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Guia de Sobrevivência do
EMPREENDEDOR
PEDRO MELLO
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(11) 3032-3098
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
ÍNDICE
Introdução ........................................................................................................................ 4
A diferença entre dar certo e dar errado ........................................................................ 10
Que tipo de sócio você quer: o porco ou a galinha?...................................................... 16
Mais um pouco sobre sócios ......................................................................................... 22
Quando pouco dinheiro é melhor que muito dinheiro .................................................... 27
O problema de pensar muito nos problemas ................................................................. 33
Os três tipos de vendedores: águia, andorinha e peru .................................................. 39
A salada de dezoito frutas, ou a lição do garçom que salvou o dia ............................... 44
Erro bom é erro original ................................................................................................. 50
Técnica, suor e cuidado para conquistar clientes .......................................................... 55
O foco do pato, que anda, voa e nada, mas não faz nada direito ................................. 62
A grandeza dos pequenos ............................................................................................. 68
A sabedoria da quarta gaveta ........................................................................................ 77
Planejamento é um sanduíche de bom senso, com uma fatia de
democracia embaixo e outra de liderança em cima ...................................................... 84
Prejuízo pode não matar, finanças descontroladas sim ................................................ 91
Pausa para meditação ................................................................................................... 97
O quintal do concorrente não é mais verde do que o seu ........................................... 102
O exercício das duas colunas ...................................................................................... 107
Jamais frustre a expectativa do cliente ........................................................................ 114
Desamarre o gato, ou uma história sobre procedimentos que não
servem para nada ........................................................................................................ 119
Empreendedor, pero no mucho ................................................................................... 125
Faça amor não faça guerra.......................................................................................... 132
A sua parte de um país melhor .................................................................................... 137
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“Saber e não fazer é o
mesmo que não saber”
Lao Tse
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Introdução
Montar um negócio próprio não é fácil, por mais que a idéia seja boa
e o mercado, propício. O primeiro passo é a abertura da firma, algo
que poderia ser simples, mas acaba sendo complicado, penoso e
demorado. A lei exige toda empresa tenha um contador, um
profissional pago para entender o ininteligível emaranhado de
normas, estatutos, leis, emendas, alíneas, alíquotas e taxas de uma
legislação absurda. De saída, você, seu dinheiro, seu tempo, sua
empresa, seu futuro já ficam na mão de alguém que, por mais que
tenha sido bem recomendado, não deixa de ser um completo
estranho. Se ele errar algo, você terá pelo menos seis meses de dor
de cabeça em algum momento, mais cedo ou mais tarde. Passar
ileso por essa primeira fase é como acertar na loteria.
Uma empresa - a sua empresa - nasce de idéias, sonhos, ambição e
fé no próprio talento. Criar um negócio deriva sempre de uma mistura
de pragmatismo com romantismo. Você tem questões imediatas e
concretas: precisa pagar as contas, sustentar a família, melhorar de
vida, comprar coisas novas e melhores. Mas também tem um lado
existencial e muito pessoal: quer ser reconhecido, ter o inenarrável
prazer de construir algo com as próprias mãos, deixar sua marca no
mundo. Abrir uma empresa é sempre, invariavelmente, uma união da
necessidade com a esperança.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
E é assim, cheio de boa vontade e fé, com empolgação contagiante e
confiança inabalável, que você tem o primeiro grande choque cultural
- no momento em que, mal inaugurou a empresa, seu sonho é
invadido por um exército desumano de livros de registros,
documentos fiscais, notas, obrigações trabalhistas, guias, formulários,
burocracias de todas as formas, jeitos e tamanhos, impostos, taxas,
taxas e impostos – isso sem falar da fiscalização corrupta e
insaciável. Empreendedores, no entanto, são persistentes e
perseverantes. São as dores do parto, pensam eles, daqui a pouco
tudo será melhor. E então trabalham, trabalham e trabalham.
Trabalham o dobro do que previam e, geralmente, conseguem vender
a metade do que imaginavam. Em conseqüência, vem a falta de
dinheiro no caixa – ainda mais porque poucos empreendedores
sabem ou procuram saber como gerenciar as finanças da empresa. E
o lado financeiro, e não a publicidade, é que é a alma do negócio. Por
não entender isso, por não pensar nisso antes, dúzias de
empreendedores de primeira viagem (às vezes de segunda ou
terceira) quebram antes de sua empresa completar um ano de vida.
Nesse momento, você deve estar pensando: “comprei um livro para
melhorar meu negócio e o autor só fica me desestimulando”. Acredite,
é melhor fazer isso agora do que depois de perder muito tempo,
saúde e dinheiro. Há pessoas que não foram talhadas para ser
empreendedor – da mesma forma que nem todos jogam futebol como
o Ronaldinho Gaúcho ou desfilam como a Gisele Bündchen. Muitos
se dão melhor com carteira assinada. Outros precisam da proteção
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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um sistema de franquia para tocar um negócio. No fundo, são
relativamente poucos os que efetivamente têm alma empreendedora.
Há estudiosos que acreditam que o empreendedorismo faz parte das
características inatas de uma pessoa, assim como a cor do cabelo ou
a propensão para engordar. Pode ser que até seja verdade. Mas o
que realmente importa é que existem boas tinturas para cabelo e
regimes para emagrecer. O que quero dizer com isso é que
empreendedorismo se aprende. É treino, experiência, talento pessoal,
dedicação, esforço, persistência, criatividade, capacidade de
execução, boas idéias, visão de futuro, disciplina e fé. Requisitos que
todos têm, sem exceção - em graus variados decerto, mas
definitivamente têm.
Neste livro, você vai encontrar dicas e lições que são úteis a quem
pensa em abrir, manter ou expandir seu negócio. São experiências
passadas por quem já começou um negócio próprio e bateu muita
cabeça até descobrir caminhos mais fáceis. Nenhuma delas vai
garantir o sucesso da sua empresa, nem ensinar uma fórmula mágica
de ganhar dinheiro. Mas elas podem ajudar a mostrar a algumas
coisas óbvias do negócio, que normalmente estão bem debaixo do
nosso nariz e poderiam ajudar a evitar algumas decisões erradas.
Algumas das histórias são boas para serem lidas de tempos em
tempos. Isso ajuda a lembrar que muitas vezes fazemos os mesmos
erros mais de uma vez sem nem perceber. Outras podem ser usadas
também como material de treinamento para sua equipe. Para isso,
foram criados alguns panfletos em um formato adequado para
reuniões, palestras ou encontros. É só entrar no site
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www.guiadesobrevivencia.com.br e se cadastrar para ter acesso a
esses materiais.
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“Sem saber que era
impossível, foi lá e fez”
frase atribuída a tantos que já não se pode
garantir quem a inventou
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1.
A diferença entre dar certo e dar
errado
Com seus cabelos brancos e muitos milhões de reais no banco, um
velho empreendedor gosta de contar a história de dois garotos que
estudavam numa pequena cidade do interior, até se separarem no
final do ginásio. Foram se reencontrar numa esquina de São Paulo,
trinta anos depois. Um era funcionário subalterno de um
escritoriozinho. O outro, principal sócio de uma importante indústria.
Depois de algum tempo de conversa, o mais pobre não agüentou e
perguntou:
- Mas como é que você se deu assim tão bem na vida?
- Eu pulei na hora certa.
Inconformado com a resposta, o pobre retrucou:
- Mas e como você sabia a hora certa de pular?
Eis a resposta: "Não sabia. Fiquei pulando o tempo todo."
Essa historinha saltitante esconde uma verdade ululante. Para ter
sucesso no próprio negócio, é preciso ser muito, mas muito teimoso 10
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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por muitas razões, sobretudo para agüentar por um bom tempo a
conta bancária no vermelho, sem luz visível no final do túnel. É, não
raro, um teste infernal de resistência, pontilhado por obstáculos de
mercado, armadilhas da concorrência, rejeição da clientela – isso
sem falar da alucinante montanha russa emocional na qual o
empreendedor sacoleja diariamente, com picos de euforia pela
manhã, descidas vertiginosas à tarde e vales de depressão à noite.
Está enganado quem acredita que os empreendedores de sucesso
chegaram aonde chegaram por causa de inteligência privilegiada.
Mesmo porque os empreendedores que se julgam muito inteligentes
normalmente são os que desistem mais rápido diante de resultados
pouco animadores. São traídos pela própria inteligência, achando que
ela está sendo subutilizada num negócio que não parece ter futuro
certo. Por outro lado, os empreendedores que persistem, colocando o
sonho acima da vaidade intelectual, continuam a tocar o seu negócio.
Passam por anos de sacrifício, até que em algum momento
desembocam na hora e no lugar certos, com as pessoas certas. E o
negócio finalmente deslancha.
De cada 10 empresas que prosperam, nove têm algo em comum: o
dono gosta do que faz, acredita no que faz e tem paciência para
esperar o mercado reconhecer seu valor. Se não gosta, deixa de
acreditar. Se não acredita, a paciência não tem sentido. E, sem
sentido, nada existe. Ou a mesma coisa de outro jeito: se gosta, o
trabalho se assemelha ao prazer, não àquele fardo que se suporta
apenas para pagar as contas. Se acredita, talvez nem pense em
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desistir, afinal o tempo não importa tanto assim quando se tem fé. E,
se não desiste, dar certo é uma questão de tempo.
A matemática ajuda a explicar o sucesso dos persistentes. Se um
empreendedor entregar os pontos depois de prospectar 50 clientes
em um ano de trabalho e outro empreendedor continuar no negócio
por mais cinco anos com a mesma taxa de prospecção, o persistente
terá cinco vezes mais chance de fazer a empresa prosperar. Lógico.
Note que a taxa de sucesso, no caso, não tem nada a ver com
inteligência privilegiada – apenas com paciência e persistência. O
mundo está cheio de pessoas que ninguém dava um tostão por elas e
que hoje são acionistas de empresas milionárias. Da mesma forma,
há uma multidão de primeiros alunos da classe que abriram sua
empresa e não tiveram a paciência necessária para continuar
remando contra a maré. Fecharam as portas e hoje, na mesa do bar,
sempre que têm oportunidade, comentam com os amigos que não
conseguem entender como tanta “gente burra” dá certo e ele,
“inteligente e cheio de idéias novas”, quebrou a cara.
Paciência é fundamental, sim, mas não é tudo. Existe uma linha nem
sempre nítida que separa a persistência virtuosa da insistência inútil.
Jamais gaste vela boa com defunto ruim - melhor assumir o prejuízo
e fechar as portas do que perder mais dinheiro e aumentar o
desgaste e o estresse. Se a situação está muito mal, a hora de fechar
fica evidente. A grande questão é quando a empresa está patinando
sem sair do lugar, naquele vai-não-vai, fecha-não-fecha. O que fazer
nesse caso? Bem, o amigo pobre desistiria. Já o amigo rico
continuaria pulando.
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Pense nisso...
§
Persistência é fundamental. O mundo está cheio de
empreendedores que sofreram muito nos três primeiros anos.
Depois, decolaram.
§
Gostar do que faz é importante. Mas acreditar – em você, na
empresa, no potencial do negócio – é mais ainda. Sem isso, não
terá paciência para esperar o mercado descobrir a empresa.
§
A vaidade intelectual é inimiga dos negócios. No início solitário da
empresa, trabalho braçal, disposição para pagar micos e
humildade valem mais do que MBA.
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“Com pessoas boas você
pode até fazer maus
negócios. Mas com pessoas
do mal nunca há bons
negócios”
Rolim Amaro, fundador da TAM
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Pedro Mello
2.
Que tipo de sócio você quer: o porco
ou a galinha?
Para descobrir se alguém será, ou não, um bom sócio da sua
empresa, recomenda-se uma dupla imbatível: ovos com bacon. Como
assim, cara-pálida? Deixe-me explicar: como alguns sabem, ovos
com bacon é um prato tipicamente americano servido no café da
manhã. Para prepará-lo, são necessários dois animais, o porco e a
galinha. Qual é a diferença entre eles? A galinha está levemente
envolvida com os ovos, enquanto o porco está totalmente
comprometido com o bacon. Ou seja, a galinha põe o ovo e vai ciscar
ao sol, mas é o coitado do porco, rapelado e estripado, que vê sua
pele fritar e torrar na frigideira.
Apesar de pouco sutil, a metáfora do porco e da galinha retrata um
modelo de sociedade destinada a fabricar desgastes em série, uma
vez os sócios têm participações e riscos incompatíveis (ou, no
mínimo, muito desiguais). De um lado, está a galinha talentosa, com
idéias originais e capacidade de trabalho, mas sem um tostão no
bolso. Do outro, o investidor que, arriscando o próprio couro, dispõe-
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se a abrir a carteira para apostar na tal boa idéia. Esse tipo de
associação, produto da fome com a vontade de comer, sempre nasce
bem, mas, a menos que se ganhe dinheiro muito rápido, seu destino
geralmente é triste, gerando prejuízo de um lado e frustração do
outro.
A metáfora dos ovos com bacon não deixa de ser um tanto
reducionista, por determinar o grau de comprometimento de um sócio
pelo dinheiro que ele colocou no negócio – ainda mais porque muitos
dos que entram apenas com trabalho estão efetivamente
comprometidos até o pescoço com o negócio. De qualquer modo, a
experiência mostra que o dinheiro investido ainda é o melhor
termômetro para indicar quem realmente acredita no sucesso de um
projeto. Afinal, como dizia Machado de Assis, melhor cair das nuvens
do que de um quarto andar. Logo, melhor perder um ano do que um
milhão.
Se você pretende montar uma sociedade com alguém, lembre disso:
quanto mais porcos uma empresa tiver (leia-se mais dinheiro e mais
comprometimento), mais chances de sucesso ela terá. Sim, isso é
bastante óbvio, muito desejável mas nem sempre possível. Na
sociedade de galinhas com porcos, quem investe quer gastar o
mínimo e quem é financiado quer ter o máximo possível de dinheiro
para tocar a empresa – de preferência com um belo pró-labore. Eis
uma situação delicada, complexa e potencialmente explosiva. Para
reduzir a zona de atrito, a melhor combinação é a que reúne bom
senso e parcimônia. Comece pequeno, com o mínimo de
investimento - um pró-labore simbólico, que mal paga as contas de
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casa, espanta a acomodação e obriga os sócios a se desdobrar para
colocar mais dinheiro na empresa. O negócio vai levar mais tempo
para crescer, mas pelo menos será construído em bases mais sólidas
e difíceis de serem abaladas no futuro.
Os recursos limitados, de certa forma, fazem bem aos negócios. Com
dinheiro sobrando, a tendência é repetir tudo aquilo que já foi feito
duzentas mil vezes, muitas vezes sem bons resultados, em todas as
áreas – estrutura, vendas, marketing e por aí afora. O dinheiro curto,
por sua vez, estimula a inventividade, parceiras, alternativas,
diferenciais - ou seja, o que realmente importa no atual ambiente de
negócios.
A grande questão, aqui, é distinguir dois tipos diferentes de dinheiro
curto. Um é o tal que estimula a criatividade. O outro é aquele que
aperta o pescoço da galinha, estrangula o negócio, empobrece o
produto, asfixia a qualidade e sufoca a empresa. É a economia burra,
que irriga a árvore com tão pouca água que apenas garante a
sobrevivência das folhas mas inviabiliza a produção de frutos. Dessa
forma, o porco investidor, com dinheiro mas sem visão, não investe
de verdade, só pinga o mínimo do mínimo e, com isso, inviabiliza a
decolagem o negócio. Em decorrência, coloca a galinha num eterno
banho-maria. E, assim, por mais que ela trabalhe, se comprometa e
faça milagre com pouco ou quase nada, estará reduzida a uma canja
insossa pela obtusidade do porco - que tem medo de virar torresmo e
que, apenas e exclusivamente por ter medo, acaba mesmo virando
torresmo ao sufocar a galinha dos ovos de outro.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Pense nisso...
§
Sociedades nas quais um sócio entra com o dinheiro e o outro
com o trabalho já nascem com dois pesos e duas medidas. Raras
são as que dão certo. A maioria gera mais desgastes do que
lucro
§
Investimentos devem ser feitos para financiar o negócio, e não os
sócios. Pró-labore alto gera acomodação. Melhor condicionar as
retiradas ao lucro
§
O que vale para sócios também vale para funcionários.
