Informática Educativa - Tecnologia e Educação
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Informática Educativa - Tecnologia e Educação
Pesquisa e Organização Professora Mara Tavares Abril de 2008 Informática Educativa Fernando José Almeida Fernando Moraes Fonseca Júnior O que é um ambiente? O que seria criar um ambiente inovador em Educação? Pensar na criação de ambientes é pensar em criar um mundo inteiro de possibilidades. Desenvolver ambientes sempre novos é próprio da natureza humana. Está em nosso modo de ser. Os ambientes são concepções de espaço e convivência. Facilitam ou dificultam certos tipos de relações das pessoas com os lugares e, principalmente, das pessoas entre si e consigo mesma. Pense, por exemplo, na arquitetura de uma igreja, nas cores quando a luz entra pelos vitrais multicoloridos, na altura da abóbada e no efeito sonoro da voz em seu interior. Lembre-se dos sons e das imagens... Esse é o ambiente de uma igreja. Freqüentemente, proporciona experiências pessoais e coletivas de proximidade com o divino, com o mistério, com o sacro.Agora, pense em uma sala de cinema: a escuridão, as dimensões da tela refletindo imagens enormes e brilhantes, os efeitos sonoros que fazem vibrar as cadeiras... Nesse ambiente, mergulhamos em histórias de outras vidas, de outros povos, de outros tempos, de outros lugares. No cinema, permanecemos por duas ou mais horas num envolvimento total que nos faz rir, chorar, zangar, sentir medo... Renova ou recria nossa visão do mundo.A Educação de cada povo também faz isso. Cria ambientes para que seus valores e suas competências passem de geração em geração. Mas os "povos" não são homogêneos. Há grupos, subgrupos, classes, castas, e cada um cria seus ambientes de aprendizagem ou os tem impostos pelos grupos que dominam a sociedade. No Brasil, a imprensa só chegou em 1808, com a vinda da família real.E os livros, por muito tempo, só podiam ser impressos nas gráficas oficiais: os brasileiros não podiam escolher o que iriam, ou não, imprimir e ler.Os livros são um “microambiente” de aprendizagem, no qual soltamos nossa imaginação, criamos cenários, ouvimos sons, desenhamos os rostos dos personagens, sentimos pavor ou desânimo com as derrotas dos heróis, alegramo-nos com suas vitórias. Nesse sentido, os livros são ambientes criados por autores, editores, projetistas gráficos, desenhistas e até pelas, pessoas que nos recomendam sua leitura. Mas o grande ambiente, claro, é crie do pelo leitor.A escola é uni ambiente privilegiado de aprendizagem. Nela, o currículo, a formação dos professores, a administração do, tempo, do espaço, o material didático, estão planejados para ajudar a constituir um ambiente de aprendizagem. Ela é muito eficaz para o fim a que se propõe. Bilhões de seres humanos passaram por suas salas, por sua estrutura e pelas práticas de seus mestres. Formam-se cidadãos.Melhores uns, piores outros, mas a verdade é que sua prática mudou o rumo da sociedade.Humanizou os jovens que por ela passaram.Os milhares de anos vividos na sociedade ocidental fizeram as escolas acumularem vícios. A proposta deste texto é retomar o sentido preciso e renovado de ambiente educacional que uma escola pode viver quando balançada pelos ventos das novas tecnologias. Certamente a escola não mudou muito nos últimos séculos. Imagine como eram os espaços e tempos educacionais há dois ou três séculos, há vinte ou trinta anos, e, finalmente, hoje. Talvez muito pouco tenha mudado de fato. Persistem as carteiras fixas, os laboratórios de demonstração (quando os há), os livros de chamada, as notas, o recreio, as velhas disciplinas...Tente, agora, imaginar como serão esses ambientes escolares daqui a uma ou duas décadas. Pense no que precisarão ser, quanto terão que se modificar! Há uma projeção desse cenário futura que mostra computadores sendo absorvidos pela escola como o foram a TV e o vídeo, com pouco impacto na qualidade dos processos de ensino e aprendizagem.Mas nós acreditamos que existem outras possibilidades, outros arranjos de ambientes que a escola pode proporcionar, contando com os computadores e as tecnologias a eles relacionadas. Os problemas são outros, as tecnologias são imensamente poderosas e velozes, o mundo é permeado por comunicações antes inexistentes sincronicamente como hoje. O planeta, a civilização, nosso ambiente de vivência, enfim, são inteiramente outros.Por tudo isso, a Educação deve mudar.Acreditamos que essas inovações nos ambientes escolares trarão reflexos positivos sobre os processos de ensino e aprendizagem, e isso bastaria para justificar a reflexão proposta por este texto.Mas não paramos aí! Acreditamos que as novas tecnologias da informação e comunicação podem contribuir decisivamente com os educadores que vislumbram um futuro condizente com as responsabilidades da instituição educacional numa nova sociedade do conhecimento.Este texto pretende refletir sobre a possibilidade de criação desses novos ambientes de aprendizagem, Mas para falar deles temos que falar do grande ambiente onde essas aprendizagens acontecerão, a quem servirão, e que ser humano queremos que seja desenvolvido para constituir um avanço no rumo de uma nova civilização.Esse grande ambiente é da sociedade do próximo século. Essa nova civilização enfrentará desafios desconcertantes, jamais enfrentados pela humanidade. Sempre foi assim, a qualquer tempo, mas os desafios vão, evidentemente, se tornando mais complexos, conforme a própria civilização acumula conhecimentos, tecnologias, e sofistica suas expectativas e desejos. Assim, cria novos problemas, que exigem respostas mais sofisticada.Por vezes escutarmos algo como "a medicina vai encontrar uma solução para isso"! Parece haver uma crença inabalável de que sempre seremos, enquanto espécie, capazes de solucionar no futuro os problemas que criamos hoje. Não que seja uma crença desprovida de fundamento; afinal a História testemunha uma impressionante seqüência de conquistas do gênero humano.O avanço da ciência e da tecnologia corresponde a avanços cognitivos da população e das suas estratégias de investigação. Atualmente, e certamente no futuro, algumas dessas estratégias serão fundamentais para a solução de problemas e superação das dificuldades. Especialmente se pretendemos que essas soluções sejam humanizadoras e, portanto, éticas e voltadas para o bem comum. A TECNOLOGIA RENOVANDO O PROCESSO EDUCATIVO (Texto produzido pelas professoras Ana Maria e Gabriela, com base na leitura do texto: O ENSINO E OS RECURSOS DIDÁTICOS EM UMA SOCIEDADE CHEIA DE TECNOLOGIAS, de Vani Moreira Kenski). A educação nos dias atuais está passando por um processo de renovação de espaços, de resignificação de conteúdos e de valores, tendo como ponto de partida todas as mudanças ocorridas na sociedade. A escola, como instituição integrante e atuante dessa sociedade e desencadeadora do saber sistematizado, não pode ficar fora ou a margem deste dinamismo. Sabemos que o padrão educativo vigente é ritualizado, cheio de divisões, seriações, conteúdos preestabelecidos, carga horária, calendários etc., onde permanece quase sempre inalterável. O tempo destinado a criação, a interpretação, a reflexão, a descoberta de novas tecnologias é escasso e nem sempre é aproveitado de maneira racional. Fora da escola, professores e alunos, estão permanentemente em contato com tecnologias cada vez mais avançadas, onde a máquina transforma, modifica e até substitui as tarefas humanas. Eles vivem e atuam nesta realidade como cidadãos participativos, mas não "conseguem" introduzir estas "novidades" dentro da escola, pois necessitam cumprir conteúdos programáticos exigidos. A escola é um local de tradição cultural e de ampliação de conhecimento, onde o aluno é o centro do processo de aprendizagem, analisando e interpretando as imagens e sons existentes na TV , rádio, computador, através da imagem do professor na sala de aula. É imprescindível que o professor perceba e saiba o valor e a importância dos recursos audiovisuais para o bom desempenho e eficácia do seu trabalho escolar. A tecnologia além de renovar o processo ensino-aprendizagem, vai propiciar o desenvolvimento integral do aluno, valorizando o seu lado social, emocional, crítico, imaginário, deixando margens para exploração de novas possibilidades de criação. Portanto, os recursos audiovisuais servem para explorar novas possibilidades pedagógicas e contribuir para uma melhoria do trabalho docente em sala de aula, valorizando o aluno como sujeito do processo educativo. A TELEPRESENÇA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA ÁREA DE INFORMÁTICA EM EDUCAÇÃO: IMPLANTANDO O CONSTRUCIONISMO CONTEXTUALIZADO José Armando Valente NIED-UNICAMP/SP Este artigo descreve uma experiência de uso do construcionismo contextualizado na formação de professores realizado através da combinação de atividades presenciais e via rede Internet. Tradicionalmente os cursos de formação de professores na área de informática na educação não propiciam experiências para os professores implementarem o computador como parte das atividades de sala de aula. Isto pode ser feito através do construcionismo contextualizado. Essa experiência tem criado um processo de formação continuada, realizada no contexto da escola onde os professores têm a oportunidade de implementar o computador na suas atividades de sala de aula, depurar essas experiências e construir conhecimento sobre os aspectos computacionais, pedagógicos e de como criar situações de aprendizagem onde seus alunos possam também construir o conhecimento sobre conceitos curriculares através do uso do computador. INTRODUÇÃO O presente artigo tem como objetivo descrever o trabalho de investigação sobre o uso da rede Internet no processo de formação de professores da área de informática em educação que já está sendo realizado com o Colégio Mãe de Deus, de Londrina. A interação via rede Internet tem permitido os pesquisadores do Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED) "estarem juntos" dos professores dessa escola e com isso implantar uma formação com base no construcionismo contextualizado: construcionista no sentido da construção de conhecimento baseada na realização concreta de uma ação que produz um produto palpável (um artigo, um objeto) através do computador, e que seja de interesse pessoal de quem produz; contextualizada no sentido do produto ser vinculado à realidade da pessoa ou do local onde o produto vai ser produzido e utilizado. O trabalho que está se desenvolvendo atualmente sobre o uso da rede Internet na formação de professores da área de informática em educação tem como objetivo preparar o professor para usar o computador em sua sala de aula, alternando adequadamente atividades tradicionais de ensino-aprendizagem e atividades que usam o computador e, com isso, criar condições para os alunos construírem seu conhecimento. Isso significa uma formação que pretende atingir três pontos fundamentais. Primeiro, propiciar ao professor condições para ele entender o computador como uma nova maneira de representar o conhecimento provocando um redimensionamento dos conceitos já conhecidos e possibilitando a busca e compreensão de novas idéias e valores. Usar o computador com essa finalidade requer a análise cuidadosa do que significa ensinar e aprender bem como demanda rever o papel do professor nesse contexto. Segundo, propiciar ao professor a vivência de uma experiência que contextualiza o conhecimento que ele constrói. É o contexto da escola, a prática dos professores e a presença dos seus alunos que determinam o que deve ser abordado nos cursos de formação. Assim, o processo de formação deve prover condições para o professor construir conhecimento sobre as técnicas computacionais, entender por que e como integrar o computador na sua prática pedagógica e ser capaz de superar barreiras de ordem administrativa e pedagógica, e com isso possibilitar a transição de um sistema fragmentado de ensino para uma abordagem integradora de conteúdo e voltada para a resolução de problemas específicos do interesse de cada aluno. Finalmente, criar condições para que o professor saiba recontextualizar o aprendizado e a experiência vividas durante a sua formação para a sua realidade de sala de aula compatibilizando as necessidades de seus alunos e os objetivos pedagógicos que se dispõe a atingir. Essa formação tem sido possível combinando atividades presenciais e atividades via rede Internet e está sendo desenvolvido com o Colégio Mãe de Deus, em Londrina, Paraná. CURSOS DE FORMAÇÃO EM INFORMÁTICA EM EDUCAÇÃO A formação de professores do 1º e 2º graus para usarem a informática em educação tem recebido muita atenção por parte dos pesquisadores da área. Diversos estudos têm abordado esse tema (Altoé, 1993; Almeida, 1996; Menezes, 1993; Prado, 1996; Silva Neto, 1992; Mattos, 1992) e todos os Centros de Informática Educativa (CIEd) têm programas de formação de profissionais na área como relatado na Em Aberto (Ano XII, nº 57, 1993). As escolas que têm interesse em implantar a informática no processo de ensino-aprendizagem dedicam parte do orçamento para a formação de professores. Em geral, a capacitação de profissionais para atuarem na área de informática em educação tem sido realizada através de cursos de pós-graduação (mestrado ou doutorado) ou cursos de sensibilização, extensão, aperfeiçoamento, e especialização. Isso acontece tanto no Brasil quanto em outros países (Harper, 1993; Hoyles, Noss e Sutherland, 1991). Todos esses modelos de cursos são presenciais porque exigem a presença física tanto do professor que está sendo formado quanto do professor formador. No caso da informática em educação essa presença é ainda mais marcante devido as peculiaridades que a formação nessa área exige. O professor formado necessita conhecer ferramentas computacionais (linguagem de programação ou banco de dados), teorias que explicam o processo de aprendizagem, os fatores sociais e afetivos que contribuem para a mesma e conhecer como intervir na interação aluno-computador. Assim, parte do processo de formação exige que o professor interaja com o computador obrigando que os cursos nessa área sejam realizados em centros onde haja concentração de computadores. O Projeto FORMAR no Brasil, o Projeto FORMAR tem sido usado como modelo de formação de professores na área de informática em educação. O FORMAR teve como objetivo principal o desenvolvimento de cursos de especialização na área de informática em educação. O primeiro curso foi realizado na UNICAMP, durante os meses de junho a agosto de 1987, e ministrado por pesquisadores, principalmente, dos projetos EDUCOM. Este curso ficou conhecido como Curso FORMAR I. No início de 1989 foi realizado o segundo curso, conhecido como FORMAR II. A estrutura dos cursos é muito semelhante, apesar de os objetivos específicos serem um tanto diferentes (Valente, 1993b). Tanto o FORMAR I quanto o FORMAR II foram realizados na UNICAMP. Em cada um dos cursos participaram 50 professores, vindos de praticamente todos os estados do Brasil. Esses cursos tiveram duração de 360 horas, distribuídas ao longo de 9 semanas: 45 dias, com 8 horas por dia de atividades. Os cursos eram constituídos de aulas teóricas, práticas, seminários e conferências e os alunos foram divididos em duas turmas. Enquanto uma turma assistia aula teórica a outra turma realizava aula prática usando o computador de forma individual.O FORMAR I e o FORMAR II apresentaram diversos pontos positivos. Primeiro, propiciaram a capacitação de profissionais da educação que nunca tinham tido contato com o computador e que hoje desenvolvem atividades nesta área nos CIEds ou nas respectivas instituições de origem. Esses profissionais, em grande parte, são os responsáveis pela disseminação e a formação de novos profissionais na área de informática em educação. Segundo, o curso propiciou uma visão ampla sobre os diferentes aspectos envolvidos na informática em educação, tanto do ponto de vista computacional quanto pedagógico. Terceiro, o fato de o curso ter sido ministrado por especialistas da área, de praticamente todos os centros do Brasil, propiciou o conhecimento do tipo de pesquisa e do trabalho que estava sendo realizado em informática em educação. Entretanto, os cursos apresentaram diversos pontos negativos. Primeiro, o curso foi realizado em local distante do local de trabalho e de residência dos participantes. Isso significa que eles tiveram que interromper, por dois meses, as atividades docentes e deixar a família - o que nem sempre é possível e o mais propício para a sua formação. Segundo, o curso foi demasiadamente compacto. Com isso tentou-se minimizar o custo de manutenção do profissional no curso e o tempo que ele deveria se afastar do trabalho e da família mas, deixou de oferecer o espaço e o tempo necessários para que os participantes assimilassem os diferentes conteúdos e praticassem com alunos as novas idéias oferecidas pelo curso. Os participantes do curso nunca tiveram a chance de vivenciar o uso dos conhecimentos e técnicas adquiridas e receber orientação quanto à sua performance de educador no ambiente de aprendizado baseado na informática. Terceiro, muitos desses participantes voltaram para o seu local de trabalho e não encontraram as condições necessárias para a implantação da informática na educação. Isso aconteceu tanto por falta de condições físicas (falta do equipamento) quanto por falta de interesse por parte da estrutura educacional. Alguns meses foram necessários para a construção das condições mínimas de modo que os conhecimentos adquiridos pudessem entrar em operação. Não obstante, certos aspectos do Projeto FORMAR, principalmente conteúdo e metodologia, passaram a ser usados como base para outros cursos de formação na área de informática em educação. O material gerado pelo curso e as experiências acumuladas têm sido usadas na implantação de praticamente todos os cursos nessa área (Prado & Barrella, 1994). Especialmente agora com implantação da informática através do projeto dos 100.000 micros do Ministério da Educação, praticamente todos os cursos de formação elaborados pelas Secretarias de Educação dos Estados têm como modelo o Projeto FORMAR. Em vista dos problemas identificados com o FORMAR os pesquisadores do NIED elaboraram uma proposta de cursos de formação de professores que minimizassem esses problemas e incorporassem os conhecimentos do construcionismo (Valente, 1993a). De acordo com essa proposta, o objetivo dos cursos de formação não é só propiciar conhecimento sobre informática e sobre os aspectos pedagógicos mas, auxiliar o professor e a administração da escola a construir o processo de implantação da informática na escola. A FORMAÇÃO COM BASE NO CONSTRUCIONISMO A abordagem construcionista significa o uso do computador como meio para propiciar a construção do conhecimento pelo aluno ou seja, o aluno, interagindo com o computador na resolução de problemas, tem a chance de construir o seu conhecimento. O conhecimento não é passado para o aluno; o aluno não é mais instruído, ensinado, mas é o construtor do seu próprio conhecimento. Esse é o paradigma construcionista que enfatiza a aprendizagem ao invés de destacar o ensino; a construção do conhecimento e não a instrução. Para "ensinar" o computador o aluno deve utilizar conteúdos e estratégias. No caso da resolução de um problema via computador o aluno tem que combinar esses conteúdos e estratégias através de um programa que resolve um problema. A análise da tarefa de programar o computador tem permitido identificar diversos passos que o usuário realiza e que são de extrema importância na aquisição de novos conhecimentos (Valente, 1993a). Primeiro, a interação com o computador através da programação requer a descrição de uma idéia em termos de uma linguagem formal e precisa. A descrição permite ao aluno representar e explicitar o nível de compreensão que possui sobre os diferentes aspectos envolvidos na resolução do problema. Segundo, o computador executa fielmente a descrição fornecida. Esse "feedback" fiel e imediato é desprovido de qualquer animosidade ou afetividade que possa haver entre o aluno e o computador. O resultado obtido é fruto somente do que foi solicitado à máquina. Terceiro, o resultado obtido através do computador permite ao aluno refletir sobre o que foi solicitado ao computador. Finalmente, se o resultado não corresponde ao que era esperado, o aluno tem que depurar a idéia original através da aquisição de conteúdos ou de estratégias. A atividade de depuração é facilitada pela existência do programa do computador. Esse programa é a descrição das idéias do aluno em termos de uma linguagem precisa e formal. Além disso, existe uma correspondência direta entre cada comando e o comportamento do computador. Essas características disponíveis no processo de programação facilitam a análise do programa de modo que o aluno possa achar seus erros (bugs). O processo de achar e corrigir o erro constitui uma oportunidade única para o aluno aprender sobre um determinado conceito envolvido na solução do problema ou sobre estratégias de resolução de problemas. O aluno pode experimentar alterar o conteúdo ou as estratégias e verificar se essas alterações são mais ou menos efetivas na busca da solução do problema. O aluno pode também usar seu programa para relacioná-lo com seu pensamento em um nível metacognitivo. Ele pode analisar seu programa em termos da efetividade das idéias, estratégias e estilo de resolução de problema. Nesse caso, o aluno começa a pensar sobre suas próprias idéias. Entretanto, o processo de descrever, refletir e depurar não acontece simplesmente colocando o aluno em frente ao computador. A interação aluno-computador precisa ser mediada por um profissional que conhece Logo, tanto do ponto de vista computacional, quanto do pedagógico e do psicológico. Esse é o papel do mediador no ambiente Logo (Valente, 1996). Além disso, o aluno como um ser social, está inserido em um ambiente social que é constituído, localmente, pelo seus colegas, e globalmente, pelos pais, amigos e mesmo a sua comunidade. O aluno pode usar todos esses elementos sociais como fonte de idéias, de conhecimento ou de problemas a serem resolvidos através do uso do computador. As ações que o aluno realiza na interação com o computador e os elementos sociais que suportam essa interação estão mostrados no diagrama abaixo. Utilizar a abordagem construcionista na formação do professor significa propiciar as condições para o professor agir, refletir e depurar o seu conhecimento em todas as fases pelas quais ele deverá passar na implantação do computador na sua prática de sala de aula: conhecer os diferentes software e como eles podem propiciar aprendizagem, saber como interagir com um aluno, saber como interagir com a classe como um todo e desenvolver um projeto de como integrar o computador na sua disciplina. Nesse sentido, professores e pesquisadores do NIED devem vivenciar a mesma experiência de modo que cada uma das partes possa entender a outra e propiciar soluções condizentes com a respectivas realidades. Além disso a introdução da informática na escola deve também incrementar a qualidade do ensino realizado pelos professores. Isso significa que as atividades computacionais deverão ser integradas às atividades desenvolvidas em sala de aula. Para tanto, cada professor deverá adquirir conhecimento sobre a informática e desenvolver, juntamente com os seus alunos, atividades relativas ao conteúdo da sua disciplina. A necessidade do contexto da escola no processo de formação Um curso de formação baseado na abordagem construcionista para ser efetivo deve ser desenvolvido na escola onde o professor trabalha. Isso apresenta diversas vantagens tanto para os professores como para o professor do curso. Primeiro, o conhecimento adquirido é contextualizado. A familiaridade dos professores com o computador acontece através do uso do computador da escola, com o sistema computacional e com a rede de computadores montada na escola. A experiência de aprender e de usar o computador acontece na escola, utilizando a população da escola como meio dos professores exercitarem e construírem o conhecimento sobre informática em educação. Segundo, os professores não deixam o seu local de trabalho e não têm que interromper a sua prática de ensino. As atividade do curso de formação podem ser organizadas de acordo com os horários dos professores. Terceiro, o professor do curso pode ser mais efetivo. Ele pode vivenciar e entender as idiossincrasias daquela escola de modo que as soluções pedagógicas e administrativas podem ser baseadas na realidade da comunidade escolar. Os professores e a administração da escola, através dessa vivência, vão adquirindo conhecimento sobre como implantar a informática como recurso pedagógico da escola. O curso de formação baseado no construcionismo contextualizado permite a introdução do computador na escola como produto de um processo de construção do conhecimento. Esse processo implica na construção de conhecimento pedagógico sobre como usar o computador e mudanças administrativas de modo que o computador possa vir a ser parte das atividades realizadas pelos próprios professores da escola. Cursos de formação baseados no construcionismo contextualizado foram utilizados em uma instituição de educação especial, a Associação de Assistência à Criança Defeituosa (AACD) de São Paulo, e na Escola Farroupilha, em Campinas. Embora esses cursos tenham sido muito mais eficiente, eles exigiram um contato muito intenso entre a escola e o professor do curso. O professor do curso deve ficar literalmente à disposição dos professores da escola para resolverem os problemas que impedem a realização das atividades de informática. Isso se tornou tremendamente custoso e impossível de ser continuado. No entanto, parte do custo e do esforço da presença do professor pode ser minimizado através do uso da Internet. Com a possibilidade do uso das redes computacionais, é possível resolver grande parte dos problemas que a presença constante das partes envolvidas impõe. Essa solução deu origem ao projeto de formação baseado no construcionismo contextualizado combinando atividades presencias e atividades e trocas de informação via Internet. O CONSTRUCIONISMO CONTEXTUALIZADO VIA Internet A formação de professores para usarem o computador como parte da sua disciplina está sendo realizado combinando atividades presenciais e via Internet com os professores do Colégio Mãe de Deus, em Londrina, Paraná. O projeto de formação dos professores e de implantação do computador no Colégio Mãe de Deus teve início em Fevereiro de 1995, com um curso presencial de 25 horas sobre a linguagem e a metodologia LOGO. Esse curso foi realizado conjuntamente por pesquisadores do Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e pelo Núcleo de Informática Educativa (NIE) da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Após essa experiência 21 professores da pré-escola à oitava série iniciaram o trabalho com um ou dois de seus respectivos alunos. Essa experiência foi muito breve pelo fato de os estudantes não envolvidos nessa atividade demandarem o direito de usar o computador. Em seguida, foi realizado um outro curso presencial de aprofundamento do Logo, com duração de 25 horas. Após o término desse curso os professores iniciaram as atividades de uso do computador com suas respectivas classes. No início de 1996 os professores e administradores do Colégio se interessaram em participar do projeto de formação via rede Internet. Nessa ocasião foi solicitado ao Colégio a ligação da rede local de computadores com um provedor da cidade de Londrina de modo que o Colégio pudesse ter acesso à rede Internet. A ligação com a Internet somente aconteceu no final de 1996. Independentemente do fato do Colégio não ter a comunicação via Internet os professores continuaram a utilizar o computador com os alunos e a interagir com os pesquisadores do NIED através do envio de documentos via correio ou interação via telefone. Quando a rede Internet foi instalada, foi realizada diversas oficinas presenciais no Colégio ministradas por duas pesquisadoras do NIED: Fernanda Maria F. Barrella e Maria Elisabette B. B. Prado que estão colaborando nesse projeto. Essas oficinas versaram sobre o uso do computador em disciplinas curriculares específicas e sobre o uso da rede Internet (oficina de 4 horas de duração). Assim, durante o ano de 1996 as atividades de formação dos professores do Colégio foram predominantemente presencias. As atividades de uso do computador durante esse ano foram compiladas e descritas em um relatório enviado via correio. Nesse relatório podemos identificar que quinze professores do Colégio, sendo três da pré-escola, oito da 1ª a 4º séries, quatro da 5ª a 8ª séries sendo que duas dessas professoras também ministram aulas no magistério. A análise das atividades que os alunos realizaram mostra que o computador ainda não estava integrado às diferentes disciplinas. O nível dos programas dos alunos era bastante simples, não envolvendo nenhuma sofisticação computacional. O computador era basicamente utilizado para ilustrar as tarefas que os alunos desenvolvem. Por exemplo, o aluno elaborava uma série de desenhos usando Logo para ilustrar como um fenômeno acontecia ou desenhos para ilustrar uma visita a um determinado local da cidade. Isso mostrava que o computador ainda não tinha sido assimilado como um auxiliar na resolução de problemas ou no desenvolvimento de projetos interdisciplinares. As atividades computacionais eram restritas a uma disciplina e eram simples. A partir do início do ano de acadêmico de 1997 as interações com o Colégio passou a ser feita somente via Internet. Cada um dos professores enviou via e-mail o plano para o primeiro semestre de 1997 sobre como pretendia utilizar o computador na sua disciplina. Foram dezessete planos enviados e que chegaram praticamente ao mesmo tempo. Atualmente são quinze professores que têm mantido troca de informação via e-mail: três professoras da educação infantil, sete professoras da 1ª a 4ª séries, uma professora de 5ª série, duas professoras de 8ª série, e duas professoras do magistério do segundo grau. O Colégio dispõe de um micro onde está instalado o sistema de e-mail, ligado ao servidor da Universidade Estadual de Londrina via linha telefônica. O sistema de comunicação é o Eudora e o Colégio como um todo dispõe de um endereço. Assim, os professores do Colégio ainda não dispõem de um endereço particular e não têm o hábito de ler o e-mail (o e-mail é lido pelo professor responsável pela manutenção da rede local de computadores que avisa aos professores destinatários a existência de mensagens). A análise das primeiras mensagens enviadas foi bastante complica pois o sistema de e-mail instalado no NIED não estava preparado para lidar com a quantidade de informação, com a organização e catalogação da mesma. O sistema Eudora que está sendo usado tanto pelo Colégio quanto pelo NIED não permite a integração de mensagens com gráficos ou programas relacionados com a mensagem. Os arquivos são anexados à mensagem mas são recebidos e abertos em um outro sistema (Word, PaintShop ou LOGO). A ligação dessas informações bem como a catalogação das mesmas têm que ser feita manualmente, sendo que é mais eficiente imprimir e arquivar a mensagem impressa. Isso têm consumido muito tempo, atrasando a freqüência do feedback fornecido ao professor. Além disso, a interação via e-mail entre os pesquisadores do NIED e os professores do Colégio não tem sido muito intensa. Primeiro, as mensagens têm sido na forma de relatos que devem ser processados e o feedback tem levado um tempo maior do que o desejado. Terceiro, as mensagens enviadas pelos professores do Colégio são compostas no papel e "passadas" no editor do Eudora e enviadas. Finalmente, falta uma infraestrutura computacional no sistema de e-mail do NIED para receber e processar um volume substancial de informação enviada pelos professores do Colégio. No entanto, as interações que foram realizadas com os professores do Colégio relatam as experiências dos alunos, questões teóricas ou práticas de uso do computador, e dificuldades que os professores encontram no aspecto pedagógico de uso do computador com seus alunos. Essas mensagens são ricas em conteúdo e refletem o nível de dificuldade encontrada no atual processo de implantar o computador na realidade da escola. Embora a atividade de uso do e-mail tenha sido iniciada no primeiro semestre de 1997, é muito cedo para dizer quais serão as repercussões desse tipo de interação. No entanto, hoje nós sentimos que temos uma visão muito mais ampla do que está acontecendo na escola. Essa experiência está sendo diferente do que fazíamos anteriormente quando ficávamos aguardando até o final do semestre para receber o relatório das atividades dos professores e conhecermos o que funcionou ou não. Através do e-mail estamos podendo atuar a cada momento no desenvolvimento das atividades dos professores e auxiliá-los na solução das questões que emergem no processo de implantar o computador em uma atividade específica ou mesmo em questões de ordem administrativa. Assim, a interação via e-mail tem indicado que podemos "estar junto" do professor na sua prática do dia-a-dia e com isso construir juntos o processo de implantação do computador na sua sala de aula e a desenvolver uma nova abordagem pedagógica que enfatiza a construção de conhecimento ao invés da transmissão de informação. REFLEXÃO SOBRE A FORMAÇÃO VIA Internet Essa experiência desenvolvida com os professores do Colégio Mãe de Deus tem fornecido material para refletir e entender sobre três questões:(1) a compreensão de como a rede Internet pode ser usada na educação, (2) o desenvolvimento de uma metodologia de formação de professores baseado no construcionismo contextualizado,(3) a identificação de diversos aspectos que devem ser implementados para facilitar o processo de interação entre os professores da escola e os pesquisadores do NIED. USO DA INTERNET NA EDUCAÇÃO A utilização da rede Internet na educação é uma realidade. O número de experiência nessa área tem crescido muito nesses últimos anos e tem surgido diversas modalidades de uso da rede na formação de professores. No entanto, a abordagem de uso da Internet que estamos desenvolvendo é diferente da abordagem que usa a Internet para conectar professores, propiciar acesso a material atualizado em sua área, como alguns projetos descritos na literatura: O projeto RedeLet iniciado em 1991 é dedicado à integração, a nível nacional, das instituições federais de educação tecnológica, atualização de professores, reciclagem, apoio e intercâmbio com outros países da América do Sul (Santos, 1996). O projeto Conexiones da Colômbia (Restrepo et all, 1996) tem como objetivo geral criar ambientes de aprendizagem baseados em tecnologias de informação e de comunicação que dêem suporte a uma melhoria da qualidade da educação no país. O sistema KIE (Knowledge Integration Environment) permite o debate eletrônico entre professores e alunos, estimulando a argumentação e a exposição de idéias. A rede K12 oferece interligação entre professores, alunos e outras pessoas interessadas em promover uma comunidade global para educação de alunos com idade entre 5 e 18 anos, de escolas públicas e particulares (Murray, 1993). A rede KIDLINK que tem como principal objetivo ajudar jovens entre 10 e 15 anos a construir uma rede global utilizando a Internet. Os professores podem usar as respostas como um ponto de partida para discussões em classe e muitos as utilizam para ajudar os estudantes a uma melhor autoconsciência do mundo em que vivem (Presno, 1996). O TCA (Teacher´s Curriculum Assistant) é o protótipo de um ambiente que fornece suporte de software para professores utilizarem efetivamente os recursos da Internet (Stahl et all, 1995). Esses sistemas permitem a interação entre pessoas e o acesso dessas pessoas à informação necessária para a sua formação. No entanto, eles não dispõem de facilidades para auxiliar os usuários no processo de construção de conhecimento. Essa facilidade pode ser encontrada em outros sistemas dedicados tanto ao aluno quanto ao professor como: ARCOO (Aprendizagem Remota Cooperativa Orientada a Objetivos) é um sistema de apoio a alunos e professores na construção de novos conhecimentos, através do trabalho cooperativo e sob a orientação de especialistas. Esse sistema está sendo utilizado experimentalmente, objetivando sua validação, junto a disciplinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Barros, 1995). O Virtual Classroom, projeto do New Jersey Institute of Technology, é um sistema de conferência por computador onde professores e alunos compartilham suas idéias, enviando e recebendo mensagens, lendo e comentando material de leitura, fazendo avaliações e recebendo feedback sem ter que participar de aulas fixas e formais (Harasim, 1990). O projeto de formação de professores via rede, oferecido pelo Laboratório de Estudos Cognitivos (LEC) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dirigido a 20 educadores responsáveis pelo Programa Nacional de Informática Educativa da Costa Rica. O objetivo foi o de preparar recursos humanos para estabelecer uma metodologia que implicasse, ela própria, na obtenção de novos modelos de prática pedagógica (Axt e Fagundes, 1995). Na interação com os participantes do curso, o LEC utilizou o método clínico piagetiano de interação e intervenção adaptado aos ambientes telemáticos de aprendizagem. No entanto, todos esses projetos contemplam somente os aspectos teóricos envolvidos nas respectivas disciplinas ou no processo de formação de professores para a área de informática em educação como é o caso do projeto do LEC. Esses projetos não abrangem o aprendizado sobre "o fazer" como no caso da elaboração de um programa de computador ou do acompanhamento da implantação efetiva do computador na atividades de sala de aula. Metodologia de formação baseado no construcionismo contextualizado O trabalho com os professores do Colégio Mãe de Deus tem permitido a implantação de um novo modelo de curso de formação que é desenvolvido na escola onde o professor trabalha. Isso apresenta diversas vantagens tanto para os professores quanto para o professor que ministra o curso. Primeiro, o conhecimento adquirido é contextualizado na realidade da escola. Por exemplo, é muito comum cursos de formação na área de informática onde o professor utiliza um sistema computacional e a escola dispõe de um outro sistema. O conhecimento adquirido no cursos tem que ser adaptado a uma outra realidade e isso normalmente tem que ser feito pelo professor sem ajuda dos especialistas dos cursos. No nosso caso, a familiaridade dos professores com o computador acontece através do uso do computador da escola, com o sistema computacional e com a rede de computadores montada na escola. Além disso, a experiência de aprender e de usar o computador com alunos acontece na escola, utilizando a população da escola como meio dos professores exercitarem e construírem o conhecimento sobre informática em educação. Segundo, os professores não deixam o seu local de trabalho e não têm que interromper a sua prática de ensino. As atividade do curso de formação podem ser organizadas de acordo com os horários dos professores. Além das dificuldades operacionais que a remoção do professor da sala de aula causa, os cursos de formação realizados em locais distintos daquele do dia-a-dia do professor, acarretam outras dificuldades. Esses cursos são descontextualizados da realidade do professor uma vez que o conteúdo dos cursos de formação e as atividades desenvolvidas são propostas independentemente da situação física e pedagógica daquela em que o professor vive. Além disso, esses cursos não contribuem para a construção, no local de trabalho do professor formando, de um ambiente, tanto físico quanto profissional, favorável à implantação das mudanças educacionais. Em geral, o professor após terminar o curso de formação, volta para a sua prática pedagógica, encontrando os mesmo problemas e dificuldades que existiam anteriormente; quando não, um ambiente hostil à mudança. Terceiro, o professor que ministra os cursos de formação pode ser mais efetivo. Ele pode vivenciar e entender as idiossincrasias daquela escola de modo que as soluções pedagógicas e administrativas podem ser baseadas na realidade da comunidade escolar. Os professores e a administração da escola, através dessa vivência, vão adquirindo conhecimento sobre como implantar a informática como recurso pedagógico da escola. É impossível imaginar que os professores formados sejam capazes de por si só enfrentar situações difíceis e de implantar as mudanças educacionais necessárias para implantar o computador na escola. Em síntese, os cursos de formação de professores em informática em educação exigem uma nova abordagem, incorporando aspectos pedagógicos que contribuam para que o professor seja capaz de construir, no seu local de trabalho, as condições necessárias e propícias à mudança educacional. Essa mudança não pode ser vista como um interruptor que o professor formado aciona através de conteúdos descontextualizados que ele adquiriu. Essa mudança tem que ser um processo de construção que o professor empreende na sua prática pedagógica e essa construção tem que ser realizada no contexto da escola e auxiliada pela estrutura do curso de formação. IMPLEMENTAÇÃO DE INFRA-ESTRUTURA COMPUTACIONAL A experiência com a troca de informação via e-mail com os professores e administradores do Colégio Mãe de Deus tem permitido entender que existem enormes dificuldades que devem ser sobrepujadas para que o uso da Internet possa ser mais efetivo. Primeiro, é muito difícil estabelecer comunicação com os professores via e-mail ou "ler" as idéias e os sentimentos desses professores somente com base no material escrito enviado. Isso significa que é necessário algum grau de envolvimento presencial para que a comunicação via Internet possa ser estabelecida de maneira significativa e efetiva. Segundo, a instalação de sistemas de teleconferências poderia minimizar os problemas do "ler as idéias". No entanto, essa instalação ainda que viável do ponto de vista de custo de equipamentos se torna inviável como solução prática devido à baixa velocidade de transmissão das linhas instaladas no país. Terceiro, é necessário dispor de algum tipo de facilidade computacional para organizar e catalogar a quantidade de mensagens que recebemos e temos que responder. Para tanto, um sistema de controle tanto do envio quanto do recebimento das mensagens facilitaria enormemente o trabalho de troca de informação com os professores com a escola. Essa interface estão sendo desenvolvidas por pesquisadores e bolsistas do NIED. CONCLUSÕES O presente trabalho de pesquisa está ainda em andamento mas apresenta diversos aspectos que podem ter importantes contribuições na formação de professores para a área de informática na educação. Primeiro, a formação de profissionais envolvidos, tanto pesquisadores do NIED quanto professores do Colégio Mãe de Deus. Do ponto de vista do NIED são diversos pesquisadores e bolsistas de iniciação científica que estão envolvidos diretamente no projeto e têm a oportunidade de apropria-se dos conhecimentos envolvidos no desenvolvimento dessa nova metodologia de formação de professores. Esses profissionais estão estudando questões sobre como a intervenção no processo de construção de conhecimento pode ser feita via presencial e via rede; como o nível de interação pode ser sustentado via rede; como essas intervenções podem ser efetivas no processo de auxiliar o professor a implantar o computador na sua prática de sala de aula; e como desenvolver ferramentas computacionais para dar suporte ao acompanhamento, via rede, do trabalho que o professor desenvolve na sua escola. Do ponto de vista do Colégio são quinze professores que estão diretamente envolvidos no projeto e que estão sendo formados para serem capazes de implantar o computador na sua prática de sala de aula. Esses professores estão adquirindo conhecimento sobre informática e desenvolvendo, juntamente com os seus alunos, atividades relativas ao conteúdo da sua disciplina. Essa formação é feita de maneira gradativa, e está sendo realizada através das atividades de programação e as atividades de uso do computador com alunos e com a sala de aula permitindo a reflexão sobre a performance do professor e a introdução de diferentes aspectos das teorias que enfatizam a construção do conhecimento, como Piaget, Papert, Vygotsky e Freire além de outras teorias que contribuem para explicar os diferentes níveis de interação e as atividades que acontecem nesse ambiente de aprendizado. O segundo tipo de resultado é o desenvolvimento de interfaces computacionais para dar suporte às atividades via rede de computadores, principalmente a Internet. Esse resultado deve incrementar o desenvolvimento de aplicações educacionais na Internet. As interfaces em desenvolvimento deverão resolver alguns dos problemas de interação entre os professores do Colégio e os pesquisadores do NIED. Essas facilidades deverão contribuir para aumentar a freqüência e a qualidade da interação via rede Internet, e possibilitar a presença mais constante de profissionais capazes de auxiliarem a resolução de dificuldades e problemas que advém do processo de mudança na escola que a implantação do computador provoca. O terceiro resultado é o desenvolvimento de uma metodologia de formação de professores da área de informática em educação baseado no construcionismo contextualizado e que combina atividades presenciais e via rede Internet. Esse é um modelo de curso de formação onde as atividades com os professores são desenvolvidas na escola onde o professor trabalha. A escola adquire os computadores, monta o seu laboratório e os pesquisadores do NIED vão até a escola para realizar algumas atividades presenciais. Outras atividades como acompanhamento do trabalho que o professor realiza com os alunos, aprofundamento no Logo, nos software e elaboração de projetos podem ser acompanhados via rede de computadores. Isso significa que o professor não deixa o seu local de trabalho e os pesquisadores do NIED podem vivenciar a problemática da escola, tanto do ponto de vista pedagógico quanto administrativo, podendo auxiliar na superação das dificuldades. Por outro lado, os pesquisadores do NIED não devem ficar de plantão na escola a espera que os problemas surjam. Os problemas de ordem pedagógica e administrativa podem ser resolvidos via rede de computadores. O quarto resultado é a disseminação dessa metodologia de formação. Essa nova metodologia de trabalho bem como as informações oriundas da troca de informação entre os professores do Colégio e os pesquisadores do NIED estão sendo documentadas e disponibilizadas na rede Internet para que possam ser utilizadas por professores de outros centros interessados na área de informática em educação. Esse conhecimento adquirido na forma de um trabalho de pesquisa e disseminado para outros centros de informática em educação incrementará a possibilidade de atuação desses centros na formação de professores e na implantação de computadores em escolas em regiões remotas. Finalmente, a área do ensino via rede Internet poderá beneficiar-se dos resultados do presente projeto. Essa área é bastante nova e os materiais e os meios de disseminação desses materiais ainda são, na grande maioria, unidirecionais. A utilização do computador e da telepresença possibilitará a interação multidirecional e o acompanhamento remoto do trabalho que os professores desenvolvem. A relevância desses resultados é enorme se considerado que o número de escolas interessadas no uso do computador na educação está crescendo assustadoramente. Por exemplo, o interesse do Ministério de Educação em implantar o computador em 5.000 escolas (menos de 1% das escolas no Brasil) e a implantação do computador nos sistemas municipal de educação de grandes cidades como a Secretaria Municipal de Educação das cidades de São Paulo. No entanto, o número crescente de escolas interessadas no uso do computador e a problemática da formação dos professores decorrente não devem ser usadas como argumentos para reduzir os objetivos da informatização da escola à simples instalação do laboratório de computadores e ao uso de software do tipo tutorial. A solução da informatização da escola deve ser a manutenção dos objetivos de usar o computador em uma escola transformada e a preparação de professores para atuarem nessas escolas deve ser feita através de meios inovadores, combinando uma parte presencial e outra via rede de computadores, como proposto nesse trabalho. REFERÊNCIAS Almeida, M.E.B.T.M.P. (1996). Informática e Educação - Diretrizes para uma Formação Reflexiva de Professores. Tese de Mestrado. São Paulo: Departamento de Supervisão e Currículo da PUC. Altoé, A. (1993). O Computador na Escola: O Facilitador no Ambiente Logo. Tese de Mestrado. São Paulo: Departamento de Supervisão e Currículo da PUC. Axt, M e Fagundes, L. (1995). EAD - Curso de Especialização via Internet: Buscando Indicadores de Qualidade. Anais do VII Congresso Internacional Logo, I Congresso de Informática Educativa do Mercosul, pp. 120 - 131. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Barros, L. A. (1995). 