02 anos
Igual a 1 e igual ou inferior a 2 anos
04 anos
Superior a 2 e igual ou inferior a 4 anos
08 anos
Superior a 4 e igual ou inferior a 8 anos
12 anos
Superior a 8 e igual ou inferior a 12 anos
16 anos
Superior a 12 anos
20 anos
Vale lembrar que se aplicam às penas restritivas de direito os mesmos prazos
prescricionais para as penas privativas de liberdade, conforme o art. 109, parágrafo único do
Código Penal, observa Régis Prado.
Além disso, os prazos prescricionais são reduzidos de metade quando o agente era, ao
tempo do crime, menor de (21) vinte e um anos, ou, na data da sentença, maior de (60) sessenta
anos, como dispõe a Lei 10.741/2003 – Estatuto do Idoso, para efeitos de prescrição da
pretensão punitiva, numa interpretação favorável constitucionalmente assegurada conforme o
art. 5.º, XL, da Constituição Federal e não mais a idade de setenta (70) anos conforme previa o
art. 115 do Código Penal. Assim, observa-se, o não cabimento da aplicabilidade da
emancipação do agente disciplinado no Código Civil (art. 2043, do Código Civil). Uma vez
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
18
que, ainda emancipado, o menor de 21 anos (agora 18 anos) continuará a ser beneficiado pela
redução do lapso prescricional estabelecido pelo Ordenamento Penal.
Conforme Régis Prado, as causas de aumento e de diminuição de pena (gerais ou
especiais) incidem no prazo prescricional da pretensão punitiva.
Assim, se a causa de aumento ou de diminuição têm limites variáveis, incide aquele que importa
em maior aumento ou em menor diminuição, respectivamente, desta Régis Prado.
Considerando a hipótese de concurso formal ou de crime continuado (arts. 70 e 71, do CP),
porém, o aumento de pena previsto não altera o prazo prescricional. Segundo Régis Prado:
Para efeito de cômputo do prazo prescricional, inclui-se a exacerbação d apena
relativa à forma qualificadora do delito. Por outro lado, as circunstâncias agravantes
e atenuantes não são consideradas no cômputo do prazo prescricional da pretensão
punitiva. (PRADO, 2004: 732)
Neste diapasão, a prescrição da pretensão punitiva pode operar, ainda segundo Régis
Prado, entre a data da consumação do crime e a do recebimento da denúncia ou queixa, entre a
data do recebimento da denúncia ou queixa e a publicação da sentença final e a partir d
publicação da sentença condenatória. Sendo competente, destaca Régis Prado, o tribunal do júri
para o processo e julgamento do delito, é possível a ocorrência da prescrição da pretensão
punitiva entre a data do fato e a do recebimento da denúncia, entre a sentença de pronúncia e
sua confirmação, entre a pronúncia ou sua confirmação e a sentença final e a partir da sentença
condenatória, conclui Régis Prado (2004: 732).
No tocante ao termo inicial do prazo da prescrição que toma por base a pena máxima
cominada (pena em abstrato), o Código Penal Brasileiro assim dispõe que o termo inicial d
prescrição antes de transitar em julgado a sentença final (art. 111, co CP), em que a prescrição,
antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:
I – do dia em que o crime se consumou;
II – no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa;
III – nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;
IV – nos crimes de bigamia (art. 235, CP) e nos de falsificação ou alteração de assentamento
do registro (art. 241, CP), da data em que o fato se tornou conhecido.
Cabe destacar que o prazo prescricional é contado em dias, incluindo-se em seu cômputo
o dies a quo (conforme o art. 10, do CP), segundo o calendário comum.
O prazo prescricional é suscetível de suspensão ou de interrupção.
3.9.1.1 Suspensão do prazo prescricional
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
19
Suspender significa dizer que o lapso prescricional fica parado, dormindo e descansando
por um determinado período que não é computado, voltando a contagem a considerar somente
o tempo restante.
