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Publicação da FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
ANO I - NÚMERO 1 - DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
03 ENTREVISTA EMERSON KAPAZ
08 EDUCAÇÃO SETORIAL
E COMPETITIVIDADE NO BRASIL
MARISA EBOLI
10 OS CURSOS SUPERIORES
DE TECNOLOGIA,
O PROFISSIONAL TECNÓLOGO
E SUAS DINÂMICAS
DIRCEU D’ALKMIN TELLES
16 A NOVA EDUCAÇÃO
18 MERCADO DE TRABALHO:
EMPREGO E DESEMPREGO
NO FIM DO SÉCULO XX
FRANCISCO SCARFONI FILHO
E JACYRA C. MONTANARI
25 RECARGA ARTIFICIAL
DE AQÜÍFEROS
IVANILDO HESPANHOL
30 TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
32 O DESAFIO DAS ÁGUAS
ANGELO ALBIERO FILHO
34 ARTE E CIÊNCIA
NÃO SÃO INCOMPATÍVEIS,
MAS A MÍDIA SE IMPORTA
COM ISSO?
ENIO SQUEFF
38 INOVAR É PRECISO,
E O PAPEL DAS EMPRESAS
FAZ DIFERENÇA, SIM!
IMPROVISAR
NÃO É PRECISO
RICARDO YOUNG
LUIZ CARLOS MORAES REGO
GUILHERME ARY PLONSKI
ENTREVISTA
EDITORIAL
EMERSON KAPAZ
EXPEDIENTE
A NOVA PROPOSTA DA FAT
CÉSAR SILVA [DIRETOR-PRESIDENTE DA FAT]
A
DIRETORIA EXECUTIVA
Diretor Presidente
Prof. César Silva
Diretor Administrativo
Prof. Francisco Scarfoni Filho
Fundação de Apoio à Tecnologia – FAT foi criada em dezembro de 1987 por
um grupo de professores da Faculdade de Tecnologia de São Paulo - Fatec-SP,
e caracteriza-se como uma fundação de direito privado, sem fins lucrativos.
Sua criação originou-se da idéia de se ter uma entidade ágil, eficiente e eficaz que
pudesse interagir e obter sinergia com o sistema produtivo, por meio do desenvolvimento de projetos de Educação, Pesquisa, Inovações Tecnológicas, Terceirização e
Desenvolvimento Profissional, tendo em vista a difusão e a implantação de tecnologias.
Nossa filosofia de trabalho apóia-se no atendimento diferenciado de cada projeto de assessoria, ensino, pesquisa e treinamento. A partir do conhecimento, da
análise dos problemas e das necessidades da organização, a FAT propõe, desenvolve
e implanta soluções específicas para cada caso.
Por isso, é com enorme satisfação que estamos apresentando a primeira
edição da Revista da FAT.
Há algum tempo identificamos a necessidade da criação de um canal de comunicação com a sociedade, pelo qual pudéssemos compartilhar os conhecimentos
adquiridos pela FAT ao longo desses 17 anos.
Durante esse longo período, a FAT vem se consolidando como instituição preocupada em cumprir com suas finalidades, buscando atingir os mais elevados níveis
de excelência em suas atividades. Para isso, firmamos parcerias fortes e sólidas
capazes de gerar novos conhecimentos que agreguem valor aos serviços prestados,
partindo, sempre, da filosofia de que o respeito a uma instituição só é adquirido a
partir do momento em que se pode corresponder aos anseios da sociedade.
Vivemos em uma época na qual a produção de informação é muito maior que a
nossa capacidade de absorção. A Revista da FAT visa estruturar e consolidar as
informações, de forma a facilitar o entendimento dos assuntos tratados.
Nossa proposta, com a Revista da FAT, é difundir o conhecimento adquirido
ao longo desses anos, de forma a contribuir para o desenvolvimento social,
econômico e tecnológico do nosso Estado e do nosso País.
CÉSAR SILVA
[email protected]
Diretor-presidente da FAT,
professor da Fatec São Paulo
e consultor na área
de gestão empresarial.
Diretor Técnico
Prof. Luiz Roberto Vannucci
CONSELHO DE CURADORES
Prof. Dirceu D’Alkimin Telles
Prof. Francisco Antonio Pinto Éboli
Prof. Almério Melquiades de Araújo
Profa. Yolanda Silvestre
Prof. Victor Sonnenberg
Profa. Silvia Regina Lucca
Prof. Remo Alberto Fevorini
Profa. Rosana Maria Siqueira
-----------------------CONSELHO EDITORIAL
Prof. Dr. Angelo Albiero Filho
Prof. Dr. Claudio Felisoni de Angelo
Prof. Dr. Dirceu D´Alkmin Telles
Enio Squeff
Prof. Dr. Guilherme Ary Plonski
Prof. Dr. Ivanildo Hespanhol
Prof. Luiz Carlos Moraes Rego
Prof. Dra. Marisa Eboli
Marcus Vinicius Sinval
Ricardo Young
Prof. Dr. Roberto Sbragia
-----------------------Editor/ Jornalista Responsável
Luiz da Silva de Nogueira Mtb 15.612
11 9639-6850 - [email protected]
Revisão de textos Hebe Ester Lucas
Projeto Gráfico/ Direção de Arte Ronie Prado
Editoração Eletrônica Mariângela Bueno
A ÉTICA CONCORRENCIAL
NO SETOR EMPRESARIAL BRASILEIRO
Emerson Kapaz é engenheiro civil e tem 48 anos. No fim da década
de 1980, junto com um grupo de empresários, fundou o PNBE Pensamento Nacional das Bases Empresariais. Também participou da
criação da Fundação Abrinq. Foi secretário da Ciência, Tecnologia e
Desenvolvimento do Estado de São Paulo no governo Mário Covas. Em
2000, colaborou para a criação do Instituto Ethos, que incentiva as
empresas a incorporar o conceito de responsabilidade social.
Fotos Júlio Hilário, Photodisc e Folha Imagem
Ilustração Enio Squeff
Eleito deputado federal em 1998, participou ativamente da aprovação
Fotolito, impressão
e acabamento
da nova Lei das S.A.s, de projetos de lei de incentivo às micro e peque-
Tiragem 2.000 exemplares
nas empresas, de aumento de crédito para a exportação e para tornar
------------------------
mais transparente o balanço das empresas. Foi o relator da comissão
Revista da FAT - Publicação TRIMESTRAL
da Fundação de Apoio à Tecnologia
Ano I - Número 1 - DEZ’2004 e JAN/FEV’2005
Rua Três Rios, 131 - cj. 42 - Bom Retiro
São Paulo - SP - CEP 01123-001
Telefones: (11) 3313-1200
3315-9511/ 228-8373
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Os conceitos emitidos em artigos assinados são de
exclusiva responsabilidade dos autores.
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
Ele aborda também temas como a universidade, a
gestão de pessoas, o ensino tecnológico, o meio ambiente
e as PPP - Parcerias Públicas Privadas.
Presidente do Conselho de Curadores
Prof. Kokei Uehara
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do
conteúdo desta revista em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização prévia.
02
Em entrevista inaugural da Revista da FAT, o presidenteexecutivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial Etco fala sobre a importância do combate à concorrência
desleal no Brasil e seus reflexos na economia.
especial criada para elaborar a política nacional de resíduos sólidos.
Também lutou para garantir a aplicação do Estatuto da Criança e do
Adolescente e participou da aprovação da lei que permite que as
ONGs possam receber recursos públicos. Apresentou projeto para
assegurar aos alunos do ensino público a inscrição gratuita nos concursos vestibulares de universidades federais e estaduais.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
03
ENTREVISTA
EMERSON KAPAZ
Para situar nossos leitores, quais são os
seus projetos atuais?
A minha vontade maior é continuar o
trabalho que venho fazendo na sociedade
civil organizada, que é o de fortalecimento
da concorrência leal no Brasil, por meio do
Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial
– Etco, ou seja, continuar nessa ONG, que
foi criada em janeiro de 2003, e fazer o trabalho institucional em defesa da concorrência. Um dos maiores problemas que o
Brasil enfrenta hoje é a concorrência
desleal, e o trabalho do Instituto vem
sendo muito importante para a retomada
do crescimento sustentado no Brasil.
Quais são os objetivos do Etco e como
se dá a sua participação na gestão
da entidade?
Fui convidado para ser presidente-executivo do Etco e nosso principal objetivo é o
combate à concorrência desleal, que abre
eixos em sonegação, contrabando e falsificação. Esses eixos nos levam a um trabalho
institucional voltado para a parceria com
governos estaduais, federais, com o legislativo e com o judiciário. Buscamos combater a concorrência desleal por meio do que
chamamos de desvios concorrenciais tributários, que são feitos para favorecer
empresas a ter preços menores ilegalmente.
Nosso principal
objetivo é o
combate à
concorrência desleal,
que abre eixos
em sonegação,
contrabando
e falsificação
Quais são as estratégias da direção
do Etco para ampliar e difundir o conceito de ética no País?
Num primeiro momento, é importante
marcar muito bem a posição do que é ética
concorrencial, ou seja, a disputa entre
empresas de um mesmo mercado de forma
ética, pagando seus tributos, suas contribuições. Num segundo momento está
sendo ampliado um conceito de discussão
da questão da ética em si, porque a ética
concorrencial implica também que as
empresas não cedam à tentação de achar
que é fácil ganhar a concorrência de uma
outra empresa, não pagando imposto ou
04
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
não registrando funcionários. Esse é o caminho fácil. O caminho difícil é mudar o
sistema tributário, é reduzir o número de
taxas, é trazer para a formalidade empresas
informais. O Instituto tem como parceiros
empresas brasileiras dos setores de combustíveis, cigarros, cervejas e refrigerantes.
Estamos abrindo a possibilidade de participação de empresas de outros segmentos,
e é a partir desse instante que o trabalho
começa a ganhar densidade.
Quais são as ações de destaque que o
Etco está desenvolvendo com resultados imediatos?
Nos setores de cervejas e refrigerantes, já
conseguimos uma mudança conceitual e de
prática importante, que é a implantação dos
medidores de vazão para controle fiscal. Em
2005, será iniciado o trabalho no setor de
cervejas; a partir daí, vamos tentar passar para
o setor de refrigerantes. No caso dos combustíveis, foi muito forte a diminuição de
liminares na distribuição do produto, que
eram dadas para as distribuidoras fantasmas,
ou laranjas, para não pagarem tributos. Em
um trabalho com os juízes, conseguimos
resolver isso e hoje não há mais nenhuma
liminar em Cide tramitando no judiciário.
Para o setor de cigarros, um efeito significativo foi a prisão de Roberto Eleutério, conhecido como Lobão. Ele já está, inclusive,
com sentença de prisão decretada. Além
disso, outros trabalhos têm sido feitos. O
mais importante deles é a criação do
Conselho de Combate à Pirataria e Defesa da
Propriedade Intelectual, que começa a vigorar em novembro. É um marco na virada do
combate à pirataria.
No quesito parceria, como as empresas/entidades podem interagir com o Etco?
As empresas em geral podem procurar o
Instituto, seja para uma orientação de como
fazer o seu trabalho, para uma aproximação
concreta ou por meio de entidades de classe.
Às vezes a empresa não quer se associar, mas
provoca uma discussão dentro da sua entidade de classe, e esse órgão nos procura. É
nesse momento que a empresa se aproxima
do Etco, inclusive para atuar no Conselho
Nacional de Combate à Ilegalidade.
Que outras informações sobre as
atividades do Etco o senhor poderia nos
relatar?
As pessoas que quiserem conhecer melhor
o Instituto podem acessar o nosso site,
que tem informações relevantes e que
são atualizadas diariamente. O endereço
eletrônico é www.etco.org.br.
Qual a importância do ensino tecnológico para o desenvolvimento da
economia do País?
Hoje a competição exige uma mão-deobra qualificada, e existem trabalhadores
que não conseguem atingir um nível de
graduação, ou precisam ter uma qualificação para poder estar atentos às demandas
de mercado. O ensino técnico sempre foi
colocado como uma das prioridades no
Estado de São Paulo, ou seja, preparar bem,
treinar, qualificar a mão-de-obra, principalmente por meio do ensino técnico. Hoje
as empresas precisam cada vez mais desse
tipo de qualificação, que é perfeita para as
demandas dessa competição no futuro.
Quais são as maiores dificuldades
que o Brasil enfrenta atualmente nos
cenários nacional e internacional?
No cenário nacional, é a nossa grande
dívida interna, que provoca uma permanente necessidade de superávits fiscais
altos. Em segundo lugar está a estrutura
tributária brasileira. Temos uma estrutura
de cobrança de tributos completamente
fora de sintonia com os outros países do
mundo. O Brasil carece também de um
planejamento estratégico de médio e longo
prazo. Precisaríamos ter um projeto
nacional construído com a sociedade civil
organizada. Ele iria definir a política industrial, tecnológica, científica e de financiamento. Isso começaria a embasar a retomada sustentada do desenvolvimento. Outro
problema é a distribuição de renda. Nosso
maior drama é ver a chaga social do Brasil,
essa dificuldade de crescer e distribuir
renda ao mesmo tempo e, mais importante
ainda, distribuir renda para poder crescer e
incorporar milhões de pessoas que não
recebem o suficiente para se alimentar.
Na sua opinião, a reeleição de
George W. Bush trará que tipo de conseqüências para a economia brasileira?
Em um primeiro momento, nenhuma
conseqüência mais trágica ou complicada.
Talvez a médio prazo possa provocar danos
ao País, caso ele continue com essa visão
intervencionista e militarista em algumas
nações. Isso pode provocar uma crise internacional, e a conseqüência para o Brasil
poderá ser muito séria, pois dependemos do
fluxo de capital estrangeiro.
O que o senhor acha das PPP Parcerias Públicas Privadas? Qual é o
benefício que podem trazer para a área
de infra-estrutura do País?
O projeto das PPPs pode significar um
avanço de investimentos em infra-estrutura
no Brasil. As PPPs seriam muito eficientes,
desde que aprovadas de forma a não favorecer
determinados grupos ou gerar possibilidades
de aumentar a corrupção dentro do governo.
Como conciliar o desenvolvimento
industrial com a preservação ambiental?
Não dá para imaginar que é possível
crescer sem preservar o meio ambiente,
pois, caso contrário, o País não está crescendo, está prejudicando gerações futuras e
destruindo a sua capacidade de crescimento. Não consigo conceber um modelo de
desenvolvimento que não tenha como précondição a preservação ambiental.
Que projeções o senhor faria para
a economia brasileira nesse terceiro
milênio?
O Brasil tem tudo para ser um país que
ocupe um espaço no cenário internacional à
altura do que merece. Temos matériasprimas, não temos problemas de raça, nem
de religião, divisas internas, brigas regionais. Temos uma população ávida por
consumir. O que nos falta é criar
condições para esse desenvolvimento,
principalmente na questão da distribuição de renda, e de um planejamento estratégico. Quando o Brasil
desatar esses nós, teremos um crescimento vigoroso.
Na área de processos e projetos,
qual o atual estágio da indústria
nacional?
A indústria nacional tem avançado muito.
Tem conseguido investir estrategicamente e
se adequar rapidamente às mudanças
socioambientais que o Brasil provoca.
Foram dezenas de planos econômicos,
mudanças de moeda, juros altos, tributos
altos, e a empresa brasileira sobrevive porque
consegue ter um planejamento estratégico
para isso, consegue se adequar rapidamente,
tem uma velocidade de adaptação muito
grande. Isso transforma o empresário brasileiro
em um dos mais criativos do mundo.
Como o senhor vê o desenvolvimento
dos programas de responsabilidade
social no Brasil?
Vejo muito bem. É uma área que está
crescendo e ocupando a cabeça dos empresários, aumentando a percepção das
empresas de que responsabilidade social é
condição prioritária para ser bem-aceita pelo
consumidor. Hoje responsabilidade social
empresarial é uma das pré-condições para
uma empresa crescer de forma vigorosa.
Qual é o modelo de balanço social
ideal para as organizações brasileiras?
Não existe um modelo pronto. Não
temos ainda um formato. Isso foi discutido
no Congresso, e fui inclusive relator do projeto inicial sobre balanço social. Fizemos
uma grande discussão e achamos que não
havia ainda um modelo, porque balanço
social poderia ser algo obrigatório, mas não
daria certo. O importante é a empresa se convencer de que essa prestação de contas faz bem
a ela e à sociedade. A partir daí, começa-se a
definir parâmetros, paradigmas. Existem
alguns conceitos de apresentações, mas cada
empresa faz como achar melhor.
ENTREVISTA
EMERSON KAPAZ
Não dá para imaginar uma empresa que
tenha bons produtos sem um bom marketing.
E a comunicação deve ser integrada. Não
deve ser feita só para fora da empresa, como
para dentro também, com os seus funcionários, com o que acontece dentro da
empresa no seu dia-a-dia.
Qual é a sua análise das universidades públicas do País? Como demoQual a importância dos projetos de
cratizar o acesso de pessoas carentes
valorização profissional para o futuro
em seus cursos superiores?
das empresas?
Temos o melhor exemplo do que é uma
A empresa que quiser estar bem no futuro
boa universidade pública, apesar das difiprecisa entender que o capital humano é mais
culdades. A USP, a Unicamp e a Unesp são
importante que o capital fixo. Valorização
universidades exemplares do ponto de vista
profissional é o conceito mais relevante e
de autonomia, do repasse que o governo
importante, pois pode-se ter as máquinas mais
vem fazendo constantemente a elas. Essa
avançadas, mas se não houver gente preparada
autonomia universitária está servindo de
para operar, de nada adianta.
exemplo para a administração das universidades federais. O que falta é uma percepção melhor do que pode significar a
Acredito na
universidade pública e quanto temos
parceria estratégica
que direcionar a ela e ao ensino de
primeiro e segundo graus. É preciso ter
entre universidade
um ensino médio qualificado, de altíssie empresa, mas
mo nível, melhor do que o privado, para
existe um pouco
democratizar o acesso às universidades
de preconceito
públicas, que são de muita boa qualidos dois lados
dade no Brasil.
Na área de gestão de pessoas, o que
o senhor acha da adoção pelas empresas de Universidades Corporativas?
É uma alternativa. Não sei se o investimento em recursos humanos pode chegar a
ponto da empresa adotar práticas de
Universidades Corporativas. O interessante
seria uma parceria de empresas com universidades para investimentos que possam ser
feitos na melhoria de cursos. Acredito também na parceria estratégica entre universidade e empresa, mas existe um pouco de preconceito dos dois lados, tanto do empresário,
que acha que a universidade sonha muito,
como da universidade, que acha que o empresário tem uma visão econômica pragmática demais. Essa aproximação seria fundamental e pode ser valorizada no Brasil.
Como o marketing e a comunicação
social podem melhorar o desempenho
e a rentabilidade das organizações empresariais?
São instrumentos poderosíssimos de
desempenho profissional empresarial. O
marketing é uma alavanca de conhecimentos da empresa, dos produtos que ela faz.
Como as instituições privadas
de ensino poderiam atuar em caráter
filantrópico para permitir o acesso de pessoas carentes em seus cursos superiores?
Dedicando uma parcela das vagas a pessoas que têm um nível baixo de renda comprovado. Seria uma possibilidade, mas é
uma discussão que precisa ser aprofundada.
E voltando à questão anterior, deve-se ter
um adequado nível de preparação desses
alunos no ensino médio.
Como a tecnologia pode ser usada
para melhorar a qualidade de vida dos
brasileiros?
A tecnologia é um instrumento poderosíssimo de melhoria de qualidade de vida,
desde que tenhamos em mente que ela é
um instrumento, e não um fim em si mesmo.
A tecnologia tem de estar a serviço da
qualidade de vida e do ser humano.
Por LSNogueira
[email protected]
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
05
ÍNDICE
NOSSA CAPA
Obra do artista plástico Enio Squeff
“Vésperas Paulistanas”, 2002
óleo, aquarela e carvão sobre tela,
100 x 70 cm
Publicação da FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
ANO I - NÚMERO 1 - DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
02
03
07
ENTREVISTA EMERSON KAPAZ
O TEMPO NÃO APENAS NÃO PÁRA: ACELERA
EDUCAÇÃO SETORIAL E COMPETITIVIDADE NO BRASIL
MARISA EBOLI
10
OS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA,
O PROFISSIONAL TECNÓLOGO E SUAS DINÂMICAS
DIRCEU D’ALKMIN TELLES
15
ARGUMENTO OU INSTRUMENTO?
