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Primeira Seção
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 1.043.487-SP
(2009/0063261-9)
Relator: Ministro Teori Albino Zavascki
Embargante: Fazenda Nacional
Advogado: Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Embargado: O.E.S.P. Grafica S/A
Advogado: José Paulo Moutinho Filho e outro(s)
EMENTA
Processual Civil. Recurso especial. Sentença proferida no
processo principal. Cautelar. Cessação da eficácia. Art. 808, III, do
CPC.
1. Nos termos do artigo 808, III do CPC, “cessa a eficácia da
medida cautelar (...) se o juiz declarar extinto o processo principal, com
ou sem julgamento de mérito”. A cessação da eficácia, em casos tais,
independe do trânsito em julgado da sentença extintiva do processo,
especialmente quando a providência requerida como cautelar tem
típica natureza antecipatória. Entendimento contrário importaria,
na prática, a conferir efeito suspensivo a todos os recursos, inclusive
ao especial e ao extraordinário, que vierem a ser interpostos contra
sentenças e acórdãos de improcedência ou terminativos proferidos no
processo principal.
2. Embargos de divergência providos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
conhecer dos embargos e dar-lhes provimento, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins,
Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves e Cesar
Asfor Rocha votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Meira.
REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Brasília (DF), 08 de junho de 2011 (data do julgamento).
Ministro Teori Albino Zavascki, Relator
DJe 14.06.2011
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Teori Albino Zavascki: Trata-se de embargos de divergência
(fls. 286-300) opostos em face de acórdão da 2ª Turma cuja ementa, à fl. 283, é
a seguinte:
Processual Civil. Recurso especial. Ação cautelar. Julgamento da ação principal.
Interpretação sistemática dos arts. 807 e 808, III, do CPC.
1. Embora a defeituosa redação do art. 808, III do CPC sugira a idéia de que,
com a prolação da sentença na ação principal cessa a eficácia da medida cautelar,
tal dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o art. 807 do mesmo
diploma, segundo o qual a cautelar conserva sua eficácia na pendência do
processo principal. Assim, somente perde o objeto a cautelar após o trânsito em
julgado da ação principal.
2. Recurso especial provido.
Sustenta a embargante que o acórdão atacado diverge da orientação
adotada pela 1ª Turma (REsp n. 647.868-DF, Min. Luiz Fux, DJ de 22.08.2005)
no sentido de que “a extinção do processo principal, com ou sem julgamento de
mérito, implica cessação da eficácia da medida cautelar” (fl. 290).
Às fls. 329-340, a embargada apresentou impugnação na qual sustenta,
em síntese, que “apenas o julgamento da ação principal, seguido do trânsito em
julgado da respectiva decisão, cessa a eficácia da medida cautelar, em decorrência
do caráter acessório desta em relação ao pleito meritório, o que não ocorreu no
presente caso” (fl. 331).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Teori Albino Zavascki (Relator): 1. Há identidade de
controvérsia, com soluções diferentes, entre o acórdão embargado e o paradigma:
ambos tratam do momento em que cessa a eficácia da medida cautelar em
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face de sentença prolatada na ação principal. No acórdão embargado, ficou
reconhecido que esse momento é o do trânsito em julgado da sentença proferida
na ação principal, ao passo que, no acórdão paradigma, decidiu-se que a perda
da eficácia se dá com a prolação da sentença de extinção do processo principal.
Conheço, pois, dos embargos de divergência.
2. No mérito, são convincentes, a propósito, as razões deduzidas no acórdão
paradigma (REsp n. 647.868-DF, Min. Luiz Fux, DJ de 22.08.2005), plasmadas
à luz de doutrinadores de nomeada, a saber:
Deveras, o tema concernente à cessação da eficácia da medida cautelar na
hipótese de julgamento do processo principal encerra controvérsia nesta Corte.
Isto porque, a Segunda Turma, no julgamento do REsp n. 320.681-DF, Relatora
Ministra Eliana Calmon, entendeu que o art. 808, III, do CPC deve ser interpretado
em conjunto com o art. 807 do mesmo diploma legal, o que conduz à manutenção
da eficácia da medida cautelar até o trânsito em julgado do processo principal.
Por outro lado, a jurisprudência majoritária desta Corte entende que a extinção
do processo principal, com ou sem julgamento de mérito, implica cessação da
eficácia da medida cautelar, consoante julgados, verbis:
Processual Civil. Pluralidade de procuradores. Suficiência da intimação de
apenas um. Processo principal e medida cautelar. Julgamento.
1. Está assentado na jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal
Federal, que constando da mesma procuração o nome de vários advogados
basta que a intimação seja feita a um deles.
2. Segundo a letra do art. 808, III, do Código de Processo Civil, cessa a
eficácia da medida cautelar quando declarado extinto o processo principal,
com ou sem julgamento de mérito.
3. Precedentes.
4. Recurso especial não conhecido (REsp n. 488.913-BA, Relator Ministro
Fernando Gonçalves, DJ de 154.03.2004).
Mandado de segurança contra ato judicial. Ação revisional julgada
improcedente, extinta a cautelar preparatória. Revogação da liminar. Legalidade.
