Juliana Alves dos Santos, Maria Cristina Perusi

Transcrição

Juliana Alves dos Santos, Maria Cristina Perusi
http://6cieta.org
São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.
ISBN: 978-85-7506-232-6
ANTROPOSSOLOS E URBANIZAÇÃO DE RISCO:
ESTUDO DE CASO NO SÍTIO JOANINHA, REGIÃO
METROPOLITANA DE SÃO PAULO
Juliana Alves dos Santos
Mestranda em Geografia pela FCT/Unesp Campus de Presidente Prudente
[email protected]
Maria Cristina Perusi
Unesp/Câmpus de Ourinhos
[email protected]
INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
A revolução técnica científica deixou ainda mais complexa a relação entre a
sociedade e o meio natural. O aumento da interação matéria e energia reforça o impacto
geral do homem sobre a natureza, enquanto a capacidade da própria natureza para
reproduzir os recursos intensamente explorados e absorver os resíduos inevitavelmente
produzidos, encontra-se limitada (GUERASIMOV, 1983).
Atualmente, nas cidades, se materializam inúmeras situações que representam a
dificuldade de se conciliar um processo de urbanização que garanta, ao mesmo tempo, boas
condições de habitação e a proteção das paisagens naturais ou pouco transformadas pela
ação antrópica. Em partes, essa dificuldade se deve à desarticulação entre políticas públicas,
urbana e ambiental. Entende-se que essa desarticulação é consequência de uma herança
colonial, na qual a ação política ocorria pela conquista de espaços e da expansão territorial
de tal modo que o território, e não a população acabou sendo a prioridade das políticas
públicas. (MORAES, 1999)
Nestes países, mais do que em qualquer outra parte, o Estado aparece antes de
tudo como um organizador do espaço, um gestor do território. Por isso, a prática
estatal manifesta-se fortemente em suas histórias enquanto políticas territoriais,
isto é, como ações de modelagem e produção de espaços. A dotação de
infra-estruturas, a normalização dos usos do solo, a regulação da propriedade
fundiária, a distribuição das populações, tudo se enfeixa na atuação
governamental. (MORAES, 1999, p. 44)
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Dessa maneira, o nexo articulador de diferentes políticas públicas era o território
e não a população "[...] o país sendo visto como um espaço (e não como uma nação)"
(MORAES, 1999, p. 44). Ao conceber nação como país, as políticas públicas tiveram como
foco o território, e não a população. O resultado disso pode ser ainda sentido quando acaba
por gerar objetivos conflitantes, mesmo quando o que se almeja são resultados
semelhantes e até complementares, como ocorre com as políticas públicas urbanas e
ambientais, como se verá adiante.
Moraes (2011) ao tratar da elaboração do Plano Nacional de Saneamento Básico,
afirma que quatro políticas públicas setoriais ganham especial importância: a política
pública urbana, de saúde, de meio ambiente e a de recursos hídricos, mas aponta a falta de
coordenação entre elas afirmando que:
Cada um desses setores elabora planos, programas e ações com estratégias de
planejamento e execução variadas e muitas vezes contrastantes, não sendo raro
que os resultados de uma política apareçam como problemas para a outra. Um
modelo de planejamento com diretrizes trans-setoriais (e com fóruns
interinstitucionais
de
coordenação)
ainda
é
pouco
praticado
no
país,
prevalecendo uma atuação autônoma de cada setor. (MORAES, 2011, p. 70)
Por tal situação é que se torna complexo conciliar a Lei do Estatuto das Cidades
no. 10.257/ 2001, que objetiva "o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a
garantia ao direito a cidades sustentáveis" (ESTATUTO DAS CIDADES, 2001, p. 09) com a Lei
nº. 12.651/12 que por meio da Lei Federal nº 7.803/89 inviabiliza a melhoria das condições
de saneamento ambiental em áreas de proteção ambiental ocupada por assentamentos
irregulares1.
Lei Federal n° 7.803/89, repleta de bons princípios e intenções, estende a
aplicação do Código Florestal às áreas urbanas (acrescenta parágrafo único ao
art. 2º do Código Florestal). Aí se verifica uma evidente tensão com as ZEIS: como
a única situação admitida nas margens de rios e córregos – Áreas de Preservação
Permanente (APPs) é a preservação da vegetação natural, resulta na proibição
de qualquer tipo de implantação (inclusive infra-estrutura de saneamento e
drenagem / contensão de erosão). (MARTINS, 2006, p.30)
Assim, a questão ambiental urbana é consequência da falta de política pública
de habitação de interesse social e da intensidade e distribuição do uso do solo (MARTINS,
1
Assentamentos irregulares para Martins (2006) são aqueles que estão em desacordo com o que a legislação
urbanística ou ambiental considerou adequado, apesar da complexidade que envolve a noção de regularidade que a
própria autora trata em seu trabalho.
