5 erros dos conselhos

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5 erros dos conselhos
liderança e pessoas | reportagem
estratégia e execução
sustentabilidade
5
erros
dos
conselhos
Polêmicas envolvendo ícones da comunidade
empresarial evidenciam a fragilidade dos conselhos de
administração no Brasil, mas podem levá-los à esperada
profissionalização, estimulando empresas e conselheiros
a atacar os verdadeiros problemas estruturais
A reportagem é de
Adriana Salles Gomes
e Sandra Regina da Silva,
respectivamente editora-chefe e
colaboradora de HSM Management.
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As múltiplas armas dos
conselheiros
Veja como membros de conselho de administração
podem agir em casos complexos; estes sÃo
hipotéticos, mas inspirados na realidade recente
O
O trágico suicídio do vice-presidente do board da Enron, J. Clifford
Baxter, em 2002, abriu uma ferida nos conselhos de administração. Mais até do que colegas que
foram presos, isso chamou a atenção do mundo para a irresponsabilidade de conselheiros com os
acionistas de empresas.
O trauma chegou ao Brasil, por
meio das companhias com ações
negociadas nos EUA, mas diluído.
Agora, nos últimos 12 meses, dois
episódios nos deram nosso próprio
trauma: envolvem a organização
que é símbolo da brasilidade, a Petrobras, e o empresário que vinha
inspirando milhares de jovens com
seu empreendedorismo, Eike Batista. Os conselhos da Petrobras e da
OGX, de Batista, aprovaram estratégias suspeitas de suas empresas e
isso ganhou contornos de escândalo.
Surgiu a dúvida: os conselheiros
teriam sido ingênuos, negligentes
ou cúmplices? E o que seria pior? O
maior interesse de investidores em
participar do capital das empresas
brasileiras, abertas e fechadas, aumentou a temperatura desses casos.
A empresa quer comprar 50% de uma fábrica nos EUA, mas o
valor é bem superior ao praticado dois anos antes. Qualquer
operação de compra, venda ou fusão demanda valuation de uma
consultoria internacional –ou duas, dependendo do preço. Como
o conselheiro não pode dizer “eu não sabia”, ele só deve aprovar
uma aquisição se tiver acesso a essa avaliação com antecedência
e estudá-la. O conselho também pode exigir due diligence, com
o pagamento condicionado à realidade encontrada. A lógica é:
só se paga aquele valor se não houver problemas inesperados.
A empresa faz seu plano de crescimento, que será divulgado, com
base em um volume de produção futuro que é imenso.
Qualquer projeção é extremamente delicada, em especial
se for uma ação que influi muito nas negociações da bolsa de
valores. Então, o conselho deve tratar qualquer projeção com
atenção redobrada, privilegiando tanto as informações técnicas
–segundos e terceiros pareceres podem ser solicitados– como
a compreensão do contexto em que a projeção foi feita. O
conselho deve fazer-se, por exemplo, a seguinte pergunta: os
executivos recebem bônus mediante a mera identificação
da possibilidade de produzir? Se sim, isso pode afetar suas
estimativas. O conselheiro precisa tomar um cuidado adicional
se o CEO for carismático e parecer preparado; o fato de ele
dominar vários idiomas não quer dizer que seja bom gestor.
A empresa investe pesadamente em contratos futuros de dólar
para fazer hedge (proteção) para sua receita de exportações.
Se o lucro não operacional da empresa (a receita financeira) é
muito alto, pode significar ineficiência de caixa –há um caixa maior
do que o necessário e deveria ser distribuído. O conselheiro deve
questionar o porquê da não distribuição e, diante do argumento
do hedge, conferir a relação entre ele e exportação. Se, a cada
US$ 50 exportados, a diretoria executiva fez um hedge de US$ 40
para garantir-se ante uma flutuação do dólar, é um caso de proteção
contra os riscos. Mas, se US$ 50 exportados corresponderam a
um hedge de US$ 150, é especulação que aumenta os riscos.
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À esquerda, Maurício Botelho, ex-presidente do conselho da Embraer (ao qual ele
renunciou por discordância) e conselheiro da CBMM; acima, Antonio Pizarro Manso,
conselheiro do Banco Caixa Geral Brasil, da GPO (empresa de engenharia da Solví),
da TAM Aviação Executiva e da LM Wind Power do Brasil, que frequentemente atua
como membro independente e participa de comitês
• Conselho de compadres. Pouco ativo, existe
somente para cumprir exigências legais; é composto por amigos do acionista controlador.