Remuneração variável é afrodisíaco para os negócios
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“Não sei a fórmula do
sucesso, mas a do fracasso
é querer agradar todo
mundo”
John Kennedy, ex-presidente dos Estados
Unidos
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Pedro Mello
3.
Mais um pouco sobre sócios
Sociedade, seja com os ovos ou com o bacon do capítulo anterior, é
como casamento: quem está fora quer entrar e quem está dentro
quer sair. Quando se começa um negócio sozinho, batendo escanteio
e cabeceando, reza-se todos os dias para encontrar um sócio.
Quando se encontra, em 99 de cada 100 casos, passa-se a pedir aos
céus para que ele suma, de preferência sem surrupiar o dinheiro da
empresa.
Você pode achar que é caricatura, maldade ou invenção, mas
conheço pelo menos três histórias que, com nomes diferentes, se
repetiram de maneira desesperadora. Eis uma. João, o pai da idéia,
era sócio de José, um amigo convidado para ajudar a executá-la.
João acordava às cinco e meia e às sete já estava trabalhando. José
chegava às dez, com cara de sono. João saía às nove, achando que
tinha feito pouco. José já tinha se mandado às seis, pensando que
tinha trabalhado demais. No final do mês, João queria reinvestir o
lucro, mas José queria trocar de carro.
Não precisa ser gênio para imaginar que o pensamento que mais
passava pela cabeça de João era: "Por que raios eu não toquei o
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
negócio sozinho?". Pouca coisa é pior no mundo do que se sentir um
otário, ainda mais se quem lhe faz de trouxa é justamente a última
pessoa que deveria fazer isso. Guardadas as devidas proporções,
não é um sentimento muito diferente de quando um marido pega a
mulher na cama com outro, ou vice-versa. Ele fica ali parado com
aquela cara de boi no pasto, sentindo suas energias serem sugadas
pela decepção, pela impotência, pelo ódio. O cidadão se esfalfa para
as coisas darem certo e o outro retribui daquele jeito.
Claro que existem bons casamentos e bons sócios. Mas, nos dois
casos, não dá para saber antes se vai dar certo ou não. Amizades de
décadas já foram para o vinagre meses depois da formação de uma
sociedade. Por outro lado, pessoas que você mal conhecia se provam
os parceiros perfeitos. Mas, para descobrir quem é quem, só testando
na prática. Seja como for, há coisas que você pode levar em conta
antes de convidar alguém para ser seu sócio:
Relacionamento: Por mais que as pessoas mudem ou se revelem
em uma sociedade, você diminui a chance de erro se conhecer muito
bem a outra pessoa. Se já tiver trabalhado com ela, ótimo, pois assim
terá parâmetros concretos para avaliar a afinidade nos negócios.
Amizades construídas ao redor de cerveja, em geral, não rendem
boas sociedades.
Equilíbrio: Pode ser agradável ficar na boa vida enquanto o outro
agüenta as buchas do dia-a-dia. Mas desse jeito o preguiçoso só está
criando uma bomba relógio para si. Um dia o sócio trabalhador se
enche de fazer papel de otário e manda o molenga para o espaço,
com toda a razão.
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Valores: Se os sócios não dividem os mesmos valores e objetivos
para a empresa, melhor não ficarem sócios. Se um acha que ganhar
X por mês é suficiente para uma vida boa e o outro acha que deve
ganhar 5X para ser feliz, vocês já começaram a discordar do tamanho
que a empresa deve ter.
Diretoria: Se uma sociedade com duas pessoas já é difícil, imagine
com três ou mais. Se puder, mantenha o menor número possível de
sócios.
Investimento: Evite sociedades em que só um põe dinheiro e o outro
trabalho. Por menor que seja o investimento, ambos sempre têm que
investir juntos, para estarem igualmente comprometidos.
Salvação: Muitos julgam que um sócio é a salvação para todos os
problemas. Sociedade montada em tempo de desespero só ajuda a
levar os dois para o fundo do poço mais rápido. Primeiro porque
quem está bem não quer ser sócio de quem está mal. Segundo
porque quando alguém está se afogando abraça até jacaré.
Ou seja, se você está buscando um sócio para resolver seus
problemas, é muito melhor aprender a nadar sozinho ou você ainda
vai ter que conviver com lágrimas de crocodilo.
Pense nisso...
§
Por falta de dinheiro, divisão de trabalho ou insegurança, a
maioria das pessoas, quando pensa em abrir uma empresa, quer
logo arranjar um sócio. Sócio não é muleta.
§
Pessoas são imprevisíveis e sócios são pessoas. Se um sócio
for realmente necessário, escolha alguém que você já conheça.
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Ouça quem já fez negócios com ele. Mesmo assim, nunca há
garantia de nada
§
Desde o início, por mais desagradável que possa ser, estabeleça
todas as regras do jogo societário. Defina tarefas, obrigações,
remuneração, penalidades, até a dissolução da sociedade.
Quanto mais claro for para todos os lados, menor a chance de
passar anos se engalfinhando na justiça.
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“O progresso é decorrente
do homem que age, e não
do discursa sobre a maneira
que as coisas deveriam ser”
Franklin Delano Roosevelt
Ex-presidente e grande estadista americano
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4.
Quando pouco dinheiro é melhor que
muito dinheiro
Sabe qual é o melhor negócio do mundo? Um poço de petróleo bem
administrado. E o segundo? Um poço de petróleo mal administrado.
Ou seja, se o seu negócio for bom, é provável que você ganhe
bastante dinheiro com ele, mesmo que a gestão seja desastrosa. Mas
se seu negócio for ruim, pode esquecer. Mesmo com o mais bacana
dos consultores, as chances de prosperidade são pequenas. Como
não há poços de petróleo no seu quintal, é preciso ter muito cuidado
na hora de lidar com dinheiro. Quando se começa um negócio, muitos
empreendedores acreditam que o negócio só não deslancha por falta
de capital para investir. Erro. Infelizmente, essa é a premissa que leva
a maioria das empresas ao seu próprio fim.
Por incrível que pareça, não é qualquer capital que é bom para os
negócios – ou melhor, dinheiro sempre é bom, mas, se você não
utilizá-lo com sabedoria, pode virar fumaça em pouco tempo. Capital
é bom mesmo em duas situações. A primeira é quando ele sai do
negócio na forma de lucro e vai para o bolso dos sócios. A segunda,
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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quando um investidor entra com dinheiro para expandir a operação.
Na primeira situação, minha preferida, o negócio anda bem. Mesmo
que esse rendimento seja pequeno, o importante é que a empresa
sobrevive com seus próprios recursos e não depende mais de injeção
de capital dos sócios para pagar suas contas. Esse é o caminho mais
demorado, mas também o mais sólido para crescer. Foi assim que a
maioria das grandes empresas chegou onde está.
Na segunda situação, a empresa também já está equilibrada, mas
precisa de investimento apenas para expandir sua operação. Porém,
os sócios não têm fundos suficientes para isso. Nesse caso, o capital
de um investidor serve para aumentar a competitividade da empresa.
Essas são praticamente as duas situações principais nas quais o
dinheiro faz bem para a empresa.
Agora, se você estiver naquele estágio anterior, no qual seu negócio
ainda não deu lucro e você acha que uma injeção de capital vai
arrumar todos os seus problemas, pare um pouco para pensar antes
de fazer uma burrice. O tempo e a experiência ensinam que excesso
de dinheiro (principalmente quando ele não é seu) deixa a empresa
acomodada. Duvida? Então feche os olhos e experimente pensar
como seria abrir um negócio com um milhão de reais na conta para
gastar. Pensou? Então, já deve estar imaginando quantas pessoas
sua empresa vai contratar, quantos computadores serão comprados,
site na Internet, marketing, panfletos, etc. Parece um paraíso, não é?
Agora pense em abrir a mesma empresa com os, digamos, R$ 5.000
de sua conta bancária, mais os R$ 10.000 de limite do cartão de
crédito. Ainda conte com a venda do seu carro, caso o negócio
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demore um pouco mais para decolar. Em qual das duas situações
você se esforçará mais?
Percebeu as principais diferenças entre essas duas maneiras de abrir
seu negócio? Se você optar pela segunda maneira, vai economizar
um milhão de reais para o investidor que acreditou em você e ainda
terá dez vezes mais chances de ver seu negócio dar certo. Parece
loucura, mas não é. O fato é que, no momento em que qualquer
investidor acenar a possibilidade de investir um milhão na sua
empresa, provavelmente você vai começar a pensar em tudo onde
vai gastar esse dinheiro – tudo menos o que a empresa realmente
precisa: mais clientes e mais faturamento. Rapidamente o dinheiro vai
embora e a empresa continua no mesmo lugar, apenas mais inchada
e cheia de contas para pagar. Se você começar sem nada, decerto
será bem mais difícil. Vai sentir o que é matar um leão a cada dia.
Mas com o tempo vai sobrar um pouco mais de dinheiro para
contratar mais pessoas e comprar micros melhores. Com muita
paciência, o negócio começará a tomar forma e crescer, e pode
chegar muito mais longe do que aqueles que começaram com muito
dinheiro.
Pense nisso...
§
Em negócios que dão certo, a criatividade vale mais do que o
dinheiro.
§
Agüente quanto puder com seu próprio capital, mesmo que isso
signifique descer ao fundo do poço. Depois que você conseguir
se reerguer, verá que aprendeu a se virar muito mais do que se
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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tivesse aceitado dinheiro de capitalistas para amenizar o seu
sofrimento.
§
Não esqueça que o sócio capitalista vai querer seu capital de
volta se um dia você decidir quebrar a sociedade.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“Se você pensa que pode
ou pensa que não pode, de
qualquer modo você tem
toda razão”
Henry Ford, fundador da Ford
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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5.
O problema de pensar muito nos
problemas
Alguns anos atrás os astronautas americanos tinham um grande
problema para escrever relatórios em órbita. Sem gravidade, as
canetas esferográficas empacavam. Para resolver essa questão, a
NASA, a agência espacial dos Estados Unidos, contratou
especialistas a fim de criar uma caneta que funcionasse em
quaisquer condições, no espaço, na água, no frio ou de cabeça para
baixo. Dez anos e milhões de dólares depois, a tal caneta ficou
pronta. E sabe o que os russos fizeram para resolver o mesmo
problema? Usaram lápis.
Essa historinha mostra a principal diferença entre as pessoas que se
perdem no problema e aquelas que se concentram em encontrar a
solução. Quem gasta muita energia com problemas tende a ficar
patinando no atoleiro – enquanto os que usam a cabeça para driblar
as adversidades alcançam mais rápido o sucesso na vida e nos
negócios. Não há uma receita para se tornar um especialista em
soluções, mas a experiência mostra que o caminho mais curto passa
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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pela simplicidade e pela humildade. Humildade para buscar a
simplicidade. E simplicidade para não complicar, que afinal é o que a
maioria das pessoas faz.
Imagine que algo deu errado na sua empresa. Qual a sua primeira
reação? Resposta provável: começar a caça ao maldito culpado. Ao
fazer isso, automaticamente colocou a humildade de lado e começou
a se preocupar mais com o problema do que com a solução. Como
na areia movediça, esse tipo de movimento só contribui para atolar
mais – algo imperdoável quando o que você realmente precisa é sair
do buraco. E se a burrada foi sua? De novo, não complique, não
perca tempo com desculpas esfarrapadas e faça o máximo para
consertar tudo rapidinho. Essa atitude desarma até quem foi
prejudicado pelo seu erro – ao passo que desculpas tolas e tentativas
de se eximir da culpa só irritam. Da mesma forma que também irrita
aquele grupo de funcionários que, diante de um erro do colega, gasta
horas crucificando quem pisou na bola, sob o pretexto de que estão
fazendo “crítica construtiva”. Ignore-os. Alie-se a gente que quer
mesmo resolver problemas, não importa de quem foi o erro.
Problemas são eternos e estão em todos os lugares. Não adianta
amaldiçoar a existência deles. É mais gratificante encontrar as
soluções. É uma questão de postura.
Veja esse caso, contado por um amigo sobre um consultor de vendas
que foi participar de um ciclo de palestras em outra cidade e teve sua
mala extraviada no aeroporto. Sem mudas de roupas, foi a um
shopping para comprar uma camisa azul, a única que ele julgava
combinar com o terno. Entrou na primeira, na segunda, na quarta loja.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Nenhuma delas tinha. Até que, num manequim da vitrine da quinta
loja, ele viu a sua camisa azul.
Entrou e perguntou à vendedora se tinha aquela camisa no tamanho
três. Em vez de dizer sim ou não, ela perguntou com que terno ele a
usaria. O consultor apontou para a roupa do corpo. Com educação, a
moça perguntou se podia fazer uma sugestão. Pediu para o consultor
tirar o paletó do terno e o colocou em cima do balcão. Pegou uma
camisa amarela e, colocando-a por baixo do paletó, mostrou que ela
combinava mais com o terno do que a azul – ainda mais se ele
levasse também uma gravata que ela exibia. Resultado:
satisfeitíssimo, o consultor comprou a camisa amarela e também
levou a gravata.
Mas assim que ele deu alguns passos fora do shopping, a ficha caiu.
“Peraí”, pensou ele, “vim comprar uma camisa azul e saí da loja com
uma camisa amarela mais uma gravata que eu nem precisava! E a
camisa azul que eu queria comprar, porque não a levei?”. Deu meiavolta e entrou novamente na loja. Agora, frente a frente com a
vendedora, perguntou se ela tinha ou não a tal da camisa azul que
ele estava procurando há horas no shopping? A resposta foi um
recatado não, com a explicação de que infelizmente ela não tinha a
camisa na numeração dele e por esse motivo ofereceu a camisa
amarela. Eis uma bela lição: diante da falta da peça que o cliente
queria, a moça encontrou um caminho para a solução falar mais alto
do que o problema e, assim, não perder a venda. Um bom caso de
como transformar problema em oportunidade. Ou, na falta da caneta
espacial, de como escrever uma lição de sucesso a lápis.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Na vida do negócio próprio, essas histórias mostram que os
empreendedores de sucesso sempre simplificam os problemas com
soluções rápidas e eficazes. Nada de enrolação com relatórios longos
e complicados, pesquisas qualitativas ou reuniões intermináveis. Ele
vai direto ao assunto em busca do que está causando o problema e
foca suas energias para descobrir como ele pode ser resolvido.
Pense nisso...
§
Bons
empreendedores
oportunidades.
transformam
§
A maior parte dos problemas normalmente é menor e mais fácil
de resolver do que parece.
§
Sempre há uma maneira mais simples e óbvia para resolver até
os problemas mais complexos.
§
Se você errar, assuma o erro e corra para arrumá-lo em vez de
ficar se explicando.
§
Normalmente a solução para o problema já existe e está dentro
da sua própria empresa.
§
Peça opinião dos funcionários. A combinação de dois ou mais
pontos de vista estimulam soluções criativas
36
problemas
em
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“Enquanto os vencedores
comemoram, os perdedores
se justificam”
Roberto Shinyashiki
37
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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Pedro Mello
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
6.
Os três tipos de vendedores: águia,
andorinha e peru
É possível separar vendedores em três grupos principais: águia,
andorinha e peru.
O vendedor tipo águia tem uma visão muito aguçada, voa alto e
enxerga de longe sua presa. Quando vai para o ataque, dificilmente
perde o bote. Ele não precisa de estímulos externos para caçar e
trabalha muito bem sozinho. É o vendedor que todos sonham ter. Dá
pouco trabalho, faz o serviço bem feito e traz para a empresa bons
resultados, sem precisar de tapinhas nas costas e festinha de
parabéns.
O vendedor tipo andorinha normalmente fica reunido em pequenos
bandos, voa um pouco em busca de comida e volta logo para o fio do
poste em que as outras andorinhas estão. Passados alguns minutos,
lá estão todas as andorinhas conversando sem parar. A maior parte
da equipe de vendas é formada por esse tipo de profissional, que
sempre precisa de um gerente ou diretor para dar uma balançada no
“fio do poste” e, assim, provocar uma revoada em direção às vendas.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Como se vê, infelizmente, só funcionam se alguém estiver sempre
cobrando resultados.
