Conhecendo o livro dos Salmos | Pe.Ney Brasil | Salmo 103 (102

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Conhecendo o livro dos Salmos | Pe.Ney Brasil | Salmo 103 (102
Conhecendo o livro dos Salmos | Pe.Ney Brasil | Salmo 103 (102): Não esqueças!
          Pe. Ney Brasil Pereira - Professor de Exegese  Biblica na
FACASC/ITESC           Uma gratidão entusiasmada brilha em cada
linha deste salmo, dirigido ao Deus de toda graça, antecipando no Antigo Testamento
a revelação da paternidade divina, que é o centro do Evangelho de Jesus. Parece
que o salmo seguinte, 104, foi escrito para complementá-lo e explicitá-lo, a julgar
pela abertura e o encerramento, semelhantes nos dois salmos. Ambos louvam a Deus
como Salvador e Criador, Pai poderoso e cheio de misericórdia. Como escreveu
alguém: “na galáxia do Saltério, estes salmos são estrelas gêmeas de
primeira grandeza―.           Note-se antes de tudo, na estrutura do
salmo, a importância do verbo “bendizer― com o sentido de agradecer, louvar.
O salmo apoia-se nesse verbo, repetindo-o duas vezes no começo, na 2ª pessoa
do singular – bendize! – o autor incentivando-se a si mesmo, e mais quatro vezes
no final, três delas convocando todas as criaturas, na 2ª pessoa do plural –
bendizei! – e uma última vez a si mesmo, na 2ª pessoa do singular.
          O autor começa, partindo da experiência pessoal. No v. 10
entra em cena o plural: “nós, nossos―. Quem são esses? Os vv. 6-9 e 17-18
remontam à recordação histórica de Moisés e da Aliança. Trata-se, portanto,
do povo escolhido, que de novo experimentou, após o ExÃ-lio, a misericórdia do
Senhor.  Os vv. 14-16 remontam, porém, à criação do ser humano (cf. Gn 2),
alargando a dimensão do salmo para toda a humanidade.
Bendize, minha alma!
     2. Bendize, minha alma, ao Senhor / e tudo o que há em mim, ao seu santo Nome!
isso, quer engajar, nessa atividade, “tudo o que há em mim―: todo o seu aparelho cognoscitivo,
Não esqueças!
          2. Bendize, minha alma, ao Senhor / e não esqueçasÂ
nenhum de seus benefÃ-cios!
são passageiros, efêmeros e, por mais que resultem também do esforço e engenho humanos, sÃ
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a cuidado! Procura com grande zelo nunca te esqueceres de tudo o que teus olhos viram...― (Dt 4,9) A
É ele quem perdoa, cura, salva
3. É Ele quem perdoa todas as tuas culpas, / e cura todasÂ
 as tuas enfermidades;
4. É Ele quem salva tua vida da fossa / e te envolve com sua bondadeÂ
 e sua misericórdia;
5. É Ele quem te cumula de bens pela vida afora; / e tua juventude se renovaÂ
como a da águia.
aÃ- se revela como seu “resgatador―, ou “redentor―, em hebraico, go’el, tÃ-tulo frequ
Moisés e seus caminhos
6. O Senhor age com retidão, / faz justiça a todos os oprimidos;
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7. Revelou a Moisés os seus caminhos, / suas grandes obrasÂ
aos filhos de Israel.
mediador, Moisés, o único nome pessoal evocado no texto. É a Moisés que Deus “revela seus
Rico em misericórdia
8. O Senhor é misericordioso e compassivo, / lento para a cóleraÂ
e rico em bondade.
9. Não está sempre pleiteando, / e não dura eternamente a sua ira.
10. Não nos trata conforme nossos pecados, / não nos castigaÂ
conforme nossas culpas.
us olhos te viram!― (Jó 42,5) O salmista comprovou, e agora também proclama, que “o Senhor
Mais alto e mais longe
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11. Pois quanto é alto o céu sobre a terra / tanto é excelsa a sua bondadeÂ
para com os que o temem.
12. Quanto é distante o oriente do ocidente, / tanto Ele afasta de nósÂ
as nossas culpas.
assim, a bondade do Senhor nos ultrapassa e nos envolve. Quanto à distância, que não pode ser
Como um Pai misericordioso
13. Como um pai se compadece dos filhos, / o Senhor se compadeceÂ
dos que o temem.
sa agora, falando de Deus “como um pai―, e poderia dizer também “como uma mãe―, Ã
Como o barro, como a erva
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14. Pois Ele sabe de que somos feitos: lembra-se de que não somos
 mais que pó.      Â
15. Como a erva são os dias do ser humano, / ele floresceÂ
como a flor do campo;
16. Basta que sopre o vento, desaparece, / e o lugar que ocupavaÂ
 não voltará a vê-la.
o, feito de pó (cf Gn 2,7), e a sua duração efêmera, como a da flor do campo. A propósito, sobre a
Sua bondade, e sua Aliança
17. Mas a bondade do Senhor desde sempre e para sempre / é para aqueles
 que o temem; / e sua justiça para os filhos dos filhos,
18. Para os que guardam sua aliança / e se lembram de observar
 seus preceitos.
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19. O Senhor estabeleceu seu trono nos céus; / seu reinado se estendeÂ
sobre o universo.
rdia divina. Esta, porém, condicionada à fidelidade à Aliança: é para “os que guardam seus p
Bendizei, bendigamos!
20. Bendizei ao Senhor, vós, os seus anjos / heróis fortes que executais suas
ordens, / obedecendo a sua palavra!
21. Bendizei ao Senhor, vós, todos os seus exércitos / que o servis e executais
suas vontades!
22. Bendizei ao Senhor, vós, todas as suas obras, / em todos os lugares onde Ele
domina!
        Bendize, minha alma, ao Senhor!
        O final do salmo é uma grandiosa sinfonia coral, como o último
movimento da IX Sinfonia de Beethoven, só que não na terra mas no céu:
convidados a executá-la não são os seres humanos, mas os angélicos e, enfim,
toda a criação. O próprio salmista, porém, não quer ficar de fora desse louvor.
E por isso retoma seu autoconvite inicial: “Bendize, minha alma, ao Senhor! ―
Leia o salmo e medite:
      1) Qual o sentido e a importância do verbo “bendizer―, neste
salmo? 2) Por que a exortação a “não esquecer―?  3) Quais os caminhos
revelados por Deus a Moisés?  4) Qual a experiência pessoal de Deus, do
salmista? Â 5) Como o salmista expressa o contraste entre a pequenez humana e a
grandeza da misericórdia divina?
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