PROPRIEDADES QUÍMICAS DO SOLO

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PROPRIEDADES QUÍMICAS DO SOLO
PROPRIEDADES QUÍMICAS DO SOLO
Luciano Colpo Gatiboni*
ÍNDICE
1 – INTRODUÇÃO........................................................................................................... 2
2 ÁREA SUPERFICIAL ESPECÍFICA........................................................................... 3
3 CARGAS ELÉTRICAS................................................................................................. 4
3.1 Origem das cargas elétricas............................................................................... 5
3.2 Ponto de carga zero........................................................................................... 8
3.3 Dispersão e floculação....................................................................................... 9
4 ADSORÇÃO E TROCA DE ÍONS............................................................................... 11
4.1 Energia de ligação entre colóides e íons........................................................... 11
4.2 Poder tampão do solo........................................................................................ 15
4.3 Determinação da CTC....................................................................................... 16
5 ACIDEZ DO SOLO....................................................................................................... 17
5.1 Introdução.......................................................................................................... 17
5.2 Origem da acidez do solo.................................................................................. 19
5.3 Componentes da acidez do solo........................................................................ 21
5.4 Parâmetros da acidez do solo............................................................................ 23
5.5 Interpretação dos resultados de acidez do solo.................................................. 25
6 SOLOS ALAGADOS E SOLOS AFETADOS POR SAIS........................................... 27
6.1 Modificações químicas em solos alagados........................................................ 27
6.2 Modificações químicas em solos afetados por sais........................................... 28
7 BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA............................................................................ 29
* Eng. Agr., Dr., Professor substituto do Departamento de Solos da UFSM.
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PROPRIEDADES QUÍMICAS DO SOLO
1 – INTRODUÇÃO
O sistema solo está constantemente em atividade química, onde inúmeras reações se
processam ao mesmo tempo dentro de cada uma de suas fases (sólida, líquida e gasosa), entre elas e
delas com o ambiente.
Devido a sua alta reatividade, a maioria dos fenômenos químicos ocorre nas partículas
menores do solo, chamada fração coloidal. Os colóides do solo, que compreendem as partículas
com diâmetro entre um mícron e um nanômetro (Figura 1), são compostos principalmente pelas
argilas do solo e pela fração mais reativa da matéria orgânica (ácidos húmicos e fúlvicos). Partículas
menores que um nanômetro são chamadas de solutos e compreendem as moléculas de tamanho
médio a pequeno, os íons e os átomos (Figura 1).
A fração coloidal do solo é bastante heterogênea, pois é constituída de diferentes espécies
de minerais e materiais orgânicos e, ainda, está no solo em meio a partículas maiores, como silte e
areia. Mas, mesmo assim, não deixa de expressar suas características químicas.
Figura 1 – Distribuição esquemática dos constituintes do solo segundo seu tamanho.
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Como a fase líquida do solo funciona como uma intermediária entre a fase sólida e a
planta, neste capítulo serão abordadas as principais propriedades químicas e fenômenos físicoquímicos ocorrentes na interface sólido-solução do solo.
2 – ÁREA SUPERFICIAL ESPECÍFICA
A área superficial específica (ASE) é a medida da área da superfície das partículas por
unidade de peso (expressa em metros quadrados por grama). A ASE de uma massa de partículas
aumenta proporcionalmente com a diminuição do diâmetro dela, conforme ilustrado na Figura 2.
Figura 2 Aumento da área superficial específica de um cubo com sua divisão em
unidades menores.
A Tabela 1 ilustra o aumento da ASE à medida que um cubo de um centímetro de aresta e
de massa um grama é subdividido em partículas da mesma forma. Pode ser observado que um
grama de argila poderá representar uma ASE cerca de mil vezes maior do que um grama de areia.
No solo as diferenças são em geral maiores, pois podem existir argilominerais expansíveis, como a
montmorilonita, que além das superfícies externas têm superfícies internas situadas entre as
camadas do mineral, o que provoca aumento da ASE. Assim, dependendo da composição
mineralógica do solo, há variações substanciais na sua área superficial específica.
A ASE, embora sendo uma característica física, afeta diretamente as propriedades
químicas do solo, pois, de maneira geral, quanto maior a ASE, maior será a reatividade das
partículas de solo devido à sua maior área de contato com a fase líquida do solo (local onde ocorrem
os principais fenômenos físico-químicos).
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Tabela 1 Relação hipotética entre o tamanho médio das partículas e a área superficial
específica em 1 grama de solo.
Aresta da partícula
(mm)
10
1
3
Número de
partículas
ASE
(m2 g-1)
0,0006
Fração do solo
correspondente
Cascalho
1
1.000
0,006
Areia grossa
0,1
1.000.000
0,06
Areia fina
0,01
1.000.000.000
0,6
Silte
0,001
1.000.000.000.000
6
Argila
CARGAS ELÉTRICAS
As cargas elétricas do solo são fundamentais para a sustentação do crescimento e
desenvolvimento das plantas porque são elas as responsáveis pela retenção dos nutrientes essenciais
no solo. Se isso não ocorresse, os nutrientes seriam levados pela água que infiltra no solo durante as
chuvas (processo conhecido como lixiviação). Por causa das cargas, especialmente dos
argilominerais e matéria orgânica, o solo funciona como um reservatório que estoca nutrientes,
liberando-os para a solução do solo em pequenas quantidades, de onde as plantas podem absorvêlos.
As estruturas dos minerais do solo não são perfeitas, ocorrendo falhas, distorções e
substituições de átomos dentro da rede cristalina. Esses defeitos internos da estrutura cristalina
geralmente resultam em desbalanços elétricos dos minerais, fazendo com que apresentem,
permanentemente, cargas, as quais irão se manifestar na superfície dos minerais.
Os minerais das frações silte e areia, devido ao seu maior tamanho e menor ASE, não
manifestam facilmente na superfície suas cargas oriundas dos desbalanços. Além disso, os minerais
das frações mais grosseiras são geogênicos, isto é, provenientes da rocha matriz, possuindo menos
defeitos pela menor ocorrência de substituições de átomos. Já os minerais da fração argila
normalmente são pedogênicos, isto é, formados pela recristalização a partir de átomos orginários do
desmonte dos minerais do material de origem. Com isso, os minerais da fração argila possuem
maior número de imperfeições, gerando mais cargas elétricas. Assim, as frações mais grosseiras
(silte e areia) exercem pouca influência sobre o conteúdo total de cargas de um solo.
