Volume 9 – Número 1 - Revista Ciência e Conhecimento
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Revista Ciência e Conhecimento ISSN: 2177-3483 REVISTA CIÊNCIA E CONHECIMENTO Volume 9 – Número 1 – Ano 2015 Periódico Oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo – RS – Brasil Revista oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Campus São Jerônimo ISSN: 2177-3483 – Volume 9 – Número 1 – 2015 Editor: Rodrigo Baptista Moreira Editores adjuntos: Vitor Hugo acunha Rosani Nascimento Leite Comissão editorial - Administração Jane Ferreira Picarelli Liana Maria Razek Comissão editorial - Publicação Simone da Silva Ferreira - Bibliotecária Comissão editorial (associada) – Tradução Wanessa Baum dos Santos Implantação e manutenção on-line da revista Marcos André Lopes – TI/ULBRA Consultores Gisele Trommer Martins Adriana Porto Jeferson Souza Wolff Adriana Torres de Lemos Jorge Maurício C. de Oliveira Adroaldo C. A. Gaya Leandro Hirt Rassier Alexandre Grandi Mandelli Lidiane R. Alli Feldmann Álvaro Werlang Lívia Lucina Ferreira Albanus Bianca Rocha Gutterres Maria de Fátima Dias Ávila Carlos Mário Dal’Col Zeve Maria Francisca L. Johson Carolina Moraes Migliavacca Mariana Secorun Inácio Christiane Martinatti Maia Marisa Beatriz L. M. Sanchez Clarissa Lopes Trojack Marjane Bernardy Souza Claudeth Conceição de Oliveira Claudia Lisete de Oliveira Groenvald Maurício Amaro Lopes Olindo Barcelos da Silva Cleber Fernando Homem Osvaldo Donizete Siqueira Daniel Carlos Garlipp Pablo Rodrigo Alflen Dorval Antônio Ferreira Dias Paulo Henrique D. Machado Élvia Elena Silveira Vianna Rosa Maria da Cruz Braga Ernani Soares Barbosa Rosa Quitéria C. de Novaes Evandro Agiz Heberle Roséli Azzi Nascimento Fernanda Ferreira Alves Pelegrini Rossano André Dal-Farra Franz Josef F.F. da Silva Rudimar Serpa de Abreu Gabriel Gustavo Bergmann Elaboração, veiculação e informações: Universidade Luterana do Brasil – ULBRA Campus São Jerônimo – RS - Brasil Rua Antônio de Carvalho, esq. RS 401, nº 1 CEP: 96700-000 - Fone: (51) 3651-1121 E-mail: contato@ciênciaeconhecimento.com Acesse a revista on-line: www.cienciaeconhecimento.com.br Revista oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Campus São Jerônimo ISSN: 2177-3483 – Volume 9 – Número 1 – 2015 Editorial A Revista Ciência e Conhecimento é o periódico oficial da Universidade Luterana do Brasil - ULBRA/São Jerônimo. A revista publica trabalhos nos seguintes formatos: artigos originais, artigos de revisão, trabalhos de conclusão de curso de graduação e pós-graduação, trabalhos acadêmicos e comentários, nas diversas áreas do conhecimento. É um periódico que publica, resultados de pesquisas que contribuam para o desenvolvimento humano e social nas seguintes áreas: atenção à saúde e bem-estar; desenvolvimento humano; metodologias e estratégias de ensino aprendizagens; gestão pública e institucional; gestão de conhecimento; tecnologia e produção; meio ambiente e sustentabilidade e desenvolvimento urbano e rural. Todo o conteúdo da revista está disponível em português no site www.cienciaeconhecimento.com.br, de livre acesso. A revista possui circulação regular desde 2007, sua versão eletrônica e impressa em língua portuguesa tem periodicidade quadrimestral. Neste número, apresentamos 7 artigos (5 originais e 2 de revisão) nas diversas áreas do conhecimento. Rodrigo Baptista Moreira Editor da Revista Ciência e Conhecimento Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP C569 Ciência e conhecimento / Universidade Luterana do Brasil. - Vol. 1, n. 1 (2007)-. - São Jerônimo: ULBRA São Jerônimo, 2007-. v. ; 30 cm. Disponível em: http://www.cienciaeconhecimento.com.br Semestral. ISSN 2177-3483 1. Produção técnico-científica periódicos. 2. Pesquisa científica. I. Universidade Luterana do Brasil. CDU: 001.891 Bibliotecária responsável – Simone da Silva Ferreira – 10/1267 Revista oficial da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Campus São Jerônimo ISSN: 2177-3483 – Volume 9 – Número 1 – 2015 ÍNDICE Artigos originais EQUOTERAPIA NO TRATAMENTO DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: A PERCEPÇÃO DOS TÉCNICOS (Páginas 5 – 23) Marjane Bernardy Souza e Priscilla de L. N. da Silva MÍDIAS SOCIAIS COMO FERRAMENTAS DE ESTRATÉGIAS DE MARKETING (Páginas 24 - 41) Marco Miller Trainini e Jéssica da Silva Torres O PROGRAMA ACELERA BRASIL E OS MÉTODOS DE LEITURA: REFLEXÕES SOBRE UM ESTUDO DE CASO EM BREJO DO CRUZ/PB (Páginas 42 – 53) Demóstenes Dantas Vieira e Joana Lúcio Maia A DIMENSÃO DA POLITECNIA E A PRÁTICA DOCENTE NO ÂMBITO DO ENSINO MÉDIO POLITÉCNICO DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO CAIC MADEZATTI – SÃO LEOPOLDO/RS (Páginas 54 – 68) Cléber Fernando Homem CRESCIMENTO SOMÁTICO E ÍNDICE DE MASSA CORPORAL EM ESCOLARES DOS 10 AOS 15 ANOS DE IDADE. ANÁLISE DOS RESULTADOS PROVENIENTES DE DESENHOS TRANSVERSAIS, LONGITUDINAIS E LONGITUDINAIS MISTOS (Páginas 69 – 83) Daniel Carlos Garlipp, Rodrigo Baptista Moreira, Anelise Reis Gaya e Adroaldo C. A. Gaya Artigos de revisão DA NECESSIDADE DE PSICOEDUCAÇÃO EM PREVENÇÃO ÀS DROGAS NO ÂMBITO ESCOLAR (Páginas 84 – 98) Erica I. D. Andrade e Élide Ávilla Kesller BASES EPISTEMOLÓGICAS DA CRIAÇÃO DO CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL: UMA ANÁLISE A PARTIR DA TEORIA DE NONAKA E TAKEUCHI (Páginas 99 – 118). Ana Claudia Donner de Abreu, Angela Regina Heinzen Amin Helou e Greicy Kelli Spanhol Lenzi Artigo Original EQUOTERAPIA NO TRATAMENTO DO AUTISTA: A PERCEPÇÃO DOS TÉCNICOS Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 TRANSTORNO DO ESPECTRO Marjane Bernardy Souza¹ e Priscilla de L. N. da Silva² RESUMO - O Transtorno do Espectro Autista tem como característica diagnóstica o comprometimento severo e invasivo em três áreas do desenvolvimento: habilidades de interação social, habilidades de comunicação e presença de comportamentos estereotipados. A Equoterapia é um método terapêutico que utiliza o cavalo dentro de uma abordagem interdisciplinar, nas áreas de saúde, educação e equitação, que busca auxiliar no desenvolvimento biopsicossocial de pessoas com necessidades especiais. Esta pesquisa tratou de investigar o desenvolvimento de uma criança de 10 anos, com o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista, que está em tratamento há quatro anos, tendo como objetivo identificar os aspectos motores, sociais, psicológicos e de linguagem, trata-se de um estudo qualitativo tendo como referencial teóricometodológico. Foi utilizado para o tratamento dos dados a análise de conteúdo de Bardin (2011), que é uma técnica de investigação que tem por finalidade a descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação. Participaram do estudo uma equipe multidisciplinar, composta por psicóloga, terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e fisioterapeuta. Para obter as informações necessárias, foi realizada uma entrevista semiestruturada, contendo cinco questões abertas, sendo aplicada individualmente, em ambiente reservado, garantindo, assim, o sigilo e o conforto das participantes, tendo duração média de uma hora e foram gravadas e transcritas para análise. De acordo com os dados obtidos foi possível evidenciar, na percepção desses técnicos, que a Equoterapia foi um método fundamental e eficaz para a reabilitação dessa criança, sendo uma prática que proporcionou bem-estar e qualidade de vida, contribuindo para melhorar a coordenação motora, o equilíbrio, a afetividade e os relacionamentos sociais, assim como a autonomia e a autoestima. Revista Ciência e Conhecimento Volume 9 – Nº1 – 2015. 1 – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo. Professora do Curso de Psicologia. São Jerônimo, RS, Brasil. 2 – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo. Acadêmica do Curso de Psicologia. São Jerônimo, RS, Brasil. Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista. Equoterapia. Tratamento. ABSTRACT - The Autism Spectrum Disorder as a diagnostic feature is the severe and pervasive impairment in three areas of development: social interaction skills, communication skills and presence of stereotyped behaviors. The Hippotherapy is a therapeutic method that uses the horse within an interdisciplinary approach in the areas of health, education and riding that seeks to assist the biopsychosocial development of people with special needs. The present paper is a qualitative study with theoretical and methodological framework was used for the processing of data content analysis, which is a research technique that aims at the objective, systematic and quantitative description of the manifest content of communication. The study comprised a multidisciplinary team composed of a psychologist, occupational therapist, speech therapist and physiotherapist. To obtain the necessary information, one semi-structured interview, with five open-ended questions, being applied individually, in private atmosphere, thus ensuring the confidentiality and comfort of participants, average duration of one hour and were recorded and transcribed for analysis was performed. According to the data obtained, it may prove, in the perception of these coaches, that hippotherapy is a fundamental and effective method for the rehabilitation of people with the spectrum being a practice that provides wellness and quality of life, helping to improve coordination motor, balance, affective and social relationships, as well as autonomy and self-esteem. . Keywords: Autism Spectrum Disorder. Hippotherapy. Treatment. Dados para correspondência Marjane Bernardy Souza; Rua: Gaspar Silveira Martins, nº 2533. CEP: 96825-002 E-mail: [email protected] Recebido em: 09/12/2014. Revisado em: 10/01/2015. Aceito em: 20/02/2015. Área: Atenção à saúde e bem estar. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 5 INTRODUÇÃO O Transtorno do Espectro Autista (TEA) ocorre antes dos três anos de idade, onde os pais podem perceber a falta de reciprocidade diante de estímulos, na maioria dos casos, os bebês com o TEA não procuram pela mãe, não reagem a atos de carinho, como por exemplo, abraços. O diagnóstico do TEA é feito por uma equipe multidisciplinar, onde o paciente é observado em diferentes situações, para obter um diagnóstico preciso. Após ser diagnosticado o TEA, a família da criança deve recorrer a tratamentos específicos, que irão auxiliar a criança e sua rede de apoio, buscando possibilidades para melhorar a qualidade de vida, proporcionando bem-estar e para que a criança tenha a oportunidade de desenvolver os aspectos motores, sensoriais e de comunicação. Sendo assim, um desafio para os pais, familiares e educadores, é estabelecer um elo positivo que proporcione aprendizagem para a criança, por isso é fundamental utilizar uma abordagem adequada e eficiente para que o indivíduo se desenvolva, de acordo com a sua realidade, mesmo que de forma lenta (FONSECA, 2014). Existem muitas formas de tratamento para o TEA, a Equoterapia é uma técnica que está cada vez mais sendo utilizada como recurso terapêutico para o tratamento do TEA (BUENO, MONTEIRO, 2011). O modelo terapêutico da Equoterapia envolve uma equipe interdisciplinar, composta por profissionais de áreas de saúde e equitação como: fisioterapeutas, psicólogos, equitadores, médicos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais entre outros, que durante a efetiva realização de um programa de atendimento equoterápico, são partes contribuintes para a aplicação eficaz do método. Assim, o presente estudo tem como objetivo analisar o tratamento de Equoterapia no desenvolvimento de uma criança (10 anos) com o Transtorno do Espectro Autista nos aspectos cognitivos, emocionais, psicomotores, sociais e de comunicação, através de entrevistas realizadas com os profissionais da equipe técnica, composta por: psicóloga, terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e fisioterapeuta. 1.1 O Transtorno do Espectro Autista O termo autismo surgiu em 1911, de acordo com Santana (2013), quando Bleuler psiquiatra austríaco, utilizou o termo para referir-se a uma alteração comum à esquizofrenia, sendo o isolamento da realidade externa, o termo autismo teria o significado de estar fechado em si mesmo. O mesmo autor faz referência que em 1942, Leo Kanner psiquiatra americano, descreveu por meio de um artigo, a realidade de algumas crianças consideradas especiais, tendo como tema o autismo sob o nome de “distúrbios autísticos de contato afetivo”. O SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 6 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 psiquiatra estudou minuciosamente onze pacientes esquizofrênicos, onde observou o transtorno autista como característica marcante em seus pacientes, na época destacou que as crianças autistas nasciam assim, considerando o fato de que a síndrome era precoce. No momento em que observou o comportamento dos pais dessas crianças, passou a mudar os seus conceitos relacionados à síndrome, considerando o contato afetivo frio entre elas, denominado como “mãe geladeira”, referindo-se a frieza das mães, promovendo em seus filhos hostilidade inconsciente a qual seria direcionado para situações de relacionamento social. Asperger em 1944, também teve sua participação para a divulgação do autismo, tendo semelhanças às hipóteses de Kanner, com algumas diferenças. Asperger na Alemanha apresentou histórias clínicas de quatro crianças e as nomeou como “psicopatia autista”, caracterizando o comportamento autista como, falta de empatia, pouca habilidade para fazer amigos, comunicação não verbal pobre e linguagem repetitiva, inabilidade motora e má coordenação (UNTOIGLICH, 2013). Os conceitos acima denotam um comportamento clássico do transtorno autista, sendo a falta de habilidades sociais e a reciprocidade as principais características, causando dificuldades de aprendizagem e na interação social. A criança fica aprisionada a rituais e sintomas, evitando emoções criando um mundo particular, onde a comunicação é um desafio que compromete o desenvolvimento saudável (ANDRADE, TEODORO, 2012). Porém, a tese de que as mães poderiam influenciar no aparecimento do transtorno, foi deixado de lado, no momento em que as tecnologias de estudo foram sendo aprimorados. Na atualidade, o autismo passou a ser considerado uma desordem de origem neurobiológica, sendo classificado pelo CID - 10 (Classificação Internacional de Doenças, 1993), como um Transtorno Global do Desenvolvimento. Caracterizado por diversos fatores, sendo eles: um desenvolvimento anormal ou alterado, manifestado antes de três anos, uma perturbação característica do funcionamento em cada dos três domínios, sendo as interações sociais, a comunicação, o comportamento focalizado e repetitivo, ainda ressalta que o transtorno acompanha outras manifestações inespecíficas, como por exemplo, fobias, perturbações de sono ou da alimentação crises de birra ou agressividade (FERNANDES et al., 2012). Em muitos casos, o TEA, pode ser percebido antes dos três anos de idade, é importante ressaltar que o diagnóstico do TEA é obtido através de observação clínica e pela história referida pelos pais ou responsáveis, sendo feito sempre por uma equipe multidisciplinar. Para obter um diagnóstico preciso, é ainda fundamental que a criança seja observada de forma física, psicológica e neurologicamente, sendo necessário realizar entrevistas com os pais para SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 7 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 uma maior compreensão sobre o caso, além de exames complementares para doenças genéticas e hereditárias (SANTANA, 2013). Segundo o DSM-V, Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (2014), os fatores prognósticos do transtorno autista são a presença ou ausência de deficiência intelectual e comprometimento da linguagem associados, bem como outros problemas de saúde mental, existindo fatores de risco inespecíficos, como idade parental avançada, baixo peso ao nascer ou exposição fetal a ácido valproico (antiepiléptico), podendo assim contribuir para o risco do Transtorno do Espectro Autista. A genética e a fisiologia, também são fatores relevantes, existem estimativas de herdabilidade para o transtorno, variando de 37% até mais ou menos 90%, com base nas taxas de concordância entre gêmeos. Nos dias atuais, 15% dos casos podem estar associados à mutação genética, no entanto, mesmo quando um transtorno do espectro autista estiver relacionado a uma mutação genética conhecida, pode não haver penetrância completa. O diagnóstico do autismo sofreu modificações em sua classificação a partir do DSM-V (2014), a principal alteração foi à eliminação das categorias Autismo, Síndrome de Asperger, Transtorno Desintegrativo e Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação, passou a existir apenas uma denominação, sendo “Transtornos do Espectro Autista” (TEA), os critérios diagnósticos se referem aos déficits relacionados à comunicação, a emoção, relacionamento social, motricidade, contato visual e linguagem, no qual o processo de desenvolvimento infantil está significativamente comprometido com relação à interação social e comunicação, assim como pelo repertório restrito de interesses e atividades. Ainda de acordo com informações retiradas do DSM-V (2014), a prevalência do TEA, alcançou 1% na população dos Estados Unidos e em outros países, com estimativas similares em amostras de crianças e adultos, porém ainda não está claro se taxas mais altas refletem expansão dos critérios diagnósticos do DSM-IV incluindo casos subliminares, diferenças na metodologia dos estudos ou aumento na frequência do transtorno. Embora ainda não haja uma etiologia comprovada, que explique os reais motivos para o autismo, muitos estudiosos tentam explorar o assunto para compreender melhor as suas causas, e muitas já foram citadas, sendo as principais, os fatores psicológicos, disfunções cerebrais, alterações de neurotransmissores e fatores ambientais (LINHARES, 2012). SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 8 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 1.2 Formas de tratamento O tratamento do TEA envolve diversas intervenções psicológicas e educacionais, como orientação familiar, desenvolvimento da linguagem e socialização. O tratamento é sempre feito por uma equipe multidisciplinar que está habilitada para desenvolver um programa de intervenção orientado, com o objetivo de satisfazer as necessidades particulares de cada indivíduo. Os profissionais envolvidos no tratamento são: psiquiatras, psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas e educadores físicos (FERRARI, 2009). São utilizados diferentes métodos e procedimentos de intervenção com a intenção de reverter, em parte, as alterações dos quadros dos TEA, buscando proporcionar uma melhor qualidade de vida para os indivíduos diagnosticados dentro desse espectro, a análise do comportamento tem papel primordial no desenvolvimento de tecnologia comportamental eficiente na intervenção sobre esses distúrbios (MARINHO, MERKLE, 2009). Segundo informações obtidas no site “Associação de amigos do Autista – (AMA, 2008)”, existem tratamentos específicos para o Transtorno do Espectro Autista, são eles: TEACCHR que é um programa estruturado que combina diferentes materiais visuais para organizar o ambiente físico através de rotinas e sistemas de trabalho, de forma a tornar o ambiente mais compreensível, esse método visa à independência e o aprendizado. O PECSR sendo um método de comunicação alternativa através de troca de figuras é uma ferramenta valiosa tanto na vida das pessoas com autismo que não desenvolvem a linguagem falada, quanto na vida daquelas que apresentam dificuldades ou limitações na fala. O ABA, ou seja, Análise Comportamental Aplicada, que se embasa na aplicação dos princípios fundamentais da teoria do aprendizado, baseado no condicionamento operante e reforçadores para incrementar comportamentos socialmente significativos, reduzir comportamentos indesejáveis e desenvolver habilidades. Há várias técnicas e estratégias de ensino e tratamento comportamentais associados à Análise do Comportamento Aplicado que tem se mostrado útil no contexto da intervenção incluindo: (a) tentativas discretas, (b) análise de tarefas, (d) ensino incidental, (e) análise funcional, e o uso de medicações, que é indicado quando existe alguma comorbidade neurológica e/ou psiquiátrica e quando os sintomas interferem no cotidiano. É importante ressaltar que até o momento não existe uma medicação específica para o tratamento de autismo, e a Equoterapia é um recurso terapêutico que também pode ser usado como forma de tratamento do TEA. É importante destacar que não existe tratamento padrão SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 9 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 que possa ser utilizado, dessa forma, cada paciente deve ter acompanhamento individual, de acordo com suas necessidades e deficiências (LINHARES, 2012). 1.3 Definição de Equoterapia A Equoterapia, segundo os autores Silva e Aguiar (2008), é um método terapêutico educacional que utiliza o cavalo dentro de uma abordagem interdisciplinar, nas áreas de saúde, educação e equitação, buscando o desenvolvimento biopsicossocial de pessoas portadoras de deficiências e/ou com necessidades especiais. A palavra “Equoterapia” foi criada pela ANDE-BRASIL, sendo fundada a Associação Nacional de Equoterapia (ANDE BRASIL, 2010), instituição de cunho societário civil, de caráter filantrópico, terapêutico, educativo, cultural, desportivo e assistencial, não visando lucros, atuando em todo o país, sediada na cidade de Brasília no Distrito Federal no dia 10 de maio de 1989. No ano seguinte em 1990, com a disponibilidade de infraestrutura básica, proporcionando condições de realizar atendimento e com uma equipe interdisciplinar de profissionais nas áreas da saúde, educação e equitação, foi realizado a 1.ª sessão de Equoterapia com pacientes na sede da ANDE BRASIL, com apoio da equipe de profissionais da saúde do Hospital Sarah Kubitschek, referência no Brasil no tratamento do aparelho locomotor, tornando possível a execução prática do método terapêutico em vigência na Europa, de onde foi reproduzido. Em seguida oficializou-se o 1.º Encontro Nacional de Equoterapia com a participação de órgãos do Governo Federal, instituições universitárias e especial participação da Associação Nacional Italiana de Reabilitação Equestre- ANIRE – ITÁLIA. Já em 1997, o Conselho Federal de Medicina por meio do parecer n.º 06/97 de 09 de abril de 1997 deu por reconhecido a Equoterapia como método de reabilitação (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE EQUOTERAPIA, 2006). A palavra Equoterapia está registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial INPI, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, com o Certificado de Registro de Marca n.º 819392529, de 26 de julho de 1999, o reconhecimento da Equoterapia como método terapêutico e educacional, iniciou a partir do momento em que o Conselho Federal de Medicina - CFM, em Sessão Plenária de 09 de abril de 1997, aprovou no Parecer 06/97, que: A Equoterapia é reconhecida como método a ser incorporado ao arsenal de métodos e técnicas direcionadas aos programas de reabilitação de pessoas com necessidades especiais (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 1997). O tratamento com a utilização do cavalo precisa estar fundamentado e amparado em pesquisa científica, sendo comprovado com estudos e sendo reconhecido como modelo SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 10 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 sistemático de reabilitação, precisando produzir resultados eficazes. Na área da saúde, estas respostas são presenciadas nos aspectos, físico-motores, e psicológicos e sociais, o que culminou com a manifestação do órgão oficial que zela pela saúde e bem-estar da sociedade, o Conselho Federal de Medicina (1997), quando publica o parecer favorável ao reconhecimento do método de reabilitação. Os benefícios que decorrem do método Equoterápico são evidenciados e comprovados nas áreas da saúde, educação e equitação, dessa forma, foi criada uma associação que representasse e englobasse todos os conceitos de reabilitação e educação com o uso do cavalo como agente promotor (ANDE-BRASIL, 2010). 1.4 Equoterapia e o Psicólogo Para Cittério (1991), a prática da Equoterapia objetiva benefícios físicos, psíquicos, educacionais e sociais de pessoas com deficiências físicas ou mentais e/ou com necessidades especiais, sendo, deficiências físicas ou mentais que podem ser causadas por lesões neuromotoras de origem encefálica ou medular, patologias ortopédicas congênitas que geralmente são adquiridas por acidentes diversos, disfunções sensório-motoras, comportamentais, de aprendizagem. Os recursos terapêuticos que utilizam o cavalo são considerados um conjunto de técnicas reeducativas, que auxiliam no desenvolvimento dos aspectos sensoriais, motores, cognitivos e comportamentais, caracterizando como uma atividade lúdico-desportiva (NASCIMENTO, 2006). A Equoterapia é uma atividade que exige a presença de uma equipe multidisciplinar, sendo composta por profissionais da área da psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia (NEWTON, 2011). A função do psicólogo durante a atividade da Equoterapia, conforme Bueno e Monteiro (2011) é possibilitar ao paciente um cenário simbólico, para que inicie o vínculo junto ao cavalo, buscando familiarizar o praticante ao ambiente, para que seja possível desenvolver as atividades terapêuticas, criando desta forma o setting terapêutico. No primeiro momento um exercício de alongamento, com conversa, onde psicólogo estimula o vínculo entre ambos. Desta forma, o psicólogo desenvolve um papel de extrema importância, acompanhando os praticantes e seus familiares, orientando-os, através de jogos, brincadeiras, sempre de forma lúdica. É importante destacar que cabe ao psicólogo conhecer todos os profissionais que estarão trabalhando juntos de forma interdisciplinar, como o cavalo, o praticante, e todo o material empregado nas técnicas e exercícios utilizados na equoterapia. De acordo com SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 11 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Barbosa e Munster (2013) o psicólogo ajuda na desenvoltura da equipe, para haver harmonia entre todos e obter um ótimo resultado no trabalho, portanto a interação de toda a equipe permite que cada um entenda a abordagem de seu colega, possibilitando assim um trabalho dinâmico. 1.5 Equoterapia como tratamento do Transtorno do Espectro Autista. De acordo com Marinho (2009), a equoterapia no tratamento do TEA inicia após ser feito um diagnóstico preciso e o encaminhamento ocorre quando o médico considera necessário. Após o paciente passar por uma avaliação com profissionais multidisciplinares como: psicólogo, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e equitador, a equipe multidisciplinar é essencial, pois é ela que garante a escolha correta do cavalo, bem como do programa específico para cada praticante. Para realizar o processo terapêutico Ferrari (2009), ressalta que é importante a equipe técnica, ter conhecimento aprofundado sobre os sintomas e as limitações do paciente, levando em consideração também o contexto social em que o indivíduo está inserido, proporcionando benefícios para o paciente, assim como a sua família. É importante lembrar que os principais sintomas do TEA, estão relacionados aos déficits na reciprocidade sócio emocional, nos comportamentos comunicativos, dificuldade para se adequar a contextos sociais, padrão restritivo e repetitivo de comportamento, movimentos motores estereotipados (ex.: alinhar brinquedos, estereotipias motores simples), rotinas de rituais de comportamento verbal ou não verbal (sofrimento extremo diante de grandes ou pequenas mudanças), interesse fixo e anormal a determinados objetos, hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais (DSM-V, 2014). Dessa forma atividades lúdicas e recreativas podem contribuir de forma positiva no tratamento do transtorno, principalmente quando são realizadas ao ar livre, sendo a equoterapia a atividade proposta que é desenvolvida dessa forma. A prática da Equoterapia é desenvolvida ao ar livre, uma característica positiva e diferenciada é que o paciente fica ligado à natureza, proporcionando a execução de exercícios psicomotores, de recuperação e integração, completando as terapias tradicionais em clínicas e consultórios (SILVA, 2006). Nascimento (2006) ressalta que a atividade terapêutica da Equoterapia inicia no instante em que o indivíduo entra em contato com o animal, no primeiro momento o cavalo passa a representar um problema, exigindo que o praticante aprenda a lidar, aprendendo também a maneira correta de montar ou descobrindo meios para fazer com que o animal SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 12 aceite seus comandos, essa relação contribui para o desenvolvimento da sua autoconfiança, afetividade e autonomia, trabalhando também os limites. Dessa forma é importante ressaltar, que as terapias utilizando cavalos podem ser consideradas como um conjunto de técnicas que agem para superar danos sensoriais, motores, cognitivos e comportamentais, através de uma atividade lúdico-desportiva que tem como meio o cavalo (CITTÉRIO, 1991). Sendo assim é importante que a criança com o transtorno tenha a possibilidade de ser observada e diagnosticada por uma equipe multidisciplinar, com o objetivo de ser programada a melhor forma de tratamento, de acordo com a necessidade e realidade da criança. 2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Foi realizada uma pesquisa com metodologia qualitativa, possibilitando interpretar como o indivíduo percebe o mundo que o cerca. A pesquisa qualitativa, permite compreender o sujeito da pesquisa, focando seu papel específico e suas relações sociais, dentro do contexto ao qual faz parte (BARDIN, 2011). Participaram do estudo uma equipe multidisciplinar, composta por: psicóloga, terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e fisioterapeuta. Todos profissionais habilitados para trabalhar com a técnica da Equoterapia, profissionais da área da saúde, que trabalham com uma criança com Transtorno do Espectro Autista. A presente pesquisa foi avaliada e aprovada pelo plenário do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos e Animais da Universidade Luterana do Brasil, campos Canoas, nº 771.199 em 28/08/2014. A coleta de dados foi realizada no período outubro de 2014, em lugares alternados de acordo com a escolha dos participantes, mediante agendamento prévio de data e horário. Inicialmente, foi prestado esclarecimento sobre a pesquisa e após o aceite, foi solicitado que lessem e assinassem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, foi concordado a autorização para a gravação da entrevista. Foi realizada uma entrevista semiestruturada, contento cinco questões abertas, essa entrevista foi realizada individualmente, em ambiente reservado, garantindo, assim, o sigilo e o conforto das participantes. Elas tinham duração média de uma hora e foram gravadas e transcritas para análise. Para a análise dos dados foi utilizada a metodologia de Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2011), que é uma expressão comumente usada para representar o tratamento dos dados de uma pesquisa qualitativa, dados estes obtidos através da entrevista semiestruturada. SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 13 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 A análise de conteúdo, segundo Bardin (2011), é um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter de forma sistemática o conteúdo das mensagens. Este método de análise divide-se em cinco etapas. A pré-análise é a fase de organização, que consistiu na escolha dos documentos a serem analisados e na retomada dos objetivos iniciais da pesquisa. A primeira atividade foi o contato com os documentos e o conhecimento do texto, surgindo hipóteses ou questões norteadoras, o que Bardin (2011) chama de leitura flutuante. Após, escolheu-se índices, que surgiram destas questões norteadoras e das hipóteses, que foram organizados em indicadores. A exploração do material consistiu numa operação classificatória, que visou alcançar o núcleo de compreensão do texto. Buscou-se encontrar categorias que são expressões ou palavras significativas em função das quais o conteúdo de uma fala foi organizado e descrito. Na fase seguinte, de acordo com Bardin (2011), buscou-se transformar as unidades significativas em categorias, conforme critérios de semelhança dos conteúdos. Assim, pôde-se sintetizar os dados obtidos nas entrevistas. Em seguida, foi realizada a apresentação dos resultados em categorias, a partir da análise do material das entrevistas. Foram criadas nesta pesquisa cinco categorias. Esta etapa será apresentada no capítulo a seguir. Na última fase, a interpretação, os resultados brutos foram tratados de maneira a serem significativos e válidos, a partir de operações que permitiram salientar as informações obtidas. Em seguida, voltou-se aos referenciais teóricos que deram embasamento e perspectivas significativas ao estudo. A relação entre os dados obtidos e a fundamentação teórica, conforme Bardin (2011) deu sentido à interpretação, que será apresentada logo após na apresentação e discussão dos resultados. 3. