INFLUÊNCIA DE EVENTOS ENOS NA PRECIPITAÇÃO DE
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INFLUÊNCIA DE EVENTOS ENOS NA PRECIPITAÇÃO DE
INFLUÊNCIA DE EVENTOS ENOS NA PRECIPITAÇÃO DE CAMPINAS, SP Leônidas Mantovani Malvesti 1 e Dr. Jonas Teixeira Nery 2 RESUMO O objetivo desse trabalho foi analisar a variabilidade interanual e a influência de ENOS no município de Campinas, São Paulo. Gerou-se um índice trimestral, com base nos dados de precipitação pluvial obtido junto a Agência Nacional de Água, no período de 1939 a 1999 e correlacionou-os a valores de anomalias trimestrais do Oceano Pacífico Tropical. Os dados trimestrais foram obtidos através da National Weather Service, EUA. Palavras–chave: precipitação, anomalia, índice, ENOS ABSTRACT The objective of this paper is to analysis the interanual variability and ENSO phenomena in Campinas city. Monthly rainfall data during the period 1939 to 1999. The correlation was used between anomaly of the temperature in Pacific Ocean and rainfall index in this city. Key-Words: rainfall, anomaly, index, ENSO INTRODUÇÃO Muitos pesquisadores consideram que o fenômeno ENOS constitui uma oscilação de vários meses de amplitude que afeta o conjunto do oceano Pacífico Intertropical (Wyrtki, 1975). Numa primeira fase, os ventos alísios intensos concentram as águas quentes equatoriais no Pacífico oeste, com temperaturas superiores a 28ºC, desencadeando uma intensa convecção e chuvas intensas na área da concentração dessas águas. Os ventos alísios de leste tendem a debilitar-se, podendo mudar de sentido, soprando de oeste para leste, observando-se uma afluência de águas anormalmente quente sobre a costa ocidental da América do Sul e Pacífico tropical oriental. O episódio El Niño tem lugar durante uma mudança brusca entre ambos os sistemas de circulação. Em 1997, Rodolfo Rodriguez, da Universidade de Piura, definia El Niño como o debilitamento ou inversão dos ventos superficiais ao longo do Pacífico equatorial causado pela mudança nas pressões atmosféricas. Esses ventos tendem a soprar de oeste para leste, provocando o deslocamento das águas aquecidas para o flanco oriental do oceano Pacífico, alcançando à costa sul americana, tornando a região úmida e chuvosa. Ao colapsar, os ventos alísios no Pacífico equatorial ocidental mudam 1 2 Aluno de graduação de Geografia da UNESP/Ourinhos [email protected] (CLIMA/CNPq) Professor de Geografia da UNESP/Ourinhos [email protected] (CLIMA/CNPq) 1 sua direção em 180º, chegando a se anular. Estas anomalias dos ventos de baixo nível estão associadas com a flutuação denominada Oscilação Sul, na atmosfera (Cavalcanti, 1992 e Kousky, 1996). A mudança brusca da circulação superficial equatorial do Pacífico gera uma perturbação oceânica, conhecida, como onda equatorial de Kelvin. Está comumente aceito que, no Pacífico Equatorial, as oscilações de baixa freqüência desempenham papel importante no transporte de energia e as ondas Kelvin são responsáveis por esse transporte desde a parte ocidental do Pacífico até o flanco oriental. Nos últimos 50 anos, a América do Sul foi afetada por muitos episódios El Niño, sendo que os períodos de ocorrência do fenômeno El Niño ou anti-El Niño, calculado pelo Centro de Análises Climáticos da NOAA tem relação com o início e os valores negativos do IOS. O objetivo desse trabalho foi analisar a variabilidade interanual e a influência de ENOS no município de Campinas, São Paulo. METODOLOGIA Foram realizadas correlações lineares entre um índice de precipitação pluvial trimestral e a anomalia da temperatura do Oceano Pacífico Equatorial, dados trimestrais obtidos na National Weather Service, EUA. Com base em episódios quentes, do Centro de Previsão Climática da National Weather Service, EUA, calculado para um limiar de ± 5oC de temperatura, para o Oceano Pacífico, com valores acumulados cada três meses, relativos ao El Niño 3.4, na região 5oN – 5oS, 120o a 170oW, O índice foi gerado através da expressão, sendo p o valor da precipitação pluvial para cada três meses e P o valor da precipitação pluvial média de todo o período analisado. A partir das correlações realizadas foram feitos ajustes polinomiais entre as séries significativamente correlacionadas. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Podem-se observar nos gráficos abaixo diversos ajustes, para diferentes períodos e com defasagem de um, dois e três trimestres, para cada evento. Esses ajustes foram realizados com base nos resultados obtidos nas correlações, Tabela I. Pode-se observar na Tabela I que a precipitação em Campinas sofre a influência de eventos ENOS, ainda que haja variabilidade de um evento para outro. Por exemplo: o evento ocorrido em 1957-58 explicou 78% da chuva nesse município, considerando a 2 correlação entre a precipitação e a temperatura do oceano, já o evento ocorrido nos anos 1965-66 explicou apenas 44%. Importante salientar que algumas defasagens apresentaram correlações altamente significativas, tais como no evento 1957-58, como na defasagem de três trimestres, a correlação linear foi de 83%, ou seja, a chuva ocorrida nesse período foi explicada pela ocorrência desse evento no Pacífico. Deve-se ressaltar que o evento El Niño 1982-83, considerado um dos mais intensos dos últimos 50 anos, não redundou em precipitação intensa na região, mesmo para diferentes defasagens, o mesmo pode ser constatado no durante o evento 1997-98. TABELA I – Correlação linear de alguns anos, dentro do período analisado. Ano SDef 0,78 0,44 0,70 0,55 0,65 0,56 0,60 1957-1958 1965-1966 1972-1973 1976-1978 1982-1983 1991-1995 1997-1998 Def1 0,81 0,52 0,60 0,65 0,64 0,52 0,58 Def2 0,82 0,66 0,65 0,74 0,63 0,52 0,59 Def3 0,83 0,80 0,82 0,77 0,56 0,54 0,68 Com base nessas correlações foram traçados alguns ajustes lineares e polinomiais (de segunda e terceira ordem), mostrando, mais uma vez, significativas variabilidade de evento para evento. Nas Figura 1, 2, 3 e 4 são apresentados ajustes para o evento ocorrido em 1957- 6 6 5 5 4 4 IPP(3)_DEF1 IPP(3) 58, podendo-se observar variabilidade de um índice em ralação aos outros. 3 2 3 2 1 1 0 0 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 ATSM(3) 1,6 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 ATSM(3) Figura 1 - Ajuste polinomial para o evento Figura 2 – Ajuste polinomial para o evento 19571957-1958, sem defasagem trimestral. 1958, com defasagem de um trimestre. 3 6 5 5 4 4 IPP(3)_DEF3 IPP(3)_DEF2 6 3 2 1 3 2 1 0 0 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 -0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 ATSM(3) 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 ATSM(3) Figura 3 - Ajuste polinomial para o evento 19571958, com defasagem de dois trimestres. Figura 4 - Ajuste polinomial para o evento 19571958, com defasagem de três trimestres. Outro evento que também não foi intenso no Pacífico, mas relaciona-se com parte da precipitação na região, ocorreu nos anos 1976 a 1978. Foi longo, mas não intenso. E explicou grande parte da chuva em Campinas, como se pode observar nos ajustes realizados (Figura 5, sem defasagem e 6, com defasagem de três trimestres). Estes ajustes são respectivamente polinomiais de ordem dois e três apresentando desta 6 6 5 5 4 4 IPP(3)_DEF3 IPP(3)_DEF2 forma significativa variabilidade na explicação dessa precipitação. 3 2 1 3 2 1 0 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 ATSM(3) Figura 5 - Ajuste polinomial para o evento 19761978, com defasagem de dois trimestres. 