Leia a Carta, Oi - Pai, Preciso de Você

Transcrição

Leia a Carta, Oi - Pai, Preciso de Você
Em algum momento, o sonho se fez forte para sobreviver à realidade. Em algum momento, eu ouvi ao longe a voz do coração de um menino. Em algum momento, o Pai teve aquele sonho com um pedaço do Amor do filho. Esse sonho só quer aproximar, querer bem. Certo dia, o laço foi cortado, meu menino foi levado para longe, muito longe. Sigo sem estar com meu menino e, para tentar sobreviver a esse vazio, tento criar um sonho. E talvez esse sonho seja apenas uma forma de tentar me ajudar a entender o que eu sinto neste momento pelo qual venho passando, infinito e inevitável. Fico imaginando ele ter o Amor que sempre tivemos. Mas o fato é que mais de 400 dias se passaram. Intervalo. Desde a saída dele de nosso ambiente, quando se criou o vazio e a ausência. Como seria bom se o meu menino pudesse dar voz aos sentimentos de aproximação que sempre tivemos, das emoções que, bem pouco tempo atrás, compartilhamos por um longo tempo. Foram mais de 7 anos; e como foram intensos; e como a felicidade foi nossa maior companhia, com a confiança, crescimento e alegria. Mas se esvaiu com a distância. E o que me resta neste intervalo infinito e irreparável? O que fazer? Cruzar os braços diante desta separação forçada? Não há saída para caminho livre, nem remédio que cure esse mal. Apenas sinto, do que me resta, que eu gostaria de ouvi-­‐lo poder falar, dar voz a tudo de bom que um dia tivemos e que não sei como está agora. Apenas sinto que isso seria muito bom para ele, para mim. Apenas sinto que isso poderia nos ajudar, para quem sabe um dia podermos ter de volta a nossa convivência. Convivência que, por ora, vira passado no presente, sem futuro. Sem perspectiva de estarmos juntos, filho e pai. Como seria bom se o meu menino pudesse conversar, falar de todas as coisas boas que ele gosta, dos momentos que passamos juntos desde que ele nasceu. Então, criei um sonho. E neste sonho, nós estamos perto um do outro. Ele conversa, conta sobre tudo que temos passado nesse momento que ele está de um lado e eu fiquei do outro lado. Estamos a milhas e milhas de qualquer lugar, lugar este que não é mais o mesmo e, pelo andar dos acontecimentos, nem nunca mais será o mesmo este lugar. Porque a nossa casa continua; mas é de quem agora? A casa agora é apenas terra de ninguém, território afastado, com fronteiras que impedem a aproximação. E aqui, no exílio do meu próprio habitat, o sonho que criei me ajuda. No sonho, ele tem aquele Amor incondicional que sempre tivemos. No sonho, ele diz o que sempre me disse: “Você é o melhor Pai do mundo”. No sonho, ele sente minha falta de uma forma absurda e quer muito poder me reencontrar para ficarmos juntos por quantas vezes pudermos. Nesse sonho, ele ama estar na cidade em que nasceu e onde compartilhava tantos momentos, com tantos amigos, com tanta alegria. No sonho, ele imagina que foi apenas uma viagem e que tudo poderá ser como antes. No sonho, ele imagina os momentos felizes do passado e imagina os momentos felizes no futuro, pois, nesse sonho, imaginar esses momentos seria o seu maior presente. É apenas um sonho, onde eu imagino que ele possa querer o Pai perto dele. É apenas um sonho, onde penso que ele possa precisar do Pai por perto. Nesse sonho, eu ouço a vez dele me dizer: “Pai, eu preciso de você”. E nesse sonho, eu digo: “Davi Gabriel, te amo muito e vou cuidar de você, sempre”. (...) Oi, Pai. Estou com Saudades. Não posso mais te ver, abraçar e beijar você todos os dias, brincar, conversar. Sinto muitas saudades da minha casa. Sinto saudades do meu irmão e de minha avó. Pai, você é e sempre será “o melhor Pai do mundo”, sempre disse isso quando você fazia aquele pão ‘delicioso’ todos os dias de manhã cedo. Aí eu te apertava, te abraçava e beijava você com toda a minha força. Pai, eu sinto saudades de ir com você todos os dias pra escola. E também tenho saudades dos dias em que você ia me buscar no horário de saída. Pai, eu tenho muita saudade de vc. Eu ficava muito feliz brincando na Lagoa de Coca de Cola, na Praia da Joana, na Praia das Tartarugas, na Praça da Baleia, lá "no" Rio das Ostras. Não sei se um dia vou poder te ver novamente. Aqui, onde estou agora, às vezes falam sobre o senhor. Sinto sua falta. Pai, eu te amo. Quero te ver, poder estar com vc. Estou me acostumando a ficar sem você. Muitas vezes vou dormir tarde. Aí no Rio eu estudava de manhã, íamos juntos para a escola. Depois da escola, eu fazia aula de judô e jogava futebol à tarde, ia pra natação. E ficava muito feliz, no fim da tarde, quando eu via que era vc que foi me buscar. Despedia dos meus amigos e saía correndo para pular no seu colo, te dar um abraço e um beijo bem forte. Ninguém aqui vem falar pra mim que eu vou poder ver o senhor de novo. Já são muitos dias longe. Quero te ver, mas só ouço dizer palavras que não me deixam perto de você. Todo esse ano, que passei aqui, eu não ouvi ninguém falar que vou poder viajar aí para o Rio, para ficar com o senhor de novo. Ninguém quer que eu vá encontrar com vc: ninguém diz isso pra mim. Até falam coisas sobre vc, Pai, e não são poucas vezes. Pai, te amo muito. Você é "o melhor Pai do mundo". Pai, fique bem, estou bem. Estou brincando, fazendo as minhas lições de casa, obedecendo e não respondendo às pessoas, como o senhor sempre me ensinou. Posso brincar aqui, ganhei até um cachorrinho (o Kevin), me deixam jogar vídeo game direto, mas eu também quero ficar perto do senhor. Tenho medo de falar isso. Tenho medo. Pai, eu preciso de você. 

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