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A seguir serão apresentados e discutidos os resultados obtidos através das entrevistas realizadas. Os temas foram divididos em quatro diferentes categorias, sendo elas: a) o cavalo como agente provedor de mudanças no desenvolvimento da criança autista, b) movimentos motores adquiridos durante o processo terapêutico, c) afetividade e socialização como mudanças positivas durante o tratamento e d) bem-estar, alegria e a qualidade de vida após o tratamento. As entrevistas semiestruturadas foram aplicadas em quatro profissionais responsáveis pelo tratamento de uma criança autista, sendo eles: 1) psicóloga; 2) terapeuta ocupacional, 3) fonoaudióloga e 4) fisioterapeuta, todos atuam na Equoterapia há seis anos, tendo feito curso especializado para poder atuar na área, estando em tratamento com a criança autista há quatro anos. É importante ressaltar que a realização da atividade prática de equoterapia SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 14 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 possibilita trabalhar a criança de forma individual ou grupal, onde o acompanhamento interdisciplinar é fundamental prevendo as adaptações e estabelecendo assim um programa para atender as necessidades específicas de cada praticante (SILVA, AGUIAR, 2008). Sendo assim, a equipe multidisciplinar é fundamental para o sucesso no tratamento equoterápico, podendo criar programas com o objetivo de contribuir no desenvolvimento da criança. A criança em questão trata-se de uma menina de 10 anos com o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista, que está em tratamento há quatro anos, a atividade é realizada em uma instituição onde existe a estrutura adequada para a realização da terapia, contendo picadeiro, cavalos disponíveis, equitadores e uma equipe multidisciplinar habilitada para realizar a atividade. A categoria (a) está relacionada à importância do cavalo durante todo o processo terapêutico da atividade, sendo uma questão extremamente importante que apareceu nas quatro entrevistas realizadas, onde os técnicos ressaltaram que o animal é primordial na atividade equoterápica, sendo o protagonista, e a equipe entra como complemento ao tratamento. De acordo com as entrevistas feitas, podemos identificar que o significado da equoterapia, vai além dos conceitos estabelecidos nos livros, segundo os técnicos a equoterapia, é uma intervenção que está fundamentada principalmente na atuação do cavalo, a psicóloga ressalta a importância do cavalo durante o processo do tratamento cita:“a equoterapia é uma relação afetiva com o cavalo, que em minha opinião é um ser de muita afetividade, e o terapeuta é um coadjuvante, dessa terapia ele vai tá ali, digamos ele vai estar ali orquestrando, direcionando essa relação e através do feeling da experiência profissional do psicólogo no caso, desenvolvendo a pessoa que está praticando, desenvolvendo aspectos necessários, como segurança, expressão, autoestima, e o afeto as emoções, mais ou menos isso.” De acordo com Vogel e Lyra (2007) as interações com o cavalo, incluindo os primeiros contatos, o ato de montar e o manuseio final, contribuem no desenvolvimento de novas formas de socialização, autoconfiança e autoestima, a fonoaudióloga, também ressalta a importância do animal no tratamento terapêutico da equoterapia dizendo:“a equoterapia é tratamento terapêutico que vem em auxílio, e com a ajuda do animal, o cavalo, é um trabalho em equipe, mas não só da equipe multidisciplinar, mas o animal é o centro, é o principal, é o tratamento terapêutico que auxilia no desenvolvimento da criança num todo, biopsicossocial.” É importante compreender como os técnicos percebem a equoterapia, e como eles se relacionam entre si, pois as atividades acontecem em equipe, porém cada um possui uma responsabilidade específica, onde todas as partes se complementam, com o intuito de beneficiar o paciente, promovendo as mudanças SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 15 de acordo com as necessidades do paciente. De acordo com as entrevistas, o cavalo é o protagonista e a equipe é coadjuvante durante a atividade. O terapeuta ocupacional fala sobre o sentimento e das mudanças da paciente em relação ao cavalo, citando com: “o cavalo foi o agente de mudanças no comportamento da paciente, ela iniciou com o comportamento de fuga e com o desenvolvimento das sessões ela foi se vinculando ao cavalo, e a demonstração é a felicidade, alegria por está ali com cavalo, tocando fazendo carinho manifestando e fazendo alguns sons”. Esse vínculo está relacionado ao que os autores Vogel e Lyra, (2007) referem diante da interação com o cavalo, incluindo os primeiros contatos, o ato de montar e o manuseio final, desenvolvem novas formas de socialização, autoconfiança e autoestima. A autonomia é um aspecto muito relevante durante o processo do tratamento, que pode ser observado como um resultado positivo, assim como relata a fonoaudióloga:“...ela está mais independente, consegue soltar, antes ela saia correndo da gente, hoje em dia, ela fica esperando o horário dela, ela deixa colocar o capacete, bem tranquila, pega a nossa mão vem, antes parecia que as pernas dela ficavam frouxas, caindo, agora ela caminha, sabe, põe o pé ali, ela própria se ajuda, ela já tem uma organização, antes tínhamos que fazer força, ela da beijo no cavalo sem medo”, que segundo Mendes (s/d), sugere que a atividade terapêutica da Equoterapia começa no instante em que o aluno entra em contato com o animal, onde o praticante aprende a lidar com a presença do cavalo, aprendendo também a maneira correta de montar, essa relação contribui para o desenvolvimento da sua autoconfiança, afetividade e autonomia. Ainda sobre a relação afetuosa com o cavalo durante o processo terapêutico, a psicóloga fala sobre os pontos positivos:“...são vários pontos positivos, mas um dos principais é a confiança, é uma relação de confiança mutua tanto do praticante com o animal, quanto do animal com o praticante também, e o cavalo se comunica com o olhar, pelos gestos, pelos movimentos, o praticante pode estar entrando nesse universo do animal, começa a desenvolver outra dimensão de percepção, eu acho que o cavalo tem uma sensibilidade muito grande, inclusive espiritual, é uma vivência, é firme, é grande, sensível e puro, o brilho do olhar faz entrar em outra dimensão”. Sendo uma das maiores dificuldades do TEA, o fato de receber e demonstrar afeto às pessoas, que segundo Fonseca (2014), em alguns casos é possível perceber nos primeiros anos de vida do bebê. O fato de eles não olharem diretamente para os pais, geralmente se entretêm sozinhos, são repetitivos e não interagem com os outros, tendo dificuldades em se relacionar com a própria mãe, SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 16 característica que se intensifica ao longo dos anos, prejudicando a vida social, assim como o processo de aprendizagem. Percebe-se que ao iniciar o tratamento equoterápico, a criança inicia em um mundo novo e diferente, cheio de possibilidades, onde muitos ganhos são adquiridos, sendo a relação afetiva um dos principais, ultrapassando barreiras e modificando de forma positiva sua rotina. A categoria (b), diz respeito a movimentos motores, fatores que tiveram mudanças significativas durante o tratamento, tendo a flexibilidade e o equilíbrio como ganhos positivos, a psicóloga fala a respeito com a seguinte frase:“...eu acredito que o contato físico e corporal, dela estar tocando no cavalo, sentada, abraçando e desenvolvendo mais flexibilidade, também porque ela tinha muita rigidez e foi desenvolvendo mais flexibilidade na montaria, foi tendo um pouco mais de leveza”. Para Brilinger (2005), os movimentos proporcionados pelo andadura do cavalo são capazes de despertar no corpo do praticante uma grande quantidade de estímulos sensoriais e neuromusculares que interferem diretamente na aquisição de habilidades motoras. A fonoaudióloga diz que: “...hoje em dia, ela quer ir, quer subir, quando o cavalo para ela quer continuar, o equilíbrio dela mudou, antes ela caia, tinha muitas quedas, não parava, hoje em dia fica esperando a vez dela, deixa colocar o capacete, coloca o pezinho e sobe no cavalo”. Segundo Freire et al. (2007), a equoterapia sendo organizada com técnicas adequadas e por equipe capacitada proporciona melhoras nos aspectos motores relacionados ao equilíbrio. É possível identificar, dessa forma, que as mudanças ocorridas no processo terapêutico, durante as sessões de equoterapia, são percebidas também no cotidiano da criança, sendo esse um dos principais objetivos da prática. Para Ferrari (2009), o cavalo é constituído por mais de 200 ossos diferentes, o que significa que em movimento este conjunto de ossos desencadeia uma gama de estímulos insubstituíveis por qualquer outro recurso mecânico, o cavalo realiza um movimento tridimensional: para frente e trás, para cima e baixo, para esquerda e direita, contribuindo na coordenação motora, alinhamento postural, autoestima, atenção, concentração, estimulação sensório-motora, noção espacial e esquema corporal. A fisioterapeuta relata que também percebeu grandes modificações nesse aspecto: “...percebo grandes melhoras na coordenação motora, no equilíbrio, sinto que ela mais calma e focada e feliz na atividade, muito diferente de quando começou”. As mudanças citadas pelos técnicos são percebidas também pelos familiares, que acompanham assiduamente as atividades, o terapeuta ocupacional diz que: “...hoje em dia ela chega acompanhada pela mãe, de mãos dadas, espera a vez dela, a própria mãe se diz SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 17 contente, que consegue ir sozinha com a menina a alguns lugares, sem que ela fique agressiva ou caindo no chão, antes tinha que sair sempre com a companhia de uma terceira pessoa para segurá-la”. Ainda sobre as questões motoras, a fonoaudióloga relata que: “...durante o percurso ela é muito atenta aos barulhos da rua, tudo chama a atenção dela, sendo bem sensível aos sons, principalmente de carros e caminhões, porém ela consegue se manter em cima do cavalo e continuar o percurso, coisa que no início do tratamento não acontecia, quando ela escutava um som desses queria sair, queria virar, e era bem dificultoso para continuar a atividade”. De acordo com o DSM-V (2014) um dos aspectos do diagnóstico do TEA, é a hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente, o que se percebe nessa criança, é o fato de ela estar conseguindo lidar com essa questão, que foi modificada durante o processo do tratamento, sem deixar comprometer a atividade equoterápica. Newton (2011) realizou um estudo em que relatou que a prática de equoterapia é capaz de desenvolver aspectos como a sensibilidade física e psíquica, pois exige a constante percepção e reação frente a diversos estímulos, o que resulta em harmonia e equilíbrio físico e psíquico. A percepção do outro, a imitação, a vivência social, mímica, linguagem falada, sorriso como resposta, postura corporal ou gestos para iniciar ou modular a interação social, vinculação com objetos inusitados, percepção em relação ao mundo externo, são algumas características que segundo Silva e Aguiar (2008), podem ser observadas durante as atividades da equoterapia. É importante lembrar que nem todos os praticantes reagem da mesma forma, a criança que está sendo analisada, teve ganhos notáveis em muitos aspectos, sendo a flexibilidade e o equilíbrio alguns deles, dessa forma é importante ressaltar a importância da preparação da equipe técnica, assim como a colaboração da família, afim de alcançar os objetivos propostos pela atividade. A categoria (c) trata dos aspectos de afetividade e socialização, sendo características de maior dificuldade do transtorno, e que ao entrevistar a equipe técnica foi possível detectar que existem ganhos obtidos através do tratamento. Segundo o DSM-V (2014) a afetividade e a socialização são critérios diagnósticos, sendo especificados como déficits na reciprocidade social e emocional, assim como dificuldade em estabelecer uma conversa normal e lidar com emoções e demonstrações de afeto. A psicóloga refere que: “...com o desenvolvimento das sessões, ela foi se vinculando ao cavalo, tocando, fazendo carinho, manifestando alguns sons. Vejo que ela começou o tratamento muito distante, com muita resistência, agora ela está mais aberta, tendo contato com o terapeuta, mais proximidade com a equipe”. De SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 18 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 acordo com Barbosa e Munster (2013), a equoterapia pode ampliar socialização da criança, dando condições para que ela possa desenvolver simultaneamente outras habilidades que estão internamente relacionadas com desenvolvimento do praticante. Entende-se que todo o processo terapêutico tem um tempo de adaptação, por isso é válido destacar a fala da psicóloga: “...o processo de adaptação durou em torno de dois meses...” e diz ainda: “...a confiança é mutua, entre praticante e animal, o praticante acaba entrando no universo do animal”. A fonoaudióloga faz referência a essas mudanças: “... ela pega o terapeuta pela mão e quer começar logo”, outra frase marcante dita pela terapeuta ocupacional: “...me olha, me aceita, me da à mão”, essas frases significam que a criança estabeleceu vínculo afetivo, não apenas com o cavalo, mas com a equipe técnica também, o que possibilita uma comunicação eficaz entre paciente/equipe, não só na atividade terapêutica, mais sim na vida cotidiana da paciente. A fonoaudióloga relata sentir diferença na comunicação da menina durante a atividade: “...noto que ela tem mais uma comunicação visual com a gente, não assim olho a olho, mas agente nota que, até o último atendimento dela, ela deu tchau para nós, já estava com outro paciente, e a mãe saiu depois com ela, gritei tchau e ela abanou para o nada, mas ela fez o gesto, ela levantou, ela não olhou para nós, mas ela sabia que era tchau”. Do ponto de vista psicológico segundo Bueno e Monteiro (2011), a equoterapia contribui nos aspectos da autoestima, autoconfiança, assim como sensação de bem-estar, proporciona condições para desenvolver afetividade (vínculo), desenvolvimento psicomotor, aquisição da autonomia. Há, também o estímulo da linguagem e da área sensorial e perceptiva, aspectos que possibilitam resultados positivos na vida social da criança. A psicóloga diz que: “...ela foi demonstrando felicidade, alegria por estar com o cavalo, tocando fazendo carinho manifestando alguns sons”, o fato de a criança estar adquirindo habilidades para lidar com as suas limitações, estão relacionadas ao vínculo construído durante o processo terapêutico, assim como a felicidade que demonstra ao estar praticando a atividade, que antes era um grande desafio, hoje faz parte da rotina de sua vida, o terapeuta ocupacional fala com entusiasmo sobre os progressos da paciente: “...é uma satisfação ver o desenvolvimento dela, o neurologista que vê ela uma vez por mês, nota a diferença, ele disse que ela melhorou 100%, a gente sabe que ela ainda vai progredir cada vez mais”. Muitos estudos constataram melhora dos praticantes de equoterapia segundo Ribeiro (2011), que relaciona a interação social, o equilíbrio estático e dinâmico, além da melhora nos aspectos comportamentais e emocionais nos praticantes da atividade. A fonoaudióloga relata sobre o progresso da paciente:“...ela entrou em 2010, tem 10 anos, 4 anos de SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 19 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 tratamento, a afetividade e socialização foram as principais mudanças, o nosso vínculo é muito positivo, e a socialização pelo que a mãe comenta, ela está conseguindo sair só a mãe e ela, antes tinha que levar alguém junto uma em cada mão, a mãe diz que agora está conseguindo sair sozinha com ela, porque ela se jogava no chão, às vezes ela ainda dispara, mas não como antes, ela aceita os colegas, ela sempre é a primeira a fazer a atividade, mas ela vê as outras crianças, não empurra os outros, ela só teve evoluções”. A categoria (d) representa o fato da felicidade da criança em estar em contato com o animal, com a natureza e com todos que participam da atividade, sendo esse um ganho essencial e de extrema importância em qualquer tratamento. Independente da situação do sujeito, as autoras Bueno e Monteiro (2011), consideram os movimentos tridimensionais do cavalo, assim como a relação que se estabelece com o mesmo sendo grandes precursores dos benefícios que a equipe atinge no decorrer dos atendimentos, considerando também a relação homem-cavalo e a vivência dos profissionais no processo terapêutico, onde todos esses fatores completam o setting terapêutico, e os resultados que serão proporcionados ao praticante. Dessa forma entende-se que a atividade equoterapia proporciona resultados positivos, sendo um conjunto de fatores que auxiliam, não apenas nos aspectos de desenvolvimento da criança, mas também modifica a rotina, contribuindo para a qualidade de vida e bem estar da criança e consequentemente da sua rede de apoio. O contato com o animal e com a natureza representa um novo mundo, onde a criança encontra desafios e oportunidades de estabelecer novos relacionamentos, aprendendo a lidar com as suas limitações, esses fatores são fundamentais, e estão diretamente relacionados aos diversos ganhos citados anteriormente, assim como o bem estar, e a alegria em praticar a atividade. A fisioterapeuta relata: “...ela sorri quando está em cima do cavalo”, a psicóloga em vários momentos ressalta a alegria da paciente: “... o que mais me chamou a atenção foi à alegria, a sensação de liberdade, de expressão como se ela pudesse está se manifestando de outra forma, expressando para outra forma de chamar a atenção dela, trazer ela para aqui e agora, naquele momento ela poder estar ali. ”As características do cavalo apontadas, explicam o fato de curiosidade da criança em relação ao animal, sendo visto no primeiro momento como algo assustador e no decorrer do tratamento percebe-se a fascinação que desperta no imaginário infantil. Por fim, é importante ressaltar o desempenho da equipe técnica que ao trabalhar em, proporciona mudanças significativas no desenvolvimento da criança, percebe-se que o cavalo e o local onde são feitas às atividades são fatores primordiais para o sucesso do tratamento, além das mudanças no desenvolvimento motor, social e afetivo, destaca-se a SOUZA e SILVA. Equoterapia no tratamento do transtorno do espectro autista. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 20 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 sensação de bem estar, a alegria ao cavalgar, fatores que estão relacionados ao vínculo criado com o animal assim como a equipe, dessa forma é possível associar uma modificação na vida cotidiana da paciente, adquirindo uma melhor qualidade de vida. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com os relatos dos técnicos (psicóloga, terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e fisioterapeuta) foi possível obter informações relevantes sobre o TEA, compreendendo como funciona a atividade da equoterapia, que está de acordo com o referencial teórico. Fica claro como a equoterapia se estabeleceu no Brasil, e como ela pode ser utilizada de forma profissional e válida, tendo o cavalo como o principal motivo para as mudanças ocasionadas durante e após o tratamento. É importante ressaltar que a disponibilidade da equipe técnica foi fundamental para a realização dessa pesquisa, equipe essa que reconhece e administra de forma consciente o papel e a função de cada um, valorizando assim o trabalho em grupo, considerando como fundamental o papel do animal durante à pratica. É possível perceber a responsabilidade dos profissionais que atuam nessa área, que de forma multidisciplinar identificam as reais necessidades de cada paciente e organizam as intervenções apropriadas para cada praticante. Considerando as limitações e dificuldades do Transtorno do Espectro Autista, tais como interação social, déficits nos aspectos psicológicos, afetivo, psicomotor, social e de comunicação, entre outros, foi possível observar que a atividade de equoterápica foi um método fundamental e eficaz para o desenvolvimento da menina proporcionando bem-estar e qualidade de vida, contribuindo também para melhorar a coordenação motora, o equilíbrio, a afetividade e os relacionamentos sociais, assim como a autonomia e a autoestima. É valido citar a importância de realizações de pesquisas como essas, para que cada vez mais posam contribuir para a descoberta de novas possibilidades referentes ao transtorno do espectro autista, assim como o conhecimento de novas opções de tratamento. 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Artigo Original Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 MÍDIAS SOCIAIS COMO FERRAMENTAS DE ESTRATÉGIAS DE MARKETING Marco Miller Trainini1 e Jéssica da Silva Torres1 RESUMO - O presente artigo aborda assuntos pertinentes ao uso das Mídias Sociais como ferramentas de estratégias de Marketing Digital, através da pesquisa bibliográfica que se desenvolve em conjunto ao estudo do Marketing de relacionamento com objetivo de identificar quais são as ferramentas da Internet utilizadas para desenvolver estratégias voltadas para o mundo em constante globalização e avanços tecnológicos, que cada vez mais, são eficazes para o desenvolvimento de competitividade a fim de atingir o máximo de pessoas possíveis. O estudo procurou como objetivo geral investigar a importância do Marketing Digital e das novas mídias, a fim de expor os benefícios e malefícios a respeito da utilização das mesmas, como canal de comunicação nas organizações. A pesquisa quanto aos fins é do tipo descritivo e exploratório, pois irá descrever as estratégias de marketing que são utilizadas sem um planejamento estratégico, utilizando-se um levantamento bibliográfico e análises de exemplos que facilite a compreensão. Palavras-chave: Marketing digital. Marketing de relacionamento. Mídias sociais. ABSTRACT – This article discusses matters pertaining to the use of Social Media as Digital Marketing strategies tools, through literature that develops together to relationship marketing study in order to identify what are the Internet tools used to develop focused strategies to the world of constant globalization and technological advances, increasingly, are effective for the development of competitiveness in order to achieve the maximum possible people. The study sought is to investigate the importance of digital marketing and new media, to expose the benefits and harms regarding the use of the same, as a communication channel in organizations. Research on ends is descriptive and exploratory, it will describe the marketing strategies that are used without a strategic plan, using a literature review and analysis of examples to facilitate understanding. Keywords: Digital marketing. Relationship marketing. Social media. Revista Ciência e Conhecimento Volume 9 – Nº1 – 2015. 1 – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo. Curso de Administração. São Jerônimo, RS, Brasil. Dados para correspondência Marco Miller Trainini; Rua: Barreto Leite, nº 381. São Jerônimo/RS/Brasil CEP: 96700-000 E-mail: [email protected] Recebido em: 28/09/2014. Revisado em: 28/11/2014. Aceito em: 10/03/2014. Área: Gestão do conhecimento. 24 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 INTRODUÇÃO As tecnologias cada vez estão mais integradas, com o desenvolvimento empresarial e a globalização, e as organizações estão se adaptando neste mundo tecnológico, fazendo com que o seu planejamento de marketing se inclua nesta tendência, para poder competir no mercado e buscar cada vez mais a atenção dos clientes, tendo um alto poder de transmitir e receber informações em um ambiente tão disperso. Devido à globalização, as organizações estão identificando ferramentas virtuais de acordo com o uso da Internet através de compras, pesquisas e principalmente a comunicação, várias empresas buscam lançar novas informações com o objetivo de atingir cada vez mais pessoas. As novas e grandes tecnologias instigam a curiosidade e faz com que aumente o consumo virtual, pois muitas informações estão sendo lançadas, trocadas, debatidas na rede, podendo ser acessada, visualizada por qualquer usuário, fazendo com que aumente o nível de competitividade para o gerador de conteúdo, resultando a utilização virtual cada vez mais efetiva e positiva para a marca. O Marketing Digital tem como foco além da fidelização de cliente, a personalização ao cliente, com muitas possibilidades de fortalecer a marca da empresa e reestruturar o planejamento e posicionamento perante o mercado. E-marketing pode avaliar e quantificar o impacto da ferramenta, buscando informações quanto ao retorno imediato e principalmente o relacionamento da empresa com o cliente. De acordo com este avanço na tecnologia, com as mudanças e adaptações, os clientes podem estar conectados em qualquer lugar e momento, e através desta oportunidade, esta pesquisa desenvolve a seguinte questão: quais as estratégias que as empresas podem utilizar para captar clientes com o Marketing digital? O objetivo desta pesquisa é identificar quais são as ferramentas do Marketing digital utilizadas para desenvolver estratégias para captar clientes, que cada vez mais, são eficazes para o desenvolvimento de competitividade a fim de atingir o máximo de pessoas possíveis. A pesquisa será do tipo descritivo e exploratório, pois irá descrever as estratégias de marketing que podem ser utilizadas nas organizações, utilizando-se um levantamento bibliográfico e analises de exemplos que facilite a compreensão. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 25 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 2. Referencial teórico 2.1 Marketing digital O conceito de Marketing é muito mais amplo que o Marketing digital, que segundo Fascioni (2007) podemos definir Marketing Digital como uma maneira de fazer Marketing através de ações de comunicação que as empresas utilizam com recursos digitais, podendo ser utilizados e representados via internet. Kotler (2000) afirma que as empresas terão mais chance de sucesso as que escolherem seu mercado-alvo e se prepararem para programas de marketing customizados. Afirmando então que é importante conhecermos o perfil do consumidor online. É essencial conhecer o contexto do marketing digital, para depois planejar ações que façam a empresa crescer. O marketing digital é uma das vantagens dos negócios online, onde se pode personalizar o contato com os consumidores virtuais, observar seu comportamento e medir o seu grau de engajamento. Torres (2009) diz que quando falamos de marketing digital e internet, estamos falando de pessoas, suas histórias e desejos, estamos falando sobre relacionamentos e necessidades a serem atendidas. Assim, o marketing vem em busca da necessidade pelo o qual todos desejam ou necessitam qualquer produto ou serviço. Torres (2009) afirma também que um modelo simples mostra quatro comportamentos do consumidor online, que permite analisar com mais profundidade e clareza as atividades realizadas na Internet, entendendo as motivações no uso de cada uma das tecnologias existentes, são eles: a) Relacionamento; b) Informação; c) Comunicação e d) Diversão. Conforme o autor citado, essa visão é baseada no comportamento do consumidor, que nos permite analisar e definir estratégias de marketing digital, muito mais adequadas a cada um dos ambientes e situações presentes na Internet. Vaz (2010) define da seguinte forma; [...] a época atual é do relacionamento. A palavra de ordem é personalizar a comunicação, os produtos, os serviços e criar um laço emocional com consumidores de modo que estes escolham sua empresa pelo coração, não pelo produto ou preço [...] O quadro 1, adaptado de Torres (2009) mostra a relação entre as estratégias de marketing digital, as estratégias do modelo de marketing digital e suas aplicações operacionais. É necessário entender que a Internet viabiliza o uso de mais uma estratégia que é o monitoramento de resultados, importante no mundo empresarial e difícil programar no marketing tradicional. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 26 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Quadro 1. O Marketing e a Internet. Estratégia de Marketing Estratégia de Marketing Digital Ações Táticas e Operacionais Tecnologias e plataformas empregadas atualmente Comunicação corporativa Relações Públicas Marketing de Conteúdo Geração de Conteúdo Marketing de busca Blogs SEO/SEM Marketing de Relacionamento Marketing nas mídias sociais Ações em rede sociais. Ações com blogueiros Orkut, Twitter, Facebook, Youtube, Linkedin etc. Marketing direto E-mail Marketing Newsletter Promoções Lançamentos E-mail SMS Publicidade e propaganda de Marketing de Guerrilha Marketing Viral Postagem de vídeos, animações e músicas Publicação de widgets Redes Sociais You tube Widgets virais Publicidade e propaganda Branding Publicidade on-line Banners Podcast e vídeo cast Widgets Jogos online Sites e blogs Mídias Sociais Google Adwords Pesquisa de Mercado Branding Pesquisa on-line Bancas e Clipping Monitoramento de marca Monitoramento de mídias Google Redes Sociais Clipping Fonte: Adaptado de TORRES (2009, p. 69). Chleba (1999) separa as grandes forçar do marketing digital em interatividade, personalização, globalização, integração, aproximação, convergência e democratização da informação. Para ele cada uma delas oferece uma nova dimensão à comunicação, às vendas e ao relacionamento com o mercado. São elas: A interatividade é uma exigência crescente dos clientes, e deve ser compreendida como a possibilidade bidirecional de transferência de dados, como a forma em que o usuário interage por meio de troca de dados e do fácil acesso as informações do que deseja. A personalização é uma força que o marketing digital deve usar de forma a atender especificamente cada pessoa, utilizando da segmentação e das informações. A empresa pode direcionar o conteúdo do jeito que o usuário deseja, adequando os serviços, produtos e anúncios individualmente. A integração e a utilização de um único sistema que reduz os custos e integram informações, esta é uma tendência muito forte que faz com que a empresa centralize suas operações neste único sistema. Aproximação se enquadra nas tecnologias multimídias, que permite a divulgação de produtos e serviços com um enorme volume informativo, fazendo com que esta aproximação realize a venda e que ela seja direta e sem intermediários, como ocorre nos sites. Convergência na representação digital das imagens, sons e vídeos. Democratização da informação na quantidade de informações disponíveis, nunca foi tão vasta e tão barata, tanto em sites informativos, quanto nos sites comparativos. Essas forças do marketing digital posicional a mídia como um inovador e poderoso recurso dotado de características únicas e indispensáveis para empresas que desejam estabelecer uma comunicação instantânea e direta com seu alvo. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 27 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Torres (2009) relata que essas estratégias são interdependentes e subdividem-se em: Marketing de conteúdo: é o conteúdo dentro de um site, e a primeira e mais importante forma de comunicação com o consumidor conectado. Marketing nas mídias sociais: são sites construídos para interação social e compartilhamento de informações, ou seja, opiniões de pessoas falando de diversas coisas, inclusive dos serviços prestados. Marketing viral: que é a comunicação individual entre um internauta e outro, o chamado “boca a boca”. E-mail marketing: uma forma de comunicação pessoal e empresarial, onde são enviadas mensagens em massa, para destinatários específicos, de maneira estratégica. Publicidade online: geralmente são banners com anúncios publicitários, que com o tempo ganharam animação, interação, som, vídeo e muitos outros recursos. Pesquisa online: é uma forma de conhecer o público-alvo, seu comportamento e suas opiniões, para planejar suas estratégias e ações de marketing. Monitoramento: que é uma ação estratégica que integra os resultados de todas as outras ações estratégicas, táticas e operacionais, permitindo verificar os resultados e agir para correção de rumos ou melhoria das ações. Dessa forma, nota-se que o marketing digital deve ser encarado como um conjunto de sete ações estratégicas, cada uma criando ações táticas e operacionais, que de forma coordenada e interdependente, gera sinergia e resultados, de acordo com a dinâmica utilizada pelas empresas. 2.2 Marketing de relacionamento O Marketing de Relacionamento é um processo de desenvolvimento, de liderança, de fidelidade ao consumidor e de rápida aceitação dos novos produtos e serviços no mercado. A criação de relações sólidas e duradouras é uma tarefa árdua, de difícil manutenção, mas acredita-se que, em um mundo onde o cliente tem tantas opções, mesmo em segmentos limitados, uma relação pessoal é uma das formas de manter a fidelidade do cliente. Hoje as empresas devem estudar o mercado e principalmente, seu público-alvo, para poder atender, da melhor forma, suas necessidades, pois o consumidor é a alma do negócio. Segundo Las Casas (1987): O mais importante era a conquista e a manutenção de negócios em longo prazo, mantendo relações permanentes com o cliente, por isso uma valorização maior do consumidor. O cliente passou a dominar o cenário da comercialização como um dos caminhos para a obtenção de melhores resultados. Estava determinado o conceito de marketing, em que o consumidor passava a ser considerado o rei. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 28 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 O Marketing de Relacionamento tem como pressuposto o conceito de valorização, que é o algo a mais do que produto ou serviço, ou seja, aquilo que não se toca e não se vê. Isso remete às práticas do atendimento diferenciado e qualificado. Trabalhar com os desejos, ansiedades do cliente, facilitando a memorização de sua marca, e deixar o cliente à vontade para que se possam compreender suas necessidades. Para McKenna (1993): Com o desenvolvimento da tecnologia e o aumento da competição, algumas empresas mudaram sua abordagem e começaram a voltar para o cliente. Essas empresas expressaram uma nova disposição em modificar seu produto de modo a atender às exigências dos clientes – praticando a escola de marketing do diga que cor prefere. Com efeito, com tantas empresas oferecendo produtos, a fidelização do cliente seria uma tarefa muito dispendiosa caso se utilizasse os métodos convencionais. Ou seja, aumentar o pessoal de vendas ou aumentar o pessoal de marketing. Uma prática mais fácil seria o treinamento do pessoal, que em uma pequena margem já melhoraria as condições reais de interação da empresa e o cliente, na qual o cliente falando de suas necessidades, indiretamente, estaria colaborando para o lançamento de novos produtos. Todos os setores que formam uma empresa são importantes e contribuem no processo de relacionamento e fidelização. Os funcionários internos precisam ter consciência da importância de prestar um atendimento diferenciado ao cliente, criando-se um valor adicional, aumentando, assim, suas possibilidades de fidelização. Para obter um bom trabalho de equipe e incrementar a fidelidade dos clientes é preciso derrubar as barreiras que separam os diferentes departamentos da empresa. Todos devem estar empenhados em prestar um serviço de excelência que supere as expectativas mais elevadas (SOUKI, 2000). Enfim, é importante que a empresa acompanhe todas as necessidades do cliente para obter dele a satisfação total. 