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2006). Pode se somar a isso a desarticulação entre políticas públicas diferentes. É a partir
dessas contribuições e reflexões que se pretende compreender o histórico do assentamento
Sítio Joaninha e do seu entorno em Diadema e São Bernardo do Campo na Grande São
Paulo (Mapa 01).
Mapa 1. Localização aproximada do Sítio Joaninha em relação à Região Metropolitana de São Paulo
Fonte: http://www.stm.sp.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2024&Itemid=201
Segundo Rolnik (2000) o município de Diadema, durante as décadas de 1960 e
1970, ao se integrar a industrialização que ocorria na RMSP, atrai migrantes de baixa renda.
O Plano Diretor de 1973 regulou o uso do solo da cidade destinando mais de dois terços das
áreas melhor urbanizadas para usos industriais, ao passo que a Lei de Proteção aos
Mananciais de 1976 excluiu pouco mais de 23% da área do município de qualquer uso
urbano, menos o de alta renda com baixíssima densidade. Como consequências imediatas,
a autora aponta ter havido excesso de terra para uso industrial o que gerou a escassez de
áreas na cidade para uso residencial ou outros.
Essa equação, num contexto de altos índices de crescimento demográfico
(20,42% por ano nos anos 60 e 11,23% nos anos 70) provocaram uma expansão
periférica, ocupando áreas não urbanizadas, e consumindo vorazmente toda a
terra não destinada para usos industriais, inclusive as áreas de preservação
ambiental. Sem outra alternativa, com uma oferta quase inexistente de zonas
destinadas para os pequenos lotes residenciais de baixa renda, a expansão
urbana foi, em sua maior parte, irregular,feita por mercados informais que não
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se adequavam a qualquer padrão de urbanização. O resultado foi que no início
dos anos 80 apenas 30% das ruas existentes eram pavimentadas, 50% dos
domicílios estavam conectados à rede de água, e a taxa de mortalidade infantil
era de 83/1000. (ROLNIK, 2000, p.6).
Por isso, as áreas protegidas pela legislação ambiental afastou o mercado
imobiliário formal, de tal modo que se converteram em áreas para as quais se dirigiram a
população de baixa renda, sem nenhuma intervenção do poder público quanto à
urbanização, produzindo nesse contexto, um processo de urbanização de risco.
Tal processo apresenta inseguridade da construção, da condição jurídica da
posse do terreno e se dá em áreas ambientalmente frágeis como encostas íngremes, beiras
de córregos, áreas alagadiças. Essas áreas ambientalmente frágeis são convertidas em áreas
de riscos. (ROLNIK, 2000, p. 02)
As terras onde se desenvolvem estes mercados de moradia para os pobres são,
normalmente, justamente aquelas que pelas características ambientais são as
mais frágeis, perigosas e difíceis de ocupar com urbanização: encostas íngremes,
beiras de córregos, áreas alagadiças. As construções raramente são estáveis, e a
posse quase nunca totalmente inscrita nos registros de imóveis e cadastros das
prefeituras. O risco é, antes de mais nada, do morador: o barraco pode deslizar
ou inundar com chuva, a drenagem e o esgoto podem se misturar nas baixadas
– a saúde e a vida são assim ameaçadas. No cotidiano, são as horas perdidas no
transporte, a incerteza quanto ao destino daquele lugar, o desconforto da casa e
da rua. Mas, neste caso, o urbanismo é de risco para a cidade inteira: por
concentrar qualidades num espaço exíguo e impedir que elas sejam partilhadas
por todos, os espaços melhor equipados da cidade sentem-se constantemente
ameaçados por cobiças imobiliárias, por congestionamentos, por assaltos.
É nesse contexto que se insere o Sítio Joaninha (Figura 01) cuja ocupação, no
início da década de 1980, ocorria em áreas de mananciais da RMSP, precisamente sobre o
reservatório Billings.