- Cessa a eficácia da liminar se o Juiz declarar extinto o processo principal,
com ou sem julgamento de mérito (art. 808, III, do CPC).
- Julgadas concomitantemente a ação principal e a cautelar, interposta
apelação única e global, ao Juiz cabe recebê-la com efeitos distintos, a
correspondente à medida cautelar no efeito tão-somente devolutivo (art.
520, IV, do CPC).
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Recurso ordinário improvido (ROMS n. 11.384-SP, Relator Ministro Barros
Monteiro, DJ de 19.08.2002).
Sobre o thema decidendum destaca Galeno Lacerda, in Comentários ao Código
de Processo Civil, Vol. VIII, Tomo I, Forense, 1998, litteris:
Art. 808. Cessa a eficácia da medida cautelar:
I - se a parte não intentar a ação no prazo estabelecido no art. 806;
II - se não for executada dentro de 30 (trinta) dias;
III - se o juiz declarar extinto o processo principal, com ou sem
julgamento de mérito.
Parágrafo único. Se por qualquer motivo cessar a medida, é defeso à
parte repetir o pedido, salvo por novo fundamento.
(...)
COMENTÁRIO
74. Cessação de eficácia - O art. 808 completa as disposições contidas
nos arts. 806 e 807, com os quais integra um todo harmônico. Por isto, sua
esfera de incidência coincide com a destes dispositivos, com as mesmas
limitações assinaladas nos respectivos comentários. Remetemos o leitor,
especialmente, para os n. 66 e n. 70, supra.
Do ponto de vista teórico, distingue-se a perda de eficácia, nas hipóteses
do art. 808, das sentenças de carência ou de improcedência da ação
cautelar, ou, mesmo, terminativas do processo cautelar jurisdicional por
outro fundamento. Mas o efeito prático, em todos os casos, sobre a cautela
eventualmente concedida, será o de cessação de eficácia, lato sensu.
Pontes de Miranda entende que a perda de eficácia, nos casos do art.
808, é ipso jure, dispensando-se “despacho declarativo da não eficácia,
menos ainda despacho constitutivo negativo (nada há que se tenha de
desconstituir)”. já que “não se trata de revogação ou de modificação”,
embora adiante admita que “o juiz pode, conhecendo a causa extintiva da
eficácia, decretar que se observe a cessação”.
Cabe, contudo, a distinção apontada por José Frederico Marques: a
declaração judicial de perda de eficácia se torna indispensável. salvo na
hipótese de procedência da ação principal, quando ocorre a conversão ou
a manutenção da medida para efeitos de execução. Claro está que, apesar
de cessada a eficácia ipso jure, um seqüestro, p. ex., não se levanta, nem se
cancela a respectiva averbação no registro de imóveis, sem ordem judicial,
com declaração prévia de extinção da medida. Se, acaso, o interessado
comparecesse ao cartório do registro para pedir cancelamento da
averbação exibindo, apenas, certidão de que a ação principal não ingressou
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Jurisprudência da PRIMEIRA SEÇÃO
no prazo de trinta dias, receberia em resposta um rotundo e categórico
“não”. Por este motivo, não nos apegamos a distinções sem efeito prático.
Em todos os casos. quer se trate de declaração de perda de eficácia, quer de
juízo de improcedência ou carência da cautela, haverá sempre revogação.
lato sensu, da medida liminar e, até, da sentença cautelar. nas hipóteses do
art. 808.
Essa revogação pode ser decretada de ofício. Se o juiz pode fazê-lo
na sentença de extinção do processo principal (inciso III) nada obsta lhe
caiba também a iniciativa nas hipóteses dos nos I e II. O interesse público
que coexiste na função cautelar jurisdicional a tanto o autoriza (Certos, os
acórdãos em RT, 236/244 e 409/408) (grifo nosso).
A cessação de eficácia da medida pelo não ingresso de ação principal no
prazo de trinta dias (n. I) não afeta, evidentemente, o direito de promover
dita ação (RT, 428/202), embora a cautela revogada importasse antecipação
provisória de sentença (Jurisp. Bras., Ia ed., 2/320). O ônus de promover
a ação principal cabe ao autor da cautelar. Se este se omitir, a eventual
iniciativa da demanda contrária pelo requerido, dentro do prazo, não salva
a medida dos efeitos da decadência (RT, 390/173). A alegação de que a
ação principal foi ajuizada fora do prazo deve ser feita no processo cautelar,
e não no principal como preliminar da contestação (RT, 503/151). A ação
principal pode ser a de execução (RT, 488/142).
Insistimos em que os nos I e II do art. 808 só se aplicam às cautelas
jurisdicionais, com as ressalvas feitas nos comentários aos arts. 806 e 807
(No mesmo sentido, quanto ao n. I, com outras palavras, a Conclusão n. 66
do Simpósio de Curitiba - RT, 482/273).
Note-se que, cessada a eficácia da medida pelo decurso do prazo,
desaparece a prevenção do juízo para a ação principal ainda não proposta
(Alexandre de Paula, ob. cit., XXXII/2.097, n. 36.688).