• Conselho de notáveis. É formado, para
atrair investidores, por ex-ministros, ex-presidentes do Banco Central e empresários de sucesso,
todos com pouco tempo disponível. Veio na esteira da onda da abertura de capital, em 2006 e 2007.
• Conselho profissional. Cumpre seu papel de
ajudar a empresa a crescer e atingir melhores resultados. O modelo avança de dois anos para cá.
“Neste exato instante, muitas empresas estão
decidindo migrar para conselhos mais profissionais”, afirma Carlos Júlio, conselheiro de empresas como Tecnisa e Camil. Não há estatísticas
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crise
boa
A expectativa é de que
os casos Petrobras e
OGX proporcionem um
salto de qualidade aos
conselhos, se a investigação,
feita por instâncias como
a Comissão de Valores
Mobiliários, for séria
disso, nem do número de empresas com conselho no Brasil,
mas ninguém duvida que as
647 companhias abertas (dado
de 2013) sentiram o golpe.
HSM Management fez
duas perguntas a conselheiros
e especialistas da área: qual a
explicação para os traumáticos
acontecimentos? Que mudanças podem ser feitas para evitar
que esses problemas se repitam
e acelerar o ingresso na fase
profissional?
a explicação
Ingenuidade, negligência ou
má-fé mostram-se insuficientes
para explicar os casos Petrobras
e OGX –ou mesmo o da Sadia,
ocorrido em 2008. Essas ocorrências resultariam muito mais
de uma distorção coletiva do
que de erros individuais e isolados, conforme os especialistas.
Alguns geradores dos problemas seriam tão prosaicos
quanto a terminologia adotada na área. Se você diz que
determinado conselheiro é
Divulgação
A ebulição pode mostrar-se uma grande oportunidade, contudo. Quem o afirma é Piero Minardi, sócio da Gávea Investimentos, investidor
do tipo que participa dos conselhos das empresas
em que investe. “Se a investigação for séria, como
parece estar sendo, e os culpados forem punidos,
teremos um salto de qualidade nos conselhos.”
A crise em curso talvez acelere a evolução pela qual os conselhos vêm passando no Brasil, na
opinião de Paulo Conte Vasconcellos, coordenador da comissão de conselho de administração do
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa
(IBGC). Conte distingue três fases evolutivas:
representante de tal acionista, erra. O conselheiro tem de decidir o que é melhor para a
empresa, não para o acionista, e é assim que
ele defende os acionistas –todos eles.
Outras raízes têm maior profundidade, como o
fato de o papel do conselho de administração ainda ser culturalmente subdimensionado no Brasil.
“Muitos controladores, seja como donos, seja
como conselheiros ou gestores, continuam chamando para si uma parte bastante robusta das
decisões”, afirma Sandra Guerra, presidente do
conselho do IBGC.
Israel Vainboim, experiente conselheiro, completa que controladores em geral não gostam de
conselhos, por mais que digam o contrário; enxergam a participação de pessoas não envolvidas
com a companhia como intromissão. “O dono
acha que ninguém de fora sabe tanto do negócio
quanto ele.”
A própria divulgação da excelência em governança às vezes prejudica os conselhos. Várias empresas incluem as boas práticas do código do IBGC em seu sistema formal de governança, mas suas práticas reais são outras.
Ilustra isso a companhia em que o CEO não é
o presidente do conselho (recomendável), mas
age como se fosse. “Um modelo de governança
menos avançado e real é preferível a um modelo irreal, porque é passível de aperfeiçoamentos”, diz Guerra.
Uma terceira explicação para os casos traumáticos vem de José Guimarães Monforte, um
dos mais experientes conselheiros do Brasil,
que recentemente integrou o conselho da Petrobras, pós-crise. Para ele, as empresas estão
acelerando agressivamente seu crescimento, e
as funções de controle, como a do conselho,
têm de correr atrás, em vez de andar junto.
Essa cultura
de donos
fortes acaba
por diminuir o
papel real do
conselho de
administração,
atrapalhando a
compreensão
do que ele
realmente
deve fazer
feedback em 360 graus
a embraer inova também na avaliação do conselho
Em 2006, Maurício Botelho, presidente do conselho
de administração da conhecida fabricante de aeronaves
brasileira depois de 12 anos como seu CEO, percebeu um
desafio novo: precisaria, em dois anos, compor uma chapa de
conselheiros para ser votada na assembleia geral de acionistas.