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Além das cargas originadas das imperfeições dos minerais, chamadas cargas permanentes,
nas bordas das argilas podem ocorrer reações físico-químicas com a fase líquida do solo, gerando
cargas na superfície das argilas. Essas cargas são formadas principalmente pela adsorção ou
dessorção de íons hidrogênio nos grupos funcionais das argilas, gerando, respectivamente, cargas
positivas ou negativas. Essas cargas, por sua característica dinâmica, são de efeito temporário e
variam conforme a concentração de hidrogênio na solução do solo, ou seja, variam com o pH do
solo. Por esse motivo, essas cargas são chamadas de cargas variáveis ou cargas dependentes do
pH.
Fenômeno semelhante ocorre com o material orgânico adicionado ao solo, que vai sofrendo
transformações físico-químico-biológicas até atingiram o tamanho coloidal, quando passa a ser
chamado de matéria orgânica ou húmus do solo. Durante essas transformações, várias ligações
moleculares são quebradas, restando radicais químicos com cargas elétricas. Por seu amorfismo, a
matéria orgânica possui ASE muito maior que os argilominerais e, conseqüentemente, uma
quantidade de cargas expostas muito maior que eles, conforme mostrado na Tabela 2.
3.1 ORIGEM DAS CARGAS ELÉTRICAS DO SOLO
Os solo apresentam, concomitantemente, cargas elétricas positivas e negativas. Essas cargas
podem ser permanentes ou variáveis (dependentes do pH). A seguir, serão abordadas as principais
maneiras pelas quais há formação de cargas no solo.
3.1.1) Origem das cargas negativas
3.1.1.1 Substituição isomórfica
Como visto anteriormente, o alumínio e o silício das camadas octaedrais e tetraedrais da
estrutura dos argilominerais podem ser substituídos por outros íons de raios iônicos semelhantes. As
substituições isomórficas mais comuns são a do silício (Si+4) pelo alumínio (Al+3) na camada
tetredral e a do alumínio (Al+3) pelo magnésio (Mg+2) na camada octaedral das argilas. Pelo
visto, os cátions substituintes têm menor valência que os substituídos, o que gera uma deficiência de
cargas positivas e excesso de cargas negativas.
Esse desbalanço de cargas no interior da rede cristalina pode se manifestar na superfície do
argilomineral quando a distância entre a ocorrência da substituição e a borda do mineral não for
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grande, ou seja, quanto maior a ASE do mineral, maior será a probabilidade da manifestação das
cargas deste na superfície (Figura 3).
Como a geração de cargas pela substituição isomórfica ocorre no interior dos argilominerais
durante a sua formação, essas cargas são imutáveis enquanto o mineral existir e, por isso, são
chamadas de cargas permanentes.
- O - Al – O – Si – O – Si – O – Al – O – Si – OH
Substituição isomórfica
com manifestação da
carga na superfície
- O - Al – O – Al – O – Mg – O – Al – O – Al – OH
- O - Si – O – Si – O – Si – O – Si – O – Si – OH
- O - Si – O – Si – O – Si – O – Si – O – Si – OH
- O - Al – O – Mg – O – Al – O – Al – O – Al – OH
- O - Si – O – Si – O – Si – O – Al – O – Si – OH
Substituição isomórfica
sem manifestação da
carga na superfície
- O - Si – O – Si – O – Si – O – Si – O – Si – OH
- O - Mg – O – Al – O – Al – O – Al – O – Al – OH
- O - Si – O – Si – O – Si – O – Al – O – Si – OH
Figura 3 Substituições isomórficas nos argilominerais e manifestação das cargas
negativas na superfície do argilomineral.
3.1.1.2 Dissociação de radicais OH
No interior da estrutura cristalina dos argilominerais, os oxigênios dos tetraedros e
octaedros estão ligados a átomos de silício e/ou alumínio, estando com suas cargas neutralizadas.
Porém, nos tetraedros e octaedros das bordas do cristal, os oxigênios mais externos ficam apenas
parcialmente neutralizados, apresentando excesso de carga negativa. Essas cargas negativas podem
ser neutralizadas por íons hidrogênio (H+) oriundos da fase líquida. Assim, as bordas dos
argilominerais apresentam, na verdade, radicais OH. Com isso, dependendo do pH (concentração
de H+) da fase líquida, pode haver maior ou menor número de íons hidrogênio ligados aos oxigênios
das bordas dos argilominerais (Figura 4). Quando aumenta o pH da solução do solo, significa que
aumentou a concentração de íons hidroxila (OH-) livres no meio e estes acabam por competir com
os argilominerais pelos íons hidrogênio (H+) e estes tendem a se desligar das argilas e ir para a
solução, onde reagem com os íons hidroxila, formando água (OH- + H+ = H2O). Quando o
hidrogênio deixa a borda do argilomineral (dissociação dos radicais OH), o oxigênio dos tetraedros
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e octaedros voltam a apresentar cargas negativas. Por outro lado, se o pH da solução do solo
diminuir (aumento da concentração de H+), as cargas negativas dos oxigênios das bordas dos
argilominerais serão bloqueadas (Figura 3). Pelo exposto, a formação de cargas negativas nas
bordas dos argilominerais é dependente do pH do meio e, por isso, essas cargas são chamadas de
cargas variáveis ou cargas dependentes do pH.
Figura 4 Formação de cargas negativas nas bordas dos argilominerais por causa do
aumento do pH do meio.
Nos solos tropicais a fração argila é composta principalmente por argilas do tipo 1:1 e
óxidos de ferro e alumínio. Como a formação de cargas por substituição isomórfica é baixa nestes
tipos de minerais, as cargas desses solos são, em sua grande maioria, do tipo dependente do pH.
Além dos argilominerais, as cargas variáveis também ocorrem na matéria orgânica do solo,
onde a variação do pH é que rege a quantidade e o caráter (negativo ou positivo) das cargas.
Existem vários grupos funcionais na matéria orgânica que podem ter seus hidrogênios dissociados e
apresentarem cargas negativas (Figura 5), mas os principais são os radicais carboxílicos e fenólicos.
De modo geral, a quantidade de cargas que podem ser geradas pela matéria orgânica é muito grande
por causa de sua alta ASE e número de grupos funcionais.
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Figura 5 Principais grupos funcionais da matéria orgânica do solo (Sparks, 1995)
3.1.2) Origem das cargas positivas
Nos solos, as cargas positivas normalmente ocorrem em menor quantidade que as negativas,
mas têm igual importância pois são as responsáveis pela retenção dos ânions (muitos dos quais são
nutrientes essenciais às plantas).
As cargas positivas do solo são exclusivamente do tipo dependente do pH e ocorrem em
maior quantidade quando o pH da solução do solo é baixo (alta concentração do H +). Pelo
abaixamento do pH ocorre a protonação de alguns radicais do solo, originando cargas positivas. A
formação de cargas positivas é ocorrência mais comum na superfície dos óxidos de ferro e
alumínio, nos grupos aluminol dos octaedros (-Al-OH) expostos das argilas 1:1 e 2:1 e nos
grupos amina da matéria orgânica (R-NH2).