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A UTILIZAÇÃO DAS NOVAS TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO NUMA PERSPECTIVA CONSTRUTIVA Fábia Magali Santos Vieira Estudos demonstram que a utilização das novas tecnologias de informação e comunicação (NTICs), como ferramenta , traz uma enorme contribuição para a prática escolares em qualquer nível de ensino. Essa utilização apresenta múltiplas possibilidades que poderão ser realizadas segundo uma determinada concepção de educação que perpassa qualquer atividade escolar.O objetivo desse trabalho é, portanto, discutir alguns aspectos relevantes sobre a questão da utilização das NTICs na educação, segundo uma concepção construtivista de aprendizagem. Inicialmente é importante salientar que, desde o final da década de 80, as escolas públicas do Estado de Minas Gerais têm sido equipadas com um verdadeiro arsenal de tecnologias: TV Escola, video-escola, centrais de informática, etc. Todos esses projetos têm a pretensão de ensinar com o apoio das máquinas e assim melhorar a prática pedagógica. Certamente tais tecnologias têm auxiliado, em algum momento, o processo de ensino e talvez o de aprendizagem, mas o resultado tem sido pouco observável na prática e a educação formal continua essencialmente inalterada. Para LOING (1998), a introdução das NTICs na educação deve ser acompanhada de uma reflexão sobre a necessidade de uma mudança na concepção de aprendizagem vigente na maioria das escolas atualmente. Segundo LITTO (1992), o atual sistema educacional é um espelho do sistema industrial de massa, onde os alunos passam de uma série a outra, numa seqüência de matérias padronizadas como se fosse uma linha de montagem industrial. Os conhecimentos acumulados são despejados em suas cabeças; alunos com maior capacidade para absorção de fatos e comportamento submisso são colocados em uma trilha mais veloz, enquanto outros são colocados na trilha de velocidade mediana. “Produtos defeituosos” são tirados da linha de montagem e devolvidos para “conserto”. Estamos vivendo em uma era de transformações, uma era de interdependência global com a internacionalização da economia e a supervalorização da comunicação e informação. Organizações da sociedade industrial estruturadas para desempenhar tarefas de natureza hierárquicas de comando e controle estão sendo substituídas, devido à competitividade e à complexidade, pela formação de grupos em torno de projetos específicos. Comando e controle dão lugar à aprendizagem e resposta, numa tentativa, por parte de cada organização, de ser a primeira a chegar no mercado com produto ou serviço de boa qualidade. O ambiente apropriado para a realização desse tipo de trabalho tem sido o que privilegia reuniões presenciais de grupos, mas também fornece acesso instantâneo à rede Internet e aos discos e disquetes contendo respostas para permitir as tomadas de decisões do grupo. Comprovando assim que o ambiente de aprendizagem ou trabalho determina, em parte, a natureza do produto.Com a revolução tecnológica e científica, a sociedade mudou muito nas últimas décadas. Assim a educação não tem somente que adaptar às novas necessidades dessa sociedade do conhecimento como, principalmente, tem que assumir um papel de ponta nesse processo.Os recursos tecnológicos de comunicação e informação têm se desenvolvido e se diversificado rapidamente. Eles estão presentes na vida cotidiana de todos os cidadãos, que não podem ser ignorados ou desprezados. Embora seja possível ensinar e aprender sem eles, as escolas têm investido cada vez nas NTICs. Pela enorme influência que essas NTICs, especialmente a computação, têm exercido atualmente na educação é que torna-se necessária uma reflexão sobre a concepção de aprendizagem que deverá perpassar a utilização dessa tecnologia na prática educativa.Uma idéia muito difundida na educação é que as NTICs, principalmente a informática, servem para facilitar o processo de ensino e aprendizagem. Essa idéia está ligada ao fato de que a tecnologia entrou na vida do homem para facilitar. Dessa maneira a utilização das NTICs está fundamentada em uma concepção de aprendizagem Behaviorista, onde aprender significa exibir comportamento apropriado. Assim o objetivo principal da educação se restringe a treinar os estudantes a exibirem um determinado comportamento e controlá-lo externamente. Uma segunda idéia é o uso do computador na educação como dispositivo para ser programado, realizando o ciclo descrição – execução – reflexão – depuração – descrição, que é de extrema importância na aquisição de novos conhecimentos. Segundo VALENTE (1998), diante de uma situação problema, o aprendiz tem que utilizar toda sua estrutura cognitiva para descrever para o computador os passos para a resolução do problema, utilizando uma linguagem de programação. A descrição da resolução do problema vai ser executada pelo computador. Essa execução fornece um “feedback” somente daquilo que foi solicitado à máquina. O aprendiz deverá refletir sobre o que foi produzido pelo computador; se os resultados não corresponderem ao desejado, o aprendiz tem que buscar novas informações para incorporá-las ao programa e repetir a operação. Dessa forma, o computador complica a vida do aprendiz ao invés de facilitá-la. Com a realização desse ciclo, o aprendiz tem a oportunidade de encontrar e corrigir seus próprios erros e o professor, entender o que o aprendiz está fazendo e pensando. Portanto, o processo de achar e corrigir o erro constitui uma oportunidade única para o aluno aprender sobre um determinado conceito envolvido na solução de um problema ou sobre estratégias de resolução de problemas.A realização do ciclo descrição – execução – reflexão – depuração – descrição não acontece simplesmente colocando o aprendiz diante do computador. A interação aluno – computador precisa ser mediada por um profissional – agente de aprendizagem – que tenha conhecimento do significado do processo de aprender por intermédio da construção de conhecimento, para que ele possa entender as idéias do aprendiz e como atuar no processo de construção do conhecimento para intervir apropriadamente na situação, de modo a auxiliá-lo nesse processo. Essa idéia está fundamentada nos princípios da teoria construtivista de Piaget, que parte da premissa que o conhecimento não procede apenas da programação inata do sujeito e nem de sua única experiência sobre o objeto, mas é resultado tanto da relação recíproca do sujeito com seu meio, quanto das articulações e desarticulações do sujeito com esse objeto. Dessas interações surgem contruções cognitivas sucessivas, capazes de produzir novas estruturas em um processo contínuo e incessante. Portanto, o uso das NTICs na educação deve ter como objetivo mediar a construção do processo de conceituação dos alunos, buscando a promoção da aprendizagem e desenvolvendo habilidades importantes para que ele participe da sociedade do conhecimento e não simplesmente facilitando o seu processo de ensino e de aprendizagem. Para que as NTICs promovam as mudanças esperadas no processo educativo, devem ser usadas não como máquinas para ensinar ou aprender, mas como ferramenta pedagógica para criar um ambiente interativo que proporcione ao aprendiz, diante de uma situação problema, investigar, levantar hipóteses, testá-las e refinar suas idéias iniciais, construindo assim seu próprio conhecimento. A utilização das NTICs na educação não garantirá por si só a aprendizagem dos alunos, pois as mesmas são instrumentos de ensino que podem e devem estar a serviço do processo de construção e apropriação do conhecimento dos aprendizes. A introdução desses recursos na educação deve ser acompanhada de uma sólida formação dos professores para que eles possam utilizá-las de uma forma responsável e com potencialidades pedagógicas verdadeiras, não sendo utilizadas como máquinas divertidas e agradáveis para passar o tempo. Bibliografia: FAGUNDES, Léa. A escolha de software educativo e a inserção de software em projetos educacionais. In: III Encontro Nacional do PROINFO – MEC, 1998, Pirenopólis – GO LITTO, Fredric M. Repensando a educação em função de mudanças sociais e tecnológicas recentes. In: OLIVEIRA, Vera B. Informática em Psicopedagogia. São Paulo: Editora SENAC, 1996. P. 85 – 110. LOING, Bernard. Escola e tecnologias: Reflexão para uma abordagem racionalizada. Tecnologia Educacional. Rev., Rio de Janeiro, p. 40-43, julho/agosto/setembro.1998. CARVALHO, Mauro Giffoni. PIAGET E VYGOTSKY: As contribuições do interacionismo. Dois Pontos. Rev., N. 24 . Belo Horizonte, p 26 – 27, 1996. VALENTE, José A. Análise dos diferentes tipos de softwares usados na educação. In: III Encontro Nacional do PROINFO – MEC, 1998, Pirenopólis - GO COMPUTADOR NA ESCOLA: RESISTÊNCIAS INICIAIS O uso do computador na formação do professor Um enfoque reflexivo da prática pedagógica Maria Elisabette Brisolara Brito Prado Falar em Informática na Educação ainda cria certo clima de receio entre os educadores.Por que acontece? Pode-se, entender de uma maneira geral, que o computador representa, pare alguns desses profissionais, um domínio desconhecido. "...facilmente sucumbimos à tendência de fixação no conhecido e no habitual. Tudo o que é novo desencadeia medo e mobiliza os mecanismos de defesa." (Dethlefsen, 1994:.12).Nesse sentido, o computador, como objeto desconhecido, pode gerar um estado de insegurança, de perturbação. Para superá-lo, é preciso, muitas vezes, abandonar as posturas rígidas, abrindo-se para integrar o novo ao conhecido ampliando e transformando o próprio conhecimento. Assim, o educador, sem receios, poderia opinar e tomar suas decisões de escolhas, criteriosamente, acerca do uso da Informática na Educação.Pode ser um caminho, mas nem sempre ele é percebido. Existem outro fatores que levam, naturalmente, o educador a ignorar ou mesmo a repudiar as questões que envolvem a Informática na Educação.O fato de o computador ser um objeto tecnológico faz com que ele possa, à primeira vista, ser associado à concepção pedagógica. tecnicista - uma concepção que norteia as práticas pedagógicas vigentes, na maioria dos sistemas de ensino. O computador, inserido nesse contexto, pode facilmente ser identificado e/ou incorporado como mais um instrumento que vem reforçar a ação educativa, centrada na eficiência das técnicas e dos métodos de ensino.Além disso, a visão tecnicista vem sendo veementemente criticada por educadores preocupados com a qualidade do processo de formação. Autores como Saviani (1980), Mello (1937), Lelis (1989), entre outros, apontam para a ênfase dada à competência técnica como um dos fatores responsáveis pela desqualificação do professor. Os cursos, de formação desenvolvidos nessa concepção enfocam, essencialmente, as normas e regras referentes ao planejamento didático, ao processo de avaliação e aos métodos instrucionais.A conseqüência do enfoque tecnicista: reflete na prática a "tecnização" dos conteúdos e das relações humanas. Isso, na realidade, afasta o professor da possibilidade de assegurar um aprofundamento do seu conhecimento sobre os vários aspectos que constituem o seu universo de ação. Um fato que acaba gerando a desvalorização da função do professor, caracterizando o atual estado de precariedade do processo educativo....um profissional intelectualmente desqualificado, com poucas possibilidades de vir a ser um profissional que questiona a realidade, que pergunta pelo sentido de sua prática, que assume uma atitude reflexiva diante da Educação e da sociedade". (Coelho, 1982:35).O mais agravante é que os profissionais que foram( e ainda estão sendo) preparados para executar tarefas predeterminadas e para seguir as regras estão recebendo cada vez mais os "pacotes educacionais" sobre uma nova metodologia de ensino. Para colocar em prática uma nova proposta, os professores participam de um treinamento que enfatiza apenas a sua operacionalização. Isso significa que independente do caráter da nova proposta, a maneira de o professor aprendê-la é apenas mecânica, fechada e pronta para ser reproduzida. Dessa forma a concretização de unia proposta educacional, por mais eficiente e necessária que seja para o sistema de ensino, será superficial. Na verdade, os problemas educacionais não podem ser resolvidos simplesmente "maquiando" e rotulando a prática do professor. É preciso resgatar o professor na sua essência, como um profissional reflexivo, potencialmente capaz de saber fazer, de compreender e de transformar sua prática.Compartilho da preocupação de muitos educadores respeito do enfoque tecnicista queexiste na formação do professor. Portanto, gostaria de esclarecer, em relação à Informática na Educação, uma questão bastante sutil. O computador em sin não está, necessariamente vinculado à pedagogia tecnicista. No entanto, o modo de utilizá-lo e as escolhas que o professor precisa fazer expressam, claramente, uma determinada concepção de educação.De mineira geral, os materiais e as ferramentas pedagógicas são criados a partir de determinados pressupostos teóricos. No entanto, esse fato não garante que sua utilização no contexto educacional preserve os mesmos pressupostos. É comum encontrar professores que dizem e acreditam estar trabalhando com os princípios educacionais construtivistas, utilizando inclusive os materiais destinadas às provas piagetianas. Por exemplo: as provas da conservação da massa , do número entre outras. Mas a maneira como o professor utiliza esses materiais nem sempre é coerente com a visão construtivista. Em outras palavras, a concepção de uma abordagem pedagógica não se concretiza pelo fato de se usar a terminologia e/ou de se fazer uso de um material piagetiano; ela se concretiza pela ação do professor. Situações semelhantes também podem acontecer com o uso do computador na educação.Por essa razão, torna-se necessário que o professor conheça não apenas a operaciorialização da máquina, mas também compreenda as implicações pedagógicas envolvidas nas diferentes formas de utilizar o computador com finalidades educacionais. A compreensão é fundamental para que o uso do computador não seja apenas mais um instrumento eficiente de ensino e aprendizagem, segundo a visão tecnicista. Ao contrário, é importante que seu uso possa ser um meio favorável ao desencadeamento de processos reflexivos sobre a aprendizagem e sobre uma nova abordagem pedagógica. DIFERENTES USOS DO COMPUTADOR NA EDUCAÇÃO José Armando Valente Introdução Para a implantação do computador na educação são necessários basicamente quatro ingredientes: o computador, o software educativo, o professor capacitado para usar o computador como meio educacional e o aluno. Todos eles têm igual importância e serão devidamente tratados ao longo desse livro. Entretanto, esse capítulo apresenta uma visão geral dos diferentes usos do computador e, especificamente, descreve os diferentes tipos de software educativo: um ingrediente com tanta importância quanto os outros pois, sem ele, o computador jamais poderá ser utilizado na educação. Na educação o computador tem sido utilizado tanto para ensinar sobre computação — ensino de computação ou "computer literacy" — como para ensinar praticamente qualquer assunto — ensino através do computador. No ensino de computação o computador é usado como objeto de estudo, ou seja, o aluno usa o computador para adquirir conceitos computacionais, como princípios de funcionamento do computador, noções de programação e implicações sociais do computador na sociedade. Entretanto, a maior parte dos cursos oferecidos nessa modalidade podem ser caracterizados como de "conscientização do estudante para a informática", ao invés de ensiná-lo a programar. Assim, os propósitos são vagos e não determinam o grau de profundidade do conhecimento que o aluno deve ter — até quanto o aluno deve conhecer sobre computadores e técnicas de programação. Isto tem contribuído para tornar esta modalidade de utilização do computador extremamente nebulosa e facilitado a sua utilização como chamarisco mercadológico. E como tal, as escolas oferecem cursos de computação onde os alunos, trabalhando em duplas, têm acesso ao computador somente uma hora por semana, quando muito. Certamente esse não é o enfoque da informática educativa e, portanto, não é a maneira como o computador é usado no ambiente de aprendizagem discutido ao longo desse livro. O ensino pelo computador implica que o aluno, através da máquina, possa adquirir conceitos sobre praticamente qualquer domínio. Entretanto, a abordagem pedagógica de como isso acontece é bastante variada, oscilando entre dois grandes pólos, como mostra a figura abaixo: Esses pólos são caracterizados pelos mesmos ingredientes: computadores (hardware), o software (o programa de computador que permite a interação homem-computador) e o aluno. Porém, o que estabelece a polaridade é a maneira como esses ingredientes são usados. Num lado, o computador, através do software, ensina o aluno. Enquanto no outro, o aluno, através do software, "ensina" o computador. Quando o computador ensina o aluno o computador assume o papel de máquina de ensinar e a abordagem educacional é a instrução auxiliada por computador. Essa abordagem tem suas raízes nos métodos de instrução programada tradicionais porém, ao invés do papel ou do livro, é usado o computador. Os software que implementam essa abordagem podem ser divididos em duas categorias: tutoriais e exercício-e-prática ("drill-andpractice"). Um outro tipo de software que ensina é dos jogos educacionais e a simulação. Nesse caso, a pedagogia utilizada é a exploração autodirigida ao invés da instrução explícita e direta. No outro pólo, para o aprendiz "ensinar" o computador o software é uma linguagem computacional tipo BASIC, Logo, Pascal ou, uma linguagem para criação de banco de dados do tipo DBase; ou mesmo, um processador de texto, que permite ao aprendiz representar suas idéias segundo esses software. Nesse caso o computador pode ser visto como uma ferramenta que permite ao aprendiz resolver problemas ou realizar tarefas como desenhar, escrever, comunicar-se, etc... O objetivo deste capítulo é apresentar uma breve descrição de cada um dos diferentes tipos de software, suas vantagens e desvantagens, as novas tendências do uso da informática na educação tendo em vista a experiência e os atuais avanços computacionais. Entretanto, antes de passarmos à descrição de cada uma dessas modalidades de uso do computador, é importante mencionar que existem outras maneiras de classificar os software usados na educação. Por exemplo, Taylor (1980) classifica os software educativos em tutor (o software que instrui o aluno), tutorado (software que permite o aluno instruir o computador) e ferramenta (software com o qual o aluno manipula a informação). Assim, o tutor equivale aos programas do pólo onde o computador ensina o aluno. Os software do tipo tutorado e ferramenta equivalem aos programas do pólo onde o aluno "ensina" o computador. Já outros autores preferem classificar os software educativos de acordo com a maneira como o conhecimento é manipulado: geração de conhecimento, disseminação de conhecimento e gerenciamento da informação (Knezek, Rachlin e Scannell, 1988). Um pouco de História A introdução do computador na educação tem provocado uma verdadeira revolução na nossa concepção de ensino e de aprendizagem. Primeiro, os computadores podem ser usados para ensinar. A quantidade de programas educacionais e as diferentes modalidades de uso do computador mostram que esta tecnologia pode ser bastante útil no processo de ensinoaprendizado. Segundo, a análise desses programas mostra que, num primeiro momento, eles podem ser caracterizados como simplesmente uma versão computadorizada dos atuais métodos de ensino. A história do desenvolvimento do software educacional mostra que os primeiros programas nesta área são versões computadorizadas do que acontece na sala de aula. Entretanto, isto é um processo normal que acontece com a introdução de qualquer tecnologia na sociedade. Aconteceu com o carro, por exemplo. Inicialmente, o carro foi desenvolvido a partir das carroças, substituindo o cavalo pelo motor a combustão. Hoje, o carro constitui uma indústria própria e as carroças ainda estão por aí. Com a introdução do computador na educação a história não tem sido diferente. Inicialmente, ele tenta imitar a atividade que acontece na sala de aula e a medida que este uso se dissemina outras modalidades de uso do computador vão se desenvolvendo. O ensino através da informática tem suas raízes no ensino através das máquinas. Esta idéia foi usada por Dr. Sidney Pressey em 1924 que inventou uma máquina para corrigir testes de múltipla escolha. Isso foi posteriormente elaborado por B. F. Skinner que no início de 1950, como professor de Harvard, propôs uma máquina para ensinar usando o conceito de instrução programada. A instrução programada consiste em dividir o material a ser ensinado em pequenos segmentos logicamente encadeados e denominados módulos. Cada fato ou conceito é apresentado em módulos seqüenciais. Cada módulo termina com uma questão que o aluno deve responder preenchendo espaços em branco ou escolhendo a resposta certa entre diversas alternativas apresentadas. O estudante deve ler o fato ou conceito e é imediatamente questionado. Se a resposta está correta o aluno pode passar para o próximo módulo. Se a resposta é errada, a resposta certa pode ser fornecida pelo programa ou, o aluno é convidado a rever módulos anteriores ou, ainda, a realizar outros módulos, cujo objetivo é remediar o processo de ensino. De acordo com a proposta de Skinner, a instrução programada era apresentada na forma impressa e foi muito usada durante o final de 1950 e início dos anos 60. Entretanto, esta idéia nunca se tornou muito popular pelo fato de ser muito difícil a produção do material instrucional e os materiais existentes não possuem nenhuma padronização, dificultando a sua disseminação. Com o advento do computador, notou-se que os módulos do material instrucional poderiam ser apresentados pelo computador com grande flexibilidade. Assim, durante o início dos anos 60 diversos programas de instrução programada foram implementados no computador — nascia a instrução auxiliada por computador ou "computer-aided instruction", também conhecida como CAI. Na versão brasileira estes programas são conhecidos como PEC (Programas Educacionais por Computador). Durante os anos 60 houve um investimento muito grande por parte do governo americano na produção de CAI. Diversas empresas de computadores como IBM, RCA e Digital investiram na produção de CAI para serem comercializados. A idéia era revolucionar a educação. Entretanto, os computadores ainda eram muito caros para serem adquiridos pelas escolas. Somente as universidades poderiam elaborar e disseminar este recurso educacional. Assim, em 1963 a Universidade de Stanford na Califórnia, através do Institute for Mathematical Studies in the Social Sciences, desenvolveu diversos cursos como matemática e leitura para alunos do 1º grau (Suppes, 1972). Posteriormente, diversos cursos da Universidade de Stanford foram ministrados através do computador. O professor Patrick Suppes desta Universidade se apresentava como o professor que ministrava mais cursos e que tinha o maior número de estudantes do que qualquer outro professor universitário nos Estados Unidos da América. Todos os seus cursos eram do tipo CAI (Suppes, Smith e Bear, 1975). No início de 1970 a Control Data Corporation, uma fábrica de computadores, e a Universidade de Illinois desenvolveram o PLATO. Este sistema foi implementado em um computador de grande porte usando terminais sensitivos a toque e vídeo com alta capacidade gráfica. Na sua última versão, o PLATO IV dispunha de 950 terminais, localizados em 140 locais diferentes e com cerca de 8.000 horas de material instrucional, produzido por cerca de 3.000 autores (Alpert, 1975). É sem dúvida o CAI mais conhecido e o mais bem sucedido. A disseminação do CAI nas escolas somente aconteceu com os microcomputadores. Isto permitiu uma enorme produção de cursos e uma diversificação de tipos de CAI, como tutoriais, programas de demonstração, exercício-e-prática, avaliação do aprendizado, jogos educacionais e simulação. Além da diversidade de CAIs a idéia de ensino pelo computador permitiu a elaboração de outras abordagens, onde o computador é usado como ferramenta no auxílio de resolução de problemas, na produção de textos, manipulação de banco de dados e controle de processos em tempo real. De acordo com estudos feitos pelo "The Educational Products Information Exchange (EPIE) Institute" uma organização do "Teachers College", Columbia, E.U.A., foram identificados em 1983 mais de 7.000 pacotes de software educacionais no mercado, sendo que 125 eram adicionados a cada mês. Eles cobriam principalmente as áreas de matemática, ciências, leitura, artes e estudos sociais. Dos 7.325 programas educacionais mencionados no relatório da Office of Technology Assestment (OTA) 66% são do tipo exercício-eprática, 33% são tutoriais, 19% são jogos, 9% são simulações e 11% são do tipo ferramenta educacional (um programa pode usar mais do que uma abordagem educacional). É bom lembrar que essa produção maciça de software aconteceu durante somente três anos após a comercialização dos microcomputadores. Hoje é praticamente impossível identificar o número de software educacionais produzidos e comercializados. Entretanto, as novas modalidades de uso do computador na educação apontam para uma nova direção: o uso desta tecnologia não como "máquina de ensinar" mas, como uma nova mídia educacional: o computador passa a ser uma ferramenta educacional, uma ferramenta de complementação, de aperfeiçoamento e de possível mudança na qualidade do ensino. Isto tem acontecido pela própria mudança na nossa condição de vida e pelo fato de a natureza do conhecimento ter mudado. Hoje, nós vivemos num mundo dominado pela informação e por processos que ocorrem de maneira muito rápida e imperceptível. Os fatos e alguns processos específicos que a escola ensina rapidamente se tornam obsoletos e inúteis. Portanto, ao invés de memorizar informação, os estudantes devem ser ensinados a buscar e a usar a informação. Estas mudanças podem ser introduzidas com a presença do computador que deve propiciar as condições para os estudantes exercitarem a capacidade de procurar e selecionar informação, resolver problemas e aprender independentemente. A mudança da função do computador como meio educacional acontece juntamente com um questionamento da função da escola e do papel do professor. A verdadeira função do aparato educacional não deve ser a de ensinar mas sim a de criar condições de aprendizagem. Isto significa que o professor deve deixar de ser o repassador do conhecimento — o computador pode fazer isto e o faz muito mais eficientemente do que o professor — e passar a ser o criador de ambientes de aprendizagem e o facilitador do processo de desenvolvimento intelectual do aluno. As novas tendências de uso do computador na educação mostram que ele pode ser um importante aliado neste processo que estamos começando a entender. Entretanto, é importante lembrar que estas diferentes modalidades de uso do computador na educação vão continuar coexistindo. Não se trata de uma substituir a outra, como não aconteceu com a introdução de outras tantas tecnologias na nossa sociedade. O importante é compreender que cada uma destas modalidades apresenta características próprias, vantagens e desvantagens. Estas características devem ser explicitadas e discutidas de modo que as diferentes modalidades possam ser usadas nas situações de ensino-aprendizado que mais se adequar. Além disto, a diversidade de modalidades, propiciará um maior número de opções e estas opções certamente atenderão um maior número de usuários. Hoje, o que dispomos nas escolas é um determinado método sendo priorizado e generalizado para todos os aprendizes. Alguns alunos se adaptam muito bem ao método em uso e acabam vencendo. Outros, não sobrevivem ao massacre e acabam abandonando a escola. São estes que poderão beneficiar-se destas novas concepções de ensino e de aprendizagem. O computador como máquina de Ensinar Esta modalidade pode ser caracterizada como uma versão computadorizada dos métodos tradicionais de ensino. As categorias mais comuns desta modalidade são os tutoriais, exercício-e-prática ("drill-andpractice"), jogos e simulação. Programas tutoriais Os programas tutoriais constituem uma versão computacional da instrução programada. A vantagem dos tutoriais é o fato de o computador poder apresentar o material com outras características que não são permitidas no papel como: animação, som e a manutenção do controle da performance do aprendiz, facilitando o processo de administração das lições e possíveis programas de remediação. Além destas vantagens, os programas tutoriais são bastante usados pelo fato de permitirem a introdução do computador na escola sem provocar muita mudança — é a versão computadorizada do que já acontece na sala de aula. O professor necessita de pouquíssimo treino para o seu uso, o aluno já sabe qual é o seu papel como aprendiz, e os programas são conhecidos pela sua paciência infinita. Por outro lado, o desenvolvimento de um bom tutorial é extremamente caro e difícil. As indústrias de software educativo preferem gastar no aspecto de entretenimento — gráficos e som conquistadores — ao invés de gastar no aspecto pedagógico ou no teste e na qualidade do programa. A tendência dos bons programas tutoriais é utilizar técnicas de Inteligência Artificial para analisar padrões de erro, avaliar o estilo e a capacidade de aprendizagem do aluno e oferecer instrução especial sobre o conceito que o aluno está apresentando dificuldade. O exemplo de um programa com estas características é o SOPHIE (SOPHisticated Instructional Environment), programa para auxiliar a detecção de problemas num circuito elétrico. Ele identifica o estilo de resolução de problemas do usuário, identifica dificuldades conceituais que o usuário apresenta e, através de instrução detalhada, levando o aluno a assimilar estes conceitos (Wenger, 1987). Basicamente, existem dois tipos de problemas com os sistemas tutoriais inteligentes. Primeiro, a intervenção do sistema no processo de aprendizagem é muito superficial. Ainda é muito difícil implementar na máquina um "bom professor". Segundo, o tamanho dos programas e recursos computacionais que eles requerem é muito grande e os computadores pessoais não são ainda tão poderosos para permitirem que estes programas cheguem até às escolas. A falta de recursos computacionais e de equipes multidisciplinares que permitem a produção de bons tutoriais tem feito com que grande parte dos programas que se encontram no mercado sejam de má qualidade. O EPIE verificou que cerca de 80% dos 163 programas mais utilizados não passaram pela fase de teste em campo. A maioria dos programas disponíveis é desprovida de técnicas pedagógicas, não requer nenhuma ação por parte do aprendiz a não ser ler um texto e responder uma pergunta de múltipla escolha, perpetuando um método de ensino que já é péssimo só, que agora numa versão computacional. Programas de exercício-e-prática Tipicamente os programas de exercício-e-prática são utilizados para revisar material visto em classe principalmente, material que envolve memorização e repetição, como aritmética e vocabulário. Segundo um estudo feito pelo EPIE cerca de 49% do software educativo no mercado americano são do tipo exercício-e-prática. Estes programas requerem a resposta freqüente do aluno, propiciam feedback imediato, exploram as características gráficas e sonoras do computador e, geralmente, são apresentados na forma de jogos. Por exemplo, "Alien Intruder" é um programa para a criança das primeiras séries do 1º grau que exige a resolução de problemas de aritmética o mais rápido possível para eliminar um "alien" que compete com o usuário. As estatísticas de uso dos programas de exercício-e-prática nas escolas dos Estados Unidos da América indicam que cerca de 40% do tempo que a criança, das primeiras séries do 1º grau, passa no computador é consumido em programas do tipo exercício-e-prática. A vantagem deste tipo de programa é o fato do professor dispor de uma infinidade de exercícios que o aprendiz pode resolver de acordo com o seu grau de conhecimento e interesse. Se o software, além de apresentar o exercício, coletar as respostas de modo a verificar a performance do aprendiz, então o professor terá à sua disposição um dado importante sobre como o material visto em classe está sendo absorvido. Entretanto, para alguns professores, este dado não é suficiente. Mesmo por que é muito difícil para o software detectar o por que o aluno acertou ou errou. A avaliação de como o assunto está sendo assimilado exige um conhecimento muito mais amplo do que o número de acertos e erros dos aprendizes. Portanto, a idéia de que os programas de exercício-e-prática aliviam a tediosa tarefa dos professores corrigirem os testes ou as avaliações não é totalmente verdadeira. Eles eliminam a parte mecânica da avaliação. Entretanto, ter uma visão clara do que está acontecendo com o processo de assimilação dos assuntos vistos em classe, exige uma visão mais profunda da performance dos alunos. Jogos educacionais A pedagogia por trás desta abordagem é a de exploração auto-dirigida ao invés da instrução explícita e direta. Os proponentes desta filosofia de ensino defendem a idéia de que a criança aprende melhor quando ela é livre para descobrir relações por ela mesma, ao invés de ser explicitamente ensinada. Exemplos de software nesta modalidade são os jogos e a simulação. De acordo com o estudo da The Johns Hopkins University (1985) 24% do tempo que as crianças das primeiras séries do 1º grau passam no computador é gasto com jogos. Os jogos, do ponto de vista da criança, constituem a maneira mais divertida de aprender. Talvez, o melhor exemplo de um jogo educacional no mercado seja o "Rocky's Boots" — uma coleção de 39 jogos desenvolvida para ensinar às crianças (a partir de 9 anos de idade) conceitos de lógica e de circuito de computadores. Usando componentes eletrônicos a criança monta o seu próprio circuito. O fato dele estar certo ou errado é evidenciado pela maneira como o circuito funciona e se ele auxilia a criança a atingir determinados objetivos estabelecidos pelos jogos. Assim, como o "Rocky's Boots", existem uma grande variedade de jogos educacionais para ensinar conceitos que podem ser difíceis de serem assimilados pelo fato de não existirem aplicações práticas mais imediatas, como o conceito de trigonometria, de probabilidade, etc.. Entretanto, o grande problema com os jogos é que a competição pode desviar a atenção da criança do conceito envolvido no jogo. Além disto, a maioria dos jogos, explora conceitos extremamente triviais e não tem a capacidade de diagnóstico das falhas do jogador. A maneira de contornar estes problemas é fazendo com que o aprendiz, após uma jogada que não deu certo, reflita sobre a causa do erro e tome consciência do erro conceitual envolvido na jogada errada. É desejável e, até possível, que alguém use os jogos dessa maneira. Na prática, o objetivo passa a ser unicamente vencer no jogo e o lado pedagógico fica em segundo plano. Simulação Simulação envolve a criação de modelos dinâmicos e simplificados do mundo real. Estes modelos permitem a exploração de situações fictícias, de situações com risco, como manipulação de substância química ou objetos perigosos; de experimentos que são muito complicados, caros ou que levam muito tempo para se processarem, como crescimento de plantas; e de situações impossíveis de serem obtidas, como um desastre ecológico. Por exemplo, "Odell Lake" é um programa que permite à criança aprender ecologia dos lagos americanos. O aprendiz é colocado no papel de uma truta que procura alimento evitando predadores e outras fontes de perigo. A simulação oferece a possibilidade do aluno desenvolver hipóteses, testá-las, analisar resultados e refinar os conceitos. Esta modalidade de uso do computador na educação é muito útil para trabalho em grupo, principalmente os programas que envolvem decisões. Os diferentes grupos podem testar diferentes hipóteses, e assim, ter um contato mais "real" com os conceitos envolvidos no problema em estudo. Portanto, os potenciais educacionais desta modalidade de uso do computador são muito mais ambiciosos do que os dos programas tutoriais. Nos casos onde o programa permite um maior grau de intervenção do aluno no processo sendo simulado (por exemplo, definindo as leis de movimento dos objetos da simulação) o computador passa a ser usado mais como ferramenta do que como máquina de ensinar. Por outro lado, as boas simulações são bastante complicadas de serem desenvolvidas, requerem grande poder computacional, recursos gráficos e sonoros, de modo a tornar a situação problema o mais perto do real possível. Geralmente, estas características não são exploradas. O que se encontra no mercado em geral é extremamente trivial ou muito simples. Outra dificuldade com a simulação é o seu uso. Por si só ela não cria a melhor situação de aprendizado. A simulação deve ser vista como um complemento de apresentações formais, leituras e discussões em sala de aula. Se estas complementações não forem realizadas não existe garantia de que o aprendizado ocorra e de que o conhecimento possa ser aplicado à vida real. Além disto, pode levar o aprendiz a formar uma visão distorcida a respeito do mundo; por exemplo, ser levado a pensar que o mundo real pode ser simplificado e controlado da mesma maneira que nos programas de simulação. Portanto, é necessário criar condições para o aprendiz fazer a transição entre a simulação e o fenômeno no mundo real. Esta transição não ocorre automaticamente e, portanto, deve ser trabalhada. É importante notar que a descrição dos programas que ensinam apresentada aqui, é bastante didática. Na verdade é impossível encontrar um programa puramente tutorial ou de exercício-e-prática. Além disso, com o desenvolvimento dos recursos computacionais, é possível integrar texto, imagens de vídeo, som, animação e mesmo interligação da informação numa seqüência não linear, implementando, assim, o conceito de multimídia ou de hipermídia. Os programas com essas características são extremamente bonitos, agradáveis e muito criativos. Porém, mesmo nesses casos, a abordagem pedagógica usada é o computador ensinando um determinado assunto ao aprendiz. Mesmo com todos esses recursos ainda é o computador que detém o controle do processo de ensino. Entretanto, o computador pode ser um recurso educacional muito mais efetivo do que a "máquina de ensinar". Ele pode ser uma ferramenta para promover aprendizagem. O computador como ferramenta O computador pode ser usado também como ferramenta educacional. Segundo esta modalidade o computador não é mais o instrumento que ensina o aprendiz, mas a ferramenta com a qual o aluno desenvolve algo, e, portanto, o aprendizado ocorre pelo fato de estar executando uma tarefa por intermédio do computador. Estas tarefas podem ser a elaboração de textos, usando os processadores de texto; pesquisa de banco de dados já existentes ou criação de um novo banco de dados; resolução de problemas de diversos domínios do conhecimento e representação desta resolução segundo uma linguagem de programação; controle de processos em tempo real, como objetos que se movem no espaço ou experimentos de um laboratório de física ou química; produção de música; comunicação e uso de rede de computadores; e controle administrativo da classe e dos alunos. Em seguida serão apresentados somente alguns exemplos destes diferentes usos. Aplicativos para o uso do aluno e do professor Programas de processamento de texto, planilhas, manipulação de banco de dados, construção e transformação de gráficos, sistemas de autoria, calculadores numéricos, são aplicativos extremamente úteis tanto ao aluno quanto ao professor. Talvez estas ferramentas constituam uma das maiores fontes de mudança do ensino e do processo de manipular informação. As modalidades de software educativos descritas acima podem ser caracterizadas como uma tentativa de computadorizar o ensino tradicional. Mais ou menos o que aconteceu nos primórdios do cinema quando cinema = teatro + câmera. Hoje o cinema tem sua técnica própria. Este mesmo fenômeno está acontecendo com o uso dos computadores na educação. Com a criação destes programas de manipulação da informação estamos vendo nascer uma nova indústria de software educativo que pode causar um grande impacto na maneira como ensinamos e como nos relacionamos com os fatos e com o conhecimento. Exemplo de ferramentas desenvolvidas especialmente com objetivos educacionais são os programas do "Bank Street", sendo o seu processador de texto o mais conhecido; a combinação de Logo e processamento de texto que a "Logo Computer System" colocou no mercado; e alguns "sistemas especialistas" que auxiliam o processo de tomada de decisão, desenvolvidos para computadores de grande porte mas que podem ser adaptados para alguns microcomputadores, como da linha PC. Resolução de problemas através do computador O objetivo desta modalidade de uso do computador é propiciar um ambiente de aprendizado baseado na resolução de problemas. O aprendizado baseado na resolução de problemas ou na elaboração de projetos não é nova e já tem sido amplamente explorada através dos meios tradicionais de ensino. O computador adiciona uma nova dimensão — o fato do aprendiz ter que expressar a resolução do problema segundo uma linguagem de programação. Isto possibilita uma série de vantagens. Primeiro, as linguagens de computação são precisas e não ambíguas. Neste sentido, podem ser vistas como uma linguagem matemática. Portanto, quando o aluno representa a resolução do problema segundo um programa de computador ele tem uma descrição formal, precisa, desta resolução. Segundo, este programa pode ser verificado através da sua execução. Com isto o aluno pode verificar suas idéias e conceitos. Se existe algo errado o aluno pode analisar o programa e identificar a origem do erro. Tanto a representação da solução do problema como a sua depuração são muito difíceis de serem conseguidas através dos meios tradicionais de ensino. As linguagens para representação da solução do problema podem, em princípio, ser qualquer linguagem de computação, como o BASIC, o Pascal, ou o Logo. No entanto, deve ser notado que o objetivo não é ensinar programação de computadores e sim como representar a solução de um problema segundo uma linguagem computacional. O produto final pode ser o mesmo — obtenção de um programa de computador — os meios são diferentes. Assim, como meio de representação, o processo de aquisição da linguagem de computação deve ser a mais transparente e a menos problemática possível. Ela é um veículo para expressão de uma idéia e não o objeto de estudo. Com essas preocupações em mente é que algumas linguagens de programação foram desenvolvidas, sendo que o Logo é a mais conhecida delas. O Logo, tanto a linguagem como a metodologia Logo de ensino-aprendizado, tem sido amplamente usado com alunos do 1º, 2º, 3º graus e educação especial. O papel de destaque que o Logo ocupa na educação no Brasil faz com que a próxima seção seja dedicado totalmente à linguagem Logo e a metodologia de uso do Logo. Por hora é importante mencionar que o Logo geralmente é apresentado através da Tartaruga (mecânica ou de tela) que se move no espaço ou na tela como resposta aos comandos que a criança fornece através do computador. Neste ambiente de aprendizagem o aprendiz pode explorar conceitos de diferentes domínios, como matemática, física, etc., resolução de problemas, planejamento e programação. A dificuldade com a utilização de Logo na escola é a preparação do professor, capacidade do computador para processar Logo e o fato de Logo não poder ser utilizado em todas as áreas do conhecimento. Entretanto, a representação da solução de um problema não precisa ser necessariamente feita por uma linguagem de programação. Hoje existem programas onde a linguagem para representação da solução é bastante específica e voltada para o tipo de problema sendo abordado. É o caso do "Geometric Supposer". Através desse software o usuário pode construir e medir figuras geométricas usando para isso termos como "unir os pontos" de uma figura, "calcular" o ângulo entre duas semi-retas previamente definidas, etc.. O resultado é bastante semelhante ao que o aluno faz com o Logo gráfico, porém no caso do "Supposer" o domínio e a linguagem de comunicação com o programa é mais específica. Produção de música A representação de resoluções de problemas no computador pode ser utilizada em diferentes domínios do conhecimento, inclusive na música. Segundo esta abordagem, o aprendizado de conceitos musicais devem ser adquiridos através do "fazer música", ao invés do aprendizado tradicional onde os conceitos musicais são adquiridos através da performance de uma peça musical ou são vistos como pré-requisitos para a performance da peça musical. Neste contexto temos dois agravantes: primeiro, o aprendiz deve adquirir habilidades para manusear um instrumento musical; segundo, deve adquirir os conceitos e a capacidade para a leitura de uma partitura a fim de executar a peça musical. A implicação desta abordagem é que a técnica de manipulação do instrumento passa a ser mais importante do que a produção ou composição musicais. Isto pode ser revertido utilizando o computador. Aprender música através do "fazer música" e usar o computador como uma ferramenta que serve tanto para auxiliar o processo de composição musical quanto para viabilizar a peça musical através de sons. Neste caso, o computador elimina a dificuldade de aquisição de técnicas de manipulação de instrumento musicais e ajuda o aprendiz a focar a atenção no processo de composição musical e na aquisição dos conceitos necessários para atingir este objetivo. Programas de controle de processo Os programas de controle de processo oferecem uma ótima oportunidade para a criança entender processos e como controlá-los. Um dos melhores exemplos de programas nesta área é o "TERC Labnet"", desenvolvido pela "Technical Education Research Centers". Trata-se de uma coleção de programas que permitem a coleta de dados de experimentos, a análise destes dados, e a representação do fenômeno em diferentes modalidades, como gráfico e sonoro. A vantagem deste tipo de software é eliminar certos aspectos tediosos de descrição de fenômenos. Geralmente, nas situações de laboratório, o aluno deve coletar uma infinidade de dados que devem ser usados para elaborar um gráfico, por exemplo. Acontece que nessas situações é muito comum observar que a elaboração do gráfico passa a ser mais importante do que o uso do gráfico para compreender o fenômeno. O fato de termos o computador monitorando o fenômeno, um dos subprodutos pode ser a coleta de dados por parte do computador e a representação destes dados em forma gráfica, isto acontecendo a medida que o fenômeno está se realizando. Neste caso, o gráfico é mais um recurso que o aluno dispõe para entender o que está acontecendo, do que uma representação dos fatos do fenômeno. Outro exemplo de uso do computador no controle de processo é o projeto LEGO-Logo desenvolvido pelo "Media Laboratory do MIT" e que está sendo implantado no NIEDUNICAMP. Utilizando o brinquedo LEGO o aprendiz monta diversos objetos que são controlados através de um programa escrito em Logo. Este tipo de atividade envolve, primeiro, a capacidade de entender cada componente LEGO e como ele pode ser utilizado como elemento mecânico ou eletrônico de um dispositivo. Segundo, há a necessidade de aprender conceitos específicos sobre o dispositivo sendo construído. Por exemplo, se o aprendiz está construindo um veículo, ele tem a oportunidade de manusear dispositivos que alteram a direção do veículo, engrenagens, eixos e opera com conceitos de velocidade, atrito e deslocamento. Terceiro, exercitar conceitos de controle de processos, uma vez que este veículo deve ser controlado pelo computador e, assim, pode ser inserido num contexto onde existe um semáforo, ou outros veículos, etc.. Em síntese, o ambiente LEGOLogo fornece ao aprendiz a chance de vivenciar os problemas complexos de um engenheiro com as vantagens de poder manipular objetos concretos ao invés de equações no papel, e de poder depurar suas idéias sem que isto tenha implicações catastróficas do ponto de vista de segurança, de economia - se o veículo não anda é só alterar alguns componentes ou alterar o programa sem ter que modificar a linha de montagem da fábrica. Os alunos que têm vocação para o "aprendizado através do fazer" são os que mais se beneficiam deste tipo de modalidade de uso do computador na educação. O computador como controlador de processos adiciona outras peculiaridades à atividade que o aluno desenvolve, permitindo que sejam explorados aspectos pedagógicos que são impossíveis de serem trabalhados com o material tradicional, como facilidade de depuração de processos; ou que não são explorados pelo simples fato de o aluno estar envolvido com o produto (como o gráfico) e não com o processo de como os fenômenos acontecem. O computador obriga a explicitação do processo. Computador como comunicador Uma outra função do computador como ferramenta é a de transmitir a informação e, portanto, servir como um comunicador. Assim, os computadores podem ser interligados entre si formando uma rede de computadores. Isto pode ser conseguido através de uma fiação ligando fisicamente os computadores ou via uma interface (modem) que permite a ligação do computador ao telefone possibilitando a utilização da rede telefônica para interligar os computadores. Uma vez os computadores interligados é possível enviar mensagens de um para outro através de software que controla a passagem da informação entre os computadores. Este tipo de arranjo cria um verdadeiro correio eletrônico mais conhecido como "electronic mail" ou "email". Um outro uso das redes de computadores é a consulta a banco de dados, ou mesmo a construção compartilhada de um banco de dados. Um número de pessoas que compartilha de um mesmo interesse pode trocar informações sobre um determinado assunto, criando uma base de dados. As possibilidades da comunicação via rede de computadores está sendo explorada por diversos grupos, como a "National Geographic" que está desenvolvendo programas educacionais envolvendo alunos de todas as partes do mundo. Esses alunos coletam e disseminam, via rede, dados sobre a água, o tipo de chuva, a fauna, a flora da região em que vivem. Esses dados são acumulados, analisados por especialistas no assunto e novamente compartilhados por todos os alunos envolvidos no estudo. A visão planetária e a sensibilização para os aspectos ecológicos está sendo conseguida pelo fato de o aluno estar participando do processo de fazer ciência e trabalhando com especialistas da área. Um outro uso do computador como comunicador é o de complementar certas funções do nosso sentido facilitando o processo de acesso ou de fornecimento da informação. Isto é especialmente interessante quando o computador é usado por indivíduos deficientes. Por exemplo, os portadores de deficiência física que não dispõem de coordenação motora suficiente para comandar o teclado do computador podem usá-lo, através de dispositivos especialmente projetados, para captar os movimentos que ainda podem ser reproduzidos, como movimento da cabeça, dos lábios, da pálpebra dos olhos, e com isto permitir que estas pessoas transmitam um sinal para o computador. Este sinal pode ser interpretado por um programa e assumir um significado, uma informação, que levará o computador a executar algo, como usar um processador de texto, um controlador de objetos etc., até mesmo para "falar". Os dispositivos para receber ou emitir um sinal para o computador podem ser os mais variados: desde um simples interruptor até um leitor óptico ou de relevo; ou ainda um sintetizador de voz. A combinação destes dispositivos tem permitido que a escrita convencional seja convertida em Braille ou em algo falado, ou que uma mensagem falada seja impressa em Braille. As possibilidades são inúmeras e o limite está praticamente na nossa capacidade de imaginação e criatividade. Com o avanço da tecnologia de computadores é difícil de imaginar alguém que ainda se mantenha incomunicável ou que não se beneficie dos processos educacionais por falta de capacidade de comunicação. As possibilidades de uso do computador como ferramenta educacional está crescendo e os limites dessa expansão são desconhecidos. Cada dia surgem novos maneiras de usar o computador como um recurso para enriquecer e favorecer o processo de aprendizagem. Isso nos mostra que é possível alterar o paradigma educacional; hoje, centrado no ensino, para algo que seja centrado na aprendizagem. Esse tem sido o enfoque da metodologia Logo. A metodologia Logo de Ensino-Aprendizagem Logo é uma linguagem de programação que foi desenvolvida no Massachusetts Institute of Technology (MIT), Boston E.U.A., pelo Professor Seymour Papert (Papert, 1980). Como linguagem de programação o Logo serve para nos comunicarmos com o computador. Entretanto, ela apresenta características especialmente elaboradas para implementar uma metodologia de ensino baseada no computador (metodologia Logo) e para explorar aspectos do processo de aprendizagem. Assim, o Logo tem duas raízes: uma computacional e a outra pedagógica. Do ponto de vista computacional, as características do Logo que contribuem para que ele seja uma linguagem de programação de fácil assimilação são: exploração de atividades espaciais, fácil terminologia e capacidade de criar novos termos ou procedimentos. O aspecto computacional do Logo A exploração de atividades espaciais tem sido a porta de entrada do Logo. Estas atividades permitem o contato quase que imediato do aprendiz com o computador. Estas atividades espaciais facilitam muito a compreensão da filosofia pedagógica do Logo por parte dos especialistas em computação. Por outro lado, elas fazem com que os aspectos computacionais da linguagem de programação Logo seja acessíveis aos especialistas em educação. Assim, o aspecto espacial será usado neste artigo com a finalidade de apresentarmos a filosofia Logo. Entretanto, é importante lembrar que o Logo, como linguagem de programação, tem outras características mais avançadas, como já foi mencionado. Os conceitos espaciais são utilizados em atividades para comandar uma Tartaruga que se move no chão (tartaruga de solo) ou na tela do computador em atividades gráficas. Isto se deve ao fato dessas atividades envolverem conceitos espaciais que são adquiridos nos primórdios da nossa infância, quando começamos a engatinhar. Entretanto, estes conceitos permanecem a nível intuitivo. No processo de comandar a Tartaruga para ir de um ponto a outro, estes conceitos devem ser explicitados. Isto fornece as condições para o desenvolvimento de conceitos espaciais, numéricos, geométricos, uma vez que a criança pode exercitá-los, depurá-los, e utilizá-los em diferentes situações. Os termos da linguagem Logo, ou seja, os comandos do Logo, que a criança usa para comandar a Tartaruga (tanto a de solo como a de tela) são termos que a criança usa no seu dia-a-dia. Por exemplo, para comandar a Tartaruga para se deslocar para frente o comando é parafrente. Assim, parafrente 50 desloca a Tartaruga para frente 50 passos do ponto em que ela estava inicialmente, como mostra a figura 1. Se após esse deslocamento comandarmos