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Figura 01. Sítio Joaninha e entorno em Diadema - RMSP
Fonte: : Ortofoto Emplasa 2010/2011
Trata-se de população localizada no que Ab'Saber (2012, p. 17) chamou de
Domínios da Natureza dos Mares de Morro, sendo áreas constituídas por:
Setores de vales, com esporões sucessivos ou escalonados, interpenetrados
pelas águas de grandes reservatórios construídos por companhias hidrelétricas
brasileiras, constituindo reservas de espaços para povoamento de weekend,
road setlement e para lazer.
Conforme o referido autor, o equilíbrio entre morfogênese, clima e pedogênese
nesse domínio natural é bem sutil, e pode representar grandes fragilidades do ponto de
vista ambiental que por sua vez se traduz em situação de risco e vulnerabilidade social por
tudo o que já foi exposto.
PROCEDIMENTO METODOLÓGICO
O questionário foi aplicado durante o período de fevereiro a maio de 2014 e é
composto por 20 questões abertas e fechadas. As perguntas foram agrupadas segundo dois
temas: condições socioeconômica e socioambiental. No total foram entrevistadas 72
famílias2. Com esse procedimento foi possível avaliar as condições sanitárias, de segurança
2
Em entrevista com o presidente da Associação de moradores foi afirmado que residem no Sítio Joaninha
aproximadamente 800 famílias, os dados oficiais da prefeitura de Diadema apontam para 500.
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das edificações da área de estudo e, sobretudo, como era o objetivo do questionário, foi
possível identificar os moradores que estão habitando o perímetro compreendido pelo
antigo lixão, que totalizam por volta de 30 famílias já no município de São Bernardo do
campo.
RESULTADOS
Os resultados apresentados se referem à aplicação dos questionários para
identificar os moradores residentes sobre esse passivo ambiental. As informações
explicitam a precariedade das condições de saneamento básico da população manifestado
no dado de que 100% dos entrevistados não têm acesso a serviços básicos de saneamento
ofertados por agentes públicos ou em consórcio com empresas privadas.
Falta-lhes água encanada, rede e tratamento de esgoto, como se pode observar
nas Fotos 01 e 02, além da captura das águas pluviais.
Foto 01: Rede de encanamento de água
improvisada por moradores
Foto 02: Esgoto lançado à céu aberto - Sítio
Joaninha
Foto: Santos (2014)
Foto: Santos (2014)
A prestação de serviços de energia elétrica foi disponibilizada há menos de dois
meses. O fornecimento de água se dá pela distribuição por caminhão pipa ou por
improvisação de rede de encanamento feita pelos moradores (Fotos 03 e 04).
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Foto 03: Caminhão pipa que abastece a população
do Sítio Joaninha
Foto 04: Lançamento de águas servidas
(esgoto) a céu aberto
Fotos: Santos (2014)
As perguntas posteriores trataram diretamente das condições de saneamento
básico da área de estudo. A Tabela 01 mostra as respostas para perguntas como: possui
água encanada em sua residência? Drenagem das águas pluviais? Coleta e tratamento de
esgoto? Dentre outras.
Tabela 01 - População entrevistada atendida por serviços de saneamento básico
Serviços prestados
Oferta de água encanada
Drenagem das águas pluviais
Coleta e tratamento de esgoto
Coleta de lixo
Água fornecida por caminhão pipa
Energia elétrica
Pavimentação das vias
Total de entrevistados
Sim
13
0
0
66
42
63
0
72
%
18
0
0
92
59
87,5
0
Sobre os dados é necessário fazer algumas ponderações: os moradores que
afirmaram ter água encanada em suas residências a tem de modo improvisado pois não há
empresa pública ou em consórcio com o poder municipal que oferte esse serviço. A maior
parte dos moradores entrevistados tem acesso a água potável por meio do caminhão pipa.
Sobre a coleta de lixo, 92% dos entrevistados são atendidos por esse serviço,
mas houve descontentamento generalizado quanto a periodicidade com que o caminhão
coletor passa e com a qualidade dos serviços como se pode observar nas Tabelas 02 e 03.