3.2. PONTO DE CARGA ZERO (PCZ)
Um parâmetro importante nos solos de cargas variáveis é o ponto de carga zero (PCZ). O
PCZ é o valor de pH no qual o colóide apresenta o mesmo número de radicais com carga positiva
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(protonados) e negativa (deprotonados), ou seja, é o ponto isoelétrico do solo. Assim, se o pH de
um solo estiver abaixo de seu PCZ, ele apresentará maior número de cargas positivas. Caso
contrário, apresentará mais cargas negativas que positivas.
Na tabela 2 são apresentados os valores de PCZ para alguns minerais. Por esta, pode-se
observar que num solo com predominância de caulinita, se o pH for maior que 4,6 haverá maior
número de cargas negativas. Já em um solo hematítico, para haver predomínio de cargas negativas o
pH tem que ser muito mais alto.
Quando o solo apresentar maior número de cargas negativas, convencionou-se dizer que ele
apresenta predominância de CTC (capacidade de troca de cátions) e quando apresenta maior
número de cargas positivas, diz-se que ele tem predominância de CTA (capacidade de troca de
ânions). A ocorrência de solos que apresentem CTA > CTC é rara, pois somente é possível em solos
altamente intemperizados (solos oxídicos), os quais não existem no Rio Grande do Sul.
Tabela 2 Ponto de carga zero de alguns minerais do solo (adaptado de Sparks,1995).
Mineral
PCZ
Quartzo
2,5 – 3,7
Montmorilonita
2,5
Caulinita
4,6
Hematita
9,5
Goethita
7,8 – 8,9
Gibsita
7,8 –9,5
3.3) DISPERSÃO E FLOCULAÇÃO DO SOLO
Entre as partículas do solo existem dois tipos fundamentais de forças, as de atração e as de
repulsão. As forças de atração (Van der Waals) ocorrem quando as partículas estão muito próximas
e fazem com que as partículas fiquem umas atraídas pelo campo elétrico das outras. Quando isso
ocorre, o sistema coloidal torna-se floculado. As forças de repulsão são conseqüência da repulsão
entre os campos elétricos de colóides de mesmo sinal, ou seja, quando duas partículas estão
carregadas negativamente, há o afastamento das partículas e o sistema coloidal torna-se disperso.
Quando num sistema coloidal em meio líquido predominam as forças de atração, ocorre a
floculação ou coagulação e as partículas agrupam-se formando pequenos flocos que decantam até o
fundo do recipiente. Já quando predominam as forças de repulsão, as partículas tendem a se afastar
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e continuar em suspensão (movimento Browniano). O PCZ afeta diretamente o grau de floculação
do solo, pois é neste pH que ocorre um número igual de cargas positivas e negativas nos colóides, o
que facilita a atração entre as partículas. Assim, é no PCZ que ocorre a máxima floculação do solo
(Figura 6).
A floculação dos colóides do solo é um fenômeno muito importante sob o aspecto
pedogenético, pois afeta a pedoturbação, iluviação de colóides, formação de agregados, estruturação
do solo, entre outras.
Figura 6 Ponto de carga zero e seu efeito na floculação e dispersão do solo.
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4
ADSORÇÃO E TROCA DE ÍONS
Entende-se por adsorção o fenômeno químico de ligação ou atração entre a carga de um
colóide e um íon da solução do solo e que resulta na sua retenção. O inverso desse fenômeno é a
dessorção do íon, que devolve-o para a solução. Os fenômenos de adsorção e dessorção são
comumente chamados de fenômenos de troca, já que dizem respeito à troca de fase de um íon (da
fase sólida para a líquida, ou vice-versa) e desta nomenclatura provem os termos capacidade de
troca de cátions (CTC) e capacidade de troca de ânions (CTA).
Devido às cargas dos colóides, tanto inorgânicos como orgânicos, há a aproximação dos
íons da solução, formando-se uma “nuvem de íons” ao redor dos colóides (Figura 7). Como as
cargas dos colóides são predominantemente negativas, há um maior número de cátions atraídos (que
configuram a CTC do solo) e estes acabam por atrair alguns ânions (que compõem a CTA do solo).
Por esta razão, mesmo que um solo possua um grande número de cargas negativas, os ânions
também são adsorvidos e, assim, tanto os nutrientes catiônicos como os aniônicos são retidos no
complexo de troca.
4.1 ENERGIA DE LIGAÇÃO ENTRE COLÓIDES E ÍONS
4.1.1) Tipos de energia de ligação
Os íons que estão afastados dos colóides a uma distancia tal que este já não exista força de
atração são chamados de “íons livres” e compõem a solução do solo (conforme ilustrado na figura
6). Já os íons atraídos pelos colóides, chamados de íons trocáveis, podem estar adsorvidos com
diferentes energias de ligação. Os íons próximos dos colóides são retidos com mais força, enquanto
aqueles mais afastados têm fraca energia de ligação. Assim, os íons próximos dos colóides podem
estar ligados a estes através de ligações iônicas ou covalentes enquanto aqueles mais afastados estão
rodeados por moléculas de água (solvatados) e são atraídos pelo colóide por forças eletrostáticas (do
tipo Van der Waals ou pontes de hidrogênio).
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Figura 7 Figura esquemática da distribuição dos íons em torno dos coloides
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Várias nomenclaturas são utilizadas para descrever a adsorção dos íons aos colóides. Elas
dão idéia da energia de ligação entre eles e, portanto, da probabilidade de rompimento da ligação e
retorno do íon para a solução do solo.
a) adsorção química - ocorre quando há a ligação iônica ou covalente entre o colóide e o
íon, sendo dificultada sua passagem da fase sólida para a líquida. Há três tipos de
adsorção química: complexação, quelação e precipitação.
i.
Complexação – É o tipo mais comum de adsorção química e ocorre na
superfície dos colóides. O íon complexado é retido com alta energia ao colóide
(ligação iônica ou covalente). Algumas bibliografias ainda trazem os temos
“oclusão” e “fixação”, os quais são sinônimos de complexação, mas estão em
desuso.
ii.
Quelação – É um tipo especial de complexação que ocorre nos colóides
orgânicos ou em moléculas quelantes, os quais adsorvem especificamente um
íon não por apenas uma, mas por duas ou mais ligações (Figura 8).
iii.