O vendedor tipo peru é o pior de todos. Bate asas, faz um barulho
danado e não sai do lugar. É aquele tipo que passa os primeiros três
meses na empresa sem fazer uma única venda, mas cheio de
histórias de negócios que estão sendo fechados. Algumas
características típicas desse vendedor são: nunca dá respostas
precisas a perguntas (normalmente começa a resposta com “veja
bem”, “sabe” ou “então”), sempre fala no gerúndio (fazendo,
analisando, conversando, negociando, visitando, pensando e aí vai) e
leva o triplo do tempo para fazer qualquer coisa.
Sim, é muito difícil formar equipes de vendas. Talvez esse seja um
dos maiores desafios de qualquer empresa, principalmente das
iniciantes. A maioria dos empreendedores investe boa parte do seu
tempo na criação, desenvolvimento ou aperfeiçoamento de seu
produto ou serviço. Com o tempo que sobra, controla as finanças e
quebra a cabeça para tentar fazer seu negócio ficar conhecido. É
tanta correria que muitos esquecem que, sem uma boa equipe de
vendas, pouco ou nada adianta – até mesmo porque boa parte dos
empreendedores de primeira viagem é um bicho, com todo respeito,
meio toupeira. Cansei de ver gente talentosa, que até tinha um
produto muito bom, mas que no começo tinha vergonha de falar o
preço e pedir para o cliente assinar o pedido. A parte boa é que,
depois de um ou dois negócios perdidos, a ficha cai e ele perde a
inibição para os negócios.
40
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Comecei a pensar sobre isso tudo e acho que cheguei a uma outra
teoria, que une o começo ao fim dessa história. Quanto mais
vergonha a liderança da empresa tem em vender seus produtos e
serviços, mais chance tem de contratar vendedor tipo peru. Por outro
lado, quanto mais expressiva for essa mesma liderança, mais
chances de atrair o vendedor tipo águia. Quanto ao vendedor tipo
andorinha, bem, ele encontrará seu lugar em qualquer que seja o tipo
de empresa, pois não haveria o bom e o ruim se não fosse o mais ou
menos.
Se você ainda não se convenceu da importância das águias e da
irrelevância dos perus, vai aqui um provérbio zoológico, muito comum
na zona rural: mais vale uma mula enlouquecida do que uma égua
empacada. Ou seja, abra as portas da sua empresa àqueles que,
mesmo fora do figurino, saem como uns loucos atrás de vendas e, no
final, como as águias, acabam voando mais alto do que todos. Da
mesma forma, esqueça o tipo altivo, com aparência de lorde inglês,
mas que não sai do lugar e, como os perus, acabam morrendo na
véspera.
Pense nisso...
§
Muitos empreendedores de primeira viagem se preocupam muito
com o produto e negligenciam as vendas. Esquecem que, sem
venda, não há empresa
§
Pessoas que usam muito os verbos no gerúndio (fazendo,
esperando, analisando, etc), normalmente tem baixa
performance.
41
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§
Pedro Mello
Grandes vendedores geralmente são pouco convencionais. Se
ele traz bons resultados, para que pegar no pé se ele não chega
às oito?
“Um dos segredos do
sucesso é fazer coisas
comuns de maneira
incomum”
John Rockfeller, um dos maiores
empreendedores da história do capitalismo
42
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7.
A salada de dezoito frutas, ou a lição
do garçom que salvou o dia
Um amigo me mandou um e-mail. Queria contar como tinha sido o
almoço numa pequena churrascaria do Rio de Janeiro. A narração
começava pela descrição do ambiente: decoração inexistente, arcondicionado pifado, iluminação de catacumba. Continuava pela
qualidade do rodízio, que podia ser resumida pelos dois tipos de
carne disponíveis – as duras e as gordurosas. Terminava dizendo
que só não foi embora no meio do almoço por causa do garçom, um
tipo muito bem-humorado, que, com alegria e entusiasmo, driblava os
problemas como se nada estivesse acontecendo.
O melhor exemplo do ânimo do garçom ocorreu na hora da
sobremesa. O que é que tem?, perguntou meu amigo.
- Sugiro a nossa deliciosa salada de dezoito frutas.
- Como é?
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
- Ela é feita com dezessete bananas e um mamão, exclamou o
garçom, com a empolgação de quem estava apresentando a melhor
sobremesa do mundo.
Meu amigo saiu de lá rindo, contagiado pela presença de espírito do
garçom, que conseguira transformar a pobreza em luxo - tanto que se
deu o trabalho de contar a história num e-mail e passá-la aos amigos.
Há aqui uma grande lição sobre atendimento de clientes. Mesmo que
o lugar fosse uma espelunca e a comida, uma desgraça, meu amigo
praticamente só lembrava do ótimo garçom que trabalhava lá. Por
pior que fosse todo o resto, havia a possibilidade de o cliente voltar à
casa só para se divertir mais uma vez com o tal garçom.
Esse tipo de relação entre o cliente e quem está vendendo um
produto ou prestando um serviço é a coisa mais valiosa que uma
empresa pode desejar. Em uma pesquisa realizada pela Walt Disney,
para identificar os motivos pela qual as pessoas deixam de comprar
produtos ou serviços que estão habituados a consumir, descobriu-se
que:
§
9% não compram mais porque morreram, mudaram de bairro,
cidade ou hábitos. Ou seja, não há nada que possa ser feito para
fazer esse cliente voltar a comprar de sua empresa.
§
9% não compram mais por causa do preço do produto ou serviço.
Por isso, optaram pelo concorrente. Você pode recuperá-lo, mas
vai dar um certo trabalho.
§
14% não compram mais por motivos relacionados à qualidade do
produto ou serviço que sua empresa vende. Como o grupo
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
anterior, é precisar suar a camisa para reconquistar sua
confiança.
§
68% deixam de comprar em sua empresa pelo atendimento ou
comportamento dos funcionários. Ou seja, aqui está o pulo do
gato. Trabalhe com sua equipe para que ela sempre seja
educada e prestativa e você verá seus clientes cada vez mais
fiéis aos produtos e serviços que sua empresa vende.
Apesar de isso tudo parecer tão óbvio, além de haver algumas
dezenas de livros que falam sobre esse assunto, é difícil estar
sempre de bom humor e atender bem todos os clientes. Essa é uma
característica que não precisa estar dentro de você desde que
nasceu, mas precisa ser treinada todos os dias – e há pouca coisa
melhor para treiná-la do que cliente chato.
Numa daquelas promessas de final de ano, outro amigo, dono de
uma locadora de vídeos em São Paulo, jurou que iria tratar todos
clientes mais insuportáveis como se fossem reis. Parece brincadeira,
mas fez uma lista dos mais intragáveis, mal educados, arrogantes,
desagradáveis. Toda semana ligava para cada um. Oferecia fitas de
cortesia, avisava dos lançamentos, ou apenas perguntava se
estavam passando bem. Depois de poucos meses, oito dos dez
insuportáveis viraram pessoas afáveis, que puxavam conversa e
alugavam mais filmes. Essa metamorfose ocorreu apenas porque
eles receberam mais atenção. Simples assim.
Para quem mora em grandes metrópoles, onde o caos e o estresse
tomam conta do dia-a-dia, ser gentil e atencioso com os clientes é, no
mínimo, uma tarefa complexa. Mas não há outro jeito. Se você quer
46
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
que os clientes continuem prestigiando o seu negócio, lembre-se da
salada de dezoito frutas.
Pense nisso...
§
Atendimento normalmente é mais importante do que o próprio
produto.
§
Custa muito mais caro conquistar um novo cliente do que manter
os atuais.
§
No mundo louco de hoje, se você der um mínimo de carinho e
atenção para seu cliente, já estará fazendo muito mais do que os
seus concorrentes.
47
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Pedro Mello
“Fracasso é apenas uma
ocasião de começar uma
nova tentativa com mais
sabedoria”
Henry Ford, que quebrou três empresas
antes de acertar com a primeira linha de
montagem de automóveis do mundo
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Pedro Mello
8.
Erro bom é erro original
Depois de três semanas no interior da África, dois caçadores ingleses
se preparavam para voltar para casa. Na bagagem, cada um levava
500 quilos de marfim, peles de leopardo, carne de antílope e presas
de leão. Acomodaram tudo no jipe e partiram para um pequeno
aeroporto, no qual um teco-teco os aguardava para transportá-los à
capital. Ao ver a quantidade de carga, o piloto sentenciou:
– É peso demais. Nós, mil quilos de caça mais o equipamento e as
malas. O avião não agüenta.
– Deixa disso, disse um dos caçadores. No ano passado, nós
caçamos a mesma coisa, com o mesmo equipamento e as mesmas
malas, e o avião, igualzinho ao seu, conseguiu levantar vôo.
O piloto duvidou, os caçadores insistiram. Insistiram tanto que
convenceram o homem a deixá-los embarcar com toda a carga. O
avião começou a taxiar na pista. Lentamente foi ganhando
velocidade. O final da pista se aproximava. O piloto pisava mais
fundo, o barulho do motor crescendo e a pista acabando. E aí, nos
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Pedro Mello
metros finais, com muito sofrimento, o aviãozinho finalmente saiu do
solo. Ufa... Decolaram.
Bravamente, o teco-teco ganhou alguns metros de altura, mas
sucumbiu ao excesso de peso, foi caindo, caindo e pumba, estatelouse no chão. Atordoados, meio tontos, os dois caçadores se
arrastaram para fora da aeronave estraçalhada.
– Nossa, onde é que estamos?, perguntou um.
– Acho que uns cinco quilômetros para frente de onde caímos no ano
passado, respondeu o outro.
Esses caçadores não são tipos incomuns. De uma forma ou de outra,
muitos empreendedores se comportam assim. Sim, errar é humano,
até inevitável no caso de empresas. O problema é quando se insiste
no erro – o nome técnico dessa reincidência é: burrice. Há inúmeras
razões para agir assim. Uns insistem no erro por vaidade. Algo do
tipo "se eu conseguir fazer isso funcionar, mostro para todo mundo o
quanto sou bom, inteligente, determinado e superior" – e depois, se
não funciona, o sujeito fica com aquela cara de idiota, derrotado e se
sentindo um total incompetente. Outros reincidem por teimosia. Põem
na cabeça que é desse jeito que eles querem e, como burricos com
viseira, tocam adiante de qualquer jeito, mesmo que haja um abismo
à frente. Há ainda os que persistem no erro por falta de opção – se
admitirem que estão errados, enfrentarão a difícil questão de fechar
as portas ou, ao menos, repensar tudo e, quem sabe, recomeçar do
zero. Mais cômodo e menos trabalhoso, portanto, é não assumir que
estão fazendo o mesmo erro, mais uma vez, de novo e de novo.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Empreendedor competente não gasta tempo com o que não presta.
Se a coisa não funciona direito, ele tenta novas estratégias, novos
caminhos. Com isso, pode cometer erros novos, mas os antigos
jamais. A diferença entre um e outro é que, com os erros novos, você
aprende, enquanto que com os velhos só afunda.
É claro que há situações nas quais, com ou sem erros, não há muito
o que fazer – é o caso de quando o mercado fica um lixo, as pessoas
mal têm dinheiro para pagar as contas e o concorrente faz uma
promoção demolidora. Mas não é porque a situação saiu do controle
que você vai piorá-la com atitudes que parecem certas sob a ótica do
desespero, mas que, na verdade, são platitudes sob a luz da razão.
Para reerguer o seu negócio, é fundamental ter sangue frio e mente
aberta para buscar alternativas. Sangue frio para ver a vida como ela
é. E mente aberta para enxergar possibilidades. Sem isso, a
tendência, em muitos casos, é tornar-se refém do ego. Lembre-se: se
for para errar, que esses erros sejam, ao menos, originais.
Pense nisso...
§
Errar é humano, mas insistir no erro realmente é burrice.
§
Tente diferente. Não adianta fazer a mesma coisa da mesma
forma se você já sabe que não vai dar certo.
§
O que funcionou no passado não necessariamente funcionará
hoje. Por mais que ainda esteja dando certo, a tendência é o jogo
virar. Logo, às vezes errar é simplesmente deixar tudo como está.
52
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“Se você faz do mesmo
jeito o que sempre fez,
conseguirá cada vez menos
do que conseguia antes”
Evandro Mota, consultor brasileiro
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Pedro Mello
9.
Técnica, suor e cuidado para
conquistar clientes
Imagine que você está numa daquelas convenções bem chatas, com
explanações maçantes às sete da manhã, relatórios para cá, gráficos
para lá e papo furado por todo lugar. Mas, no penúltimo dia de tédio
absoluto, pouco antes de deitar, alguém bate à porta do seu quarto.
Você abre a porta e ali, parada, meio sem jeito, está a Gisele
Bündchen. Ela fala, com um sorriso encabulado: "Olha, desculpa te
incomodar, mas é que eu vi você desacompanhado no bar, você nem
me notou, depois foi embora e, sei lá por quê, não consegui tirar você
da minha cabeça. Então eu tomei coragem e vim aqui para perguntar
se você não queria tomar um drinque comigo". Agora eu pergunto:
você conhece alguém que já tenha vivido uma história como essa?
Eu também não. O motivo é simples. Na vida real, nenhuma Miss
Universo vai bater na sua porta a troco de nada para te convidar para
uma noite de prazer. Se você quiser ganhar a gata, com certeza terá
que trabalhar bastante para conquistá-la.
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Pedro Mello
O que essa historieta tem haver com o seu negócio? Bem, se você
quer ter sucesso, tenha uma certeza - nada, absolutamente nada vai
cair do céu. Para fazer sua empresa crescer, precisa fazer o que as
pessoas do interior chamam de cercar o frango. Ou seja, fazer de
tudo para ele não escape de você. Vai ter que pular, agachar, correr,
gritar, gesticular, rebolar, etc. etc. etc. Em um negócio, obviamente, o
frango não é uma mulher deslumbrante, mas sim os seus potenciais
clientes, que precisam ser cercados por todos os cuidados e atrativos
que o levem a comprar seu produto ou serviço. Para fazer isso bem
feito, alguns pontos fundamentais precisam ser observados.
Primeiro: Esqueça medo e vergonha e lembre-se da Gisele
Bündchen. Se você não tiver coragem nem inteligência para fazer
uma boa abordagem, a gata vai desprezá-lo. Perguntas tolinhas
como “o senhor precisa de ajuda?” é quase a mesma coisa que
perguntar o número do telefone do cachorrinho da moça – em 99,9%
dos casos a resposta é só um curto “não”. Entreter e encantar o
cliente é o que você tem de fazer, não fazer perguntas óbvias de
atendente de loja mal treinado.
Segundo: Entenda que cliente não compra o que o vendedor quer
vender, mas sim o que ele deseja comprar. Há vendedores,
sobretudo de produtos eletrônicos, que perdem um tempo enorme
falando de especificações técnicas. A maioria dos clientes, no
entanto, não está nem aí para coisas como impedância, SACD Ready
ou a rebimboca da parafuseta. Cliente quer saber se um produto vai
resolver os problemas e as necessidades dele, com qualidade e
segurança. Por isso, pergunte sem ser chato e responda sem ser
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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técnico. Fale a língua do desejo do cliente, e não o linguajar dos que
empurram qualquer coisa para ganhar comissão.
Terceiro: conheça bem os pontos fortes e fracos do seu produto e
dos seus concorrentes. Informação aliada a bom senso e inteligência
é uma combinação imbatível. Lembro de uma história de um carro
que tinha um porta-malas minúsculo. Assim que um cliente em
potencial chegava, a primeira coisa que o vendedor perguntava era:
“você vai usar esse carro mais para a cidade ou para viajar?”.
Quando chegava a hora de mostrar o porta-malas, o cliente,
previsivelmente, reclamava do tamanho. Na hora, o vendedor saía-se
com essa: “Você me disse que iria usar o carro mais na cidade, então
para que pagar mais caro por um carro só para ter um porta-malas
grande?”. Geralmente, o cliente concordava e levava o carro.
Quarto: não tenha medo de fechar a venda. Às vezes você faz tudo
direito, argumenta com propriedade, explica da melhor maneira
possível, mas o cliente permanece em dúvida – e, pior, você não
sabe o que fazer para tirá-lo desse estado e comprar de uma vez.
Certa vez, um vendedor fez comigo algo que me impressionou muito.