Na suspensão o lapso temporal anterior à causa suspensiva computa-se quando da
continuação da contagem. Já na hipótese de interrupção, cessada a causa interruptiva do prazo
prescricional a contagem deste reinicia-se por inteiro, isto é, o período anteriormente decorrido
não é computado, destaca Régis Prado.
Assim, antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição da pretensão punitiva
não ocorre (suspensão), nos seguintes casos:
(a) art. 116, I, do CP – enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que depende o
reconhecimento da existência do crime. Desta forma, em havendo questão prejudicial
(obrigatória ou facultativa), suspende-se o curso da ação penal até que a controvérsia seja
dirimida pelo juízo civil (arts. 92 a 94, do CPP).
(b) art. 116, II, do CP – enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro. Assim, é vedada a
extradição do agente que está cumprindo pena no estrangeiro, daí ser incabível o regular
decurso do lapso prescricional. Entretanto, destaca Régis Prado (2004: 733), se o agente cumpre
pena por outra infração penal no Brasil, não se suspende a prescrição.
De outra parte, tem-se a interrupção da prescrição antes do trânsito em julgado da sentença final
(art. 117, I a IV, do Código Penal):
1) pelo recebimento da denúncia ou da queixa: não é suficiente, pois, o mero oferecimento da
denúncia ou queixa pelo Ministério Público ou pelo querelante, mas a efetiva publicação do
despacho o que recebe a exordial acusatória. O aditamento da denúncia para correição de
irregularidade (art. 569, CPP), sem a inclusão de fato novo, não interrompe a prescrição.
Entretanto, a simples alteração da definição jurídica do fato que importe aplicação de pena mais
grave (art. 384, parágrafo único, do CPP) não interrompe o curso prescricional. O aditamento
da denúncia para inclusão de co-autor não acarreta a interrupção da prescrição.
Na hipótese de descrição de fato delituoso novo, interrompe-se o curso do prazo prescricional,
destaca Régis Prado (2004: 734);
2) pela pronúncia: nos crimes de competência do Tribunal do Júri (art. 74, § 1.º, CPP), se o juiz
se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o soeu autor, deve pronunciálo, dando os motivos do soeu convencimento (art. 408, caput, do CPP). Publicada a sentença
de pronúncia, observa Régis Prado, interrompe-se a prescrição. Se na fase de pronúncia o juiz
desclassifica o crime para outro, também da competência do Tribunal do Júri, ocorre a
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
20
interrupção do prazo prescricional; entretanto, se desclassifica para outro delito, da competência
do juiz singular, tal decisão não importa em interrupção da prescrição;
3) pela decisão confirmatória da pronúncia: o acórdão confirmatório da sentença de pronúncia
também conduz à interrupção do curso da prescrição, a partir da data de julgamento do recurso
em sentido estrito interposto, segundo Régis Prado (2004: 734);
4) pela sentença condenatória recorrível: a interrupção ocorre com a publicação da sentença
(art. 389, CPP), Reformada pelo Tribunal a sentença absolutória para condenar o réu, tal decisão
interrompe a prescrição, a partir da data do julgamento do recurso, observa Régis Prado. Se
confirmada pelo tribunal a sentença condenatória, não ocorre nova interrupção. Entretanto,
continua Régis Prado, reformada a sentença condenatória, absolvendo o acusado, mantém-se a
interrupção da sentença de primeira instância.
Se interrompida a prescrição (exceto quando decorrente do início ou continuação do
cumprimento da pena, art. 117, V, do CP), todo o prazo começa a correr, novamente, do dia da
interrupção, conforme art. 117, § 2.º, do CP, destaca Régis Prado (2204: 734).
Observa-se que a interrupção da prescrição (salvo motivada pelo início ou continuação do
cumprimento da pena ou pela reincidência – art. 117, V e VI, do CP – produz efeitos
relativamente a todos os autores do crime (art. 117, § 1.º, 1.ª parte, do CP, destaca Régis Prado.
Nos chamados crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a
interrupção relativa a qualquer deles, como se observa do art. 117, § 1.º, 2.ª parte.