a Tartaruga para girar para a direita 90 graus o comando é paradireita 90, produzindo o efeito mostrada na figura 2. Os comandos que movimentam a Tartaruga podem ser utilizados numa série de atividades que a criança pode realizar. Por exemplo, explorar o tamanho da tela ou realizar uma atividade simples, como o desenho de figuras geométricas. Uma outra característica importante da linguagem Logo é o fato dela ser uma linguagem procedural. Isto significa que é extremamente fácil criar novos termos ou procedimentos em Logo. Assim, para programarmos o computador para fazer um triângulo, a metáfora que usamos com as crianças é a de "ensinar a Tartaruga" a fazer um triângulo. Para tanto, usamos o comando aprenda e fornecemos um nome ao conjunto de comandos que produz o triângulo. Este nome pode ser qualquer nome, por exemplo, triângulo, tri, maria, etc.. Assim, aprenda tri parafrente 50 paradireita 120 paradireita 120 parafrente 50 fim define o que é um tri. Uma vez que esta definição terminada, o computador nos indica que "aprendeu" tri. Agora, se digitarmos tri, o computador produz o triângulo. E assim, podemos usar o comando tri como um outro comando do Logo. Aprenda flor repita 3 [ tri ] fim: Produz um catavento ou uma flor. A medida que a criança explora os comandos do Logo ela começa a ter idéias de projetos para serem desenvolvidos na tela. Ela pode propor fazer o desenho de uma casa, de um vaso, etc.. Neste instante a metodologia Logo de ensino-aprendizagem começa a se materializar. Além dos comandos de manipulação da Tartaruga, a linguagem Logo dispõe também de comandos que permitem a manipulação de palavras e listas (um conjunto de palavras). Com estes comandos é possível "ensinar" a Tartaruga a produzir uma frase da Língua Portuguesa, usar os conceitos de concordância verbal, criar poemas e, mesmo, integrar a parte gráfica com a manipulação de palavras para produzir estórias onde os personagens são animados, um verdadeiro teatro, com as narrativas, cenários, etc. ou, ainda, explorar conceitos de Ciências, Física, Química e Biologia (Valente e Valente, 1988). Os domínios de aplicação do Logo estão em permanente desenvolvimento, como o objetivo de atrair um maior número de usuários e motivar os alunos a usarem o computador para elaborarem as mais diferentes atividades. Entretanto, o objetivo não deve ser centrado no produto que o aluno desenvolve, mas na filosofia de uso do computador e como ele está facilitando a assimilação de conceitos que permeiam as diversas atividades. Portanto, é o processo de ensino-aprendizagem que é o cerne do Logo e é este que deve ser discutido e explicitado. O aspecto pedagógico do Logo O aspecto pedagógico do Logo está fundamentado no construtivismo piagetiano. Piaget mostrou que, desde os primeiros anos de vida, a criança já tem mecanismos de aprendizagem que ela desenvolve sem ter freqüentado a escola. A criança aprende diversos conceitos matemáticos por exemplo: a idéia de que em um copo alto e estreito pode ser colocado a mesma quantidade de líquido que existe em um copo mais gordo e mais baixo. Essa idéia ela aprende utilizando copos de diferentes tamanhos. E com isso ela desenvolve o conceito de volume sem ser explicitamente ensinada. Assim, Piaget conclui que a criança desenvolve a sua capacidade intelectual interagindo com objetos do ambiente onde ela vive e utilizando o seu mecanismo de aprendizagem. Isto acontece sem que a criança seja explicitamente ensinada. É claro que outros conceitos também podem ser adquiridos através do mesmo processo. É justamente este aspecto do processo de aprendizagem que o Logo pretende resgatar: um ambiente de aprendizado onde o conhecimento não é passado para a criança, mas onde a criança interagindo com os objetos desse ambiente, possa desenvolver outros conceitos, por exemplo, conceitos geométricos. Assim, do ponto de vista pedagógico existem diversos aspectos na metodologia Logo que devem ser enfatizados. Primeiro, o controle do processo de aprendizagem, está nas mãos do aprendiz e não nas mãos do professor. Isto por que a criança tem a chance de explorar o objeto "computador" da sua maneira e não de uma maneira já pré-estabelecida pelo professor. É a criança que propõe os problemas ou projetos a serem desenvolvidos através do Logo. Estes, são projetos que a criança está interessada em resolver. É claro que o professor tem um papel importante a desempenhar. Por exemplo, propor mudanças no projeto para ajustá-lo ao nível da criança, fornecer novas informações, explorar e elaborar os conteúdos embutidos nas atividades, etc.. E tudo isso sem destruir o interesse e a motivação do aprendiz. Segundo, propicia à criança a chance de aprender fazendo, ou seja, "ensinando a Tartaruga" a resolver um problema. O fato de o aprendiz ter que expressar a resolução do problema segundo a linguagem de programação, faz com que o programa seja uma descrição formal e precisa desta resolução; esse programa pode ser verificado através da sua execução; o resultado da execução permite ao aluno comparar as suas idéias originais com o produto do programa e assim, ele pode analisar suas idéias e os conceitos aplicados; finalmente, se existe algo errado, o aluno pode depurar o programa e identificar a origem do erro. A situação de erro mais interessante do ponto de vista do aprendizado é o erro conceitual. O programa que a criança define pode ser visto como uma descrição do seu processo de pensamento. Isto significa que existe uma proposta de solução do problema a nível de idéia e uma descrição desta idéia a nível de programa. Isto permite a comparação da intenção com a atual implementação da resolução do problema no computador. Se o programa não produz o esperado, significa que ele está conceitualmente errado. A análise do erro e sua correção constitui uma grande oportunidade para a criança entender o conceito envolvido na resolução do problema em questão. Portanto, no Logo, o erro deixa de ser uma arma de punição e passa a ser uma situação que nos leva a entender melhor nossas ações e conceitualizações. É assim que a criança aprende uma série de conceitos antes de entrar na escola. Ela é livre para explorar e os erros são usados para depurar os conceitos e não para se tornarem a arma do professor. A atividade Logo, portanto, torna explícito o processo de aprender de modo que é possível refletir sobre o mesmo a fim de compreendê-lo e depurá-lo. Tanto a representação da solução do problema quanto a sua depuração são muito difíceis de serem conseguidas através dos meios tradicionais de ensino e, portanto, estão omitidos do processo de ensino. Assim, o uso do Logo pode resgatar a aprendizagem construtivista e tentar provocar uma mudança profunda na abordagem do trabalho nas escolas. Uma mudança que coloca a ênfase na aprendizagem ao invés de colocar no ensino; na construção do conhecimento e não na instrução, como será mostrado no próximo capítulo. A metodologia Logo de ensino-aprendizagem tem sido utilizada numa ampla gama de atividades em diferentes áreas do conhecimento e com diferentes populações de crianças. Assim, temos utilizado Logo com crianças que não conhecem letras, palavras, ou números, e portanto, a atividade Logo passa a fazer parte do processo de alfabetização. Temos mostrado que é possível utilizar Logo para implementar jogos e desenvolver atividades na área de Matemática, Física, Biologia e Português do 1º e 2º graus (Valente e Valente, 1988). Essa metodologia tem sido usada na educação especial, com crianças deficientes físicas, crianças deficientes auditivas, crianças deficientes visuais e crianças deficientes mentais (Valente, 1991). Os computadores estão propiciando uma verdadeira revolução no processo de ensino-aprendizagem. Uma razão mais óbvia advém dos diferentes tipos de abordagens de ensino que podem ser realizados através do computador, devido aos inúmeros programas desenvolvidos para auxiliar o processo de ensino-aprendizagem. Entretanto, a maior contribuição do computador como meio educacional advém do fato do seu uso ter provocado o questionamento dos métodos e processos de ensino utilizados. Quando o computador, através de um tutorial, possibilita a passagem de informação nos mesmos moldes que um professor realiza em sala de aula, este professor pode se tornar totalmente substituível. Claro que isto não aconteceu. Primeiro, por que o questionamento do papel do professor possibilitou entender que ele pode exercer outras funções além de repassador do conhecimento, como facilitador do aprendizado, algo que os computadores ainda não podem fazer. Segundo, o repasse do conhecimento, como acontece hoje na sala de aula, não acontece de maneira semelhante e constante para todos os alunos. Esta flexibilidade ainda não é norma dos sistemas de ensino baseados no computador. Por mais sofisticado que ele seja, — por mais conhecimento sobre um determinado domínio que ele possua, por melhor que ele seja capaz de modelar a capacidade do aprendiz — o computador ainda não é capaz de adequar a sua atuação de maneira que a intervenção no processo de ensino-aprendizagem seja totalmente individualizada. Terceiro, os recursos audio-visuais e a perfeição metodológica com que o conhecimento pode ser repassado pelo computador, não garantem que esta metodologia de ensino seja a maneira mais eficiente para promover aprendizagem. Alguns aprendizes se adaptam a estas abordagens, enquanto outros preferem o aprendizado através da descoberta e do "fazer". Portanto, é necessário levar em conta o estilo de aprendizado de cada aprendiz e não simplesmente generalizar o método de ensino usado. Estes argumentos têm sido usados para fortalecer o uso do computador como ferramenta ao invés de "máquina de ensinar". Como ferramenta ele pode ser adaptado aos diferentes estilos de aprendizado, aos diferentes níveis de capacidade e interesse intelectual, às diferentes situações de ensino-aprendizagem, inclusive dando margem à criação de novas abordagens. Entretanto, o uso do computador como ferramenta é a que provoca maiores e mais profundas mudanças no processo de ensino vigente, como a flexibilidade dos pré-requisitos e do currículo, a transferência do controle do processo de ensino do professor para o aprendiz e a relevância dos estilos de aprendizado ao invés da generalização dos métodos de ensino. Estas questões só podem ser contornadas a medida que o uso do computador se dissemine e coloque em xeque os atuais processos de ensino. Talvez esta esteja sendo a maior contribuição do computador na educação. Um outro argumento a favor das ferramentas é o custo de produção de programas do tipo CAI. Estes programas, em geral, são bastante complicados para serem desenvolvidos. Requerem uma equipe muito boa de pedagogos, de bons programadores e pessoas de arte capazes de dar um acabamento estético necessário ao software. Esta equipe, muitas vezes, deve trabalhar meses e até anos para desenvolver um bom software. Isto tudo, para cobrir um tópico muito específico do currículo. Portanto, um software que leva meses ou anos para ser produzido, é consumido em minutos ou horas de uso. A viabilização de um projeto de desenvolvimento de software educacional somente faz sentido se houver um mercado muito grande. Por exemplo, nos Estados Unidos da América, o consumo destes programas é muito grande. Daí a produção e a enorme diversidade destes programas, que são produzidos pelas principais editoras de livro texto. Estas editoras perceberam que ao invés do livro didático convencional, o livro texto do futuro pode ser um disquete onde estão armazenados os programas que ensinam. Claro que interessa a eles que as coisas na educação não mudem muito. Passar do livro texto para o disquete não implica em mudança nenhuma — não muda a escola, não muda a mentalidade de quem produz o material didático para a escola, e não muda a mentalidade de quem os usa: professor e aluno. Se a indústria de produção destes programas conseguir criar demanda e manter a diversidade de programas, ela continuará existindo como sub-existiu produzindo livros. Entretanto, numa sociedade mais pobre, onde não existe nem a produção de livro texto, a produção de software educacional é ainda mais cara. Os profissionais da área são em número menor, dificultando e encarecendo a manutenção da equipe. O software produzido é compartilhado por um pequeno número de usuários. As escolas particulares que enveredaram pela utilização e produção de software montaram uma verdadeira "software house", sendo que o produto serve somente àquela escola e não é comercializado no mercado. Portanto, o custo desta solução é muito alto. Já, uma solução mais barata, como a cópia e adaptação de programas já existentes, nem sempre é a mais interessante pelo fato de os programas educacionais serem muito específicos a uma cultura ou a um sistema educacional para o qual ele foi desenvolvido. Estas dificuldades de ordem econômica das sociedades de menor consumo tem contribuído para que a introdução de computadores na educação seja feita através do uso de ferramentas. A ferramenta é comprada uma única vez. Seu uso é mais extenso e atende a uma ampla gama de domínios do conhecimento, de disciplinas, de diversidade de interesse e de capacidade dos alunos. Assim, a implantação do computador via ferramenta é mais viável e é o que está acontecendo nos países com menos recursos financeiros. Por exemplo, é mais comum encontrarmos uma escola usando o Logo no Brasil, do que o CAI. Na Costa Rica, a solução adotada para implantar o computador na educação a nível nacional, foi através de ferramenta do tipo aplicativos e Logo. Portanto, a existência de diferentes modalidade de uso do computador na educação tem o objetivo de atender diferentes interesses educacionais e econômicos. A coexistência destas modalidades é salutar e a decisão por uma outra modalidade deve levar em consideração a diversidade de variáveis que atuam no processo de ensino-aprendizagem. Se isto for feito, o computador poderá ser um importante aliado desse processo. Caso contrário, não devemos esperar muito dessa tecnologia, pois ela ainda não é capaz de fazer milagres. Referências Bibliográficas Alpert, D. (1975) The PLATO IV System in Use: a Progress Report. Em O. Lecarme e R. Lewis (editores) Computers in Education, North-Holland, Amsterdam. Center for Research on Elementary and Middle Schools, (1985), The Johns Hopkins University, Baltimore, Maryland. Educational Products Information Exchange (EPIE) Institute, Teachers College, Columbia University, New York, New York. Knezek, G.A., Rachlin, S.L. e Scannell, P. (1988) A Taxonomy for Educational Computing. Educational Technology, March, 28 (4). Office of Technology Assessment (OTA), (1988) Power On! New Tools for Teaching and Learning, Congress of the United States, Washington, Distric of Columbia (DC). Papert, S. (1980) Mindstorms: Children, Computers and Powerful Ideas. Basic Books, New York. Traduzido para o Português em 1985, como Logo: Computadores e Educação, Editora Brasiliense, São Paulo. Suppes, P. (1972) Computer-Assisted Instruction at Stanford. Em Man and Computer, Proceedings of International Conference, Bordeaux 1970. pp. 298-330. Karger, Basel. Suppes, P., R. Smith, e M. Bear (1975) University-Level Computer-Assisted Instruction at Stanford: 1975. Technical Report nº 265, Institute for Mathematical Studies in Social Sciences, Stanford University, California. Taylor, R.P. ed. (1980) The Computer in the School: Tutor, Tool, Tutee. Teachers College Press, New York. Valente, J.A. org. (1991) Liberando a Mente: Computadores na Educação Especial. Gráfica da UNICAMP, Campinas, São Paulo. Valente, J.A e Valente, A.B. (1988) Logo: Conceitos, Aplicações e Projetos. Editora McGraw-Hill, São Paulo. Wenger, E. (1987) Artificial Intelligence and Tutoring System: Computational and Cognitive Approaches to the Communication of Knowledge. Morgan Kaufmann Publishers, California. EDUCAÇÃO E INFORMÁTICA: A RELAÇÃO HOMEM - MÁQUINA E A QUESTÃO DA COGNIÇÃO Jorge R. M. Fróes 1 – Introdução A discussão sobre o uso de computadores nas escolas tem-se estendido a diversos temas, associados a questões pedagógicas. Este breve trabalho pretende abordar uma outra face dessas questões, desenvolvendo reflexões a partir da seguinte pergunta: - como se processa a influência do uso de recursos informatizados na forma pela qual as pessoas aprendem, ou seja, na questão cognitiva? Ou, de outra forma: se a capacidade humana cria e modifica a tecnologia, criando e inventando novos instrumentos, qual o efeito inverso, isto é, como age a tecnologia sobre a cognição? A importância do tema está diretamente ligada ao entendimento atual das questões educacionais em geral, e particularmente no que se refere ao processo de aprendizagem quanto ao uso dos recursos informatizados na educação. Abordarei então a questão da cognição a partir de suas relações com a tecnologia. 2 – Tecnologia, computadores e o paradigma cognitivista 2.1- A tecnologia sempre afetou o homem: das primeiras ferramentas, por vezes consideradas como extensões do corpo, à máquina a vapor, que mudou hábitos e instituições, ao computador que trouxe novas e profundas mudanças sociais e culturais, a tecnologia nos ajuda, nos completa, nos amplia.… Facilitando nossas ações, nos transportando, ou mesmo nos substituindo em determinadas tarefas, os recursos tecnológicos ora nos fascinam, ora nos assustam… E esta forma de interferência da tecnologia em nosso cotidiano caracteriza uma contribuição que ocorre naturalmente, mesmo que não nos estejamos dando conta disso. Trata-se de um processo interessante, que está mudando, entre outras coisas, aquilo que tradicionalmente chamamos de "ensino", aproximando-o cada vez mais do próprio processo natural de difusão cultural. As assim chamadas "novas tecnologias" estão desterritorializando a instituição escolar: hoje, aprendese não apenas no prédio físico da escola, mas em casa, no escritório de trabalho, em qualquer lugar onde se possa ter acesso às informações (e o próprio escritório de trabalho pode estar em nossa residência). Assim, da mesma forma como a criatividade inventiva do homem gera novas ferramentas tecnológicas, e modifica constantemente os instrumentos que inventa, existe um efeito inverso: a tecnologia modifica a expressão criativa do homem, modificando sua forma de adquirir conhecimento, interferindo assim em sua cognição. 2.2 – Desde a invenção do primeiro computador eletrônico programável, o ENIAC, (Electronical Numerical Integrator and Computer), operacionalizado inicialmente em 1946, resultante de um esforço de guerra, necessário à participação militar americana na Segunda Guerra Mundial, registra-se, na história da computação, a ênfase na resolução de problemas, apoiada em fundamentos lógicos. Datam igualmente da década de 40 os primórdios do lançamento da primeira etapa das assim chamadas "ciências da cognição", envolvendo diversas disciplinas tais como a lingüística, a epistemologia, a psicologia cognitiva, as neurociências e, claro, a Inteligência artificial. Essas disciplinas destacam, de uma forma geral, a lógica matemática como base do entendimento do funcionamento do cérebro, fato verificado em diversas propostas, onde os neurônios eram representados como componentes dotados de princípios lógicos, reproduzindo as configurações das "portas lógicas", dos circuitos lógicos, "and", "or", e suas combinações formais. A lógica passou então a ser utilizada como modelo formal do funcionamento do sistema nervoso e do próprio raciocínio humano, dando início à construção de um novo paradigma sobre o conhecimento, nas suas relações com a tecnologia: o paradigma cognitivista (Cf. Varela, 1996). 2.3 - A formulação cognitivista, que tanto influenciou nossas atuais concepções educacionais, admitindo a semelhança entre o desempenho da inteligência humana e o funcionamento lógico de um computador, propõe que o pensar humano ocorre da mesma forma como um computador processa informações. É interessante notar-se que, a partir dos primeiros computadores, criados pela cognição inventiva de pesquisadores e técnicos, e concebidos segundo um modelo que reproduzia, de certo modo, a forma como se admitia conhecer o pensar humano (modelo lógicomatemático), fortaleceu-se e fundamentou-se, pelo menos na visão cognitivista, a crença de que o cérebro humano desenvolve, como os computadores, o tratamento da informação. Daí, certamente, a utilização de metáforas como a expressão cérebro eletrônico, inicialmente considerada para referência à unidade central de processamento da máquina, e, por extensão, aos próprios computadores. Vamos examinar com mais cuidado o significado dessa proposta. O que significa admitir que o pensar humano funciona como um computador? Ora, o tratamento da informação pelos computadores é uma operação efetuada sobre símbolos, ou seja, uma operação realizada a partir de elementos que representam aquilo a que correspondem. Em conseqüência, o tratamento computacional apóia-se na noção fundamental de representação. E, uma vez que computadores manipulam apenas a forma "física" dos símbolos, sem ter qualquer acesso ao seu significado, pois as distinções semânticas, aquelas que atribuem significado a cada símbolo, são realmente expressas pelo programador, através das regras sintáticas específicas da linguagem ( de programação ) que ele utiliza, pode-se concluir que o pressuposto cognitivista, adotando o modelo da representação ("conhecer é representar"), apoiado na computação física de códigos simbólicos, manipulados por regras sintáticas, toma o computador como um modelo mecânico do pensamento. Note-se ainda que as diversas propostas behavioristas apoiadas em recursos tecnológicos, como as famosas máquinas de ensinar de Skinner, bem como diversas outras modalidades pedagógicas de ensino programado, ou de EAC (Ensino Assistido por Computadores), estão calcadas no citado modelo cognitivista. 3 – A máquina gerando regimes cognitivos: a cognição como prática inventiva Os recursos atuais da tecnologia, os novos meios digitais: a multimídia, a Internet, a telemática, trazem novas formas de ler, de escrever, e portanto, de pensar e agir. O simples uso de um editor de textos mostra como alguém pode registrar seu pensamento de forma distinta daquela do texto manuscrito ou mesmo datilografado, provocando no indivíduo uma forma diferente de ler e interpretar o que escreve, forma esta que se associa, ora como causa, ora como conseqüência, a um pensar diferente. O que nos traz hoje, de forma simples e imediata, o trato com computadores?.. Como se dá nossa interação com estas máquinas?... Como procede uma criança na sua relação com o computador, frente ao vídeo, tendo sua curiosidade desafiada por diversos botões e pelo teclado? Operamos sempre na busca, no tateamento, e, inadvertidamente, nos transformamos, como crianças, em "experimentadores", em curiosos - e inseguros - pesquisadores que, face às diversas possibilidades, de resultados imprevisíveis, que nos oferece a máquina, virtualizamos nossas experiências, nossas tentativas de invenção. E isto ocorre até mesmo com os "mais plugados", os ditos "especialistas": supostos senhores da operacionalidade técnica da máquina, eles também "navegam", errantes, nos hipertextos ou nas águas virtuais da Internet, exercendo assim seu devir-criança, despreocupados, perdendo-se nas buscas intermináveis, horas a fio, tateando como os iniciantes, ainda que com outra finalidade, mas com uma certa autoridade, (ou mesmo sem qualquer finalidade específica, num exercício livre de busca descomprometida). E, apesar de toda sua autoridade suposta, também eles se surpreendem com a imprevisibilidade da máquina, que os desafia, aguçando sua curiosidade, tornando-os, como as crianças, mais criativos, mais inventivos... E este "tatear" leva-nos em geral a outros caminhos, não necessariamente previstos; o digitar traz uma nova dimensão ao trabalho com a máquina: não me prendo – ou não posso prender-me – ao que antes estava planejado, pois as ocorrências na tela de vídeo me obrigam a re-pensar o que aparentemente estava decidido de antemão; trata-se agora de construir e re-construir a cada momento o que foi realizado, impondo a mim mesmo, como usuário, simultaneamente autor e leitor, uma contínua re-construção. Em resumo: as máquinas de hoje, os modernos microcomputadores, e por extensão, os sistemas informatizados em geral, nos trazem: a) - uma relação diferente com o objeto técnico, apoiada na experimentação, na errância; b) - uma relação na qual não mais faz sentido a idéia de uma representação que antecede a ação a ser desenvolvida: como afirma Pierre Lévy (1993), não se trata agora do sujeito cognitivo que interage com a máquina-objeto; ele não representa algo exterior a si, para orientar sua ação, pois é no acoplamento imediato com a máquina que as decisões ocorrem; c) - a ocorrência de uma relação usuário / máquina onde se desenvolve um regime cognitivo determinado: na medida em que informações são interpretadas e utilizadas pelo usuário, estas atualizações operam sobre o indivíduo, que, pelo próprio acoplamento nas interfaces com a máquina, a partir das diversas possibilidades oferecidas, se renova e se modifica, desenvolvendo e participando ele mesmo, de um processo criativo contínuo e imprevisível; d) - uma nova forma de possibilitar a construção e elaboração do conhecimento, (diferente das tradicionais, baseadas na teoria ou na experimentação prática), resultante de características próprias das novas tecnologias: a simulação em mundos virtuais de determinados mecanismos e processos, permitindo a reprodução e o controle de processos onde diversos parâmetros podem ser modificados, verificando-se os resultados, discutindo-se e analisando-se as conseqüências dessa variação; a simulação em mundos virtuais problematiza situações, promovendo a invenção criativa. Em conseqüência, trata-se agora da cognição, não mais como representação, mas como prática: "... a cognição entendida como uma prática, não como uma representação. Enquanto prática, seu trabalho é o de pôr em relação elementos heterogêneos. Estes não são formas puras, sujeito e objeto, mas vetores materiais e sociais, etológicos e tecnológicos, sensoriais e semióticos, fluxos ou linhas que não se fecham em formas perfeitas e totalizadas. As relações cognitivas não são previsíveis pois os elementos não formam um sistema fechado. São abertas e temporais. São inventivas." ( Kastrup,1997, p. 79) Uma conseqüência imediata na prática pedagógica segundo a citada concepção da questão cognitiva, e mesmo resultante da própria característica de imprevisibilidade da máquina, está na necessária mudança de postura do professor em seu trabalho cotidiano: se as relações cognitivas são necessariamente abertas e imprevisíveis, se o trato com as máquinas repousa em uma relação diferente com o objeto técnico, apoiada na experimentação e na errância, impõe-se uma revisão da forma como consideramos o ato de errar – não apenas no que se refere ao erro de cada um de nós, mas principalmente quanto ao considerarmos o erro de nosso aluno, em determinadas situações, como parte do processo de busca e experimentação, necessário à construção do conhecimento. Trata-se então de uma nova relação professor / aluno, na qual ambos caminham juntos, a cada momento, buscando, errando, aprendendo… Cabe então ao professor, não mais o lugar de dono da verdade absoluta, mas o de interlocutor privilegiado, que incita, questiona, provoca reflexões… 4 – Da teoria à prática: conclusões e sugestões de leitura 4.1 - A forma de ver as máquinas aqui proposta, admitidas como produtoras de subjetividade, considera a relação homem / máquina como um campo de criação da cognição. Assim entendida, a cognição é uma prática inventiva, onde o principal interesse não estaria centrado na resolução de problemas previamente colocados, mas na colocação de problemas. Face a uma dada situação, ou a um problema, não se trata então propriamente de compreender ("com-prehendere", pegar, agarrar com as mãos), uma ação que pressupõe um afastamento, uma certa distância de algo que se propõe alcançar, admitindo-se que este algo já tenha de antemão existência subjetiva. Trata-se, isto sim, como afirma Deleuze (1988), de entrar na espessura do problema, ou seja, trata-se de problematizar-se com ele. Neste sentido, aprender é, antes de qualquer outra coisa, constituir um problema e formar com ele um campo problemático. (cf. Kastrup, 1997) Segue-se que a possível utilização de recursos informatizados na educação não deve apoiar-se no modelo cognitivista, não obstante a forte inclinação natural para sua aplicação. Ao contrário, a própria natureza da interação usuário / máquina, abordada no texto, sugere o deslocamento da ênfase no objeto – o computador – para o projeto, visando o ambiente cognitivo, a rede de relações humanas que se deseja instituir, o que pode ser facilitado pela consideração da cognição como uma prática inventiva. E esta prática inventiva estende, por sua vez, a ênfase do processo à coletividade: a construção de conhecimento passa a ser igualmente atribuída aos grupos que interagem no espaço do saber, próprio da inteligência coletiva, uma inteligência distribuída por toda a parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo real, e que resulta em uma mobilização efetiva das competências individuais ( Cf. Lévy, 1998, pg. 28). A desejada mobilização efetiva de competências, entretanto, só pode realmente ocorrer se determinados cuidados forem observados. Não se pode afirmar que a simples introdução das chamadas novas tecnologias na escola provoquem naturalmente modificações válidas e proveitosas na organização educacional, no currículo, e no trato das questões pedagógicas. Não se trata simplesmente de modificar a estrutura administrativa e curricular da escola, informatizando o processo já existente, sem um entendimento mais apurado do que se deseja realmente mudar. Em tais situações, muda-se usualmente apenas a forma, não a essência do processo, vindo a tecnologia simplesmente disfarçar os mecanismos tradicionais, dando a eles um certo ‘ar de modernidade’: passa-se, por exemplo, da "aula-cópia e copiada" para a "aula-cópia informatizada e copiada", reforçando-se as relações de poder que permeiam a prática estabelecida. Ao contrário, a introdução da tecnologia, e de todas as suas novas vertentes, deve ser provocada, em suas origens, pela necessidade constatada de uma real mudança no processo educacional. Ou seja, a necessidade da mudança, da reconstrução do processo educacional, deve ser a causa, não a conseqüência, da introdução dos recursos informatizados na escola. E, uma vez constatada esta necessidade de mudança, mobilizar os profissionais da educação para o uso consciente e eficaz de novos recursos tecnológicos, é um processo que necessita discussões, reflexões e amadurecimento das idéias discutidas. 4.2 - Como realizar então a prática destas idéias, inserindo a tecnologia no processo educacional, sem alterar-lhe a necessária visão humanista, mas reconhecendo nela, (a tecnologia), o instrumento de um fenômeno social mais amplo, que a todos atinge ? Ora, o deslocamento citado, da ênfase no objeto, à ênfase no projeto, o trato e a valorização da inteligência coletiva, a necessidade da construção gradativa da competência específica de professores e alunos no uso dos novos recursos, a mudança do eixo da relação professor / aluno, e especialmente o ‘entrar na espessura do problema’, o ‘problematizar’, sugerem naturalmente a adoção da pesquisa como instrumento fundamental do processo educacional. E a prática da pesquisa é o caminho natural sugerido - e mesmo facilitado- pelos novos recursos. Analogamente, a construção da competência específica do professor, relativa ao domínio dos instrumentos informatizados, não deve ser isolada do processo mais amplo de construção de sua competência profissional. Até porque a questão da competência refere-se a um "saber fazer", no sentido de " fazer e fazer-se oportunidade" ( Cf. Demo, P., 1996). Não se trata, portanto, de fazer do professor um especialista em Informática, mas de criar condições para que se aproprie, dentro do processo de construção de sua competência, da utilização gradativa dos referidos recursos informatizados: somente uma tal apropriação da utilização da tecnologia pelos educadores poderá gerar novas possibilidades de sua utilização educacional. Finalmente, registre-se que a escola, ainda aprisionada na cultura da pagus, a cultura da escrita, do texto estático, do conhecimento fragmentado e territorializado, precisa buscar as formas de lançar-se ao referido espaço do saber, caracterizado pela dinâmica interativa do ciberespaço. Este é o desafio do nosso tempo: temos que discutir e analisar com nossos filhos e nossos alunos, a utilização e os efeitos de mudanças que vivemos ao mesmo tempo que eles. Não podemos recorrer a quem as tenha vivenciado antes de nós: falta-nos um referencial crítico anterior... Cabe-nos então construir este referencial para as gerações futuras. 4.3- Como sugestão de leitura, visando um aprofundamento de algumas das idéias apresentadas neste texto, propõe-se o livro "As tecnologias da inteligência", de Pierre Lévy (1993). Nesse livro, o autor desenvolve um estudo das tecnologias intelectuais, a partir da escrita, abordando seus efeitos sobre os grupos sociais, discutindo o que denomina uma abordagem ecológica da cognição. Destacando o computador como uma máquina de produção da cognição, Lévy recorre ao conceito de interface, utilizado pelos especialistas em informática, atribuindo a ele uma dimensão filosófica que lhe permite tratar a cognição como sendo produzida pelo agenciamento homem / máquina, a partir dos efeitos inventivos registrados. Sociólogo e estudioso da história da Ciência, Pierre Lévy, conhecido como filósofo das novas tecnologias, analisa em seus trabalhos os efeitos da tecnologia sobre o social a partir da própria tecnologia. Referências bibliográficas DELEUZE, G. Diferença e Repetição. Tradução Luís Orlandi e Roberto Machado. Graal, Rio de Janeiro,1988 DEMO, P. Educar pela Pesquisa - Campinas, São Paulo, Autores Associados, 1996; FRóES, J. A tecnologia na vida cotidiana: - importância e evolução sóciohistórica Rio de Janeiro, 1994. Mimeografado --------------- Os Sistemas Informatizados: uma Cartografia do processo de introdução dos recursos informatizados na Escola - Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - São Paulo, 1997. Mimeografado. KASTRUP, V. A invenção de si e do mundo - uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição - Tese (Doutorado)- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1997. Mimeografado LÉVY, P. As Tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Tradução de Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993. _________ A Inteligência Coletiva - por uma antropologia do ciberespaço. Tradução de Luiz Paulo Rouanet. Edições Loyola, S. Paulo, 1998 VARELA, F.J. Invitation aux sciences cognitives. Editions du Seuil, Paris, 1996 ENSINANDO NA ERA DA INFORMAÇÃO Norman Coombs Norman Coombs é professor de História no Rochester Institue of Tehnology. Ele foi premiado com uma bolsa de estudos Fulbright para estudar na Inglaterra no período de 1959-60 e um auxílio da National Endowrnet for the Humanities para se tornar proficiente em outra área, a de estudos sobre os negros, em 1969-70. Dr. Coombs e coordenador do Projeto EASI Online Resource Working Group do Programa de EDUCOM de Usos Educacionais da Tecnologia da Informação (EUIT), que está desenvolvendo uma base de dados de documentos relacionados as questões de acesso em uma área de FTP na Universidade de Michigan. Obteve seu Ph.D. na Universidade de Wisconsisn em 1961. A informação sempre foi a ingrediente principal na educação. O uso de redes de alta velocidade, com fibras óticas ou conexões via satélite para acessar rapidamente as grandes bibliotecas eletrônicas expansíveis e bases de dados fornece a base para uma potencial revolução no aprendizado. A combinação destes recursos com um computador pessoal dá aos estudantes acesso a grandes quantidades de informações, e moverá o locus do poder do professor para o aprendiz. As comunicações via computador, por exemplo, a conexão de computadores pessoais a servidores "mainframe" via redes de dados, pode criar ambientes educacionais altamente interativos. Uma Revolução no Aprendizado O computador pessoal colocou um poder inimaginável nas mãos dos aprendizes individuais. Ele pode permitir que os aprendizes trabalhem de suas próprias maneiras, em velocidades variadas. Por muito tempo, a educação tem feito promessas infundadas para atender as necessidades únicas dos indivíduos e ensiná-los de que maneira aprender. O adventos da era da informação juntamente com o advento dos computadores pessoais tornam esta meta mais significativa . Tipicamente, as salas de aula tradicionais têm fileiras de estudantes, sentados lado a lado, encarando bem em frente um professor, que é o fornecedor do conhecimento. Quaisquer diferenças entre os estudantes são explicadas como medidas da inteligência individual. Esta estrutura espelha os sistemas de linhas de montagem da sociedade industrial e reflete a mentalidade da revolução industrial que certa vez guiou os caminhos de nossa sociedade. A era da informação de hoje necessita de um novo modelo para a educação; por isso, existe o potencial para uma revolução no aprendizado. Uma mudança no Foco Instrutivo Em 1985, a RIT colocou como meta instrucional usar comunicação mediada por computador para fornecer as mesmas experiências educacionais de alta qualidade que estavam disponíveis aos alunos do campus para os aprendizes de fora do campus. Usando o correio eletrônico (e-mail) e os sistemas de conferência via computador, comecei a trabalhar nessa meta dentro de uma estrutura de um telecurso tradicional na história americana. Anterior a essa mudança metodológica, o curso utilizou serviço de correio e telefones tradicionais, que forneceram interatividade não satisfatória. O serviço de correio eletrônico serviu para substituir com sucesso o papel do telefone, e a conferência via computador forneceu interações grupais similares aquelas das salas de aula. As discussões em grupo previamente ao telecurso falharam, e a conferência via computador não só forneceu uma estrutura para perguntas e respostas, mas também serviu como uma plataforma para compartilhar opiniões e percepções diferentes sobre o conteúdo do curso. Os estudantes aprenderam uns dos outros e foram capazes de medir seus progressos baseados nos comentários dos colegas de classe. Além disso, como esperado, as mudanças criaram verdadeiro ambiente "de aprendizado flexível", permitindo aos estudantes se conectarem via residência ou trabalho, de acordo com sua conveniência, usando microcomputadores e modems. Os estudantes mostraram que gostaram de ter o curso adaptado as sua necessidades individuais. Através de registros de distribuição de vídeos e do uso das conferências por computador para discussão, os aprendizes puderam montar seus próprios horários e puderam progredir num passo ótimo. Tais resultados foram subseqüentemente relatados por muitos educadores . Uma mudança no Foco das Salas de Aula Gradualmente, me dei conta de que o uso desta tecnologia estava alterando meu pensamento sobre o ensinar. Observei que relações mais próximas entre os participantes eram formadas e que o conteúdo do curso se tornou "real" para os estudantes. A vasta carga de interação de grupo mediada por computador foi acompanhada usando o VAX Notes, como um substituto para discussões em sala de aula. Inserindo comentários, periodicamente, nas discussões, estimulei e direcionei seu fluxo e forneci um senso de envolvimento contínuo como moderador da discussão. Também enviei mensagens pessoais semanalmente para cada estudante, o que constituiu –se mais num contato pessoal do que o contato que eu tinha com eles na sala de aula. As mensagens eram geralmente curtas, mas elas permitiam um contato significativo sem ter um estudante sentado e batendo papo em meu gabinete por uma hora! Finalmente, compreendi que os telecursos individuais dos estudantes eram melhores do quer se eu tivesse aqueles estudantes em meus cursos regulares. Eles, por sua vez, disseram que me acharam mais acessível do que seus professores na sala de aula. Os estudantes não só estavam desenvolvendo um componente afetivo com o aprendizado, mais também discutiam os tópicos com uma abertura que não era típica de outras experiências em sala de aula. Os estudantes estavam ligando o que estudamos sobre história as experiências pessoais ou estórias aprendidas de suas famílias. Ao invés de meramente ensiná-los sobre a Grande Depressão ou sobre os horrores dos linchamentos raciais, tornei-me consciente de como os eventos históricos os tocavam pessoalmente. Cada estudante estava aprendendo o material dentro do seu próprio contexto. Por exemplo, após assistir um vídeo sobre saúde, os estudantes responderam via conferência de computador a questões que coloquei com relação as necessidades e problemas de saúde. Após alguns "replies" sobre os conteúdos tradicionais, as respostas de um estudante abriu uma discussão muito franca entre os membros da classe. Este nível de fraqueza provavelmente não teria ocorrido numa sala de aula. Percepção dos Estudantes Os estudantes reconheceram que estavam interagindo diferentemente via conferência computacional do que faziam nas salas de aula. "As pessoas têm a possibilidade de escrever seus sentimentos numa forma um pouco anônima," observou um estudante, "deixando-as com a possibilidade de dizer o que realmente sentem:" A mensagem continuou. "Não acho que as pessoas teriam respondido da mesma maneira se fosse uma discussão face a face na sala de aula." Outro participante comentou: "Não sou um bom orador, dai a conferência me ajuda apor ordem em meus pensamentos e me permite expressá-los melhor sem enrolar a língua." Vários estudantes disseram que cooperam mais neste telecurso do que nas aulas padrões. Outros relataram que algumas vezes hesitam em falar abertamente nas salas de aula. Estes estudantes se sentiram mais livres para falar o que pensam, porque o meio é menos amedrontador. Muitos membros da classe me agradeceram especificamente por usar esta tecnologia e também expressaram sua apreciação a seus colegas por usá-la (tecnologia) tão livremente. "Também concordo com todos sobre como foi boa a idéia de usar esta conferência," e um outro membro da classe ainda comentou, chamando a atenção que "as barreiras de comunicação diárias são evitadas. Se a barreira de audição está sendo reduzida, seja negro, branco ou verde, seja tímido ou não fale bem, ou o que quer que seja, estas diferentes de comunicação e muitas outras estão sendo resolvidas." Percepção do Instrutor Como professor, achei-me desenvolvendo uma consciência dual em seguir nossas discussões: era tanto um observador/professor como um participante/aprendiz. Por uma lado, fui capaz de observar uma conferência cheia de participantes, como li através das discussões. Por outro, quando um comentário em particular detinha minha atenção, eu podia responder via "e-mail" para aquele indivíduo por algum tempo, sem colidir com outros estudantes. Como observador/professor, eu sabia que todos os estudantes estavam estudando o mesmo conteúdo material. Como participante/aprendiz, eu estava ciente de que cada estudante, como indivíduo, trouxe suas necessidades e discernimentos únicos para a informação. Através destas interações, desenvolvi um entendimento muito profundo da singularidade de cada aprendiz. Estudantes diferentes aprendiam o mesmo material de formas diferentes, cada um trazendo uma quantidade variada de informações prévias sobre o assunto e tendo diferentes necessidades de informação. Adaptando as Necessidades do Aprendiz Como resultado deste discernimento, penso menos em mim como um condutor de informação bem embalada e mais como um facilitador para guiar cada aprendiz único. Ainda é necessário ter um corpo padrão de materiais para ser aprendido, mas, devido a nenhum aprendiz ser padrão, as metas educacionais podem ser melhor seguidas através de rotas individuais. A característica individual e única que pode ser adaptada, usando técnicas tais como as incorporadas neste telecurso, não só incluem as técnicas para populações dominantes, mas, com a ajuda de computadores especialmente equipados, pode também abranger pessoas com deficiência. Sou totalmente cego. Durante o outono de 1991, dei um curso "on-line" que se supriu uma variedade de necessidades dos aprendizes. Metade da classe era de estudantes com audição reduzida da Gallaudet University, em Washington, D.C: outro quarto de estudantes surdos do National Technical Institute of the Deaf, em Rochester Institute of Tevhinology ( RIT ); e o restante eram estudantes mais velhos do RIT. Este curso poderia Ter facilmente incluído participantes com outras deficiências físicas. A Definição da Revolução do Aprendizado A relação no aprendizado não chegou aqui ainda. Suas ferramentas estão sendo agrupadas e requer mentes criativas para dirigi-las e aplica-las. A medida que a riqueza das informações eletrônicas se expande, os professores deveriam carregar menos e menos informações; a partir daí, eles deveriam funcionar como guias para aprendizes que buscam por informações relevantes. O ensino no futuro deveria se deter mais em ajudar o estudante a saber que questões perguntar, onde achar a informação e como estudar a informação uma vez encontrada. As partes mais difíceis do ensino estarão em saber como motivar e desafiar os estudantes e como encorajá-los a desenvolver o requisito de auto disciplina para o aprendizado. Após usar conferências de computador para ensinar os cursos de história Americana e Afro-Americana, estou mais consciente de tentar motivar os estudantes a se tornarem aprendizes ativos. Meu papel na revolução do aprendizado atualmente esta limitado, em parte pela escassez de materiais disponíveis "on-line" para suprir minhas necessidades particulares, e em parte pela minha propila falta de idéias criativas sobre o uso do que já esta disponível. Estou explorando menos mais criativos de usar as ferramentas que estão por vir. Um sistema de conferência modificado para que tivesse capacidades de hipertexto e um dos tais sonhos. Um sistema de conferência de hipertexto, "on-line" e interativo poderia permitir ao professor estruturar os materiais do curso, e ainda capacitar estudantes individuais a escolher seus próprios caminhos para digerir estes materiais. Isto parece ser um próximo passo obvio, porque os microcomputadores já são usados como ferramentas de apresentação de multimídia. Espera-se que estas características estejam logo disponíveis nas redes e se tornem prontamente acessáveis por grupos educacionais. O Futuro Se tal revolução de aprendizado ocorrer, fará, como observado anteriormente, mover o centro do controle do professor para o aprendiz. As pessoas resistem ferozmente ao poder de renunciar e os professores são notoriamente conservadores sobre educação. Na Idade Média, os professores liam de seus manuscritos para suas classes. A máquina de impressão ameaçou aquele modelo educacional. Entretanto, foi descoberto subseqüentemente que, se os estudantes tivessem disponíveis os professores poderiam expandir-se em seus textos e fornecer outras explicações que aumentam o aprendizado. Numa tendência semelhante, muitos educadores sentem medo agora de que o computador faça com que os estudantes se tornem máquina de busca e pesquisa tão poderosas que a faculdade se torna redundante. Assim como a máquina de impressão liberou o ensino a mover-se para um nível mais alto de conceptualização, também a educação na era da informação transcendera o que tem sido comum em nosso tempo. Bons professores não serão substituídos pelos assistentes de ensino e ajudantes de professores, mas liberados para definir a educação em termos mais excitantes e criativos. INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO: PARA TODOS OU PARA ALGUNS Prof. Fernando César Silva/NTE-Pe Caruaru-PE Em nossa história recente, sempre tentou-se justificar máxima presente na Constituição de "Educação para Todos" num contexto de quantidade, de massificação da educação. Pretendendo-se servir ao discurso de modernidade e para justificar vultuosos recursos em programas educacionais. Em tempos de Globalização, modernização das atividades produtivas e informação instantânea, vemos adiante uma perspectiva de ampliação dos horizontes, através das novas Tecnologias da Informação a serem difundidas na Educação. Mas, o que realmente significa trazer a Tecnologia da Informação, a Informática e a Comunicação num contexto como nunca se viu antes, para o sistema de ensino? Antes, vamos nos reportar ao conceito de modernização, que não é novo, e há muito tempo surge uma "onda" de projetos e políticas de levar modernização a "velha" arte de ensinar no quadro negro com o giz. Desde o início do século, com a Era Industrial, onde o trabalhador precisou sair de sua condição de "doador" da força de seus braços em troca de salários, para também utilizar o intelecto nas novas máquinas que chegavam nas linhas de produção das fábricas. Até a chegada do Rádio de ondas médias, foi louvado como um instrumento para levar à Educação mais longe e para mais pessoas. Num processo de "Modernização Conservadora" (Gileno, 1997), apenas tentou se reproduzir o ambiente e o sistema presentes na sala de aula através de muitas tecnologias, passando do Rádio, pela TV, Aparelho de Video-Cassete, Antena Parabólica, e agora pela verdadeira revolução da informação através da Tecnologia da Informática. Quando estas inovações não vêm acompanhadas de uma reflexão e de um estudo de como utilizá-las como Ferramenta Pedagógica, inicia-se um processo de apenas copiar um sistema de ensino arcaico, fechado, o qual nenhum objeto eletrônico consegue dinamizar e tornar mais acessível. Vejamos que, para utilizar a tecnologia da informação e comunicação temos que antes de mais nada, desenhar claramente o papel do aluno e do professor na sala de aula. Pois, antes, único "transmissor" do conhecimento, o professor passa agora a ser mediador de inúmeras informações nas mais diversas vertentes as quais a Informática, pela Internet principalmente, consegue levar aos alunos. O ambiente de uma sala de aula informatizada é um ambiente novo, onde a "O mundo da Imagem"(Braudillard, 1996) emerge como uma nova concepção do processo ensino-aprendizagem, já que, com a informação instantânea carregada de imagens e sons, de aplicativos multimídia, consegue contextualizar conceitos nunca antes imaginados pelo aluno em sala de aula, e com a multimídia este processo passa a ser audio-visual, a sala de aula informatizada passa a ser um Laboratório Virtual, onde se processa conceitos e conteúdos que não podiam ser vistos e analisados em quadro negro e nos livros didáticos. Este acesso a um universo de informação instantânea, principalmente pela Internet, é um dos maiores avanços a serem explorados numa nova perspectiva do processo ensino-aprendizagem. Ganha o aluno com a diversidade (que nem sempre significa qualidade, daí a importância de se manter o valor do papel pedagógico do professor), ganha em dinâmica de exploração de informações e troca de idéias e conceitos com outros alunos de outras escolas de outras culturas, e ganha o professor que tem um de suas limitações, a de se reciclar em termos de conhecimentos, uma nova porta para ampliar seus conceitos e sua didática. É possível, desde que se dê o direcionamento correto, fazer do computador um grande auxiliar no processo pedagógico, dar mais liberdade em termos da concepção dos papéis do professor e do aluno, onde a criticidade pode ser muita mais explorada, onde a prática da pesquisa seja desenvolvida. As barreiras econômicas e políticas para um sistema de ensino Informatizado que traga melhoria de qualidade de ensino e do acesso à educação ainda são grandes, correntes céticas surgem, críticos, a que se conquistar um espaço muito delicado onde a tecnologia não pode e nem deve se propor a substituir, o espaço do educador. A tecnologia é importante, e temos na nossa época um processo irreversível onde a informática está em todas as atividades da sociedade, sendo inegável sua contribuição para a otimização dessas atividades. Em termos de Educação, esta performance tem que ser analisada mais friamente, pois não é a simples transposição dos conteúdos didáticos dos livros para a tela de um computador que dará um ganho real de aprendizagem. As novas tecnologias da informação e da comunicação são instrumentos que podem ser criadores ou re-criadores da realidade atual das escolas, onde em nosso país prevalece um sistema arcaico, que ainda não se adaptou as mudanças da modernidade. O novo sempre causa receio e ceticismo, mas com critérios que não sejam baseados em "sorteio de prestígio político", com a informática sendo disseminada e conquistando os professores para a sua utilidade, a Informática Educativa conquistará um espaço importante. Alguns podem pensar na Informática Educativa como um "modismo", como uma estratégia da Indústria da Informática para a conquista de novos consumidores, o que poder ser verdade em alguns aspectos. Afinal, vivemos numa sociedade capitalista onde a busca por mercados consumidores é uma prática vital de sobrevivência. Mas a Informática Educativa deve se valer da tecnologia para otimizar a produção pedagógica, o processo ensino-aprendizagem, e não formar novos trabalhadores antes de formar cidadãos. Para tal, deve-se priorizar um investimento capacitação dos profissionais da Educação, antes de se inundar de máquinas as salas de aula, para não correr o risco de criar-se "elefantes brancos" tecnológicos, onde não se saiba o que fazer com os computadores. A Informática pode então, com este direcionamento abrir oportunidades de alunos com grande dificuldade numa ou noutra disciplina, para ter em mãos um complemento extra-curricular, também pode-se realizar um grande intercâmbio de alunos e professores com outros em outras culturas, trazendo para a escola um mundo de notável dinâmica e versatilidade, que proporcionará uma nova "Cultura da Informação" (Ripper,1995) onde os conteúdos passam a ser mais livres da limitação do livro didático e dos conteúdos programados. Esta desvinculação do conhecimento ao ambiente de sala de aula sempre foi a busca de uma pedagogia de construtivismo, neste contexto as novas tecnologias da informação se prestam bem a este papel, onde há um universo de informações a serem analisadas e classificadas para posteriormente produzir-se novos conteúdos. A possibilidade de utilizar a tecnologia para uma educação de qualidade não é um sonho ou modismo, é uma realidade, mas que só se tornará possível com muito trabalho, pesquisa e inovações nas didáticas de ensino. A informática tem a seu favor a sua versatilidade de aplicação, sua adaptabilidade a todas as atividades, e sem dúvida o ensino tem um meio de ser mais aberto e de qualidade que leve a população brasileira ao mais altos níveis não de conhecimento tecnológico, mas sim de cidadania e cultura. FERRETTI, Celso J. et alii. Novas Tecnologias, trabalho e educação. Petrópolis, Vozes, 1994. FRIGOTTO, Gaudêncio. A produtividade da escola improdutiva. São Paulo, Cortêz, 1995. PRETTO, Nelsom. Uma escola sem/com futuro. São Paulo, Papirus, 1996. LUCENA, Marisa. Um Modelo de Escola aberta na Internet: Kidlink no Brasil. Editora Brasport. Rio de Janeiro,1997. CYSNEIROS, Paulo Gileno. Novas Tecnologias na Educação – Texto em Construção – Recife,1998. SANDHOLTZ, Judith Haymore. RINGSTAFF, Cathy. DWYER, David C.. Ensinado com Tecnologia: criando salas de aula centradas nos alunos. Editora Artes Médicas. Porto Alegre, 1997. PAPERT, Seymour. A Máquina das Crianças: Repensando a Escola na Era da Informática. Editora Artes Médicas. Porto Alegre, 1994. Logo: Computadores e Educação. Editora Brasiliense. 