MARCUS VINICIUS SINVAL
16
A NOVA EDUCAÇÃO E O PAPEL DAS EMPRESAS
RICARDO YOUNG
18
MERCADO DE TRABALHO: EMPREGO E DESEMPREGO
NO FIM DO SÉCULO XX
FRANCISCO SCARFONI FILHO E JACYRA C. MONTANARI
25
RECARGA ARTIFICIAL DE AQÜÍFEROS
IVANILDO HESPANHOL
30
TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO FAZ DIFERENÇA, SIM!
LUIZ CARLOS MORAES REGO
32
O DESAFIO DAS ÁGUAS
ANGELO ALBIERO FILHO
34
ARTE E CIÊNCIA NÃO SÃO INCOMPATÍVEIS,
MAS A MÍDIA SE IMPORTA COM ISSO?
ENIO SQUEFF
36
AGENDA
ALTEC 2005 - XI SEMINARIO DE GESTIÓN TECNOLÓGICA
37
LEITURA RECOMENDADA
LANÇAMENTO DE LIVRO SOBRE AS RECENTES
TRANSFORMAÇÕES NA EDUCAÇÃO
38
INOVAR É PRECISO, IMPROVISAR NÃO É PRECISO
GUILHERME ARY PLONSKI
06
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
ACELERA
Por CLAUDIO FELISONI DE ANGELO [FEA-USP]
EDITORIAL CÉSAR SILVA, diretor-presidente da FAT
CLAUDIO FELISONI DE ANGELO
08
O TEMPO NÃO APENAS NÃO PÁRA:
Em 1347 a Europa foi vitimada pela peste
bubônica. Em apenas um ano sucumbiram,
vítimas da doença, nada menos que dois terços
da população européia. Os marinheiros vindos
da Ásia contraíram a doença e a propagaram rapidamente em razão das péssimas
condições de higiene do fim da Idade Média
e à enorme concentração de pessoas existente
nas cidades do velho continente.
Trata-se, sem dúvida, de um episódio
dramático e único na história. Depois de
causar um número de mortes sem precedentes, a doença praticamente desapareceu:
repentinamente, do mesmo modo que havia
surgido. Ela voltaria a atacar, mas não mais
com a mesma força letal.
Este fato incrível nos deixa ainda hoje estupefatos. Imaginem as reações das pessoas no
século XIV. Muitas hipóteses foram levantadas. Os sábios franceses acreditavam que a
doença era provocada pelos terremotos que
estavam abalando territórios no Extremo
Oriente. Outros atribuíam a causas ainda
mais vagas, para não falar daqueles que julgavam tratar-se de uma punição divina.
Deixa-nos também perplexos o tempo
decorrido para que se descobrisse o mecanismo de transmissão da doença: nada menos
que 500 anos! Somente em meados do século XIX é que se conseguiu enfim saber
exatamente o que havia de fato ocorrido
naquele fatídico ano de 1347.
Essas considerações suscitam um paralelo.
Infelizmente a Aids ainda mata. Entretanto,
diferentemente do que ocorreu com a peste
bubônica, ao surgirem os primeiros casos
descritos com a mesma sintomatologia, no
fim da década de 1970, foram necessários
apenas cinco anos para que o vírus fosse perfeitamente identificado.
A exemplo desses dois fatos no campo da
medicina, seria possível listar muitas outras
situações igualmente emblemáticas. Tais
diferenças devem ser entendidas obviamente
como resultantes diretas do desenvolvimento científico, particularmente o ocorrido nos
dois últimos séculos.
Tal expansão se explica, em boa parte, pela
velocidade das comunicações. Ciência, e,
conseqüentemente, desenvolvimento tecnológico, requerem geração e compartilhamento contínuo de informações.
Gradativamente, graças ao progresso técnico,
da simples estrada até a sofisticada comunicação eletrônica, vem se construindo, ao longo
dos anos, a aldeia global em que vivemos.
Esse desenvolvimento tecnológico que
nos torna vizinhos globais evidentemente
produz extensos efeitos políticos e econômicos. Em termos políticos, um exemplo por
certo ilustraria essas mudanças. A guerra do
Iraque poderia se manter pelo mesmo tempo
que se estendeu a do Vietnã? Muito
provavelmente não. Qual o presidente americano que suportaria a pressão dos seus
eleitores vendo (on-line) seus filhos sendo
mortos nos campos de batalha de um país
longínquo?
Na área econômica, diversas são as
dimensões do impacto do desenvolvimento
científico e tecnológico. Fiquemos apenas
com uma: a tendência à padronização. As
comunicações mais rápidas têm aproximado padrões de comportamento de consumo
entre diferentes culturas. O desenvolvimento tecnológico tem imposto, por
exemplo, uma forma particular de desenho
dos automóveis. Por questões de aerodinâmica, todos os veículos têm assumido
uma forma de cunha. Os aparelhos de TV,
por sua vez, não apenas se assemelham, são
praticamente iguais. Isso não ocorre apenas
no caso de produtos
– os serviços seguem
a mesma trajetória.
Se trocarmos as
placas de identificação de um supermercado pelo de seu
concorrente, seria
difícil que um consumidor percebesse
significativas diferenças operacionais
que revelariam tal
mudança. O mesmo
ocorre com muitos
outros serviços.
A conseqüência desse fenômeno é uma
dificuldade crescente das empresas em promover a diferenciação, tendo como resultante uma intensificação da competição. A
sobrevivência torna-se muito mais complicada. Neste cenário, onde tudo se transforma velozmente, a pré-condição para seguir
adiante é buscar ampliar a dotação do recurso produtivo mais valioso: a informação. É
preciso, não há dúvida, investir em equipamentos, instalações e sistemas. Entretanto, o
mais importante é o capital humano. O
capital humano é o resultado dos investimentos em educação. O posicionamento
competitivo depende de forma crescente da
capacidade das pessoas em levantar, selecionar e analisar informações. A perenidade
jamais foi um atributo inquestionável do
mundo dos negócios: as organizações também desaparecem. No passado remoto, as
leis de mercado operavam em outro ritmo:
de 500 em 500 anos. Hoje, por certo, um
qüinqüênio representa uma eternidade.
CLAUDIO FELISONI DE ANGELO
[email protected]
Prof. Titular da FEA-USP.
Coordenador Geral do Provar - Programa
de Administração de Varejo Fundação
Instituto de Administração.
Lição de Anatomia do Dr. Nicolaes Tulp, 1632
Rembrandt van Rijn,1632-1696
Óleo sobre tela, 169.5 x 216.5 cm
The Hague, Mauritshuis
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
07
O desenvolvimento econômico e empresarial de um país há muito deixou de se basear
na produção e exportação de produtos primários e intermediários, de baixo valor agregado, para se apoiar, cada vez mais, na capacidade de as empresas desenvolverem soluções
originais. Este novo cenário envolve a geração e sustentação de instituições, empresas e
indivíduos, capazes de transformar o conhecimento existente em negócios e, conseqüentemente, em crescimento econômico e social.
EDUCAÇÃO SETORIAL
E COMPETITIVIDADE
NO BRASIL
Por MARISA EBOLI [FEA-USP]
Essa transformação renovou e deu mais
qualidade ao debate sobre a necessidade de o
Brasil adotar ou não uma política industrial.
Uma das propostas mais inovadoras e ao
mesmo tempo polêmicas foi a de que a melhor
política industrial que o país pode adotar é
investir os parcos recursos públicos em educação, em vez de subsidiar setores industriais.
No Brasil, presenciamos um movimento,
talvez sem precedentes na nossa história, no
sentido de qualificar os trabalhadores para elevar o patamar de competitividade do país.
No intuito de criar uma alternativa de alta
qualidade, elevada flexibilidade, focada nas
necessidades dos diversos setores produtivos e
de custo acessível aos interessados, surgiu a
idéia de desenvolver projetos de educação setorial, dos quais participam, em consórcio,
empresas, universidades e outras entidades de
ensino. Essa visão completa-se com um trabalho de educação continuada que possa, inclusive, contemplar a presença de competidores
em um mesmo processo de capacitação.
Tais projetos fundamentam-se no conceito
ampliado de Educação Corporativa ou
Universidade Corporativa (UC), para atender a
diversas empresas de um mesmo setor produtivo, o que lhes confere uma condição de
Universidade Setorial. Valem basicamente os
mesmos conceitos aplicados às UCs, só que o
foco não é uma empresa e sim um conjunto de
empresas. Essas iniciativas têm se revelado
uma peculiaridade e uma forte tendência da
realidade brasileira em termos de UCs.
Uma vez que formar continuamente um
empregado é uma tarefa complexa, audaciosa e
onerosa, é normal que as micro e pequenas
empresas (MPEs) tenham mais restrições e
dificuldades para conceber e implantar projetos eficazes de educação permanente. No
entanto, não se pode desconsiderar o forte
impacto das MPEs na economia brasileira.
Segundo Silvano Gianni, diretor-presidente do
Sebrae, aproximadamente 65% da PEA
(População Economicamente Ativa) está nas
micro e pequenas empresas.
Para equacionar esse problema, tem-se
observado um movimento crescente no Brasil
de experiências bem-sucedidas de projetos de
educação para setores de atividades específicos,
ou para determinadas categorias profissionais.
Devido à sua escala, as Universidades Setoriais
podem viabilizar propostas de educação continuada hoje praticamente inacessíveis para
muitas empresas desse porte.
São associações, sindicatos ou organizações
não-governamentais que estão realizando
profícuas e revitalizadoras parcerias, muitas
vezes envolvendo algumas universidades,
institutos técnicos ou de ensino superior. O
objetivo é formar profissionais com o perfil de
competências exigido pelo setor, e também
promover a Gestão do Conhecimento Setorial
mediante a realização de pesquisas e prestação
de serviços.
Essas novas parcerias estão ativamente
envolvidas em garantir que as necessidades de
capacitação da força de trabalho sejam atendidas, por meio da criação de programas conjuntos de educação, e desenvolvam-se assim as
competências necessárias para o sucesso numa
determinada indústria ou setor produtivo.
Algumas experiências no Brasil são:
Educação Corporativa do Senac-SP; Rede
Estratégica das UCs, criada pela Confederação
Nacional das Indústrias; UniSesi Universidade Virtual do Sesi; Universidade
Abrange, da Associação Brasileira de Medicina
em Grupo; Universidade Corporativa da
Indústria da Paraíba – Ucip; Universidade de
Alimentos – UAL; Universidade Secovi, do
Sindicato das Empresas de Compra, Venda,
Locação e Administração de Imóveis
Residenciais e Comerciais de São Paulo
e Usen - Universidade Sebrae de Negócio,
em Porto Alegre.
Resumidamente, podemos dizer que essas
experiências têm como objetivos comuns:
• Desenvolver competências críticas para
aumentar o padrão de desempenho do setor
de atividade.
• Tornar-se um pólo de irradiação de
conhecimentos e formação de profissionais
para o setor.
• Propagar crenças e valores do setor de
atividade (cultura setorial) e do seu ambiente dos negócios.
• Formar categorias de profissionais competentes para gerar o sucesso do setor e das
empresas componentes de toda a sua cadeia
produtiva.
• Aumentar o valor de mercado das categorias profissionais envolvidas.
Desenvolver uma estrutura de rede de edu-
cação, por meio de uma associação ou sindicato empresarial de um determinado setor produtivo, voltada a disponibilizar conhecimentos de interesse das empresas congregadas,
com certeza ajuda a promover a capacitação e
o aperfeiçoamento de suas categorias profissionais.
Essas redes de educação, de modo geral, se
inserem no contexto da ação principal da entidade, fornecendo meios para apoiar os esforços
de melhoria da competitividade das empresas
associadas e de seus respectivos setores produtivos.
Nesse sentido, pode-se dizer que esses
sistemas de Educação Empresarial geram
um impacto positivo na competitividade
das empresas, dos setores produtivos e, conseqüentemente, do país.
Penso que estas reflexões iniciais, além de
constituírem uma contribuição importante
para o entendimento sobre os desafios e
perspectivas que se colocam para a capacitação empresarial, também interessam a todos
que lutam por um sistema nacional de educação de qualidade. Exige-se, no entanto, que
todos os atores sociais envolvidos participem
desse processo e que se integrem os esforços
nas esferas pública e privada para a formulação
de políticas e práticas educacionais integradas,
eficazes e competitivas.
MARISA EBOLI
[email protected]
Doutora em Administração pela Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo
(FEA-USP), onde ministra a disciplina Educação Corporativa:
Da Prática à Teoria nos cursos de pós-graduação (mestrado
e doutorado). Autora do livro Educação Corporativa no Brasil:
Mitos e Verdades, publicado pela Editora Gente em 2004.
Atua como palestrante e consultora de empresas.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
09
Pesquisas realizadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais (Inep), vinculado ao MEC, apontaram o crescimento
de 74,7% dos CST - Cursos Superiores de Tecnologia (conhecidos
como cursos profissionalizantes de nível superior ou cursos de
Educação Profissional Tecnológica). No período de 2000 a 2002, esse
crescimento superou a expansão dos cursos convencionais de
graduação, que registrou um aumento de 36%. Os cursos superiores de
tecnologia passaram de 364 (2000) para 636 (2002) no País. Nesse
contexto, as instituições particulares de ensino superior responderam por 66% desses novos cursos.
Dados parciais de 2004, fornecidos pela Secretaria de Educação
Profissional e Tecnológica (SETEC), do Ministério da Educação, confirmam a continuidade desse crescimento, como mostra o Quadro 1.
ANO
Novos CST Autorizados (*)
2001
2002
2003
2004 (Parcial)
43
106
113
102
Quadro 1 – Expansão
dos cursos superiores
de tecnologia
autorizados pela SETEC
Fonte: MEC (*) Não incluídos os
cursos mantidos por universidades
estaduais e particulares.
A LDB (Lei 9.394, de 20.12.1996), legislação complementar,
pareceres e as novas tendências nacionais para a educação estão
provocando uma incontrolável agitação nas organizações dos cursos superiores de tecnologia e na profissão de tecnólogo.
OS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA,
O PROFISSIONAL TECNÓLOGO
com predominância de uma delas. Esse tipo de curso é autorizado
pelo Ministério da Educação (MEC) e, assim como os bacharelados
e licenciaturas, confere diplomas de graduação, possibilitando a
continuidade dos estudos em pós-graduação (lato e stricto sensu).
Atualmente são classificados em 20 áreas profissionais definidas
na legislação: Agropecuária, Artes, Comércio, Comunicação,
Construção Civil, Design, Geomática, Gestão, Imagem Pessoal,
Indústria, Informática, Lazer e Desenvolvimento Social, Meio
Ambiente, Mineração, Química, Recursos Pesqueiros, Saúde,
Telecomunicações, Turismo e Hospitalidade e Transportes. Esses
cursos atendem sempre às necessidades específicas das empresas e,
por isso, vêm conquistando cada vez mais espaço no mercado.
Os atuais cursos superiores de tecnologia se distribuem na rede
pública federal pelos CEFETs – Centros Federais de Educação
Tecnológica, ligada diretamente ao MEC, na rede pública do
Estado de São Paulo, na qual as FATECs - Faculdades de
Tecnologia são mantidas pelo CEETEPS – Centro Estadual de
Educação Tecnológica Paula Souza, e pela extensa rede privada
que atravessa uma fase de grande expansão.
A Figura 1 ilustra a comparação entre os cursos superiores de
tecnologia e os de engenharia, envolvendo disciplinas e níveis.
CURSOS DE ENGENHARIA
CURSOS DE TECNOLOGIA
NÍVEIS
E SUAS DINÂMICAS
NÍVEIS
ESPECÍFICO
E
PRÁTICO
Por DIRCEU D’ALKMIN TELLES [FATEC - SP]
PROFISSIONAIS
BÁSICO INCLUSIVE
HUMANÍSTICO
1. Os cursos superiores de tecnologia
O engenheiro de telecomunicações
Mauro Sebastiany, gerente de projetos
na Tellabs do Brasil.
(São Paulo, SP, 22/04/2002.
Foto: Fernando Santos/ Folha Imagem)
10
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
A formação dita tecnológica não é inovação brasileira; muito
pelo contrário, a criação dos cursos superiores de tecnologia
baseou-se nos cursos similares consagrados na Alemanha e em
outros exemplos internacionais, como os College of Advanced
Technology, da Inglaterra, os Junior College, dos Estados Unidos,
os Institutes Universitaires de Technology, da França e os Tanki
Daigaku, do Japão. Há notícias de que cursos tecnológicos se iniciaram no Brasil no princípio do século XX.
Conceitualmente, os cursos superiores em tecnologia são cursos
de graduação concebidos e desenvolvidos para atender aos segmentos atuais e emergentes das diversas atividades produtivas
(industrial, construção e de serviços), tendo em vista a constante
evolução tecnológica, e com elas compromissados. Devem ter currículos flexíveis, compostos por disciplinas básicas e humanísticas, de apoio tecnológico e de formação específica voltados à aplicação prática, com aberturas para o desenvolvimento da pesquisa
aplicada. Conduzem ao diploma de Tecnólogo.
O ensino deve ser apoiado em projetos reais, estudo de casos e
em laboratórios/oficinas específicos aparelhados para reproduzir as
condições do ambiente profissional. Exige uma variedade de
docentes, desde os que se dediquem integralmente ao ensino,
como também os que se voltem às pesquisas e, preponderantemente, os especialistas.
Os CST são abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente, abrangendo os diversos setores da economia. Os graduados nesses cursos são profissionais de nível superior,
especializados em segmentos de uma ou mais áreas profissionais,
DISCIPLINAS
Figura 1 - Comparação entre os CST e o curso de engenharia com
referência a disciplinas e níveis.
2. O profissional tecnólogo
De acordo com o Conselho Nacional de Educação, o tecnólogo
deve estar apto a desenvolver, de forma plena e inovadora, atividades em uma determinada área profissional, devendo ter formação específica para a aplicação, o desenvolvimento, a pesquisa e
a inovação tecnológica, podendo atuar junto à gestão de processos
de produção de bens e serviços e ao desenvolvimento da capacidade empreendedora.
O tecnólogo pode atuar desde a criação até o domínio, a
absorção e a difusão dos conhecimentos, atingindo o pleno atendimento das necessidades estabelecidas. Trata-se de um profissional
capaz de oferecer soluções criativas e de participar de equipes
habilitadas na concepção e no desenvolvimento de soluções. A
interdisciplinaridade em sua formação e a polivalência em sua
atuação facilitam a inserção em equipes produtivas de trabalho. O
tecnólogo é o agente capaz de colocar a ciência e a tecnologia a
serviço da sociedade, no atendimento de suas necessidades; é um
profissional emergente no ambiente competitivo, apto a implantar e administrar sua própria empresa.
Nas circunstâncias atuais e projetadas, o tecnólogo é visto como
o profissional que busca sistematicamente ampliar seus conhecimentos, suas habilidades e suas aptidões, não só no âmbito
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
11
SEQUÊNCIAIS
GRADUAÇÃO
Fachada do prédio
da Fatec-SP
[Faculdade de Tecnologia].
EXTENSÃO
Outros Títulos
Licenciatura
Plena
Licenciatura
Curta
Tecnólogo
Bacharelado
(São Paulo, SP, 05/05/1998.
Foto: Cleo Velleda/ Folha Imagem)
Formação
Específica
Formação
Específica
PÓS-GRADUAÇÃO
Stricto Sensu
Complementação
de Estudos
Extensão
A rede de FATECs,
que até 2002 contava
9 (nove) unidades, foi
expandida pelo CEETEPS,
contando atualmente 17
(dezessete) unidades distribuídas pelo Estado de
São Paulo, como mostra
o Quadro 3.
Cursos sequenciais
de complementação
de Estudos
Latu Sensu
Certificados
Mestrado
Profissional
Mestrado
Doutorado
Especialização
Diplomas
Mestre
Mestre
Doutor
Figura 2 - Cursos,
diplomas e certificados
na educação superior.
Especialista
Fonte: Cadernos do MEC (adaptado).
tecnológico, como no humanístico (comunicações e relações
humanas), a fim de contribuir para o desenvolvimento holístico da
sociedade em harmonia com o ambiente. Para tanto, ciência e tecnologia constituem embasamentos que esse profissional utiliza
para a concepção e desenvolvimento de produtos, processos e
materiais, objetivando uma aplicação econômica e comprometida
com o bem-estar social e do ambiente.