No tocante à prescrição da pena de multa, esta ocorrerá (art. 114, Código Penal):
a) em dois anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada;
b) no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da pena privativa de liberdade, quando a
multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada, destaca
Régis Prado.
Assim, observa Régis Prado, sendo a multa a única pena abstratamente cominada ou a
única pena aplicada pela sentença penal condenatória, a prescrição da pretensão punitiva (assim
como a prescrição da pretensão executória) dar-se-á em dois (2) anos. Entretanto, lembra Régis
Prado, se a pena de multa alternativa ou cumulativamente cominada ou aplicada obedecerá ao
prazo previsto para a prescrição punitiva (ou executória) da pena privativa de liberdade. Assim,
destaca Régis Prado, dispõe o art. 118, do CP, ao estatuir que as penas mais leves, sendo elas
multa, restritivas de direito, prescrevem com as mais graves, conclui (PRADO, 2004: 735).
Há também caso de suspensão do curso de prazo prescricional pelo indeferimento ou
pela ausência de deliberação do Senado ou da Câmara sobre o pedido de licença pra processar
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
21
senador ou deputado federal, de acordo com a Constituição Federal. E isso porque a
Constituição Federal de 1988 dispõe expressamente em seu art. 53, § 2.º, que “desde a
expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em
flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos à Casa respectiva, para
que, pelo voto da maioria dos seus membros resolva sobre a prisão”. Assim, após o recebimento
da denúncia, o STF dará ciência à Casa respectiva, que poderá sustar – por maioria de seus
membros - o andamento do processo (art. 53, § 3.º, da CF), mas somente por crime ocorrido
após a diplomação. A suspensão do processo implicará na suspensão da prescrição (CF, art. 53,
§§ 3.º-5.º).
O CPP cria deferentes causas impeditivas da prescrição.
Suspende-se o curso do prazo prescricional se o acusado, citado por edital, não comparecer,
nem constituir advogado (conforme redação do art. 366, CPP, de acordo com redação da Lei
9.271/1996). Assim, a expedição de carta rogatória para citação do réu no estrangeiro, em lugar
sabido, suspende o prazo prescricional até o seu cumprimento (CPP. Art. 368). De igual modo,
durante o prazo de suspensão condicional do processo não correrá a prescrição (art. 89. § 6.º,
Lei 9.099/1995).
3.9.1.2 Prescrição da pretensão executória
Sabe-se que com a prescrição da pretensão executória/condenação, desaparece o direito
de execução da sanção penal imposta. Ou seja, transitada em julgado a sentença condenatória,
a prescrição regula-se pela pena in concreto, observando o disposto no art. 109, CP. Portanto,
irrecorrível a sentença condenatória, o curso do lapso prescricional terá por base a pena
aplicada, segundo os prazos determinados naquele diploma, os quais, segundo Régis Prado,
aumentam de um terço se o condenado é reincidente, dada a redação do art. 110, caput, do
Código Penal.
Uma vez declarada a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória,
não se executa a pena imposta e tampouco a medida de segurança, conforme o art. 96, parágrafo
único, do CP, subsistindo ainda os efeitos penais secundários da condenação e os efeitos civis,
art. 67, II, do CP.
Neste sentido, a prescrição da pretensão executória, ao contrário da que ataca a
pretensão punitiva, só atinge o efeito principal da condenação, ou seja, a pena imposta. Os
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
22
efeitos penais e extrapenais secundários persistem, como a reincidência, a obrigação de reparar
o dano etc.
Quanto ao termo inicial da prescrição após a sentença condenatória irrecorrível começa
a correr, de acordo com o artigo 112 do Código Penal:
a) do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga
a suspensão condicional d apena ou o livramento condicional;
b) do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva
computar-se na pena: se a execução é interrompida pela fuga do condenado, inicia-se então o
prazo prescricional da pretensão executória, com base no restante da penal. Não obstante, a
interrupção motivada pela superveniência de doença mental ou internação em hospital de
custódia e tratamento psiquiátrico (arts. 41 e 42, CP) não inicia o decurso do prazo prescricional
da pretensão punitiva, conclui Régis Prado (2004: 736).