Ele manteria os mesmos como candidatos ou os trocaria?
A resposta veio com o processo de autoavaliação anual.
No primeiro ano do mandato, serviria para correção de rumo;
no segundo, para definir a candidatura. Em vez de focar só o
colegiado e a si mesmos, os conselheiros avaliaram também seus
pares. O presidente do conselho –Botelho– era avaliado duas
vezes, como conselheiro e como presidente, por sua habilidade
de coordenação, pelas informações divulgadas etc. Houve
constrangimentos, mas foram superados.“Toda avaliação é rica desde
que seja honesta e cara a cara; e as pessoas entenderam isso.”
erros e aprendizado
Há, conforme HSM Management apurou
no mercado, cinco erros comuns aos conselhos
cuja correção poderia, de fato, profissionalizá-los:
1. Acionistas e executivos não
entendem para que serve o conselho.
O que faz um conselho de administração?
Minardi, que já participou do capital e da gestão de 45 companhias até hoje com a Gávea,
não hesita: “Ajuda na gestão e no projeto de
crescimento da empresa”.
Claro, o ponto de partida da gestão é a visão do CEO. Mas esta “é validada ou modificada pelo conselho, sempre com o objetivo de
perpetuar a organização”, como explica Carlos
Júlio, experiente nas duas cadeiras, de CEO da
construtora Tecnisa e, agora, de seu conselho.
Com o conselho, a gestão passa a não depender
apenas do presidente-executivo, como lembra
Vainboim –e isso é bom tanto para a empresa
como para o CEO.
Outro modo de explicar a função do conselho é
que ele “cria valor para o negócio”. Como supervisor e fiscalizador, combate a destruição de valor
e, como orientador e agente de desenvolvimento,
ele o cria, especialmente no longo prazo.
Essa concepção nem sempre tem boa aceitação entre controladores e executivos, por uma
questão tão ancestral quanto a da disputa de
poder, mas não deveria, diante do alarmante
número de executivos que se queixam de falta
de tempo para pensar em algo que não seja a
operação diária.
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• Segredos entre a diretoria executiva e o conselheiro. Como diz Vainboim, “os executivos gastam 90% do tempo mostrando como suas companhias são lindas e não têm problemas. Não
pode ser assim; os conselheiros precisam saber de
tudo para atuar como devem”.
• Inexistência de uma agenda anual temática.
“É a espinha dorsal da governança. Deve ter assuntos fixos e flexibilidade para encaixar outros;
entre os fixos, precisam estar presentes diretrizes,
planejamento estratégico, aprovações, mapeamento de riscos com discussão sobre os que devem
ser eliminados e aqueles com que se pode conviver”, sugere Monforte. A agenda anual, quando
existe, costuma ser pró-forma.
• Baixa frequência de reuniões. Conforme estudo da KPMG, mesmo nas empresas de listagem
do Novo Mercado, mais evoluídas em governança,
há 5,7 reuniões de conselho por ano, ou seja, as
reuniões são bimestrais. Mesmo que estas tenham
duração mais longa –e lembre-se de que um dia
inteiro nem sempre é produtivo–, não se trata de
um bom modo de “compartilhar” gestão.
• Recebimento da pauta das reuniões em cima
da hora e sem detalhamento. Parece incrível, mas
essa reclamação é frequente; segundo alguns, há situações em que a pauta nem é entregue antes se
os conselheiros não cobrarem. “O ideal é ter de
uma semana a 15 dias para que possamos estudar
Paulo Conte
Vasconcellos,
coordenador
da comissão
de conselho de
administração
do IBGC
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bem a pauta; uma informação
enviada sem tempo para permitir uma análise melhor pode ser
uma das razões para a submissão à vontade do controlador”,
segundo Antonio Pizarro Manso, outro conselheiro experiente,
de empresas como Banco Caixa
Geral Brasil e TAM.
• Não estabelecimento dos comitês de análise necessários. A
KPMG estudou a governança
de 232 empresas em 2013 e menos de um quarto da amostra
tem comitês. Achou 37 companhias com comitê de riscos; 48
possuem órgãos de RH, e 50, de
finanças –esses são os mais frequentes, além do conselho fiscal
(que costuma ser um informante
do conselho de administração).