A não revogação da medida depois do prazo, nas hipóteses em que esta
incide, constitui constrangimento ilegal, passível de mandado de segurança
(RT, 346/487).
Se não executada a providência dentro de trinta dias (n. II), não cabe
condenação do autor pelos prejuízos referidos no art. 811, já que a medida
não se concretizou, embora caiba responsabilidade pela sucumbência,
não só nesta hipótese, como em relação aos demais casos de cessação de
eficácia tratados pelo art. 808, desde que tenha havido resposta do réu
(RT, 3971218, 421/163, 490/72, 289/758, este aplicável por analogia à ação
cautelar), ou tenha ele sofrido prejuízo.
Cumpre observar, quanto ao inciso II, que, se a medida for complexa (p.
ex., arresto ou seqüestro de vários bens), basta a execução pardal dentro do
prazo para afastar o risco de decadência.
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A cessação de eficácia por extinção do processo principal, com ou
sem julgamento do mérito (n. III), pressupõe a não condenação do réu.
Se condenado este, a medida não se extingue: ou passa ao processo de
execução, para nele se transformar em ato executório, ou se converte no
próprio comando definitivo da sentença (p. ex., alimentos provisionais em
definitivos). Maior análise no comentário ao art. 807, n. 71, supra. 254
Dentre as várias hipóteses de extinção do processo sem julgamento
do mérito, previstas no art. 267, não se aplica ao tema em exame, salvo
desistência da cautela, a que resulta do compromisso arbitral (n. VII). Como
demonstramos no comentário ao art. 806, n. 69, in fine, a necessidade de
cautela jurisdicional prévia entre as partes em litígio importa renúncia
necessária ao compromisso. Não tem sentido, portanto, extinguir-se a
cautela em virtude de um compromisso tomado impraticável pela situação
de conflito criada pelos próprios interessados, salvo se houver prévia
desistência da medida, hipótese, então, em que esta cessará pelo fato da
desistência, e não pelo compromisso. Há incompatibilidade entre jurisdição
cautelar prévia e juízo arbitral futuro. Ou se desiste de uma ou se renuncia
a outro, com efeito vinculativo sobre a parte contrária, e a renúncia tácita
ocorre pelo só aforamento de ação cautelar antecedente acompanhado de
concessão da medida protetiva.
Se a extinção do processo sem julgamento do mérito não obstar a que
o autor intente de novo a ação (art. 268), ainda assim haverá decadência da
cautela, salvo se renovada esta por outro fundamento (art. 808, parágrafo
único). É que a cessação de eficácia, nestas circunstâncias, possui caráter
sancionatório contra o autor. No Congresso, pretendeu-se a manutenção da
medida, desde que reiterada a ação no prazo de trinta dias, mas a emenda
foi repelida em parecer lacônico da Comissão: “Extinto o processo, seja
qual for a causa, cai a medida cautelar”. 2SS Firmou-se com isto, também,
o critério de absoluta dependência do processo cautelar jurisdicional ao
processo principal em harmonia com a regra do art. 796, ressalvada a
hipótese de prolongamento pela execução.
O problema da eficácia da cautela na dependência de recurso contra
sentença adversa ao autor foi analisado no comentário ao art. 807, n. 72,
supra.
A transação, a renúncia ou a desistência, quando extinguirem processo
principal, põem termo também às medidas cautelares (RT, 291/660,
492/116), mas a homologação é necessária (RT, 289/373). Não pode a
medida manter-se por acordo após acabada a ação principal (Jurisp. Bras.,
1a ed., n. 21.339).
A cessação de eficácia das medidas cautelares em virtude de Sentença
favorável ao réu está prevista, igualmente, na Lei de Falência (art. 12, § 5°,
do Decreto-Lei n. 7.661, de 21.06.1945), e no Código de Processo Penal (art.
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Jurisprudência da PRIMEIRA SEÇÃO
141). Na hipótese de sentença condenatória penal, os autos de hipoteca
ou seqüestro serão encaminhados ao juízo cível, para efeitos de execução
(art. 143 do CPP). Neste caso, pelo interesse público ínsito no Direito Penal,
não incide a preclusão do art. 808, I (errôneo, o acórdão em RT, 269/338 que
ordenou o levantamento do seqüestro de bens de funcionário acusado de
desfalque, porque a Fazenda Pública não propôs ação principal no prazo
de trinta dias. Certo, a este respeito, embora limitado ao Processo Penal, o
acórdão em RT, 494-332).
omissis (p. 291-294).
Forçoso, ainda, destacar a doutrina de Ovídio Baptista da Silva, in Do Processo
Cautelar, Forense, 1998, verbis:
DO PROCESSO CAUTELAR
Art. 808. Cessa a eficácia da medida caute/ar:
I - se a parte não intentar a ação no prazo estabelecido no art. 806;
I - se não for executada dentro de 30 (trinta) dias;
III - se o juiz declarar extinto o processo principal, com ou sem
julgamento de mérito.
Parágrafo Único. Se por qualquer motivo cessar a medida, é defeso à
parte repetir o pedido, salvo por novo fundamento.