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Tabela 02 - Periodicidade da coleta lixo
Periodicidade da coleta de lixo
3x por semana
Menos de 3 vezes por semana
Irregular
Não respondeu
Total
Frequência
19
43
02
02
66
%
29
65
3
3
100
Tabela 3: Qualidade dos serviço de coleta segundo os entrevistados
Qualidade do serviço de coleta de lixo
Boa
Regular
Ruim
Não respondeu
Total
Frequência
19
20
26
01
66
%
29
30
40
1
100
Alguns moradores afirmaram que é comum passarem mais de 15 dias sem
coleta dos resíduos, e que a passagem do caminhão muitas vezes fica condicionada às
condições atmosféricas, tendo em vista o fato de que em dias de chuvas intensas os
caminhões não conseguem subir em decorrência dos aclives acentuados não serem
pavimentados, quando isso acontece o meio de eliminar o lixo é queimando-o. Seis
entrevistados afirmaram não ter coleta de lixo. Foi identificado que esses moradores estão
na porção do entorno da área de estudo que se encontra no município de São Bernardo de
Campo (SBC). A presença inconstante da coleta dos resíduos produzidos pela população
local acarreta em sérios riscos à saúde, contamina os solos, a água e também contribui para
poluição visual do local como demonstram as Fotos 05 e 06.
Foto 05: Depósito de antropossolo líxico na área
de estudo
Foto 06: Vista parcial do Sítio Joaninha
evidenciando aspectos da urbanização de risco
Fotos: Santos (2014)
Os entrevistados responderam, também, sobre a presença de animais e/ou
vetores causadores de doenças como expõe a Tabela 04.
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Tabela 04: Presença de vetores causadores de doenças
Animais espécie
Ratos
Baratas
Cobras
Escorpiões
Outros (carrapatos incluindo estrela e aranhas)
Total de entrevistados
Frequência
61
57
58
07
04
72
%
85
80
81
10
6
Como mais um indicador da presença do antigo lixão, sua delimitação espacial e
a caracterização dos antropossolos líxicos, os participantes também responderam se viam
com frequência materiais antrópicos como "sacolinhas de supermercado, tijolos, plásticos"
ou materiais de outra natureza. Dois moradores afirmaram que se cortaram ao manipular o
piso de suas residências. Como se observa pela Tabela 05, a maioria dos entrevistados
respondeu afirmativamente a essa questão:
Tabela 05: Identificação de materiais antropizados no solo
Materiais antropizados no solo
Sim
Não
Não respondeu
Total
Frequência
47
24
01
72
%
65,28
33,33
1, 39
100
Durante os trabalhos de campo foi possível encontrar diferentes locais com
materiais antropizados incorporados aos perfis de solo. Um morador disse que já viu
mangueira e até seringa na terra. Na Foto 07 há indicador de camada antrópica, linha
pontilhada, conforme caracterização dos antropossolos pela Embrapa (2004). Também se
observa variações nas cores, seta amarela, que podem decorrer da introdução desses
materiais.
Foto 07: Perfil de solo exposto com materiais
antrópicos incorporados
Foto 08: Destaque para materiais antrópicos no
solo.
Fotos: Santos (2014)
As fotos 08 e 09 destacam a camada antrópica e seus materiais.
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Foto 09: Destaque para materiais antrópicos no solo.
Foto: Santos (2013)
Como o estudo do meio evidenciou, as condições de saneamento são precárias.
A população habita área de passivo ambiental, pois se trata de lixão com o agravante de
estar apenas 10 km da captação de água pela SABESP no Rio Grande (PREFEITURA DE SÃO
BERNARDO DO CAMPO, 2010) portanto, localizado em área de manancial (Figura 02).
Figura 02. Localização do Antigo Lixão do Alvarenga na Bacia Hidrográfica do reservatório Billings.
Fonte: Prefeitura de São Bernardo do Campo (2010)
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A Lei Estadual 898/75 e o Código Florestal foram bem restritivas com relação às
intervenções no uso do solo das áreas de mananciais, fato que resultou na proibição de
intervenção de obras de melhorias sanitárias para a população que vive na área de estudo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Abordar
todos
os
fatores
que
originaram
a
paisagem
estudada
é
empreendimento laborioso, dada complexidade das interações entre as variáveis envolvidas
no processo. Por este motivo, o presente trabalho almeja apontar alguns caminhos a fim de
se aproximar de um entendimento mais profundo da realidade do Sítio Joaninha,
vislumbrando estender esse entendimento para outras áreas de assentamentos irregulares
na metrópole paulista.
Com isso procurou-se esboçar alguns reflexões para uma abordagem inicial da
problemática apresentada: desarticulação entre a política urbana e ambiental e a
precariedade no processo de urbanização dela decorrente.