1995. CASTRO, Claudio de Moura. O Computador na Escola. Editora Campus. Rio de Janeiro, 1988. INFORMÁTICA, EDUCAÇÃO E TRABALHO: IDEOLOGIAS À PARTE Prof. Fernando César Silva/NTE-Pe Caruaru-PE Educação e trabalho desde a Era Industrial, quando verificou-se a necessidade de formação de mão-de-obra, são complementos num enfoque de uma macropolítica para um maior desenvolvimento. Nos dias atuais, com o processo de globalização, esta junção de prerrogativas se faz mais necessário ainda. Existe um processo de multiplicação de habilidades na qual classe trabalhadora vem sendo submetida, e consequentemente há descarte daqueles que não conseguem qualificar-se, estando neste fator um dos principais motivos para o alto nível de desemprego. A Educação, durante muito tempo foi associada ao slogan "preparando o jovem para o mercado de trabalho", ficando claro uma ideologia de massificação da classe operária, e quando se fala em Escola Pública isto fica ainda mais claro já que esta preparava principalmente através do ensino profissionalizante, jovens filhos da classe operária para continuarem como classe operária. Nas mudanças que a "Massificação da informação" (Pretto, 1996) procederam nas atividades produtivas, a parceria EducaçãoTrabalho tornou-se para os países industrializados uma questão crucial em suas políticas. Não há, porém, uma mudança ideológica, apenas o jovem filho da classe operária está sendo melhor preparado nas escolas, porquê a classe operária agora tem que operar máquinas e computadores, exigindo uma melhor qualidade intelectual, preterindo a atividade braçal. Às vésperas de um novo milênio, percebeu-se que a escola está em descompasso com esta modernização e cultura da informação que modifica a cada dia as relações de produção da sociedade moderna. Não há dúvida que a própria busca de um mercado de consumo propicia um investimento para que esta preparação tecnológica seja inserida no sistema de ensino. Um exemplo são os investimentos, disfarçados de "doações" que a Microsoft, gigante do mercado de Software, está iniciando nas escolas públicas dos EUA e países com mercado próspero na informática, como o Brasil por exemplo. A função primeira da Educação, que seria de formar cidadãos, embora deva-se analisar sob várias ópticas o conceito de cidadania, passa a ser de formar cidadãos capazes de operar máquinas complexas através de seus computadores. Esta afirmação seria simples e lógica se não houvesse o forte apelo ideológico de perpetuação das classes, formando apenas um nicho de castas mais especializadas, mais sem promover o que deveria ser a Luta de Classes (Marx, 1912), onde a ascensão entre classes sociais deveria ser propiciada à todos os cidadãos, e a escola deveria ser o condutor deste processo. O uso do verbo no passado sugere a crítica, não infundada, pois é claro que a política para a Educação no Brasil aponta para o primeiro pressuposto: formar trabalhadores para continuarem trabalhadores. Para uma completa mudança na educação, com uma política voltada para a formação social é necessário repensar a função da escola, principalmente a escola pública, já que, fazendo parte da Inversão Educacional(Frigotto, 1995) os jovens da classe "A" são preparados por uma escola privada para ingressarem nas Universidades Estatais, onde permanecerão com profissões de status de classe "A". Não que a Escola Pública não possa ser de qualidade, e prepare o jovens para todos os níveis de ascensão profissional, para isto ser uma regra e não uma exceção, a política para a Educação quando se põe uma perspectiva de modernização, com a chegada de computadores nas escolas por exemplo, não pode ser a de formar alunos em informática técnica comercial, para serem digitadores e operadores de microcomputadores nas empresas e indústrias, e sim a de formar profissionais cônscios de uma modernização real nas atividades produtivas, dando à este aluno uma didática de ensino buscando o computador com ferramenta pedagógica, onde ele possa conceituar os ensinamentos de sala de aula, sempre dentro de uma perspectiva de criticidade, formando operadores de computador que "pensam no que estão digitando, e não simplesmente digitam automaticamente". A formação do jovem deve ser aquela que pressupõe a consciência dele enquanto cidadão, agente produtivo capaz de ascender classes e não tão somente "reproduzido num laboratório, como cobaias geradas in vitro". Onde o jovem da classe operária seria preparado ainda para ser um operário um pouco mais especializado que os das gerações anteriores. Uma nova conceituação dos princípios pedagógicos frente a modernização das atividades do trabalho passam por muitos prismas, entre eles a própria qualificação do profissional da educação, que devido as políticas de desvalorização contínua de seu status, tem sido não mais um agente formador de opinião, mas apenas mais um trabalhador formando trabalhadores nas salas de aula, de acordo com o nível social da escola em que trabalha e consequentemente de sua clientela. O profissional de educação é um gerador de mudanças sutis, de conscientização, que pode, dependendo de seus encaminhamentos didáticos, a mola propulsora de uma "Revolução Branca", no seio de um geração que tem em mãos a informação democratizada com nunca se viu antes em nenhuma época. Não que a informação seja uma arma e professores e alunos sejam soldados numa "cruzada" contra a classe Burguesa!, o discurso planfetário até já saiu do plano ideológico e caio num limbo, onde não existem mais esquerda e direita, e sim, Globalização, desemprego, Qualidade Total, que no final são produtos do chamado "Capitalismo Selvagem", que leva o professor a repensar seu papel, já que infelizmente ele não mais um profissional liberal com status financeiro, mas continua sendo a principal profissão da civilização. A Educação e o Trabalho continuam sendo co-autores de uma processo de crescimento que se pretende não seja apenas de produção, de crescimento econômico que muitas vezes não vem acompanhado de crescimento social. O processo deve ser ambíguo, onde sejam formados cidadãos conscientes, plenos, capazes de se lançar no desafio de construir uma sociedade moderna, tecnológica e humanamente falando. FERRETTI, Celso J. et alii. Novas Tecnologias, trabalho e educação. Petrópolis, Vozes, 1994. FRIGOTTO, Gaudêncio. A produtividade da escola improdutiva. São Paulo, Cortêz, 1995. PRETTO, Nelsom. Uma escola sem/com futuro. São Paulo, Papirus, 1996. MARX e ENGELS, O manifesto do partido comunista, São Paulo, Vozes, 1988. CONHECENDO A INFORMÁTICA EDUCACIONAL Vidente Willians Meu primeiro contato com a Informática Educacional foi em 1993. Nesta época, ministrava aulas de informática em um Curso Profissionalizante de Ensino Médio (2º Grau). Estava visitando uma Feira de Informática realizada no antigo MEC e, neste evento, além da exposição de stands, seriam realizadas algumas palestras. Vendo o programa daquele dia, achei que seria bastante interessante assistir a uma palestra sobre Inteligência Artificial. Antes desta palestra haveria outra sobre Informática Educacional?!. Eu não tinha idéia do que se tratava, mas, como tinha que esperar pela palestra sobre Inteligência Artificial, fiquei no auditório. Para tentar encurtar essa história, posso dizer que aquela palestra sobre Informática Educacional mudou de forma radical a minha postura quanto ao que pensava ser educação. Os relatos e questionamentos levantados pelo palestrante me fizeram repensar sobre tudo que considerava ser o "papel de um professor". A partir daquele momento, comecei a entender que nem sempre ou até, por que não dizer?, quase nunca é o aluno o único responsável pela sua dificuldade de aprendizado. Entendi que para se trabalhar com educação é necessário um "algo mais", que não dá para explicar, algo que faz com que você aceite participar de um processo de construção. Trocando em miúdos, depois desta palestra procurei estudar e conhecer mais sobre Informática Educacional. Através dos estudos feitos nesta área, comecei a modificar minha postura frente aos problemas de aprendizagem dos meus alunos, procurando tratar cada um como sendo único, respeitando sua individualidade ajudando-os perceber a importância de estarem aprendendo algo para ser utilizado em sua vida. É importante ressaltar as dificuldades encontradas neste período, pois eu era o tipo de professor "turrão", que acreditava estar "dando" uma aula maravilhosa e que todos os aluno deveriam ficar muito satisfeitos e atentos à mesma. Esta minha nova postura não me trouxe problemas com os alunos; pelo contrário, a minha relação passou a ser muito mais prazerosa. Uma das observações mais importante que fiz neste período foi a de que a relação professor / aluno melhorou muito gerando o companheirismo e favorecendo a aprendizagem. Os problemas que não tive com os alunos foram os encontrados com meus colegas de profissão e com a coordenação da escola, pois todos achavam que minha nova postura contrastava com a da maioria dos outros professores. Só para exemplificar esta fase, houve um dia em que, como sempre acontecia, estávamos em um Conselho de Classe, e os professores começaram a falar das dificuldades que a maioria dos alunos tinha em assimilar os conteúdos "tão bem explicados". Como já era de costume, estávamos todos indo para o lugar-comum de falar que os alunos não conseguiam aprender, usando, inclusive, expressões bastantes grotescas. Diante deste panorama, tomei a atitude de perguntar à Diretora da escola, que participava do conselho, se aquela reunião se resumiria ao levantamento dos problemas de alunos. Ela pediu para que eu fosse mais claro em minha indagação. Relatei, então, que já estava na escola há 4 anos e que em todos os conselhos eram levantadas as mesmas dificuldades, algo que devo reconhecer que também era feito por mim um tempo atrás. Falei que o importante seria que, além de estarmos levantando os problemas, também estivéssemos fornecendo sugestões sobre como solucioná-los. Para minha "grande" surpresa, alguns professores pensavam da mesma forma que eu. Aproveitando o fato de já ter conseguido fazer com que os professores entendessem que, pelo menos em parte, eram responsáveis pelas dificuldades dos alunos, sugeri que fosse criada o que chamamos na época de "aula de reforço", e fazer nessas aulas, algo "diferente", utilizando outros recursos que não fossem somente o quadro-negro e o giz. Neste momento o grupo se dividiu, pois para alguns a solução estava no aumento da quantidade de aulas; já outros sabiam que o problema não era a quantidade e sim a qualidade dessas aulas. Meus argumentos não foram aceitos por todos, porém alguns professores abraçaram a idéia por completo e nas suas aulas começaram a utilizar filmes, palestras de profissionais da área, etc. Um dos maiores ganhos que tivemos foi a criação de projetos integrados com a utilização da Informática como ferramenta. Nesta oportunidade os alunos começaram a perceber que as disciplinas não são coisas isoladas; perceberam, também, a importância de se aprender determinados conteúdos das disciplinas para solucionar problemas. Outra constatação importante que tive dessa experiência foi a de que, quando o aluno não participa somente como espectador, os resultados são muito mais expressivos e comprometidos. Conhecendo o berço da Informática Educacional Quando acreditava ser um mestre em informática educacional, tive diversas surpresas. Vim trabalhar na Trend Tecnologia Educacional e fiquei sabendo que se tratava da mesma empresa na qual trabalhava aquele palestrante a que assisti no evento do MEC, e que me fez rever conceitos antes imutáveis na minha prática pedagógica. Porém, esta foi apenas a primeira das surpresas. A maior delas foi quando percebi que deveria permitir que os alunos descobrissem, suas soluções e seus próprios caminhos, e que meu papel era o de auxiliar nesta caminhada. Mesmo para mim que já estava acostumado a trabalhar de forma "diferente", achava um pouco estranho ser professor "sem ensinar", ainda mais pelo fato de ser um professor de curso profissionalizante em que se trabalha de forma totalmente sistematizada. Eu ficava me perguntando: e se o aluno não descobrir?, e se ele não aprender nada? Eu serei o culpado? Como eles vão me considerar como professor se minha disciplina (informática educacional) não tem nota? Qual será a minha importância na vida daquele aluno? O aluno não está acostumado a pensar, o sistema escolar entrega tudo definido; por que só eu tenho que fazer tão diferente? Bem, essas perguntas, embora sendo bastante angustiantes, foram sendo respondidas. Entendi que, para o aluno querer descobrir, era necessário que fosse instigado; que, para aprender, ele teria que saber a importância daquele aprendizado na sua vida; e que, para ser considerado professor, não é preciso ter o poder de dar nota, basta despertar o interesse dos alunos. É claro que para chegar a este estágio tive que passar por várias etapas, sendo que a primeira e mais importante era a de acreditar naquilo que falava, pois nós só podemos convencer alguém de algo em que nós próprios acreditamos. Uma coisa muito importante nesta época era o fato de saber que todos nós, professores da empresa, estávamos na mesma situação, o que fez com que recorrêssemos uns aos outros, buscando idéias e trocando experiências de sala de aula. Naquela época já usávamos a inteligência coletiva, hoje tão discutida. Conseguimos avanços significativos, pois, além da experiência em sala de aula, também contávamos com total apoio da empresa, que nos oferecia oportunidade de estar sempre atualizado com o que havia de mais moderno na área de Tecnologia Educacional e nos oferecia momentos de troca. Trabalhando com projetos mesmo tendo diversos avanços no trabalho com os alunos no laboratório, descobrimos que utilizar o computador não era o único e nem o principal objetivo da Informática Educacional, pois isto poderia ser feito em qualquer um dos muitos cursos existentes no mercado; o grande ganho no uso desta tecnologia nas escolas era a forma que ela poderia ser utilizada no processo pedagógico. Foi, então, que começamos a elaborar projetos, tendo a informática como ferramenta, fazendo com que os alunos ao trabalharem as diversas disciplinas utilizassem a informática, tornando a aprendizagem mais interessante, pois, ao invés de estarem sentados apenas assistindo ao que está sendo falado pelo professor, eles atuam diretamente na construção de seu conhecimento. O nosso trabalho com projetos foi ficando cada vez mais intenso, pois com a dimensão que informática começou a ter em todas as áreas, não só na educação, mas em todas as áreas da sociedade, tivemos cada vez mais a participação dos professores e realizamos projetos cada vez mais interessantes. O Curso Técnico Quando fui chamado para assumir a coordenação do curso técnico na empresa, procurei me inteirar ao máximo sobre tudo o que a ele se relacionava. Comecei pela lei que regulamentava os cursos profissionalizantes. Pode parecer incrível, mas enquanto era "só" professor, nunca tinha dado atenção a LDB. Assim, a nova LDB foi o meu objeto de estudo. Como já tinha começado a ver o que a lei dizia sobre cursos técnicos, aproveitei para estudá-la por inteiro, e foi muito interessante descobrir que sua estrutura era bem parecida com o que nós da empresa pensávamos sobre educação, algo do tipo valorizar mais o caminho do que o resultado, não supervalorizar o erro, etc. Bem, faltava, agora, fazer com que nossos professores entendessem que "nota" não poderia ser a única maneira de fazer com que os alunos tivessem interesse em nossas aulas. Só para exemplificar o que estou falando, havia um professor que, quando foi chamado para trabalhar no curso técnico, disse o seguinte, "Legal! Agora já posso mandar aluno para fora de sala! " . Diante deste panorama, tenho procurado dar uma ênfase muito grande ao que diz respeito à relação "aluno / professor". Cada vez torna-se mais necessário estar preparado para trabalhar não só com o conteúdo do curso, mas também com a parte afetiva de nosso alunos, pois acreditamos que é importante para a aprendizagem o interesse do aluno, nestas aulas, assim como é importante a postura do professor para com estes alunos. Em nossas aulas procuramos utilizar diversos recursos, pois, já que estamos formando técnicos em informática, nada mais natural que tenham contato com os recursos existentes nesta área, além de estarmos sempre relacionando nossas aulas com o cotidiano que encontrarão no mercado de trabalho. Se é para trabalhar com programação, então vamos fazer um programa sobre como registrar as notas da turma, calcular médias finais, etc.; se a disciplina for manutenção, vamos abrir um computador e mexer de verdade nos seus componentes, etc. Este trabalho tem sido muito gratificante, pois é uma forma prática de responder perguntas do tipo: onde eu usarei isto?. Acho que este é o nosso diferencial. Outra particularidade do curso é o fato de que, mesmo tendo professores com formação bastante técnica (tecnólogos, analistas, engenheiros, etc.), conseguimos ter uma boa dinâmica pedagógica em nossas aulas; com certeza, isso ocorre por serem aqueles professores os mesmos que, desde o início de nosso trabalho na Trend, vinham revendo sua postura diante dos alunos, convergindo para uma verdadeira mudança de paradigma educacional. Falar de profissionalização nos dias de hoje é algo extremamente delicado, pois a única coisa que podemos garantir nesta área é que as exigências do mercado de trabalho atual serão quase que obsoletas dentro de 2 ou 3 anos. Logo fica claro que é necessário oferecer um plano de curso bastante abrangente e, mais ainda, capacitar nosso alunos a conseguirem se adaptar às mudanças que estão por vir. O que nos cabe, como educadores que somos, é saber que estaremos sempre diante de obstáculos, que nunca estaremos prontos, e que crescemos a cada dia. Com nossas experiências e com as de nossos alunos. Ou seja, cada professor deve ser um eterno aprendiz. O QUE É INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO José Armando Valente O termo "Informática na Educação” tem assumido diversos significados dependendo da visão educacional e da condição pedagógica em que o computador é utilizado. No entanto, o MEC-PROINFO ao longo da sua história de atuação nessa área, tem muito peculiar e, portanto, merece ser explicitada. Em linhas gerais, a Informática na educação significa a inserção do computador no processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos curriculares de todos os níveis e modalidades da educação. Os assuntos de uma determinada disciplina da grade curricular são desenvolvidos por intermédio do uso do computador. Uma vez isso posto, a primeira distinção que é necessário explicitar é que essa visão elimina o uso do computador para ensinar conteúdos de ciência da computação ou “alfabetização em informática”. Nesse caso, o aluno usa o computador para adquirir conceitos computacionais, como princípios de funcionamento do computador, noções de programação e implicações sociais do computador na sociedade. Essa abordagem tem sido bastante divulgada e é a solução que muitas escolas encontram para o uso do computador na educação. Para tanto, o atual currículo é incrementado com uma disciplina de "Introdução à Informática" cujo objetivo é ensinar sobre computação. Certamente isso permitirá ao aluno conhecer o computador. Porém, do ponto de vista educacional, isso não altera o modo como os conteúdos das outras disciplinas são ministrados. Portanto, a Informática na Educação significa o desenvolvimento do conteúdo de disciplinas curriculares por intermédio do computador. Por exemplo, o conteúdo de uma determinada série pode ser desenvolvido integrando o computador aos métodos tradicionais que o professor usa. No entanto, isso pode ser feito pelo próprio professor da disciplina como por um especialista em informática cuja missão é desenvolver as atividades de uso de computador na escola. escola. Em geral, a presença do especialista em informática na educação tem sido adotada por escolas que deseja ter o computador implantado nas atividades educacionais, mas não estão interessados em resolver as dificuldades que a inserção do computador na disciplina normalmente acarreta como a alteração do esquema de aulas, ou investir na formação dos professores das disciplinas. A Informática na educação que o MECPROINFO tem adotado enfatiza o fato de o professor da disciplina curricular ter conhecimento sobre os potenciais educacionais do computador e ser capaz de alterar adequadamente atividades tradicionais de ensino-aprendizagem e atividades que usam o computador. No entanto, a atividade de uso do computador pode ser feita tanto para continuar transmitindo a informação para o aluno e, portanto, para reforçar o processo instrucionista, quanto para criar condições do aluno construir seu conhecimento. EDUCAÇÃO E INFORMÁTICA CRIANDO AMBIENTES INOVADORES Fernando José Almeida Fernando Moraes Fonseca Júnior Pedagoga da Pergunta No início, os alunos ficam estáticos perante unia espécie de fascínio exercido pelo computador. Alguns se imobilizam e outros, mais afoitos, saem descontrolados, em busca da solução dos problemas sem considerar a existência de outros à sua volta. Estes inibem mais ainda os que têm uma ceda paralisia diante do mundo da tecnologia da Informática. Cabe ao professor, diante desses dois extremos, ter a sabedoria de estimular o clima de cooperação e de autoconfiança da classe. O velho Sócrates já dizia que, se soubermos fazer as perguntas corretas, as pessoas aparentemente mais ignorantes poderão mostrar que tudo sabem. O aluno adquire autoconfiança ao ser perguntado sobre seus processos mentais e ao ser valorizado enquanto os realiza. O aluno aprende que as suas idéias se tornam imensamente enriquecidas quando ele ouve a do outro, mesmo que seja para duvidar do que ele disse. Ao ter que explicitar para o professor ou provar para o colega, ele aprende mais. Contar passo a passo o seu trajeto mental auxilia-o a aprender como se aprende. O que só acontece quando se é provocado e estimulado a tal. Saber criar o clima de autoconfiança, de aprendizagem conjunta, de respeito à idéia do outro, é tão importante quanto lançar questões instigadoras e situá-las dentro de ricos contextos de aprendizagem. Note alguns dos procedimentos criados pelo professor para desenvolver um ambiente adequado de aprendizagem: • exige dos alunos que explicitem os pensamentos que utilizaram para responder às questões; • implementa sugestões para que se vá adiante nos raciocínios; • lança dúvidas em cima de dúvidas; • admite e estimula outros caminhos inesperados para a solução do problema; • pede que o aluno, explicite o percurso mental que usou para dar as respostas de forma intuitivas ou muito rápidas; • leva o aluno aperceber que pode haver múltiplas hipóteses: "E se isso for assim... e se for de outro modo... e se tentarmos por ali..." Mas não se trata apenas de instigar os alunos à cooperação e à reflexão sobre seus processos mentais. Há funções mais complexas ainda nas atividades dos professores. Historiar as questões que a humanidade se colocou, fornecer o chão da História, mostrar as contribuições das demais áreas do saber para o aprendizado das Ciências: tudo significa criar ambiente de aprendizagem. Insatisfeito consigo mesmo, o aluno irá buscar informações e o processo de curiosidade científica se instaurará. Esse professor terá formado no aluno o embrião do investigador. O aluno aprenderá também a duvidar do que já aprendeu e entenderá que a Ciência constrói modelos que explicam temporariamente a verdade. Não está acabada e é uma construção coletiva dos homens a partir de muito esforço de pequenas pesquisas, nunca suficientes para explicar toda a verdade. Revigoramento do papel do professor Apoiado pelas exigências das novas tecnologias, o fim do século exige um redimensionamento da função o do professor. A nova dimensão é mais nobre ainda e muito mais complexa. Não é o mestre distante e autoritário. Não é mero técnico que domina conteúdos específicos e imutáveis. Não é o tio ou tia que compreendem, apoiam ou se condoem com os problemas dos jovens, discutindo e ajudando-os a resolver suas dificuldades psicológicas. É o professor, um profundo conhecedor de uma área do conhecimento e das áreas correlatas. Tem uma visão de conjunto do que é sociedade, marcando o seu trabalho com forte dimensão política, estética e ética. Conhecer os processos mentais pelo qual o aprendiz passa é condição básica para ser um professor. O professor que ensino a trabalhar em conjunto é também alguém que trabalha com os demais professores na construção de projetos em parcerias com diferentes áreas e com diferentes agentes sociais. Se há décadas bastava ser competente em uma das habilidades descritas, agora, a complexidade da tarefa é muito maior. Por isso, o domínio de técnicas inovadoras e a atualização contínua de conhecimentos fazem parte de sua rotina de trabalho. Nesse sentido, o professor é mais importante que nunca no processo de aprendizagem. Imaginar que o computador é algo que dispensará o professor pela quantidade e qualidade do softwares que virão a existir é uma idéia superada, que veio à luz num momento da história da Educação em que não se conhecia exatamente as possibilidades da máquina. Muito menos se sabia qual era a mais nobre função do professor educador: um criador de ambientes de aprendizagem e de valorização do educando. POR QUÊ O COMPUTADOR NA EDUCAÇÃO José Armando Valente Introdução Foi dito no capítulo anterior que o computador está propiciando uma verdadeira revolução no processo de ensino-aprendizagem. Uma das razões dessa revolução é o fato de ele ser capaz de ensinar. Entretanto, o que transparece, é que a entrada dos computadores na educação tem criado mais controvérsias e confusões do que auxiliado a resolução dos problemas da educação. Por exemplo, o advento do computador na educação provocou o questionamento dos métodos e da prática educacional. Também provocou insegurança em alguns professores menos informados que receiam e refutam o uso do computador na sala de aula. Entre outras coisas, esses professores pensam que serão substituídos pela máquina. Além disso, o custo financeiro para implantar e manter laboratórios de computadores exige que os administradores adicionem alguma verba ao já minguado orçamento da escola. Finalmente, os pais exigem o uso do computador na escola, já que seus filhos, os futuros membros da sociedade do século 21, devem estar familiarizados com essa tecnologia. Tendo em mente esse panorama, talvez um pouco exagerado mas, não impossível, as perguntas mais comuns e naturais que se faz são: que benefícios serão conseguidos com a introdução do computador na educação? ou, por quê usar o computador na educação? Existe realmente algum benefício auferido ou é uma questão de modismo? A posição defendida nesse capítulo é a de que o computador pode provocar uma mudança de paradigma pedagógico. Como foi discutido no capítulo anterior, existem diferentes maneiras de usar o computador na educação. Uma maneira é informatizando os métodos tradicionais de instrução. Do ponto de vista pedagógico, esse seria o paradigma instrucionista. No entanto, o computador pode enriquecer ambientes de aprendizagem onde o aluno, interagindo com os objetos desse ambiente, tem chance de construir o seu conhecimento. Nesse caso, o conhecimento não é passado para o aluno. O aluno não é mais instruído, ensinado, mas é o construtor do seu próprio conhecimento. Esse é o paradigma construcionista onde a ênfase está na aprendizagem ao invés de estar no ensino; na construção do conhecimento e não na instrução. Entretanto, a questão ainda é: como e por quê o computador pode provocar a mudança do instrucionismo para o construcionismo? Será que o computador não está sendo usado como uma grande panacéia educacional, como tantas outras soluções já adotadas? E tudo não continuou exatamente como era? Quantas vezes essa mudança pedagógica já não foi proposta? As Visões Céticas e Otimistas da Informática em Educação A introdução de uma nova tecnologia na sociedade provoca, naturalmente, uma das três posições: ceticismo, indiferença ou otimismo. A posição dos indiferentes é realmente de desinteresse ou apatia: eles aguardam a tendência que o curso da tecnologia pode tomar e aí, então, se definem. Já, as visões cética e otimista, são mais interessantes para serem discutidas. Elas nos permitem assumir uma posição mais crítica com relação aos novos avanços tecnológicos. São essa duas visões que serão discutidas a seguir. A Visão Cética Os argumentos dos céticos assumem diversas formas. Um argumento bastante comum é a pobreza do nosso sistema educacional: a escola não tem carteiras, não tem giz, não tem merenda e o professor ganha uma miséria. Nessa pobreza, como falar em computador? De fato a escola e o sistema educacional não têm recebido a atenção que merecem, não têm recebido recursos financeiros e se encontram paupérrimos. No entanto, melhorar somente os aspectos físicos da escola não garante uma melhora no aspecto educacional. Valorizar o salário do professor certamente contribui para uma melhora do aspecto educacional, como já foi demonstrado com estudos realizados pela Câmara do Comércio BrasilEstados Unidos (1993). Entretanto, essa valorização salarial deve ser acompanhada de uma valorização da educação como um todo. Isso significa que a escola deve dispor de todos os recursos existentes na sociedade. Caso contrário a escola continuará obsoleta: a criança vive em um mundo que se prepara para o século 21 e freqüenta uma escola do século 18 (isso tanto a nível de instalações físicas como de abordagem pedagógica). Segundo, a valorização salarial não significa, necessariamente, que haverá uma mudança de paradigma pedagógico. Hoje, as mudanças do sistema de produção e dos serviços, as mudanças tecnológicas e sociais exigem um sujeito que saiba pensar, que seja crítico e que seja capaz de se adaptar às mudanças da sociedade. Como está descrito no capítulo 14 desse livro, essas mudanças já estão ocorrendo no sistema de produção e é um processo irreversível. Por isso, o aluno não pode mais ser visto como um depósito que deve estocar os conteúdos transmitidos pelo professor. A informação que está sendo transmitida certamente é obsoleta e essa postura passiva que é imposta ao aluno não o prepara para viver nem na sociedade atual, quanto mais na sociedade do século 21. Portanto, a melhoria do aspecto físico da escola e do salário do professor deve ser acompanhada de uma mudança pedagógica. Um outro argumento utilizado contra o uso do computador na educação é a desumanização que essa máquina pode provocar na educação. Esse argumento tem diversas vertentes. Uma delas é a possibilidade do professor ser substituído pelo computador. Com isso se eliminaria o contato do aluno com o professor e, portanto, o lado humano da educação. Esse receio é mais evidente quando se adota o paradigma instrucionista. Nesse caso, tanto o professor quanto o computador podem exercer a função de transmissores de fatos. Dependendo do professor, o computador pode facilmente ser mais vantajoso. Assim, se o professor se colocar na posição de somente passar informação para o aluno, ele certamente corre o risco de ser substituído. E será. Existem aí vantagens econômicas que forçarão essa substituição. Uma outra vertente desse argumento é o fato de a criança ter contato com uma máquina racional, fria, e, portanto, desumana, propiciando com isso a formação de indivíduos desumanos e robóticos. Os aficionados dos vídeo-jogos colaboram para que essa visão seja cada vez mais disseminada. No entanto, o que acontece hoje com o computador ou mesmo com o vídeo-jogo pode acontecer com outros artefatos como televisão, música, etc. Nesse caso, o problema em si não está no artefato, mas no estilo de vida e na personalidade do usuário desses artefatos. Segundo, o computador na educação não significa que o aluno vá usá-lo 10 ou 12 horas por dia. Nas melhores condições ele usará o computador uma hora por dia. Pensar que esse nível de exposição a algo considerado racional e frio, produzirá um ser robótico e desumano é subestimar a capacidade do ser humano. É atribuir ao ser humano a função de mero imitador da realidade que o cerca. Outros argumentos usados pelos céticos estão relacionados à dificuldade de adaptação da administração escolar, dos professores e dos pais à uma abordagem educacional que eles mesmo não vivenciaram. Esse, certamente, é o maior desafio para a introdução do computador na educação. Isso implica numa mudança de postura dos membros do sistema educacional e na formação dos administradores e professores. Essas mudanças são causadoras de fobias, incertezas e, portanto, de rejeição do desconhecido. Vencer essas barreiras certamente não será fácil porém, se isso acontecer, teremos benefícios tanto de ordem pessoal quanto de qualidade do trabalho educacional. Caso contrário, a escola continuará no século 18. A Visão Otimista Os entusiastas do uso do computador na educação apresentam outros argumentos. Esses argumentos nem sempre são tão convincentes. O otimismo é gerado por razões pouco fundamentadas, correndo o risco de provocar uma grande frustração, como já ocorreu com tantas outras soluções que foram propostas para a educação. Sem entrar nos detalhes de cada um dos argumentos, os mais comuns podem ser classificados como: - Modismo: outros países (estados ou cidades) ou outras escolas dispõem do computador na educação, portanto, nós também devemos adotar essa solução. Esse tipo de argumento é muito superficial e já foi causa de muitos erros implantados no sistema educacional. Certamente, as experiências existentes devem ser utilizadas, porém com muito senso crítico e não devem ser meramente copiadas. - O computador fará parte da nossa vida, portanto a escola deve nos preparar para lidarmos com essa tecnologia. Esse tipo de argumento tem provocado que muitas escolas introduzam o computador como disciplina curricular. Com isso o aluno adquire noções de computação: o que é um computador, como funciona, para que serve, etc. No entanto, esse argumento é falacioso. Primeiro, computador na educação não significa aprender sobre computadores, mas sim através de computadores. Segundo, existem muitos artefatos que fazem parte da nossa vida cuja habilidade de manuseio não foi adquirida na escola, por exemplo, o telefone, o rádio, a televisão. Somos capazes de manuseá-los muito bem e essa habilidade não foi adquirida na escola através de cursos sobre esses equipamentos. Por que o computador merece esse destaque dentre as tecnologias, a ponto de ser considerado objeto de estudo na escola? Se ele fará parte da nossa vida, como já ocorre, ele será simples, descomplicado, de modo que o usaremos sem saber que estamos usando um computador. Como ocorre com o telefone: usamos sem saber princípios de telefonia ou como funciona o telefone. O interesse em estudar esses objetos tecnológicos na escola deve ir além do simples fato de eles permearem a nossa vida. - O computador é um meio didático: assim como temos o retroprojetor, o vídeo, etc, devemos ter o computador. Nesse caso o computador é utilizado para demonstrar um fenômeno ou um conceito, antes do fenômeno ou conceito ser passado ao aluno. De fato, certas características do computador como capacidade de animação, facilidade de simular fenômenos, contribuem para que ele seja facilmente usado na condição de meio didático. No entanto, isso pode ser caracterizado como uma sub-utilização do computador se pensarmos nos recursos que ele oferece como ferramenta de aprendizagem. - Motivar e despertar a curiosidade do aluno. A escola do século 18 não consegue competir com a realidade do início do século 21 em que o aluno vive. É necessário tornar essa escola mais motivadora e interessante. Entretanto, esse tipo de argumento é preocupante e revela o descompasso pedagógico em que se encontra a escola atualmente. Primeiro, é assustador pensar que necessitamos de algo como o computador para tornar a escola mais motivadora e interessante. A escola deveria ser interessante não pelo fato de possuir um artefato mas, pelo que acontece na escola em termos de aprendizado e desenvolvimento intelectual, afetivo, cultural e social. Segundo, o computador como agente motivador pressupõe que a escola, como um todo, permaneça como ela é, que não haja mudança de paradigma ou de postura do professor. Nesse caso, o computador mais parece um animal de zoológico que deve ser visto, admirado, mas não tocado. O computador entra na escola como meio didático ou como objeto que o aluno deve se familiarizar, mas sem alterar a ordem do que acontece em sala de aula. O computador nunca é incorporado à prática pedagógica. Ele serve somente para tornar um pouco mais interessante e "moderno" o ambiente da escola do século 18. - Desenvolver o raciocínio ou possibilitar situações de resolução de problemas. Essa certamente é a razão mais nobre e irrefutável do uso do computador na educação. Quem não quer promover o desenvolvimento do poder de pensamento do aluno? No entanto, isso é fácil de ser falado e difícil de ser conseguido. Já foram propostas outras soluções que prometiam esses resultados, e até hoje a escola contribui muito pouco para o desenvolvimento do pensamento do aluno. Por exemplo, essa não é uma das razões pelas quais ensinamos matemática na escola? Por Quê se Ensina Matemática na Escola? As razões pelas quais se ensina matemática na escola não são diferentes das razões pelas quais se propõe o uso do computador na escola. De fato, Kline (1973) lista várias justificativas que podem ser sintetizadas: - Transmitir fatos matemáticos. Os conceitos matemáticos têm sido acumulados desde o ano 3.000 AC. Um indivíduo que se diz "escolarizado", necessariamente, deve conhecer alguns desses fatos. - Pré-requisito para o sucesso. Normalmente as profissões de maior destaque na nossa sociedade requerem o conhecimento matemático. Se o aluno deseja o status social que essas profissões propiciam, então é necessário "ser bom em matemática". - Beleza intrínseca à estrutura matemática. Os matemáticos se encantam com a estrutura matemática. O fato de um número mínimo de axiomas dar origem a um tipo de geometria ou de teoria dos números é impressionante como estrutura lógica. Essa beleza e o poder mental que a construção dessa estrutura exige deveria ser transmitida aos alunos. A mesma satisfação que o matemático encontra em raciocinar e organizar o seu pensamento, segundo essas estruturas matemáticas, o aluno deveria encontrar em resolver um problema. - Valores práticos. A matemática auxilia o homem a entender e dominar o mundo físico e, até certo ponto, o mundo econômico e social. A descrição precisa do que acontece ao nosso redor é feita em termos da matemática ou de um sistema simbólico que tem características matemáticas. - Treino da mente. Mais uma vez, a razão nobre e irrefutável ou seja, propiciar o desenvolvimento disciplinado do raciocínio lógico-dedutivo. A própria origem da palavra "matemática" significa a técnica (tica) de entender ou compreender (matema). Portanto, fazer matemática exige, necessariamente, o desenvolvimento de habilidades ou técnicas de pensamento ou raciocínio. Entretanto, quando observamos o que acontece com o ensino de matemática na escola notamos que o argumento nobre, o desenvolvimento do raciocínio lógicodedutivo, não é o subproduto mais comumente encontrado. Muito pelo contrário. Aprender matemática ou fazer matemática é sinônimo de fobia, de aversão à escola e, em grande parte, responsável pela repulsa ao aprender. Assim, o que foi introduzido no currículo como um assunto para propiciar o contato com a lógica, com o processo de raciocínio e com o desenvolvimento do pensamento, na verdade acaba sendo a causa de tantos problemas relacionados com o aprender. Será que o mesmo não pode ocorrer com o computador? Quem pode garantir que o que acontece hoje com a matemática não acontecerá amanhã com o computador? Será que o argumento que o computador na sala de aula propiciará o desenvolvimento do raciocínio não é a mesma versão do que está acontecendo atualmente com o ensino de matemática? Não será mais uma desculpa para introduzirmos essa tecnologia na escola sem obtermos os resultados que nos propomos atingir? Antes de responder a essas questões, vale a pena entender um pouco melhor o que acontece com o ensino de matemática na escola. O desenvolvimento do raciocínio lógicodedutivo e a apreciação da beleza da estrutura matemática ocorre realmente com o matemático. Isso por que ele está fazendo matemática. E quando o matemático faz matemática ele está criando, raciocinando, um processo que pode ser caracterizado como: "O matemático diz A, escreve B, pensa C, mas D é o que deveria ser. E D é de fato uma idéia esplêndida que emerge do processo de organizar a confusão." (Kline, 1973;p. 58) O processo de fazer matemática, ou seja, pensar, raciocinar, é fruto da imaginação, intuição, "chutes" sensatos, tentativa e erro, uso de analogias, enganos e incertezas. A organização da confusão significa que o matemático desenvolveu uma seqüência lógica, passível de ser comunicada ou colocada no papel. No entanto, o que o aluno faz quando faz matemática é muito diferente do processo de organização da confusão mental. Ao contrário, o fato matemático é passado ao aluno como algo consumado, pronto, que ele deve memorizar e ser capaz de aplicar em outras situações que encontrar na vida. Como isso nem sempre acontece, o aluno fracassa e, portanto, é o responsável pelo fracasso da matemática. E essa culpa é somente do aluno. Não é da matemática, pois, mesmo sendo muito difícil, ela tem que ser passada ao aluno. Não existe outra maneira. Nem é do professor, já que este se esmera o máximo possível em passar o conceito matemático, adota a melhor didática possível, uma aula magnífica, tudo perfeito. Portanto, se o aluno não consegue aplicar o conceito já visto na resolução de um problema então, a culpa é do aluno. Entretanto, as razões pelas quais o aluno fracassa são diversas. Primeira, o fato de o aluno não ter construído o conceito, mas esse ter sido passado ao aluno. Nesse caso não houve a apropriação do conceito e sim a sua memorização. Segundo, mesmo que houvesse a apropriação do conceito num determinado contexto, a aplicação desse conceito em um outro contexto deve ser encarada como uma outra questão. A transferência do conhecimento não ocorre automaticamente. Enquanto o conceito é frágil, ele deve ser reconstruído no outro contexto ao invés de simplesmente reaplicado. Essa reconstrução tem a finalidade de "encorpar" o conceito, de modo que esse possa ser usado na resolução de diferentes problemas (Valente, 1993). Terceiro, o fato de o aluno não ter chance de adquirir o conceito matemático está relacionado também com a própria matemática. Os conceitos matemáticos são complicados, a notação matemática se tornou complexa, dificultando o pensamento matemático e o exercício do raciocínio. A complexidade da notação matemática tem feito com que o ensino da matemática seja reduzido ao domínio da própria notação. A notação se tornou objeto de estudo. Com isso a matemática deixa de exercitar o raciocínio para valorizar o ensino da notação que o matemático usa para expressar o raciocínio. Assim, o aluno adquire técnicas de como resolver uma equação do primeiro ou do segundo graus e nunca o processo de "fazer matemática", ou seja, pensar sobre um problema, cuja solução pode ser expressa segundo uma equação matemática e resolvida através da técnica de resolução de equações. Ao aluno só é fornecida a segunda parte do processo. Isso porque, primeiro, é difícil o professor prever os problemas que o aluno poderá encontrar na vida e, assim, usar esses problemas como objeto de estudo. Isso faz com que o professor se limite à técnica, esperando que o aluno, no futuro, consiga aplicar essas técnicas à solução dos problemas que encontrar. Segundo, mesmo quando algum problema é utilizado, esse problema é "fabricado", no sentido de facilitar a explicação de um determinado conceito. Quando o problema não advém do aluno, é difícil fazê-lo motivar-se e interessar-se por um problema simulado que não lhe diz respeito. A solução para evitar o ensino das técnicas matemáticas tem sido o uso de material pedagógico. O aluno manuseia um material que propicia o desenvolvimento de conceitos matemáticos. No entanto, esse tipo de atividade constitui a primeira parte do processo de fazer matemática. A solução do problema proposto pelo material pedagógico nem sempre é formalizada e expressa segundo a notação matemática. Sem essa formalização do conceito o aluno não tem a chance de sintetizar suas idéias, colocá-las no papel, compará-la com outras soluções, verificar sua validade, etc. Portanto, esse tipo de ensino também é incompleto. Ele tem a vantagem de desenvolver o raciocínio, mas não o de expressar o raciocínio segundo uma notação precisa e não ambígua. É importante notar que o que ocorre com o ensino de matemática não é diferente do que ocorre com o ensino de outras disciplinas. Por exemplo, a disciplina de Português também é reduzida ao ensino de técnicas. Ensina-se gramática, análise léxica, sintática, etc, mas nunca a expressão do pensamento segundo a língua Portuguesa. Isso somente aconteceu quando os exames vestibulares passaram a enfatizar a comunicação do pensamento. Mesmo nesse caso, essa comunicação foi reduzida à técnica: como fazer uma descrição, uma narração, ou um conto. O conteúdo da comunicação é outra história! O mesmo acontece com disciplinas que não fazem parte do currículo, como por exemplo a Música. O aprendiz passa nove anos no conservatório adquirindo técnicas de domínio do instrumento e da notação musical. Pouca ou nenhuma ênfase é dada ao processo de composição de uma peça musical: a expressão de uma idéia segundo a notação musical. Esses exemplos mostram que a razão pela qual o ensino ficou reduzido à aquisição de técnicas também está relacionado com a complexidade das diferentes notações utilizadas para representar o processo de pensamento. Isso não significa que as técnicas não tenham importância no processo de aprendizagem, mas sim, que uma coisa não deve ser explorada em detrimento da outra. Além disso, o ensino tradicional de matemática vê a técnica desvinculada do conceito, enquanto que a compreensão da técnica só ocorre quando o aluno compreender os conceitos matemáticos a que ela se refere. Portanto, a mudança do paradigma educacional deve ser acompanhado da introdução de novas ferramentas que devem facilitar o processo de expressão do nosso pensamento. Esse é um dos papéis do computador. O Computador na Educação Como foi descrito no capítulo anterior, o computador pode ser usado na educação como máquina de ensinar ou como ferramenta. O uso do computador como máquina de ensinar consiste na informatização dos métodos de ensino tradicionais. Do ponto de vista pedagógico esse é o paradigma instrucionista. Alguém implementa no computador uma série de informações, que devem ser passadas ao aluno na forma de um tutorial, exercício-e-prática ou jogo. Entretanto, é muito comum encontrarmos essa abordagem sendo usada como uma abordagem construtivista, ou seja, para propiciar a construção do conhecimento na "cabeça" do aluno. Como se os conhecimentos fossem tijolos que devem ser justapostos e sobrepostos na construção de uma parede. Nesse caso, o computador tem a finalidade de facilitar a construção dessa "parede", fornecendo "tijolos" do tamanho mais adequado, em pequenas doses e de acordo com a capacidade individual de cada aluno, como pode ser ilustrado pelo esquema abaixo. Embora, nesse caso o paradigma pedagógico ainda seja o instrucionista, esse uso do computador tem sido caracterizado, erroneamente, como construtivista, no sentido piagetiano. Piaget observou que a criança constrói a noção de certos conceitos porque ela interage com objetos do ambiente onde ela vive. Essa interação propicia o desenvolvimento de esquemas mentais e, portanto, o aprendizado. Entretanto, esse desenvolvimento é fruto do trabalho mental da criança e não de um processo de ensino ou transmissão de informação, como se essa informação fosse um "tijolo" que se agrega a outros, contribuindo para a construção de uma noção maior. Com o objetivo de evitar essa noção errônea sobre o uso do computador na educação, Papert denominou de construcionista a abordagem pela qual o aprendiz constrói, através do computador, o seu próprio conhecimento. O Paradigma Construcionista A construção do conhecimento através do computador tem sido denominada por Papert de construcionismo (Papert, 1986). Ele usou esse termo para mostrar um outro nível de construção do conhecimento: a construção do conhecimento que acontece quando o aluno constrói um objeto de seu interesse, como uma obra de arte, um