I - O art. 808 tem visível compromisso com a doutrina aceita pelo Código,
segundo a qual a função do processo cautelar é proteger o processo
principal, de modo que, extinto este, não vislumbra o legislador qualquer
interesse em preservar a eficácia da medida cautelar porventura decretada
como medida preparatória ou incidente. A situação, como observa Sérgio
FadeI (Comentários, 225), pode gerar dificuldade, desde que o requerente
da providência cautelar que haja perdido a eficácia segundo o art. 808, não
poderá repropô-la senão fundado em novos fatos, ou novo fundamento,
como indica o parágrafo único deste artigo. Sendo assim, as prescrições
contidas neste dispositivo têm um nítido sabor de punição aplicada ao
litigante que, obtendo a medida cautelar, veja ela perder a eficácia em
conseqüência I do art. 808. Na hipótese do inc. I, parece justificada a sanção,
desde que o não ajuizamento da ação principal, sem motivo, faz presumir
a desnecessidade da cautela. A Cessação da eficácia da medida cautelar
com fundamento no inciso II do art. 808 deve decorrer da não execução
da medida nos 30 dias em razão de fato atribuível ao requerente. Se a
responsabilidade pelo retardamento for do juízo, ou da parte adversa, é
evidente que incide a regra do art. 807, parágrafo único, pois, nessas
emergências, ter-se-á por suspenso o prazo para propositura da ação
principal (ex-art. 265, V).
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As medidas que perdem a eficácia segundo o art. 808 são aquelas
mesmas de que tratamos ao comentar o art. 806. Apenas as medidas
cautelares que importem em constrição de bens, tais como o arresto, o
seqüestro, a busca e apreensão, ou a caução eventualmente impostas ao
réu, perderão a eficácia. Igualmente perdem eficácia as medidas cautelares
proibitivas que imponham ao demandado uma abstenção, ou forcem-no
a um determinado comportamento. Como antes dissemos, os alimentos
provisionais entram no campo de incidência do art. 808. Igualmente as
outras medidas provisionais do direito de família. Se, obtida a separação
de corpos, o requerente não promoveu a demanda principal nos 30 dias,
a partir daí seu afastamento do domicílio conjugal pode importar em
“grave violação dos deveres do casamento”, de modo a legitimar a ação
de separação judicial (art. 5º da Lei n. 6.515, de 25.12.1977). A sustação
de protesto, como as demais medidas cautelares que importem restrição
de direitos imposta ao demandado, perdem eficácia, conforme o art.
808. Quanto a esta, como já observamos nos comentários ao art. 806
(n. 10), há uma tendência para transformar a sustação de protesto em
medida definitiva, a prescindir do ajuizamento de qualquer ação principal
pelo requerente. Isso evidencia como, na maioria dos casos, o pedido de
sustação de protesto era, em verdade, medida satisfativa e não provisional.
Tanto que não havia demanda principal a ser proposta.
Se a medida for complexa, como o arresto de diversos bens, situados
às vezes em locais diferentes, basta para elidir a incidência do art. 808 a
execução apenas parcial da medida (Theodoro Júnior, Comentários, n. 153;
Galeno Lacerda, Comentários, n. 408), prosseguindo-se após o decurso do
prazo.
Se, durante o transcurso dos 30 dias, o réu da cautelar antecipa-se e
promove alguma ação inversa contra o autor, como se, pedido o seqüestro
do bem, como medida preparatória da ação anulatória de contrato, o
réu antecipa-se e ingressa com uma ação declaratória de validade do
mesmo negócio jurídico, então a eficácia da medida cautelar não se perde.
Theodoro Júnior (ob. cit., p. 152) imagina a hipótese de ter sido o seqüestro
decretado como medida preparatória de uma ação de anulação de contrato
e haja o réu, nos prazos do art. 808, promovido a mesma ação de anulação.
O exemplo sem dúvida pode ocorrer, embora isso não seja freqüente.
Se o réu tiver outro fundamento para o pedido de anulação do mesmo
contrato, pode suceder que ele esteja legitimado para outra ação também
de anulação. Se o contrato for produto de simulação inocente, ambos os
contratantes podem estar legitimados para ação declaratória de simulação,
a que se deveria, então, cumular a demanda de imissão de posse para a
recuperação do bem transferido ao outro contratante em razão do contrato
(cf. Nossa Ação de Imissão de Posse no Direito Brasileiro Atual, n. 193).
Aqui, evidentemente, ó seqüestro preparatório só poderia ser pedido pelo
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Jurisprudência da PRIMEIRA SEÇÃO
contratante sem posse, o que, todavia, não impediria que aquele que o
sofrera ingressasse com a demanda principal.
Galeno Lacerda (Comentários, n. 407), todavia, adere ao entendimento
manifestado pela 3a Câmara Cível do TJ-SP, que, no Ag. de Instrumento n.
160.462, entendeu que a propositura da ação pelo demandado não seria
capaz de afastar a incidência do art. 677, do Código anterior. Não vemos,
todavia, razão para tal restrição.
Se o arrestro ou outra medida cautelar constritiva tiver sido proposta
para segurança de crédito ainda não vencido, o prazo de 30 dias conta-se a
partir de seu vencimento (Pontes de Miranda, Comentários, n. 125).