2.3 Mídias sociais Ao se utilizar o marketing digital, podemos encontrar inúmeras ferramentas grátis que ajudam a promover a organização, como as redes sociais, onde as maiores do Brasil hoje são Facebook, You tube e Twitter, além de outras como Google+, Blogs, Orkut, que está foi encerrada e foi uma das maiores redes sociais, Askfm, Badoo, Instagram, etc. Além das redes sociais, as empresas podem utilizar websites, que foram os primórdios do marketing digital. A maior dúvida é saber distinguir o que cada rede social oferece e os recursos e a abrangência da atuação na internet. Uma rede social é composta por pessoas ou organizações, conectadas por vários tipos de relações, que partilham de objetivos e valores em comuns, característica fundamental na TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 29 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 definição das redes, possibilitando relacionamentos não hierárquicos e horizontais entre os usuários. 2.3.1 Facebook Facebook é uma rede social que foi criada em fevereiro de 2004, em Harvard, nos EUA por Mark Zuckerberg e três amigos. Em dezembro do mesmo ano, a rede já alcançara a marca de um milhão de usuários. Ele foi à rede social mais visitada do mundo, no ano de 2010, superando a Google, líder absoluta de acessos até então. O Facebook atinge nos dias de hoje vários usuários espalhados por todos os continentes, podendo também encontrar várias empresas, escolas entre outros que utilizam essa ferramenta para divulgar os acontecimentos, além de estarem sintonizados com os desejos e expectativas de seus clientes, sendo uma ferramenta comum nível de recursos incríveis, como fotos, textos, vídeos e também integrando o Youtube, Skype, Twitter, etc. Uma das grandes vantagens do uso do Facebook é que ele tem como característica a centralização de informações, o que permite ao usuário navegar em busca de diversos assuntos sem sair da sua página na rede. O Facebook, atualmente, pode ser acessado pelo celular, diminuindo a distância entre a rede e o usuário, que pode tê-la em suas mãos. Para pessoa física existe o Perfil no Facebook e para pessoa jurídica, que é a empresa possui uma página, mais conhecido como Fanpage. As vantagens para as empresas na Fanpage são: São indexadas pelos mecanismos de busca (Google, Bing...), o que aumenta o tráfego na página, e consequentemente no seu site; Visualmente se torna muito atrativo para o usuário, que em seu momento de lazer entra na página de empresas, buscando indicações de produtos e serviços; É possível criar campanhas de publicidade direcionadas para a página, dentro do Facebook; Não possui limitação de fãs (perfis estabelecem limites de amigos); Sua empresa estará dentro dos termos de uso do Facebook; A rede que mais cresce no mundo é a tendência que seus usuários passem a fazer compras através dela. Nas redes, quem dita às regras é o consumidor e não o anunciante. A página de um usuário é repleta de informações relevantes, onde encontramos a localidade da pessoa, interesses e, em muitos casos, o consumidor diz com suas próprias palavras seu desejo, pela atualização de status. A partir destas informações conseguimos conhecer melhor o público TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 30 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 alvo, podendo gerar o conteúdo que ele deseja receber no seu feed de atualizações, horários mais propícios para se fazer as postagens e o tipo de publicações que serão feitas (fotos, enquetes, links externos, ações promocionais que incentivem o usuário a interagir e compartilhar o conteúdo, e até a própria marca). Também é possível anunciar dentro da rede social, utilizando o Facebook Ads, que impulsiona o post e pode filtrar o público que deseja mostrar. Como qualquer outra mídia social, o sucesso da Fanpage depende do engajamento dos usuários perante a marca ou empresa. Isso depende de um bom planejamento nas redes e na web como um todo, realizado com muita competência. 2.3.2 Twitter O Twitter é um serviço online de micro blogging, sendo que o usuário deve responder a simples pergunta “O que está acontecendo” (What’s happening?) em no máximo 140 caracteres, assim ele pode expor opinião, debater, comentar e fazer publicidade. É uma rede de informações em tempo real (TWITTER, 2011). Como cita Vaz (2008); [...] o Twitter é um ambiente moderno, inovador, rápido, ágil, jovem, informal. Esse deve ser o espaço em que seus consumidores se sintam mais próximos de sua marca ou de você, tenham vontade de interagir, tenham a sensação de serem seus amigos e, por serem seus amigos, terem até um sinal positivo desta rede social [...] Está ferramenta é de grande prioridade para uma empresa que deseja ter um e-marketing audacioso em relação aos seus clientes, o exemplo é que se acabou de lançar o produto, as pessoas que seguem o usuário da empresa não precisarão entrar no site organizacional ou em sites de pesquisas, ao abrir o Twitter já haverá a informação que tal produto foi lançado. Diferente de outras redes sociais, no Twitter não é necessário que haja correspondência mútua entre usuários para que aconteça uma interação. É possível seguir alguém que não siga o seu perfil e vice-versa. Isso torna o Twitter uma poderosa mídia social de rádio difusão. Não há diferença técnica entre perfis de pessoas e de empresas. A dinâmica é a mesma para todos. Ao seguir um perfil, você automaticamente começa a receber em sua “timeline” os tweets desse usuário. A sigla RT é a abreviação de Retweet. Quando um usuário dá RT em um tweet de outro usuário, ele replica o conteúdo dele para seus próprios seguidores. O Retweet pode ser dado clicando no botão "Retweet", ao passar o cursor do mouse por um tweet. Outra opção é copiar a mensagem a ser retweetada e postar em seu perfil colocando a sigla RT e o @usuário à frente do tweet. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 31 O símbolo “#” é utilizado na rede social para identificar e agrupar em uma busca palavras-chave e assuntos importantes. Ao clicar em uma palavra com “#”, você é direcionado automaticamente a uma página que exibe todos os tweets que utilizaram a mesma palavra. Assim é possível acompanhar o que milhares de usuários da rede estão falando sobre um determinado assunto e, assim, disseminar conteúdo segmentado também. 2.3.3 YouTube O YouTube, é um site pertencente a Google, que é basicamente um compartilhador de vídeos, onde o usuário pode fazer o upload (enviar para o servidor) do vídeo e permitir que o mundo inteiro o assista, comentem, deem notas, compartilhe seu vídeo exibindo-o em outras páginas Web, enviar para amigos, etc. É o mais popular site devido à possibilidade de hospedar qualquer vídeo, exceto materiais protegidos por copyright. Trata-se de início da produção de conteúdo colaborativo, ou simplesmente uma forma de fazer Consumer Generated Media – GCM, pois este consumidor saturado está com o poder em suas mãos, com seus aparelhos mentais ligados a propaganda, que Gracioso (2002) conceitua assim: Propaganda é a mensagem divulgada em veículos de grande penetração (TV, rádio, revistas, jornais, etc.) e patrocinada (paga) por um anunciante, que tem por fim criar ou reforçar imagens ou preferências na mente do consumir, predispondo-o favoravelmente em relação ao produto, serviço ou instituição patrocinadora. O Youtube utiliza um compartilhamento de recursos audiovisuais muito aderidos por empresas de música e cinema, além disso, é uma ferramenta que disponibiliza a qualquer empresa divulgar de forma mais lúdica e criativa seus produtos e serviços, também muito aderida por jovens, com o intuito de se auto promover mediante a rede, hoje em dia, é muito comuns os canais de pessoas físicas ou empresas, onde relatam sobre diversos acontecimentos e publicam seus respectivos vídeos, se gerar um forte impacto na rede, as organizações podem perceber o quão o mercado está sendo necessitado, podendo criar um e-marketing ao nicho desejado. 1.3.4 Website Atualmente o website é a ferramenta mais usada na rede, pois as empresas utilizam como forma de comunicação entre clientes e fornecedores, disponibilizando do endereço da organização até toda a sua variedade de produtos e serviços. É uma ferramenta que inicialmente tem um custo baixo ao serem criados, com o aperfeiçoamento poderá gerar despesas em inovação e comodidade aos clientes, como as suas atualizações e seus TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 32 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 certificados de segurança, que consomem uma renda financeira das empresas para serem atualizadas frequentemente. Segundo Monteiro (2007), o link patrocinado é um modelo de propaganda onde a anunciante paga pelo clique no anúncio, e não pela exposição do mesmo. Este tipo de anúncio é também chamado de campanha por palavra chave ou PPC (payper-click), pois o anúncio é mostrado através de alguma palavra chave. O Adwords é um programa de publicidade do GOOGLE, onde os anúncios são exibidos em forma de links. Esses anúncios são exibidos nas pesquisas do site e nos sites que utilizam o adsense, um serviço de publicidade onde os donos de sites se inscrevem no serviço e disponibilizam os resultados em suas páginas, gerando lucro baseado na quantidade de cliques ou visualizações dos anúncios. De acordo com Vaz (2008), dos formatos de publicidade oferecidos pelo Google no Adwords, o mais comum é o em forma de texto, seguido pelos anúncios gráficos e os de animação. Outros formatos oferecidos também são anúncios em vídeos, anúncios de empresas locais e em celulares. Através das informações do site do Adwords Google (2008), os links patrocinados funcionam porque o seu alcance é segmentado, pois a sua exibição será somente quando houver pesquisas relacionadas à sua palavra-chave cadastrada, possuindo maior controle, pois pode ser exibido de diversos formatos, inclusive por área geográfica e idiomas; e valor mensurável, pois não há compromisso de tempo ou requisito de gasto mínimo, com a opção de custo por clique, só é cobrado quando recebe um clique, isso significa que todo o seu orçamento é usado para clientes potenciais. De acordo com O’Brien (2010) os sites e serviços de rede Internet/Intranet, por exemplo, possibilitam um processo de marketing interativo, no qual os clientes podem tornarse parceiros na criação, comercialização, na compra e na melhoria de produtos e serviços. Os websites também podem absorver as informações dos clientes e fornecedores, como um banco de dados, a fim de utilizar as necessidades e desejos dos mesmos e facilitar a comunicação entre eles, o que é de grande importância em um mercado totalmente competitivo. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 33 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Figura 1. Representação do Adwords. Fonte: http://adwords.google.com. 2.3.5 Blog Os blogs, ou weblogs, são exemplos de espaço virtual que possibilitam a ação em comunidades com outros usuários, com uma interface relativamente fácil de ser aplicada, normalmente gratuita, onde os usuários se expressam, criam grupos que partilham interesses em comum, trocam informações e dão opiniões sobre produtos e filmes e etc. A força dos blogs está na possibilidade de que seus atores utilizem essa ferramenta para se beneficiar ou comprometer uma corporação, o que pode representar oportunidades e ameaças para a empresa. Entretanto é possível utilizar um blog para atualizar os empregados sobre os negócios da empresa, alertar os clientes sobre os novos serviços (ou problemas) e também para ajudar nos esforços para a recuperação de falhas permitindo que os clientes e empregados se comuniquem durante possíveis emergências (ROSA, 2007). O blog tem um formato mais informal, dando à empresa uma “face humana”, ou seja, a empresa perde aquela imagem de “intocável” oferecendo oportunidade de interação com seus clientes. Um blog bem escrito e com constantes atualizações aproxima os clientes da empresa, além de passar credibilidade. O baixo custo de manutenção é mais uma vantagem de se usar essa ferramenta. Podendo ainda obter excelentes resultados com campanhas de marketing. A comunicação direta é mais um facilitador. É possível falar especificamente da empresa, de seus produtos, seus funcionários, eventos realizados. Ou seja, inserir o cliente naquele contexto. Uma das formas de manter o relacionamento é manter o blog atualizado sempre, dar dicas, antecipar lançamentos e oferecer serviços da empresa, incluindo links para o site. O blog também é um excelente lugar para oferecer produtos e promoções. Apenas deve-se tomar cuidado para não exagerar e acabar prejudicando a proposta da empresa. Com o blog, a empresa também pode atualizar o site disponibilizando conteúdo de qualidade, aumentando a quantidade de acessos e consequentemente o SEO – Search Engine Optimization. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 34 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 2.3.6 Google+ É uma rede social lançada em 2011 pelo Google. Agrega diversos serviços do próprio Google e proporciona uma nova dinâmica entre usuários com os Círculos e Hangouts. Já possui mais de 250 milhões de usuários e é tido como a proposta do Google para concorrer com o Facebook. Possui o botão +1 é semelhante ao botão "Curtir" do Facebook, mas para utilizá-lo, basta ter um perfil no Google. Ele permite recomendar páginas publicamente na web e compartilhar com seus círculos, caso você tenha perfil no Google+. Possui os “Círculos” que é a função de organizar os seguidores nas categorias desejados, como por exemplo, “Amigos Pessoais”, “Colegas de Trabalho”, “Empresas”. Dessa forma, é possível segmentar o conteúdo que você compartilha. Para as empresas é importante classificar os novos seguidores de sua página, segundo o seu perfil, idade, sexo, localização, etc. Assim, suas postagens podem ser exclusivas para certos círculos e aumentam a chance de interação. Para adicionar seus seguidores nos círculos, é preciso classificá-lo de forma exata e de forma manual (não tem como o seguidor se encaixar em um círculo, é você quem decide), sendo algo trabalhoso, mas que pode gerar bons resultados no futuro. Vale lembrar que você pode adicionar um mesmo usuário em mais de um círculo. Como opção de bate papo possui o Hangouts, que é a opção para realizar uma videoconferência gratuita com os seus usuários. Você cria o Hangout, define quais círculos vão ter acesso e depois é enviado um convite aos participantes perguntando se eles querem ou não assistir. Outra opção são os Hangouts On Air, que permite que você faça uma transmissão ao vivo para um número indeterminado de pessoas em todo o mundo. Depois de terminado o Hangout On Air, o vídeo é colocado automaticamente em sua conta verificada do YouTube. O Google+ já disponibilizou o selo de verificação de conta, entretanto, ainda não está liberado para as empresas. Por enquanto, o Google mesmo verifica a veracidade da conta, dando preferência para páginas de figuras públicas, celebridades e pessoas que forem adicionados ao grande número de círculos. Após um longo tempo sem essa permissão, as páginas já podem ser administradas por até 50 pessoas. Basta o criador adicionar os e-mails nas configurações da página. É uma forte ferramenta para empresas que querem gerar discussões e debates com formadores de opinião. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 35 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Figura 2. Google + Fonte: https://plus.google.com/. 2.3.7 Instagram Instagram é um aplicativo móvel (Android, iOS) de edição e de compartilhamento de imagens e de vídeos, com as seguintes funcionalidades sociais: Criação de um perfil público. Inscrição nas contas de usuários. Tags (palavras-chave ou "marcadores") adicionados às fotos/vídeos, geolocalização, Interações com os conteúdos compartilhados (curtir, comentar). Conexão com outros aplicativos (Facebook, Twitter). O aplicativo é propriedade do Facebook e também declinada em versão web. O Instagram para ajudar a segmentação deve-se usar as hashtags (#) certas no conteúdo e colocar a foto no sistema de busca do canal. O mais importante é usar hashtags pertinentes ao que está sendo postado. A empresa pode criar hashtags próprias para o seu negócio, começando com o nome da empresa. Assim, todas as fotos relacionadas diretamente à empresa podem ser encontradas na busca através do nome criado. Além disso, se alguém ainda não souber que a organização tem um perfil oficial da sua marca no Instagram, ficará sabendo se buscar por hashtags ligadas ao nome da empresa. Os consumidores se interessam sobre como seu negócio funciona “por dentro”. Este APP serve também para divulgar benefícios do produto ou serviço através de fotos dele sendo feito, fotos dos locais físicos da sua empresa, fotos de seus funcionários, etc. A utilização desta ferramenta é para saber além do que o Instagram mostra. Com o Statigram tem como, por exemplo, o número total de likes que as fotos do perfil possuem e TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 36 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 quem são as pessoas que mais se engajam com o perfil da empresa. Além disso, a rede é uma febre mundial. Figura 3. Instagram para empresas. Fonte: marketingsemgravata.com.br – julho/2014. 2.4 Monitoramento de redes sociais No marketing digital, o monitoramento das redes sociais desempenha uma função primordial em qualquer campanha. O monitoramento das redes sociais não se aplica exclusivamente a marcas de produtos e serviços. No marketing político, por exemplo, o monitoramento das mídias sociais é essencial para sentir a tendência do eleitorado. Não se imagina uma ação de marketing nas mídias sociais sem que haja uma estratégia de monitoramento eficiente da mensagem e sua repercussão junto ao público presente nas mídias sociais. É através do monitoramento das redes sociais que podemos identificar quais são os melhores caminhos para ser seguido por um produto ou serviço ou então, ter uma percepção exata do conceito da marca junto ao público-alvo. Outra função desse processo de monitoramento de mídias sociais é identificar tendências do mercado através do mapeamento dos assuntos que usuários com o perfil mais afinado com a marca ou produto estão comentando nas diversas redes sociais. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 37 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Frequentemente, esse tipo de monitoramento nos traz insights para novas campanhas ou ações táticas, além de funcionarem como parâmetro para uma sintonia fina das campanhas em vigor. O estabelecimento de uma estratégia de monitoramento de redes sociais pode trazer uma série de benefícios para a empresa como, por exemplo, a compreensão do comportamento do público através da observação do que lhe agrada ou não, além é claro, do entendimento da percepção da marca junto ao público que faz uso dessas mídias. Atualmente, existem inúmeras ferramentas, pagas e gratuitas, que podem ajudar no monitoramento de uma marca ou tópico nas redes sociais online. Ferramentas gratuitas podem citar algumas como: Social Mention: Pesquisa menções em várias redes sociais, possibilitando filtrar as mais interessantes. A ferramenta disponibiliza um resultado completo, com top users, top keywords e top hashtags.WhosTalking: A interface é agradável e a pesquisa, fácil de ser realizada, pois fazem uma busca simples e linca as menções com os comentários diretamente nas redes em que foram postadas; Topsy: Interface semelhante ao Google, monitora também o Google+, o que faz toda a diferença, pois ainda são poucas as ferramentas que monitoram essa plataforma; Tweet Deck: é um dos mais populares, tendo sido comprado pelo Twitter no ano passado. Por meio dele, a empresa pode seguir as menções em diferentes contas dessa rede social e também do Facebook; Addictomatic ou o HootSuite: Disponibilizam serviço parecido, observando outras fontes, como o Foursquare, Linkedin e Google+, entre outras ferramentas. Para análises mais aprofundadas, que incluam métricas com volume de menções, associações de palavras, mensagens replicadas, alcançadas, mensagens, engajamento, usuários mais influentes que interagem ou recomendam a marca, é recomendada a utilização de ferramentas mais sofisticadas, e pagas, que além de oferecer mensurações, podem garantir a coleta e o armazenamento de um número ilimitado de mensagens. Podemos citar algumas: Scup e o Livebuzz: permitem boas análises da influência que a empresa tem na rede, observando o número de compartilhamentos e comentários. Scup é uma plataforma desenvolvida pela DirectLabs onde é possível monitorar tecnologias como o Twitter, comunidades do orkut, blogs, portais de notícias, Flickr, Youtube e Yahoo Respostas. A ferramenta também permite a publicação de conteúdo, classificar as conversas, adicionar tags e gera gráficos precisos das atividades nas redes sociais; Radian6: A ferramenta monitora desde comentários em fotos até grupos do Facebook e conversas no twitter, também fornece relatórios detalhados de análises e gráficos; ScoutLabs: Poderoso aplicativo baseado na Web que monitora mídias sociais e encontra sinais de ruído e ajuda sua equipe a criar produtos melhores e criar relacionamentos mais fortes com os clientes; TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 38 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Alterian: SM2 é uma solução de monitoramento e análise de mídias sociais concebida para profissionais de marketing e RP. A plataforma ajuda a rastrear conversas e classificar o sentimento sobre sua marca, entre outras ferramentas. Na verdade, as próprias redes sociais disponibilizam ferramentas de busca que permitem a observação e captação de comentários em tempo real, como por exemplo o Facebook, onde na Fan Page onde conseguimos medir o retorno de cada postagem e muitas outras funções, como mostra a figura 04. Figura 4. Página do Facebook da empresa X com informações gerenciais. Fonte: www.facebook.com.br Considerações finais O presente artigo buscou demonstrar através de uma revisão de bibliográfica a importância no Marketing digital, finalidades e importância para as organizações que desejam estar sempre atualizados. Pesquisas apontam que os brasileiros passam cerca de 8 horas mensais conectados às redes sociais, sendo que destas o Facebook se destaca, ocupando o primeiro lugar no ranking de acessos. O consumidor de hoje procura mais do que nunca em uma marca, além da qualidade, a segurança de estar fazendo um bom negócio. E para isso, ter um dos melhores produtos já não é mais o suficiente, é preciso de algo mais, é preciso fazer com que o consumidor se sinta inserido no contexto da empresa, que faça parte dela. TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 39 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 A empresa que falar de forma sincera com os seus clientes pode conquistar sua confiança, consegue estabelecer vínculos fieis e duradouros, mas para que isso seja realizado de forma concisa, antes de tudo, a empresa precisa conhecer quem é o seu cliente de fato, e é aí que se encaixam as redes sociais. As redes sociais são as maiores fontes de informação da atualidade. Um banco de dados de números astronômicos que, se aplicados a um planejamento estratégico e modelados da forma correta, poderá ser o mapa da mina para a empresa que as utilizarem. As redes sociais abrem espaço para a avaliação dos clientes. Hoje o consumidor prefere ir a página da empresa no facebook do que ligar no SAC. Isso porque os serviços por telefone geralmente são demorados e nunca, ou quase nunca, resolvem o problema, enquanto na internet o que está em jogo é a reputação da empresa diante de milhares de outros clientes – e possíveis novos clientes, o que pressiona para que o consumidor seja ouvido e tenha seu problema solucionado. Além da importância de estar presente nas redes sociais para monitorar os comentários que surgem sobre seu produto, as empresas conectadas transmitem melhor imagem para os consumidores contemporâneos, pois demonstram atitude de preocupação com a opinião de seus clientes, podendo inicial utilizar ferramentas gratuitas conforme citadas anteriormente, para conseguir medir e identificar, além de melhorias futuras, o perfil do consumidor e do público que a empresa pode atingir. Por meio das mídias sociais sua empresa pode divulgar novos produtos, disseminar promoções, acompanhar sua imagem na internet, ficar atento às tendências de mercado, identificar o que seus clientes procuram fidelizar seus consumidores, atingir e envolver diretamente seu público-alvo. Ao inserir a sua empresa nas redes sociais, é importante delegar a função de gerenciamento das mesmas a um profissional de comunicação qualificado. O criador de conteúdo precisa compreender a linguagem da empresa, o perfil do público-alvo, além de conseguir desenvolver postagens interessantes. É preciso desenvolver uma identidade gráfica da marca e manter-se fiel ao segmento e perfil da empresa fora do mundo virtual. Além disso, é indispensável manter os perfis da empresa atualizados e com conteúdo atraente, para que além de um SAC, a página da empresa se torne uma fonte de conhecimento e entretenimento para o consumidor. Atualmente, as pessoas buscam engajamento com as empresas que simpatizam, não adianta apenas criar uma conta nas redes sociais, é preciso ter conhecimento e um bom plano estratégico para compreender e atingir seu “target” e também criar relacionamento e mantê-lo, TRAININI e TORRES. Mídias sociais como ferramentas de estratégias de marketing. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 40 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 pois, se mostra uma ótima ferramenta de fidelização de clientes onde faz com que o cliente siga a empresa de acordo com o conteúdo que a mesa lhe oferece. Mais do que a presença empresarial ser essencial nas redes sociais, ela precisa ser útil para os usuários. Suas páginas nas redes de relacionamento precisam passar conteúdo único e relevante para que sua empresa faça diferença no dia a dia dos consumidores. REFERÊNCIAS CHLEBA, Márcio. Marketing Digital: novas tecnologias e novos modelos de negócios. São Paulo: Futura,1999. GRACIOSO, Francisco. Propaganda: engorda e faz crescer a pequena empresa. São Paulo: Altas, 2002. KOTLER, Philip; ARMSTRONG, Gary. Princípios de Marketing. 9.ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2003. KOTLER, Philip; KELLER, Kevin Lane. Administração de Marketing: a edição do novo milênio. 10ª Ed. São Paulo: Prentice Hall, 2000. LAS CASAS, Alexandre Luzzi. 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Artigo Original Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 O PROGRAMA ACELERA BRASIL E OS MÉTODOS DE LEITURA: REFLEXÕES SOBRE UM ESTUDO DE CASO EM BREJO DO CRUZ/PB Demóstenes Dantas Vieira1 e Joana Lúcio Maia2 RESUMO - Visto que a leitura apresenta-se como instrumento sociocomunicativo indispensável à inserção totalitária dos educandos na sociedade e que, a mesma é a base inicial para a construção de inúmeras formas de conhecimento, este trabalho, descritivo e explicativo, visa descrever as análises de um estudo de caso realizado na Escola Municipal Josué Alves de Azevedo, localizada no município de Brejo do Cruz – PB. Nele, propõe-se a análise das práticas de leitura realizadas na referida escola, mais especificamente, no Programa Acelera Brasil. Nessa perspectiva, adota-se como fonte teórica os estudos de Kleiman (2004), Aguiar e Bordine (1993), Kato (2004), Koch (2004), Nóbrega e Pinheiro (2006), os Parâmetros Curriculares Nacionais (2001) e outros teóricos julgados essenciais ao desenvolvimento dessa pesquisa. Quanto aos métodos de leitura utilizados em sala de aula, percebe-se a necessidade de reflexão sobre a visão tradicional da leitura, que muitas vezes, acontece em detrimento de uma prática direcionada às necessidades humanas sócio comunicativas. Tendo em vista a reflexão realizada mediante a análise do instrumento de coleta de dados (o questionário) pôde-se perceber que o professor do referido programa analisado adota uma postura bastante consciente quanto à leitura numa perspectiva social e, principalmente, como momento de prazer. Revista Ciência e Conhecimento Volume 9 – Nº1 – 2015. 1 – Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN 2 – Faculdades Integradas de Patos - FIP Palavras-chave: Práticas de leitura. Estudo de caso. Programa Acelera Brasil. ABSTRACT - Since reading is presented as an instrument essential to the socio-communicative integration of students in the totalitarian society and that it is the initial basis for the construction of numerous forms of knowledge, this study, descriptive and explanatory, but to describe the analysis of a field study conducted at the Municipal School Josué Alves de Azevedo, located in the swamp of Brejo do Cruz- PB. In it, it is proposed to examine the practices of reading held at the school, more specifically, the program Speeds Brazil. From this perspective, is adopted as a source of theoretical studies Kleiman (2004), Aguiar e Bordine (1993), Kato (2004), Koch (2004), Nóbrega e Pinheiro (2006) the National Curriculum Parameters (2001) and others deemed essential to the development of this research. Regarding methods of reading used in the classroom, we see the need for reflection on the formalist view of lelitura, which often happens at the expense of a practice directed to human needs socio-communicative. In view of the discussion conducted by analysis of the data collection instrument (the questionnaire) could be perceived that the teacher of that program analysis adopts a rather conscious about reading in a social perspective, and especially as a moment of pleasure. Keywords: Practice reading. Field study. Program Accelerate Brazil. Dados para correspondência Demóstenes Dantas Vieira; Rua: Jaen Menescal, nº 25. CEP: 59604-200 E-mail: [email protected] Recebido em: 23/01/2015. Revisado em: 28/03/2015. Aceito em: 02/05/2015. Área: Metodologias e estratégias de ensino aprendizagens. 42 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 INTRODUÇÃO É notório que em diversos casos a leitura tem sido tratada como mais um ato de formalismo, tanto tratada pelos educandos como pela instituição escolar. Ela, entretanto, continua sendo instrumento essencial para o desenvolvimento dos indivíduos inseridos no processo de ensino-aprendizagem, pois ela perpassa todas as áreas do conhecimento. A escola enquanto instituição social é responsável, em parte, pela formação e inserção social dos educandos, porém é possível perceber que em diversas situações a leitura não é percebida como elemento fundamental a essa integração dos indivíduos na comunidade. Para isso é de fundamental importância que a escola e, principalmente, os professores, possam ver na leitura um poderoso instrumento para a efetivação da cidadania e desenvolvimento dos aspectos sensíveis indispensáveis à vida social. É nisto que consiste a importância da leitura e, principalmente, do texto literário; na formação ética, moral, afetiva, crítica e comunicativa. Entretanto, vale ressaltar que para isso acontecer, a escola deve repensar o espaço, as concepções e os métodos dados à leitura, pois, enquanto o ato de ler for considerado como “mais um” momento obrigação e, às vezes, até mesmo de castigo, esse objetivo não vai concretizar-se. Torna-se então fundamental questionar “como desenvolver e incentivar a leitura de forma prazerosa e significativa?”