relato de experiência ou um programa de computador. Na noção de construcionismo de Papert existem duas idéias que contribuem para que esse tipo de construção do conhecimento seja diferente do construtivismo de Piaget. Primeiro, o aprendiz constrói alguma coisa ou seja, é o aprendizado através do fazer, do "colocar a mão na massa". Segundo, o fato de o aprendiz estar construindo algo do seu interesse e para o qual ele está bastante motivado. O envolvimento afetivo torna a aprendizagem mais significativa. Entretanto, na minha opinião, o que contribui para a diferença entre essas duas maneiras de construir o conhecimento é a presença do computador — o fato de o aprendiz estar construindo algo através do computador (computador como ferramenta). O uso do computador requer certas ações que são bastante efetivas no processo de construção do conhecimento. Quando o aprendiz está interagindo com o computador ele está manipulando conceitos e isso contribui para o seu desenvolvimento mental. Ele está adquirindo conceitos da mesma maneira que ele adquire conceitos quando interage com objetos do mundo, como observou Piaget. Papert denominou esse tipo de aprendizado de "aprendizado piagetiano" (Papert, 1980). No entanto, após mais de uma década de uso do Logo com alunos do 1º e 2º graus (ver os demais artigos nesse livro) e na educação especial (Valente, 1991a), nós aprendemos por que essa interação com o computador propicia um ambiente riquíssimo e bastante efetivo do ponto de vista de construção do conhecimento. Para explicar o que acontece nessa interação com o computador vou me concentrar, inicialmente, no aspecto gráfico do Logo. Em seguida, essa idéias serão expandidas para outras modalidades de uso do computador como ferramenta . Quando o aluno usa o Logo gráfico para resolver um problema, sua interação com o computador é mediada pela linguagem Logo, mais precisamente, por procedimentos definidos através da linguagem Logo de programação. Essa interação é uma atividade que consiste de uma ação de programar o computador ou de "ensinar" a Tartaruga a como produzir um gráfico na tela. O desenvolvimento dos procedimentos se inicia com uma idéia de como resolver o problema ou seja, como produzir um determinado gráfico na tela. Essa idéia é passada para a Tartaruga na forma de uma seqüência de comandos do Logo. Essa atividade pode ser vista como o aluno agindo sobre o objeto "computador". Entretanto, essa ação implica na descrição da solução do problema através dos comandos do Logo (procedimentos Logo). O computador, por sua vez, realiza a execução desses procedimentos. A Tartaruga age de acordo com cada comando, apresentando na tela um resultado na forma de um gráfico. O aluno olha para a figura que está sendo construída na tela e para o produto final e faz uma reflexão sobre essas informações. Esse processo de reflexão pode produzir diversos níveis de abstração, os quais, de acordo com Piaget (Piaget, 1977 e Mantoan, 1991), provocará alterações na estrutura mental do aluno. O nível de abstração mais simples é a abstração empírica, que permite ao aluno extrair informações do objeto ou das ações sobre o objeto, tais como a cor e a forma do objeto. A abstração pseudo-empírica permite ao aprendiz deduzir algum conhecimento da sua ação ou do objeto. A abstração reflexiva permite a projeção daquilo que é extraído de um nível mais baixo para um nível cognitivo mais elevado ou a reorganização desse conhecimento em termos de conhecimento prévio (abstração sobre as próprias idéias do aluno). O processo de refletir sobre o resultado de um programa de computador pode acarretar uma das seguintes ações alternativas: ou o aluno não modifica o seu procedimento porque as suas idéias iniciais sobre a resolução daquele problema correspondem aos resultados apresentados pelo computador, e, então, o problema está resolvido; ou depura o procedimento quando o resultado é diferente da sua intenção original. A depuração pode ser em termos de alguma convenção da linguagem Logo, sobre um conceito envolvido no problema em questão (o aluno não sabe sobre ângulo), ou ainda sobre estratégias (o aluno não sabe como usar técnicas de resolução de problemas). A atividade de depuração é facilitada pela existência do programa do computador. Esse programa é a descrição das idéias do aluno em termos de uma linguagem simples, precisa e formal. Os comandos do Logo gráfico são fáceis de serem assimilados, pois são similares aos termos que são usados no dia-a-dia. Isso minimiza a arbitrariedade das convenções da linguagem e a dificuldade na expressão das idéias em termos dos comandos da linguagem. O fato de a atividade de programação em Logo propiciar a descrição das idéias como subproduto do processo de resolver um problema, não é encontrada em nenhuma outra atividade que realizamos. No caso da interação com o computador, à medida que o aluno age sobre o objeto, ele tem, como subproduto, a descrição das idéias que suportam suas ações. Além disso, existe uma correspondência direta entre cada comando e o comportamento da Tartaruga. Essas características disponíveis no processo de programação facilitam a análise do programa de modo que o aluno possa achar seus erros (bugs). O processo de achar e corrigir o erro constitui uma oportunidade única para o aluno aprender sobre um determinado conceito envolvido na solução do problema ou sobre estratégias de resolução de problemas. O aluno pode também usar seu programa para relacionar com seu pensamento em um nível metacognitivo. Ele pode analisar seu programa em termos de efetividade das idéias, estratégias e estilo de resolução de problema. Nesse caso, o aluno começa a pensar sobre suas próprias idéias (abstração reflexiva). Entretanto, o processo de descrever, refletir e depurar não acontece simplesmente colocando o aluno em frente ao computador. A interação aluno-computador precisa ser mediada por um profissional que conhece Logo, tanto do ponto de vista computacional, quanto do pedagógico e do psicológico. Esse é o papel do mediador no ambiente Logo. Além disso, o aluno como um ser social, está inserido em um ambiente social que é constituído, localmente, pelo seus colegas, e globalmente, pelos pais, amigos e mesmo a sua comunidade. O aluno pode usar todos esses elementos sociais como fonte de idéias, de conhecimento ou de problemas a serem resolvidos através do uso do computador. As ações que o aluno realiza na interação com o computador e os elementos sociais que permeiam e suportam a sua interação com o computador estão mostrados no diagrama abaixo. Construcionismo X Construtivismo Por quê é necessário um outro termo para definir o tipo de aprendizado que acontece no ambiente Logo ou, mais precisamente, com o Logo gráfico? Uma das razões, como já foi mencionado anteriormente, é o fato de a interação aluno-objeto ser mediada por uma linguagem de programação. Através dessa linguagem o aluno pode descrever suas idéias, o computador pode executar essa descrição e o aluno pode depurar a sua idéia original tanto em termos de conceitos quanto de estratégias. Essas características adicionam uma outra dimensão à já conhecida interação com objetos que Piaget observou e descreveu como fonte do processo de construção do conhecimento. Uma outra razão é o fato de a interação aluno-computador ser mediada por um profissional que conhece Logo - o mediador. No caso dos estudos de Piaget, a criança interagindo com um objeto era observada por um experimentador cuja função era a de usar o método clínico para entender, o melhor possível, as estruturas mentais da criança. O experimentador não é professor e, portanto, ele não tem por objetivo prover ou facilitar a aprendizagem.Por outro lado, no ambiente Logo, o mediador tem que entender as idéias do aluno e tem que intervir apropriadamente na situação de modo a ser efetivo e contribuir para que o aluno compreenda o problema em questão. Assim, a atuação do mediador vai além do uso do método clínico ou da investigação sobre as estruturas mentais do aluno. O mediador tem que intervir e a questão é: como? Esse tem sido o maior desafio dos profissionais que trabalham com o Logo. Entretanto, o modelo que melhor descreve como o mediador deve atuar é fornecido por Vygotsky. Segundo esse modelo o mediador é efetivo quando ele age dentro da Zona Proximal de Desenvolvimento (ZPD), definida por Vygotsky como "a distância entre o nível de desenvolvimento atual, determinado pela resolução de problema independente e o nível de desenvolvimento potencial determinado através da resolução de problema sob auxílio do adulto ou em colaboração com colegas mais capazes" (Vygotsky, 1978, p. 86). Isso significa que o mediador no ambiente Logo pode usar o método clínico piagetiano ou, simplesmente, observar o aluno para determinar o nível de desenvolvimento atual e o nível potencial de desenvolvimento. Entretanto, para que a sua intervenção seja efetiva, ele deve trabalhar dentro da ZPD. Se o mediador intervém no nível de desenvolvimento atual do aluno, o mediador está "chovendo no molhado" — o aluno já sabe o que está sendo proposto pelo mediador. Se, atuar além do nível potencial de desenvolvimento, o aluno não será capaz de entender o mediador. Certamente, a teoria da ZPD, não prescreve nenhuma receita de como o mediador deve atuar efetivamente no ambiente Logo. No entanto, ela mostra que o papel do mediador vai além do uso do método clínico piagetiano: a atividade do mediador é mais pedagógica do que psicológica (a de investigar a estrutura mental do aluno). Finalmente, no ambiente Logo o aluno está inserido em um contexto social e não está isolado da sua comunidade. Esse contexto social pode ser utilizado como fonte de suporte intelectual e afetivo ou mesmo de problemas contextuais para serem resolvidos, como Paulo Freire sugere (Freire, 1970). O aluno pode aprender com a comunidade bem como auxiliar a comunidade a identificar problemas, resolvê-los e apresentar a solução para a comunidade. Essa é abordagem que está sendo utilizada no Projeto Gênese, relativo ao uso do computador na educação e em desenvolvimento na Secretaria de Educação do Município de São Paulo (Valente, 1992; Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, 1992). Assim, o suporte teórico para a atividade que acontece no ambiente Logo não advém somente de Piaget. Outras teorias contribuem para explicar os outros níveis de interação e atividades que acontecem nesse ambiente de aprendizagem. Certamente, o objetivo desse capítulo, não é fazer uma análise teórica da interação aluno-computador no ambiente Logo mas sim, mostrar que os diferentes níveis de interação e as respectivas contribuições para o desenvolvimento intelectual do aluno vão além do construtivismo piagetiano. Entretanto, é importante lembrar que dependendo do tipo de trabalho que é realizado no ambiente Logo uma ênfase maior é colocada em uma ou em outra teoria. Por exemplo, em uma atividade de uso do Logo para investigar o desenvolvimento intelectual da criança, o aspecto piagetiano é mais enfatizado. Já, em um trabalho de uso do Logo por um grupo de alunos, os aspectos sociais das teorias de Freire e de Vygotsky se tornam mais enfatizados. De uma maneira geral, o construcionismo proposto por Papert é uma tentativa de melhor caracterizar a construção do conhecimento que acontece no ambiente Logo. A contribuição de cada uma dessas diferentes teorias é mostrada no diagrama abaixo. Construcionismo Transcende o Logo Gráfico As atividades que acontecem no ambiente Logo, principalmente com o Logo gráfico, são ideais para explicar o construcionismo de Papert. Entretanto, outros usos do computador como ferramenta (processamento de texto, planilhas) permitem a construção do conhecimento de acordo com a abordagem construcionista. Como foi mencionado anteriormente, a abordagem construcionista acontece quando usamos certos aspectos do Logo, como o Logo gráfico. Os comandos da linguagem são relativamente fáceis de serem aprendidos, a descrição da resolução de problemas espaciais em termos do Logo gráfico não é complicada, o resultado da execução do computador é uma figura, o que facilita a interpretação, a reflexão e a depuração. Em outros domínios do Logo, como processamento de listas, a descrição, reflexão e depuração não são tão simples de serem realizadas como no domínio do Logo gráfico. Primeiro, a descrição de processos recursivos não é um tipo de atividade do dia-a-dia. Segundo, a execução de procedimentos recursivos no processamento de listas é opaco, tornando difícil o acompanhamento do que o computador está realizando. No processamento de listas não existe uma entidade como a Tartaruga cujo comportamento tem uma correspondência direta com os comandos e procedimentos que estão sendo executados. Terceiro, no processamento de listas a reflexão não é auxiliada pelas ações do computador. A ausência da Tartaruga e os tipos de resultados que são obtidos como produto do processamento de listas torna difícil a interpretação do que acontece com os procedimentos e, portanto, com a descrição da resolução do problema. Assim, não é por mero acaso que o Logo gráfico é o domínio mais conhecido e usado do Logo! Por outro lado, isso não significa que o processamento de listas seja impenetrável. A compreensão das diferentes atividades que o aluno realiza no processamento de listas e como elas contribuem na construção do conhecimento tem nos levado a desenvolver recursos computacionais cujo objetivo é facilitar a aprendizagem construcionista nesse domínio do Logo. Por exemplo, para tornar as ações do computador menos opacas, foi desenvolvido um sistema computacional que mostra essas ações à medida que os comandos e procedimentos são executados, como as alterações dos valores das variáveis, as chamadas recursivas, etc. (ver capítulo 16 desse livro). Outras linguagens de programação podem ser analisadas segundo os mesmos critérios usados na análise do processamento de listas do Logo. O objetivo dessa análise é o de fornecer dados para verificar quando essa ferramenta facilita ou não a aprendizagem construcionista. Por exemplo, a linguagem Pascal apresenta as mesmas características do processamento de listas do Logo e, portanto, torna difícil a aprendizagem construcionista. Os comandos em Pascal são em inglês, dificultando sua assimilação; é necessário o domínio de certas estruturas de representação de dados (matrizes, listas) e de noções de algoritmo, para descrever a solução de um problema através do Pascal; os resultados da execução do programa, em geral, não são gráficos; e a depuração é bastante complicada: achar um erro em um programa escrito em Pascal é uma tarefa trabalhosa. Essas características fazem com que seja bastante difícil criar um ambiente de aprendizagem construcionista baseado no Pascal. Com os processadores de texto as dificuldades são de outra natureza. Se nós entendemos a edição de um texto como "ensinando" o texto para o computador, nós podemos incluir os processadores de texto no rol das ferramentas e, assim, analisá-las em termos da abordagem construcionista. Os processadores de texto atuais são bastante simples de serem utilizados e a descrição de idéias através deles é uma atividade que tem, praticamente, o mesmo grau de dificuldade apresentado no uso do lápis e papel. Entretanto, o resultado que é apresentado na tela consiste, simplesmente, da formatação do texto. O conteúdo do texto não é executado como é executado um programa escrito em Logo ou Pascal. Se o texto não é executado significa que não existe a interpretação do texto pelo computador, dificultando a verificação das idéias e como elas foram transmitidas para o computador. Para obtermos essas informações é necessário imprimir o texto, e solicitar a alguém que leia o texto e nos informe se o conteúdo do texto está claro ou não. A depuração das idéias e do texto somente poderão ser realizadas quando dispomos das informações do leitor. Mesmo nesse caso, as informações fornecidas sempre apresentam a visão do leitor e são parciais. É muito diferente do resultado oferecido pelo computador que ainda não sofre dos males que nós sofremos e não se altera quanto ao humor, disposição física e mental. Assim, para a criação de ambientes de aprendizagem baseados no computador onde o conhecimento é construído segundo a abordagem construcionista, é necessário que o software tenha certas características que facilitem as atividades de descrição, reflexão e depuração. Nas linguagens de programação são encontradas a maior parte dessas características, embora, dependendo da linguagem de programação utilizada, nós tenhamos essas atividades mais ou menos facilitadas. Entretanto, como foi muito bem observado, a programação atualmente não precisa ser vista como a explicitação de uma idéia em termos de uma seqüência de comandos de uma linguagem de computador (Ackermann, 1993). O processo de programação pode iniciar com uma idéia clara de como resolver um problema. Essa é a visão "hard" ou planejadora da atividade de programação (Turkle, 1984). Atualmente, existem ferramentas, como Paintbrush, que tornam a atividade de resolver um problema através do computador mais parecida com uma atividade de escultura. Essa é a visão "soft" de programação: a solução do problema emerge à medida que está sendo resolvido. Para tanto, à medida que as ações computacionais são selecionadas e executadas pelo computador, e satisfazem as exigências do problema, essas ações são armazenadas e, posteriormente, convertidas em um procedimento ou programa que resolve o problema em questão. Esse tipo de facilidade, incorporada às modernas ferramentas de programação, não é diferente do que acontece quando uma criança usa o Logo Simples com a opção de gravar suas ações (Valente e Valente, 1988). À medida que a criança comanda a Tartaruga, os comandos são armazenados em uma lista que poderá ser convertida, no final da atividade, em um procedimento. O rastro deixado na forma de uma lista de comandos pode ser visto como a descrição de uma idéia e pode ser usado na reflexão e na depuração da idéia. "Mondrian", um software desenvolvido por Lieberman (1992) possui essas características. Esse software auxilia a construção de figuras quadráticas na tela bastando para isso escolher ações de um menu, através do "mouse". Essas ações são armazenadas e transformadas em um procedimento. Esse procedimento pode ser convertido em um item do menu e usado na construção de outras figuras. Conclusões O objetivo desse capítulo foi o de responder às questões: por quê usar o computador na educação e como ser mais efetivo do ponto de vista educacional. O argumento para responder essas questões foi o de que o computador deve ser utilizado como um catalisador de uma mudança do paradigma educacional. Um novo paradigma que promove a aprendizagem ao invés do ensino, que coloca o controle do processo de aprendizagem nas mãos do aprendiz, e que auxilia o professor a entender que a educação não é somente a transferência de conhecimento, mas um processo de construção do conhecimento pelo aluno, como produto do seu próprio engajamento intelectual ou do aluno como um todo. O que está sendo proposto é uma nova abordagem educacional que muda o paradigma pedagógico do instrucionismo para o construcionismo. O objetivo da introdução do computador na educação não deve ser o modismo ou estar atualizado com relação às inovações tecnológicas. Esse tipo de argumentação tem levado a uma sub-utilização do potencial do computador que, além de economicamente dispendiosa, traz poucos benefícios para o desenvolvimento intelectual do aluno. Entretanto, a nova questão que se coloca é: como conseguir essa mudança? Parece que o sistema educacional, como um todo, resiste a essas mudanças. Existe uma tendência de se manter o paradigma instrucionista por razões de ordem histórica — foi assim que fomos educados é assim que devemos educar — ou pela falta de entendimento do que significa aprender ou ainda pela falta de experiência acumulada que possa comprovar a efetividade educacional do paradigma construcionista. Por outro lado, a análise dos resultados do paradigma instrucionista são desoladores: provocamos o êxodo do aluno da escola ou produzimos um educando obsoleto. Os que abandonam a escola engordam a fileira dos fracassados, dos que não conseguem aprender. Os obsoletos não conseguem acompanhar o desenvolvimento atual da sociedade, mais especificamente, não estão preparados para trabalhar no novo sistema de produção ou serviço que está emergindo na sociedade atual —sistema enxuto de produção de bens e de serviços. Esse sistema elimina excessos de estoques e perdas, e demanda um trabalhador ativo, criativo e capaz de participar do processo de produção ao invés de ser um executor de ordens, como é mencionado no Capítulo 14 desse livro. A falta de preparo para atuar na sociedade ou nos sistemas mais modernos de produção tem levado os profissionais a procurarem cursos sobre criatividade ou sobre o desenvolvimento da capacidade de pensar. Entretanto, esses cursos podem ser caracterizados como uma tentativa de transmitir uma série de técnicas de como ser criativo ou como pensar corretamente. Irônico! E não há outra maneira de ser. A capacidade de criar e de pensar não se constrói do dia para a noite. O desenvolvimento dessas habilidades é um processo longo que deve iniciar desde os primeiros dias de vida. De fato, como mostrou Piaget, ele inicia no momento do nascimento e prossegue até entrarmos na escola. É durante esse período que aprendemos a andar, falar e os princípios de matemática ou mesmo de ciência. Isso, sem sermos formalmente ensinados, fruto somente do aprendizado piagetiano, como denominou Papert. A escola e o paradigma instrucionista castram essa nossa habilidade de aprender sem ser ensinado e com isso nossa habilidade de criar e de pensar. Quando o adulto necessitar dessas habilidades seria ingênuo pensar que elas poderiam ser adquiridas como se adquire itens de um supermercado. No entanto, a mudança de paradigma educacional deve ser vista com algo que vai além da vontade política e econômica. Ela deve ser acompanhada da inclusão de ferramentas que permitam a implementação do paradigma construcionista. Os diferentes domínios da ciência estão cada vez mais sofisticados, exigindo notações e meios de expressão dos fenômenos desses domínios cada vez mais complicados e difíceis de serem assimilados. Como foi mostrado ao longo desse capítulo, essa dificuldade impossibilita o "fazer matemática" ou o "fazer música". É necessário usar uma ferramenta que facilite a expressão do raciocínio e a reflexão e a depuração do mesmo. O computador pode ser essa ferramenta. Entretanto, o computador para ser efetivo no processo de desenvolvimento da capacidade de criar e pensar não pode ser inserido na educação como uma máquina de ensinar. Essa seria a informatização do paradigma instrucionista. O computador no paradigma construcionista deve ser usado como uma ferramenta que facilita a descrição, a reflexão e a depuração de idéias. Isso é conseguido quando o computador é usado na atividade de programação e, ainda mais efetivamente, quando a linguagem de programação apresenta as características do Logo gráfico. Felizmente, no Brasil e em outros países da América Latina, diversos projetos relativos ao uso do computador na educação têm adotado a linguagem Logo e, procuram com isso, criar as condições para uma mudança de paradigma educacional. Por exemplo, o projeto de uso de computadores na educação na Costa Rica e na Venezuela (Valente, 1991), o Projeto Gênese na cidade de São Paulo (Valente, 1992; Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, 1992) e os projetos de uso do Logo na educação especial em mais de 50 centros na América Latina (Valente, 1991a). Além desses exemplos, cada vez mais, os esforços dos centros de pesquisa e dos centros formadores de professores devem ser na direção de promover a utilização do computador segundo o paradigma construcionista. Com isso estaremos aumentando nossa esperança de ter o computador usado segundo esse paradigma, ao invés do instrucionista, como está acontecendo com a maior parte dos países desenvolvidos. Se essa mudança de paradigma realmente for feita estaremos antecipando uma mudança que contribuirá para a nossa sobrevivência. O planeta não suporta mais o nível de produção que atingimos e os gastos e perdas de recursos naturais que ela acarreta. É necessário um outro método de produção de bens e de serviços, mais econômico, mais eficiente, com menos excessos e onde trabalhem profissionais capazes de criarem e pensarem. É para formar esse novo profissional que a mudança de paradigma educacional é necessária. Caso contrário, o tempo dirá. Referências Bibliográficas Ackermann, E. (1993) Comunicação Pessoal durante "The 10th International Conference on Technology and Education", Cambridge, Massachusetts. Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos (1993) Estudo para a Melhoria da Qualidade da Educação. São Paulo. Freire, P. (1970) Pedagogy of the Oppressed. The Seabury Press, New York. Kline, M. (1973) Why Johnny Can't Add: the failure of the new math. Vintage Books, New York. Lieberman, H. (1992) Mondrian: A Teachable Graphical Editor. Artigo não publicado. Visible Language Workshop, Massachusetts Institute of Technology Media Laboratory, Massachusetts. Mantoan, M. T. E. (1991) O Processo de Conhecimento - tipos de abstração e tomada de Consciência. NIED-Memo, Campinas, São Paulo(no prelo) Papert, S. (1986) Constructionism: A New Opportunity for Elementary Science Education. A proposal to the National Science Foundation, Massachusetts Institute of Technology, Media Laboratory, Epistemology and Learning Group, Cambridge, Massachusetts. Papert, S. (1980) Mindstorms: Children, Computers and Powerful Ideas. Basic Books, New York. Traduzido para o Português em 1985, como Logo:Computadores e Educação, Editora Brasiliense, São Paulo. Piaget, J. (1977) Recherches sur L'abstraction Réfléchissante. Études d'épistemologie génétique. PUF,tome 2, Paris. Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (1992) Projeto Gênese - A Informática Chega ao Aluno da Escola Pública Municipal. Relatório Técnico. Prefeitura do Município de São Paulo, São Paulo. Turkle, S. (1984) The Second Self: Computers and the Human Spirit. Simon and Schuster, New York. Valente, A.B. (1993) A Intransigência da Transferência de Conhecimento. A ser publicado na Acesso, FDE, São Paulo. Valente, J.A (1992) Logo and Freire's Educational Paradigm. Logo Exchange, 11 (1) 39-43. International Society for Technology in Education, Oregon. Valente, J.A (1991) Report from Latin America. Logo Exchange, 10 (2) 4345. International Society for Technology in Education, Oregon. Valente, J.A. org. (1991a) Liberando a Mente: Computadores na Educação Especial. Gráfica da UNICAMP, Campinas, São Paulo. Valente, J.A e Valente, A.B. (1988) Logo: Conceitos, Aplicações e Projetos. Editora McGraw-Hill, São Paulo. Vygotsky, L.S. (1978) Mind in Society: the development of higher psychological processes. Harvard University Press, Cambridge, Massachusetts. PROFESSORES E MÁQUINAS: UMA CONCEPÇÃO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO Paulo gileno Cysneiros Resumo Apresenta um modelo em construção, multidisciplinar, sobre a assimilação das tecnologias da informação (TI) pela escola pública, tendo como base uma análise fenomenológica da relação ser humano à tecnologia à mundo. Examina a história da tecnologia educativa e a trajetória cíclica de inovações passadas, que geravam elevadas expectativas, eram acompanhadas por um discurso sobre mudanças na educação, estabeleciam-se políticas de introdução, resultando com o tempo em uso limitado. Considera a possibilidade das TI diminuírem a distância entre a atividade mental na escola e no trabalho. Desenvolve o conceito de microculturas, formadas por grupos específicos de interesse, virtuais e reais. Examina a Internet na educação, o lugar do software educativo, a formação de professores, o ensino introdutório de informática na escola e o gerenciamento das TI em educação. Introdução Neste texto apresento um modelo em construção, procurando atender à necessidade de um ponto de vista multidisciplinar - unificador de enfoques diversos - que possa ser útil no processo de formação de professores para o uso das novas tecnologias da informação (TI), particularmente computadores ligados à Internet. Esta lacuna tornou-se mais evidente com a multiplicidade de cursos de especialização em Informática Educativa, uma das primeiras ações do Programa Nacional de Informática na Educação, ocorrendo simultaneamente em vários pontos do pais em 1997 e com a vulgarização de computadores em escolas particulares. Na primeira versão deste trabalho (1996), meu ponto de partida era uma objeção comum, que ouvi muitas vezes de professores que vivenciam diariamente os problemas da escola pública brasileira: como colocar computadores em uma escola que não possui condições materiais básicas, não tem pessoal de apoio nem professores capacitados e com tempo para usá-los? Nossas escolas públicas não possuem equipamentos mais básicos, tais como telefones, copiadora, fax. Alguns parcos equipamentos - geralmente um mimeógrafo a álcool, uma pequena televisão com videocassete, um gravador, um sistema de som - quando não estão quebrados são pouco ou mal utilizados e não tem manutenção. Embora estejam melhorando lentamente, nossas escolas - principalmente nos estados do norte e nordeste e na regiões rurais - ainda sofrem de males consideráveis. Servem a comunidades carentes que não a consideram como suas e apresentam mobiliário e instalações precárias e sem segurança. Não dispõem do recurso mais fundamental que é uma biblioteca atualizada razoável. Nas grandes cidades são ruidosas, quentes, escuras e tem pouco espaço físico, apresentando uma arquitetura desconfortável que dificulta o trabalho intelectual de alunos e mestres. Dependem excessivamente da administração central das redes, em contextos tradicionais de forte dependência da burocracia e das oscilações de quem estiver no poder. A escolha de professores e dirigentes escolares situa-se além da comunidade e do próprio secretário de educação, sendo moeda política controlada pelos mais votados no bairro ou na região, onde ética e competência profissional são fatores secundários. O professor típico nem sempre domina o conteúdo que ensina, encontra-se sobrecarregado com aulas em mais de uma escola, falta-lhe tempo para estudar e experimentar coisas novas, recebe baixos salários. É comum encontrarmos nas escolas casos incipientes de alcoolismo e um semi-absenteeísmo camuflado, com o professor evitando sempre que pode a sala de aula ou fazendo de conta que ensina, resultado de um esgotamento profissional prematuro. Existem as exceções. Algumas escolas tem boas instalações físicas e recebem atenção especial da rede (são as escolas-vitrines, para serem mostradas a visitantes ilustres e à mídia local). Outras possuem administradores excepcionais e um pequeno grupo de professores dedicados. Algumas outras recebem ajuda permanente de universidades, empresas ou organizações da comunidade. Algumas poucas redes estão em municípios com excepcionais recursos humanos e materiais. No entanto, um raciocínio linear - no sentido de resolver primeiro os problemas básicos para depois cuidar da tecnologia não é a melhor forma de abordar o problema. Basta lembrar que dois dos maiores projetos do atual governo federal envolvem o uso de tecnologias da informação: vídeo com antenas parabólicas em todas as escolas e instalação de cem mil computadores em redes públicas, com previsão de preparação de pessoal e manutenção de equipamentos, a um custo estimado em 476 milhões de dólares para o biênio 1997-1998 (Mec/Seed, 1996; www.proinfo.mec.gov.br/). Os alunos de escolas públicas estarão muito em breve no mercado de trabalho (muitos já estão) e serão os cidadãos das primeiras décadas do próximo século, onde o uso das TI será ainda mais corriqueiro, do chão de fábrica à universidade (Dimenstein, 1997). Tais alunos vem sendo discriminados também neste aspecto, uma vez que as escolas particulares estão oferecendo - embora quase sempre de modo superficial - acesso a computadores e à Internet. Uma Concepção Fenomenológica de Tecnologia Para evitarmos um pragmatismo sujeito a flutuações da moda, é importante o desenvolvimento de concepções teóricas coerentes que fundamentem o uso dessas tecnologias nas nossas escolas. Porém a teorização deve ser continuamente enriquecida pela prática (e vice-versa), para não cairmos no discurso acadêmico de quem não tem vivência do objeto nem na descrença daqueles que tem experiência mas não renovam suas concepções pragmáticas. No campo desta nova tecnologia educativa não vejo utilidade para concepções polarizadoras. O modo comum de encará-la como redentora da humanidade ou como um mal necessário em nada ajuda. Como base para um modelo viável, venho explorando a utilidade de partes do trabalho de Don Ihde (1979), numa perspectiva das filosofias da práxis. Baseando-se em Heidegger, Ihde faz uma análise fenomenológica do uso humano de ferramentas (denominada por ele de filosofia da instrumentação), a qual estou tentando aplicar aos instrumentos eletrônicos de manipulação do conhecimento usados nas escolas. A Fenomenologia tenta abordar os objetos do conhecimento tais como aparecem, isto é, tais como "se apresentam" à consciência de quem procura conhecê-los, tentando deixar de lado toda e qualquer pressuposição sobre a natureza desses objetos (Heidegger, 1996; Rezende, 1993; Chauí, 1995), Um dos primeiros passos neste sentido é tentar rever a experiência psicológica do óbvio, do cotidiano, cujo conhecimento é embotado pela familiaridade. Tal abordagem, embora pareça fácil, torna-se difícil pela enorme complexidade da experiência humana. Como diz um ditado, o peixe é o último a descobrir a água. Segundo Ihde, nossa experiência da realidade é transformada quando usamos instrumentos {Ser Humano à (máquina) à Mundo}. Através do instrumento há uma seleção de determinados aspectos da realidade, com ampliação e redução de outros. A amplificação é o aspecto mais saliente e pode nos deixar impressionados, maravilhados, ao passarmos a experimentar coisas que não faziam parte da nossa experiência anterior, com nossos sentidos nus. A redução, ao contrário, é recessiva e pode passar despercebida, alienando o usuário do instrumento. Em parte devido à novidade e ao aspecto dramático, parece ser difícil, para alguns adultos, como também para crianças em desenvolvimento intelectual e emocional (construindo representações fundamentais do mundo), fazer distinções claras entre ser humano e computador, antropomorfizando a máquina (algo que crianças pequenas fazem normalmente ao lidar com objetos bem menos reativos ou interativos). Para isto deve haver uma contribuição não desprezível da linguagem associada com Informática, vulgarizada pela ciência e pela mídia, cheia de termos e expressões como inteligência artificial, tutor ou professor eletrônico, agente inteligente, computadores infectados por vírus, vacinas, realidade virtual, voz sintetizada, "mandar" o computador fazer isso ou aquilo, o computador errou (ou não erra), horóscopo por computador, comandado por computadores, etc. Tal linguagem esconde o fato que por trás de qualquer ação da máquina existem ações humanas individuais ou coletivas, extremamente complexas, imediatas ou não. Assim, a conclusão de uma primeira análise fenomenológica superficial é que a tecnologia não é neutra, no sentido de que seu uso proporciona novos conhecimentos do objeto, transformando, pela mediação, a experiência intelectual e afetiva do usuário; possibilitando interferir, manipular, agir mental e ou fisicamente, sob novas formas, pelo acesso a aspectos até então desconhecidos do objeto. Dependendo do objeto, do sujeito (mais ou menos crítico), de sua história e da situação especifica (epistêmica), pode-se cair no exagero de considerar as novas características ampliadas do objeto (geralmente aspectos micro ou macro) como mais reais do que aquelas que aparecem, que são conhecidas sem a ajuda de instrumentos. Pode-se, assim, confundir as duas dimensões de continuidade (em essência o mesmo objeto) e diferença (conhecido parcialmente de outro modo) entre a percepção ordinária e aquela mediada pelo instrumento. Neste sentido, as realidades possibilitadas pelas novas tecnologias da informação podem ser alienantes, como nos relatos dos viciados em computadores. Usemos uma analogia simples: para quem nunca fez longas viagens por terra, o avião deforma, aliena a experiência individual de distância (entre países e cidades) e de todos os outros aspectos contextuais associados (paisagens, climas, topografias, características de outros meios de transporte, condições econômicas e sociais do percurso, etc.). Vejamos o exemplo do computador como instrumento de comunicação pela Internet (quando se usam programas tipo chat). A realidade selecionada é basicamente aquela da expressão escrita textual e eventualmente de algum material gráfico, produzidos pelos que se comunicam. Há ampliação da comunicação linear simultânea e da possibilidade do registro das trocas (memória eletrônica). A distância torna-se irrelevante, havendo redução do tempo de comunicação, dos aspectos não verbais da comunicação, do contexto da realidade concreta da interação face a face (entre outros). Uma análise fenomenológica mais detalhada mostraria muitos outros elementos, ampliados e reduzidos: facilidade de construção de respostas mais "pensadas", alterando a contingência do tempo de reação à fala do interlocutor; ausência do parceiro (ou parceiros simultâneos) no espaço pessoal de quem se comunica ou de quem recebe (todos estão nos seus espaços, "em casa", sem invasões e sem espaços "neutros"; segurança pessoal, possibilidade de interrupção brusca do diálogo ou de saída de uma dupla para outro espaço virtual; desconhecimento do espaço físico do interlocutor, ausência de cheiros e assim por diante. Em tais contextos é comum as pessoas esconderem do interlocutor ou alterarem aspectos pessoais como idade, aparência, situação social, idealizando, ao mesmo tempo, outros aspectos do parceiro conhecido apenas através do computador e de elementos contextuais muito limitados. Há também alteração do peso dos talentos pessoais: algumas pessoas se comunicam melhor por escrito do que oralmente. Outras, com dificuldades de relações humanas, consideram o instrumento eletrônico um meio de comunicação mais gratificante. Outro aspecto não desprezível é o caráter inicial dramático da realidade mediada pela nova tecnologia. Nos primeiros anos do cinema, por exemplo, as platéias em salas escuras tinham medo de cenas de trens que se aproximavam do espectador (confusão entre percepção ordinária e mediada). Atualmente a TV ainda goza do charme dramático da novidade, ao realçar formas e alterar perspectivas de rostos e de outros detalhes corporais; ao criar efeitos e modificar objetos e contextos televisionados, mostrando-os repetidamente, descobrindo ou inventando novas realidades. A mídia, a ficção - e mesmo alguns cientistas com formação humanista limitada - tem exagerado, há décadas, os aspectos dramáticos dos computadores, considerando-os máquinas "pensantes", dotadas de inteligência artificial. Um fenômeno interessante foi a extensa cobertura pela mídia, em 1996 e 1997, dos jogos entre o campeão mundial Garry Kasparov e o computador Deep Blue da IBM. Há tempo que computadores ganham das pessoas comuns, em jogos de xadrez, sem se fazer nenhum alarde. O xadrez é um jogo lógico que exige cálculos complexos rápidos, para se decidir sobre próximas jogadas, com base em jogadas passadas. Isto é algo que máquinas computacionais tem de sobra: memória lógica e capacidade de cálculo; em quantidade, rapidez e precisão bem maiores que o cérebro humano. Usando uma analogia, ninguém de bom senso mede forças nem sente-se inferiorizado por um guindaste que levanta dezenas de milhares de quilos, não havendo comparação com a capacidade muscular humana. Ninguém desafia tais máquinas, como foi o caso do enxadrista russo com o supercomputador da IBM. Diferentemente da inteligência, também não se fala em "força artificial". Neste incidente, parece-me que se caminha para uma situação de bom senso. Como no caso de guindastes, Gasparov percebeu que, em vez de lutar contra máquinas, a atitude mais inteligente é usá-las como extensão humana. Numa nova época do xadrez, ele e o campeão búlgaro Topalov se enfrentarão, contando ambos com a ajuda do software "Chessmaster 5500" durante os jogos em junho de 1998 na Espanha. Ainda assim, o efeito dramático aparece na mídia e nas declarações do jogador. Segundo uma revista semanal (Época, 1º de junho 1998, p.66), o russo declarou: "Vamos ver um exemplo do xadrez do século XXI: a perfeita simbiose entre o homem e a máquina" (analogamente, sem o efeito dramático, ninguém hoje refere-se "à perfeita simbiose entre maquinistas e poderosos guindastes portuários"). As máquinas baseadas na Informática são extremamente repetitivas, por mais inteligentes ou criativas que pareçam. Sempre existem, subjacentes, algoritmos matemáticos que controlam desempenhos de tarefas específicas. A ilusão de poder decisório, no sentido humano, é produto da operacionalização de conceitos matemáticos sofisticados, pouco acessíveis à pessoa comum. Eu não consigo sequer aceitar que tais máquinas sejam "burras", porque este conceito supõe atividade biológica inteligente, mesmo limitada. Neste sentido, Wallich (1997), comentando um livro que examina a concepção de computadores disseminada pelo filme "2001" há trinta anos atrás, comenta que muitos aspectos do cotidiano imaginado no filme de Stanley Kulbrick perderam-se de vista no horizonte tecnológico, não sendo mais surpresa que mesmo os talentos mais básicos do computador Hal 9000 (personagem principal do filme) - como por exemplo manter uma conversa simples com uma pessoa - estão muito além dos computadores modernos: "...Eles não conseguem sequer converter sons, de modo confiável, numa representação interna de significado; não conseguem nem mesmo gerar uma fala com entonação natural. As máquinas ainda carecem da enorme base de conhecimento implícito sobre o mundo e de compreensões intuitivas de emoção ou crença que a maioria das pessoas considera como algo dado" (p.96). Voltando à Educação, as tecnologias educacionais tem ampliado formas convencionais de atuação de professores. Rádio, cinema e televisão ampliavam a capacidade expositiva do professor, reduzindo a interação entre mestre e estudante. Havia enorme redução da presença do aprendiz na nova realidade do ensino à distância, tornando-o impessoal. O aluno tendia a tornar-se mais passivo e a ser considerado uma estatística, praticamente desaparecendo a relação humana com o professor, apesar dos artifícios de se usar monitores em salas de telecurso, de se incentivar o uso do correio físico e de outras formas mediadas de comunicação. Além de ampliar os sentidos, condicionando a experiência da realidade, as tecnologias do passado ampliavam a força humana, a capacidade de agir fisicamente na realidade concreta. Com as tecnologias da informática, amplificam-se aspectos da capacidade de ação intelectual. Talvez este aspecto explique em parte o mito - disseminado no início dos anos oitenta com a linguagem LOGO (Papert, 1985) e desde então reforçado pela mídia - que computadores desenvolvem a inteligência das crianças, apesar das pesquisas sérias não corroborarem tal coisa. O fato de "inteligência" ser um conceito amplo, uma realidade construída, não visível, um terreno fértil para interpretações enganosas, torna-se fácil disseminar a crença na sua ampliação pelo uso de instrumentos (diferentemente do que ocorre com ampliações da força física). Segundo Jean Piaget, não pensamos para agir. O pensamento já é uma forma de ação. Quando pensamos, usamos símbolos no lugar de objetos concretos e operações mentais no lugar de mãos, pés, ferramentas físicas. Entre outras vantagens adaptativas, isto nos liberta da matéria (peso, densidade, etc.), do tempo e do espaço físico, tornando-nos muito mais poderosos na interação com outros seres, com o ambiente. Ajudados por computadores, podemos ampliar nossa capacidade de construir e manipular símbolos, historicamente limitada pelo nosso pequeno cérebro, com o apoio de lápis, pincéis, papel e outras tecnologias mecânicas relativamente toscas. Podemos agora construir e armazenar eletronicamente enormes quantidades de objetos abstratos, relacioná-los, acessar tais memórias de modo extremamente rápido e organizado, amplificar a capacidade de calcular, em suma, agir simbolicamente com objetos de enorme complexidade física e lógico-matemática, em espaços e tempos virtuais. Estas formas de ampliação, repetimos, longe de serem neutras, são dramáticas. Produzem espanto e sentimentos confusos (por serem realidades novas para nós) e tendem a gerar desequilíbrios na interação entre ser humano e realidade física, social, etc., uma vez que as formas anteriores de interação foram historicamente construídas em contextos diferentes de equilíbrio de forças. Parafraseando um poemamúsica de Caetano Veloso, novas relações de força possibilitam construir e destruir coisas belas, sendo necessário algum tempo, muito erro e muita experiência para o desenvolvimento de novos equilíbrios. A nascente história das tecnologias da informação já nos mostra que poderosas formas de manipulação de dados tem alterado o conhecimento e a forma de realidades físicas, sociais, cognitivas, culturais, econômicas, possibilitando ações tanto benéficas como negativas. Por exemplo, a globalização das economias, através de computadores e das telecomunicações, ampliou oportunidades para novos negócios e empregos. Por outro lado, pela velocidade de tais transformações, os países em desenvolvimento, mais fracos, estão sendo vitimados pela incapacidade de competir com economias maduras e bem organizadas. Pela facilidade de transferência de grandes volumes de capitais, são vulnerais à especulação financeira internacional, como ficou patente com a recente crise das bolsas. A educação ainda não sofreu muito tal impacto, uma vez que as tecnologias da informação não foram desenvolvidas para lidar com as realidades dos sistemas educacionais. Mas o uso relativamente incipiente das TI na educação nos permite entrever a repetição da história. Voltando à análise das relações entre o real e o virtual em educação, façamos um esforço de reexame do óbvio, no espírito da Fenomenologia, sob a ótica de um hipotético professor de Geografia trabalhando com conceitos de espaço, inicialmente de forma descritiva, aparentemente mais simples. O que as tecnologias selecionam, amplificam, reduzem, no processo de conhecimento, pelo aprendiz, de representações de um determinado espaço e tempo? Partiremos do pressuposto que, para um ensino de qualidade, é necessário constantemente tentar assumir a perspectiva do aprendiz. Um ponto de referência do professor poderá ser a experiência do próprio espaço e das diferenças em relação ao aprendiz; dos espaços mais conhecidos de cada um e que servem de referências individuais. Essa deve ser a concepção fundamental de espaço, porque a mais natural, feita sem ajuda de instrumentos e no contexto da qual o ser humano evoluiu sua inteligência, inicialmente espaços limitados pela capacidade de mobilidade humana. A partir do seu espaço o aprendiz poderá imaginar e aprender sobre outros espaços, também conhecidos dele ou dela através de deslocamentos habituais, que fazem o cotidiano de cada um. A partir do espaço real, poderemos imaginar experiências virtuais dos espaços fundamentais, que possam ser cotejadas com experiências físicas pessoais: um mapa de seu bairro ou de sua cidade, do país, das fotos (tradicionais ou digitalizadas na Internet), ou de fotos ou descrições verbais constantes de catálogos de agências de viagem ou de órgãos das cidades que exploram o turismo. Noutro estágio, o conhecimento focado pela mídia, de espaços no tempo passado próximo. Com esta expressão me refiro aos tempos e espaços que estão na memória da comunidade, da coletividade, devido a acontecimentos extraordinários. Por exemplo, no tempo em que escrevo estas linhas (abril de 1998), os espaços da copa do mundo na França; do fenômeno meteorológico El Niño, relacionados com a seca e a fome no sertão nordestino. Tais espaços, num pequeno período de tempo (meses), tem sido mostrados e comentados repetidamente na televisão, em revistas e jornais, comentados entre pessoas. Alguns em todo o planeta, outros regionalmente. A indústria da propaganda de cada local tem feito promoções de viagens, camisas, bonés, diversas modas aplicadas a objetos do cotidiano, especialmente o vestuário. A TV tem mostrado a França focando as cidades onde serão realizados os jogos. Sempre aparecem alguns marcos conhecidos (a Torre Eiffel, enorme nos anúncios). Os materiais gráficos de promoção do turismo são sempre a cores, em papel brilhante e não mostram poluição no ar nem nas ruas. Os prédios são limpos e as perspectivas são deformadas, pelas lentes das cameras, para realçar pontos turísticos, comerciais e históricos. Os países do hemisfério Norte não são mostrados no ciclo das quatro estações. Em tais documentos geralmente é verão ou primavera, quando ocorre o maior fluxo de turistas. Excepcionalmente mostram-se cenas de inverno, quando ocorrem esportes desta estação. Neste caso mostram-se locais montanhosos. As exceções são os tempos quando ocorrem acontecimentos extraordinários, climáticos, naturais, artificiais - enchentes, tempestades de neve, furacões, acidentes aéreos. Aqui cabe uma observação para o professor de Geografia: como ensinar virtualmente, mas de modo crítico, sobre tais lugares, se ele ou ela não tiver a experiência primeira, (in loco ou em locais parecidos), o conhecimento concreto de tais tempos e espaços? Caberão sempre reflexões sobre a natureza do espaço virtual, por mais que ele seja uma cópia do espaço real (ver Lévy, 1996). Ele poderá até ser muito útil, particularmente em atividades de análise, de síntese, de generalização, de re-exame do que for aprendido a partir de referências a espaços reais, sempre que possível. Não ocorrem no mesmo tempo (são artificiais, como nos diz Milton Campos (1997). Os instrumentos usados na sua construção, especialmente as cameras e os atores de edição, não se deslocam nas mesmas perspectivas tridimensionais, locais e ritmos do aprendiz e não capta as mudanças associadas de período e ritmo do dia ou noite. Em certo sentido, são comuns experiências virtuais de percepção ubíqua, algo hoje corriqueiro com a TV - como em uma imagem secionada mostrando duas pessoas ao telefone em lugares diferentes do planeta -, algo até pouco tempo domínio da ficção. Tais reflexões devem ser feitas em relação não apenas à Geografia, mas praticamente em qualquer situação educacional que envolva o trabalho com virtualidades. Novamente, cabe enfatizar, tais situações de ensino exigirão sempre criatividade, experimentação, adaptação a cada situação nova, a cada grupo de alunos, a cada tipo de material, nos remetendo, inexoravelmente, à complexidade do ato de ensinar e de educar, que se tornam bem mais delicados com a presença das sofisticadas tecnologias da informação, como já ocorre noutras áreas como a medicina, o comércio e a indústria. Em vez de substituídos pela máquina, haverá necessidade de mestres bem mais preparados, mais sensíveis, cada vez mais cidadãos do mundo, mas principalmente cidadãos do bairro, da cultura, dos espaços e tempos do aluno ou aluna (comparar com Cysneiros, 1998). Singularidade da Tecnologia e Inovação Conservadora Embora estejamos longe do uso continuado das TI na maioria das disciplinas e das escolas públicas, pela primeira vez a tecnologia possibilita ampliação das capacidades do aluno, no trabalho com conteúdos escolares, transformando - selecionando, ampliando, reduzindo - a experiência pessoal e de grupo envolvendo textos, números, imagens, sons; acesso remoto à informação, comunicação, registro; relações entre professor e aluno. Isto de modo concomitante ou não com a ampliação de capacidades análogas do professor e de administradores de sistemas educacionais nos seus vários níveis. Utilizando a expressão de Papert (1985), neste sentido o computador pessoal é o Proteu das máquinas, ao assumir inúmeras