Revista Atitude Nº 08

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Revista Atitude Nº 08
CÓPIA DA CAPA
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
REVISTA ATITUDE – Construindo Oportunidades
Periódico da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre
- Ano IV - Nº 8 - Julho a Dezembro de 2010
Porto Alegre - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre.
ISSN 1809-5720
A REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades tem por finalidade a produção e a divulgação do conhecimento nas áreas das ciências aplicadas produzido particularmente pelo seu
corpo docente e colaboradores de outras instituições, com vistas a abrir espaço para o intercâmbio de ideias, fomentar a produção científi ca e ampliar a participação acadêmica na comunidade. O Conselho Editorial reserva-se o direito de não aceitar a publicação de matérias que não
estejam de acordo com esses objetivos. Os autores são responsáveis pelas matérias assinadas.
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Porto Alegre, 2010
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Revista Atitude - Construindo Oportunidades – Revista de Divulgação Científica da Faculdade
Dom Bosco de Porto Alegre
Ano IV, Volume 4, número 8, jul-dez 2010 – ISSN 1809-5720
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Revisão:
Cristiane Billis – MTb 26.193
Os artigos e manifestações assinados correspondem, exclusivamente, às opiniões dos respectivos autores.
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Sumário
Apresentação....................................................................................................................... 4 7
1. A conquista da aposentadoria desejada através do planejamento financeiro
pessoal .......................................................................................................................... 4 9
Liége Pires do Rosário Lau e Luís Alexandre Ribeiro Cure
2. O ensino de empreendedorismo em ambientes de aprendizagem que consideram
a afetividade do aluno.................................................................................................. 419
Eduardo Pertille Costa Leite
3. A nota fiscal eletrônica e informatização empresarial.............................................. 427
Elisabeth Maria Mosele e Sheila Ferreira Pereira
4. Gestão estratégica de pessoas: um estudo em empresas de prestação de serviços 4
produtivos e distributivos na região metropolitana de Porto Alegre...................... 439
Neuri Antonio Zanchet e Fernanda Casanova
5. A gestão em cursos de educação a distância à luz dos fatores críticos de
sucesso.......................................................................................................................... 4494
Daniela Rodrigues Cunha Retamal
6. Gestão de bacias hidrográficas: modo inovador de administrar recursos
hídricos.......................................................................................................................... 459
Luciane Teresa Salvi
7. O fim negativo do contrato.......................................................................................... 465
Débora Cristina Holenbach Grivot
8. Los trabajadores extranjeros en la Argentina y en el Brasil: sus consecuencias . para el DIPr.................................................................................................................... 4774
Dr. Silvio Javier Battello e Julio Córdoba
9. Constituição estadual e sistema federativo............................................................... 497
Bruno Nubens Barbosa Miragem
10. Algumas notas sobre a ‘constitucionalização’ do direito privado...........................105
4 Roberta Drehmer de Miranda
11. Recensão.......................................................................................................................121
José Nosvitz Pereira de Souza
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Apresentação
Fiel à sua missão de “formar bons cristãos e honestos cidadãos” de acordo com as opções
educativas de Dom Bosco, nosso patrono, a Revista Atitude – Construindo Oportunidades mais
uma vez apresenta estudos realizados por professores e acadêmicos de nossa Faculdade,
bem como de colaboradores de outras instituições e segmentos.
O curso de Direito é o mais presente nesta edição. Autorizado a funcionar há três anos,
tem conseguido reunir um grupo de professores com características de pesquisadores.
Muitos deles já concluíram seu doutorado, outros estão com o mesmo em andamento.
A perspectiva é sempre apresentar horizontes para a sociedade civil numa dimensão de
vivência da cidadania.
O curso de Administração se faz presente com quatro artigos. Digno de menção é que três deles
são fruto de nosso Programa de Iniciação Científica. Durante um bom tempo, três professores
com três alunos aprofundaram determinado tema. Amadureceram suas conclusões e agora
partilham com a comunidade acadêmica e com os leitores desta Revista. Certamente que para
estes acadêmicos, a escrita destes artigos, fruto de um tempo de pesquisa e amadurecimento,
representa uma experiência marcante e que os anima a concluir seu curso de graduação
numa perspectiva de formação continuada. Também para os professores significa um gesto
de humildade e generosidade, partilhando seu tempo, suas energias e suas convicções com
bons discípulos.
Um dos grandes desafios para o mundo é a conservação e a partilha dos recursos hídricos.
Aqui entra a responsabilidade social de todos. O artigo que é apresentado nesta revista pela
professora Luciane Teresa Salvi é na direção da construção de uma sociedade pacífica,
partilhando os bens hídricos para que todos tenham vida em abundância. Mesmo o Brasil,
com tanta água, deve contribuir para a paz mundial através do uso inteligente, generoso e
solidário da mesma.
Ciências Sociais e Aplicadas
Finalmente, há uma recensão bibliográfica de um volumoso e suculento livro publicado
pelos professores Bruno Miragem e Aloísio Zimmer. A obra, Comentários à Constituição
do Estado do Rio Grande do Sul, de 3 de outubro de 1989, ao realizar a apreciação das
disposições da Carta Magna, atende a um vazio do cenário editorial regional e nacional de
comentários aprofundados e refletidos sobre o texto das constituições estaduais. Poucos
são os escritos que aprofundam com tanta competência e amplitude as Constituições
Estaduais quanto este livro.
Parabéns aos autores. Parabéns maior aos leitores que encontrarão nesta Revista um
horizonte de perspectivas e um estímulo a continuar construindo cidadania.
Conselho Editorial da Revista Atitude – Construindo Oportunidades.
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A conquista da aposentadoria desejada
através do planejamento financeiro pessoal
Liége Pires do Rosário Lau(1)
Luís Alexandre Ribeiro Cure(2)
RESUMO: Este estudo tem o propósito de demonstrar a importância do
Planejamento Financeiro Pessoal através da reflexão da necessidade de
acumulação de recursos por meio de iniciativas simples de forma equilibrada
e segura. Foram utilizadas bibliografias referentes ao assunto com vistas à
conscientização quanto à necessidade de informação, destinação de recursos e
formação de uma poupança para garantir uma renda adicional na aposentadoria.
No mundo, o mercado financeiro está cada vez mais sofisticado, e novos
produtos são oferecidos continuamente ao público. O primeiro passo para
o desenvolvimento de uma trajetória financeira de sucesso é o planejamento
financeiro pessoal através de boas escolhas na relação consumo e poupança,
tomando opções conscientes em relação a riscos e retorno, para melhorar a
relação com as finanças pessoais e garantir uma velhice tranquila.
Palavras-chaves: Educação Financeira. Planejamento Financeiro. Poupança.
Produtos Financeiros. Renda. Aposentadoria.
ABSTRACT: This study aims at the importance of Personal Financial Planning
through the evidence that one must accumulate resources through simple,
balanced and secure program. The bibliographies used are associated to the
subject with the intention to conscious people about the need for information,
resource allocation and savings to ensure an additional income for the retirement
period. Worldwide, the financial market is more and more sophisticated, and
new products are continuously offered to the public. The first step in developing
the financial success is the personal financial planning through good choices in
consumption and saving, and making up to date choices in relation to risk and
return, to improve the relationship with personal finances and make certain a
peaceful old age
Keywords: Financial Education, Financial Planning, Savings, Financial Products,
Income, Retirement.
Introdução
Os brasileiros têm um longo caminho
a percorrer para se igualar aos padrões
ingleses e norte-americanos quanto ao
planejamento, à educação e à cultura
financeira. A maior dificuldade repousa
em uma longa temporada de incertezas
no campo político e econômico, com juros
e inflação em níveis muito elevados que
dificultam o planejamento financeiro com
(1)
Psicóloga, mestre em Ciências Sociais Aplicadas, especialista em Administração e Estratégia Organizacional, professora da Faculdade
Dom Bosco de Porto Alegre, consultora de empresas. E-mail: [email protected]
(2)
Advogado, diretor administrativo da INDUSPREVI – Sociedade de Previdência Privada do Rio Grande de Sul, conselheiro do Fundo
de Pensão Multipatrocinado da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio Grande do Sul. Bacharel em Administração pela
Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]
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vistas ao desenvolvimento de um projeto de tomar decisões de investimentos.
aposentadoria de longo prazo.
Assim, desenvolver ações voltadas
A História do Brasil foi marcada para a Educação Financeira e Previdenciária
por períodos de instabilidade política e seguramente terá o seu importante papel
econômica, o que explica o fato de se ter uma cada vez mais reconhecido, em proveito do
cultura financeira ainda incipiente, apesar Brasil e da massa de seus trabalhadores, que
do tamanho de economia nacional. O Brasil dispõe de uma Previdência Complementar
cresceu, desenvolveu competências na área Fechada de qualidade e modelo para outros
política e econômica, e as mudanças foram países.
suficientes para ressaltar a importância de um
planejamento financeiro pessoal. Porém, os
1. A Imprevidência Brasileira
altos patamares de inflação, que perduraram
Pode-se dizer que a cultura do país tem
por praticamente três décadas, fizeram com o centro de gravidade calcado no “aqui e
que os indivíduos concentrassem as ações agora”. A razão histórica disso é o resultado
em curto prazo, já que, num ambiente como da confluência de três outras culturas
esse, era difícil qualquer previsibilidade extremamente imediatistas. O colonizador
financeira.
ibérico veio para o Brasil para encontrar o
Pensar em aposentadoria no Brasil paraíso e não para construí-lo, ao contrário
até meados da década de 1970 era pensar do que aconteceu na América do Norte.
a vida às expensas da previdência social, No Brasil, o colonizador trouxe a noção do
entretanto, com os primeiros sinais de desfrute imediato e predatório.
uma grande crise no regime, surgiram no
Outro fator importante que contribui para
país os primeiros planos de previdência essa formação passa pela cultura africana
complementar, exigindo participação e empregada que, submetida à escravidão e
contribuições a um regime privado pouco não sendo dona, não via porque se dedicar à
conhecido. O sistema de previdência formação de recursos para melhorar o futuro.
complementar está estruturado na adesão Ainda, para corroborar com a baixa cultura
facultativa de empregados, o que só se de poupança de longo prazo, houve uma
viabiliza através de uma disciplina financeira. forte influência dos indígenas, que sequer
O desafio de um planejamento mantinham uma agricultura organizada.
financeiro deve ser enfrentado logo, para
As combinações dos fatores acima
que não se produza mais uma geração de expostos podem oferecer um conjunto de
brasileiros que, ao chegar aos 40 ou 50 anos, justificativas para afirmar a despreocupação
perceba tarde demais o quanto faz falta do brasileiro com o futuro, aliado a períodos de
uma preparação econômica e financeira, descontroles inflacionários e às fragilidades
considerando cenários, rentabilidade, riscos dos governantes. As promessas políticas que
e liquidez.
não se cumprem reforçam a ideia de que não
Então, a importância do tema que é vale a pena fazer sacrifícios agora pensando
a capacitação financeira das pessoas, em no futuro, segundo Giannetti (2005).
geral, se justifica e decorre da sofisticação
Atribuir a ausência de um programa
atual dos produtos financeiros. É necessário de educação financeira e previdenciária
um conjunto de habilidades
somente aos políticos é
por
questões uma maneira fácil de não
para
compreender
os Seja
termos
do
mercado. culturais, políticas ou enfrentar o problema. O
O
desconhecimento, econômicas, o fato é que governo não é tão diferente
a
incapacidade
do poucos brasileiros se da sociedade quanto se
entendimento e a falta de preocupam com o futuro. imagina. É justamente o
planejamento resultam no
reflexo de seu povo.
adiamento da formação da
Esse comportamento
poupança previdenciária e na dificuldade em se traduz na falta de planejamento para
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a aposentadoria, motivo pelo qual há um
grande arrependimento entre a população
de idosos aposentados.
cada um ganha, gasta e conserva o seu
dinheiro, não só define o seu estilo de vida
atual, mas, certamente, influenciará, positiva
ou negativamente, naquilo que se pretende
no futuro.
Obviamente, o objetivo deste estudo
não é despertar a avareza e um estilo de vida
somente apoiado na acumulação de recursos
financeiros, mas sim, buscar um equilíbrio
na vida presente, com vistas a um futuro
digno com mais qualidade de vida. Também
não se refere a uma lista de obstáculos e
renúncias no presente, e sim à dedicação a
uma antecipação de um período em que não
se reunirão todos os elementos necessários
a realizar grandes conquistas.
O ditado popular “dinheiro não traz
felicidade”, destacado por Barduchi (2010,
p. 136), parece muito adequado; todavia, a
falta dele traz infelicidade e o distanciamento
de prazeres e confortos necessários na
velhice. Saber conciliar as necessidades e a
possibilidade em cada fase da existência só é
possível através de um planejamento financeiro
decorrente de um bom projeto de vida.
2. Projeto de Vida e Educação
Financeira
Preparar-se
financeiramente
para
a
aposentadoria
envolve
disciplina,
persistência e, acima de tudo, manter na
fase ativa um projeto de vida que ofereça
condições de evitar o arrependimento tardio.
Segundo Barduchi (2010, p.16), um
projeto de vida é mais do que uma ferramenta,
trata-se de uma forma de pensar e posicionarse no mundo, integrando diversas esferas
que constituem o ser humano e que são
indissociáveis, pois, qualquer alteração em
uma delas impacta a outra.
Possuir um projeto de vida é o grande
diferencial na preparação de uma velhice
tranquila e equilibrada, não somente por
tratar questões relacionadas à capacidade
financeira nesta etapa.
Para Leite (1993, p. 121), o passado
ajuda a decidir se a aposentadoria será
prêmio ou castigo, uma vez que ela tenderá
a reproduzir o que ocorre durante o período
3. Planejamento Financeiro
de atividade.
A proposta de uma reflexão em relação
O projeto de vida tem como ao planejamento financeiro pessoal visa
finalidade buscar o autoconhecimento e a a despertar os indivíduos a estabelecer
transformação de sonhos em metas a serem uma relação mais saudável com o dinheiro.
alcançadas. O importante é que se tenha um Entender melhor o funcionamento da gestão
projeto de vida escrito, que em se tratando de econômica e financeira nos diversos ciclos da
finanças pessoais, permita uma visualização vida e aprender a tomar decisões inteligentes
antecipada da vida que se pretende no favorece a construção de celeiros para um
futuro. É importante saber
momento de escassez.
antecipadamente o que ele Entender a diferença entre
Numa época em que
nos reserva, pois ações querer, poder e precisar é o acesso demasiado ao
desenvolvidas no presente essencial na elaboração crédito de consumo, o
podem nos afetar mais de um projeto de vida “comprar” e o “ter” assumem
adiante, corrobora Barduchi com a organização das uma
importância
muito
finanças pessoais com grande na vida das pessoas,
(2010, p. 17).
Atualmente, percebe-se vistas à construção de é fundamental ter noções
que pessoas sem problemas uma trajetória de sucesso. de poupança e economia.
financeiros tendem a ter
Este binômio deve estar em
melhor
convívio
social,
sintonia com valores éticos e
familiar e profissional. Além disso, essas com a perspectiva de bem-estar e qualidade
pessoas também apresentam melhor de vida das pessoas. Os exemplos passados
produtividade no trabalho, autoestima mais no âmbito familiar e, posteriormente, o
elevada e são mais felizes. A maneira como gerenciamento dos recursos adequadamente
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na fase adulta são fundamentais segundo
Gustavo Cerbasi1.
Kiyosaki (2000, p. 59) afirma que, na
elaboração de um projeto de vida, surgem
muitos objetivos e metas, sendo alguns
mais fáceis de atingir, outros mais difíceis e
a maioria deles depende de disponibilidades
financeiras. Estas disponibilidades, na vida
de um trabalhador assalariado, dependem
exclusivamente do salário recebido ao longo
de um mês de trabalho e dedicação, devendo
fazer frente a todas as necessidades de
consumo e investimentos.
Nos tempos atuais, em que há uma
expansão e acesso facilitado ao crédito, as
pessoas têm que controlar os gastos para
não prejudicar os objetivos. Para Barduchi
(2010, p.139), a decisão de economizar,
quando tomada de forma consciente, não
significa privar-se de todas as atividades
prazerosas e mudar radicalmente o modo
de vida. Pode, sim, torná-la satisfatória, pois
é possível planejar o futuro, realizar sonhos
antigos, manter determinados hábitos sociais
e de consumo.
O primeiro passo a enfrentar é abandonar
o analfabetismo financeiro. De acordo com
Kiyosaki (2000, p.114), “a capacidade de
entender números é a primeira habilidade
técnica a ser desenvolvida e aperfeiçoada
para se construir uma trajetória de sucesso”.
O enfrentamento do analfabetismo
financeiro contribui para um diagnóstico da
situação entre receitas e despesas pessoais
e o nível de endividamento que remete a
um ciclo vicioso e, para muitos, eterno. O
processo de endividamento começa quando
se precisa recorrer à linha de crédito para
completar o orçamento ou sanar algumas
dívidas, seja através de cartões de crédito,
cheque especial, empréstimos, entre outros.
Dessa maneira, os resultados somente
tenderão a piorar, uma vez que os juros
são despesas elevadas e irrecuperáveis,
apresentando ritmo acelerado de crescimento
ao longo do período.
A maioria das pessoas não consegue
visualizar de forma clara os acréscimos
1
decorrentes dos juros embutidos nas
transações de compra e faturas de cartões
de crédito.
A alfabetização financeira defendida
por Kiyosaki (2000) permite aos indivíduos
fazerem escolhas conscientes, ensinando-os
a adquirir novos hábitos na hora de comprar
ou investir. O resultado deste processo
junto à sociedade irá contribuir para um
consumo financeiro mais responsável da
população, assegurando a conscientização
dos riscos assumidos pelos consumidores e,
principalmente, irá reforçar a estabilidade e
a confiança no Sistema Financeiro Nacional.
Ao adquirir controle sobre o dinheiro
através da elaboração de um planejamento,
é possível estabelecer uma relação mais
saudável com o dinheiro, permitindo alcançar
uma superação decorrente do desejo de
querer processar as mudanças necessárias
no orçamento pessoal em face das escolhas
para um futuro melhor.
Segundo Barduchi (2010, p.137), na
elaboração do orçamento, é importante
questionar quanto as atitudes tomadas
no presente melhorariam a qualidade de
vida, sendo este um fator de motivação do
planejamento e controle. O retorno, conforme
o autor, poderá ser imediato, pois, quando se
sente a sensação profunda por saber que se
destina recursos para a concretização dos
sonhos, se está melhorando a qualidade de
vida no presente.
Clason (2005, p.110) adiciona que “[...]
aquele que gasta mais do que ganha está
semeando os ventos da autoindulgência,
naturalmente desnecessária, de onde pode
estar certo de que colherá turbilhões de
problemas e humilhações”.
O segundo passo indicado por Kiyosaki
e Lechter (2000. p. 114) “é buscar estratégias
de investimentos, ou seja, a ciência do
dinheiro fazendo dinheiro”.
Muitas pessoas não alcançam o
grau de investidores porque passam a
vida toda gerenciando dívidas e buscando
incessantemente alternativas para driblar
a precariedade de recursos para fazer
BARDUCHI, Ana Lúcia Jankovic et al. Empregabilidade: competências pessoais e profissionais. apud Gustavo Cerbasi. p. 137.
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frente às inúmeras obrigações assumidas.
Especialistas afirmam que para se tornar um
investidor não se deve esperar resolver todos
os problemas financeiros. Se as despesas
estiverem altas, se a conta corrente estiver
no negativo, mesmo assim deve-se iniciar a
reservar recursos para investimentos. Tudo o
que for reservado, mesmo que em pequenas
parcelas, ficará fora do alcance de despesas
diárias e dos impulsos de consumo que são
tão comuns.
provavelmente todos se tornam vítimas de
impulsos de consumo.
Já os investimentos permanentes
representam uma garantia de um futuro
melhor, privilegiando as ações ou os resultados
previstos no planejamento, auxiliando na
consecução dos objetivos e metas. São os
investimentos permanentes que propiciarão
condições favoráveis ou desfavoráveis, mas
que, com toda a certeza, serão compensados
no futuro, segundo Barduchi (2010, p.139).
A trajetória a ser alcançada é longa,
4. Estratégia de Investimentos e permitindo que em determinados momentos
Trajetória Financeira
seja realizada uma avaliação por novos
Para atingir uma estratégia de investimentos ou aquisições de bens que
investimentos defendida também por possam maximizar os resultados.
Barduchi (2010, p.137), é necessário
Assim, segundo Kiyosaki e Lechter
entender o processo de tomada de decisões (2000, p. 114), uma trajetória financeira de
financeiras, o qual, para a gestão financeira sucesso deve respeitar a lei da oferta e da
pessoal, é dividido em duas etapas distintas demanda, consistindo assim o terceiro passo
entre a decisão de investir e financiar. Ainda, da estratégia de investimento. O mercado,
segundo o autor, essas decisões ocorrem a defendido pelo autor, cria oportunidades boas
todo o momento e, por vezes,
e rentáveis, mas também
passam despercebidas.
oferece grandes entraves de
Os investimentos podem Independente do momen- desperdícios e má aplicação
ser
classificados
como to, da disponibilidade e do de recursos.
temporários e permanentes, valor a ser investido nas
O primeiro princípio
sendo os primeiros definidos diferentes fases da vida, saudável de investimento
como todo o gasto que traz guardar dinheiro deve é a segurança do capital
benefícios temporários ou estar sempre em primeiro aplicado, ou seja, o principal.
uma satisfação momentânea lugar na lista de prioridades É prudente cobiçar altos
e os segundos aqueles que do orçamento financeiro ganhos, porém não se deve
proporcionam
condições pessoal e nunca no final, deixar enganar pelo desejo
favoráveis para acumulação se sobrar alguma coisa. de fazer fortuna rapidamente.
de reservas.
O fato de se ter iniciado
Os investimentos temporários são o entendimento dos números, através da
os mais prejudiciais para obtenção dos alfabetização financeira, ter estabelecido
objetivos traçados, visto estarem presentes estratégias de investimentos e um projeto
nas situações cotidianas que impulsionam a de vida, não torna a pessoa detentora do
gastos desnecessários. Isto porque a maioria mercado financeiro e conhecedora de boas
das pessoas se contenta com pequenos e alternativas de investimentos.
breves momentos de felicidades, adquirindo
Clason (2005, p. 49) aconselha a
pequenos objetos que não necessitam e procurar antes de tudo a opinião de pessoas
nem sabem para que servem. As pessoas acostumadas com negócios e lucros, uma
são impulsionadas a todo o momento por vez que somente assim se está salvo dos
ações agressivas de marketing a despertar investimentos de alto risco.
o desejo de consumir, independentemente
O enriquecimento é um processo por
da necessidade. Constantemente, há meio do qual a riqueza é acumulada: primeiro,
bombardeios de anúncios que induzem a as pequenas somas, depois as maiores. À
confundir desejos como necessidades e medida que o homem aprende a se tornar
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mais capaz, quanto mais conhecimento
adquire, mais ele pode ganhar. O indivíduo
que busca aprender mais sobre qualquer
negócio será sempre melhor compensado.
Inúmeras são as oportunidades de
ganhos fáceis no mercado, e a ganância por
resultados imediatos faz com que muitos
abandonem a meta da poupança de longo
prazo para aposentadoria, lançando-se em
grandes aventuras financeiras.
“Protejam seus tesouros contra a perda,
investindo onde o principal esteja a salvo,
onde possa ser reivindicado sempre que o
desejarem e onde fique claro para vocês que
vão realmente conseguir uma bela renda.
Consultem homens experimentados”, afirma
Clason (2005, p. 49). O autor prossegue,
afirmando: “Sigam a opinião daqueles que
lidam habitualmente com dinheiro. Deixem que
o tirocínio deles proteja seus tesouros contra
os investimentos de alto risco” (2005, p. 49).
O conhecimento do mercado passa,
inevitavelmente, além das opções de
produtos financeiros, da destinação de uma
parcela significativa para a formação de uma
renda de aposentadoria.
2008, mantendo os mesmos níveis de renda
da população de aposentados. Para Clason
(2005, p.79), “o ouro busca a proteção do
proprietário cauteloso que o investe de
acordo com os conselhos de homens mais
experimentados em seu manuseio”.
Não se pode esquecer que a
diversificação dos investimentos é uma
das lições mais antigas do mundo e, como
já referido, os excedentes podem ser
submetidos a mercados de riscos.
Entre os piores fatores e principais
preocupações que podem advir na época
da aposentadoria está a diminuição da
renda dos trabalhadores, segundo Garcia
(2007, p. 88). A passagem da fase ativa
para a aposentadoria dos trabalhadores
que mantém o investimento em previdência
complementar é quase imperceptível, pois,
assim como outros tipos de investimentos,
o binômio contribuição versus benefício é
acompanhado por especialistas e monitorado
pelo próprio participante.
A alternativa de investimento através da
previdência complementar é o caminho mais
seguro para alcançar metas e objetivos no
futuro, sem sustos e riscos, se comparado
às alternativas disponíveis no mercado.
Este tipo de investimento é totalmente
caracterizado e pautado num horizonte
de longo prazo e sempre privilegiando a
trajetória de contribuições na fase ativa e a
segurança na aposentadoria. Neste sentido,
o segmento cresceu, especializou-se e
ofereceu boas opções quando o assunto é
investimento.
A Organização Internacional do Trabalho
– OIT estabelece que todo o trabalhador
deveria direcionar esforços no sentido
de manter o equilíbrio entre três pilares
fundamentais para assegurar uma posição
confortável na velhice. O primeiro pilar a ser
construído refere-se à previdência básica
oficial, assegurada no Brasil pelo Instituto
Nacional de Seguridade Social – INSS,
que atua de forma compulsória, ou seja,
todo o trabalhador que exerce atividade
formal registrada é obrigado a participar do
regime. Houve grandes avanços no sentido
de o Governo estender o benefício aos
5.
Mercado
de
Previdência
Complementar Fechado
O conhecimento do mercado pressupõe
entender a necessidade de se promover
a previdência complementar fechada e,
havendo excedentes, criar condições
alternativas para investimentos. Leite (1993,
p.93) acredita ser este o ponto fundamental
para o enfretamento dos problemas
financeiros que afetam o grande contingente
de aposentados no Brasil.
A recente crise financeira global
em 2008 contribuiu para demonstrar aos
idosos e trabalhadores na fase ativa que
as responsabilidades provenientes dos
fundos de pensão brasileiros passaram
pela crise sem ser afetados. Isto porque o
modelo conservador e protetivo do sistema
permitiu manter o futuro das aposentadorias
contratadas.
Assim, o Sistema de Previdência
Complementar
Brasileiro
atingiu
sua
maturidade ao enfrentar a crise financeira de
14
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
trabalhadores informais através de medidas caminho mais seguro, prático e específico
compensatórias de contribuição, inclusive com para enfrentar dignamente a fase da
a redução de alíquotas para essa categoria.
aposentadoria, não esquecendo, contudo,
O segundo pilar estabelecido pela OIT que existem outras formas inclusive apoiadas
trata da Previdência Complementar, que, pela OIT.
conforme exposto anteriormente, oferece
O planejamento financeiro pessoal
bons produtos com a segurança desejada. constitui-se da base para o início de uma
Infelizmente muitos brasileiros sequer trajetória de sucesso e permite que os
conseguem atingir o pilar da previdência indivíduos e suas famílias estejam seguros
oficial, estando ainda a
nas próximas gerações. O
trabalhadores desconhecimento e a falta
previdência
complementar Muitos
muito distante para a grande destinam grande parte do de coragem para enfrentar
maioria. Isto decorre do seu imposto de renda ao as dificuldades financeiras
analfabetismo
financeiro governo, desconhecendo existem para todos, porém o
poderiam
abater enfrentamento, a disciplina e
que impede a formação de que
até
doze
por
cento
da o controle sobre as finanças
recursos para investimentos
base
bruta
tributável
em
futuros.
são
fundamentais
para
O terceiro e último pilar favor de planos de apo- alcançar o êxito.
defendido pela OIT é a reunião sentadoria complementar.
Importante
é
não
de ativos e bens próprios que
se lançar em aventuras
foram construídos ao longo
financeiras e promessas de
da fase produtiva da vida. Muitos acreditam ganhos fáceis, pois os investimentos vêm
nesta vertente para assegurar uma velhice e vão, os mercados sobem e descem, as
tranquila. Porém, com as incertezas do mundo, economias melhoram e entram em crise.
a combinação de fatores e alternativas ainda O mundo sempre apresenta oportunidades
deve ser avaliada.
únicas, a cada dia, mas, na maioria das
Independente
da
alternativa
de vezes, não são perceptíveis.
investimentos a ser construída, o conhecimento
da lei, normativos e dos requisitos que regulam
Conclusão
o mercado é indispensável para a manutenção
A educação e o planejamento financeiro
e o crescimento dos investimentos, conforme baseiam-se no equilíbrio entre gastar, poupar
defende Barduchi (2010, p. 137). Segundo e investir em cada ciclo ou em cada fase da
o autor, o quarto passo para se atingir uma vida, sabendo fazer escolhas ou renúncias
inteligência financeira é se aproveitar da em prol de um futuro mais tranquilo.
legislação a partir de oportunidades legais,
O censo comum pouco contribuiu para
visando a um benefício direto no crescimento despertar na população a necessidade
do patrimônio.
de uma organização financeira pessoal
O
mercado
oferece
inúmeras defendida pelos autores. Na educação
oportunidades a partir de poucos investimentos, formal, desde o ensino básico até o nível
porém a utilização de instrumentos legais de graduação, as instituições educacionais
possibilita o reinvestimento e a geração não ensinam o valor do dinheiro e a lidar
de mecanismos que trabalham a favor do com questões básicas de crédito, juros,
investidor.
financiamentos e investimentos.
Inúmeros são os benefícios atingidos
A primeira lição a ser praticada para
através da previdência complementar que são elaboração e acompanhamento das finanças
desperdiçados pela falta de conhecimento pessoais é registrar sistematicamente todos
deste mercado.
os ganhos auferidos e todos os dispêndios em
Este estudo refere-se diversas vezes um determinado período de tempo, permitindo
ao segmento de previdência complementar uma visualização e um acompanhamento da
fechado pelo entendimento de que é o destinação dos recursos disponíveis.
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
O registro das movimentações entre
entradas e saídas de recursos das finanças
pessoais deve privilegiar um saldo final
positivo, considerando a necessidade
de destinar uma parcela dos ganhos em
produtos financeiros que propicie renda
adicional para momentos de incertezas.
Os conceitos básicos financeiros
que são importantes para enfrentar os
endividamentos são desconhecidos, assim
como as novas oportunidades que surgem
no mercado financeiro quando iniciada
uma disciplina orçamentária. O mercado
consumidor brasileiro privilegiou inicialmente
questões voltadas aos direitos e aos deveres
na relação de consumo, porém não buscou
esclarecimentos em relação às despesas
adicionais nos financiamentos decorrentes
das taxas de juros e despesas cadastrais,
embutidas nas transações e que acabam
elevando sobremaneira os gastos com
produtos e serviços consumidos.
Igualmente, conhecer os produtos
financeiros e avaliar o binômio risco versus
retorno é fundamental para a destinação dos
recursos reservados para esta finalidade.
Um bom planejamento financeiro
pessoal é outra iniciativa que deve ter
a finalidade de estimular a disciplina do
indivíduo na organização e na coordenação
do comportamento do padrão de vida
desejado na fase produtiva e o esperado
para aposentadoria. O planejamento
financeiro permite aumentar o padrão de
compra, fazendo economias no dia a dia e,
consequentemente, contribui para que os
recursos acumulados sejam aplicados em
atividades produtivas.
Os investimentos temporários e
permanentes dos recursos fazem toda
a diferença na seleção e priorização
de economias realizadas no presente
para proverem benefícios no futuro. A
dedicação e o apelo consumista acabam
afastando o planejamento de investimentos
permanentes, essenciais para a construção
de uma trajetória de sucesso quando se trata
de finanças pessoais.
Para o trabalhador que está pensando em
fazer economia para desfrutá-la futuramente,
na forma de renda de aposentadoria, os
investimentos permanentes através dos
planos de previdência complementar
contribuem, sobremaneira, para ampliar o
grau de conhecimento sobre sua situação,
favorecendo a tomada de decisão adequada
em cada momento da vida.
A acumulação de recursos para
a obtenção de uma renda própria na
aposentadoria pressupõe, basicamente,
algum esforço durante o período de
atividade. Os planos oferecidos pelos
Fundos de Pensão no Brasil possibilitam
fazer uma boa administração dos recursos
financeiros, uma vez que se pode considerálos como investimentos permanentes de
trato sucessivo, através de contribuições
mensais, com incentivos tributários, através
da dedução da base bruta do cálculo do
imposto de renda, e a garantia de uma
renda adicional na aposentadoria. Uma
boa gestão dos investimentos pessoais por
meio da previdência complementar envolve
também identificar planos de benefícios que
ofereçam a possibilidade de escolhas de
ativos financeiros, de acordo com o perfil de
cada investidor – conservador, moderado e
agressivo – e de acordo com a exposição de
riscos e retornos desejados.
O trabalhador brasileiro conta com
um eficiente sistema de previdência
complementar, de natureza facultativa,
e instituído para aumentar a renda do
aposentado, além de assegurá-lo contra os
riscos da perda prematura de capacidade
laborativa, em caso de doença.
Deste
modo,
a
Previdência
Complementar surge como uma opção
acessível para os indivíduos não se
aventurarem em investimentos de riscos
e fazer, através desta, a oportunidade da
ciência do dinheiro fazendo dinheiro.
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Empregabilidade: competências pessoais
e profissionais. São Paulo: Pearson Prentice
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
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O ensino de empreendedorismo em
ambientes de aprendizagem que
consideram a afetividade do aluno
Eduardo Pertille Costa Leite(1)
Resumo: O presente artigo visa a analisar metodologias de ensino do
Empreendedorismo e sua utilização na Computação Afetiva para desenvolver
ambientes de aprendizagem virtuais na formação de empreendedores.
A necessidade da inovação, criatividade e do desenvolvimento de novas
tecnologias faz com que as pessoas percebam que mudar é um fator primordial
para a sobrevivência, todavia a mudança de comportamento não significa que
houve aprendizagem, pois só há mudança de comportamento quando existe a
mudança de atitude, uma característica básica empreendedora. Para desenvolver
habilidades empreendedoras, o artigo propõe a utilização da Inteligência Artificial
através de agentes animados que, a partir de situações reais de negócios, possam
contextualizar uma efetividade didática no ensino do empreendedorismo.
Palavras-chave: Empreendedorismo. Aprendizagem. Afetividade. Inteligência
Artificial.
Abstract: This paper aims at analyzing education methodologies of entrepreneurship
and its use in the affective computing to develop virtual learning environment. The
need of innovation, creativity and development of new technologies make people
realize that changes are necessary for surviving. However, changes in behavior
do not mean that learning has happened because there was only a change
when there is an attitude change which is a basic entrepreneurial characteristic.
For developing entrepreneurial abilities this paper suggests the use of artificial
intelligence through animated agents that can contextualize an effective didactics
in teaching entrepreneurship through real business situations.
Keywords: Entrepreneurship, Learning, Affectivity, Artificial Intelligence.
Introdução
O Empreendedorismo é um neologismo
derivado da livre tradução da palavra inglesa
“entrepreneurship” e é utilizado para designar
os estudos relativos ao empreendedor, seu
perfil, suas origens, seu sistema de atividades,
seu universo de atuação. Segundo Dolabela
(1999), o empreendedorismo oferece
graus elevados de realização pessoal.
Ainda conforme Dolabela (1999), por ser a
exteriorização do que se passa no âmago de
uma pessoa, e por receber o empreendedor
com todas as suas características pessoais,
a atividade empreendedora faz com que
trabalho e prazer andem juntos.
Durante vinte anos, até a década de
1980, os comportamentalistas dominaram o
campo do empreendedorismo com grande
quantidade de pesquisas e publicações que
procuravam definir as características dos
(1)
Mestre em Políticas e Planejamento Universitário (UFSC), professor da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, professor da Faculdade
IENH de Novo Hamburgo-RS, administrador da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). e-mail: [email protected]
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empreendedores. Mas os resultados obtidos
Para
tornar
o
ensino
de
são diferenciados e muitas
empreendedorismo
mais
vezes contraditórios.
“Para tornar o ensino de eficaz, pode-se desenvolver
Até hoje, não foi possível empreendedorismo mais softwares
adaptados
às
estabelecer cientificamente eficaz, pode-se desenvol- características do aluno, ou
um perfil psicológico do ver softwares adaptados seja, permitir um ensinoempreendedor, devido às às características do alu- aprendizagem personalizado.
inúmeras
variáveis
que no, ou seja, permitir um Para tanto, verifica-se a
concorrem na sua formação ensino-aprendizagem.” necessidade
de
inserir
(Dolabela, 1999). Assim, o
“inteligência” nos softwares
perfil do empreendedor certamente será educacionais.
diferente em função do tempo que está no
O conceito de Inteligência Artificial –
mercado (empreendedores que começaram IA já foi apresentado de forma diferenciada
há dois anos têm perfil diferente dos que por vários autores, mas a melhor maneira
atuam há vinte anos). Também influem a de definir IA é mostrando a diferença entre
experiência de trabalho, a região de origem, os sistemas convencionais e os sistemas
o nível de educação, a religião, a cultura que utilizam inteligência artificial. Segundo
familiar (Filion, 1999). Portanto, pesquisas Figueiredo (1999), a grande diferença entre
nesta área devem considerar todos esses os sistemas que utilizam IA e os sistemas
elementos na amostragem, o que não foi feito convencionais é que enquanto o sistema
pelos comportamentalistas.
convencional tem como
Hoje, no Brasil, o ensino
principal
característica
de empreendedorismo tem “Intuição não é um talen- armazenar
informações,
evoluído consideravelmente. to misterioso. É o sub- registrar e controlar eventos,
produto direto do treinaInúmeras instituições de
a IA está preocupada em
mento e da experiência
ensino já possuem em q u e f o r a m e s t o c a d o s utilizar estas informações
seu currículo a disciplina c o m o c o n h e c i m e n t o . ” para auxiliar nas tomadas
de
Empreendedorismo
de decisões. Portanto, a IA
em vários cursos, mas os
tem como objetivo utilizar a
resultados concretos ainda estão abaixo dos inteligência, ou seja, as faculdades de pensar,
esperados. Uma das razões é a alta taxa de raciocinar e compreender para auxiliar na
evasão de alunos e a baixa produtividade na tomada de decisões, procurando para isto
geração de Planos de Negócios consistentes, utilizar princípios da inteligência humana.
devido às dificuldades encontradas pelos
alunos na realização de seus Planos de
1. Principais etapas da formação
Negócios. Como consequência, há uma empreendedora
queda na motivação dos alunos, o que é
1.1 Desenvolver o conceito de si
considerado um fator inibidor na formação
Toda atividade humana supõe certo
de empreendedores.
número de condições para ser exercida.
Desta maneira, muitos trabalhos
A
aprendizagem
está
muito
têm sido desenvolvidos no sentido de estreitamente ligada ao conceito de si, o qual
também promover a motivação do aluno se exprime no interior do espaço psicológico
em ambientes de aprendizagem, inclusive de cada um, ou seja, pelo espaço de si
no ensino de empreendedorismo. Além dos recebido e em seguida criado. É também o
cursos presenciais existentes, conta-se já lugar que permite exprimir a intencionalidade,
com vários softwares educativos, entre eles quer dizer, aquilo que reflete a maneira como
o MakeMoney (Dolabela, 1999) e Ottomax alguém se vê agora e no futuro. Estes são
(DORNELAS 2008), e ainda sistemas que elementos que alimentam a raiz do sistema
testam o perfil empreendedor, como o do empreendedorista – raiz esta expressa sob a
SEBRAE.
forma de visões a realizar (Filion, 1999).
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
1.2 Identificar o perfil empreendedor
A grande pergunta que os pesquisadores
se fazem é: quais são as características dos
empreendedores de sucesso? Eles têm algo
diferente dos outros? Filion (1997) acredita
que as características variam de acordo com
as atividades que as pessoas executam em
uma dada época ou em função da etapa
de seu crescimento pessoal. Isto explica
por que os pesquisadores apresentam
resultados diferentes em suas pesquisas.
E por que a preocupação em identificar o
perfil do empreendedor de sucesso? Para
que possamos aprender a agir, adotando
comportamentos e atitudes adequadas, ou
seja, as características empreendedoras
podem ser adquiridas e desenvolvidas. O
candidato a empreendedor deve identificar
as características que seu futuro trabalho irá
exigir e avaliar seu potencial em relação a
elas.
A seguir apresentamos algumas
características do empreendedor, segundo
Timmons (1994):
- tem iniciativa, autonomia, autoconfiança,
otimismo e necessidade de realização;
- tem perseverança e tenacidade para
vencer obstáculos;
- considera o fracasso um resultado
como outro qualquer, pois aprende com os
próprios erros;
- sabe fixar metas e alcançá-las; luta
contra padrões impostos; diferencia-se;
- tem sempre alto comprometimento;
crê no que faz;
- é um sonhador realista: é racional,
mas usa também a parte direita do cérebro;
- é orientado para resultados, para o
futuro, para o longo prazo;
- cultiva a imaginação e aprende a
definir visões;
- traduz seus pensamentos em ações;
- cria um método de aprendizagem:
aprende a partir do que faz; emoção e
afeto são determinantes para explicar seu
interesse. Aprende indefinidamente.
na atividade empreendedora. As crianças
parecem ser extremamente criativas e há
estudos indicando que, depois do Ensino
Fundamental, elas começam a perder esta
capacidade, pelo fato de sua vida passar
a ser estruturada e definida por valores
externos, como sistema educacional,
instituições e comunidade. De fato, as
escolas enfatizam os conteúdos intelectuais
e o rigor do pensamento lógico o que, junto
com as pressões sociais, constituem uma
séria ameaça ao pensamento criativo.
Existem técnicas e exercícios para
desenvolver um comportamento criativo.
Parece que este advém do hábito de tentar
encontrar novas ideias, novas formas de
apresentar ideias antigas, de identificar
problemas e inconsistências nos produtos
e serviços oferecidos. Tudo indica que
a criatividade é melhorada através de
muito trabalho em que a intuição deve ser
desenvolvida.
Mas o que é intuição? Intuição não
é um talento misterioso. É o subproduto
direto do treinamento e da experiência que
foram estocados como conhecimento. A
criatividade surge durante o processo de
solução de problemas que, por sua vez,
depende do conhecimento, incluindo um tipo
de conhecimento que permite ao especialista
compreender situações rapidamente e
produtivamente.
1.4
Desenvolver
o
processo
visionário
Segundo Filion (1997), existem alguns
elementos que funcionam como suporte à
formação do processo visionário: conceito
de si, energia, liderança, compreensão de
um setor de rede de relações.
Toda atividade humana supõe certo
número de condições para ser exercida.
A aprendizagem está muito estreitamente
ligada ao conceito de si, o qual se exprime
no interior do espaço psicológico de cada
um, ou seja, pelo espaço de si recebido e em
seguida criado. É também o lugar que permite
exprimir a intencionalidade, quer dizer, aquilo
que reflete a maneira como alguém se vê
agora e no futuro. Estes são elementos que
1.3 Desenvolver a criatividade
A percepção de que a criatividade
pode ser aprendida é de grande importância
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
alimentam a raiz do sistema
empreendedorista – raiz esta
expressa sob a forma de
visões a realizar.
“O Plano de Negócios é um
instrumento que permite
ao empreendedor condensar as informações que
são obtidas no mercado.”
1.5 Construir uma
rede de relações
A formação de relações pode se dar
através de dois processos:
- Direcionado, quando as relações são
mapeadas, tendo em vista a ideia de negócio
e a visão. Neste caso, as pessoas são
claramente identificadas.
- Disperso, o princípio é que qualquer
pessoa pode contribuir no fortalecimento da
visão, no momento ou no futuro, não havendo
um controle sobre quais pessoas deverão
fazer parte da rede. Como a construção de
uma rede de relações demanda muita energia
e tempo, são necessários prioridades, foco e
controle. um processo de feedback. É
a verificação dos resultados
em comparação com a meta.
Caso os resultados não sejam
satisfatórios, o caminho é
percorrido novamente.
1.7 Elaborar e concluir um Plano de
Negócios
Um Plano de Negócios deve ser
elaborado com o objetivo de identificar as
possíveis oportunidades e ameaças e de
sustentar as decisões que o empreendedor
deverá tomar para se tornar bem-sucedido.
Portanto, antes de abrir uma empresa,
é conveniente elaborar um Plano de
Negócios. Este instrumento facilitará o
planejamento. Ao mesmo tempo, evitará
que o pré-empreendedor abra uma empresa
alimentado apenas por seu entusiasmo, sem
qualquer estudo prévio.
O Plano de Negócios é, portanto, um
instrumento que permite ao empreendedor
condensar as informações que são obtidas
no mercado, buscando sensibilizar parceiros
e investidores. Através do Plano de Negócios,
podem-se verificar as diversas influências
ambientais incidentes sobre o novo negócio,
podendo, desta forma, minimizar riscos.
1.6 Avaliar condições para iniciar um
Plano de Negócios
O pré-empreendedor deve avaliar
se reúne as condições necessárias para
elaborar seu Plano de Negócios. Estas
incluem tanto aspectos pessoais, como
motivação, disposição para enfrentar a
atividade empreendedora (correr riscos),
adequação da ideia à personalidade quanto a
aspectos relativos ao negócio, como grau de
conhecimento do setor, de desenvolvimento
da ideia, do produto ou serviço, da visão
emergente e central. Enfim, o empreendedor
precisa verificar se está preparado para fazer
o Plano de Negócios.
Para tanto, o melhor caminho é
desenvolver uma atividade de aprendizado
bem definida, com objetivos próprios, pelo
qual passa o empreendedor no seu processo
de formação. Uma das formas de aprender
como desenvolver habilidades é estabelecer
metas, um objetivo a ser atingido. É o
“aprender fazendo”. O ciclo pode ser descrito
da seguinte forma: fazer sozinho algo
novo, buscando uma meta. Esta forma de
fazer normalmente leva a erros que, vistos
criticamente, transformam-se em fonte de
aprendizado para o empreendedor e gera
1.8 Capacidade para negociar e
apresentar uma ideia
A negociação é entendida como a
cooperação entre as pessoas, parceiros ou
empresas, para alcançar objetivos de tal
forma que todos saiam ganhando. Negociar é
uma atividade do dia a dia do empreendedor.
Nesta etapa, o empreendedor deve saber
estruturar a apresentação de uma ideia, saber
vendê-la, saber apresentar o próprio Plano
de Negócios. Para tanto, o empreendedor
deve conhecer técnicas de negociação.
Uma forma de desenvolver esta habilidade
é de participar de jogos e exercícios de
negociação, através de metodologias
próprias e softwares específicos.