. Desse problema surge à necessidade de realização deste trabalho, pois, sabe-se da necessidade da leitura como eixo gerador em todas as áreas do conhecimento. À vista disso, este trabalho, compreendido como estudo de caso, foi desenvolvido em 2014 na Escola Municipal de E. F. Josué Alves de Azevedo, situada na cidade de Brejo do Cruz-PB e utilizou-se como instrumento de coleta de dados um questionário semi-estruturado (aplicado ao professor). Ressaltamos que a nossa pesquisa teve como foco o Programa Acelera Brasil, adotado pela escola. Sobre o aporte teórico, ressaltamse os estudos de Kleiman (2004), Aguiar e Bordine (1993), Kato (2004), Koch (2004), Nóbrega e Pinheiro (2006), os Parâmetros Curriculares Nacionais (2001) e outros teóricos julgados essenciais ao desenvolvimento dessa pesquisa. Vale ainda ressaltar as contribuições da referida pesquisa no meio acadêmico no tocante que visa proporcionar a investigação e reflexão sobre os aspectos que permeiam a leitura na instituição escolar. Buscando entender qual a atribuição dada à leitura pela escola e refletir sobre as concepções e métodos adotados pela instituição escolar ao trabalhar a leitura. Nessa perspectiva, objetiva-se contribuir para a reflexão e construção da leitura como um momento privilegiado de ensino e prazer. VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 43 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 2. O TEXTO E O CONTEXTO DOS MÉTODOS DE LEITURA Numa sociedade extremamente letrada o ato de ler e escrever são de fundamental importância ao convívio social. Pode-se inferir que leitura e a escrita pode ser agente de inclusão e exclusão social, pois as mesmas podem proporcionar o acesso aos mais variados ambientes e situações comunicativas, enquanto aquele que não possui o conhecimento de “ler e escrever” acaba sendo excluído de inúmeras situações de interação sócio comunicativa e também de diversas oportunidades de inserção no mercado de trabalho. Consciente dessa realidade torna-se de suma importância refletir sobre a função social da escola, que se apresenta como segundo mais poderoso aparelho ideológico na vida dos educandos, principalmente das crianças. Pode-se inferir que a função da instituição escolar é extremamente social, visto que almeja proporcionar a construção das competências sociais, afetivas, éticas, morais, cognitivas, físicas, estéticas, etc., para inserção dos indivíduos na sociedade. Prais (1996, p. 58) atribui” como função social e política da escola, não só de transformação, socialização e crítica da herança cultural acumulada, mas também a produção de um novo saber a fim de preparar o indivíduo para a vida da totalidade social”. A escola deve proporcionar a crítica à herança cultural da humanidade, como também possibilitar a inserção do indivíduo na comunidade, de forma que o mesmo adentre nela detentor das habilidades necessárias à vida em totalidade, criticamente e, acima de tudo, como ser humano capaz de integrar-se sócio afetivamente à sociedade. Para a concretização desses objetivos o educador deve reconhecer-se como parte desse processo de integração e transformação social. Apesar das inúmeras barreiras enfrentadas pela educação, não se pode desanimar. Freire (1996) já afirmava que a escola sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco pode haver transformação. Sozinha a educação não pode mudar o mundo, entretanto vale ressaltar que ela é um dos instrumentos, e porque não dizer o mais poderoso instrumento, para que essa mudança possa existir. A transformação “macro” só pode acontecer a partir da “micro”. Talvez a formação de um indivíduo seja apenas a demonstração do micro poder da educação, mas é através de todos esses indivíduos sócio historicizados que o “macro poder” passa a existir. É nisso que consiste a magnitude da educação. A possibilidade de o individual transformar. E é nisto que consiste o poder da leitura: na contribuição para formação sócio histórica dos educandos. Formado criticamente o indivíduo poderá exercer um papel concreto na sociedade e contribuir para sua transformação. VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 44 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Quanto à função social da escola? Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental elenca os seguintes objetivos: Posicionar-se de maneira crítica, responsável, e construtiva nas diferentes situações sócias, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas; Desenvolver o conhecimento de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania; (BRASIL, 2001, p.8-9). Como é possível perceber os Parâmetros Curriculares Nacionais estabelece como objetivo da educação para o Ensino Fundamental a formação da autonomia dos indivíduos, de modo que inseridos na comunidade os mesmos possam se posicionar criticamente ante as realidades sociais, utilizando as competências desenvolvidas para resolução de conflitos e exercício pleno da cidadania. Faz-se então necessário refletir sobre quais instrumentos podem ser utilizados para atender tal objetivo. Pode-se então inferir que a leitura é um dos mais importantes instrumentos para sua realização. Quanto a isso, os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental suscita suas contribuições e orientam que se deve Compreender os textos orais e escritos com os quais se defrontam em diferentes situações de participação social, interpretando-os corretamente e inferindo as intenções de quem os produz; Valorizar a leitura como fonte de informação, via de acesso aos mundos criados pela literatura e possibilidade de fruição estética, sendo capazes de recorrer aos materiais escritos em função dos mais diversos objetivos (BRASIL, 2001, p. 4142). Através da leitura o professor proporciona aos educandos possibilidades de posicionamento diante da sociedade em que vivem. Ler é muito mais que decodificar, entretanto é essa concepção que se apresenta mais forte no presente sistema de ensino, a leitura como decodificação. Essa concepção equivocada faz com que muitas crianças se tornem leitores passivos, capazes apenas de decodificar o texto, ou seja, de juntar os signos linguísticos e formar palavras e frases, essa concepção tende a torná-los leitores que não interagem, que não interpretam, que não se posicionam em relação ao texto. Nessa perspectiva realizam apenas a atividade decodificativa, mas não entendem o que lêem. Quanto a essa concepção Kleiman (2004, p. 20) faz as seguintes considerações: Essa concepção dar lugar a leituras dispensáveis, uma vez que em nada modificam a visão de mundo do aluno. A atividade compõe-se de uma série de automatismos de identificação e pareamento das palavras do texto com as palavras idênticas numa pergunta ou comentário. Isto é, para responder a uma pergunta sobre alguma VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 45 informação do texto o leitor só precisa o passar do olho pelo texto a procura de trechos que repetem o material já decodificado da pergunta. Formar leitores é formar alguém capaz de entender o que lê e, além disso, é proporcionar o desenvolvimento linguístico de modo que os educandos possam se posicionar quanto ao que está escrito. Entender o texto e inferir do texto. A leitura é um elemento de fundamental importância tanto no processo educacional como no cotidiano das pessoas, através dela o alunado começa a visualizar realidades diferentes do mundo no qual está inserido, permitindo liberdade de pensamento e expressão, tornando-os mais críticos e criativos. Segundo Mary Kato (1995), a leitura ainda favorece a interdisciplinaridade entre diversos tipos de conhecimento. Quando um aluno consegue fazer essa associação entre os conteúdos, tem mais facilidade de entendimento de sua própria realidade e compreensão dos assuntos expostos. É notório que a leitura favorece o desenvolvimento cognitivo do ser humano, permite que o indivíduo construa suas próprias ideias e automaticamente, seu senso crítico a sua sociedade. Assim, antes de tudo vale enfatizar que a leitura tem uma importante função social, pois em uma sociedade letrada ela é fundamental ao desenvolvimento das atividades políticosociais. Kock (2004, p.159) enfatiza que “ao professor cabe a tarefa de despertar no educando uma atitude crítica diante da realidade em que se encontra inserido, preparando-o para ler o mundo: a princípio o ‘seu mundo’, mas, paulatinamente, todos os mundos possíveis”. O texto é portador de muitos mundos, a leitura é a ponte para a inserção nesses mundos de informação, amor, magia, entretenimento, etc. Assim, o educador deve proporcionar a leitura da sociedade na qual o educando está inserido e, também promover a reflexão sobre tantas outras sociedades através das quais os indivíduo pode adquirir conhecimento. Pode-se então coligir que é função da instituição escolar proporcionar o contato do aluno com toda a diversidade textual produzida pelo homem, desde os gêneros textuais de caráter social (carta, bilhete, receita, ata, abaixo-assinado, etc.) até a literatura, portadora de inúmeras possibilidades de prazer. Entretanto, em muitos casos, acontece o contrário, a leitura é vista apenas como mais um momento de obrigação. Torna-se então evidente a necessidade de reflexão sobre a prática de leitura e motivação para que o aluno conceba a leitura como um momento privilegiado de prazer e aprendizagem. Para isso, é necessário que o professor seja mediador na construção afetiva pelo ato de ler, de forma que o mesmo seja também um leitor ativo para que assim possa VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 46 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 transmitir paixão pela leitura e, que seus alunos possam ver nele um espelho de um verdadeiro leitor. Segundo Foucambert (1994, p. 37), “a escola deve ajudar a criança a tornar-se leitor dos textos que circulam no social e não limitá-la à leitura de um texto pedagógico, destinado apenas a ensiná-lo a ler”. Consciente disso vale ressaltar as múltiplas atitudes, que aqui, jugase pertinente à prática de leitura na instituição escolar. Dentre os conceitos atribuídos ao ato de ler “a leitura instrumental e informativa” apresenta-se bastante relevante, pois é notório a necessidade crítica e cidadã de compreensão da diversidade de gêneros informativos da sociedade. O professor, enquanto facilitador da inserção social do indivíduo deve proporcionar o contato e reflexão da diversidade textual em circulação, tais como receitas, bulas de remédio, catálogos, enciclopédias, placas, notícias, reportagens, artigos, classificados de jornais, regras de jogos, etc. Assim, tende a formar leitores ativos e participativos na sociedade. A abordagem dada a leitura, aqui, abrange, portanto, desde capacidades necessárias ao processo de alfabetização até aquelas que habilitam os alunos à participação ativa nas práticas sociais letradas, ou seja, aquelas que contribuem para o seu letramento. Soares (1998, p. 21) afirma que “dentre outras habilidades/capacidade, a leitura inclui as de fazer previsões significados combinando conhecimentos prévio e informação textual, de refletir sobre o significado do que foi lido e tirar conclusões sobre o assunto enfocado”. Inserir-se nas práticas sociais próprias à cultura escrita implica comportamentos procedimentos e destrezas tipos de quem vive no mundo da leitura. Isto é movimentar-se numa biblioteca, frequentar livrarias, estar atento aos escritos urbanos e aos materiais escritos que circulam na escola. Implica também adquirir, quando se fizer necessário e quando aparecem novos usos para a leitura na sociedade, outras formas de ler. Utilizando-se de metodologias apropriadas que promovam o estímulo e o desejo pelos livros mostrando-lhes os benefícios que dela resultam, os educandos poderão então perceber, nos momentos de leitura, um momento de prazer e reflexão, visto que a mesma poderá proporcionar-lhes uma viagem inesquecível a tantos mundos que a leitura e, principalmente, a literatura, pode oferecer. É por isso que a literatura é tão importante, tanto para o aluno quanto para o professor, porque os aproxima do outro, de mundos, de viagens, de sonhos. Da angústia do ser humano e de suas esperanças. De sua revolta com os problemas sociais e da necessidade de transformação. A literatura faz que cada um sinta-se parte de um todo, que é a vida em sociedade, pois o poder da leitura e da literatura consiste na expressão do estado do espírito humano no decorrer do tempo e do espaço. Nesse sentido, VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 47 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Ler é identificar-se com o apaixonado ou com o místico. É ser um pouco clandestino, é abolir o mundo exterior, deportar-se para uma ficção, abrir o parêntese do imaginário. Ler é muitas vezes trancar-se (no sentido próprio e figurado). É manter uma ligação através do tato, do olhar, até mesmo do ouvido (as palavras ressoam). As pessoas lêem com seus corpos. Ler também é sair transformado de uma experiência de vida, é esperar alguma coisa. É um sinal de vida, um apelo, uma ocasião de amar sem ter a certeza de que se vai amar. (BELLEUGER apud KLEIMAN, 2004, p.15). Vale ressaltar que a escola, todos os seus profissionais, deve refletir sobre qual o lugar que a referida instituição tem dado a leitura nas aulas, eventos, etc. O professor deve questionar-se quanto ao objetivo que o mesmo tem adotado para trabalhar a leitura com seus alunos e, principalmente, perceber-se ou construir-se enquanto leitor, para que dessa forma possa transmitir um pouco da necessidade e do prazer proporcionado pela leitura. A formação de leitores exige, antes demais nada, professores leitores. 3. OS MÉTODOS DE LEITURA E O PROGRAMA “ACELERA BRASIL” Dar-se o nome de “Programa de Aceleração” ou “Acelera Brasil” o programa desenvolvido pelo Instituto Ayrton Senna em parceria com o Governo Federal cujo objetivo é acelerar o desenvolvimento da aprendizagem de alunos fora da faixa-etária estipulada para as séries iniciais do ensino fundamental (1º ao 4º ano). Objetiva-se, aqui, descrever e analisar as atividades de leitura desenvolvidas pelo professor do referido programa da Escola Municipal Josué Alves de Azevedo, situada na cidade de Brejo do Cruz/PB. Inicialmente foi proposto um questionário semi-estruturado de 8 questões que foi aplicado com sucesso. Nele o professor foi questionado quanto à sua formação, conceitos, métodos e outras questões relacionadas à leitura, objetivando compreender o texto e o contexto da leitura na escola e, mais especificamente, na sala de aula. Antes de adentrar na análise propriamente dita vale ressaltar que a turma analisada é composta por alunos de 9 a 14 anos, de uma população composta de alunos extremamente carentes e de alunos advindos da zona rural (os mesmos compõem uma turma de 3º e 4º anos). Diante disso, vale ressaltar o que, aqui, é considerado um grave problema de aprendizagem, que seria a indisciplina, segundo o próprio professor, “causada pela diferença de idade dos alunos”. Isso, segundo o professor, dificulta o relacionamento pessoal dos educandos e até mesmo os momentos de interação e socialização da aprendizagem. A primeira pergunta realizada no questionário foi direcionada a formação do professor. O professor é Graduado em Pedagogia e é Especialista em Supervisão e Orientação Educacional. VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 48 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Visando entender a concepção de leitura do professor, realizou-se a seguinte pergunta: “Na sua opinião o que é leitura?”. O mesmo respondeu que “A leitura é uma compreensão do mundo, é através dela que podemos desenvolver nosso pensamento crítico e construir a nossa própria opinião, tendo em vista que a mesma pode contribuir contundentemente na formação moral e afetivo-social do ser humano”. Pode-se inferir que a leitura para o professor está relacionada a dois fatores: o desenvolvimento da criticidade e da humanidade, isso é notório quando o mesmo afirma que a leitura objetiva “desenvolver nosso pensamento crítico” e a “formação moral e afetivo-social do ser humano”. Confrontando esse conceito com os Parâmetros Curriculares Nacionais perceber-se uma íntima ligação, visto que o Brasil (2001, p.8-9) atribui ao Ensino Fundamental o desenvolvimento das competências críticas e afetivas, de modo, que o aluno possa “posicionar-se de maneira crítica”, “mediar conflitos”, e, desenvolver as capacidades “afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e inserção social”. Como é possível o conceito dado pelo professor está em conformidade com os Parâmetros Curriculares Nacionais. A terceira pergunta foi direcionada aos métodos de leitura, foi pedido que o professor marcasse os métodos de leitura utilizados em sua aula. O professor marcou os seguintes: Leitura silenciosa (realizada pelo aluno). Leitura oral (realizada pelo alunado). Leitura oral (realizada pelo professor). Roda de leitura. Momento literário (de gêneros literários – contos, crônicas, romances, etc.) Leitura dos textos produzidos pelo alunado. Leitura de textos informativos (artigos, notícias, reportagens, etc.). Dos métodos de leitura propostos o único não utilizado pelo professor é promover o acesso à biblioteca, isso se deve ao fato de que a referida escola não possui biblioteca, enquanto ambiente físico, apesar de ter um bom acervo de livros de literatura infantil. Ainda na mesma questão o professor respondeu que se utilizava da “biblioteca itinerante” que segundo o mesmo, é um pequeno acervo de livros de literatura infantil que são levados à sala de aula diariamente para a leitura tanto do professor quanto dos alunos. O professor respondeu ainda que se utiliza de uma estratégia denominada por ele de “adotar um livro”. Esse seria um método de estimulo à leitura de modo que os alunos deveriam adotar um livro para sua leitura. Outro método julgado, aqui, de grande significado é uma prática de leitura chamada pelo professor de “venda do livro”. Esse possui um caráter bastante motivador. Nele o professor levaria diariamente um livro para casa e faria a leitura, no outro dia ele faria a propaganda desse livro. Falaria de sua narrativa, dos personagens, um VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 49 pouco do enredo, os porquês do livro ser bom, e tentaria, (claro de maneira simbólica vender o livro lido as crianças) para que os mesmos pudessem ler. Esse método é bastante interessante, tendo em vista que através dele o prazer da leitura torna-se algo muito próximo do dia-a-dia das crianças, assim, pode-se inferir que o referido professor se torna espelho de leitor ativo, que se encanta com o texto, que se apaixona por ele, que viaja e mergulha no mundo fantástico da leitura. Sobre isso Belleuger apud Kleiman (2004, p.15) já afirmava que ler é “identificar-se com o apaixonado ou com o místico”. É ser “clandestino”, é “deportar-se para uma ficção, abrir o parêntese do imaginário”. Nessa perspectiva o professor apresenta-se ao aluno como um exemplo de um experienciador dos mundos e dos sentimentos proporcionados pela leitura. A quarta questão proposta foi direcionada aos objetivos adotados pelo professor quanto aos métodos de leitura. O mesmo atribui os seguintes objetivos à leitura na sala de aula: Desenvolver atividades de ortografia. Desenvolver atividades de gramática. Desenvolver as habilidades de compreensão textual. Desenvolver atividades sobre o vocabulário do texto. Desenvolver os aspectos sensíveis e humanos do aluno. O referido professor marcou todos os objetivos propostos. Entretanto vale refletir sobre alguns. Bem, sabe-se que o objetivo primordial da leitura na instituição escolar é desenvolver as competências sócio comunicativas da escrita e fala, além, proporcionar através da arte da palavra (a literatura) o desenvolvimento dos aspectos sensíveis indispensáveis a vida social. Dos objetivos acima se pode inferir que dois se apresentam nessa perspectiva: desenvolver as habilidades de compreensão textual; desenvolver os aspectos sensíveis e humanos do aluno. Porém, vale ressaltar que a leitura pode servir para os outros objetivos propostos desde que esses sejam encarados como primordiais. Vale ainda ressaltar que a leitura enquanto prática de aumento de vocabulário e prática das regras gramaticais pode proporcionar a construção de um leitor passivo, por isso, é necessário que o educador compreenda o real significado da leitura: como prática sócio comunicativa, cognitiva, critica, afetiva, moral, etc. Entretanto, aqui, não se julga tais métodos como desprezíveis, desde que os mesmos não sejam tidos como essenciais e, que esses mesmos métodos, sejam vistos como práticas secundárias, posteriores as atividades de compreensão e deleite da leitura. Sobre isso os PCNs (2001, p. 41-42) afirmam que a leitura no ensino fundamental justifica-se prioritariamente pela necessidade de compreensão dos “textos orais e escritos” com os quais os educandos “se defrontam em diferentes situações de participação social, interpretando-os VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 50 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 corretamente e inferindo as intenções de quem os produz” além de proporcionar a valorização da leitura através do “acesso aos mundos criados pela literatura”. Foi realizada ainda a seguinte pergunta: Qual(is) tipo(s) de texto você trabalha nas aulas de leitura? Foram adquiridas as seguintes respostas: Os textos do livro didático. Fábulas. Livros paradidáticos. Memórias. Crônicas. Contos de fadas. Contos Romances Literatura infantil no geral Noticias Cartas Receitas Os únicos textos não trabalhados pelo professor foram músicas e bulas. Diante disso, pode-se inferir que o professor compreende a leitura como prática social, visto que o mesmo tem trabalhado uma diversidade textual bastante coerente e, até, elogiável. Se a leitura e a escrita são práticas sociais, é de fundamental importância que assim seja considerada pela instituição escolar, que assume como função proporcionar a reflexão aos mais diversos gêneros textuais que circulam na sociedade. As últimas perguntas foram direcionadas ao cotidiano do professor enquanto leitor. Foi perguntado “Qual a intensidade que você costuma indicar livros para seus alunos?” O professor respondeu que indica livros “muito” frequentemente. Foi ainda perguntado: “Você é conhecedor (leitor) da literatura infantil?” O professor respondeu que “sim”. E, por último pediu-se que o professor indicasse alguns livros de literatura infantil. O mesmo indicou as seguintes obras: A princesa sapo – A. Sônia. (Re) fabulando – Elias José. O homem que espalhou o deserto – Ignácio de Loyola. A magia do amor – A. Sônia. Estamos em paz – Gian Calvi. Como é possível perceber as práticas de leitura do referido professor apresentam-se bastante significativas. Conhecedor da literatura infantil e integrante do processo de desenvolvimento da leitura enquanto prática social e momento de prazer, o professor VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 51 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 demonstra-se bastante consciente de que a postura de leitor, de fato, proporciona a intimidade e aproximação do aluno com a leitura visto que para se construir leitores ativos é necessário que o educador, antes de mais nada, seja também um leitor. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante das considerações realizadas pode-se inferir que na realidade investigada o professor demonstra-se bastante consciente de seu papel enquanto agente formador de leitores, não apenas numa perspectiva formal e decodificativa, mas, principalmente, numa visão holística desse processo enquanto uma prática comunicativa social indispensável à inserção do indivíduo na sociedade. Quanto aos tipos de texto, ressalta-se a heterogeneidade atribuída pelo professor as suas aulas, isso reflete em um ato consciente do texto enquanto um produto social, com características e funções específicas. Sobre as práticas de leitura propriamente ditas, vale ressaltar a atitude do professor em promover a exaltação do ato de ler, “a venda do livro”, a frequente indicação da literatura, o uso da biblioteca itinerante, parecem ser atitudes que somadas à paixão do professor pelo ato de ler podem contribuir de maneira ímpar para a formação dos educandos. Pode-se, portanto, concluir que a referida instituição e o Programa Acelera Brasil adotam uma postura bastante coerente no que compete às concepções e métodos de leitura como um ato sócio comunicativo, cognitivo e, acima de tudo, como uma prática que não deve ser desassociada das atividades do dia a dia. REFERÊNCIAS AGUIAR, Vera Teixeira de; BORDINE, Maria da Glória. Literatura: a formação do leitor: alternativas metodológicas. 2 ed. Porto alegre, Mercado Aberto, 1993. BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais. Língua portuguesa. Brasília: A secretaria, 2001. _______. Parâmetros Curriculares Nacionais. Ensino fundamental: introdução. Ministério da educação fundamental. Brasília: A secretaria, 2001. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. São Paulo: Paz e terra, 1996. _______. Educação e mudança. Tradução de Moacir Gadotti e Lllian Lopes Martins. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1999. KATO, Mary. Por que é difícil aprender a ler e a escrever? In: No mundo da escrita: uma perspectiva psicolingüística. 3ª ed. São Paulo: Ed. Ática, 1990. KLEIMAN, Ângela. Oficina da leitura: teoria e prática. 10ª ed. São Paulo: Ed. Pontes, 2004. KOCH, Ingedore G Villaça. Argumentação e linguagem. 9 ed. São Paulo: Cortez, 2004. VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 52 NÓBREGA. Marta; PINHEIRO, Hélder. (org.). Literatura: da crítica a sala de aula. Campina Grande: Bagagem, 2006. PRAIS, M. L. M. Conselhos universitários na universidade pública. 4 ed. Campinas: Papírus, 1996. VIEIRA e MAIA. O programa acelera Brasil e os métodos de leitura. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Artigo Original Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 A DIMENSÃO DA POLITECNIA E A PRÁTICA DOCENTE NO ÂMBITO DO ENSINO MÉDIO POLITÉCNICO DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO CAIC MADEZATTI – SÃO LEOPOLDO/RS Cléber Fernando Homem1,2 RESUMO - Este artigo busca apresentar um estudo de caso da apropriação pelos docentes da Escola Estadual de Ensino Médio CAIC Madezatti, de São Leopoldo, sobre os conceitos fundamentais da proposta de ensino médio politécnico, à luz das proposições da Secretaria Estadual de Educação (SEDUC RS), órgão do governo estadual responsável pela elaboração e implantação desta proposta de ensino. Através da aplicação de um questionário individual ao conjunto dos docentes da escola e, também, à coordenação do ensino médio da SEDUC RS, pode-se identificar o quão alinhado estão as estratégias e práticas docentes daquele grupo de professores em relação aos princípios orientadores definidos pelo Estado na proposta pedagógica para o ensino médio politécnico e educação profissional integrada ao ensino médio. Os resultados advêm da análise qualitativa das respostas obtidas junto aos docentes e sua comparação com as respostas obtidas junto à SEDUC RS. As análises foram referenciadas nos princípios orientadores do ensino politécnico: relação parte-totalidade, reconhecimento de saberes, teoria e prática, interdisciplinaridade, avaliação emancipatória e pesquisa. Os resultados indicam que a interdisciplinaridade, enquanto prática, e a pesquisa, como princípio fundamental para apropriação de saberes estabelecidos e base para a construção de novos saberes, ainda se constitui em maior obstáculo a concretização do ensino médio politécnico. Palavras-chave: Ensino médio politécnico. Politecnia. Prática docente. ABSTRACT - This article aims to present a case study on the appropriation by the teachers of a state school in São Leopoldo and the main concepts of the Polytechnic School according to the State Education Department. By applying an individual questionnaire to all school teachers and also to the coordination of the State Education Department, it is possible to identify just how aligned are the strategies and teaching practices of that teachers group with the rules set by the state in the pedagogical proposal for Polytechnic School and professional education integrated to high school . The results are from qualitative review of the comparison of the answers obtained from the teachers and the responses obtained from the State Education Department. Analyses were referred to the principles of polytechnic education: the relationship between part and whole, recognition of knowledge, theory and practice, interdisciplinarity, emancipatory evaluation and research. The results show that interdisciplinarity, as a practice, and research, as a key principle to frame established knowledge and a base to build new knowledge, still are the major obstacle to the polytechnic education implementation. Keywords: High school. Polytechnic. Teaching practice. Revista Ciência e Conhecimento Volume 9 – Nº1 – 2015. 1 – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo, RS, Brasil. 2 – Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, RS, Brasil. Dados para correspondência Cléber Fernando Homem Rua: Emilio Becker, nº 26. CEP: 93042-370 E-mail: [email protected] Recebido em: 23/01/2015. Revisado em: 10/03/2015. Aceito em: 20/04/2015. Área: Metodologias e estratégias de ensino e aprendizagens. 54 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 INTRODUÇÃO A proposta de ensino médio politécnico surge no âmbito do Plano de Governo para o Rio Grande do Sul no período 2011-2014 como alternativa para reestruturação do ensino médio praticado nas escolas públicas estaduais. Amparado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9.394/96, e na Resolução Nº 4, de 13 de julho de 2010, sobre Diretrizes Curriculares para a Educação Básica emitida pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), a Proposta Pedagógica para o Ensino Médio Politécnico e Educação Profissional Integrada ao Ensino Médio consiste: Numa proposta para a educação do século XXI, a qual tem a responsabilidade de ofertar à juventude e ao mundo um novo paradigma, uma mudança estrutural que coloque o Ensino Médio para além da mera continuidade do Ensino Fundamental, instituindo-o efetivamente como etapa final da educação básica. Um Ensino Médio que contemple a qualificação, a articulação com o mundo do trabalho e práticas produtivas, com responsabilidade e sustentabilidade e com qualidade cidadã (SEDUC RS, 2011). Basicamente, a proposta constitui-se no entendimento de que a politecnia resulta da articulação das diferentes áreas do conhecimento e suas tecnologias com os assim designados eixos estruturantes: cultura, ciência, tecnologia e trabalho enquanto princípio educativo. Ou seja, num contexto produtivo em que o modelo de produção taylorista/fordista perde espaço para novas formas de organização produtiva e, logo, a escola baseada no modelo iluminista/positivista mostra-se ineficiente para formar profissionais capazes de atuar nestas novas dinâmicas produtivas, a concepção de uma escola politécnica ganha força diante da possibilidade de atender as necessidades de intelectualização da técnica. Segundo Saviani (1989, p. 17), a noção de politecnia diz respeito ao domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas que caracterizam o processo de trabalho produtivo moderno. Sendo assim, a politecnia surge como alternativa à dualidade em que o ensino médio estava envolto a partir do Decreto nº 2.208/1997, que promoveu a separação entre o ensino médio e a educação profissional. Revogado, é verdade, pelo Decreto nº 5.154/2004 que, juntamente com a Lei nº 11.741/2008 normatiza a articulação da Educação Profissional com o Ensino Médio, nas formas integrada, concomitante e subsequente. No entanto, mesmo o novo arcabouço legal constituído sobre uma nova percepção do papel a ser cumprido pelo ensino médio, não contempla a educação tecnológica ou politécnica, mas contém princípios orientadores que acabam por fornecer os pilares de fundamentação necessários à consolidação da politecnia como uma alternativa concreta. No entanto, muitos são os desafios para a consolidação do Ensino Médio Politécnico. A criação dos chamados Seminários Integrados, por exemplo, cuja intencionalidade consiste na promoção da articulação entre os dois blocos que integram o currículo, a “formação geral” HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 55 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 (núcleo comum) e a “parte diversificada” (humana – tecnológica – politécnica), tem sido objeto de muita discussão. Talvez porque sejam estes seminários o lócus onde se espera que ocorra a materialização da interdisciplinaridade pretendida. É nos seminários integrados que se objetiva dar significado à interlocução entre as diferentes áreas de conhecimento e suas transversalidades, oportunizando aos aprendizes tanto a apropriação dos conhecimentos quanto a geração de novos saberes que contribuam no processo de construção da cidadania e na inserção destes no mundo do trabalho. Portanto, entender a proposta de criação do ensino médio politécnico como um processo em construção sugere a necessária avaliação não só do seu objetivo final, entendido aqui como a produção sistematizada pelo conjunto da escola no âmbito dos seminários integrados, como também das atividades fundamentais que podem conduzir a efetiva consolidação da proposta no médio ou longo prazo. Para isso, mais que analisar os discursos, muitas vezes permeados por fatores exógenos à proposta, mas nem por isso irrelevantes, como a questão dos baixos salários e problemas de infraestrutura das escolas, buscou-se investigar o quanto as práticas docentes estão alinhadas com a intencionalidade da proposta. 