Precipitação – É um tipo de adsorção química onde o íon é precipitado, ou seja,
forma um complexo estável e praticamente irreversível.
b) adsorção física - ocorre quando há a ligação físico-química de baixa energia entre o íon
e o colóide. Essa interação ocorre através de forças eletrostáticas como forças de Van
der Waals (Keeson, Debye e London) e pontes de hidrogênio. A adsorção física não
ocorre na superfície do colóide, mas sim a uma certa distância dele apenas por efeito do
seu campo elétrico. São forças de pequena magnitude e permitem a troca rápida de íons
entre a fase sólida e a solução do solo, compondo a parte mais ativa da CTC e a da
CTA.
Figura 8 Representação gráfica de alguns fenômenos de adsorção.
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4.1.2) Fatores que afetam a energia de ligação entre colóides e íons
A integração de vários fatores ligados ao íon e ao colóide determina o tipo de energia que
poderá ocorrer. Dentre eles, os mais importantes são a valência do íon, o grupo periódico do íon, o
tamanhos do íon, o grau de hidratação do íon, a concentração do íon na solução do solo e a
seletividade do colóide.
a) Valência do íon – quanto maior a valência, maior será a energia de ligação ao colóide.
O hidrogênio é uma exceção, pois se comporta como se fosse polivalente.
b) Grupo periódico do íon – elementos de transição (das famílias “B” da tabela periódica)
formas compostos de maior energia de ligação que os metais alcalinos e alcalinos
terrosos.
c) Tamanho do íon – quanto menor o íon, mais fortemente pode ser adsorvido.
d) Hidratação do íon – quanto mais hidratado for o íon, com menor força ele será
adsorvido. A hidratação é inversamente proporcional ao tamanho e valência do íon.
e) Concentração do íon na solução – o aumento da concentração de um íon na solução
provocará maior adsorção do mesmo, deslocando os demais adsorvidos que estejam em
menor concentração.
f) Seletividade do colóide – certos colóides têm maior preferência para a adsorção de
certos cátions, conforme abaixo:
Ilita: Al3+ > K+ > Ca2+ > Mg2+ > Na+
Caulinita: Ca2+ > Mg2+ > K+ > Al3+ > Na+
Montmorilonita: Ca2+ > Mg2+ > H+ > K+ > Na+
Matéria orgânica: Mn2+ > Ca2+ > Mg2+ > NH4+ > K+ > Na+
De maneira geral, pela integração dos fatores ligados aos íons acima listados, a energia de
adsorção deles com os colóides segue a seguinte ordem:
CÁTIONS:
Al3+ = H+ = Fe3+ > Zn2+ = Cu2+ = Mn2+ = Fe2+ > Ca2+ > Mg2+ > NH4+ > K+ > Na+
ÂNIONS:
PO43- > MoO42- > SO42- > NO3- = Cl-
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4.2 PODER TAMPÃO DO SOLO
Por causa das cargas dos colóides, o solo tem a capacidade de reter uma grande quantidade
de íons nos colóides e manter apenas uma pequena quantidade destes na solução do solo. Isso evita
a lixiviação excessiva dos nutrientes pela água que percola no solo.
Por outro lado, se existem nutrientes adsorvidos no complexo de troca, não há carência para
as plantas, pois quando elas absorvem um nutriente da solução do solo, rapidamente este é reposto
pela fase sólida. Isso ocorre porque há um equilíbrio químico dinâmico entre a fase sólida e a
líquida. Também, quando algum nutriente é adicionado ao solo pela fertilização, há aumento de sua
concentração na solução e a maior parte acaba sendo adsorvida ao solo e disponibilizado na solução
apenas em pequenas quantidades. Por isso, diz-se que o solo tem capacidade de tamponar a
solução do solo, liberando íons quando a solução está em baixa concentração e retendo quando o
íon está em alta concentração. O poder tampão do solo pode ser visualizado, esquematicamente,
como um sistema de vasos comunicantes (Figura 9), onde há um grande reservatório (fases sólida)
interligado e em equilíbrio com um pequeno reservatório (solução do solo), de onde os nutrientes
são retirados (absorvidos ou lixiviados). Como são interligados, a retirada de íons do pequeno
reservatório é reposta pelo reservatório maior, mantendo o equilíbrio entre os dois compartimentos
FASE SÓLIDA
Figura 9 – Representação esquemática do poder tampão do solo
Solução do solo
(Figura 8).
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4.3 DETERMINAÇÃO DA CTC
A capacidade de troca de cátions representa a medida do poder de adsorção e toca de
cátions do solo. A CTC é, numericamente, a quantidade de cátions que um solo é capaz de reter por
unidade de peso (em Cmolc kg solo-1). Constitui-se numa propriedade fundamental para a
caracterização do solo e avaliação de seu potencial agrícola.
A CTC varia com o pH do solo em decorrência da existência de cargas dependentes do pH.
Por isso são feitas duas medidas de CTC: ao pH natural do solo e em um pH pré-estabelecido. A
CTC determinada ao pH natural do solo é denominada CTC efetiva ou CTC Real. A CTC
determinada utilizando-se uma solução tamponada a pH 7,0 (maior que o pH do solo) é denominada
CTC potencial ou CTC a pH 7,0. Como em solos ácidos o número de cargas negativas aumenta
com o aumento do pH, a CTC potencial será maior que a CTC efetiva.
A determinação da CTC real é feita saturando-se o solo com um determinado cátion (ex.
NH4+, na forma de NH4Cl). A seguir, lava-se o excesso deste cátion com um líquido de baixa
polaridade (álcool etílico ou isopropílico). Após, extrai-se o cátion pela adição de outro (ex. Na+, na
forma de NaCl) e mede-se a quantidade do cátion deslocado (NH4+), obtendo-se assim a medida da
CTC, que é dada em Cmolc kg solo-1. A CTC potencial é feita da mesma maneira, porém ao invés
de ser adicionado NH4Cl, é adicionado acetato de amônia (CH2COO(NH4)2 - pH 7,0), que é um sal
tamponado à pH 7,0.
Como a CTC efetiva e potencial do solo representam, respectivamente, a quantidade de
cátions que estão ou que podem ser adsorvidos, elas podem ser estimadas. A CTC efetiva pode ser
estimada somando-se as quantidades trocáveis dos cátions Ca2+, Mg2+, K+, Na+ e Al3+, os quais são
normalmente determinados nas análises químicas do solo. Existem outros cátions trocáveis no solo,
como NH4+, Mn2+, Cu2+, Zn2+, Fe2+, etc., mas considera-se que os teores dos mesmos são pequenos
e pouco afetam o valor da CTC. A CTC potencial do solo pode ser estimada através do “valor T”,
que é a soma dos cátions trocáveis Ca2+, Mg2+, K+, Na+, Al3+ e H+ (este último obtido por titulação
com sal tamponado à pH 7,0). No Brasil, normalmente têm-se utilizado o valor T para estimativa da
CTC potencial, já que os valores são muito semelhantes aos obtidos pela técnica padrão (descrita
acima).