Através de jogos empresariais, o
usuário pode praticar e conhecer suas
habilidades empreendedoras via simulação
de um ambiente empresarial real e da
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
confrontação com dilemas empresariais
onde as características empreendedoras são
mais necessárias nos dias atuais. Nos jogos,
empresas virtuais com dezenas de cenários,
animações, personagens, ambientes, sons,
estimulam a criatividade com a qual o jogador
deverá tomar decisões diárias para tornar a
empresa bem-sucedida.
A partir dos softwares hoje utilizados
no ensino do empreendedorismo, podemos
evoluir para a computação afetiva. modelo cognitivo do aluno, um modelo afetivo
que considere o histórico afetivo do mesmo:
todas as emoções que ele sentiu enquanto
usou o ambiente educacional.
Ortony, Clore e Collins (apud Vicari,
2005) construíram uma teoria baseada
na abordagem cognitiva da emoção, que
explica a origem das emoções, descrevendo
os processos cognitivos que ativam cada
uma delas. Por exemplo, a esperança
aparece quando uma pessoa desenvolve
a expectativa de que algum evento bom irá
2. Computação Afetiva
acontecer no futuro. Esta teoria resulta em
O campo da Inteligência Artificial que um modelo psicológico que explica a origem
pesquisa a emoção em computadores é de vinte e dois tipos de emoções. Este
chamado de Computação Afetiva (“Affective modelo é chamado de OCC devido às letras
Computing” em inglês). Picard (apud Vicari, iniciais dos sobrenomes dos autores.
2005) define Computação Afetiva como
As emoções também podem ser inferidas
“computação que está relacionada com, a partir do comportamento observável do
que surge de ou deliberadamente influencia aluno, isto é, das ações dele na interface
emoções”. O campo é dividido em dois ramos do ambiente educacional. Alguns exemplos
maiores de pesquisa. O primeiro estuda de comportamento observável são: tempo
mecanismos para reconhecer emoções para realizar um exercício, sucesso ou falha
humanas ou expressar emoções por na realização de tarefas, pedido de ajuda
máquinas na interação homem-computador. ou negação de uma ajuda, entre outros.
O segundo ramo investiga a simulação de Neste caso, o sistema deve realizar um
emoções em máquina (síntese de emoções) processamento sobre uma situação geradora
a fim de descobrir mais sobre as emoções de emoção e tentar inferir as emoções do
humanas e também construir robôs que usuário, usando um modelo psicológico de
pareçam mais reais.
emoções. Geralmente, o sistema infere a
A
pesquisa
sobre
emoção do aluno usando um
emoção
na
área
de “... quando o aluno encon- modelo psicológico cognitivo
Informática na Educação tra-se frustrado com sua de emoções, principalmente
situa-se
principalmente performance, ele provavel- o modelo OCC. A ideia é
no
primeiro
ramo
da mente irá abandonar a tarefa usar a informação fornecida
Computação
Afetiva, que está sendo realizada.” pelo modelo psicológico para
pois, está especialmente
construir uma interpretação
interessada em reconhecer
de uma situação do ponto de
emoções dos alunos e exibir emoções na vista do usuário e raciocinar à qual emoção
interação entre tutor artificial e o estudante.
esta interpretação leva. Por exemplo, para
Para que o sistema possa se adaptar à inferir a emoção feliz de acordo com o
afetividade do aluno, esse deve reconhecer as modelo OCC, o sistema raciocina sobre
emoções dele. Por exemplo, quando o aluno o aspecto desejável de um evento em
encontra-se frustrado com sua performance, relação aos objetivos do aluno. Se o aluno
ele provavelmente irá abandonar a tarefa (empreendedor) tem o objetivo de montar um
que está sendo realizada. O sistema precisa negócio, obter uma avaliação boa em seu
saber quando o aluno está frustrado a fim de Plano de Negócios é um evento desejável
encorajá-lo a continuar estudando e a realizar (situação) já que ele promove seus objetivos
as suas atividades. Assim, é necessário e, desta maneira, dispara emoções positivas
também que o ambiente tenha, além de um como felicidade.
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Para responder apropriadamente ao
empreendedor, o ambiente educacional
deve interpretar de maneira apropriada as
emoções dele. Por exemplo, supõe-se que
o empreendedor encontre dificuldades para
a realização de um exercício de identificar
uma oportunidade no mercado, porque
ele se encontra ansioso. Se o sistema
interpreta de maneira errada o estado
afetivo do empreendedor, ele pode mostrar
um comportamento que o tornará ainda
mais ansioso, ao invés de ajudá-lo. Desta
maneira, o sistema deve ser capaz de inferir
as emoções do empreendedor e possuir,
além de um modelo cognitivo do mesmo,
um modelo afetivo que considere os seus
estados afetivos.
Conforme VICARI (2005), devido
à tendência humana de antropomorfizar
software, recentes estudos têm mostrado
que sistemas educacionais compostos por
agentes pedagógicos animados são mais
efetivos pedagogicamente e possuem um
forte efeito motivacional no aluno devido à sua
capacidade de expressar emoções. O uso
de emoções torna possível transmitir mais
entusiasmo ao conteúdo a ser apreendido
e, então, estimula a vontade de apreender.
Alguns pesquisadores (Reilly e Bates, 1992)
acreditam que tais agentes pedagógicos
animados iriam interagir de uma maneira
mais real com o aluno, se eles possuíssem
uma arquitetura interna de emoções, se eles
se comportassem como se tivessem as suas
próprias emoções. Neste caso, o agente
tem uma arquitetura computacional que lhe
permite analisar as situações e eventos do
ambiente com algumas heurísticas que são
baseadas no modelo humano de emoções.
Desta forma, os agentes engajam o
aluno mais ativamente na sua aprendizagem,
podendo estimular reflexão e autoexplicação,
facilitando o desenvolvimento do perfil
empreendedor.
a motivadores extrínsecos (aprender
porque estará na prova). Quando motivados
intrinsecamente
tendem
a
empregar
estratégias que demandam maior esforço e
que lhes permitem passar informação mais
profundamente. Além disso, estudantes que
são orientados intrinsecamente tendem a se
implicar em tarefas desafiadoras, persistem
mais tempo em uma atividade, aceitam
de melhor maneira as suas falhas e usam
melhores estratégias de aprendizagem.
Sabe-se que mudar atitudes do ser
humano não é tarefa muito fácil, porém é
possível e viável quando demonstradas
vantagens e melhorias que acarretarão no
decorrer dos dias. Os grandes desafios são
superados quando alguém tem vontade e
acredita ser capaz de superá-los e, a partir
daí, cria alternativas e implementa as ações.
Todas essas considerações compreendem
um conjunto multidisciplinar de informações
que precisa ser integrado num trabalho
que exige mudança de comportamento,
consequentemente, mudança no sistema de
aprendizagem.
Para tanto, deve-se intensificar as
pesquisas em Ambientes Virtuais de
Aprendizagem, buscando-se através da
Computação Afetiva uma alternativa no
processo de formação de empreendedores.
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em riqueza. São Paulo: Cultura Editores
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3. Conclusões e Recomendações
Alguns pesquisadores sugerem que
o melhor aprendizado ocorre quando a
motivação intrínseca (aprender porque é
interessante e útil) é enfatizada em relação
DOLABELA, Fernando. O Segredo de
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DOLABELA, F., DoctorSys, MakeMoney.
24
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
26
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
A nota fiscal eletrônica e informatização
empresarial
Elisabeth Maria Mosele(1)
Sheila Ferreira Pereira(2)
Resumo: Essa pesquisa teve por objetivo caracterizar o grau de
informatização das empresas localizadas na região metropolitana de Porto
Alegre e a relação com a implantação da nota fiscal eletrônica (NF-e). Cinquenta
e quatro atividades econômicas iniciaram a adoção da NF-e a partir de 1o de
setembro de 2009, o que identifica plenamente o efeito dominó do SPED, pois é
um caminho sem volta, ou seja, depois que instituída a NF-e não se poderá mais
utilizar a nota fiscal impressa. Procurou-se responder questões inerentes aos
processos de emissão e contingências relacionadas com a nota fiscal eletrônica
dentro de dois grupos de empresas. O primeiro para quem já a utiliza e, o
segundo, para quem ainda não a implantou. Dentro dessa forma geral, vincula
o conhecimento à sua origem e à sua aplicação na pesquisa, quantifica-se e
apresenta-se os resultados, onde se evidencia o grau de informatização e as
estratégias governamentais para a inclusão das empresas à NF-e, bem como
os desafios, a conectividade e a relação entre informatização e transferência de
dados entre o governo e empresas (SPED).
Palavras-chave: NF-e. SPED. DANFE. Informatização Empresarial.
Conectividade. Transações Comerciais Eletrônicas
Abstract: That research had for objective to characterize the degree of
computerization of the located companies in the metropolitan area of Porto Alegre
and the relationship with the implantation of the electronic receipt (NF-e). Fifty
four economical activities began the adoption of the NF-e starting from first of
September of 2009, what identifies the effect domino of SPED fully, because it
is a road without turn, in other words, after instituted the NF-e her more it cannot
use the receipt printed. The researchers tried to answer inherent subjects inside
to the emission processes and contingencies related with the electronic receipt of
two groups of companies. The first for who already uses her and, the second, for
who still didn’t implant her. Inside in that general way, it links the knowledge to her
origin and her application in the research, it quantifies and presented the results,
where it is evidenced the computerization degree and the government strategies
for the inclusion of the companies to the NF-e. The challenges, the Connectivity
and the relationship between computerization and transfer of data between the
government and companies (SPED).
Key-words: NF-e. SPED. DANFE. Business computerization. Connectivity.
Electronic Commercial Transactions
Mestre em Administração com ênfase em Planejamento Estratégico (PUC-RIO), especialista em Administração Financeira (UNISINOS)
e Análise de Sistemas (PUC-RS); graduada em Administração de Empresas (PUC-RS). Professora da Faculdade Dom Bosco de
Porto Alegre, diretora da DIAGT (www.diagt.com.br) e EADUS (www.eadus.com). Site pessoal: www.emosele.com E-mail: emosele@
emosele.com
(2)
Graduada em Administração de Empresas (FDB-POA), graduanda do curso de Web Design (FAQI). Supervisora administrativo-financeira
da Wega Livros e Revistas e professora na Escola Técnica Sul Ensino (Gravataí-RS). E-mail: [email protected]
(1)
27
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Introdução
tecnologias de informação e comunicação
Nada se altera com maior velocidade estão sendo usadas nas empresas; b)
do que a tecnologia de informação e determinar de que forma e quais ainda estão
comunicação (TIC), principalmente no em fase de exploração pelas empresas;
século XXI. A internet domina nesse c) identificar qual a frequência e tipo de
universo, porque é um meio de comunicação transações financeiras eletrônicas utilizadas;
de amplitude global. Dentro desse mesmo d) determinar se as empresas estão
contexto de inovação e mudança que a preparadas ou se preparando para implantar
tecnologia bate as portas das empresas e não a nota fiscal eletrônica; e) verificar o grau
dá muita alternativa para ser ignorada ou não informacional das empresas pesquisadas
introduzida no mundo empresarial. Seja pelo em relação à nota fiscal eletrônica.
aspecto de concorrência, de crescimento ou
simplesmente de sobrevivência; o fato é
Metodologia
que nada mais se organiza e se estabelece
O tipo de pesquisa quanto aos fins foi
como há alguns anos atrás. As mudanças descritiva, pois expõe as características
são avassaladoras e consomem muito inerentes à conectividade em ambiente
tempo, estudo e trabalho para que sejam corporativo e à NF-e. Quanto aos meios,
efetivamente métodos que agreguem valor foi uma pesquisa de campo telematizada,
e evidenciem-se na forma de
pois a operacionalidade da
produtividade e resultados.
pesquisa foi por intermédio
desse
mesmo da Web. A população do
Dentro
do
escopo Dentro
desses projetos existem dois contexto, o governo brasi- estudo foi representada
que afetam drasticamente leiro tem, ao longo das pelas empresas situadas no
a forma de fiscalização e últimas duas ou três décadas, município de Porto Alegre e
métodos região metropolitana, cujo
controle sobre as operações implementado
de
conectividade
que cadastro tem discriminado
de negócios das empresas
permitam
estreitar
a
relação
estabelecidas no território
o e-mail no catálogo de
nacional, ou seja, o Sistema entre cidadão e Estado. empresas industriais do Rio
Público de Escrituração
Grande do Sul (SESI). A
Digital (SPED) que traz
amostragem foi determinada
novos desafios para as empresas regidas pela acessibilidade do público-alvo a que
pelo lucro real e a Nota Fiscal Eletrônica se obteve o endereço de correio eletrônico
(NF-e). Ambos incorporam estratégias do válido e os sujeitos da pesquisa foram
e-government1, pois têm sua plataforma de representados pelos respondentes dos
operacionalização baseada na conexão com questionários online.
Foi utilizado o correio eletrônico
a internet.
Dentro desse contexto pergunta- para divulgação da pesquisa por meio
se: como estão preparadas as empresas de e-mail marketing. Foram gerados dois
para essas mudanças que envolvem o formulários eletrônicos com o questionário
uso do computador, acesso a Internet e a da pesquisa: um para as empresas que já
substituição do papel impresso pela tela do tinham a NF-e implantada e outro para as
empresas que ainda não implantaram a
computador?
O objetivo geral desse estudo foi nota fiscal eletrônica; a fim de pesquisar,
determinar o impacto da implantação junto às empresas, o objeto desse estudo.
da nota fiscal eletrônica sobre o grau de Para a análise dos dados foi utilizado
informatização das empresas. Os objetivos o software estatístico SPSS versão 12.
secundários foram: a) identificar quais Ambos os questionários passaram por uma
1
E-government: Government-to-Citizen (G2C) – (governo-cidadão): entidade governamental que adquire produtos, serviços ou
informação de empresas ou de cidadãos, ou ainda, oferece esses bens a tais empresas e cidadãos. (REVISTA E-MOTION, 2003).
28
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
quantificação das respostas em escala
Likert e planificados em planilha Excel para
posterior exportação para o SPSS.
Eletrônica5 com o foco na divulgação das
informações sobre o projeto. Os quatro
principais serviços ofertados pelo portal são:
Consulta completa a uma nota fiscal
eletrônica;
Consulta de inutilização de uma NF-e;
Consulta resumo de uma NF-e;
Verificação de disponibilidades dos
serviços da NF-e na SEFAZ.
e-Government – Um Novo Modelo de
Administração Pública
A modernização da administração
pública tem por objetivo aproximar o
Governo e o Cidadão ao mesmo tempo
em que procura tornar o Governo mais
competitivo em âmbito global. Um dos
primeiros passos, adotado pelos países que
procuraram a modernização, foi conhecer
os processos de negócios e as métricas
adequadas para medir o seu desempenho.
O segundo passo foi à automatização dos
processos de negócios, buscando atingir
uma maior eficiência operacional. Por fim,
a integração dos serviços para chegar até o
Cidadão (REVISTA E-MOTIONJ, 2003).
O Projeto do Brasil e-Gov2 fornece
recomendações de boas práticas na
área digital com o intento de aperfeiçoar
a comunicação, o fornecimento de
informações e a prestação de serviços ao
cidadão por meio eletrônico pelos órgãos
do Governo Federal. Em abril de 2010 foi
lançada a Cartilha da Usabilidade na versão
1.2. Essa real preocupação em relação à
usabilidade está vinculada à necessidade de
tornar os portais governamentais acessíveis
a todo e qualquer cidadão. Portanto,
almeja a facilidade de uso, de aprendizado
e memorização das tarefas, além da
produtividade na execução das atividades e
a satisfação do indivíduo.
A adoção de TICs permite o aumento
da eficiência, eficácia e transparência
governamental. Para tal, o Governo
teve um cuidado especial com a
interoperacionalidade3, gerando padrões de
interoperacionalidade do governo eletrônico
(e-PING)4.
Dentro do contexto descrito foi
desenvolvido o Portal da Nota Fiscal
Sistema Público de Escrituração
Digital (SPED)
O SPED foi instituído pelo Decreto nº
6.022 de 22 de janeiro de 2007 e consiste na
informatização da relação ente o fisco e as
empresas contribuintes para o cumprimento
das obrigações acessórias, utilizando
certificação digital para fins de assinatura
eletrônica. É composto de três subprojetos:
escrituração contábil digital, escrituração
fiscal digital e NF-e (ambiente nacional), o
que representa uma iniciativa conjunta das
administrações tributárias governamentais,
ou seja, federal, estadual e municipal
(CUNHA, 2008).
Nota Fiscal Eletrônica (NF-e)
Cunha (2008) considera NF-e o
documento armazenado eletronicamente,
com existência apenas digital, cuja validade
jurídica é garantida pela assinatura digital
do emitente e autorização de uso pela
administração tributária antes do início da
operação. Para a emissão, o contribuinte
deverá efetuar o credenciamento junto
ao fisco e usar um sistema eletrônico de
processamento de dados.
Para complementar a conceituação
destaca-se o conceito de nota fiscal
eletrônica atribuído pela Receita Federal
do Brasil (RFB), Coordenação Geral de
Fiscalização (COFIS) e Encontro Nacional
dos Coordenadores e Administradores
Tributários
Estaduais
(ENCAT)
em
apresentação ao projeto da Nf-e:
Portal Eletrônico do Governo Brasileiro http://www.governoeletronico.gov.br/
Interoperacionalidade – a conectividade entre dispositivos
e-PING define um conjunto mínimo de premissas, políticas e especificações técnicas que regulamentam a utilização da Tecnologia
de Informação e Comunicação (TIC) no Governo Federal, estabelecendo as condições de interação com os demais poderes e esferas
de Governo e com a sociedade em geral (PADRÕES DE INTEROPERABILIDADE DE GOVERNO ELETRÔNICO).
5
Portal da NF-e http://www.nfe.fazenda.gov.br/portal/
2
3
4
29
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
É um documento emitido e armazenado
eletronicamente, de existência apenas digital,
com o intuito de documentar uma operação
de circulação de mercadorias ou prestação
de serviços ocorrida entre as partes, cuja
validade jurídica é garantida pela assinatura
digital do emitente e recepção, pelo fisco,
antes da ocorrência do Fato Gerador.
Conceituada a NF-e, entende-se a
necessidade de esclarecer alguns outros
conteúdos relacionados ao assunto abordado.
Fiscal Eletrônica7, as diretrizes do Projeto
da NF-e aponta mudanças de paradigmas
como a eliminação do papel e posteriores
despesas de armazenamento, proporciona
ao Fisco o controle em tempo real das
operações realizadas e simplificam as
obrigações acessórias aos Contribuintes
com o mínimo impacto na atividade
comercial. As empresas emitentes da NF-e
passam a utilizar a tecnologia de certificação
digital, que garantem a validade e integridade
da NF-e emitida pelo contribuinte. Este
certificado possui dados do contribuinte
emitente que comunicam à SEFAZ seus
dados cadastrais como o CNPJ.
Contribuinte Vendedor (Emissor NF-e)
De acordo com PIASSINI (2008), para
o contribuinte vendedor são esperados os
seguintes benefícios:
• Redução de custos de impressão.
• Redução de custos de aquisição de
papel.
• Redução de custos de armazenagem
de documentos fiscais.
• Simplificação
de
obrigações
acessórias (dispensa de AIDF).
• Redução de tempo de parada em
Postos Fiscais de Fronteira.
• Incentivo a uso de relacionamentos
eletrônicos com clientes (B2B).
• Domínio de tecnologia certificação
digital e web service.
SEFAZ Virtual – Ambiente Nacional
(SVAN)
A SEFAZ VIRTUAL é um ambiente
seguro de disponibilidade e desempenho
elevados
que
objetiva
assumir
as
funcionalidades das Secretarias Estaduais
de Fazenda (SEFAZ) para desenvolver o
projeto da Nota Fiscal Eletrônica. De acordo
com o manual8, as principais funcionalidades
identificadas para o ambiente de SEFAZ
VIRTUAL são:
• Manter atualizada uma base de
dados com o cadastro dos contribuintes
autorizados a emitir NF-e para cada Sefaz
cujo ambiente está integralmente suportado
por esta solução.
• Recepcionar notas fiscais eletrônicas
e lotes de NF-e.
• Processar notas fiscais eletrônicas e
lotes de NF-e.
• Autorizar notas fiscais eletrônicas e
lotes de NF-e.
• Cancelar NF-e autorizadas.
• Inutilizar numeração de NF-e.
• Disponibilizar a consulta da situação
atual de um documento de NF-e.
• Fornecer informações sobre o status
de serviço.
A SEFAZ permite, em seu ambiente de
homologação, que as empresas, depois de
Contribuinte Comprador (Receptor
NF-e)
De acordo com PIASSINI (2008), para
o contribuinte comprador são esperados os
benefícios elencados a seguir:
• Eliminação de digitação de notas
fiscais na recepção de mercadorias.
• Planejamento de logística possibilitada
pela recepção antecipada da informação da NF-e.
• Redução de erros de escrituração
devido a erros de digitação de notas fiscais.
• Incentivo a uso de relacionamentos
eletrônicos com fornecedores (B2B).
Diretizes da NF-e
Segundo o Portal Nacional da Nota
7
8
http://www.nfe.fazenda.gov.br/portal/
Portal da NF-e –para download do manual http://www.nfe.fazenda.gov.br/portal/diversos.aspx
30
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
cadastradas junto à SEFAZ correspondente
à unidade federativa (UF), possam realizar
experimentos com sua solução tecnológica
em um ambiente de testes por tempo
indeterminado. Somente após a aprovação
das equipes de TI e negócios envolvidos no
projeto é que a aplicação é transferida para
o ambiente de produção, visando o efetivo
início do processo de emissão de NF-e
válidas.
Emissão da NF-e
A emissão da NF-e pelo contribuinte é
realizada em suas instalações conforme a
Ilustração 1.
Envio
e
Recepção
pelas
Administrações das tributárias
O envio e recepção da NF-e pelas
Administrações tributárias ocorre conforme
demonstrado na Ilustração 2.
NF-e
Ilustração 2 – Envio e Recepção
pelas Administrações das tributárias
Fonte: Manual de Integração –
Contribuinte.
Padrões
Técnicos
de
Comunicação
Versão 3.0.0 – Março de 2009
Considerações sobre o envio e
recepção da NF-e
Segundo o Portal Nacional da Nota
Fiscal Eletrônica, podem ocorrer três
situações:
• Autorização de Uso
• Rejeição do Arquivo:
1. Falha na recepção do arquivo
2. Falha no reconhecimento da autoria
ou da integridade do arquivo digital
3. Remetente não habilitado para
emissão da NF-e
4. Duplicidade de número da NF-e
5. Falha na leitura do número da NF-e
6. Número da NF-e inutilizado
7. Qualquer
outra
falha
no
preenchimento ou no leiaute da NF-e.
• Denegação de Uso:
1. Irregularidade fiscal do emitente
2. Irregularidade fiscal do destinatário
3. Consulta a NF-e
A consulta a NF-e9 pode ser feita de
Ilustração 1 – Fluxo de Emissão da
Fonte: Manual de Integração –
Contribuinte.
Padrões
Técnicos
de
Comunicação
Versão 3.0.0 – Março de 2009
9
Consulta NF-e http://www.nfe.fazenda.gov.br/portal/assuntoagrupado3.aspx
31
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
percebe-se que as empresas têm um bom
grau de informatização em termos de sistema
de gestão empresarial. Em sistemas de apoio
à decisão, apenas 34,5% dos respondentes
o possui.
A maioria possui os computadores
interligados em rede local, entretanto apenas
25,5% têm extranet, ou seja, criptografia
e autenticação de senha para acesso
remoto dos sistemas, ou seja, fora do local
da empresa. Quando a questão é portal
corporativo, um ponto único de acesso a toda
informação da organização, percebe-se que
os respondentes foram coerentes e sinceros
em suas respostas, pois as estatísticas entre
extranet e portal corporativo praticamente
batem em termos percentuais e a diferença
está concentrada no desconhecimento do
respondente em relação ao tema (12,7%).
Quando o fator pesquisado se relaciona
com o interesse e conhecimento dos
respondentes em relação à NF-e, 72,7%
executaram algum tipo de pesquisa sobre a
tecnologia e o sistema envolvidos. Entretanto
identifica-se que os respondentes optaram
pela indicação do sistema a ser implantado
(63,6%).
Quando a referência passa para web,
identifica-se que todos têm conhecimento
sobre um site na internet. O Gráfico
2 apresenta 0% na opção “não tem
conhecimento”. Compreende-se melhor
o fato ao visualizar o Gráfico 3, pois uma
grande proporção de respondentes utiliza
transações online.
As próximas questões do questionário
se relacionam exclusivamente a NF-e. A
dificuldade para implantação da NF-e teve
duas opções que foram as mais referenciadas:
o cadastramento junto à SEFAZ e outros
problemas não especificados (Tabela 2).
maneira completa pelo prazo de 90 dias ou
de maneira simplificada sem limite de tempo.
Levantamento e Quantificação de
Dados
As estatísticas de envio de e-mails
marketing se encontram contabilizadas
na Tabela 1. Foram feitas validações nos
endereços de correio eletrônico existentes nas
listagens que se obteve. Em decorrência do
tempo despendido deu-se por encerrada a fase
de coleta de dados e passou-se a quantificação
das respostas obtidas com um tamanho
amostral de 55 sujeitos para NF-e implantada
e 14 sujeitos para NF-e não implantada.
Tabela 1 – Estatísticas de Envio de
E-mails
E-mails
Retornos
E-mails enviados
8.412
E-mails inválidos
4.859
E-mails válidos
3.553
E-mails equivocados
18
Anti-spam
36
Resposta automática do servidor
50
Mensagens enviadas
por questionamento dos
respondentes
Respostas validadas de empresas
com NF-e
Respostas validadas de empresas
sem NF-e
5
55
14
Pesquisa em Empresas com a NF-e
Implantada
O primeiro critério de avaliação foi
especificar o grau de informatização das
empresas respondentes. Pelo Gráfico 1
32
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
GRÁFICO 1 – Grau de Informatização das Empresas
GRÁFICO 2 – Negócios na Web
33
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GRÁFICO 3 – Transações Online
Tabela 3 – Auxílio na Preparação da
Transição para NF-e
Frequência
Absoluta
Frequência
Relativa
Frequência
Absoluta
Frequência
Relativa
Tabela 2 – Dificuldade para Implantar
a NF-e
Cadastramento na SEFAZ
Sistema utilizado sem
módulo para NF-e
Especificação de hardware
19
34,5%
Fornecedor de software
27
49,1%
7
12,7%
Contador
18
32,7%
1
1,8%
Analista de sistemas
6
10,9%
Atualização do JAVA
Condições do Banco de
dados existente
Outro problema não
especificado
Total
3
5,5%
0
0,0%
7
12,7%
1
1,8%
18
32,7%
Diretor
Outra pessoa do quadro
funcional
Consultoria
3
5,5%
55
100,0%
Total
55
100,0%
Alternativa
Alternativas
Aos questionados sobre o uso do
formulário de contingência, apenas 20%
afirmaram que já fizeram uso. Levando-se
em consideração quem o utilizou, 12,7% dos
entrevistados utilizaram por falta de conexão
com a internet. No quesito relacionado à
política, caso não haja conectividade, 18,2%
ativariam outro provedor; 41,8% adotariam a
opção de que “se não tem conexão, não emite
nota fiscal”; 34,5% utilizariam o formulário de
contingência e 5,5% adotariam outra medida
O maior impacto na escolha da NF-e foi
o preço seguido em percentuais igualitários
como segunda opção à credibilidade e outros
fatores. A maior dificuldade identificada pelos
respondentes da pesquisa foi relacionada
à complexidade de operação do sistema
da NF-e seguida pela conectividade.
Na Tabela 3 verifica-se que quem mais
proporcionou suporte à implantação da NF-e
foi o fornecedor de software seguido pelo
contador.
34
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
não especificada. De qualquer forma,
praticamente a metade dos respondentes
afirmou que o portal da SEFAZ auxiliou na
implantação da NF-e.
Na questão que envolve o tempo
que levou para a efetiva implantação da
NF-e pelas empresas respondentes, 58%
responderam que levaram de um a três
meses (Gráfico 4). No quesito custos
envolvidos na implantação da NF-e, 34,5%
afirmaram que gastaram menos de cinco mil
reais, enquanto outros 34,5% responderam
que gastaram de 5 a 10 mil reais. Apenas
16,5% gastaram de dez a quinze mil reais,
enquanto que no critério para a escolha da
certificação digital teve maior incidência: o
preço, seguido pelo atendimento e suporte.
que, em pleno século XXI, apenas 31% das
empresas tenham um sistema de gestão
empresarial.
GRÁFICO 5 – Grau de Informatização
das Empresas Respondentes
O Gráfico 6 fornece um panorama da
situação computacional e web das empresas
sem NF-e. Itens como computadores em
rede, site na web e depósitos eletrônicos
(DOC) aparecem com mais de 75% de
adesão pelas empresas respondentes.
Aproximadamente 70% tem adesão com
relação à transferência eletrônica (TED) e
53,8% com relação a serviços bancários
online com boletos eletrônicos. Por fim,
uma tendência já constatada no mercado:
as vendas online ainda não se caracterizam
como uma modalidade consagrada no
ambiente de mercado gaúcho (30,8%).
Para as empresas que ainda não
implantaram NF-e, a não escolha da
certificação digital tem como peso substancial
o quesito preço (46%) e credibilidade (23%),
que aparecem em primeiro e segundo lugar.
GRÁFICO 4 – Tempo Gasto para
Implantação da Nota Fiscal Eletrônica
Empresas
que
Ainda
Não
Implantaram NF-e
Observa-se pelo Gráfico 5 que o grau de
informatização das empresas respondentes
é disperso, mas chama a atenção o fato de
35
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Negócios pela web para empresas ainda sem NF-e Implantada
GRÁFICO 6 – Negócios na web para empresas ainda sem NF-e
O conhecimento que os respondentes
têm a respeito da NF-e é bem pouco
representativo, pois apenas 23,1% já
efetuaram algum tipo de pesquisa no Portal
da NF-e. Quanto ao planejamento para
essa nova sistemática de emissão de nota
fiscal, apenas 53,8% tê m conhecimento de
qual o período que passarão a utilizar NFe. Entretanto, o caso mais crítico ficou com
o do Portal da NF-e, pois apenas 15,4% o
conhecem (Gráfico 7).
O plano de investimentos em
informatização dos negócios das empresas
respondentes aponta que elas pretendem
investir pouco, isto é, até cinco mil reais na
proporção de 61% e de cinco a dez mil reais
(23%), segundo aponta o gráfico 8.
GRÁFICO 8 – Plano de Investimentos
das Empresas em Informatização
Análise Integrada dos Dados
No grau de informatização das
empresas percebe-se que muitas ainda
não possuem sistema integrado de gestão
e muitas nem têm conhecimento do que
é Business Intelligence (BI). A situação
torna-se preocupante quando se evidencia
que as empresas que não têm NF-e ainda
GRÁFICO 7 – Conhecimento sobre NF-e
36
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
implantada possuem 23% dos respondentes
Por fim, a pesquisa junto aos
operando, basicamente, com planilhas respondentes trouxe a informação de que
eletrônicas. Entretanto, quando o assunto é o conhecimento que tem, ou foram buscar,
redes e internet, o panorama é outro, no qual a respeito da NF-e é considerado muito
a opção “desconheço” sobre o tema é nula.
baixo, pois não alcançou nem 60% dos
As transações online são uma realidade respondentes, sendo que todos, em algum
na vida empresarial. As facilidades de operar momento, terão que emitir suas notas
na economia digital foram incorporadas eletronicamente.
pelas empresas, principalmente porque o
setor bancário brasileiro tem um alto grau de
Conclusão
informatização e impulsiona as empresas a
Essa pesquisa foi importante para
trabalharem dessa forma por questões de que se pudesse mapear a real situação
custos e agilidade.
das empresas em relação às estratégias
Em relação à dificuldade inicial para a adotadas ao SPED. Ficou bem caracterizada
implantação da nota fiscal eletrônica, a maior a dificuldade das empresas em se adaptar
frequência foi a dificuldade de cadastramento às novas sistemáticas e, realmente, elas
junto à Secretaria da Fazenda (34,5%) estão sendo “empurradas” para o caminho
seguida pelas condições do banco de dados da economia digital, da conectividade e
e a aquisição do módulo a ser incorporado da interação online em suas transações
no sistema da empresa. Deve-se evidenciar, comerciais. Da mesma forma, percebe-se
também, que praticamente metade das que as empresas têm intenções de investir
empresas respondeu que o Portal da NF-e em tecnologia. Algumas mais outras menos,
auxiliou na implantação. Os dois profissionais mas é uma fatalidade se tiverem por objetivo
mais apontados como referência para a o crescimento e a sustentabilidade.
implantação da NF-e foram o fornecedor de
A NF-e, em muitos momentos, é
software e o profissional da contabilidade. um desafio, mas à medida que for sendo
Quase 60% das empresas implantaram o utilizada pode facilitar em muito o trabalho e
sistema da NF-e em menos de três meses.
controle tanto da empresa, quanto do fisco. O
As empresas ainda se sentem Governo aumenta a eficiência da fiscalização
atropeladas pela implantação da NF-e e e do uso dos recursos; as empresas ganham
a grande maioria não tem
em termos de otimização
políticas de continência, Há também o aspecto dos processos internos e
caso não consigam emitir da
transparência
do agilidade de comunicação.
a NF-e, o que pode vir a processo, o que faz a São inúmeros detalhes,
resultar num caos eminente concorrência se tornar consistências, análises e
ao faturamento da empresa, mais leal e beneficiar medidas a serem adotadas,
caso a contingência se as empresas em termos seguidas e implementadas.
estenda por vários dias.
de
cumprimento
de Entretanto, a tecnologia não
Em
relação
à suas
responsabilidades deve ser vista como uma
certificação digital, os dois fiscais
e
tributárias. inimiga, mas uma aliada
tópicos
mais
apontados
para fazer com que trabalhos
foram preço e atendimento e
essencialmente burocráticos
suporte para quem já tem a NF-e implantada. sejam automatizados e as ações das
Para os que têm de implantar são relevantes pessoas fiquem mais centradas à tomada de
o preço e a credibilidade. No caso dos decisões e estratégias de negócios.
investimentos feitos na implantação da NF-e,
A economia digital cria desafios para
quase 70% gastaram menos de dez mil reais, as empresas, para os governos e para
enquanto que a estimativa dos que ainda não a sociedade. Na era da globalização,
implantaram a NF-e é de não ultrapassar os da informação e do conhecimento é
cinco mil reais (61%).
indispensável a utilização de tecnologias
37
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
da informação e comunicação para a plena
integração ao mercado digital. Não foi
somente o Brasil que procurou estreitar a
relação entre Cidadão e Governo, foram as
principais nações no mundo.
Esse “empurrão tecnológico” não pode
ser considerado um modismo ou uma frívola
inovação. Ela é necessária, pois a integração
do computador e o processamento de
dados originaram uma gama de dados e
informações que se tornaram intangíveis
no aspecto operacional de forma manual,
da mesma maneira que as empresas não
fazem seus registros mais manualmente,
porque seu custo operacional em termos de
pessoal e tempo incapacita-as a procederem
assim. Logo, como se detectou na pesquisa,
mesmo que não possuam um sistema
integrado de gestão, possuem planilhas
eletrônicas. Pode não ser a melhor opção,
mas diante das necessidades, elas também
cumprem seu papel.
O SPED e a NF-e podem se tornar
os pilares da inclusão digital empresarial.
Fez-se essa afirmação, porque há muitas
pequenas empresas que ainda não possuem
uma conexão de internet banda larga,
computadores interligados em rede, nem
sistemas básicos como fluxo de caixa e
cadastros de fornecedores e clientes em
meio digital, entretanto, com a adoção dos
critérios estabelecidos pelo e-Government,
isso se tornará uma realidade em breve.
MANUAL DA UTILIZAÇÃO DA SEFAZ
VIRTUAL EM AMBIENTE NACIONAL
Disponível
em
[http://www.nfe.fazenda.
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DE
INTEGRAÇÃO
–
CONTRIBUINTE. PADRÕES TÉCNICOS DE
COMUNICAÇÃO. Versão 3.0.0 – março de
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38
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Gestão estratégica de pessoas: um estudo
em empresas de prestação de serviços
produtivos e distributivos na região
metropolitana de Porto Alegre
Neuri Antonio Zanchet(1)
Fernanda Casanova(2)
Resumo
Este estudo apresenta uma pesquisa qualitativa, descritiva, baseada no
método de estudo de casos múltiplos sobre a percepção de seis profissionais de
empresas vinculadas ao setor de serviços produtivos e distributivos, na região
metropolitana de Porto Alegre, a respeito da sua área de atuação. Os dados
obtidos foram analisados nos moldes da análise de conteúdo que considerou
o teor temático das formas discursivas utilizadas pelos sujeitos. Os resultados
revelaram que: as áreas de gestão de pessoas nessas empresas, na sua grande
maioria, estão estruturadas no nível tático e não estratégico de atuação. Nas
empresas de serviços de distribuição, as práticas de gestão de pessoas são
caracterizadas como operacionais e de controle, enquanto que nas empresas de
serviços de produção, as práticas de gestão são mais abrangentes. Constatouse que os profissionais das áreas de gestão de pessoas possuem um perfil
diversificado. Verificou-se também que há dificuldade de disseminar uma nova
ideia de gestão e de visualizar as pessoas como diferencial.
Palavras-chave: Setor de Serviços. Gestão de Pessoas. Estratégia e Desafios.
Abstract
This study is based on a qualitative and descriptive approach, through
multiple case studies, about the perception on their area of expertise from six
professionals which belongs to enterprises of the productive and distributive
service sector located in the Metropolitan Region of Porto Alegre. We used a
content analysis considering the thematic tenor of the speeches. Results indicated
that the sectors of people management are mainly structured on a tatical level
instead of a strategic level. The enterprises of the distributive service area show
operational and control practices, whereas the ones of the productive service
area have more extensive practices. It was noted that the professionals of the
management area show a diversified profile. There are difficulties to spread a new
idea of management as well as to view people as a differential.
Key-words: Service Sector. People Management. Strategy. Challenges.
1. Introdução
Desde os anos 1980, fala-se da
necessidade de rever a forma de gestão e
repensar conceitos e ferramentas. Apesar
Bacharel em Administração – Habilitação: Recursos Humanos; mestre em Ciências Sociais Aplicadas; doutorando em Desenvolvimento
Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC; consultor de Empresas e professor da Faculdade Dom Bosco de Porto
Alegre. E-mail: [email protected]
(2)
Acadêmica do curso de Administração da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]
(1)
39
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
disso, pouca coisa foi proposta ao longo
O diferencial na GP reside em superar
dos anos 80; somente a partir dos anos 90 a visão tradicional da administração de
é que surgem propostas mais concretas recursos humanos que concebe as pessoas
de mudança e começamos a observar como recursos semelhantes aos demais
resultados positivos em novas formas de recursos da organização para um modelo
gerir pessoas. Coda et al (2005) diz que a de gestão gerencial e estratégico que, em
evolução iniciou a partir do pensamento muitos casos, trouxe grandes avanços
pouco estratégico (anterior à década de como, por exemplo, a introdução de novas
1980 e que resumia a área de Gestão de técnicas orçamentárias, descentralização
Pessoas (GP) ao Departamento de Pessoal administrativa de alguns setores, redução de
(DP), passando para o aparecimento de hierarquias, implementação de instrumentos
estratégias funcionais (década de 80), de avaliação de desempenho organizacional,
alcançando a proposta de desenvolvimento entre outras.
de capacidades estratégicas (nos anos
Diante dessa realidade, surgiu o interesse
iniciais da década de 90) até atingir a de caracterizar a percepção de profissionais
visão atual, que busca o alinhamento da de GP de seis empresas vinculadas ao
área de GP aos resultados
setor de serviços produtivos
estratégicos da empresa.
e distributivos na região
pesquisa
descritiva metropolitana
Essas mudanças na área A
de
Porto
de GP espelharam-se nas expõe características de Alegre, a respeito da sua
população área de atuação. Assim,
mudanças do mercado de determinada
ou
determinado
fenômeno pretende-se identificar as
trabalho e nas rupturas
(VERGARA,
2004), práticas de GP em face
verificadas no pensamento
estudando
as
relações
relacionado às estratégias
dos argumentos quanto
das empresas, notadamente entre duas ou mais ao seu papel estratégico
na discussão que se fez variáveis, sem manipulá-las na atualidade. Para tal, foi
relacionada à competitividade (KÖCHE, 2000). Os dados realizada uma pesquisa
e ao desenvolvimento de obtidos foram analisados qualitativa, descritiva. Dentro
competências
essenciais nos moldes da análise da abordagem de pesquisa
para
o
negócio
das de conteúdo segundo qualitativa,
o
“research
(BARDIN,
1995)
que design” utilizado na presente
empresas.
considerou o teor temático
Enquanto as estratégias das formas discursivas investigação é o de estudo de
funcionais
prendiam-se utilizadas pelos sujeitos. casos múltiplos, segundo YIN
(2005), no qual, a partir de
às funções clássicas e
fontes internas, levantadas in
burocráticas da área de GP,
loco, são obtidas informações
voltadas para atender a alguma demanda,
aprofundadas
sobre
o contexto das empresas
as capacidades estratégicas tinham como
participantes.
foco o estudo da cultura, das competências
e do desenvolvimento do comprometimento
dos empregados para que a empresa
alcançasse seus objetivos. A visão atual
é de que as empresas são conjuntos de
pessoas que atuam como agentes proativos
e empreendedores inovadores, que prestam
serviços aos clientes, decidam, lideram,
motivam, comunicam, supervisionam e
gerenciam os negócios das empresas. Assim,
a GP passa a ser uma responsabilidade
compartilhada por todas as lideranças na
empresa.
2. O setor de serviços: definição e
classificação
O Brasil tornou-se, nas últimas três
décadas, uma economia na qual o setor de
serviços representa quase dois terços do
emprego urbano metropolitano e responde
por mais da metade do PIB, numa trajetória
semelhante à evolução econômica dos
países desenvolvidos. Mesmo assim, o setor
de serviços é considerado ainda como a
parte menos entendida da economia.
40
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Segundo Andrade (1994, p.5)
o considerou muito mais adequada para
expressar a grande variedade de atividades
aí incluídas. A substituição da expressão
“terciário” por “serviços” foi defendida por
Clark porque esta nova nomenclatura
anunciava uma crescente diversificação. Ele
também reconhecia que algumas atividades
se orientavam quase que exclusivamente
para o consumo final, enquanto outras para
o consumo intermediário; umas utilizam
capitais enquanto outras são intensivas
em trabalho. É evidente que o próprio
desenvolvimento econômico contribuiu para
que surgissem teorias sobre a natureza e a
evolução destas atividades.
Segundo a tipologia adotada pela
Classificação Nacional de Atividades
Econômicas – CNAE (2010), os ramos de
atividade econômica estão agregados em
quatro grupos: Serviços produtivos, Serviços
distributivos, Serviços sociais e Serviços
pessoais. O critério de classificação dos
serviços nos quatro grupos principais é o
tipo de demanda. Os serviços produtivos e
os serviços distributivos são demandados
principalmente pela indústria, enquanto os
serviços sociais e pessoais se caracterizam
por serem demandados basicamente pelo
setor pessoal da economia. No presente
estudo, adequou-se esta proposta de
tipologia à classificação dos ramos de
atividade econômica disponíveis na Relação
Anual de Informação Social – RAIS, de
acordo com a CNAE. Cada ramo dos
serviços é composto de subgrupos de
setores que foram agregados de acordo com
a homogeneidade do tipo de atividade.
A definição de setor “serviços” é uma
discussão que se encontra em bases
precárias na literatura. Inicialmente esse
setor foi tratado como uma categoria residual
– por exclusão, todas aquelas atividades
que não se enquadrassem na classificação
dos setores primário e secundário eram
consideradas atividades do terciário. O setor
de serviços se caracteriza, principalmente,
pela heterogeneidade de suas atividades, o
que torna difícil uma delimitação metodológica
objetiva. As principais tentativas de elaboração
de uma conceituação mais rigorosa assentamse sobre a dicotomia bens e serviços, muito
embora o significado econômico dessa relação
não seja algo evidente.
Neste sentido, a quantidade e a
qualidade das atividades que estão contidas
na definição do que sejam serviços nem
sempre se apresentam de forma clara,
dificultando uma análise uniforme sobre
os efeitos da liberalização neste setor. O
uso de novas tecnologias vem exigindo o
aparecimento de novos serviços e fazendo de
muitos deles insumos fundamentais para os
demais setores econômicos, particularmente
para a indústria. Tais considerações
reforçam a ideia da dificuldade de se definir
adequadamente o setor serviços.
Contudo, a problemática de definição e
classificação do setor de serviço se iniciou nos
anos 30, quando os serviços passaram a ser
objeto de consideração na análise econômica,
primeiramente sob uma denominação
genérica de “Terciário”. Os principais autores
foram Fisher (1933) e Clark (1940). Fisher
(1933) foi quem propôs uma classificação
das atividades econômicas em primárias,
secundárias e terciárias, identificando-as
para cada caso concreto; para o autor a
característica do terciário é que produzia
bens imateriais. Clark, em 1940 reafirma
as ideias de Fisher (1933) quanto à divisão
da produção econômica em três grandes
setores. Em 1957, quando publicou a terceira
edição de sua obra, originalmente de 1940,
The conditions of economic progress, Clark
introduziu a expressão “Serviços” porque
2.1 Composição do setor “serviços”
2.1.1 Serviços produtivos
Os
serviços
produtivos
são
demandados, sobretudo, pelo setor industrial
da economia. Muito embora possam também
sê-lo por consumidores, os determinantes
principais da demanda desses serviços
são as decisões de investimento e produto
das empresas, uma vez que estes se
caracterizam como auxiliares ao processo
produtivo. Os serviços produtivos podem ser
oferecidos tanto por empresas individuais,
41
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
prestadoras de serviços, como podem estar
inseridos na própria corporação industrial.
Neste grupo distinguem-se quatro
subgrupos de serviços produtivos, de acordo
com a natureza da atividade econômica. A
classificação dos ramos da RAIS, segundo
a CNAE, e tendo em vista a tipologia
nos serviços produtivos, é composta por:
Serviços profissionais e de negócios;
Serviços financeiros; Serviços imobiliários;
Serviços de seguros.
que atendem basicamente à demanda
individual, são caracterizados em cinco
subgrupos, diferenciados de acordo com
a natureza da atividade econômica: hotéis,
bares e restaurantes; recreação e diversão;
serviços domésticos; serviços de reparo;
serviços pessoais diversos.
Segundo dados do Ministério de
Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior (MDIC), o setor de serviços
representou, em 2009, 68,5% do Produto
Interno Bruto (PIB) brasileiro, e respondeu
por 70% dos empregos formais. Custa
significativamente menos a criação de um
emprego em serviços do que a criação de um
emprego na indústria. Enquanto a indústria
tende à automação, à especialização do
trabalho, reduzindo a participação humana,
o setor de serviços não consegue facilmente
dispensar o elemento humano.