formas e atender a inúmeros gostos, adaptando-se a condições e situações as mais diversas. Que aspectos da experiência humana da escola e do ato de educar, nos conteúdos das várias disciplinas e séries merecem e podem ser transformados, ampliados ou reduzidos com a Informática e a Telemática? Quais as implicações das reduções que inexoravelmente ocorrerão, uma vez passado o caráter dramático inicial? Tais perguntas não são fáceis de responder, mas podem servir de guias genéricos para a reflexão e a experimentação em situações do cotidiano da escola, onde o professor e o administrador não dispõem do apoio confortável e protetor do conhecimento acumulado e da experiência pessoal ou institucional. Perkins e outros (1995) usam a expressão "alvos de dificuldade" referindo-se a assuntos e tópicos que apresentam dificuldades de ensino e de aprendizagem, principalmente em matemática e em ciências, que podem representar formidáveis obstáculos para aprendizes e deixam intrigados muitos professores. Os autores citam como exemplos a geometria euclidiana, a distinção entre calor e temperatura, a semântica de frações (p.xv). Baseadas na boa pedagogia, no conhecimento de como os aprendizes compreendem tais problemas e na pesquisa com software específicos (e não no "efeito do computador") as novas tecnologias podem contribuir para mudar tal situação. Algumas projetos experimentais, desenvolvidos por escolas e redes públicas e por empresas particulares, apontam para possibilidades interessantes. Tem sido feitos estudos de temas específicos, por alunos e professores de um número maior ou menor de escolas, ligadas pela Internet, com o apoio e o acompanhamento de especialistas nos temas explorados. Em Recife, por exemplo, foi feito, durante todo um ano letivo, o estudo multidisciplinar do período holandês em Pernambuco, envolvendo escolas particulares e duas escolas públicas (ARS Consult, 1995). A rede Kidlink, ligando adolescentes e professores de todo o mundo, tem sido usada nas escolas para o estudo dos temas mais diversos (Lucena, 1997). Mais de uma década de pesquisas em escolas e redes públicas brasileiras, do Rio Grande do Sul ao Pará, tem demonstrado que a atividade pedagógica com computadores pode contribuir para melhoria do ensino, atingindo outros aspectos da escola (e.g. Fagundes & Mosca, 1985; Axt, 1996). Em uma escola pública da cidade do Recife (Cysneiros & Urt, (1995) verificaram que, para determinados alunos e alunas, três horas semanais de atividades com computadores pode ter qualitativamente mais impacto para a aprendizagem de determinados conteúdos do que períodos de tempo maiores na situação precária de sala de aula comum. Se alunos e alunas das redes públicas ainda não tem uma escola semelhante àquela freqüentada pelos filhos e filhas da elite, pelo menos que tenham ambientes - neste caso com computadores - que proporcionem acesso a contextos educativos da melhor qualidade. Para alguns professores também foi constatado que a atividade exploratória com computadores, algo diferente do trabalho de sala de aula comum, pode apontar alternativas inovadoras (na pesquisa citada, professores de Português, História e Matemática). Um aspecto que merece tratamento à parte é a possibilidade de inovação (ou modernização) conservadora de uma determinada atividade, pelo uso da tecnologia. Em nossas escolas públicas, carentes de recursos, uma ferramenta cara como o computador não deveria ser utilizada para realizar apenas tarefas que possam ser feitas, de modo satisfatório, por ferramentas mais simples (gravadores, retroprojetores, copiadoras, livros, até mesmo lápis e papel). Usos do computador que não mexem qualitativamente com a rotina da escola, do professor e do aluno, além de não explorarem os recursos únicos do computador, aparentam mudança substantivas, quando na realidade apenas muda-se a aparência. Um exemplo corriqueiro é a simples digitação de trabalhos escolares convencionais, fora da sala de aula e sem a orientação do professor. Neste caso, a tecnologia pode até mesmo facilitar ou dissimular a cópia plagiadora de pedaços de enciclopédias, de livros de texto e de materiais gráficos escaneados, impressionando professores sem experiência de computadores, pelo aspecto gráfico esmerado dos trabalhos e pela extensão do texto (em alguns casos feita por outra pessoa, algo mais difícil de ocorrer quando o professor conhece a caligrafia do aprendiz). Outro exemplo trivial é a confecção de faixas e cartazes por programas monótonos de computadores (antes, em formulário contínuo; atualmente, com impressoras coloridas que consomem caros cartuchos descartáveis de tinta). Tais materiais podem ser bem mais baratos, bonitos e criativos quando confeccionados com os velhos pincéis e papéis coloridos, por pessoas talentosas da escola (sem excluir, obviamente, o uso ocasional de tais programas gráficos). Voltando ao ensino e a aprendizagem, os usos educativos das TI na última década - instrução assistida por computador (CAI), informações em rede, aprendizado à distância - foram embasados em métodos pedagógicos tradicionais: fluxo unidirecional de informações, tipicamente um professor transmitido pela TV ou computadores "passando" informações a alunas e alunos passivos (Byte, 1995). Alguns professores experientes percebem que quase nada mudou, porém outros, talvez iludidos por um suposto efeito do computador, vêm vantagens nas novas formas de apresentar o conteúdo (aspecto dramático), reforçadas por concepções tradicionais de ensino e de aprendizagem (apesar de um discurso defendendo o Construtivismo ou outros conceitos da moda, pouco ou mal-compreendidos). Os alunos também cansam-se facilmente após o efeito da novidade. Um excelente exemplo de modernização conservadora encontra-se em um belo livro de Asimov (1986), com uma série de cartões produzidos por um desenhista francês no final do século passado, imaginando o que seria a sociedade do ano dois mil. Um dos desenhos representa uma escola deste final de século, com alunos sentados em fileiras com fones de ouvido, recebendo passivamente o conteúdo de livros que estão sendo "moídos" por um ajudante do professor. Outra distorção, associada ao conceito de modernização conservadora é o que Salomon & Perkins (1996) chamam de Justificativa (rationale) do Monte Everest ("Porque está lá"), ou seja, a tecnologia está em todo canto e é preciso usá-la no maior número possível de disciplinas e de conteúdos. Assim, observamos a tendência a se dar aulas expositivas com projetores de vídeo, onde a tecnologia não acrescenta nada além de cores, letras bonitas e outros aspectos epidérmicos, que podem até distrair a audiência, mas não enriquecem qualitativamente a exposição. Uma vez passado o efeito dramático dos primeiros anos do uso de computadores na educação, duas coisas são amplamente reconhecidas na comunidade acadêmica: primeiro, computadores em si não afetam muito a aprendizagem. A presença pura e simples da tecnologia na escola, mesmo com bons software, não estimula os professores a repensarem seus modos de ensinar nem os alunos a adotarem novos modos de aprender. Como ocorre em outras áreas da atividade humana, professores e alunos precisam aprender a tirar vantagens das TI. Costumo dizer que um bisturi a laser não transforma o médico em um bom cirurgião, embora um bom cirurgião possa fazer muito mais se dispuser da melhor tecnologia médica, em contextos apropriados. Segundo, o ambiente de aprendizagem como um todo, com ou sem computadores, é o fator mais importante. Neste sentido, é mais relevante nossa compreensão da cognição humana, daquilo que é necessário para se aprender algo por determinados sujeitos em determinados contextos. O importante não é o que a tecnologia pode acrescentar, mas o que as pessoas podem fazer com ou sem tecnologias. Não há sentido em se colocar tecnologia de ponta na escola em um processo de inovação conservadora, sem a preparação e o envolvimento da escola como um todo. Isto parece ter ocorrido em países onde órgãos centrais resolveram fazer implantações apressadas de projetos grandiosos. Analogamente, tapetes ou condicionadores de ar colocados em celas não mudarão a natureza das prisões. História da Inovação Tecnológica na Educação Mesmo no primeiro mundo o uso pedagógico de computadores parece não ser algo generalizado, onde a integração com o padrão curricular é pobre. Akker e outros (1992) relatam que em vários países do Norte o número de computadores nas escolas cresceu muito já no início da década de noventa, mas eram poucos os professores usuários regulares, sendo comum salas cheias de computadores ociosos. Predominavam software educativos que sofrem da síndrome do teste escolar: estímulo à memorização de conceitos e à prática pouco significativa de algoritmos. Tais programas basicamente exigem que o aluno aperte algumas teclas para "virar páginas" de livros eletrônicos. São comuns os programas tipo exercício-e-prática, onde o estudante assume uma atitude submissa frente à máquina, tendo apenas que fornecer respostas simples. Deu-se pouca atenção a um conjunto amplo de fatores, essenciais quando se introduz mudanças em ambientes educacionais, tratadas por Akker e colaboradores em quatro categorias: A. Contexto nacional Legislação e regulamentações, sistema de formulação de políticas e de tomada de decisões em assuntos educacionais, recursos, instalações e infra-estrutura disponíveis; valores; atitudes de políticos sobre a inovação. características da escola (como organização); suporte externo e características da inovação. B. A Escola como Organização Social - Experiências com inovações anteriores, papel do diretor, métodos de tomada de decisões, recursos materiais, financeiros e humanos, etc. C. Suporte externo - Capacitação inicial de pessoal, em serviço, continuada; contatos com especialistas e colegas de outras escolas. Os professores iniciantes no uso das TI geralmente precisam de muito suporte para vencer os obstáculos iniciais de insegurança, incerteza, preocupações quanto a mudanças na relações entre professor e alunos e sobre os resultados da inovação, devido à "quebra" de relações e rotinas tradicionais (Sandholtz et alii, 1997). D. Características da Inovação Investimento inicial e continuado em hardware, desenvolvimento de software e de pesquisa; suporte técnico. Para entendermos tal situação é necessário uma breve incursão na história da tecnologia educacional. Teodoro (1992), coloca que as tentativas de introdução de artefatos tecnológicos no ensino (regular ou supletivo) tem sido uma história de insucessos. Vários fatores são apontados como responsáveis pela não absorção de tecnologias educativas, dentre os quais saliento a ênfase na própria tecnologia e a falta de sistemas de apoio. As inovações tecnológicas em educação tem sido historicamente consideradas como tecnologias de substituição (incluindo a substituição do professor), através de projetos originados fora da escola. O rádio e o filme (à partir da década de 1920) e a televisão (na década de 1960 e depois), minimizavam a figura do professor e a organização social da escola. Havia desconsideração pela heterogeneidade cultural de regiões e comunidades diferentes e pouca autonomia da escola como unidade social, com o pressuposto de certa uniformidade lingüística na comunicação professoraluno, disseminando de modo uniforme um mesmo conteúdo. As inovações tiveram uma trajetória cíclica, sumariada por Cuban (1986) em quatro fases: geravam elevadas expectativas, eram acompanhadas de um discurso sobre a necessidade de mudanças na educação, estabeleciam-se políticas públicas de introdução, resultando, após certo tempo, em uso limitado. Aspectos estruturais, econômicos e culturais também não devem ser esquecidos. A história mostra que o rádio e a televisão foram apressadamente exportados de países do Norte para países satélites. Além dos grandes investimentos necessários para que houvesse continuidade e daquelas tecnologias serem pouco desenvolvidas para uso na educação, contextos culturais diferentes e a inadequação das máquinas burocráticas estatais tornavam praticamente impossível a absorção permanente de qualquer tecnologia pelas escolas públicas de países em desenvolvimento. Alguns elementos da história delineada por Cuban tem estado presentes na história da informática educativa. Vejamos brevemente cada um deles. 1. Elevadas expectativas. No Brasil, os usos das TI na educação foram estimulados pelo contexto da política de reserva de mercado em informática, na década de oitenta (Almeida, 1987). Desde o início das tentativas de se introduzir computadores na educação, tem sido comuns os discursos que o computador fará maravilhas na escola, existindo uma certa ideologia associada ao seu uso, disseminada por autores e conferencistas e pelos meios de comunicação. Por exemplo, Alfred Bork, no começo dos anos oitenta, nos Estados Unidos, afirmava que "... estamos no início de uma grande revolução na educação; uma revolução sem paralelos deste a invenção da imprensa. O computador será o instrumento desta revolução. Em torno do ano 2000 a principal maneira de aprender, em todos os níveis, e praticamente em todas as áreas de conteúdo será através do uso interativo de computadores" (1980, p.53). No mesmo ano, Papert lançava seu livro Mindstorms, com o mesmo discurso otimista, defendendo a idéia de que o domínio de uma linguagem de programação por crianças iria mudar o modo de resolver problemas e de pensar sobre o próprio pensamento. A enorme difusão do Mindstorms certamente deveu-se, em larga medida, à novidade da tecnologia na educação, associada a uma poderosa e flexível linguagem de programação acessível a crianças (aspecto dramático). Seymour Papert também é um bom escritor, tendo conseguido traduzir para o grande público idéias normalmente restritas aos círculos acadêmicas. Várias publicações da época, tanto de Informática como de Educação, traziam o mesmo discurso defendido por Papert. Ainda hoje alguns entusiasmados defensores da informática educativa parecem esquecer que Educação será sempre o substantivo e Informática apenas um dos seus adjetivos, tornando-se transparente, um elemento de fundo, que não aparece muito quando funciona bem. Após as primeiras pesquisas independentes terem indicado que as previsões do Mindstorms eram otimistas demais (e.g. Pea & Kurland, 1984), o próprio Papert (1985, p.54) começou a dar outro tom aos seus escritos, sugerindo que se evitasse o "tecnocentrismo" , ou seja, a supervalorização do computador e dos seus efeitos, particularmente por pessoas que não aprenderam a lidar com tais máquinas (emergindo em perguntas como: "...Qual o efeito do computador na inteligência do aluno?" ). Segundo ele, com o uso de tais instrumentos as culturas poderiam mudar e com elas as maneiras das pessoas (no nosso caso educadores e estudantes) aprenderem e pensar. A ênfase na tecnologia também é estimulada pela linguagem da informática e por alguns informatas, que encantados com a força e a complexidade das novas máquinas (efeito dramático, sedutor) e certamente carentes de uma perspectiva epistemológica mais densa, chegaram a afirmar que computadores tem crenças e que algum dia terão sentimentos, contribuindo para manter elevado o nível de expectativas em relação às TI. Neil Postman (1994, cap.7) relata um comentário feito pelo inventor do termo "inteligência artificial", quando afirmou que até máquinas simples como termostatos tem crenças (por ex. "aqui está quente") e agem em conformidade. Postman salienta que neste caso há uma redefinição da palavra "crença", significando apenas o que alguém (ou algo) faz, rejeitando-se a concepção de que estados mentais internos (p.ex. memórias, conhecimentos, emoções, atitudes) são o fundamento das crenças humanas. 2. Retórica da necessidade de inovação, afirmando que a escola está obsoleta. Um bom exemplo desta retórica é uma anedota que circula nos meios educacionais e que inicia um dos livros de Seymour Papert (1994), repetida com freqüência por pessoas que comentam a nova tecnologia educacional. Em linhas gerais, a estória diz que se médicos e professores do século dezenove nos visitassem hoje, teriam reações bem diferentes. Os primeiros não reconheceriam as atuais salas de cirurgia, devido ao avanço da medicina, mas os professores se sentiriam em casa se entrassem numa sala de aula cem anos depois. Embora esta estorieta tenha um lado salutar, ela é inadequada em vários aspectos, especialmente se aplicada ao nosso país. Ignora coisas mais importantes na escola, como a figura modelo, o domínio do conteúdo e a sabedoria do professor; o diálogo socrático professor-aluno, as relações família-escola, coisas que tem pouca relação com inovações tecnológicas. Se os professores viajantes no tempo entrassem numa boa escola notariam muitas mudanças, como por exemplo relações mais espontâneas entre mestres e aprendizes, ausência de castigos físicos, alunos e alunas na mesma sala e sem fardamento, recintos com ar condicionado, quadro verde ou de pincel, carteiras individuais, conteúdos novos em várias disciplinas, uma didática melhor, antenas parabólicas nos tetos, salas com vídeo e alguns computadores, a presença de negros e de filhos de trabalhadores, etc. Mesmo com todas as dificuldades, pesquisadores em Informática Educativa reconhecem que a sala de aula, com seus professores, livros textos, quadro e giz, currículo e organização escolar, dirigida para a educação de populações - constitui uma das invenções fundamentais da civilização contemporânea (Perkins et al., 1995). Por outro lado, apesar de toda parafernália curativa, a medicina moderna não conseguiu erradicar as doenças endêmicas que afligem a maior parte da população do planeta. Erradicou o médico de família, que conhecia pessoalmente seus clientes, curando-os muitas vezes com algumas drogas simples e palavras de prevenção. Finalmente, se os médicos do século passado entrassem em um típico hospital público brasileiro, certamente notariam que houve mudança para pior. 3. Políticas de Introdução. Os anos oitenta foram a década de políticas nacionais de Informática Educativa nos países do primeiro mundo. O Brasil também estabeleceu políticas públicas federais, estaduais e municipais (SEI, 1982; MEC, 1989; Menezes, 1992; Moraes, 1997; Oliveira, 1997). Em 1981 e 1982, em Brasília e em Salvador, o MEC, a SEI (antiga Secretaria Especial de Informática) e o CNPq patrocinaram a realização de dois seminários nacionais, reunindo especialistas em educação e em informática, que forneceram subsídios para as primeiras políticas públicas na área. Daqueles seminários nasceu o Projeto EDUCOM, previsto para cinco anos (1983 a 1988), implementado em cinco universidades brasileiras (UFPE, UFMG, UFRJ, UNICAMP e UFRGS) escolhidas em regiões diferentes, entre as 26 instituições que se candidataram. Os centros-piloto do EDUCOM foram projetos experimentais, interdisciplinares, reunindo pesquisadores em Informática, Educação e áreas afins, cujo objetivo principal era a produção de materiais pedagógicos, validados pela pesquisa em escolas públicas de segundo grau, como também a formação de professores. Em retrospectiva, constatamos que pouco material foi produzido nos centros experimentais. A grande contribuição do EDUCOM foi a formação de recursos humanos, tanto professores de primeiro e segundo graus nas redes públicas, como na própria universidade, na época bolsistas de pesquisa e alunos de cursos de pós-graduação que fizeram parte das equipes. Hoje os ex-bolsistas do EDUCOM são pesquisadores formados em Educação, Psicologia, Informática, etc., muitos deles com dissertações e teses de mestrado e doutorado explorando o uso das novas tecnologias. Estão ocupando postos nas universidades, contribuindo, como professores e pesquisadores experientes, para a nova fase da Informática Educativa no país e mesmo a nível internacional. Por outro lado, a experiência parece mostrar que as inovações educacionais, quando implementadas por autoridades, de cima para baixo, sem certa autonomia e envolvimento das escolas, são prontamente incorporadas por administradores e alguns professores, porém funcionam somente enquanto houver apoio oficial. 4. Uso Limitado. No primeiro mundo o ciclo já foi fechado, com avaliações baseadas em estudos independentes. As pesquisas indicam que computadores contribuem para a aprendizagem (não tanto quanto se previa), que são mais importantes em algumas disciplinas e séries (matemática e língua-mãe sempre aparecem), que existem limiares mínimos de uso continuado para que os efeitos possam ser detectados e que no conjunto o papel do professor da disciplina é fundamental (Watson, 1993). No Brasil, houve um arrefecimento após quase uma década de políticas federais instáveis, com o impulso retomado pelo atual governo (Mec/Seed, 1996). Em algumas redes educacionais, foram criados centros de informática, que se burocratizaram e foram absorvidos sem atingir as escolas (com as exceções de praxe). É importante sublinhar que as pesquisas e teorias feitas no primeiro mundo, embora nos ensinem algumas lições, nem sempre são bons guias para a situação de nossa escola pública, com necessidades, história, características culturais, econômicas e sociais bem diversas. Devemos trabalhar para que a história de insucessos não se repita com a introdução de computadores nas escolas públicas brasileiras. Lutemos para que as novas TI venham a ter maior impacto nas nossas escolas do que o ocorrido nos países ricos, onde o acesso da população à educação de melhor qualidade e às tecnologias de modo geral é incomparavelmente maior. Mesmo no contexto das escolas públicas, vejo a possibilidade de acentuação de contrastes, com a introdução de computadores. Basta citar que no atual programa federal (MEC/Seed 1996), segundo critérios acordados entre os secretários estaduais de educação (média do percentual de escolas de 1o e 2o graus do estado com mais de 150 alunos e do percentual de matrículas), 53,6 % dos computadores, para o biênio 1997-1998, serão alocados aos sete estados da regiões sul e sudeste, onde muitas escolas já possuem computadores e professores capacitados para usá-los, algo raro em escolas públicas dos estados menos desenvolvidos do país. É comum, nos meios educacionais acadêmicos e administrativos, atitudes de indiferença ou de minimização do potencial das TI para educação, certamente pela história acima mencionada, mas também pelo desconhecimento e por padrões de pensamento (mindsets) firmemente estabelecidos. Em vez de rejeitadas ou ignoradas, as novas tecnologias da informação podem ser experimentadas, estudadas, modificadas e assimiladas às várias áreas do saber educacional, em situações específicas. Atividade Mental na Escola e no Trabalho Diferentemente das tecnologias do passado, as novas tecnologias baseadas na Informática e na Telemática possibilitam o desenvolvimento de novas relações entre a atividade intelectual que ocorre na escola e no trabalho. Neste particular, tomamos como pano de fundo o pensamento de Lauren Resnick (1987), que aponta quatro características amplas da atividade mental fora da escola, contrastando-as com o trabalho escolar típico: 1. A forma dominante de aprendizagem escolar é o desempenho individual. Em contraste, o trabalho, a vida pessoal e o lazer ocorrem em contextos sociais onde a habilidade de cada pessoa para funcionar com êxito depende do modo como se entrelaçam os desempenhos mentais e físicos de várias pessoas. O uso de computadores na educação pode diminuir este contraste, através da atividade intelectual socializada, mediada pela tecnologia. Os muros da escola podem ser eletronicamente transpostos ao se trabalhar com problemas e ferramentas de software da vida fora da escola. 2. Na escola, atividades de pensamento puro são mais recompensadas; ou seja, aquelas que os indivíduos podem fazer sem o suporte externo de livros e anotações, calculadoras ou outros instrumentos. Em contraste, as atividades mentais fora da escola, na sua maioria, são realizadas com a ajuda de ferramentas (máquinas, tabelas, etc.); a atividade cognitiva resultante é modelada por e dependente das ferramentas disponíveis. Com as novas tecnologias, é possível não apenas usar o suporte de elementos externos e de "andaimes cognitivos" os mais diversos, como também a avaliação em processo do que estiver sendo aprendido, possibilitada pela capacidade dos computadores para manter registros e processar informações. 3. Manipulação de símbolos na escola, versus raciocínio contextualizado fora da escola, onde as ações são intimamente conectadas com objetos e eventos. As pessoas freqüentemente usam os objetos e eventos diretamente em seus raciocínios (por exemplo, o cálculo de preços por vendedores de feira, manipulando conjuntos de frutas ou verduras, tais como contar um cento com conjuntos de cinco laranjas). As atividades mentais, assim, estão ancoradas na lógica de situações imediatas. Em contraste, a aprendizagem escolar torna-se uma questão de memorizar regras de manipulação de símbolos e de dizer ou escrever coisas de acordo com regras (e com as preferências dos professores), com pouca ou nenhuma compreensão e sem auto-monitoração, levando a erros sistemáticos. O uso pedagógico de ferramentas universais de software para manipulação da escrita, da matemática, de imagens e sons que sirvam como âncoras virtuais de situações da vida, pode ser feito de modo mais próximo da atividade mental que ocorre em ambientes naturais. Aprendizagem generalizada na escola, versus competências específicas fora. A escola procura ensinar habilidades gerais e princípios teóricos. Fora da escola as pessoas desenvolvem competências específicas a situações. Entre outras possibilidades, as ferramentas computacionais poderão ser elementos para a coleta contínua de informações sobre situações da vida real (no ensino de ciências, por exemplo), possibilitando a contextualização da aprendizagem através do trabalho com problemas da realidade e do interesse dos alunos. É importante salientar que, em si, as tecnologias da informática não conduzem naturalmente às ligações brevemente apontadas acima. Isto exigirá trabalho cooperativo do professor, desenvolvimento de formas de uso de ferramentas que não são fáceis e que demandam tempo, trabalho em equipe, experimentação. Internet e Educação A Internet começou , nos anos sessenta, como uma pequena rede de um projeto militar norte-americano. Só nos anos oitenta, com a evolução da tecnologia, expandiu-se rapidamente, quando passou a ser usada pelo meios acadêmicos daquele país e logo depois da Europa e de outras partes do mundo. Só no início dos anos noventa é que começou a ser usada de modo generalizado por todos os setores da sociedade. A mídia brasileira, seguindo o restante do mundo, vem explorando muito a Internet, caracterizada como a rede das redes mundiais de computadores. O discurso comum inclui expressões como democratização da informação, aldeia global, acesso a bibliotecas em qualquer parte do mundo. Tais expressões, meio obscuras para quem não lida com computadores, são acompanhadas por números impressionantes: dezenas de milhões de computadores interligados, transmissão de milhões de bits por segundo, outros tantos milhões e bilhões de dólares em jogo. Os cadernos semanais de Informática dos grandes jornais dedicam a maior parte do espaço a informações sobre a rede. Também tem sido explorado o lado sujo da rede, como pornografia, uso pelo crime organizado e a preocupação de controlar seu acesso por crianças. Franco coloca (1997, cap. 2) que a Internet é um emaranhado de sistemas e serviços, alguns derivados de estruturas tradicionais, como correios, bibliotecas, bancos. Outros são novos, devido a características intrínsecas à mídia, salientando-se a virtualidade, a interatividade e a assincronia, tendo transformado a velocidade e as formas de comunicação entre indivíduos, grupos, instituições. Tais características possibilitaram a concretização de idéias já existentes, particularmente o hipertexto. A vulgarização da Internet no Brasil foi pontuada pelo primeiro livro do jornalista Sérgio Charlab (199 ) e pelo surgimento de revistas mensais especializadas. Também neste caso - como nas outras áreas da Informática - desenvolveu-se um relacionamento sólido entre as mídias impressa e eletrônica. Passado o efeito dramático (que deverá ainda demorar um bom tempo), alguns aspectos da Internet, acredito, sobressairão e se estabilizarão, como se sobressaem os detalhes de uma paisagem ao passar a tempestade. Um dos elementos repetidamente enfatizados pela mídia é a possibilidade de acesso instantâneo a informações (texto, números, imagens, cores, sons) em qualquer parte do mundo. Para a pesquisa e leitura inquiridora, crítica, abrem-se vastos horizontes; novamente ocorrerão continuidades e diferenças. Em qualquer escola, em casa ou noutro espaço de estudo e pesquisa, o aprendiz poderá acessar um documento mestre e consultar várias de suas fontes, de certo modo como se estivesse pessoalmente e de modo permanente, nas melhores bibliotecas do planeta. Além disso, outras opções estarão ao seu alcance, como consultar diretamente autores, consultar atualizações de textos, comentar com colegas, imprimir, enviar suas observações, decidir pela veracidade e confiabilidade do que estiver "consumindo." De certo modo fora do campo educacional, existem complicadores pelas possibilidades do aprendiz distrair-se com jogos, desviar-se por caminhos atrativos, ouvir música, ler jornais, realizar compras, etc., que não podem ser ignorados pela escola.. Esse aspecto poderá tornar-se mais importante para quem estiver em locais ou países pobres de recursos, uma situação típica de nossas escolas públicas e mesmo da maioria de nossas universidades. Essa leitura exigirá maior capacidade de crítica, tanto na escolha do que ler como na forma de leitura (devido à multiplicidade de possibilidades e riqueza do material exposto), como pela mutação constante a que está sujeita a informação eletrônica. Se acessarmos algum documento científico, veremos que sua forma mudou pouco: ainda são muito parecidos com os documentos reais, com a diferença da forma hipertextual virtual e de referências bibliográficas a endereços eletrônicos e não apenas a textos nas formas clássicas de livros e revistas. Mesmo a forma hipertextual é, essencialmente, muito semelhante ao texto científico convencional, como este documento que você está lendo (entremeado de citações, figuras, notas de rodapé). O professor deverá tentar ensinar ao aprendiz novas formas de leitura, que no fundo são as de sempre: ler nas entrelinhas, não se impressionando mais com a aparência e a forma; questionar afirmações; confirmar ou questionar fontes e a veracidade ou qualidade de citações, da história, da informação. Tal atitude já ocorre nas universidades e mesmo nas escolas de países acostumados com tais tecnologias, mas quase impossível hoje de se fazer em larga escala em um país como o Brasil, com alunos e professores pouco conhecedores do meio e deslumbrados com os computadores e com a multiplicidade de opções da Internet. Isso também acarretará maior responsabilidade, além da maior liberdade ao aluno. Também maior possibilidade de expressão individual e o desenvolvimento de novas habilidades de busca e de troca, novas convenções de catalogação, de difusão, para que possamos reconhecer e decidir o mais rapidamente possível o que é confiável, o que é de boa qualidade, o autêntico do lixo, o brilho do ouro verdadeiro daquele da imitação. Nesse sentido ainda estamos começando. Se entrarmos em qualquer endereço da Internet, veremos que é muito comum a ênfase nos aspectos de aparência e no lixo informacional, sem a colocação de datas, de fontes, de créditos para fotos e outros materiais, sem a história do documento. Neste sentido, está havendo ênfase na informação em bits produzida sob o estímulo da emoção, instantaneamente, sem os cuidados e os tempos que normalmente acompanham a informação em átomos. Tal tipo de material tem um lado salutar, pois permite, além de maior acesso e menos custo material, maior registro de boa parte da produção que não se materializava antes do surgimento do computador portátil e de Internet, pela falta de suporte, pela falta de interlocutores (talvez a razão mais forte para se produzir algo), pela ausência ou dificuldade de meios adequados de expressão ou de registro, ou seja, além do texto, o gráfico, a foto, o som, a combinação imediata de tudo isso, a flexibilidade retroativa e proativa no manejo materializado virtualmente de tudo isso, com maior número de diálogos ou reconstruções possibilitadas pela reação de outrem e pelo exercício anterior, pela memória do que foi produzido, em um efeito já conhecido de escritores ou artistas experimentados acostumados a dialogar com públicos gerais ou especializados que os estimulam a produzir cada vez mais, a refazer, a tentar novas abordagens. Nesse sentido, sim, poderá haver profundas transformações da escola, exigindo mais do professor, criando dilemas em relação aos conteúdos que deverão ser trabalhados para se atingir objetivos que, na maior parte (como ocorreu em outros setores) permanecerão os mesmos, ou seja, formar o indivíduo para se inserir de modo responsável no seu mundo, conhecendo a produção passada da humanidade e do seu grupo, agindo segundo valores universais e locais, levando adiante a identidade cultural do seu grupo social nas várias instâncias, tornando-se mais humano, lutando por utopias, etc. Neste sentido também os Sócrates da humanidade, nas suas essências, permanecerão e talvez se tornem ainda mais conhecidos e mais valorizados. Será a repetição do que sempre ocorreu e ocorrerá: a continuidade e a mudança. Continuidade, como dissemos antes, porque os valores permanecerão, os objetos como já são conhecidos continuarão a existir, ligando o passado ao presente e ao futuro. Objetos, nunca é demais enfatizar, em tempos e espaços reais e cada vez mais em tempos e espaços virtuais. Mudança, pelo conhecimento de novos aspectos do objeto até então desconhecidos por todos ou por uma grande fatia da humanidade, que antes eram privilégio de alguns, como as bibliotecas de átomos restritas a uma pequena elite religiosa da idade média (como nos mostra Humberto Eco, em o Nome da Rosa). De acordo com Lévy, as novas tecnologias da comunicação colocam o homem diante de si mesmo, a nível planetário. Diríamos que sim, mas não somente isso: poderá colocá-lo cada vez mais diante de sua própria cultura, do outro próximo (espacial e culturalmente), como já propiciam outras mídias convencionais. Uma pequena parte dos membros de uma cultura local tenderão a ausentar-se virtualmente (como ocorre fisicamente através de migrações), mas a maioria é estável, quando a cultura é viva, em condições favoráveis de continuidade. Permanecem os valores, as perspectivas culturais locais, as identidades. Se não fosse assim, ocorreria a desumanização, que não acredito que ocorra apenas por causa das novas TI. Vejamos, noutro plano, a tendência hoje à fuga das grandes cidades, em direção ao campo e a pequenas comunidades, mais em sintonia com o gregarismo humano desenvolvido desde os primórdios de sua evolução. Estou considerando a metáfora espacial das grandes cidades como um bom elemento de previsão do que poderá ser a megalópole planetária virtual hoje conhecida como Internet: solidão, apesar da presença maciça de pessoas em locais comuns como praças, metrôs, shows, aglomerações espontâneas. Em tais locais, ainda o que se salienta são as pequenas comunidades desenvolvidas em bairros, nas organizações relativamente pequenas que constituem o todo, tais como igrejas, estabelecimentos comerciais, associações esportivas, escolas, etc. Tal como já começa a ocorrer na Internet, as grandes cidades são o ambiente natural para o desenvolvimento da violência, da banalização da vida humana, das patologias sociais, algo já estudado pelos cientistas sociais. Culturas de Informática na Educação A existência de uma cultura de Informática numa escola significa, em linhas gerais, a utilização freqüente dos recursos informáticos por uma parcela significativa das pessoas que compõem os vários grupos da escola e do sistema escolar, idealmente interagindo com a comunidade fora da escola. Alguns recursos poderão ser usados por todos da escola, implicando na democratização da tecnologia. O recurso mais compartilhado tem sido o processador de textos e em menor escala a planilha eletrônica. Outro recurso comum a todos deverá ser a comunicação eletrônica, dentro e fora da escola (redes locais ligadas à Internet). No entanto, estes usos não são suficientes. É essencial a formação e o desenvolvimento de culturas específicas de uso, que chamo de microculturas (MCC). Cada MCC pode ser formada por professores de áreas específicas, que possuem formação e problemas pedagógicos comuns; estratégias compartilhadas de avaliação, de solução de problemas, socialização entre pares e histórias de vida semelhantes. Há a possibilidade de incluir, em tais grupos, professores de outras escolas e instituições (especialmente pesquisadores e alunos de pós-graduação em trabalho de tese) com interesses comuns. Além de professores, seria interessante a formação de MCCs de especialistas (administradores, supervisores, pessoal técnico). A formação de grupos de interesse pode ser um elemento significativo para a assimilação da Informática pela escola, devido ao potencial para socialização de problemas, de soluções e de novos conhecimentos específicos da área, pelo registro e troca de informações que afetem o cotidiano do grupo, dentro e fora da escola. Tem a vantagem do suporte social, algo fundamental em qualquer grupo, como também de metodologias, linguagens de comunicação e perspectivas que muitas vezes são restritas ao seus membros (cito o exemplo dos professores de matemática). Os participantes poderão comunicar-se (pelo menos em parte, quando houver infra-estrutura suficiente) através do computador, tirando máximo proveito das características do instrumento, especialmente pela possibilidade de atividade virtual simultânea com alguns ou todos os componentes da MCC. Em tais situações, embora haja redução de alguns aspectos do diálogo face a face, é ampliada a presença virtual de todos (ou de parte dos membros do grupo, a critério do "emissor"), uma vez que o conteúdo colocado na rede é depositado automaticamente na caixa postal eletrônica de todos (ou de endereços selecionados), podendo ser lido e relido, transformado, impresso, redistribuído, etc. Uma vez criada uma MCC, poderão ser feitas capacitações dirigidas para as características e necessidades do grupo (por exemplo, um curso de exploração dos recursos e dos possíveis usos pedagógicos de uma planilha eletrônica, para as MCC de Matemática e de ciências; ou de um processador de textos para a MCC de Português ou História). Uma vez conseguido o uso regular de ferramentas universais no cotidiano da escola, haverá um solo fértil para a exploração de software educativos, como também discussão e mesmo construção de software por pessoas da própria da MCC, nascidos com o suporte, nas condições e em função das necessidades do grupo. Outras culturas de uso da informática na educação vem sendo desenvolvidas, destacando-se a rede internacional Kidlink, sem fins lucrativos, iniciada em 1990 na Noruega, que estimula e organiza a comunicação entre jovens, na maioria com idade de 10 a 15 anos), monitorada por educadores e pais voluntários em todo o planeta, durante 24 horas por dia, envolvendo mais de cem mil jovens de 114 países. São 38 listas de discussão públicas em várias línguas, um chat e um site de exibição de arte eletrônica produzida pelas crianças. O principal meio de comunicação é o correio eletrônico e qualquer jovem que queira participar deve apenas responder às quatro perguntas que definem a filosofia da Kidlink: Quem sou eu? Que quero ser quando crescer? Como gostaria que o mundo fosse quando eu crescer? Que posso fazer agora para que isso aconteça? A Kidlink brasileira, em português, deve muito ao trabalho incansável da professora Marisa Lucena (1997; www.kidlink.org/) da PUC-RJ, coordenadora nacional e uma das principais executivas da rede a nível internacional. Várias khouses (salas de computadores que permitem acesso a crianças de escolas públicas em dias e horários determinados) existem de norte a sul, criadas e mantidas com o apoio de várias organizações, sob supervisão e com o apoio da professora Lucena e colaboradoras. Software Educativo Para nossos propósitos, o software educativo pode ser classificado em duas grandes categorias: 1. Transposição, para o computador, de formas tradicionais de ensinar, e 2. Aplicação dos recursos inerentes à ferramenta ao ensino e a aprendizagem de conteúdos específicos. Na primeira categoria a confecção de programas educativos não oferece grandes problemas e previsivelmente é onde tem ocorrido maior produção. Com a ajuda de bons programadores e de especialistas em design, é relativamente fácil de se transpor conteúdos impressos para o computador, sem grandes mudanças, constituindo-se em exemplos de modernização conservadora. Existe no mercado uma enorme quantidade de "livros didáticos eletrônicos," enriquecidos superficialmente com movimentos, sons, cores vivas, apresentação gráfica atraente. Essencialmente o conteúdo e a forma de ensinar permanecem inalterados, apesar de maquiados. São comuns também programas de exercício de fórmulas e de algoritmos de resolução de problemas. Devido ao caráter inicial dramático (Ihde) do novo modo de apresentação, tais programas tornam o conteúdo mais atraente para o professor e para o aluno, mas tendem a cair na rotina escolar, uma vez passado o efeito da novidade. Alguns apresentam a vantagem de registrar respostas a exercícios e fornecem feedback imediato ao aprendiz, numa espécie menos rígida de instrução programada. A produção de um bom software educativo na segunda categoria, lançando mão dos aspectos singulares da tecnologia, apresenta problemas consideráveis. Em primeiro lugar, o conteúdo manipulado através do instrumento pode apresentar características diferentes da realidade do livro didático ou da aula convencional. Vejamos o exemplo da geometria da tartaruga, possibilitada pela parte gráfica da linguagem Logo (Valente, 1996), da geometria através do Cabri-geomètre (Bittencourt, 1996) ou da álgebra através de uma conjunto de dados em uma planilha eletrônica. Outro aspecto complicador é que o conhecimento em inteligência artificial ainda não nos ajuda muito a planejar e construir bons ambientes de aprendizagem. Além disso, tem sido questionado se bons tutoriais são soluções desejáveis e adequadas em muitas situações de sala de aula, uma vez que tais ambientes poderiam limitar a criatividade e a participação ativa do aprendiz. O conhecimento e as capacidades que os alunos normalmente devem adquirir na sua formação básica é algo muito complexo, envolvendo não apenas a aplicação flexível de conhecimentos organizados, referentes a determinados domínios, envolvendo regras, conceitos, princípios, algoritmos, etc. (algo que a ideologia da disponibilidade de informações pela Internet tende a esquecer). Supõe o uso de heurísticas (estratégias de análise e transformação de problemas), de capacidades metacognitivas (automonitoração do próprio funcionamento cognitivo) e de estratégias de aprendizagem (v. De Corte, 1992 e 1995 para uma discussão detalhada de tais pontos). Em vista disso, há algum tempo atrás um psicólogo cognitivista propôs a idéia de tutores "não inteligentes", que dariam apoio temporário aos alunos, permitindo-lhes desempenhar em um nível logo acima do seu nível real de competência, sendo gradualmente retirado quando não fosse necessário. O potencial de produção nesta área é muito grande, apesar de difícil. Basta lembrarmos que textos, figuras e conjuntos de dados manipulados através de ferramentas computacionais perdem a rigidez do papel, tornam-se dinâmicos, possibilitando maior rapidez na atividade intelectual individual e em grupo e maior alcance das ações mentais, tanto retroativas (com a possibilidade de acesso a textos, figuras, dados numéricos já "conhecidos", através de arquivos eletrônicos existentes) como também ações mentais proativas, de certo modo concretizadas pela construção virtual de conteúdos possíveis porém desconhecidos, com a ajuda de simulações de software específicos ou de ferramentas de uso geral. Representações múltiplas (dinâmicas, tridimensionais, a cores, em escalas diversas) possibilitadas pelo computador, permitem maior comunicação entre pessoas com interesses, histórias, problemas, esquemas conceituais parecidos e portanto podem potencializar, sob várias formas, o trabalho intelectual socializado, tanto a nível de quem ensina, como principalmente a nível de quem aprende, enriquecendo as possibilidades criativas da interação de elementos do grupo com talentos diversos. A disponibilidade constante de representações múltiplas e da ajuda mnemônica da máquina, no processo de criação, pode assim afetar a produção criativa individual e do grupo de formas interessantes. Autores de livros didáticos tem anexado ao texto software de apoio à aprendizagem de conteúdos que não podem ser adequadamente explorados apenas pelo mídia impressa (p.ex., Fiolhais et alii, 1996). Este recurso tende a crescer no futuro, tanto pela transição gradual de boa parte do texto escrito para a mídia eletrônica, como pelo fato de tal estratégia desobrigar o professor, até certo ponto, de lidar com computadores, abrindo espaço, desta forma, para que seus alunos certamente na maioria já usuários da máquina - possam beneficiar-se das possibilidades didáticas da tecnologia, em casa ou na escola, sem depender do professor. Para tal, no entanto, é desejável que haja disponibilidade, na escola, de software e de computadores para todos os alunos, com o auxílio de monitores, que podem ser alunos de séries seguintes, experientes no manejo do software. O trabalho com monitores pode ter implicações mais amplas, pois ensinar é uma das melhores formas de aprender. Tais monitores poderão vir a ser futuros professores, com capacidades pedagógicas e atitudes inteiramente diferentes, em relação às TI, dos seus mestres do passado. Devo registrar que o trabalho com alunos monitores poderá contribuir para aumentar o nível de insegurança de determinados professores, gerando conflitos em situações de sala de aula. Grande parte dos software educativos disponíveis no mercado carecem de documentação pedagógica que ajude o professor a usá-los e integrá-los na atividade de ensino. Isto é compreensível, porque a produção de versões amadurecidas consome tempo, exige recursos financeiros e trabalho interdisciplinar de pessoal especializado. Algumas exceções merecem ser citadas, como os software brasileiros de David Carraher e colaboradores. O Divide (Carraher, 1992) é um pequeno jogo matemático, levando o aprendiz a tentar quebrar um código de dez letras que representam os numerais de zero a nove. O programa escolhe aleatoriamente um dividendo, exibindo-o em uma janela . O jogador insere, noutra janela, um divisor de sua escolha. Usando os resultados calculados pelo programa, o aprendiz pode deduzir gradualmente os numerais representados pelas letras. Em cada tentativa, apesar do computador calcular o quociente e o resto, alguns resultados são fornecidos em código, estimulando o jogador a continuar "dividindo para conquistar". (Inserir figuras, interfaces do Divide e do Sherlock) O principal objetivo do Sherlock, também na forma de um jogo, é o preenchimento de lacunas em um texto vazado (ou palavras apresentadas com as letras embaralhadas), com o auxílio de pistas para a descoberta das palavras. A interação com o programa estimula a criatividade do jogador, à medida que tenta reconstituir o sentido do texto, buscando pistas no contexto. Os jogadores tendem a se envolver na atividade desde os primeiros momentos, ficando a máquina em segundo plano (uma das qualidades de bons programas educativos). Através de um editor próprio, os textos podem ser compostos pelo professor ou por outros jogadores, dependendo dos objetivos da aprendizagem. Como uma ferramenta sem conteúdos, o Sherlock pode ser usado em qualquer disciplina que envolva a linguagem escrita. Do ponto de vista computacional, ambos os software de Carraher são muito simples, podendo ser rodados em computadores hoje obsoletos. Como ferramentas mais sofisticadas, destacam-se, nos EUA, a série de software educativos para ensino de geometria, desenvolvida sob o nome de Geometric Supposers, pelo grupo liderado por Judah Schwartz (Perkins et al, 1995) e na França o Cabri-Geomètre (e.g. Bittencourt, 1996). Este último vem sendo explorado no Brasil por muitos professores de matemática. Ensino de Informática Não tratarei em detalhes o ensino profissionalizante de informática, algo que vem sendo feito pelas escolas técnicas, por alguns projetos de segundo grau e pela empresa especializada de ensino. A UNESCO chegou a publicar um currículo de informática para o ensino médio (MEC/SEED, 1997). Na América Latina há grande expectativa da população no sentido de que lidar com computadores é importante para a obtenção de um emprego Em alguns projetos tem havido confusão entre ensino isolado de informática e informática para melhoria do ensino. Ensinar através de pequenos cursos a manejar alguns programas de computadores, embora desejável e importante, é algo relativamente fácil e pouco acrescenta à educação de um aluno típico de escola pública. A pesquisa tem demonstrado que o difícil é colocar computadores numa escola pública de modo duradouro e usá-los para melhoria do ensino e da aprendizagem. A introdução da Informática na escola deve abrir espaço para atendimento à comunidade e aos alunos que desejam obter tais habilidades, supervalorizadas pela propaganda continuada dos cursos isolados de Informática. Este aspecto torna-se mais saliente ao contrastarmos a situação da clientela da escola pública com a situação de famílias afluentes que possibilitam a seus filhos ambientes culturais onde a Informática e a Telemática são objetos do cotidiano, em casa, na escola particular, no trabalho. É importante realizar, com os próprios alunos, um trabalho de leitura crítica desta realidade, discutindo-se as limitações e vantagens do que é ensinado e aprendido em tais situações e possíveis usos de tal conhecimento no trabalho e na sociedade. O domínio superficial de um processador de textos ou de uma planilha pode facilitar a obtenção de um emprego de digitador ou de secretária, mas o mais importante será aquilo que o trabalhador irá fazer com a máquina. Neste enfoque, o melhor ensino da ferramenta deveria ser feito através dos conteúdos manipulados com o instrumento. A pesquisa já demonstrou que o simples uso da ferramenta não melhora o conhecimento de português, matemática ou de outra disciplina. Como usuário iniciante da ferramenta, o educador e o aprendiz não precisam entender o que está acontecendo "por trás" da tela do computador para operá-lo eficientemente. Não há necessidade de memorizar teorias sobre códigos binários, história do computador, etc., do mesmo modo que o operador de um robô não precisa saber que por trás da máquina há uma sofisticada tecnologia baseada na inteligência artificial. Boa parte da teoria dos cursos de introdução à Informática é conhecimento inútil no contexto da escola (e do trabalho), podendo ser considerado como um novo tecnicismo. Se este enfoque for adotado pela escola, há a possibilidade de desenvolvimento de estruturas que estimulem o ensino de mais uma disciplina "chata", que tende a tornar-se obsoleta, com ocorreu com a disciplina "Processamento de Dados." O ensino verbal intensivo de conhecimentos de Informática, com prática superficial e sem uso continuado posterior da ferramenta, será em grande parte esquecido pelo aprendiz após alguns dias ou meses. Além disso, tal conhecimento vem mudando com rapidez, tornando-se mais complexo para o profissional de informática e menos necessário para o usuário comum, acentuando-se assim a desnecessidade de seu ensino na escola. No entanto, numa cultura de uso, quando se precisa usar algum recurso específico da ferramenta, ou quando algum recurso que o usuário não conhece irá tornar seu trabalho mais fácil e melhor, deve-se ensinar - no contexto de uso - o recurso necessário (aprendizagem just in time), havendo