Conforme visto anteriormente, os valores de CTC efetiva irão depender do pH do solo. Já
os valores de CTC potencial irão variar conforme sua composição mineralógica e teor de matéria
orgânica, pois para cada tipo de mineral há um número médio de substituições isomórficas que
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acarretarão em cargas que, em ultima análise, são a CTC. Na Tabela 3 pode-se observar a CTC
média de alguns minerais e da matéria orgânica.
Tabela 3 Área superficial específica (ASE) e capacidade de troca de cátions (CTC) de
alguns colóides do solo (adaptado de McBride, 1994)
Colóide
ASE
2
-1
m g
cmolc kg
7 – 30
0–1
Óxidos
-
2–4
Micas
40 – 150
10 – 40
Vermiculita
500 – 800
100 – 150
Montmorilonita
600 – 800
80 – 150
Matéria orgânica
800 - 900
200 - 300
Caulinita
5
-1
CTC
ACIDEZ DO SOLO
5.1 INTRODUÇÃO
Acidez é a concentração de íons hidrogênio em uma solução ou suspensão qualquer. A
unidade básica de medida da acidez é o pH, que é o logarítmo inverso da concentração de H+ na
solução (pH = log 1/[H+]). A escala de pH varia de zero a 14, sendo o pH 7,0 a neutralidade.
Soluções com pH menor que 7,0 são considerados ácidas e as com pH maior são consideradas
básicas. Como é expresso em escala logarítmica, para cada variação na unidade do pH, a
concentração de íons hidrogênio varia 10 vezes e, por isso, uma pequena diferença de pH pode ser
bastante significativa, conforme visto na Tabela 4.
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Tabela 4 Relação entre o pH e a concentração de íons hidrogênio na solução.
pH
Concentração de H+
-1
(mol L )
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
7,0
8,0
9,0
10,0
11,0
12,0
13,0
14,0
1
(10-0)
0,1
(10-1)
0,01
(10-2)
0,001
(10-3)
0,0001
(10-4)
0,00001
(10-5)
0,000001
(10-6)
0,0000001
(10-7)
0,00000001
(10-8)
0,000000001
(10-9)
0,0000000001
(10-10)
0,00000000001
(10-11)
0,000000000001 (10-12)
0,0000000000001 (10-13)
0,00000000000001 (10-14)
Nos solos, a amplitude de pH da solução do solo, chamado pH em água, é de 3,0 a 9,0,
embora os valores mais comuns ocorram na faixa intermediária. Nos solos do Rio Grande do Sul,
mais da metade dos solos apresentam pH em água na faixa de 5,0 a 6,0 (Tabela 5), ou seja, são
ácidos.
Porém, a acidez do solo não é composta somente pelos hidrogênios presentes na fase
líquida do solo, pois parte deles está adsorvido às cargas elétricas dos coloídes da fase sólida.
Assim, a acidez dos solos é dividida em dois tipos: Acidez ativa (na solução do solo) e acidez
potencial (hidrogênios adsorvidos). A distribuição quantitativa dos íons hidrogênio nessas duas
formas segue o mesmo princípio dos elementos nutrientes, ou seja, há uma pequena quantidade de
H+ na solução e, quando estes são consumidos, a fase sólida os repõe, manifestando o poder
tampão do solo.
Quando em excesso, a acidez do solo é nociva para as plantas, pois há aumento das
quantidades de elementos tóxicos (como alumínio e manganês trocáveis), diminuição da
disponibilidade de nutrientes (principalmente os aniônicos), dentre outras conseqüências. Por isso,
uma das práticas mais difundidas dento da agricultura é a aplicação de calcário ao solo (calagem),
que tem por objetivo corrigir a acidez do solo.
19
Tabela 5 Estratificação dos valores percentuais de pH em água dos solos do Rio
Grande do Sul, com base em 168.200 análises de solo (Adaptado de
Rheinheimer et al. 2000).
Intervalo de pH
% de solos
< 4,5
4,0
4,5 – 4,9
13,3
5,0 – 5,4
27,3
5,5 – 5,9
29,3
26,1
 6,0
5.2 ORIGEM DA ACIDEZ DO SOLO
Muito tempo e eventos transcorrem entre a presença de uma rocha e sua transformação em
um solo. Este solo, sendo o produto resultante dos fatores de formação, manterá ou não algumas
características químicas do material de origem, dependendo da intensidade de cada um dos fatores.
Solos formados em regiões quentes e úmidas são geralmente ácidos mesmo que o material
de origem não o seja. Na Tabela 6 estão os resultados da análise química de três rochas e de solos
formados a partir delas. Observa-se que as rochas, finamente moídas, têm uma reação próximo à
neutralidade, enquanto que os solos gerados são ácidos, têm menor quantidade de nutrientes e maior
quantidade de alumínio e ferro. Isso mostra que a acidez do solo é um processo natural e sua
origem está em diversas reações que ocorrem no solo, as quais serão descritas a seguir.
Tabela 6 Composição química elementar de três rochas e três solos formados a partir
dessas (Adaptado de Bohnen, 2000).
Característica
ARENITO
BASALTO
GRANITO
química
Rocha
solo
rocha
solo
rocha
solo
6,9
4,2
6,9
4,9
7,3
4,6
pH em água
0,20
0,01
0,81
0,07
0,40
0,02
Cálcio (%)
0,10
0,03
0,17
0,08
0,20
0,04
Magnésio (%)
0,10
0,07
3,85
0,15
4,07
0,25
Potássio (%)
0,04
0,04
0,19
0,04
4,02
0,04
Sódio (%)
1,70
3,10
6,00
10,60
6,60
2,10
Alumínio (%)
0,29
1,02
4,40
11,90
0,38
1,14
Ferro (%)
5.2.1) Chuva
Inicialmente, a fonte de acidez para o solo é a água da chuva, que têm pH ácido pos causa
de sua reação com o gás carbônico da atmosfera, conforme descrito na reação abaixo.
20
CO2 + H2O  HCO3- + H+
5.2.2) Lixiviação de bases
Comparando-se as concentrações dos cátions na rocha matriz e no solo formado (Tabela 6),
verifica-se que há uma substancial diminuição nos teores de cálcio, magnésio, sódio e potássio e,
concomitantemente, aumento dos teores de ferro e alumínio. Isso decorre do fato dos cátions
básicos (Ca2+, Mg2+, Na+ e K+) formarem complexos mais solúveis, podendo ser mais facilmente
perdidos por lixiviação. Enquanto isso, o alumínio e o ferro, por formarem complexos estáveis,
acumulam-se no solo. Pela hidrólise e lixiviação das bases, restam no solo o hidrogênio, o qual é
adsorvido pelos colóides, aumentando a acidez. Por isso, os solos são ácidos em regiões tropicais e
subtropicais úmidas, pois há quantidade de chuva suficiente para lixiviar as bases.