2.1.2 Serviços distributivos
Os serviços distributivos também se
caracterizam com serviços cuja demanda
majoritária tem origem na indústria. A
diferença fundamental que distingue os
serviços produtivos dos serviços distributivos,
é que estes não participam diretamente do
processo produtivo, mas se caracterizam
como serviços auxiliares necessários
somente após a conclusão da produção de
mercadorias. As principais funções desses
serviços envolvem atividades de transporte
de mercadorias e informações. Neste grupo
distinguem-se quatro subgrupos de ramos:
Comércio varejista; Comércio atacadista;
Serviços de transporte; Comunicações;
Serviços auxiliares.
3. A gestão estratégica de pessoas
“A gestão estratégica de pessoas é a
função gerencial que visa à cooperação das
pessoas que atuam nas empresas para o
alcance dos objetivos tanto organizacionais
como individuais” (GIL, 2001 p.17).
No entanto, a aplicação dos novos
conceitos e modelos de gestão, na atualidade,
parte da premissa da necessidade de
visualizar cada atividade dentro de um
contexto ambiental mais amplo e que se
modifica a cada momento, uma vez que
as empresas operam e funcionam em um
contexto ambiental dinâmico e complexo.
Nesse aspecto, verificou-se que as
transformações ocorridas nos modelos de
gestão influenciaram a forma de gerenciar
pessoas, alterando o perfil exigido pelas
empresas e priorizando a busca por um
profissional
autônomo,
empreendedor,
participativo e envolvido com o sucesso do
negócio da empresa na qual atua (DUTRA,
2001). Sendo assim, a gestão das pessoas
passou a ter um caráter estratégico, como
meio para a promoção de mudanças que
auxiliem para uma atuação mais eficaz
e efetiva das empresas no mercado
competitivo.
A formulação estratégica nas empresas
2.1.3 Serviços sociais
Os serviços sociais caracterizam-se,
principalmente, por representarem uma
demanda coletiva e por serem, basicamente,
não comercializáveis. Em geral são
ofertados pelo setor público e não guardam
grandes disparidades em termos de oferta
regional. O que se pode notar é a diferença
do peso da participação desse grupo na
geração de empregos no setor terciário, a
qual é resultado de estágios diferenciados
de desenvolvimento das demais atividades
do terciário. Os serviços sociais podem ser
divididos em quatro subgrupos: Serviços
públicos (vinculados à administração direta);
Serviços de Saúde; Serviços de Educação;
Serviços sociais diversos.
2.1.4 Serviços pessoais e domiciliares
Os serviços pessoais e domiciliares,
42
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
é apresentada por Albuquerque (2002, como administração de pessoal, relações
p.63) “como um processo, uma sequência industriais e administração de recursos
de etapas que permite a empresa refletir humanos (CHIAVENATO, 2009).
e definir seus propósitos, orientando e
Notadamente,
o
termo
gestão
implementando ações para atingi-las”. No estratégica de pessoas procura substituir
alinhamento da gestão de pessoas com a os termos que ainda são utilizados para
estratégia corporativa, o autor coloca uma designar os modos de lidar com as pessoas
filosofia voltada para o comprometimento em muitas empresas.
das pessoas com os objetivos da empresa,
No entanto, Gil (2001) esclarece que
partindo do pressuposto de que o os argumentos em prol dessa mudança
comprometimento dos funcionários está de nomenclatura ressaltam que os termos
diretamente relacionado com o aumento utilizados são limitados, pois implica a
de desempenho. Esta estratégia de gestão percepção das pessoas que trabalham numa
apresenta características diferenciadas da empresa.
gestão voltada para o controle, pois prevê
Assim, alguns autores adeptos da gestão
ações que propiciem melhor desempenho e de pessoas procuraram designar as pessoas
confiança mútua entre equipes de trabalho, que trabalham nas empresas não mais como
como maior participação dos funcionários recurso, mas como pessoas. Desse modo,
nas tomadas de decisões, redução de o termo gestão de pessoa evoluiu para a
níveis hierárquicos, foco no longo prazo e gestão estratégica de pessoas. Se antes esta
desenvolvimento de carreiras. Além disso, área se envolvia apenas com os processos
a análise de ambiente externo que afeta administrativos, formais, hoje, ela tem um
diretamente ou indiretamente as relações de papel muito importante nas organizações, um
trabalho e a análise das capacidades internas papel estratégico. Segundo Pereira (2008, p.
das pessoas, baseadas em competências, 48), a “área de gestão de pessoas passou
passam a ter presença nas políticas de a ter a função estratégica de atrair, reter e
gestão de pessoas. Neste sentido, a gestão motivar as pessoas necessárias à realização
estratégica de pessoas pode ser definida dos negócios da empresa”.
como uma sequência de ações adotadas,
É uma via de mão dupla, em que as
com o propósito de desenvolver equipes pessoas contribuem para que a organização
competentes, qualificadas e comprometidas prospere e esta ajuda no desenvolvimento
com os objetivos estratégicos da empresa, das pessoas. Para Dutra (2006), a gestão
a fim de contribuir para a
estratégica de pessoas é
criação e manutenção de
um processo estruturado
uma vantagem competitiva A gestão estratégica de de interação das pessoas
pessoas pode ser definida entre si e com a organização
sustentável em longo prazo.
A
perspectiva como uma sequência de ações e/ou negócio, de forma a
estratégica
tem
como adotadas, com o propósito construir um projeto coletivo
desenvolver
equipes de desenvolvimento. Na
premissa o argumento de de
competentes,
qualificadas
que a empresa deve ser vista
gestão
estratégica
de
como um sistema aberto. e comprometidas com os pessoas, os funcionários
Neste sentido, a gestão objetivos estratégicos da são considerados partes
estratégica de pessoas é empresa, a fim de contribuir integrantes da empresa,
uma função que busca a para a criação e manutenção sendo
valorizados
e
cooperação de pessoas que de uma vantagem competitiva comprometidos
com
os
trabalham nas empresas sustentável em longo prazo. objetivos da organização.
para o alcance dos objetivos,
Há um sentimento de
tanto organizacionais quanto
pertencimento, criando-se
individuais. Constitui, desse modo, uma uma relação de compromisso mútuo, no
evolução das áreas designadas no passado qual o empregador trata o funcionário não
43
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
como um custo a ser controlado, mas como
um ativo a ser desenvolvido.
Neste novo modelo, as relações entre
indivíduos e organizações são pautadas
pela reciprocidade e a gestão estratégica de
pessoa precisa ser integrada, de tal forma
que o conjunto de políticas e práticas que
a formam deve, ao mesmo tempo, atender
os interesses e expectativas da empresa
e das pessoas (DUTRA, 2006). Gerenciar
estrategicamente as pessoas é uma
ciência que, se respeitada e processada
adequadamente, certamente impactará –
no curto prazo – o sucesso sustentável de
qualquer empreendimento.
Diante disso, o desafio da gestão
estratégica de pessoas amplia-se em
grande medida pela necessidade de buscar
alternativas e incorporar mecanismos que
proporcionem aos indivíduos condições
para adequar-se a tais exigências sem
ferir a sua integridade enquanto pessoas.
Gradativamente, o conceito e as várias faces
da diversidade tangenciam as preocupações
dessa área, fazendo com que os dirigentes
passem de uma visão burocrática para uma
visão estratégica que, de acordo com Becker
et al (2003), implica em evoluir de uma
perspectiva com ênfase na conformidade e
nas funções tradicionais de pessoal para uma
perspectiva com ênfase na implementação
da estratégia.
Os principais desafios para a gestão
estratégica de pessoas, segundo Gil (2001,
p.17) são:
- Ambientais: as grandes revoluções
tecnológicas e de comunicação, globalização,
ampliação do setor de serviços, diversificação
da força de trabalho e a ampliação do nível
de exigência do mercado.
- Organizacionais:
competitividade,
integração dos empregados à cadeia de
valor descentralização, terceirização, cultura
organizacional, entre outros.
- Individuais: identificação do funcionário
com a empresa, conduta ética, produtividade,
segurança no emprego, qualidade de vida e
manutenção dos talentos.
De acordo com Gil (2001, p.32), “desafios
ambientais são forças externas às empresas”.
Essas influenciam de forma significativa o
desempenho e estão fora do seu controle.
Já os desafios organizacionais e individuais,
segundo Gil (2001, p. 38), “decorrem de
problemas internos das empresas”. Afirma
ainda que estas podem ser “subproduto das
formas ambientais, pois nenhuma empresa
opera no vácuo”, ou seja, toda empresa está
fundamentada em algum objetivo.
Segundo Fisher e Albuquerque (2001,
p. 16) os desafios são: atrair, capacitar
e reter talentos; gerir competências;
gerir conhecimento; formar novo perfil
do profissional demandado pelo setor;
gerir
novas
relações
trabalhistas;
manter motivação/clima organizacional;
desenvolver uma cultura gerencial voltada
para a excelência; RH reconhecido como
contributivo para o negócio; RH reconhecido
como estratégico; conciliar redução de
custo e desempenho humano de qualidade;
equilíbrio com qualidade de vida no trabalho;
descentralizar gestão de RH.
4. Apresentação e análise dos
resultados
As áreas de gestão de pessoas das
empresas envolvidas na pesquisa estão
estruturadas, na sua grande maioria, no
nível tático e não estratégico de atuação.
Tem por objetivo otimizar determinada área
de resultado e não a empresa como um todo.
Nas empresas ligadas ao serviço de
distribuição, a área de gestão de pessoas
se caracteriza pela pouca autonomia em
termos de políticas de gestão ou mudanças
nos modelos de gestão de pessoas.
Estruturalmente, a área está vinculada
à gerência administrativa, política e
tecnicamente, à direção da empresa.
Já nas empresas de serviços de
produção, duas das três áreas de gestão
de pessoas estão subordinadas à gerência
administrativa da empresa. Neste caso,
destaca-se que a área de gestão de pessoas
tem um papel estratégico na empresa,
atuando tanto no nível decisório quanto na
implementação das ações da empresa.
Este tipo de vínculo foi observado em
duas empresas pesquisadas, nas quais os
44
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
profissionais têm um papel estratégico na predomínio de funções operacionais.
definição e no desenvolvimento de atividades
Já nas empresas de distribuição,
que extrapolam a gestão de pessoas encontraram-se, em sua maioria, empresas
tradicional. Sua atuação é de assessoria, o com áreas pouco estruturadas e pouca
que demonstra as novas tendências para as autonomia, com atribuições clássicas de
quais se volta a área de gestão de pessoas gestão de pessoas e não formalizadas no
das empresas.
contexto da estrutura da empresa. Tal quadro
Em relação à estrutura de gestão de pode decorrer do tamanho da empresa e do
pessoas das empresas estudadas, vale grau de profissionalização administrativa em
ressaltar que na maioria das vinculadas aos que se encontra, bem como pelo modo como
serviços de produção, a área se restringe à está estruturada em termos de natureza do
ao profissional de gestão de pessoas. Isto é, a negócio: normalmente são constituídas por
área de gestão de pessoas não é formalizada vários sócios de área e cultura diferentes,
na empresa, mas sim o profissional que está não percebendo que sua empresa tem toda
vinculado à direção da empresa.
uma complexidade a ser gerenciada para
Contudo, o que se observou em que possa funcionar adequadamente.
depoimentos
de
alguns
profissionais
Em relação ao perfil dos profissionais de
entrevistados foi a grande dificuldade de gestão de pessoas das empresas abordadas
se disseminar uma nova ideia de gestão e neste estudo, eles possuem um perfil bem
o princípio de que as pessoas podem ser o diversificado. A amostra foi representada por
diferencial dentro da empresa. Considerando cinco homens e uma mulher, sendo que dos
que nessas empresas a direção, em sua seis profissionais entrevistados, apenas quatro
maioria, é assumida por
possuem curso superior em
profissionais da área técnica, O conhecimento da área diversas áreas como segue:
é comum perceber-se o em que se atua como Administração, Engenharia,
seu despreparo acerca de gestor de pessoas torna- Sistemas de informação e
princípios básicos de gestão, se fundamental para uma Economia. Apesar da suposta
notadamente na gestão análise mais consubstan- discrepância na relação entre
da
realidade, formação acadêmica e função
das
pessoas.
Exemplo ciada
para
o
planejamento
e profissional, destaca-se que
disso é a constatação sobre
a
tomada
de
decisões.
a dificuldade em serem
três entrevistados têm cursos
aprovados
programas
de pós-graduação em nível
de treinamento, capacitação para os de especialização em Gestão de Pessoas.
funcionários que necessitam aperfeiçoar-se
No caso das empresas do setor de
para melhor executarem seu trabalho. Por serviços, esse quadro demonstra que a
terem uma visão muito técnica, os dirigentes gestão de pessoas nas empresas estudadas
parecem não perceber tal necessidade, não está necessariamente exigindo uma
bem como a importância na modificação formação específica em gestão. Todavia
de rotinas e definição de ações voltadas às sabe-se que o conhecimento da área
pessoas, que seriam básicas e essenciais em que se atua como gestor de pessoas
para melhorar o seu desempenho, mas que torna-se fundamental para uma análise
são por eles negadas.
mais consubstanciada da realidade, para o
Em relação às características das planejamento e a tomada de decisões. No
áreas de gestão de pessoas nas empresas caso de profissionais graduados nas áreas
estudadas pode-se dizer que foram que não são de gestão, a gestão tende a
identificadas duas situações ao mesmo tempo limitar-se ao controle mais burocrático ou a
contrastantes e contraditórias. Nas empresas práticas essencialmente operacionais, sem
de serviço de produção, a área de gestão de necessária abordagem a outros aspectos
pessoas tem atribuições específicas, porém que são importantes para a integração dos
ainda conservadoras e centralizadas, com o funcionários à missão organizacional.
45
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Outro aspecto ligado ao perfil dos
profissionais entrevistados é o tempo de
serviço na área de gestão de pessoas. Dos
entrevistados, dois estão na área há menos
de um ano, três profissionais atuam entre um
ano e meio e seis anos, um atua há mais de
quatorze anos.
Constatou-se, também, que 83,33% dos
profissionais entrevistados têm mais de 45
anos de idade. Isso pode explicar as razões
de a maioria das referidas empresas ainda
estarem atuando sob um enfoque de gestão
de pessoas mais tradicional. Os profissionais
não desenvolveram uma visão mais holística
para gerir as pessoas da empresa, pois já
assumiram uma cultura que pode não aceitar
muito facilmente as mudanças.
Dessa forma, pode-se afirmar que o
perfil do gestor de pessoas também influencia
as formas de comportamento empresarial.
Caso as empresas não estejam preparadas
para enfrentar as mudanças necessárias com
o passar dos anos, elas poderão apresentar
limitações no seu funcionamento interno, seja
pela ineficiência das rotinas desenvolvidas
nas áreas de gestão de pessoas,
pelas dificuldades de relacionamento
organizacional, ou até mesmo pela falta de
motivação dos seus funcionários.
Quanto às principais atividades que
os profissionais das áreas de gestão de
pessoas desenvolvem, constata-se que
os entrevistados desenvolvem diversas
atividades com o intuito de atingir os objetivos
organizacionais. Alguns com maior ênfase
em procedimentos legais e burocráticos,
meramente rotineiros, outros em manutenção
de pessoas, de um modo geral todos
coordenam atividades relacionadas aos
subsistemas de gestão de pessoas.
Nas empresas de serviços de
distribuição, as práticas são caracterizadas
principalmente como operacionais e de
controle. Nesse sentido, são desenvolvidas
atividades, como controle da vida funcional
do funcionário, controle de ponto, férias,
vale-transporte e vale-alimentação.
Já nas empresas de serviço de produção,
as práticas de gestão de pessoas são mais
abrangentes. A maioria das áreas de gestão
de pessoas atua em todos os processos
ligados à área de gestão de pessoas,
responsabilizando-se desde a admissão do
funcionário até o desligamento da empresa.
Nesse sentido, a área desenvolve atividades
de recrutamento, seleção, programas de
treinamento e desenvolvimento, programas
de benefícios e remuneração.
Destacou-se, dentre as empresas de
serviço de produção envolvidas na pesquisa,
uma que tem na área de gestão de pessoas
o principal suporte em termos de gestão
organizacional. A área atua em todas as
frentes da empresa, descentralizando a
função e preparando outros chefes para
atuarem como gestores de pessoas.
Nas empresas de serviço de distribuição
fatores como a pouca qualificação de
pessoas que ocupam cargos estratégicos, o
desvio de função, o desinteresse por parte
da direção com relação à importância da
área de gestão de pessoas, dentre outros,
contribuem para uma avaliação negativa da
gestão de pessoas.
Em algumas empresas de serviço de
produção abordadas, por outro lado, pôdese constatar na prática, que quase sempre
os funcionários são vistos como funcionários
que trabalham em equipes, existindo a
interdependência entre os colegas e as
equipes de trabalho; o conhecimento e
o talento individual são valorizados na
empresa, a prioridade é o atendimento e
a satisfação dos clientes e o funcionário
deve atuar vinculado à missão e à visão
da empresa. Porém, alguns fatores que
caracterizar a visão de pessoas como
recursos, também são observados em
algumas dessas empresas.
Quanto aos pontos fortes da área
de gestão de pessoas, de acordo com
os profissionais entrevistados, estão os
relacionados com os benefícios oferecidos
bem como a preocupação com a integração
dos funcionários. Os pontos fracos referemse à falta de apoio do corpo diretor e a
escassez de recursos para investir na
qualificação profissional dos funcionários.
Em termos da percepção dos
profissionais quanto aos objetivos, funções
46
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
e importância da área de gestão de pessoa
na empresa, a maioria dos profissionais
entrevistados reconhece a área de gestão de
pessoas como o mais importante da empresa.
Percebem que o desempenho eficiente da
empresa e o clima organizacional favorável
só se estabelecem se houver uma gestão
de pessoas bem estruturada e que trabalhe
em conjunto com os níveis estratégicos e
gerenciais da empresa.
Em relação às atividades desenvolvidas
pelas áreas de gestão de pessoas, os
entrevistados das empresas de distribuição
manifestaram-se no sentido de que na maioria
das empresas não são atingidos os reais
objetivos da área. Dentre as justificativas
dessa manifestação, estão a centralização
tanto administrativa como de recursos que
impede ações mínimas de gestão de pessoas
e a falta de preocupação dos dirigentes com
a área de gestão de pessoas.
Nas empresas de serviço de produção,
por sua vez, a maioria dos profissionais
percebe que por meio das suas atividades
desenvolvidas consegue atingir seus
objetivos, pois cada funcionário possui a sua
meta, o que permite a observação concreta
dos resultados da política implantada e da
sua operacionalização pela empresa.
funcionários autonomia suficiente para que
eles próprios diagnostiquem, analisem e
proponham soluções para determinados
problemas ligados ao dia a dia de trabalho de
sua área. Os profissionais revelaram também
ter consciência da influência que a área de
gestão de pessoas exerce na empresa como
um todo. Por isso, percebem a importância
de se dar aos funcionários autoridade e
responsabilidade, independência e autonomia
em suas tarefas, de forma que tomem
decisões como se fossem donas do negócio.
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Conclusões
De acordo com a pesquisa, a percepção
dos profissionais da área de gestão de pessoa
nem sempre demonstra a realidade como é
tratada a área nas empresas de prestação de
serviço de produção e distribuição. Por se tratar
de empresas de natureza técnica e voltadas à
produção de serviços, observa-se uma maior
preocupação com os resultados do que com os
processos. Neste sentido, os profissionais de
gestão de pessoas demonstraram que apesar
de perceberem a área de gestão de pessoas
como sendo de fundamental importância, as
empresas, em sua maioria, têm a visão dos
funcionários ainda como recursos que estão ali
somente para produzir e dar retorno financeiro
para a empresa.
Contudo, revelaram que essa percepção
vem mudando e a área de gestão de pessoas
precisa cada vez mais conferir aos seus
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48
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
A gestão em cursos de educação a
distância à luz dos fatores críticos de
sucesso
Daniela Rodrigues Cunha Retamal(1)
Resumo: Este artigo trata de um estudo que analisa os Fatores Críticos
de Sucesso (FCS) relacionados com os elementos de gestão em cursos de
educação a distância (EAD) via internet. A metodologia da pesquisa é o estudo
de casos-múltiplos baseado nos Cursos de Graduação em Pedagogia –
Licenciatura (PEAD), e de Graduação Tecnológica – Planejamento e Gestão Para
o Desenvolvimento Rural (PLAGEDER) da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS). Os resultados demonstram que os cursos recebem recursos
do Ministério da Educação (MEC) e, portanto, é necessário definir parâmetros
de qualidade e estipular critérios para alocação e gerenciamento dos mesmos.
Neste sentido, percebe-se a importância de identificar os FCS relacionados com
os elementos de gestão, a fim de auxiliar no processo de gerenciamento.
Palavras-chave: Educação a Distância. Qualidade do Ensino. Elementos
de Gestão. Fatores Críticos de Sucesso.
Abstract: This article aims at analyzing the Critical Success Factors
(CSF) associated with management elements used in distance learning courses
(DLC) via the Internet. The research methodology is the study of multiple cases
based on the Undergraduate Course in Pedagogy – Teaching (PEAD) and on
the Technological Undergraduate Course – Planning and Management for
Rural Development (PLAGEDER) of Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS). Results showed that DLC receive resources from the Brazilian
Ministry of Education and, therefore, it is necessary to define quality parameters
and establish criteria for resource allocation and management. In this sense, it is
important to identify the CSF associated with management elements to assist in
the management process.
Keywords: distance learning, quality of education, management elements,
critical success factors.
1. Introdução
Este artigo apresenta parte dos
resultados de uma tese de doutorado1
que trata da análise dos Fatores Críticos
de Sucesso (FCS) relacionados com os
elementos de gestão em cursos de educação
a distância (EAD) via internet. O estudo
buscou entender como ocorre a gestão,
mediante a utilização e gerenciamento dos
recursos disponíveis.
Nos últimos anos, o acelerado
desenvolvimento científico e tecnológico
(1)
Doutora em Informática na Educação pela UFRGS. Professora da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: drcunha0408@
globo.com
1
Tese sob o título: A gestão em cursos de educação a distância via internet: uma visão a partir dos fatores críticos de sucesso,
apresentada em 2009, em cumprimento às exigências do Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (PPGIE/UFRGS), para obtenção do título de doutor.
49
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
gerou mudanças constantes nos diversos
segmentos da sociedade. O desenvolvimento
de
Tecnologias
de
Informação
e
Comunicação (TIC) provocou um grande
impacto no segmento educacional, no
qual a incorporação destas tecnologias às
formas tradicionais de ensino impulsionou a
modalidade de EAD. Para Moore e Kearsley
(2008), essa modalidade de ensino é
entendida como um aprendizado planejado
que ocorre normalmente em um lugar
diferente do local de ensino. Portanto, exige
técnicas especiais de criação do curso e de
instrução, comunicação por meio de várias
tecnologias e disposições organizacionais e
administrativas especiais.
As Instituições de Ensino Superior
(IES) vivem num ambiente de mudanças
e transformações que desafiam suas
tradicionais estruturas e suas estratégias.
Dessa forma, é possível dizer que a lentidão
no processo decisório, a burocracia interna,
a qualidade docente e discente, aliadas ao
amadorismo de aspectos relacionados à
gestão, contribuem para um desempenho
pouco eficiente e eficaz. Entretanto, algumas
instituições já perceberam esta realidade
e vêm procurando incorporar uma nova
postura estratégica em busca de melhorias
na sua gestão.
A gestão em EAD é vista como um espaço
sistêmico, descentralizado e ético, o que exige
a flexibilidade dos processos, postura de
escuta, valorização do outro e a potenciação
do crescimento do capital intelectual, alicerce
mais importante da instituição (POLAK et al.,
2008). Nessa ótica, observa-se a necessidade
de funcionamento do sistema como um
todo, a partir da definição dos objetivos
educacionais, das atividades desenvolvidas,
dos mecanismos de apoio à aprendizagem,
das tecnologias a serem utilizadas e das
formas de avaliação. Assim é possível dizer
que modalidade de EAD exige dos gestores a
padronização de alguns aspectos, que visem
assegurar a condução do processo de forma
sistematizada e com qualidade.
2
3
Neste
sentido,
a
SEED2/MEC3
apresenta um documento com a definição
de Referenciais de Qualidade para a EAD.
A partir de uma reflexão dos indicadores
apresentados, percebe-se a importância
de definir princípios, diretrizes e critérios
que sejam referenciais para as instituições
que ofereçam cursos na modalidade a
distância. Isso permite dizer que, pelo fato
destes aspectos estarem relacionados com
a gestão, é fundamental que se estabeleçam
estratégias e mecanismos para que o sistema
funcione conforme o previsto.
Para auxiliar no desenvolvimento do
presente estudo, uma abordagem teórica, que
é usada no meio empresarial, foi adaptada
para a área acadêmica e educacional.
Devido à diversidade de recursos a serem
gerenciados, e para entender como ocorre
o processo de gestão, focalizou-se na
identificação dos FCS relacionados com os
elementos de gestão. Percebe-se que esta
relação poderá auxiliar os gestores no que
se refere ao gerenciamento dos recursos e
ao processo de gestão em cursos de EAD
via internet. Os elementos foram definidos
com base na literatura e pela análise
conjunta da autora e especialistas. Desta
forma, destacam-se como elementos de
gestão: a qualidade, o gerenciamento, a
infraestrutura, os recursos humanos, os
recursos financeiros, e o modelo pedagógico.
Neste estudo, a natureza é de caráter
qualitativo e a estratégia de investigação é
a do estudo de casos-múltiplos. Este artigo
está organizado em seções apresentadas a
seguir.
A seção 2 apresenta o contexto da
EAD, que é entendida como um aprendizado
planejado que ocorre normalmente em um
lugar diferente do local do ensino. Neste
sentido, essa modalidade de ensino exige
técnicas especiais de criação do curso e de
instrução, comunicação por meio de várias
tecnologias e disposições organizacionais e
administrativas especiais A seção 3 explora
o conceito de gestão em EAD e oportuniza a
SEED – Secretaria de Educação a Distância.
MEC – Ministério da Educação.
50
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
reflexão sobre a importância de considerar o
elemento qualidade no processo de gestão.
A seção 4 aborda a teoria dos Fatores
Críticos de Sucesso (FCS). Também
oportuniza uma reflexão do resgate teórico
envolvendo aspectos relacionados à gestão
e aos FCS, permitindo a definição dos
elementos de gestão.
A seção 5 apresenta os resultados dos
estudos de caso, que teve como unidades
de análise dois cursos de graduação a
distância desenvolvidos e implementados
na Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS). Neste caso, o curso de
Graduação em Pedagogia – Licenciatura
(PEAD); e o curso de Graduação
Tecnológica – Planejamento e Gestão para
o Desenvolvimento Rural (PLAGEDER). A
conclusão é abordada na seção 6. E por fim,
na seção 7 são apresentadas as referências
bibliográficas.
de estudantes; e) emprego de tecnologias de
informação e comunicação (TIC’s).
Nesse
sentido,
percebe-se
a
necessidade de manter a qualidade do
ensino superior e intensificar sua expansão e
diversidade. De acordo com Moraes (2007),
o ensino superior abre-se para a EAD, porém
permanece atento às necessidades, às
capacidades, às tradições e aos valores de
países e culturas particulares dos contextos
onde atuam.
Na literatura, o conceito de EAD
varia de acordo com o pensamento de
cada autor. Na visão de Peters (2001) é
entendida como um método racional de
compartilhar conhecimentos, habilidades e
atitudes, através da aplicação e divisão do
trabalho e de princípios organizacionais,
bem como pelo uso extensivo de meios de
comunicação, especialmente para produzir
materiais técnicos de alta qualidade. De
acordo com Moore e Kearsley (2008), é
2. O contexto da Educação a Distância definida como um aprendizado planejado
A EAD pode ser caracterizada como que ocorre normalmente em um lugar
uma modalidade de educação a distância que diferente do local de ensino, exigindo
ocorre através da comunicação mediada por técnicas especiais de criação de curso e de
computador, seja de forma
instrução, comunicação por
EAD
apresenta meio de várias tecnologias e
síncrona ou assíncrona. Para A
que disposições organizacionais
Roesler (2008), na EAD a características
contribuem
para
a e administrativas especiais.
aprendizagem é viabilizada
democratização
do
a
estudantes
remotos,
Pelo fato de ser considerada
geograficamente dispersos, acesso ao conhecimento, uma
aprendizagem
e que passam a contar diversificação no processo planejada, requer técnicas
aprendizagem
e especiais de design de
com
uma
infraestrutura de
ampliação
dos
espaços
institucional para atender
cursos, de planejamento
Essa instrucional
as
suas
necessidades educacionais.
e
métodos
modalidade proporciona especiais de comunicação.
educativas.
Ao
apresentar
as acesso aos conteúdos dos Assim,
entende-se
que
características
dessa cursos e ainda permite essa modalidade de ensino
modalidade
de
ensino, a formação contínua de deve se organizar segundo
Velandia (2004) traz a noção profissionais que atuam metodologia,
gestão
e
de um sistema aberto, em uma sociedade em avaliação peculiares.
mudança.
flexível e disponível em constante
Diante
desse
qualquer
instante.
Com
contexto, percebe-se que a
isso, percebe-se que o enfoque pedagógico revolução das tecnologias da informação e
deve proporcionar: a) estudo autônomo e comunicação (TIC) está reduzindo o prazo
independente do estudante; b) liberação de validade dos modelos até então utilizados
das restrições de tempo e de espaços; e facilitando a quebra dos paradigmas mais
c) orientação acadêmica por docentes e resistentes. A EAD apresenta características
tutores; d) espírito cooperativo entre o grupo de flexibilidade de espaço e tempo que
51
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
podem se adaptar às diversas demandas.
O grande diferencial da EAD está em
proporcionar ao aluno a opção de escolher o
próprio local e horário de estudo. Para Sartori
e Roesler (2005), possibilita aos estudantes
que não podem frequentar a educação
presencial à recepção de mensagens
educativas onde quer que estejam. Portanto,
pode-se dizer que essa modalidade de
ensino facilita o acesso aos conteúdos de
estudo, favorece o diálogo com a instituição
de ensino e elimina a necessidade de
presença física.
O desenvolvimento da EAD gera novos
processos na organização, no funcionamento
e na gestão das universidades tradicionais.
Esta modalidade de ensino requer novas
estratégias de gerenciamento acadêmico
(serviços aos estudantes e docentes);
pedagógico (processos e metodologias de
ensino e aprendizagem que potencializem
a formação e a aprendizagem em rede);
tecnológico (softwares de apoio e de gestão
dos processos e dos serviços); articulação
com a estrutura da própria universidade; e
avaliação permanente e integral do sistema
(ROESLER, 2008). Neste sentido, observase que a instituição de ensino precisa
apresentar em seu modelo de gestão um
atendimento eficaz e eficiente de forma a
consolidar os serviços nas áreas acadêmica,
administrativa e pedagógica.
De acordo com Polak et al. (2008),
o advento do uso das tecnologias na
educação traz consigo a necessidade de
uma redefinição do conceito de gestão em
EAD. O paradigma que norteia a gestão
é o mesmo que determina mudanças na
sociedade globalizada.
Para compreender a gestão em EAD é
preciso registrar que antigamente o enfoque
era prescritivo e normativo, definindo a gestão
como previsão, organização, comando,
coordenação e controle (CHIAVENATO,
2004). Atualmente estas funções deram lugar
ao planejamento, à organização, à direção e
ao controle (POLAK, 2006; DUARTE, 2007).
Na realização desse conjunto de funções, a
gestão em EAD é entendida como um espaço
sistêmico e descentralizado, o que exige
a flexibilidade dos processos, postura de
escuta, valorização do outro e a potenciação
do crescimento do capital intelectual, alicerce
mais importante da instituição (POLAK et al.
2008). No que se refere ao espaço sistêmico,
pode-se destacar que este é descentralizado,
dinâmico, criativo, multidisciplinar, e a
mediação humana e tecnológica é vital para
assegurar o alcance dos objetivos e o foco
da gestão.
De acordo com Moraes (2007), a
gestão em EAD precisa contemplar algumas
dimensões. Percebe-se que inserir nas
3. A Gestão em Educação a Distância
Segundo Rumble (2003), a gestão
pode ser entendida como um processo que
possibilita o desenvolvimento de atividades
com eficiência e eficácia, a tomada de
decisão considerando as ações que forem
necessárias, a escolha e verificação da
melhor maneira de executá-las. Dessa forma,
torna-se necessário considerar as funções
de planejamento, organização, direção e
controle, onde cada função é responsável
por desenvolver ações que contribuirão para
o melhor gerenciamento dos processos.
Para Abu-Duhou (2002), citado por
Moraes (2007), a gestão em educação requer
autonomia e distribuição do poder de decisão,
onde os envolvidos devem estar vinculados
em um mesmo propósito. Portanto, percebese que o processo de gestão compreende
autonomia, organização, implementação e
controle dos recursos.
Diante desse contexto observa-se que
todo o processo da EAD faz parte de uma
estrutura, na qual esta deve ser organizada
para que funcione em perfeita sintonia. Para
Rezek Neto (2008), vê-se a necessidade
do trabalho diferenciado da equipe gestora
da instituição de ensino, juntamente com
o grupo de apoio (professores autores e
tutores, designer instrucional). Diante disso,
percebe-se a importância da elaboração
de um currículo e um projeto de curso
condizente com a realidade local do aluno,
preocupando-se com o aspecto formativo,
qualitativo e quantitativo do conteúdo que
será trabalhado.
52
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
políticas e na estrutura funcional das IES um
programa de EAD requer a determinação
em nível de políticas e planejamentos
institucionais. Para tanto, deve-se considerar
os aspectos culturais e de resistência à
inovação. Essas percepções evidenciam
a necessidade de uma organização
institucional cuidadosa, para que a EAD se
integre às políticas e ações em todas as suas
dimensões.
Diante desse contexto, a gestão em
EAD é vista como um espaço sistêmico.
Entretanto, para assegurar que esta ocorra
de forma sistematizada é preciso refletir sobre
a importância da qualidade no processo de
gestão.
De acordo com Teperino et al. (2006),
o conceito de qualidade está associado
à excelência, consecução de objetivos,
eficiência
e
eficácia,
conformidade
às especificações e preservação de
características fundamentais.
Atualmente, pode-se dizer que a
qualidade tem um papel importante na
educação. Neste sentido, a qualidade
envolve: processo de ensino e aprendizagem;
programas; recursos humanos, físicos e
tecnológicos; alunos e gestores. Portanto,
faz-se necessário que as instituições de
ensino tenham consciência dos benefícios
proporcionados a partir do desenvolvimento
de ferramentas e instrumentos para a gestão
da qualidade de programas educativos.
Conforme Oliveira (2007) existem
alguns fatores relacionados a uma qualidade
de ensino, como sendo: organização
pedagógica da gestão e participação,
a efetividade do processo de ensino e
aprendizagem, os recursos humanos,
o envolvimento dos atores, a cultura, o
contexto da organização e a participação
dos atores envolvidos no processo ensino e
aprendizagem.
que dão qualidade a um curso podem ser
destacadas: a efetividade; a eficiência; a
pertinência; a acessibilidade; a oportunidade;
a atualidade; e a aceitabilidade. Neste
sentido, educar no contexto da EAD consiste
em desenvolver estratégias pedagógicas,
investir na capacitação dos atores envolvidos
(administrativo, professores, tutores, equipe
de apoio) e buscar mecanismos que possam
assegurar uma educação de qualidade.
4. A Gestão a partir dos Fatores
Críticos de Sucesso
O termo Fatores Críticos de Sucesso
foi introduzido por Rockart (1979).
Os
FCS consistem em fatores essenciais,
fundamentais para alcançar objetivos,
estratégicos ou táticos de uma organização
(TESTA 2002; ROCKART, 1979). Dessa
forma, estes fatores constituem áreas de
atividades que devem receber uma atenção
constante dos gestores.
Para Odilon (2006), o modelo dos FCS
apresenta algumas vantagens como sendo a
facilidade de entendimento e de monitoração,
tendo em vista que a dinâmica de elaboração e
controle dos mesmos é contextual, adaptável
e evolutiva, sendo voltada para a visão de
futuro de qualquer ramo de negócio. Estes
fatores têm sido aplicados em organizações
por diversas razões (Stollenwerk, 2001),
como por exemplo, (1) como ferramenta para
gerentes refinarem seus mapas mentais;
e (2) método para auxiliar na definição das
habilidades, tecnologias e conhecimentos
considerados como essenciais.
A amplitude de aplicação deste modelo
oportuniza uma reflexão sobre a importância
de considerar os FCS na gestão de cursos
em EAD. Entretanto, as instituições podem
ter fatores diferenciados, em função da
estratégia adotada, onde a identificação de
tais fatores pode contribuir para um melhor
gerenciamento de cursos na modalidade a
distância via Internet.
Para tanto, se faz necessário entender
que um dos principais objetivos do
gerenciamento é a identificação de fatores
que podem contribuir para o sucesso ou
A qualidade é uma propriedade de um
curso que se torna adequada à missão de
uma instituição de ensino, comprometida
com o pleno das necessidades de seus
estudantes. De acordo com a visão de
Mezomo (1994), dentre as propriedades
53
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
fracasso de um curso. Isso significa dizer
que os FCS se constituem de recursos
necessários para que uma iniciativa venha a
ser sustentada no longo prazo. Portanto, se
o método for aplicado como um instrumento
de gestão permite identificar os elementos
de gestão e o compartilhamento de práticas
bem-sucedidas.
Na literatura de educação a distância
são encontrados estudos que abordam o
modelo dos FCS. As publicações de Jòia e
Costa (2007); Oliveira et al. (2007); Rovai
e Downey (2009); Selim (2005); e Testa
(2002); contribuíram significativamente para
o desenvolvimento desta pesquisa. A partir
do resgate teórico percebe-se que identificar
os FCS relacionados com os elementos de
gestão é fundamental para apoiar o processo
de gestão em cursos de EAD.
No presente estudo, os elementos
de gestão foram definidos com base na
literatura e pela análise conjunta das autoras
e especialistas em EAD. São eles:
Elemento Qualidade – as propriedades
que dão qualidade a um curso são: a
efetividade, a eficiência, a pertinência, a
acessibilidade, a oportunidade, a atualidade
e aceitabilidade.
Elemento Gerenciamento – processo
que possibilita o desenvolvimento de
atividades com eficiência e eficácia, a tomada
de decisão considerando as ações que forem
necessárias e a escolha e verificação da
melhor maneira de executá-las.
Elemento Infraestrutura - se refere às
propriedades da instituição de ensino para
alocar os recursos, tais como: prédios,
instalações, tecnologias e equipamentos
necessários para possibilitar a interação
entre os envolvidos.
Elemento Recursos Humanos – são
intrínsecos às pessoas como sua criatividade,
comportamento, educação e capacidades;
incluem a formação, a experiência e a
capacitação dos atores envolvidos.
Elemento
Recursos
Financeiros
– envolvem os critérios que orientam
as decisões relativas à alocação e
gerenciamento dos recursos.
Elemento Modelo Pedagógico – é um
sistema de premissas teóricas que embasa
a arquitetura pedagógica (AP), sendo esta
constituída por aspectos organizacionais,
conteúdo, metodológicos e tecnológicos; e
as estratégias para aplicação das APs.
5. Resultados dos estudos de caso
Os resultados apresentados decorrem
da análise dos dados coletados no caso
1: Curso de Graduação em Pedagogia –
Licenciatura (PEAD), e no caso 2: Curso
de Graduação Tecnológica – Planejamento
e Gestão para o Desenvolvimento Rural
(PLAGEDER). Para a identificação dos FCS
relacionados com os elementos de gestão,
foi usada a abordagem teórica dos Fatores
Críticos de Sucesso. Os elementos de gestão
utilizados como base para análise dos casos
se referem à qualidade, ao gerenciamento,
à infraestrutura, aos recursos humanos, aos
recursos financeiros e ao modelo pedagógico.
No elemento qualidade, ficou
constatado, nos casos analisados, que é
a coordenação geral que define quais os
parâmetros que serão adotados no curso,
tanto na fase de planejamento quanto na
fase de implementação do curso. Durante
o processo de implementação considera
aspectos como a formação e envolvimento
dos atores envolvidos, a avaliação, a
aceitabilidade dos alunos e a qualificação
na formação dos alunos. Os parâmetros de
qualidade não são baseados em referenciais
específicos, normalmente são utilizados
a partir da percepção e subjetividade da
equipe gestora. O principal FCS relacionado
com este elemento foi a implementação
do curso. Esta fase se apresentou como
a mais crítica, pois nela se identificou
maiores dificuldades. Nos casos analisados,
apesar de os entrevistados declararem
que a dificuldade estava associada à
implementação, constatou-se que se trata
basicamente da seleção adequada dos
parâmetros de qualidade com base em
referenciais específicos.
No elemento gerenciamento, os
FCS são associados com plano de ações,
acompanhamento pedagógico, normas,
armazenamento das informações, o papel
54
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
da secretaria e a disponibilidade de recursos.
No caso PEAD, foi identificado que: quanto
ao plano de ação, é elaborado anualmente
e acompanhado pela coordenação do curso;
quanto às normas, são definidas a partir
do projeto pedagógico, de acordo com as
normas instituições da universidade e da
legislação sobre EAD; quanto ao papel
da secretaria, tem função acadêmica e de
gerenciar o pagamento de bolsas e aquisição
de materiais e equipamentos. No caso
PLAGEDER, foi identificado que: quanto às
normas, são definidas com base no projeto
pedagógico; quanto ao armazenamento das
informações, são armazenadas no AVA e no
HD do computador; quanto à disponibilidade
de recursos, a partir disto são definidos os
critérios para alocação.
Os FCS relacionados com o elemento
infraestrutura se referem à interação
proporcionada pelo AVA e estrutura no
local de polo. A coordenação destes cursos
realizou uma avaliação da infraestrutura
virtual e presencial disponível e necessária
para o funcionamento do curso. As
ferramentas de comunicação disponíveis
nos AVA’s são adequadas e proporcionam
a efetiva interação no processo de ensino
e aprendizagem. Além disto, também
fizeram a avaliação da estrutura presencial.
A estrutura disponível e necessária para o
desenvolvimento das atividades presenciais
varia de acordo com cada polo, alguns são
mais equipados e outros menos.
No elemento recursos humanos, os
FCS relacionados se referem ao processo
de seleção, capacitação e formação e/
ou experiência em EAD dos atores
envolvidos. Para estes FCS, normalmente
os coordenadores dos cursos utilizam
os mesmos critérios para selecionar os
professores, que são convidados, e tutores,
que são alunos ou ex-alunos de cursos
de mestrado e doutorado. Após serem
selecionados, estes atores passam por
uma capacitação, não sendo privilegiada
a formação e experiência na modalidade
de ensino a distância. O curso PEAD foi o
único caso que adota critérios diferentes
para selecionar e capacitar os professores,
coordenadores e tutores. O professor da
disciplina e o coordenador de polo são
vinculados a FACED da universidade
nas áreas de Pedagogia e Tecnologia,
especificamente em informática na educação.
Os tutores são alunos ou ex-alunos de pósgraduação da FACED, mas a seleção é feita
por edital. Todos os professores e tutores
passam por uma capacitação inicial e,
posteriormente, por outra no início de cada
semestre.
Nos casos pesquisados, os aspectos
associados com o elemento recursos
financeiros dizem respeito à disponibilidade
de recursos, aos critérios que orientam a
alocação dos recursos, e o conhecimento da
forma de gestão dos recursos públicos.
No elemento modelo pedagógico, o FCS
relacionado é o conteúdo, caracterizado pelo
tipo de material didático utilizado no curso. No
caso PLAGEDER, basicamente os materiais
são os mesmos utilizados no ensino tradicional,
que foram adaptados para o ensino a distância.
O caso PEAD apresenta uma concepção
diferente, no qual o conteúdo se caracteriza
pelo tipo de material utilizado voltado para a
teoria/prática. Os textos, exercícios e atividades
desenvolvidas visam proporcionar a construção
do conhecimento. Este curso considera a
interação/autonomia/colaboração no processo
de ensino e aprendizagem, com ênfase na
abordagem construtivista, no que se refere aos
aspectos metodológicos, bem como a seleção
das técnicas, dos procedimentos e dos recursos
tecnológicos utilizados. As contribuições da
teoria e prática orientaram a definição do
modelo pedagógico. Neste curso são utilizadas
teorias da área de educação na EAD.
As
modalidades
de
avaliação
utilizadas são a presencial e a distância.
Os aspectos associados com os FCS
relacionados com o elemento avaliação da
aprendizagem são divergentes. No caso
do curso de graduação em Administração
a Distância, o FCS acompanhamento das
atividades é feito semanalmente a partir
de diferentes referenciais, tais como a
avaliação de fóruns, chats, dinâmicas de
grupo, exercícios práticos e estudos de caso.
Existe uma concepção única dos recursos
55
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
de equipamentos e a estrutura disponível
nos polos para a realização das atividades
presenciais. Os aspectos associados
com os recursos humanos dizem respeito
à qualificação dos atores para atuar no
curso, o que inclui o processo de seleção, a
capacitação, e a formação e experiência em
EAD. Os recursos financeiros se referem à
disponibilidade dos recursos, às decisões
relativas à alocação e ao conhecimento
da forma de gestão dos recursos públicos.
Para o gerenciamento dos recursos, fica
evidente que este processo está vinculado
ao orçamento aprovado pelo MEC. A partir
deste orçamento, os critérios utilizados para
alocação e gestão dos recursos disponíveis
são definidos de acordo com a forma de
gestão dos recursos públicos.
Para a melhor visualização, a figura I
apresenta os resultados, classificados por caso
e por FCS relacionados com os elementos de
gestão.
de aprendizagem utilizados na avaliação.
Já no caso do PEAD, o acompanhamento
do desempenho do aluno é feito no decorrer
de cada semestre, sendo utilizados como
recursos de aprendizagem para a avaliação
dos alunos, portfólio e workshop. E no caso do
PLAGEDER, foi mencionado que o professor
tem autonomia para definir os recursos de
aprendizagem utilizados em sua disciplina,
porém, a coordenação orienta que faça parte
desta avaliação uma atividade presencial.
Nesta atividade presencial, na maioria das
disciplinas se utilizam provas, mas existem
algumas disciplinas que utilizam seminários.