Quanto à perda de eficácia da medida cautelar, nas hipóteses do art. 808,
111, já observamos que a previsão legal é fruto de um equívoco. A cessação
de eficácia de medida cautelar, em virtude da sentença final proferida na
demanda satisfativa, poderá dar-se apenas se a sentença for de rejeição
do pedido, sentença de improcedência, ou uma daquelas a que a doutrina
denomina sentença de “carência da ação”. Nestas hipóteses, é possível que
a medida cautelar perca a eficácia, desde que o direito que ela pretendia
proteger foi declarado inexistente embora seja permitido ao julgador,
como dissemos ao examinar o artigo anterior (p. 177), manter mesmo neste
caso, a vigência da medida liminar (grifo nosso).
Se a sentença, porém, for de acolhimento do pedido, portanto sentença
de procedência, a medida cautelar não perderá a eficácia até ser substituída
por outra medida satisfativa, salvo se as circunstâncias ou a natureza de tal
sentença por si sós dispensem, a partir dela, a proteção cautelar.
Pontes de Miranda (Comentários, n. 81) entende que a perda de eficácia
nas hipóteses do art. 808 é de pleno direito (p. 93) e independe de o juiz
decretar “que se observe a cessação”. Aqui, o verbo decretar tem o sentido
que lhe é próprio de ordenar e não de desconstituir, como se emprega
para qualificar as sentenças que decretam, por exemplo, a anulação do
ato ou do contrato. Embora a cessação da eficácia da medida cautelar não
dependa de sentença declaratória e menos ainda de sentença constitutiva,
o levantamento do arresto ou do seqüestro ou de qualquer outra
medida cautelar, ou o cancelamento de alguma averbação preventiva,
não se dará sem prévio mandamento judicial, o que importa que o juiz,
que está dispensado de revogar a medida que teve sua eficácia cessada
por efeito do art. 808, ou mesmo de declará-Ia ineficaz, tem o dever de
despachar no processo, ordenando a expedição do competente mandado
de levantamento, ou de comunicação de cessação da eficácia. A simples
exibição de certidão, atestando o não-ajuizamento da ação principal, por
exemplo, não autorizará o cancelamento da averbação, ou a entrega pelo
depositário do bem arrestado ou seqüestrado ao demandado (cf. Galeno
Lacerda, ob. cit., p. 406).
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O autor que haja obtido medida cautelar preparatória de alguma ação
expressamente indicada na ação preventiva poderá, dentro de certos
limites, variar de demanda, ajuizando outra semelhante. Se a separação de
corpos foi pedida como preparatória de uma ação de separação judicial,
poderá o autor promover, nos 30 dias, ação de anulação ou de nulidade
de casamento. Em princípio, essa mesma regra é pertinente também às
demais medidas cautelares, tais como o arresto e o seqüestro. Por mais
fortes razões, às vistorias e inquirições ad perpetuam.
Com relação ao prazo de 30 dias, já vimos nos comentários ao art. 806
como ele deve ser calculado. Os princípios aplicáveis ao art. 808 são os
mesmos.
II - Segundo o art. 808, parágrafo único, ao autor que permita que a
medida cautelar por ele obtida perca a eficácia, não é dado repetir o pedido,
“salvo por novo fundamento”. Temos de entender como fatos novos todos
os que não tenham sido apreciados na primeira demanda cautelar, ainda
que já existentes à data de seu respectivo ajuizamento (Fritz Baur, Tutela
Jurídica mediante Medidas Cautelar n. 124, n. 125 e n. 128). O limite, como
já dissemos, há de ser dado pela boa-fé do requerente e pela ausência
de negligência ou erro grosseiro na formulação da primeira demanda. As
prescrições do art. 808, como se tem observado (Sérgio Fadei, Comentários,
n. 225; Galeno Lacerda, ob. cito, p. 409; Theodoro Júnior, Comentários, n.
155), já são extremamente severas para que a exegese ainda lhe acrescente
esta nova limitação (...) (p. 190-192).
Sobre o tema leciona Márcio Louzada Carpena, in Do Processo Cautelar
Moderno, Forense, p. 312-316, litteris:
Dispõe o art. 808, inc. III do CPC, que “cessa a eficácia da medida cautelar
se o juiz declarar extinto o processo principal, com ou sem julgamento do
mérito”.
A redação de tal artigo apresenta inegável imprecisão técnica, pois nem
toda a sentença que julga o processo principal extinto, acarreta a cessação
do processo cautelar. A sentença de procedência da ação principal não
influência a sorte da cautelar que poderá seguir o mesmo rumo, caso
presentes os seus elementos de mérito, fumus banijuris e periculum damnum
irreparabile. Em análise ao disposto sob comentário, Ovídio Baptista da
Silva bem apreciou que “a previsão legal é fruto de um equívoco, visto que
a cessação da eficácia da medida dar-se-á somente quando a sentença
final for declarada improcedente rejeitando o pedido”, já que “no caso de
procedência da ação principal, a medida não perderá a sua eficácia até
ser substituída por outra medida satisfativa, salvo se as circunstâncias ou
a natureza de tal sentença por si só dispensem, a partir dela, a proteção
cautelar”.