Eu tinha gostado de um produto, mas não sabia se levava ou não. De
repente, aproveitando um momento de hesitação (como se fosse um
namorado roubando o primeiro beijo da namorada), o vendedor tirou
suavemente o produto das minhas mãos, perguntou “como o senhor
deseja pagar, cartão ou cheque?” e foi se dirigindo ao caixa. Comigo
funcionou. Saí da loja pensando que o vendedor foi um mestre. Se
não tivesse sido o artista que foi, provavelmente eu ficaria irritado e
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Pedro Mello
incomodado por ele ter feito o que fez. Mas, como soube fazer, o
frango aqui acabou indo para a panela.
Quinto: se você não sabe sorrir, nunca chegue perto da área de
vendas da sua empresa.
Essas cinco pequenas dicas não têm a mínima pretensão de servir
como uma aula de como se tornar um bom vendedor. Mas serve
como um alerta. Se elas lhe mostraram algo novo, que você não
conhecia ou nunca se viu fazendo, pare. Você precisa considerar a
compra de alguns livros de técnica de vendas e quem sabe até se
inscrever em alguns cursos para abrir um pouco seus horizontes
nessa área.
Embora muitas pessoas ignorem, o fato é que todo empreendedor
tem que ter um certo tino comercial. Se não tiver, é recomendável ter
um sócio com desenvoltura nas vendas. Se esse também não for seu
caso, melhor pensar duas vezes antes de abrir seu negócio próprio.
Afinal, abrir as portas da empresa implica a condição de estar sempre
vendendo algo para seus clientes, todos os dias. Se não vender, você
vai acabar fechando as portas.
Pode parecer um pouco injusto, mas a realidade é que uma empresa
com um ótimo corpo técnico e uma área comercial sofrível tem
chances bem menores de sobrevivência do que o contrário. É melhor
ter vendas de um produto ruim do que estoques encalhados de um
produto incrível.
Pense nisso...
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§
Pedro Mello
A maioria dos clientes compra por necessidade, não porque o
vendedor precisa vender. Se você não se conectar com o cliente,
jamais saberá do que ele precisa.
§
Cada cliente tem uma necessidade diferente. Saber ouvir com
atenção, junto com um pouco de bom senso, vale muito mais do
que decorar manuais de técnica de venda.
§
Ao falar com o cliente, pergunte sem ser chato e responda sem
ser técnico.
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“Impasse é a fração de
tempo entre um grande
problema e uma brilhante
solução”
James Bond, o agente 007
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Pedro Mello
10.
O foco do pato, que anda, voa e
nada, mas não faz nada direito
Eu realmente me esforçava, mas o cliente continuava ali, com
expressão de alface, nada interessado no que eu dizia. Com
empolgação e pertinência, eu falava das virtudes de um programa
que minha empresa tinha desenvolvido. Com cara de sonso, ele
retrucava dizendo que já tinha um parecido. Com paciência, eu
tentava provar que o sistema dele era limitado, difícil de usar e caro
para manter. O cliente nem piscava os olhos. Foi aí que me ocorreu
dar uma de maluco: “se você optar por nosso produto, nós
diminuiremos o risco de você virar um pato, que voa, anda e nada,
mas não faz nenhum dos três direito”. O silêncio se espalhou pela
sala por alguns intermináveis segundos, até que ele deu uma
gargalhada. Ufa, finalmente fizemos contato e a cara de alface saiu
do seu rosto. Desse momento em diante, quando ele falava que o
programa dele era igual ao nosso, eu falava apenas “quack, quack”.
No fim, ele se convenceu.
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Pedro Mello
Por trás dessa história, existe uma lição muito importante para o
sucesso de qualquer negócio: foco. Isso mesmo, não adianta querer
nadar, andar e voar ao mesmo tempo, pois a tendência é não fazer
nenhum dos três direito. É preciso focar muito naquilo que você
realmente faz bem e gera dinheiro para sua empresa, para não correr
o risco de virar um pato. Principalmente enquanto o seu negócio
ainda for pequeno. Depois que ele estiver bem estabelecido no
mercado, você pode até considerar a diversificação como forma de
crescimento. Mas, até isso acontecer, o foco é seu principal aliado
para construir um negócio sólido.
Veja o caso da Microsoft, líder disparada no mercado de software e
uma das maiores e mais lucrativas empresas do mundo. Ela tem
algumas centenas de produtos, mas o foco principal da empresa está
em apenas duas linhas: Windows e Office. Juntos, eles representam
mais de 70% da receita total da empresa, além de dar o fôlego
financeiro necessário para investir em outros produtos, como os
consoles para jogos. Mas casos como o da Microsoft são raros. Além
disso, é importante lembrar que eles não chegaram onde estão do dia
para a noite. A Microsoft tem mais de 25 anos de vida, e toda sua
trajetória foi feita num ritmo de trabalho bem puxado.
Também me lembro de uma história sobre um encontro anual de
franqueados da Midas, uma das maiores redes especializadas na
troca de escapamentos de carros nos Estados Unidos. Lá pelas
tantas da reunião, um franqueado se levantou e perguntou quando
iriam começar a vender pneus na rede. O presidente respondeu com
outra pergunta... “qual é o percentual de moradores do seu bairro que
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utilizam seus serviços?”, e o franqueado respondeu “acredito que uns
15%”. Bem, como resposta ele teve que ouvir do presidente que
assim que ele chegasse aos 90%, ele o receberia com muito prazer
para discutirem mais sobre novas linhas de produtos. Em vez de ficar
sonhando com variedade, é muito melhor se concentrar na
especialidade da empresa e procurar conquistar o que falta do
mercado.
Quem ouve essas histórias até pensa que é fácil, mas a verdade é
que ter foco no negócio é algo bem difícil de fazer. A tentação para
virar um pato é muito grande, principalmente quando o negócio ainda
está engatinhando. Afinal, é preciso pagar as contas no final do mês
e se aparecer alguém procurando por algo que não é bem a sua
especialidade, mas que pagará bem pelo serviço e tirará sua conta
bancária do vermelho... aposto dez contra um que você pegará o
serviço. Faça isso algumas vezes e quack, quack... sua empresa já
perdeu o foco.
Outra armadilha para tirar o foco é quando as vendas de um novo
produto ou serviço parecem não decolar. Isso acontece sempre, a
não ser que você esteja vendendo água no deserto, cerveja gelada
no verão ou gasolina numa estrada sem outros postos. Simplesmente
porque qualquer negócio novo leva um certo tempo para ficar
conhecido e gerar boas vendas. Nesse meio tempo é comum ficar
meio desanimado e imaginar que, criando um outro produto ou
serviço, tudo estará resolvido. Mas ao fazer isso, você estará
voltando à estaca zero e provavelmente vai se decepcionar
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novamente. O melhor é continuar focado, até ver seu produto
emplacar.
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Pense nisso...
§
É melhor fazer uma coisa bem feita do que muitas malfeitas
§
Especialização e segmentação são tendências fortíssimas no
mercado, qualquer mercado
§
Diversificar só pode ser bom depois que seus produtos e serviços
principais estiverem bem estabelecidos no mercado
66
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“Pense grande, aja
pequeno”
Lição aprendida por dez entre dez bons
empreendedores
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11.
A grandeza dos pequenos
Luiz e Rubens eram amigos havia 20 anos, desde o tempo da
faculdade de engenharia. Depois de formados, tornaram-se
empreendedores no setor de construção civil. Com escritórios
próximos, almoçavam juntos uma vez por semana. Aproveitavam
esses momentos para falar de negócios, trocar experiências e buscar
maneiras de contornar a crise econômica que emperrava o país.
Falavam da dureza que era vender o almoço para pagar o jantar e,
assim, honrar os salários dos poucos funcionários no final do mês.
Mas aí a economia reaqueceu e houve quatro anos de grande
prosperidade. Quanto melhor iam os negócios, menos eles se viam.
Os almoços se tornaram mensais, depois trimestrais, por fim
semestrais. As diferenças de estilo foram ficando cada vez mais
evidentes. A empresa de Luiz não parava de contratar – em pouco
tempo, o escritório de 60 metros quadrados e móveis usados foi
trocado por um de 500 metros quadrados em uma região nobre de
São Paulo. O escritório do Rubens, por sua vez, continuava com o
mesmo tamanho, no mesmo lugar, apenas com seis funcionários a
mais.
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Pedro Mello
Quando se encontravam para o almoço, Luiz sempre chegava
atrasado, falando no celular com jeito de quem não tinha tempo para
nada. Gabava-se do crescimento da empresa, dos mais de 200
funcionários e de todos os contratos que havia fechado. Falava tanto
sobre seu sucesso que nunca dava brecha a Rubens fazer
comentários. Sempre que ele começava a contar algo, Luiz o cortava.
Estava mais interessado em falar do que em ouvir.
Com isso, os amigos se afastaram. Para Rubens, o Luiz tinha se
tornado arrogante, sempre metido a querer ser dono da verdade.
Para Luiz, o Rubens tinha ficado parado no tempo. “Com 12
funcionários espremidos num escritório minúsculo, você não vai
impressionar ninguém. Pergunte aos meus clientes como um
escritório grande faz a diferença”, dizia Luiz. “Você precisa parar de
pensar pequeno”, completava, sem dar espaço para Rubens se
justificar ou dar opinião e menos ainda para fazer críticas à postura
de Luiz.
Como estamos no Brasil, depois de quatro anos de prosperidade, o
país entrou em recessão. Ninguém vendia mais nada. Numa tarde
chuvosa, Luiz apareceu no escritório de Rubens sem avisar. Com
uma expressão preocupada, contou que, entre contratos cancelados
e calotes de clientes, não tinha dinheiro em caixa para pagar os
funcionários. “A verdade é que minha empresa está endividada em
mais de um milhão de reais, valor equivalente a todo patrimônio que
levei doze anos para construir. Já peguei dinheiro em meia dúzia de
bancos e não tenho mais crédito na praça nem para pagar o aluguel
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Pedro Mello
de 20.000 reais”, disse Luiz, cujo escritório milionário, com seu
altíssimo custo fixo, tornou-se um sugadouro de dinheiro.
Rubens olhou para seu amigo e disse que lhe emprestaria R$ 1
milhão ao invés dos 20.000 que Luiz fora lhe pedir – com duas
condições. A primeira era que o empréstimo seria garantido com 50%
da empresa. Se Luiz não conseguisse pagar o dinheiro de volta,
Rubens ficaria com metade da empresa. A segunda condição era um
compromisso por escrito de que Luiz reduziria todas as despesas
fixas para o mínimo possível e parasse de gastar com supérfluos.
Luiz não entendeu nada. Procurou Rubens para pedir R$ 20.000
emprestados, um dinheiro que nem tinha certeza de que Rubens
possuía, e agora estava diante de uma proposta de empréstimo de
R$ 1 milhão!
Luiz não agüentou e perguntou: “Mas, Rubens, como é que você tem
um milhão para me emprestar se sua empresa não cresceu nem a
décima parte do que a minha cresceu?”.
- Luiz, nesses anos todos de prosperidade nós trabalhamos muito.
Fechamos contratos grandes e mantivemos projetos com mais de
500 pessoas alocadas. Mas, em vez de contratar esse pessoal todo e
aumentar os custos com escritórios maiores, móveis e despesas
fixas, terceirizamos grande parte do trabalho. Mantive apenas a parte
estratégica e financeira aqui. Com isso nossos lucros foram
aumentando cada vez mais. Nesses quatro anos de vacas gordas
conseguimos guardar uns 10 milhões.
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Pedro Mello
- Mas, Rubens, eu nunca diria que você tem tanto dinheiro guardado.
Pensava que você ainda estava fazendo apenas aqueles trocados
que fazíamos até quatro anos atrás!
- Eu tentei te alertar, mas você não me ouvia.
Parece brincadeira, mas essa é uma história real. Vi acontecer e sou
amigo até hoje desses dois sujeitos. Também conheço muita gente
que tem uma história parecida para contar. Às vezes as empresas
são de áreas de atuação diferentes, mas a história é terrivelmente
semelhante. Isso ocorre porque ter um negócio de médio ou grande
porte no Brasil é algo bem difícil de gerenciar.
Em tempos de vacas gordas, é preciso investir em contratações,
computadores, mobiliário, espaço físico e treinamento para todo o
pessoal. Isso é feito para não deixar escapar nenhum dos pedidos
que estão caindo na mão. É tanta fartura que até parece milagre.
Todo mundo fica entusiasmado e sai investindo para não perder a
onda. Os salários ficam inflacionados, mas tudo bem, já que os
preços de venda também sobem junto. Nesses períodos, os
investimentos são altos e, quando chega a hora de ver quanto sobrou
no bolso, descobre-se que não foi muito. Afinal, apesar das vendas
serem bem maiores que o normal, investiu-se muito para entregar
aquilo que foi vendido.
Ai vem os tempos de vacas magras. Começa a corrida para cortar
custos, mandar gente embora, reduzir salários e por aí vai. Fechar
contratos nessa época é um sacrifício. E quando chega a hora de ver
quanto sobrou no bolso, descobre-se que também não sobrou quase
nada.
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Pedro Mello
Então você pensa... hummm, melhor voltar a ser funcionário de
empresa, assim não tenho que passar por esse estresse todo. Ganho
menos dinheiro, mas tenho mais segurança. Verdade, desde que
você não esteja empregado numa empresa que provavelmente vai
cortá-lo nas vacas magras. Ou pior, numa empresa que não agüente
a crise e feche as portas. O fato é que a economia mundial tem
mudado muito nos últimos anos. Os modelos que funcionavam antes
já não resolvem mais nada.
Veja a quantidade de empresas grandes e poderosas que está
acumulando prejuízos astronômicos há anos. Um grande número
delas está passando por sérias dificuldades, mesmo estando na
seleta lista das 500 maiores empresas do Brasil. Entram nesse bolo
desde companhias aéreas, grupos de mídia, fabricantes de veículos
multinacionais, até companhias de telefonia celular e fixa. Quem
imaginaria que esses pesos pesados fossem um dia desaprender a
fórmula de gerar lucro? Isso sem falar nas dívidas acumuladas em
empréstimos feitos para bancar novos investimentos. Muitos são
impagáveis.
Para não correr risco de ver sua empresa nesse grupo dos
desesperados, use a criatividade para manter os custos baixos. Uma
fórmula que tem se difundido com certa rapidez é ter empresas
menores, com custo fixo baixo e grande parte dos funcionários com
seus ganhos diretamente ligados ao resultado da empresa. Ou seja,
quando as vacas gordas chegam, todo mundo ganha mais. Quando
elas ficam magras, todo mundo ganha menos. Isso ajuda a manter a
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empresa funcionando e os funcionários empregados em vez de
demiti-los.
Nessas empresas, além de atrelar os salários de parte dos
funcionários à produtividade e resultado do negócio, algumas
posições são terceirizadas. Com isso, a empresa pode diminuir os
preços dos seus produtos e serviços quando há falta de contratos e
pedidos, já que seu custo fixo mensal é mais enxuto. Isso é bom
para todos. O cliente com caixa baixo pode continuar a comprar, a
empresa sobrevive com lucros menores no bolso dos sócios e os
colaboradores contratados também continuam trabalhando, apesar
de receberem menos pelos seus serviços.
Esse tipo de estrutura acaba forçando uma divisão mais equilibrada
do lucro entre o dono do negócio, seus funcionários e colaboradores.
Apesar dos ganhos menores, terá uma equipe mais coesa, fiel,
produtiva e feliz. Provavelmente você aprenderá que a diferença de
ganhos será compensada por mais qualidade de vida.
Pense nisso...
§
Mantenha a estrutura da sua empresa a mais enxuta possível e
terceirize tudo o que não for vital ao negócio.
§
Explore fórmulas de remuneração que aumente os ganhos
variáveis pelos resultados gerados e diminua o custo fixo.
§
Apresente de maneira simples, transparente e periódica a
evolução dos ganhos da empresa e, se possível, a contribuição
individual que cada funcionário teve para isso ter acontecido
73
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§
Pedro Mello
Não subestime a capacidade de pessoas mais simples e com
menor grau de educação entender planos de remuneração
variável e elevar seu comprometimento com os resultados da
empresa.
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“Problemas complexos têm
soluções simples, fáceis de
compreender, e
invariavelmente erradas”
Uma das leis de Murphy, aquele do “tudo
que pode dar errado dará”
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Pedro Mello
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Pedro Mello
12.