Embora haja um aumento em
relação a anos anteriores, isso é
pouco. “Os comitês tornam o
conselho de administração funcional; são eles que fazem suas
decisões acontecerem”, afirma
Minardi, cuja empresa de investimentos Gávea exige a formação de comitês para participar
de um negócio.
“Nos colegiados com muitos conselheiros, como os de
11 membros, se não há comitês, os conselheiros não conse-
apenas 30%
das empresas
possuem
conselheiros
independentes
Sandra
Guerra,
presidente
do conselho
do IBGC
e autora
do Guia
Prático de
Governança
Corporativa
guem fazer nada mais do que
carimbar decisões; é um desastre”, reforça Vainboim.
Não montar comitês por economia é tolo: são equipes menores –podem ter três pessoas–,
compõem-se muitas vezes também de executivos e, segundo
Pizarro Manso, a empresa não
precisa criar um órgão para cada assunto que surge. “Pode-se
determinar que um conselheiro se dedique àquilo ou ainda
criar um grupo de trabalho situacional com três conselheiros
para tratar do caso específico.”
• Ausência de conselheiros
independentes de qualidade.
Todos os conselheiros devem
ser independentes em suas decisões, mas o significado de independência nesse caso remete
a não ser indicado por nenhum
acionista, além de ser externo à
organização. Entre 30% e 34%
das empresas possuem conselhos independentes, conforme
a pesquisa da KPMG, e a independência, além de incomum,
é um desafio, porque, como diz
Minardi, em 60% dos casos os
Divulgação; luís simione; PAULO FRIDMAN
É essa compreensão do real papel do conselho
que transforma as práticas mais apontadas como
causadoras da ineficiência dos conselhos:
por
bimestre
Na maioria das empresas, os
conselhos se reúnem 5,7 vezes
por ano, pouco para um
envolvimento do tipo que cria valor
o investidor
que é presente
como é a gestão da
gávea investimentos
Se uma empresa quer ir
para a bolsa de valores, tudo
o que ela pode desejar é
ter a Gávea Investimentos
como sócia. Fundada em
2006 pelo ex-presidente
do Banco Central Armínio
Fraga, a empresa de private
equity tornou-se um
selo de qualidade para
companhias que querem
abrir o capital. Ela não
acumulou o patrimônio atual
de US$ 4,6 bi­lhões à toa;
mesmo com participação
minoritária (5% a 49%),
a Gávea faz questão de
participar da gestão.“Sempre
montamos conselho de
administração, indicando
dois membros em geral, e
fazemos questão de comitês
que tornem o conselho
funcional, no mínimo três:
estratégia/operações, RH,
finanças/auditoria”, diz
o sócio da Gávea Piero
Minardi. “Agnóstica” quanto
à atividade das empresas
escolhidas, a Gávea prioriza
as com gestores parceiros.
“Procuramos sócios.”
conselhos têm um único membro independente. “É preciso
que o conselheiro independente
seja muito bom tecnicamente”,
reforça o sócio da Gávea. Pizarro Manso é frequentemente
membro independente e acrescenta que não é difícil acontecer
de conselheiros independentes,
mesmo qualificados, ficarem
submissos à vontade do controlador. Não aceitar passivamente
as decisões por voto da maioria
controladora requer esforço, em
especial quando se está só.
• Desatenção aos recursos
humanos. O estudo da KPMG
observou em 2013 a tendência
de comitês de remuneração serem convertidos em comitês
de pessoas, ganhando maior
abrangência, mas ainda são tímidos. Como diz Maurício Botelho, que presidiu o conselho
da Embraer, o desenvolvimento de pessoas tem de ser a atribuição de maior relevância.
2. Não se recrutam as
pessoas certas; não se
sabe quem elas são.
Uma empresa precisa saber definir quais competências e experiências são neces-
Israel Vainboim, membro do conselho do Itaú Unibanco, da
Embraer, da Iochpe-Maxion e das Lojas Marisa, que incluiu em seu
livro (ao lado) o capítulo “A vida de conselheiro de empresas”
sárias a seu conselho, porque nem sempre um
bom executivo é um bom conselheiro. “Onde o
executivo exige, o conselheiro recomenda, por
exemplo”, diz Júlio. Diretrizes básicas não são
seguidas, como a diversidade de formações acadêmicas, experiências de vida, gêneros, origens
e até geográfica. “O conselho diverso é muito
mais interessante e previne que haja um fenômeno chamado group thinking, em que todos
pensam igual”, diz Sandra Guerra.