Ainda segundo Régis Prado, suspende-se a prescrição, depois de passada em julgado a
sentença condenatória, durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo,
conforme artigo 116, parágrafo único do Código Penal.
3.9.1.3 Prescrição superveniente
Prescrição superveniente é uma espécie de prescrição da pretensão punitiva regulada
pela in concreto. A prescrição superveniente, seja intercorrente ou subseqüente, é hipótese
excepcional em que a prescrição da pretensão punitiva não regida pelo máximo da pena
privativa de liberdade abstratamente cominada, mas sim pela pena imposta na sentença
condenatória, observa Régis Prado.
Neste sentido, o Código Penal Brasileiro estatui em seu artigo 11, parágrafo 1.º, que “a
prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois
de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada”. Assim, o marco inicial da prescrição
superveniente é a aplicabilidade da sentença condenatória, e o marco final, o trânsito em julgado
daquela para ambas as partes, ou seja, para acusação como para a defesa.
Assim, são suas as hipóteses em que poderá ocorrer a prescrição superveniente:
a) trânsito em julgado para a acusação: prolatada a sentença condenatória, a acusação não
recorreu da mesma. Todavia, a sentença ainda não se tornou definitiva, já que não passou em
julgado para a defesa, entre a sentença condenatória e o seu definitivo trânsito em julgado
poderá ocorrer a prescrição subsequente, conclui Régis Prado (2004: 737);
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
23
b) improvimento do recurso da acusação: a acusação recorre objetivando ao aumento da pena
aplicada, mas seu recurso é improvido pelo tribunal. Decorrido o prazo prescricional com base
na pena imposta, haverá a prescrição subseqüente. Entretanto, se o recurso interposto pela
acusação é provido sem que haja elevação da pena aplicada, também é possível o
reconhecimento da prescrição superveniente, como bem observa Régis Prado.
3.9.1.4 Prescrição retroativa
Com a entrada em vigor da lei 11.234/2010, em 06.05.02014, que além de ampliar o
prazo mínimo de prescrição (que era de dois anos para as infrações com pena máxima inferiores
a um ano, e hoje é de três anos), também alterou o art. 110, § 1.º, para estabelecer a seguinte
redação:
§ 1.º A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a
acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não
podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou
queixa.
Com isso, persiste a prescrição retroativa em nosso ordenamento , mas, para os fatos
praticados a partir de 06.05.2010, não será possível o reconhecimento de prescrição retroativa
entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa. As demais hipóteses (entre o
recebimento da denúncia e a sentença, ou entre o recebimento da denúncia e a pronúncia, entre
a pronúncia e o acórdão que a confirma, entre o acórdão que a confirma e a sentença final)
continuam plenamente cabíveis.
Para alguns doutrinadores, como é o caso de Gustavo Octaviano Diniz Junqueira, esta
alteração é inconstitucional, visto o que a possibilidade de prescrição retroativa não é uma mera
opção política do legislador, mas a concretização do princípio constitucional da isonomia, com
seu consectário da individualização da pena, bem como da própria duração razoável do
processo. Ora, não se pode ter o mesmo prazo prescricional, sempre calculado a partir da pena
máxima e abstrato, para as hipóteses flagrantemente diversas, como do condenado à pena
mínima, e o condenado, em concreto, a pena máxima. Se o sistema penal brasileiro se vale da
quantidade da pena como critério para o cálculo da prescrição, o ouso d apena máxima em
abstrato só se justifica enquanto não é possível individualizar a pena do sujeito, ou seja, antes
da condenação com trânsito em julgado para a acusação. Após, os princípios constitucionais
referidos impõem o reconhecimento da prescrição retroativa em todos os casos previstos na
antiga legislação. No limite, a Nova legislação fere também a vedação de retrocesso em matéria
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
24
de direitos e garantias individuais, pois “retrocede” minimizando todos os já citados princípios,
destaca Gustavo Junqueira (JUNQUEIRA, 2011: 213-214).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste artigo científico pretendeu-se apresentar, de forma sucinta, a questão da
punibilidade, bem como das chamadas escusas absolutórias e as causas extintivas da
punibilidade.