A sabedoria da quarta gaveta
João telefonou para Ana, sua melhor amiga. Ele inaugurara há pouco
uma empresa e queria desabafar sobre alguns problemas que já
estava tendo com o sócio. Como o assunto era longo e delicado, Ana
propôs uma conversa ao vivo. Encontraram-se, na mesma noite,
numa pizzaria ao lado do escritório dele. João falou, lamentou, falou,
lastimou, falou e reclamou por uma hora. Interpretando as
imprecações, Ana compreendeu que o núcleo do problema estava no
rumo que a empresa deveria tomar – João queria ir para um lado e o
sócio, para outro.
Ana era psicóloga e havia anos trabalhava como terapeuta. Era uma
especialista em conflitos, uma profissional experiente em administrar
problemas que pareciam insolúveis à ótica dos envolvidos. O caso do
João não era diferente. O sócio queria diversificar os negócios. João
queria se concentrar na venda de um produto que só eles tinham.
Esse produto, no entanto, não tinha glamour algum. Vendê-lo exigia
um trabalho braçal, também sem glamour nenhum.
No fundo, embora não confessassem, os dois achavam que suas
conquistas anteriores não combinavam com um produto tão modesto.
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Pedro Mello
A diferença é que o sócio sofria com isso, enquanto João encarava
esse início nada charmoso como uma das etapas inevitáveis do jogo,
sem a qual não se chega mais longe. Assim, João se contentava em
ter uma empresa de representação comercial. O sócio, por sua vez,
não queria nada menos do que uma grande consultoria. Mas, por
mais que o sócio tentasse conseguir clientes, a consultoria
continuava a zero. Enquanto isso, o produto sem glamour ia fazendo
sucesso no mercado e garantindo receita para a empresa. Em vez de
se deixar levar pelos ventos favoráveis, o sócio não se conformava
em ficar tirando pedidos. Se alguém telefonava querendo informações
sobre o produtinho, o sócio passava para João. Se havia um
compromisso para tentar ampliar as vendas, o sócio dizia que não
podia, que tinha de visitar grandes empresas para emplacar os
serviços de consultoria. Essa postura foi gerando atritos e
desavenças na sociedade. “Por que você não fica feliz em ganhar
dinheiro em vez de sonhar com o que está distante?”, perguntava
João. “Esse produtinho é uma coisa menor para minha experiência no
mercado”, rebatia o sócio.
E então, ali naquela pizzaria, João perguntou à Ana o que ele poderia
fazer para convencer o sócio, ou, ao menos, criar um clima de
harmonia na empresa.
– João, o seu problema é o mesmo problema das mesas dos
escritórios americanos da década de 50. Falta uma gaveta, a mais
importante delas.
– Mesa? Gaveta?
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Pedro Mello
– Sim! Naquela época, as mesas de escritório só tinham três gavetas.
Em um estudo de perfil psicológico de funcionários de grandes
empresas, feito por uma renomada universidade americana, foi
descoberto que as pessoas usavam as gavetas de maneira idêntica,
independente do escritório que fosse pesquisado. Na prática, o
relatório final da pesquisa apontava que na primeira gaveta, os
funcionários guardavam objetos pessoais, como escova e pasta de
dente. Ali também ficavam alguns objetos úteis ao trabalho, como
papel carbono, mata-borrão e tinta para caneta.
– E daí? Que isso tem a ver com meus problemas?, perguntou João.
– Calma, estou chegando lá, disse Ana. As gavetas também servem
para guardar os problemas do trabalho que precisam ser resolvidos.
Assim, as pessoas, de maneira geral, acabam separando seus
problemas de maneira parecida. Na primeira gaveta, junto com as
escovas e clipes, elas sempre guardam os problemas urgentes,
pendências que precisam ser resolvidas com prioridade máxima na
primeira hora do dia seguinte.
– E a segunda?...
– Aqui ficam os problemas que precisam de soluções rápidas, mas
que podem esperar por uns dois ou três dias. Já na terceira gaveta,
são colocados os probleminhas, aqueles casos que podem ser
adiados sem criar maiores confusões.
- E qual gaveta que está funcionando?
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Pedro Mello
- Então João, ai é que descobriram um dos maiores erros de design
dos anos 50. Faltava a quarta gaveta, aquela que deveria ser usada
sempre para colocar os problemas que só tempo pode resolver.
Ana parou por alguns instantes para deixar a história entrar na
cabeça do amigo e então continuou:
– João, esses problemas de quarta gaveta não tem conserto rápido.
Por mais que você busque uma solução imediata, só vai gastar
energia à toa e ficar frustrado. Então, meu amigo, esse problema que
você tem com seu sócio, o lugar dele é na quarta gaveta. Veja, ele
está tão empenhado em fazer a consultoria decolar que nada vai
fazê-lo mudar de idéia agora. É igual criança. Só quando ele
perceber, por sua própria experiência, que não vai dar certo, é que
vai mudar de idéia. Antes disso, continuará insistindo sem ouvir
ninguém.
– Mas até lá eu faço o quê?
– Confie e aguarde. Se a consultoria der certo, você também ganha.
Se não der em nada, ele vai passar a dar importância ao produtinho,
como vocês dizem. Só nesse ponto é que seu sócio vai caminhar na
mesma estrada que você.
João seguiu o conselho de sua amiga e colocou o problema numa
quarta gaveta imaginária. Deixou seu sócio teimar mais um tempo
tentando vender serviços de consultoria. Para não arriscar o negócio,
colocou um prazo de seis meses até sua paciência estourar. Mas,
dois meses antes do final do prazo, o sócio marcou uma reunião com
ele.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
– João, disse o sócio, acho que você tinha razão. Faz um ano que as
propostas da consultoria dão em nada. Nesse tempo todo, você está
camelando com o produtinho e é ele que tem sustentado minhas
tentativas. Acho que já deu. A partir de agora, vou jogar mais no seu
time.
E assim eles sentaram para definir a estratégia de vendas, materiais
de apresentação e posicionamento do produto. Afinados, trabalharam
duro e venderam cada vez mais. Os meses foram passando e a cada
dia o sentimento de que a empresa estava no rumo certo aumentava.
Depois de mais um ano de trabalho, as vendas haviam triplicado. Um
dia eles acabaram percebendo que apesar do produto não ter
glamour algum, eles tinham desenvolvido um grande orgulho, talvez
até uma paixão, pela empresa – inclusive porque tinham conseguido
colocar em prática todos os conceitos que tentaram vender em suas
propostas de consultoria, mas ninguém quis comprar. Com isso, em
vez de gerar resultados para os outros, viram o lucro aumentar em
seus próprios bolsos. E hoje o sócio, em vez de ser consultor, ganha
um dinheirão fazendo palestras nas quais conta como conseguiu
fazer tanta sucesso com um produtinho sem graça.
Pense nisso...
§
Não adianta forçar, alguns problemas só se resolvem com o
tempo.
§
Ter paciência não é aguardar de braços cruzados. Faça a sua
parte, sempre, da melhor maneira possível. Os resultados que
você obtêm podem ser seus melhores argumentos para mudar
uma situação.
81
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
§
Pedro Mello
O orgulho e a vaidade podem ser inimigos dos empreendedores.
Trabalhos braçais fazem parte de inícios. E muitas grandes
empresas começaram com uma portinha e o dono atrás do
balcão.
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“O segredo não é correr
atrás das borboletas, mas
cuidar do jardim para que e
elas venham até você”
Mario Quintana, poeta gaúcho
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
13.
Planejamento é um sanduíche de bom
senso, com uma fatia de democracia
embaixo e outra de liderança em
cima
Da dona-de-casa que reforça o orçamento fazendo brigadeiro para
festas ao empresário mais tarimbado, todo mundo está cansado de
ouvir que planejamento é fundamental para o sucesso de um
negócio. De maneira geral, entenda-se planejamento como a
definição de metas estratégicas mensais de faturamento, vendas,
despesas e lucro. A maioria das pessoas, no entanto, considera esse
exercício de projeção de resultados uma total chatice. Também há
muitos gerentes que não confessam mas, no fundo, acham que o
planejamento é um tipo de primo rico da futurologia - uma ginástica
inócua e inútil, na qual os números nunca batem.
Afinal, o faturamento sempre fica abaixo das metas e as despesas
bem acima – ainda mais numa economia como a brasileira, cheia de
altos e baixos, mais baixos que altos. Como o papel aceita qualquer
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
coisa, acertar as metas estipuladas acaba sendo realmente uma
tarefa tão difícil quanto ganhar na loteria.
Tenho um amigo, administrador competente, que defende a tese de
que “planejar é errar, mas cada vez menos”. Explico. No primeiro ano
de uma empresa, por mais que o dono projete resultados
conservadores mês a mês, inevitavelmente comprovará, no final do
ano, que errou feio todas as contas. No segundo ano de atividade,
com um pouco mais de experiência, já errará menos. Ao cabo de
quatro ou cinco anos, a probabilidade é de que as projeções iniciais
sejam semelhantes ao resultado. Nunca, absolutamente nunca - a
não ser em caso de um milagre espantoso -, os números serão
iguais, apenas próximos.
Seja como for, apesar disso, o fato é que planejar é imprescindível.
Indo além dos números, o planejamento embute dois efeitos
colaterais benéficos e importantíssimos. O primeiro é o
comprometimento das pessoas que trabalham na empresa. Mostrar
aonde você quer chegar gera envolvimento. Explicar porque e como
chegarão juntos lá gera confiança. O bom planejamento de metas
implica discussões em grupo, troca de opiniões, sugestões, idéias e
experiências. É como diz o sábio chinês: “na conversa entre o
ignorante e o sábio, quem aprende mais é o sábio”. Ou seja, os
maiores empresários sabem que funcionários humildes podem
contribuir com idéias e sugestões inovadoras. Por isso, os
negociantes de sucesso nunca deixam de conversar com sua equipe,
clientes e fornecedores. É com essas conversas que eles descobrem
alternativas para manter o negócio próspero, sólido e lucrativo. Isso já
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está mais do que provado: se todas as pessoas participam do destino
da empresa, sentem-se importantes e, por isso, lutam por ela.
Já aqueles empreendedores que decidem tudo sozinhos e apenas
mandam fazer só conseguem colher isolamento. A falta de
envolvimento gera um rebanho de funcionários que só dizem “sim,
senhor” e fazem tudo de má vontade, loucos para o dia terminar e
eles voltarem para casa. Empresas assim não vão para a frente.
O segundo ponto colateral do planejamento está relacionado à
eficácia. Envolver todo mundo não significa necessariamente
conduzir todos para uma meta. Uma coisa é mostrar a direção, outra
é apontar o caminho. Para ter sucesso, é preciso somar eficiência à
comprometimento. Quem descobre essa mágica cedo normalmente
consegue levar seu negócio muito mais rápido ao sucesso - além de
precisar de muito menos esforço para obter resultados.
Por fim, tenha em mente que democratizar é importante, sim, mas
mesmo a democracia tem limite. A maioria das decisões sobre os
rumos da empresa cabe apenas a uma única pessoa: o dono do
negócio. Ele deve ouvir o máximo de pessoas que puder, mas, no
final das contas, ele é o líder. Esse negócio de levar em conta
opiniões e sugestões com o intuito de dividir responsabilidades é
muito bonito, mas, na prática, o único responsável continua sendo o
dono do negócio. É o nome dele que está no contrato social, sendo
vigiado pela Receita Federal e cobrado pelos fornecedores. Até por
isso ele tem o dever de planejar o melhor que puder, tendo sempre
em mente que o bom planejamento é um sanduíche de bom senso,
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com uma fatia de democracia embaixo e outra fatia de liderança em
cima.
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Pense nisso...
§
Planejamento não é só plano de metas para a diretoria. É
também um recurso para obter comprometimento, engajamento e
resultados da equipe
§
Planejamento não é futurologia. É um exercício de tentativa e
erro que é aprimorado com o passar dos anos
§
Há um diferença enorme entre o desejável e o possível. Cada vez
mais as empresas traçam planos de metas inatingíveis. Ao
contrário do se pensa, isso não estimula ninguém
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“Uma coisa é uma coisa e
outra coisa é outra coisa”
Ditado popular
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14.
Prejuízo pode não matar, finanças
descontroladas sim
O índice de mortalidade de empresas iniciantes é alto. Dizem que
nove em cada dez negócios fecham as portas antes dos primeiros
cinco anos de vida. Pode ser verdade, mas, ao contrário do que
dizem as estatísticas, não acredito que todos apenas quebrem. É
bem provável que, nessa conta, sejam incluídas pessoas que não
eram empreendedores de verdade – apenas estavam
empreendedores por falta de opção. Na primeira chance, voltaram a
trabalhar numa empresa com carteira assinada.
Há outros que não gostaram da atividade que escolheram,
enxergaram outra oportunidade e fecharam uma empresa para abrir
outra. Outros, pressionados por uma carga tributária massacrante,
encerram a empresa no papel mas continuam trabalhando, só que na
informalidade. É claro que má administração, escolha errada de
sócios, descontrole das finanças, produtos e serviços ruins e mercado
desfavorável, numa lista que ainda poderia se estender por muitas e
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muitas linhas, destroem negócios. O que quero dizer é que talvez não
sejam tantos quanto dizem por aí.
De todos os itens que podem afundar um negócio – pressupondo que
o empreendedor gosta do que faz e aposta em si e no seu negócio –,
o mais mortal, aquele que deveria tirar seu sono, é o lado financeiro.
Você pode ter um produto ótimo, admiradores fanáticos, elogios dos
clientes, mas se as contas não fecharem você também tem um
problemão. Nesse caso, por menos que você goste da idéia, sua
vaquinha começou a se encaminhar para o brejo. Você acha que eu
estou falando de prejuízo, não é? Pois não estou.
Ter prejuízo não significa necessariamente que a vaca atolou – mas
fluxo de caixa mal administrado, sim, quer dizer. Esse é o verdadeiro
atoleiro, que leva mais empresas à bancarrota do que os prejuízos.
Fluxo de caixa não é coisa do outro mundo. É um retrato, uma
fotografia de um momento da empresa – e não é sempre que
pessoas, ou empresas, saem bem na foto. Tem dia em que fica feio
mesmo, com o cabelo espetado, ou cara de sono. Faz parte do jogo.
O que não pode, nesse dia ruim, é botar peruca e dentadura falsa,
para tentar aparentar algo diferente da realidade. Há empresários que
maquilam o fluxo de caixa para aparentar o que a empresa não é.
Outros não fazem por mal – ou se distraem ou não conseguem se
entender com números.
Numa foto fiel, os valores que sua empresa tem a receber e a pagar
em cada dia do mês, pelos próximos três ou seis meses, devem
aparecer bem nítidos. Se estiver sempre faltando dinheiro no caixa, o
negócio pode estar no caminho errado. Mas muitos se enganam ao
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Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
pensar que, tendo lucro na venda de um produto, o negócio está
certamente indo bem.
Tome por exemplo uma empresa vendeu por R$ 1.000, em cinco
parcelas iguais de R$ 200, um produto que lhe custou R$ 500, valor
faturado para ser pago em 14 dias. Nessa situação, a empresa teve
uma margem de lucro excepcional de 50%. Em compensação, tem
apenas 200 reais da primeira parcela recebida do cliente em caixa,
insuficiente para pagar os 500 reais que a empresa precisará pagar
em 14 dias. Ou seja, seu fluxo de caixa ficará negativo em 300 reais
no dia em que o pagamento do fornecedor tiver que ser feito. Nesse
caso, se o seu fluxo de caixa não prepará-lo para isso, você corre o
risco de entrar para a lista de empresas que fecham do pior jeito –
com lucro, mas sem disponibilidade de caixa. Para evitar esse tipo de
problema, é importante trabalhar com prazos de faturamento e
recebimento semelhantes. Dessa maneira sua empresa não precisará
de grandes volumes de capital para continuar girando as vendas
faturadas para os clientes. Porém, se você continuar a vender em
cinco parcelas e comprar em 14 dias, precisará de uma montanha de
dinheiro para financiar o prazo que está dando aos seus clientes. Se
não tiver esse dinheiro, você verá a vaca ir pro brejo.