2. MARCO REFERENCIAL Os princípios orientadores do ensino médio politécnico constituem a base de sustentação da proposta elaborada pela SEDUC e organizam os processos de ensino e aprendizagem. Ou seja, esses princípios possibilitam ação à intenção. Instrumentalizam os diferentes atores para o desempenhar de suas atividades de maneira articulada e coordenada. Tendo como referencial Gramsci (1966;1981), a SEDUC RS propõe que o conhecimento deve ser elaborado a partir da realidade vivida, a partir do senso comum, como conhecimento científico no âmbito da escola e deve retornar como bom senso à sociedade. Com isso, entende-se que o ensino politécnico não só contribui para que os diferentes atores compreendam os processos de construção do conhecimento como, ao mesmo tempo, atende as necessidades de grupos sociais marginalizados na medida em que permite que a construção deste conhecimento se dê no sentido da realidade dos educandos até o conhecimento cientificamente produzido. São princípios orientadores do ensino politécnico: relação parte-totalidade, reconhecimento de saberes, teoria e prática, interdisciplinaridade, avaliação emancipatória e pesquisa. Relação parte-totalidade refere-se ao desafio de compreender fatos e realidades amplas e complexas, a partir da escolha de conteúdos curriculares. Dito de outra forma, consiste no HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 56 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 reconhecimento da insuficiência da proposta disciplinar para a solução de problemas concretos, demandando abordagens sistêmicas na perspectiva da multi, inter e transdisciplinaridades ressignificarem os conteúdos e relacioná-los com as condições existenciais. Reconhecimento de saberes compreende a colocação da práxis pedagógica no espaço mais permanente da sociedade: no espaço das lutas sociais pela emancipação do ser humano. Consiste no reconhecimento de que a realidade é um constructo das práticas sociais e que, por esta razão, o ponto de partida para o conhecimento cientifico é o saber popular. No entanto, é preciso reconhecer também que a compreensão da realidade demanda a superação do senso comum e o entendimento de que o conhecimento científico produzido e sistematizado também deve avançar na direção do saber popular. Neste contexto, faz-se necessário reconhecer e compreender as diferenças sociais, políticas e culturais de cada população, definindo estratégias diferenciadas de apresentação dos conteúdos a partir da introdução de aspectos da realidade dos alunos na abordagem em sala de aula. A relação entre teoria e prática deve ser entendida como a organização planejada, sistemática e metodológica de uma intervenção humana na realidade. Ou seja, consiste na indissociabilidade entre o saber e o fazer. O saber, isoladamente, constitui-se em mera representação abstrata e sem sentido. Por outro lado, o fazer pelo fazer torna-se um processo mecânico, desprovido de reflexão e meramente automatizado e alienante. Promover a relação entre teoria e prática significa produzir aplicabilidade para os saberes nos problemas concretos da vida e da sociedade. A abordagem interdisciplinar possibilita o estudo de temáticas transversalizadas, permitindo a integração das diferentes áreas do conhecimento e destas com os problemas concretos das sociedades. A compartimentação do saber, organizado em disciplinas, constituise em solução elaborada com o propósito de facilitar a aprendizagem, no entanto, acaba por descaracterizar o todo, de maneira a comprometer sua aplicabilidade em situações concretas da existência humana. No que se refere aos processos de avaliação, desenvolver a consciência crítica em relação ao desempenho de cada sujeito frente às diferentes situações de aprendizagem e, ao mesmo tempo, propor alternativas para superar eventuais problemas e entraves, constitui-se em desafio a ser perseguido na perspectiva de implementar um processo de avaliação emancipatório. Nesta direção, ideias como a avaliação processual, que toma por referência o desenvolvimento do aluno em relação a ele próprio, bem como a utilização de diferentes HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 57 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 métodos avaliativos, representam a possibilidade de colocar o aluno, e não a prova, no centro do processo de avaliação. A avaliação emancipatória, enquanto prática que oportuniza decisões democráticas e a participação cidadã dos educandos e educadores na intermediação e superação de conflitos e na convivência com o contraditório, constitui-se em eixo fundamental do processo de aprendizagem. Além de ter origem na realidade, sinaliza não só os progressos do educando como também indica as melhorias necessárias ao processo, logo, permite a revisão das práticas da escola. Por fim, a pesquisa enquanto processo pedagogicamente estruturado, uma vez absorvido e praticado pela escola de ensino médio, possibilita a efetiva apropriação da realidade e projeta possibilidades de intervenção nesta realidade. Ou seja, possibilita o aprendizado a partir das realidades das diferentes comunidades e, dessa forma, a intervenção destas comunidades em suas realidades próprias. Propõe-se, assim, uma escola de ensino médio que atue como uma comunidade de aprendizagem. Nela, os jovens desenvolverão uma cultura para o trabalho e demais práticas sociais por meio do protagonismo em atividades transformadoras. Explorarão interesses vocacionais ou opções profissionais, perspectivas de vida e de organização social, exercendo sua autonomia e aprendendo a ser autônomo, ao formular e ensaiar a concretização de projetos de vida e de sociedade (UNESCO, 2011, p. 9). A pesquisa, neste contexto, constitui-se na mola propulsora para a apropriação do conhecimento já produzido e para produção de novos saberes. A análise das diferentes realidades, à luz do conhecimento científico já sistematizado, não apenas dá significado aos saberes como possibilita a intervenção nas realidades a serem transformadas. Os princípios orientadores da proposta de ensino médio politécnico atuam como elo entre os conhecimentos formais, ou eixos profissionalizantes (arte, educação física, língua portuguesa, língua materna, línguas estrangeiras, matemática, biologia, física, química, filosofia, geografia, história, sociologia, ensino religioso) e os conhecimentos sociais, ou eixos pedagógicos (práticas sociais, realidade, eixos temáticos transversais). A operacionalização desta interface se dá no âmbito dos denominados Seminários Integrados. Na sua essência, o SI proporciona a articulação e o diálogo entre as áreas de conhecimentos (conhecimentos dos componentes curriculares formais, historicamente construídos) e os conhecimentos sociais (práticas sociais-realidade). A materialização dos princípios orientadores (pesquisa, reconhecimento dos saberes, relação teoria-prática, relação parte-totalidade, interdisciplinaridade e avaliação emancipatória) por meio do enfoque crítico e investigativo, possibilita a construção do conhecimento-aprendizagem, que viabiliza a intervenção para transformar a realidade. A estratégia de resolução de problemas recorre metodologicamente à pesquisa, para a identificação da situação a ser resolvida. Para tanto, emprega procedimentos de observação, de levantamento de hipóteses, de testagem e de aplicação da opção selecionada. Esse processo utiliza os conteúdos curriculares como meio de construção dos processos mentais, que se concretizam com a HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 58 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 construção dos conceitos fundantes, que levam a novas aprendizagens. Na sequência, para cada construção de conhecimento efetivada, um novo problema surge para ser solucionado, constituindo-se assim uma rede de conhecimentos que caracteriza a própria aprendizagem – um movimento espiral de crescente ampliação. O SI propõe-se a desconstituir dois grandes entraves de concepção que têm inviabilizado as tentativas de mudanças nos currículos escolares: a) a hegemonia de algumas disciplinas em relação a outras, caracterizada especialmente pela distribuição desequilibrada da carga horária do tempo escolar; b) a fragmentação do conhecimento pela consagração de disciplinas e conteúdos como fim em si mesmos. (Reestruturação do Ensino Médio: pressupostos teóricos e desafios da prática, 2013, p 197). 3. METODOLOGIA Conforme anunciado, este é um estudo de caso sobre a apropriação pelos docentes da Escola Estadual de Ensino Médio CAIC Madezatti de São Leopoldo sobre os conceitos fundamentais da proposta de ensino médio politécnico, à luz das proposições da Secretaria Estadual de Educação (SEDUC RS). Segundo Stake (1994, apud Andre, 2013), o estudo de caso não se constitui em um método específico de pesquisa, nem em uma escolha metodológica, é sim uma forma particular de estudo e de escolha do objeto a ser estudado. Para Gomes (2008), o estudo de caso constitui-se em uma investigação empírica e um método abrangente, com base em uma lógica do planejamento, coleta e análise de dados, aplicável tanto em estudos de caso único quanto múltiplos, utilizando-se de abordagens de pesquisa tanto qualitativas quanto quantitativas. O estudo de caso é utilizado para investigar novos conceitos e também para investigar a aplicação de elementos teóricos. Desta forma, buscou-se com este estudo verificar, a partir dos dados coletados, a dimensão prática da atuação docente e não as suas percepções e entendimentos em relação à proposta da SEDUC RS. Ou seja, não se buscou afrontar eventuais divergências. Assim, pretende-se evidenciar sinergias e distorções que possam indicar o grau de compatibilidade entre o fazer docente e o caminho pretendido com a implantação do ensino médio politécnico. Os dados foram obtidos através de um questionário contendo vinte e quatro afirmações relacionadas às práticas docentes, formuladas ao longo da observação das manifestações de docentes em reuniões pedagógicas. Para cada uma destas afirmações os entrevistados poderiam indicar com que intensidade as praticavam: nunca (zero), raramente (um), frequentemente (dois) ou sempre (três). O questionário ainda dispunha de outras seis afirmações diretamente relacionadas com os princípios organizadores da proposta de ensino politécnico (uma para cada princípio). Para estas afirmações os docentes poderiam assinalar se as praticavam frequentemente (dois), eventualmente (um) ou nunca (zero). As mesmas afirmações foram submetidas, na forma de um segundo questionário estruturado, à análise da Coordenação do Núcleo do Ensino Médio da SEDUC. Para as HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 59 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 primeiras vinte e quatro afirmações, além de assinalar se aquelas práticas docentes eram desejáveis ou indesejáveis no âmbito do ensino politécnico, os representantes da SEDUC poderiam indicar a intensidade com que cada uma daquelas práticas se relacionavam com os seis princípios organizadores do ensino politécnico. Por fim, os representantes da SEDUC indicaram a intensidade desejada para cada uma das práticas docentes relacionadas nas seis últimas afirmações do questionário. Essas, diretamente relacionadas aos princípios organizadores do ensino politécnico. O primeiro grupo de questões submetidas à análise tanto da SEDUC quanto dos docentes, buscou caracterizar situações da prática docente relatadas pelos próprios professores quando da realização de reuniões pedagógicas e/ou momentos de formação. Compuseram esta primeira parte do questionário as seguintes afirmações: 1. Foco minha atuação no programa do componente curricular. 2. Incorporo problemáticas da realidade dos alunos, inclusive os que não se relacionam diretamente com o conteúdo das minhas matérias, nas atividades em sala de aula. 3. Planejo minhas aulas em conjunto com os demais professores das outras áreas. 4. Faço da aula um momento profícuo para a apropriação dos conteúdos, evitando discussões sobre temas diversos que geram dispersões e queda do rendimento. 5. Procuro inovar nas aulas com temas atuais que transcendam a matéria que leciono. 6. Planejo sempre minhas aulas com base no diagnóstico da turma pois, cada turma é única. 7. Entendo que a integração dos conteúdos dos diferentes componentes curriculares é o resultado da construção individual do conhecimento pelo aluno. 8. Adoto um critério único e geral para embasar minhas aulas, exemplos e métodos de significação dos conteúdos, que se adapte a todas as turmas, primando pelo tratamento igualitário. 9. Compreendo a construção do conhecimento como um processo coletivo, permanente e inacabado. 10. Exijo dos alunos o domínio do conteúdo, que é o que realmente importa para o acesso a universidade. 11. Agrego poucos elementos novos às minhas aulas na medida em que a leciono estes conteúdos já há muito tempo. 12. Julgo mais importante a formação integral do sujeito na hora da avaliação, em detrimento ao conteúdo do componente curricular. 13. Restrinjo o espaço dado à pesquisa enquanto processo de aprendizagem sob pena de não cumprir o programa do componente curricular em função da falta de tempo para repassar todo o conteúdo. 14. Considero a avaliação um processo de classificação que, dentre outras funções, seleciona aqueles que efetivamente poderão desempenhar com qualidade suas futuras profissões. 15. Julgo que a apropriação do conteúdo é mais um processo mental do que formativo. O verdadeiro objetivo da escola é orientar o aluno a identificar e interpretar problemas e, principalmente, buscar respostas. 16. Entendo a prova apenas como uma das muitas formas de avaliar, que nem sempre é a mais justa e eficaz. 17. Acredito que a escola tem o poder de transformar a realidade sócio-político-cultural dos alunos. 18. Utilizo dos problemas concretos trazidos pelos alunos para, a partir destas questões que lhes são quotidianas, desafiá-los a buscarem soluções com base na discussão das teorias consagradas, sua reconfiguração e, até mesmo, em novas proposições. 19. Reconheço os limites da escola em promover a cidadania e, por esta razão, me concentro em dar boas aulas que ajudem os alunos a conseguirem uma boa colocação profissional no futuro. HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 60 20. Vejo as atividades praticas como uma forma eficaz de demonstrar aos alunos a aplicabilidade e a eficácia das teorias. 21. Discordo da afirmação de que a escola educa. Quem educa é a família, a escola apenas ensina os conteúdos. 22. Entendo que a relação entre teoria e pratica consiste em interface necessária para produção de conhecimento, sem o qual a escola não atingirá seu propósito. 23. Acredito na capacidade transformadora da escola em potencializar os projetos de vida de cada aluno, formando consciência sobre seus direitos e deveres e alterando sua condição pessoal, de suas famílias e de suas comunidades. 24. Apresento aos alunos os clássicos e as teorias consagradas, papel fundamental da escola e “conhecimento” indispensável para as futuras atividades que desempenharão, sejam quais forem. A segunda parte do questionário, composta por seis questões diretamente relacionadas aos princípios organizadores do ensino politécnico, foi constituída das seguintes afirmações: 1. Utilizo os seminários integrados como fato mobilizador das minhas aulas, buscando convergir teoria e prática através da aplicabilidade dos conteúdos nos problemas de pesquisa propostos pelos alunos (Relação Teoria e Prática). 2. Pratico a avaliação processual tendo como referência o desenvolvimento do aluno em relação a ele próprio, de maneira integrada e utilizando diferentes métodos avaliativos (Avaliação Emancipatória) 3. Proponho atividades voltadas à resolução de problemas, organizando os conteúdos de forma a oferecer aos alunos instrumental teórico adequado para o desenvolvimento de suas pesquisas (Pesquisa). 4. Planejo minhas aulas em conjunto com os demais professores, de maneira a contemplar aspectos que extrapolam os limites do conteúdo de meu componente curricular e que subsidiem as pesquisas realizadas pelos alunos (Interdisciplinaridade). 5. Proponho atividades que denotem a insuficiência da proposta disciplinar para a solução de problemas concretos, exigindo dos alunos uma abordagem sistêmica para resolução de seus problemas de pesquisa, bem como em relação à sua condição existencial (Relação Parte-Totalidade). 6. Defino estratégias diferenciadas de apresentação dos conteúdos para cada turma, considerando suas características, de forma a introduzir aspectos da realidade dos alunos na abordagem em sala de aula (Reconhecimento de Saberes). A única diferença na formulação das afirmações para submissão à SEDUC, em relação ao questionário submetido aos professores, diz respeito ao sujeito empregado na construção da oração. Se para os professores utilizou-se o “eu” (ex: “Eu” defino estratégias para...), para a SEDUC se utilizou o “ele”, no caso, o professor (ex: Espera-se que “ele” defina estratégias para...). 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES A análise dos resultados baseou-se na comparação das respostas obtidas junto ao conjunto dos professores em relação às respostas obtidas junto à SEDUC. Essas últimas, utilizadas como padrão referencial ou meta. Para tanto, foram aplicados princípios estatísticos como média, desvio padrão e moda para quantificar e descrever os diferentes comportamentos verificados. HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 61 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Caracterização dos Respondentes Pela Seduc, dois profissionais do Núcleo do Ensino Médio responderam conjuntamente ao questionário. Quadro 1. Caracterização do grupo de professores respondentes. Tipo Gênero Idade Nível de formação Vínculo de contratação Tempo de atuação como professor da rede pública estadual Nº de Escolas em que cumpre seu contrato com o Estado Carga horária contratual atual com o CAIC (1) Formação por área do conhecimento Caracterização Masculino QTD 12 Feminino 16 De 30 a 40 anos 15 Mais de 40 anos 13 Ensino Médio 1 Graduação 21 Especialização 6 Concursado 15 Contrato Emergencial 13 Até 3 anos de atuação na rede estadual Mais de 3 até 10 anos de atuação na rede estadual Mais de 10 anos de atuação na rede estadual 7 13 Cumpre seu contrato só no CAIC 24 Cumpre seu contrato em duas escolas Cumpre seu contrato em três ou mais escolas 3 Até 10 horas no CAIC 1 De 11 a 20 horas no CAIC 7 De 21 a 30 horas no CAIC 6 Mais de 31 horas no CAIC Formação em Linguagens e suas tecnologias Formação em Matemática e suas tecnologias Formação em Ciências humanas e suas tecnologias Formação em Ciências da Natureza e suas tecnologias 14 8 1 13 4 8 4 Formação em Seminário Integrado 1 (1) A soma das quantidades supera o número de respondentes porque alguns docentes indicaram formação em mais de uma área do conhecimento. Na escola CAIC Madezatti, vinte e oito professores, de um total de trinta e um que atuam no ensino médio politécnico responderam ao questionário. A caracterização deste grupo de professores está descrita no Quadro 1. HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 62 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Primeira parte do Questionário Os técnicos da SEDUC definiram que seis das vinte e quatro afirmações consistiam em características indesejáveis para o modelo de ensino politécnico. Ao estabelecer o grau de intensidade destas afirmações em relação a cada um dos princípios organizadores, atribuíram peso zero. Ou seja, consideraram que por ser uma prática ou percepção indesejada dos professores, nenhuma relação ou contribuição estas podem trazer ao ensino politécnico. Para as dezoito afirmações restantes, consideradas como desejáveis para o modelo de ensino politécnico, foram atribuídas intensidade relacional mediana (peso dois) para quatro afirmações e forte (peso três) para as demais quatorze. O resultado obtido com a tabulação dos dados coletados junto aos professores está expresso nos gráficos que seguem. A partir do Gráfico 1, é possível identificar que valores e práticas consideradas inadequadas para o sucesso da proposta de ensino politécnico ainda são majoritariamente praticados pela maioria dos docentes. Em particular, cabe destacar as respostas obtidas com relação à dimensão dos conteúdos e sua importância, bem como aquelas que dizem respeito ao critério utilizado para organizar aulas de mesmo conteúdo para turmas diferentes. Outro fator a se considerar é a medida de dispersão das respostas coletadas para este grupo de questões, cujo coeficiente de variação oscilou entre 57% e 103%. Gráfico 1. Características Indesejáveis: Comparação Docentes X SEDUC. No que se refere às características desejáveis com contribuição mediana para o sucesso do ensino politécnico, verifica-se que os docentes hegemonicamente estão alinhados com as proposições da SEDUC. O que é possível de se constatar na análise do gráfico 2, onde denta- HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 63 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 se que a tanto a média quanto a moda das respostas dos docentes atingiram valores idênticos, ou muito próximos, daqueles assinalados pela SEDUC. Gráfico 2. Características Desejáveis de Contribuição Mediana: Comparação Docentes X SEDUC. Com relação às características desejáveis de forte contribuição para o sucesso do ensino politécnico, constata-se que em apenas cinco das quatorze afirmações existe um posicionamento hegemônico dos docentes alinhado com a visão da SEDUC. Tomando-se o gráfico 3, verifica-se que a questão mais crítica se refere ao planejamento das aulas de forma integrada pelos docentes das diferentes áreas do conhecimento. Neste caso, os docentes indicaram que raramente praticam o planejamento integrado (ou conjunto), enquanto a SEDUC sugere que esta seria uma prática com forte contribuição para o sucesso do ensino politécnico. Com relação ao coeficiente de variação encontrado para este conjunto de questões, este variou entre 21% e 75%. HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 64 Gráfico 3. Características Desejáveis de Contribuição Forte: Comparação Docentes X SEDUC. Segunda parte do Questionário Para as seis questões que compõem esta parte do questionário, a SEDUC indicou que as práticas contidas nestas afirmações devem ser realizadas com frequência pelos docentes do ensino politécnico. No entanto, tomando como referência as respostas obtidas junto aos docentes, verificase que as questões referentes à relação teoria x prática, relação parte e totalidade e, sobretudo, interdisciplinaridade, são praticadas eventualmente pela maior parte dos docentes. Destaca-se que o tema da interdisciplinaridade foi o que apresentou maior dispersão e maior coeficiente de variação (55%). O comportamento das respostas obtidas para este grupo de questões está expresso no gráfico 4. HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 65 Gráfico 4. Prática Docente e Princípios Orientadores do Politécnico: Comparação Docentes X SEDUC. CONCLUSÕES A partir do cruzamento dos dados e análise dos resultados obtidos com a aplicação dos questionários, buscou-se compreender como os professores daquela escola praticam, ou não, os princípios norteadores do ensino politécnico. Isso comparativamente ao que a SEDUC entende como prática ideal. No que se refere às respostas obtidas junto à SEDUC, os técnicos adotaram o critério da indissociabilidade entre os princípios organizadores e a suposta contribuição igualitária destes para com o sucesso da proposta de ensino politécnico. Para cada uma das afirmações, atribuíram o mesmo grau de importância para todos os princípios. Ou seja, se a afirmação foi julgada desejável e importante, ela foi considerada igualmente importante para todos os princípios. Se a afirmação foi julgada desejável e pouco importante, segue a mesma lógica anterior. E por fim, se a afirmação foi julgada indesejável, ela foi considerada sem importância em relação a todos os princípios. Com relação aos docentes, as respostas obtidas sugerem que os mesmos demonstram clareza com relação ao papel da escola enquanto lócus de transformação social e de construção da cidadania. Isto fica evidenciado quando se analisa as respostas obtidas sobre o processo de avaliação e sobre a necessidade de promover a ressignificação dos conteúdos, na perspectiva de sua aplicação na realidade dos alunos. Ainda em relação aos docentes, analisando as respostas às afirmações que tratam da dialética entre teoria e prática, pesquisa, interdisciplinaridade, como valores de emancipação dos educandos, verifica-se que foram estes os pontos mais díspares, se comparados ao que a HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 66 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 SEDUC indicou como ideal. Neste sentido, é recorrente o debate sobre a necessária revisão da organização curricular como forma de promover a integração entre os docentes e das diferentes disciplinas, nos diferentes fóruns docentes de discussão constituídos na escola. Sobre este prisma, Freire (1965) afirma que a educação deve possibilitar aos educandos construírem-se sujeitos de seu agir e de sua própria história, sendo a dialogicidade a ação de permitir que alunos ajam e reflitam sobre a ação pedagógica. Essa, segundo Freire, é a essência da educação libertadora. Para isso, características como colaboração, união, organização e síntese cultural, são imprescindíveis para que essa educação libertadora se concretize. Freire (1998), afirma que não basta só conhecer o mundo, é preciso transformá-lo. Para isso, ainda segundo Freire (1997), a teoria sem a prática vira “verbalismo”, assim como a prática sem teoria, vira ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se a práxis, a ação criadora e modificadora da realidade. Buscando uma melhor compreensão da realidade vivida pelo grupo de docentes pesquisados, faz-se relevante destacar algumas características peculiares daquele grupo e da realidade escolar por eles vivenciada: a. Apenas 25%, ou sete professores, atuam nos seminários integrados. Respondendo diretamente por trinta e uma turmas de ensino médio politécnico. b. Apenas um respondente declarou ter “formação” para atuar nos seminários integrados. c. Seis professores, ou 27% do total, tem pós-graduação lato sensu e nenhum stricto sensu. d. Vinte professores, ou 71% do total, cumprem mais de 20 horas na escola. Destes, quatorze, ou 50% do total, cumprem mais 30 horas na escola. e. Apenas um professor cumpre menos de 10 horas na escola. f. Vinte e quatro professores, ou 84% do total, cumprem integralmente seu contrato de trabalho com o Estado apenas naquela escola. Por fim, em relação à efetiva compreensão e apropriação da proposta de ensino médio politécnico pelos docentes da Escola CAIC Madezatti, é importante ressaltar o esforço e o protagonismo daquela comunidade escolar para produzir os melhores resultados possíveis. A busca permanente pela qualificação docente, as reuniões sistemáticas de alinhamento e planejamento, a qualificação da infraestrutura da escola tem, em grande medida, contribuído para o rápido progresso e consolidação de um modus operandi próprio da escola, mas que sinaliza um avanço na direção da concepção original da proposta. HOMEM. A dimensão da politecnia e a prática docente no âmbito do ensino médio. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 67 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 REFERÊNCIAS ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. Tradução da 1ª edição brasileira coordenada e revista por Alfredo Bosi. Revisão da tradução e tradução de novos textos Ivone Castilho Benedetti. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. ANDRE, M. E.D.A. O que é um estudo de caso qualitativo em educação?. Revista FAEEBA, v. 22, p. 95-104, 2013. FERREIRA, Vera Maria. Ensino médio politécnico: mudanças de paradigmas. In: AZEVEDO, Jose Clovis de; REIS, Jonas Tarcísio (org.). 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Gaya3 e Adroaldo Gaya3 RESUMO - O objetivo deste estudo é descrever as diferenças nas médias da estatura, massa corporal e índice de massa corporal em dados provenientes de desenhos transversais, longitudinal e longitudinal misto, com o intuito de alertar sobre os possíveis equívocos quanto a comparações de resultados provenientes de diferentes desenhos de pesquisa. A amostra coletada de forma transversal provém dos dados analisados nos anos de 2003 e 2008. Os dados de 2003 contam com 370 alunos (157 do sexo masculino e 213 do sexo masculino) e os dados de 2008 contam com 299 alunos (151 do sexo masculino e 148 do sexo feminino) com idades entre 10 e 15 anos de idade. A amostra coletada de forma longitudinal foi formada por 71 alunos, dos dois sexos, seguidos dos 10 aos 15 anos de idades, entre os anos de 2003 e 2008. Já a amostra coletada de forma longitudinal mista foi elaborada a partir de 4 coortes da seguinte forma: Coorte 1 = dez, onze e doze anos, Coorte 2- onze, doze e treze anos, Coorte 3- doze, treze e quatorze anos, Coorte 4 – treze, quatorze e quinze anos de idade. Para a análise do crescimento somático utilizou-se as medidas da estatura e da massa corporal. O índice de massa corporal foi obtido através da divisão da massa corporal em quilogramas pela estatura em metros ao quadrado. Os resultados foram apresentados na forma de tabelas e gráficos. Como principal resultado identificou-se que não existe um padrão entre as diferenças dos desenhos de pesquisa analisados. Conclui-se, portanto que não é aconselhável comparações de resultados provenientes dos diferentes desenhos de pesquisa. Palavras-chave: Crescimento somático. IMC. Escolares. ABSTRACT - The aim of this study is to describe the differences in average height, weight and body mass index on data from cross designs, longitudinal and mixed longitudinal design, in order to warn of possible misunderstandings as to compare results from different designs search. A sample collected in a cross design derived from the data analyzed in the years 2003 and 2008. The 2003 data have 370 students (157 males and 213 males) and 2008 data have 299 students (151 males and 148 females) aged between 10 and 15 years of age. A sample collected from a longitudinal design consisted of 71 students of both sexes, followed by 10 to 15 years of age, between the years 2003 and 2008. Since the sample collected from a mixed longitudinal design was drawn from four cohorts as follows: Cohort 1 = ten, eleven and twelve years, Cohort 2 - eleven, twelve and thirteen years, Cohort 3 - twelve, thirteen and fourteen years, Cohort 4 - thirteen, fourteen and fifteen years old. For the analysis of somatic growth, we used measures of height and weight. The body mass index was obtained by dividing the body weight in kilograms by height in meters squared. The results were presented in tables and graphs. The main result we identified that there is a difference between the standard of research designs analyzed. It is therefore not advisable to compare results from different research designs. Keywords: Somatic growth. BMI. School. Revista Ciência e Conhecimento Volume 9 – Nº1 – 2015. 1 – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/Canoas, RS, Brasil. 2 – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo, RS, Brasil. 3 – Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, RS, Brasil. Dados para correspondência Daniel Carlos Garlipp Rua: Quintino Bocaiuva, nº 345, apt.02, Bairro Moinho de Ventos, Porto Alegre. CEP: 90440-051 E-mail: [email protected] Recebido em: 23/02/2015. Revisado em: 16/03/2015. Aceito em: 28/04/2015. Área: Atenção à saúde e bem-estar. 69 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 INTRODUÇÃO O crescimento somático e suas relações vêm sendo estudado ao longo do tempo através da utilização de desenhos transversais (CHEN et al., 2002; CDC, 2005; GARLIPP et al., 2005, PRISTA et al., 2005; MALHOTRA et al., 2006; CONDE E MONTEIRO, 2006; JIANG et al., 2006; TRETYAK, 2007; DINIZ et al., 2008; BERGMANN et al., 2009; KHADILKAR et al., 2009), longitudinais (DEHEEGER et al., 2002; AMIRHAKIMI, 2003; LEE et al., 2004; ECKHARDT et al., 2005; CSUKÁS et al., 2006; CRIMMINS et al., 2007; LI et al., 2007; VIGNEROVÁ et al., 2007; GARLIPP et al, 2009) e longitudinais mistos (DAI et al.,2002; BHALLA, 2003; VIRANI, 2005; MATTHEWS et al., 2006; FREITAS et al., 2007). Em muitos casos, faz-se a comparação de resultados que utilizaram um tipo de desenho com resultados de estudos que utilizaram outro tipo de desenho de pesquisa. Essas comparações muitas vezes se fundamentam no fato do crescimento somático possuir forte influência de fatores genéticos (cerca de 60% para a estatura e 40% para a massa corporal), apresentar certo padrão de desenvolvimento, além de ser canalizado, ou seja, tende a seguir canais específicos em tabelas de crescimento (MALINA e BOUCHARD, 2002). Entretanto, crescer é bem mais complexo do que a simples adição de valores estaturais ao longo da idade, do nascimento ao estado adulto (MAIA e LOPES, 2006). Crescer é fruto de uma grande variação que está associada às diferenças na maturação biológica, efeitos genéticos e ambientais, extremamente complexa de se ilustrar gráfica ou numericamente. Nesse sentido, há muito tempo o crescimento tem sido usado como um espelho da sociedade (Tanner, 1986). Para Lee e Ginkel (2004), dados acerca do crescimento somático são uma das maiores preciosidades informativas para se lidar com necessidades físicas das crianças, na medida em que constitui um dos parâmetros indicadores da qualidade de vida de um país. Historicamente, profissionais da área da saúde tem utilizado a estatura e a massa corporal como medidas para avaliar as alterações no crescimento. Essas medidas antropométricas, avaliadas de forma individualizada, podem ser usadas para obter informações sobre o comprometimento da saúde ou bem-estar nutricional. Já, quando avaliadas a nível populacional, podem ser usadas para obter informações sobre o estado nutricional de um país, de uma região, comunidade ou grupo socioeconômico. Dessa forma, muitos estudos populacionais foram realizados em diversos países com o intuito de propor normas de avaliação para o crescimento somático e IMC (HAMIL et al., 1979; FREEMAN et al.,1995; CACCIARI et al., 2002; ADAK et al., 2002; KHADILKAR et al., 2009; BERGMANN et al., 2009) e índice de massa corporal (MUST et al., 1991; COLE et al., 2000; SHANG et al., 2005; JIANG et al., 2006; INOKUSHI et al., 2006; KHADILKAR et GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 70 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 al., 2009). Essas investigações por motivos lógicos como custo e tempo, provém de dados analisados transversalmente, sendo que, em muitos casos, são utilizados como fator de comparação, mesmo que o estudo a ser comparado contenha informações que utilizem outro tipo de desenho de pesquisa. Frente a isso, o presente estudo tem como objetivo descrever as diferenças nas médias da estatura, massa corporal e índice de massa corporal em dados provenientes de desenhos transversais, longitudinal e longitudinal misto, com o intuito de alertar sobre os possíveis equívocos quanto a comparações de resultados provenientes de diferentes desenhos de pesquisa. 