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A sentença de extinção do processo principal sem julgamento do mérito
ou de improcedência - e, não, qualquer sentença -, é que tem o condão
de ocasionar a cessação dos efeitos da tutela assecurativa, já que decisão
nesse sentido demonstra a inexistência do fumus bani juris autorizador da
irradiação dos efeitos da ação acessória acauteladora. A redação do art.
808, inc. III, deve ser vista como se ali estivesse escrito: “cessa a eficácia da
medida cautelar quando o juiz julgar improcedente o processo principal ou
extingui-Io sem julgamento do mérito”.
Quando se tratou da autonomia do processo cautelar, sublinhou-se
que essa se verifica no plano formal de maneira praticamente absoluta, ao
passo que, no material, apenas de forma relativa, já que somente há vínculo
da decisão principal com a auxiliar, quando aquela é negativa; vale dizer,
ando o resultado for desfavorável ao autor da ação acautelada impedida
lá a procedência da cautelanda, já que um dos elementos de mérito dessa
é verossimilhança do direito que se discute naquela; se demonstrada a
inexistência deste direito através de cognição exauriente, não resiste a
verossimilhança registrada em sede de cognição “sumária” e “precária”, não
tendo como se sustentar a ordem cautelar.
Julgado improcedente ou extinto sem julgamento de mérito o processo
principal, imediatamente cessam os efeitos da cautelar, na medida em que
fica prejudicada a decisão proferida no processo provisório pela de cognição
exauriente. Dessa maneira, o recurso que desafia tal decisão, que veio a
valer para o processo principal e cautelar ainda que de forma distinta, terá
efeito diverso para cada demanda, de acordo com a disposição legal no que
pertine seu caráter suspensivo e devolutivo, ou apenas devolutivo frente à
natureza cada ação. Melhor aclarando, o recurso de apelação no processo
principal será recebido, via de regra - fora das hipóteses do art. 520, CPC, com efeito suspensivo e devolutivo, ao passo que, para os fins do cautelar,
somente no devolutivo, já que a sentença que decide a sorte dessa demanda
não à agregada de efeito duplo, a teor justamente do art. 520, inc. IV, do CPC.
O recurso de apelação no processo principal não estende os seus efeitos
à cautelar como sustentam alguns julgados, a partir da interpretação
fechada do art. 807 do Código que diz que “as caule/ares conservam sua
eficácia na pendência do processo principal.
A propósito, é conveniente dizer que inexiste qualquer antinomia
deste art. 807 com o art. 808, inc. III, e o art. 520, inc. IV, todos do CPC,
pois a conservação da eficácia na pendência da lide principal se dá
quando o processo cautelar está revestido dos elementos autorizadores
de sua manutenção. Desaparecendo o fumus boni juris ou o periculum
in mora, não se verifica fundamento procedente para manter a cautela.
Inarredavelmente, a decisão em cognição exauri ente que reconhece a
inexistência do direito alegado se sobrepõe à mera aparência de direito
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REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
suposto no momento de deferimento da cautela, em cognição sumária,
tornando inviável a sua manutenção.
Assim, não se pode concordar com a lição de Galeno Lacerda no sentido
de que, a teor do art. 807, deve-se conservar a medida se, “em face e
em virtude da apelação tempestiva, o processo principal ainda pende
de decisão superior”. Igualmente, não parece correta a afirmação de que
“enquanto se mantiver o principal, sem decisão definitiva transitada em
julgado, e enquanto não confirmada a revogação em segundo grau, no
respectivo processo, a cautela permanece, salvo se se tratar de hipóteses do
art. 808, incs. I e II.
Essa situação de prolongamento de instância se toma, no mínimo, de
todo inconveniente, já que engessa uma situação que sequer baseada na
verossimilhança se apresenta.
Absolutamente acertada é a lição de Celso Agrícola Barbi, no sentido de
que, se a revogação ocorrer através de decisão interlocutória, o efeito do
recurso de agravo de instrumento contra a mesma será apenas devolutivo,
fazendo com que não subsista a liminar, com muito maior razão não deve
se manter a liminar, se a revogação for determinada através de sentença
final, cuja certeza e segurança são muito maiores.
Também importante lembrar que, como já dito, se a própria sentença
exarada dentro do processo cautelar tem o condão de afetar imediatamente
a liminar, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça - o que renega
a interpretação de manutenção da liminar com base na leitura isolada do
art. 807 do Código - com maior razão a sentença proferida no processo
principal, com cognição exauriente, tem esse alcance (..).