A Figura 2 mostra o posicionamento do profissional tecnólogo
na educação superior em relação à graduação, à pós-graduação e ao
tipo de diplomação.
Conquistar o diploma de graduação em um tempo menor e
ainda ter mais chances de obter emprego são os principais atrativos para quem opta por um curso superior de tecnologia, ou
graduações profissionalizantes, como também são conhecidos.
Muitos afirmam que, por serem cursos mais direcionados e com
maior teor prático, a absorção de seus profissionais por parte das
empresas é muito grande.
O fato é que o número de cursos superiores profissionalizantes
vem crescendo cada vez mais e estes começam a ganhar cada vez
mais adeptos.
O CEETEPS, por meio do seu sistema de Acompanhamento
Institucional de Egressos, verificava a empregabilidade de seus tecnólogos um ano após a graduação. No Quadro 2 verifica-se que, ao longo
do período pesquisado, de 2000 a 2002, o número de trabalhadores,
entre os egressos, aumenta após um ano de formatura, contrariando
os demais índices em acentuada queda, no período em que o País
registrou momentos difíceis no seu contexto econômico.
Ano de
Pesquisa
Ano de
Formatura
2000
2001
2002
1999
2000
2001
% sobre o
Número
Número de
Pesquisado Concluintes
254
210
216
43.8
29,9
35,1
Estavam trabalhando
Cadastro
1 ano depois
81%
82%
85%
87%
87%
88%
Quadro 2 – Resultados das pesquisas de egressos de cursos superiores
de graduação em tecnologia do CEETEPS
Fonte: SAIE/ CEETEPS.
12
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
Estudantes de informática durante aula na Fatec de Mauá (SP).
(Mauá, SP, 15/04/2004. Foto: Lalo de Almeida/ Folha Imagem)
Faculdades de Tecnologia de
São Paulo
Sorocaba
Jaú
Baixada Santista
Zona Leste
Americana
Taquaritinga
Botucatu
Guaratinguetá
Indaiatuba
Mauá
Jundiaí
Praia Grande
Garça
Mococa
São José do Rio Preto
Ourinhos (*)
Número de
cursos
10
4
4
3
2
2
2
2
1
1
1
1
1
1
1
1
Número de
vagas por
semestre
880
240
160
200
120
120
160
80
40
40
80
80
80
80
80
80
200
(*) A FATEC-Ourinhos oferece 200 vagas anuais garantidas para cursar apenas os 2 (dois) primeiros semestres.
Quadro 3 - Faculdades de tecnologia do sistema CEETEPS, número de
cursos e vagas.
Está prevista para 2005, pelo Centro Paula Souza, a abertura de
3 (três) novas unidades, uma na zona sul da capital, outra em
Carapicuíba e outra em São Bernardo do Campo.
3. Os cursos de tecnologia do CEETEPS
Os cursos superiores de tecnologia ministrados nas FATECs do
Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, que atua
no Estado de São Paulo, têm uma carga horária média de 2.700
horas, com duração de 3 ou 4 anos. Com exceção dos cursos da
FATEC de Ourinhos, não são modulares e não fornecem certificações intermediárias.
As faculdades de tecnologia que o CEETEPS mantém têm
origem em 1968 por uma Resolução do Governo do Estado de São
Paulo, criando um grupo de trabalho com o objetivo de “estudar
a viabilidade de implantação gradativa de uma rede de cursos
superiores de tecnologia”. Foram criadas as FATECs de São Paulo
e de Sorocaba. A aula inaugural foi proferida em fevereiro de 1970
pelo governador do Estado.
4. Os CST, a LDB de 1996
e os Decretos 2208/1997 e 5154/2004
A Lei Federal nº 9.394, de 20/12/1996 (LDB) estabeleceu as
diretrizes e bases da educação no Brasil. Em seu Título V, define
os níveis e as modalidades de educação e ensino. Neste título, em
seu Capítulo I – Composição dos níveis escolares, determina:
“Artigo 21 – A educação escolar compõe-se de:
I – educação básica, formada pela educação infantil, ensino
fundamental e ensino médio.
II – educação superior.”
Aparentemente excluída da educação escolar, a educação profissional está enfocada no Artigo 39:
“A educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente
desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva.”
O parágrafo primeiro deste artigo estabelece: “o aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e superior, bem
como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a possibilidade de aptidões para a vida produtiva”.
Só em 17/04/1997, por meio do Decreto 2208, é regulamentada a educação profissional referida no Artigo 39 da LDB de 1996.
Esse decreto estabelece:
“Artigo 1º - A educação profissional tem por objetivos:
II – proporcionar a formação de profissionais aptos a
exercerem atividades específicas no trabalho, com escolaridades
correspondentes aos níveis médio, superior e de pós-graduação.”
Ainda o Decreto 2208, agora no seu Artigo 3º, define que a
educação profissional compreende os níveis básico e técnico.
Por outro lado, esse mesmo decreto, em seu Artigo 10,
esclarece:
“Os cursos de nível superior, correspondentes à educação profissional de nível tecnológico, deverão ser estruturados para desenvolver os diversos setores da economia, abrangendo áreas especializadas, e conferirão o diploma de Tecnólogo.” (grifo nosso)
O Decreto 5154, de 23/07/2004, que revoga o Decreto
2208/97, reforma a regulamentação do Artigo 39 da LDB
(Educação Profissional) e estabelece:
“Artigo 1º - A educação profissional, prevista no art. 39 da Lei
nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional), observadas as diretrizes curriculares
nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação, será
desenvolvida por meio de cursos e programas de:
I - formação inicial e continuada de trabalhadores;
II - educação profissional técnica de nível médio; e
III - educação profissional tecnológica de
graduação e de pós-graduação.
Artigo 5º - Os cursos de educação profissional tecnológica de
graduação e pós-graduação organizar-se-ão, no que concerne aos
objetivos, características e duração, de acordo com as diretrizes curriculares nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação.
Artigo 6º - Os cursos e programas de educação profissional técnica de nível médio e os cursos de educação profissional tecnológica de graduação, quando estruturados e organizados em etapas
com terminalidade, incluirão saídas intermediárias, que possibilitarão a obtenção de certificados de qualificação para o trabalho
após sua conclusão com aproveitamento.
§1º - Para fins do disposto no caput, considera-se etapa com
terminalidade a conclusão intermediária de cursos de educação
profissional técnica de nível médio ou de cursos de educação profissional tecnológica de graduação que caracterize uma qualificação
para o trabalho, claramente definida e com identidade própria.
§2º - As etapas com terminalidade deverão estar articuladas
entre si, compondo os itinerários formativos e os respectivos perfis profissionais de conclusão.
Artigo 7º - Os cursos de educação profissional técnica de nível
médio e os cursos de educação profissional tecnológica de graduação conduzem à diplomação após sua conclusão com aproveitamento.” (grifos nossos).
5. Novas concepções e aspectos legais
relativos aos CST
No início da década de 1990, principalmente após a LDB de
1996, novas concepções e aspectos legais surgiram no âmbito da
educação envolvendo os CST. O Quadro 4 resume os principais
destaques dessa desordenada situação que envolve profundos
interesses econômicos e sociais.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
13
CONCEPÇÕES E ASPECTOS LEGAIS
TEMA
ANTERIORES
NOVAS
Alvo
Ensino/Professor
(o que deve ser ensinado)
Aprendizagem/Alunos
(o que deve ser aprendido)
Foco
Conteúdo
Aprender
Avaliação do conhecimento
adquirido pelos alunos
Aprovação em disciplinas
Obtenção de competências (saber fazer)
Avaliação das instituições
Formalmente não existente
• Exames aplicados nos alunos
• Avaliação dos cursos
• Avaliação das condições
de oferecimento dos cursos
Currículo mínimo
Existente, para cada curso
Não-exigência
Carga horária mínima*
Exigência, não formal
• Não-exigência
• Limitações impostas pelos
conselhos profissionais
Diretrizes curriculares
Sem regulamentação
• Dec. 2208/97 (já revogado)
e complementos, regulamenta as diretrizes
curriculares dos CST - Dec. 5154/04 revoga
o Dec. 2208/97. A serem formalizados
Aceitação de créditos dos alunos
Obtidos em disciplinas equivalentes
de cursos superiores
De competências obtidas
inclusive na vida profissional
Certificações intermediárias
Não existentes
Permitidas
Número de CST
Leve crescimento
Explosão no número de novos cursos
Prazo mínimo para
conclusão do CST
Informalmente, 3 anos
Instituições oferecendo cursos superiores
de 2 anos, mas não deixam claro se são CST
e se conduzirão ao diploma de Tecnólogo
Quadro 4 - Dinâmica das concepções e dos aspectos legais dos CST
(*) Decisão do CONFEA – Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia datada de 30/04/2004
considera mantida a carga horária mínima de 2.400 horas para a formação de profissionais dos cursos de Tecnologia para fins de registros profissionais no sistema CONFEA/CREA.
No fim de 2004 estão em curso dois processos que também
interferirão nos CST e na profissão de Tecnólogo. São eles:
• Reforma Universitária;
• Elaboração de proposta de anteprojeto
da Lei de Educação Profissional e Tecnológica.
Além disso, está programada a implantação de novas instituições de ensino e de cursos de graduação de “menor” duração –
2 anos (1.600 horas) –, que podem ser confundidos com os Cursos
Superiores de Graduação em Tecnologia.
As preocupações emergentes com essa descontrolada dinâmica
são com a qualidade e reconhecimento dos CST e com a reputação
do profissional tecnólogo.
DIRCEU D’ALKMIN TELLES
[email protected]
Engenheiro civil, mestre e doutor
em Engenharia pela Escola Politécnica
da USP. Atualmente é professor
e diretor da Fatec-SP e professor
convidado da pós-graduação da Epusp.
FONTES CONSULTADAS
• Legislação pertinente
• Cadernos do MEC
• Sistema de Avaliação Institucional de Egressos - CEETEPS
• Portal Univérsia
• Catálogo da FATEC-SP
• Revista do Tecnólogo – SINTESP
• Cursos Superiores de Graduação em Tecnologia – CEETEPS
• Revista Ensino Superior – SEMESP
14
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
COLABORADORES
Assistente Técnica de Direção
Maria José Zecchinato Staicov - CEETEPS
Prof. Me. Décio Moreira - FATEC-SP/ SINTESP
Profa. Dra. Eliana Magrini Fochi
ARGUMENTO OU
INSTRUMENTO?
Por MARCUS VINICIUS SINVAL [SEBRAE]
Diz a teoria que marketing é pesquisar, conhecer, compreender e
atender às necessidades do consumidor. Seguindo esses passos, o profissional de marketing certamente terá êxito em suas empreitadas.
Pois é, como se fosse simples assim.
Só para variar, o grande desafio é conseguir colocar
em prática, no mundo real, a teoria que se estuda e
se aprende no mundo ideal. Nos livros, os modelos
são perfeitos e no dia-a-dia, nem tanto. Daí uma das
dificuldades em promover a tecnologia por meio da
comunicação.
Ora, se fiz minha lição de casa e pesquisei, conheci
e compreendi as necessidades do consumidor, teoricamente deveria estar apto a apresentar-lhe a tecnologia como solução de seus problemas ou atendimento às suas necessidades.
Acontece que o consumidor, aquele que vai assistir ao filme publicitário, que vai ver o outdoor e ler
a revista, esse consumidor é um ser humano, como
todos nós, programado geneticamente para fugir do
desconforto e buscar o prazer; que tem capacidade de
se adaptar, mas que também resiste natural e inconscientemente ao novo, ao desconhecido.
E que palavras podem ser mais sinônimos de tecnologia do que “novo”, “pioneiro”, “inédito”?
Além disso, normalmente a tecnologia, além de
representar o “novo”, vem acompanhada de vários
termos, também novos, para explicá-la. Neologismos
e tecnicismos que mais confundem a cabeça do
consumidor do que esclarecem as vantagens e
conveniências de sua aplicação.
E este é o ponto: a conveniência.
Aquilo que pode ser novo, novíssimo, mas que se
pode traduzir praticamente na vida do indivíduo por
termos, expressões e palavras, todos já bem conhecidos e de uso regular. Nada que se precise aprender,
mas que signifique uma nova situação, de maior
facilidade, de maior conforto, de maior conveniência.
Bom, mas aí voltamos ao convencional, ao popular; e aquela tecnologia, supernova, que custou anos
de pesquisas e tanto investimento para ser desenvolvida, nem apareceu, não pôde ser comunicada.
É assim mesmo, a tecnologia tem de aprender a
falar a língua do consumidor e os profissionais de
marketing e comunicação têm de aprender a língua
da tecnologia, não para ensiná-la ao consumidor, mas
para saber utilizá-la como ferramenta de comunicação, de relacionamento.
Na era da informação, é muito importante estar
em dia com as possibilidades que a tal tecnologia,
que não conseguimos comunicar, pode nos proporcionar.
Database, datawharehouse, datamining e uma
série de outros “data-alguma coisa”, por exemplo, são
algumas noções técnicas necessárias para que aconteça a comunicação com os verdadeiros conhecedores
e operadores da tecnologia que vai nos ajudar a identificar e localizar o consumidor, conhecer e entender
os seus hábitos e necessidades, a fim de que possamos
falar com ele, não esqueçam, sobre conveniência.
Existe um mundo não pequeno, mas menor do
que o do consumo no varejo, que é o mundo dos
negócios entre empresas, de técnicos para técnicos,
business to business, em que a tecnologia pode ser
comunicada pelas suas características técnicas.
Na maioria dos casos, porém, tecnologia funciona
muito mais e melhor como instrumento do que
como argumento.
MARCOS VINICIUS SINVAL
[email protected]
Gerente de Marketing do Sebrae-SP.
Administrador de empresas, especialista
em comércio exterior e em
desenvolvimento de pesquisas de mercado
nas áreas de planejamento e marketing.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
15
A NOVA EDUCAÇÃO
E O PAPEL DAS EMPRESAS
Por RICARDO YOUNG [INSTITUTO ETHOS]
Muito mais importante
que repassar conhecimento
é desenvolver no aluno
a capacidade de aprender
Texto originalmente publicado no livro Unesco Brasil
“Investimentos em Educação, Ciência e Tecnologia - o que
pensam os empresários”, lançado em junho de 2004.
Desde o início da revolução tecnológica,
vivemos uma ruptura de paradigmas em
vários setores, e o impacto dessas inovações
é especialmente sentido na área da educação. Até poucos anos atrás, o profissional
de educação era apenas um depositário do
conhecimento em determinada área. Sua
função era transmiti-lo ao aluno de forma
seqüencial e linear, em sessões com hora
marcada. Do aluno só se esperava uma atitude passiva e cordata, pelo menos até que
atingisse o nível universitário. Se havia
alguma reflexão coletiva, era em poucos
estabelecimentos cujas propostas de ensino
eram mais avançadas, ou em nível de
mestrado e doutorado, longe do dia-a-dia
das escolas.
Com a popularização da Internet, a partir
do início da década de 1990, o conhecimento
já não é mais um monopólio de poucos, e o
professor deixou de ser um guardião do saber.
Hoje é impossível alguém deter toda a informação, que pode ser encontrada em toda
parte, num fluxo que se constrói e se renova o
tempo todo. A rede mundial permitiu que o
conhecimento acumulado pelas instituições
fosse reunido num único meio, deixando-o à
disposição de todos os interessados. Permitiu
ainda que esse riquíssimo conteúdo passasse a
ser atualizado e renovado permanentemente, o
que conferiu à construção do conhecimento
uma nova dinâmica.
Essa mudança radical e veloz traz grandes
desafios tanto para os alunos quanto para as
instituições de ensino. O primeiro deles é que
o processo de aprendizado deixa de ocorrer
apenas num certo espaço de tempo ou num
determinado local, passando a ser contínuo,
ininterrupto. Essa nova dinâmica exige que
professores e alunos reajam mais prontamente,
respondam com maior rapidez.
Outro desafio que se apresenta é a adoção
1
O despertar do gigante. Editora Universidade, 2003.
16
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
2
de uma nova postura em relação ao ato de
ensinar. O professor se tornou ao mesmo
tempo aprendiz e consultor do processo de
construção do conhecimento. Na verdade,
O sociólogo italiano
todas as pessoas passaram a ser potencialDomenico de Masi,
mente aprendizes e consultoras desse
durante entrevista
processo. Assim, professor e aluno estão
em São Paulo (SP).
sendo desafiados a lidar com sua relação de
maneira diferente, já que ambos são agentes
Foto: Ormuzd Alves/
do conhecimento e essa condição exige
Folha Imagem
outro grau de interação. Essa nova postura
imprime uma qualidade diferenciada
no processo de aprendizagem, permitindo
apenas para o trabalho e o lucro. É preciso
outras formas de colaboração entre eduoferecer a formação total”. Para De Masi,
cador e educando, bem como uma maior
formação total significa “educar não apenas
sociabilização do aluno – caminho para a
para o trabalho, mas também para o estudo e
construção da cidadania.
para o ócio; para as satisfações e necessidades
Segundo o educador Claudio de Moura
mais essenciais do ser humano: o amor, a
Castro, da Rede Pitágoras de
amizade, a diversão, o conPara a nova educação que se
Belo Horizonte, “quanto mais
vívio, a solidariedade, a
propõe, muito mais importante
tempo ouvindo passivamente
beleza. Significa formar o
que repassar conhecimento é
a aula, menos se aprende”.
cidadão em toda a sua
desenvolver no aluno a capaciEm sua opinião, a particiamplitude de homem
dade de aprender. Isso redefine o
papel da escola, atribuindo-lhe
pação ativa do aluno é esseneconômico, estético, social
outros objetivos, entre os quais:
cial: “Educação requer ouvir,
e ético”2.
falar, ler, discutir, escrever,
Portanto, mais do que
• estimular e aprofundar as
habilidades cognitivas do aluno;
trocar idéias. Se não são prapassar conhecimento, a nova
• incentivar sua capacidade
ticadas todas essas atividaeducação forma indivíduos
de discernimento, de trabalhar
des, o ensino está aleijado,
que aprendem a aprender, a
com processos lógicos e
fica faltando o outro lado.
tornar-se ativos na busca da
sistêmicos que lhe permitam
correlacionar as informações
Portanto, não se pode espeinformação, utilizando coobtidas e distinguir o que
rar grandes resultados”1.
mo ferramentas básicas a
de fato é relevante;
Concordamos com o sofilosofia, a matemática e ou• encorajá-lo a buscar seus
ciólogo italiano Domenico
tras línguas, além de seu
valores e os da comunidade que
de Masi, autor de obras como
próprio idioma. A dimensão
o cerca, e a refletir sobre eles;
• desenvolver suas habilidades
O ócio criativo e A sociedade pósfilosófica conduz o aluno à
de comunicação.
industrial, para quem “a escola
lógica formal e ao desendeve estar sempre se atualizanvolvimento de valores, que é a base para a fordo e acompanhando as mudanças da
mação da cidadania; a matemática o capacita a
sociedade. Se o mundo precisa de pessoas criaoperar o pensamento abstrato aplicado na
tivas, a escola deve estimular esse lado. Não
prática; desenvolver a linguagem falada e
podemos mais continuar formando os jovens
escrita permite ao educando expressar suas
Entrevista à revista Nova Escola, da Fundação Victor Civita, em outubro de 2000.
conscientizar de que apenas contratar talentos
idéias com mais eficácia e entender melhor o
prontos no mercado não é a solução. Mais do
que ouve, enquanto o aprendizado de línguas
que isso, é preciso investir no aperfeiçoamento
estrangeiras o auxilia a lidar com outras
do público interno, com a criação de um
sociedades e outros valores, aproximando-o do
espaço para seu desenvolvimento contínuo,
mundo globalizado.
que pode ser tão simples como a qualificação
É uma educação para o desenvolvimento,
de um operário por seu sindicato, ou tão comque capacita as pessoas continuamente nesse
plexo quanto o desenvolvimento de uma uninovo conjunto de habilidades. O grande
versidade corporativa para complementar
desafio é criar condições para que o educando
a formação acadêmica dos profissionais da
se aproprie desse novo ferramental e desenvolempresa em sua área de
va sua criatividade, seu senso
Em resumo, uma agenda de eduatuação.
de observação, tornando-se
cação ideal para o nosso país teria
Para acumular e atualizar
uma pessoa mais produtiva e
de contemplar os seguintes pontos:
o conhecimento necessário ao
realizada. O novo educador é
• inclusão digital;
incremento de seu desemmenos responsável pela trans• desenvolvimento das
penho, a empresa pode agir
missão de conhecimento e
habilidades cognitivas;
de várias maneiras. A
mais pela instigação à investi• capacitação do aluno
aquisição sistemática de
gação filosófica e pelo monipara sociabilizar-se;
• diversidade cultural e
informação em instituições
toramento da maneira como o
universalidade, incluindo o ensino
especializadas e a emulação
aluno está usando o ferramende línguas estrangeiras;
da já mencionada universital colocado à sua disposição.