A maior parte das pessoas pensa que o prejuízo é o maior
responsável pela morte das empresas. Mas a verdade é que até uma
empresa que tenha constantes prejuízos ainda pode sobreviver por
muito tempo, desde que tenha uma excelente administração do seu
fluxo de caixa. Por outro lado, uma empresa que tem constantes
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lucros pode fechar suas portas rapidamente se administrar
porcamente seu fluxo de caixa.
Outra dica importante é saber usar o dinheiro certo para cada tipo de
investimento. Resumindo, pegue dinheiro de longo prazo para
investimentos de longo prazo e dinheiro de curto prazo para
investimentos de curto prazo. Essa regrinha simples também
atrapalha bem os negócios quando é ignorada.
Na prática, se você precisar de capital para investir no negócio e ele
vai demorar a dar retorno (longo prazo), você precisa de dinheiro com
custo de juros barato (empréstimo também de longo prazo). Algo
como construir uma nova fábrica que leva 12 meses para ficar pronta
com dinheiro do BNDES e carência de um ano para o pagamento da
primeira parcela. Agora, se você precisa de dinheiro para tapar o
buraco do caixa da empresa por alguns dias ou semanas (curto
prazo), você pode usar dinheiro para capital giro no seu banco (curto
prazo), que tem juros mais altos.
Para entender como essa regrinha pode acabar com a sua empresa,
experimente construir a tal fábrica com empréstimo de capital de giro
do banco. É quase certeza o empréstimo se tornará uma dívida
impagável.
Por isso, se você acha não sabe direito quanto tem para pagar e
receber nos próximos dois meses ou três meses, revise sua planilha
de receitas e despesas assim que acabar de ler esse capítulo e sente
com calma para trabalhar no seu fluxo de caixa. Senão, sua empresa
corre o risco de se auto-destruir em dez segundos, nove, oito...
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Pense nisso...
§
É mais fácil uma empresa quebrar por falta de dinheiro em caixa
do que por falta de lucro.
§
Utilize financiamento de longo prazo (juros mais baixos) para
investimento com retorno lento e financiamento de curto prazo
(juros mais altos) apenas para cobrir os buracos do caixa no dia a
dia. Nunca confunda os dois
§
Abilio Diniz, presidente do conselho de administração do Pão de
Açúcar, sempre repete: “custo é como unha. Precisa cortar
sempre”. Sem o fluxo de caixa, você não encontra o alicate e
talvez nem saiba direito onde está a unha
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“Sabedoria não é saber
fazer. É saber fazer do
melhor jeito”
Provérbio chinês
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15.
Pausa para meditação
Com pouco mais de 60 anos, James era o melhor lenhador do
Canadá. Um dia, um rapaz de 18 anos, com todo o vigor e a
imprevidência da idade, bateu à sua porta e lhe disse: "Ouvi dizer que
você é o melhor lenhador da região. Eu quero ser o melhor lenhador
do mundo. Trabalho de graça se me ensinar tudo o que sabe". James
aceitou e passou os seis meses seguintes com o rapaz a tiracolo. No
sétimo mês, ao sair para o trabalho, o veterano encontrou o aprendiz
à sua espera.
- Estou me despedindo. Muito obrigado, mas você já me ensinou tudo
o que eu precisava saber, disse o jovem.
James pediu que ele ficasse, que ainda havia muito a aprender. O
rapaz riu:
- Você só diz isso porque tem medo de que eu seja melhor do que
você. Mas eu já sou. Para provar, proponho um desafio: vamos ver
quem derruba primeiro cinqüenta árvores, provocou o rapaz.
No dia seguinte, ao raiar do sol, os dois começaram a disputa. Com
uma hora de competição, o rapaz derrubava três árvores para cada
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duas de James. Uma hora depois, enquanto continuava golpeando
troncos sem trégua, o jovem notou que o grande lenhador tinha
parado para descansar. "Vai ser moleza", pensou ele.
Horas depois, quando faltavam apenas quatro árvores para o rapaz
terminar, ele olhou novamente para o lado e tomou um susto ao ver
que James já tinha derrubado suas 50 árvores.
- Agora eu entendo por que você é o melhor lenhador da região. Mas
eu não consigo ainda entender o que aconteceu. Como é que você
conseguiu chegar na minha frente?
Calmamente James respondeu:
- Meu filho, toda vez que eu parava para descansar, aproveitava para
afiar o machado. Você, por sua vez, golpeava sem parar com um
machado cada vez mais sem fio.
Muitas vezes, empreendedores, sobretudo os que criam negócios
bem-sucedidos, agem como o rapaz. O sucesso dá segurança,
aumenta a auto-estima e faz bem para o ego. Mas também pode
atrapalhar um pouco sua visão. Sem perceber isso, fica fácil cair na
rotina de fazer todo dia a mesma coisa. Passam-se anos e o negócio
continua lá, do mesmo jeitinho. E o dono sem parar de trabalhar um
dia sequer para olhar o que a concorrência está fazendo. Dá para
entender. Como o negócio deu certo, não há por que mexer em time
que está ganhando. E com o passar do tempo as vendas vão
minguando, até que um dia não resta outra coisa senão fechar as
portas.
E fica a pergunta: mas que diabos aconteceu?
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Para fazer um negócio continuar a dar certo, é preciso mais do que a
ralação e o suor que foram tão importantes nos primeiros anos de
vida da empresa. É preciso começar também a "afiar o seu
machado". Ou seja, se preparar cada vez mais, além de continuar a
executar, que foi o que você mais fez até agora. Para isso acontecer,
é importante de tempos em tempos dar uma parada para olhar seu
negócio do lado de fora. Assim você consegue avaliar como ele está
posicionado, como a concorrência está crescendo, quais são as
novidades do setor, como os seus funcionários se sentem na
empresa e muitas outras coisas importantes que o dia-a-dia faz você
esquecer. Quer ver?
Qual foi a ultima vez que você foi a uma feira ou convenção, ou fez
um treinamento de gestão de negócios ou visitou um concorrente
para ver como ele estava ou até um fornecedor para estreitar sua
relação com ele? Se a resposta for maior do que seis meses,
considere parar um pouquinho para descansar e aproveite para afiar
o seu machado.
Pense nisso...
§
Depois que seu negócio estiver mais estável, separe um pouco
de tempo para avaliar, planejar, aperfeiçoar e depois voltar a
executar novamente.
§
Enquanto você toca seu negócio todos os dias da mesma
maneira, seu concorrente pensa numa nova forma de fazer
melhor tudo o aquilo que você faz.
99
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
§
Pedro Mello
O mundo enxerga virtudes na pessoa que rala no trabalho 16
horas por dia. Quantidade não é qualidade. Se não parar para
pensar onde está indo, tem boas chances de chegar aonde não
quer.
“Idéias para criar serviços e
atender melhor são
inesgotáveis. Basta prestar
atenção no cliente”
Chieko Aoki, presidente da rede de hotéis
Blue Tree
100
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
101
Pedro Mello
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
16.
O quintal do concorrente não é mais
verde do que o seu
Episódio 1: anos atrás, construí minha primeira casa. O terreno era
uma pirambeira só. Mas, tratando-se de minha primeira grande
aquisição, aos meus olhos era uma planície perfeita. Como não tinha
muito dinheiro, decidi tocar a obra sem engenheiro. Minha equipe se
resumia a Luís, pedreiro que era irmão do zelador do condomínio, e
seus dois ajudantes. Num sábado chuvoso, eu e Luís nos
encontramos para marcar a fundação da casa. Acreditando que
estava diante de um grande especialista em construção civil (uma
suposição compreensível; afinal, quem seria louco de comandar uma
obra sem entender bulhufas?), Luís perguntou: "Quantas sapatas nós
vamos colocar nessa casa?".
Até aquele momento, sapata, para mim, era mulher que gostava de
mulher. Mas, se assumisse isso, ficaria desmoralizado. Olhei para ele
com cara séria e expressão compenetrada, como se fizesse
sofisticados cálculos mentais. Aí, imitando um mestre que julga o
aprendiz, perguntei: "Quantas sapatas você colocaria?". E assim ele
102
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
começou a falar e eu comecei a entender o que era sapata em
fundação de obra. Dois anos mais tarde, a casa estava pronta.
Episódio 2: certa vez, eu investi numa empresa especializada na
prestação de um serviço diferente. Em teoria, havia um só competidor
no mercado – mas, a bem da verdade, o que ele fazia não era
exatamente o que eu fazia. Mas ele soube que ganharia um rival e
ficou apavorado. Na sua cabeça, nós poderíamos acabar com sua
empresa. Para se defender, um dia me telefonou e propôs: "O que
você pensa de fundirmos as duas empresas numa só? Em vez de
rivais, seremos sócios". Marcamos uma reunião. Ele insistiu que
fosse no nosso escritório – imagino que ficou com receio de que, se a
reunião fosse na empresa dele, fôssemos roubar algum segredo.
Sentamos na sala e o cara começou a falar sem parar. Falou, por
exemplo, de todos os problemas do mercado e do dinheiro que
gastara com coisas desnecessárias. Depois do discurso, perguntei se
ele precisava de investimento no seu negócio. Disse que seria bom,
mas não se eu fosse o investidor, pois não queria abrir os números
da empresa para mim. Simplesmente surrealista. Tempos depois,
soube que, após essa reunião, o sujeito resolveu mudar radicalmente
a estratégia da sua empresa para não competir conosco.
Episódio 3: certo dia, o sócio de um negócio que estávamos
preparando há quase um ano para lançar me ligou desesperado. Ele
tinha acabado de ler uma matéria no jornal que falava sobre uma
nova empresa que tinha acabado de abrir e coincidentemente
oferecia o mesmo tipo de serviço inovador que iríamos lançar em
breve. Foi um balde de água fria. Ele se sentiu muito mal e, para
103
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
piorar, entrou na Internet para pegar mais dados da empresa. Pronto,
descobriu que era uma sociedade anônima, uma S.A. Para ele isso
era nossa morte. Ainda lembro de suas palavras: “Eles são uma
sociedade anônima e devem ter milhões para investir no negócio.
Aqui no jornal diz que só no sistema online eles colocaram um milhão
de dólares. Nós estamos fritos!”. E eu do outro lado da linha me limitei
a dizer – “Cara, se eles gastaram tudo isso, começaram mal. Devem
estar gastando um dinheirão todo mês para manter a infra-estrutura
de um escritório que nem sequer tem clientes. Quem conhece um
pouco de sistemas sabe que não se deve investir tanto numa primeira
versão de um programa, pois assim que ele estiver pronto e os
clientes começarem a usá-lo, aparecerá uma lista infindável de
alterações necessárias para ele funcionar bem. Ou seja, mais
dinheiro”.
O que esses três episódios têm em comum? Eles revelam o péssimo
hábito que as pessoas – prestadores de serviços e empreendedores,
sobretudo – têm de imaginar que a grama do vizinho é sempre mais
verde. No primeiro caso, Luís sabia muito mais do que eu sobre
construção civil (aliás, eu não sabia rigorosamente nadica de nada).
Mas, como eu tinha mais estudo, mais dinheiro e mais pose do que
ele, Luís achou que eu sabia mais do que ele.
No segundo, o cidadão tinha uma empresa legal, mas, ao imaginar
que ganharia um rival com mais experiência e talento (sei lá de onde
ele tirou isso), amedrontou-se a ponto de praticamente implodir seu
negócio original.
104
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
No terceiro, três meses após o lançamento do tal programa de um
milhão de dólares, o tal concorrente começou a oferecer seus
serviços numa promoção onde os primeiros seis meses eram grátis,
tamanha a falta de clientes. Um ano e meio depois essa empresa
mudou de ramo.
Poucos erros são mais desastrosos do que alimentar essa visão torta
do jardim do vizinho. Na hora em que sua empresa passa por
dificuldades, chega a ser natural pensar que o concorrente é melhor
do que você. Mas vá passar uma semana na empresa dele para ver
que o jardim, que antes parecia tão verdejante, também tem ervas
daninhas e bichos estranhos – talvez mais do que o seu. Além disso,
tenha em mente que, para o seu rival, o vizinho é você – logo, a
grama mais verde é a sua. Por isso, em vez de gastar tempo
imaginando coisas, tire proveito da situação. Se o outro acha que seu
jardim é mais verde, sorte sua. Acredite nisso você também e mande
ver.
Pense nisso...
§
Antes de conhecer a fundo seu negócio, 99% das pessoas
pensarão que ele é maior, melhor e mais organizado do que
realmente é.
§
As aparências enganam. Mas o escritor Oscar Wilde costumava
dizer que só as pessoas fúteis não julgam pela aparência.
§
Quanto menos informação você der, mais fantasias vão criar a
seu respeito.
105
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“A maneira mais fácil de
ganhar dinheiro é deixar de
perder”
Rolim Amaro, fundador da TAM
106
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
17.
O exercício das duas colunas
Num domingo de manhã, o ex-executivo Paulo Borges foi comprar o
jornal na banca da esquina. Chegando lá, a fotografia da capa de
uma revista de negócios chamou sua atenção. Ela mostrava um
homem sorridente, com ar vitorioso, vestindo um terno azul-marinho.
Sob a foto, os dizeres: “Mauro Borges Leite, dono da empresa
agrícola Plantasol, o empreendedor do ano”.
- Mas não pode ser!, exclamou Paulo. Esse é o Maurinho, o meu
primo caipira!
Fazia uns bons 40 anos que Paulo não via o primo do campo. Na
infância pobre, os dois brincavam juntos. Na adolescência, em busca
de uma vida melhor, os pais de Paulo mudaram para a capital. Para
reforçar o orçamento doméstico, Paulinho começou a trabalhar cedo
como office-boy. De dia, dava duro no batente e à noite ia para a
escola. Estudioso, entrou numa das melhores faculdades de
administração.
Com o passar dos anos, progrediu, tornou-se gerente, supervisor e
diretor. Aos 55 anos, quando achava que se tornaria presidente, ou
107
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
pelo menos vice, recebeu o cartão vermelho. “Estamos atravessando
uma crise, com uma queda brutal nas vendas”, justificou-lhe então o
presidente. “Não temos caixa para pagar seu salário e benefícios. Me
perdoe mas os acionistas não me deram alternativa”.
Fazia oito meses que isso tinha acontecido. Sem encontrar nova
colocação no mercado, para manter o mesmo padrão de vida, Paulo
já gastara boa parte de suas reservas financeiras, o que deixava seu
moral baixo. E agora parado ali, na banca de jornal, mais um golpe:
Paulo, que sempre se considerara o mais bem sucedido da família,
descobria que o primo caipira o havia superado em muito. De
repente, a ficha caiu. “Peraí”, pensou Paulo, “está aqui a minha
oportunidade de conseguir de volta um bom emprego”.
Na segunda-feira de manhã, Paulo ligou para o primo. Foi
recepcionado com entusiasmo e as eternas frases de quem não se vê
há décadas: “que prazer te ouvir, quanto tempo, como é que vai?,
aparece aqui para um café”. Paulo foi. Depois de uma sessão de
confraternizações, o primo Maurinho contou como, depois de muitas
adversidades, um dia, o dono de um laticínio simpatizou com ele e lhe
deu uma oportunidade. Começou como representante de vendas, foi
subindo na empresa, tornou-se sócio, expandiu os negócios, apostou
em exportação, investiu no varejo, comprou a parte do sócio e hoje
comanda um das principais empresas agrícolas do país. Ao fim do
relato, quis saber:
- E você, primo Paulo, como está?
- Preciso de uma oportunidade, disse ele. Veja, não quero favor. Se
você tiver uma vaga, peço apenas que me inclua na lista de
108
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
candidatos. Quero participar das entrevistas do processo de seleção
por meus próprios méritos, não por ser seu primo.
Por sorte, havia uma vaga na diretoria de vendas, a área em que
Paulo se especializara em sua carreira executiva. E assim, uma
semana depois, Paulo foi chamado para uma entrevista com o vicepresidente de recursos humanos. O vice adorou a desenvoltura do
candidato e sua facilidade de comunicação. Impressionou-se com a
visão de Paulo, que dissera que a empresa deveria investir mais em
treinamento para os funcionários, criar workshops para entrosar as
equipes e, quem sabe, montar uma academia de ginástica para
combater o estresse e melhorar a qualidade vida de todos. “Paulo é o
homem perfeito para o que precisamos”, sentenciou o vice de
recursos humanos em seu relatório. E acrescentou: “P.S.: mas tem
aquilo lá”.