O conceito de punibilidade enquanto possibilidade jurídica de impor pena ao violador
da lei penal parte-se para o estudo das causas de extinção do poder de punir do Estado. Nesse
passo, observa-se que podem surgir fatos ou atos jurídicos que extingam a punibilidade – as
denominadas “causas de extinção da punibilidade” –, que se configuram enquanto garantias
individuais frente ao poder estatal punitivo, ou seja o grande Leviatã. Por isso, diz-se, com
razão, que as causas de extinção da punibilidade são aqueles fatos ou atos jurídicos que
impedem o Estado de exercer seu direito de punir os infratores da lei penal.
Neste sentido existem hipóteses em que o agente é isento de pena por expressa
determinação legal. Assim, não obstante a prática do delito - ação ou omissão típica, antijurídica
e culpável - a imposição de sua consequência (pena/medida de segurança) resta obstada por
causa de natureza pessoal, fundada em razões de conveniência e oportunidade. As escusas
absolutórias encontram–se taxativa e expressamente consignadas nos textos legais, mormente
na parte especial do Código Penais. Assim, as causas extintivas da punibilidade são atos ou
fatos que impedem a aplicação da sanção penal ou, seja, as escusas absolutórias são causas
pessoais de isenção de pena. Embora configurado o delito em todos os seus elementos
constitutivos, presentes as escusas absolutórias não ocorrerá a imposição da pena abstratamente
cominada.
Neste diapasão, as condições objetivas de punibilidade são estruturadas de forma
objetiva, isto é, seu advento fundamenta a punibilidade do delito; já as escusas absolutórias são
formuladas de modo negativo, afastando a punibilidade do mesmo. Assim, em ambas situações,
o crime encontra-se perfeitamente estruturado, somente a possibilidade de aplicação da pena é
sobrestado por considerações político-criminais.
Portanto, no que se refere a condição objetiva de punibilidade, sua ausência exclui a
punibilidade do delito em relação aos demais co-autores ou partícipes; diversamente, a escusa
absolutória – instituída de modo taxativo pela lei – não se comunica aos eventuais partícipes
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare
25
que não apresentem as características personalíssimas exigidas, pois são causas pessoais de
isenção de pena.
Já a diferença entre as causas extintivas da punibilidade e as causas de isenção de pena
é que nessas últimas o fato, desde logo, não é punível, enquanto, nas primeiras o fato é, a
princípio, punível, mas em decorrência de um fato jurídico, o poder de punir se extingue.
Dito de outra forma, as causas de extinção da punibilidade implicam renúncia, pelo
Estado, do exercício do direito de punir, seja pela não-imposição de uma pena, seja pela nãoexecução ou interrupção do cumprimento daquela já aplicada.
Observou-se, portanto, que há rol não taxativo das causas extintivas da punibilidade
no artigo 107 do Código Penal: morte do agente, abolitio criminis, anistia, indulto, graça,
decadência, perempção, prescrição, perdão do ofendido, renúncia, retratação e perdão judicial.
Fora destas, há outras causas extintivas, como o cumprimento do período de prova do sursis da
pena e do sursis processual sem revogação.
REFERÊNCIAS
BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal. Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2001,
vol. 1, p. 359.
DELMANTO, Celso; et al. Código Penal Comentado. 6ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1985.
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1990, vol. 1.
JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. Direito Penal. 11ª ed., São Paulo Revista dos
Tribunais, 2011.
MESQUITA JUNIOR, Lídio Roda se. Prescrição penal. 4ª Ed., São Paulo: Atlás, 2007.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, 1986.
PRADO, Luiz Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 4ª Ed., São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004, vol. 1.
JUDICARE-Faculdade de Direito de Alta Floresta – MT V.9,N.1(2016) http://judicare.com.br/index.php/judicare