• reflexão filosófica - capacidade
dade corporativa são exemSeu papel é o de navegador do
para refletir sobre valores;
• formação da cidadania na
plos disso. Outra forma de
educando na aventura de busconcepção clássica, incluindo-se
garantir que o conhecimento
car o conhecimento em toda
a introjeção de valores como
contínuo se verifique é estaparte, inclusive na sala de
o processo coletivo, a construção
belecer uma nova interativiaula. Cabe também ao profescoletiva do conhecimento,
dade com os centros de
sor criar condições para que o
o intercâmbio e o diálogo,
o respeito à diversidade e a
pesquisa, tendo em vista um
aluno amplie seu relacionacompreensão da cidadania como
princípio lógico, mas muitas
mento, tanto no plano social
dimensão da própria educação.
vezes ignorado: a criação
como no virtual.
de conteúdo pela universidade é importante para as empresas tanto
quanto é importante para as instituições
A contribuição das empresas
acadêmicas a aplicação pela empresa do
Embora a educação seja por princípio uma
conteúdo que elas produzem.
atribuição do Estado, a participação da iniUm exemplo de sucesso de interatividade
ciativa privada é extremamente desejável.
de empresas com um centro de pesquisas é a
Como diz Moura Castro, “educação e escola
verdadeira revolução ocorrida no agribusiness
não são assuntos de governo, mas de todos”.
brasileiro nas últimas décadas, graças ao fabuPortanto, as empresas, um dos pólos mais
loso conhecimento gerado pelas várias
dinâmicos e inovadores da sociedade, podem
unidades da Empresa Brasileira de Pesquisa
e devem contribuir para o desenvolvimento
Agropecuária (Embrapa). Dentre as muitas
da educação em nosso país.
iniciativas de sucesso, destaca-se a inclusão do
Essa contribuição pode se dar de pelo
cerrado brasileiro no sistema de produção de
menos duas maneiras: 1) pela formação de
grãos. Quando a agroindústria passou a utiseus colaboradores, que concorrerão para a
lizar as tecnologias e os cultivares desenvolviconstrução do conhecimento de que a
dos pela Embrapa, as áreas que compõem o
empresa necessita; 2) pelo apoio a projetos
cerrado tornaram-se responsáveis por 41% da
que beneficiem a educação da comunidade
produção brasileira de soja, arroz, feijão e
em que a empresa se localiza.
milho. A soja, por exemplo, foi plenamente
Tornando-se co-responsável pela formação
adaptada às condições do País, que se tornou o
de seus funcionários, a empresa cria condições
segundo maior produtor do mundo (58 mipara que a construção do conhecimento
lhões de toneladas na safra 2003/2004) e é hoje
necessário ao seu desenvolvimento seja cono maior exportador mundial do produto (8,2
tínua. O empresário deve compreender que o
bilhões de dólares em 2003).
conhecimento, cujo processo é dinâmico e
infindável, deixou de ser um bem que se possa
comprar no mercado, pela contratação de pesApoio à comunidade local
soas talentosas ou pela aquisição de tecnologia.
A segunda maneira que mencionamos de
Na verdade, a evolução do conhecimento pascontribuir para o desenvolvimento da edusou a se dar de forma dialógica. Devemos nos
cação no País é a empresa agir na própria
comunidade de entorno, ajudando a promover
condições para que os centros de educação
locais cumpram seu papel de forma adequada.
Essa participação pode se dar por meio de
apoio a organizações não-governamentais que
atuem na área da educação. Um exemplo disso
é o apoio de empresas à atuação do Comitê
para a Democratização da Informática (CDI)
em favor da inclusão digital de populações
carentes em todo o País. A organização já
instalou cerca de 800 unidades de sua Escola
de Informática e Cidadania em 20 Estados
brasileiros e em dez outros países, com mais de
4,1 mil computadores instalados em toda a
rede, tendo formado mais de 501 mil alunos,
com o apoio de 1,7 mil educadores e cerca de
mil voluntários.
Outro bom exemplo são as empresas que
apóiam o projeto de aceleração de aprendizagem feito pelo Instituto Ayrton Senna
para o Estado de Pernambuco, em parceria
com a Secretaria Estadual de Educação.
A primeira etapa começou em maio de
2003 e engloba 48 municípios pernambucanos. Até 2009, o programa prevê alfabetizar anualmente 20 mil alunos com idade
entre 8 a 14 anos, bem como acelerar a
aprendizagem de outros 447 mil crianças e
adolescentes que acumulam reprovações,
reduzindo assim a distorção entre a idade
e a série que freqüentam.
A empresa pode também atuar diretamente
nos centros de educação da comunidade em que
está instalada, seja criando condições para que
esses centros tenham acesso efetivo a recursos,
seja treinando professores, por exemplo. Ou
estabelecendo parceria com uma escola pública
local, desde que essa parceria se dê na área de
atuação da empresa. É importante observar esse
aspecto, pois somente atuando em sua área de
competência a empresa pode agregar valor.
Se isso não for possível, é aconselhável não
agir diretamente, mas por meio de parceria
com uma ONG, como nos casos já citados.
Seja de que modo for, investir nessa nova
educação, reestruturada, participativa, estimulante, é preparar cidadãos que irão edificar
uma sociedade mais justa e eqüitativa para
todos os brasileiros.
RICARDO YOUNG
[email protected]
Empresário da área de educação,
presidente do Conselho Deliberativo
do Instituto Ethos e atualmente
presidente do UniEthos - Educação
para a Responsabilidade Social e o
Desenvolvimento Sustentável.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
17
MERCADO DE TRABALHO:
EMPREGO E DESEMPREGO
NO FIM DO SÉCULO XX
Por FRANCISCO SCARFONI FILHO E JACYRA C. MONTANARI [PUC-SP]
RESUMO: Após um período inusitado com baixos índices de desemprego, conquistas salariais e sociais que ampliaram seu poder de compra e lhe trouxeram maior segurança e bem-estar, o trabalhador se vê,
hoje, com a reestruturação produtiva, à mercê de um mercado de trabalho polarizado e diante de um sindicato desmobilizado, sem poder
de luta. O objetivo deste artigo é mostrar as mudanças ocorridas no
mercado de trabalho nos últimos 20 anos e as conseqüências da reestruturação produtiva sobre as relações de trabalho e sobre o dimensionamento do mercado de trabalho, com a redução do número de empregos formais que vem ocorrendo no Brasil.
1. Introdução
ABSTRACT: After an unusual period
of low unemployment rates, social
and salary advances that improved
the workers’ purchase power and
brought them more security and satisfaction, with the productive reorganization, the workers find themselves today, at the mercy of a polarized job market and a weak Union.
The subject of this article is to show
the changes that happened in the job
market in the last twenty years and
the effects of the productive reorganization on the job relationships and
the size of the job market, and the
consequent reduction of the formal
employment in Brazil.
PALAVRAS-CHAVE:
Reestruturação produtiva,
relações de trabalho, emprego
e desemprego.
KEYWORDS: productive reorganization, job relationships, employment
and unemployment.
18
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
A sociedade, de maneira geral, e o mercado de trabalho, em particular, vêm sendo afetados significativamente pela reestruturação produtiva (econômica,
tecnológica e organizacional) nas empresas com uso
intensivo de recursos informacionais e pelo processo
de globalização em andamento, que provoca, entre
outros efeitos, o rápido deslocamento de empresas
entre países e, nesses, entre regiões.
A velocidade dessas mudanças assusta e causa as
mais diversas reações nas pessoas, direta ou indiretamente atingidas por esse processo, podendo significar ameaça ou oportunidade no novo contexto.
De qualquer forma, o tipo de reação a essas transformações depende diretamente da capacidade de cada
um de se adaptar às condições exigidas pela nova
economia para a sobrevivência das empresas1.
É por meio do trabalho que produtos e serviços são
gerados para a satisfação das necessidades humanas,
proporcionando renda para a aquisição desses bens e
serviços, além de ser possível fonte de realização
profissional e satisfação pessoal, fatores que afetam a
auto-estima. No mundo capitalista, como se sabe, a
forma predominante de inserção no processo produ-
tivo e de prestação de serviços é o trabalho assalariado, isto é, o emprego.
Nas últimas décadas, a elevação das taxas de desemprego tem sido uma das questões globais mais candentes, pois todos os países do mundo, em escalas e
proporções diferentes, têm sido afetados. Esse problema não se vincula somente a aspectos econômicos e de
justiça social, mas seus reflexos também podem ser
sentidos nas esferas coletiva e individual dos trabalhadores.
O objetivo deste artigo é mostrar as mudanças ocorridas no mercado de trabalho nos últimos 20 anos e as
conseqüências da reestruturação produtiva sobre as
relações de trabalho e sobre o dimensionamento do
mercado de trabalho, com a redução do número de
empregos formais que vem ocorrendo no Brasil.
2. Breve histórico do mercado
de trabalho nos últimos 20 anos
O mercado de trabalho e a questão do emprego
têm sido fatores preocupantes, pois, do pós-guerra
até meados da década de 1970, houve um período de
empregos estáveis, bem remunerados e conquistas
Entendendo-se por nova economia aquela cujas características fundamentais são a intensificação do uso da informação e do conhecimento
pelos agentes econômicos para gerar produtividade e competitividade, impondo uma nova organização das atividades produtivas.
1
sociais estabelecidas. Hoje as tendências são
outras. Estudos recentes mostram um
aumento significativo do emprego precário,
do trabalho informal, queda generalizada
nos salários reais e crescimento das taxas de
desemprego.
O problema do aumento do desemprego
nos países desenvolvidos tem sido acompanhado por transformações tecnológicas
que ocorrem em larga escala e grande
velocidade, refletindo num rápido declínio
do emprego industrial, principalmente nos
países europeus com sólidas políticas de
bem-estar social.
O processo de reestruturação econômica,
fruto da combinação ou conjugação da
introdução de novas tecnologias e novas
técnicas organizacionais, conduz a uma
redução no emprego industrial em todos os
países. Porém, de acordo com Castells
(1999, p. 230), apesar da tendência geral, o
declínio do emprego industrial é irregular,
“indicando de maneira clara a variedade
fundamental das estruturas sociais de acordo com as diferenças políticas, econômicas
e das estratégias empresariais. Assim,
enquanto o Reino Unido, os Estados
Unidos e a Itália vivenciavam rápida desindustrialização (reduzindo a percentagem de
emprego industrial, em 1970-90, de
38,7% para 22,5%; de 25,9% para 17,5%;
de 27,3% para 21,8%, respectivamente), o
Japão e a Alemanha presenciavam uma
queda moderada da participação de sua
força de trabalho industrial: de 26,0% para
23,6% no caso do Japão e de 38,6% para
um nível ainda bastante alto de 32,2% em
1987, no caso da Alemanha”.
A taxa média anual de desemprego nos
países desenvolvidos aumentou de 5,1%
em 1974-79 para 7,4% em 1980-97. Essa
tendência vem acompanhada de um processo de desaceleração do crescimento
econômico e a característica marcante da
queda da importância do emprego industrial vem ocorrendo em favor do emprego
no setor de serviços, ao mesmo tempo em
que se confirma a tendência secular de
queda do emprego no setor agrícola.
A América Latina teve seu desenvolvimento prejudicado durante a década de
1980 pela crise da dívida e pela deterioração dos preços das commodities no mercado internacional, pois, até esse período,
20
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
os países latino-americanos, com exceção do
Brasil, dependiam fortemente dessas exportações. A queda dos preços dos produtos
primários se deve ao aumento da produtividade agrícola nos países desenvolvidos e à
transformação tecnológica que substituiu
matérias-primas tradicionais por produtos
sintéticos.
Porém, de acordo com Castells, os fatores
mais decisivos e os reais complicadores do
desenvolvimento da América Latina foram
o endividamento irresponsável ocorrido nos
anos 70 e as políticas monetárias nos anos
80 na tentativa de conter a crise. Esses fatos
comprometeram o desenvolvimento nas
últimas duas décadas, com sensíveis reflexos no mercado de trabalho.
Na América Latina, a incapacidade de
geração de empregos tem sido uma propensão clara e, diante do baixo dinamismo da
economia, do aumento da produtividade
devido às transformações tecnológicas, do
aumento da população e da liberação das
importações, o número de desempregados
vem se elevando, registrando taxas de dois
dígitos na Argentina (17,4%), no Uruguai
(11,7%), na Venezuela (11,4%) e na
Colômbia (10,2%) em 1995. No Brasil,
essa taxa era de 5,2% (GONÇALVES e
PELEGRINO, 1997,
p. 31).
Durante a década de
1970, o Brasil viveu
um período conhecido
como “milagre econômico”, com altas taxas
de crescimento da economia e, em conseqüência, aumento da
proporção de empregados em empresas privadas de 41,7% para
52,2%; de empregos
públicos de 7,3% para
8,8% e redução do
número de autônomos
de 33,8% para 25,2% e
a de não remunerados
de 9,3% para 5,3%.
Nesse período, o desenvolvimento era financiado pela abundância e
facilidade de acesso ao
crédito internacional,
levando o país a se
endividar de maneira
descontrolada.
Na década de 1980,
a história passou a ser
diferente. Os países
desenvolvidos estavam preocupados em
resolver seus problemas de inflação e suas
crises internas causadas pelos elevados custos das políticas de bem-estar social e pela
rigidez dos investimentos em capital fixo
do período fordista, iniciando a reestruturação do sistema financeiro internacional
para salvaguardar os seus interesses, principalmente nos países devedores.
Neste momento, o Brasil foi submetido a
um choque múltiplo e simultâneo provocado pela alta da taxa de juros internacionais,
pela recomposição do preço do petróleo, pela
deterioração das relações do comércio internacional com a queda dos preços das com-
Desempregados fazem fila na
regional de Santo Amaro, em
São Paulo, durante cadastramento
em busca de vaga para empregos
temporários. O desemprego deve
aumentar até o início de 2002
por causa da desaceleração
da economia, corte de vagas
e grande número de demissões.
(São Paulo, SP, 04/10/2001.
Foto: Moacyr Lopes/ Folha Imagem)
modities e, como conseqüência, o sistema
financeiro internacional se afastou, dificultando o acesso a novos créditos.
Ocorreu um processo de estagnação da
economia, já que as receitas obtidas tiveram
de ser utilizadas para cobrir as obrigações
financeiras advindas do processo de endividamento descontrolado da década de 1970.
O crescimento pouco expressivo da
economia compromete o processo de desenvolvimento do País e poucas mudanças
ocorrem até 1986, quando algumas alterações no mercado de trabalho são notadas:
a proporção de empregados em firmas particulares cai de 50,5% em 1986 para
48,8%, em 1990, aumenta a proporção de
empregados públicos, de 9,2% para 9,7%,
de não remunerados de 7,7% para 8,1% e
de empregadores de 3,5% para 4,7%
(SINGER, 1996, p. 3).
Esse aumento da proporção de empregadores e de não remunerados entre 1986 e
1990 sugere que houve alguma descentralização do capital, com a multiplicação de
pequenas firmas, nas quais trabalham o
empregador, empregados registrados e não
registrados. Esses empregadores podem ser
trabalhadores demitidos que, com os recursos da rescisão do contrato de trabalho,
montam um negócio próprio e empregam
parentes e amigos próximos.
Pode-se inferir que nos anos 80 houve
alguma alteração na dinâmica do mercado
de trabalho, com os primeiros sinais de
aumento do desemprego urbano e deterioração das condições de trabalho com o
aumento da informalidade, apesar dos
níveis relativamente baixos.
A grande alteração ocorreu na década de
1990, com o nível da atividade econômica
atingindo índices bastante baixos, afetando
diretamente o mercado de trabalho, cujo
processo de desestruturação, com a retração
das atividades econômicas e com a alteração
qualitativa das estruturas produtivas existentes, provocou uma acentuada redução na
capacidade de geração de empregos formais
e, por esses motivos, pela primeira vez na
história a economia nacional mostrou-se
incapaz de gerar postos de trabalho em termos absolutos.
De acordo com dados do IBGE, nas duas
últimas décadas a economia brasileira teve
os piores desempenhos do século, quando a
taxa média de crescimento econômico ficou
em 1,6% para os anos 80 e em 2,7% para
os anos 90. A correlação entre a falta de
dinamismo da economia e a elevação das
taxas de desemprego é direta. Estima-se
que durante os anos 90 cerca de 3,3 milhões
de empregos formais deixaram de existir na
economia, atingindo principalmente a
indústria de transformação em diversos segmentos, como o têxtil, o metalúrgico, o
mecânico, o químico e o farmacêutico, além
da indústria de construção civil e o setor de
serviços financeiros.
Há muito tempo as pesquisas de opinião
pública registram o desemprego como a
maior preocupação da população, afetando as
pessoas de maneiras diferentes. Entre 1989 e
1998, o desemprego cresceu relativamente
mais entre os homens de mais idade (40 anos
ou mais), cônjuges e para os de maior escolaridade. Ocorreu também alteração no
tempo de desemprego médio: de 15 semanas,
em 1989, para 36 semanas, em 1998,
atingindo 40 semanas no início de 1999.
O mercado de trabalho no Brasil tem sofrido os efeitos do processo de ajuste estrutural
da economia e o mais importante é o crescimento da taxa de desemprego, que chegou ao
nível de 8%, no fim de 1998, 7,6% no fim
de 1999 e 7,1% no fim de 2000, conforme
dados do IBGE. Por outro lado, o crescimento do desemprego tem convivido com
salários reais crescentes, o que pode significar
que quem conseguiu manter seu emprego
teve ganhos reais de renda nos últimos anos e
quem não o conseguiu teve de procurar alternativas fora do trabalho formal.
O panorama econômico mundial é pouco
alentador, pois a estagnação das três
maiores economias do planeta – Estados
Unidos, Europa e Japão – já arrasta quase
todos os países à recessão. A reestruturação
produtiva em andamento baseia-se na
racionalização de custos e na redução de
ineficiências, utilizando-se de tecnologias
poupadoras de mão-de-obra, cujos efeitos
na geração de desemprego não são compensados pelos investimentos feitos nas empresas da nova economia, alterando as relações
de trabalho e, em muitos casos, tornando-as
cada vez mais precárias.
3. As novas relações de trabalho
O final do século XX assiste a uma
mudança nas relações de trabalho devido,
sobretudo, à intensificação da competitividade entre as empresas. O sistema de produção fordista, cujos fundamentos são a
segmentação do trabalho, a desqualificação
da mão-de-obra e o controle excessivo sobre
o trabalhador, passa a ser questionado
quando o modelo japonês de produção
começa a ser conhecido por seus produtos
de qualidade e baixo custo. Tais aspectos
são conseqüência de uma mão-de-obra polivalente e de uma tecnologia de organização
A médica Teresa Sacchetta
é especialista em
informática médica
e trabalha como webmanager
do Laboratório Fleury.
(São Paulo, SP, 26/09/2001.
Foto: Juca Varella/ Folha Imagem)
até então desconhecida do Ocidente: Justin-Time (JIT), Círculo de Controle de
Qualidade (CCQ), Kaizen, Células de
Produção (CEP), etc.
A reestruturação produtiva (conjugação
da introdução de novas tecnologias e novas
técnicas gerenciais) pela qual os países industrializados tiveram de passar para poder ser
competitivos, tem provocado o surgimento
de novas e variadas relações de trabalho.
Tanto se pode registrar a preocupação de
empregadores em ter a sua mão-de-obra
altamente motivada por meio do enriquecimento do trabalho ou por meio de participação nos lucros, como também uma
relação de trabalho autoritária marcada pela
intensificação de seu uso, pelo controle
excessivo sobre o trabalhador e pela total
dissociação entre concepção e execução.