Na segunda entrevista, com o vice de marketing, Paulo brilhou ainda
mais. Sugeriu que a empresa deveria mudar embalagens, para tornálas mais coloridas e atraentes ao público. Falou também em
alternativas de merchandising, em marketing institucional e de
relacionamento. “Há tempos não via alguém tão preparado”, escreveu
o vice em seu relatório. E também acrescentou: “Mas tem aquilo lá”.
Chegou então a entrevista final, com o primo-presidente da
companhia. Nela, Paulo disse tudo o que pensava para melhorar a
empresa. Afirmou que deveriam ter um escritório mais moderno e
salas de reunião suntuosas para receber fornecedores e clientes.
Também deveriam investir num novo sistema de gestão e abrir
escritórios regionais, para, nos próximos cinco anos, obter também a
109
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
liderança em outros estados. Paulo falou por uma hora. Ao final, o
presidente Mauro falou:
- Paulo, meu primo, devo dizer que você impressionou a todos aqui.
Suas sugestões são ótimas, sejam as que você deu a mim ou aos
vice-presidentes. Não tenho dúvidas de que a empresa ganharia se
elas fossem implementadas. Mas há algo que você precisa levar em
conta. Nossa capacidade financeira não comporta essas suas ótimas
idéias. Além disso, temos aqui um outro estilo de gestão. Ao contrário
de muitas empresas, nós não deixamos um mal cultural que
apelidamos de “aquilo lá” se desenvolver em nosso negócio: a mania
de ter idéias que gerem despesa ao invés de idéias que geram
receita.
Nesse momento, Mauro pegou uma folha de papel sulfite e, com um
lápis, fez um risco no meio da página, separando-a em duas colunas.
Na coluna da esquerda, escreveu cinco sugestões de Paulo. Em
seguida, falou:
- Essas são as suas cinco melhores idéias. Se você reparar, todas
elas pressupõem que precisaremos gastar dinheiro, mas não
necessariamente veremos esse investimento retornar. Peço, então,
que, na coluna da direita, que até agora está vazia, você dê
sugestões que aumentem nosso faturamento sem precisarmos gastar
nada. Leve o exercício para casa. Quando você tiver preenchido a
coluna da direita, com boas sugestões para aumentarmos nossas
receitas, volte para continuarmos a nossa conversa.
Pelo que sabemos, até o dia que esse livro foi para a gráfica Paulo
ainda não tinha retornado para o seu primo com as tais sugestões.
110
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
É provável que na sua empresa também haja pessoas, do estagiário
ao sócio, passando pelos gerentes e diretores, que tenham um
bocado de boas idéias para fazer sua empresa crescer. Algumas
delas, decerto, valem a pena. Muitos investimentos são realmente
imprescindíveis para aumentar o retorno. Se ninguém conhece seu
produto, como vão comprá-lo? Se a equipe é minúscula, como fazer
tudo o que é necessário? Se não tem um bom site na Internet, pode
estar perdendo dinheiro. Essas coisas geralmente não se resolvem
sem investimento, mesmo que seja pouco.
Mas também é fato que a maioria das pessoas aloca seu talento e
criatividade em idéias que geram mais despesas que resultados.
Mesmo numa época de concorrência absurda, a mentalidade do
presidente Maurinho ainda é uma raridade em muitas empresas –
quando deveria ser lei. Por isso, se você esta pensando em convidar
alguém para ser sócio, ou avaliando a possibilidade contratar alguém,
faça o exercício das duas colunas. Na coluna da esquerda, peça para
listarem idéias que geram despesas. Na da direita, aquelas que
aumentam o faturamento sem precisar de novos gastos. É uma
providência simples, que pode avaliar melhor as pessoas à sua
frente, poupar muita dor de cabeça e garantir um futuro melhor para o
seu negócio.
Pense nisso...
§
É mais fácil gostar de quem fala coisas que gostaríamos de ouvir
do que aqueles que nos mostram a realidade.
111
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
§
Pedro Mello
Encontrar maneiras de gastar dinheiro é bem mais simples do
que encontrar formas de ganhá-lo, principalmente quando ele não
é seu.
§
Normalmente o ditado de “cão que late muito não morde" se
aplica também às pessoas que prometem muito, mas que
dificilmente cumprem suas promessas.
112
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“O homem que não sabe
sorrir não deve nunca abrir
uma loja”
provérbio árabe
113
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
18.
Jamais frustre a expectativa do cliente
O jornalista Paulo Francis, morto em 1997, afirmava que a burrice é
um fator histórico subestimado. Para ele, poucos enxergavam o papel
decisivo que as decisões burras tiveram, por exemplo, em inúmeros
atos de governo e planos econômicos. No varejo, o mais subestimado
dos fatores é aquele que diz respeito à expectativa dos clientes.
Poucos empreendedores levam em conta que tudo o que está em
sua loja – a decoração, a apresentação das prateleiras, a disposição
dos produtos, a aparência dos vendedores – gera uma expectativa na
mente do cliente.
Durante 40 anos, Saul comandou sua loja de tecidos e armarinhos no
Bom Retiro, bairro tradicional de São Paulo. Foram 40 anos de filas.
Mas, agora, aos 80 anos, Saul queria descansar, viajar e conhecer o
mundo. Para isso, deixou a loja nas mãos de Saulzinho, seu filho
mais velho, formado em administração de empresas com pósgraduação em varejo.
A primeira providência de Saulzinho foi modernizar a loja. Livrou-se
das prateleiras caindo aos pedaços, da iluminação precária, do
114
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
balcão do tempo do onça e dos vendedores sem refinamento. Em
seguida, fez vitrines modernas, prateleiras futurísticas, balcão de
mármore importado, instalou ar-condicionado central, mudou o
logotipo da empresa e desenhou uniformes para todos os
funcionários. Resultado: semanas depois da inauguração da nova loja
de Saulzinho, as vendas desabaram. Os clientes passavam na frente
da loja, olhavam a vitrine e não entravam.
Quando o velho Saul voltou de suas férias, chorou de desgosto ao
ver a situação do seu negócio. Reassumiu a loja, desfez a decoração
moderna de Saulzinho e recomprou as prateleiras empoeiradas, o
balcão encardido e as luminárias descascadas. No primeiro sábado
de reabertura da nova velha loja, as filas voltaram.
- Como, pai? Não entendi nada, disse Saulzinho.
E o velho Saul respondeu:
- Meu filho, quando passam na rua e olham para a loja bagunçada,
com essa aparência meio desleixada, os clientes achavam que os
produtos eram muito baratos, entravam e compravam. Quando você
reformou a loja, passou aos clientes a imagem de que nossos
produtos tinham ficado caros.
Obviamente essa história se aplica apenas em situações específicas.
Se fosse uma região de lojas de luxo bem montadas e organizadas,
uma loja bagunçada e empoeirada como a de Saul teria seus dias
contados.
Mas a história de Saul pode ser traduzida por uma pesquisa que foi
feita anos atrás para uma grande operação de varejo de informática.
115
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Era uma loja bonita e moderna, com mais de 600 metros quadrados,
equipe treinada e uniformizada, vitrine bem montada, iluminação
impecável e atendimento de primeiro mundo. O objetivo era entender
o processo de avaliação dos clientes sobre a qualidade dos serviços
da loja. Depois de alguns meses, o relatório final da pesquisa
mostrava que assim que pisavam dentro da loja, os clientes criavam
inconscientemente uma expectativa de preço e atendimento. Quando
perguntados logo na entrada sobre qual seria essa expectativa em
uma nota entre zero e dez, a resposta era nove. Mas, por mais que a
loja tivesse preços competitivos e funcionários bem treinados, os
clientes, respondendo novo questionário na saída, davam nota 7 para
o serviço que tinham recebido. Em termos absolutos, 7 é uma boa
nota – mas, comparado com o 9 anterior, o saldo era de 2 pontos
negativos.
A mesma pesquisa foi feita na loja da esquina, com poeira sobre os
produtos esbranquiçados pelo sol que batia na vitrine, vendedor com
cigarro aceso e chinelo de dedo nos pés. Ao entrar na loja, a
expectativa do cliente em relação ao atendimento resultava numa
nota 3. Mas aí encontrava o que queria por um preço bom, saía de lá
satisfeito e, no final das contas, dava nota 5 à loja. Cinco é uma nota
medíocre, mas, comparado com 3, o saldo era de dois pontos
positivos.
Para os donos dessa loja, está claro que é mais vantajoso criar uma
expectativa baixíssima e entregar um trabalho mais ou menos do que
ser refém de uma expectativa alta. Da mesma forma, os sócios da
loja moderna precisam se aprimorar mais para não ficar aquém do
116
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
que o cliente espera. Note que isso é uma constatação, não uma
justificativa para baixar o nível. É imprescindível ter um atendimento
de primeira e ter preços competitivos. Mas isso não elimina o fato de
que é muito ruim entregar menos do que o prometido.
Pense nisso...
§
Ambientes sofisticados criam uma expectativa nos consumidores
de que os produtos e serviços são caros, mesmo que não sejam.
§
É melhor criar uma expectativa baixa no seu cliente e
surpreendê-lo com um serviço muito melhor do que ele esperava
do que o contrário.
§
Um dos maiores erros é confundir o que o cliente quer com aquilo
que o empreendedor acha que ele quer
117
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“Se uma série de eventos
pode dar errado,
certamente dará errado na
pior seqüência possível”
Outra lei de Murphy
118
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
19.
Desamarre o gato, ou uma história
sobre procedimentos que não servem
para nada
Isolado no topo de uma montanha distante, o monastério vivia na paz
absoluta. Todos os dias, às cinco da madrugada, os monges se
reuniam numa sala para a primeira oração da manhã. Em silêncio
total e imperturbável, meditavam durante 40 minutos. Num certo dia,
no entanto, essa rotina foi quebrada. Um gato, que se instalara no
sótão, resolveu que iria caçar ratos, derrubar objetos e miar como
louco justamente no momento da oração. A princípio, os monges
tentaram abstrair. Não deu certo. O barulho impedia a concentração.
Como não seria piedoso expulsar o gato, o abade tomou uma
decisão: “Vamos fazer o seguinte”, disse ele a seu ajudante, “às
quinze para cinco da madrugada, você vai até o sótão e amarra o
gato. Amordace-o também, para que ele não mie. Quando
terminarmos a oração, você sobe e o solta”.
119
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Assim, durante muito tempo, a ordem do abade foi cumprida. Mesmo
quando ele morreu, anos mais tarde, o gato continuou sendo
amarrado e amordaçado. E, quando o gato morreu, os monges
saíram em busca de outro gato para que fosse amarrado e
amordaçado durante a meditação. As décadas se passaram e os
antigos monges também morreram. As novas gerações de abades,
irmãos e monges continuaram amarrando e amordaçando gatos.
Como o passar do tempo, ninguém mais sabia dizer como surgira o
hábito e nem se lembrava para que ele servia. Mesmo assim, ou
talvez por isso mesmo, o ritual ficou cada vez mais importante. Foi
criado o cobiçado cargo de “amarrador de gato” – essa pessoa
precisava seguir as diretrizes de um grosso manual, que
especificavam o tipo de corda a ser usada, quantas voltas tinham de
ser dadas ao redor do gato e os tipos de nós permitidos.
Duzentos anos depois, no mosteiro, surgiram inúmeros grupos de
pesquisa, que se dedicavam a interpretar a origem do ritual – a
corrente predominante defendia uma origem divina, argumentando
que o gato, a mordaça e a corda eram metáforas da santa trindade.
Outros monges, baseados em livros antigos de leitura restrita,
garantiam que a simbologia era outra e evidenciava a origem humana
– pois só pelas mãos do homem é que gato, corda e mordaça
passavam a ser uma entidade única.
Aos poucos, as divergências sobre a origem do ritual ficaram
insustentáveis e os monges se dividiram em dois grupos
inconciliáveis. Um deles, que acreditava que qualquer gato poderia
ser amarrado e amordaçado, partiu do monastério e fundou sua
120
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
própria escola. O outro grupo, que garantia que apenas gatos
brancos poderiam ser amarrados e amordaçados, permaneceu no
monastério. O primeiro grupo acusa o segundo de radicalismo. O
segundo acusa o primeiro de heresia. Já há quem fale em criar uma
terceira ordem, com as virtudes dos dois grupos e nenhum dos
defeitos. Enquanto isso, muitos monastérios que nunca se
desentenderam por causa de rituais incompreensíveis continuam
prosperando.
Por mais que seja apenas uma história, a verdade é que no mundo
das empresas ela se repete todos os dias em inúmeras empresas.
Quantas vezes você já teve que cumprir procedimentos sem pé nem
cabeça, que ninguém mais sabe quem criou, nem para quê? Tudo
pelo simples fato de que as pessoas tendem a continuar a fazer tudo
o que vinha sendo feito, sem questionamento. A razão é simples,
questionar implica em trabalho, pesquisa, fracassos em tentativas por
novos caminhos, enquanto manter como está não dá trabalho algum.
Por isso, promova sempre a campanha do “Desamarre o gato” dentro
da sua empresa, para torná-la mais produtiva, menos ilógica e com
menos pessoas que só costumam responder “sim senhor”.
Pense nisso...
§
Há uma série de procedimentos e processos nas empresas que
todos repetem sem saber por quê. Dizer amém é bom nas
igrejas, nunca nos negócios.
§
Muitas coisas podem fazer sentido nas empresas, mas isso não
quer dizer que elas tenham significado nem utilidade.
121
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
§
Pedro Mello
A lição dos alcoólicos anônimos também vale aqui: “Dai-me
serenidade para aceitar as coisas que não posso mudar e
coragem para mudar o que precisa ser mudado. E sabedoria para
distinguir uma coisa da outra”.
122
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
“Não tenha pudor em
copiar o que é bom.
Exemplos foram feitos para
isso mesmo: copiar”
Abílio Diniz
Presidente do conselho de administração da
rede de supermercados Pão de Açúcar
123
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
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Pedro Mello
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
20.
Empreendedor, pero no mucho
Vida de empreendedor, não custa repetir, não é moleza. Por outro
lado, quem tem sangue empreendedor não agüenta empregos
quadrados, que embotam a criatividade e podam a inquietude e a
inovação. Entre esses dois extremos está o dilema: o que fazer?
Conformar-se com o emprego frustrante ou arriscar-se por conta e
risco no próprio negócio? Para quem não se entusiasma com
nenhuma dessas duas opções, ainda há uma intermediária: comprar
uma franquia.
Franquia talvez seja a opção mais sensata para quem não quer se
arriscar demais, mas também não quer ter mais ter patrão. Por esse
sistema, você se torna empreendedor com um tipo de negócio que,
na maioria das vezes, já foi testado e aprovado pelo mercado. Sem
dúvida é mais seguro, embora não seja garantia de nada – é a
qualidade do seu trabalho que efetivamente vai fazer dar certo, ou
não. Se você pensa em se aventurar por esse caminho, é preciso
levar em conta alguns pontos importantes:
Orgulho besta: Muita gente acredita que a pessoa que opta por
comprar uma franquia só faz isso porque não tem capacidade de criar
125
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
um negócio sozinho. Mesmo que seja verdade, não há mal algum
nisso. Para que pular sozinho no abismo, se você pode usar uma
rede de segurança? Prudência é uma questão de bom senso.
Chefe nunca mais: quem pensa que ter uma franquia é dizer adeus
ao patrão, esqueça. Por mais que você seja dono da franquia, terá
que se sujeitar aos padrões da rede. Ou seja, experimente sair da
linha e você verá alguém parecido com seu ex-chefe recriminando
seu jeito de trabalhar. Em contrapartida, você não terá que criar uma
série de procedimentos, materiais de marketing, controles
administrativos e financeiros e mais uma lista infindável de coisas
chatas. Coisas que tomam tempo e dinheiro. Por outro lado, toda vez
que você tiver uma idéia para, por exemplo, melhorar a gestão,
precisará da aprovação do franqueador. Isso pode se tornar frustrante
para quem tem o espírito um pouco mais empreendedor.
Riqueza garantida: eis outro mito que precisa ser demolido. Quem
monta um negócio próprio procura mais qualidade de vida,
independência e também uma maneira de fazer um bom pé de meia.