5.2.3) Hidrólise do alumínio
Com o intemperismo, os íons alumínio dos minerais primários vão sendo liberados da
estrutura cristalina e, devido a sua alta reatividade, reagem com a solução do solo, formando
hidróxido de alumínio (prcipitado) e íons hidrogênio, conforme a reação abaixo.
Al3+ + 3H2O  Al(OH)3 + 3H+
Devido a esta reação ser praticamente instantânea quando o alumínio está na solução do
solo, embora não seja um ácido, por gerar H+ rapidamente ele é considerado como tal. Por isso,
convencionou-se dizer que a acidez do solo é composta por H+ + Al3+.
5.2.4) Respiração
A degradação inicial da rocha pelo efeito da acidez da água libera nutrientes desta, os quais
possibilitam a nutrição dos microrganismos e plantas. Estes liberam para a fase líquida e gasosa do
solo o CO2 da respiração que, pela mesma reação descrita anteriormente, geram bicarbonato
(HCO3-) e hidrogênio (H+).
5.2.5) Decomposição de resíduos orgânicos
Os tecidos orgânicos possuem, em média, .....% de hidrogênio em sua composição. A
decomposição de resíduos orgânicos pelos microrganismos liberam para a solução do solo íons
hidrogênio (principalmente no processo de nitrificação), além de ácidos carbônicos de cadeia curta
21
(como ácido cítrico, fítico, maleico, etc.) e de cadeia longa (como ácidos húmicos e ácidos
fúlvicos), os quais também têm alta concentração de hidrogênios.
5.2.6) Liberação de íons H+ pelas raízes das plantas
Pelo mecanismo de antiporte da membrana citoplasmática das células vegetais, quando há
absorção de um cátion nutriente, há, concomitantemente, a extrusão de um íon H+ para fora da
célula para a manutenção do potencial eletroquímico intracelular. Assim, a absorção de cátions
pelas plantas resulta em acidificação da rizosfera, principalmente nas plantas leguminosas, as quais
absorvem mais cátions que as gramíneas.
5.2.7) Adubos acidificantes
A adição de adubos acidificantes, como o sulfato de amônio - (NH4)2SO4 – (pelo processo
de nitrificação) e os fertilizantes fosfatados (por sua reação ácida), quando solubilizam-se, liberam
íons H+ no solo.
5.3 COMPONENTES DA ACIDEZ DO SOLO
Da mesma maneira que os nutrientes em geral, os íons hidrogênio são particionados em
dois compartimentos no solo: os presentes na solução do solo e os adsorvidos aos colóides. Os
hidrogênios na solução do solo são chamados de acidez ativa, pois estão atuando diretamente no
local onde as plantas obtêm água e nutrientes. Os hidrogênios adsorvidos aos colóides são
chamados de acidez potencial, pois podem repor ou tamponar os íons H+ da solução quando do
desaparecimento destes. A acidez potencial, por sua vez, é dividida em acidez trocável e não
trocável. A acidez trocável são os íons ligados fracamente aos colóides (por ligações físicas) e que
podem rapidamente tamponar a solução e a acidez não trocável são os íons adsorvidos com alta
energia (adsorção química) às bordas dos argilominerais, superfície dos óxidos e matéria orgânica.
Pelo mesmo exemplo dos vasos comunicantes, vistos na Figura 9, podemos dizer que a acidez ativa
está tamponada pela acidez trocável e esta, pela acidez não trocável.
5.3.1) Acidez ativa
A concentração de íons hidrogênio na solução do solo é extremamente pequena em relação
à quantidade de íons adsorvidos (não raro chega a ser 1000 vezes menor). Porém, mesmo em baixa
concentração afeta diretamente o crescimento das plantas pela afeta a disponibilidade de nutrientes
22
e elementos tóxicos. A determinação da acidez ativa é feita em uma suspensão de solo e água (na
relação 1:1 ou 1:2,5), onde mede-se o pH (atividade ou concentração de íons H+) através da imersão
de um eletrodo de vidro ligado a um potenciômetro. O pH também pode ser medido em soluções
salinas ao invés de água, como por exemplo KCl 1 mol L-1 ou CaCl2 0,01 mol L-1.
5.3.2) Acidez potencial
Os H+ adsorvidos aos colóides do solo compõem a acidez potencial do solo e são divididos
em acidez trocável e acidez não trocável.
5.3.2.1 Acidez trocável
A acidez trocável é a parte da acidez potencial onde os íons acidificantes (H+ + Al3+) estão
adsorvidos fracamente aos colóides (através de forças eletrostáticas). Como o teor de H+ geralmente
representa menos que 5% da acidez trocável, admite-se como esta sendo composta apenas pelo
alumínio trocável. A acidez trocável é muito variável, mas, em termos gerais, pode representar até
50% da acidez do solo. A acidez trocável (Al3+ trocável) é determinada através da extração do
alumínio trocável por um sal neutro (geralmente KCl 1 mol L-1) e sua titulação com solução de
NaOH.
5.3.2.2 Acidez não trocável
A acidez não trocável é resultado da dissociação dos H+ dos grupos funcionais da matéria
orgânica, das bordas dos argilominerais e da superfície dos óxidos de ferro e alumínio. Essa
dissociação ocorre quando da elevação do pH do meio, pois os íons OH- adicionados para aumentar
o pH começam a competir com os colóides pelo H+, forçando sua dessorção. Cada grupo funcional
tem uma energia de ligação, mas a dissociação dos H+ dos grupos ligados ao silício na borda dos
argilominerais (Si-OH)e dos grupos carboxílicos da matéria orgânica (R-COOH) ocorre a pH menor
que 4,0. Já a dissociação dos H+ dos grupos ligados ao alumínio dos argilominerais (Al-OH), ao
ferro dos óxido (Fe-OH) e aos grupos fenólicos da matéria orgânica (R-OH) somente ocorre em pH
maior que 6,0.
Pelo efeito da acidez não trocável, cada vez que o pH da solução do solo for elevado pela
adição de base (calcário, por exemplo), há a dissociação de alguns H+ e o pH torna a baixar. O pH
somente será efetivamente aumentado quando a quantidade de base adicionada for suficiente para
neutralizar todos os H+ dissociados. O comportamento do solo é semelhante ao comportamento
químico dos ácidos fracos (ex. H2CO3), os quais não se dissociam completamente e, quando da
tentativa de sua neutralização, apresentam resistência ao aumento do pH por causa do
tamponamento dos H+ não dissociados.