Os estudos feitos por Kern & Schumann
(1989) sobre os Controladores de Sistemas
nas indústrias alemãs automotivas e químicas mostra um grupo de trabalhadores de
produção altamente qualificado, motivado e
de difícil supervisão. Tais trabalhadores têm
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
21
suas atividades valorizadas, pois precisam
estar a par das mudanças. São os primeiros a
perceber as irregularidades na maquinaria e
a corrigi-las. Além disso, precisam ter competência social para desenvolver uma melhor
comunicação com engenheiros e técnicos. É
a polivalência que os transforma em ilhas no
mercado de trabalho alemão.
Junto a esses trabalhadores polivalentes
são encontrados aqueles sem qualificação,
que fazem parte de estruturas dualistas com
alta tecnologia/baixa tecnologia, como
linhas equipadas com robôs e pintura.
Em seus estudos sobre a reestruturação
produtiva no Brasil-França-Japão, Hirata
(1998, p. 9) mostra que a introdução da
microeletrônica no processo produtivo e
da tecnologia japonesa de organização
(JIT/TQC) não diminuiu o ritmo de trabalho e o sofrimento do trabalhador. Segundo
a autora, “ao contrário, a produção flexível
e seus estoques conduziu, segundo a
pesquisa sobre condições de trabalho (C.T.),
a uma maior intensificação do trabalho.
Entre 1984 e 1993, o percentual de
assalariados que declarou ter seu ritmo de
trabalho determinado pela demanda dos
clientes ou do público passou de 39% para
58%”.
No que se refere ao sofrimento no trabalho, além do provocado pela ameaça permanente de demissão, há, segundo Dessous e
Torrente (1996, apud DEJOURS, 1998, p.
28), “o sofrimento dos que temem não
satisfazer, não estar à altura das imposições
da organização do trabalho: imposições de
horário, de ritmo, de formação, de informação, de aprendizagem, de nível de
instrução e de diploma, de experiência, de
rapidez de aquisição de conhecimentos
teóricos e práticos e de adaptação à ‘cultura’
ou à ideologia da empresa, às exigências do
mercado, às relações com clientes, os particulares ou o público, etc.“
De um lado, a reestruturação produtiva
exige do trabalhador habilidades e competências tais como: autonomia, fidelidade,
responsabilidade, comunicação, flexibilidade, etc. e, do outro, traz a insegurança no
emprego e na renda (MATTOSO, 1994, p.
531-536), com a redução de empregos
estáveis e permanentes para empregos
temporários, de tempo parcial e muitas
vezes sem carteira assinada, como acontece no Brasil.
Segundo Mattoso (1994, p. 525), a instabilidade e a insegurança no trabalho e na
renda são resultado do que ele chama de
2
“modernização conservadora”, que passa a
considerar as políticas de proteção ao trabalhador, no que se refere às relações de
trabalho e à segurança do emprego, responsáveis pelo crescimento do desemprego,
reduzindo, dessa forma, os empregos
estáveis ou permanentes.
Quanto à renda, a “modernização conservadora” introduz a flexibilização do salário
em lugar da negociação coletiva entre
empresas e sindicatos. Essa flexibilização,
segundo Mattoso (1994) torna os rendimentos do trabalho instáveis e também
amplia a concentração da renda, acentuando a desigualdade social.
A terceirização, outro resultado da
reestruturação produtiva, surge para melhorar a eficiência empresarial e contribui
para a precarização das relações e das
condições de trabalho, visto que as empresas terceirizadas não têm as mesmas políticas de contratação, remuneração e recompensas da empresa núcleo.
Segundo Hirata (1997, p. 25), o trabalhador japonês “com carreira estável coexiste com o receio de passar do ‘núcleo’ para
a periferia precária dos subcontratados de
diferentes tipos com que conta a organização industrial japonesa para funcionar”.
Finalmente, a reestruturação produtiva
traz novas formas de controle sobre o trabalhador. Uma delas é a desmobilização dos
sindicatos por meio da adoção, por parte da
empresa, do papel sindical, impedindo, por
meio de sua política de pessoal, possíveis
conflitos coletivos.
Uma outra forma de controle e que também contribuiu para o enfraquecimento do
sindicato é a mudança da empresa para
regiões de pouca ou nenhuma experiência
fabril, com grande oferta de mão-de-obra e
alternativas escassas de emprego.
Isso faz com que haja menor rotatividade
de pessoal e nenhuma mobilização coletiva
no sentido de reivindicação salarial e outros
benefícios sociais. Além disso, permite à
empresa ter “liberdade para reformular as
relações de produção de acordo com os seus
interesses” (SINGER, 1996, p. 10).
Uma terceira forma de controle é a vigilância constante sobre o trabalhador efetuada pelo grupo de trabalho, pela supervisão e pelos clientes internos. Os sistemas
JIT e Total Quality Control (TQC) favorecem a evidência dos erros, pois não permitem estocar, nem esconder peças erradas.
Não há gargalos na produção com o sistema
JIT/TQC. O controle e a vigilância aumen-
tam mais quando é instituída a avaliação do
desempenho vinculada ao aumento salarial.
4. As novas relações
de trabalho no Brasil
A década de 1970 foi, para o Brasil, um
período de grande expansão das indústrias e
do emprego industrial (milagre econômico), devido à entrada de capital estrangeiro
em países do Terceiro Mundo em processo
de industrialização para atender aos mercados dos países industrializados (Estados
Unidos, Europa e Japão) com produtos
mais baratos, elaborados por uma mão-deobra menos qualificada e pior remunerada.
No que se refere à gestão da mão-deobra, esta se caracterizava por políticas
organizacionais que não a valorizavam. A
gestão de pessoal baseava-se no autoritarismo, com trabalho altamente fragmentado,
rotineiro e monótono, condições estas para
recrutar pessoal sem qualificação e incentivar sua alta rotatividade.
O fim dos anos 70 e início dos anos 80
são marcados por constantes greves dos trabalhadores e pelo fortalecimento dos sindicatos, que, até então, vinham tendo um
papel pouco atuante. Esse período coincide
com a implantação nas empresas dos
Círculos de Controle de Qualidade (CCQ),
que tiveram pouca duração. Isso porque as
empresas não modificaram suas formas de
organização do trabalho nos moldes do
modelo japonês, nem o seu modo de gerir
as pessoas, mantendo ainda um comportamento autoritário, impedindo muitas vezes
seus funcionários de participar das reuniões
ou boicotando as idéias apresentadas.
Os CCQs foram abandonados e substituídos, na segunda metade dos anos 80, por programas de Qualidade Total (Total Quality
Control), mas esbarrando ainda na resistência
dos empresários no sentido de modernizar
suas formas de organização do trabalho,
como, por exemplo, maior autonomia do trabalhador em relação às suas atividades, maior
participação nas decisões e a formação de
equipes de traba-lho. O trabalhador
brasileiro, em vez de ser polivalente, é um
“multitarefeiro”2, porque é um mero executor de tarefas em vez de ser multifuncional.
Expressão usada pelo prof. Ruy de Quadros Carvalho no curso “Educação, Trabalho e Progresso Técnico” – PUC/SP, 1997.
22
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
Com a abertura do mercado brasileiro a produtos estrangeiros similares aos nacionais e
com a crise econômica dos anos 90, que
restringiu o consumo interno, as empresas
brasileiras não viram outra saída a não ser se
modernizarem para poder competir.
É justamente no fim dos anos 80 e início
dos 90 que há, por parte das empresas, um
grande investimento na microeletrônica.
As máquinas de controle numérico (CNC)
tiveram um índice de crescimento de 42%
em relação aos investimentos, em 1988,
passando de 742 unidades para 1.052
unidades instaladas, em 1989. Os sistemas
CAD/CAM tiveram, em 1989, um índice
de crescimento de aproximadamente 280%
em relação a 1988, quando o número de
unidades instaladas passa de 700 para
2.650. (Sobracon: Retrospectiva da década
de 80 do setor de automatização industrial.
LEITE, M.P., 1994, p. 567).
Quanto à tecnologia de organização
japonesa (JIT/TQC), as empresas brasileiras
encontraram e encontram problemas em
sua implantação devido à baixa escolaridade
do trabalhador constatada por Humphrey
(1994) e Fleury (1995). A baixa qualidade
da educação brasileira, no que diz respeito
ao ensino fundamental, não condiz com as
necessidades das empresas hoje. O trabalhador precisa ser alfabetizado e conhecer
bem português e matemática para poder
trabalhar com dados estatísticos. Ler e
interpretar desenhos, tomar decisões sobre
o seu trabalho e ter autonomia. São poucos os
trabalhadores com essas qualificações. Daí a
corrida das empresas com programas de alfabetização e treinamentos técnicos nos anos 90,
apesar desses treinamentos serem em número
menor, se comparados com os treinamentos
comportamentais. Segundo Leite (1994, p.
577), “o treinamento destina-se a programas
comportamentais ou motivacionais, que se
caracterizam basicamente pela preocupação
em despertar nos trabalhadores uma postura
cooperativa com relação às estratégias gerenciais e que não podem ser confundidos com
treinamentos destinados a formar trabalhadores mais qualificados”.
Ainda no que se refere ao treinamento,
parece haver diferenças de tratamento entre
o homem e a mulher no local de trabalho.
Aos homens é dada a chance de se qualificar
por meio de treinamentos que lhes habili-
tam a trabalhar com as novas tecnologias
(CNC, CAD/CAM E CLP) e com o CEP
(Controle Estatístico do Processo) e às mulheres ficam reservados os trabalhos menos
“nobres”, mais rotineiros e monótonos
(HIRATA, 1998, p. 12-13).
Nos mesmos moldes das empresas
européias e americanas que se estruturaram e
implantaram o modelo japonês de produção,
intensificando o trabalho, também as
brasileiras acabaram procedendo dessa forma.
Em pesquisa com supervisores de produção realizadas por Montanari (1994, p.
55 e 1998, p. 106), respectivamente em
uma empresa de autopeças e em outra de
transportadores de interiores, a reestruturação produtiva e a implantação na produção de JIT/TQC em ambas levaram à
intensificação do trabalho, como ilustra o
discurso dos supervisores:
“Hoje a gente trabalha, não vamos dizer
assim sob pressão, mas trabalhamos atrás de
metas cirradas. Metas que não é qualquer
um que tem condições físicas e psicológicas
para suportar...”
“A carga de trabalho é estressante. As
pressões caem sobre você e você precisa ter
habilidade de repassar isso. A carga de trabalho e estresse é maior e é uma questão de
administração... É como se estivesse trocando
o pneu com o carro andando, mas tendo de
manter o nível de produção e a qualidade.”
5. A precarização das
relações de trabalho
Se, de um lado, a reestruturação produtiva leva à maior produtividade e exige uma
mão-de-obra mais qualificada, autônoma e
responsável, de outro, para obter maior
flexibilidade e ganhar em economia, a
empresa terceiriza tudo aquilo que não faz
parte do seu negócio principal.
A terceirização tem por objetivo o ganho
em produtividade por meio da redução de
custos e do acesso a tecnologias de ponta,
sem, entretanto, investir nessa tecnologia. O
investimento fica por conta da empresa terceirizada. A redução de custos, pelo que se
pode observar, é a redução da mão-de-obra,
acompanhada da precarização das relações de
trabalho, como: salários reduzidos e benefícios sociais menores que os da empresa
núcleo, jornadas mais extensas de trabalho,
contrato temporário de trabalho, etc.
A precarização do trabalho não está restrita aos países em desenvolvimento: ela vem
acontecendo também nos desenvolvidos.
A pesquisa realizada por Hirata (1997) no
Brasil-França-Japão sobre “Reestruturação
produtiva, trabalho e relações de gênero”,
mostra que a precarização não está atingindo apenas os laços empregatícios (contrato
de trabalho, carteira profissional assinada,
etc.), mas também a essência da organização do trabalho. Ela cria, além da intensificação do trabalho, a dependência do trabalhador com os seus pares e chefia. A reestruturação produtiva gera também a polarização da mão-de-obra. De um lado, temos um
grupo de trabalhadores qualificados, bem
pagos, com empregos estáveis e, de outro,
um grupo com trabalhos temporários,
tempo parcial e alguns ainda sem carteira
assinada, como é o caso do Brasil.
Há ainda a polarização da mão-de-obra
segundo o gênero. Ao trabalhador masculino são conferidos trabalhos mais qualificados, criativos e maiores salários do que à
mulher trabalhadora.
No Japão, segundo Hirata (1997), a
mulher é obrigada a trabalhar em tempo
parcial, com baixa remuneração e em
condições bastante precárias. Na França, o
recrutamento é feito em função de uma
igualdade aparente entre o homem e a mulher. No entanto, as mulheres vão pouco
a pouco sendo excluídas dos trabalhos
qualificados, conforme a entrada da
microeletrônica e da nova tecnologia de
organização na produção. No Brasil, não há
trabalho em tempo parcial (lei constitucional de 1988) e as mulheres são contratadas para a produção com salários mais
baixos e com discriminação na função –
como auxiliares de produção e os homens
como operadores.
Dessa forma, a reestruturação produtiva
para as mulheres, em vez de melhorar a sua
qualificação e seu nível salarial, tem efeito
contrário: tira-lhes as chances de crescimento e desenvolvimento profissional,
impõe-lhes ritmos de trabalho mais intensos do que aos homens e exclui-lhes a
chance de usar sua criatividade e habilidades que, como menciona Leite (1995, p.
339), são da natureza da mulher, tais como:
atenção, concentração e destreza manual.
Nos Estados Unidos, segundo Paul
Singer (1996), há uma divisão do mercado
de trabalho a partir do fim dos anos 60 e
início dos 70 em dois segmentos. O
primário, com altos salários, emprego
estável e perspectivas de carreira, e o
secundário com situação contrária, ou seja,
salários mais baixos, porém, os trabalhadores são empregados com o mesmo tipo
de contrato que os do segmento primário.
São pertencentes ao segmento secundário:
faxineiros, garçons, mensageiros, recepcionistas, estoquistas e vendedores de nível baixo.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
23
Com a entrada da microeletrônica na produção, os trabalhos
rotineiros e repetitivos foram substituídos por robôs, gerando
demissões em massa de trabalhadores que não conseguem, em
curto prazo, ter acesso a novos empregos. Em primeiro lugar,
porque as mulheres acabam assumindo, em tempo parcial, os postos de trabalho e, em segundo lugar, porque o seguro-desemprego
muitas vezes paga melhor do que as novas ocupações.
Segundo Paul Singer (1996), nos Estados Unidos os trabalhadores mais atingidos pelo desemprego foram os da produção;
em seguida, vêm os trabalhadores de escritórios e técnicos, como
engenheiros, secretárias, contadores, mecânicos, eletricistas. No
que se refere à precarização do trabalho, os trabalhadores mais
atingidos são os que pertencem ao segmento secundário, como
garçons, recepcionistas, mensageiros, etc.
A precarização só acontece nos países desenvolvidos e nos em
desenvolvimento porque as empresas conseguiram a desmobilização dos sindicatos. Entre outras razões, isso ocorreu devido às
políticas de cooptação de pessoal ou, como mencionado anteriormente, pelo deslocamento das empresas para regiões com pouca ou
nenhuma experiência sindical e com escassa oferta de trabalho para
mobilizar os trabalhadores na luta pela ampliação dos seus direitos. Assim, as empresas se fortalecem e ditam as regras que mais
lhes convêm no que diz respeito às relações de trabalho. Como
menciona Paul Singer (1996, p. 9) quanto à precarização:
“A flexibilidade extensa procura traduzir para a gestão do pessoal o
que representa o método just-in-time na gestão de estoques. Trata-se
de evitar estoques de mão-de-obra sem utilidade imediata”.
declínio do emprego industrial, principalmente nos países
europeus com sólidas políticas de bem-estar social.
Uma das principais conseqüências é a precarização das relações
de trabalho e das condições de trabalho, que se dá de maneira
irregular, refletindo as diferenças políticas, econômicas, tecnológicas e as estratégias empresariais de cada país.
Os países em desenvolvimento tiveram seu crescimento e desenvolvimento econômico prejudicados na década de 1980 pela crise da
dívida e pela deterioração dos valores do comércio internacional,
fatos que não só comprometeram o desenvolvimento nas últimas
duas décadas, mas também tiveram sensíveis reflexos na geração de
empregos e nas relações e condições de trabalho.
No Brasil, com o baixo índice de crescimento econômico nas
décadas de 1980 e 1990, houve extinção de postos de trabalho ocasionada pela destruição de estruturas existentes na economia
industrial, sendo que os investimentos feitos na nova estrutura
econômica não são suficientes para absorver o contingente de trabalhadores desempregados, além da questão da qualificação dos
trabalhadores, que se torna fator impeditivo de acesso aos novos
postos de trabalho.
FRANCISCO SCARFONI FILHO
6 – Considerações finais
Retomando o objetivo deste artigo, devido às mudanças ocorridas no mercado de trabalho e nas suas relações de trabalho nos
últimos 20 anos, em função da reestruturação produtiva que
atingiu todos os países, desenvolvidos e em desenvolvimento,
pode-se observar que o desemprego nos países desenvolvidos tem
sido acompanhado por transformações tecnológicas que ocorrem
em larga escala e grande velocidade, refletindo num rápido
Professor Pleno da Fatec-SP.
Mestre em Administração, FGV-SP.
Doutorando em Ciências Sociais (PUC-SP).
JACYRA C. MONTANARI
Professora das Faculdades Costa Braga.
Doutoranda em Ciências Sociais (PUC-SP).
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DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
RECARGA
ARTIFICIAL
DE AQÜÍFEROS
Por IVANILDO HESPANHOL [ESCOLA POLITÉCNICA - USP]
RESUMO: A prática de recarga artificial de aqüíferos com efluentes
domésticos tratados, embora já esteja consolidada internacionalmente
é, ainda, pouco conhecida no Brasil. Entretanto, quando estiver adequadamente regulamentada e praticada, trará benefícios, introduzindo
uma nova dimensão para a disposição de efluentes domésticos, proporcionando, simultaneamente, aumento da disponibilidade de água, proteção de aqüíferos costeiros contra salinização, controle de subsidência
de solos e sustentação dos níveis de aqüíferos freáticos submetidos a
condições inadequadas de demanda.
A recarga artificial pode ser efetuada diretamente através de poços de
injeção ou por sistemas de infiltração. Os métodos de infiltração são
mais econômicos e permitem utilizar a capacidade de remover poluentes da camada insaturada e do próprio aqüífero, estabelecendo as
condições para projeto dos sistemas de tratamento e percolação designados por tratamento solo-aqüífero ou TSA.
Esses sistemas proporcionam níveis de tratamento elevados em termos de compostos orgânicos (remoção de DBO, DQO, CODT), organismos patogênicos (coliformes fecais, criptosporídeos, giardia e vírus)
e compostos inorgânicos (nitrogênio e metais pesados), a custos bastante inferiores aos associados a tratamento avançados convencionais,
construídos na superfície.
1. Introdução
A prática de recarga artificial de aqüíferos com
efluentes domésticos tratados vem encontrando aplicação em diversas partes do mundo, tanto em regiões
áridas e semi-áridas como em áreas com disponibilidade hídrica elevada. No Brasil, a prática, que é
ainda pouco conhecida, vem suscitando reações de
hidrogeólogos, biólogos, engenheiros ambientais e
conservacionistas em geral, que a consideram uma
metodologia com grande potencial para contaminar
as águas subterrâneas.
A recarga natural de aqüíferos subterrâneos se
realiza diretamente, através da precipitação pluviométrica e de run-off, ou através de rios, lagos e
reservatórios. A recarga natural é evidentemente efetuada sem qualquer controle ou seleção, podendo vir,
também, a poluir os aqüíferos subjacentes. A
condição mais crítica é, entretanto, quando a recarga
é influenciada pela atividade antrópica não planejada
ou inconsciente, submetendo os aqüíferos a um
processo de contaminação por infiltração e/ou lixiviação associada à aplicação, no solo, de efluentes ou
biossólidos e de fertilizantes e biocidas. Ocorre,
ainda, pela infiltração de micropoluentes orgânicos e
IVANILDO HESPANHOL
[email protected]
Professor titular da Escola Politécnica
da Universidade de São Paulo,
presidente do Centro Internacional
de Referência em Reuso
de Água-CIRRA/IRCWR.
www.usp.brcirra
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
25
2. Objetivos e vantagens
A recarga artificial, vista como uma modalidade de reuso, pode atender a uma gama
significativa de objetivos, entre os quais:
• proporcionar tratamento
adicional de efluentes;
A infiltração e percolação de efluentes
tratados se beneficia da capacidade natural
de biodegradação, sorção, hidrólise, precipitação, complexação, troca iônica, filtração, etc. dos solos, proporcionando um
tratamento in situ e permitindo, em função
do tipo de efluente utilizado, dos métodos
de recarga, de condições hidrogeológicas e
dos usos previstos, eliminar a necessidade
de sistemas de tratamento avançados. O sistema de tratamento proporcionado pelo
conjunto da camada insaturada e do
aqüífero propriamente dito é designado por
Tratamento Solo-Aqüífero, ou TSA.