maior possibilidade de aprendizagem exploratória, significativa, adequada para a situação, com resultados visíveis. Para se começar a usar, cursos introdutórios, de poucas horas de duração, poderão ser obtidos em qualquer centro urbano de um tamanho razoável. Na escola, tais cursos podem ser oferecidos por alunos que dominam a ferramenta e que tem talento para ensino, supervisionados por um professor experiente. Porém tais cursos não são suficientes para o domínio das modernas ferramentas universais de software, que embora simples de se manejar superficialmente, apresentam recursos sofisticados que só o uso continuado, em comunidades de prática, irá revelar. O treino inicial também poderá ser feito ou complementado através de fitas de vídeo e da literatura existente em quantidade nas livrarias. Formação de professores em Informática Educativa Antes, afirmei que informática é adjetivo, que o professor deverá explorar as novas TI com ênfase no conteúdo, não na ferramenta, e de modo continuado com o apoio de seus parceiros, em grupos físicos ou virtuais de interesse com características comuns. Também coloquei que a escola deve gerir seus recursos tecnológicos e que sem o apoio da administração central da rede ou de outra instituição dificilmente qualquer projeto terá êxito. Que as TI estão cada vez mais fáceis de usar e que o suporte técnico tende a ficar a cargo de especialistas. Para isto é desejável o apoio de entidades que lidem com informática e com educação, particularmente de universidades e de organizações como SENAC, SENAI, escolas técnicas federais, empresas da comunidade, outras escolas que já lidem com tecnologias da informação. Neste modelo, como formar professores para usar as novas TI na escola? Quem deverá formá-los, de que modo? Em primeiro lugar, não devemos confundir dois tipos de profissionais. De um lado, há o professor que pode eventualmente usar computadores em algumas aulas ou orientar seus alunos e alunas como usá-los para complementação da aprendizagem de um determinado conteúdo; do outro, existe o especialista em tecnologia educacional, idealmente formado a nível de especialização ou outro curso de pós-graduação mais avançado, que não trataremos aqui. O ideal será que o educador, no primeiro grupo, aprenda a lidar com as TI durante sua formação regular, nos cursos de licenciatura e de pedagogia, em disciplinas mais ou menos com os nomes de "Tecnologia Educacional" ou "Tecnologias da Informação na Educação" e de modo mas detalhado nas didáticas de conteúdos específicos (Metodologias de Ensino). Algumas faculdades já oferecem tais disciplinas, porém como a universidade, compreensivelmente, é um grande navio de leme curto (não muda de curso facilmente), ainda demorará alguns anos para que haja mudanças neste sentido. Na escola, o educador também poderá começar a explorar a ferramenta com a ajuda de alunos ou alunas experientes, como oportunidades para início de novas relações entre aluno e professor. No mundo complexo de hoje, todos nós temos algo a ensinar e a aprender, independente de sexo, idade, posição social, e a escola poderá aproximar-se da vida também neste particular. Não se deve esperar que todos os professores da escola queiram aprender ou utilizem as novas TI. Aliás, não se deve esperar homogeneidade ou adesão de todos em nada e em nenhum lugar. Existem pessoas que não gostam de máquinas e o computador é um objeto que desperta sentimentos fortes de aproximação e de afastamento. Tenho escutado, espontaneamente, falas de professores neste sentido e tais posições devem ser respeitadas. No etapa de introdução, alguns professores não estarão interessados nas aplicações pedagógicas do computador, mas sim em aprender a dominar a máquina para outros propósitos. Tais casos são delicados e deverão ser objeto de exame pela escola e pelo grupo de interesse ao qual o professor pertença. As etapas e os problemas vividos por professores em várias escolas, durante quase uma década, são descritos de modo detalhado por Sandholtz e colaboradores (1997), que acompanharam o projeto ACOT, da empresa Apple, nos EUA. São exceções as redes escolares que possuem estruturas administrativas de suporte para as novas TI. As existentes encontram-se em poucos estados e municípios que possuem condições materiais e recursos humanos mais capacitados. São necessárias estruturas de apoio, tanto a nível de formação em serviço, continuada, como de suporte técnico para manutenção e atualização de equipamentos e de software. Na escola, será necessário o gerenciamento diário da atividade com computadores, que deverá tomar parte do tempo de alguns funcionários e professores. Este aspecto torna-se mais saliente no processo de implantação. O conhecimento sobre preparação de pessoal e sobre os usos das novas TI na educação ainda é algo relativamente recente em nosso meio (de certo modo em todo o mundo), estando acumulado nas teses e nas publicações de pesquisadores universitários. Os cursos de formação ainda encontram-se numa situação experimental, os alunos sofrem as deficiências da falta de estruturas, de software, de literatura didática. Uma deformação comum, tecnocentrista, é a ênfase em disciplinas de cursos de Informática (fora do contexto para o qual foram pensadas), que certamente terão pouca ou nenhuma utilidade para professores em geral e para os responsáveis pela Informática Educativa na escola (que prefiro chamar de Educadores de Apoio em Informática, enfatizando a identidade primeira do professor, que é ensinar alguma disciplina do currículo a crianças e adolescentes, da qual não deveriam se afastar, salvo exceções, apesar das novas funções). Gestão da Tecnologia pela Escola e pela Rede Escolar Na nossa situação atual, para gerir os recursos de Informática, as pessoas que fazem a escola não necessitam conhecimentos especializados de computação, mas sim de conhecimentos e de experiência em educação, em administração escolar; de vivência do cotidiano complexo, difícil e algumas vezes delicado de uma escola. É desejável que administradores e técnicos também participem de microculturas específicas, formando grupos eletrônicos de interesse, com suporte e incentivos das administrações centrais, de órgãos oficiais e de organizações profissionais. Fora da escola, máquinas caras geralmente são usadas de modo intensivo para viabilizar economicamente e otimizar o investimento. O custo dos computadores é um aspecto que se torna mais saliente nos ambientes modestos de escolas públicas. Ademais, computadores tornam-se obsoletos em poucos anos. Portanto, qualquer experiência realista deve prever o uso máximo dos computadores nos horários de atividade na escola (com pequenos intervalos para limpeza do ambiente e manutenção preventiva). O uso intensivo, por outro lado, acarreta problemas consideráveis de manutenção e de responsabilidades pessoais na escola. Para mencionar um aspecto corriqueiro, o funcionamento contínuo de uma sala de computadores exige limpeza freqüente do piso e de filtros de ar condicionado, manutenção e reinstalação de programas e arquivos danificados por vírus, compra periódica de novos software e equipamentos, cuidado com a segurança. Assim, será necessário retreinar e talvez ampliar o número de pessoas encarregadas de tais tarefas. Um problema citado com freqüência é a posse da chave da sala de informática por administradores autoritários ou por um professor, impedindo o uso intensivo das máquinas. Tenho sugerido que os novos recursos sejam sempre gerenciados por dois ou mais professores da escola, pelo menos um deles com formação especializada, que tenham sua carga de aulas diminuída para atender as novas tarefas. Isto impede o domínio de um indivíduo, minimiza as transições causadas por mudanças de pessoal e estimulam a construção coletiva de rotinas de funcionamento e de solução de problemas que surgem com freqüência nos primeiros anos de assimilação da inovação. Nenhum projeto de assimilação de novas tecnologias pela escola pública terá êxito permanente sem o apoio continuado da administração central da rede escolar. A presença de novas tecnologias na escola requer estruturas de suporte que dependem de políticas específicas. Dentre tais elementos, saliento o tempo de professores e de outros profissionais da escola que irão lidar com a tecnologia; capacitação periódica de pessoal; manutenção e substituição de equipamentos, aquisição de software; ligação com a Internet, preparação de espaço físico adequado na escola. Embora fuja, em parte, ao tema central deste texto, vale a pena notar que nossos administradores ainda não perceberam as enormes implicações de bons projetos de informatização da administração central das redes públicas de educação. Talvez por falta de assessoramento adequado, além de causas outras. O argumento da falta de recursos não é convincente. Investimentos bem feitos nesta área geralmente tem retornos compensadores em prazos bem menores do que o previsto. Em muitos casos, a informatização tem se limitado à produção anual de estatísticas educacionais, à matrícula de alunos e confecção de cadernetas escolares, sem mudanças significativas nas rotinas, continuando a centralização e a existência de fontes de erros de estruturas de gerenciamento anteriores à automação. O uso da informática na avaliação do desempenho escolar também deverá crescer no futuro próximo, com formas de registro e tratamento rápido de grandes volumes de dados que possibilitem a avaliação em processo, envolvendo todos os atores das instituições educacionais. Referências Akker, J.V.; Keursten, P. & Plomp, T. (1992). The integration of computer use in education. International Journal of Educational Research, v.16, pp.65-76. Almeida, Fernando J. (1987). Educação e Informática: Os computadores na escola. SP, Cortez. Andrade, Pedro F. & Albuquerque Lima, Mª Candida (1993). Projeto EDUCOM. Brasília, MEC/OEA. Asimov, Isaac (1986). 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Um computador é um processador de informações e não faz nada que não tenha sido programado a fazer. Por trás de uma tela bonita e colorida há sempre um grande trabalho intelectual e “braçal”, feito por pessoas humanas trabalhando em equipe. Entender isso significa partir do pressuposto de que adquirir computadores e instalá-los em uma escola não é um indicador per si do rumo que esta escola tomará. Não significa necessariamente que a educação desta escola será melhor do que a de outras, ou que esta escola é mais moderna que outras. Primeiro, porque este “melhor” ou “moderno”, independente de estar relacionado à computação ou não, está longe de ser algo consensual: o que é ser melhor? É “dar” aos alunos mais “conteúdo” e, assim, seguindo em certo raciocínio muito comum em algumas escolas, aprovar mais alunos no vestibular? E o que é ser “moderno”? É preparar melhor os alunos para o mercado de trabalho? Segundo, porque a inclusão de computadores por si só indica nada sobre o uso que dará a estes. Como computadores são instrumentos, o que realmente importa não é se a escola os utiliza ou não, mas, sim, como ela os integra ao processo educacional da escola. Numa escola comprometida com um determinado ideal de pessoa, de educação e de sociedade, toda a ação precisa estar direcionada para este fim comum, construído participativamente pela comunidade educativa. Computadores e programas deveriam ser objetos que ajudam a construir sujeitos, mas, em alguns casos, o que acontece é o contrário. Uma solução que vem pronta de fora e não é criada (ou ao menos recriada) pelo grupo de professores e coordenadores, certamente, não produzirá os efeitos desejados no rumo da construção do ideal deste grupo. Há, no entanto, uma questão ainda mais importante a levar em conta nesta discussão: se uma determinada prática é ruim sem os computadores, ela não vais melhorar com eles e pode ficar ainda pior. Computadores, sendo instrumentos, são muito semelhantes a procedimentos metodológicos. Se você não repensa os fundamentos teóricos e gnosiológicos que embasam sua prática, pouca diferença faz mudar a forma de agir (esta mudança isolada pode mascarar ainda mais determinadas características que já são ocultar na prática de uma instituição). Assim, se a prática educativa se uma escola não inclui a formação de sujeitos do processo de conhecimento, não será a introdução de computadores que fará isto. É fundamental pensar também no conteúdo dos programas de computador que as escolas vêm usando. Muitas partem do pressuposto de que tudo que é feito em computadores é melhor do que é feito nas aulas tradicionais. Mas a mesma crítica que temos feito aos livros didáticos, é preciso fazer aos programas de computador. Por que trazem este conteúdo e não outro? Quais as noções que ficaram de fora neste recorte da realidade feito pelos autores do programa? Muitos dos programas usados nas escolas são a mera transposição de livros didáticos para o “atraente” formato computacional. Há, ainda, outra questão ligada à discussão do conteúdo. Como a esmagadora maioria dos programas educacionais de computador são das chamadas “ciências exatas”, corre-se o risco de relegar as disciplinas “humanas” a um segundo plano quando de um processo maciço de informatização das escolas. Terão prestígio na escola apenas as disciplinas que se utilizarem dos recursos computacionais. Isto ocorre principalmente porque as escolas tendem a comprar programas prontos ao invés de desenvolvê-los. As perguntas a fazer são: de que serve comprar computadores de última geração e depois reproduzir os mesmo velhos conteúdos e as mesmas velhas práticas, utilizando alta tecnologia? Qual o sentido de introduzir computadores se não questionamos o conhecimento presente nas escolas? Por que não aproveitar a nova “forma” para repensar todo o currículo? Uma outra questão inseparável desta citada acima é: como os computadores serão usados concretamente na escola? A maioria das “aulas de computação” ( o próprio nome dado às aulas já indica o objeto da aula ... ) é bastante restrita e restritiva. Num primeiro momento, os alunos aprendem a usar minimamente os computadores. A fase seguinte é oferecer aos alunos um programa que vai pedir a eles que leiam um texto, vejam algumas figuras, ouçam alguns sons e apreciam algumas animações. Após esta fase, pedese que o alunos responda algumas questões, no próprio programa, sobre o que viu e ouviu. Uma pergunta se faz necessária: é preciso usar computadores para repetir esta metodologia usada há gerações na escola? Não é possível que uma escola que leva a sério o trabalho da educação adquira computadores apenas para levar seus alunos para brincar com jogos eletrônicos ou aprender a operar um editor de texto no laboratório de computação . Isto qualquer cursinho de computação faz (quando a pessoa não se dispuser a aprender sozinha...). A escola precisa oferecer um diferencial. Se alguém entende a educação apenas como apresentação de novas informações, deve se preparar para a aposentadoria. Computadores multimídia com bons programas fazem isto muito melhor que a escola. A escola pode e deve ser o local onde os alunos criam e recriam conhecimentos, começam (ou continuam) a aprender a ler e interpretar o mundo onde vivem e preparar-se (e por que não começar) a agir na construção de ideais. Isto é o diferencial da escola e não são computadores ou programas que farão isto. Mas eles, como tudo o mais na escola, devem estar a serviço disto. São bons instrumentos, desde que você saiba exatamente o que quer com eles. Sendo um instrumento, os recursos que os computadores proporcionam, deveriam ser usados pelos professores das disciplinas, aproveitando os computadores para integrar mais o trabalho deles. Ou seja, é preciso que nós, professores, aceitemos o desafio de dominar a linguagem computacional e subordinar o uso de programas de computador aos objetivos específicos de nossa área de conhecimento e, mais amplamente, ao nosso projeto de educação e sociedade. Muitos professores parecem ter mesmo muito receio da introdução de computadores na educação. Um destes medos é daqueles que, preocupados com seus alunos, associam imediatamente estas máquinas com crianças ou adolescentes isolados, brincando compulsivamente com jogos eletrônicos. Isto pode ocorrer, da mesma forma que ocorreu e ainda ocorre com a TV. Mas a escola pode estimular um outro uso, mais coletivo destas máquinas. A ligação de computadores em rede permite que recursos computacionais possam ser compartilhados e que - mais importante no caso da educação – figuras, textos, sons e apresentações elaboradas pelos alunos também possam ser compartilhadas. Tal ligação permite a criação de textos coletivos, o estímulo da idéia de solidariedade e a noção da informação como algo que deve estar disponível para todos a fim de que o trabalho seja de boa qualidade. Crianças de regiões diferentes do país (e por que não de outros países também) que estejam estudando um mesmo tema podem trocar impressões com colegas que vivem em realidades totalmente diferentes e, portanto, ter uma visão um pouco mais global do problema em questão. Ou seja, é possível discutir a questão da diversidade cultural, da convivência e o respeito ao diferente, a idéia que o conhecimento se constrói através de esforços coletivos, entre idéia-chave que perpasse todo o currículo. É óbvio que conectar-se à Internet tem custos que podem ser muito altos. Mas há muitas soluções criativas, tais como o uso da Internet via rádio amador (ao invés de linha telefônica), o que reduz o custo de manutenção das conexões com outras escolas a quase zero. Outro destes medos é o de que, a exemplo do que ocorre em bancos, fábricas e no setor produtivo em geral, as máquinas venham a substituir os trabalhadores e eliminar empregos. É uma preocupação bastante legítima, principalmente se tivermos em mente muitas das escolas atuais. Como já discuti acima, se entendermos educação como uma mera transmissão de informações, a profissão de professor está mesmo ameaçada. Informações estão disponíveis em programas e principalmente na Internet. Nesta é possível obter a última informação disponível em praticamente qualquer área do conhecimento de forma rápida e eficiente. Como competir? Educação , no entanto, como demonstrei no decorrer deste artigo, é muito mais do que mera transmissão de informação. Por isso, desde que tenha um diferencial, seja um local de produção de conhecimento, não vai competir com computadores, programas e Internet, mas vai utilizá-los para construir e reconstruir “saberes”. Nesta concepção de escola, o professor é indispensável. Concluindo, ninguém fique com a idéia de que sou contra o uso de computadores na escolas. Eu mesmo sou um usuário ativo de computadores e coordeno um laboratório de computação para o ensino de graduação na Faculdade de Educação de UFRGS. Os computadores podem, de fato, tornar muitas tarefas imensamente mais fáceis. O que realmente importa não é discutir se devemos ou não usar computadores nas escolas – embora esta seja uma questão hoje, creio que eles inexoravelmente estarão (se já não estão) presentes em nossas vidas em nossas escolas em um futuro próximo – mas, como tudo o mais em educação, refletir sobre a lógica que vai reger o seu uso na nossa escola e qual a relação que este terá com o nosso projeto político-cultural-pedagógico. Esta é uma tarefa urgente para nós educadores. REPENSANDO A INFORMÁTICA EM AMBIENTES DE EDUCAÇÃO ESPECIAL Silvia Branco Vidal Bustamante UCP/Petrópolis/RJ Abstract Informática e Educação Especial envolvem-se no contexto do Centro de Informática Educativa da Universidade Católica de Petrópolis, interligandose com a mesma metodologia dos outros projetos desenvolvidos. Considerando a importância das tecnologias cognitivas e a necessidade de se trabalhar com os computadores dentro de uma pedagogia de reestruturação de conhecimentos ao invés de priorizar uma tecnologia de reprodução de informações, o trabalho com Informática nos conduz a uma metodologia pela qual toda Educação é um processo especial. Estes projetos se desenvolvem com a atuação específica de Janine Cristina Coutinho de Souza, Orientadora Educacional e Mara Carneiro de Souza, Psicóloga. Ambas são Especialistas em Informática Educativa. Introdução O Projeto de Informática Educativa da Universidade Católica de Petrópolis iniciou suas atividades em 1984 tendo como linha mestra ao longo destes anos, trabalhar inteligência e cognição através do uso de computadores como ferramenta. A presença dos computadores na sociedade contemporânea transforma a escola num segmento apropriado para a inserção da tecnologia, ensejando pesquisas que investiguem cibernética e educação, considerando que cada vez mais os ambientes escolares estão mediados pela relação homem-máquina. Nesse contexto as tecnologias cognitivas (Baranauskas, 1993), tornam-se importantes elementos de mediação e de transformação da prática pedagógica convencional, buscando resgatar para a escola o uso da inteligência como origem e fonte do processo de conhecimento. O Projeto de Informática Educativa da Universidade Católica de Petrópolis procura investir no pensamento e na criatividade do aluno e do professor utilizando as tecnologias da informática e da comunicação para resgatar a beleza de aprender e pensar como um trabalho interativo de descoberta e redescoberta da inteligência. Não basta ter a informação diante de si para que ela se transforme em conhecimento. Torna-se necessário trabalhar com ambientes interativos onde a tecnologia atue como estímulo à cognição social (Nastasi, B. et alii 1990), à aprendizagem cooperativa e a descoberta do potencial escondido de pensamento em cada um dos elementos que interagem nos ambientes pedagógicos. Tomamos como referencial de todos os projetos que desenvolvemos, o quadro que considera que os computadores voltam-se mais para uma pedagogia de reestruturação do conhecimento, que para uma tecnologia de reprodução de informações. O Projeto de Informática e Educação Especial: O Centro de Informática Educativa da Universidade Católica de Petrópolis, trabalha com Informática e Educação Especial desde 1988, abrangendo indivíduos portadores de necessidades específicas utilizando a metodologia Logo (Papert, 1985). Sem constituir linhas de pesquisa experimental em sentido estrito, o projeto vem se desenvolvendo ao longo destes anos como investimento de natureza pedagógica, buscando resgatar a qualidade de vida do indivíduo especial. O que se pretende abranger é o desenvolvimento qualitativo de funções residuais e funções alternativas que possam servir para integrar o portador de necessidades especiais. Por outro lado a utilização de tecnologias avançadas de imagem, animação, som e comunicação não constituem o traço fundamental do projeto, tendo em vista que a relação homem-máquina é desprovida de significado se não for propulsora de uma referência que resgate a relação do ser humano consigo mesmo e com outros seres humanos (Bustamante, S. 1992 b). A tecnologia por si mesma não representa garantia de reestruturações lógicas, ainda que possa desempenhar importante apelo quanto à motivação. Sua importância maior consiste em que se possam utilizar os computadores como próteses e como amplificadores da cognição (Battro, A. M. 1989 a). Objetivos O que se pretende neste projeto é despertar caminhos interiores que levem a mobilizar o ambiente pedagógico no sentido da qualidade da aprendizagem como ferramenta adequada para desenvolver a inteligência. Outra perspectiva importante do projeto consiste em nos permitir considerar que a educação como um todo não depende da tecnologia, mas da maneira pela qual os recursos disponíveis são implementados. Quaisquer que sejam os modernos recursos da cibernética nenhum deles será válido em área alguma se não se considerar como pressuposto que toda a Educação é um processo Especial. Esses parâmetros são relevantes como investigação e como modelos de relacionamento onde, ao trabalhar com o computador aprende-se a diferença entre o homem e a máquina, buscando metodologias mais dignas para abordar o indivíduo deficiente e aqueles que, por condições marginais, podem apresentar dificuldades de acesso aos padrões de vida normal na sociedade. Metodologia A metodologia utilizada para a reabilitação do indivíduo portador de necessidades especiais encontra no computador uma ferramenta para estabelecer o diagnóstico da inteligência. Esse diagnóstico no entanto não se realiza através dos testes convencionais de psicologia voltados para a psicometria. A inserção desses testes no computador é sem duvida um recurso tecnológico poderoso. No entanto não é nesse poder que reside a riqueza do uso do computador. O diagnóstico com que atuamos requer um processo longitudinal de acompanhamento pedagógico onde, através de ações e operações que o indivíduo deficiente possa realizar interagindo com o computador, este atue como espelho da mente. Através da projeção figural na tela do computador é possível identificar como as estruturas lógicas estão sendo trabalhadas. Nas situações onde é possível trabalhar com a organização de procedimentos detecta-se o processo não apenas pela projeção figural, mas pela estruturação interna que gera a figura proposta como projeto ou como desafio. Esse recurso é essencialmente válido no caso dos portadores de deficiência auditiva severa e no caso dos portadores de paralisia cerebral cujas funções lógicas não tenham sido atingidas pela lesão. Os casos em que se pode diagnosticar estruturas lógicas intactas ou passíveis de recuperação representam uma área interessante de investigação dos processos cognitivos enquanto sofrem ou não interferência da perda sensorial ou motora. A novidade apresentada pelas conquistas da tecnologia em hardware e software oferece excelentes recursos no que se refere à atualização cultural e á aquisição de informações. São veículos necessários à integração do ser humano à sociedade do nosso tempo. Os recursos da Multimídia, da Internet e da Realidade Virtual enquadram-se neste contexto. No entanto o significado dessa utilização deve potencializar, no caso da Multimídia, a mídia do sujeito com capacidade de criar a superação dos seus limites, utilizando o pensamento como capacidade de criar e como fonte da mensagem que dá sentido à mídia. Os recursos da Internet como rede de comunicação nos levam a buscar a incidência pedagógica sobre as redes neurais do indivíduo portador de deficiência, no intuito de torná-las capazes não apenas de receber, mas de estabelecer e criar condições de conhecimento e comunicação. Quanto à tecnologia de Realidade Virtual utilizada como recurso terapêutico para que o sujeito se veja com imagem projetada sem as deficiências que possui, nosso trabalho incide no sentido de que o sujeito portador de deficiência trabalhe a virtualidade ou a possibilidade de entender o que lhe é real e operar em condições de superá-lo quanto à compreensão de suas limitações. Desta forma irá buscar não a realidade virtual oferecida artificialmente pelos recursos do computador, mas a realidade virtual de suas possibilidades. Sendo portanto mais críticos e restritos no sentido da aceitação da mídia tecnológica, buscamos trabalhar com o computador para desenvolver não o Logo linguagem de programação, mas o Logo pensamento e linguagem. Esse pensamento e linguagem tanto na Educação Especial como na educação como um todo podem utilizar a informática para resgatar para a escola o sentido perdido da aprendizagem autêntica e o significado verdadeiro do ser humano no tempo da tecnologia. Os projetos que se dedicam à Educação Especial abaixo discriminados, envolvem indivíduos portadores de diversas necessidades, cada uma delas sendo diagnosticada através da interação com o computador em trabalho longitudinal. 1. Projeto Portadores de Deficiência Auditiva Desenvolve-se com duas turmas de alunos da Escola Municipal Santos Dumont, em Petrópolis, RJ. desde 1990. O projeto, além de possibilitar curso para deficientes auditivos volta-se para a sua integração social com indivíduos ouvintes, através dos recursos da comunicação total. No desenvolvimento das atividades do projeto não se utiliza a linguagem de sinais. O computador é apenas uma ferramenta, não se objetivando de maneira direta o uso profissionalizante. No entanto, procura formar monitores capazes de atuar em ambientes computacionais de aprendizagem dentro da metodologia Logo (Papert, 1985), criando oportunidades de trabalho, restabelecimento do senso de poder pessoal e do poder de comunicação com a comunidade. Atualmente dois portadores de deficiência auditiva severa encontram-se atuando como "professores" para crianças, sendo que um deles já atua no processo desde 1993, monitorando dois grupos de crianças e adolescentes em nossos laboratórios. As perspectivas de integração do portador de deficiência auditiva à vida profissional dependem de um desenvolvimento longitudinal e se apresentam como promissoras em pequena escala, no sentido de estabelecer a comunicação intra e interpessoal em padrões significativos para os objetivos do projeto. Essa integração deve ocorrer não apenas entre indivíduos portadores da mesma deficiência, mas enseja o estabelecimento de ambientes interativos que incorporem o portador de deficiência auditiva atuando em comunidades de pessoas ouvintes de acordo com as possibilidades que ele pode desenvolver. 2. Projeto Autismo O projeto autismo utiliza uma fundamentação que contraria o que normalmente se pensa sobre o uso dos computadores em educação: há hipóteses relacionadas a que, a criança em contato com o computador pode apresentar indícios de fechamento para o contato com o mundo exterior. Nesse caso, a máquina pode contribuir para que as predisposições ao isolamento sejam acentuadas, contribuindo para a formação de comportamentos estereotipados e agressivos não desejáveis ao ambiente educacional. Ao contrário do que se poderia supor, este projeto trabalha com ambientes computacionais de aprendizagem visando a abertura do portador de autismo para o mundo exterior. Considerando a gravidade do problema em estudo, o trabalho que se realiza é lento com resultados bastante significativos ao nível de aquisição da linguagem escrita e falada, bem como dos primeiros sinais de comunicação com o mundo exterior. Desenvolve-se desde 1993, em sessões isoladas com três indivíduos portadores de autismo em diferentes graus. Como experiência piloto trabalha, a partir de então com um autista desprovido de linguagem oral e alfabetização, tendo conseguido integrá-lo ao mundo da comunicação verbal escrita e falada. Trabalha também com autistas já em processo de socialização, marcados porém por rituais e comportamentos mecanizados que constituem sua estereotipia. Em 1996, o portador de autismo que se caracterizou como experiência piloto em nosso centro, apresenta padrões de comunicação através da linguagem falada e escrita, bem como através da busca de canais de comunicação com as pessoas que participam do projeto, e com outras pessoas em outros ambientes. Essa conquista gradativa é importante para o trabalho que está sendo realizado, tendo em vista que a criança no início do processo apresentou características de hiperatividade, ausência de linguagem escrita e falada, comunicando-se através de gritos sem conteúdo significativo. Pelo quadro exposto, o trabalho utiliza a linguagem Logo, procurando, ao máximo desvincular o uso do computador de qualquer proposta de automação entre estímulo e resposta. Trabalha através da descoberta e da expressão pessoal, gerando interessante e inédita documentação do processo e da diagnose do desenvolvimento do autista através do uso do computador como ferramenta. Destaca o valor da metodologia Logo como técnica de abertura da mente exclusiva de um mundo isolado de objetos e pessoas, para um mundo que é diferente do subjetivismo, onde cada um possa ser capaz de perceber e receber a existência do outro. 3. Projeto Síndrome de Down Desenvolve-se no Centro de Informática Educativa da Universidade Católica de Petrópolis, desde 1990, buscando abordagem alternativa ao treinamento, para que o portador de Síndrome de Down possa desenvolver-se e integrar-se como pessoa na família, no ambiente escolar e na comunidade em que vive. Utiliza o computador para desenvolver as funções lógicas que podem ser ampliadas ao invés de serem treinadas, estimulando a sociabilidade, a descoberta e o comportamento criativo, necessários à integração social do portador de Síndrome de Down. Trabalha com 6 crianças em orientação de desenvolvimento longitudinal, onde os resultados são obtidos a longo prazo, dentro da sociabilidade que normalmente permite uma interação não muito difícil com os recursos do computador e da Linguagem Logo. As atividades são sugeridas pelo ambiente Logo através de pequenos desafios que atuam sobre a função lógica residual objetivando integrá-la a outras atividades que o portador de Síndrome de Down seja capaz de realizar individual e comunitariamente. O objetivo não é profissionalizar, mas desenvolver a riqueza interior da criança Down, através de projetos que utilizem o computador como proposta de desafios mediando a descoberta do que existe dentro da própria criança, como possibilidade de realização. O acompanhamento longitudinal tem permitido verificar o enriquecimento de suas potencialidades através da metodologia interativa onde o computador é apenas uma ferramenta para o desenvolvimento de outras atividades interligadas à sua valorização como Pessoa. A relevância deste projeto reside também na integração do portador de Síndrome de Down com outros indivíduos que podem aprender a aceitar os seus padrões de comportamento, orientando-os no entanto a uma conduta passível de integração sem superproteção. Os resultados obtidos através deste trabalho apresentam-se como motivadores em relação a um ambiente que nos permite descobrir outras abordagens para a prática pedagógica que não se restringem ao treinamento. O que se propõe neste contexto é explorar as experiências que o portador da síndrome é capaz de realizar e enriquecer o próprio ambiente com os recursos utilizados pelo sujeito para empreender uma aprendizagem que é significativa para ele mesmo, para seu grupo, para a família e a comunidade em que vive, resgatando interna e externamente o significado de uma existência e de uma aprendizagem interativa. 4. Projeto Paralisia Cerebral O projeto teve início em 1992, e atualmente trabalha com 6 crianças da Sociedade Pestalozzi de Petrópolis. Representa uma das áreas de mais difícil abordagem, visto que os indivíduos portadores de paralisia cerebral apresentam características físicas distintas, dependendo da área lesada e do grau de comprometimento do cérebro. Em alguns desses indivíduos, encontramos profundos déficits na psicomotricidade, o que torna difícil a interação com o computador, a manipulação do mouse e do teclado; outros apresentam apenas dificuldades da psicomotricidade fina, sendo ambos, ainda assim passíveis de uma orientação que procura ao máximo ser não diretiva, buscando no sujeito o impulso para vencer os obstáculos na interação com o meio ambiente. Em nenhum dos casos utilizamos teclados especiais ou metodologias que nos induzam a fazer pelo aluno o que ele possa fazer por si mesmo. Utilizando o computador dentro de metodologia centrada no aluno, o projeto visa ao desenvolvimento de funções cerebrais alternativas que possam substituir as funções prejudicadas por lesões específicas. Considera a plasticidade do cérebro e os motivos para agir que independente de dificuldades motoras ou cerebrais possam significar processos de aprendizagem e de atuação significativa no ambiente em que vivem. Trabalha ao nível da dificuldade de cada indivíduo, levando-o a crescer em autonomia e sem superproteção, para que possa vencer as dificuldades de natureza lógica ou psicomotora relacionada à paralisia das funções cerebrais. O computador atua como prótese em relação ao desenvolvimento cognitivo, individual e social do portador de paralisia cerebral, atuando também como elemento integrador do portador de deficiência física em atividades que possam ser por ele exercidas de maneira adequada. O principal enfoque do projeto consiste em utilizar os computadores como amplificadores da cognição (Battro, 1989), fazendo que a consciência de possibilidades lógicas e motoras, ainda que residuais, possa ser trabalhada no sentido da valorização pessoal e da interação do portador de paralisia cerebral e deficiência física com a comunidade escolar e com a sociedade que normalmente não está preparada para entendê-lo e recebê-lo como ser humano. 5. Projeto Deficiente Mental Moderado Desenvolve-se com crianças da rede pública estadual no município de Petrópolis, desde 1988. Os alunos que fazem parte deste projeto são normalmente alunos de classes especiais que não apresentam o desenvolvimento necessário para a participação em turmas que se orientem por um currículo normal. Sem apresentarem maiores problemas na área da psicomotricidade fina, caracterizam-se por dificuldade de concentração, linguagem, cálculo e funções relacionadas à aquisição de símbolos e signos necessários à representação do conhecimento e à sua utilização na vida escolar e cotidiana. O projeto utiliza o computador como forma de possibilitar a diagnose da dificuldade e o desenvolvimento dos resíduos que permitam a localização das funções espaço-temporais do portador de deficiência mental moderada. Busca permitir que possa atuar no mundo em que vive, não dentro das limitações provocadas pela deficiência, mas dentro de condições de estímulo que lhes permitam resgatar a autonomia e a realização de pequenas tarefas rotineiras. Estimula o desenvolvimento de estruturas lógicas, procurando expandir a capacidade de realização, sem incidir diretamente sobre o reforço, o treinamento ou a aquisição de conteúdos escolares, mas voltando-se sobretudo, para o domínio do lógico, a incidência sobre a auto-imagem e o senso de confiança. Embora o resultado do projeto nesta área seja muito lento e a longo prazo, os objetivos não consistem em preparar para a profissionalização, nem em estabelecer uma prática de utilização dos computadores no sentido de inteirá-los com a tecnologia da informática. O que se pretende é resgatar a possibilidade de integração social e a viabilidade da integração consigo mesmo, permitindo que se expandam as possibilidades de atuação na escola e em situações de vida que sejam distintas do isolamento e da alienação. O projeto permite também resgatar ao professor de classe especial a motivação para o trabalho que realiza onde, apesar dos poucos resultados alcançados é possível verificar que a quantidade do que se consegue é insignificante perante a qualidade de cada momento em que a criança conseguiu superar a si mesma. 6. Projeto Meninos de Rua Considera-se esta área como um trabalho de Educação Especial, tendo em vista que os meninos de rua são portadores de carências que provocam seu comportamento desviante. Comparando-os com outros deficientes, os meninos de rua são de certa forma também portadores de necessidades especiais, pelas deficiências que apresentam e pelo muito que exigem em função do pouco que lhes é dado pela estrutura marginal de sua vida. Desenvolve-se no Centro Comunitário de Nogueira, Petrópolis, RJ, desde 1993, atendendo em média a 80 crianças por ano. A característica dessas crianças é fortemente marcada pela vivência na rua, apresentando índices de passagem à delinqüência que merecem investimento para reverter o processo. Considerando-se a dificuldade de interagir com o menor em risco de delinqüência, o projeto é considerado de relevância para a sociedade em geral priorizando o uso do computador para atuar sobre os padrões lógicos que orientam o comportamento marginal, levando a situações onde os desafios a serem solucionados conduzam à reestruturação do raciocínio de modo a caminhar de padrões subjetivos e desintegrados, a padrões de objetividade lógica e social. Na fase atual estão sendo preparados os Educadores de Meninos de Rua que atuam no Centro para trabalharem como multiplicadores do projeto. As diversas oficinas participam de forma integrada com as propostas da Oficina de Informática. O projeto, agora em uma nova fase, volta-se para o uso do computador como ferramenta de profissionalização. O projeto Meninos de Rua desenvolve-se também desde agosto de 1995, na Casa dos Meninos de Petrópolis. Este centro atende a 200 crianças que possuem relativo referencial familiar mas se caracterizam por eventual risco de desintegração social e perda do sentido de lar. As diversas atividades interligam-se ao desenvolvimento de situações de aprendizagem que possam ser transferidas para situações de vida, objetivando relacionar as estruturas lógicas solicitadas pelo uso do computador à vivência profissionalizante característica deste centro de trabalho com o menor. Em 1998, o projeto expandiu-se, através da interação com o Projeto Vem prá Casa, promovido pela Secretaria de Ação Comunitária da prefeitura Municipal de Petrópolis, que integrou no novo laboratório da Casa dos Meninos de Petrópolis, diversas oficinas, atendendo a crianças que moram na rua, a crianças que estudam na Casa dos Meninos e as crianças do Centro Comunitário de Nogueira, cujo laboratório encontrava-se obsoleto. Neste centro da comunidade, estão sendo desenvolvidos os trabalhos do Centro de Informática Educativa, com 140 crianças e adolescentes. Ainda em 1998, a interação com a Comissão Municipal de Atuação Comunitária - COMAC, permitiu que o trabalho envolvesse outros 80 adolescentes, com o desenvolvimento de oficinas de informática para a formação de alunos carentes, dentro de uma perspectiva de uso de computadores voltado para a integração do indivíduo na sociedade, permitindo a descoberta da máquina mas utilizando o computador para o resgate do ser humano e o encontro consigo mesmo e com o Outro, em busca de uma dimensão mais humana do uso da tecnologia. Repensando a Informática em ambientes de Educação Especial: "Em um mundo de máquinas, não somos máquinas, nem buscamos as máquinas apenas. Buscamos pessoas que esperem nosso tempo e superem conosco nossas limitações: Apenas a máquina não pode resgatar para mim, o sentido perdido da existência que a sociedade parece me negar. Necessito alguém que acredite naquilo que de bom posso fazer apesar da marginalidade em que me vejo envolvido. O computador não pode fazer por mim, o que eu mesmo não posso realizar: não poderei ouvir através do computador os sons que não escuto, nem poderei dizer as palavras que não sei e que dentro de mim são silêncio. Apenas poderei escrever o que não ouço e trabalhar meus conceitos a partir da lógica que pouco a pouco vou construindo na difícil busca entre objetos, palavras e conceitos. As janelas do mundo exterior que são fechadas dentro de mim não se abrirão apenas através da máquina. É necessário quem escute meus gritos ou minha linguagem mecânica e os transforme em compreensão até que eu chegue a perceber o outro e o mundo que me cerca, interagindo com ele e transformando o meu grito em palavra. Minhas deficiências não serão substituídas pela eficiência da máquina e meus limites não serão em mim jamais quantitativamente superados. Não passarei a andar, se não puder fazê-lo, nem poderei escrever, se meus dedos não coordenarem o movimento da escrita. Poderei apenas pensar e sorrir, ainda que com pensamento limitado e com sorriso talvez distorcido pela deficiência ou pela dificuldade que me atinge. Naqueles que me conduzem, encontro pessoas de coração aberto que, ao invés do automatismo da máquina me permitem encontrar a alegria perdida, apesar da minha marginalidade, apesar da minha segregação, apesar dos meus limites, apesar do meu grito incompreensível e apesar do meu silêncio. Em um mundo de máquinas, que elas nos ajudem a encontrar pessoas que sejam diferentes delas: pessoas que saibam ter a esperança que muitas vezes não temos e que nessa esperança nos convidem a encontrar no limite da nossa existência a beleza escondida de nossas possibilidades." Equipe do Projeto Janine Cristina Coutinho de Souza, Mara Carneiro de Souza Noel, Fábio Gelatti , Daniela dos Santos Alves, Frederico Mendonça Motta, Alexandro Caputo Doufen, Cristina Stanitz Teixeira, Luis Gustavo Ferreira da Silva Costa, Wenderson Fani, Cátia Cristina Carrano Gastadel, Caroline Dias Galheigo, Andréa Abreu dos Santos, Fernanda de Melo Pacheco e Viviane Almeida de Souza. Bibliografia: BARANAUSKAS, C. (1993) Novas Tecnologias no Processo do EnsinoAprendizagem. DCC/Nied/UNICAMP, São Paulo, SP. BATTRO, A. M. (1989 a) La educación del talento excepcional. Fundación Bernardo A. Houssay, Buenos Aires. ------------------, DENHAM, P. (1989 b) Discomunicaciones: computación y niños sordos. Fundación Navarro Viola, Buenos Aires. BUSTAMANTE, Silvia Branco Vidal (1991) Projeto Logo Deficiente Mental Educável. 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COUTINHO DE SOUZA, Janine Cristina (1995) O computador como ferramenta para retratar a estrutura lingüística e a visão de mundo do menino de rua. Anais do VII Congresso Internacional Logo e I Congresso de Informática Educativa do Mercosul, Porto Alegre, RS. ------------------- (1995) Subsídios para uma análise das dificuldades de aquisição da língua escrita em criança portadora de visão subnormal. Anais do VII Congresso Internacional Logo e I Congresso de Informática Educativa do Mercosul, Porto Alegre, RS. FAGUNDES, Léa da Cruz (1986). Psicogênese das Condutas Cognitivas da Criança em Interação com o Mundo do Computador. São Paulo, Universidade de São Paulo, Instituto de Psicologia, (Tese de doutoramento). FREIRE, Fernanda Maria Pereira (1994) A aprendizagem de crianças com problemas sensoriais no ambiente Logo NIED / Unicamp GUILFORD, J. P. (1971) The nature of humain intelligence. McGraw Hill, London. NASTASI, B. et alii (1990) Social Cognitive Interactions. 