3. Esse entendimento se justifica, com redobradas razões, em casos como o
da espécie, em que a medida de urgência requerida e deferida como cautelar tem
natureza de típica tutela antecipatória. Aqui, conforme relatado pelo acórdão do
TRF, o que se tem é “medida cautelar objetivando a compensação dos valores
recolhidos a maior a título de PIS, na forma dos Decretos-Leis n. 2.445/1998
e n. 2.449/1988 com parcelas do próprio PIS e de outras contribuições sociais”
(fls. 196). Como se percebe, o provimento assim requerido tem de “cautelar”
apenas o nome e o procedimento. Sua real natureza é de antecipação de tutela
(aliás, vedada pela Súmula n. 212-STJ). Ora, relativamente a medidas dessa
natureza, é firme a jurisprudência do STJ, em seus diversos órgãos fracionários,
no sentido de que a superveniência do julgamento da causa produz a imediata
cessação de eficácia da medida provisória, acarretando, inclusive, a perda de
objeto de eventual recurso a respeito. Nesse sentido, a título exemplificativo:
Corte Especial: EREsp n. 361.744-RJ, Ministro Francisco Peçanha Martins,
108
Jurisprudência da PRIMEIRA SEÇÃO
DJ de 27.06.2005; 1ª Seção: Rcl n. 1.444-MA, Min. Eliana Calmon, DJ de
19.12.2005; AgRg na Rcl n. 1.884-RJ, Ministro Luiz Fux, DJ de 14.09.2009;
EREsp n. 506.887-RS, Ministro Castro Meira, DJ de 03.04.2006; 1ª Turma:
REsp n. 1.089.279-PE, Ministro Benedito Gonçalves, DJe de 03.09.2009;
AgRg no REsp n. 875.155-RJ, Ministro Luiz Fux, DJe de 03.12.2008; AgRg
no Ag n. 880.632-PA, Ministra Denise Arruda, DJe de 25.06.2008; REsp n.
853.349-SP, Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 25.09.2006; AgRg no
REsp n. 669.371-RS, Ministro Francisco Falcão, DJ de 11.10.2007; 2ª Turma:
EDcl no AgRg no REsp n. 721.249-PE, Ministro Castro Meira, DJe de
13.05.2009; AgRg no REsp n. 611.127-SC, Ministro Herman Benjamin, DJe
de 19.03.2009; AgRg no REsp n. 929.618-PE, Ministro Humberto Martins,
DJe de 11.11.2008; AgRg no REsp n. 762.397-RS, Ministro Mauro Campbell
Marques, DJe de 21.11.2008; REsp n. 591.031-DF, Ministro João Otávio de
Noronha, DJ de 14.08.2007; MC n. 15.116-SP, Min. Eliana Calmon, DJ de
02.06.2009; 3ª Turma: AgRg no REsp n. 695.945-CE, Ministro Sidnei Beneti,
DJe de 1°.06.2009; AgRg no REsp n. 734.992-ES, Ministro Sidnei Beneti,
DJe de 24.11.2009; EDcl nos EDcl no REsp n. 954.065-MS, Ministro Vasco
Della Giustina (Desembargador convocado), DJe de 28.10.2009; AgRg no Ag
n. 789.447-SP, Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 14.12.2007; 4ª
Turma: REsp n. 37.741-RJ, Ministro Fernando Gonçalves, DJ de 17.12.2007;
AgRg no REsp n. 751.026-MG, Ministro Hélio Quaglia Barbosa, DJ de
24.09.2007; 5ª Turma: AgRg no AgRg no Ag n. 935.340-RS, Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 03.11.2009; AgRg no AgRg no REsp
n. 1.015.486-RS, Ministro Jorge Mussi, DJe de 06.04.2009; AgRg no REsp
n. 913.005-RN, Ministra Laurita Vaz, DJe de 29.09.2008; AgRg no REsp n.
408.648-RS, Ministro Laurita Vaz, DJ de 03.04.2006; REsp n. 976.846-RS,
Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 03.11.2008; 6ª Turma: AgRg no Ag n.
699.687-DF, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 23.06.2008.
Orientação idêntica foi adotada pelo STF ao julgar o RE n. 230.645-AgR,
Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe de 22.06.2007. Nesse particular,
seguiu-se, mutatis mutandis, a linha já traçada pela Súmula n. 405 daquela Corte:
“Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo,
dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da
decisão contrária”.
4. Esse entendimento é o que melhor compatibiliza as medidas de tutela
de urgência - sejam as cautelares, sejam as antecipatórias - com o Sistema
do Processo Civil, conforme enfatizado, entre outras oportunidades, em voto
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REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
proferido como relator do REsp n. 818.169-CE (1ª Turma, DJ de 15.05.2006),
nos seguintes termos:
2. As medidas liminares, tanto as antecipatórias quanto as tipicamente
cautelares, são provimentos jurisdicionais com características e funções
especiais. São editados em situações peculiares de ocorrência ou de iminência
de risco ou de perigo de dano ao direito ou ao processo. Justamente em razão
da urgência, são medidas tomadas à base de juízo de verossimilhança, que, por
isso mesmo, se revestem de caráter precário, não fazem coisa julgada e podem
ser modificadas ou revogadas a qualquer tempo. Elas exercem, no contexto da
prestação jurisdicional, uma função de caráter temporário, vigorando apenas pelo
período de tempo necessário à preparação do processo para o advento de outro
provimento, tomado à base de cognição exauriente e destinado a dar tratamento
definitivo à controvérsia.