De acordo com os resultados da
pesquisa, foi observado que os recursos
utilizados nos cursos de graduação a
distância são recursos físicos e tecnológicos,
humanos e financeiros. Os recursos físicos
e tecnológicos se referem à infraestrutura
virtual e presencial, que compreende a
definição do AVA, a aquisição ou melhoria
CASOS
QUALIDADE
GERENCIAMENTO
Graduação em
Pedagogia Licenciatura
(PEAD)
• Definição dos
locais de polo
• Implementação
do curso
• Serviços de
apoio
• Aceitabilidade
dos alunos
• Avaliação dos
alunos
• Qualificação
e inovação na
formação dos
alunos
• Plano de ações
• Normas de
gerenciamento
• Apoio de
secretaria
Graduação
Tecnológica Planejamento
e Gestão para
o Desenvolvimento Rural
(PLAGEDER)
• Capacitação
dos atores
• Implementação
do curso
• Aceitabilidade
dos alunos
• Serviços de
apoio disponíveis
• Qualificação e
capacitação na
formação dos
alunos
• Normas de
gerenciamento
• Armazenamento de
informações
• Comunicação
entre os atores
• Disponibilidade
de recursos
INFRAESTRUTURA
RECURSOS
HUMANOS
RECURSOS
FINANCEIROS
MODELO
PEDAGÓGICO
• Internação
proporcionada
pelos AVA’s
• Estrutura no
local do polo
• Processo de
seleção
• Capacitação
• Formação e/ou
experiência em
EAD
• Alocação dos
recursos
• Conhecimento
da forma de gestão dos recursos
públicos
• Conteúdo
• Internação/
autonomia/
colaboração no
processo de
ensino e aprendizagem
• Utilização de
teorias da área
de educação na
EAD
• Avaliação da
aprendizagem
• Internação
proporcionada
pelo AVA
• Estrutura no
local de polo
• Processo de
seleção
• Capacitação
• Formação e/ou
experiência em
EAD
• Disponibilidade
de recursos
• Conteúdo
• Avaliação da
aprendizagem
Figura I - Os FCS relacionados com os elementos de gestão
Fonte: Elaborado pela autora
56
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
6. Conclusão
A partir dos resultados apresentados
neste estudo, percebe-se que os cursos
pesquisados recebem recursos do MEC.
Dessa forma, entende-se que os gestores
devem considerar aspectos relacionados
à gestão dos recursos públicos. A partir
do conhecimento sobre a forma de
gestão destes, torna-se necessário definir
parâmetros de qualidade e estipular
critérios para alocação e gerenciamento dos
recursos.
A relação dos FCS com os elementos
de gestão mostra que as equipes gestoras
de cursos de EAD precisam desenvolver
modelos de gestão para identificar os FCS
a serem considerados para melhor uso dos
recursos disponíveis.
É importante mencionar que este
estudo traz algumas contribuições para o
conhecimento acadêmico sobre a gestão
em cursos de EAD via internet. A principal
contribuição é demonstrar que a metodologia
dos FCS utilizada mais usualmente na área
de administração, pode ser utilizada na área
de EAD para, assim, auxiliar na gestão.
Nesta perspectiva, a expectativa que
sustentou os esforços desenvolvidos é a de
que os resultados possam ser utilizados para
subsidiar o estabelecimento de uma prática
de gestão focada nos esforços e recursos
com base nos FCS. Além disso, pretendeuse contribuir para a consolidação de uma
base de conhecimento capaz de sustentar
o gerenciamento de cursos em EAD via
Internet, independente da instituição de
ensino, área de conhecimento e AVA.
Informação e Comunicação na Formação
em Educação a Distância, Universidade
Federal do Ceará, Fortaleza, 2007.
7. Referências
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Informação e Comunicação) – Programa de
Mestrado Profissional em Tecnologias da
57
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58
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Gestão de bacias hidrográficas: modo
inovador de administrar recursos hídricos
Luciane Teresa Salvi(1)
Resumo: Diversos mecanismos vêm sendo desenvolvidos no intuito de
aprimorar a prestação de serviços na área de saneamento, muitos dos quais
representam inovações que rompem com as técnicas ou processos até então
utilizados. Um destes processos é a nova forma de se gerenciar os recursos
hídricos através da gestão de bacias hidrográficas. Este modelo sistêmico de
gestão de recursos hídricos em implantação no Brasil tem como fundamentos a
descentralização e o envolvimento da sociedade. Um dos instrumentos utilizados
por este modelo é a instituição de Comitês de Gerenciamento de Bacias
Hidrográficas, nos quais são chamados a participar grupos da sociedade civil,
representantes da União, dos Estados e dos Municípios e usuários das bacias. No
presente trabalho é discutida a instituição do Comitê do Lago Guaíba, no estado
do Rio Grande do Sul, seu funcionamento e atribuições. O referido Comitê obteve
sucesso na resolução de questões técnicas, porém salienta-se a necessidade de
fomentar a participação dos cidadãos no processo.
Palavras-chave: Lago Guaíba. Inovação. Participação Popular.
Abstract: Various mechanisms are being developed in order to improve the
provision of services in the area of sanitation, many of which represent innovations
that break with the technical or processes up then used. One of these processes
is the new way of managing water resources through the management of river
basins. This model systemic management of water resources in implantation in
Brazil has grounds as the decentralisation and the involvement of society. One
of the instruments used by this model is the establishment of committees of
management of river basins, which are involved civil society groups, representatives
of the Union, of the States and Municipalities and users of river basins. In this
work is discussed the institution of the Committee of the Lake Guaíba in the state
of Rio Grande do Sul, its operation and tasks. This Committee was successful
in the resolution of technical issues, but stresses-if the need to encourage the
participation of citizens in the process.
Key-words: Lake Guaíba. Innovation. Popular Participation.
Introdução
A noção de que a água é um bem de
domínio público limitado e dotado de valor
econômico tem se difundindo nos setores
público (que são responsáveis por gerir este
recurso) e, principalmente, no acadêmico.
Apesar disto, muito há ainda por se fazer para
que esta conscientização atinja os cidadãos,
transformando-os em atores participantes
das ações de preservação e gestão deste
recurso hídrico.
Uma ação política que busca promover
a descentralização e a participação da
sociedade civil na gestão de recursos hídricos
Professora do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre; graduada em Ciências Biológicas
(PUCRS – 1988) e Arquitetura e Urbanismo (UniRitter – 2001); especialista em Genética (UFRGS – 1991); mestre em Gestão Urbana
(PUCPR – 2008). E-mail: [email protected]
(1)
59
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
é a adoção da bacia hidrográfica como
unidade básica de planejamento e gestão.
O objetivo deste trabalho é o de revisar
alguns conceitos relacionados a este novo
modelo, de forma a situar o leitor quanto
às questões referentes à gestão da bacia
hidrográfica do Lago Guaíba no Rio Grande
do Sul.
Embora o presente artigo não possua
a pretensão de esgotar os assuntos
abordados, no texto que segue são feitas
algumas considerações sobre questões que
cercam este modo inovador de gestão.
processo. Esses aprimoramentos podem
até ser imperceptíveis ao consumidor,
como é o caso das inovações que resultam
na otimização de processos de produção
(LEMOS, 1999). A evolução do design de um
determinado objeto também pode ser citada
como um exemplo de inovação incremental.
As inovações radicais, ao contrário, são
revolucionárias e rompem com processos
estabelecidos,
apresentando
soluções
inteiramente novas. Costumam provocar
“saltos” na evolução das sociedades, pois
os produtos gerados provocam impactos de
tal magnitude que promovem uma “ruptura
estrutural com o padrão tecnológico anterior”
(LEMOS, 1999). A descoberta da penicilina,
as invenções da máquina a vapor e do avião
são alguns desses exemplos.
1. Invenção x Inovação
Inovar não é inventar. Enquanto a
invenção trabalha com o conceito da dúvida
– o resultado do método inventivo pode ou
não dar certo –, o processo de inovação
envolve a transformação de ideias que
resultam num produto (tangível ou não)
de sucesso. Existe, então, uma questão
conceitual importante que os diferencia:
inventar significa lidar com a possibilidade
de êxito; inovar, com a sua confirmação
(LEMOS, 1999; QUANDT; SILVA; AISSE,
2006; FAPESP, 2006).
As formas de inovação podem ser
diferenciadas em incremental e radical. O
primeiro tipo envolve as transformações que
são graduais, nas quais os aperfeiçoamentos
agregam melhorias a um produto ou a um
1.2
Inovações
envolvendo
o
saneamento
Atualmente, diversas técnicas vêm
sendo desenvolvidas no intuito de aprimorar
a prestação de serviços na área de
saneamento, envolvendo o abastecimento de
água potável, coleta e tratamento de esgotos,
coleta de águas pluviais e tratamento de
resíduos sólidos.
As inovações propostas podem ser
agrupadas em diferentes categorias, de
acordo com seu caráter: as eminentemente
técnicas, educativas ou políticas (Quadro 1).
INOVAÇÕES NA ÁREA DE SANEAMENTO
 De origem TÉCNICA
Controle de perdas físicas nos sistemas de abastecimento
Desenvolvimento de materiais e métodos de recuperação de redes envelhecidas; aprimoramento
da instrumentação, da certificação, emprego de telemetria em macromediação.
Reuso da água
Utilização do esgoto doméstico, após tratamento, para fins não potáveis como a irrigação de
parques e jardins, alimentação de fontes e espelhos d’água, reservatórios de incêndio, descargas
sanitárias e lavagens de veículos; na indústria emprego em torres de arrefecimento, produção de
vapor; no meio rural, para irrigação e aquicultura.
Coleta de águas pluviais
Usos potenciais na irrigação de jardins, alimentação de descargas sanitárias e lavagem de veículos.
Vantagens como a redução de escoamentos superficiais decorrentes da impermeabilização do
solo em áreas urbanizadas.
60
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Ações de economia no uso da água
Substituição ou adoção de equipamentos de instalações hidráulicas prediais de baixo consumo
de água, ex. peças sanitárias; instalação e regulagem de hidrômetros.
 De origem EDUCATIVA
Ações de economia no uso da água
Ações educativas que promovam a conscientização da importância de se economizar água.
 De origem POLÍTICA
Gestão dos recursos hídricos
Gestão da bacia hidrográfica - novo modelo de administrar os recursos hídricos.
Quadro 1 - Categorias de inovações da área de saneamento
Fonte: Elaborada com base em NASCIMENTO; HELLER, 2005.
recursos hídricos; aprovar o Plano de
Recursos Hídricos da bacia; acompanhar e
intervir na execução deste Plano; propor a
isenção da obrigatoriedade de outorga de
direitos de uso de recursos hídricos quando
as acumulações, derivações, captações e
lançamentos forem de pouca expressão;
estabelecer mecanismos de cobrança de
uso e critérios para o desenvolvimento das
obras de uso múltiplo” (BRASIL, 1997). Querino (2004) afirma que a Lei N°
9.433/97 promove a implementação de
um modelo institucional descentralizado e
participativo pela aplicação de um processo
decisório que envolve responsabilidades
compartilhadas.
Sob
esta
ótica
e,
especialmente, se considerados os momentos
políticos até então experimentados pela
nação brasileira, esta representa uma forma
inovadora de gestão.
No Rio Grande do Sul, o marco legal em
direção a esta transformação dá-se em 30
de dezembro de 1994, por meio da sanção
da Lei no 10.350, legislação que reestrutura
o processo de formação de novos comitês
de bacias hidrográficas no RS (CÁNEPA
et al., [200-]). Quatro anos mais tarde, em
setembro de 1998, é instalado o Comitê do
Lago Guaíba – entidade comprometida com
a geração de informações sobre a Bacia e
com a mobilização da sociedade civil em
torno de sua conservação (UFRGS, 2010).
A criação do referido comitê dá-se a partir do
Decreto Estadual N° 38.989 de 29 de outubro
1.3 Gestão de bacias hidrográficas
A definição da bacia hidrográfica como
unidade territorial de gerenciamento de
recursos hídricos, que acaba por determinar
a própria ocupação do território, incita a
cooperação intermunicipal, mesmo entre
cidades que não se encontram associadas
às regiões metropolitanas (NASCIMENTO;
HELLER, 2005).
A consideração deste novo parâmetro
implica na construção de um modelo
sistêmico de gestão de recursos hídricos,
o qual possui como fundamentos a
descentralização e o envolvimento da
sociedade. Essa forma de gestão conduz a
transformações que aprimoram as relações
entre o Estado e a sociedade civil. As
comunidades que habitam os entornos das
bacias são convocadas a participar através
de um sistema de representação, fator que
reforça os princípios da cidadania ativa.
Grupos da sociedade civil, representantes
da União, dos Estados e dos Municípios e
usuários das bacias se organizam dentro
dos Comitês de Gerenciamento de Bacias
Hidrográficas – CGBH (GUERRA, [200-]),
onde é realizada uma série de atividades.
Segundo a Lei Federal N° 9.433 de 8
de janeiro de 1997, compete aos Comitês de
Bacia Hidrográfica:
“promover o debate das questões
relacionadas a recursos hídricos e articular
a atuação das entidades intervenientes;
arbitrar os conflitos relacionados aos
61
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
de 1998, alterado pelo de N° 43.418 de 22 de
outubro de 2004 (SEMA, 2010).
Os 14 municípios citados possuem
características bem distintas. Existem aqueles
com baixas densidades populacionais, que
subsistem à base da agricultura e, por essa
razão, encontram no rio sua principal fonte de
água para irrigação. Em contrapartida, outros
se encontram intensamente urbanizados,
como é o caso de Porto Alegre e Canoas,
que possuem uma demanda de recursos
hídricos relacionada às atividades relativas à
ocupação urbana (PRÓ-GUAÍBA, 2010).
São justamente estas diferentes
necessidades e contribuições apresentadas
pelas aglomerações urbanas que exigem
um modo inovador de gerir interesses
tão diversificados e que seja capaz de
atender às demandas sem comprometer a
própria integridade dos recursos hídricos
disponíveis.
1.4 Regiões hidrográficas do Rio
Grande do Sul
Três grandes regiões hidrográficas
podem ser identificadas no Rio Grande do
Sul. Ao norte e a oeste do estado encontrase a Região Hidrográfica da Bacia do
Rio Uruguai; no sul e a sudeste, a região
Hidrográfica das Bacias Litorâneas; no centro
e nordeste, a Região Hidrográfica da Bacia
do Guaíba (MENEGAT; KIRCHHEIM, 1998).
A região hidrográfica da bacia do
Guaíba tem cerca de 1.700km2. Ao longo
das bacias se inserem 14 municípios: Barão
do Triunfo, Barra do Ribeiro, Canoas, Cerro
Grande do Sul, Eldorado do Sul, Guaíba,
Mariana Pimentel, Nova Santa Rita, Porto
Alegre, Sentinela do Sul, Sertão Santana,
Tapes, Triunfo e Viamão. Assim, a qualidade
das águas do Lago Guaíba é dependente das
ações existentes no seu entorno e também
daquelas havidas nas bacias dos rios que a
ele afluem (GUERRA, [200-]).
As nove bacias que compõem a região
Hidrográfica do Lago Guaíba são vistas na
Figura 1:
2. Método
O presente trabalho utilizou-se da
metodologia
de
Estudo
Bibliográfico
para a sua realização. Foram reunidos,
neste processo, materiais de diferentes
procedências: livros, monografias, periódicos
e legislação (federal e estadual). Foi também
consultada a produção textual elaborada na
disciplina de Inovação Tecnológica no Meio
Urbano integrante do curso de Mestrado em
Gestão Urbana da PUC-PR, ano de 2006.
Para finalizar, foram realizadas pesquisas
em meio eletrônico.
3. Discussão
A implementação de um Comitê
voltado à Gestão de Bacias Hidrográficas
implica no desenvolvimento de várias
atividades que viabilizem uma estrutura
organizacional eficiente, que seja capaz
de administrar, de modo adequado, um
bem público finito. Entre outros fatores,
faz-se necessário o estabelecimento de
uma estrutura administrativa e a reunião
multidisciplinar de profissionais responsáveis
por pesquisas, elaboração de documentos
e mobilização da sociedade civil em torno
do projeto. Desta forma, a primeira gestão
do Comitê do Lago Guaíba (1997-1998) foi
responsável pela estruturação do regimento
Figura 1 - Nove bacias que compõem
a região Hidrográfica do Lago Guaíba, Rio
Grande do Sul
Fonte: FEPAM, 2010
62
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
interno e pela formação da Comissão
Permanente de Assessoramento. Foram
organizados três grupos de trabalho: um
dedicado à elaboração de uma proposta de
construção do enquadramento dos cursos
d’água, um segundo grupo responsável
pela comunicação social e ambiental e
um terceiro, responsável pelas relações
institucionais (GUERRA, [200-]).
Ainda segundo a autora, a segunda
gestão (1999-2000) iniciou o processo de
planejamento dos usos e preservação dos
recursos hídricos. Neste momento foram
identificadas as demandas que cercavam o
Lago, reunidas as informações técnicas e
iniciados os trabalhos de mobilização social,
com o intuito de esclarecer a população e
convocá-la a participar do processo.
A terceira gestão (2001-2002) iniciou
a elaboração de um documento, o Termo
de Referência – TR, para a compilação dos
dados técnicos até então reunidos. No ano
de 2005, este documento foi finalizado e hoje
consiste em fonte de informações técnicas
sobre disponibilidades, demandas hídricas
e pré-enquadramento na bacia do Lago
Guaíba (GUERRA, [200-]).
Segundo Neto, Freitas e Agra (2002),
vários foram os benefícios obtidos nestes
trabalhos:
1) uma maior articulação e integração
entre os agentes do sistema estadual de
recursos hídricos; 2) reforço das funções
específicas de cada uma dessas instituições
no sistema estadual de recursos hídricos;
3) um avanço conceitual no processo de
planejamento e implantação do sistema
de recursos hídricos, incorporando outras
variáveis além do balanço hídrico e do
enquadramento; 4) a ampliação do espectro
de atuação e participação do Comitê pela
existência de uma pauta concreta de
deliberações; 5) a incorporação aos TR
de metodologias para a participação e
mobilização social, aportadas pelo próprio
Comitê e, portanto, identificadas com o perfil
sociocultural da Bacia, entre outros.
Apesar da constatação de que questões
de ordem técnica foram satisfatoriamente
atendidas, restrições foram encontradas no
que diz respeito à participação social – ainda
limitada – e à descentralização da tomada de
decisões sobre os recursos hídricos (NETO,
FREITAS; AGRA, 2002).
4. Considerações finais
Para se promover a recuperação, a
conservação, ou mesmo garantir a utilização
racional dos recursos hídricos, é necessária
a cooperação da população, dos municípios,
dos estados e da União.
O município representa a primeira
instância de ação, ou seja, é o responsável
imediato pela conservação dos mananciais
que se encontram sob a sua jurisdição e o
estado e o governo federal devem ter o papel
de fiscalizar e financiar, se necessário, estas
ações.
A população residente nos municípios
é a principal interessada em que esses
recursos hídricos se mantenham com
qualidade e disponíveis, permanentemente,
em quantidade adequada. O cidadão possui
agora a oportunidade de participar através
de um novo modelo de gestão de recursos
hídricos – o Comitê de Bacia Hidrográfica
– expressando seus interesses relativos
aos usos destas águas e manifestando-se
também pela sua conservação.
As bacias hidrográficas ultrapassam
fronteiras
político-administrativas.
Por
esse motivo, a sua gestão representa uma
inovação quanto à forma de se administrar
um bem natural de domínio público.
Entretanto, essa inovação apenas poderá
ser considerada radical se a participação
popular no processo se der de forma intensa
e constante, de modo que todo munícipe
sinta-se responsável pela conservação de
sua bacia hidrográfica, exercendo assim sua
cidadania e seus direitos.
Referências
BRASIL. Lei n. 9.433, de 8 de janeiro
de 1997. Institui a Política Nacional de
Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional
de Gerenciamento de Recursos Hídricos,
regulamenta o inciso XIX do art. 21 da
Constituição Federal, e altera o art. 1º da
Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, que
63
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro
de 1989. Diário Oficial da União, Brasília, 8
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rs.gov.br/bacias.htm>. Acesso em: 19 abr.
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tecnológica - definições. Disponível em:
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Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do
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64
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
O fim negativo do contrato
Débora Cristina Holenbach Grivot(1)
Resumo: O presente artigo se preocupa em demonstrar fim negativo do
contrato, tentando perceber quais são os novos rumos da responsabilidade
contratual permeada pela diretriz ético-social e sistemática do Código Civil.
Palavras-chave: Contrato, Inadimplemento, Responsabilidade.
Abstract: This article is concerned to demonstrate the negative end of the
contract, trying to understand the new directions of contractual liability permeated
by social and ethical tendency on the civil law.
Key-words: Contract, Default, Liability.
Introdução
Firma-se uma obrigação para durar
temporariamente, tendo um início e estando
destinada a durar por certo período de tempo,
para então chegar ao seu almejado fim: o
adimplemento, que por sua vez “atrai e polariza
a obrigação” (COUTO e SILVA, 1976). Este
processo obrigacional presente no Código
Civil de 2002 está dividido sistematicamente
entre as fases de criação do vínculo, de
desenvolvimento e de conclusão. Esta última
pode ser distinguida entre o modo normal
ou habitual (adimplemento) e o patológico
(inadimplemento), que por sua vez está
localizado em Título diverso. No que diz respeito
ao inadimplemento, há uma inovação no perfil
metodológico que embora possa merecer
crítica pontual, representa um aperfeiçoamento
em relação ao anteriormente disposto, pois a
sistematização seguida permite à doutrina mais
facilmente destacar os pontos-chave, para o
delineamento do modelo jurídico legislativo
do inadimplemento, o que tem evidentes
reflexos práticos (MARTINS-COSTA, 2003).
Este trabalho pretende abordar o tema do “fim
negativo do contrato”, das consequências do
fim patológico do contrato, tentando perceber
quais são os novos rumos da responsabilidade
contratual, agora permeada pela diretriz éticosocial e sistemática, demonstrada numa nova
noção estrutural.
I – A responsabilidade contratual
Do ponto de vista passivo, a relação
obrigacional apresenta-se como débito,
isto é, como dever de realizar a prestação.
Na hipótese deste débito não ser cumprido,
pode nascer para o devedor outra
obrigação que é precisamente a obrigação
de indenizar o credor. Se o devedor
não cumpre a prestação por motivo a si
imputável, ele poderá ser coagido a fazêlo, ou poderá ver a obrigação ser realizada
judicialmente, ou ainda poderá ser
forçado a indenizar os prejuízos sofridos
pelo credor, quando não forem possíveis
ou não forem suficientes as medidas
anteriores: é nisto tudo que consiste a sua
responsabilidade (NORONHA, 2003).
Sabe-se que esta responsabilidade,
segundo a terminologia mais adequada,
se deve chamar obrigacional (NORONHA,
2003) porque provém da violação de uma
obrigação, nascida de contrato ou de outra
fonte; e que se distingue da responsabilidade
extraobrigacional, em que se incorre perante
(1)
Débora Cristina Holenbach Grivot é bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC/RS, mestre em Direito Privado pela UFRGS,
doutoranda em Direito na UFRGS, professora de Direito Romano e História do Direito na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, na
Faculdade São Judas Tadeu de Porto Alegre. E-mail: [email protected]
65
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
uma pessoa de que se não é devedor, e cujo
âmbito se determina por exclusão de partes.
Mas a maior parte da doutrina brasileira ainda
a denomina responsabilidade contratual, como
sendo o contrato a sua fonte e não a obrigação
inadimplida em si mesma considerada.
No sistema brasileiro pode-se afirmar
que a responsabilidade civil é a obrigação
de reparar, para o agente causador, por
imposição legal, os danos suportados pela
vítima, sejam eles materiais, morais ou a
imagem. Desta forma, o agente causador tem
o dever de indenizar, ou seja, tornar indene
(ileso) quando possível com a sua restituição
à situação anterior, vale dizer, antes do evento
danoso. Na hipótese de impossibilidade
dessa restituição, resta a fixação de quantia
em dinheiro (indenização pecuniária).
duas teorias: (1) Para a teoria clássica ou
unitária, a obrigação é essencialmente uma
relação entre duas pessoas, tendo por objeto
uma conduta do devedor (dever prestar,
ou débito) e estando ele sujeito, em caso
de inadimplemento, a diversas medidas
(responsabilidade). De acordo com essa
concepção, a responsabilidade acompanha
o débito da mesma forma que a sombra
acompanha o corpo. (2) Para a teoria dualista
a relação obrigacional seria composta de
duas obrigações distintas: uma de natureza
pessoal e de direito substantivo, que seria o
dever jurídico, ou o debitum, por força da qual
o devedor ficava vinculado a uma conduta, ou
prestação; a outra de caráter patrimonial (e
para muitos de direito processual), que seria
a responsabilidade, ou obligatio, consistindo
na sujeição do patrimônio do devedor (ou em
casos especiais de outra pessoa) ao credor,
através da execução, para garantia do
debitum. A obligatio só surgiria se o devedor
caísse em inadimplência (NORONHA, 2003).
Segundo Martins-Costa (2003, pg.
342), o modelo do inadimplemento contratual
do Código Civil apresenta-se ancorado em
três eixos valorativos: (a) o princípio da boafé objetiva (art. 422) que marca o standart
da conduta devida ao largo da relação
obrigacional; (b) as pautas estimativas da
ilicitude, cujas normas gerais estão fixadas
nos arts. 186 e 187, sendo de exponencial
importância a adstrição à finalidade
econômico-social do negócio jurídico (art.
187); (c) o critério da utilidade da prestação,
que marca a transformabilidade (ou não)
do inadimplemento, de relativo (mora) para
absoluto (art. 395, parágrafo único),
É exatamente lá onde se encontram e
se comungam a unitária fonte da obrigação
de indenizar. Para Clóvis do Couto e Silva
(1976, pg. 40), é interessante verificar que
os conceitos de culpa contratual ou aquiliana
partem da mesma ideia ética e induzem
para o responsável a mesma consequência.
Neste ponto, a concepção tradicional
choca-se com a noção moderna que aquela
diferencia, enquanto esta as aproxima. É
que se na sua estrutura, a violação desta
é um dano, em nada importa que o pré-
1. Localização da responsabilidade
contratual
no
atual
sistema
de
responsabilização civil
A tentativa de localizar o âmbito da
responsabilidade
contratual
encontra
seu principal fundamento na lógica
da sistematização e dos benefícios
proporcionados pela estrutura didática que
já há muito tempo vêm demonstrando a sua
importância. Segundo o professor Fernando
Noronha (2003, pg. 134), o estudo do direito
obrigacional deveria mesmo começar pela
responsabilidade civil que funciona, de certo
modo, como regime-regra em relação as
obrigações negociais. Na verdade, estas,
quando não cumpridas, também geram
uma obrigação de indenizar e por outro
lado, o próprio inadimplemento delas é
comparável ao ato antijurídico gerador da
responsabilidade civil em sentido estrito.
Assim que surgiram as teorias unitária e
dualista da responsabilidade civil, conforme
a seguir vamos delinear.
1.1 Teorias unitária e dualista da
responsabilidade civil: cabimento da
teoria unitária
Ao tratarmos do tema da responsabilidade,
um primeiro questionamento é justamente
acerca de sua fonte. Para justificar as origens
do dever de indenizar foram formuladas
66
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
ordenamento seja legal ou convencional.
Desta forma, a progressiva aproximação
entre a responsabilidade contratual e
extracontratual resulta da consideração
de que os dois tipos de responsabilidade
supõem uma lesão a deveres pré-existentes.
A obrigação que resulta de um delito e de
um contrato tem sempre a mesma estrutura
e é polarizada pela mesma finalidade:
a satisfação do interesse do credor, em
que pese a finalidade da relação jurídica
proveniente de um contrato poder variar
e frequentemente varie, conforme as
determinações que resultam da vontade das
partes (BECKER, 1995).
Por isso se conclui que o dogma da
vontade no negócio jurídico, assim como o
primado da culpa no ilícito, são como species
de um único genus: o elemento subjetivo
na fonte das obrigações. E não somente
nas duas fontes típicas representadas pelo
‘contrato’ e pelo ‘ato ilícito’, mas também as
variae causae, que parecem ter a tendência
de sujeitarem-se a essa bipolarização e a
manifestarem-se como satélites atraídos
cada um pelo respectivo elemento subjetivo
de cada astro, seja o contrato, seja o ilícito
(RUFFOLO, 1978).
Por outro lado, ainda que comunguem
a mesma fonte, alguns elementos se
apresentam indispensáveis para que
a
responsabilização
contratual
seja
implementada. É o que se passa a averiguar.
(1) Ato ilícito consistente na inexecução
da obrigação. A ilicitude significa a
contrariedade ao Direito e não apenas à lei,
abrangendo, portanto, também a violação
de princípios fundamentais do Ordenamento
(MARTINS-COSTA, 2004).
(2) A existência de um dano injusto. O
artigo 389 do Código Civil prevê a reparação
dos danos causados pelo inadimplemento
contratual. Desta forma, o Diploma Legal
estabelece o requisito da existência do dano
para o surgimento da responsabilização.
Aqui vale ressaltar também que não é
qualquer dano ou prejuízo capaz de gerar
o dever de indenizar, como veremos na
segunda parte deste trabalho. Mas o que
importa neste momento frisar é que o dano,
qualificado de injusto, é condição necessária
e indispensável para a existência da
responsabilidade contratual.
(3) A Imputabilidade é o terceiro
elemento já que, embora a noção de
dano seja indissociável da própria noção
de responsabilidade civil (pois não há
responsabilidade sem dano), até poucas
décadas o seu elemento forte consistia na
culpa. Também haverá oportunidade de
observar que, em que pese forte doutrina seja
a favor de uma objetivação, o ordenamento
jurídico brasileiro ainda está e parece assim
permanecer, baseado na noção de culpa,
elemento identificador da imputabilidade,
essencial para a responsabilização civil.
(4) Nexo de causalidade. Pelo nexo
causal é estabelecido se uma determinada
ação pode ser considerada causa de
determinado resultado. Em outras palavras,
trata-se de saber da existência de um vínculo
entre duas realidades, de forma a que se
reconheça que um dano é consequência de
certa atividade ou omissão. O autor italiano
Guido Alpa (1999, pg. 317) afirma que o
nexo de causalidade tem diversas funções:
não serve apenas a reconstruir os eventos e
as ligações entre dano e responsabilidade,
mas também a selecionar a área dos danos
ressarcíveis.
Em resumo, a responsabilidade
obrigacional tem como pressupostos: a
inexecução da obrigação (ato ilícito), o dano
1.2 Elementos indispensáveis para
a identificação da responsabilidade
contratual
Ainda a título de localização da
responsabilidade contratual dentro de um
sistema de responsabilização civil no Código
Civil, é possível perceber que, para identificar
a possibilidade de uma responsabilização, fazse necessária a presença de alguns elementos
indispensáveis.
Primeiramente,
deve-se
perceber que a reparação civil é inspirada
na preocupação de harmonia e equilíbrio
que orienta o direito e lhe constitui elemento
animador (DIAS, 1995). Para colocar indene o
credor, e restabelecer a harmonia e o equilíbrio,
são necessários os seguintes elementos:
67
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
injusto, a culpa e a causalidade.
e apoiando-se na responsabilidade objetiva.
A vertente tendente à responsabilização
objetiva sustenta que o contratante
inadimplente será sempre responsável, firme
ainda no parágrafo único do artigo 927, que
se apresenta como cláusula geral. Para
Fernando Noronha (2003, pg. 487), quando
a lei pretende impor uma responsabilidade
objetiva comum, a lei fala geralmente na
obrigação de reparar danos resultantes de
uma atividade que, sendo “normalmente
desenvolvida”, implica, “por sua natureza,
risco para os direitos de outrem” ou “risco que
tal espécie [de atividade] faz naturalmente
correr”. Um exemplo típico de risco de
empresa é a responsabilidade pelo fato do
produto e do serviço, prevista no art. 931 do
Código Civil e especialmente regulada, no
que diz respeito às relações de consumo,
pelos artigos 12 e seguintes do Código de
Defesa do Consumidor.
Já a tese que reconhece na culpa o
fundamento da responsabilidade debitória é
aquela que justifica tal responsabilidade no
empenho devido no sentido de cumprir a
prestação. Guido Alpa, tratando da análise
econômica do direito, não deixou de tratar
do tema da imputabilidade e reiterou a
imprescindibilidade da culpa, afirmando
que a orientação da jurisprudência está
inclinada a afirmar a responsabilidade e
em consequência o ressarcimento do dano
somente se o inadimplente seja “culpado”.
(1996, pg. 718)
Também na Alemanha, mesmo depois
da reforma do BGB em janeiro de 2002,
no que trata da matéria do inadimplemento
contratual, a base de imputação ainda é
a culpa. Tratando deste assunto, Canaris
(2003, pg. 18) afirma que com relação às
circunstâncias objetivas, esta regra exige
uma violação da obrigação ou uma execução
defeituosa de uma obrigação. Com base neste
princípio, a lei introduz a questão subjetiva de
distinguir se o devedor é ou não responsável
pelo inadimplemento. Neste particular,
reverte o ônus da prova para o devedor.
Comparada à lei anterior, a mensuração da
responsabilidade do devedor continua a
mesma: o devedor permanece responsável
2. O inadimplemento imputável:
fundamento da responsabilização civil
Em sentido estrito, o inadimplemento
é a não realização da prestação devida
enquanto devida. O inadimplemento imputável
é aquele que comporta a responsabilidade
do devedor, isso é a sujeição à obrigação do
ressarcimento do dano e aos outros remédios
sancionatórios. O inadimplemento não é, pois,
nem a simples ausência de cumprimento nem
a mera não realização da prestação devida:
constitui, especificamente, a não realização da
prestação devida na medida em que essa não
realização corresponda à violação da norma
(legal, convencional, imposta pelos usos ou
derivada de modelo jurisprudencial) que era
especificamente dirigida ao devedor (cominado
o dever de prestar) ou do credor (cominado o
dever de receber). (MARTINS-COSTA, 2004).
Assim, o inadimplemento (em sentido
estrito) que leva ao cabo as cominações
legais é aquele que se pode qualificar de
inadimplemento imputável ao devedor.
A respeito deste fator fundamental – a
imputabilidade – a doutrina se divide e
compõem-se de duas teorias acerca do “nexo
de imputação”. Segundo o que explica Judith
Martins-Costa (2004, pg. 83), a doutrina (e
não só a brasileira) está separada em dois
grupos no que concerne à questão acima
arguida. No primeiro, estão juristas de porte
de Clóvis do Couto e Silva, Ruy Rosado de
Aguiar Jr., Agostinho Alvim, Silvio Rodrigues,
Serpa Lopes e Clóvis Beviláqua, para quem
a imputabilidade é sempre culposa. No outro
grupo estão juristas de não menor porte,
como Pontes de Miranda, Arakén de Assis,
Mario Julio de Almeida Costa, que discernem
entre imputabilidade e culpa. Para melhor
compreensão, passa-se a analisar.
2.1 Teorias da imputabilidade baseada
na culpa e da responsabilidade objetiva
Do
estudo
da
responsabilidade
obrigacional, surgiram duas correntes
doutrinárias para justificar a sustentação da
responsabilidade civil, uma baseada na culpa
e outra pressupondo a prescindibilidade desta
68
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
se agir com intenção ou negligência: assim
fica responsável pelo ilícito.
No direito português, a regra contida
no artigo 227, 1 do Código Civil de 1966,
tratando da culpa na formação dos contratos,
dispõe que “quem negocia com outrem para
a conclusão de um contrato deve, tanto
nos preliminares como na formação dele,
proceder segundo as regras da boa-fé,
sob pena de responder pelos danos que
culposamente causar à outra parte”.
O nosso ordenamento jurídico sustenta
a responsabilidade civil sob os preceitos da
culpa, conforme o dispositivo abaixo transcrito:
Art. 392: Nos contratos benéficos,
responde por simples culpa o contratante,
a quem o contrato aproveite, e por dolo
aquele a quem não favoreça. Nos contratos
onerosos, responde cada uma das partes por
culpa, salvo as exceções previstas em lei.
Portanto, em regra, o fundamento
da imputação da responsabilidade é a
culpa, podendo de forma excepcional (mas
incomum) haver imputação pelo risco (quem
exerce atividades que podem por em risco
pessoas e bens alheios, da mesma forma
que aufere os benefícios daí resultantes,
também deve suportar os prejuízos,
independentemente de ter ou não procedido
com culpa. (NORONHA, 2003).
do interesse do credor. A diligência pretendida
pela lei ao devedor se conforma precisamente
a algumas objetivas condutas sociais e
profissionais. Segundo Judith Martins-Costa
(2003. pg. 342), o art. 422 do Código Civil
marca o standart de conduta devida ao largo
da relação obrigacional, como demonstração
do princípio da boa-fé objetiva, e constitui
um dos três eixos valorativos no qual o novo
sistema do inadimplemento está baseado.
Clovis do Couto e Silva (1976, pg. 39) torna
inteligível esta matéria tão sutil afirmando que
o conceito de dever secundário é mais amplo
que o de culpa. Embora entre ambos existam
pontos de contato, o comportamento que o
direito valoriza é o de ambos os partícipes.
Compreendida a relação jurídica como um
todo; a liquidez do princípio da culpa vai
encontrar sua justa medida na contemplação
da conduta do outro figurante.
Esta conduta que está sob exame: o
sentido objetivo do nexo de imputação, é
justamente a natureza do dever jurídico que
consiste na “obediência” ao objeto do contrato.
Quando esta conduta, segundo os padrões
ético-sociais estabelecidos pelo ordenamento
jurídico, sofre uma determinada positivação,
ainda que mediante cláusula geral (como é o
artigo 422 do Código Civil), ela está sim sendo
objetivada, normatizada e criando um standart
a ser respeitado, seja o do cumprimento do
objeto do contrato, de seus acessórios, ou
das consequências do seu incumprimento.
2.2 A violação de um dever de
conduta dentro da categoria dos atos
ilícitos: a culpa objetiva
Para compor o significado de culpa na
qual se sustenta o inadimplemento, é preciso
identificar, pois, um elemento objetivo – a
violação de dever jurídico – e um elemento
subjetivo – a voluntariedade da conduta.
Uma tendência se desenvolve no sentido de
‘objetivar’ o elemento subjetivo, o que numa
categoria geral da responsabilidade civil, até
mesmo as hipóteses de responsabilidade
por culpa, recebem um ‘conceito’ de cada
vez mais objetivo.
Massimo Bianca (1994, pg. 15) dá a
noção exata da concepção de culpa “objetiva”,
dizendo que culpa é a inobservância da
normal diligência, isto é do esforço volitivo e
técnico normalmente adequado à satisfação
II – O efeito do inadimplemento
contratual: Dever de Indenizar – o art. 389
do CC2002
Adentrando na questão acerca dos
efeitos gerados pelo inadimplemento
contratual pode-se identificar a resolução ou
a extinção pura e simples da obrigação e a
indenização. Nesta seara, analisa-se apenas
a questão da indenização, decorrente da
responsabilização
contratual,
deixando
de lado as demais consequências do não
cumprimento contratual.
Como se tem visto, a nova estrutura
do direito obrigacional, em especial o seu
‘fim negativo’, qual seja o inadimplemento,
possibilitou o exame da matéria de forma
69
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
sistemática, que agrega a análise das
regras e princípios de uma nova perspectiva
que reflete as diretrizes do ordenamento
jurídico. No Código Civil, os efeitos do
inadimplemento contratual vêm da seguinte
forma positivados:
Art. 389: Não cumprida a obrigação,
responde o devedor por perdas e danos,
mais juros e atualização monetária segundo
índices oficiais regularmente estabelecidos e
honorários de advogado.
É a cláusula geral do inadimplemento,
isto é, o efeito geral e típico do inadimplemento
das obrigações, qual seja o nascimento da
responsabilidade pelo pagamento de perdas
e danos (MARTINS-COSTA, 2004).
Art. 395: Responde o devedor pelos
prejuízos que a sua mora causar, mais
juros, atualização dos valores monetários
segundo os índices oficiais regularmente
estabelecidos e honorários de advogado.
É também outro efeito típico do
inadimplemento, qual seja, a caracterização
do momento da responsabilidade (haftung).
Art. 475: A parte lesada pelo
inadimplemento pode pedir a resolução
do contrato, se não preferir exigir-lhe o
cumprimento cabendo, em qualquer dos
casos, indenização por perdas e danos.
Este artigo representa o poder formativo
extintivo de resolução, que é consequência
de inadimplemento definitivo e imputável
(MARTINS-COSTA, 2004).
Assim, para melhor compreensão da
‘ratio’ destes dispositivos faz-se necessária a
análise, ainda que de forma não exaustiva,
do dano ressarcível e qual a sua extensão,
incluindo a análise da violação dos ‘novos
deveres’ e sua indenização.
imputável ao devedor consiste na obrigação
de indenizar os prejuízos causados ao credor.
Então, o não cumprimento da obrigação tem
como principal consequência, abstraindo a
realização coativa da prestação, nos casos
em que ela é viável, o nascimento de um
dever secundário de prestar que tem por
objeto já não mais a prestação debitória
inicial, mas a reparação dos danos causados
ao credor. Quais são esses danos?
Como será adiante abordado, o catálogo
de danos a serem ressarcidos em decorrência
de um inadimplemento pode demonstrar a
tutela de diversas posições jurídicas. É assim
que o autor italiano Adolfo di Majo apresenta
esta matéria. Ele afirma que a obrigação que
se define contratual é fundamentalmente
dirigida a proteger a espectativa da prestação
– objeto do contrato. Ela, vista pelo seu
aspecto coercitivo de remédio contra o
inadimplemento, se dirige a colocar o sujeito
(não inadimplente) na mesma situação na
qual ele teria estado caso o contrato tivesse
sido cumprido. A obrigação contratual, então,
contribui de tal modo que também delimita
uma primeira noção de dano contratual
ressarcível (DI MAJO, 2003). Segundo
Visintini, na Itália, a delimitação dos danos
ressarcíveis merece ser examinada com
uma nova atenção não somente por razões
técnicas, mas também por razões econômicosociais, já que a disciplina do ressarcimento
do dano é a principal garantia da atuação das
relações contratuais (VISINTINI, 1983). E esta
“nova atenção” no sentido econômico-social
se manifesta principalmente acerca da própria
noção de dano e identificação de quais são
estes danos passíveis de ressarcimento. É o
que se passa a examinar.
1. O ressarcimento dos danos como
remédio geral de tutela das posições
jurídicas
É o teor do artigo:
Art. 389: “Não cumprida a obrigação,
responde o devedor por perdas e danos,
mais juros e atualização monetária segundo
índices oficiais regularmente estabelecidos e
honorários de advogado.”
O efeito fundamental do não cumprimento
1.1 A noção de dano e os danos
ressarcíveis: dano positivo e dano
negativo
Para Clóvis do Couto e Silva (1997,
pg. 217), sem que se estabeleça a noção
de dano, não se pode ter uma ideia exata
da responsabilidade civil de um determinado
país. O artigo 395 do nosso Diploma Civil
apresenta a regra geral da responsabilização
civil determinando a imputabilidade do
70
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
devedor sobre “os prejuízos a que a sua mora
causar (...)”. A seguir examina-se no que
consiste este “prejuízo” e até onde ele vai.
A noção de dano, introduzida por
Clovis do Couto e Silva, é a noção de
interesse juridicamente tutelado. Porém,
esta delimitação pode ainda encontrar o
questionamento se o interesse é positivo ou
negativo. Arakén de Assis (2004, pg. 149)
introduz o questionamento afirmando que
existe muita controvérsia se a indenização
visa ao ressarcimento dos danos “positivos”,
vale dizer, colocando o parceiro fiel na situação
em que se encontraria caso o contrato se
tivesse exaurido pelo cumprimento, ou
dos danos “negativos”, compensando os
prejuízos sofridos em virtude da conclusão
do negócio.
Como se tem visto, o ressarcimento
do dano corresponde à tutela jurídica do
ordenamento perante os interesses por
este reconhecido. São justamente nestes
interesses violados por uma conduta faltosa
do devedor – o inadimplemento – que
consistirá a reparação do dano. Desta forma,
é possível utilizar recursos didáticos da
conceitualização para entender melhor qual
é o objeto da indenização.
O interesse positivo é o interesse de
cumprimento; corresponde ao aumento que o
patrimônio do credor teria experimentado se o
contrato tivesse sido cumprido; é o acréscimo
que o contratante, em caso de cumprimento
da avença, auferida como valor da prestação,
descontado o valor da contraprestação e mais
a vantagem decorrente da disponibilidade
desse acréscimo, desde o dia previsto para
o cumprimento até o da indenização (AGUIA
JÚNIOR, 1991).
O interesse negativo é o “dano derivado
da confiança”, consequente ao fato de a
parte ter confiado no contrato, para cuja
celebração e cumprimento pode ter efetuado
despesas e assumido obrigações, preterindo
outras alternativas.
Adolfo di Majo problematiza questionando
se o dano contratual tutela somente o
interesse (do contratante não inadimplente)
de ser colocado na mesma condição na
qual teria estado caso o contrato tivesse
sido executado; ou não. Também o diverso
interesse de ser colocado na mesma posição
em que estaria, caso não tivesse concluído o
contrato. Trata-se de um interesse que não
diz respeito ao contrato como fonte negocial
de obrigações, mas esse como fato histórico.
Fala-se repetidamente na doutrina de
interesse contratual negativo, entendido como
o interesse a não conclusão para diferenciá-lo
daquele positivo que é o interesse à execução
do contrato (DI MAJO, 2003).
Em relação à doutrina estrangeira,
percebe-se que a orientação é pela satisfação
do interesse negativo. Partindo do princípio
de que o credor, escolhendo a resolução,
deixou de lado a opção de cumprimento do
contrato, em espécie ou pelo equivalente, e
considerando ainda que o efeito extintivoretroativo da resolução elimina a relação,
não caberia outra indenização senão
aquela derivada da confiança na eficácia
do contrato, para a qual apenas interessa
a recomposição da situação existente ao
tempo da celebração.
É a opinião predominante em Portugal.
Segundo Almeida Costa (1991, pg. 69),
a orientação do Código Civil é a de que,
optando o lesado pela resolução do contrato,
seria em substância contraditório que, ao
mesmo tempo, pedisse a indenização pelo
seu não cumprimento. O que decorre da
lógica e coerência dessa opção é colocar
o prejudicado na situação em que se
encontraria se o contrato não houvesse sido
celebrado.
Igualmente Antunes Varella (1997,
pg. 101) entende que desde que o credor
opte pela resolução do contrato, não faria
sentido que pudesse exigir do devedor o
ressarcimento do benefício que normalmente
lhe traria a execução do negócio.
Pontes de Miranda (1959, pg. 33.),
porém, é de opinião diversa: depois de dizer
que o interesse negativo é o que vem em
primeiro lugar, acrescenta: “mas, à diferença
do direito alemão e do suíço, o direito
brasileiro admite que se levem em conta o
interesse negativo e o positivo”.
Realmente, no sistema legislativo
brasileiro, esta última é a orientação mais
71
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
coerente com a realidade, como será
abordado a seguir no item acerca da extensão
dos danos indenizáveis. Segundo Adolfo
di Majo (2003, pg. 229) a verdade é que a
diferença entre interesse contratual positivo
e negativo nao é de ordem quantitativa, mas
qualitativa. Trata-se de interesse (tutelado)
de natureza diferente: um (aquele positivo)
diz respeito à plena e correta execução do
contrato; outro (aquele negativo) diz respeito
à validade e/ou eficácia deste. No primeiro
há carater dinâmico, no segundo, estático,
porque direcionado à proteção da própria
esfera patrimonial contra danos patrimoniais
que o contrato como fato histórico ocasionou.