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VISÃO ANALÍSTICA DA INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO NO BRASIL: A QUESTÃO DA FORMAÇÃO DO PROFESSOR José Armando Valente INTRODUÇÃO A História da Informática na Educação no Brasil data de mais de 20 anos. Nasceu no início dos anos 70 a partir de algumas experiências na UFRJ, UFRGS e UNICAMP. Nos anos 80 se estabeleceu através de diversas atividades que permitiram que essa área hoje tenha uma identidade própria, raízes sólidas e relativa maturidade. Apesar dos fortes apelos da mídia e das qualidades inerentes ao computador, a sua disseminação nas escolas está hoje muito aquém do que se anunciava e se desejava. A Informática na Educação ainda não impregnou as idéias dos educadores e, por isto, não está consolidada no nosso sistema educacional. Diante desse quadro, a pergunta que se faz é: "por que essa proliferação não aconteceu"? Talvez a resposta mais óbvia seja: "faltou vontade política dos dirigentes", projetos mais consistentes e corajosos e, conseqüentemente, verbas. Mas a resposta não é tão simples. Focar a discussão somente na falta de recursos financeiros parece muito superficial. Nesse momento, quando se inicia o ano de 1997 e o Governo Federal cria condições para a disseminação da Informática na Educação, é extremamente oportuna a reflexão sobre essa longa caminhada e a compreensão de como essa disseminação pode ser efetivamente mantida dentro de propostas competentes e viabilizadas pela comunidade científica e educacional. A posição que defendemos é que, além da falta de verbas existiram outros fatores responsáveis pela escassa penetração da Informática na Educação. A preparação inadequada de professores, em vista dos objetivos de mudança pedagógica propostos pelo "Programa Brasileiro de Informática em Educação" (Andrade, 1993; Andrade & Lima, 1993) é um destes fatores. Esse programa é bastante peculiar e diferente do que foi proposto em outros países. No nosso programa, o papel do computador é o de provocar mudanças pedagógicas profundas ao invés de "automatizar o ensino" ou promover a alfabetização em informática como nos Estados Unidos, ou desenvolver a capacidade lógica e preparar o aluno para trabalhar na empresa, como propõe o programa de informática na educação da França. Essa peculiaridade do projeto brasileiro aliado aos avanços tecnológicos e a ampliação da gama de possibilidades pedagógicas que os novos computadores e os diferentes software disponíveis oferecem, demandam uma nova abordagem para os cursos de formação de professores e novas políticas para os projetos na área. O artigo descreve, inicialmente, os principais marcos do desenvolvimento da Informática na Educação nos Estados Unidos da América e na França. O Programa Brasileiro de Informática na Educação, de certa forma, foi influenciado pelo que foi realizado em Informática na Educação nesses países e, portanto, a discussão dessas realizações cria um contexto bastante importante para entender o Programa Brasileiro. Em seguida o artigo descreve as bases para a Informática na Educação no Brasil de forma genérica uma vez que o artigo da Maria Cândida de Moraes (ver páginas xxxxx) detalha as principais ações do Programa Brasileiro de Informática na Educação. Finalmente, aprofunda nas questões da formação do professor e dos avanços tecnológicos em consonância com as exigências e peculiaridades do Programa Brasileiro. A INFLUÊNCIA DE OUTROS PAÍSES NO DESENVOLVIMENTO DA INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA A Informática na Educação no Brasil nasce a partir do interesse de educadores de algumas universidades brasileiras motivados pelo que já vinha acontecendo em outros países como nos Estados Unidos da América e na França. Embora o contexto mundial de uso do computador na educação sempre foi uma referência para as decisões que foram tomadas aqui no Brasil, a nossa caminhada é muito particular e difere daquilo que se faz em outros países. Apesar das nossas inúmeras diferenças, os avanços pedagógicos conseguidos através da informática são quase os mesmos que em outros países. Nesse sentido estamos no mesmo barco. Mesmo nos países como Estados Unidos e França, locais onde houve uma grande proliferação de computadores nas escolas e um grande avanço tecnológico, as mudanças são quase inexistentes do ponto de vista pedagógico. As mudanças pedagógicas são sempre apresentadas ao nível do desejo, daquilo que se espera como fruto da informática na educação. Não se encontram práticas realmente transformadoras e suficientemente enraizadas para que se possa dizer que houve transformação efetiva do processo educacional como por exemplo, uma transformação que enfatiza a criação de ambientes de aprendizagem, nos quais o aluno constrói o seu conhecimento, ao invés de o professor transmitir informação ao aluno. Informática na educação nos Estados Unidos da América Nos Estados Unidos, o uso de computadores na educação é completamente descentralizado e independente das decisões governamentais. O uso do computador nas escolas é pressionado pelo desenvolvimento tecnológico e pela competição estabelecida pelo livre mercado das empresas que produzem software, das universidades e das escolas. As mudanças de ordem tecnológica são fantásticas e palpáveis mas não têm correspondência com as mudanças pedagógicas. O início da Informática na Educação nos Estados Unidos, no princípio dos anos 70, não foi muito diferente do que aconteceu no Brasil. Os recursos tecnológicos existentes no sistema educacional de 1° e 2° graus nos Estados Unidos em 1975 era semelhante ao que existia no Brasil. Segundo Ahl (1977), a tecnologia existente nas escolas americanas era a do giz e quadro-negro. O número de escolas que usavam computadores como recurso educacional era muito pequeno. Por outro lado, as universidades já dispunham de muitas experiências sobre o uso do computador na educação. No início dos anos 60, diversos software de instrução programada foram implementados no computador, concretizando a máquina de ensinar idealizada por Skinner no início dos anos 50. Nascia a instrução auxiliada por computador ou o Computer-Aided Instruction (CAI), produzida por empresas como IBM, RCA e Digital e utilizada principalmente nas universidades. O programa PLATO, produzido pela Control Data Corporation e pela Universidade de Illinois, sem dúvida, foi o CAI mais conhecido e mais bem sucedido. Entretanto, a presença dos CAIs foi fundamental para fomentar a discussão de questões mais profundas de ordem pedagógica. Isso ficou claro na conferência Ten-Year Forecast for Computer and Communication: Implications for Education, realizada em Setembro de 1975 e patrocinada pela National Science Foundation. Os trabalhos apresentados indicavam a existência de uma polêmica entre os autores que defendiam o uso do sistema de grande porte na disseminação de CAI como ferramenta auxiliar do processo de ensino e os que defendiam o uso de sistemas computacionais para facilitar uma reforma total do sistema educacional, como Minsky (1977), Papert (1977), e Dwyer (1977). As dificuldades da disseminação do CAI eram de ordem técnica (do tipo como armazenar e distribuir a instrução) e de produção do material instrucional. Já no caso da reforma da educação, o problema era o de entender os conceitos sobre aprendizado, preparação de manware e a falta de uma concepção sobre a real necessidade de tal mudança no ensino (o que Papert tentou fazer em seu artigo). Embora essa polêmica devesse ser o foco da discussão da conferência, como disse o organizador do documento (Seidel, 1977), os participantes estavam mais interessados em apresentar seus produtos do que em discutir os propósitos da educação. Nunca ficou resolvido se a informática na educação deveria continuar na direção do uso dos CAIs implementados em sistemas de grande porte ou se deveria ser enfatizado o desenvolvimento de sistemas computacionais que facilitassem uma reforma total do processo educacional. Entretanto, as dificuldades técnicas provenientes do fato de os computadores serem de grande porte foi eliminada com o aparecimento dos microcomputadores no início dos anos 80. O aparecimento dos microcomputadores, principalmente o Apple, no início dos anos 80 permitiu uma grande disseminação dos microcomputadores nas escolas. Essa conquista incentivou uma enorme produção e diversificação de CAIs, como tutoriais, programas de demonstração, exercício-e-prática, avaliação do aprendizado, jogos educacionais e simulação. De acordo com estudos feitos pelo The Educational Products Information Exchange (EPIE) Institute uma organização do Teachers College, da Universidade de Columbia, foram identificados em 1983 mais de 7.000 pacotes de software educacionais no mercado, sendo que 125 eram adicionados a cada mês. Isso aconteceu durante os primeiros três anos após a comercialização dos microcomputadores! Entretanto, a presença dos microcomputadores permitiu também a divulgação de novas modalidades de uso do computador na educação como ferramenta no auxílio de resolução de problemas, na produção de textos, manipulação de banco de dados e controle de processos em tempo real. De acordo com essa abordagem, o computador passou a assumir um papel fundamental de complementação, de aperfeiçoamento e de possível mudança na qualidade da educação, possibilitando a criação de ambientes de aprendizagem. O Logo foi o exemplo mais marcante dessa proposta. A linguagem Logo foi desenvolvida em 1967 tendo como base a teoria de Piaget e algumas idéias da Inteligência Artificial (Papert, 1980). Inicialmente essa linguagem foi implementada em computadores de médio e grande porte (PDP 11 e PDP 10, respectivamente), fato que fez com que, até o surgimento dos microcomputadores, o uso do Logo ficasse restrito às universidades e laboratórios de pesquisa. As crianças e professores se deslocavam até esses centros para usarem o Logo e nessas circunstâncias os resultados das experiências com o Logo se mostraram interessantes e promissores. Na verdade, foi a única alternativa que surgiu para o uso do computador na educação com uma fundamentação teórica diferente, passível de ser usado em diversos domínios do conhecimento e com muitos casos documentados que mostravam a sua eficácia como meio para a construção do conhecimento através do uso do computador. Com a disseminação dos microcomputadores, o Logo passou a ser adotado e usado em muitas escolas. No período de 1983 até 1987 aconteceu uma verdadeira explosão no número de experiências, na produção de material de apoio, livros, publicações e conferências sobre o uso do Logo. Esse mesmo interesse já não existe hoje. Esse desencanto com o Logo aconteceu, em grande parte, porque a apropriação do Logo pelos professores não foi muito cuidadosa. Os escritos de Papert e os relatos das experiências usando Logo sugeriram que o Logo poderia ser utilizado sem o auxílio do professor. Sem a preparação adequada do professor os resultados obtidos foram muito aquém do que havia sido prometido. O Logo ficou conhecido pelo fato de ter prometido muito e fornecido muito pouco como retorno. Hoje sabemos que o papel do professor no ambiente Logo é fundamental, que o preparo do professor não é trivial não acontecendo do dia para a noite (Valente, 1996). A proliferação dos microcomputadores, no início da década de 90, permitiu o uso do computador em todos nos níveis da educação americana. O computador é largamente utilizado na maioria das escolas de 1° e 2° graus e universidades. No entanto, isso não significa que a utilização maciça do computador tenha provocado ou introduzido mudanças pedagógicas. Muito pelo contrário. A mudança pedagógica, ainda que muito lenta, foi motivada pelo avanço tecnológico e não por iniciativa do setor educacional. Nas escolas de 1° e 2° graus o computador é amplamente empregado para ensinar conceitos de informática ou para "automação da instrução" através de software educacionais tipo tutoriais, exercício-e-prática, simulação simples, jogos, livros animados. Os resultados desse tipo de uso têm sido questionados em termos do custo e dos benefícios educacionais alcançados (Johnson, 1996). Alguma mudança pedagógica tem sido propiciada pelo uso da rede Internet através da qual os alunos têm tido a chance de acessar e explorar diferentes bases de dados. No entanto, os artigos que descrevem essas atividades não mencionam a dinâmica que se estabelece em sala de aula. Alguns críticos dessa abordagem pedagógica argumentam que a exploração da rede, em alguns casos, deixa os alunos sem referência, com sensação de estarem perdidos ao invés de serem auxiliados no processo de organizar e digerir a informação disponível. Já nas universidades americanas, o computador está sendo usado como recurso para o aluno realizar tarefas. Desde os anos 60 as universidades dispõem de muitas experiências sobre o uso do computador na educação. Mesmo assim, previa-se que a disseminação da tecnologia de maneira rotineira nos cursos de graduação ocorreria somente por volta do início do ano 2000 (Ahl, 1977). E realmente é o que está acontecendo com os cursos de graduação nos Estados Unidos. Hoje o computador passou a fazer parte da lista de material que o aluno de graduação deve adquirir e o seu uso se tornou rotineiro em praticamente todas as atividades desde a produção de documentos, uso em sala de aula e em laboratório, consulta à banco de dados, comunicação entre alunos e aluno-professor e desenvolvimento das disciplinas. Isso significa que o aluno sai da universidade com um bom conhecimento sobre o uso da informática. Porém o processo pedagógico envolvido no preparo do aluno de graduação ainda não sofreu mudanças profundas e enfatiza-se basicamente a transmissão de informação. Além da Internet, outra fonte de mudança pedagógica tem sido os centros de pesquisa em educação que passam por profundas transformações. A preocupação atual não é mais a produção de software cada vez mais inteligente e robusto para "automatizar a instrução" mas a produção de software que facilita o desenvolvimento de atividades colaborativas e auxiliares no desenvolvimento de projetos baseados na exploração. As atividades dos centros de pesquisa da Xerox e da RAND, por exemplo, mostram que hoje existe a preocupação com a interação homem-máquina, com a realização de atividades mediadas pelo computador ao invés de o computador ser a supermáquina que assume o controle do processo de ensino. Por outro lado, a formação de professores voltada para o uso pedagógico do computador nos Estados Unidos não aconteceu de maneira sistemática e centralizada como, por exemplo, aconteceu na França. Nos Estados Unidos os professores foram treinados sobre as técnicas de uso do software educativos em sala de aula ao invés de participarem de um profundo processo de formação. Em outros casos, profissionais da área de computação têm assumido a disciplina de informática que foi introduzida na grade curricular como forma de minimizar a questão do "analfabetismo em informática". As universidades americanas ainda são as grandes formadoras de professores para a área de informática na educação. Praticamente todas as universidades oferecem hoje programas de pósgraduação em informática na educação e muito desses cursos estão disponíveis na Internet. No entanto, não é possível dizer que o processo de aprendizagem foi drasticamente alterado. A preparação dos profissionais da educação ainda é feita com o objetivo de capacitá-los para atuarem em um sistema educacional que enfatiza a transmissão de informação. Poucas são as escolas nos Estados Unidos que realmente sabem explorar as potencialidades do computador e sabem criar ambientes que enfatizam a aprendizagem. Informática na educação na França A marca da cultura francesa sobre nossa terras e sobre nossas mentes é bastante conhecida. Seu charme, sua cultura, sua filosofia e sua política têm sido parâmetros para avaliarmos o que de bom se produz ao sul do Equador. Na questão da Informática na Educação, a França foi o primeiro país ocidental que programou-se como nação para enfrentar e vencer o desafio da informática na educação e servir de modelo para o mundo. A perda da hegemonia cultural (e conseqüentemente da hegemonia econômica) para os Estados Unidos e o ingresso da França no Mercado Comum Europeu levou os políticos franceses a buscarem essa hegemonia através do domínio da essência da produção, transporte e manipulação das informações encontradas na informática. A história da França coloca-a como uma espécie de carrefour da Europa, com a necessidade de diferenciar-se para sobreviver ao caos cultural e aos interesses de tantas tensões vizinhas e internas. Enquanto nação, com esta forte identidade de cultura, construiu nos últimos dois séculos, um estado centralizador e fortemente planejador. A escola pública é fortíssima e a escola particular é quase inexistente. Indústria, comércio, cultura, saúde, interagem ativamente com a rede escolar. No Brasil, só o estado é tido como responsável e mostra efetivo interesse (quando mostra...) pela escola pública. No caso da informática na educação a batalha se deu tanto na produção do hardware e do software quanto na formação das novas gerações para o domínio e produção de tal tecnologia. A implantação da informática na educação foi planejada em termos de público alvo, materiais, software, meios de distribuição, instalação e manutenção do equipamento nas escolas. Neste planejamento os dirigentes franceses julgaram ser fundamental a preparação, antes de tudo, de sua inteligênciadocente. E foi aí que dedicaram muitos anos e muitos recursos à formação de professores. No início foram formados os professores dos liceus (59, em toda a França) através de um processo de longa duração: um ano, com meio período diário. Embora o objetivo da introdução da informática na educação na França não tenha sido o de provocar mudanças de ordem pedagógica, é possível notar avanços nesse sentido porém, esses avanços estão longe das transformações desejadas. A síntese dessa história encontra-se nos livros de Baron & Bruillard (1996), Dieuzeide (1994), e Minc & Nora (1978). Os primeiros Programas Nacionais de Informática na Educação, na década de 1970, estabeleceu um debate caracterizado por questões do tipo: deve-se formar para a informática ou deve-se formar por e com a informática? A informática deve ser objeto de ensino ou ferramenta do processo de ensino? Nos anos 60 e início dos anos 70 os software empregados em educação se caracterizaram como EAO (Enseignement Assisté par Ordinateur), o que eqüivale ao CAI desenvolvido nos anos 60 nos Estados Unidos, inspirados no ensino programado com base na teoria comportamentalista e no condicionamento instrumental (estímulo-resposta). Este tipo de software era adequado às características rígidas dos equipamentos disponíveis. Contribuíram em alguns aspectos até então desconsiderados no ensino, tais como: atendimento individual ao ritmo do aluno, verificação imediata das respostas certas ou erradas, repetição de informações precisas tantas vezes quantas forem necessárias, ensino em pequenas doses. Somente no início dos anos 80 começou a disseminar-se na França a linguagem de programação e metodologia Logo com fins educacionais, opondo-se frontalmente às bases conceituais do EAO. No terceiro plano nacional, Informatique pour Tous (1985), houve maior proliferação da informática no âmbito das instituições escolares. Os objetivos continuavam sendo a aquisição do domínio técnico do uso do software e a integração de ferramentas computacionais ao processo pedagógico. É importante notar que o programa de informática na educação da França não tinha como objetivo uma mudança pedagógica, mas sim a preparação do aluno para ser capaz de usar a tecnologia da informática. Assim, usando o computador como recurso para o desenvolvimento de tarefas, os professores orientavam a edição de jornais com processadores de texto, a resolução de equações do 2º grau através de planilhas ou acompanhavam o desenvolvimento de projetos experimentais registrando os dados em um banco de dados. O Logo era empregado no desenvolvimento de projetos para os níveis de ensino elementar e secundário. Na década de 90 com a disseminação dos computadores, progressivamente as escolas, notadamente os liceus, colégios e escolas secundárias, informatizaram os seus CDI (centro de documentação e de informação), objetivando a gestão do acervo disponível e o atendimento de "livre serviço", em que são disponibilizados equipamentos e software para os alunos desenvolverem suas atividades e estudos. As salas de aulas de disciplinas tais como FísicoQuímica, História-Geografia, cada vez mais são equipadas com computadores, interfaces e software específicos, permitindo a realização de experiências assistidas por computador - EXAO, bem como a observação de fatos históricos ou de situações geográficas através de programas que permitem analisar todo o contexto sob diferentes pontos de vista. Após 20 anos de execução dos diversos planos nacionais, todos os colégios e liceus já possuíam equipamentos computacionais e cerca de 5% de seus professores foram preparados em informática pedagógica em cursos e em estágios de formação continuada. Porém, ainda se considerava que os objetivos definidos inicialmente pouco haviam evoluído. A informática deixou de ser ensinada como disciplina, passando a ser empregada desde o 1º grau como ferramenta tecnológica, sendo freqüente o emprego da robótica pedagógica. Atualmente, o uso do espaço informático em educação articula-se em torno de duas tendências: a interligação dos equipamentos em redes de dados (locais e à distância) e o emprego de equipamentos portáteis. Tal prática tem como objetivo reduzir a necessidade de espaço para os equipamentos, levantando a suposição do fim da "sala de informática" e a reflexão sobre a derrubada das paredes da escola surgindo novos cenários pedagógicos. Embora na França tenham sido propostos inúmeros projetos de informática na educação, para alguns autores, esses projetos não tiveram êxito ou não provocaram mudanças pedagógicas. No entanto, é difícil determinar o que significa êxito ou mudança em tão curto espaço de tempo, quando o pretendido é formar a cultura de um povo. A França avançou em muitos aspectos da informática aplicada à educação e não é possível ingressar em qualquer dos seus domínios sem se consultar esse país. No entanto, se perguntarmos "o que acontece concretamente na França em termos de mudanças pedagógicas advindas do uso da informática na educação?" em síntese podemos afirmar que a centralização das decisões não trouxe maiores mudanças. Em relação à aculturação e à aprendizagem através da informática, os resultados positivos que se puderam verificar na França freqüentemente não foram previstos e a "hipótese de uma homogeneização do sucesso pela mediação tecnológica não é jamais verificada" (Linard, 1990, pág.). A preocupação inicial da Educação Nacional era a de buscar formas de tornar os jovens capazes de se adaptarem às diferentes situações que possivelmente enfrentariam no decorrer de suas vidas. A vida dos jovens poderia mudar rapidamente de direção a fim de assumirem novos contextos profissionais que surgissem, sem que para isso fossem necessários elevados e prolongados custos em formação. A preocupação incidia sobre uma formação básica polivalente, que possibilitasse a articulação de distintas modalidades de especialização posterior para responder às demandas da sociedade. Tais preocupações deixaram o plano de intenções e pouco-a-pouco se traduzem em ações concretas, nas quais o uso de recursos tecnológicos se faz cada vez mais presente. Por exemplo, os programas de História englobam a mundialização da informação; o uso de calculadoras deixou de ser questionado para as provas de Matemática; o estudo de Francês voltou-se cada vez mais para a comunicação e expressão; o estudo de História e de Geografia em alguns colégios e liceus passou a constituir-se como um só campo de conhecimento. Parece-nos que a tendência interdisciplinar presente no domínio da informática desenvolveu estas potencialidades de uma educação mais aberta e articuladora. Entretanto, se tais alterações de perspectivas pedagógicas ocorreram, elas não foram planejadas. Esses avanços pedagógicos se deram por causa da introdução da informática na escola. O difícil, seguramente, é destacar esta ou aquela causa como o único agente de avanço. Essa causas formam um todo indicativo da gestação longa e difícil do novo. No entanto, esses avanços ainda estão longe das transformações pedagógicas desejadas. Talvez o que mais tenha marcado o programa de informática na educação da França tenha sido a preocupação com a formação de professores. Desde o início de 1970 a formação de professores e técnicos das escolas foi considerada como condição imperativa para uma real integração da informática à educação. Foram estruturados centros de formação e, no segundo plano nacional, houve uma preparação intensiva dos professores, mas ainda sem uma abordagem pedagógica específica. Os conteúdos versavam sobre o estudo do objeto informática e computadores, bem como sobre introdução a linguagens de programação, sem estabelecer articulações entre teorias educacionais e práticas pedagógicas com o computador. A formação em informática propriamente pedagógica iniciou-se a partir do Plano Informática para Todos (1985). Foram desenvolvidos programas de formação de professores, inicialmente com 50 h de duração, remuneradas, uma vez que se realizavam em períodos de férias escolares. Posteriormente os professores participavam de outras atividades de formação, inclusive estágios de observação e atuação, perfazendo um período de aproximadamente 3 meses. Em 1985 foram preparados 100.000 professores. Outra preocupação do programa francês tem sido o de garantir a todos os indivíduos o acesso à informação e ao uso da informática. Atualmente isso tem sido reforçado pelos projetos de implantação de redes de computadores e de comunicação à distância para a educação e a formação. No âmbito da educação existe um projeto nacional para colocar em rede os liceus, colégios e escolas apoiado na tecnologia Internet e na infra-estrutura da rede Renater. Os liceus e colégios dispõem de ligações permanentes na rede Renater, o que lhes permite acolher os projetos das instituições escolares e apoiar o seu desenvolvimento em coordenação com outros centros que têm serviços pedagógicos na Internet. O uso das Novas Tecnologias da Informação e Comunicação impõe mudanças nos métodos de trabalho dos professores, gerando modificações no funcionamento das instituições e no sistema educativo. Tais modificações são de caráter discreto e seus resultados não aparecerão senão em uma macro-história educacional. AS BASES PARA A INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO NO BRASIL No Brasil, como em outros países, o uso do computador na educação teve início com algumas experiências em universidades, no princípio da década de 70 (ver artigo da Maria Cândida de Moraes). Na UFRJ, em 1973, o Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde e o Centro LatinoAmericano de Tecnologia Educacional (NUTES/CLATES) usou o computador no ensino de Química, através de simulações. Na UFRGS, nesse mesmo ano, realizaram-se algumas experiências usando simulação de fenômenos de física com alunos de graduação. O Centro de Processamento de Dados desenvolveu o software SISCAI para avaliação de alunos de pós-graduação em Educação. Na UNICAMP, em 1974, foi desenvolvido um software, tipo CAI, para o ensino dos fundamentos de programação da linguagem BASIC, usado com os alunos de pós-graduação em Educação, produzido pelo Instituto de Matemática, Estatística e Ciência da Computação, coordenado pelo Prof. Ubiratan D'Ambrósio e financiado pela Organização dos Estados Americanos. Em 1975, foi produzido o documento "Introdução de Computadores no Ensino do 2° Grau", financiado pelo Programa de Reformulação do Ensino (PREMEN/MEC) e, nesse mesmo ano, aconteceu a primeira visita de Seymour Papert e Marvin Minsky ao país, os quais lançaram as primeiras sementes das idéias do Logo. Entretanto, a implantação do programa de informática na educação no Brasil inicia-se com o primeiro e segundo Seminário Nacional de Informática em Educação, realizados respectivamente na Universidade de Brasília em 1981 e na Universidade Federal da Bahia em 1982. Esses seminários estabeleceram um programa de atuação que originou o EDUCOM e uma sistemática de trabalho diferente de quaisquer outros programas educacionais iniciados pelo MEC. No caso da Informática na Educação as decisões e as propostas nunca foram totalmente centralizadas no MEC. Eram fruto de discussões e propostas feitas pela comunidade de técnicos e pesquisadores da área. A função do MEC era a de acompanhar, viabilizar e implementar essas decisões. Portanto, a primeira grande diferença do programa brasileiro em relação aos outros países, como França e Estados Unidos, é a questão da descentralização das políticas. No Brasil as políticas de implantação e desenvolvimento não são produto somente de decisões governamentais, como na França, nem conseqüência direta do mercado como nos Estados Unidos. A segunda diferença entre o programa brasileiro e o da França e dos Estados Unidos é a questão da fundamentação das políticas e propostas pedagógicas da informática na educação. Desde o início do programa, a decisão da comunidade de pesquisadores foi a de que as políticas a serem implantadas deveriam ser sempre fundamentadas em pesquisas pautadas em experiências concretas, usando a escola pública, prioritariamente, o ensino de 2° grau. Essas foram as bases do projeto EDUCOM, realizado em cinco universidades: UFPe, UFMG, UFRJ, UFRGS e UNICAMP. Esse projeto contemplou ainda a diversidade de abordagens pedagógicas, como desenvolvimento de software educativos e uso do computador como recurso para resolução de problemas. Do ponto de vista metodológico, o trabalho deveria ser realizado por uma equipe interdisciplinar formada pelos professores das escolas escolhidas e por um grupo de profissionais da universidade. Os professores das escolas deveriam ser os responsáveis pelo desenvolvimento do projeto na escola, e esse trabalho deveria ter o suporte e o acompanhamento do grupo de pesquisa da universidade, formado por pedagogos, psicólogos, sociólogos e cientistas da computação. Na França as políticas implantadas pelo governo não foram necessariamente fundamentadas em pesquisa. e nos Estados Unidos, embora tenham sido produzidas inúmeras pesquisas, estas podiam ou não ser adotadas pela escola interessada em implantar a informática. A terceira diferença é a proposta pedagógica e o papel que o computador deve desempenhar no processo educacional. Nesse aspecto o programa brasileiro de informática na educação é bastante peculiar e diferente do que foi proposto em outros países. No nosso programa, o papel do computador é o de provocar mudanças pedagógicas profundas ao invés de "automatizar o ensino" ou preparar o aluno para ser capaz de trabalhar com o computador. Todos os centros de pesquisa do projeto EDUCOM atuaram na perspectiva de criar ambientes educacionais usando o computador como recurso facilitador do processo de aprendizagem. O grande desafio era a mudança da abordagem educacional: transformar uma educação centrada no ensino, na transmissão da informação, para uma educação em que o aluno pudesse realizar atividades através do computador e, assim, aprender. A formação dos pesquisadores dos centros, os cursos de formação ministrados e mesmo os software educativos desenvolvidos por alguns centros eram elaborados tendo em mente a possibilidade desse tipo de mudança pedagógica. Embora a mudança pedagógica tenha sido o objetivo de todas as ações dos projetos de informática na educação, os resultados obtidos não foram suficientes para sensibilizar ou alterar o sistema educacional como um todo. Os trabalhos realizados nos centros do EDUCOM tiveram o mérito de elevar a informática na educação do estado zero para o estado atual, possibilitando-nos entender e discutir as grandes questões da área. Mais ainda, temos diversas experiências instaladas no Brasil que apresentam mudanças pedagógicas fortemente enraizadas e produzindo frutos. No entanto, essas idéias não se alastraram e isso aconteceu, principalmente, pelo fato de termos subestimado as implicações das mudanças pedagógicas propostas no sistema educacional como um todo: a mudança na organização da escola e da sala de aula, no papel do professor e dos alunos, e na relação aluno versus conhecimento. Somente através das análises das experiências realizadas é que torna-se claro que a promoção dessas mudanças pedagógicas não depende simplesmente da instalação dos computadores nas escolas. É necessário repensar a questão da dimensão do espaço e do tempo da escola. A sala de aula deve deixar de ser o lugar das carteiras enfileiradas para se tornar um local em que professor e alunos podem realizar um trabalho diversificado em relação a conhecimento e interesse. O papel do professor deixa de ser o de "entregador" de informação para ser o de facilitador do processo de aprendizagem. O aluno deixa de ser passivo, de ser o receptáculo das informações para ser ativo aprendiz, construtor do seu conhecimento. Portanto, a ênfase da educação deixa de ser a memorização da informação transmitida pelo professor e passa a ser a construção do conhecimento realizada pelo aluno de maneira significativa sendo o professor o facilitador desse processo de construção. O processo de repensar a escola e preparar o professor para atuar nessa escola transformada está acontecendo de maneira mais marcante nos sistemas públicos de educação, principalmente os sistemas municipais. Nas escolas particulares o investimento na formação do professor ainda não é uma realidade. Nessas escolas a informática está sendo implantada nos mesmos moldes do sistema educacional dos Estados Unidos no qual o computador é usado para minimizar o analfabetismo computacional dos alunos ou automatizar os processos de transmissão da informação. Embora as questões envolvidas na implantação da informática na escola estejam mais claras hoje, as nossas ações no passado não foram voltadas para o grande desafio dessas mudanças. Mesmo hoje, as ações são incipientes e não contemplam essas mudanças. Isso pode ser notadamente observado nos programas de formação de professores para atuarem na área da informática na educação que ainda hoje são realizados. FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO A formação de professores do 1º e 2º graus para usarem a informática na educação recebeu uma atenção especial de todos os centros de pesquisa do EDUCOM. É a atividade principal de todos os Centros de Informática Educativa (CIEd) como relatado na Em Aberto (Ano XII, nº 57, 1993) e tem sido tema de muitas teses (Almeida, 1996; Altoé, 1993; Mattos, 1992; Menezes, 1993; Prado, 1996; Silva Neto, 1992). Essa formação tem sido feita através de cursos que requerem a presença continuada do professor em formação. Isso significa que o professor em formação deve deixar sua prática pedagógica ou compartilhar essa atividade com as demais exigidas pelos cursos de formação. Além das dificuldades operacionais que a remoção do professor da sala de aula causa, os cursos de formação realizados em locais distintos daquele do dia-a-dia do professor, acarretam ainda outras. Primeiro, esses cursos são descontextualizados da realidade do professor. O conteúdo dos cursos de formação e as atividades desenvolvidas são propostas independentemente da situação física e pedagógica daquela em que o professor vive. Em segundo lugar, esses cursos não contribuem para a construção, no local de trabalho do professor formando, de um ambiente, tanto físico quanto profissional, favorável à implantação das mudanças educacionais. Em geral, o professor, após terminar o curso de formação, volta para a sua prática pedagógica encontrando obstáculos imprevistos ou não considerados no âmbito idealista do curso de formação; quando não, um ambiente hostil à mudança. A falta de contextualização e as conseqüências advindas desse tipo de formação ficaram extremamente claras nos cursos FORMAR. O FORMAR teve como objetivo principal o desenvolvimento de cursos de especialização na área de informática na educação. O primeiro curso foi realizado na UNICAMP, durante os meses de junho a agosto de 1987 e ministrado por pesquisadores, principalmente, dos projetos EDUCOM. Este curso ficou conhecido como Curso FORMAR I. No início de 1989 foi realizado o segundo curso, o FORMAR II. A estrutura dos cursos é muito semelhante, apesar de os objetivos específicos serem um tanto diferentes (Valente, 1993b). Tanto o FORMAR I quanto o FORMAR II foram realizados na UNICAMP. Em cada um dos cursos participaram 50 professores, vindos de praticamente todos os estados do Brasil. Esses cursos tiveram duração de 360 horas, distribuídas ao longo de 9 semanas: 45 dias, com 8 horas por dia de atividades. Os cursos eram constituídos de aulas teóricas, práticas, seminários e conferências. Os alunos foram divididos em duas turmas de modo que enquanto uma turma assistia aula teórica a outra turma realizava aula prática usando o computador de forma individual. O FORMAR I e o FORMAR II apresentaram diversos pontos positivos. Primeiro, propiciaram a preparação de profissionais da educação que nunca tinham tido contato com o computador e que hoje desenvolvem atividades nesta área nos CIEds ou nas respectivas instituições de origem. Esses profissionais, em grande parte, são os responsáveis pela disseminação e a formação de novos profissionais na área de informática na educação. Em segundo lugar, o curso propiciou uma visão ampla sobre os diferentes aspectos envolvidos na informática na educação, tanto do ponto de vista computacional quanto pedagógico. Terceiro, o fato de o curso ter sido ministrado por especialistas da área de, praticamente, todos os centros do Brasil, propiciou o conhecimento dos múltiplos e variados tipos de pesquisa e de trabalho que estavam sendo realizados em informática na educação no país. Entretanto, os cursos apresentaram diversos pontos negativos. Primeiro, o curso foi realizado em local distante do local de trabalho e de residência dos participantes. Eles tiveram que interromper, por dois meses, as atividades docentes e deixar a família -- o que nem sempre é possível e propício para a formação. No entanto, a razão do deslocamento do professor para Campinas, naquele momento, foi o fato de não existir no Brasil um centro que dispusesse de computadores em número suficiente para atender a 25 professores simultaneamente. Para que isso fosse possível foi necessário contar com a colaboração de algumas fábricas de computadores. Segundo, o curso foi demasiadamente compacto. Com isso tentou-se minimizar o custo de manutenção do profissional no curso e o tempo que ele deveria se afastar do trabalho e da família mas deixou de oferecer o espaço e o tempo necessários para que os participantes assimilassem os diferentes conteúdos e praticassem com alunos as novas idéias oferecidas pelo curso. Os participantes do curso nunca tiveram a chance de vivenciar o uso dos conhecimentos e técnicas adquiridas e receber orientação quanto à sua performance de educador no ambiente de aprendizado baseado na informática. Terceiro, muitos desses participantes voltaram para o seu local de trabalho e não encontraram as condições necessárias para a implantação da informática na educação. Isso aconteceu tanto por falta de condições físicas (falta do equipamento) quanto por falta de interesse por parte da estrutura educacional. Alguns meses foram necessários para a construção das condições mínimas de modo que os conhecimentos adquiridos pudessem entrar em operação. Por outro lado, é impossível imaginar que os professores, somente com os conhecimentos adquiridos, fossem capazes de enfrentar situações difíceis e de implantar as mudanças educacionais almejadas. Como foi mostrado por Ackermann (1990), a aplicação de um conhecimento requer um outro tipo de conhecimento. O fato de nós conhecermos alguma coisa não implica necessariamente que nós saibamos aplicar esse conhecimento. A aplicação desse conhecimento deve ser exercitado de modo a aprender como usá-lo em diferentes situações. Como os cursos de formação não oferecem condições para os professores aprenderem, efetivamente, a usar o computador, a esses professores não restam muitas alternativas: eles se acomodam ou abandonam o seu ambiente de trabalho. Resultado: não alcançamos as mudanças e ainda contribuímos para o fracasso dos cursos de formação de professores! Não obstante suas dificuldades, certos aspectos do Projeto FORMAR, principalmente conteúdo e metodologia, passaram a ser usados como base para outros cursos de formação na área de informática na educação. O material gerado pelo curso e as experiências acumuladas têm sido usadas na implantação de praticamente todos os cursos nessa área (Prado & Barrella, 1994). Ou seja, continuamos a fazer a formação descontextualizada e isso não faz mais sentido quando se têm computadores em, praticamente, todos os centros de educação no país. As experiências de implantação da informática na escola têm mostrado que a formação de professores é fundamental e exige uma abordagem totalmente diferente. Primeiro, a implantação da informática na escola envolve muito mais do que prover o professor com conhecimento sobre computadores ou metodologias de como usar o computador na sua respectiva disciplina. Existem outras barreiras que nem o professor nem a administração da escola conseguem vencer sem o auxílio de especialistas na área. Por exemplo, dificuldades de ordem administrativa sobre como viabilizar a presença dos professores nas diferentes atividades do curso ou problemas de ordem pedagógica: escolher um assunto do currículo para ser desenvolvido com ou sem o auxílio do computador. Segundo, os assuntos desenvolvidos durante o curso devem ser escolhidos pelos professores de acordo com o currículo e a abordagem pedagógica adotadas pela sua escola. É o contexto da escola, a prática dos professores e a presença dos seus alunos que determinam o que vai ser trabalhado pelo professor do curso. O curso de formação deixa de ser uma simples oportunidade de passagem de informação para ser a vivência de uma experiência que contextualiza o conhecimento que o professor constrói. Terceiro, esses cursos devem estar desvinculados da estrutura de cursos de especialização. Essa é uma estrutura rígida e arcaica para dar conta dos conhecimentos e habilidades necessárias para preparar os professores para o uso do computador na educação. Finalmente, as novas possibilidades que os computadores oferecem como multimídia, comunicação via rede e a grande quantidade de software disponíveis hoje no mercado fazem com que essa formação tenha que ser mais profunda para que o professor possa entender e ser capaz de discernir entre as inúmeras possibilidades que se apresentam. Hoje a questão é muito mais complicada do que optar pelo uso ou não do Logo. EVOLUÇÃO DO COMPUTADOR NO BRASIL E AS IMPLICAÇÕES NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES Nos Estados Unidos o Apple foi o microcomputador disseminado nas escolas. Era uma máquina simples, de fácil compreensão e domínio, muito flexível e relativamente poderosa e robusta. Essa flexibilidade e fácil domínio fez com que fosse possível o desenvolvimento de todo tipo de software e de hardware para o Apple. E isso era feito tanto por empresas e por especialistas da área da computação, quanto por professores, pais, alunos e pessoas que se interessavam pela produção de material a ser utilizado na educação. O resultado foi a avalanche de material que mencionamos anteriormente. No Brasil, embora existissem mais de 40 diferentes fabricantes de computadores do tipo Apple e muito software e hardware disponível, ele não foi adotado como o computador da educação. Isso aconteceu principalmente por limitações técnicas como por exemplo, a impossibilidade de se usar os caracteres da língua portuguesa. Era impossível imaginar que o aluno fosse usar um instrumento na escola que não permitisse escrever corretamente palavras da sua língua. Por outro lado, era impossível convencer os produtores do Apple a fazerem as alterações necessárias para superar essa dificuldade. Com isso o Apple entrou nas empresas e no comércio mas não entrou nas escolas. O microcomputador adotado na maioria das universidades brasileiras e pelos projetos EDUCOMs foi o I 7000 produzido pela Itautec. Ele possibilitava o uso dos caracteres da língua portuguesa e diversos software foram desenvolvidos pela Itautec para explorar essas facilidades como o processador de texto Redator e o Logo Itautec desenvolvido em colaboração com a UNICAMP. No entanto, pouco software educativo foi desenvolvido para o I 7000 e esse microcomputador acabou servindo para a produção de texto e uso do Logo. Seu período de vida foi curto e logo substituído pelos microcomputadores PC padrão IBM. Os computadores PC foram desenvolvidos basicamente para servirem à empresa e ao comércio. Essa máquina, embora dispusesse do teclado com os caracteres da língua portuguesa, não dispunha de nenhuma outra característica indispensável para a educação como cores, animação, som. Além disso, o seu preço era proibitivo para as escolas. O computador adotado pelas escolas brasileiras foi o MSX. Esse computador foi produzido e lançado no mercado em 1986 pela Sharp (Hotbit) e Gradiente (Expert) e voltado para o mercado dos vídeo-jogos. Ele tinha inúmeras facilidades de hardware que permitiam implementar animação, quatro canais para produção simultânea de som, 256 cores e usava como monitor uma televisão a cores. Essas facilidades permitiam o desenvolvimento de bons software educativos, inúmeros jogos e uma ótima versão do Logo (até hoje, mesmo com as facilidades e velocidade dos Pentiuns, o Logo para essas máquinas não dispõe das facilidades que o Logo do MSX dispunha como por exemplo, animação). Por outro lado, o MSX não era uma máquina com a mesma flexibilidade do Apple. Não dispunha de facilidades para gravar as informações em disco (inicialmente a informação era gravada em fita cassete) ou ligar-se a impressoras ou mesmo a outros dispositivos. Além disso, o MSX não dispunha de um processador de texto ou programas de planilha e banco de dados. Ele era mais parecido com um brinquedo do que um computador. A escola que adotasse o MSX para desenvolver atividades usando o Logo deveria dispor de alguns computadores I 7000 ou PC para produzir textos, planilhas ou banco de dados. Era irônico que um sistema educacional pobre como o nosso devesse dispor de dois tipos de computadores par dar conta das atividades desenvolvidas na escola. Com todas as facilidades e dificuldades do MSX, ele foi adotado como o computador para a educação. Muitas escolas adquiriram essa máquina para implantar a abordagem Logo, como as 50 escolas da rede municipal de Educação da cidade de São Paulo e todos os centros de pesquisa em informática e educação. Os EDUCOMs da UFRJ e UFMG produziram bons software educativos para o MSX. Empresas e pessoas interessadas em informática na educação também produziram esses software encorajados pelos Concursos de Software Educacionais promovidos pelo MEC. A simplicidade do MSX e o fato de não dispor de muitas alternativas do ponto de vista de software, reduziu a questão do uso do computador na educação em termos de dois pólos: o uso do Logo ou de software educacionais como jogos, tutoriais, etc.. Tendo o professor optado por um desses pólos, a formação e o domínio dessa abordagem educacional era gradativa e sem muitos percalços. Por exemplo, no caso do Logo era só ligar o MSX que a Tartaruga aparecia na tela. O professor acabava se sentido confortável e familiar com a informática. Não era preciso enveredar por atalhos como sistemas operacionais, diferentes hardware, etc. e o professor podia se concentrar nas questões pedagógicas do uso do computador na educação. Essas questões estavam sendo trabalhadas em um ambiente relativamente seguro e de fácil domínio. No entanto, essa calmaria foi tumultuada pela descontinuidade de produção do MSX em 1994 e pelo aparecimento do sistema Windows para o PC. O Windows possibilitou o desenvolvimento de inúmeros programas para praticamente todas as áreas. Surgiram também outras modalidades de uso do computador na educação como uso de multimídia, de sistemas de autorias para construção de multimídia e de redes. A questão educacional atualmente não pode ser dicotomizada em dois pólos, como na era do MSX. Certamente o Logo ainda se mantém como possibilidade para o aluno programar o computador e aprender através do ciclo descrição-execução-reflexão-depuração. O programa é a descrição da resolução do problema na linguagem de programação. O computador executa esse programa e fornece um resultado que é usado pelo aprendiz como objeto de reflexão. Se o resultado obtido não corresponde ao desejado, o aluno deve depurar suas idéias através da busca de novos conceitos ou novas estratégias (Valente, 1993a). No entanto, o aprendizado através desse tipo de interação com o computador é também possível através de outros software como os sistemas de autoria e software abertos como planilhas, banco de dados e simulações. Esses sistemas possibilitam ao aluno descrever a resolução do problema para o computador e com isso engajar-se no ciclo da programação adquirindo novos conceitos e novas estratégias. Portanto, hoje o Logo não é a única opção que o professor dispõe para criar ambientes de aprendizagem usando o computador. Por outro lado, se esses novos software ampliam as possibilidades que o professor dispõe para o uso do computador na construção do conhecimento, eles também demandam um discernimento maior por parte do professor e, conseqüentemente, uma formação mais sólida e mais ampla. Isso deve acontecer tanto no domínio dos aspectos computacionais quanto do conteúdo curricular. Sem esses conhecimentos é muito difícil o professor saber integrar e saber tirar proveito do computador no desenvolvimento dos conteúdos. A nossa experiência observando professores desenvolvendo atividades de uso do computador com alunos tem mostrado que os professores não têm uma compreensão mais profunda do conteúdo que ministram e essa dificuldade impede o desenvolvimento de atividades que integram o computador. Assim, as novas possibilidades tecnológicas que se apresentam hoje têm causado um certo desequilíbrio no processo de formação do professor. Sair do MSX e passar para o sistema Windows significa um salto muito grande. O professor diante dessas novas possibilidades tem se sentido bastante inseguro e, praticamente, a sua formação tem que ser refeita. O sentimento é que voltamos a estaca zero. Isso só não é totalmente verdade por que o professor que usou o MSX possuiu uma boa noção da base pedagógica que sustenta o uso do computador na educação e tem muita experiência nessa área. Mas se essas novas tecnologias criam certas dificuldades, facilitam outras. Por exemplo, através da ligação desses computadores na rede Internet o professor na escola pode estar em permanente contato com os centros de formação. Através desse contato os professores e os pesquisadores dos centros de informática na educação podem interagir e trocar idéias, responder dúvidas, participar de debates via rede, receber e enviar reflexões sobre o andamento do trabalho. Esse contato poderá contribuir tanto para a formação do professor quanto para auxiliá-lo na resolução das dificuldades que encontra na implantação da informática nas atividades de sala de aula. Mesmo os cursos de formação poderão explorar as facilidades da rede para minimizar os efeitos da retirada do professor do seu contexto de trabalho desenvolvendo cursos que combinem parte presencial e parte via rede, como está sendo atualmente feito em diversas experiências de formação realizadas pelo NIED. Na verdade, a introdução da informática na educação segundo a proposta de mudança pedagógica, como consta no programa brasileiro, exige uma formação bastante ampla e profunda do professor. Não se trata de criar condições para o professor dominar o computador ou o software, mas sim auxiliá-lo a desenvolver conhecimento sobre o próprio conteúdo e sobre como o computador pode ser integrado no desenvolvimento desse conteúdo. Mais uma vez, a questão da formação do professor mostra-se de fundamental importância no processo de introdução da informática na educação, exigindo soluções inovadoras e novas abordagens que fundamentem os cursos de formação. CONCLUSÕES Em diferentes países a introdução de computadores nas escolas não produziu o sucesso esperado, ou seja, os projetos ambiciosos, em grande escala, não têm conduzido aos objetivos programados, mesmo quando deixados ao sabor do livre mercado, como no caso do Estados Unidos ou quando são bem planejados em termos de público alvo, equipamentos, materiais, software, meios de distribuição, instalação e manutenção, como é o caso da França. As práticas pedagógicas inovadoras acontecem quando as instituições se propõem a repensar e a transformar a sua estrutura cristalizada em uma estrutura flexível, dinâmica e articuladora. No entanto, como isto pode ser possível em projetos de grande dimensões que atingem todo um país ou, por outro lado, em escolas isoladas? A possibilidade de sucesso está em se considerar os professores não apenas como os executores do projeto, responsáveis pela utilização dos computadores e consumidores dos materiais e programas escolhidos pelos idealizadores do projeto, mas principalmente como parceiros na concepção de todo o trabalho. Além disso, os professores devem ser formados adequadamente para poderem desenvolver e avaliar os resultados desses projetos. Se por um lado, o planejamento "idealista" não logrou realizar todo o previsto nas metas políticas, alguns avanços pedagógicos podem ser observados no sistema educacional da França. O mesmo se pode dizer dos experimentos nos Estados Unidos ou no Brasil. Nos três países podemos ver novas modalidades de trabalhos interdisciplinares que começam a ocupar um espaço fundamental nas práticas escolares; ligações entre regiões fechadas do país começam a se tecer. No caso da França, apesar de fortemente centralizadora, a política não se impôs como hegemônica pois as diferentes regiões moldaram-se às exigências centralizadoras da mesma com projetos dirigidos às necessidades locais. De todo o modo, sem um recuo histórico um pouco mais longo, não se pode afirmar com clareza se houve ou não fracasso ou êxito desta multiplicidade de projetos coordenados por um Estado zeloso e empenhado em ter na informática e na educação instrumentos e apanágios de sua mais avançada e moderna cultura. Também não se pode afirmar que as leis criativas do mercado, como no caso dos Estados Unidos, tenham impelido a escola para superarem os fechamentos de seus muros e de suas velhas tradições. No Brasil, embora a introdução da informática na educação tenha sido influenciada pelos acontecimentos de outros países, notadamente França e Estados Unidos, a nossa caminhada foi muito peculiar. A influência exercida por estes países foi mais no sentido de minimizar os pontos negativos e enfatizar os pontos positivos ao invés de servir como modelo para uma reprodução acrítica. No nosso caso, o êxito não é maior por uma série de razões, desde a falta de equipamento nas escolas e, portanto, a falta de um maior empenho na introdução da informática na educação, até um processo de formação de professores frágil e lento. A formação de professores para implantar as transformações pedagógicas almejadas exige uma nova abordagem que supere as dificuldades em relação ao domínio do computador e ao conteúdo que o professor ministra. Os avanços tecnológicos têm desequilibrado e atropelado o processo de formação fazendo com que o professor sinta-se eternamente no estado de "principiante" em relação ao uso do computador na educação. Por outro lado, o Programa Brasileiro de Informática em Educação é bastante ambicioso tendo o computador como recurso importante para auxiliar o processo de mudança pedagógica -- a criação de ambientes de aprendizagem que enfatizam a construção do conhecimento e não a instrução. Isso implica em entender o computador como uma nova maneira de representar o conhecimento provocando um redimensionamento dos conceitos já conhecidos e possibilitando a busca e compreensão de novas idéias e valores. Usar o computador com essa finalidade requer a análise cuidadosa do que significa ensinar e aprender bem como demanda rever o papel do professor nesse contexto. A formação do professor deve prover condições para que ele construa conhecimento sobre as técnicas computacionais, entenda por que e como integrar o computador na sua prática pedagógica e seja capaz de superar barreiras de ordem administrativa e pedagógica. Essa prática possibilita a transição de um sistema fragmentado de ensino para uma abordagem integradora de conteúdo e voltada para a resolução de problemas específicos do interesse de cada aluno. Finalmente, deve-se criar condições para que o professor saiba recontextualizar o aprendizado e a experiência vividas durante a sua formação para a sua realidade de sala de aula compatibilizando as necessidades de seus alunos e os objetivos pedagógicos que se dispõe a atingir. Agradecemos aqui de maneira muito especial aos alunos que cursaram as atividades do Núcleo de Tecnologias Educacionais, do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Currículo, da PUC-SP, no primeiro semestre de 1997. A cada encontro ajudaram-nos a debater as idéias trazendo suas experiências na área e escrevendo textos à cada semana sobre o tema. Certamente eles se reconhecerão em alguns momentos destas páginas. São eles: M. Elizabeth Almeida, Claudia Negrão Pellegrino, M. Elisabette B.B.Prado, Elisa T.M. Schlunzen, Miriam A.R. Machado Teixeira, Vitória C. Dib, Vitória K. Hernandez, Maria Raquel M. Morelatti, Leo Burd, e Cirlei Izabel da Silva. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Ackermann, E. (1990). From Descontextualized to Situated Knowledge: revising Piaget´s water-level experiment. Epistemology and Learning Group Memo Nº 5. Cambridge: Massachusetts Institute of Technology. Ahl, D.H. (1977). Does Education Want What Technology Can Deliver? Em R.J. Seidel, R.J. & M.L. Rubin (ed.) Computers and Communications: implications for education. New York: Academic Press. Almeida, M.E.B.T.M.P. (1996). Informática e Educação - Diretrizes para uma Formação Reflexiva de Professores. Tese de Mestrado. São Paulo: Departamento de Supervisão e Currículo da PUC. Altoé, A. (1993). O Computador na Escola: O Facilitador no Ambiente Logo. Tese de Mestrado. São Paulo: Departamento de Supervisão e Currículo da PUC. Andrade, P.F. (1993). (org.) Projeto EDUCOM: Realizações e Produtos. 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