Um assunto em alta é o aumento da participação das mulheres nos conselhos, que hoje ocupam
não mais do que 8% das posições, segundo a pesquisa da KPMG. Para Ana Paula Chagas, que
faz executive search para conselhos e preside a
Women Corporate Directors no Brasil, isso seria
relevante.“Mulheres costumam fazer as perguntas
que os colegas homens evitam.”
Nos conselhos atuais impera o desequilíbrio,
porque sobram profissionais com experiências similares em finanças, controladoria, área jurídica,
macroeconomia, conhecimento técnico setorial,
conforme Chagas, mas falta quem domine sustentabilidade, RH, redes sociais e tecnologia. “Só que
é obrigatório ter o conhecimento financeiro bási-
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3. Menos de três em dez
Piero Minardi,
sócio da Gávea
Investimentos,
modelo de
investidor que
atua na gestão
das empresas
em que investe
por meio dos
conselhos;
muitos fundos
de pensão
e fundos
estrangeiros
ainda não têm
estrutura para
isso. Entre as
empresas do
portfólio da
Gávea estão
Magnesita, Azul,
Tickets for Fun
e Chilli Beans
conselhos são avaliados.
O conselho da holding do
grupo Odebrecht é avaliado
desde 2002. No início do ano,
cada membro tem uma avaliação individual em uma reunião
com o presidente e os dois discutem possibilidades de desenvolvimento. Depois, o presidente consolida os dados sem
identificar fontes e isso vai ao
colegiado, que debate pontos
gerais de melhoria.
O conselho da Natura é avaliado desde 2006. Ele mistura
avaliações externas e autoavaliações do colegiado, mas não faz
avaliações individuais, por causa
da senioridade dos membros.
Também desde 2006, a Embraer faz autoavaliações, e em
360 graus: os conselheiros avaliam a si mesmos, aos pares e
ao colegiado.
Essas três empresas são exceção à regra, porque entendem
a diferença que a avaliação faz;
em apenas 7% das companhias
tradicionais há avaliação de
conselhos, segundo a pesquisa
da KPMG, e o índice não ultrapassa 29% entre as empresas
de melhor governança.
Isso ainda é motivo de constrangimento, mas é crucial
para a mudança. Israel Vainboim explica que há três níveis de avaliação –avaliação
externa do conselho, autoavaliação dos conselheiros e
autoavaliação do colegiado–,
um processo evolutivo implantado em etapas. “No Itaú
Unibanco o fazemos há cinco
anos: há uma avaliação externa do funcionamento do conselho e avaliamos o presidente
da companhia e o presidente
do conselho, além de fazermos uma autoavaliação. Este
ano, pela primeira vez, cada
conselheiro vai avaliar os colegas”, conta Vainboim.
ir além
Conselheiro tem de
visitar fábrica, conversar com
fornecedor e cliente, estudar
o impacto da empresa
na sociedade
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Os próprios elementos avaliados reforçam a função do conselho de criar valor: busca-se
medir se cada um fez seu papel
de definição de estratégia, como
supervisiona o desempenho da
empresa e dos executivos, como
planeja a melhoria dos pontos
indicados, como se comporta
em relação a pessoas, riscos etc.
4. Ser conselheiro não
é visto como carreira.
Se um conselheiro depende
de um conselho como se depende de um emprego, isso não
é bom: como ele pode sugerir
preservar o caixa da empresa
em vez de distribuir dividendos
polpudos se teme não agradar?
Por isso, segundo os entrevistados, o conselheiro deve agir
como quem administra uma
carreira. Entre outras coisas, isso significa participar de vários
conselhos para não depender
de nenhum –recomenda-se de
quatro a seis; mais tende a ser
incompatível com o princípio
da dedicação. Ter atividade
complementar é salutar, mas
que não lhe tome todo o tempo,
como seria um cargo de CEO.
A carreira implica preparo,
fazer escolhas, dizer “não”. Por
iniciativa própria, “conselheiro
tem de visitar fábrica, conversar com fornecedor e cliente,
entender de que forma o produto impacta a sociedade”, diz
Conte, complementando que
muitos poucos fazem isso.