Mas ambos encontram proteção no regime
da responsabilidade contratual sob a espécie
de aspectos diferentes do dano (contratual)
ressarcivel.
Dentro desta descrição, Visintini (1983,
pg. 814) demonstra que a racionalidade do
artigo nada mais é do que a limitação da
ressarcibilidade, porque o critério legislativo
das consequências diretas e imediatas
continua a desenvolver no campo contratual a
função de limitar a ressarcibilidade de algumas
consequências danosas compreendidas
na série causal dos danos conexos ao
inadimplemento. Tudo isso porque, segundo
Martins-Costa (2004, pg. 358), o lucro
cessante representa aquilo que o devedor
razoavelmente deixou de lucrar, ou seja,
a diminuição potencial de seu patrimônio,
causada pelo inadimplemento da contraparte.
Assim, o dano deve ser certo, o que significa
dizer que não pode ser uma mera hipótese.
Porém, pode haver um prejuízo futuro que
seja certo, e não mera hipótese – é o caso
abrangido justamente pela expressão ‘lucro
cessante’ que é a perda do ganho esperável,
da expectativa de lucro ou a diminuição
potencial do patrimônio da vítima.
1.2 Extensão dos danos indenizáveis
Tarefa nem sempre fácil é a de
estabelecer a extensão do prejuízo
indenizável, vale dizer, quais são os efeitos
do dano que devem ser indenizados. O artigo
944 consagra a teoria da reparação integral.
A equivalência entre dano e indenização
gera muitos problemas principalmente no que
se refere ao ‘quantum’ (quanto será preciso
colocar no prato do dano e no prato da
indenização para que a balança se equilibre
sobre o fiel). Nesta seara, a discussão versa
sobre os danos emergentes e os lucros
cessantes, danos esses diretos e imediatos
de sua causa – o inadimplemento. Vejamos
o que diz o Código:
Art. 403.: Ainda que a inexecução
resulte de dolo do devedor, as perdas e danos
só incluem os prejuízos efetivos e os lucros
cessantes, por efeito dela direto e imediato,
sem prejuízo do disposto na lei processual.
Para Judith Martins-Costa (2004, pg.
354), o prejuízo é direto quando decorre por
relação de causa e efeito diretamente do fato
danoso, atingindo a vítima, em si mesma ou
seu patrimônio, sem intermediação. Já o dano
indireto é aquele tangencial, que não pode
comportar um ressarcimento, sob pena de
representar um desequilíbrio no nexo de causal,
sustentando uma iniquidade na reparação.
2. A quebra positiva do contrato e o
dever de indenizar
Segundo a lição de Vera Fradera
(1998, pg. 144), a quebra positiva do
contrato pode ser definida como sendo
a lesão culposa da obrigação que não
tenha como fundamento a impossibilidade
ou a mora. É então o não-cumprimento
de um dever legal quando devido em um
contrato. Para a autora, é na doutrina de
Staub que se encontra o desenvolvimento
do instituto, que o identificou segundo um
grupo de casos onde existe a violação de
um vínculo através de atuações positivas,
isto é, fazendo-se o que deveria ser omitido,
ou realizando-se a conduta devida, mas de
maneira imperfeita. Por meio desta teoria
da quebra positiva do contrato teve início
a transformação da compreensão da lesão
da relação jurídico-obrigacional, admitindose a existência de deveres acessórios ou
implícitos, instrumentais e independentes,
junto à obrigação principal, deveres esses
vinculados à aplicação do princípio da boa-fé.
O descumprimento destes deveres, se
comprovado o prejuízo, deve ser indenizado
72
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
no esquema da responsabilidade contratual
até aqui abordada. Tanto é assim que o
art. 422 do Código Civil determina que
os contratantes são obrigados a guardar,
assim na conclusão do contrato como em
sua execução, os princípios de probidade
e boa-fé. A lesão positiva do contrato
vincula-se à boa-fé, possibilitando o
exercício do poder de resolução antes que
se consume o inadimplemento, desde que
o devedor tenha repudiado expressamente
o cumprimento da obrigação ou que as
circunstâncias objetivas apontem para
a impossibilidade de fazê-lo. Difere do
inadimplemento, quando, via de regra, há
uma omissão do devedor; na lesão positiva,
um ato comissivo revela a indisposição ou
a impossibilidade quanto ao adimplemento
futuro (PASQUALOTTO, 1997).
dano derivado de uma obrigação secundária
correlata, pode até ser exigida a indenização,
mas já não mais com a natureza que teria se
estivesse vinculada ao contrato. Assim que,
para Paolo Gallo (2002, pg. 261) no âmbito
dos deveres acessórios que encontram
fundamento no princípio da boa-fé, é notável
a relevância que assume os deveres de
proteção. Trata-se de um instituto que foi
elaborado na Alemanha (Schutzpflichten)
nesta área de problemas. A existência dos
deveres de proteção depende da existência
de uma válida obrigação, se a obrigação
resultasse insubsistente. Por exemplo,
como consequência da nulidade do contrato
sobre o qual se funda, a responsabilidade
poderia transformar-se de inadimplemento
para aquiliana.
2.2 A implicação do princípio da
boa-fé objetiva em relação ao lesado na
relação contratual
O princípio da boa-fé objetiva impõe
ao lesado o dever de diligência, para agir
de forma a não aumentar o seu prejuízo,
deixando-o circunscrito apenas àquilo que
está sob a responsabilidade do devedor,
impedindo sua eventual expansão. A boafé, como cláusula geral que é, pode de
várias maneiras fazer possível a nova
diretriz
ético-social
do
ordenamento.
Segundo Martins-Costa (2003, pg. 355),
a colaboração e a tutela da confiança,
decorrentes da operatividade do princípio da
boa-fé objetiva, orientam axiologicamente a
complexidade, a dinamicidade e a potencial
transformabilidade, no tempo, que estão na
base das obrigações, na medida em que as
situações jurídicas subjetivas complexas são
compostas por um dinâmico ‘todo’ de direitos,
deveres, faculdades, ônus, expectativas
legítimas, etc., finalisticamente interligados
ou coligados.
Na doutrina italiana, nomes de peso no
assunto, como o de Giovanna Visintini, já na
década de 80 do século passado, ensinavam
as implicações do princípio da boa-fé
objetiva em relação ao lesado na relação
contratual. Para aquela autora, registra-se,
no campo contratual, uma interpretação
2.1 Os novos deveres e suas
violações: a abrangência do dever de
indenizar
O tema dos novos rumos da
responsabilidade civil contratual, como foi
visto em nota introdutória, apresenta-se em
coerência com a nova axiologia típica de um
Código preocupado com os novos valores
ético-sociais. Em matéria de indenização,
terreno fértil do Direito Privado, onde as
mudanças sociais se refletem de forma mais
intensa, não poderia deixar de apresentar a
tutela dos novos interesses da sociedade.
Para Clóvis do Couto e Silva (1976, pg. 39),
o comportamento que o Direito valoriza é o
de ambos os partícipes. Compreendida a
relação jurídica como um todo; a liquidez do
princípio da culpa vem encontrar sua justa
medida na contemplação da conduta do
outro figurante.
Para Paolo Gallo (2002, pg. 261), também
na Itália é claro que a conclusão do contrato
obriga não somente a adimplir a obrigação
principal, mas também uma miríade de
obrigações de natureza acessória, funcionais
ao exato adimplemento, fundadas na boa-fé.
Interessante é perceber que quando
a obrigação contratual principal já não
tem mais subsistência, qualquer que seja
o motivo, no que concerne a um eventual
73
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
evolutiva, na jurisprudência mais recente que
se traduz num maior envolvimento referente
ao passo do credor, chamado a empreender
comportamentos positivamente voltados a
reduzir o dano e não somente a abster-se de
agravá-lo (VISINTINI, 1983).
Segundo Ruy Rosado, a consideração
dos danos deve atender a alguns parâmetros.
Dentre eles, a “doctrine of mitigation”
recomenda que o lesado (credor, autor da
ação de resolução) deve comportar-se de
modo a mitigar os danos, mantendo-os
nos limites imediatamente decorrentes da
existência do ato ilícito (2003, pg. 266). O
autor cita André Tunc para corroborar a sua
posição, afirmando que a vítima não pode
assistir passiva ao desencadear das diversas
consequências da culpa, mas deve reagir com
todo seu vigor contra suas consequências na
medida em que elas agravariam o dano.
Para Adalberto Pasqualotto (1997, pg.
120), neste tema há adequada analogia com a
“anticipatory breach of contract”, desenvolvida
no direito inglês. Ocorrendo a lesão antecipada
do contrato, nasce um novo dever para o
credor, que é o de tomar todas as medidas
razoáveis para limitar o vulto do prejuízo, cujo
ressarcimento poderá demandar ao devedor
(duty to mitigate damages).
Para arrematar, a lição de Miguel Reale
é a de que a boa-fé objetiva tanto a forma de
conduta como a norma de comportamento,
numa correlação objetiva entre meios e
fins, como a exigência de adequada e fiel
execução do que tenha sido acordado
pelas partes. Isso significa que a intenção
destas só pode ser endereçada ao objetivo
a ser alcançado, tal como este se acha
definitivamente configurado nos documentos
que o legitimam. A boa-fé representa
o superamento normativo e, como tal,
imperativo daquilo que, no plano psicológico,
se põe como intentio leal e sincera, essencial
à juridicidade do pactuado.
jurídico privatístico brasileiro, fica evidente
a
transformação
dos
conceitos
e,
principalmente, da forma de se perceber a
normativa axiológica no plano concreto.
Trata-se de responsabilidade contratual,
matéria que não é nova, ao contrário,
que foi objeto de muitos estudos sobre a
sua primazia perante a responsabilidade
aquiliana. Mas o ordenamento mudou, ou
assim se pretendeu, com as inovações
trazidas pelo Código Civil vigente desde
2003, que a diretriz sistemática se apresenta
como um novo modelo e tratamento para o
“fim negativo” do contrato.
Esta mudança, além de atualizar a letra
da lei àquelas questões já suscitadas pela
doutrina, como o caso da boa-fé objetiva,
etc., sistematizou o inadimplemento como
categoria própria. Razões para isso são
muitas, que para além da ideia indispensável
de sistematização, se assentam também na
ideologia ético-social do Novo Código.
Percebe-se com o presente estudo que
ainda a teoria unitária das fontes obrigacionais
se apresenta como a mais adequada, na qual
o ato ilícito, conforme expresso no artigo 186
do Diploma Civil, se dá pela ação ou omissão
voluntária, negligência, imprudência ou
imperícia, caracterizada pela violação de direito
e da causação do dano, categoria explicitamente
cabível na responsabilização contratual.
O dever de indenizar pressupõe a
presença de determinados elementos,
quais sejam o ato ilícito, o dano, a culpa e
o nexo causal. Acerca da discussão sobre o
fundamento da responsabilização contratual
estar assentado na imputação, isto é, na
culpa, em contrariedade ao posicionamento
de alguns bons juristas, como Fernando
Noronha, por exemplo, parece evidente
a opção do Novo Código em permanecer
baseada na responsabilidade do nexo de
imputação, ainda que o elemento objetivo
(violação de um dever de conduta) esteja
prevalentemente mais exposto.
O dever de indenizar marca justamente
a obrigação que nasce do inadimplemento
contratual. Esta indenização dá-se em
parâmetros que podem atender todo o
discurso sobre o novo sentido axiológico
Conclusões
A partir do momento em que uma
sociedade se propõe a inserir como pilar
essencial do ordenamento à diretriz
ético-social, como foi feito no sistema
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Contrato por Inadimplemento. São Paulo:
Rev. dos Tribunais, 2004.
do ordenamento, abrangendo inclusive
delimitação do ressarcimento quando o
credor não age em conformidade com
o princípio da boa-fé e dentro de suas
possibilidades estanca os danos que são de
responsabilidade do inadimplente.
Como melhor conclusão é a opinião
de Guido Alpa, segundo o qual a análise de
algumas regras relativas ao inadimplemento
contratual e às técnicas de ressarcimento
do dano dele, consequente, demonstra que
os modelos da análise econômica do direito
não são neutros: eles se movem de um
ordenamento positivo ou da concessão do
direito que são próprios de uma experiência
histórica determinada. O recurso ao modelo
perfeito, ideal, abstrato pode ser útil como
quadro de referência mas, para atingir
resultados concretos, é preciso colocar a
análise na realidade dos ordenamentos e da
elaboração contratual que constituem o seu
fundamento (1996, pg. 722).
BECKER, Anelise. Elementos para uma
Teoria Unitária da Responsabilidade Civil.
Revista de Direito do Consumidor. São
Paulo: Rev. dos Tribunais, Vol. 13, 1995.
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ASSIS,
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Resolução
MARTINS-COSTA,
Judith,
O
Adimplemento e Inadimplemento das
Obrigações no Novo Código Civil e seu
sentido ético e solidarista. O Novo Código
do
75
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Civil: Estudos em Homenagem ao Prof.
Miguel Reale, São Paulo: Editora LTr, 2003.
PAQUALOTTO, Adalberto. A boa-fé
nas obrigações civis. Faculdade de Direito:
O Ensino Jurídico no Limiar do Novo
Século, org. Antonio Paulo Cachapuz de
Medeiros. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1997.
MARTINS-COSTA, Judith. Comentários
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RUFFOLO, Ugo, Il Parallelismo colpa
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negoziale nella pianificazione provata. Riv.
Trim. Dir. e Proc. Civ, anno XXXII, v. 1-2,
1978
MIRANDA, Francisco Pontes de.
Tratado de Direito Privado: Direito da
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1959.
VISINTINI, Giovanna, Risarcimento Del
Danno. Rivista di Diritto Civile, anno XXIX,
1983. p. 811 a 822.
NORONHA, Fernando. Direito das
Obrigações. vol. 1. São Paulo:Editora
Saraiva, 2003.
76
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Los trabajadores extranjeros en la
Argentina y en el Brasil: sus consecuencias
para el DIPr1
Prof. Dr. Silvio Javier Battello(1)
Prof. Julio Córdoba(2)
Resumo: O presente trabalho analisa o rol social e jurídico dos imigrantes
na Argentina e no Brasil, desde o descobrimento das Américas até nossos dias.
O estudo, eminentemente evolutivo, verifica a participação dos trabalhadores
estrangeiros através do prisma do Direito Internacional Privado. Texto em espanhol.
Palavras chaves: Trabalhadores, Imigrantes, Direito Internacional Privado.
Abstract: This study examines the social and legal role of immigrants in
Argentina and Brazil, since the discovery of the Americas. The study, eminently
historical, verifies the participation of foreign workers through the prism of private
international law. Text in Spanish.
Key-words: Workers, Immigrants, Private International Law.
Introducción
América Latina se caracteriza por ser
una región de contrastes. Existen sectores
económicos y parcelas sociales muy
desarrollados. Basta transitar por los centros
comerciales de São Paulo o Buenos Aires
y notaremos que no se diferencian de los
de las capitales europeas o de ciudades
norteamericanas. Pero estas parcelas
de gran desarrollo se vinculan con otros
sectores sociales mayoritarios, de clases
económicas menos favorecidas, y que en
muchos casos guardan relación con antiguos
sistemas productivos de la época colonial, y
obviamente relaciones sociales que todavía
conservan este esquema.
La dicotomía o diferencias sociales
pueden ser encontradas en varios países,
por ejemplo, del continente africano.
Pero a diferencia del continente negro,
donde las clases económicas aparecen
yuxtapuestas y donde no hay integración
social2, en América Latina se mantiene una
combinación estructural, una interrelación
tanto de aspectos económicos como de
aspectos sociales que son fruto de una larga
y compleja historia3.
Son las particularidades del continente
americano las que determinan una forma
particular de tensión estructural de sus
sociedades, y por consecuencia, de las
relaciones laborales que en ellas se verifican.
(1)
Abogado en Argentina y Brasil; Especialista en Derecho Empresarial; Doctor en Derecho; Profesor de Derecho en Cursos de Grado
y de Posgrado; Director del Estudio Youhao Group do Brasil.
(2)
Abogado en Argentina; Profesor de grado y de Posgrado de Derecho Internacional Privado y de Contratos internacionales de la
Universidad de Buenos Aires.
1
O presente trabalho foi apresentado no “XXII CONGRESO ARGENTINO DE DERECHO INTERNACIONAL: ARGENTINA Y SU
PROYECCIÓN LATINOAMERICANA, en el BICENTENARIO de la REVOLUCIÓN de MAYO”, realizado na cidade de Salta, Argentina,
nos dias 21, 22 e 23 de outubro de 2010.
2
Sobre las relaciones sociales y económicas en el continente africano, véase: HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos. Breve século
XX. 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, en especial págs. 337 y ss. y 421 y ss.
3
La historia latinoamericana puede ser entendida y comparada a partir de la obra de BETHEL, Leslie (Org). Historia da América Latina.
Vol. I, II y III (do período colonial até 1930). São Paulo: Edusp, 2004; de forma más resumida: CHEVALIER, François. América Latina.
De la independencia hasta nuestros días. México: Fondo de la Cultura Económica, 1999.
77
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Argentina y Brasil no escapan de esta realidad,
y se suma para estos países una situación
particular cuando hablamos de relaciones
laborales con elementos extranjeros.
Para intentar explicar este fenómeno
y su reglamentación legal, hemos divido
nuestro trabajo en dos partes. En un primer
momento analizaremos como evolucionó
y cuáles son las características del trabajo
en ambos países. Y en la segunda parte,
veremos cómo esta naciones tratan las
relaciones iusprivatistas internacionales
originadas en un vínculo laboral.
mercado del trabajo. Pero en ambos casos, la
multiplicidad de servicios continúa retratando
como trasfondo funciones económicas y
sociales propias de la época colonial. Pero
esto solo puede ser explicado a partir de las
distintas etapas históricas que dieron lugar al
escenario actual.
A) La colonización europea y el
trabajo como explotación
La colonización tuvo dos finalidades
principales, la cristianización de los pueblos
americanos y la explotación (al máximo y en
el menor tiempo posible) de las riquezas del
nuevo mundo. La cristianización se llevó a
cabo principalmente por obra de los Padres
de la Iglesia Romana por autorización de la
Corona5. Y la explotación económica por el
trabajo de indios6 y negros traídos de África7.
Recordemos que los europeos de los primeros
tiempos de la colonia no arribaron para trabajar
la tierra, y menos aún en las minas.
Pero desde el inicio se notó una dualidad
o un desencuentro de principios en relación
al tratamiento de los indios, porque existía,
por un lado, la necesidad de mano de obra,
y por otro, las preocupaciones humanitarias
más o menos formales de la Iglesia8. A la
dicotomía valorativa sobre el indio se le
sumaban las dificultades para administrar las
colonias, ya que las decisiones tomadas en
las metrópolis demoraban meses en llegar al
nuevo continente, y en ámbito recursivo, las
soluciones podían demorar inclusive años. Se
genera así una revolución, sobre todo mental,
de españoles y portugueses en la forma de
administrar el trabajo en las Américas.
La principal actividad económica fue
la explotación de metales preciosos, que
en los primeros tiempos se encontraban
El concepto (y valor) del trabajo y su
evolución en América del Sur
La realidad laboral latinoamericana,
y en especial la argentina y brasileña, es
muy diferente al ‘trabajo’ y a la repercusión
jurídica que el instituto tiene en Europa y
los Estados Unidos. En el hemisferio norte
las modalidades de trabajo se diversificaron
notablemente luego de la revolución
industrial, aún más luego de la revolución
tecnológica desde la segunda mitad del
siglo XX hasta nuestros días. Sin embargo,
el ‘trabajo’, o mejor, el valor social del
trabajo no se diversificó, al contrario, fue
evolucionando en línea recta y convergente4.
Así, las condiciones sociales del trabajo en
los países europeos y en los Estados Unidos
son relativamente uniformes: agricultor,
albañil, enfermero o profesor realizan tareas
distintas, pero el lugar que ocupan en la
sociedad, las relaciones con sus patrones
y con el conjunto de la sociedad son
relativamente uniformes en todos los casos,
inclusive con los trabajadores extranjeros.
Brasil
y
Argentina
también
experimentaron una fuerte diversificación del
Para un análisis de esta realidad, o realidades, véase: BAUMAN, Zygmunt. La Globalización. Consecuencias humanas. Buenos
Aires: Fondo de Cultura Económica, 2010.
Cf. BERNARDAS, Josep. A Igreja Católica na América Espanhola Colonial. In: BETHEL, Leslie (Org). Historia da América Latina.
Vol. I, citado, p. 521 y ss.; HOORNAERT, Eduardo. A Igreja Católica no Brasil Colonial. In: BETHEL, Leslie (Org). Historia…, Vol.
I. p. 553 y ss.
6
Cf: MACLOED, Murdo. Aspectos da Económicos interna da América Espanhola Colonial: Mão de Obra; Tributação; Distribuição
e Troca. In: BETHEL, Leslie (Org). Historia…, Vol. II, citado, p. 219 y ss.
7
Cf: SCHWARTZ, Stuart. O Brasil Colonia, C. 1580-1750: As Grandes Lavouras e as Periferias. In: Leslie (Org). Historia…, Vol.
II, citado, p. 339 y ss.
8
El tema aparece magistralmente ilustrado por: GIBSON, Charles. As Sociedades indígenas sob o Domínio Espanhol. In: Leslie
(Org). Historia…, Vol. II, citado, p. 269 y ss.
4
5
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para tornar rentables estas actividades.
El trabajo agrícola era llevado a cabo
por esclavos e indios. Para estos últimos se
utilizaba el régimen de la Encomienda11, que
fue la forma predominante en las colonias
españolas. Ya en los territorios portugueses,
y debido a la falta de aptitud de los
aborígenes locales para este tipo de trabajos,
se utilizaron también esclavos africanos12.
A medida que la actividad agrícola se
desarrollaba comenzaron las exportaciones
para Europa (s. XVII) de aquellos productos
típicamente americanos: azúcar, café, cacao,
etc.. De esta forma se afianzaron las grandes
propiedades rurales, y en su seno, sistemas
de producción y relaciones de trabajo casi
feudal, también conocidos en Brasil como
sistema de coronelismo.
Para fines de la época colonial (fines
del siglo XVIII y comienzo del siglo XIX) son
evidentes dos características particulares de
la organización social y laboral de la región, y
que de cierta forma perduran hasta nuestros
días: a) Un sector urbano a través del cual se
manifiesta el poder (esa pequeña burguesía);
b) Una clase social peculiar, los propietarios
de latifundios, íntimamente vinculada al
poder central, de quien recibían mano de
obra indígena y tierras13.
con facilidad y en grandes cantidades. Pero
a medida que el tiempo fue pasando las
dificultades aumentaron, la localización de
los minerales se complicaba y se requirió un
aumento geométrico de la mano obra9.
La necesidad de mano de obra fue
motivo determinante para la creación de
un sistema de trabajo indígena sui generis,
diverso de la esclavitud o del trabajo de los
hombres libres conocidos por Europa en
la época. Los indios eran reclutados por la
fuerza y sometidos al régimen colectivo de la
Mita10. Fue tan destacada la actividad minera
que los primeros centros urbanos se formaron
a su alrededor (Potosí, Lima, Cuzco, México)
y en los puertos de exportación (Veracruz,
Cartagena, Callao, Buenos Aires). Estos
nuevos centros urbanos crearon desde el
comienzo el problema de la relación ciudad–
interior. Esto se debe a que en las ciudades
no solo permanecieron la mayor parte de
los europeos, sino que también comenzaron
a concentrar una gran cantidad de mano de
obra con cierta calificación, por lo que se dio
origen a una pequeña burguesía (superior
cuantitativamente a los habitantes del interior).
El desarrollo de la agricultura comenzó
como forma de abastecer a los habitantes de
las ciudades y de las minas, primeramente
con productos típicamente americanos,
como la papa, mandioca, maíz, y a posterior
con la introducción de productos europeos,
como el trigo. En esta primera etapa el
cultivo se concentró en las zonas tropicales.
Pero la falta de tecnologías y medios de
transporte deficitarios fueron determinantes
para el surgimiento de grandes latifundios
(fazendas), con producción a gran escala y
grandes inversiones como única alternativa
B) Las nuevas Repúblicas y la
“importación” de trabajadores
Para los albores del siglo XIX la
economía colonial ya había dejado de
cumplir la promesa de los primeros años de
la conquista. Portugal y España no eran más
las grandes potencias que fueron en el siglo
XVI, y se desmoronaron frente a la presión
de otras naciones europeas.
Por ejemplo, las minas de plata de Potosí que están situadas a más de 3 mil metros de altura, con elevado riesgo de exploración.
Sobre la explotación de los indios en las minas de Potosí, véase: BAKEWEL, Peter. A Mineração na América Espanhola. In: Leslie
(Org). Historia…, Vol. II, citado, p. 99 y ss.
10
El nombre Mita es de origen quichua, y era el término utilizado por los indios enviados a trabajar de todas las partes de Perú y Charcas
para trabajar en las minas de Potosí por un periodo fijo de 6 o 12 meses, luego del cual eran sustituidos por otro grupo y retornaban para
casa. El uso de la palabra indica claramente que los indios asociaban este trabajo para los españoles a la Mita impuesta anteriormente
por los incas, un reclutamiento para varios tipos de trabajos públicos, inclusive trabajos de minería.
11
En el sistema de encomienda, se entregaba a una persona un grupo de indios para que se aproveche de su trabajo, pero con la
obligación, por parte del encomendero, de darles instrucción cristiana. Para más información del instituto, véase: GIBSON, Charles.
As Sociedades Indígenas…, citado, p. 272.
12
Cf: MARCÍLIO, Maria Luiza. A População do Brasil Colonia. In: Leslie (Org). Historia…, Vol. II, citado, p. 327.
13
Para un estudio más detallado: ALDEN, Dauril. O Periodo Final do Brasil Colonia, C. 1690-1808. In: Leslie (Org). Historia…, Vol. II,
citado, p. 527 y ss.
9
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El tráfico ilícito era tan o más importante
que el propio comercio legal. Las colonias,
por voluntad expresa de las metrópolis, no
poseían prácticamente ninguna industria y
casi todos los bienes manufacturados debían
traerse de Europa.
Al declararse las independencias
nacionales, ninguna de las nuevas repúblicas
latinoamericanas poseía una estructura
capitalista de producción, y las posibilidades
de grandes inversiones internas eran casi
nulas. En la Argentina, porque las guerras de
la independencia agotaron los recursos de
la incipiente Nación; y en el Brasil, porque la
actividad económica estaba exclusivamente
volcada para la exportación de productos
agrícolas que no dejaban saldo suficiente
para la reinversión. Esto hizo que no se
modifique, por lo menos en los primeros
tiempos, la estructura social vigente. Al
contrario, las relaciones sociales y laborales
fueron reforzadas14.
De cualquier forma, no podemos dejar
de mencionar otros cambios importantes
en la región. En primer lugar, como la
producción mineral quedó en segundo plano
(solo continúa en Bolivia con el bismuto y el
estaño), tomó mayor relevancia la producción
agrícola, concentrada fundamentalmente en
los países tropicales (azúcar, café, cacao).
Pero el desarrollo del transporte marítimo
junto con la implementación de los métodos
frigoríficos hicieron posible la exportación
en gran escala de carne. Esto modifica el
equilibrio de la región, y la anterior supremacía
de los países tropicales fue sustituida por la
de los países templados (Argentina, Uruguay
y Chile). Las exportaciones de carne y trigo
sirvieron para abastecer las necesidades del
continente europeo que sentía las dificultades
de la superpoblación.
Como acabamos de mencionar, existe
aquí una especie de divorcio entre los países
tropicales, que continúan aumentando su
producción, pero que no modifican sus
estructuras latifundistas, y por otra parte
Argentina que poco a poco avanza para una
producción cada vez más industrial. Por su
parte, Brasil se divide: São Paulo y el sur del
país acompañan los cambios en la actividad
productiva, mientras que el centro y norte del
país mantienen el sistema de coronelismo
propios de la etapa colonial15.
Para la instalación y desarrollo de
la actividad industrial desde fines del
siglo XIX y comienzos del siglo XX fue
necesario incorporar más capital y mano
de obra especializada. Europa provee
ambos elementos. Capital, generalmente
por inversiones privadas (inglesas) para
infraestructura, y mano de obra por medio
de las grandes corrientes inmigratorias que
llegaron a la Argentina, São Paulo y sur del
Brasil. Pero la nueva mano de obra no tiene
las características del trabajo del indio ni
del trabajo esclavo. En el ámbito jurídico, la
llegada en masa de trabajadores europeos,
toma una dimensión especial. Los inmigrantes
son recibidos por los gobiernos con buenos
ojos, ya que ven en ellos una herramienta
más para impulsar una revolución industrial
que llega tarde a la región.
Las primeras contrataciones de
trabajadores europeos se realizaban
siguiendo los antiguos institutos romanos
de la locatio conductio operarum y la
locatio conductio operis16, rebautizados
y actualizados bajo las figuras típicas de
la locación de servicio y locación de obra
respectivamente, sin reconocer aún los
derechos y garantías laborales.
A diferencia de los españoles y
portugueses de los primeros tiempos de
la vida colonial, los nuevos inmigrantes
europeos no se mezclaron con los indios y
negros aquí asentados. Fueron absorbidos
Comparten esta posición, entre otros: HALPERÍN DONGHI, Tulio. A Economia e a Sociedade na America Espanhola do PósIndependência. IN: Leslie (Org). Historia…, Vol. III, citado, p. 277 y ss.; BETHEL, Leslie y MURILO DE CARVALHO. O Brasil de
Independência a Meados do Sec. XIX. In: Leslie (Org). Historia…, Vol. III, citado, p. 695 y ss.
15
Sobre el crecimiento económico de São Paulo y las diferencias con otras regiones de Brasil, véase: CHEVALIER, François. América
Latina, citado, p. 214 y ss.
16
Para un estudio detallado de las figuras romanas y su sobrevida en los sistemas jurídicos modernos, véase: GOMEZ-IGLESIAS, Angel
Casal. La influencia del Derecho Romano en las Modernas Relaciones de Trabajo. Madrid: Editorial Civitas, 1995, en especial p. 65 y ss.
14
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casi en su totalidad por las ciudades, ahora
en incipiente proceso de industrialización,
o se recluyeron en colonias agrícolas que
ellos mismos fundaron, como atestiguamos
en las provincias de Buenos Aires, Santa Fe
y Córdoba en la Argentina, y en Rio Grande
do Sul y Santa Catarina en el Brasil. Indios,
mestizos y negros quedaron relegados a las
actividades agrícolas.
El arribo de europeos para el sector
industrial y confinamiento del indio y el
negro en la propiedades rurales crearon
una reserva casi ilimitada de mano de obra,
lo que permitió que los salarios en ambos
países se mantengan muy estables en el
siglo XIX y primeras décadas del siglo XX.
Por otra parte, los ingresos provenientes
de las actividades agrícolas e industriales
fueron aumentando gradualmente. Así, la
antigua y pequeña burguesía urbana no solo
se mantiene en el poder, sino que también
aumenta sus riquezas.
Como consecuencia de lo expuesto
se produce una separación entre las zonas
urbanas y las zonas rurales. En las regiones
urbanas, y a pesar de los bajos sueldos, se
establecen relaciones de trabajo similares a
las europeas. La inmigración creo nuevas
actitudes sociales que condujeron a formas
más desarrolladas en la organización del
trabajo, y fueron los propios inmigrantes
quienes introdujeron las ideologías y la
estructura políticas del mundo laboral
(sindicalismo-socialismo). Pero en las
regiones rurales, y salvo raras excepciones,
las relaciones laborales no se modificaron, y
continuaron obedeciendo a la voluntad de los
propietarios de la tierra.
de gobiernos democráticos y gobiernos de facto
o militares17. Pero las constantes alteraciones
de la vida política no alteran el cuadro de las
relaciones laborales, básicamente porque
la oferta de mano de obra continúa siendo
prácticamente ilimitada, y por tanto, los dueños
del capital y del poder continúan aumentando
sus ganancias pero sin aumentar los niveles
de ingreso de los trabajadores.
Si bien es cierto que en el ámbito jurídico,
y en especial durante las presidencias de
Juan Domingo Perón y Getulio Vargas,
los derechos laborales y sindicales
son reconocidos y positivados a nivel
constitucional (superando definitivamente
los esquemas civilistas de este tipo de
contratación), tales mejorías no repercutieron
significativamente en la economía de los
trabajadores. Por estas y otras razones, a
medida que el siglo XX avanzaba el interés
de los trabajadores europeos para arribar
a sud América disminuía. Ya en la segunda
mitad del siglo Argentina y Brasil dejan de
ser definitivamente una alternativa para los
trabajadores europeos.
La libertad, el estímulo y los subsidios
a la inmigración de finales del siglo XIX y
comienzo del siglo XX quedan en el pasado
luego de la segunda guerra mundial. Tanto
Argentina como Brasil inician intensos
procesos de control y reglamentación de la
inmigración de trabajadores. En la segunda
mitad del siglo XX los inmigrantes vienen
de países vecinos como Paraguay, Bolivia
y Perú, que se trasladan a los centros
urbanos de Argentina y Brasil en busca de
nuevas oportunidades. Surge el flagelo del
desempleo (que se mantiene hasta nuestros
días) y comienza el éxodo interno de los
trabajadores rurales para las principales
ciudades de ambos países que crecen
descontroladamente, con el agravante de
asentamientos irregulares conocidos como
villas miseria o favelas18.
Con la caída del Muro de Berlín en
1989, el fin de la guerra fría y la implosión
C) Del siglo XX (del trabajo como
Derecho) al siglo XXI (del trabajo como
integración)
Luego de la primera guerra mundial,
y en especial con la crisis económica de
1930, Argentina y Brasil inauguran una etapa
caracterizada por las alteraciones constantes
Sobre las alteraciones políticas de ambos países, véase el trabajo de historia comparada de FAUSTO, Boris y DEVOTO, Fernando.
Brasil e Argentina. Um ensaio de Historia Comparada (1850-2002). São Paulo: Editora 34, p. 259 y ss.
Cf: Brasil, Reforma ou caos / Helio Jaguaribe… (et al.). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989, p. 63 y ss.
17
18
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del delicado equilibro mundial EUA-URSS, el
mundo se globaliza. Si bien la globalización
aún se muestra como un concepto en proceso
de elaboración, es evidente que por su causa
la noción y el valor del trabajo se altera,
quizás gracias al extraordinario desarrollo
tecnológico en los más diversos ámbitos
(transporte,
comunicación,
educación,
etc.)19. También es verdad que Argentina
y Brasil todavía no recibieron los aspectos
más positivos de este fenómeno, y ambas
sociedades no modificaron sustancialmente
sus estructuras laborales20. Por el contrario, la
mundialización actual solo refleja sus marcas
más negativas en el hemisferio sur, como
es, por ejemplo, el apartheid tecnológico
de la mayor parte de los trabajadores de
estas latitudes. Esta exclusión agudiza las
diferencias socio-económicas laborales,
aumenta la polarización entre trabajadores
rurales y trabajadores urbanos, y limita el
desarrollo personal y familiar del asalariado
no capacitado, además de aumentar la
brecha que separa a los países ricos
(tecnificados) de los países pobres (en vías
de tecnificación).
El desarrollo económico fue el arma
elegida por los gobiernos para contrarrestar
los efectos nocivos de la globalización en el
ámbito laboral, en especial el desempleo, y
alcanzar el bienestar general21. Desde los
últimos gobiernos militares hasta nuestros días
las políticas públicas utilizan como principales
estrategias la industrialización nacional y la
inversión extranjera, con mejores resultados
en el Brasil que en la Argentina, que también
utilizó (y abusó) en los años 90 del régimen
de las privatizaciones de empresas públicas.
La soñada industrialización, si bien es una
realidad en el Brasil, no tuvo los resultados
deseados, primero, debido a las dificultades
en la creación de grandes polos o complejos
fabriles; y segundo, porque las políticas de
promoción empleadas siempre fueron de
‘arriba hacia abajo’, es decir, las decisiones
sobre las áreas en que es necesario
intervenir son tomadas por los gobiernos
centrales y generalmente administradas por
ellos mismos.
Actualmente las relaciones laborales,
tanto nacionales como internacionales,
se someten a la coexistencia de cuatros
fuerzas simultáneas en permanente tensión:
a) Las fuerzas globales, representadas por
la globalización de la economía y por el
conjunto de transformaciones tecnológicas,
principalmente en el ámbito de la cibernética
y de las telecomunicaciones; b) Las fuerzas
nacionales, que se materializan en los
Estados nacionales debilitados e inoperantes,
amordazados en sus estructuras internas
rígidas y por compromisos internacionales
que les impiden una actuación eficiente; c)
Las fuerzas regionales, que nacen como
forma de superar las debilidades de los
Estados nacionales, y que se constituyen
en diversos bloques de integración regional
y sub-regional; d) Las fuerzas multilaterales,
ONU, OMC, poderosas ONG, etc., cada vez
más relevantes y con mayor injerencia, en
especial la OIT para el ámbito laboral.
Es en este contexto que se desarrollan
los procesos migratorios del siglo XXI.
Actualmente Argentina y Brasil son
‘importadores’ y ‘exportadores’ de mano
de obra. La ‘exportación’ para los Estados
Unidos y Europa de trabajadores de clase
media empobrecida y la ‘importación’ de
mano de obra barata, como ya referida, de
países vecinos como Bolivia, Paraguay o
Perú, que llegan en masa a los principales
centros urbanos motivados por el crecimiento
frenético de las metrópolis y el deseo de una
mejor calidad de vida.
Ante esta realidad socio-económica
de las nuevas migraciones se nos abre el
debate jurídico sobre el tratamiento legal de
los trabajadores extranjeros y el análisis de
las normas nacionales para la solución de
sus controversias. Veamos.
Cf: BAUMAN, Zygmunt. La Globalización…, citado. En especial capítulo IV. Turistas y vagabundos, p. 103 y ss.
Cf: FAUSTO, Boris y DEVOTO, Fernando. Brasil e Argentina…, citado, p. 497.
Sobre el pensamiento económico en este periodo, véase: STIGLIZT, Joseph. Globalização. Como pode dar certo. São Paulo:
Companhia das Letras, p. 91 y ss.
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II. La situación jurídica del trabajador
extranjero
A) La actividad laboral como forma
de inmigración lícita
Las legislaciones de Argentina y
Brasil parten de principios constitucionales
comunes para reglamentar la inmigración
de trabajadores22. La Ley de Migraciones
No. 25.871 de la Argentina y el Estatuto do
Estrangeiro (Ley 6.815 de 1980) para el
Brasil determinan, entre otras formas legales
de ingreso al país, las condiciones a ser
observadas por los trabajadores extranjeros
para el ingreso en territorio nacional.
El Estatuto do Estrangeiro es más
restrictivo que la normativa argentina sobe
la materia, ya que el ingreso de trabajadores
puede ser limitado para determinados tipo de
actividades, en especial las de mano de obra
especializada o que sean de interés para el
desarrollo nacional23. Por tal motivo, los cinco
países que más han enviado trabajadores a
Brasil en los últimos años fueron Estados
Unidos, Reino Unido, Filipinas, Alemania y
China, en cuanto que la Argentina aparece
en el número veinte del ranking24.
Los extranjeros interesados deben
cumplir una serie de formalidades legales
antes del arribo al país. Quien concede la
autorización de residencia es el Ministerio
de Relaciones exteriores, previa aprobación
del Ministerio de Trabajo ya que por regla el
trámite se inicia y se concluye ante la unidad
consular brasileña del lugar donde el trabajador
reside25. Entre otros requisitos, deben
presentarse comprobantes de residencia,
de inexistencia de antecedentes criminales,
certificado de nacimiento o casamiento y, de
existir, el contrato de trabajo legalizado por el
Ministerio de Trabajo del Brasil.
Las
exigencias
enunciadas
y
establecidas por Ley funcionan para un
número reducido de trabajadores extranjeros,
trabajadores de cuello blanco, científicos o
personas altamente calificadas. Sin embargo
la realidad social, principalmente de las
regiones urbanas, demuestra que existe
un número mucho mayor de trabajadores,
de cuello azul, que ingresan al país desde
estados limítrofes para realizar tareas
menos calificadas. Estos trabajadores no
son considerados como inmigración lícita, y
la mayoría actúa en la informalidad, sin los
beneficios y derechos de los trabajadores
legales. Los extranjeros en esta situación
pueden ser deportados en los términos
del art. 57 y siguientes del Estatuto do
Estrangeiro26.
Para el Derecho Brasileño, véase: Preámbulo, art. 5, caput. Sobre el tema: SUSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho.
Rio de Janeiro: Renovar, 1999; Para el Derecho Argentino: Preámbulo, arts. 20, 21 y 25. Sobre el tema: ZARINI, Helio Jan. Constitución
Argentina. Comentada y concordada. Buenos Aires: Astrea, 1998.
23
“Art. 16. O visto permanente poderá ser concedido ao estrangeiro que pretenda se fixar definitivamente no Brasil. Parágrafo único.
A imigração objetivará, primordialmente, propiciar mão-de-obra especializada aos vários setores da economia nacional, visando à
Política Nacional de Desenvolvimento em todos os aspectos e, em especial, ao aumento da produtividade, à assimilação de tecnologia
e à captação de recursos para setores específicos . Art. 17. Para obter visto permanente o estrangeiro deverá satisfazer, além dos
requisitos referidos no artigo 5º, as exigências de caráter especial previstas nas normas de seleção de imigrantes estabelecidas pelo
Conselho Nacional de Imigração. Art. 18. A concessão do visto permanente poderá ficar condicionada, por prazo não-superior a 5
(cinco) anos, ao exercício de atividade certa e à fixação em região determinada do território nacional.”
24
Fuente: http://www.mte.gov.br/trab_estrang/est_origem.pdf, consultado en 30-09-2010.
25
Más información sobre trámites y requisitos legales puede ser consultada en: http://www.portalconsular.mre.gov.br/; y también en el
site del Ministerio de Trabajo del Brasil: http://www.mte.gov.br/trab_estrang/default.asp
26
Art. 57. Nos casos de entrada ou estada irregular de estrangeiro, se este não se retirar voluntariamente do território nacional no prazo
fixado em Regulamento, será promovida sua deportação. § 1º Será igualmente deportado o estrangeiro que infringir o disposto nos
artigos 21, § 2º, 24, 37, § 2º, 98 a 101, §§ 1º ou 2º do artigo 104 ou artigo 105. § 2º Desde que conveniente aos interesses nacionais, a
deportação far-se-á independentemente da fixação do prazo de que trata o caput deste artigo. Art. 58. A deportação consistirá na saída
compulsória do estrangeiro. Parágrafo único. A deportação far-se-á para o país da nacionalidade ou de procedência do estrangeiro,
ou para outro que consinta em recebê-lo. Art. 59. Não sendo apurada a responsabilidade do transportador pelas despesas com a
retirada do estrangeiro, nem podendo este ou terceiro por ela responder, serão as mesmas custeadas pelo Tesouro Nacional.. Art.
60. O estrangeiro poderá ser dispensado de quaisquer penalidades relativas à entrada ou estada irregular no Brasil ou formalidade
cujo cumprimento possa dificultar a deportação. Art. 61. O estrangeiro, enquanto não se efetivar a deportação, poderá ser recolhido à
prisão por ordem do Ministro da Justiça, pelo prazo de sessenta dias. . Parágrafo único. Sempre que não for possível, dentro do prazo
previsto neste artigo, determinar-se a identidade do deportando ou obter-se documento de viagem para promover a sua retirada, a
prisão poderá ser prorrogada por igual período, findo o qual será ele posto em liberdade, aplicando-se o disposto no artigo 73. Art.
62. Não sendo exeqüível a deportação ou quando existirem indícios sérios de periculosidade ou indesejabilidade do estrangeiro,
proceder-se-á à sua expulsão. Art. 63. Não se procederá à deportação se implicar em extradição inadmitida pela lei brasileira. Art. 64.
O deportado só poderá reingressar no território nacional se ressarcir o Tesouro Nacional, com correção monetária, das despesas com
a sua deportação e efetuar, se for o caso, o pagamento da multa devida à época, também corrigida.
22
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La solución dada por el gobierno brasileño
a los miles de trabajadores extranjeros
irregulares existentes en su territorio, fue,
como primeras medidas la concesión de
amnistías o la celebración de acuerdos
internacionales para la regularización
migratoria27. De forma más reciente, en
02 de julio de 2009, fue promulgada la Ley
No. 11.961 que “Dispõe sobre a residência
provisória para o estrangeiro em situação
irregular no território nacional e dá outras
providências”28. En ella se dispone que todos
los trabajadores que hayan ingresado al Brasil
de forma irregular antes del 01 de febrero de
2009, o que ingresando de forma regular
se hayan tornado irregulares por expiración
de plazo, podrán regularizar su situación y
acceder a la visa de residente temporario
por dos años, y por consecuencia, a todos
los derechos y prerrogativas del trabajador
brasileño. Por último, la ley dispone la
posibilidad, una vez concluido el plazo de
dos años antes mencionado, de transformar
la visa temporaria en permanente, desde que
el trabajador compruebe, en los términos
del art. 7: “I. exercício de profissão ou
emprego lícito ou a propriedade de bens
suficientes à manutenção própria e da sua
família; II - inexistência de débitos fiscais
e de antecedentes criminais no Brasil e
no exterior; e III - não ter se ausentado
do território nacional por prazo superior a
90 (noventa) dias consecutivos durante o
período de residência provisória.”
Por otra parte, la legislación argentina ha
estipulado desde sus orígenes la prohibición a
las personas públicas o privadas de proporcionar
ocupación remunerada a extranjeros que
residan irregularmente en el país29.
En un viejo fallo plenario la Cámara
Nacional de Apelaciones del Trabajo dispuso
que “no es válido el contrato de trabajo
celebrado por un trabajador extranjero
que reside en el país en infracción a la ley
17.294 sin perjuicio de su derecho a percibir
la retribución por el trabajo cumplido”30. La
interpretación de la conclusión arribada
llevaba a que se reconociese al dependiente
extranjero ilegal derecho a la percepción de
los salarios ganados durante el curso de
la relación laborativa, más no al cobro de
indemnizaciones por despido injustificado31.
La referida doctrina se apoyaba en las
disposiciones del art. 1° de la ley 17.294
que establecía que “Los extranjeros que
se encuentren ilegalmente en el país y los
que hubieren ingresado y permanezcan en
calidad de residentes temporarios, no podrán
desarrollar tareas o actividades remuneradas
en todo el territorio de la República ya sea por
cuenta propia o en relación de dependencia.
Los residentes temporarios podrán hacerlo
si estuvieran habilitados por la autoridad
migratoria”. El art. 13 de la misma ley creaba
una causal autónoma de despido justificado
al disponer que todo empleador que tuviese
contratados extranjeros ilegalmente entrados
en el país podría disponer la ruptura del
vínculo si éstos no regularizaban su situación
en el plazo de 90 días.