2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Este estudo faz parte de uma série de trabalhos que estão sendo desenvolvido pelo Projeto Esporte Brasil (PROESP-Br), sendo que o protocolo de estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A amostra é considerada por conveniência, e formada por duas amostras coletadas de forma transversal, uma amostra coletada de forma longitudinal e uma amostra coletada de forma longitudinal mista. Todos os dados provêm do Instituto Estadual de Educação Vasconcelos Jardim do município de General Câmara – RS. Importante salientar que os dados não se repetem nos diferentes estudos, ou seja, nenhum indivíduo que esteja em um tipo de amostra compõe outro tipo de amostra. As amostras que compõe os desenhos transversais foram avaliadas nos anos de 2003 e 2008 e estão descritas na tabela abaixo: Tabela 1. Distribuição da amostra separada por ano de avaliação, idade e sexo. Idades Ano de Sexo avaliação 10 11 12 13 14 15 2003 35 19 25 32 28 18 Masculino 2008 10 16 25 34 32 34 2003 45 28 37 35 43 25 Feminino 2008 12 22 15 26 25 48 Total 157 151 213 148 A amostra que compõe o desenho longitudinal foi formada por 71 alunos (30 do sexo masculino e 41 do sexo feminino) seguidos dos 10 aos 15 anos de idades, entre os anos de 2003 e 2008. Já a amostra que compõe o desenho longitudinal misto foi elaborada a partir de 4 coortes da seguinte forma: Coorte 1 = dez, onze e doze anos, Coorte 2- onze, doze e treze GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 71 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 anos, Coorte 3- doze, treze e quatorze anos, Coorte 4 – treze, quatorze e quinze anos de idade, e distribuídos conforme a tabela 2 e composta conforme a figura 1: Tabela 2. Distribuição da amostra nas diferentes coortes nos dois sexos. Coorte Sexo Masculino Sexo Feminino 1) 10 – 12 anos 40 39 2) 11 – 13 anos 51 49 3) 12 – 14 anos 44 48 4) 13 – 15 anos 39 41 Total 174 177 1ª coorte: 10 a 12 anos 10 11 12 2ª coorte: 11 a 13 anos 11 12 3ª coorte: 12 a 14 anos 12 4ª coorte: 13 a 15 anos Figura 1. Composição do desenho longitudinal misto 13 13 13 14 14 Total 79 100 92 80 351 15 Para a coleta das informações seguiu-se os seguintes caminhos: (a) no ano de 2003, após consentimento do órgão diretivo da escola, foram apresentados em reunião para pais, alunos e professores, os objetivos da aplicação dos testes e medidas analisados; (b) após consentimento dos pais iniciou-se a coleta de dados; (c) no mês de março de 2003 foi realizada a primeira coleta de dados e anualmente, em todos os meses de março, até o ano de 2008, se repetiu a coleta das medidas em todas as crianças e jovens matriculados desde os sextos anos do ensino fundamental até o terceiro ano do ensino médio. Todos os dados foram coletados pelo mesmo professor de Educação Física e equipamentos. Para a análise do crescimento somático utilizou-se as medidas da estatura e da massa corporal. A estatura foi medida em cm entre o vértex e plano de referência do solo por intermédio de um estadiômetro com resolução de 0,1 cm. A massa corporal foi medida em kg através de uma balança digital com 0,1 kg de precisão com os escolares vestindo o mínimo possível de roupas. O índice de massa corporal foi obtido através da divisão da massa corporal em quilogramas pela estatura em metros ao quadrado [IMC = massa corporal (kg)/estatura (m2)]. Os dados foram apresentados em forma de tabelas pelos valores médios, desviopadrão, mínimo e máximo, e de forma gráfica através de curvas da distância. Para tanto, primeiramente foram analisados os gráficos boxplot para identificação e possível eliminação de possíveis outliers severos. Todas as análises foram realizadas no pacote estatístico SPSS for Windows versão 18.0. GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 72 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Cabe salientar que nenhuma medida político-econômica foi realizada no município durante os anos de investigação, ou qualquer fato tenha ocorrido que sabidamente pudesse interferir nos resultados analisados. 3. RESULTADOS Os resultados das três variáveis analisadas serão apresentados na forma de tabelas contendo os valores médios, desvio-padrão, além dos valores mínimos e máximos e gráficos para cada idade e sexo investigados. Tabela 3. Valores descritivos da estatura corporal (cm) em cada idade e sexo para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto). Sexo Idades 10 11 Masculino 12 13 14 15 10 Feminino 11 12 13 Tipo de estudo Média DP Mínimo Máximo Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto 144,37 140,06 144,77 141,93 147,26 148,89 149,10 147,03 150,04 151,04 155,05 153,71 158,64 161,41 161,30 159,79 164,10 165,12 166,74 165,58 173,14 170,08 170,96 169,53 144,04 141,20 143,93 141,74 146,92 149,33 148,93 147,85 152,28 154,72 154,20 152,26 156,46 155,49 156,94 156,55 7,33 5,59 7,04 5,82 7,56 9,30 7,32 6,68 8,29 6,35 8,23 8,33 9,26 7,90 8,72 8,86 9,71 8,56 8,76 8,42 7,53 9,25 8,67 8,31 7,62 8,66 7,86 8,36 6,95 5,82 7,64 8,49 8,78 4,58 6,82 7,21 5,89 7,60 6,44 6,90 129,10 130,50 130,10 129,40 133,00 139,60 133,90 133,00 135,00 136,60 139,60 135,00 145,00 141,80 146,60 140,00 146,80 143,00 152,00 145,20 154,60 151,00 153,00 154,60 129,30 129,20 129,30 125,60 133,00 138,00 132,00 130,00 134,00 144,00 139,00 137,00 141,30 140,80 143,80 140,80 159,00 146,40 159,00 158,20 159,40 169,80 165,90 163,40 174,80 160,00 173,40 174,80 181,80 177,10 182,40 180,10 182,20 177,40 183,60 187,10 183,00 185,80 185,80 188,80 160,00 158,00 160,00 173,00 162,60 159,20 163,00 177,40 174,60 161,80 167,60 174,60 166,00 167,00 169,00 176,60 GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 73 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Tabela 3. Valores descritivos da estatura corporal (cm) em cada idade e sexo para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto). Continuação Sexo Idades Feminino 14 15 Tipo de estudo Média DP Mínimo Máximo Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto 158,28 158,61 158,79 158,87 161,57 160,40 160,41 160,64 6,07 6,92 6,54 6,20 7,35 6,21 6,39 6,40 143,10 148,00 144,40 145,80 147,40 147,00 147,00 146,00 171,40 178,40 172,00 177,40 178,90 172,40 172,40 178,80 Sexo Masculino Sexo Feminino Figura 1. Distribuição dos valores médios de estatura, nos dois sexos, dos dados coletados de forma transversal em 2003 e 2008, longitudinal e longitudinal misto em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Tabela 4. Valores descritivos da massa corporal (kg) em cada idade e sexo para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto). Sexo Idades 10 Masculino 11 12 13 Tipo de estudo Média DP Mínimo Máximo Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto 38,71 35,47 38,62 38,82 42,56 43,28 41,97 42,97 39,27 46,15 45,48 46,31 52,27 56,49 51,77 52,31 8,46 6,83 8,54 10,13 10,42 10,59 8,61 10,64 7,89 10,16 8,45 12,04 12,97 13,20 10,11 13,47 27,30 27,80 27,30 26,50 28,60 31,30 30,30 28,10 26,70 32,50 33,50 26,70 31,20 36,60 38,10 28,10 65,30 45,00 65,30 72,70 60,40 69,50 68,10 69,50 58,60 70,00 69,00 99,50 74,50 83,00 71,00 107,00 GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 74 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Tabela 4. Valores descritivos da massa corporal (kg) em cada idade e sexo para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto). Continuação 14 15 10 11 Feminino 12 13 14 15 Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Sexo Masculino 54,87 56,90 56,74 54,38 60,60 60,90 61,94 60,53 37,10 36,10 36,30 37,31 39,22 44,91 40,15 41,02 43,33 48,84 45,62 43,97 48,10 51,27 49,08 47,92 50,68 49,75 52,09 49,76 52,01 54,71 54,98 51,88 15,98 11,61 10,20 11,31 8,16 10,57 10,24 11,75 8,92 6,50 8,15 10,10 9,26 10,22 8,88 10,69 9,98 9,14 9,78 9,17 7,54 9,54 9,03 9,38 8,27 9,76 9,23 8,89 6,22 9,57 9,66 7,88 35,30 36,90 42,30 31,80 46,40 44,00 45,90 36,30 23,90 26,10 23,90 21,10 27,30 28,70 24,70 22,00 25,60 36,30 29,50 25,60 32,70 36,60 35,00 28,20 28,50 35,50 39,00 29,00 42,50 38,60 42,20 30,50 89,50 83,20 80,00 83,90 79,00 83,90 83,90 89,70 61,90 47,20 54,00 82,00 71,90 76,90 57,80 85,00 67,40 67,90 65,40 77,20 65,00 77,60 71,30 82,50 71,50 71,80 74,00 89,50 66,20 77,90 77,90 70,30 Sexo Feminino Figura 2. Distribuição dos valores médios da massa corporal, nos dois sexos, dos dados coletados de forma transversal em 2003 e 2008, longitudinal e longitudinal misto em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 75 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Pode-se identificar na tabela 4 e figura 2 que os valores médios de massa corporal, de uma forma geral, são crescentes ao longo das idades em ambos os sexos, nos três tipos de desenhos de pesquisa. Ao ser analisadas as maiores diferenças da massa corporal entre os diferentes tipos de desenhos de pesquisa, pode-se identificar, no sexo masculino que esta se deu aos 12 anos entre o desenho transversal de 2003 em relação ao estudo longitudinal misto (7,04kg). Já no sexo feminino, a maior diferença ocorreu aos 12 anos de idade entre os dois desenhos transversais (5,68kg). Quanto às menores diferenças, essas variaram entre 0,03 e 0,30 kg no sexo masculino e entre 0,01 e 0,87 kg no sexo feminino. Tabela 5. Valores descritivos do índice de massa corporal (kg/m2) em cada idade e sexo para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto). Sexo Idades 10 11 Masculino 12 13 14 15 10 Feminino 11 12 13 Tipo de estudo Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Média 18,44 18,00 18,31 19,07 19,45 19,45 18,80 19,69 17,57 20,17 18,84 19,36 20,53 21,46 19,80 20,26 20,04 20,06 20,32 19,70 20,16 20,96 21,12 20,93 17,70 18,18 17,35 18,36 18,02 20,07 17,92 18,58 18,52 20,36 19,03 18,87 19,58 21,11 19,83 19,45 DP 3,10 2,85 3,26 3,86 3,65 3,52 3,29 3,82 2,54 4,15 2,71 3,56 3,66 3,63 3,08 3,88 4,01 2,19 2,82 3,16 1,86 2,69 2,75 2,99 3,09 3,61 2,69 3,52 3,17 4,23 2,77 3,63 3,17 3,46 3,09 3,19 2,40 3,06 2,78 3,00 GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Mínimo 14,31 13,41 14,31 13,41 15,02 15,65 15,20 13,98 14,16 16,11 15,12 14,16 14,05 16,89 16,02 14,19 14,38 16,14 16,51 15,08 17,22 17,08 17,08 15,19 12,37 15,47 12,37 11,96 14,74 14,44 13,16 12,78 13,44 14,73 13,65 12,57 14,53 16,85 14,87 12,55 Máximo 28,94 22,80 28,94 30,59 26,63 28,56 29,48 31,35 24,33 32,39 27,64 32,56 26,48 28,91 27,21 32,99 29,77 26,61 27,68 32,10 24,93 28,31 28,31 29,31 27,08 25,52 23,84 27,40 27,19 34,18 23,45 30,36 27,23 27,20 26,57 28,51 24,83 29,42 27,07 31,75 Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 76 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Tabela 5. Valores descritivos do índice de massa corporal (kg/m2) em cada idade e sexo para os três desenhos de análise (transversal, longitudinal e longitudinal misto). Continuação Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto Transversal 2003 Transversal 2008 Longitudinal Longitudinal misto 14 15 20,20 19,71 20,57 19,65 20,00 21,20 21,28 20,06 3,02 3,28 2,88 2,94 2,79 3,08 2,95 2,57 Sexo masculino 12,80 14,33 15,47 12,89 16,59 15,15 16,61 12,83 29,68 26,44 27,72 33,28 26,63 28,51 28,51 27,43 Sexo feminino Pode-se identificar, na tabela 5 e figura 3, que os valores médios do índice de massa corporal, de uma forma geral, são crescentes ao longo das idades em ambos os sexos, nos três tipos de desenhos de pesquisa. Ao ser analisadas as maiores diferenças do IMC entre os diferentes tipos de desenhos de pesquisa, pode-se identificar, no sexo masculino que esta se deu aos 12 anos entre os dois desenhos transversais (2,60 kg/m2). Já no sexo feminino, a maior diferença ocorreu aos 11 anos de idade entre o desenho transversal de 2008 e o desenho longitudinal (2,14 kg/m2). Quanto às menores diferenças, essas variaram entre 0,00 e 0,52 kg/m2 no sexo masculino e entre 0,05 e 0,17 kg/m2 no sexo feminino. 4. DISCUSSÃO A partir dos resultados pode-se identificar que não existe um padrão entre as diferenças dos desenhos de pesquisa analisados. Ou seja, quanto à estatura, as maiores diferenças ocorreram entre o desenho transversal de 2003 e o longitudinal no sexo masculino e entre os dois desenhos transversais no sexo feminino. Já na massa corporal as maiores diferenças ficaram entre o desenho transversal de 2003 e o desenho longitudinal misto no sexo masculino e entre os dois desenhos transversais no sexo feminino. E no índice de massa GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 77 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 corporal as maiores diferenças ocorreram entre os dois desenhos transversais no sexo masculino e entre o desenho transversal de 2008 e o longitudinal misto no sexo feminino. Essas diferenças podem ser explicadas pelo fato de que cada desenho utilizado (transversal, longitudinal e longitudinal misto) tem as suas peculiaridades. Para Malina e Bouchard (2002), o desenho transversal é um retrato de uma população, ou parte dela, em um determinado momento. Esse desenho pode determinar a presença ou a ausência da exposição e desfecho em cada indivíduo estudado em certo momento (GORDIS, 2004), sendo que a sua grande vantagem é a capacidade de inferência dos resultados observados para uma população definida no tempo e no espaço, o que muitas vezes não é possível em estudos que utilizam outros desenhos de pesquisa (KLEIN e BOCH, 2002). Já, o desenho longitudinal conforme Singer, Nobre e Rocha (2009), constitue um caso especial dos estudos denominados como medidas-repetidas. Esse tipo de desenho de pesquisa fornece maior precisão nas estimativas de mudanças temporais do que os estudos transversais do mesmo tamanho, devido à eliminação da variabilidade interindividual nas comparações realizadas (COOK e WARE, 1983). As principais vantagens do desenho longitudinal voltadas ao estudo do crescimento físico e desempenho motor são que, além de fornecer informações quanto ao estágio atual de um determinado atributo, também pode trazer valiosas informações referentes às mudanças nos índices e progressos que ocorrem ao longo do tempo (MALINA, BOUCHARD e BAROR, 2004). Por outro lado, o desenho longitudinal misto pode ser utilizado para cumprir em simultâneo as promessas principais dos dois outros tipos de estudos. Ou seja, permite analisar o desenvolvimento de crianças e adolescentes, principalmente quanto à transição da infância para adolescência, e até a fase adulta, em um espaço de tempo consideravelmente mais curto, o que permite que esse desenho seja conhecido também como um modelo de estudos acelerados (KEMPER, 1988; TWISK e KEMPER, 1995; KEMPER et al., 1997; VAN MECHELEN e MELLEMBERGH, 1997; MAIA e LOPES, 2003). Frente aos resultados, surpreendeu o fato de, em uma determinada idade e sexo, as maiores diferenças ocorrerem entre o estudo longitudinal e o longitudinal misto. Isso ocorreu para o sexo masculino na estatura (2,07cm) e IMC (0,89 kg/m2) aos 11 anos, aos 15 anos para a massa corporal (1,41kg) e aos 14 anos para o IMC (0,62 kg/m 2). Já no sexo feminino, as maiores diferenças entre o estudo longitudinal e longitudinal misto ocorreram na massa corporal (3,10kg) aos 15 anos e no IMC aos 10 (1,01 kg/m2) e 14 (0,92 kg/m2) anos de idade. Essas diferenças não eram esperadas tendo em vista que o desenho longitudinal misto por ser uma combinação do desenho longitudinal com o transversal tem por finalidade descrever e interpretar a verdadeira mudança, bem como aspectos preditivos das diferenças entre os GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 78 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 sujeitos (MAIA e LOPES, 2003). Ou seja, esse método é considerado o meio do caminho entre os estudos transversais e os longitudinais, do qual se esperava resultados semelhantes ao que foi identificado no desenho longitudinal. Entretanto, se forem observados o comportamento dos valores médios nos três desenhos de pesquisa, identifica-se que as curvas representantes do desenho longitudinal e do desenho longitudinal misto são as mais semelhantes, enquanto que as curvas representantes dos desenhos transversais (2003 e 2008) são as que apresentam maiores oscilações. As oscilações identificadas podem ter ocorrido devido a uma maior variabilidade interindividual presentes nos estudos transversais. Como citado anteriormente, os estudos longitudinais eliminam a variabilidade interindividual (COOK e WARE, 1983), desta forma o valor do desvio-padrão no desenho longitudinal deveria apresentar menores valores quando comparado com os demais desenhos de pesquisa, entretanto, isso não ficou muito evidente no presente estudo. Quanto à estatura, em nenhum momento o desvio-padrão do estudo longitudinal apresentou menor valor em relação aos estudos transversais e longitudinal misto. Na massa corporal, menor valor de desvio-padrão foi identificado aos 11 anos nos dois sexos e aos 13 e 14 anos no sexo masculino. No IMC, o valor do desvio-padrão do estudo longitudinal foi menor do que nos outros estudos aos 11 e 13 anos do sexo masculino e aos 10, 11, 12 e 14 anos no sexo feminino. Outro fato que chama a atenção nos resultados do presente estudo é a grande variação apresentada pelas três variáveis analisadas entre os desenhos transversais de 2003 e 2008. Ou seja, ao descrever essa população com um intervalo de 5 anos de diferença, é possível verificar um aumento nas médias de estatura (4,37cm no sexo masculino e 2,63cm no sexo feminino), massa corporal (5,66kg no sexo masculino e 4,94kg no sexo feminino) e IMC (1,05kg/m2 no sexo masculino e 1,46kg/m2 no sexo feminino). Todavia, essas diferenças não são possíveis de ser observadas nos outros dois tipos de desenhos (longitudinal e longitudinal misto). Esses resultados reforçam as características de cada desenho de pesquisa, onde conforme Matton et al. (2007), desenhos longitudinais são fundamentais quando se pretende responder a perguntas em relação à consistência das características individuais no decurso do tempo, ou sobre os efeitos, em longo prazo, de alguma experiência; enquanto que os desenhos transversais, como já citado anteriormente, apresentam um retrato de uma população, ou parte dela, num determinado momento (MALINA e BOUCHARD, 2002). Ainda é possível identificar que as maiores diferenças se concentraram entre os 10 e os 12 anos de idade. Pode-se sugerir que essas diferenças tenham ocorrido devido às intensas mudanças das características somáticas ocorridas nesse período etário conhecido como salto GARLIPP et al. Crescimento somático e IMC em escolares dos 10 aos 15 anos de idade. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 79 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 pubertário (BERGMANN et al, 2007). Para Siervogel et al. (2003) a informação da ocorrência ou não do salto pubertário auxilia na avaliação do estado nutricional e conseqüentemente na avaliação das modificações antropométricas e da composição corporal. CONCLUSÕES No presente estudo não foi identificado um padrão de desenvolvimento das curvas médias de estatura, massa corporal e IMC entre os três tipos de desenhos de pesquisa. Todavia, foi identificada uma semelhança no desenvolvimento das curvas, nas três variáveis analisadas, nos dois sexos, entre os desenhos de pesquisa longitudinal e longitudinal misto. Ainda observaram-se aumentos médios nas médias de estatura, massa corporal e IMC entre os anos de 2003 e 2008, quando analisadas as curvas provenientes dos desenhos transversais. Frente ao exposto, sugere-se que a utilização de um ou outro desenho de pesquisa para a investigação das alterações nas variáveis somáticas ao longo do tempo, seja acompanhada de um profundo entendimento das limitações e vantagens de cada modelo. Ainda, não se aconselha comparações de resultados provenientes dos diferentes desenhos de pesquisa. REFERÊNCIAS ADAK, D.K.; TIWARI, M.K.; RANDHAWA, M.; BHARATI, S.; BHARATI, P. Pattern of Adolescent Growth Among the Brahmin Girls – Rural-Urban Variation. Collegium Antropologicum, v. 26, n. 2, p. 501-507, 2002. AMIRHAKIMI, G.H. A longitudinal growth study from birth to maturity for weight, height and head circumference of normal Iranian children compared with western norms: a standard for growth of Iranian children. Iranian Journal of Medical Sciences, v. 28, n. 1, 2003. BAHLLA, A.K. Growth attainments of well-off Chandigarh children: a Mixed Longitudinal Study. International Journal of Anthropology, v. 18, n. 3, p. 113-125, 2003. 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Algumas pesquisas indicam um aumento do uso de drogas entre o público adolescente, e apontam a questão grupal como um dos fatores de risco para o consumo inicial. Percebendo a importância de psicoeducar esses adolescentes sobre os riscos do uso de drogas, elaboramos um cronograma de atividades, baseado em conceitos da teoria cognitivo-comportamental breve. A intenção é que ele possa ser utilizado em escolas, promovendo o vínculo e orientando sobre os danos causados pelo uso de drogas, a partir do uso de uma linguagem que aproxime e facilite a discussão. Palavras-chave: Dependência de drogas. Comorbidades psiquiátricas. Adolescentes e drogas. Revista Ciência e Conhecimento Volume 9 – Nº1 – 2015. 1 – Escola Estadual Dolores Alcaraz Caldas – ESAE. Porto Alegre, RS, Brasil. 2 – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/São Jerônimo. Curso de Psicologia. São Jerônimo, RS, Brasil. ABSTRACT - The use of psychoactive substances has long been occupying the spaces of vulnerability in the face of changes that occur in human life. Some research indicates an increase in drug use among the teen audience and highlighting the issue as a group of risk factors for early consumption. Realizing the importance of psychoeducate these teenagers about the risks of drug use, we developed a schedule of activities, based on concepts of brief cognitive- behavioral theory. The intention is that it can be used in schools, promoting the bond and directing the damage caused by drug use, from using a language that approaches and facilitate the discussion. Keywords: Drug dependence. Psychiatric comorbidities. Teens and drugs. Dados para correspondência Erica I. D. Andrade Rua: Coronel Corte Real, nº 620. CEP: 90630080 Bairro: Petrópolis. Compl.: 202 Cidade: Porto Alegre/RS/Brasil E-mail: [email protected] Recebido em: 09/02/2015. Revisado em: 26/03/2015. Aceito em: 20/04/2015. Área: Atenção à saúde e bem-estar. 84 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 INTRODUÇÃO Este estudo está embasado em um trabalho de psicoeducação desenvolvido em uma escola pública, situada em uma região carbonífera do Estado do Rio Grande do Sul, onde a direção escolar solicitou ajuda da equipe de psicologia da ULBRA São Jerônimo para auxiliar no assunto relativo à prevenção de drogas junto aos adolescentes do ensino médio. Para tanto, demos início a uma pesquisa qualitativa (GIL, 2002), com a finalidade de aprofundar os conhecimentos sobre a adolescência e, por ser um momento de mudanças na vida do indivíduo onde é difícil seguir as orientações provenientes da família ou de terceiros. As drogas, presentes na história do ser humano há muito tempo, podem ocupar esse espaço de vulnerabilidade, que ocorre em algumas mudanças e trazer grandes prejuízos ao desenvolvimento dos jovens (MARQUES e CRUZ, 2000; RAMOS e PENSO, 2013). A relevância verificada no tema nos levou à elaboração deste estudo, permitindo-nos realizar uma pesquisa bibliográfica mais aprofundada (GIL, 2002) com relação ao uso e não uso de substâncias psicoativas (SPA), bem como, ao uso com finalidade de permitir a desinibição e entrada do adolescente em grupos. A escolha da adolescencia, como objeto de aplicação da presente pesquisa, se deu em razão de ser uma etapa de fortes mudanças no desenvolvimento do ser humano (ZANELATTO e LARANJEIRA, 2013). Nela, o adolescente está deixando o ensino fundamental (visto por ele como lugar de crianças/infantil), para ingressar no ensino médio (mais juvenil). Também, é a etapa em que começa a perceber mais fortemente as mudanças corporais, onde ocorrem os namoros, obtém o primeiro emprego, ingressa em novos grupos e o surge o medo da proximidade do futuro e de assumir as responsabilidades que começam a aparecer em suas vidas (KESSLER, 2005). 2. USO DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS NA ADOLESCÊNCIA Até o ano passado, o DSM-IV-TR™ (2002) incluía, nos transtornos de substâncias, desde drogas de abuso até efeitos colaterais de medicamentos e exposição a toxinas. No entanto, o novo e atual DSM V (2014, p. 481) modificou essa definição, passando a considerá-los como “transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos”, contando com 10 substâncias descritas no manual. De acordo com o novo manual, “todas as drogas que são consumidas em excesso têm em comum a ativação direta do sistema de recompensa do cérebro [...]” (DSM V, p. 481). Assim sendo, a dependência química pode ser entendida como a necessidade crescente do uso da substância, incluindo a tolerância e a abstinência, ou um padrão compulsivo de uso; ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 85 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 ou seja, não há controle quanto ao uso, pelo período mínimo de um ano. A tal quadro deve ser acrescentado algum tipo de prejuízo ou, então, problemas psicossociais e ambientais, como problemas familiares, profissionais, educacionais, entre outros. As pesquisas apontam um aumento no número de adolescentes envolvidos com álcool e outras drogas, e a questão grupal como fator de risco para o início do uso (RAMOS e PENSO, 2013). Ainda, temos a afirmação, feita pela doutrina, no sentido de que o uso de drogas psicoativas está associado a um maior número de comorbidades psiquiátricas (HESS et al., 2012; SILVA et al., 2009; DIEHL, et al., 2010). Assim, podem ocorrer alucinações auditivas e visuais, delírios persecutórios semelhantes aos quadros psicóticos dos transtornos de humor bipolar e esquizofrenia. Dito de outro modo, as drogas psicoativas podem ocultar os sintomas de algum outro problema, pois muitos indivíduos apresentam comportamentos característicos a alguns transtornos. Não raro, vemos que pessoas em uso constante de drogas elevam as chances de surgimento de outras doenças e podem apresentar comportamentos de risco em decorrência de alucinações e delírios, os quais podem ser explicados também pelo uso (intoxicação) da droga ou pelo advento de alguma outra comorbidade – como no caso da esquizofrenia – sendo, comumente, internados por apresentarem quadro de surto psicótico. Em razão disso, é necessário que, ao se fazer o processo de avaliação, tenha-se maior cuidado para não considerar um sintoma ou reclamação como algo isolado e não correlacionado. Logo, deve-se avaliar, de forma integrada, o consumo de substâncias e os transtornos psiquiátricos que podem estar associados (CORDEIRO e DIEHL, 2011; COSTA e VALÉRIO, 2008). Feita essa observação, é possível dizer que os transtornos mentais podem ser diagnosticados antes do uso/abuso de uma substância ou ser encontrados de modo simultâneo quando da identificação de um quadro de dependência química, ou, ainda, ser decorrentes da utilização de substâncias psicoativas. Segundo Cordeiro e Diehl (2011, p. 107-108), as comorbidades podem ter origem em diversos fatores. Um deles diz respeito à “origem genética”, como nos casos em que mulheres grávidas usam substâncias psicoativas; ou, os transtornos podem ser independentes, mas se retroalimentarem, como no caso do uso de álcool, que gera ansiedade e leva a mais uso de álcool. Ainda, segundo os autores citados, o sofrimento causado por um distúrbio mental pode levar o indivíduo a fazer uso de substâncias psicoativas com a finalidade de diminuir esse desconforto, como pessoas em “quadros depressivos podem relatar diminuição do desanimo, de baixa autoestima e de insônia quando consomem bebidas alcoólicas”. Por fim, temos o ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 86 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 inverso, ou seja, o uso de substância psicoativa como fator desencadeante para uma outra doença, como depressão ou sintomas psicóticos, comuns em diversos transtornos (CORDEIRO e DIEHL, 2011, p. 107-108). As pesquisas nos mostram que existe um grande número de transtornos mentais associados à dependência química (COSTA e VALÉRIO, 2008; SILVA, et al., 2009; PORTUGAL et al., 2010; SWENDSEN et al., 2010; CORDEIRO e DIEHL, 2011;). As mais comuns dizem respeito aos transtornos depressivos e de personalidade (CHAMPMAM e CELLUCCI, 2007; PORTUGAL et al., 2010; CABALLO 2011; LIANG et al., 2011; HESS et al., 2012), fobia social (PAIVA et al., 2008), esquizofrenia (CORDEIRO e DIEHL, 2011), transtornos do espectro bipolar e alimentar (ELBREDER et al., 2008), transtornos de déficit de atenção e hiperatividade e transtorno de conduta (BIEDERMAN et al., 2006; COSTA e VALÉRIO 2008; OHLMEIER et al., 2008). A esquizofrenia, segundo o DSM V (2014, p.100), “envolve uma gama de disfunções cognitivas, comportamentais e emocionais”, síntomas que estão “associados a um funcionamento profissional ou social prejudicado”. Os itens que compõem o quadro da esquizofrenia “costumam surgir no final da adolescência” (DSM-V, 2014, p. 102) e podem ser desencadeados pelo abuso de substâncias. O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, que é outro quadro que aparece com frequência em usuários de drogas, leva a um baixo rendimento escolar e, por consequência, a uma piora na qualidade de aprendizagem do adolescente. Os adolescentes podem apresentar comportamentos hiperativos, desatentos, impulsivos, agressividade, dificuldade de realizar tarefas que exijam desempenho neurocognitivo mais elevado, assim como, problemas sociais e falta de motivação (DIEHL et al., 2010). O indivíduo com quadro de comorbidade psiquiátrica frequentemente apresenta comportamento mais agressivo, geralmente, decorrente de transtornos de conduta ou antissocial que fazem parte do diagnóstico (ANDRADE et al., 2004), bem como, um maior número de recaídas e comportamento parassuicida ou tentativas de suicídio exitosas (HESS et al., 2012; (ARCOVERDE e SOARES, 2012). Por outro lado, o paciente que exibe um quadro de transtorno mental grave associado – como no caso dos transtornos do espectro “bipolar e na esquizofrenia”, e fizer uso de qualquer quantidade de droga psicoativa – pode ter uma piora do quadro atual e do prognóstico do transtorno (CORDEIRO e DIEL, 2011, p. 107). Comumente, adolescentes e adultos usuários de substâncias psicoativas não se submetem a avaliações e exames clínicos frequentes, tornando difícil e tardio o diagnóstico de uma comorbidade (SILVA et al., 2009). Portanto, além das condições médicas gerais do ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 87 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 indivíduo, é de suma importância que seja feito um bom levantamento de quando começou o uso, o tempo de dependência, a quantidade e os tipos de substâncias que a pessoa usa/usou, e quais prejuízos cognitivos e comportamentais podem ser identificados. De posse dessas informações, será possível identificar com segurança se existe alguma comorbidade associada e, posteriormente, traçar um prognóstico e desenvolver um plano de tratamento que o paciente consiga aderir (VALÉRIO, 2008 e HESS et al., 2012). 2.1 Psicoeducação Baseando-nos na piora dos quadros onde estão associados transtorno de uso de substâncias e outro transtorno psiquiátrico, sustentamos ser a psicoeducação um dos caminhos para que se possa orientar o adolescente sobre os riscos e danos e, ainda, tentar engajá-lo na busca de tratamento. Dentro da psicologia, a teoria cognitivo-comportamental (BECK, 2007) faz uso da psicoeducação como um importante instrumento de engajamento do sujeito no processo psicoterápico e medicamentoso, muitas vezes, utilizando-se de algumas técnicas, como o questionamento socrático, checagem de evidências, entre outras, para fazer com que a pessoa compreenda as informações que estão sendo fornecidas. Baseando-se em um “modelo médico biopsicossocial”, a teoria cognitivo-comportamental (psicoeducação) fornece ao indivíduo “conhecimentos teóricos e práticos sobre o seu problema”, e objetiva “familiarizar o paciente ao modelo cognitivo e ao funcionamento do tratamento aditivo” (FREIRE, 2011, p. 393). De acordo com essa teoria, os indivíduos com transtornos psiquiátricos têm pensamentos disfuncionais, distorcem situações reais e têm pouca ou nenhuma flexibilidade cognitiva, o que leva a emoções negativas e desadaptação à realidade, e a uma percepção de que todas as pessoas não os compreendem e querem prejudicá-los (COSTA e VALÉRIO, 2008). Em razão disso, a teoria cognitivo-comportamental objetiva auxiliar esses indivíduos a aprenderem novas formas comportamentais mais flexíveis para lidarem com as situações do ambiente (COSTA e VALÉRIO, 2008). A técnica da psicoeducação quer ensinar e apropriar o indivíduo da sua doença, proporcionando a ele, desde o início do tratamento, informações sobre os efeitos e resultados do seu diagnóstico (FIGUEIREDO, 2009). É uma técnica com uma duração determinada, que segue um roteiro de acordo com o momento atual, e tem, como objetivo, ensinar o sujeito, através de diversos meios (folhetos explicativos, imagens, entre outros), sobre como opera o seu transtorno e como e porque o seu comportamento desorganizado lhe provoca angústia (FIGUEIREDO, 2009). ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 88 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 A pessoa deve entender as informações teórico-práticas da sua doença (COLOM e VIETA, 2004, p. 48). Por isso, devemos fornecer ao indivíduo informações suficientes sobre os sintomas daquela doença, sobre a estrutura psíquica de cada pessoa em interação com o ambiente, e as consequências que alguns medicamentos provocam no organismo (COLOM, VIETA, 2004). Aos poucos, a pessoa passa a compreender que, por exemplo, na dependência química, existe a fissura e seus sinais, que são a irritação, alteração do humor, sudorese e taquicardia. Tendo aprendido a lidar conscientemente e identificar esses sintomas, o indivíduo pode se alertar quando está indo em direção à recaída (FREIRE, 2011). Esta informação lhe dá a oportunidade de procurar ajuda antes que reincida no uso/abuso. As especificidades que o sujeito adquire sobre determinado transtorno que o acomete fazem com que ele aprenda a conhecer-se. Além disso, ajuda a fortificar a aliança com o psicoeducador, pois o paciente não se sentirá manipulado ou enganado com o tratamento. Logo, tem-se um tratamento embasado no empirismo colaborativo, onde há uma adesão maior do indivíduo e, por conseguinte, resultados mais positivos. Alguns transtornos mentais, como os depressivos ou as fases maníacas dos transtornos de humor, interferem negativamente na capacidade e interesse em aprender (BIEDERMAN et al., 2006), pois há uma tendência à autodestruição e uma falta de atenção involuntária (COLOM e VIETA, 2004). Como o indivíduo não consegue entender e reter as informações, elas parecem ser ilusórias e que não vão ajudá-lo a superar a doença. Contudo, para algumas pessoas com comorbidades psiquiátricas associadas com a dependência química, a psicoeducação, é uma prática aplicada e eficaz de intervenção clínica (HODGINS e PEDEN, 2008; FORMIGA et al., 2012). Podemos ver que, para a esquizofrenia, Un programa psicoeducativo, en el que se incluían módulos sobre medicación, conocimiento de la enfermedad y otras actividades psicoeducativas, se obtiene que la adherencia al tratamiento farmacológico se incremente en aproximadamente 30%, los pacientes al estar mejor informados aumentan su conciencia de la enfermedad y son más capaces de hacerse responsables de tomar la medicación, su calidad de vida mejora al tener menos recaídas y/o reingresos hospitalario (RIVERA, 2011, p.74). É importante que a família também passe pela psicoeducação, pois é ela que, muitas vezes, será responsável pelo tratamento, sendo necessário que sejam elucidados os mitos e crenças populares que cercam as comorbidades e a dependência química (ALMEIDA e MONTEIRO, 2011). É preciso que o transtorno de uso de substâncias seja entendido como uma doença que afeta o sistema de recompensa e prazer do cérebro, e não uma falta de motivação para melhorar ou deixar o uso, ou algo que provoca alívio da ansiedade e deixa a pessoa mais tranquila (LARANJEIRA et al., 2000; COSTA e VALÉRIO, 2008). ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 89 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 A família precisa entender como os transtornos podem estar relacionados e qual o seu papel no tratamento. Por isso, o objetivo de psicoeducar a família reside em promover uma mudança na forma como ela entende e age em relação ao indivíduo que apresenta um quadro de dependência e um transtorno mental associado (LARANJEIRA et al., 2000). 2.2 Psicoeducaçã em grupo Ainda há pouco material literário que trata da psicoeducação sob o enfoque da dependência química e comorbidades correlatas (COSTA e VALÉRIO, 2008). Os estudos apontam para a psicoeducação de um transtorno específico, mas a realidade das clínicas demonstra que, dificilmente, um transtorno aparece individualizado. O que vemos é que os grupos para dependentes de substâncias se utilizam da técnica educativa como ferramenta de impulso ao tratamento. Todavia, é importante observar que, quando a comorbidade – que acomete algum dos membros do grupo – for incapacitante (como nos casos de esquizofrenia), essa pessoa não deve participar dos grupos de dependência química, pois o comportamento psiquiátrico de um integrante pode comprometer a comunicação e a participação significativa de todo o grupo (WASHTON e ZWEBEN, 2009). Será, desta forma, necessária a existência de grupos específicos para esses pacientes, pois a abordagem dos temas se dá de forma mais acolhedora e pausada, sendo repetida inúmeras vezes ao longo do tratamento, até que alguns pontos fiquem completamente entendidos, e comecem a gerar resultado no tratamento clínico. Ao realizar seminários de psicoeducação sobre determinado tema – que vise clarear aos indivíduos os mitos e verdades sobre a dependência química, o psicoeducador pode se valer de algumas estratégias para fazer com que eles consigam absorver mais informações dentro daquele grupo. A participação dos integrantes do grupo é estimulada através de técnicas dirigidas e semiestruturadas, que ajudam pessoa a pensar sobre o que está sendo tratado. Na prática com adolescentes, é comum serem usados recursos educacionais alternativos, como vídeos e sites de internet, que o estimulam a pesquisar sozinho e, com isso, auxiliar na formação do seu conhecimento sobre aquele tema (WRIGHT et al., 2012). No grupo de psicoeducação, procura-se, através das técnicas de registro de pensamentos disfuncionais e automonitoramento, fazer o sujeito “reconhecer os estímulos que despertam fissura e entender os fatores que influenciam o comportamento aditivo. Deve-se fazer um mapeamento de situações, companhias, hábitos e lugares que estão condicionados ao uso de SPA” (FREIRE, 2011). Uma vez identificadas as situações pelo registro dos pensamentos, utiliza-se o automonitoramento desses estados que provocam o estresse e ansiedade. ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 90 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Durante a psicoeducação, é comum a pessoa trazer exemplos pessoais, situações experienciadas que servem de paradigma para a futura tomada de decisões em relação a usar ou resistir. Trabalhando estas questões levantadas, é possível “reconhecer as distorções e evidenciar as diferenças entre os pensamentos funcionais e disfuncionais, o coordenador trabalha a reestruturação cognitiva, promovendo o confronto com a realidade” (FREIRE, 2011, p. 394). Assim, através da reestruturação cognitiva, o “terapeuta formula hipóteses que relacionam os pensamentos disfuncionais às crenças e testa com o sujeito a validade dessas hipóteses de forma objetiva e sistemática” (FREIRE, 2011). Na psicoeducação, o coordenador mostra estratégias de enfrentamento e algumas formas de como a pessoa pode treinar as habilidades que possui no momento do craving. O objetivo desse tipo de educação “é evitar o aumento da fissura com medidas comportamentais” (FREIRE, 2011, p. 396). Ao ensinar para o indivíduo que a dependência química é uma doença que necessita tratamento, que ele necessita de pessoas para ajudá-lo e que existem técnicas que podem auxiliá-lo a evitar o comportamento de fissura, percebe-se que ele se motiva muito mais para o tratamento. O indivíduo entende que há formas de fazer prevenção à recaída, e que é importante formar uma rede de apoio que possa ajudá-lo nas etapas difíceis da abstinência. Desta forma, o indivíduo percebe que é preciso fazer um “resgate de atividades saudáveis que promovem satisfação pessoal, convivência com pessoas que não usam drogas e proximidade afetiva com familiares e pares” (FREIRE, 2011). Quando falamos de rede de apoio, referimo-nos não só à família, mas também a amigos e reuniões de usuários anônimos. Segundo Marinho et al. (2011), “a rede pode complementar a terapia individual ou em grupo e as reuniões de AA”, sendo “criada para executar uma tarefa simples: ajudar o terapeuta a manter a abstinência do paciente. A abordagem deve envolver membros da família e intervenções de cuidados totalmente planejados”. 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 3.1 Cronograma breve de psicoeducação A terapia cognitivo-comportamental breve segue alguns itens que consideramos importantes incorporar ao trabalho, quando da elaboração de um programa de educação sobre drogas para adolescentes (ARAÚJO et al., 2011). Os encontros de psicoeducação, baseados na teoria cognitivo-comportamental breve (ANDRETTA e OLIVEIRA, 2010), devem ter, como característica principal, o “empirismo colaborativo”, o que significa criar e fortalecer o vínculo com o grupo, reforçando-o a cada ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 91 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 encontro. O programa deve ter uma estrutura que atenda ao “tempo disponível”, e “ritmar as sessões de maneira eficaz e dar e receber feedback sobre o andamento do processo” (WRIGHT et al., 2012, p. 20 e 21). Como os adolescentes precisam se sentir à vontade para expressarem suas opiniões e perguntas, pautamos a atividade psicoeducativa em grupos de discussão sobre: a) os diversos tipos de substâncias psicoativas; b) dinâmicas sobre as drogas e suas consequências psicológicas, sociais e orgânicas; e c) dinâmicas e vídeos sobre as drogas com pessoas conhecidas publicamente. Com base no que foi exposto neste trabalho, formulamos um cronograma de atividades psicoeducativas para adolescentes com 10 encontros, sendo que os primeiros quatro estão embasados no que nos ensina Ramos (2013) sobre os adolescentes e as drogas. 1º encontro: apresentação e integração com o grupo. Dinâmica: promover a integração lúdica entre os adolescentes. Procedimento: cada adolescente apresenta aquele que está à sua esquerda, e diz como ele vê aquela pessoa. Objetivo: promover o contrato de trabalho: presença de todos, respeito ao outro e ao local, não usar o celular, outras regras que os adolescentes queiram colocar no papel; bem como, explicar sobre o que trata o projeto, e de que forma será realizado. 2º encontro: substâncias psicoativas. Dinâmica: pedir para cada adolescente escrever, individualmente em uma cabine (caixa de papel), o nome da droga que (se for o caso) tenha usado ou use. Objetivo: debater sobre as drogas que eles mencionaram: dúvidas, problemas relacionados, etc.; conhecer e trabalhar a relação que os adolescentes têm com as drogas. 3º encontro: como se proteger das drogas. Dinâmica: pedir que cada adolescente debata sobre as situações de risco que envolvem as drogas e como podem se proteger do uso. Objetivo: visa discutir o contexto dessas situações, e de que outra forma se pode evitar um risco e se sentir protegido. 4º encontro: projetos para o futuro. ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 92 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Dinâmica: debate sobre aspirações e possibilidades futuras baseadas nos conteúdos que são estudados na escola. Objetivo: incentivar, nos adolescentes, possibilidades de realizarem seus desejos e projetos de forma saudável. 5º encontro: levantamento das drogas e questões que serão abordadas nos demais encontros. Dinâmica: debater em grupo, com base nas drogas mencionadas no segundo encontro, sobre quais drogas estão mais presentes, e quais as questões gostariam que fossem abordadas nos demais encontros através de vídeos psicoeducativos. Os vídeos usados devem conter a legislação sobre as drogas ilícitas e depoimentos, como, por exemplo, de pessoas conhecidas da mídia e do público jovem, especialistas da área de dependência química. 6º encontro: vídeos sobre o álcool e nicotina, efeitos psicológicos e físicos; questões sociais e criminais; 7º encontro: vídeos sobre a maconha, efeitos psicológicos e físicos; questões sociais e criminais; 8º encontro: vídeos sobre a cocaína, o crack e as anfetaminas, efeitos psicológicos e físicos; questões sociais e criminais; 9º encontro: pesquisa do aproveitamento dos projetos desenvolvidos. Dinâmica: uso da técnica de balança decisória. Cada adolescente deverá dividir uma folha branca com um risco ao meio. De forma anônima, em um dos lados da linha escreverá quais as vantagens no uso das drogas, ao passo que, do outro lado da linha, escreverá quais as desvantagens no uso das drogas, tudo isso de acordo com os pontos discutidos durante o trabalho. Após, recolhe-se as folhas e se faz uma roda para discutir as vantagens e desvantagens levantadas pelo grupo. A técnica da balança decisória é utilizada para avaliar as “vantagens e desvantagens que a pessoa faz para si mesma” (BARLETTA, 2010, p. 313), em relação às informações que lhe foram oferecidas. A “visualização estruturada das vantagens e desvantagens de usar ou não usar” drogas “contrasta os argumentos relacionados aos fatores de exposição e de proteção do consumo” (ZANELATTO e LARANJEIRA, 2013, p. 360). Com isso, os adolescentes podem ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 93 avaliar, de acordo com a sua própria experiência, os benefícios ou não do uso de substâncias psicoativas. 3.2 Metodologia Trata-se de um projeto de qualitativa, com objetivo exploratório, seguindo procedimentos técnicos bibliográficos e documentais (GIL, 2002), pois buscamos conhecer mais o assunto. Para tanto, realizamos pesquisa nas bases de dados SciELO, BVS-Psi, base de dados da Biblioteca da PUC/RS e Journal Addiction, no período de 2000 - 2014, sendo utilizados os seguintes descritores: dependência de drogas (drug dependence); comorbidades psiquiátricas (psychiatric comorbidities); adolescentes e drogas (teens and drugs) e transtorno de substâncias (disorder substances). Após essa etapa de coleta bibliográfica, pudemos formular os objetivos do trabalho que, de forma geral, são: a) levar informação qualificada aos adolescentes e, mais especificamente, esclarecê-los sobre os efeitos das drogas no organismo; b) mostrar ferramentas para identificar e prevenir o uso e o consumo de substâncias psicoativas; c) instruí-los sobre formas de dizer não ao uso de drogas, e também de cessar o uso, trabalhando e discutindo questões sobre a influência de amigos e grupos; d) informá-los quanto aos riscos e comorbidades associados ao uso de substâncias psicoativas; e, por fim, e) integrar essas metas com os conteúdos acadêmicos discutidos na escola. 4. DISCUSSÃO A literatura vem demonstrando que o uso de substâncias psicoativas que alteram o estado de consciência faz parte da experiência humana por milênios, e que, nos últimos anos, há aumento no consumo dessas substâncias. Partindo desta premissa, estamos nos deparando com um novo fator, qual seja, o início cada vez mais precoce do uso dessas substâncias que alteram os sentidos (In: SILVA, MICHELI, et al. 2006). Pesquisas recentes apontam uma elevada prevalência, entre os adolescentes, de substâncias como álcool, tabaco, solventes, maconha, ansiolíticos, anfetaminas e cocaína (MONTEIRO et al., 2012). Também assinalam que os alunos do ensino médio, com faixa etária entre 14 e 16 anos, estão entre os números mais altos de consumo de drogas (MONTEIRO et al., 2012). Nesta faixa etária apontada pelas pesquisas, podemos ver que há uma grande influência dos grupos de convivência, e que a necessidade de pertencimento e entrosamento são fatores que contribuem de forma a facilitar a entrada no mundo das drogas. A fase de grupos é ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 94 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 determinada como de maior socialização e de aprendizagem das regras sociais, que, devido ao envolvimento com as drogas, pode ficar prejudicada e trazer prejuízos sociais e judiciais ao jovem. Ainda, quanto mais cedo se dá o início do consumo de substâncias psicoativas, mais grave será o quadro de dependência e de danos ao organismo (SILVA et al., 2006; MOURA et al., 2009; MONTEIRO et al., 2012;). Além da influência do grupo, outros fatores – como amigos que usam ou toleram que o outro use alguma substância, e um dos mais importantes, que é a presença de conflitos familiares (SILVA et al., 2006) – são incentivadores e facilitadores do primeiro uso. No que tange aos conflitos familiares, vemos que, quando existem desentendimentos, existe pouco diálogo ou um diálogo empobrecido, sem espaço para perguntas e dúvidas comuns na fase de mudanças que é a adolescência. As famílias, os educadores e profissionais da área de dependência química têm demonstrado uma grande preocupação (SILVA et al., 2006), mas não têm conhecimento ou recursos suficientes para trabalhar o problema de forma efetiva. No caso dos pais e educadores, muitas vezes, há uma “supervalorização dos perigos oferecidos pelas drogas ilícitas e minimização dos problemas decorrentes do uso de drogas lícitas” (SILVA et al., 2006). Ainda, algumas famílias preferem que seus filhos façam o uso de álcool em casa, com a ilusão de que, dessa forma, terão mais controle do uso, e poderão ensinar o filho(a) a beber de forma correta. Entretanto, estes pais esquecem que estão cometendo um crime ao fornecerem álcool para menores, pois a legislação vigente proíbe o fornecimento de bebidas alcoólicas a esse público. Em outras palavras, para os menores de 18 anos, o álcool é considerado uma droga ilícita, e, se um adulto lhe fornece essa droga, está cometendo um crime (BRASIL. Lei nº 8.069/90, art. 243). Não existe um consenso sobre qual seria a forma mais correta de abordar questões de prevenção e tratamento para o público adolescente. No entanto, um programa de prevenção ao uso de drogas, para ter maior eficácia, deve estar baseado em modelos que já tenham sido usados e que tenham apresentando um bom resultado. No caso, a psicoeducação tem se mostrado um modo simples de se trabalhar os assuntos mais delicados, fazendo com que a própria pessoa reflita sobre questões complexas. Por isso, entendemos que, para abordar questão das drogas junto ao público adolescente, temos que conseguir formar um bom vínculo e, ao mesmo tempo, trabalhar as questões complexas trazidas de forma educativa e simples, em ações concretas e que realmente busquem resultados efetivos. ANDRADE e KESSLER. Da necessidade de psicoeducação em prevenção às drogas. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 95 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 CONSIDERAÇÕES FINAIS É importante que sejam criados outros mecanismos de prevenção primária, que busquem abranger os jovens dentro das escolas, proporcionando, naquele espaço, um ambiente de elucidação de dúvidas sem preconceitos. Mais que isso, é preciso unir esforços de diversas áreas, para que sejam desenvolvidos mais estudos que permitam reduzir os índices do quadro de dependência química que assola o país atualmente. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Priscila Previato, MONTEIRO, Maria de Fátima Neuropsicologia e Dependência Química. In: DIEHL, Alessandra; LARANJEIRA, Ronaldo; CORDEIRO, Daniel Cruz. Dependência Química: prevenção, tratamento e políticas públicas. Porto Alegre: Artmed, 2011, p. 98 -105. ANDRADE, R.C.; SILVA, V.A.; ASSMPÇÃO JR., F.B. Preliminary data on the prevalence of psychiatric disorders in Brazilian male anda female juvenile delinquentes. 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Este estudo foi empreendido para possibilitar uma análise das críticas apresentadas por Von Krogh, Ichijo, Nonaka (2001) e Behr, Nascimento (2008), que consideram que a Gestão do Conhecimento está envolvida em uma série de questões práticas e conceituais que podem impossibilitar a implantação com sucesso desse paradigma. Os procedimentos adotados foram a pesquisa qualitativa, explicativa e bibliográfica. Como resultados, ao se buscar uma relação com as críticas feitas tem-se que: se o modelo de gestão do conhecimento que suporta a prática da organização é fundamentado na concepção subjetiva do conhecimento, será imprescindível a participação das pessoas na criação do conhecimento organizacional. Nesse entendimento, se existe um momento em que um ativo que gera riqueza para uma organização está incorporado nas pessoas – o conhecimento – esse momento é agora. Portanto, é preciso promover a emancipação dos homens na organização, de maneira que o seu potencial criativo possa ser liberado para gerar a inovação que vai permitir que a organização permanentemente se reconfigure de maneira estratégica. Por emancipação entende-se todas as formas de gestão que se baseiam em uma nova racionalidade, especialmente naquela denominada substantiva. Se as organizações querem fundamentar-se em modelos de GC que tenham as características propostas por Nonaka e Takeuchi, elas precisam entender o potencial que essa emancipação pode significar e cultivar uma nova cultura organizacional fundamentada nas pessoas. Palavras-chave: Gestão do Conhecimento. Epistemologia. Criação do Conhecimento Organizacional. ABSTRACT - This paper presents an epistemological analysis of the creation of the theory of organizational knowledge of Nonaka and Takeuchi (2008), seeking to deepen the bases underlying the proposed design. This study was undertaken to permit an analysis of the criticisms made by Von Krogh, Ichijo, Nonaka (2001) and Behr, born (2008), believe that knowledge management is involved in a number of practical and conceptual traps and so if makes an awkward and not reform paradigm for organizations. For this purpose, the procedures used were qualitative, explicative and literature. As a result, when seeking a relationship with the criticisms we have that: if the model of knowledge management that supports the organization's practice is based on the subjective knowledge of design, people's participation in the creation of organizational knowledge is essential. In this understanding, if there is a time when an asset that generates wealth for an organization is embedded in people knowledge - that time is now. Therefore, it is necessary to promote the emancipation of men in the organization, so that their creative potential can be released to generate the innovation that will enable the organization to permanently reconfigure strategically. For emancipation means all forms of management that are based on a new rationality, especially in that substantive called. If organizations want to be based on GC models that have the characteristics proposed by Nonaka and Takeuchi, they need to understand the potential that this emancipation can mean and cultivate a new organizational culture based on people. Keywords: Knowledge Knowledge Creation. Management. Epistemology. Organizational Revista Ciência e Conhecimento Volume 9 – Nº1 – 2015. 1 – Faculdade Estácio de Sá. SC, Brasil. 2 – Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC, Brasil. Dados para correspondência Ana Claudia Donner Abreu Rua: Professor Milton Sullivan, nº 107, bairro Carvoeira, compl. 101. CEP: 88040-620 Cidade: Florianópolis/SC/Brasil E-mail: [email protected] Recebido em: 30/04/2015. Revisado em: 20/05/2015. Aceito em: 30/05/2015. Área: Gestão do conhecimento Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 99 INTRODUÇÃO A passagem nos últimos duzentos anos da sociedade industrial para a sociedade do conhecimento, mudou a maneira como as organizações gerenciam o recurso conhecimento, onde ganhou destaque a gestão desse recurso. Nonaka e Konno (1998) colocam que esse se tornou um tópico frequentemente discutido na literatura de gestão. Nesse sentido, Nonaka e Takeuchi (2008) complementam que desde a década de 90 a gestão do conhecimento se converteu em tema de pesquisa acadêmica, sendo bastante utilizada também em consultoria. Isso ocorreu porque a “implantação coordenada da Gestão do Conhecimento (GC) cria uma vantagem competitiva sustentável e de difícil imitação, pois está enraizada nas pessoas que trabalham na empresa, e não em recursos físicos, que são facilmente imitáveis pelos concorrentes” (SILVA, 2004, p. 143). Com o intuito de obter essas vantagens a teoria se difundiu, no entanto, essa popularidade, pode induzir a uma percepção de que a organização tem enfrentado de maneira construtiva as barreiras à criação do conhecimento organizacional, porém para Von Krogh et al. (2001) a gestão do conhecimento como está sendo praticada representa um paradigma constrangedor e não reformador para as organizações, visto que se encontra envolvida em várias armadilhas conceituais. A primeira dessas armadilhas é a de que a gestão do conhecimento depende de informações que são facilmente detectáveis e quantificáveis: as habilidades humanas que impulsionam a criação de conhecimento têm mais a ver com relacionamentos e construção de comunidades do que com banco de dados. A tecnologia e os sistemas são importantes sim, porém insuficientes para transformar informação em conhecimento (VON KROGH et al., 2001). Os autores (2001) complementam que a segunda armadilha é a de que a gestão do conhecimento se dedica à fabricação de ferramentas: embora as ferramentas possam ajudar a organização a iniciar o processo de criação de conhecimento, elas não podem se tornar mais importantes do que os resultados obtidos. Assim, as ferramentas devem ser criadas, selecionadas e adaptadas ao longo do processo para atender às necessidades específicas de micro comunidades dentro da organização. Portanto, as ferramentas são necessárias, mas também são insuficientes para criar conhecimento organização. Por fim, a terceira armadilha é a de que a gestão do conhecimento depende de um executivo do conhecimento: a criação do conhecimento não pode estar sujeita às fronteiras. Ao contrário, deve envolver diferentes disciplinas, funções e indivíduos com diversidade de ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 100 experiências e transpor as fronteiras organizacionais, estendendo-se aos fornecedores, clientes e até aos concorrentes (VON KROGH et al., 2001). Nesse sentido, Fischer e Amorim (2007) colocam que as principais armadilhas são: confundir conhecimento com informação; não diferenciar conhecimento individual de conhecimento organizacional; tratar conhecimento como estoque; desconsiderar a interface com os demais modelos ou sistemas de gestão da organização. Behr e Nascimento (2008) também fazem suas críticas em relação à gestão do conhecimento. Enfatizam que na literatura existente sobre o campo, predomina uma concepção cartesiana de gestão com destaque à dimensão funcionalista, ou seja, às abordagens que priorizam um conjunto de técnicas e ferramentas visando a produtividade e eficácia das organizações. Indo mais além, os autores consideram que a conversão do conhecimento tácito em explícito, como a técnica de gestão de conhecimento em que se baseiam para fazer sua apreciação, nada mais é do que “um mecanismo de controle do trabalhador, pelo que ele é pressionado, tanto pela organização, quanto pelos seus pares a transmitir seus conhecimentos tácitos, tornando-os explícitos”, visto que o conhecimento implícito, subjetivo, criativo ao ser articulado pode gerar ganhos significativos de competitividade para a organização (GATTONI, 2000). Em função dessas críticas, vai se empreender neste artigo uma análise epistemológica da teoria de criação do conhecimento organizacional de Nonaka e Takeuchi (2008) buscandose aprofundar nas bases da Gestão do Conhecimento que fundamentam essa concepção proposta e avançar em relação às críticas apresentadas. 2. DESENVOLVIMENTO Uma das principais questões para a efetiva gestão do conhecimento, diz respeito a criar o conhecimento organizacional. Von Krogh et al. (1994) propõem que a criação do conhecimento organizacional se dá em três perspectivas: a cognitivista; a interacionista e a autopoiética, sendo as suas principais características: Cognitivista: As principais atividades no desenvolvimento do conhecimento são a identificação, a coleta e a disseminação centralizada das informações. As organizações são abertas, pois desenvolvem o conhecimento a partir de assimilação de novas informações. É possível a explicitação e codificação do conhecimento, sendo que este é desenvolvido a partir de regras universais da organização, onde se deve considerar o contexto da informação; ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 101 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Interacionista: O conhecimento está nas conexões e o foco deve estar na análise de fluxos dispersos de informações auto organizadas. As organizações são redes auto organizadas que dependem de comunicação e, diferentemente da abordagem anterior, esta abordagem não aplica regras universais. As regras são baseadas em grupos e variam conforme o contexto; e Autopoiética: O conhecimento é construído socialmente por meio do processo da interpretação e da observação. A organização do conhecimento é um sistema aberto (para dados) e fechado (para informação e conhecimento). O conhecimento envolve sentimentos, valores e crenças, e não é visto simplesmente como dado ou informação que pode ser armazenado, ele não é facilmente disseminado, pois depende da interpretação dentro de um sistema de acordo com regras individuais. Os autores ainda trazem mais uma colaboração sobre o conhecimento organizacional: o conceito de epistemologia corporativa, sendo esta a teoria do como e do porque as organizações aprendem, e como estas acreditam que o conhecimento é desenvolvido. Desta forma, Krogh et al. (1994) procuram evidenciar que o sucesso das iniciativas de gestão do conhecimento, perpassa por existir alinhamento entre as epistemologias dos indivíduos e a epistemologia corporativa dentro da qual estes atuam. Embora existam diferentes teorias de criação do conhecimento organizacional, para Escrivão e Silva (2011), dentre toda a literatura de GC a teoria mais consolidada atualmente é a de Nonaka e Takeuchi, uma vez que ela é a mais estruturada e detalhada. 2.1 Modelo de Criação do Conhecimento Organizacional A teoria da criação do conhecimento organizacional, é apresentada por Nonaka e Takeuchi (2008) como uma abordagem distinta daquelas que tratam a organização como um mecanismo de processamento de informações do ambiente externo para adaptar-se às novas necessidades ambientais. Essa diferença na abordagem é importante, pois o conhecimento organizacional é um ativo intangível, “que é acumulado vagarosamente ao longo do tempo e, desta forma, está impossibilitado de ser negociado ou facilmente imitado por concorrentes, uma vez que representa a base e os alicerces da história e da cultura da organização. Quanto mais especificidades esse conhecimento demonstrar em relação à organização, mais ele se tornará seu ativo estratégico” (SHINYASHIKI et al., 2003, p. 2). Assim, a teoria da criação do conhecimento organizacional pretende ser uma “plataforma para uma nova visão de organização como um sistema dinâmico, evolutivo, semiautônomo de produção e de aplicação de conhecimento” (SPENDER, 1996, p.59). Para Frota et al. (2005) assim como qualquer abordagem ao conhecimento, esta teoria tem sua própria epistemologia, que refere a reflexão geral em torno da natureza, etapas e limites do ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 102 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 conhecimento humano, ou seja, a teoria do conhecimento, mas com um foco diferente da abordagem tradicional ocidental. Essa teoria fundamenta-se em duas dimensões, a epistemológica e a ontológica. Na dimensão epistemológica, há a diferenciação entre conhecimento tácito e explícito, sendo que eles se integram através da linguagem (símbolos, metáforas e analogias), objetivando criar conhecimento organizacional. Já, a dimensão ontológica, diz respeito à criação do conhecimento individual, sendo que este pode ser expandido para o conhecimento organizacional por meio da espiral do conhecimento, o que acaba por gerar redes de conhecimento dentro da organização, ou seja, está relacionada com os níveis de criação de conhecimento dentro da organização: individual, grupal, organizacional e Inter organizacional. A interação da dimensão epistemológica emerge a “espiral virtuosa do conhecimento como sendo uma plataforma para transcender o conhecimento do nível ontológico individual para o coletivo por meio da interação entre o conhecimento tácito e o explícito” (LENZI, 2014, p. 53). Assim, a dinâmica entre o conhecimento tácito e explícito acontece e é elevado de um nível ontológico mais baixo para outro mais elevado. Cabe ressaltar que a dimensão epistemológica desta teoria está fundamentada na distinção feita por Polanyi (1962) entre conhecimento tácito e explícito. O conhecimento tácito é pessoal, específico ao contexto e por isso difícil de ser comunicado, e o conhecimento explícito é codificado, transmissível na linguagem formal, sistemática. Para Nonaka e Takeuchi (2008), na história da epistemologia ocidental existe uma controvérsia em torno do tipo de conhecimento que é mais verdadeiro. Enquanto os ocidentais tendem a enfatizar o conhecimento explícito como sendo o conhecimento mais verdadeiro, os japoneses tendem a enfatizar o conhecimento tácito. Na visão dos autores (2008), contudo, o conhecimento tácito e o conhecimento explícito não são entidades totalmente separadas, e sim mutuamente complementares, que interagem e dinamizam trocas nas atividades criativas das pessoas. Nesse modelo dinâmico da criação do conhecimento, existe o pressuposto central de que o conhecimento humano é criado e expandido a partir da interação dos dois tipos de conhecimento. A interação, nomeada como “conversão do conhecimento”, é concretizada a partir de um processo social entre indivíduos onde o conhecimento tácito e o conhecimento explícito se expandem tanto em termos de qualidade quanto de quantidade. A figura 1, apresenta o modelo de conversão do conhecimento. ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 103 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Figura 1. Espiral do Conhecimento. Fonte: Elaborado pelas autoras fundamentados em Nonaka e Takeuchi (1997). A interação entre os dois tipos de conhecimento gera então a conversão de um para outro. Para dar conta dessa dinâmica e embasar a sua teoria de criação do Conhecimento, Nonaka e Takeuchi (1997) propõem o modelo SECI de conversão de conhecimento. O modelo apresenta quatro modos de conversão, sendo eles: (a) socialização, (b) externalização, (c) combinação e (d) internalização. Esses quatro modos de conversão do conhecimento, serão apresentados a seguir. 2.1.1 Socialização - de Conhecimento Tácito em Conhecimento Tácito A socialização é um processo de compartilhamento de experiências que permite a criação do conhecimento tácito, expresso em modelos mentais e habilidades técnicas compartilhadas. Um indivíduo pode adquirir conhecimento tácito diretamente de outros indivíduos, sem usar a linguagem, mas sim pela observação, imitação e prática. O segredo para a aquisição do conhecimento tácito é a experiência. Sem experiência compartilhada, é extremamente difícil para um ser humano conhecer o processo de raciocínio de outros. A mera transferência de informações muitas vezes fará pouco sentido se estiver desligada das emoções associadas e dos contextos específicos nos quais as experiências compartilhadas são embutidas (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 104 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 2.1.2 Externalização: de Conhecimento Tácito em Conhecimento Explícito A externalização é um processo de articulação do conhecimento tácito em conceitos explícitos. Pode ser definido também como um processo de criação do conhecimento, na medida em que o conhecimento tácito se torna explícito e passa a ser expresso na forma de metáforas, analogias, conceitos, hipóteses ou modelos. Dentre os quatro modos de conversão do conhecimento, a externalização é a chave para a criação do conhecimento, pois cria conceitos novos e explícitos a partir do conhecimento tácito. Para converter o conhecimento tácito em conhecimento explícito de forma eficiente e eficaz podem ser usadas a metáfora, a analogia e o modelo (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). 