23
A acidez potencial do solo (acidez trocável + acidez não trocável), representada pelo H+ +
Al3+, é determinada pela adição de um sal tamponado à pH 7,0, normalmente o acetato de cálcio
[(CH2COO)2Ca pH 7,0] e o H+ + Al3+ extraídos são determinados por titulação com NaOH e os
resultados são expressos em centimols de carga por quilograma de solo (cmolc kg-1).
A quantidade de base (calcário) para neutralizar a acidez do solo e elevar o seu pH a um
patamar pré-estabelecido deve ser suficiente para neutralizar não só a acidez ativa, mas também a
acidez potencial. Como a acidez total do solo é devida principalmente ao teor de alumínio trocável
do solo (acidez trocável) e da quantidade de hidrogênios adsorvidos (acidez não trocável), solos
com a mesma acidez ativa (pH em água) podem ter diferentes necessidades de calcário para
correção da acidez, conforme visualizado na Tabela 7. Nela observa-se que a necessidade de
calcário do solo têm uma estreita relação com os teores de argila e matéria orgânica do solo,pois
esses fatores estão intimamente relacionados à quantidade de H+ adsorvidos nos colóides do solo.
Tabela 7 Componentes da acidez de alguns solos do Rio Grande do Sul e suas
necessidades de calcário para elevar o pH a 6,0 (Adaptado de Kaminski,
1974).
Unidade
de argila
Matéria
Acidez
Acidez
Acidez não Necessidade
mapeamento
orgânica
ativa
trocável
trocável (H+) de calcário
(pH)
Passo Fundo
Erechim
Vacaria
São Gerônimo
Bom Retiro
%
%
65
74
60
31
8
4,7
5,6
6,4
2,9
0,3
(Al3+)
-1
-1
Cmolc kg
4,2
4,2
4,2
4,2
4,2
2,3
3,8
4,9
0,6
0,5
t ha
5,4
6,8
9,4
3,7
2,2
8,1
11,7
17,9
4,1
1,8
5.4 PARÂMETROS DA ACIDEZ DO SOLO
5.4.1) Soma de Bases (Valor S)
A soma de bases (valor S) é a soma dos principais cátions trocáveis do solo (Ca2+, Mg2+, K+
e Na+), é expressa em cmolc kg-1 e traz informações sobre o montante de cátions disponível para as
plantas. O Valor S é obtido pela fórmula:
S (cmolc kg-1) = Ca2+ + Mg2+ + K+ + Na+
24
5.4.2) Estimativa da CTC (Valor T)
Conforme visto anteriormente, a CTC do solo é o somatório de todas as cargas elétricas
negativas que ocorrem a um certo pH. Como sua determinação é complexa e dispendiosa, utiliza-se
o valor T para estimar a CTC. O valor T é o somatório dos teores tocáveis dos cátions básicos do
solo (Valor S) mais a acidez potencial do solo (H+ + Al3+), todos expressos em cmolc kg-1, conforme
a equação abaixo:
T
-1
(cmolc kg )
= Ca2+ + Mg2+ + K+ + Na+ + H+ + Al3+
5.4.3) Saturação por Bases (valor V)
A saturação por bases (valor V) é a percentagem da CTC ocupada pelos cátions básicos. O
valor V é utilizado como um indicativo da fertilidade do solo, onde são considerados solos ideais
para o cultivos aqueles com valor V maior que 50 a 70% (dependendo da cultura e do manejo
utilizado). O valor V também é utilizado na classificação de solos, onde solos com V > 50% são
classificados como eutróficos e solos com V < 50% são classificados como distróficos. O Valor V
é obtido pela fórmula:
V (%) = (S / T)*100
5.4.4) Saturação por Alumínio (valor m)
A saturação por alumínio (valor m) é a percentagem de alumínio em relação às bases
trocáveis (valor S) e traz informações sobre a probabilidade de ocorrência de toxidez de alumínio
para as plantas. O cálculo do valor m é feito da seguinte maneira:
m (%) = [Al3+ / (S + Al3)]*100
Para a fertilidade do solo, de modo geral, a saturação com alumínio não deve ser superior a
15%, pois em valores maiores aumenta muito a probabilidade de ocorrência de toxidez às plantas.
Porém, este valor varia de 10 a 20%, conforme a cultura utilizada. O valor m também é utilizado na
classificação de solos, sendo atribuído o termo álico quando o solo possuir m > 50%.
25
5.5 INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS DE ACIDEZ DO SOLO
O uso isolado de um dos parâmetros da acidez não traz informações conclusivas sobre as
características de um solo. É necessário utilizar conjuntamente os parâmetros. Por exemplo, um solo
“x”, com T = 20 cmolc kg-1 e S = 10 cmolc kg-1, tem valor V = 50%. Já um solo “y”, com T = 20
cmolc kg-1 e S = 10 cmolc kg-1, também tem valor V = 50%. Entretanto, o solo “x” apresenta um teor
absoluto de cátions básicos bem mais elevado, o que significa melhor fertilidade do solo. Da mesma
maneira, dois solos com o mesmo valor T (ex. T = 20 cmolc kg-1) podem ter diferentes valores de
saturação por bases (ex. solo A, V = 70%; solo B, V = 30%). Assim, dois solos somente terão
fertilidade equivalente se possuírem o mesmo valor T e V.
A classificação dos parâmetros da acidez e do complexo sortivo (valores S, V, m e T)
diferem quando utilizados para fins de fertilidade do solo e classificação de solos, mas de maneira
geral, podem ser classificados conforme a Tabela 8.
Tabela 8 Interpretação dos valores de T, S, V e m.
Classificação
T(1)
S(1)
-1
cmolc kg
> 10
6 – 10
<6
Alto
Médio
Baixo
m(2)
V(1)
%
>6
4–6
<4
> 60
35 – 60
< 35
(1)
BRASIL, 1973;
> 15
5 –15
<5
(2)
CFS-RS/SC (1994).
Como visto anteriormente na Tabela 6, o pH em água (acidez ativa) não é um bom
parâmetro para avaliar a acidez do solo, já que solos com a mesma acidez ativa podem ter acidez
potencial totalmente diferente. Porém, os resultados de pH em água são importantes para observar a
possibilidade de ocorrência de alumínio trocável (o qual ocorre somente em valores de pH
inferiores a 5,5) e também para se ter uma estimativa da disponibilidade relativa dos nutrientes,
conforme observado na Figura 10. A faixa de pH entre 5,5 e 6,0, grifada na figura, é a faixa de pH
recomendada para a maioria das culturas, pois é onde já não há alumínio trocável e é onde todos os
nutrientes essenciais às plantas estão com disponibilidade intermediária.