En consecuencia, el contrato celebrado
en infracción a las disposiciones de la ley
17.294 era considerado nulo con efectos
ex nunc, solución que buscaba evitar el
enriquecimiento sin causa del patrono
y, también, el daño a los intereses de la
comunidad trabajadora argentina.
Con la sanción de la Ley de Contrato
de Trabajo se distinguió entre contrato de
trabajo con objeto ilícito y contrato de trabajo
con objeto prohibido. El art. 40 establece
que se considerará prohibido el objeto
cuando las normas legales o reglamentarias
hubieren vedado el empleo de determinadas
A título de ejemplo podemos citar el Acuerdo celebrado entre Brasil y Bolivia para la regularización de los trabajadores ilegales que
ingresaron en el territorio nacional con fecha anterior al 15 de agosto de 2005 y que aún permanecen en el país. Los inmigrantes
regularizados por el acuerdo gozan de los mismos derechos y están sujetos a las mismas obligaciones de naturaleza laboral en vigor
para los trabajadores brasileños y de la misma protección en el ámbito de la seguridad social. Disponible en: http://www.mte.gov.br/
trab_estrang/acordo.pdf.
28
Disponible en: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11961.htm
29
Gabet, Alejandro y Gabet, Emiliano A., Efectos de la irregularidad migratoria en el contrato de trabajo, LL 01/10/2010, p. 6.
30
CNTrab., plenario 193, 07/11/73, “Nauroth y Echegaray, Ricardo Hans Oscar y otro c/ D’Onofrio, Nicolás Osvaldo”, D.T., 1973, p. 703.
31
PAWLOWSKI DE POSE, Amanda Lucía, Breve reseña sobre la situación del trabajador extranjero, DT 1988-B, 1095.
27
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
personas o en determinadas tareas, épocas
o condiciones. Se aclara, no obstante, que
la prohibición del objeto del contrato está
siempre dirigida al empleador y no perjudica
al trabajador32.
Al poco tiempo la jurisprudencia
confirmó este criterio al resolver que “la
circunstancia de que el trabajador pudiera
ser infractor a la ley 17.294 sobre trabajo
de extranjeros no hace que se esté en
presencia de un contrato de objeto ilícito
sino de uno de objeto prohibido que no
acarrea la pérdida de los derechos que pudo
haber adquirido en el transcurso o como
consecuencia de la vinculación, ya que
la prohibición del objeto del contrato está
siempre dirigida al empleador”33.
Posteriormente la ley 17.294 fue
derogada por la Ley general de migraciones
y de fomento de la inmigración (22.439). La
nueva ley prohibía a los inmigrantes ilegales
trabajar en el país y a los empleadores
contratarlos, pero la aplicación de la ley
no eximia al empleador del pago de los
sueldos, salarios y comisiones y, en general,
del cumplimiento de las obligaciones
emergentes de la legislación laboral
respecto del extranjero al que hubiere
proporcionado trabajo34.
Finalmente en el año 2004 se promulgó
la nueva Ley de migraciones nº 25.871. Es
importante destacar que la nueva ley en su
art. 4° reconoce el derecho a la migración
como un derecho esencial e inalienable de la
persona y declara que la República Argentina
lo garantiza sobre la base de los principios
de igualdad y universalidad.
En lo que aquí interesa la ley dispone que:
Art. 53.- Los extranjeros que residan
irregularmente en el país no podrán trabajar
o realizar tareas remuneradas o lucrativas,
ya sea por cuenta propia o ajena, con o sin
relación de dependencia.
Art. 55.- … ninguna persona de existencia
visible o ideal, pública o privada, podrá
proporcionar trabajo u ocupación remunerada,
con o sin relación de dependencia, a los
extranjeros que residan irregularmente.
Art. 56.- La aplicación de la presente
ley no eximirá al empleador o dador de
trabajo del cumplimiento de las obligaciones
emergentes de la legislación laboral respecto
del extranjero, cualquiera sea su condición
migratoria; asimismo, en ningún modo se
afectarán los derechos adquiridos por los
extranjeros, como consecuencia de los
trabajos ya realizados, cualquiera sea su
condición migratoria.
Art. 67.- La expulsión no menoscabará
por sí sola ninguno de los derechos que haya
adquirido el migrante de conformidad con la
legislación nacional, incluido el derecho a
recibir los salarios y toda otra prestación que
le pudiere corresponder.
Por último, no puede dejar de
mencionarse que Argentina, a diferencia
de Brasil, ha aprobado por ley 26.202 la
Convención Internacional sobre la Protección
de todos los Trabajadores Migratorios y de
sus Familiares. El instrumento de ratificación
ha sido depositado el 23/02/07 y, de
conformidad con lo previsto en el art. 87 de
la Convención, esta se encuentra vigente en
el país desde el 1º de junio de 2007.
Jurisprudencialmente se resolvió que la
relación del trabajador extranjero en violación
32
Ley de Contrato de Trabajo Art. 42.- “El contrato de objeto prohibido no afectará el derecho del trabajador a percibir las remuneraciones
e indemnizaciones que se deriven de su extinción por tal causa, conforme a las normas de esta ley y a las previstas en los estatutos
profesionales y las convenciones colectivas de trabajo”.
33
CNTrab., sala V, 09/08/77, “Swatrzka Kozieleroski de Rodríguez, Graciela c/ Schwartz, Alejandro E. y otro, DT 1978, 590, citado por
PAWLOWSKI DE POSE, op. cit.., p. 1096.
34
Art. 30.- Los extranjeros que residan ilegalmente en la República no podrán trabajar o realizar tareas remuneradas o lucrativas ya
sea por cuenta propia o ajena con o sin relación de dependencia.
Art. 31.- Ninguna persona de existencia visible o ideal, pública o privada, podrá proporcionar trabajo u ocupación remunerada, con o
sin relación de dependencia, a los extranjeros que residan ilegalmente o que, residiendo legalmente, no estuvieran habilitados para
hacerlo, ni contratarlos, convenir u obtener sus servicios.
Art. 53.- Los empleadores o dadores de trabajo quedarán obligados al pago de los sueldos, salarios y comisiones al personal que
hubieren proporcionado trabajo u ocupación en violación a lo dispuesto en los arts. 27, 28, 30 y 31.
Art. 109.- La aplicación de la presente ley no exime al empleador o dador de trabajo del cumplimiento de las obligaciones emergentes
de la legislación laboral respecto del extranjero, salvo los casos en que al inicio de la relación laboral, éste residiera legalmente en el
país y luego se transformare en ilegal o caducare la habilitación para trabajar.
85
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
a lo dispuesto por los arts. 27, 28, 30 y 31,
ley 22.439 de Migraciones y de Fomento
de la Inmigración –en el caso, residencia
irregular-, si bien encuadra dentro de la
categoría de trabajo prohibido del art. 40 LCT,
está condicionada por el régimen específico
que regula la permanencia de los extranjeros
en el país, según el cual, conforme su art.
53, cabe reconocerles derecho a percibir
la retribución por el trabajo cumplido, pero
no aquellos rubros no salariales como las
indemnizaciones por despido injustificado o
falta de preaviso35.
Sin embargo esta concepción restrictiva
ha sido dejada de lado:
“Tal como lo puntualiza el Dr. Eduardo O.
Álvarez con sustento en lo específicamente
dispuesto por el art. 56, ley 25.871, los
empleadores no pueden considerarse
eximidos de dar cumplimiento con las
obligaciones registrales y documentales a su
cargo por el hecho de tratarse de un trabajador
extranjero porque, más allá de su condición
migratoria, el trabajo prestado en relación de
dependencia se encuentra especialmente
tutelado por normas que garantizan no sólo
la percepción de sus créditos salariales,
sino también por todas las restantes que,
en resguardo de sus derechos, integran el
ordenamiento sustantivo. Tanto la Ley de
Contrato de Trabajo como la Ley Nacional
de Empleo constituyen normas de carácter
imperativo dictadas en protección del sujeto
trabajador, y la ley 25.871 –que regula la
situación de los trabajadores migrantesclaramente tiene como finalidad evitar que
las empresas recurran a la contratación de
extranjeros ilegales con el fin de sustraerse
de la aplicación de normas de aquél carácter,
por lo que la interpretación propiciada por
el a quo, a mi juicio, se contrapone con la
teleología de la mencionada disposición
legal. En efecto, tal como lo señala el fiscal
general ante la Cámara en el dictamen
de fs. 147 (cuyos fundamentos comparto
y doy aquí por reproducidos en honor a la
brevedad), una interpretación contraria a
la propuesta significaría que el empleador
podría sustraerse de la registración con la
mera invocación de que el dependiente no
acreditó “encontrarse en condiciones de ser
inscripto” cuando ninguna medida adoptó
durante el prolongado período involucrado en
el contrato (casi 8 años) a efectos de obtener
la regularización de la situación migratoria
del demandante”36.
“toda vez que la accionada al momento
de incorporar al actor sabía que el mismo
no poseía su documentación en regla, e
igualmente lo tomó; no puede ahora intentar
eximirse de responsabilidad –por la falta de
registro de la relación, con ese fundamento-.
Ello implicaría ponerse en contradicción con
su propio accionar, invocando su propia
torpeza -conforme lo dispone la “Teoría de los
Actos Propios”-. En relación a ello he tenido
oportunidad de señalar, entre otras cosas,
que la teoría sustenta la regla de que nadie
puede ejercitar un derecho, aún cuando el
mismo sea perfectamente lícito cuando su
pretensión es abiertamente contradictoria
con su propia conducta anterior. … cabe
recordar que contratar a un extranjero
implica un contrato de objeto prohibido de
acuerdo a lo establecido en el art. 40 de la
Ley de Contrato de Trabajo, sin embargo
esta prohibición se encuentra dirigida al
empleador de modo que de ninguna manera
podría afectar los derechos del trabajador
(conf. art. 42 LCT)”37.
“… el art. 53 de la ley 25.871 prohíbe
trabajar a los extranjeros que residan
irregularmente en el país, ya sea por cuenta
propia o ajena; y el art. 55 de dicho cuerpo legal
veda a las personas físicas y jurídicas (públicas
o privadas) darle ocupación a aquéllos. Sin
embargo, la cuestión debe considerarse
encuadrada en las previsiones de los arts. 40
C. Civ. Com. Familia y Trab. Marcos Juárez, 17/5/2001, “Bravo Martínez, Jessica C. v. Ahumada, Rodolfo y/u otros”, LLC 2001, 705
Y DT 2001-B, 1948.
CNTrab., sala II, 18/03/09, A. Z., W. A. v. Mercado Claros, Leonila, RDLSS 2009-15-1358.
37
CNTrab., sala VII, 30/06/10, Ferreira, Maciel Gabino c. Barutta, Luis Eduardo, LL 01/10/2010, 6, con nota de Alejandro GABET y
Emiliano A. GABET.
35
36
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Interamericana de Derechos Humanos en
su Opinión Consultiva OC-18/03 del 17 de
septiembre de 2003 referente a la Condición
jurídica y derechos de los migrantes
indocumentados. Allí señaló:
“(…) 8. Que la calidad migratoria
de una persona no puede constituir una
justificación para privarla del goce y ejercicio
de sus derechos humanos, entre ellos los de
carácter laboral. El migrante, al asumir una
relación de trabajo, adquiere derechos por
ser trabajador, que deben ser reconocidos
y garantizados, independientemente de su
situación regular o irregular en el Estado de
empleo. Estos derechos son consecuencia
de la relación laboral.”
“9. Que el Estado tiene la obligación de
respetar y garantizar los derechos humanos
laborales de todos los trabajadores,
independientemente de su condición de
nacionales o extranjeros, y no tolerar
situaciones de discriminación en perjuicio
de éstos, en las relaciones laborales que se
establezcan entre particulares (empleadorempleado). El Estado no debe permitir
que los empleadores privados violen los
derechos de los trabajadores, ni que la
relación contractual vulnere los estándares
mínimos internacionales.”
“10. Que los trabajadores, al ser titulares
de los derechos laborales, deben contar con
todos los medios adecuados para ejercerlos.
Los trabajadores migrantes indocumentados
poseen los mismos derechos laborales que
corresponden a los demás trabajadores del
Estado de empleo, y este último debe tomar
todas las medidas necesarias para que así
se reconozca y se cumpla en la práctica.”
No se encontraron decisiones de la
justicia brasileña que hagan referencia a
la Opinión Consultiva 18/03 de la Corte
Interamericana de Derecho Humanos, pero la
doctrina nacional aprueba sus argumentos y
conclusiones39. Para el Derecho argentino, el
y 42 de la LCT pues la prohibición de otorgar
ocupación remunerada a un residente ilegal va
dirigida siempre a quien utilice sus servicios en
violación a las disposiciones de la ley. En tal
sentido, la propia ley de migraciones establece
en su art. 56 que la aplicación de lo dispuesto
en dicha normativa no exime al empleador
o dador de trabajo del cumplimiento de las
obligaciones emergentes de la legislación
laboral respecto del extranjero “cualquiera sea
su condición migratoria”, y que en modo alguno
pueden afectarse los derechos adquiridos
de éstos, en virtud de trabajos ya realizados
(conf. S.I. N°56.334 del registro de esta sala, in
re: “Chávez Báez, David Mario c. Rodríguez,
María Lucía s. despido”; del 06/05/08). … Tal
como lo puntualiza el Dr. Eduardo O. Álvarez
con sustento en lo específicamente dispuesto
por el art. 56 de la ley 25.871, los empleadores
no pueden considerarse eximidos de dar
cumplimiento con las obligaciones registrales
y documentales a su cargo por el hecho de
tratarse de un trabajador extranjero porque,
más allá de su condición migratoria, el trabajo
prestado en relación de dependencia se
encuentra especialmente tutelado por normas
que garantizan no sólo la percepción de sus
créditos salariales, sino también por todas las
restantes que, en resguardo de sus derechos,
integran el ordenamiento sustantivo. Tanto
la Ley de Contrato de Trabajo como la Ley
Nacional de Empleo constituyen normas de
carácter imperativo dictadas en protección del
sujeto trabajador, y la ley 25.871 –que regula
la situación de los trabajadores migrantesclaramente tiene como finalidad evitar que
las empresas recurran a la contratación de
extranjeros ilegales con el fin de sustraerse de
la aplicación de normas de aquél carácter, por
lo que la interpretación propiciada por el juez a
quo, a mi juicio, se contrapone con la teleología
de la mencionada disposición legal”38.
No puede dejar de señalarse,
brevemente, lo dispuesto por la Corte
CNTrab., sala II, 26/03/09, “Alzamora Zegarra, Wilver Arturo c. Mercado Claros, Leonila”, en DT 2009 (agosto), p. 871, con nota de
Laura Etel PAPO y Liliana Noemí GONZÁLEZ.
Entre otros: ALVES PEREIRA, Antonio Celso. Os Direitos do trabalhador imigrante ilegal à luz da Opinião Consultiva 18/03 da Corte
Interamericana de Direitos Humanos – CIDH. In: O Direito Internacional Contemporâneo. Estudos em homenagem ao professor Jacob
Dolinger. Carmen Tiburcio y Luís Roberto Barroso (org.). Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 85 a 110.
38
39
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
discurso de la Opinión Consultiva 18/03 debe
servir de guía insoslayable para la solución de
los casos que se planteen en la justicia del país,
y así lo ha afirmado la sala V de la Cámara del
Trabajo en el caso “Davila Guevara”40.
En el mismo fallo se dijo que el empleador
no quedará exento de la responsabilidad
indemnizatoria, ni sus obligaciones laborales
pertinentes se verán limitadas en forma
alguna a causa de la irregularidad migratoria
en que pudiera haber incurrido la trabajadora
y que la supuesta irregularidad migratoria de
la actora no justifica la decisión extintiva de la
demandada, ni excluye, por ende, el derecho
de la trabajadora a las indemnizaciones
pertinentes, por aplicación directa y operativa
del principio fundamental de igualdad y no
discriminación integrante del ius cogens.
Diferente es la situación en el Mercosur,
pues el Acuerdo sobre Residencia para
Nacionales de los Estados Partes del
Mercosur, del 6 de diciembre de 2002 –
ratificado por Argentina, Brasil, Uruguay y
Paraguay- dispone que los nacionales de
un Estado Parte que deseen residir en el
territorio de otro Estado Parte pueden obtener
la residencia legal mediante la acreditación
de la nacionalidad y el cumplimiento de los
requisitos previstos en el art. 4º del Acuerdo.
A partir de la vigencia de este
instrumento y de la unificación de los
requisitos necesarios para la obtención de
las residencias, la obtención de la residencia
en cualquiera de las situaciones les otorga el
derecho a trabajar en igualdad de tratamiento
con los trabajadores del país receptor41.
El art. 9º del Acuerdo establece que
los nacionales de las Partes y sus familias
que hubieren obtenido residencia, gozarán
de los mismos derechos y libertades
civiles, sociales, culturales y económicas
de los nacionales del país de recepción, en
particular el derecho a trabajar.
Independientemente de la forma de
inmigración, para el Derecho de Argentina
y Brasil todos los trabajadores son
merecedores de una tutela jurídica especial,
un tratamiento legal diferenciado al resto
de las relaciones jurídicas. Estas reglas de
protección existen para los trabajadores
extranjeros a nivel material y procesal. Sobre
ellas nos referiremos a continuación.
B) Derecho aplicable al contrato
individual de trabajo
1. Autonomía de la voluntad
Unos de los temas más debatidos
e importantes del Derecho Internacional
Privado es el de la Autonomía de la Voluntad,
al punto tal que Marilia Zanchet afirma que
el análisis de la materia marca la transición
entre el DIPr de carácter moderno al DIPr
de carácter hipermoderno42. Actualmente
la doctrina mayoritaria en DIPr admite que
las partes pueden elegir la ley aplicable
al contrato, cuando éste es objetivamente
internacional43. Sin embargo, en el derecho
argentino y brasileño de fuente interna no
existe una norma que expresamente faculte
a las partes a designar el derecho aplicable.
Ante esta laguna, la jurisprudencia de estos
países ha transitado por caminos diferentes.
En el Derecho argentino es pacífica la
aceptación de la autonomía de la voluntad
en los contratos internacionales por parte de
la doctrina y de la jurisprudencia44. Esto no
ocurre en el Brasil, donde la autonomía de la
voluntad sólo puede ser ejercida en aquellos
contratos que establezcan una cláusula
arbitral o que se redefinan posteriormente
CNTrab., sala V, 23/04/08, “Davila Guevara, Egla Leonor c. Rovepe S.R.L.”, IMP 2008-13 (Julio), 1154, LL 2008-E, 181, con nota
de Alejandro GABET y Emiliano A. GABET.
GONZÁLEZ, Liliana Noemí y PAPO, Laura Etel, El trabajador migrante irregular: Derecho a la indemnización por despido y a las multas
de la L.N.E., DT 2009 (agosto), 871. Sobre la vigencia del acuerdo en el Brasil, véase: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/1994069/
nota-acordo-de-residencia-mercosul.
42
ZANCHET, Marilia. A proteção dos consumidores no direito internacional privado brasileiro. Dissertação de Mestrado em Direito.
PPGD. Faculdade de Direito. UFRGS, 2006, p. 214.
43
BOGGIANO, Antonio, Derecho Internacional Privado. Derecho Mercantil Internacional, T. II, Buenos Aires, Lexis Nexis – Abeledo
Perrot, 2010; DEL’ OLMO, Florsibal de Souza. Curso de Direito…, citado, p. 157 a 162.
44
NOODT TAQUELA, María Blanca, Reglamentación general de los contratos internacionales en los Estados mercosureños, en D.
P. Fernández Arroyo (coord.), Derecho Internacional Privado de los Estados del Mercosur, Buenos Aires, Zavalía, 2003, Capítulo 25,
p. 1008/9.
40
41
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por un compromiso arbitral45. Salvo estas
hipótesis de excepción, las partes no pueden,
en el ámbito del Derecho brasileño elegir la
ley aplicable.
Sobre el contrato de trabajo internacional
tenemos que destacar que existen diferencias
entre los contratos internacionales en
general y algunos contratos especiales que
se caracterizan por la situación de debilidad
en la que se encuentra una de las partes en
relación a la otra46. Estas diferencias justifican
un tratamiento diferenciado garantizado a
nivel constitucional (art. 14 bis y 75 inc. 12 de
la Constitución Nacional Argentina y art. 7, 8,
9, 10, 11, 22 y 114 de la Constitución Federal
de Brasil)47. En los contratos de trabajo existe
una situación de desigualdad entre las partes
(empleado y empleador), no sólo económica,
sino fundamentalmente en cuanto al poder
de negociación. Por ello es un valor admitido
en el derecho laboral que las normas de
protección al trabajador son de orden público
y que se encuentran fuera del alcance de la
voluntad de las partes, siendo nulos los pactos
en contrario48. Y si no se puede renunciar a
la tutela protectora del derecho del trabajo,
tampoco puede variarse el mismo mediante
pactos de elección de ley aplicable49.
A diferencia de la justicia del trabajo
brasileña que no acepta la autonomía de la
voluntad, son numerosos los precedentes
de tribunales argentinos que receptan –
con matices- la autonomía de la voluntad
conflictual en materia laboral. Entre los más
antiguos y conocidos podemos mencionar la
sentencia “Eiras Pérez c. Techint”50 y el caso
“Livitsanis c. Allseas Shipping Co.”51.
La cuestión volvió a ser debatida en el
caso “Adano c. Dresser Atlas Argentina”52
aunque se resolvió que el acuerdo de elección
del derecho británico no había sido probado.
El Dr. Guibourg dijo que las partes tienen
la facultad de someter convencionalmente
la vinculación a un derecho determinado,
siempre que el acuerdo resulte más favorable
al trabajador, pues el principio protectorio
del Derecho del Trabajo tiene validez
internacional. El doctor Vázquez Vialard
agregó que “las partes, en la medida en que
ello resulte más beneficioso para el trabajador
(está descontado el fraude) pueden pactar la
aplicación de la norma vigente en otro país o
una especial creada ad-hoc”.
En el caso “Cunninghame Taylor”53
también se admitió la autonomía de la
voluntad conflictual con el único límite del
orden público internacional.
En la causa “Savignon Belgrano” la sala
VIII de la Cámara del Trabajo resolvió que “la
cuestión aparece disciplinada por la directiva
del art. 3º LCT, norma de colisión internacional
en este campo para determinar la vigencia del
orden jurídico argentino o su desplazamiento
por el derecho de extranjería, en cuanto
prescribe que: Esta ley regirá todo lo relativo
a la validez, derechos y obligaciones de las
partes, sea que el contrato de trabajo se haya
celebrado en el país o fuera de él, en cuanto
se ejecute en su territorio, vale decir que “…
salvo cuando media elección de las partes o
Cf: BORBA CASELLA, Paulo. Autonomia da Vontade, arbitragem comercial internacional e Direito Brasileiro. In: O Direito Internacional
Contemporâneo…, citado, p. 737 a 750. En contra de esta posición, y con fundamentos de derecho constitucional sobre la autonomía
de la voluntad: GAMA JR., Lauro. Contratos internacionais à luz dos principios de UNIDROIT 2004. Rio de Janeiro: 2004, p. 434 y ss
46
Sobre el alcance y las características de la hipo suficiencia contractual en DIPr, con énfasis en la protección de los consumidores,
véase: LIMA MARQUES, Claudia. A confiança no comércio eletrônico e a proteção do consumidor. São Paulo: RT, 2004.
47
Para un estudio comparativo de las normas constitucionales de Derecho Laboral, véase: FERREIRA CARUCCIO HÜBNER, Marlot.
O Direito Constitucional do Trabalho nos Países do Mercosul. São Paulo: Memoria Jurídica Editora, 2002.
48
Cf: KÜMMEL, Marcelo Barroso. As Convenções da OIT e o Mercosul. São Paulo: LTR, 2001, p. 27 e ss.
49
FERNÁNDEZ ARROYO, Diego P., Modalidades contractuales específicas, en D. P. Fernández Arroyo (coord.), Derecho Internacional
Privado de los Estados del Mercosur, Buenos Aires, Zavalía, 2003, Capítulo 26, p. 1035/6.
50
Tribunal del Trabajo, Zárate, 09/12/70, Eiras Pérez, Leonardo C. c. Techint Engineering Company S.A., en Córdoba, Julio César,
Derecho Internacional Privado del Trabajo, serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, pp. 115-120,
disponible en http://diprargentina.com.
51
CNTrab., sala II, 07/03/69, Livitsanis, Nicolás c. Allseas Shipping Cº y otros, en Córdoba, Julio César, Derecho Internacional Privado
del Trabajo, serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, pp. 121-124, disponible en http://diprargentina.com.
52
CNTrab., sala II, 07/03/69, Livitsanis, Nicolás c. Allseas Shipping Cº y otros, en Córdoba, Julio César, Derecho Internacional Privado
del Trabajo, serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, pp. 121-124, disponible en http://diprargentina.com.
53
CNTrab., sala VI, 12/05/97, Cunninghame Taylor, Simón R. c. Bridas S.A. , en Córdoba, Julio César, Derecho Internacional Privado
del Trabajo, serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, p. 92, disponible en http://diprargentina.com.
45
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
un obstáculo de orden público internacional,
el derecho del lugar de ejecución del trabajo
no es desplazable, en la actual redacción del
art. 3º de la LCT por el principio del régimen
más favorable para el trabajador…””54.
En sentido similar se expidió la sala II
en el caso “Krautmann de Portaro”: “esta
sala comparte el criterio acerca de que el
art. 3 de la LCT modificado por ley 21.297,
sienta el principio de “lex loci excutionis”, en
cuanto adopta el criterio de territorialidad,
es decir que salvo estipulación específica,
la norma del lugar de ejecución del trabajo,
es la que rige el negocio jurídico en su
desarrollo y extinción, tanto en relación a
los derechos y obligaciones de las partes
como a la caracterización del vínculo, el cual
no es desplazable ni aún por el principio del
régimen más favorable, salvo cuando medie
elección de partes o un obstáculo de orden
público internacional”55. En el mismo sentido
la sentencia cita los casos “Ortiz Roberto c.
Panne Huidobro Gonzalo”, “Romero Luciano
c. Sade S.A. y otros”, “Galván Néstor Fabián
y otro c. Altamiranda Nelson y Asociados
S.A.” y “Sánchez Raúl c. Lichtenstein, Mario”.
das Leis Trabalhistas determina: “A competência
das Juntas de Conciliação e Julgamento
é determinada pela localidade onde o
empregado, reclamante ou reclamado, prestar
serviços ao empregador, ainda que tenha sido
contratado noutro local ou no estrangeiro.” Esta
norma al determinar la competencia interna
de los tribunales nacionales indirectamente
también elige la ley del lugar de ejecución de
la obligaciones del trabajador como siendo la
encargada de solucionar las lides laborales. El
entendimiento legal se refuerza con la Súmula
207 del Tribunal Superior del Trabajo, que afirma:
“A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis
vigentes no país da prestação de serviço e não
por aquelas do local da contratação”.
Verificamos así una identidad de
criterios de ambas legislaciones al utilizar el
lugar de cumplimiento de la obligación, lex
loci executiones, como regla general.
En Brasil, la regla general posee
algunos fraccionamientos, como son: a) la
capacidad de las partes, que se rige par la
ley del domicilio del contratante (Art. 7 de
la Ley de Introducción al Código Civil); b) el
contenido del contrato, que será regido por
el ordenamiento jurídico sobre el cual se
realiza (lex loci contractus)56; c) los efectos
e interpretación del contrato que sienten la
influencia de la legislación del domicilio del
empleador57; d) las reglas para su rescisión,
que podrá observar la regla general del local
de ejecución o la del lugar en que se realizó58,
y e) las pruebas y las cargas probatorias
de hechos ocurridos en el exterior, que
obedecerán las reglas procesales del lugar
de su producción (art. 13 de la Ley de
Introducción al Código Civil).
Partiendo
de
fundamentos
constitucionales, con énfasis en el principio
de igualdad, los tribunales brasileños
también han recurrido a la aplicación de la
ley más favorable para el trabajador. Esto
sucedió, por ejemplo, con trabajadores de
2. Derecho aplicable en defecto de
autonomía
Ante la imposibilidad de elegir el
Derecho aplicable al contrato de trabajo,
para el caso brasileño, o cuando las partes
no han determinado la Ley aplicable a la
relación laboral, para el caso argentino,
debe buscarse la solución en las normas
del Derecho Internacional Privado. Para el
sistema de fuente interna argentina la norma
aplicable es el art. 3 de la Ley de Contrato de
Trabajo que establece: “Esta ley regirá todo lo
relativo a la validez, derechos y obligaciones
de las partes, sea que el contrato de trabajo
se haya celebrado en el país o fuera de él; en
cuanto se ejecute en su territorio”.
Por su parte, el art. 651 de la Consolidação
CNTrab., sala VIII, 18/04/91, Savignon Belgrano, Carlos H. c. Editorial Abril S.A., DT 1991-B, 1666 y DJ 1991-2, 879.
CNTrab., sala II, 20/06/01, Krautmann de Portaro, Berta c. Instituto Goethe Buenos Aires, DIPr Argentina 15/10/10.
Cf: DEL’ OLMO, Florisbal de Souza. Curso de Direito Internacional Privado. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 229.
57
Idem, ibidem.
58
Idem, ibidem.
54
55
56
90
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
la empresa aérea Air France que recibían
remuneraciones menores por iguales
cargo o tareas realizadas por sus colegas
franceses59.
La norma argentina –el art. 3 de la LCTcontempla exclusivamente los contratos con
lugar de cumplimiento en el país –sea que se
hayan celebrado en territorio nacional o en el
extranjero- y los somete a la ley patria. Para
determinar el derecho aplicable a los contratos
con lugar de cumplimiento en el extranjero
existen dos posibilidades. Una consiste en
multilateralizar la norma unilateral del art. 3º
citado y concluir que la misma determina que
el contrato de trabajo se rige por la ley del
lugar de cumplimiento del contrato. La otra
alternativa consiste en emplear las normas de
contratos en general (arts. 1209, 1210 y cc. del
Código Civil) que consagran la misma solución.
También destacamos que no es posible recurrir
al derecho del lugar de celebración del contrato.
Así lo ha afirmado, entre otros, la sala II de la
Cámara del Trabajo: “… el art. 3 LCT ubica a
la lex locis executionis como pauta excluyente
para dirimir cualquier conflicto con elemento
de extranjería, desplazando inevitablemente
la lex locis celebrationis, incluso si se tratara
de un régimen jurídico más favorable para el
demandante”60.
Tratándose de un contrato con
prestaciones recíprocas a cargo de cada una
de las partes, la que interesa es la prestación
a cargo del trabajador. Esta es la prestación
más característica del contrato y aquella que
tiene virtualidad localizadora a efectos de
determinar el derecho aplicable. Boggiano
señala que en la jurisprudencia comparada no
prevalece la elección del derecho vigente en
el lugar en que se debe cumplir físicamente la
prestación característica, sino en el domicilio
del deudor que debe cumplir la prestación
característica. Agrega que el domicilio del
deudor es gravitatorio, no el mero lugar de
cumplimiento material61. Curiosamente esta
dicotomía no es analizada en el ámbito
laboral y la aplicación del derecho domiciliar
del trabajador no ha sido propuesta.
Parecería una cuestión sencilla a
esta altura determinar cuál es el lugar de
cumplimiento del contrato de trabajo a
efectos de encontrar el derecho aplicable. Sin
embargo no es tarea exenta de dificultades.
En primer lugar, el problema puede
plantearse cuando los trabajadores han
desarrollado tareas sucesivamente en
distintos países. Cuando la ejecución se
lleva a cabo en distintos estados, Menicocci
sugiere someter el contrato al derecho del
estado en donde se cumple la prestación
laboral fundamental62. El problema consiste
en determinar precisamente qué se entiende
por “prestación laboral fundamental”.
A los fines de localizar el contrato y
elegir uno entre los diferentes lugares de
cumplimiento la doctrina y la jurisprudencia
han propuesto diferentes soluciones. Una
alternativa consiste en aplicar el derecho del
último lugar de cumplimiento. Así fue votado
por el Dr. Guibourg en el caso “Adano, Juan O.
c. Dresser Atlas Argentina”. Otra posibilidad
consiste en aplicar la ley del principal lugar
de ejecución. En el mismo caso “Adano” el
doctor Santa María consideró aplicable el
derecho argentino por ser el correspondiente
al lugar de celebración y al principal lugar de
ejecución. En el caso “Cernadas de Bohtlingk
Cf: Ementa: Constitucional. Trabalho. Princípio da igualdade. Trabalhador brasileiro empregado de empresa estrangeira: estatutos do
pessoal desta: aplicabilidade ao trabalhador estrangeiro e ao trabalhador brasileiro. C.F., 1967, art. 153, § 1º; C.F., 1988, art. 5º, caput.
I. - Ao recorrente, por não ser francês, não obstante trabalhar para a empresa francesa, no Brasil, não foi aplicado o Estatuto do Pessoal
da Empresa, que concede vantagens aos empregados, cuja aplicabilidade seria restrita ao empregado de nacionalidade francesa.
Ofensa ao princípio da igualdade: C.F., 1967, art. 153, § 1º; C.F., 1988, art. 5º, caput). II. - A discriminação que se baseia em atributo,
qualidade, nota intrínseca ou extrínseca do indivíduo, como o sexo, a raça, a nacionalidade, o credo religioso, etc., é inconstitucional.
Precedente do STF: Ag 110.846(AgRg)-PR, Célio Borja, RTJ 119/465. III. - Fatores que autorizariam a desigualização não ocorrentes
no caso. IV. - R.E. conhecido e provido. Indexação. RE 161243 / DF - Distrito Federal. Recurso Extraordinário Relator(a): Min. Carlos
Velloso. Julgamento: 29/10/1996 Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação DJ 19-12-1997 PP-00057.
60
CNTrab., sala II, 17/08/00, Sánchez, Raúl c. Lichtenstein, Mario, Lexis Nº 1/52160.
61
BOGGIANO, Antonio, Derecho Internacional Privado. Derecho Mercantil Internacional, T. II, Buenos Aires, LexisNexis – AbeledoPerrot,
2010.
62
MENICOCCI, Alejandro, El contrato individual de trabajo, calificación, ley aplicable, orden público y jurisdicción, trabajo presentado en
las Jornadas Preparatorias del XXII° Congreso de Derecho Internacional de la Asociación Argentina de Derecho Internacional –Sección
Derecho Internacional Privado- realizadas en la Facultad de Derecho de la universidad de Buenos Aires el 26 de agosto de 2010.
59
91
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
c. Homero”64 se dijo –citando a Justo Lópezque en los casos de lugar múltiple de
ejecución del contrato debe aplicarse la ley
del principal lugar de ejecución y en caso de
duda, el que tenga el derecho más favorable
por aplicación del principio de la duda. Por
principal lugar de ejecución debe entenderse
aquel en el que la vinculación fue más
prolongada. También se ha propuesto aplicar
el Derecho más favorable al trabajador entre
todos los aplicables.
Menicocci afirma que hay que evitar
el fraccionamiento del contrato en cuanto
a su sometimiento a diferentes derechos.
Coincidimos con el autor mencionado en
la inconveniencia de fraccionar el contrato
y sujetarlo a diferentes derechos, solución
que, sin embargo, ha sido adoptada en
precedentes brasileños y argentinos. Del
‘Olmo cita el caso de un trabajador extranjero
que firmó contrato de trabajo fuera del Brasil,
y que realizó actividades laborales de forma
sucesiva en Argentina, Brasil y República
Dominicana. Reconocida la competencia de
la justicia brasileña se aplicó la legislación
nacional por el tiempo (cerca de siete años)
en que trabajó en el Brasil65.
En el caso “Krautmann de Portaro” ya
citado, se trataba de un contrato de trabajo
celebrado en Brasil y, aparentemente, con
lugares de cumplimiento sucesivos en Brasil
y en Argentina. La sala II de la Cámara
del Trabajo consideró aplicable el derecho
brasileño al periodo trabajado en ese país y el
derecho argentino al trabajado aquí. Además,
como el actor había fundado toda su pretensión
de acuerdo al derecho argentino, el tribunal
decidió no computar como antigüedad el lapso
trabajado en Brasil porque el derecho brasileño
no había sido probado (invocando el nefasto art.
13 del Código Civil). Algo similar, propuso el Dr.
Guibourg en el caso “Adano, Juan O. c. Dresser
Atlas Argentina”: “los efectos del contrato de
trabajo se hallan siempre sometidos al derecho
del lugar de cumplimiento de la prestación, aun
cuando varíe”.
Por otro lado, en algunos precedentes
no se ha tomado en consideración el lugar
donde efectivamente se prestaban las tareas
sino donde se percibían los beneficios
económicos. Por ejemplo, en el caso “Palmetti
c. Editorial Abril”66 el actor era un periodista
que enviaba material desde Europa para una
revista que se publicada en el país. Se dijo en
la sentencia que si bien la tarea la realizaba
fuera de la Argentina, el material que enviaba
era consumido en nuestro país, y por lo tanto
el derecho aplicable es el argentino.
Similares
argumentos
pueden
encontrarse en el caso “Cernadas de
Bohtlingk c. Homero”: “Las tareas realizadas
por la Sra. Cernadas han tenido su origen en
Argentina, y aquí también se han ejecutado
ya que se trata de un producto fabricado en
la Argentina por una empresa local que ha
sido ofrecido en venta en el exterior por su
intermedio, siendo el empleador argentino
quien determinaba el precio y condiciones
y es quien en definitiva se beneficiaba con
aquéllas ventas”.
Por último en un caso reciente67, donde
el trabajador se había desempeñado en
una empresa paraguaya, se aplicó derecho
argentino por considerar que la puesta del actor
al frente de la empresa en Paraguay resultó en
interés de la empresa argentina y que “si bien
no hubo una prestación directa en el territorio
nacional, la prestada en el extranjero resultaba
ser en beneficio de la local”.
En todos los supuestos mencionados se
terminó aplicando la lex fori por lo que se debe
indagar si detrás de estas interpretaciones
no se esconde, en realidad, la practicidad y
el chovinismo de aplicar el derecho del juez.
C) Jurisdicción Internacional
Argentina y Brasil tienen diferencias
significativas en relación a la jurisdicción
CNTrab., sala VII, 23/09/08, Cernadas de Bohtlingk, María Rocío c. Homero S.A. s. despido, en Córdoba, Julio César, Derecho
Internacional Privado del Trabajo, serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, pp. 28-29, disponible en
http://diprargentina.com.
65
Cf: DEL’ OLMO, Florisbal de Souza. Curso de Direito…, p. 231.
66
CNTrab., sala III, 25/06/97, Palmetti, Néstor c. Editorial Abril S.A., Lexis Nº 1/50248.
67
CNTrab., sala V, 18/05/10, Carrillo, Ricardo Cesar c. Inversora de Eventos SA y otros s. despido.
64
92
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
internacional sobre lides laborales. En el
Brasil, la materia está reglamentada en el
artículo 651 de la Consolidação das Leis
Trabalhistas, supra citado, en consonancia
con las artículos 12 de la Lei de Introdução
ao Código Civil y del art. 88 del Código de
Processo Civil. Por tal motivo la doctrina
y jurisprudencia nacional son pacíficas en
aceptar que la jurisdicción internacional le
corresponde a los Tribunales Laborales
del local en que el empleado, sea actor o
demandado, preste servicios al empleador,
esto sin importar el local donde el contrato
haya sido subscripto68. Como la norma
legal no hace referencia a la posibilidad de
elección de foro, y debido al carácter de orden
público de la reglamentación establecida por
la Consolidação das Leis Trabalhistas, la
existencia de tales cláusulas en un contrato
de trabajo se considera como inexistentes.
La situación es diferente para el Derecho
Argentino, ya que en la fuente interna no
existen normas de jurisdicción internacional
específicas para el contrato de trabajo. Para
dar una solución a esta laguna legislativa se
han propuesto diferentes soluciones.
a) Una alternativa posible consiste
en aplicar las normas de jurisdicción
internacional en materia de contratos en
general (art. 1º del Código Procesal Civil y
Comercial de la Nación y arts. 1215 y 1216
del Código Civil). Estas normas otorgan
jurisdicción al juez elegido por las partes, y en
su defecto, al del lugar de cumplimiento del
contrato o el del domicilio del demandado, a
elección del actor.
La norma citada en primer término
permite pactar la jurisdicción competente
“en asuntos exclusivamente patrimoniales”.
Esta norma ha sido invocada en algún
precedente aislado para dar validez al pacto
de jurisdicción, pero su aplicación a los
contratos de trabajo ha sido cuestionada.
Así se ha dicho que el contrato de trabajo no
puede calificarse como litigio “exclusivamente
patrimonial”, pues el trabajo es insusceptible
de esta valoración puramente patrimonial69.
Para negarle eficacia a este tipo de acuerdos
también se ha mencionado el art. 19 de la
ley 18.345 de Procedimiento Laboral que
dispone que “La competencia de la Justicia
Nacional del Trabajo, incluso la territorial, es
improrrogable”. Sin embargo, consideramos
que esta norma se refiere exclusivamente a
la competencia interna y no es aplicable a
casos internacionales.
Algunos autores70 se inclinan por admitir
la validez de los acuerdos de elección de
foro, pero sujetos a ciertas condiciones: que
no sean lesivos para el trabajador y que elijan
uno de los foros previstos por el legislador:
lugar de trabajo, lugar de celebración del
contrato, o domicilio del demandado.
En ausencia de elección, y de
conformidad con una reiterada jurisprudencia
de la Corte Suprema71 – seguida
pacíficamente por los tribunales inferiores –72,
los arts. 1215 y 1216 del Código Civil otorgan
jurisdicción a los jueces argentinos cuando el
domicilio o residencia del deudor estuviere en
la República Argentina, o, concurrentemente,
cuando el contrato de que se trate debe tener
su cumplimiento en ella. Como regla general,
cuando se trata de normas de jurisdicción
internacional en materia contractual, la
voluntad del legislador consiste en dar certeza
a una pluralidad de foros concurrentes, a
fin de asegurar el derecho de las partes a
En este sentido, DEL’OLMO nos ilustra con la siguiente decisión: Recurso Ordinário Interposto pelo Reclamante. Competência da
Justiça do Trabalho. A competência internacional da justiça brasileira encontra-se delineada nos termos do art. 651 da CLT, 9 e 12 da
Lei de Introdução ao Código Civil, 88 do CPC, e ainda na orientação consubstanciada na súmula n. 207 do TST. Recurso desprovido
(TRT/4 R. – RO n. 0046600-39.2008.5.04.0333, j. em 28-05-2009)., cit., p. 232.
69
BOGGIANO, Antonio, Contrato internacional de trabajo, LL 1987-C, 773.
70
BOGGIANO, op. cit.; LATTANZI, María, Contrato de trabajo internacional, en DT 2010 (abril), 796.
71
CSJN, 20/10/98, Exportadora Buenos Aires S.A. c. Holiday Inn’s Worldwide Inc., DIPr Argentina 25/02/07, Fallos 321:2894, LL 2000-A,
404, con nota de C. D. IUD, DJ 2000-1, 849 y ED 186, 290; CSJN, 14/09/04, Sniafa S.A.I.C.F. e I. c. Banco UBS AG., DIPr Argentina
07/10/06 y Fallos 327:3701; CSJN, 03/11/09, Cri Holding Inc. c. Compañía Argentina de Comodoro Rivadavia S.A. s. exhorto, DIPr
Argentina 11/06/10.
72
CNCom., sala A, 29/04/08, Sánchez, Edilia Gabriela c. Tom Cruz S.L. y otro s. ordinario, DIPr Argentina 12/11/09; CNTrab., sala IV,
17/09/08, Verdaguer, Ricardo Aníbal c. Impsat Fiber Networks Inc. y otro s. despido, DIPr Argentina 23/12/08; CNCiv., sala I, 22/05/03,
Marotta, Luis A. c. Hosokawa, Roberto, DIPr Argentina 18/02/07; entre otros.
68
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acceder a la justicia. Por ello, en ausencia de
solución convencional específica, cualquier
lugar de cumplimiento de las obligaciones
contractuales en la República Argentina
justifica la apertura de la jurisdicción
internacional de los jueces argentinos,
conforme lo dispuesto por el citado art. 1215
del Código Civil.
b) También se ha propuesto acudir
por analogía a las normas de jurisdicción
internacional de los Tratados de Montevideo
de Derecho Civil Internacional de 1889 y
de 1940, o aplicar la teoría del paralelismo,
o forum causae, y otorgar jurisdicción a los
jueces cuyo derecho resulte aplicable de
conformidad con la norma de conflicto de la
fuente interna.
c) Otra alternativa consiste en aplicar
analógicamente a casos internacionales las
normas de competencia territorial interna.
El art. 24 de la ley 18.345 de Procedimiento
Laboral dispone que “en las causas entre
trabajadores y empleadores será competente,
a elección del demandante, el juez del lugar
del trabajo, el del lugar de celebración del
contrato, o el del domicilio del demandado”73.
La jurisprudencia también se ha
pronunciado sobre la jurisdicción internacional
en materia de contratos de trabajo.
En el caso “Verdaguer”74 se trataba de
un contrato de trabajo celebrado en Delaware
(EUA), donde el empleador tenía su domicilio,
y se había pactado la aplicación de la ley de
Delaware y la competencia de los tribunales
de ese estado. Se desestimó la excepción
de incompetencia opuesta por la empresa
y se declaró inválido el acuerdo de elección
de foro. La Cámara del Trabajo descartó
recurrir al art. 19 de la ley 18.345 (que, dijo,
se refiere exclusivamente a la jurisdicción
territorial interna) y aplicó el art. 1° del Código
Procesal Civil y Comercial de la Nación (que,
a diferencia del anterior, es una norma de
jurisdicción internacional). Concluyó que
el acuerdo de elección de foro era inválido
ya que el pacto sólo se permite en asuntos
exclusivamente patrimoniales y el trabajo es
insusceptible de esta valoración puramente
patrimonial. Analizó a continuación las reglas
contenidas en los arts. 1215 y 1216 según
la interpretación fijada por la Corte Suprema
en el caso “Exportadora Buenos Aires c.
Holiday Inn’s” y concluyó, como se dijo, en
la competencia de los tribunales argentinos,
ya que una de las codemandadas tenía
su domicilio en el país y aquí también se
encontraba al menos uno de los lugares de
prestación de las tareas.
En el caso “Martorana”75 el Dr.
Boggiano, votando en disidencia, afirmó
que para determinar la jurisdicción resultaba
específicamente aplicable al caso el principio
de improrrogabilidad de la justicia laboral
(art. 19 de la ley 18.345) y las normas de la
ley orgánica que determinan la competencia
de la justicia del trabajo.
En el caso “Cunninghame Taylor”
se afirmó que para determinar los jueces
competentes debe recurrirse a las normas
del Código Civil (art. 1215) que otorgan
jurisdicción a los jueces del lugar de
cumplimiento del contrato.