Conselheiros também têm
de saber escolher as empresas,
pesquisando bem sobre suas
práticas de governança e sobre
o negócio. Para Monforte, a es-
Divulgação
co, que pode ser obtido na certificação do IBGC”, diz Júlio.
Para o cargo de presidente
do conselho, Botelho crê ser
chave a experiência prévia como CEO, mas esse CEO precisa ser retreinado. “Ele tem
de agir como em uma terapia
em grupo, sendo o terapeuta
que faz todos se sentirem confiantes para falar de questões
delicadas”, define. O comum é
o presidente do conselho falar
mais que os outros ou antes deles, inibindo-os, e não sabendo
interpretar atitudes e falas, algo
crucial para construir consenso.
mais que o
glamour,
conta a
credibilidade
LOLA; Divulgação
trutura corporativa de gestão
de riscos e compliance é primordial na decisão; a capacidade de inovar conta muito para
Botelho. Empresas que praticam remuneração variável, por
reunião, não são bem-vistas;
não criam laços.
Na carreira de conselheiro, a
reputação pessoal tem de vir primeiro, concordam os entrevistados. “Mais que o glamour, conta a credibilidade”, diz Júlio. E,
embora deva exigir seguro para
o caso de uma ação judicial fazê-lo pagar indenizações, o conselheiro tem de lembrar que, se
não atuar direito, seus bens podem ser bloqueados.
5. O conselheiro não
entende para que serve
o conselho.
Boa parte dos conselheiros
ainda não entende a real função do conselho, de criar valor
para a empresa. Para tanto, o
conselho faz a discussão, a aprovação e o monitoramento da
estratégia, em primeiro lugar. O
conselheiro precisa ter discernimento para saber se está à altura do desafio, o que implica estar preparado para o confronto
quando for preciso –de tempos
Luiz Carlos
Cabrera,
especialista
em executive
search e
um dos
pioneiros no
recrutamento
de conselheiros
no Brasil
em tempos, será preciso. Decisões por consenso –e não por
maioria de votos– são mais eficazes na execução, mas, sempre
que um conselheiro discordar
delas, deve solicitar o registro
de seu voto ou até renunciar. O
mesmo vale para suspeitas de
fraude e corrupção. Explicitando sua posição, qualquer acionista poderá vê-la e assim ele
estará cumprindo sua função.
rumo a 2020
Isso inclui
monitorar e
desenvolver
pessoas,
gerenciar riscos
e acompanhar
resultados
O especialista em executive
search Luiz Carlos Cabrera
monta conselhos desde 2000 e
conduz avaliações desde 2008.
Ele conta que começou a estudar governança corporativa
em 1990, antevendo a priorização do assunto. Porém somente dez anos mais tarde o
tema começou a ser discutido
com propriedade aqui.
Só que a lentidão brasileira
em relação a governança não
pode ser desculpa para os conselhos de administração atrasarem sua profissionalização,
porque os conselhos devem
ser distintos por volta de 2020.
“Eles vão pensar mais em estratégia do que nos resultados
passados. Terão de responder a
questões novas, como se é bom
ou ruim a empresa estar tendo
um lucro fabuloso nos últimos
três anos e só investindo 2%
dele em pesquisa e desenvolvimento. O diálogo entre conselho e investidor será intensificado”, diz Sandra Guerra.
A mudança, segundo ela,
começará por uma nova mentalidade. “A maioria dos conselheiros atuais, na faixa dos 50 a
60 anos, não pensa em conselho com protagonismo, porque
quase não viu isso em sua trajetória, mas os jovens pensarão.”
As empresas deverão entender que não aproveitar o conselho é desperdício de dinheiro. E pode ser muito dinheiro:
um conselho modesto, de cinco
membros, não sai por menos de
R$ 600 mil por ano –segundo
pesquisa do IBGC, a remuneração anual de conselheiro varia
de R$ 120 mil a R$ 650 mil, dependendo do setor e do porte da
empresa. Que valha a máxima
de que aprendemos mais com os
erros do que com os acertos.
José Guimarães Monforte, conselheiro
da Petrobras-BR Distribuidora, do
Tribanco (Grupo Martins) e da Rossi
Residencial e presidente do conselho
consultivo da Premix Nutrição Animal
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