3. É importante realçar esse aspecto: as medidas liminares desempenham no
processo uma função essencialmente temporária. Ao contrário dos provimentos
finais (sentenças), que se destinam a trazer soluções com a marca da definitividade,
as liminares são concedidas em caráter precário e com a vocação de vigorar por
prazo determinado. É o que já ensinava Calamandrei, em seu conhecido e didático
estudo sobre as medidas cautelares: “temporal es, simplesmente, lo que no dura
siempre; lo que, independientemente de que sobrevenga otro evento, tiene por si
mismo duración limitada; provisorio es, en cambio, lo que esta destinado a durar
hasta tanto que sobrevenga un evento sucesivo, en vista y en espera del cual el estado
de provisoriedad subsiste durante el tiempo intermedio” (...). Teniendo presentes
estas distinciones de terminología, la cualidad de provisoria dada a las providencias
cautelares quiere significar en sustancia lo siguiente: que los efectos jurídicos de las
mismas no sólo tienen duración temporal (...), sino que tiene duración limitada a
aquel periodo de tiempo que deberá transcurrir entre la emanación de la providencia
cautelar y la emanaciona de otra providencia jurisdicional, que, en la terminología
común, se indica, en contraposición a la calificación de cautelar dada a la primera, con
la calificación de definitiva. La provisoriedad de las providencias cautelares sería, pues,
un aspecto y una consecuencia de una relación que tiene lugar entre los efectos de la
providencia antecedente (cautelar) y los de la providencia subsiguiente (definitiva), el
inicio de los cuales señalaria la cesación de los efectos de la primera” (CALAMANDREI,
Piero. Introducción al estudio sistemático de las providencias cautelares. Trad. de
Santiago Sentis Melendo, Buenos Aires, Editorial Bibliográfica Argentina, 1945, p.
36). Convém anotar que, no entendimento de Calamandrei, uma das espécies do
que denomina de medida cautelar está a medida que antecipa provisoriamente
providências relacionadas com o mérito (tutela antecipatória), “(...) destinada a durar
hasta el momento en que a esta regulación provisoria de la relación controvertida se
sobreponga la regulación de carácter estable que se puede conseguir a través del más
lento proceso ordinario” (op. cit., p. 59).
O signo da temporariedade das medidas liminares decorre, portanto, do
necessário vínculo de referência e de dependência que guardam em relação aos
110
Jurisprudência da PRIMEIRA SEÇÃO
provimentos de tutela definitiva, cujos efeitos ela antecipa provisoriamente. É a
tutela definitiva, com a qual mantêm elo de referência, que demarca a função e o
tempo de duração da tutela provisória. Isso significa que, em relação às liminares,
o marco de vigência situado no ponto mais longínquo no tempo é justamente o
do advento de uma medida com aptidão de conferir tutela definitiva.
4. O julgamento da causa esgota, portanto, a finalidade da medida liminar.
Daí em diante, prevalece o comando da sentença, tenha ele atendido ou não ao
pedido do autor ou simplesmente extinguido o processo sem exame do mérito.
Procedente o pedido, fica confirmada a liminar anteriormente concedida bem
como viabilizada a imediata execução provisória (CPC, art. 520, VII). Improcedente
a demanda ou extinto o processo sem julgamento de mérito, a liminar fica
automaticamente revogada, com eficácia ex tunc (Súmula do n. 405 do STF), ainda
que silente a sentença a respeito. A partir de então, novas medidas de urgência
devem, se for o caso, ser postuladas no âmbito do próprio sistema de recursos,
seja a título de efeito suspensivo, seja a título de antecipação da tutela recursal,
medidas que são cabíveis não apenas em agravo de instrumento (CPC, arts.
527, III e 558), mas também em apelação (CPC, art. 558, § único) e, como medida
cautelar, em recursos especiais e extraordinários (Regimento Interno do STF, art.
21, IV; Regimento Interno do STJ, art. 34, V). Conseqüentemente, a superveniente
sentença julgando a causa torna inútil qualquer discussão sobre o cabimento ou
não da liminar, ficando prejudicado o objeto de eventual recurso sobre a matéria.
5. De tudo se conclui, em suma, que, nos termos do artigo 808, III do CPC,
“cessa a eficácia da medida cautelar (...) se o juiz declarar extinto o processo
principal, com ou sem julgamento de mérito” e que a cessação da eficácia, em
casos tais, independe do trânsito em julgado da sentença extintiva do processo.
Entendimento contrário importaria, na prática, a conferir efeito suspensivo
a todos os recursos, inclusive ao especial e ao extraordinário, que vierem a ser
interpostos contra sentenças e acórdãos de improcedência ou terminativos
proferidos no processo principal. Aliás, não haveria como compatibilizar a
manutenção da medida cautelar com eventual cumprimento provisório da
sentença em sentido contrário, proferida no processo principal. Isso fica bem
claro no caso dos autos: a manutenção da medida “cautelar” até o trânsito
em julgado da sentença no processo principal permitiria ao autor continuar
efetivando compensações tributárias autorizadas pela referida medida, inibindo
qualquer providência do Fisco no sentido de impedi-las ou de desfazê-las,
embora tendo a seu favor provimentos, na demanda principal, emanados até
mesmo de órgãos jurisdicionais superiores.
6. Diante do exposto, dou provimento aos embargos de divergência. É o
voto.
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