Por último, en el caso “Antoñanzas”76, en
un caso conectado precisamente con Brasil,
las partes habían pactado el sometimiento
a la jurisdicción de los tribunales laborales
de la ciudad de Buenos Aires. La cuestión
jurisdiccional
no
fue
analizada
en
profundidad en la sentencia y creemos que
se trata de un precedente de dudoso alcance
RABINO, Mariela Carina, Contrato laboral celebrado en la Argentina para ser ejecutado en el exterior, RDCO 2002-571; entre otros.
CNTrab., sala IV, 17/09/08, Verdaguer, Ricardo Aníbal c. Impsat Fiber Networks Inc. y otro s. despido, en Córdoba, Julio César,
Derecho Internacional Privado del Trabajo, serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, pp. 28-29, disponible
en http://diprargentina.com.
75
CSJN, 30/05/01, Martorana, Ricardo O. c. International Business Machines Corporation y otros, Fallos 324:1761, LL 2001-F, 1021,
ED 195, 228, con nota de R. A. RAMAYO y P. H. JELONCHE, BOGGIANO, A., Derecho Internacional. Derecho de las relaciones entre
los ordenamientos jurídicos y derechos humanos, La Ley, 2001; y CÓRDOBA, Julio César, Derecho Internacional Privado del Trabajo,
serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, pp. 87-91, disponible en http://diprargentina.com.
76
CNTrab., sala VI, 25/03/96, Antoñanzas, Eduardo Lucero c. ICI Duperial SA s. despido, en Córdoba, Julio César, Derecho
Internacional Privado del Trabajo, serie Cuadernos de Jurisprudencia DIPr Argentina, vol. 1, Buenos Aires, pp. 93-97, disponible en
http://diprargentina.com.
73
74
94
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
por varias razones. En primer lugar, lo que
en una primera etapa era una relación de
dependencia, luego se transformó en un
contrato de agencia y el acuerdo de elección
de foro estaba en este último contrato.
Además, los tribunales argentinos hubieran
sido igualmente competentes por tratarse
del lugar de celebración del contrato y
del domicilio del demandado (el lugar de
cumplimiento del contrato era Brasil)77. Sin
embargo, este único precedente les permite
a algunos concluir que la jurisprudencia ha
considerado válida la prórroga de jurisdicción
contemplada en un contrato de trabajo78.
industriales y comerciantes no se reflejó en
las condiciones económicas de los nuevos
trabajadores, que siempre actualizaron sus
ingresos de forma lineal.
Los conflictos económicos y políticos
de ambos países luego de la segunda
guerra mundial los colocaron fuera de las
rutas migratorias de ciudadanos de otros
continentes. El final del siglo XX y los primeros
años del presente siglo se caracterizaron por
corrientes migratorias cruzadas: por un lado
el éxodo de argentinos y brasileños hacia
países más desarrollados, y por el otro, el
ingreso de personas de países vecinos,
como Paraguay, Perú o Bolivia.
Para esta nueva realidad social de
los trabajadores extranjeros, que todavía
buscan en el hemisferio sur un espacio
para
desarrollar
sus
potencialidades
de existencia, los Derechos argentino y
brasileño han dado soluciones jurídicas
compatibles. Aunque por caminos diferentes,
ambos países mantienen y respetan sus
tradiciones de mostrarse al mundo como
tierras de oportunidades, garantizándoles
a los trabajadores extranjeros el respeto y
aplicación de las normas laborales en las
mismas condiciones que se les aplican a los
trabajadores nacionales.
Las garantías jurídicas para los
trabajadores del exterior se hacen evidentes
en la aplicación del Derecho para los
contratos individuales de trabajo con
elementos extranjeros y el correlativo derecho
de acceso a la justicia. Si bien es cierto que
ambos sistemas tal vez padecen de cierto
grado de chovinismo en la reglamentación y
aplicación de la materia, la jurisprudencia ha
demostrado que este nacionalismo ha tenido
siempre como objetivo favorecer al trabajador,
independientemente de su nacionalidad.
Conclusión
El trabajo como actividad humana
productiva ha pasado a lo largo de la historia
de Argentina y Brasil por diversas etapas.
Pero en todas ellas se constata que el
trabajo manual siempre fue considerado
como una actividad inferior, menospreciada
socialmente y por los gobernantes de turno.
Durante el periodo colonial fue el
trabajo del indio y de esclavos africanos
(estos últimos principalmente en Brasil) que
hicieron posible la actividad de minería y las
explotaciones de grandes territorios agrícolas.
Luego de las independencias nacionales, en
especial durante la segunda mitad del siglo
XIX, América de Sur abrió sus puertas para
los trabajadores extranjeros, principalmente
de origen europeo, para llevar adelante
una revolución industrial tardía. Pero el
crecimiento económico vivido por Argentina
y Brasil durante las últimas décadas del siglo
XIX y las primeras del siglo XX no alteró el
concepto y el valor que le es conferido al
trabajo manual por estas sociedades. Es más,
los avances económicos de las naciones y de
pequeños grupos de productores agrícolas,
77
78
RADZYMINSKI, Alejandro P., La ley aplicable al contrato individual de trabajo en el derecho internacional privado argentino, ED, 172-167.
LATTANZI, op. cit., p. 797.
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Constituição estadual e sistema federativo
Bruno Miragem(1)
Resumo: O presente artigo tem por finalidade examinar a relação entre
o sistema federativo previsto pela Constituição de 1988 e o poder constituinte
dos Estados membros. Neste sentido, se utiliza do exemplo da Constituição do
Estado do Rio Grande do Sul como modelo do exercício destas competências,
realizando uma abordagem crítica quanto ao descompasso entre a distribuição
de competências legislativas, executivas e tributárias entre os entes federados no
direito constitucional brasileiro atual.
Palavras-chave: Poder constituinte dos Estados. Sistema Federativo.
Constituição do Estado do Rio Grande do Sul.
Abstract: This article aims to examine the relationship between the federal
system by the Federal Constitution of 1988, and the constitutional power of states.
For this, using the example of the Constitution of the State of Rio Grande do
Sul as a model, with a critical approach regarding the mismatch between the
division of legislative, administrative and tax powers of the states and de federal
government in the current Brazilian constitutional law.
Keywords: Constitutional power of States. Federative System. Constitution
of the State of Rio Grande do Sul.
1. Introdução
O sistema federativo brasileiro é ínsito
à República, inaugurado com a Constituição
republicana de 1891. Contudo, ao longo
da experiência republicana, vários foram
os modelos de Federação das diferentes
Constituições nacionais, desde modelos de
uma maior desconcentração de competências
da União para os Estados — como é o caso
da própria Constituição de 1891 — quanto
de modelos centralizadores, como o caso
das Constituições de 1937 e 1967. Na
primeira Constituição republicana, no que
concerne à distribuição de competências,
foram outorgados aos Estados alguns
poderes exclusivos expressos, alguns
poderes concorrentes e todos os poderes
remanescentes, quais sejam, os não
delegados à União ou nãoproibidos1.
A Constituição Federal de 1988,
entretanto,
estabeleceu
um
sistema
complexo em que os entes federados –
União, Estados, Distrito Federal e Municípios
– dividem competências legislativas e
executivas ou materiais, mas que colaboram
entre si no exercício de diversas destas
competências, em especial as suas
competências executivas. Da mesma
forma é reconhecida, no que se refere a
competências legislativas concorrentes
entre a União e os Estados, a prioridade da
União na elaboração de normas gerais e dos
Estados, para as normas especiais, podendo
estes exercerem competência legislativa
(1)
Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), especialista em Direito Civil e em Direito
Internacional pela UFRGS, professor da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, advogado e consultor jurídico. E-mail: bmiragem@
uol.com.br
1
Para detalhes, veja-se os nossos: MIRAGEM, Bruno; ZIMMER, Aloisio. Comentários à Constituição do Estado do Rio Grande do
Sul. São Paulo: Forense, 2010, p. 1 e ss. No mesmo sentido: TRIGUEIRO, Osvaldo. Direito Constitucional estadual. Rio de Janeiro:
Forense, 1980. p. 79.
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plena à falta da norma geral federal.
estabelecida na Constituição de 1988.
Com efeito, houve Constituições no
É importante frisar que, em face do
Brasil em que a participação ou o auxílio atual papel do Estado nas democracias
da União em assuntos de competência dos contemporâneas e, sobretudo, em vista
Estados se dava apenas
dos deveres de prestação
em caráter excepcional. A Parece correto identificar material, por intermédio
atual, ao contrário, prevê o sistema atual segundo da prestação de serviços
uma série de inter-relações o que se denomina como públicos diversos que lhe
entre os entes federados, Federalismo Cooperativo, são determinados, não se
em sistemas de participação no qual os diversos entes deve falar em autonomia
mútua, como é o caso federados, preservando a sem
o
correspondente
dos serviços de saúde e sua autonomia, cooperam lastro de receitas tributárias
para
fazer
educação, por exemplo. entre si para efeito de necessárias
os
melhores frente a tais imposições
Evolui-se, pois, para um alcançar
sistema federativo que se resultados no exercício das constitucionais, que ao fim e
2
contrapõe à concepção respectivas competências . ao cabo constituem a própria
razão de ser da ideia de
clássica de Federalismo dual
(Poder Central e Estados), de separação Estado. Como assevera Fernanda Menezes
rígida entre as competências dos entes Dias de Almeida, “a existência de rendas
federados, para um sistema de cooperação suficientes é que vivifica a autonomia dos
entre os entes federados, de maior entes federados e os habilita a desempenhar
intensidade nas relações entre a União, os suas competências” (DIAS DE ALMEIDA,
Estados, o Distrito Federal e os Municípios, 2000, p. 30). Atualmente, quando se trata
em vista da realização das atividades da crise do Federalismo brasileiro, o mais
confiadas ao Poder Público no interesse da importante desafio a ser enfrentado, sem
população3.
sombra de dúvida, é a questão da repartição
A Constituição do Estado, deste modo, das receitas e a concentração — de modo
caracteriza-se por reconhecer este caráter artificioso, sob o controle da União, e em
cooperativo do Federalismo brasileiro, prejuízo dos Estados-Membros — de
tomando para o Estado uma série de tarefas receitas obtidas a título de contribuição ou
a serem cumpridas em face da coletividade a concessão de facilidades ou isenções, por
de modo combinado ou concorrente com a iniciativa federal, sem a consideração dos
interesses dos demais entes federados.
atuação da União.
Daí o porque deste estudo pretender
Deve-se ressaltar agora que uma
das questões que permanecem no debate examinar a relação entre o Poder
político brasileiro contemporâneo, contudo, Constituinte decorrente dos Estados, em
tem sido a excessiva concentração de Poder especial à luz do Estado do Rio Grande
com a União, em especial por intermédio da do Sul, e o sistema federativo brasileiro
concentração de competência tributária na fundado pela Constituição Federal de 1988.
União, e da artificiosa estratégia de criação Este exame será feito mediante análise da
de tributos sob a forma de contribuições definição e dos limites do poder constituinte
às quais não obedecem à regra geral estadual em face das competências fixadas
de repartição de receitas estabelecidas na Constituição Federal.
pela Constituição Federal. Há, aqui, uma
2. Competências dos Estados na
concentração de recursos com a União, ao
tempo em que a repartição das competências Constituição Federal de 1988
A Federação se estrutura, desde
executivas permanece como originalmente
2
3
ANHAIA MELLO, José Luiz de. O Estado Federal e suas novas perspectivas. São Paulo: Max Limonad, 1969. p. 142.
HORTA, Raul Machado. Tendências do federalismo brasileiro. Revista de Direito Público, n. 9, p. 7-26, jul. / set. 1969.
98
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
o ponto de vista do reconhecimento de como a competência de um deles editar
autonomia e, portanto, de nãosubordinação, normas gerais e outros, normas específicas4.
pela técnica de repartição de competências.
Na Constituição Federal de 1988,
Competência, no exato sentido que lhe dá Ruy consagrou-se
um
modelo
complexo,
Cirne Lima, ao reconhecer o
de
convivência
entre
conceito na perspectiva do Orienta-se a predominância competências
privativas
Direito Administrativo, mas do interesse, igualmente, (com repartição horizontal) e
princípio
da competências concorrentes
em sentido universal. É, pois, pelo
subsidiariedade,
entendido
a “parcela de poder que a
(com repartição vertical),
ordem jurídica reconhece a como o reconhecimento do prevendo-se
ainda
o
uma pessoa determinada” Poder desde o nível mais estabelecimento de certas
(CIRNE LIMA, 1987, p. descentralizado (Município) matérias que, embora de
187). Assim, as principais até o mais centralizado competência
da
União,
segundo
a são delegáveis aos demais
competências reconhecidas (União),
na Federação são: a) a aptidão e a pertinência entes federados (União,
competência
legislativa relativamente à matéria Estados, Distrito Federal e
de
disposição. Municípios). O critério para a
consiste no poder de legislar objeto
sobre os assuntos definidos
repartição das competências
na norma de atribuição de competência ou enumeradas na Constituição Federal é o
ainda em caráter subsidiário, nos temas da predominância do interesse, podendo
nãoespecificados em outras normas de distinguir-se matérias de interesse geral,
mesma qualidade; b) a competência regional ou local, o que indica a atribuição
executiva ou material, qual seja, a que de competência entre os entes federados
estabelece a titularidade ou a atribuição que representem mais adequadamente tais
para a realização direta ou indireta de interesses5.
determinado serviço público ou a disposição
Cabe referir agora que os artigos 21
sobre determinada atividade pública; c) a e 22 estabelecem os Poderes da União
competência tributária, que consiste no poder em matéria administrativa e legislativa.
de imposição de tributos para o sustento das O artigo 23 da Constituição Federal
atividades estatais. É a técnica de repartição estabelece competências comuns a todos
de competência que conduzirá ao caráter de os entes federados; o artigo 24, competência
maior ou de menor concentração de poderes legislativa concorrente, sendo cabível à
de um determinado ente federal.
União editar normas gerais e aos Estados,
São duas as vertentes em matéria de normas especiais, exercendo este último
repartição de competências. Uma, típica competência plena quando ausente o
do Federalismo clássico ou Federalismo exercício do poder de legislar da União.
dual, estabelece rígida separação entre Da mesma forma, reconhece-se ao Estado
a competência da União e dos Estados, competência remanescente (Art. 25, §1º).
conhecida como repartição horizontal Já com relação aos Municípios, além de
de competências, da qual é exemplo a competência legislativa em assuntos de
Constituição norte-americana. Outra é a que interesse local (Art. 30), também lhe é
se infere do Federalismo cooperativo, de conferida a competência de suplementar
repartição vertical de competências, segundo legislação federal e estadual, no que couber
a qual se divide o poder de dispor sobre (Art. 30, II). No que concerne à possibilidade
determinada matéria dentre os diversos de delegação de competência legislativa da
entes federados, porém em níveis distintos, União para os Estados, estabelece o artigo
DIAS DE ALMEIDA, 2000, op. cit., p. 49.
CIRNE LIMA, Ruy. Princípios de Direito Administrativo. São Paulo: RT, 1987. p. 187.
5
MORAES, 2008, op. cit., p. 293.
4
99
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
22, parágrafo único, esta possibilidade e consumo; VI - florestas, caça, pesca,
em relação às matérias relacionadas fauna, conservação da natureza, defesa
como de competência da União, desde do solo e dos recursos naturais, proteção
que estabelecida por lei complementar do meio ambiente e controle da poluição;
federal. Na sistemática constitucional VII - proteção ao patrimônio histórico,
vigente, a competência exclusiva será cultural, artístico, turístico e paisagístico;
aquela indelegável e insuscetível de VIII - responsabilidade por dano ao meio
suplementação
pelos
demais
entes ambiente, ao consumidor, a bens e direitos
federados, enquanto a competência privativa de valor artístico, estético, histórico, turístico
admitirá tais circunstâncias de delegação ou e paisagístico; IX - educação, cultura, ensino
suplementação, na forma já referida, prevista e desporto; X - criação, funcionamento e
na própria Constituição Federal6.
processo do juizado de pequenas causas;
Esta situação, no entanto, altera-se XI - procedimentos em matéria processual;
quando se trata de competência tributária, XII - Previdência social, proteção e defesa da
já que, nesta matéria, a Constituição Federal saúde; XIII - assistência jurídica e Defensoria
de 1988 estabeleceu a competência residual Pública; XIV - proteção e integração social
da União (Art. 154, I), facultando-lhe o poder das pessoas portadoras de deficiência; XV
de criação e a imposição de novos tributos, - proteção à infância e à juventude; XVI desde que nãocumulativos e nãocoincidentes organização, garantias, direitos e deveres
em relação a seu fato gerador, com outros das polícias civis.”
previstos na própria Constituição. Da mesma
No
exercício
da
competência
forma, a repartição das receitas decorrentes concorrente, a própria Constituição Federal
de impostos federais entre União, Estados e estabelece o critério de vigência na hipótese
Municípios (Art. 157 e 159, II) e de impostos de concomitância ou de superveniência de
estaduais entre Estados e Municípios (Art. norma federal em relação à estadual. Neste
158 e 159, §3º), inclusive com destinação sentido, há os parágrafos 1º a 4º, do artigo
de parte das receitas provenientes da 24, da Constituição: “§ 1º - No âmbito da
arrecadação de impostos pela União, para legislação concorrente, a competência da
o Fundo de Participação dos Estados e do União limitar-se-á a estabelecer normas
Fundo de Participação dos Municípios.
gerais. § 2º - A competência da União para
Segundo a melhor doutrina, esta legislar sobre normas gerais não exclui a
sistemática complexa de repartição de competência suplementar dos Estados. § 3º competência, embora sem exemplo fiel em Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os
outras Constituições do mundo, inspira-se no Estados exercerão a competência legislativa
Direito alemão7.
plena, para atender a suas peculiaridades.
Sobre as competências legislativas § 4º - A superveniência de lei federal sobre
dos Estados expressas na Constituição normas gerais suspende a eficácia da
Federal, de modo concorrente, tem-se que: lei estadual, no que lhe for contrário.” A
“Art. 24. Compete à União, aos Estados e competência suplementar dos Estados,
ao Distrito Federal legislar
desta maneira, entende-se
concorrentemente sobre: I - (...) o caráter suplementar por aquela que se conforma
direito tributário, financeiro, da
competência
dos pelo campo deixado aberto à
penitenciário, econômico e Estados-Membros rege-se concorrência normativa pela
urbanístico; II - orçamento; pelo espaço deixado livre norma federal. Em outros
III - juntas comerciais; pelo legislador federal, termos, ao fazer referência
IV - custas dos serviços no exercício de sua à competência suplementar,
forenses; V - produção competência constitucional a Constituição Federal indica
6
7
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 483-484.
MENEZES DE ALMEIDA, 2000, op. cit., p. 76.
100
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
com toda a clareza que o caso aqui será de
não-contradição, inclusive estabelecendo a
regra para a solução de eventual antinomia
entre a norma federal e a norma estadual.
Não se assemelham, da mesma forma, as
definições de norma suplementar e norma
específica ou especial. Mais do que nunca,
o caráter geral da competência legislativa
da União mede-se pelo interesse geral que
esta representa. Já o caráter suplementar
da competência dos Estados-Membros regese pelo espaço deixado livre pelo legislador
federal, no exercício de sua competência
constitucional, não constituindo pretexto para
modificação, para ampliação ou para redução
do significado ou da abrangência dos termos
dispostos na norma federal8, ou contrariedade
a aspectos fundamentais estabelecidos nas
normas editadas pela União.9
Com fundamento na competência
legislativa concorrente prevista no artigo
24 da Constituição Federal, é reconhecida
a competência concorrente estadual para
legislar, dentre outros temas, sobre a proteção
do consumidor10, para estabelecer normas
diferenciadas em matéria de Imposto sobre
a Propriedade de Veículos Automotores
— IPVA11, proteção e defesa à saúde12,
antecipação do prazo de matrícula escolar13,
apreensão de veículos de transporte
coletivo em situação irregular14, isenção de
emolumentos para entidades beneficentes15
e previsão de índice local para correção de
tributos estaduais16. Em outra situação, na qual
se discutiu a possibilidade de imposição por
lei federal de piso nacional de remuneração
a professores do Sistema Público de
Educação, a alegação de invasão pela União,
de competência reservada ao Chefe do
Poder Executivo Estadual, foi rechaçada por
ocasião da apreciação da medida cautelar
da ADI pelo STF17. Da mesma forma, o STF
identificou inconstitucionalidade quando, ao
distinguir entre processo e procedimento,
à luz do Art. 24, XI, da Constituição Federal
— que reconhece aos Estados legislar
concorrentemente sobre procedimentos
processuais —, rechaçou norma estadual que
impunha como condição do recurso no âmbito
dos Juizados Especiais Cíveis o depósito
recursal18, ou para a criação de nova espécie
de recurso19. Na mesma linha de raciocínio,
declarou a Corte a inconstitucionalidade de
lei estadual que previa nova hipótese de
extinção do crédito tributário20. Não se admite,
igualmente, por intermédio de lei estadual, a
interferência do Estado-Membro na relação
contratual estabelecida entre a União e
os concessionários e permissionários de
serviços públicos de titularidade federal21 ou
a edição de norma estadual que estabeleça
tratamento diferenciado aos membros de
certas carreiras no tocante à submissão ao
dever de pagar tributos22. Do mesmo modo,
rejeitou o STF a possibilidade de criar por
norma estadual modalidade de jogo ou
sorteio nãoprevisto na legislação federal.23
Contudo, deve-se considerar que o
exercício das competências dos Estados
é limitado pelo disposto na Constituição
Federal,
a
qual,
como
elemento
característico do modelo federal, estabelece
uma série de deveres e/ou de proibições
a serem observados pelos demais entes
STF, ADI 1245, Rel. Min. Eros Grau; ADI MC 1893 Rel. Min. Marco Aurélio; e ADI 3054, Rel. Min. Gilmar Mendes.
STF, ADI MC 2311, Rel. Min. Néri da Silveira.
STF, RE 590015 AgR, Rel. Min. Eros Grau; ADI 1980, Rel. Min. Cezar Peluso; ADI 2832, Rel. Min. Ricardo Lewandowski.
11
STF, AI 279645 AgR, Rel. Min. Moreira Alves; RE 414259 AgR, Rel. Min. Eros Grau.
12
STF, ADI 1278, Rel. Min. Ricardo Lewandowski; RE 286789, Rel. Min. Ellen Gracie.
13
STF, ADI 682, Rel. p/ Acórdão Min. Joaquim Barbosa.
14
STF, ADI 2751, Rel. Min. Carlos Velloso.
15
STF, ADI 1624, Rel. Min. Carlos Velloso.
16
STF, RE 191091 AgR, Rel. Min. Marco Aurélio; RE 143871, Rel. Min. Marco Aurélio.
17
STF, ADI 4167 MC, Rel. Min. Joaquim Barbosa.
18
STF, ADI 4161 MC, Rel. Min. Menezes Direito.
19
STF – ADI MC 2212, Rel. Min. Octavio Gallotti; AI 210068 AgR, Rel. Min. Marco Aurélio
20
ADI 124, Rel. Min. Joaquim Barbosa.
21
ADI 3668/DF, Rel Min. Gilmar Mendes; na mesma linha os precedentes da Corte nas ADI MC 2337, p. RTJ 182/922; ADI MC 2615,
ADI MC 3322 e ADI 3533
22
ADI 3260, Rel. Min. Eros Grau
23
ADI 2995, Rel Min. Celso de Mello
8
9
10
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
federados24. Trata-se dos denominados
princípios
constitucionais
sensíveis,
segundo expressão cunhada por Pontes de
Miranda, cujo desrespeito pelos EstadosMembros pode dar causa à intervenção
federal25. Tais princípios sensíveis estão
expressos no artigo 34, VII, da Constituição
Federal, podendo ser sistematizados
como: a) forma republicana, sistema
representativo e regime democrático; b) os
direitos da pessoa humana; c) a autonomia
municipal; d) o dever de prestação de
contas da Administração Pública Direta ou
Indireta; e a aplicação dos limites mínimos
de receita constitucionalmente prevista no
desenvolvimento do ensino e em ações
e serviços públicos de saúde. O exame
destas hipóteses, cujo desrespeito dá
causa à intervenção federal nos Estados,
porém, não esgota os condicionamentos,
uma vez que também se considera inclusa,
dentre os limites aos Poderes dos EstadosMembros, a regra limitativa do artigo 60, §4º,
da Constituição da República, que dispõe
sobre as cláusulas inabolíveis, matéria
infensa inclusive à atuação do próprio
Poder Constituinte Derivado da União,
referindo a norma que não será objeto de
deliberação, proposta tendente a abolir: “I
- a forma federativa de Estado; II - o voto
direto, secreto, universal e periódico; III - a
separação dos Poderes; IV - os direitos e
garantias individuais.”
Desta regra, e mais das matérias em
que a Constituição Federal estabelece
regras gerais a serem observadas pelos
demais Estados federados, residem os
limites dos Estados-Membros no exercício
de suas competências constitucionalmente
estabelecidas. Da mesma maneira, o
exercício do Poder Constituinte Estadual
(Poder Derivado) deverá observar tais
condicionamentos
estabelecidos
pela
Constituição Federal, ao que se observa,
então, o princípio da simetria. Devem ser
observados pelos Estados-Membros, assim,
o que Alexandre de Moraes, no esteio de
autorizada doutrina, indica como princípios
federais extensíveis, tomados como normas
centrais comuns a todos os entes federados
e de observância obrigatória no poder de
organização do Estado; ainda, os princípios
constitucionais estabelecidos ou, como
denomina Manoel Gonçalves Ferreira Filho,
as normas de pré-ordenação institucional26,
quais sejam, as normas que, a par de
organizarem a Federação, estabelecem
preceitos que deverão ser observados pelos
Estados-Membros ao disporem sobre a sua
organização27. Assim, por exemplo, será o
caso de recente julgado do Supremo Tribunal
Federal, que decidiu a inconstitucionalidade
da norma estadual que ampliava a duração
de mandato de deputado estadual28.
3. A Constituição do Rio Grande do
Sul e o sistema federativo
A Constituição do Estado do Rio Grande
do Sul, promulgada em 3 de outubro de
1989, afirma, em seu artigo 1º, no tocante a
seus princípios fundamentais, que o Estado
do Rio Grande do Sul e os Municípios que
o integram formam de modo indissolúvel a
República Federativa do Brasil. Reconhece,
por outro lado, expressamente a existência
de limites de sua autonomia e competência,
reconhecendo-se como parte da República.
Este caráter indissolúvel é, pois, da essência
da Federação. A unidade nacional e o seu
caráter indissolúvel é regra cogente prevista
no artigo 1º da Constituição Federal, o que
desde logo suprime dos Estados-Membros
e dos demais entes federados o direito de
secessão. Em outras palavras, eventual
pretensão de secessão, no sentido de
alcançar soberania a ente federado, viola
frontalmente a Constituição Federal e a
Constituição do Estado em vista de seu artigo
1º que reproduz, nesta parte, a norma federal.
Note-se, contudo, que a Federação
TRIGUEIRO, 1980, op. cit., p. 90.
PONTES DE MIRANDA, 1987, op. cit., p. xx.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários a Constituição brasileira de 1988. v. 1. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 203.
27
MORAES, 2008, op. cit., p. 272.
28
STF — ADI 3825/RO; Rel. Min. Carmen Lúcia
24
25
26
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
brasileira, desde a sua origem, na primeira constitui o Estado Federal e os entes que o
Constituição republicana de 1891, não se compõe. No caso da ordem constitucional
compõe do modo clássico reconhecido na vigente, o artigo 25 da Constituição Federal
teoria do Federalismo, segundo a qual o prevê a existência dos Estados como entes
Estado Federal é constituído pela decisão federados e lhes estabelece Poder Constituinte
soberana do Estado de aderir à Federação29. Derivado e, neste sentido, limitado, pelas
A origem da Federação brasileira decorre normas constitucionais federais.
de reação republicana à concentração
de Poder do Governo Central à época do
Considerações finais
Império, sendo a Constituição de 1891 uma
Observa-se, afinal, que o modelo de
reação a tal concentração, ao impor um distribuição de competências estabelecido
rígido sistema de autonomia dos Estados pela Constituição Federal de 1988 ao outorgar
em relação ao Governo Federal. Sobre o aos Estados competências concorrentes
assunto, Pontes de Miranda observa que e/ou suplementares sem a oferta dos
“no Estado Federal, a União é permanente respectivos recursos necessários ao custeio
ou baseada no que quiseram
das diversas tarefas que
os Estados-Membros, ou no (...) o fundamento de lhe foram confiadas, ou
que o povo dele, Estado legitimidade da autonomia mesmo em face de certa
Federal, que antes não o estadual encontra-se na imprecisão do seu cotejo
era, quis. A verdade histórica Constituição Federal que com as competências da
e doutrinária a respeito do declara e que constitui União, desafia a formação
Brasil é a última; e qualquer o Estado Federal e os clássica de um sistema
interpretação da Federação entes que o compõe. federativo
de
mútua
brasileira como nascida
colaboração entre os entes
da vontade dos Estadosfederados. É inequívoco
Membros erra” (PONTES DE MIRANDA, que a União, ao concentrar grande número
1987, p. 483).
de receitas tributárias, em especial por
Todavia, embora tenha ocorrido a intermédio do poder de instituir contribuições,
afirmação da Federação na Constituição sem a necessidade de repartição desta
de 1891, as demais Constituições que lhe espécie tributária com os outros entes
sucedem apontarão em sentido contrário, federados, assim como com a fixação de
com tendência visível de concentração sua competência legislativa abrangente, a
de Poderes com o Governo Central, até partir dos largos termos utilizados para sua
o ápice da Constituição Federal de 1967, definição material, torna-se protagonista da
e a Emenda n. 1/69. Mesmo que se tenha Federação.
assegurada a autonomia dos Estados e de
Diante disso, mais do que oportuna
suas respectivas competências, observou-se é a rediscussão dos nossos marcos
na prática um processo de concentração de constitucionais no que concerne ao equilíbrio
competências pelo Governo Central.
federativo, de modo a admitir que o exercício
Cabe recordar agora que a autonomia de competências pelos entes federados
do Estado-Membro compõe-se de três represente efetivamente sua parcela de
atributos reconhecidos: a auto-organização, contribuição com as altas responsabilidades
o autogoverno e autoadministração, o que em relação ao Estado nacional.
pressupõe a independência na decisão
sobre tais temas em relação à União. No
Referências
entanto, sabe-se que o fundamento de
ANHAIA MELLO, José Luiz de. O
legitimidade da autonomia estadual encontra- Estado Federal e suas novas perspectivas.
se na Constituição Federal que declara e que São Paulo: Max Limonad, 1969.
29
DALLARI, Dalmo de Abreu. O Estado Federal. São Paulo: Ática, 1986. p. 17.
103
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
CIRNE LIMA, Ruy. Princípios de Direito
Administrativo. São Paulo: RT, 1987.
federalismo brasileiro. Revista de Direito
Público, n. 9, p. 7-26, jul. / set. 1969.
DALLARI, Dalmo de Abreu. O Estado
Federal. São Paulo: Ática, 1986.
MIRAGEM, Bruno; ZIMMER, Aloisio.
Comentários à Constituição do Estado do
Rio Grande do Sul. São Paulo: Forense, 2010.
DIAS DE ALMEIDA, Fernanda Menezes.
Competências na Constituição de 1988. 2.
ed. São Paulo: Atlas, 2000.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.
Comentários a Constituição brasileira de
1988. v. 1. São Paulo: Saraiva, 1990.
HORTA, Raul Machado. Tendências do
TRIGUEIRO,
Osvaldo.
Direito
Constitucional estadual. Rio de Janeiro:
Forense, 1980.
SILVA, José Afonso da. Curso de
Direito Constitucional positivo. 19. ed.
São Paulo: Malheiros, 2001.
104
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Algumas notas sobre a
‘constitucionalização’ do direito privado
Roberta Drehmer de Miranda(1)
Resumo
O Direito Constitucional na pós-modernidade apresenta uma nova moldura
diante do fenômeno do “constitucionalismo dos valores”, proveniente do fim da
Segunda Guerra Mundial, a partir da inserção de princípios básicos e direitos
humanos fundamentais nos textos das Constituições Estatais até então de
origem e linha liberais. Esse mesmo fenômeno trouxe, igualmente, a recepção
pelo Direito Constitucional de institutos próprios do direito privado, trazendo a
tona a discussão acerca de uma provável “constitucionalização” (ou seja, tornar
constitucional) do direito civil, elevando essa disciplina a um nível primeiro e
máximo do direito. Contudo, o que efetivamente ocorre, na contemporaneidade,
é a aceitação, nos textos das Constituições, de institutos os quais não tinham
proteção constitucional, seja por seus fundamentos, sejam para fins de objeto de
controle de constitucionalidade. Em verdade, não existe “constitucionalização”
do direito privado, cuja natureza é de direito concreto, num nível próximo; existe,
simplesmente, a garantia constitucional de institutos privados desprotegidos na
ideia liberal de Constituição.
Palavras-chave: Direito Constitucional. Constitucionalização. Direitos
Fundamentais. Direito Privado. Dritwirkung. Pós-modernidade.
Abstract
The contemporary Constitutional law shows a new feature up against the
“constitutionalism of values” phenomenon, comming from the end of the Second
War, with the admission of basics principles and fundamental human rights in the
Constitutions origin from liberal thought. This phenomenon brought the reception
by the Constitutional law of peculiar institutes from civil law, as well the discussion
about a probably “constitutionalization” (it means, to become constitutional) of civil
law, putting on this subject to a primus and maximum standart in law. However, what
really hapens, today, is the acception in the Constitutional texts of institutes wich did
not have constitutional protection, due to thouse fundaments, or in order to be object
of constitutional review. In fact, does not exist “constitutionalization” of the civil law,
wich nature is concrect law, in a local standart; what only exist is the constitutional
garantee of civil institutes desprotected by the liberal vision of Constitution.
Keywords: Constitutional Law. ‘Constitutionalization’. Human Rights.
Private Law. Dritwirkung. Postmodernism.
(1)
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mestre em Direito Público pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), doutoranda em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na linha de
pesquisa “Fundamentos Teórico-Filosóficos da Experiência Jurídica”, com tese em Sociologia do Direito. Advogada. Bolsista da CAPES.
Pesquisadora. Professora do curso de Direito da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Considerações Iniciais
fazermos uma breve análise acerca do
“A necessidade de interpretar o presente chamado “constitucionalismo”, movimento
significa comparar o passado, como processo político de cunho eminentemente liberal
histórico, e também olhar para o futuro, como que veio por ser a fonte primordial das
perspectiva de sociedade (não somente questões relativas ao direito privado e ao
como indivíduo)”1. A afirmação do jurista direito constitucional. Como bem sustentado
argentino CARLOS ALBERTO GHERSI por AMARAL JUNIOR, “Constituição
leva-nos à reflexão sobre de que modo e Codificação são institutos jurídicos
observamos e analisamos um fenômeno típicos da cultura ocidental moderna”3.
e como o apresentamos, seja na forma de Quer dizer, não há como conceber um
um discurso lógico, dialético, por vezes estudo da codificação isolado do estudo
retórico, seja eminentemente científico. do constitucionalismo (ou do surgimento
Quer dizer, a que finalidade nos dirigimos das Constituições escritas e rígidas), ou
quando queremos expor a realidade sobre o vice-versa; o próprio constitucionalismo
fenômeno analisado. É o ponto de partida, foi uma espécie de codificação, na medida
pois, sobre o qual buscamos, no presente em que transportou valores políticos
artigo, analisar o que por fim se cunha de importantes na época para um documento
“constitucionalização do direito privado”, escrito e pretensamente normativo (digo
e de que modo dito fenômeno jurídico pretensamente pois como se verá adiante
alcançou ênfase de estudo tanto no Direito a Constituição só veio ter “força normativa”,
Constitucional como no Direito Civil.
efetivamente, na contemporaneidade4),
Nosso panorama, portanto, será sistemático
e
organizado
mediante
fundamentalmente histórico-político, com prescrições obrigatórias.
algumas referências importantes à doutrina
e teoria do Direito bem como algumas
A) O Constitucionalismo Norteconclusões acerca da importância deste Americano
e
Europeu:
breves
tema na contemporaneidade (ou “pós- considerações acerca da formação
modernidade”2), sem afastar a análise crítica histórica do Estado Liberal e do Estado
acerca da forma como o assunto vem sendo Social de Direito
trabalhado no Direito Constitucional e no
Momento
histórico
de
grande
Direito Privado.
ebulição
de
ideias
O
Constitucionalismo, humanistas e iluministas,
I – Do constitucionalismo em verdade, foi um as
quais,
no
campo
de
cunho político
à construção da noção de movimento
(principalmente
“constitucionalização
do político-ideológico liberal francês), dirigiam-se como
que teve seu início pelos forma de oposição ao
direito privado”
monárquico
Primeiramente, mister fins do século XVIII. absolutismo
1
“La necesidad de interpretar el presente significa comparar el pasado, como proceso histórico, y también mirar hacia el futuro, como
perspectiva de sociedad (no sólo como individuo)” (tradução livre). GHERSI, Carlos Alberto. “La Pobreza Jurídica y el Ejercicio de
los Derechos Fundamentales: El valor de las liberdades negativas”. Revista de Direito do Consumidor. Ano 11, n.43. São Paulo:
Revista dos Tribunais, jul./set. 2002, p.11.
2
Segundo JESÚS BALLESTEROS, citando Arnold TOYNBEE, a pós-modernidade significa mais um estágio da história humana que,
por sua vez, é resultado da própria liberdade humana, e não de leis naturais casuísticas como propugnam as teses deterministas; um
estágio de resistência, e não de decadência: “Existe la posibilidad de la decadencia, pero existe también la posibilidad de la plenitud.
La elección entre decadencia e plenitud está em función de la respuesta a los retos de la sociedad actual. La decadencia supondría
la carencia de vibración ante tales problemas, mientras que la plenitud supone la creatividad, el afrontar tales retos com sentido de
responsabilidad. Tal diferenciación es la que puede permitir distinguir entre modernismo o postmodernidad como decadencia y genuina
postmodernidad como resistencia.” (grifos do autor). BALLESTEROS, Jesús. Postmodernidad: decadencia o resistencia. 2 ed.
Madrid: Tecnos, 2000, p.101 e 102.
3
AMARAL JUNIOR, José Levi. “Constituição e Codificação: primórdios de um binômio”. A Reconstrução do Direito Privado.
Organização: Judith Martins-Costa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.56.
4
Ainda que se falasse desde HANS KELSEN em uma espécie de ‘eficácia normativa’ da Constituição, sua plena caracterização como
tal iniciou com os estudos de KONRAD HESSE, acerca das relações entre a Constituição jurídica e a realidade político-social, bem
como os limites e pressupostos de sua eficácia, eminentemente na sua obra A Força Normativa da Constituição. Tradução do original
em alemão de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1991.
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
ou aos autoritarismos de então. De fato,
o constitucionalismo, calcado na doutrina
da separação de poderes de Montesquieu
(forte exemplo é o art.16 da Declaração de
Direitos do Homem e do Cidadão, em que
se demonstra que não é qualquer texto
que constitui e representa uma verdadeira
Constituição, para o constitucionalismo),
ganhou força como uma tentativa liberal
(porque fulcrada no princípio máximo da
liberdade, garantida pela lei, bem como nas
ideias de MONTESQUIEU) de contraposição
ao Estado Burocrático Nacional Moderno, no
qual havia uma concentração das funções de
Estado em um só poder (o Monarca), ainda
que na Inglaterra a função legislativa já tenha
sido separada da figura do rei e depositada
no Parlamento (com fundamento na doutrina
de LOCKE)5.
Desta forma, surgiram as primeiras
Constituições
modernas,
cuja
única
finalidade era estabelecer um programa
político que limitasse o poder (internamente
e externamente, essa pela soberania) e
estabelecesse a organização fundamental
do
Estado,
devendo
consagrar,
necessariamente, a divisão de poderes.
Ainda, tal organização do Estado estava
fundada
precipuamente
nos
direitos
fundamentais do cidadão (meramente
direitos individuais), cujo valor maior era,
sem dúvida, o da liberdade. Foi neste cenário
que iniciou-se as primeiras elaborações dos
códigos civis, destinados, pois, à regular as
relações privadas da sociedade dentro deste
ideário liberal6. Desta forma, era necessário,
diante de uma Constituição suprema, escrita
e rígida, fundada, como dissemos, nos
direitos individuais e no valor da liberdade
e legalidade, Códigos que se coadunassem
com esse imaginário, razão pela qual foram
elevados, em tais diplomas jurídicos, como
superiores, a autonomia privada e a liberdade
contratual7.
Assim, a relação entre o direito
privado e o constitucional é muito antiga
na história do direito, mas que ganhou
relevância a partir do século XVIII/XIX
pelos movimentos de codificação civil
e constitucional8. A peculiaridade deste
momento histórico está na natureza
da Constituição, entendida como um
programa político supremo a guiar e
fundamentar as leis, nada mais que isso.
Não havia, pois, regra constitucional, em
tais constituições, que se pudesse limitar
de alguma forma o legislador, em fixar
os conteúdos das regras civis: existiam
apenas valores individuais e princípios que
não poderiam ser violados, sob pena de
inconstitucionalidade (tendentes a abolir,
por exemplo, alguma liberdade prevista
na Constituição) – contudo, não se pode
dizer que tais disposições constitucionais
5
SOUZA JUNIOR, Cezar Saldanha. O Tribunal Constitucional como Poder. Uma nova teoria da Divisão de Poderes. São Paulo:
Memória Jurídica Editora, 2002, p.49 a 52; 55 a 63.
6
O ideário liberal da Codificação manifesta o que NATALINO IRTI cunhou de “idade da segurança”, nascida da estrutura social burguesa
calcada no individualismo e na autonomia plena da vontade: “Il mondo della sicurezza é, dunque, il mondo dei codici, che traducono,
in ordinate sequence di articoli, i valori del liberalismo ottocentesco. Di qui il significato ‘constituzionale’ dei codici civili, nel senso che
essi non si limitano a disciplinare semplici congegni tecnici (piú o meno perfetti e completi), ma raccolno e fissano la filosofia della
rivoluzione borghese. (...) come la ‘Dichiarazioni di diritti’ garantiscono le libertá politiche dei singoli nei rapporti con lo Stato, i
codici tutelano le ‘libertá civili dell’individuo nella sua vita privata contro le indebite ingerenze del potere politico” (grifamos).
IRTI, Natalino. L’etá della Decodificazione. 4 ed. Milano: Giuffré Editore, 1999, p.23.
7
Nesse mesmo sentido, asseverou GUSTAVO TEPEDINO: “A codificação, como todos sabem, destinava-se a proteger uma certa
ordem social, erguida sob a égide do individualismo e tendo como pilares nas relações privadas, a autonomia da vontade e a
propriedade privada. O legislador não deveria interferir nos objetivos a serem alcançados pelo indivíduo, cingindo-se a garantir a
estabilidade das regras do jogo, de tal maneira que a liberdade individual, expressão da inteligência de cada um dos contratantes,
pudesse se desenvolver francamente, apropriando-se dos bens jurídicos, os quais, uma vez adquiridos, não deveriam sofrer restrições
ou limitações exógenas”. TEPEDINO, Gustavo. “As relações de Consumo e a Nova Teoria Contratual”. Temas de Direito Civil. 3 ed.
Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p.220.
8
PONTES DE MIRANDA refere-se ao caráter histórico das relações entre direito constitucional (público) e direito privado, delimitando
o período liberal como marco da divisão entre as duas áreas: “Na Idade Média, a compenetração dos dois ramos do Direito foi notável.
Serviço militar e contribuição supunham algo de convencionado, ou de unilateralmente aceito; certos direitos privados dependiam
de direitos públicos, ligando-se a serviços militares e outras situações de ordem subordinativa. Foi a liberdade de contratar que veio
arrebentar os laços políticos entre os que trabalham e os que empregam os trabalhadores”. PONTES DE MIRANDA, Francisco
Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967. Tomo I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1967, p.110 e 111.
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tivessem alguma força normativa própria9,
pois esta residia quase que totalmente na
lei. Institutos como obrigações, direitos
reais, família e sucessões, são definidos em
lei, na forma e conteúdo, e devem respeitar
os valores e princípios constitucionais.
Se, por exemplo, o legislador optasse
por limitar a propriedade, ou distribuí-la
conforme interesses meramente políticos
ou corporativos, tal medida não seria
inconstitucional, pois cabe ao legislador
tomar tais decisões, desde que não
abolisse o direito próprio da propriedade,
que, então, feriria a liberdade prevista na
Constituição10.
Na Europa, ganha ênfase o exemplo
francês, pelo famoso Código de Napoleão
de 1801, o qual previa uma parte conceitual
e outra mais específica (tratamento jurídico
dos institutos civis: obrigações, propriedade
e família; ou seja, pessoas, bens, fatos). Dito
Código consagra este estatuto civil como
supremo na regulação das relações jurídicas
privatísticas11, destinado a regulamentar, em
todo o seu texto, quaisquer situações jurídicas
presentes e futuras, sendo, posteriormente,
criticado por ser caracterizado como um
“sistema fechado”12. Obviamente, a maneira
como foi concebido o Código, como já fora
dito antes, ajusta-se à mentalidade política
da época, alinhada com a doutrina liberal
prevalente desde então.
Contudo, verificou-se, a partir das
mudanças sociais ocorridas na Europa
(manifestadas principalmente pelas doutrinas
socialistas desconformes com os abusos
de uma elite econômica representante dos
grandes industriais da Revolução Industrial),
que a doutrina liberal então hegemônica
já não mais era objeto de consenso na
sociedade. Dita mudança social teve seus
reflexos no Direito, na medida em que
surgiram as primeiras críticas à Constituição
de cunho liberal bem como ao Código Civil
dotado de prescrições fechadas, muitas
das quais colocavam a autonomia privada e
liberdade contratual como institutos intocáveis
e ilimitáveis.
No campo do direito constitucional, a
crise deste período recaiu sobre a ausência na
Constituição de disposições que garantissem
direitos a todos, assim cunhados como direitos
sociais; outrossim, estabeleceu-se uma crítica
da fórmula Montesquiniana dos três poderes,
separados e iguais, surgindo a necessidade
de separação de mais uma função de estado,
a função governamental, distinta da Chefia
de Estado (posto que ambas, no modelo
Montesquieu, encontravam-se concentradas
no “Poder Executivo”).
Na Europa, como salienta CEZAR
SALDANHA13,
as
ditas
modificações
constitucionais foram fruto da formação do
Estado Social Contemporâneo, consagrado
no século XX pela Constituição de Weimar
(1919), a qual prevê direitos sociais que, da
mesma forma que a Constituição do México de
1917, não eram previstos constitucionalmente.