Mas, quando se opta por ter uma franquia, o pé de meia talvez não
seja tão gordo. Se você aplicar dinheiro em ações, pode ganhar ou
perder muito. Mas se aplicá-lo na poupança, terá um pequeno
retorno, apesar de garantido. A franquia está mais para poupança do
que ações. Você pode até encontrar franquias que dão bom retorno
sobre o capital investido, mas dificilmente ele o tornará um milionário.
Por outro lado, muitas pessoas acabam ganhando muito mais do que
receberiam se ainda estivessem trabalhando como empregado em
uma empresa.
126
Guia de Sobrevivência do Negócio Próprio
Pedro Mello
Sombra e água fresca: Franquia é como qualquer outro negócio
próprio. Portanto, sobretudo no início, esqueça a tranqüilidade e o
sossego. Com o passar dos anos, é possível treinar alguém para
gerenciar a franquia e com isso diminuir a carga de trabalho. Mas
para isso acontecer é preciso tempo de operação e estabilidade
financeira no negócio. Alguns franqueados optam por comprar mais
franquias ao chegar a esse estágio. Assim vão montando sua própria
rede de franquias e acabam diluindo entre as unidades o custo de ter
uma pessoa mais capacitada para gerenciar a rede. Esses poucos
franqueados que acumulam duas ou mais franquias da mesma rede
acabam tendo resultados financeiros atraentes e suficientes para
garantir um pouco de sombra e água fresca.
Negócio paralelo: muitas pessoas pensam que podem começar uma
franquia como um negócio paralelo ao emprego. Em alguns casos
também pensam na franquia como solução para “ocupar” uma
esposa que quer trabalhar mas não sabe bem o que fazer. Em
qualquer um dos casos, pare para pensar duas vezes antes de
comprar uma franquia. Franquia exige dedicação exclusiva e intensa.
Pensar que meio período, duas vezes por semana, vai ser suficiente
para começar uma franquia é um sonho. Aliás, não é sonho, é delírio.
Casamento perfeito: Franquia é uma sociedade de longo prazo.
Como em qualquer outro relacionamento, haverá momentos de
felicidade intensa e outros em que você não vai querer ver o
franqueador pintado de ouro. Paciência e dedicação ao
relacionamento são importantes. Um pouco de teimosia, orgulho,
127
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raiva, surtos, egoísmo, imaturidade ou vaidade pode levar esse
relacionamento para o buraco depois de alguns anos.
Se você acredita que esses mitos e tabus podem ser lidados com
tranqüilidade, investir em uma franquia pode ser uma boa alternativa
para suas economias. O risco de se aventurar em um novo negócio
será ainda menor se você optar por uma rede madura, com alguns
anos de operação. Mas essas redes têm poucas vagas para novos
franqueados em grandes centros, restando oportunidades em cidades
mais afastadas ou interior. Mesmo assim, todos os dias aparecem
novas redes com boas promessas para seus franqueados. Mas é
importante tomar certos cuidados para não levar gato por lebre. Por
isso, analise com mais atenção a franquia que você pensa em
comprar. Alguns cuidados simples podem acabar com grandes dores
de cabeça.
Histórico financeiro: redes com poucos anos de vida são mais
difíceis de analisar. Se você procura por segurança, o ideal é
selecionar marcas com pelo menos uns três anos de vida. Isso torna
mais fácil a análise das vendas e resultados, bem como a saúde
financeira da empresa. Esse é um ponto importantíssimo, pois a
última coisa que você quer é perder o seu negócio porque o dono da
rede não soube administrar suas finanças. Apesar de finanças e
contabilidade serem coisas bem chatas para a maioria das pessoas,
não deixe de revisá-las com muita atenção.
Satisfação dos franqueados: por mais bonito que seja o discurso de
quem criou uma marca, vale mais o testemunho de quem já comprou
uma franquia dele. Antes de assinar qualquer contrato de franquia,
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converse com os franqueados. Eles darão uma visão muito mais
realista do dia-a-dia como franqueado da rede. Questione aspectos
como o suporte oferecido para montagem do negócio, a exatidão dos
investimentos apresentados em relação aos gastos reais, a
lucratividade do negócio em meses bons e ruins, o apoio em
marketing, treinamento e operação do negócio e a flexibilidade do
franqueador para mudanças propostas pelos franqueados. Exija
transparência.
Afinidade com o negócio: Você precisará de muita dedicação e
algum tempo para a franquia dar bons resultados. Por isso, é muito
importante ter afinidade com o negócio. Um ponto comum em quase
todas as franquias é o tino comercial. Se você é do tipo calado, tímido
e com pouca habilidade para relacionamento com o público,
provavelmente terá que descartar boa parte das franquias
disponíveis. Por isso, pense dez vezes se você realmente gosta do
ramo que está entrando. Sem paixão não há satisfação.
Contratos: a primeira coisa que você receberá para analisar a
possibilidade de comprar uma franquia é um documento chamado
Circular de Oferta. Nela estão todas as características da rede, sua
história, a lista de franqueados e os relatórios financeiros da empresa.
Junto também devem ser entregues o pré-contrato de franquia
(contrato feito entre o franqueador e a pessoa que está comprando a
franquia) e o contrato de franquia (contrato que substitui o précontrato quando a empresa do franqueado é aberta). Leia-os com
muita atenção e discuta todos os parágrafos e cláusulas. Mais
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importante, você não precisa pagar um centavo sequer enquanto não
assinar o pré-contrato de franquia.
Se você achar que tem jeito para lidar com tudo o foi dito, só me resta
desejar boa sorte a você.
Pense nisso...
§
Franquia é uma opção para quem não quer arriscar suas
economias em um negócio novo, mas também não agüenta mais
ser empregado.
§
É fundamental analisar com profundidade o negócio apresentado
pelo franqueador, para não ser iludido por ele ou pelo seu próprio
sonho de ter um negócio incrível e extremamente rentável.
§
Leia todos os contratos com muita atenção e não assine nada se
ainda tiver uma única dúvida, por menor que ela seja.
§
Qualquer franquia dá tanto trabalho como ter um negócio próprio
qualquer depois de montado.
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“O amor que você dá é
igual ao amor que você
recebe”
John Lennon, guitarrista e compositor dos
Beatles
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21.
Faça amor não faça guerra
Há muitos e muitos anos, um jovem foi consultar o sábio chinês de
sua aldeia. O rapaz estava às vésperas de casar e trazia a alma
cheia de dúvidas em relação à futura mulher.
- Sei que Tsei é uma boa moça, mas não sei o que sinto por ela,
explicou o rapaz, com aquele ar de quem vive a mais dilacerante das
hesitações.
O sábio ouviu pacientemente essa frase e todas as outras que vieram
depois, tecendo infindáveis prós e contras em relação à donzela. A
seguir, o ancião o encarou e, olhando-o no fundo dos olhos, disse
uma única e solitária frase:
– Ame-a.
– Mas, mestre, eu não sei...
– Ame-a, repetiu, continuando a falar ante a inquietude do rapaz.
Ame-a, pois amar é uma decisão, não um sentimento. Amar é um
exercício de jardinagem. Prepare o terreno, elimine o que é daninho,
semeie, seja paciente, regue e cuide. Esteja preparado porque
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haverá pragas, secas e enchentes. Mas nem por isso abandone o
seu jardim. Aceite-o como é, cuide dele, valorize-o, respeite-o e
compreenda-o. Ame-o, enfim, com todas as forças, todos os dias.
Sei que parece meio piegas falar de amor quando o assunto principal
aqui é a sua empresa. Mas talvez esse seja o motivo pelo qual tantas
empresas têm dificuldade para ver o seu negócio decolar. Afinal,
nove em cada dez empreendedores afirmam que são movidos a
combustíveis como desafio, ambição, dinheiro, status, independência
e a satisfação pessoal que um negócio próprio gera. Mas poucas
vezes vemos donos de empresas, pequenas, médias ou grandes,
dizer com a boca cheia que fazem o que fazem por puro amor. Isso
mesmo: levantar todo dia para trabalhar apenas porque ama o que
faz e ponto final, tenho dito.
Parece engraçado pensar nisso, mas os negócios tocados por
pessoas que amam sua empresa crescem mais rápido que os outros.
Obviamente, minha afirmação não é uma regra nem produto de
estudo científico – mesmo porque há um bom monte de gente que
ama o que faz e nunca vê a conta da empresa engordar. Em sua
maioria, essas pessoas são consideradas artistas, que não ligam
muito para estratégia, finanças, custos e administração. Apenas
querem fazer o que gostam de fazer, do jeito que fazem. Aí fica difícil
mesmo, pois sem um mínimo de organização não dá certo nem com
reza brava. Mas, seja como for, acredito – realmente, piamente,
completamente – que o amor que você dedica à empresa que
construiu traz dividendos maiores do que os de quem vive por conta
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do dinheiro.
Você, claro está, não precisa concordar nem discordar do que digo.
Mas, se jogar no mesmo time que eu, leia a continuação das palavras
do mestre chinês ao jovem que não sabia se casava ou não casava.
Na pior das hipóteses, faz refletir sobre um monte coisas. Eis os
pensamentos do sábio:
Meu jovem, ame-a (sua mulher ou sua empresa, como queira), pois:
– Inteligência sem amor te faz perverso.
– Justiça sem amor te faz implacável.
– A diplomacia sem amor te faz hipócrita.
– Êxito sem amor te faz arrogante.
– Riqueza sem amor te faz avarento.
– Docilidade sem amor te faz servil.
– Pobreza sem amor te faz orgulhoso.
– Beleza sem amor te faz ridículo.
– Autoridade sem amor te faz tirano.
– Trabalho sem amor te faz escravo.
– Simplicidade sem amor te deprecia.
– Lei sem amor te escraviza.
– Política sem amor te deixa egoísta.
– Vida sem amor não tem sentido.
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Por fim, negócios sem amor te fazem mais um igual a todos outros
numa hora em que a diferença nunca foi tão importante.
Pense nisso...
§
Trabalhar com algo que você faz por amor é meio caminho
andado para o sucesso e a felicidade.
§
Toda sua equipe estará junto com você nos bons e nos maus
momentos se eles sentirem que você os trata com atenção, amor
e carinho.
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“Sou como uma esponja.
Absorvo o que os outros
fazem e, a partir daí, faço o
que tenho de fazer”
Albert Eisnten, um dos maiores cientistas da
história da humanidade
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22.
A sua parte de um país melhor
Pai e filho caminhavam, em um final de tarde, na praia deserta.
Desde que o filho fundara seu próprio e próspero negócio, os
momentos a sós com o pai eram raros. “Tempo é dinheiro”, dizia o
jovem ambicioso quando alguém observava que ele mal dava
atenção à família. “Entenda, a empresa está crescendo e isso exige
dedicação total. Não posso parar”, dizia o filho também naquele dia
na praia. Homem experiente, ex-diretor de grandes empresas, o pai
ouvia atentamente as justificativas do filho enquanto caminhavam
juntos na areia. De vez em quando, no entanto, o pai parava para
pegar uma estrela-do-mar trazida pelas ondas e atirá-la de volta ao
mar.
Na primeira vez que fez isso, o filho interrompeu o que estava
falando, esperou o pai terminar e então continuou a discorrer sobre a
quantidade de problemas que tinha para resolver todos os dias. Na
segunda, achou estranho mas deixou para lá. Na terceira, começou a
ficar irritado. Na quarta vez, observando a infinidade de estrelas do
mar que havia na praia, o filho perdeu as estribeiras.
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- Pô, pai, você não está prestando atenção no que estou falando. Vai
querer salvar todas as estrelas? Tem milhares delas aqui. Se passar
o resto da vida só fazendo isso, não vai salvar nem metade. Deixa
quieto, é perda de tempo, não faz diferença.
- Não, não é perda de tempo, filho. Para esta estrela, disse o pai
enquanto arremessava outra estrela-do-mar de volta ao oceano, pelo
menos para esta estrela faz toda a diferença.
Nos anos 70, essa história circulava nas comunidades que pregavam
paz e amor. Hoje, pode ser classificada como uma parábola de autoajuda. Há quem a ache linda ou inspiradora e também quem a
considere tola ou boboca. Não há dúvida de que se trata de uma
utopia. Se, no Brasil, há tanta injustiça, miséria, violência, corrupção,
qual o sentido de remar contra a maré? Se os problemas são tão
gigantescos, de que adianta ajudar um pequeno grupo de pessoas?
Bem, se você apenas cruzar os braços, tenha certeza de que a
situação só vai piorar.
Cada vez mais, grandes empresas criam fundações e programas
para ajudar quem precisa. Isso é muito bom, mas insuficiente. Por
mais que elas tenham boa vontade e dinheiro, sozinhas não
conseguirão salvar todas as estrelas-do-mar. Para que haja uma
mudança real no Brasil, é fundamental que os empreendedores, as
pequenas e médias empresas, façam a sua parte. Afinal, nós somos
o motor desse país. Um universo de quase quatro milhões de
empresas que fazem a máquina girar dia e noite, todos os 365 dias
do ano. Desse total, ainda poucos empreendedores investem em
ações sociais. Mas isso está mudando - os poucos de hoje são o
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dobro de um ano atrás e algumas dezenas de vezes o número de
“sonhadores” de cinco anos atrás. Se você aderir a essa causa, em
breve seremos o quíntuplo de hoje.
A seguir, alguns caminhos para ajudar a melhorar o país em que você
vive:
Filantropia: essa é uma das maneiras mais fáceis de começar, a
simples e indolor doação de dinheiro. Mesmo que sejam R$ 10 por
mês. Muita gente não faz doações por que ouviu dizer “é melhor
ensinar a pescar do que só dar o peixe”. Pode ser. Mas há casos e
casos. Se alguém está morrendo de fome, é recomendável primeiro
dar o peixe – só depois, quando o cidadão tiver recuperado as forças,
é que entra a parte educativa.
Também há pessoas que não fazem doações porque acreditam que
seu dinheiro será mal utilizado ou desviado para o bolso de algum
vigarista. Bem, vigaristas existem em qualquer lugar, da mesma
forma que há fundações, ONGs e entidades que fazem um trabalho
espetacular. Para saber quem é quem, visite algumas e as conheça
de perto. O site da Associação Brasileira das Organizações Não
Governamentais (www.abong.org.br) tem uma boa relação de
entidades sérias.
Cuidado ambiental: o simples fato de você cuidar do meio ambiente
já é uma grande ajuda social. O lixo reciclado deixa o mundo mais
limpo e cria oportunidade de empregos inexistentes até poucos anos
atrás. Mas a consciência ambiental pode ir além. Comprar produtos
que não contribuem para o desmatamento das reservas florestais é
um passo importante. Se for difícil identificar esses produtos, opte por
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empresas que mostram sua preocupação pelo meio ambiente. Ainda
são poucas empresas, mas se valorizarmos seus produtos, em
alguns anos elas serão muitas.
Voluntariado: Separe um dia, uma tarde ou manhã para se dedicar a
alguma causa social. Um tempo em que seu cérebro vai funcionar
apenas para isso. Seu tempo fará uma grande diferença para quem
precisa e o contato próximo com essas pessoas poderá abrir sua
mente. Você perceberá que as necessidades da parte de baixa da
pirâmide social são muito mais simples e básicas do que você jamais
poderia imaginar. Um bom trabalho de voluntariado que pode ajudá-lo
nos primeiros passos é feito pelos Parceiros Voluntários
(www.parceirosvoluntarios.org.br).
Bandeira própria: muitas empresas acabam criando suas próprias
ONGs, fundações ou instituições. Algumas criam programas originais,
outras repetem o que outros já fazem. Se a sua empresa for defender
uma bandeira social própria, tenha certeza de que esse será um
caminho inovador e que realmente contribuirá para a sociedade.
Senão é melhor apoiar ações sociais existentes.
No final do dia, o que realmente vale é fazer algo. Acredite que para
mudar, é só começar.
Pense nisso...
§
Ensinar a pescar ou até a construir a vara é importante, mas em
alguns casos dar o peixe pode ser a diferença entre a vida e a
morte para uma pessoa que precisa comer.
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§
Pedro Mello
Não há desculpa que justifique comodismo. Se ninguém agir,
tudo tende a piorar
§
Há muitas maneiras de contribuir. Não é possível que nenhuma
sirva para você.
§
Toda grande mudança começa com pequenos gestos e
iniciativas.
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