0 -0,4 -0,2 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 ATSM(3) Figura 6 - Ajuste polinomial para o evento 19761978, com defasagem de três trimestres. Nas Figuras 7 a 10, estão representados os ajustes para um período marcado pela ocorrência de um evento El Niño mais intenso no Oceano Pacífico, que provocou chuvas intensas na região Sudeste e Sul do Brasil. Essas chuvas ocasionaram perdas econômicas significativas nessas regiões, além de problemas sociais, devido principalmente ao transbordamento de rios que agravaram as condições de vida das populações ribeirinhas dessa área. 4 Campinas é uma grande área impermeabilizada marcada, através da presença do homem, pelas alterações em sua paisagem natural. Ao construir edifícios, modificar e impermeabilizar margens pluviais, córregos e rios o homem potencializou o escoamento superficial da precipitação pluvial e acelerou o assoreamento destes.. Porém, os ajustes mostram que a precipitação pluvial, sem e com defasagens trimestrais, não está 8 8 7 7 6 6 5 5 IPP(3)_DEF1 IPP(3) totalmente explicada pela ocorrência desse evento de tamanha magnitude. 4 3 2 1 4 3 2 1 0 0 -1 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0 2,2 -1 2,4 0,0 0,5 1,0 ATSM(3) 1,5 2,0 2,5 ATSM(3) Figura 7 - Ajuste polinomial para o evento 19821983, sem defasagem trimestral. Figura 8 - Ajuste polinomial para o evento 19821983, com defasagem de um trimestre. Para a análise sem defasagem pode-se observar que 65% da chuva da área foi explicada pelo evento El Niño de 1982 e 1983 (Figura 7). 64% na defasagem de um trimestre (Figura 8), 63% na de dois trimestres (Figura 9) e 56% pela defasagem com 8 8 7 7 6 6 5 5 IPP(3)_DEF3 IPP(3)_DEF2 três trimestres (Figura 10). 4 3 2 1 3 2 1 0 -1 -0,5 4 0 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 ATSM(3) Figura 9 - Ajuste polinomial para o evento 19821983, com defasagem de dois trimestres. -1 -0,5 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 ATSM(3) Figura 10 - Ajuste polinomial para o evento 19821983, com defasagem de três trimestres. 5 8 7 7 6 6 5 5 IPP(3)_DEF1 IPP(3) 8 4 3 4 3 2 2 1 1 0 0 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0 2,2 2,4 2,6 0,0 0,5 1,0 ATSM(3) Figura 11 - Ajuste polinomial para o evento 19971998, sem defasagem trimestral. 1,5 2,0 2,5 ATSM(3) Figura 12 - Ajuste polinomial para o evento 19971998, com defasagem de um trimestre. As Figuras 11 a 12 apresentam os ajustes para o El Niño dos anos de 1997 a 1998, também considerado um fenômeno intenso. Observou-se significativa variabilidade na precipitação pluvial ocorrida em Campinas e a associação à temperatura da superfície do Pacífico. Aproximadamente 60% da chuva ali ocorrida pode ser explicada devido ao evento sem defasagem (Figura 11). A defasagem de um trimestre no índice de precipitação pluvial calculado, explicou que 58% da precipitação estava associada às anomalias positivas no Oceano Pacífico (Figura 12). CONCLUSÃO O evento ENOS explicou as chuvas ocorridas no município de Campinas, apesar de existir significativa variabilidade de evento para evento durante o período analisado. Mesmo os anos em que não houve ocorrência dos eventos, essa variabilidade mostrouse significativa, com anos mais chuvosos e anos mais secos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAVALCANTI, I.F.A. GAN, M.A. Anomalous precipitation in Southern Brazil and ENSO events. Apresentado no Workshop sobre o fenômeno ENOS e a variabilidade climática nas escalas sazonal a interanual: Impactos socioeconômicos, previsão e aplicações ao processo de tomada de decisão. Florianópolis, 1992. GRIMM, A.M.; GUETTER, A.K.; CARAMORI, P.H. El Niño Paraná: o que se pode esperar em cada região. Uma análise científica. Curitiba: Simepar, 1997 (informativo 1). KOUSKY, V. E., Seminário: Variabilidade atmosférica e oceânica durante a década do TOGA relacionada com o fenômeno El Niño- Oscilação Sul. CPTEC, 22/agosto. 1996. WYRTKI, K.; MEYERS. G.. The trade wind field over the Pacific Ocean Part I: The mean field and the mean annual variation. Univ. Hawaii, Tech. Rept. HIG-75-1, 26 pp. 1975 6