O processo de recarga contribui, ainda,
para a perda de identidade entre efluentes
tratados e a água subterrânea, reduzindo o
impacto psicológico do reuso para fins benéficos diversos. A recarga artificial permite:
• aumentar a disponibilidade de água
em aqüíferos potáveis ou não potáveis;
Esta é uma das principais vantagens da
recarga artificial, particularmente em áreas
carentes de recursos hídricos. A transformação de esgotos em água com qualidade
para o atendimento de usos benéficos, tais
como a irrigação, se constitui, também, em
benefício ambiental, evitando a descarga de
efluentes em corpos d’água.
• proporcionar reservatórios de água em
substituição a reservatórios superficiais;
Alguns usos de água, que apresentam
demanda sazonal, requerem grandes reservatórios para armazenamento ou métodos
alternativos de descarga nos períodos de
26
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
• prevenir subsidência de solos;
A subsidência de solos, definida como
"movimento para baixo ou afundamento do
solo causado pela perda de suporte subjacente", constitui problema relevante em
áreas onde ocorre excessivo bombeamento
de água de aqüíferos não suficientemente
recarregados naturalmente. A recarga de
aqüíferos afetados por subsidência elimina
ou minimiza o fenômeno da subsidência.
• prevenir a intrusão de cunha
salina em aqüíferos costeiros.
O bombeamento excessivo de água subterrânea de aqüíferos adjacentes a áreas
costeiras pode provocar a intrusão de água
salina, tornando-os inadequados como
fontes de água potável ou para outros usos
que não toleram salinidade elevada. Baterias
de poços de injeção, ou bacias de infiltração,
podem ser construídos em áreas críticas,
criando barreiras para evitar a intrusão salina.
• Sistemas de infiltração superficial
Ocorrendo condições locais e características hidrogeológicas favoráveis, a recarga
BACIA DE RECARGA
POÇO DE RECUPERAÇÃO
POÇO DE OBSERVAÇÃO
POÇO DE OBSERVAÇÃO
PARA O SISTEMA
DE ABASTECIMENTO
DUNA COM LENTES DE SILTE E ARGILA
ELEVAÇÃO DO NÍVEL DE ÁGUA
NÍVEL DE ÁGUA ORIGINAL
AQÜÍFERO CALCÁREO ARENOSO
CAMADA IMPERMEÁVEL
Figura 1 - Esquema de um sistema de recarga artificial através de bacia de infiltração
RETARDAMENTO
ELIMINAÇÃO
VOLATIZAÇÃO
(CCL4, C2CL4, ETC)
O2
TRANSFORMAÇÕES BIOQUÍMICAS
PRECIPITAÇÃO
HIDRÓLISE
COMPLEXAÇÃO
SORÇÃO
TROCA IÔNICA
FILTRAÇÃO
• Injeção direta através de poços
A recarga por meio de injeção direta
requer a construção de poços projetados
especificamente para esta finalidade, estendendo-se através da camada insaturada até o
aqüífero. Os efluentes recuperados são injetados diretamente, sob pressão, geralmente
em aqüíferos profundos e bem confinados.
A injeção direta é a mais adequada quando
os aqüíferos são muito profundos ou quando a topografia local ou a disponibilidade
de área torna a técnica de infiltração
impraticável ou excessivamente custosa.
Essa metodologia tem sido empregada
com êxito para a proteção de aqüíferos
costeiros visando evitar a intrusão de água
salgada. Há uma grande experiência internacional sobre a proteção de salinização de
aqüíferos costeiros, podendo ser salientados
os que operam na região de Los Angeles
(Coastal Barrier Project, Orange County
Sanitation District), em El Paso, Texas
(Fred Harvey Water Reclamation and
Groundwater Recharge Project) e no
Sultanato de Omã (Muskat e Salalah).
Os custos envolvidos na injeção direta são
significativamente elevados tanto no que se
refere à construção de poços como em relação
aos níveis de tratamento necessários para a
proteção da qualidade de água do aqüífero.
DISPERSÃO HIDRODINÂMICA
Há dois métodos básicos para se processar a recarga de aqüíferos:
DILUIÇÃO
SOLO
DIVERSAS FASES
ESCOAMENTO VERTICAL
3. Técnicas de recarga artificial
pode ser efetuada por meio de sistemas de
infiltração superficiais, tais como bacias de
infiltração, canais modificados ou dotados
de bermas ou ainda por meio de esquemas
de inundação controlada. A Figura 1
mostra, esquematicamente, como a recarga
é efetuada através de bacias de infiltração.
O efluente, após tratamento adequado, é
recalcado para a bacia de infiltração, de
onde percola até o aqüífero. Na figura são
mostrados os poços de observação, que
poderiam ter sido construídos na fase de
elaboração dos perfis hidrogeológicos do
local, e os poços de recuperação.
A percolação através do solo superficial,
camada insaturada e o escoamento no
próprio aqüífero podem, dependendo das
características locais, possibilitar níveis de
tratamento significativos. A remoção de
organismos patogênicos e de compostos
orgânicos e inorgânicos depende da qualidade do efluente a ser infiltrado e das características hidrogeológicas da camada
insaturada e do aqüífero. Essa caracterização do solo é efetuada por meio de estudos
granulométricos e de perfis geológicos
obtidos na zona de infiltração, fornecendo
informações sobre tipos de solos, perfil
litológico da camada insaturada e do
aqüífero, níveis de água, gradiente regional, locação e volumes estimados da recarga natural, características de poços e
bombeamentos existentes, parâmetros do
aqüífero (transmissividade, condutividade
hidráulica saturada, vazão específica, etc.),
características de qualidade da água do
aqüífero em termos dos principais cátions e
ânions, poluição existente ou potencial oriunda de aterros ou quaisquer outras fontes e
quaisquer outros contaminantes do solo que
possam ser lixiviados durante a recarga.
A Figura 2 mostra, esquematicamente, os
diversos processos e operações unitárias que
podem ocorrer na zona insaturada, promovendo a diluição, o retardamento e a
eliminação de poluentes presentes nos efluentes infiltrados. No aqüífero, por meio de
escoamento horizontal, podem, também,
ocorrer processos de filtração, precipitação e
transformações bioquímicas, colaborando
para o polimento final do efluente infiltrado,
antes que este atinja os poços de recuperação.
As áreas hachuradas indicam, aproximadamente, a eficiência relativa da remoção de
poluentes, de acordo com a profundidade do
aqüífero. Note-se que a camada superior de
solo é a que tem maior potencial de remoção
devido à formação, à medida que a infiltração
ocorre, de “smutzdecke”, como ocorre em filtros lentos de areia.
FASE ÚNICA
ESCOAMENTO HORIZONTAL
• que o aqüífero possa servir
como um eventual sistema
de distribuição, permitindo eliminar
canais ou linhas troncos;
Dependendo das condições locais, os poços
de recuperação da água infiltrada podem ser
localizados em diversos pontos críticos de
demanda, permitindo redução de custos associados a sistemas de distribuição e de reservatórios de regularização.
Efluentes tratados são injetados nos aqüíferos
confinados, estabelecendo um gradiente
hidráulico no sentido do mar, que previne a
penetração de água salgada no aqüífero.
ZONA INSATURADA
baixa demanda. Esses reservatórios, quando
construídos na superfície, demandam
grandes áreas e estão sempre associados a
custos elevados. Além dos impactos ambientais que causam, reservatórios superficiais são afetados por poluição, evaporação,
desenvolvimento de gostos e odores devido
à proliferação de algas, produção excessiva
de macrófitas e outros problemas que
implicam custos de operação e manutenção.
ZONA SATURADA
inorgânicos presentes em áreas degradadas, ou
de combustíveis e chorume, oriundo de aterros
sanitários ou depósitos de lixo a céu aberto.
A engenharia de recursos hídricos desenvolveu, com a finalidade de aumentar a
disponibilidade de água e de, eventualmente, resolver problemas localizados, a
tecnologia de recarga artificial, utilizando
efluentes adequadamente tratados. Essa
prática, designada como “recarga gerenciada”, permite o aumento das reservas subterrâneas com velocidade muito maior do que
as que ocorrem naturalmente, proporcionando, ainda, maior segurança em termos
de proteção dos aqüíferos, uma vez que a
qualidade da água de recarga é adequadamente monitorada.
(CO2)
NÍVEL DE AQÜÍFERO
(N2)
(H2S)
(CH4)
Figura 2 - Remoção de poluentes na camada insaturada e no aqüífero
4. Determinação experimental
da capacidade do solo
em remover poluentes Tratamento solo-aqüífero
A capacidade do aqüífero em remover
poluentes, designada como Tratamento
Solo-Aqüífero, ou TSA, é avaliada por
meio de ensaios de laboratório, efetuados
em colunas com 0,30 m de diâmetro.
Amostras indeformadas representativas são
coletadas na área de infiltração e colocadas
em uma bateria de colunas para permitir,
simultaneamente, a recarga com diversas
taxas de infiltração. Essas taxas variam de 0,3
a 3,0 m/dia, dependendo das características
do solo. O efluente, após passar por tratamento preliminar, é aplicado na superfície da
coluna a taxas de infiltração determinadas e
amostras são coletadas na superfície e a diversas profundidades, por meio de pontos de
tomada colocados ao longo das colunas. Esses
ensaios permitem determinar, em função das
PARÂMETRO
UNIDADES
Bactérias (total)
Coliformes totais
E. coli
S. fecalis
No./ mL
NMP./ 100mL
NMP./ 100mL
NMP./ 100mL
taxas de infiltração, a profundidade mínima
de camada insaturada necessária para que o
efluente apresente qualidade adequada para
integrar o aqüífero.
O sistema TSA vem sendo empregado com
sucesso em diversos países, entre os quais a
Holanda (infiltração em dunas nas regiões de
Castricum, Leiduin e Haia), Israel (região do
Dan), Chipre (Limassol), Estados Unidos
(Cedar Creek, no condado de Nassau, e em
diversos sistemas localizados nos Estados da
Califórnia, Arizona e Nevada), Polônia
(Wroclav) e Japão (Akishima).
Os Quadros 1 a 6 apresentam a capacidade de remoção de poluentes de diversos
aqüíferos recarregados com efluentes
domésticos tratados, em operação nos
Estados Unidos. O Quadro 1 mostra a concentração de coliformes totais e fecais e de
S. fecalis antes e após o TSA, efetuado por
meio de uma bacia de infiltração.
O Quadro 2 apresenta as eficiências de
DESEMPENHO
Concentração média
Concentrações
antes do SAT
depois do SAT
100.000
400
50
150
40 - 120
0 - 20
0
0
Quadro 1 - Remoção de coliformes e organismos patogênicos em um sistema TSA
PARÂMETRO
UNIDADES
DESEMPENHO
Efluente
Sólidos Suspensos
Turbidez
Algas
DBO (particulado)
DQO (particulado)
Nitrogênio Orgânico
(particulado)
Recuperado
Eficiência (%)
mg/L
NTU
No./mm3
mg/L
mg/L
34
13
100
14
38
<1
0,5
0
0
0
>99,5
95
100
100
100
mg/L
3
0
100
Quadro 2 - Remoção de material particulado e colóides em um sistema TSA
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
27
remoção de sólidos suspensos, material
coloidal, algas, DBO, DQO e nitrogênio
orgânico associados a material particulado,
presentes no efluente utilizado para recarga.
O Quadro 3 indica uma remoção de fósforo de 98,5% e eficiências elevadas de elementos traços. Com exceção de cádmio e
molibdênio, que apresentam remoção de
67%, os demais elementos traços são
removidos a valores superiores a 70%.
No Quadro 4 é apresentada a remoção de
nitrogênio. A amônia é removida a 99,6% e as
remoções de nitrogênio orgânico e nitrito são
superiores a 90%. Note-se o acréscimo de
98% na concentração de nitrato, após a pasPARÂMETRO
Fósforo
Cádmio
Cromo
Cobre
Molibdênio
Níquel
Selênio
sagem no sistema SAT, demonstrando a significativa nitrificação proporcionada na camada
insaturada e no próprio aqüífero.
As remoções de sódio, potássio, boro e a
variação do Índice de Adsorção de Sódio –
IAS são indicadas no Quadro 5. Note-se que
a capacidade de troca de cátions do conjunto solo aqüífero diminui significativamente ao longo do tempo, indicando que,
se o TAS foi projetado para tratamento de
efluentes com vistas à irrigação de culturas,
será necessário fazer a recarga em outra
área, ou optar por um sistema de tratamento alternativo, uma vez que o aqüífero utilizado atingiu seu nível de saturação no que
UNIDADES
mg/L
µg/L
µg/L
µg/L
µg/L
µg/L
µg/L
DESEMPENHO
Antes do SAT
Após SAT
Eficiência (%)
2,1
3
10
18
9
38
8
0,03
<1
<3
5
<3
10
<2
98,5
>67
>70
72
>67
74
>75
Quadro 3 - Remoção de fósforo e elementos traços em um TSA
PARÂMETRO
UNIDADES
Amônea
N Orgânico
Nitrito
Nitrato
N Total
N (filtrado)
mg/L
mg/L
mg/L
mg/LL
mg/L
mg/L
DESEMPENHO
Antes do SAT
Após SAT
5,0
7,7
0,2
0.1
13
10
< 0,02
0,7
0,02
6,5
7,2
7,2
Eficiência (%)
45
28
DESEMPENHO
UNIDADES
Concentração
média
antes do SAT
Sódio
Potássio
LAS
Boro
mg/L
mg/L
mg/L
Concentração
Concentração
recuperado
recuperado
após exaustão da
enquanto capacidade
capacidade de troca
de troca é ativa
140
24
5,3
0,33
25 - 110
1-5
2,3 - 2,8
0.06 - 0,18
120 - 150
20 - 25
3,2 - 4,0
0,20 - 0,35
Quadro 5 - Variação da capacidade de troca iônica em um TSA
PARÂMETRO
UNIDADES
DBO
DQO
COD
KmnO4
(consumo como O2)
Absorbância, UV254
Detergentes
Fenóis
mg/L
mg/L
mg/L
mg/L
cm-1 x 103
mg/L
?g/L
DESEMPENHO
Antes5do SAT
Após?0,5
SAT
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
Eficiência
?90,0 (%)
46
18
10,9
3,2
76
82
9
239
1,1
5
1,7
48
0,25
?1,4
81
80
77
?72
Quadro 6 - Remoção de compostos orgânicos dissolvidos em um TSA
28
As condições e características consideradas
ideais para sistemas TSA são associadas
aos seguintes fatores:
• solos permeáveis com
taxas de infiltração razoáveis;
• camada insaturada com
espessura suficiente para estocar
o volume de recarga necessário;
• ausência de camadas impermeáveis
suspensas que causem excessiva
acumulação da água infiltrada
antes de atingir o aqüífero;
• distribuição granulométrica na
camada insaturada superior, que
suporte a prática do sistema TSA;
TAXA DE
APLICAÇÃO
(m/ ano) (%)
Camp Pendelton, CA
TAXA DE
PERCOLAÇÃO
(m/ dia)
A prática de recarga artificial de aqüíferos
está bem estabelecida em nível internacional
e não apresenta, quando projetada e operada
adequadamente, perigo de contaminação de
aqüíferos. Constitui prática convencional de
engenharia, que leva em conta todas as
variáveis de importância para projetar
sistemas econômicos, operacionais e com
riscos aceitáveis, tanto do ponto de vista
ambiental como de saúde pública.
Quando adequadamente regulamentada
e praticada no Brasil, a recarga artificial
trará benefícios, introduzindo uma nova
dimensão para a disposição de efluentes
domésticos, proporcionando, simultaneamente, aumento da disponibilidade de
água, proteção de aqüíferos costeiros contra
salinização, controle de subsidência de
solos e sustentação de níveis de aqüíferos
freáticos submetidos a condições inadequadas de demanda.
A recarga artificial por injeção direta
envolve custos elevados, tanto aqueles associados à construção de poços profundos
como à necessidade da produção de efluentes para recarga com qualidade de água
muito próxima à da água potável.
A recarga por sistemas de infiltração,
que se beneficia do tratamento solo aqüífero,
demanda condições especiais para permitir que os efluentes percolados mantenham a integridade dos aqüíferos.
• coeficientes de transmissividade
que não causem retenção excessiva
de água no aqüífero e
• aqüíferos não confinados.
Os custos associados aos sistemas TSA são,
em média, 40% menores do que os custos de
sistemas de tratamento convencionais equivalentes, operando na superfície.
Os sistemas TSA proporcionam níveis de
tratamento elevados em termos de compostos
orgânicos (remoção de DBO, DQO, CODT),
organismos patogênicos (coli-formes fecais,
criptosporídeos, giardia e vírus) e compostos
inorgânicos (nitrogênio e metais pesados).
PROGRAMA DE
CARREGAMENTO
O técnico da Sabesp, Eraldo Rodrigues Araújo,
observa vidros de água sem tratamento e tratada;
em cinco anos, degradação mais que dobrou
os custos para tratá-la e deixá-la potável.
(São Paulo, SP, 23/07/2004.
Foto: Marlene Bergamo/ Folha Imagem)
TIPO DE SOLO
-
2,4
Conforme a disponibilidade
de efluente.
Areia grossa
Hernet, CA
27
0,8
Oceanside, CA
44
1,4
Areia média
e grossa
Areia grossa
Phoenix, AZ
128
0.8
Carrega 1 dia (0,08m),
drena 2 dias e seca 1 dia.
Carrega até 0,90m,
drena, seca e recarrega.
Carrega 10 dias e
seca 14 dias
San Clemente, CA
131
1,5 - 3,0
Carregamento contínuo.
34
43
0,3 - 0,6
1,5 - 3,0
Carrega 18 dias e seca 30 dias.
Carrega 7 dias (1,20m),
drena 7 dias e seca 7 dias.
5. Conclusões e recomendações
Quadro 4 - Remoção de nitrogênio em um TSA
PARÂMETRO
concerne à remoção dos elementos para os
quais foi projetado.
O Quadro 6 mostra as eficiências na
remoção de compostos orgânicos dissolvidos.
Note-se a elevada remoção de DBO solúvel
(superior a 90%) e de Carbono Orgânico
Dissolvido (superior a 80%). A redução da
Absorbância em UV com comprimento de
onda de 234 nm é também bastante significativa, demonstrando a capacidade de
remoção de ácidos húmicos e fúlvicos, precursores da formação de trihalometanos,
quando é praticada a desinfecção com cloro.
O Quadro 7 ilustra a tecnologia de recarga artificial com efluentes tratados,
mostrando as características de alguns sistemas em operação nos Estados Unidos.
Como pode ser verificado, as taxas anuais
de aplicação e as taxas de aplicação diárias
dependem da disponibilidade de efluentes,
das características do solo e da operação das
bacias de infiltração. As características do
solo e do efluente sendo percolado estabelecem as operações de manutenção da parte
superficial das bacias, evitando a colmatação das camadas superiores.
St. Croix, Virgin Island
Whittier Narrows, CA
Areia com argila e
matéria orgânica na
superfície, areia grossa
e pedregulho
Areia grossa
e pedregulho
Silte, areia e argila
Areia argilosa com
matéria orgânica
MANUTENÇÃO DA
SUPERFÍCIE DAS LAGOAS
Rearranjo dos taludes e
remoção de sólidos da
superfície em anos
alternados.
Aração periódica
das bacias
Escarificação periódica
das bacias
Escarificação periódica
Nenhuma manutenção
Escarificação periódica
Quadro 7 - Características operacionais de alguns sistemas TSA em operação nos Estados Unidos
BIBLIOGRAFIA
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FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
29
NICHOLAS G. CARR
publicou o artigo
“It doesn’t matter” - ou
a TI não importa - na
Harvard Business Review
em maio de 2003.
TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
FAZ DIFERENÇA,
SIM!
Por LUIZ CARLOS MORAES REGO [FGV-EAESP]
O polêmico Nicholas Carr, que escreveu que a TI não traz
diferencial competitivo, veio ao Brasil expor suas idéias.
Neste artigo, o autor contra-argumenta algumas delas.
A publicação do artigo “It doesn’t matter” – ou a TI não importa –, do jornalista
Nicholas G. Carr, na Harvard Business
Review (HBR) de maio de 2003, causou
tanto rebuliço no mercado internacional de
tecnologia que não demorou para que ele
fosse convidado a vir ao Brasil, o que ocorreu no início de dezembro do mesmo ano.
Em seu texto polêmico, Carr prevê um
futuro no qual a Tecnologia da Informação
(TI) será commodity e passará a ser comercializada como energia elétrica e água,
remunerada pelo consumo mensal.
A argumentação de Carr lembra o artigo
“Strategy and the Internet”, de Michael
Porter, guru da estratégia e professor de
Harvard, editado na HBR por Carr em
março de 2000. No artigo, Porter classificava a Internet como mais uma tecnologia,
como CAD (Computer Aided Design) ou
Video Streaming, sem a importância
estratégica que lhe era atribuída na época. “O
artigo do Porter me influenciou muito”, confessou Carr à RNT (Revista Nacional de
Telecomunicações). Vivia-se a ressaca da bolha,
época em que as empresas americanas
estavam investindo algo em torno de 50%
dos seus orçamentos de capital em tecnologia
da informação. Mundialmente as empresas
gastavam US$ 2 trilhões por ano em TI.
Como outras tecnologias consumidas em
escala global, a TI tornou-se “invisível”, ou
seja, acessável e acessível por milhões. Na
30
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
visão de Carr, deixou de ser um bem escasso e por isso perdeu seu valor estratégico:
“Quando um recurso empresarial não é
ubíqüo e é escasso, aí sim podemos considerá-lo estratégico. As empresas ganham
vantagem competitiva possuindo ou fazendo coisas que os concorrentes não podem ou
não sabem fazer”.
Nos primórdios da TI, empresas
visionárias como a American Airlines, com
seu sistema proprietário de reserva de passagens aéreas, o Sabre, único na época, e a
Federal Express, com o sistema de acompanhamento de pacotes, ofereciam aos
seus clientes serviços aparentemente inimitáveis. Hoje são apenas “mais uma”
a oferecer esses serviços aos seus clientes.
DIFERENCIAÇÃO COMPETITIVA – Carr
cita a eletricidade como exemplo de tecnologia que hoje poucos usam como base de diferenciação competitiva. Uma das raras
exceções é a indústria de alumínio, na qual a
eletricidade é matéria-prima básica. O
“apagão” de 2002 e o conseqüente racionamento provaram ter efeito devastador sobre a
economia brasileira. Por ter investido em
fontes próprias de energia próximas das suas
plantas de processamento da bauxita, a CBA
- Companhia Brasileira de Alumínio, do
Grupo Votorantim, usufruiu dessa vantagem distanciando-se dos seus concorrentes,
grandes grupos transnacionais.
Hoje, uma paralisia dos sistemas de TI
implantados nas empresas, causada por
catástrofes como enchentes ou atos de terrorismo, podem ter efeitos igualmente negativos.
Prejudica o relacionamento da empresa com
seus clientes pelo atraso das entregas contratadas e cria custos de formação de estoques
por falta de troca de informações entre os
membros da rede de valor da empresa.
Portanto, diz Carr, “administrar os riscos da
ausência dos sistemas” é mais relevante hoje
como fator de diferenciação competitiva que o
próprio uso de TI.
No entanto, o risco maior está no investimento excessivo em recursos de TI,
adverte Carr, como aconteceu com os data
centers implantados nos anos 2000 a 2002.
Embaladas pela “euforia da demanda infinita” de capacidade de computação, algumas
dessas empresas investiram demasiadamente em recursos de TI para logo descobrirem que o mercado não era tão grande
para justificar os investimentos realizados.
Com base nessas idéias, Carr resume suas
recomendações para usuários de TI em
tempos nos quais o controle de custo e de
riscos é mais importante que investimento
e inovação, nos seguintes pontos:
1. GASTE MENOS: avalie rigorosamente o
retorno sobre os investimentos em TI.
Separe os investimentos essenciais dos
supérfluos, desnecessários ou contraprodutivos. Busque alternativas mais simples e
baratas, como a terceirização, e melhore
continuamente a produtividade dos recursos disponíveis.
2. NÃO SEJA PIONEIRO: adie investimentos, procure reduzir custos de forma significativa e minimize o risco de comprar
recursos de TI próximos da obsolescência. Usuários
inteligentes não são pioneiros, pelo contrário, só
compram depois que os mais afoitos sofreram o ônus
da experimentação e que as melhores práticas e
padrões tecnológicos daquela tecnologia tenham se
consolidado.
3. FOQUE NOS RISCOS, NÃO NAS OPORTUNIDADES:
muitos grandes usuários de TI estão passando para
terceiros suas aplicações e redes de comunicação. Os
grandes bancos brasileiros terceirizaram suas redes de
dados para prestadoras de serviços de comunicação
seguindo a lógica da concentração de recursos nas
atividades-chave do negócio.
Paga-se o preço do aumento da vulnerabilidade e
da redução da confiabilidade na comunicação com
seus parceiros e clientes.
Priorize seus investimentos em TI: gaste mais no
preparo da organização para enfrentar eventuais
emergências do que no uso radical de TI em novas
aplicações.
REPERCUSSÃO – A HBR é uma revista lida por
CEOs dos quatro cantos do mundo acostumados a
ver os investimentos em TI nos primeiros lugares das
suas agendas. Obviamente as idéias de Carr geraram
enormes controvérsias e protestos, principalmente
por parte dos fornecedores de tecnologia.
Paradoxalmente, esses fornecedores são em parte
responsáveis pela crença de que a TI não contribui
para criar diferenciação estratégica relevante. Em
lugar de promover a TI como uma poderosa ferramenta de implementação de estratégia, a maioria
dessas empresas apresentava seus produtos/serviços
como panacéias. Quando os resultados não se materializaram, o humor dos CEOs migrou de um
extremo para outro: “já que a TI não resolve todos os
meus problemas, então não é relevante”.
No entanto, poderíamos encontrar uma série de
contra-argumentos para as proposições de Carr. Os
dois mais importantes seriam os seguintes:
1. A EXTRAÇÃO DE VALOR DE TI EXIGE INOVAÇÃO NOS
PROCESSOS DE NEGÓCIO: ou seja, sem mudança de
processos, não tem sistema que dê jeito. A maioria
das empresas não aproveita o uso da tecnologia, pois
não transforma o modus operandi. Isso limita os
benefícios decorrentes. Empresas de sucesso autosustentado, como a Dell, a Wal-Mart e a Cisco,
provam isso. Mesmo depois que os concorrentes imitaram suas práticas de negócios, elas continuaram na
frente, distanciando-se cada vez mais em produtividade e agilidade. Isso porque não pararam de inovar.
Os avanços em TI criam novas possibilidades de
crescimento e competitividade que se estendem além
dos limites físicos da empresa e se espalham em toda
a sua rede de valor. Se bem aproveitados, no momento certo, esses avanços criam novas vantagens competitivas difíceis de ser prontamente copiadas.
2. O IMPACTO ESTRATÉGICO DE TI SURGE DE
INOVAÇÕES INCREMENTAIS E NÃO DE INICIATIVAS
“BIG BANG”: raramente projetos de TI bem-sucedidos
são gigantescos e baseados numa única inovação,
como os de energia elétrica citados por Carr. Pelo
contrário, em geral vão aparecendo paulatinamente e
são focados em resultados de curto prazo, mas alinhados com a estratégia maior do negócio. Os
avanços em TI estão longe de alcançar o ponto de
retorno decrescente como aconteceu com ferrovias e
distribuição de energia elétrica. Progressos em
capacidade de processamento, de armazenagem de
dados e em velocidade de transporte de dados continuam acontecendo em ritmo rápido e sustentado.
Estamos à beira da eclosão de um novo paradigma,
chamado pomposamente de “arquitetura de serviço
distribuída” e que na verdade engloba os conceitos
de computação sob demanda e grid computing, nada
mais do que o velho princípio do ASP (Application
Service Provider) incrementado, em que se paga na
medida em que se usa. Com isso, a computação será
acessível às pequenas e médias empresas que não
teriam orçamento para comprar caras licenças de
software ou equipamentos milionários. O resultado
será um imenso impacto potencial na competitividade global de uma região ou país.
MICHAEL PORTER
publicou o artigo
“Strategy and
the Internet”
na Harvard Business
Review em
março de 2001.
De fato, a TI isoladamente não é relevante. Ela só é
relevante num contexto de esforço conjunto de inovação
baseado nas novas possibilidades e oportunidades criadas
pela tecnologia. Nessa perspectiva, a TI faz diferença e
continuará sendo assim por muito tempo.
LUIZ CARLOS MORAES REGO
[email protected]
Professor da FGV-Eaesp.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
31
ÁGUAS
(São Paulo, SP, 10/05/2004. Foto: Juca Varella/ Folha Imagem)
Por ANGELO ALBIERO FILHO [CIESP]
Profetiza-se há alguns anos que o grande desafio
do novo século será o fornecimento de água para
o atendimento das necessidades da sociedade,
desde as mais básicas, como o abastecimento público, até o
32
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
funcionamento e desenvolvimento das atividades produtivas industriais e agrícolas.
Em especial na Região Metropolitana de
São Paulo, os problemas relacionados com o
tema são constantes no cotidiano da população, que sofre ora com o racionamento de
água, ora com as constantes inundações, ou
até mesmo ambas simultaneamente, bem
como com a crescente poluição dos rios e
mananciais da região.
Em função disso, a água tornou-se o foco
do discurso de inúmeros “especialistas de
plantão”, sempre prontos a defender tudo
aquilo que permita uma boa exposição nos
meios de comunicação e, principalmente,
sua autopromoção.
Impõe-se uma “enxurrada” de desinformações, instaura-se uma verdadeira
inquisição na busca incansável dos responsáveis pelos problemas, julgam-se e condenam-se publicamente os supostos culpados,
sem a necessária identificação das reais
causas e nenhuma preocupação com as
conseqüências dessas acusações.
Após o julgamento feito pelos “ambientalistas de plantão” e a condenação através
dos meios de comunicação, passam a exigir
a aplicação das sanções cabíveis. Como
alguns dos réus listados não são facilmente
localizados, o setor produtivo acaba sempre
“pagando o pato”, pois, afinal, na sua
grande maioria, está legalmente instalado,
tem telefone e endereço fixo.
Não é difícil, no entanto, encontrar as
causas dessa situação e muito menos seus
verdadeiros responsáveis, bastando apenas e
tão-somente observar os fatos e as informações
disponibilizadas pelos órgãos responsáveis
pela gestão desse recurso tão precioso.
No que se refere à escassez de água, até
mesmo São Pedro chegou a ser responsabilizado pela falta de chuva na quantidade
necessária para o atendimento da população.
A chamada “vassoura hidráulica” também
vai para o banco dos réus, como exemplo do
desperdício de água na cidade.
Não é divulgada, no entanto, a responsabilidade do setor de saneamento pelas perdas médias de 40% da água tratada dos sistemas públicos de abastecimento no Estado,
o que significa cerca de 50 metros cúbicos
por segundo, ou seja, quase 80% da água
necessária para o abastecimento da população da Região Metropolitana de São Paulo,
não sendo tampouco informado qual é o
custo dessas perdas para a sociedade.
Não merecem nenhuma nota na mídia
os dados do Relatório de Situação dos
Recursos Hídricos, publicados pelo Daee –
Departamento de Águas e Energia Elétrica,
em 2002, indicando que o setor industrial
reduziu seu consumo de água em 18% e a
irrigação reduziu em 7%, enquanto o consumo doméstico aumentou cerca de 50% no
período de 1990 a 1998.
Quando o enfoque é a poluição, invariavelmente o vilão principal é o setor produtivo. Estão também à caça dos usuários
das águas subterrâneas, culpados pela
poluição e pelo rebaixamento dos níveis
desse manancial, dentre os quais
enquadram-se os grandes condomínios,
hotéis, restaurantes, hospitais e indústrias.
Não existe, contudo, a necessária preocupação com as causas, que no caso da maior
utilização de águas subterrâneas por parte de
grandes consumidores em áreas urbanas, é o
valor excessivo das tarifas de água potável
fornecida pelas concessionárias públicas.
Em outras regiões, a causa principal são os
elevados níveis de poluição da água dos rios,
que acaba inviabilizando sua utilização,
devido aos altos custos de tratamento
necessário para o seu aproveitamento, até
mesmo para fins industriais.
Aliás, o aumento das tarifas mencionadas
decorre, em parte, justamente dos crescentes
custos para tornar a água potável, tendo em
vista o comprometimento da qualidade dos
principais mananciais de abastecimento da
Região Metropolitana de São Paulo, como as
represas Billings e Guarapiranga.
Normalmente, não é mencionado com a
mesma ênfase que a poluição desses reservatórios é resultante da ocupação irregular
de cerca de dois milhões de pessoas, sem
nenhuma infra-estrutura, nas áreas de
entorno e de preservação dos mesmos.
Essa responsabilidade é exclusiva do
de racionamento da água e sua poluição
poder público. A atual legislação ambiental,
decorrem fundamentalmente da má gestão
decantada por muitos como sendo de
dos serviços públicos de saneamento associa“Primeiro Mundo”, por ser extremamente
da à falta de investimentos no setor, reflexo
restritiva, acaba permitindo e fomentando a
direto do descaso com que o problema é
clandestinidade, que não encontra restrição
tratado pelas esferas governamentais, tanto
devido à falta de fiscalização dos órgãos
do executivo, quanto do legislativo, a quem
competentes, seja na esfera estadual ou
cabe aprovar a priorização de recursos orçana municipal.
mentários, seja no âmbito federal, estadual
Da mesma forma acontece com a poluição
ou municipal.
dos rios, que tem como principal culpado o
Não se pode mais imputar essa responpoder público, pela falta de tratamento de
sabilidade ao setor produtivo, que já incoresgotos. Essa situação é agravada em decorporou, em maior ou menor escala, o tema na
rência, novamente, da legislação ambiental,
sua agenda, e está empenhado em garantir e
que impõe limites para o lançamento de eflumelhorar o atual padrão de qualidade de vida
entes que requerem sistemas avançados para o
da sociedade contemporânea, resultado da
seu atendimento, impedindo a execução de
produção de bens e serviços que, além de
sistemas mais simplificados, que trariam
gerar renda e emprego, internaliza a preocuimensas melhorias ambientais e sociais.
pação ambiental, e principalmente permite a
Segundo dados do referido Relatório de
arrecadação de significativa carga tributária,
Situação, apenas 25% da carga orgânica de
que, se devidamente aplicada pelo setor
origem doméstica é removida, ou seja, uma
público em áreas essenciais como o saneamengrande parcela dos esgotos domésticos
to básico, resultaria na redução da poluição
continua sendo lançada sem nenhum
das águas e, conseqüentemente, na melhoria
tratamento diretamente nos corpos de água,
das condições da saúde da população.
enquanto o setor industrial remove 96%
da sua carga orgânica, atendendo à legislação em vigor.
No âmbito do Programa de Despoluição
do rio Tietê, todas as fontes de poluição de
origem industrial foram controladas e cerca
de 1.250 empreendimentos adequaram seus
sistemas de tratamento de efluentes, sem se
perceber, contudo, significativa melhora na
qualidade de suas águas. De parte do poder público, das cinco estações de tratamento de esgotos construídas, a maioria está
ociosa, operando em média com cerca de
60% de sua capacidade.
A causa disso reside no fato de que os esgotos coletados não chegam às estações por falta
ANGELO ALBIERO FILHO
de planejamento, eficiência e gestão [email protected]
da dos órgãos responsáveis, quer no âmbito
Vice-presidente do Ciesp.
estadual quer no municipal, mas, sobretudo,
Diretor Titular do Departamento
pela falta de vontade política e atuação
de Meio Ambiente e Desenvolvimento
responsável.
Sustentável do Ciesp.
No entanto, os “defensores do meio ambiente” de plantão não saem nos jornais divulgando esses dados, que estão disponíveis
on-line nas páginas oficiais. Até mesmo os
verdadeiros e legítimos defensores públicos parecem
Silhueta de pessoa na represa
de Guarapiranga, que está com
desconhecer essa realidao nível de água abaixo do normal
de, observando-se esparsas
por conta da estiagem
iniciativas para reverter
que atingiu São Paulo.
essa situação e obrigar os
(São Paulo, SP, 20/06/2000.
responsáveis a cumprir a
Foto: Caio Guatelli/ Folha Imagem)
Constituição Estadual.
Com base nessas informações oficiais, pode-se
afirmar que os problemas
Foto: Rafaelle Sgueglia
O DESAFIO DAS
Vista aérea do rio Pinheiros, nas proximidades
da avenida dos Bandeirantes, onde se vê
o esgoto sendo despejado. As obras do
Projeto Tietê, na marginal Pinheiros, fará
a captação do esgoto da região
e o conduzirá à estação de tratamento.
ARTE E CIÊNCIA
NÃO SÃO INCOMPATÍVEIS,
MAS A MÍDIA SE IMPORTA COM ISSO?
Por ENIO SQUEFF
[ARTISTA PLÁSTICO]
Assim como a vida é bem mais complexa do que sugerem os manuais de auto-ajuda, as relações entre a ciência e arte são muito mais
íntimas do que indicam a indiferença que cientistas e artistas se votam
mutuamente nesta altura do século. Há as especificidades dos trabalhos de um e de outro
– isso é evidente. Einstein, que foi violinista, sabia o quanto tiraria de seu tempo à física se dedicasse ao
violino o tempo despendido por seu amigo, o virtuose Jasha Heifez, um dos maiores violinistas de todos os
tempos. No entanto, Einstein não imaginava o mundo sem música. Seu colega brasileiro, o também físico
Mário Schenberg, foi um grande crítico de arte. Nunca se leu dele qualquer coisa que sugerisse que a
física não tinha nada a ver com a arte; e vice-versa.
34
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
A rigor, não se trata de diferenças nem de
confluências. Leonardo da Vinci – para citar
um nome que serve tanto à ciência quanto
à arte – jamais encarou como um problema
o ser artista e cientista ao mesmo tempo, ou
que as duas coisas se excluíssem. Eppur si
muove, como diria Galileu Galilei, ele
próprio um eclético que nunca imaginou a
arte num canto e a ciência noutro. De fato
assim é. A arte supõe uma formação que é
difícil de imaginar num mundo dominado
pela técnica, sobretudo pela técnica a
serviço da indústria cultural. Digamos,
como hipótese, que o assunto não se
restringe a uma simples dicotomia – artes
versus ciência e tecnologia. Esse talvez seja o
grande desafio enfrentado pelas instituições
científicas e tecnológicas de hoje. O
comodismo de marchar a favor da corrente
dá a idéia de que há um fosso genético entre
a ciência e a grande arte, quando não é
assim. Refiro-me especificamente à “grande
arte” por uma razão até prosaica. Há quem
imagine que Beethoven, Picasso ou
Dostoiévsky podem ser substituídos pelo
pagodeiro que nasceu ontem, pelo outdoor
com a moça nua vendendo calcinhas, ou
pelo último livro do Paulo Coelho. Isso faz
a grande diferença. A idéia de que bastam
grandes mestres em ciência e tecnologia para
se formarem bons técnicos – que do resto o
rádio e a televisão que temos se encarrega de
difundir – é tão deletéria para o espírito científico quanto para o espírito crítico do cidadão
que a todo momento se vê na contingência de
escolher entre o bem e o mal para a sua cidade,
o seu Estado ou o seu país.
Fala-se aqui de um esforço, quase inútil,
de se tentar uma nova ordem pelo menos no
âmbito das academias. Diz-se “quase inútil”
porque não há um só professor que rivalize
com a televisão. Ou com o rádio escutado a
todo o volume nos banheiros públicos, nos
elevadores de aeroportos, nos hospitais
estatais e privados, sempre com a mesma
música imbecil. Portanto, qualquer ação que
se conjugue a essa utopia de pensar num
mundo onde as alternativas culturais possam
ser postas com um mínimo de igualdade
deveria ser determinante para todas as instituições de ensino, sejam estatais ou particulares. Será, porém, possível?