A razão pela qual houve a necessidade de
serem colocados na Constituição supre uma
questão técnica, qual seja, de que qualquer
ato que fosse atentatório a alguma liberdade
A esse respeito, mostrou HANS KELSEN o caráter mínimo de juridicidade e normatividade das Constituições resultantes do constitucionalismo,
pontuando, especificamente, o período da passagem da Monarquia Absoluta para a Monarquia Constitucional: “Na monarquia absoluta, a
distinção entre o grau da Constituição e o grau das leis é, decerto, teoricamente possível, mas não desempenha na prática nenhum papel, já
que a Constituição consiste unicamente no princípio de que toda expressão da vontade do monarca é uma norma jurídica obrigatória. Não
há, portanto, forma constitucional particular, isto é, normas jurídicas que submetem a regras diferentes a elaboração das leis e a
reforma da Constituição; nela não tem sentido o problema da constitucionalidade das leis. A transição para a monarquia constitucional
acarreta, precisamente a esse respeito, uma modificação decisiva, que se exprime de maneira assaz característica na expressão ‘monarquia
constitucional’. A maior importância que a noção de Constituição adquire então, a existência de uma regra – regra que é precisamente
a Constituição – segundo a qual as leis só devem ser feitas de certa forma, a saber, com a colaboração da representação nacional...”
(grifamos). KELSEN, Hans. “Jurisdição Constitucional”. Jurisdição Constitucional. Tradução do original alemão de Alexandre Krug. São
Paulo: Martins Fontes, 2003, p.127 e 128.
10
Essa é, pois, a razão jurídica pela qual os direitos sociais foram, posteriormente, colocados nas Constituições: qualquer tentativa de limitação
das liberdades – mesmo que para favorecer alguma parte desfavorável no contrato, como o trabalhador – era considerada inconstitucional.
11
É o que MIGUEL REALE refere como ‘constituição do homem comum’ em O Projeto do Novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 1999, p.03.
12
Nessa linha, observa GUSTAVO TEPEDINO: “Todos os institutos do Direito Civil, a rigor, foram perdendo a estrutura abstrata e generalizante,
em favor de disciplinas legislativas cada vez mais concretas e específicas.” TEPEDINO, op. cit., p. 219. Quer dizer, nem todas as matérias
de cunho privatístico necessariamente passaram a ser previstas em um código, mas especificadas em legislações próprias, configurando o
que NATALINO IRTI chamou de ‘microssistemas’, e que CLÁUDIA LIMA MARQUES refere como fontes jurídicas coexistentes (resumida no
termo ‘diálogo das fontes’, que estudar-se-á mais adiante).
13
SOUZA JUNIOR, O Tribunal Constitucional, p.81.
9
108
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(prevista nas então Constituições liberais) – considerada, na medida de sua dignidade15.
dirigido a proteger alguma demanda social, Por óbvio, dita mudança de pensamento no
por exemplo – era julgado inconstitucional, direito constitucional teve reflexos diretos no
posto que não era protegido pela mesma direito civil, mormente a partir da tutela, na
ordem constitucional.
Constituição, de institutos de direito civil até
A partir, pois, do Estado Social de então assegurados apenas em lei, a qual tão
Direito, podemos perceber um germe largamente foi usada no período totalitário
da força normativa da Constituição, já para fins ideológicos, inclusive contra o
considerada como fundamento de validade próprio direito civil.
do
sistema
jurídico,
O Brasil não ficou alheio
legitimando
sua
própria (...) o Estado Social de às mudanças constitucionais
validade e supremacia. As Direito não evitou a europeias. Já na Constituição
totalitária, de 1946 observa-se a
próprias técnicas de controle experiência
vivida
na
Europa,
e preocupação em garantir
de
constitucionalidade
que
marcou
a
história
passam a aperfeiçoar-se,
os
direitos-liberdades
e
até
nossos alguns direitos sociais, bem
principalmente na Alemanha, mundial
Muito
dessa como o retorno a um regime
vindo por, mais tarde, originar dias.
14
experiência
deveu-se,
o Tribunal Constitucional .
democrático, superando o
Porém, o Estado Social exatamente, à natureza da período do Estado Novo
de Direito não evitou a Constituição, que, mesmo e acompanhando o novo
direitos cenário mundial do pósexperiência totalitária, vivida consagrando
sociais,
permaneceu
2ª Guerra Mundial: “Na
na Europa, e que marcou a
um
programa esteira do constitucionalismo
história mundial até nossos como
dias. Muito dessa experiência político, sem uma força europeu ocidental resultante
pós-2ª
Guerra,
a
deveu-se, exatamente, à normativa direta maior. do
Constituição voltou-se inteira
natureza da Constituição,
que, mesmo consagrando direitos sociais, ao modelo do Estado democrático e social
permaneceu como um programa político, de Direito.”16 Observa-se que, mesmo no
sem uma força normativa direta maior. A período autoritário seguinte (1964-1984),
partir do fim da segunda guerra mundial, não houve uma supressão constitucional à
estando a Europa decidida a não mais viver forma legislativa de disposição dos conteúdos
o totalitarismo – principalmente a Alemanha – de direito ordinário, principalmente no que
é que passou-se a propugnar a consagração competia ao direito civil, posto que matérias
de valores máximos da comunidade política, específicas desta seara já encontravam-se
que privilegiassem a pessoa humana em si dispostas no Código Civil então vigente (de
Sobre o Tribunal Constitucional, e da necessidade de centralização do controle de constitucionalidade, excelente trabalho de FERRERES
COMELLA, Victor. Las Consecuencias de centralizar el Control de Constitucionalidad de la ley en un Tribunal Especial. Algunas
reflexiones acerca del activismo judicial. Barcelona: Universidade Pompeu Fabra, 2005.
15
As afirmações de HESSE comprovam o espírito do período histórico mencionado: “A Constituição jurídica não significa simples pedaço
de papel, tal como caracterizada por Lassalle. Ela não se afigura “impotente para dominar, efetivamente, a distribuição de poder”, tal como
ensinado por Georg Jellinek e como, hodiernamente, divulgado por um naturalismo e sociologismo que se pretende cético. A Constituição não
está desvinculada da realidade histórica concreta do seu tempo. Todavia, ela não está condicionada, simplesmente, por essa realidade. Em
caso de eventual conflito, a Constituição não deve ser considerada, necessariamente, a parte mais fraca. Ao contrário, existem pressupostos
realizáveis (realizierbare Voraussetzungen) que, mesmo em caso de confronto, permitem assegurar a força normativa da Constituição”.
HESSE, A Força Normativa, p. 19.
16
SOUZA JUNIOR, Cezar Saldanha. Constituições do Brasil. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2002, p.61. E continua o eminente professor:
“As múltiplas disposições da carta de 1946 expõem claramente esse retorno à Democracia Social...ao lado de todo um conjunto de princípios
de Justiça Social. Os direitos liberdades foram revigorados e declarou-se pela primeira vez no País que a lei não poderia excluir da
apreciação do Judiciário qualquer lesão de direito individual” (grifamos; p.61).
17
PONTES DE MIRANDA faz uma rica análise da relação entre o direito constitucional e o ordinário dentro da tradição constitucional brasileira,
chamando de ‘direito dispositivo’ e ‘direito interpretativo’ as regras de direito civil atinentes à autonomia da vontade: “O que fica ao ‘ius dispositivum’
e ao ‘ius interpretativum’, depois de se por de parte o ‘ius cogens’, é o que se denomina campo de ‘autonomia’: as partes podem dispor o
que entendam; se dispuserem, obedecer-se-á ao que dispuserem, ou, no caso de dúvida, ao que se deve concluir, interpretativamente; se
não dispuserem, nada se entenderá inserto no branco, volitivo, que deixaram, ou se observará o que o ius dispositivum, se o houver, ordene
que se tenha por disposto. (...) Nas Constituições é preciso, sempre, mostrar-se a natureza da regra jurídica, para se saber se houve
infração pela lei”. (grifamos). PONTES DE MIRANDA, Comentários, p.122 e 123.
14
109
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
1916) e em leis esparsas17. Na Constituição
de 1967 verificou-se a introdução da
denominada ‘lei complementar’ e, mesmo
a mais autoritária das Constituições, – a de
1969 – manteve o processo legislativo, apesar
de ter aumentado os poderes do Presidente
da República na edição de decretos-leis73.
Desta forma, é incontestável que existe, na
tradição constitucional brasileira, uma busca
de conservação da função da legislação
como reguladora do direito ordinário, que não
foi diferente com o advento da Constituição
de 1988.
Efetivamente, foi a partir da Constituição
de 1988 (muito devido à forma de seu texto
e a expansão de seu conteúdo) que se
discutiu uma maior ingerência das normas
constitucionais nas relações privadas, diante
da natureza das regras postas no texto
constitucional, o que ocasionou, inclusive, o
aumento de demandas judiciais de aplicação
direta de tais normas em casos concretos de
natureza privada19. Quer dizer, o próprio direito
civil brasileiro foi revisto sob a perspectiva
da “Constituição Cidadã”: a legislação
infraconstitucional passou a acompanhar
os valores constitucionais de 198820, e o
rompimento com a visão liberal do Código
Civil de 1916 foi definitivo com a aprovação
do ‘novo’21 Código Civil em 2002.
B)
O
“Constitucionalismo
de
Valores” do Pós-Segunda Guerra e a
“Constitucionalização” de institutos de
Direito Civil: o exemplo alemão
Em oposição ao “constitucionalismo”
liberal, o “constitucionalismo de valores”,
como a própria denominação já mostra,
preconiza a existência necessária de, em
qualquer Estado que seja Democrático
de Direito, uma Constituição que garanta
um mínimo de valores, fulcrados todos no
princípio da dignidade da pessoa humana.
Este constitucionalismo, como reação ao
totalitarismo antecedente, e em paralelo à
Declaração de Direitos Humanos de 1948,
preconiza a proteção da dignidade existencial
da pessoa humana – devendo todo o direito
ser fundamentado neste princípio – o reforço
do compromisso da Constituição com os
direitos fundamentais, principalmente com os
direitos-liberdades (os quais limitam a ação
do Estado), o fortalecimento da proteção dos
direitos sociais e políticos, a consagração do
princípio democrático e do Estado de Direito,
e o pluralismo ideológico e político22. Nesse
sentido, a protagonista foi a Lei Fundamental
de Bonn de 1949, a qual prevê em seu
texto todas essas disposições, tornandose modelo do que os alemães chamam
Verfassungsstaat, ou Estado Constitucional.
Com efeito, ao proteger explicitamente
os direitos fundamentais em seu texto, a
Lei Fundamental inaugura o que mais tarde
Sobre a Constituição de 1969, observa o professor CEZAR SALDANHA: “Entretanto, sob sua vigência, somente uma vez veio a ser o
Congresso posto em recesso... De resto – e aqui uma diferença importante entre a experiência da Constituição de 1969 e a da Constituição
de 1937 – o Congresso sempre esteve em funcionamento e nunca deixaram de ser realizadas eleições parlamentares...” (grifamos).
SOUZA JUNIOR, Constituições do Brasil, p.76.
19
Tais regras constitucionais – como as concernentes à família, à propriedade, à empresa, à ordem econômica, e inclusive às trabalhistas –
levou a uma discussão entre os constitucionalistas acerca da aplicabilidade de tais normas, se feitas diretamente pelo juiz ou indiretamente,
via legislador. Sobre a aplicabilidade direta, vide trabalho de SARLET, Ingo. “Direitos Fundamentais e Direito Privado: algumas considerações
em torno da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais”. Revista de Direito do Consumidor. Ano 09, n.36. São Paulo: Revista
dos Tribunais, out./dez. 2000, p.54-102. Sobre a aplicabilidade indireta, vide HECK, Luis Afonso. “Direitos Fundamentais e sua influência no
Direito Civil”. Revista de Direito do Consumidor. N.29. São Paulo: Revista dos Tribunais, jan./mar. 1999, p.40-54. Sobre a necessidade de
se estabelecer um campo para o direito constitucional e outro para o direito ordinário, e da competência do legislador, vide SOUZA JUNIOR,
Cezar Saldanha. “Direito Constitucional, Direito Ordinário, Direito Judiciário”. Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito-PPGDir./
UFRGS. N.03. Porto Alegre, mar. 2005, p.07-18.
20
Na visão de MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, uma gradual evolução social e política brasileira fez culminar no texto da Constituição
de 1988, a qual introduziu, com mais clareza, a ordem econômica e social em suas disposições: “As Constituições modernas não são apenas
políticas, como fazia questão de se dizer a Carta de 25 de março de 1824, a Constituição política do Império do Brasil. Propõe-se também
a reger o ‘econômico’ e o ‘social’. Apresentam-se, por isso, como constituições políticas, econômicas e sociais. (...) No Brasil, a primeira a
adotá-lo foi a de 1934. Desta, um Título, o IV, foi dedicado à Ordem Econômica e Social, e outro, o V, à Família, Educação e Cultura. Em
1967, tal linha foi mantida, assim como na Emenda n. 1/69, havendo um título voltado, exatamente, para a Ordem Econômica e Social e outro
para a Família, Educação e Cultura. Na Constituição de 1988, com mais lógica, se previu, por um lado, a Ordem Econômica e Financeira e,
de outro, a Ordem Social, incluindo Seguridade Social, Educação, Cultura, Desporto, Família, etc.”. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.
Estado de Direito e Constituição. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p.86 e 87.
21
Entre aspas pois sabe-se que o Código Civil aprovado em 2002 é, em verdade, um projeto elaborado em 1975, ainda que com emendas
atualizadoras em seu texto.
22
SOUZA JUNIOR, O Tribunal Constitucional, p.106 a 109.
18
110
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se cunhou de “constitucionalização” do
direito civil. Na verdade, a discussão entre
os alemães, diante do texto constitucional,
reside, até hoje, no grau de eficácia de
tais normas jurídicas, tendo em vista que
passou-se a admitir (com fundamento na
teoria kelseniana) uma força normativa da
Constituição, diante da natureza das normas
dispostas em seu corpo, obrigatórias e
cogentes. O próprio aperfeiçoamento da
técnica de controle de constitucionalidade
leva a esta constatação, na medida em
que a Constituição obriga todas as normas
inferiores (e atos jurídicos) a serem
conformes às suas disposições – obrigando,
diretamente, o legislador.
Portanto, é no problema da eficácia
de tais normas constitucionais – mormente,
a chamada “eficácia contra terceiros” ou
“efeito horizontal” (drittwirkung) que reside a
questão atinente ao direito civil: os direitos
fundamentais vinculam diretamente o
particular? Se vinculam diretamente, como
poderão regular os atos da vida civil, ou
institutos como contratos, por exemplo?
Essa discussão foi muito forte e intensa entre
os constitucionalistas23, mas que de certa
forma foi pacificada judicialmente a partir
da “Sentença Lüth” emanada do Tribunal
Constitucional Alemão. Nesta decisão, o
Tribunal direcionou-se a optar pela eficácia
mediata ou indireta, ou seja, intermediadas
ou pelo legislador ou pelo judiciário,
que deverá interpretar o caso conforme
a Constituição. Quer dizer, os direitos
fundamentais são linhas diretivas da decisão
judicial ordinária, posto que não deverá o juiz
pronunciar-se acerca da constitucionalidade
ou não da situação em concreto, ou aplicar
diretamente algum direito fundamental, sob
pena de interferir na competência do Tribunal
Constitucional para tanto, definida na própria
Lei Fundamental24. O fundamento da decisão
do Tribunal reside no conteúdo objetivo
dos direitos fundamentais e seu efeito
irradiador no direito civil, devendo ser os
mesmos observados pelo juiz na decisão em
concreto, podendo a parte, irresignando-se
com a interpretação judicial, propor recurso
constitucional.
Assim, em casos envolvendo relações
entre particulares (um contrato, por exemplo),
os direitos fundamentais exercem influência,
mas, conforme o Tribunal Constitucional
alemão, não obrigam ou vinculam diretamente
o particular, mas sim o legislador, que tem
a função primeira de regular as situações
privadas de forma a resguardar tais direitos
fundamentais. Os particulares vinculam-se
à lei, mas podem irresignar-se contra ela
ou contra uma conduta de outro particular
(pessoa jurídica, também) caso entenda
existir alguma violação constitucional. Ao fim
e ao cabo, se presente um caso concreto,
será resolvido pelo juiz ordinário.
LUIS AFONSO HECK explica-nos com
clareza: “Um conflito entre privados sobre
direitos e deveres de normas de conduta,
jurídico-fundamentalmente
influenciadas,
do direito civil permanece, material e
processualmente, um conflito jurídico civil”25.
Quer dizer, a relação jurídica entre particulares
não perde a sua natureza civil, apenas
submete-se, como qualquer outra relação
jurídica, às disposições constitucionais,
precipuamente os direitos fundamentais.
E finaliza o autor: “O conteúdo jurídico dos
direitos fundamentais como normas objetivas
desdobra-se no direito privado por meio de
prescrições que dominam diretamente esse
setor jurídico... interpretado e empregado é o
direito civil,...” 26, à luz da Constituição.
Desta forma, deve-se entender o que
se chama por “constitucionalização”: não se
trata, propriamente, de ter, a Constituição,
agregado disposições civis em seu texto, ou
tentado regular o direito civil em superioridade
às leis infraconstitucionais, numa tentativa
de colocar o público sobre o privado, como
afirmam alguns, mas sim na necessidade,
Principalmente em autores como KONRAD HESSE, NEUNER, e CANARIS.
HECK, op.cit., p.44.
Id.,ib., p.46.
26
HECK, op.cit., p.46, nota 25.
23
24
25
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diante
da
evolução
histórico-política
constitucional e jurídica, de assegurar, tutelar,
consagrar institutos do direito civil no texto
constitucional, a fim de evitar que o legislador,
m incorrendo em arbitrariedade, venha a abolir
ou modificar substancialmente o conteúdo do
direito civil então existente. De igual maneira,
trata-se de assegurar na Constituição
direitos civis importantes e essenciais para
a comunidade política, que, por opção dela
mesma, não poderão ser alterados nem pelo
legislador ordinário, nem pelo particular, nem
pela Administração, nem pelo Governo.
Direito Constitucional todos os ramos do
Direito, tornando o primeiro um “super-direito”.
A) A relação dos direitos fundamentais
constitucionais e os direitos civis: limites
constitucionais ao direito privado
Fruto do constitucionalismo dos valores,
como já dito, a consagração nas Constituições
dos direitos fundamentais é típico da pósmodernidade, eis que, até então, não se
admitia nos diplomas constitucionais uma
tábua de direitos e princípios tão rica e fulcrada
na dignidade da pessoa humana29. Desta
forma, tornou-se um desafio, para o direito
II – A “constitucionalização” do direito do estado, e também para o direito privado,
civil na contemporaniedade
esta harmonia entre os direitos previstos na
Levando em consideração a noção de Constituição e os demais direitos previstos
“constitucionalização” do direito civil como em leis ou em atos jurídicos stricto sensu.
No Brasil, este reflexo dos direitos
uma proposta histórico-jurídico-política de
consagrar, nas Constituições (advindas do fundamentais no direito civil é ainda muito
constitucionalismo de valores), institutos mais intenso que na Alemanha ou outros
civis fundamentais para a sociedade política, países europeus devido à natureza e à forma
devendo fazer parte do texto constitucional, das descrições normativas constitucionais.
pode-se afirmar que a presença de um Como já dito, observa-se na Constituição de
conteúdo civil “constitucional” não inaugura 1988 uma presença significativa de normas
de conteúdo civil, verbi
um direito civil constitucional,
peculiaridade
da gratia, os direitos-liberdades
posto que não é esta a A
finalidade da Constituição27. Constituição reside na sua do art.5º (liberdade de
Se assim o fosse, tal supremacia no sistema, associação, direito à herança,
objetivo suprimiria inclusive posto que é fundamento à intimidade, à informação,
a competência específica de validade para as direitos autorais, direito do
propriedade
do juiz ordinário em analisar demais normas; mas não consumidor,
fundamentais,
casos concretos envolvendo busca minar o campo industrial),
impassíveis
relações jurídicas privadas, próprio de atuação da lei portanto,
o que causaria uma certa civil ou administrativa. de objeto de reforma
constitucional
(art.60,
confusão no sistema de
controle de constitucionalidade, segundo a §4º, IV). Normas, pois, que asseguram a
doutrina alemã dantes vista, e seguida entre existência e essencialidade do direito civil no
nós por vários autores28, além de explicitar um ordenamento jurídico, obrigando, inclusive, o
fenômeno ao qual chamamos “totalitarismo legislador a regulamentar tais institutos em
constitucional”, o que quer dizer, imbutir no conformidade com a Constituição.
Neste ponto, não concordamos com a posição de JOAQUÍN ARCE FLÓREZ-VALDÉS (El Derecho Civil Constitucional. Madrid: Editorial
Civitas, 1991, p.173) quando refere existir um conjunto normativo formal de direito civil na Constituição; ora, isso é propugnar a existência
de um sistema jurídico quase que paralelo ao constitucional (e não infraconstitucional, como é o correto), o que não é possível, logicamente,
tendo em vista que a Constituição é um todo, e esse todo constitui o fundamento de validade de todo o sistema normativo.
28
Nesse sentido, vide SOUZA JUNIOR, “Jurisdição Constitucional, Direito Ordinário, Direito Judiciário”, 2005.
29
Sobre a relação entre os princípios e valores constitucionais, importante referir a lição de JORGE MIRANDA: “Os princípios não se
colocam, pois, além ou acima do Direito (ou do próprio Direito positivo); também eles – numa visão ampla, superadora de concepções
positivistas, literalistas e absolutizantes das fontes legais – fazem parte do complexo ordenamental. (...) Se assim se afigura no geral,
muito mais tem do ser no âmbito do Direito constitucional, tronco da ordem jurídica estadual, todo ele envolvido e penetrado pelos valores
jurídicos fundamentais dominantes na comunidade; sobretudo, tem de ser assim na consideração da Constituição material como núcleo
de princípios e não tanto de preceitos ou disposições articuladas” (grifamos). MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo
II. Coimbra: Coimbra Editora, 1991, p.224-225.
27
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Vê-se, portanto, que não veio a
Constituição de 1988 regular o direito civil
em lugar da legislação ordinária, ou tornar o
direito civil constitucional, mas tão-somente
dar segurança jurídica à própria existência de
tais institutos (resguardando-os de eventual
arbítrio do legislador), elevando-os a nível
constitucional pela sua essencialidade em
função da existência da pessoa humana,
em sua dignidade. Ora, é necessário,
para concretizar a dignidade da pessoa, a
existência de sua liberdade; de um mínimo
existencial, manifestado muitas vezes pela
possibilidade de efetivação do consumo;
da propriedade; da família; do fim da vida,
já como idoso. Todos estes fatores são
considerados pela Constituição como
valores, devendo ser protegidos em seu
texto, e efetivados ordinariamente pela lei e
pela atividade judicial dos juízes.
Nessa mesma linha de raciocínio,
importante referir o ensinamento do Ministro
GILMAR FERREIRA MENDES: “Sem
pressupor a existência das normas de direito
privado relativas ao direito de propriedade,
ao direito de propriedade intelectual e ao
direito de sucessões, não haveria que se
cogitar de uma efetiva garantia constitucional
desses direitos... Fica evidente, pois, que
a intervenção legislativa não apenas
se afigura inevitável, como também
necessária”30. Quer dizer, a Constituição
garante e delimita a proteção desses
direitos, mas requer a intervenção legislativa
para regulá-los, concretizá-los, completálos ou até restringi-los (sem atingir o núcleo
essencial do direito), o que demonstra a sua
incapacidade de ser aplicada diretamente
nas relações privadas e sociais, sem essa
intermediação.
Aliás, cumpre efetuar breve análise
a respeito da chamada eficácia imediata
ou mediata dos direitos fundamentais
sobre as relações privadas, ou que restou
conhecido como ‘eficácia horizontal’ dos
direitos fundamentais, mormente os de
natureza civil31. A questão da diferenciação
entre a aplicação dos direitos fundamentais
numa relação jurídica particular-Estado –
então relação ‘vertical’ – e numa relação
entre particulares – chamada ‘horizontal’
– foi desenvolvida principalmente entre
os constitucionalistas alemães, como já
dito, culminando com um pronunciamento
relevante do Tribunal Constitucional
alemão na conhecida ‘Sentença Lüth’. A
problemática residia, como refere ROBERT
ALEXY, em duas vertentes: como ocorre
dita vinculação dos particulares aos direitos
fundamentais e, em que medida, tendo em
vista que trata-se de relação jurídica entre
dois titulares de direitos fundamentais,
ambos em situação de igualdade32.
A fim de solucionar a problemática,
surgiu entre os constitucionalistas duas
propostas de análise acerca da influência
dos direitos fundamentais na relação
entre os particulares: a eficácia direta dos
direitos fundamentais sobre tais relações
jurídicas, e a eficácia imediata. A primeira
trata o direito fundamental como uma norma
jurídica que expressa valores aplicáveis
a todo o ordenamento jurídico, a qual tem
ingerência automática e direta sobre as
relações jurídico-privadas, o que impede
qualquer pretensão de limitação estipulada
contratualmente,
independentemente,
inclusive, de previsão legal a respeito. Dito
caráter normativo do direito fundamental
ensejaria, ademais, um direito subjetivo
do particular a algum tipo de indenização
ou reparação, em caso de lesão ao direito
fundamental33.
A segunda proposta – a qual
30
MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Hermenêutica Constitucional e Direitos
Fundamentais. Brasília: Brasília Jurídica, 2002, p.214.
31
Tome-se, aqui, o termo ‘eficácia’, tendo em vista ser a estrutura jurídica então utilizada pelos principais autores alemães, ainda que alguns
prefiram distinguir a ‘validade’ da ‘eficácia’ dos direitos fundamentais, como o faz CANARIS. A esse respeito, vide CANARIS, Claus-Wilhelm. “A
influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado na Alemanha” in Constituição, Direitos Fundamentais e Direito Privado. Tradução:
Peter Naumann. Organização: Ingo Wolfgang Sarlet. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p.223-243.
32
ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993, p.510 a 512.
33
SARLET, Ingo Wolfgang. “Direitos Fundamentais e Direito Privado: algumas considerações em torno da vinculação dos particulares aos
direitos fundamentais”. Revista de Direito do Consumidor. Ano 09, n.36. São Paulo: Revista dos Tribunais, out./dez. 2000, p.67 e 68.
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consideramos ser a mais correta – considera
os direitos fundamentais como integradores
de uma ordem de valores objetiva (tal qual
a teoria da eficácia imediata), mas que
não possuem natureza normativa a ponto
de serem diretamente e automaticamente
aplicáveis nas relações entre particulares,
sob pena de interferência abusiva sobre a
autonomia privada e a liberdade contratual,
gerando, ainda, uma estatização do direito
privado, bem como um esvaziamento de
seu conteúdo, presente precipuamente na
lei e nos contratos e acordos celebrados34.
Como já dissemos, a aplicação direta de
prescrições constitucionais configura um
verdadeiro
totalitarismo
constitucional,
que não respeita os níveis essenciais do
ordenamento jurídico, os quais preveêm
para cada âmbito do direito a sua correta
aplicação35.
Dessa forma, a ‘eficácia irradiante’
dos
direitos
fundamentais
dar-se-á
pelo legislador ordinário, pelos próprios
particulares e pela interpretação das
cláusulas gerais e conceitos indeterminados
do direito privado em conformidade com a
Constituição (como um todo, não só em
relação aos direitos fundamentais). Acaso
ocorra alguma ofensa à Constituição, esta
deve ser analisada, judicialmente, mediante
a interpretação jurídica (pelo juiz ordinário)
ou, conforme o caso, por meio do controle
de constitucionalidade (exclusivamente pelo
Tribunal Constitucional).
B) O Direito Privado na Constituição:
desafios na pós-modernidade
A expressão “pós-modernidade” é
utilizada por ERIK JAIME para demonstrar
a circunstância de mudança, ou de crise,
ou de variabilidade do momento histórico
em que vivemos e, portanto, do próprio
Direito, por certo tendo bases sociológicas
e filosóficas (de mudanças de pensamento)
muito fortes36. Assim, sendo o direito
fruto da sociedade, certamente sofrerá
impactos constantes das mudanças sociais
e, em nosso tempo, não fica alheio às
circunstâncias surgidas com a globalização
e com a era “pós-industrial”. Para ERIK
JAIME, vive-se uma crise de mudança, a
qual implementa ao direito civil um grande
desafio, no sentido de acompanhar tais
modificações e superar dita crise. Desta
maneira, JAIME apresenta uma proposta
dita ‘reconstrutora’, baseada na identidade
“... os direitos fundamentais não são – segundo esta concepção – diretamente oponíveis, como direitos subjetivos, nas relações entre
particulares, mas que carecem de uma intermediação, isto é, de uma transposição a ser efetuada precipuamente pelo legislador e, na ausência
de normas legais privadas, pelos órgãos judiciais, por meio de uma interpretação conforme aos direitos fundamentais e, eventualmente, por
meio de uma integração jurisprudencial de eventuais lacunas, cuidando-se, na verdade, de uma espécie de recepção dos direitos fundamentais
pelo direito privado”. Id.,ib., p.68 e 69.
35
Sobre os níveis do ordenamento, explica o professor CEZAR SALDANHA: “A evolução político-jurídica do Ocidente chega ao século XXI
reconhecendo uma estrutura funcional de ordenamento jurídico em que podemos divisar três níveis de direito positivo: 1º) o nível fundamental
que, além de estabelecer o quadro da organização política básica do Estado, contempla os valores jurídicos superiores, boa parte deles
formulados como direitos ditos fundamentais, o nível do direito constitucional; 2º) o nível intermediário onde está o direito ordinário, seja ele
público ou privado, vale dizer, o conjunto de todas as normas gerais que, frente à realidade, procuram operacionalizar os valores e os direitos
fundamentais essenciais ao convívio interpessoal; e 3º) o nível concreto, o direito realizado, nos fatos da vida, pelos administradores e pelos
juízes, cujo segmento mais importante poderíamos denominar de direito judiciário.” (grifos do autor). SOUZA JUNIOR, “Direito Constitucional,
Direito Ordinário, Direito Judiciário”, p.10 e 11.
36
O pensamento de ERIK JAIME foi assim sintetizado por CLÁUDIA LIMA MARQUES: “A Tese de Jayme voltou-se inicialmente para os reflexos
da pós-modernidade no direito internacional privado como ramo mais sensível aos contatos humanos internacionais de nosso tempo e as
mudanças nos valores e modelos da sociedade. Mas a hipótese de trabalho de Jayme, qual seja de que o direito, como expressão cultural
de um povo, sofre reflexos maiores ou menores das mudanças valorativas, econômicas, históricas, éticas e mesmo religiosas de seu tempo,
é válida também para outros ramos do direito. Assim, em um tempo conhecido como pós-industrial, com uma filosofia pós-estruturalista e
discursiva, uma era do vazio e do caos, de desregulamentação, de privatizações, de forte exclusão social, da ‘euforia do individualismo e do
mercado’, era de globalização, de radicalismo tribal, de convivência e intolerância, de antinomias tão fortes que já se prevê o fim da história,
a morte da ciência, o fim dos valores e outras catastróficas previsões para a nova era, em resumo, em uma época de crise pós-moderna,
também o direito como ciência próxima da realidade social e voltada para sociedade estaria em crise e deve evoluir. Uma crise de mudança,
uma crise de crescimento” (MARQUES, Cláudia Lima. “Laudatio para Erik Jaime – Memórias e Utopia”. Cadernos do Programa de PósGraduação em Direito – PPGDir./UFRGS. Vol. I, Número I, Março/2003. 3ª Tiragem, 2ª Edição. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, dezembro de 2004, p.57/58).
37
Afirma ERIK JAIME: “Podemos, portanto, constatar que ao desenvolvimento das sociedades multiculturais corresponde o reconhecimento,
por parte do ordenamento jurídico internacional, da identidade cultural da pessoa como valor jurídico” (JAIME, Erik. “Sociedade Multicultural e
Novos Desenvolvimentos no Direito Internacional Privado”. Tradução do original em italiano por Cláudia Lima Marques e Julia Barros Schirmer.
Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGDir./UFRGS. Vol. I, Número I, Março/2003. 3ª Tiragem, 2ª Edição. Porto
Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dezembro de 2004, p.96).
34
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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
cultural da pessoa humana37 – tomada como
indivíduo – e no fortalecimento dos valores
atinentes a essa mesma natureza humana.
Na visão desse autor, as características
da cultura pós-moderna no direito seriam
o Pluralismo (o ‘direito de ser diferente’),
a Comunicação, a Narração, o retorno aos
sentimentos e a valorização dos direitos
humanos38. Portanto, segundo ERIK JAIME,
o direito terá que superar as mudanças e as
crises a partir de uma solução sistemática
mais fluída, mas flexível, pela passagem
da superação dos paradigmas para a
convivência dos paradigmas.
Essa convivência dos paradigmas,
pois, é transportada para o direito na visão
da convivência das diversas fontes jurídicas,
ou mais especificamente, legislativas,
traduzidas pela proposta do ‘diálogo das
fontes’. Assim, nessa linha exposta por ERIK
JAIME39, no direito privado, a existência de
um sistema jurídico flexível, mutável, plural,
constituído por várias fontes do direito, só
poderá dar uma solução sistemática pósmoderna a partir da coordenação de todas
as fontes legislativas. Este diálogo permite
uma aplicação simultânea, coerente e
equilibrada, posto que há, entre as fontes,
influências recíprocas, que não poderão
ser resolvidas meramente pelo sistema
“moderno” de revogação. Claro está,
contudo, que dita solução sistemática reside
precipuamente no campo da hermenêutica
ou interpretação jurídica, exigindo dos
juristas uma correta aplicação de tais
fontes legislativas ao caso concreto e em
conformidade com a Constituição.
Dessa maneira, o ‘diálogo das fontes’
no direito privado somente é possível,
tomado como parâmetro de interpretação
pelo jurista, se em conformidade com a
Constituição. O intérprete – no caso, o juiz,
que decide o caso concreto envolvendo
uma relação jurídica de natureza civil – tem
um compromisso em decidir da maneira
mais justa possível, levando em conta as
circunstâncias do caso concreto, sempre,
todavia, conformando sua interpretação às
normas constitucionais. Desta forma, o juiz
que aplica simultaneamente, por exemplo, o
Código de Defesa do Consumidor, o Código
Civil e as leis do Sistema Financeiro de
Habitação, num caso concreto, deve fazêlo de forma a não ferir qualquer prescrição
constitucional, principalmente no que tange
aos direitos fundamentais. Nesse sentido,
mesmo um sistema jurídico flexível deverá
estar submetido à Constituição, pois esta
dá o fundamento de validade ao próprio
sistema, que não poderá ser contrário,
logicamente, a mesma, sob pena de incorrer
em insolucionável contradição.
Em uma outra perspectiva, a pósmodernidade, na proposta de JESÚS
BALLESTEROS, não deve ser percebida,
na história humana, tão-somente aos
olhos da ciência natural, ou das ciências
humanas, ou, até, das mudanças sociais
na política e economia, posto que ainda
identificaríamos, nestas searas, elementos
da então Modernidade. A pós-modernidade,
como tal – expressão que, segundo
BALLESTEROS, aparece na historiografia
pela primeira vez na obra de TOYNBEE, A
Ao explicar a escolha desses valores como os caracterizadores da cultura pós-moderna, ERIK JAIME admite existir uma certa arbitrariedade
na sua proposta, bem como não deixa claro os exatos critérios para a seleção desses valores, e não outros: “O ponto de encontro entre a cultura
pós-moderna e o direito são os valores que têm em comum. ... O primeiro deles é o pluralismo (Pluralismus). Não apenas o pluralismo de formas,
mas também de estilos. É também de estilos de vida, é a ideia de autonomia em escolher seu próprio modo de vida. O mundo pós-moderno
é caracterizado por um ‘direito à diferença’... O segundo valor: o mundo pós-moderno é caracterizado pela comunicação (Kommunikation)
e por não ter mais fronteiras. De outra parte, não são apenas os meios tecnológicos que permitem a troca rápida de informação e imagens,
mas também a vontade (Wille) e o desejo (Wunsch) de se comunicar dessas pessoas. Esse desejo emerge como valor comum. A terceira
característica é a ‘narração’ (Narration): comunicar é também descrever, contar, narrar, observe-se já o alto nível da arte figurativa. O quarto
valor é o retorno aos sentimentos... Podemos, porém, considerá-lo em relação à identidade cultural que pode conduzir a conflitos culturais,
baseados em um sentimento forte de defesa de sua própria identidade cultural, de sua religião e de todas as outras expressões do individualismo.
A escolha desses quatro valores da cultura pós-moderna... pode parecer arbitrária, mas essa escolha permite pôr em evidência a
ligação entre direito e a cultura pós-moderna” (grifamos; JAIME, Erik. “Direito Internacional Privado e Cultura Pós-Moderna”. Tradução de
Lisiane Feiten Wingert, revisão de Cláudia Lima Marques. Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGDir./UFRGS. Vol.
I, Número I, Março/2003. 3ª Tiragem, 2ª Edição. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dezembro de 2004, p.106/107).
39
MARQUES, Cláudia Lima. “Diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor e o Novo Código Civil: Do ‘Diálogo das Fontes’ no combate
às cláusulas abusivas”. Revista de Direito do Consumidor. Ano 12, n.45. São Paulo: Revista dos Tribunais, jan./mar. 2003, p.74 e 75.
38
115
Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre • Ano IV • Número 8 • Julho - Dezembro de 2010
Study of History, publicada entre 1934 e 1954 garantidor dos princípios constitucionais
– pode ser identificada por determinados cujo fundamento encontra-se na dignidade
acontecimentos históricos que marcaram da pessoa humana) e o direito privado
uma mudança forte de pensamento, quais (como regulador das condutas humanas em
sejam: 1) o final da Segunda Guerra respeito aos mesmos princípios e valores
Mundial, e o apelo pela paz, caracterizando constitucionais), constituindo as duas áreas
o caminho da sobrevivência; 2) o centrais do direito para a superação da
processo de ‘descolonização’, marcado crise pós-moderna, evidente aos nossos
pelo respeito às culturas dirigido a um olhos, hoje. Para tanto, necessário será
pensar ‘ecumênico’, definindo o caminho um perfeito diálogo entre o público e o
da pluralidade de culturas; 3) a conservação privado, respeitando suas particularidades
dos recursos naturais, despertando o pensar e ao mesmo tempo perseguindo, como
‘ecológico’, no caminho da preservação diz BALLESTEROS, a ‘pós-modernidade
ambiental local e global; 4) a importância como resistência’, sendo necessário
dos valores femininos, resultando no ‘relativizar o relativismo’, encontrando uma
caminho do desapego e da revalorização do comum resistência contra as violações à
humanidade em quaisquer circunstâncias.
cuidado.
Podemos afirmar, pois, na esteira
Considerações Finais
do pensamento de BALLESTEROS, que
Entendemos, pois, ser imprescindível
a pós-modernidade, com todos os seus
elementos, está centrada neste ‘pensar o equilíbrio entre o direito privado e o
ecumênico’, no esforço de superação de constitucional a partir da exata delimitação
um etnocentrismo40 (típico da Modernidade) de suas áreas de atuação e competência.
para o reconhecimento do outro. E este Quer dizer, não basta afastarmos o direito
reconhecimento parte do pressuposto privado, e aplicarmos diretamente sobre
de ver no outro o seu semelhante, casos concretos os direitos ou prescrições
independentemente de sua cultura e suas constitucionais, pois incidiríamos num
verdadeiro
totalitarismo
diferenças. Essa semelhança
reside exatamente numa (...) a pós-modernidade, constitucional, assim como
igual
natureza
humana, com
todos
os
seus num extremo relativismo
perfectibilizada
na
sua elementos, está centrada jurídico, na medida em que
dignidade como humano, neste ‘pensar ecumênico’, dita aplicação dependerá
resultando
numa
visão no esforço de superação de sempre do aplicador –
uniformizadora e objetiva um etnocentrismo40 (típico que pode interpretar a
dos valores humanos a ser da Modernidade) para o Constituição de uma forma,
respeitados e perseguidos por reconhecimento do outro. e outro aplicador de outra.
Tampouco é razoável aplicar
todas as pessoas – valores
exclusivamente princípios
esses que transcendem a
e regras do direito privado, sem observar
identidade cultural do indivíduo.
É exatamente neste ponto que o o ordenamento superior constitucional,
direito assume o papel central de dirigir a que lhe confere fundamento e validade.
vida humana para a consecução de tais É preciso uma visão de conjunto, aliada
valores. Muito mais importância, nesse a um olhar específico sobre cada campo
sentido, tem o direito constitucional (como próprio do direito, sendo o privado seara
O etnocentrismo é uma expressão utilizada na Ciência Sociológica para referir-se à análise de uma outra realidade a partir dos olhos
individuais e próprios da realidade do observador, que, por ter esse olhar exclusivo, não identifica elementos que são próprios do fenômeno
estudado, chegando a equívocos principalmente no que tange ao estudo da cultura do outro (muitas vezes caracterizando uma tentativa de
superação de uma perspectiva sobre a outra).
40
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típica do direito ordinário e o constitucional
(o público) próprio de uma jurisdição e
legislação específica41.
Dessa forma, consideramos que o fulcro
do problema das relações entre o direito
civil e a Constituição estão, em verdade, na
interpretação jurídica, bem como na exata
delimitação dos campos jurídicos do direito
ordinário e constitucional, que não deixaram
de ter sua autonomia com os valores
constitucionais nem com a eficácia normativa
da Constituição. A palavra, pois, que ora
propugnamos é “harmonia”, ou “diálogo”, e
não “sobreposição” de um campo em outro.
Oportuno salientar que a Constituição, ao
apenas garantir os institutos civis, não toliu
ao intérprete sua liberdade de análise do
caso concreto e aplicação de fontes no
mesmo caso. Apenas direcionou o intérprete
a respeitar as disposições constitucionais,
incontestavelmente superiores no sistema,
mas perfeitamente harmoniosas com o mesmo.
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41
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fundamentales, y que además se refuerza la tendencia a dejar fluir los derechos fundamentales en el Derecho Privado también allí donde
éste en modo alguno depende de ellos. El Tribunal Constitucional cae así en el peligro de convertirse en el supremo tribunal de los conflictos
jurídico-civiles y de asumir de este modo un papel que la Ley Fundamental no le ha conferido... Al legislador del Derecho Privado corresponde
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Recensão
MIRAGEM, Bruno; ZIMMER, Aloísio. Comentários à Constituição do
Estado do Rio Grande do Sul. São Paulo: Forense, 2010, 903 p.
José Nosvitz Pereira de Souza(1)
A evolução histórica do Direito, no
Rio Grande do Sul, desde o início de sua
organização política, no Brasil independente,
revestiu-se de características muito especiais
e diferenciadas, para não dizer ímpares,
na comparação com outras unidades do
Império e da República. Linha exemplar para
a verificação dessa tendência ao sui generis
pode bem ser verificada na sucessão das
cartas constitucionais elaboradas em terra
gaúcha, nos séculos XIX e XX.
A Constituição Federal de 1988 avançara
na afirmação e desdobramento dos direitos
fundamentais e na estruturação do Estado
Democrático de Direito, como compensação
reativa ao regime autoritário precedente.
Pouco restou ao constituinte estadual para
acrescer ou inovar na área da organização
do Estado, onde por isso foram apenas
reforçados os mecanismos de participação
popular na gestão administrativa (art. 19),
bem como estabelecidos mecanismos de
preservação das entidades de administração
indireta, em especial quanto à alienação
ou transferência de controle acionário de
sociedades de economia mista (art. 22 e
§§). Na área da organização dos poderes,
além da preservação das instituições
democráticas em geral, a Constituição
do Estado detalhou os mecanismos de
participação popular mediante iniciativa
popular de projetos de lei e de propostas
de emenda constitucional (art. 68), e das
consultas referendárias e plebiscitárias,
formuladas em termos de aprovação
ou rejeição dos atos, autorizações ou
concessões do Poder Executivo, bem como
do teor da matéria legislativa sancionada ou
vetada (§§ 3º. e 4º. do art. 68, e art. 69).
A obra, Comentários à Constituição
do Estado do Rio Grande do Sul, de 03 de
outubro de 1989, de autoria dos professores
Bruno Miragem e Aloísio Zimmer Júnior,
ao realizar a apreciação das disposições
da Carta Magna, atende a um vazio do
cenário editorial regional e nacional de
comentários aprofundados e refletidos
sobre o texto das constituições estaduais.
Um certo desprestígio que se faz notar pelo
direito estadual impõe que se vislumbre a
presente obra como um alento no cenário
editorial gaúcho e brasileiro. De notar que
antes dela, as Constituições do Estado
do Rio Grande do Sul só haviam merecido
comentários de nomes como Joaquim Luis
Osório, que em 1911 procedeu o exame
da primeira Constituição republicana, e de
Maurício Cardoso, que tendo sido deputado
constituinte comentou em seguida, em
pequeno opúsculo, a Constituição estadual
de 1935. Neste sentido é de dizer que os
Comentários à Constituição do Estado do
Rio Grande do Sul, de Bruno Miragem e
Aloísio Zimmer, cumprem um importante
papel, a partir de observações fundadas
nos melhores embasamentos doutrinários
e jurisprudenciais, do texto constitucional
vigente no território estadual. Tanto são
consideradas as instituições e programas
normativos, em sua generalidade, quanto
à microvisão em temas específicos, e,
sobretudo, às peculiaridades e singularidades
da Constituição de 1989, ditadas pelo espírito
inovador ou antecipatório de algumas de
suas disposições.
Como diz em seu prefácio, o professor
Manoel André da Rocha, “a obra é vasta,
opulenta e de fino lavor, na letra e no espírito.
(1)
Mestre em Direito e Coordenador do Curso de Direito da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: nosvitz.faculdade@
dombosco.net
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Tanto se deve a que bem souberam os seus
autores, dois jovens juristas e professores de
direito, mercê de seu preparo acadêmico e
talento pessoal, compreender a Constituição
de 1989 no espaço das ideias políticas e
jurídicas tutelares da história constitucional
do Rio Grande do Sul. E lograram realizar
obra ímpar, pois que nenhuma outra existiu
com essa amplitude, abordando com clareza
e segurança temas e setores diversos do
Direito, da mais variada natureza, sempre
em comentários da mais alta qualidade
técnica, os quais inclusive desbordaram das
fronteiras estaduais para alcançar o texto da
Carta Magna federal de 1988.”
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A REVISTA ATITUDE é uma publicação semestral de acesso irrestrito que publica artigos
científicos originais e inéditos nas áreas de Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Tecnológicas
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dos artigos é feita a partir da recomendação de avaliadores ad-hoc, escolhidos entre os pares
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A Revista ATITUDE - Construindo Oportunidades está aberta a colaborações do Brasil
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publicação final, já que a dimensão das menores letras e símbolos não deve ser inferior
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por sucessivas letras minúsculas (Exemplo: Scouth 2000a,b), o mesmo ocorrendo com
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cit. nem apud. Devem ser evitadas citações a informações pessoais e de trabalhos em
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dos avaliadores deverão discorrer sobre os seguintes pontos do manuscrito: atendimento
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