Na Tabela 9 são apresentados resultados de análise de solos de algumas unidades de
mapeamento do Rio Grande do Sul, onde podem ser vistas as relações entre os parâmetros acima
discutidos.
disponibilidade
26
N, P, K, Ca, Mg, S, B, Mo
Al
Zn, Cu, Mn, Fe
4,5
Figura
10
5,0
5,5
6,0
6,5
pH
7,0
esquema representativo da variação da
disponibilidade relativa dos nutrientes e do
alumínio trocável em função do pH do solo.
Tabela 9 Dados de análise de alguns solos do Rio Grande do Sul, compilados do
Levantamento de Reconhecimento de Solos do Estado (BRASIL, 1973).
Unidade de
Classif.
Prof.
pH
T
S
V
m
mapeamento
-1
cm
Cruz Alta
Passo Fundo
Vacaria
Erechim
Bom Jesus
São Pedro
Tupanciretã
Rio Pardo
São Jerônimo
Alto das Canas
Ciríaco
Bexigoso
Pelotas
Santa Maria
Virgínia
0-13
0-30
0-11
0-15
0-17
0-25
0-25
0-50
0-20
0-40
0-25
0-20
0-23
0-20
0-40
cmolc kg
5,2
4,8
4,7
4,5
4,6
5,0
5,0
4,6
4,5
5,2
5,9
5,0
5,4
4,9
5,0
5,60
10,50
17,00
14,60
20,00
5,40
3,70
7,70
8,50
8,80
17,70
10,00
6,70
12,10
11,90
1,80
1,70
2,80
0,60
3,00
1,80
1,00
1,10
3,30
3,40
12,70
5,60
3,50
4,30
6,10
%
24
16
16
4
15
33
27
14
39
39
72
56
52
35
51
45
56
60
90
63
38
47
73
25
24
0
14
24
28
14
27
6
SOLOS ALAGADOS E SOLOS AFETADOS POR SAIS
6.1 MODIFICAÇÕES QUÍMICAS EM SOLOS ALAGADOS
Solos posicionados em cotas mais baixas na paisagem, principalmente nas várzeas, estão
sujeitos à saturação com água ou alagamentos periódicos. Essa condição de anaerobiose provoca
uma série de modificações químicas que fazem com que o comportamento destes solos seja
diferentes do dos solos drenados.
As modificações decorrentes da anerobiose são observadas não só em várzeas alagadas
(incluso solos irrigados por inundação), como também em microsítios de pouca aeração nos solos
drenados.
Quando o solo é alagado, a água ocupa o espaço da fases gasosa do solo, comprimindo o ar
remanescente no interior dos agregados, o que acarreta em sua destruição. Assim, logo após o
alagamento o solo atinge uma consistência semi-fluída, onde a agregação é inexistente.
A substituição do ar para a água no espaço poroso restringe as tocas gasosas entre a
atmosfera e o solo e o oxigênio remanescente no solo é rapidamente consumido pelos
microrganismos aeróbicos do solo. Após a extinção do oxigênio no solo, os organismos aeróbicos
obrigatórios morrem e a população microbiana remanescente é composta pelos microrganismos
aeróbicos facultativos e anaeróbicos. Esses organismos obtêm energia pela oxidação da matéria
orgânica do solo, mas ao invés de utilizarem o oxigênio como aceptor final de elétrons na cadeia
respiratória, transferem os elétrons dos compostos orgânicos para outros compostos oxidados,
transformando NO3- em N2, Mn4+ em Mn2+, Fe3+ em Fe2+, SO42- em H2S, ente outros. Na
classificação de solos, o alagamento é responsável pela pelo processo de gleização dos solos e o
aparecimento de mosqueados.
Dentro das alterações químicas decorrentes do alagamento, podem ser citados:
a)
Diminuição do potencial redox do solo (Eh) por causa da ausência de oxigênio
nos ambientes alagados;
b)
Aumento da disponibilidade de ferro e manganês no solo, já que as formas
reduzidas (Fe2+ e Mn2+) são mais móveis que as oxidadas (Fe3+ e Mn4+);
c)
Aumento da condutividade elétrica (CE) pela maior quantidade de íons solúveis
na solução do solo (Fe2+ , Mn2+ e NH4+)
28
d)
Aumento da disponibilidade de fósforo, pois a redução do ferro (Fe3+  Fe2+)
libera íons fosfato adsorvidos nos óxidos de ferro;
e)
Volatitilização do nitrogênio (perda para a atmosfera) na forma de nitrato, pois
ocorre sua transformação em gás nitrogênio.
f)
Estabilização de outras formas de nitrogênio na forma amoniacal (NH4+)
g)
Aumento do pH do solo. O pH do solo aumenta porque os elétrons excedentes da
respiração dos organismos são descarregados em compostos que se reduzem, os
quais reagem com o H+ do meio, diminuindo sua concentração.
h)
Diminuição da disponibilidade de cobre e zinco, pois estes formam complexos
estáveis na forma de hidróxidos, sulfetos e carbonatos.
6.2 MODIFICAÇÕES QUÍMICAS EM SOLOS AFETADOS POR SAIS
Solos afetados por sais são solos com altas concentrações de sais solúveis no complexo de
troca, as quais podem comprometer ou impedir o crescimento das plantas. Os solos afetados por
sais podem ser classificados como salinos (apresentam altas concentração de sais solúveis), sódicos
(alta concentração de sódio trocável) e salino-sódicos (alta concentração de sais e de sódio). No
Brasil, ocorrem principalmente na região nordeste.
A presença de altas concentrações de sais nos solos ocorre, principalmente, quando uma ou
mais situações seguintes ocorrem: a) Material de origem rico em sais; b)Baixa ou nula ocorrência
de chuvas, não tendo precipitação suficiente para a lixiviação do excesso de sais; c) Alta
evapotranspiração; d) Regiões com aporte de sais por estarem próximas ao mar.
A caracterização dos solos afetados por sais é feita através do pH em água, condutividade
elétrica e porcentagem de saturação por sódio trocável (PST), segundo a Tabela 10. A percentagem
de saturação com sódio é dada pela fórmula PST = (Na+ / T)*100.
Tabela 10 Classificação dos solos afetados por sais (adaptado de Sparks, 1995).
Classificação
CE
pH em água
PST
dS m
Solos salinos
Solos sódicos
Solos salino-sódicos
-1
>4
<4
>4
%
< 8,5
> 8,5
< 8,5
< 15
> 15
> 15
29
7
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
MEURER, E. J. Fundamentos de Química do Solo.Porto Alegre: Ed. Gênesis, 2000, 174 p.
KAMINSKI, J. Corretivos da Acidez do Solo. Santa Maria: UFSM, 1989, 224 p.

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