Na impossibilidade de se responder
imediatamente a esta questão, há sempre o
paradigma da história ou dos exemplos
alhures. Na guerra Franco-Prussiana, os
generais de Napoleão III talvez pudessem
evitar parte do fiasco do exército francês se
atentassem para as teorias dos pintores
impressionistas. Eles defendiam – com a
Portanto, qualquer ação que se conjugue a essa utopia
de pensar num mundo onde as alternativas culturais
possam ser postas com um mínimo de igualdade deveria
ser determinante para todas as instituições de ensino,
sejam estatais ou particulares. Será, porém, possível?
razão da ciência – que a cor vermelha sempre ressaltava no verde de uma campina.
Ora, muitas ações militares dos dois exércitos aconteceram durante a primavera.
Como parte da cor do fardamento dos soldados da França era vermelha, pode-se adivinhar o resto. Nunca os artilheiros e atiradores prussianos foram tão certeiros na
sua pontaria. Foi um passeio de que os
prussianos tiraram o melhor proveito possível. E venceram a guerra. Claro que não
foi só porque os generais não atentaram
para as teorias – de resto cientificamente
corretas dos impressionistas – que a França
acabou derrotada. Mas artistas e cientistas
deveriam escutar mais uns aos outros.
Na história da arte não são raros os artistas que trabalharam com ciência e viceversa. Goethe, à parte sua produção
literária, foi um cientista mais que
respeitável. No livro que escreveu ainda
jovem sobre uma viagem que fez à Itália –
obra de encantamento e de respeito de um
dos maiores gênios do mundo germânico à
civilização latina –, a todo momento as considerações se derramam sobre a paisagem
em reflexões geológicas, botânicas e
geográficas. Não há, porém, como evitar a
idéia de que seu “Fausto” – o homem que à
mercê de sua ciência faz um pacto com o
demônio – não seja um tributo a uma
reflexão pessimista, talvez mais sobre a
ciência do que sobre a arte.
De fato, mesmo que separados por pressupostos distintos, cientistas e artistas parecem comungar, pelo menos no nosso século, um mesmo pessimismo comum quanto
ao futuro. Este é o legado talvez da figura
múltipla de Fausto que Goethe elegeu
como seu personagem-símbolo. A obra é
típica do princípio do século XIX –
momento decisivo da história do homem
tecnológico e científico. O esplendor do
pensamento racionalista, positivo, cientificista parecia, em princípio, indicar uma
nova era. O próprio Karl Marx, desde as
trincheiras de sua crítica ao capitalismo,
não deixou de ser um otimista na antevisão
de um mundo superável sem as contradições alienantes do sistema que ele, por
assim dizer, desnudou. Não era, contudo, o
que previa o poeta e cientista Goethe.
Sob este e outros aspectos, arte e ciência
parecem se nutrir do mesmo paradoxo
quanto ao mundo contemporâneo e seu
porvir. Tirante a brevíssima mistificação
neolibe-ral, não há ninguém que jure pelas
benfeitorias eternas da tecnologia, independentemente dos sistemas que a desenvolvem. As separações, contudo, persistem.
Há cientistas que se julgam de bem com o
mundo e com a ciência ao não atentarem
para a grande cultura artística. Já os artistas
pensam poder superar a alienação do
mundo ao atacarem os sistemas tecnológicos, como se fosse possível ir de São Paulo a
Porto Alegre de carroça. Ou a pé.
Que fazer? Se não há incompatibilidades
entre a arte e a ciência, há, sem dúvida, a
indústria cultural. Os meios tecnológicos
que desenvolveram os sistemas de reprodução deram numa indústria em que a
própria cultura acabou envolvida. E privatizada. Mas essa é uma questão que afeta a
sociedade como um todo, embora caiba aos
cientistas – tanto quanto aos filósofos e
artistas – pensarem essa nova realidade. É
imperioso constatar que uma rede de TV
impõe-se muito mais do que várias universidades juntas. Não é por um mero efeito
virtual que um Bush ou um Berlusconni
tenham se imposto a duas sociedades das
mais desenvolvidas e civilizadas da história
do mundo.
ENIO SQUEFF
[email protected]
Pintor, jornalista e crítico de música.
É autor dos livros: O Nacional e o Popular na Música
(em co-autoria com José Miguel Wisnik)
e A Música na Revolução Francesa.
Ilustrou e escreveu (com Helder Perri Ferreira)
A Origem dos Nomes dos Municípios Paulistas,
editado pela Imesp em 2004.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
35
ALTEC 2005
XI SEMINARIO DE GESTIÓN TECNOLÓGICA
Salvador - BA - Brasil - 25 a 28 de Outubro 2005
INSCREVA SEU TRABALHO!
PRAZOS:
até 28 fevereiro 2005:
submissão de resumos
31 de maio de 2005:
submissão de
trabalhos completos
Mais informações
podem ser obtidas
pelo e-mail:
[email protected]
Ou pela Internet:
www.fia.com.br/altec
36
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
A Associação Latino-Iberoamericana de Gestão
Tecnológica - Altec é uma instituição de direito privado internacional sem fins lucrativos, fundada em
1984, com o propósito de vincular pessoas naturais e
jurídicas ativas na reflexão e no exercício da gestão
tecnológica, para realizar atividades de cooperação
nesta área. A Altec está integrada por um grupo significativo de profissionais da região, interessados na
gestão tecnológica, incluindo pesquisadores, professores universitários, empresários e executivos de
empresas, especialistas governamentais, agentes
financeiros e de cooperação e profissionais que se
desempenham em consultorias privadas.
A missão principal da Altec é promover o desenvolvimento socioeconômico da região Ibero-Americana
por meio do aperfeiçoamento contínuo da gestão tecnológica. A Altec contribui também para gerar um
pensamento ibero-americano sobre problemas relacionados com a inovação, que interfira no desenvolvimento de políticas de ciência e tecnologia e que
fomente a inovação e a instrumentação de projetos de
desenvolvimento tecnológico nos países da região.
Na sua trajetória de quase 20 anos de existência, a
Altec tem desenvolvido suas atividades com o apoio
de distintas instituições científicas, tecnológicas
e de cooperação, em âmbitos regional e internacional. Entre as mais significativas, destacam-se:
Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial - Onudi, Organização dos
Estados Americanos - OEA, Programa de Ciencia y
Tecnologia para el Desarrollo, de Espanha - Cyted,
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, El Mercado Común del Conocimiento en C y T - Mercocyt. Da mesma forma, suas
atividades têm contado com o respaldo institucional de
organizações nacionais de ciência e tecnologia, instituições tecnológicas, organizações empresariais, órgãos
governamentais e universidades dos países onde a
Associação tem promovido atividades. Informações
mais completas sobre a Altec podem ser encontradas na
página www.fia.com.br/pgtusp/altec.
A Diretoria de Altec está integrada por seis membros
de diferentes países. A presidência para o período 20012005 localiza-se na Universidade de São Paulo, Brasil,
junto ao Núcleo de Política e Gestão Tecnológica - PGT
(www.fia.com.br/pgtusp). A Diretoria atual está integrada
pelos seguintes profissionais: presidente Roberto Sbragia
(Brasil); Ex-presidente Ignacio Fernandes de Lucio
(Espanha); Diretores: Enrique Medellín (México), Enrique
Ambrosio (Espanha), Oscar Galante (Argentina), Rodolfo
Faloh Bejerano (Cuba) e Tatiana Láscaris (Costa Rica).
Uma das atividades mais importantes da Altec
tem sido a realização de um evento bienal sobre os
temas relevantes de gestão tecnológica na América
Latina e Península Ibérica, com sede nos distintos
países no seu âmbito de atuação. A trajetória dos dez
eventos promovidos pela Altec ao longo da sua
história é a seguinte: 1985 Brasil, 1987 México,
1989 Argentina, 1991 Venezuela, 1993 Colômbia,
1995 Chile, 1997 Cuba, 1999 Espanha, 2001 Costa
Rica e 2003 México.
Para 2005, atendendo à proposta da Assembléia
Geral de Associados reunida no México, em 2003, a
Junta Diretiva aprovou a realização do XI Seminário
no Brasil, tendo como tema central Inovação
Tecnológica, Cooperação e Desenvolvimento. O
evento deverá ser organizado por um conjunto de
instituições líderes no campo da Política e Gestão da
Inovação Tecnológica no Brasil e será realizado em
Salvador, Bahia, atendendo a um forte desejo de
várias instituições locais e das excepcionais condições
de desenvolvimento da região nos últimos anos.
Tendo como eixo central o tema definido, o seminário terá por objetivo apresentar as últimas tendências, linhas de pensamento e experiências que têm se
desenvolvido no âmbito ibero-americano em inovação e gestão tecnológica, com a intenção de:
• gerar um diálogo aberto que incida no processo de
definição das diretrizes que vão marcar o desenvolvimento do tema na região ibero-americana;
• apoiar a geração de um pensamento ibero-americano sobre problemas relacionados com a inovação por meio da discussão de metodologias,
enfoques e conceitos;
• partilhar experiências de diferentes países e
setores para aprender das mesmas e apoiar o
desenvolvimento tecnológico;
• brindar aos representantes acadêmicos, de negócios, assim como dos setores governamental e
privado, com ferramentas novas que permitam
compreender a importância do uso da ciência e
da tecnologia para promover e fomentar o desenvolvimento das economias regionais e partilhar
os avanços alcançados na matéria.
Como é de tradição, no Seminário Altec 2005
poderão participar especialistas e dirigentes das organizações do sistema de inovação, executivos de empresas,
diretores de marketing, produção, tecnologia e finanças,
diretores e especialistas de pesquisa e desenvolvimento,
gerentes de projetos, representantes de agências governamentais, professores e estudantes universitários que
estejam vinculados às áreas de inovação tecnológica dos
setores público e privado.
LEITURA RECOMENDADA
Ex-ministro Paulo Renato Souza
lança livro sobre as recentes
transformações na educação.
Publicado pela editora Pearson Education, o livro intitulado A revolução gerenciada mostra as mudanças
operadas na educação brasileira entre 1995-2002. Dividida em oito capítulos, a obra conta como o
governo e a sociedade se uniram para em oito anos empreender uma verdadeira revolução em todos os
níveis da educação brasileira, tendo como base um tripé formado por informação, avaliação e comunicação.
Para tanto, aborda diversos tópicos - alguns bastante polêmicos, como o Provão - que foram fundamentais
para o êxito do processo de mudança.
Escrito de maneira bastante fluente e rico em detalhes - traz, por exemplo, algumas situações de
bastidores que envolveram as principais medidas adotadas -, o livro possui fotos que contextualizam o
momento político abordado, além de tabelas e figuras que mostram dados comparativos, permitindo uma
completa visualização das mudanças.
No prefácio assinado por Fernando Henrique Cardoso, ele afirma que basta ler este livro para comprovar a
veracidade das mudanças: “Havia uma revolução silenciosa em marcha na educação brasileira. Se algum dia for
possível publicar as anotações que tomei no dia-a-dia da Presidência, será provado que fiquei, desde o início,
positivamente surpreendido com a ação intelectual e administrativa de Paulo Renato”, diz ele em seu texto.
PAULO RENATO SOUZA
Editora Pearson Education
São Paulo, 2004
264 páginas, R$ 49,90
Governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin cumprimenta
ex-ministro Paulo Renato Souza em noite de autógrafos.
(Divulgação)
SOBRE O AUTOR
Ministro da Educação entre 1995 e 2002,
Paulo Renato Souza é doutor em economia pela
Unicamp — instituição da qual foi reitor de
1986 a 1990. Na vida pública, exerceu vários
cargos técnicos e administrativos, entre eles o
de secretário da Educação de São Paulo. Foi
também gerente de operações e vice-presidente
do Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID). Atualmente está à frente da Paulo Renato
Souza Consultores, uma empresa de consultoria
que tem como objetivo assessorar seus
clientes em temas estratégicos e econômicos
relacionados à educação.
FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
37
INOVAR É PRECISO,
IMPROVISAR NÃO É PRECISO
FAT - FUNDAÇÃO DE APOIO À TECNOLOGIA
Por GUILHERME ARY PLONSKI [IPT]
A inovação vem sendo crescentemente invocada como mecanismo básico para redimir empresas, regiões e nações de suas crônicas aflições econômicas. Nesse sentido, a busca de políticas
eficientes de estímulo à inovação tornou-se, a partir dos anos 1990, um dos eixos estruturantes da Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Ecônomico (OCDE), que abrange 30 países comprometidos com a democracia pluralista e a economia de mercado.
Essa proposição vem ganhando projeção no Brasil principalmente a partir de 2001, como decorrência da mobilização
associada à Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e
Inovação, realizada em setembro daquele ano. A atual administração federal ratificou e, até certo ponto, amplificou essa projeção
pela inclusão da dimensão tecnológica em um dos carros-chefe da
política econômica, que é a Política Industrial, Tecnológica e de
Comércio Exterior. Das cinco linhas de ação para a implantação
dessa política, a primeira focaliza, justamente, a inovação e o
desenvolvimento tecnológico.
Há desafios coletivos para que essa linha de ação gere resultados
efetivos. Um deles é construir uma percepção compartilhada de que
o progresso técnico pode ser acelerado quando o processo de inovação é entendido como fenômeno sociotécnico (e não só técnico)
complexo, que precisa ser gerenciado estrategicamente. Isso requer
o desenho e a validação, pelos agentes relevantes, de um mapa cognitivo abrangente em vez de paroquial, baseado em evidências e não
reflexo de preconceitos.
Entre os desafios nesse campo, destacam-se três pela sua atualidade:
A) COMPREENDER EM PROFUNDIDADE E APLICAR O CONCEITO DE SISTEMA
DE INOVAÇÃO. Isso implica identificar modos diversos de produção do conhecimento. Não faz mais sentido restringir-se ao clássico modelo linear, que parte da pesquisa
‘pura’ e chega até novos produtos no mercado. Decorrem dele conceitos obsoletos,
ainda que correntes, como o de que a ‘transferência de tecnologia’ é o epicentro do
processo de inovação. Há outros modos de produção do conhecimento, igualmente
rigorosos, que partem da busca de soluções para questões de interesse da sociedade ou
de seus segmentos. É preciso reconhecer sua legitimidade, apreciar sua relevância e
estabelecer mecanismos de estímulo que levem em conta a sua singularidade.
B) EVITAR O REDUCIONISMO SIMPLIFICADOR QUE CONCENTRA NA EMPRESA O ALFA E O ÔMEGA DA INOVAÇÃO. Inovar requer jogo de equipe, em que a
improvisação apenas complementa o planejamento e a coordenação das ações entre os
agentes. É evidente que as empresas têm um papel protagonista. Todavia, como
demonstram casos de referência no País – da gigantesca Petrobras à média Vallée e ao
Programa de Pobreza e Meio Ambiente da Amazônia (Poema) – as empresas inovadoras estabelecem parcerias estratégicas ativas com outros agentes qualificados –
insti-tuições de ensino superior e médio, institutos de pesquisa tecnológica, organizações não-governamentais, entidades do sistema financeiro, empresas de consultoria e
de prestação de serviços especializados, sociedades profissionais e outras. Situação similar ocorre no exterior. Uma ilustração do potencial da ‘parceria público-privada’
emana do conhecido estudo pelo qual a National Science Foundation dos Estados
Unidos mostrou que 73% da base de
conhecimento que sustentava a reivindicação de patentes depositadas
naquele país por empresas decorriam
da pesquisa pública.
38
DEZ'2004 e JAN/FEV'2005
C) ACOMPANHAR AS TENDÊNCIAS DE REFORMULAÇÃO DA DIVISÃO SOCIAL DE PAPÉIS
DAS EMPRESAS NO SISTEMA DE INOVAÇÃO. Contrariamente ao senso comum, as inovações radicais são, cada vez mais, fruto de empresas de pequeno porte.
Freqüentemente são firmas nascentes, geradas por empreendedores tecnológicos.
Elas estão tipicamente abrigadas em incubadoras, nas quais ingressaram após
rigoroso processo seletivo e onde contam com forte suporte. Às empresas de
grande porte cabe, nessa divisão de papéis, identificar novos empreendimentos
alinhados com suas macroestratégias, provendo-os de componentes críticos do
processo (inovação incremental) que vão além da chispa genial: engenharia do
produto, excelência na produção, credibilidade e logística de distribuição, capital para adquirir rapidamente porte compatível com o mercado. Algumas
empresas transnacionais inovadoras criaram núcleos que funcionam como radar,
perscrutando sistematicamente hábitats de inovação selecionados, na captura de
oportunidades dessa natureza.
Talvez possamos aprimorar o tratamento da inovação inspirando-nos em doutrinas que se mostram bem-sucedidas em outros
campos. Exercitando com doutrinas do campo da saúde, emergem
alguns aforismos. A inovação tem baixo efeito se for um ato esporádico, devendo ser um estilo de atuação permanente. Não é suficiente
para uma organização ser inovadora, é necessário que o seu entorno
também o seja. A atenção à inovação se beneficia de apoio profissional qualificado. Um sistema de apoio à inovação deve conter iniciativas de atenção primária (por exemplo, de tecnologia industrial básica
– TIB), secundária (por exemplo, desenvolvimento, engenharia e tecnologia de gestão) e terciária (por exemplo, pesquisa avançada, TIB
high tech e capital de oportunidade). Quando se percebem os problemas
decorrentes da falta de inovação, por vezes já é tarde demais. Inovação
sustentada não é fruto de improviso, mas de planejamento cuidadoso
e operação competente.
GUILHERME ARY PLONSKI
[email protected]
Diretor Superintendente do Instituto de
Pesquisas Tecnológicas - IPT.
Prof. da Universidade de São Paulo - USP.
Vice-presidente da Associação Nacional de
Entidades Promotoras de Empreendimentos
Inovadores - Anprotec.
Atendimento diferenciado de cada projeto de assessoria, ensino, pesquisa
e treinamento. A partir do conhecimento e análise dos problemas e das necessidades da organização, a FAT propõe, desenvolve e implanta soluções específicas
para cada caso, desenvolvendo projetos sob encomenda.
A FAT posiciona-se, assim, na vanguarda do conhecimento técnico e tecnológico,
estando capacitada para desenvolver estudos e prestar serviços nas mais variadas
áreas do conhecimento: educação, saúde, indústria e meio ambiente, entre outras.
• Cursos - Especialização,Atualização e Capacitação • Prestação de Serviços nas
áreas da Educação, Saúde, Meio Ambiente,Transportes e Indústria, entre outras
(Hannover, Alemanha, 14/05/2000. Foto: Lalo Almeida/ Folha Imagem)
EXPO são séries de exposições mundiais realizadas periodicamente, em diferentes cidades
do mundo, com o objetivo de divulgar novas tecnologias. Na primeira edição, em 1851, em
Londres, por exemplo, foi montado o Palácio de Cristal. Em 1876, na Filadélfia, Graham Bell
mostrou ao mundo o seu telefone, ocasião em que D. Pedro II também visitava a feira. Em
Paris, 1889, foi construída a torre Eiffel, uma das mais originais edificações de todas as
Exposições Universais até hoje realizadas. Nessa mesma mostra, foi apresentado o fonógrafo de Thomas Edison. A última foi em 2000, em Hannover (Alemanha) e a próxima será
em 2005, em Aichi (Japão) e terá como tema principal “a sabedoria da natureza”.
• Concursos - Vestibular, Vestibulinhos e outros • Apoios a Eventos e Publicações
SEDE: Rua Três Rios, 131 - cj. 42 - Bom Retiro - São Paulo - SP - CEP 01123-001
Telefones: (11) 3313-1200 / 3315-9511/ 228-8373 - [email protected]
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Com o Programa Universidades Banespa, o ensino superior no Brasil vem ganhando mais
conteúdo, mais incentivo e mais modernização. Por meio deste programa, o Banespa faz parceria
com instituições universitárias, destinando recursos para que se atualizem tecnologicamente e
desenvolvam programas educacionais inovadores. Hoje já são dezenas de universidades conveniadas
que estão beneficiando toda a sua comunidade com esse apoio. Programa Universidades Banespa.
Porque incentivar o Ensino Superior faz parte da nossa história.
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