2.1.3 Combinação: do Conhecimento Explícito em Conhecimento Explícito A combinação é um processo de sistematização de conceitos em um sistema de conhecimento. Esse modo de conversão do conhecimento envolve a combinação de conjuntos diferentes de conhecimento explícito. As pessoas trocam e combinam conhecimentos por meio de documentos, reuniões, conversas ao telefone ou redes de comunicação computadorizadas. A reconfiguração das informações existentes através da classificação, do acréscimo, da combinação e da categorização do conhecimento explícito (como realizado em bancos de dados de computadores) pode levar a novos conhecimentos. A criação do conhecimento realizada a partir da educação e do treinamento formal nas escolas normalmente assume esta forma (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). 2.1.4 Internalização: de Conhecimento Explícito em Conhecimento Tácito A internalização é o processo de incorporação do conhecimento explícito no conhecimento tácito e está intimamente relacionada ao “aprender fazendo”. Quando são internalizadas nas bases de conhecimento tácito dos indivíduos, sob a forma de modelos mentais ou know-how técnico compartilhado, as experiências advindas da socialização, da externalização e da combinação tornam-se ativas e valiosas. No entanto, para viabilizar a criação do conhecimento organizacional, o conhecimento tácito acumulado precisa ser socializado com os outros membros da organização, iniciando assim uma nova espiral de criação do conhecimento (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). Nonaka e Takeuchi (2008) complementam que para o conhecimento explícito se tornar tácito, é necessário a verbalização do conhecimento sob a forma de documentação, manuais e histórias orais. A documentação ajuda os indivíduos a internalizarem suas experiências, aumentando assim seu conhecimento tácito. Além disso, os documentos ou ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 105 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 manuais facilitam a transferência do conhecimento explícito para outras pessoas, ajudando-as a vivenciar indiretamente as experiências dos outros. Quando a maioria dos membros da organização compartilha de tal modelo mental, o conhecimento tácito passa a fazer parte da cultura organizacional. 2.1.5 Conteúdo do Conhecimento e a Espiral do Conhecimento Conforme exposto anteriormente, a criação do conhecimento organizacional é uma interação contínua e dinâmica entre o conhecimento tácito e o conhecimento explícito, moldada pelas mudanças ocorridas entre diferentes modos de conversão de conhecimento. Como o conteúdo do conhecimento criado por cada modo de conversão do conhecimento é naturalmente diferente, é preciso compreender como ocorrem esses processos. Em primeiro lugar, o modo da socialização normalmente começa com o desenvolvimento de um “campo” de interação que facilita o compartilhamento das experiências e modelos mentais dos membros da organização. Já, o modo de externalização é provocado pelo diálogo ou pela reflexão coletiva, nos quais o emprego de uma metáfora ou analogia significativa ajuda os membros da equipe a articularem o conhecimento tácito oculto que, de outra forma, é difícil de ser comunicado. O modo de combinação é provocado pela colocação do conhecimento recém-criado e do conhecimento já existente, proveniente de outras experiências da organização, em uma rede, tornado-o um novo produto, serviço ou sistema gerencial. Por fim, o aprender fazendo provoca a internacionalização. Para Lenzi (2014, p. 54 – Grifo da Autora) a Socialização gera o Conhecimento Compartilhado, como um campo para compartilhar modelos mentais e habilidades técnicas. A Externalização origina o Conhecimento Conceitual, pois evoca o diálogo e a reflexão coletiva. A Combinação produz o Conhecimento Sistêmico, onde o novo conhecimento é incorporado, ou mesmo alinhado a conhecimentos já existentes. Na Internalização é criado o Conhecimento Operacional que é o aprender-fazendo. Até aqui foi apresentada a dimensão epistemológica da criação do conhecimento organizacional. Porém, uma organização não pode criar conhecimento sozinha. O conhecimento tácito dos indivíduos constitui a base da criação do conhecimento organizacional, mas a organização tem de mobilizar o conhecimento tácito criado e acumulado no nível individual. O conhecimento tácito mobilizado é ampliado organizacionalmente a partir dos quatro modos de conversão do conhecimento e cristalizado em níveis ontológicos superiores (espiral do conhecimento). Assim, a criação do conhecimento organizacional é um processo em espiral que começa no nível individual e vai subindo e ampliando comunidades de interação ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 106 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 que cruzam fronteiras entre seções, departamentos, divisões e organizações. Por isso, Nonaka e Takeuchi (2008) também apresentam as condições que são capacitadoras para a criação do conhecimento organizacional. 2.2 Condições capacitadoras da criação do conhecimento organizacional A função da organização no processo de criação do conhecimento organizacional é fornecer o contexto apropriado para facilitar as atividades em grupo e promover a criação e acúmulo de conhecimento no nível individual, mas para isso é importante considerar os aspectos apresentados a seguir: 2.2.1 Intenção A espiral do conhecimento é direcionada pela intenção organizacional que é definida como a aspiração de uma organização às suas metas. Normalmente, os esforços para alcançar a intenção assumem a forma estratégica dentro de uma organização. A intenção organizacional fornece o critério mais importante para julgar a veracidade de um determinado conhecimento, bem como o valor da informação ou do conhecimento percebido ou criado. No nível organizacional, a intenção é frequentemente expressa por padrões organizacionais ou visões que podem servir para avaliar e justificar o conhecimento criado. Por isso, a intenção é necessariamente carregada de valor (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). 2.2.2 Autonomia A segunda condição para promover a espiral do conhecimento é a autonomia. No nível individual, todos os membros de uma organização devem agir de forma autônoma conforme as circunstâncias. Ao permitir essa autonomia, a organização amplia a chance de introduzir oportunidades inesperadas. A autonomia também aumenta a possibilidade de os indivíduos se automotivarem para criar novo conhecimento. Além disso, indivíduos autônomos atuam como parte da estrutura holográfica, na qual o todo e cada parte compartilham as mesmas informações. Ideias originais emanam de indivíduos autônomos, difundem-se dentro da equipe, transformando-se então em ideias organizacionais (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). 2.2.3 Flutuação e Caos Criativo A terceira condição organizacional para promover a espiral do conhecimento é a flutuação e o caos criativo, que estimulam a interação entre organizações e o ambiente externo. A flutuação é diferente da desordem total e caracterizada pela “ordem sem ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 107 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 recursividade”. Trata-se de ordem cujo padrão é difícil de prever inicialmente. Se as organizações adotam uma atitude aberta em relação aos sinais ambientais, podem explorar a ambiguidade, a redundância ou os ruídos desses sinais para aprimorar seu próprio sistema de conhecimento. O caos é gerado naturalmente quando a organização enfrenta uma crise real, por exemplo, um rápido declínio de desempenho devido as mudanças nas necessidades do mercado ou ao crescimento significativo de concorrentes. Em suma, a flutuação na organização pode precipitar o caos criativo, que induz e fortalece o compromisso subjetivo dos indivíduos. Na realidade operacional do dia-a-dia, os membros da organização não enfrentam regularmente essa situação (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). 2.2.4 Redundância A redundância é a quarta condição que possibilita que a espiral do conhecimento ocorra em nível organizacional. A redundância é a existência de informações que transcendem as exigências operacionais imediatas dos membros da organização. Nas organizações de negócios, a redundância refere-se à superposição intencional de informações sobre atividades da empresa, responsabilidades da gerência e sobre a empresa como um todo. Para que se crie conhecimento organizacional, é preciso que um conceito criado por um indivíduo ou por um grupo seja compartilhado por outros indivíduos que talvez não precisem do conceito imediatamente. O compartilhamento de informações redundantes promove o compartilhamento de conhecimento tácito, pois os indivíduos conseguem sentir o que os outros estão tentando expressar. Nesse sentido, a redundância de informações acelera o processo de criação do conhecimento. A redundância é importante sobretudo no estágio de desenvolvimento do conceito, quando é essencial expressar imagens baseadas no conhecimento tácito. Nesse estágio, as informações redundantes permitem que os indivíduos invadam mutuamente suas fronteiras funcionais e ofereçam recomendações ou forneçam novas informações de diferentes perspectivas. Em suma, a redundância de informações precipita o “aprendizado por intrusão” na esfera de percepção de cada indivíduo (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). 2.2.5 Variedade de Requisitos A quinta condição que ajuda a desenvolver a espiral do conhecimento é a variedade de requisitos. A diversidade interna de uma organização deve corresponder à variedade e à complexidade do ambiente para permitir que ela enfrente os desafios impostos pelo ambiente. Os membros da organização podem enfrentar muitas situações se possuírem uma variedade de ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 108 requisitos, que pode ser aprimorada através da combinação de informações de uma forma diferente, flexível e rápida e do acesso às informações em todos os níveis da organização. Para maximizar a variedade, todos na organização devem ter a garantia do acesso mais rápido à mais ampla gama de informações necessárias, percorrendo o menor número possível de etapas (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Quanto aos objetivos esta pesquisa é explicativa, a escolha de procedimentos sistemáticos para a descrição e explicação dos fenômenos é qualitativa, e quanto ao processo de coleta de dados foi bibliográfica. A abordagem qualitativa se justifica, sobretudo, por se tratar de uma forma adequada para entender e explicar a natureza de um fenômeno social como a teoria da criação do conhecimento organizacional. A natureza explicativa do trabalho, está ancorada no objetivo de aprofundar o conhecimento sobre as bases epistemológicas que fundamentam essa mesma teoria e a técnica de pesquisa utilizada - bibliográfica - permitiu explicar o problema a partir de referências teóricas publicadas (CERVO e BERVIAN, 1996). 4. APRESENTAÇÃO DAS BASES EPISTEMOLÓGICAS QUE FUNDAMENTAM A TEORIA DA CRIAÇÃO DO CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL O primeiro artigo que trata da criação do conhecimento organizacional de Nonaka é datado de 1991 sob o título “The Knowledge-Creating Company”. Mais tarde, com a participação de colaboradores, incluindo Takeuchi, a teoria foi ganhando corpo e sendo desenvolvida. Cabe ressaltar que a teoria da criação do conhecimento organizacional, proposta por Nonaka e Takeuchi tem seus fundamentos epistemológicos nas tradições filosóficas orientais de Nishida, e nas tradições ocidentais de Polanyi e Whitehead, que explicam a natureza do conhecimento e a existência humana do ponto de vista de um mundo que é dinâmico e inter-relacionado (NONAKA et al., 2011). Ao formularem sua teoria, os autores (2008) partem de um questionamento da teoria da organização baseada em recursos que utiliza o conhecimento de maneira mais objetiva – para obter ganhos acima da média – e não se preocupa em entender as dinâmicas a partir das quais a organização produz continuamente recursos por meio da interação com o meio ambiente. Além disso, nessa visão de organização o conhecimento é tido como um dos muitos recursos que geram receita, mas ainda há uma incompreensão do papel do conhecimento na gestão, bem como do processo pelo qual o conhecimento é criado (NONAKA et al., 2011). Já a visão da organização baseada em conhecimento busca superar esse limite apresentado, e pretende ser uma “plataforma para uma nova visão de organização como um ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 109 sistema dinâmico, evolutivo, semiautônomo de produção e de aplicação de conhecimento” (SPENDER, 1996, p.59). Nessa visão proposta, a natureza do conhecimento como recurso de gestão é diferente da natureza do conhecimento como recurso físico. O conhecimento é criado nas interações entre as pessoas e o ambiente e é: (a) subjetivo, (b) relacionado a processos, (c) estético e (d) adquirido pela prática: a) O conhecimento é subjetivo: Essa visão de conhecimento se fundamenta na concepção de Polanyi (1962), que se opõem a visão objetiva e analítica de que o conhecimento é algo que o ser humano adquire ao analisar o objeto como algo que existe a parte e além dele mesmo. Para esse autor, o ser humano adquire conhecimento por meio de sua formação e na integração de suas experiências individuais, e faz isso de modo ativo e subjetivo, criando o conhecimento tácito. Embora não negue a importância da visão objetiva que ele denomina de conhecimento explícito, ele defende que o conhecimento é acima de tudo uma questão de como o ser humano responde à realidade, e como situa essa realidade em relação a si mesmo. Da mesma maneira, levando essa visão de conhecimento para o contexto das organizações, a realidade não possui uma “existência” objetiva. Ela é criada pela organização que a percebe como real. Isso significa que as organizações diferem entre si pelos modelos que se utilizam para reagir a uma realidade, mas também por aqueles modelos em que se baseiam para perceber a realidade (NONAKA et al., 2011). (b) O conhecimento é relacionado ao processo: A visão de mundo que embasa a teoria é fundamentada na visão dos filósofos processuais, como Whitehead. Nessa filosofia o mundo é entendido como uma teia orgânica de processos inter-relacionados ou como uma sociedade de eventos espaço-temporais complexos. E nesse sentido, o conhecimento deve ser entendido principalmente como um processo, que é criado e utilizado em relação ao conhecimento de outras pessoas. O conhecimento nasce tanto da experiência, que é um processo subjetivo de percepção, quanto da apreensão da essência na interpretação do mundo. É importante destacar que na filosofia processual, o objeto do conhecimento surge da interação com o mundo, e não o mundo que surge a partir do objeto (WHITEHEAD, 1978). Assim, nessa teoria, o conhecimento é definido como “o processo humano/social dinâmico de justificação da crença pessoas em relação à verdade” (NONAKA e TAKEUCHI, 2008, p. 58). O conhecimento é criado pelas pessoas a partir de suas relações umas com as outras e com o ambiente. Dessa forma, o conhecimento é um processo no qual os pensamentos subjetivos das pessoas são justificados pela interação social com outros e com o ambiente, para aí sim tornar-se uma “verdade” objetiva (NONAKA et al., 2011). c) O conhecimento é estético: historicamente a teoria das organizações tem se preocupado em estudar questões instrumentais como eficácia e eficiência. Entretanto, os estudos de estética - que estão relacionados com o conhecimento criado a partir de nossas experiências sensoriais - tem se tornado mais comum nas organizações. O conhecimento estético, é, portanto, uma forma de conhecimento que as pessoas adquirem ativando as capacidades necessárias para garantir que o juízo estético do diadia faça parte das organizações. Ele oferece um insight e uma consciência que talvez não se expresse em palavras, mas possibilita a organização a perceber novos caminhos. Novas oportunidades, novos mercados, tecnologias, modelos de negócio baseiam-se em uma visão de futuro que é reflexo dos valores, ideais e do senso estético dos membros da organização (NONAKA et al., 2011). ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 110 d) O conhecimento é criado por meio da prática: os teóricos da gestão têm procurado estabelecer regras universais para analisar os recursos da organização e o ambiente em que ela opera. Entretanto, o gerenciamento não pode ser realizado por meio de análises baseadas nessas regras, mas sim por práticas desenvolvidas para lidar com as situações particulares que cada organização enfrenta. Nesse sentido, o diferencial competitivo de uma organização está na capacidade que possui de adaptação e para a prática da mudança contínua, e não pela capacidade de estabelecer um plano analítico preciso (NONAKA et al., 2011). Para se compreender a gestão baseada no conhecimento, é preciso uma teoria de organização fundamentada nessa visão de conhecimento, ao invés das teorias de gestão convencionais que encaram a organização como uma entidade autossuficiente e indiferente, e na qual as subjetividades humanas são desconsideradas da análise. A visão do conhecimento como subjetivo, processual, estético e prático, indica como ele é criado para alterar a organização e o ambiente, e indica que essa capacidade se desenvolve nas interações com o meio (NONAKA et al., 2011). O que define uma organização no contexto dessa visão, é sua capacidade de formar juízos de valor em cada situação particular visando concretizar sua visão de futuro. Essa capacidade, chamada e descrita por Aristóteles de phronesis – é entendida como a capacidade de determinar e tomar a melhor atitude em relação a uma situação específica, servindo ao bem comum. A phronesis considera as circunstâncias do contexto, atende às particularidades e altera os objetivos do processo quando necessário. Está relacionada aos valores, vai além do conhecimento científico, analítico e técnico e envolve julgamentos e decisões tomadas por um ator social virtuoso (NONAKA et al., 2011). Dessa forma, o conhecimento nasce da subjetividade das pessoas inseridas em um contexto e encontra sua objetividade por meio do processo social. Surge da síntese do pensamento e da ação dos indivíduos que interagem tanto dentro quanto fora da organização e isso cria uma nova práxis de interação que, por sua vez, torna-se a base da geração de um novo conhecimento por meio da espiral do conhecimento. 4.1. Reflexão das bases epistemológicas que fundamentam a teoria da criação do conhecimento organizacional A despeito do grande número de publicações sobre teorias de gestão do conhecimento, poucos trabalhos têm se preocupado em fazer uma análise dessas teorias com relação às suas bases filosóficas. Por isso, Nonaka e Peltokorpi (2006) se propõem a fazer essa análise, utilizando como critério trabalhos que apresentam o conhecimento a partir de uma perspectiva objetiva ou subjetiva. ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 111 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Para os autores (2006), na perspectiva objetiva que é positivista, o conhecimento é objetivo, existe separado e independente das pessoas. Para o positivismo, existem fatos práticos sobre o mundo que não dependem da interpretação e nem da presença do ser humano e o mundo é constituído por relações causais entre objetos. O argumento subjacente, é de que o verdadeiro conhecimento não é produto da experiência sensorial, mas sim de um processo mental ideal, ou seja, existe um conhecimento a priori que não precisa ser justificado pela experiência (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). Por outro lado, na perspectiva subjetiva, o conhecimento é contextual, subjetivo e relacional, ou seja, é impossível existir conhecimento objetivo separado das subjetividades das pessoas (MERLEAU - PONTY, 1999). As bases que fundamentam a teoria da criação do conhecimento de Nonaka e Takeuchi (1997, 2008), se fundamentam em Polanyi, Nishida e Whitehead, que se identificam com essa visão subjetiva da criação do conhecimento. Polanyi (1962) fundamenta sua teoria de conhecimento na Gestalt, que indica que os indivíduos podem conhecer a totalidade de determinado objeto a partir da interpretação que fazem de seus aspectos particulares, ainda que não sejam capazes de isoladamente os identificar. Nesse sentido, o processo de conhecimento humano é formado por pistas fragmentadas que são integradas em categoriais nas quais as pessoas atribuem sentido à realidade. O autor (1962) propõe um conceito de conhecimento fundamentado em três pressupostos: (a) a verdadeira descoberta não pode ser explicada por um conjunto de regras e algoritmos; (b) o conhecimento é público e social, e por isso é construído pelas pessoas; (c) todo conhecimento é tácito ou nele fundamentado. Tácito é uma palavra de origem latina que significa silencioso, ou seja, no sentido próprio da palavra o conhecimento tácito é algo que o ser humano sabe mesmo não tendo capacidade para explicar. O conhecimento tácito tem dois componentes distintos: (a) o técnico – o know-how – conhecimento enraizado na ação e com o desempenho e (b) cognitivo – o modelo mental que encontra-se incorporado nos pessoas e age como um filtro a partir do qual eles enxergam, agem e se comportam no mundo. É complexo, e por ser uma experiência pessoal e específica a um contexto, é mais difícil de ser formalizado, comunicado e compartilhado. Polanyi (1962) sustenta que o componente tácito é parte indispensável de todo e qualquer conhecimento e é a base para o conhecimento explícito. Ou seja, a dimensão tácita do conhecimento é utilizada para interpretar a realidade e produzir conhecimento explícito. Nishida, tido como precursor do pensamento japonês contemporâneo e fundador da Escola de Kyoto, é outro dos autores que influenciam Nonaka e Takeuchi. A partir da Escola de Kyoto, Nishida se aproxima de Husserl e Heidegger e inicia um diálogo entre o ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 112 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 pensamento japonês contemporâneo e a filosofia ocidental. Seus escritos, pretendem oferecer uma contribuição oriental à tradição especulativa ocidental apoiando-se nos conceitos budistas e confrontar e integrar instancias próprias do mundo oriental com categorias e instituições do rigor da filosofia europeia (FLORENTINO NETO, 2008). Para Nishida, o pensamento comum ensina que sujeito e objeto são realidades independentes, mas isso é uma disposição errada. A reflexão emerge a posteriori em relação à experiência, e trazendo de novo a consciência sobre si mesma e tornando-a traduzível em palavras e comunicável, coloca entre sujeito e objeto uma separação, uma cisão. Antes da reflexão não existem sequer um sujeito e um objeto. A realidade é uma, ou seja, existe um princípio que a unifica. O único elemento capaz de corresponder à realidade na sua totalidade, o elemento que pode exprimir dialeticamente os fenômenos do mundo é a consciência. Todavia, não se trata de uma consciência intencional, que aponta o seu objeto e o define, compreende-o. Na concepção de Nishida, a consciência tem que ser entendida como um lugar de acolhimento, uma cavidade que deixa que os fenômenos aconteçam e se disponham livremente. A ideia principal, é que o momento do “fazer experiência” não precise de um sujeito – que se manifestando provocaria uma cisão, uma distância daquilo que viria como consequência a constituir-se como um objeto – mas que aconteça ao contrário, como um “puro ver” a realidade assim como é, fora da distinção cartesiana entre sujeito e objeto (FLORENTINO NETO,2008). Assim, ainda na visão de Nishida, a verdadeira direção só é percebida dentro da realidade viva da experiência anterior à separação entre sujeito e objeto. Nesse sentido, não se pode obter o verdadeiro conhecimento a partir do pensamento teórico, mas sim apenas a partir da mente e do corpo do indivíduo (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). Parece interessante que Nishida não pretenda descrever a realidade nem como objetiva, nem como subjetiva, nem mesmo como empiricamente objetiva. Para ele, o agir da experiência pura é a mesma e idêntica coisa do que o que é agido; nenhum elemento pode dominar nem resumir a si o outro (o pensamento ou a realidade, o sujeito ou o objeto), dado que a unidade posta em campo pela experiência é infinitamente dinâmica e abrangente. O saber deve ter o significado de agir, que é onde se encontra o sentido da auto- determinação dos fatos. Como na hermenêutica fenomenológica de Heidegger, que considera a compreensão como um tipo de ação e, consequentemente, a partir disso considera a existência como um fato de compreensão, podese entender que a auto compreensão vê a sua própria realidade. ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 113 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 Nessa perspectiva, o fundamento da visão com relação ao conhecimento, é suportada por três condições: (a) a unidade do homem e da natureza; (b) a unidade do corpo e da mente e (c) a unidade do eu e do outro. A primeira condição: unidade do homem e da natureza - é expressada pelas características estruturais da língua japonesa. Nela, as imagens físicas e concretas são necessárias para a expressão, e as afirmações feitas por um falante articulam imagens concretas e tangíveis. Assim, essas imagens que existem na mente do falante, mesmo que em alguns casos, só na hora em que são proferidas, se tornam reais. Além disso, essas características se associam a uma visão sobre o tempo entendido como um fluxo contínuo – um presente permanentemente atualizado. O tempo é a aqui e agora e o espaço não tem uma perspectiva fixa (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). A segunda condição: a unidade do corpo da mente - está fundamentada na ideia de personalidade total, onde o conhecimento significa a sabedoria adquirida a partir da perspectiva da personalidade como um todo. Nessa expectativa, a realidade e a existência estão na aquisição do fato a partir da experiência pura e a pessoa é o sujeito da ação. Portanto, a incorporação da experiência pessoal direta é necessária em relação ao conhecimento (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). A terceira condição: a unidade do eu e do outro - integra as duas condições anteriores. Desenvolve uma visão de mundo orgânica, onde o conhecimento subjetivo e inteligência intuitiva são valorizados, e onde a realidade surge na interação física entre a natureza e os seres humanos (NONAKA e TAKEUCHI, 1997). Da mesma maneira que Polanyi e Nishida, outro que contribui para a formação da base epistemológica da teoria que está sendo analisada é Whitehead. O filósofo e matemático Whitehead, foi um dos mais destacados críticos do cientificismo e do materialismo que caracterizam a ciência desde o século XVII. Crítico do cientificismo, o filósofo britânico apontava que o ideal de uma ciência caracterizada pela mera busca de descrições simples dos fenômenos observados, pretensamente desligada de qualquer pressuposto metafísico, torna a ciência uma empresa sem qualquer importância. A ciência só pode recuperar sua importância na medida em que esse ideal é demonstrado falso (WHITEHEAD, 1994). Para Whitehead (1994) a natureza é aquilo que se observa pela percepção obtida a partir dos sentidos e há três elementos envolvidos no conhecimento da realidade: o fato, os fatores e as entidades. O fato é a própria natureza que se apresenta à apreensão sensível; nos fatores a apreensão sensível é capaz de diferencia elementos; e, as entidades são o modo como os fatores de apreensão sensível estão presentes no pensamento. ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 114 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 O fato imediato para a apreensão sensível é a ocorrência da natureza em sua totalidade complexa, entretanto, a apreensão não é capaz de compreender o fato em sua totalidade. Por isso, em um processo de abstração, o fato é separado em fatores e concebido pelo pensamento como entidades distintas. Isso significa que, dizer que a natureza deve ser entendida como aquilo que se apresenta imediatamente à apreensão sensível, não implica a pressuposição de que ela é um conjunto de elementos distintos. Aquilo que é “um mero processo da mente na tradução da apreensão sensível em termos do conhecimento discursivo foi transmutado em caráter fundamental da natureza” (WHITEHEAD, 1994, p.23). De forma que, as abstrações produzidas pelo pensamento para tornar inteligível aquilo que aparece à apreensão sensível, foram convertidas em elementos não só inerentes ao real, mas dotados de um caráter de realidade última, imutável e diferenciada. Nesse sentido, o real se mostra através dos sentidos, sem qualquer acréscimo da consciência. Destarte, é preciso pensar a natureza homogeneamente, sem impor sobre ela artifícios criados pelo pensamento para lidar com os fatores da apreensão sensível. Nesse caso, a exterioridade da natureza em relação ao pensamento se mostra a partir da própria percepção sensível, onde se tem a consciência de algo que “não é pensamento e que é contido em si mesmo com relação ao pensamento” (WHITEHEAD, 1994, p.7). Por isso, qualquer afirmativa sobre a natureza deve evitar confundir a natureza mesma com o que o pensamento elabora sobre ela para poder comunica-la, sendo possível, apenas, o desenvolvimento de uma filosofia da coisa percebida. A tese do autor é a de que o conhecimento é uma instancia última. Não se pode explicar o porquê do conhecimento, só se pode descrever o que do conhecimento. Ou seja, é possível analisar o conteúdo e as relações internas do conhecimento, mas não explicar porque ele existe. Dessa maneira, não é possível tratar dos instrumentos de conhecer e de como a natureza age sobre eles para produzir o conhecimento. O que é preciso, é abordar o conteúdo do conhecimento verificando como ele se estrutura internamente em suas mútuas relações e pôr em coerência aquilo que apreensão sensível fornece. Negada a possibilidade de tratar o conhecimento como um produto da mente, é preciso abordá-lo enquanto apreensão abstrata de um conteúdo que vem da apreensão sensível. CONCLUSÕES Nesse trabalho se apresentou uma análise epistemológica da teoria de criação do conhecimento organizacional de Nonaka e Takeuchi, buscando-se aprofundar nas bases que fundamentam essa concepção proposta. Esse estudo foi empreendido para que fosse possível ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 115 uma análise das críticas apresentadas por Von Krogh, Ichijo, Nonaka (2001) e Behr, Nascimento (2008) sobre a gestão do conhecimento. Para esses autores, a gestão do conhecimento está envolvida em uma série de armadilhas práticas e conceituais que a torna um paradigma constrangedor e não reformador para as organizações, uma vez que os modelos de GC fundamentam-se em uma concepção cartesiana e um mecanismo de controle dos seres humanos dentro da organização. Após a apresentação das bases epistemológicas, percebe-se que esses fundamentos permitem algumas considerações mais gerais: O conhecimento é um processo humano. Não se pode reduzir a gestão do conhecimento à tecnologia de informação ou ferramentas de mensuração. Mesmo que o termo gestão implique em controle de processos, na gestão do conhecimento o que deve ser promovido é a criação do conhecimento que decorre de um processo de capacitação para o conhecimento; O conhecimento depende dos olhos do observador, que confere significado a um contexto a partir de suas referências, bem como pela maneira como utiliza esse conhecimento. As pessoas justificam a veracidade de suas crenças com base em suas observações do mundo que dependem da sensibilidade e da experiência individual. Dessa maneira, o conhecimento é uma construção da realidade e não algo “verdadeiro” de maneira abstrata e universal; É preciso o desenvolvimento de comunidades de trabalho fundamentadas em processos sociais de interação para que as organizações estejam capacitadas para o conhecimento; Da mesma maneira, levando essa visão de conhecimento para o contexto das organizações, a realidade não possui uma “existência” objetiva. Ela é criada pela organização que a percebe como real. Isso significa que as organizações diferem entre si pelos modelos que se utilizam para reagir a uma realidade, mas também por aqueles modelos em que se baseiam para perceber a realidade. O que define uma organização no contexto dessa visão, é sua capacidade de formar juízos de valor em cada situação particular visando concretizar sua visão de futuro. Assim, se o modelo de gestão do conhecimento que suporta a prática da organização é fundamentado na concepção subjetiva do conhecimento, será imprescindível a participação das pessoas na criação do conhecimento organizacional. Nesse entendimento, se existe um momento em que um ativo que gera riqueza para uma organização está incorporado nas pessoas – o conhecimento – esse momento é agora. Portanto, é preciso promover a emancipação dos homens na organização, de maneira que o seu potencial criativo possa ser liberado para gerar a inovação que vai permitir que a organização permanentemente se reconfigure de maneira estratégica. Por emancipação entende-se que todas as formas de gestão que se baseiam em uma nova racionalidade, especialmente naquela denominada substantiva. Se as organizações ABREU et al. Bases epistemológicas da criação do conhecimento organizacional. Ciênc. Conhecimento – v. 9, n. 1, 2015. 116 Revista Ciência e Conhecimento – ISSN: 2177-3483 querem fundamentar-se em modelos de GC que tenham as características propostas por Nonaka e Takeuchi, elas precisam entender o potencial que essa emancipação pode significar e cultivar uma nova cultura organizacional fundamentada nas pessoas. REFERÊNCIAS BEHR, R.; NASCIMENTO, S. A gestão do conhecimento como técnica de controle: uma abordagem crítica da conversão do conhecimento tácito em explícito. Cadernos Ebape, v. 6, n. 1, março, 2008, p. 1-11. CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia cientifica. São Paulo: Makron Books, 1996. ESCRIVÃO, G.; SILVA, S. L. da. 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