Considerou-se importante a noção de que as políticas públicas no Brasil podem
carregar em si a herança colonial de se praticar política, que ao priorizar o espaço ao invés
da população, corroborando com a literatura citada, tem provocado o conflito entre os
objetivos de políticas públicas com finalidades semelhantes: de um lado tem se Estatuto das
Cidades que busca democratizar o acesso ao uso do solo urbano e a garantia de cidades
sustentáveis, e de outro o artigo 2º do Código Florestal que proíbe qualquer intervenção em
áreas de mananciais e que somada a inflexibilidade da leia frente a realidade no caso do
Sítio Joaninha, e seu entorno, significou uma privação nefasta às condições salubres e dignas
de habitação e saneamento.
A partir do exposto, é possível repensar aquela velha máxima de que os
problemas ambientais das cidades, se assim pode-se chamá-los, como as inundações, os
escorregamentos de terras, a ausência de saneamento básico nas moradias precárias e
tantos outros, existem por causa do crescimento desordenado e da falta de planejamento
adequado. Se assim fosse, a presença do poder público atuando por meio do planejamento
ou das políticas públicas, livraria as cidades das mazelas presente em seu cotidiano. Porém,
como se viu a exemplo de Diadema da década de 1970, pode mesmo ocorrer o contrário:
quando a ação ou presença do Estado por meio da legislação, no caso do Plano Diretor
principalmente, orienta o uso do solo urbano para determinados fins que não o que
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assegura o uso do solo para habitação de interesse social nas boas áreas da cidade o que se
vê é a própria legislação - e a intervenção do poder público - gerando os assentamentos
irregulares das cidades.
Por tudo isso, o Sítio Joaninha em Diadema e suas imediações, em São Bernardo
do Campo, são resultado de todo esse processo marcado pelo descompasso entre políticas
públicas, que resulta na urbanização de risco, onde o antropossolo líxico é um indicador da
dificuldade de se assegurar para alguns cidadãos em parcelas específicas da sociedade, o
acesso ao saneamento básico e por conseguinte, a universalização dessa condição
indispensável para a garantia da tão desejada cidade sustentável.
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SÍTIO JOANINHA, REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO
EIXO 4 – Problemas socioambientais no espaço urbano e regional
RESUMO
Os Antropossolos podem ser considerados como a materialização da sociedade, ou do que ela
produz, na pedosfera, sobretudo num momento altamente tecnificado como o atual, caracterizado
pelo intenso consumo de produtos que vão desde os orgânicos, passando por metais pesados,
até material radioativo. Dentre os Antropossolos, os líxicos, representados pelo acúmulo de
resíduos sólidos urbanos (RSU), seja na forma de lixões, aterros controlados ou sanitários,
evidenciam o modo inadequado como o meio recebe os resíduos, frutos da atividade antrópica.
Além disso, outro aspecto a ser destacado é a intrínseca relação dos antropossolos com a
ocupação de risco, bem espacializada em considerável parcela da Região Metropolitana de São
Paulo (RMSP). Diante disso, o objetivo desse trabalho é avaliar as condições socioambientais dos
moradores do Sítio Joaninha, comunidade na área limítrofe entre Diadema e São Bernardo do
Campo (RMSP), habitada por aproximadamente 500 famílias, que abrigou durante o período de
1972 a 2001 o lixão do Alvarenga, com pouco mais de 208.000 m², que desde o início da década
de 1970 recebeu aproximadamente 2 milhões de toneladas de lixo. Quando de sua desativação,
sobre esse passivo e imediações, implantaram-se moradias que atualmente abrigam alguns
antigos catadores que nele trabalhavam. Nessa etapa da pesquisa foram aplicados 72
questionários apenas com os moradores residentes exatamente sobre o lixão. Os resultados
revelam que 100% dos entrevistados não têm acesso à serviços básicos de saneamento básico
ofertados por agentes públicos ou em consórcio com empresas privadas. Falta-lhes água
encanada, coleta regular de lixo, rede de esgoto e seu tratamento, bem como não há rede de
captação das águas pluviais. A prestação de serviços de energia elétrica foi disponibilizada entre
fevereiro e março de 2014. O fornecimento de água se dá pela distribuição por caminhão pipa ou
por improvisação. Toda essa situação evidencia uma condição de urbanização de risco do Sítio
Joaninha. As condições de salubridade são precárias como os antropossolos líxicos evidenciam.
Palavras-chave: antropossolos líxicos; saneamento básico; urbanização de risco.
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